



























































































































Quando se pensa em carros 100% elétricos muito se fala sobre economia e sustentabilidade. E claro, tais fatores são realmente diferenciais – segundo um estudo, o quilômetro rodado no modo elétrico custa cerca de quatro vezes menos que o mesmo trecho percorrido com gasolina. Mas você já parou para pensar na praticidade que esse tipo de modelo traz para o dia a dia?
Assim como tantos outros aparelhos elétricos que usamos na nossa rotina, os automóveis desse tipo podem facilitar, e muito, a vida dos usuários. Basta criar o hábito de carregá-lo – e já existem inúmeras maneiras e lugares para se fazer isso. A lógica é simples: se a gente se programa para ter o celular com bateria quando precisa, por que não fazer o mesmo com automóveis, que ainda trazem uma série de outros benefícios?
O setor vem ganhando cada vez mais destaque e, nesse quesito, a Volvo merece atenção especial. Dois de seus carros, incluindo o aclamado XC60, estão na liderança em eletrificação no segmento Premium em 2023.
A autonomia alcançada pelos veículos da Volvo é suficiente para o uso nas cidades e, não à toa, a marca tem investido incessantemente em infraestrutura de carregamento, com mais de 1000 eletropostos País afora, e planos grandiosos para os eletropostos de recarga rápida – em 2024, serão 28 deles e cerca de 10.000 km de rodovias cobertas. “É um dos maiores investimentos que uma marca faz em infraestrutura de eletrificação no Brasil”, explica Marcelo Godoy, diretor de Finanças da Volvo Cars América Latina e de Operação de Infraestrutura de Carregamento Brasil.
Nesses locais, que contam com monitoramento full time, é possível recarregar veículos 100% elétricos de zero a 80%, em uma média de 45 minutos. Se considerarmos nove dos dez eletropostos já instalados pela marca, foram realizadas 3.000 recargas, com um consumo de 64.500 kWh. “A energia utilizada nesses locais é suficiente para um veículo como o XC40 Recharge Ultimate rodar 331 mil quilômetros. Essa distância equivale a quase uma viagem de ida à Lua”, afirma Rafael Ugo, diretor de Marketing Volvo Car América Latina. E tudo isso, vale lembrar, sem emitir poluentes.
Para localizar uma unidade, basta acessar o hotsite da marca, que guarda todos os endereços, além de apontar qual o mais próximo do usuário. +eletropostosvolvocars.com.br
5 V ANTAGENS DE TER UM CARRO ELÉTRICO
1.
Custo reduzido em relação à gasolina (em média 4x mais barato)
2. Pegada de carbono reduzida
3. Condução silenciosa e sem emissões
4. Bateria com vida útil longa e garantia de oito anos
5. Revisões de dois em dois anos ou a cada 30 mil km, com direito a filtro de ar, checagem de fluido de freio e limpeza dos para-brisas
Os anos são como nuvens.
Em frágeis, porém incessantes, transformações.
Vivemos tantos céus.
Tantas nuvens passam por nós.
De algumas conseguimos até distinguir ferozes contornos. Já outras nos remetem a silhuetas de enormes anjos.
De vez em quando estão carregadas. E então chove. Às vezes são como brisa leve e chegam formando uma sublime sombra por cima do chão sedento. Eventualmente pintam o horizonte com apaziguadoras pinceladas alvas.
E os anos, assim como as nuvens, despontam em nossos céus.
Chegam suavemente e, quando estamos começando a nos acostumar com suas formas e entendendo os seus porquês, escondem-se em uma distraída piscadela.
E, então, ao fim de cada evaporar, o que fica são os arcos-íris que brotam de nossas névoas.
Que esta leitura seja como um nascer do Sol.
Bem-vindos de volta à Carbono Donna LILI CARNEIRO PUBLISHERBrasil: São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília,Salvador, Cuiabá, Ribeirão Preto, Curitiba, Belo Horizonte, Goiânia, Jaú, Florianópolis,Balneário Camboriú, Manaus, Maceió
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Nº 02 • 2023
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26. BOAS NOVAS Radar ligado
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50. MÚSICA Cássia Ávila
52. FIRST TIME Maria Homem
56. COLEÇÃO Ana Zambon
60. ESPORTE Renata Silveira
64. CONSUMO Upcycling
74. ARQUITETURA
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80. ECONOMIA Empresas de família
89. NO CAMINHO Rosa Zaborowsky
92. LITERATURA Protagonistas
96. VINHOS Mulheres e uvas
104. ROTINA
Marisa Ribeiro Nº 02 • 2023
110. CULTURA Podcasters
118. EMPREENDEDORISMO Adriana Lotaif
120. SAÚDE Dermatologia
124. MERCADO Garimpeiras
130. TERAPIA Psicodélicos
134. TENDÊNCIA Botânica
138. VIAGEM Fora da rota
Movidas pelo desejo de igualdade, as mulheres vêm quebrando paradigmas e assumindo o protagonismo em defesa de seu território. Esta imagem faz parte do projeto Mulheres do Xingu, desenvolvido pela artista SITAH junto às indígenas, que consiste em amplificar suas vozes por meio de fotografias que comuniquem sua mensagem. As fotos do projeto foram selecionadas pelas próprias indígenas.
Mulheres do Xingu | Meninas Kaiabi dançando durante a Assembleia do Movimento de Mulheres do Xingu realizada no Médio-Território Indígena do Xingu em 2019 | @sitah_photoart
“As mulheres do Xingu sempre lutaram pela natureza, e para manter suas tradições. Pajés, cacicas, parteiras... trabalham e resistem para que suas sabedorias sejam mantidas. As jovens lideranças estudam para ocupar novos cargos e profissões e já assumem o lugar de articuladoras em movimentos e atos políticos. Elas são a força feminina da floresta”, Sitah
no 02
No nosso caldeirão de boas-novas, um pouco de tudo: esporte, moda, literatura, bem-estar, drinks, joias e mulheres incríveis
Por Carbono DonnaNão basta ser uma velejadora com duas medalhas olímpicas de ouro e uma de prata. Nem ter sido nomeada como UK Youth Sailor of the Year, ou ocupar o cargo de estrategista da tripulação do Great Britain SailGP no campeonato mundial que está mudando a percepção da vela. Hannah Mills quer mesmo é usar o esporte para engajar jovens.
Aos 35 anos, a embaixadora de sustentabilidade e de vela da Rolex está cada vez mais ciente da força que sua imagem pode atingir e por isso tem buscado iniciativas importantes com dois objetivos principais: melhorar a inclusão feminina no esporte e combater as mudanças climáticas.
Entre os projetos de Hannah está o Big Plastic Pledge, um movimento de atletas para erradicar o plástico de uso único dentro e fora do mar. “ Não é só sobre ser excepcional no esporte. Você tem que entender a responsabilidade que vem com isso, particularmente a importância de inspirar jovens. Todo mundo precisa se inspirar em algo ou alguém para atingir seu potencial”, ela conclui. @rolex
Todos os anos espera-se ansiosamente pelo lançamento da Red Carpet Collection da Chopard. Este ano a apresentação deu-se na ocasião do 76º Festival de Cinema de Cannes e Chopard atingiu o auge da arte na alta joalheria. A presidente e diretora artística Caroline Scheufele projetou 76 obras-primas que compõem uma série fascinante inspirada na arquitetura, em museus e galerias. Estamos de queixo caído com esse anel! @chopard
Basta desembarcar na Itália para reparar: as italianas têm um estilo caloroso, autêntico e refinado que é só delas. Foi pensando nisso que a Persol criou a coleção Sartoria, repleta de detalhes de personalidade. Destaque entre as novidades da Luxottica, a linha é uma verdadeira homenagem à essência italiana. @luxottica
A jornalista e escritora Petria Chaves, além de apresentadora da CBN e dona de um vestir cheio de personalidade (que pode ser visto na seção Meu Estilo), é também autora de um livro recémlançado que Donna adorou e indica! Escute Teu Silêncio nos conduz – com lindos relatos e ótimas entrevistas – para dentro de nós, em época de tantos –e desnecessários – ruídos externos.
@planetadelivrosbrasil @petriachaves
ESG NEWS Entre os colaboradores do grupo Soma, responsável por marcas como Farm, Animale e Cris Barros, 70% são mulheres, sendo 50% delas em cargos de liderança.
A Gucci apresenta a refrescante coleção Summer Stories. Projetada para capturar o espírito da estação do Sol, traz peças que evocam a alegria coletiva e vibrante do calor. Ícones da marca –que, vale dizer, é a primeira casa italiana de luxo a receber a Certificação de Igualdade de Gênero – , como as bolsas Jackie 1961 e Horsebit 1955, ganham versões leves e inovadoras em tecido de ráfia. Na seleção prêt-à-porter, camisas florais, maiôs vibrantes, alpargatas diurnas e acessórios de praia, como toalhas estampadas e óculos coloridos. Para uma inesquecível temporada al mare. @gucci
A silhueta minimalista da Fendi C’mon, bolsa satchel que acaba de chegar ao Brasil, esconde um processo de montagem meticuloso. São 20 componentes diferentes que elevam a bolsa a uma obra-prima do artesanato. As proporções impecáveis criam um contorno redondo e suave com linhas curvilíneas e femininas. Disponível em três tamanhos – inclusive versão míni inédita que se torna uma bolsa de cinto – tem alça de couro removível e ajustável e uma paleta que vai do clássico P&B ao divertido fúcsia. @fendi
SOU NOVA DEMAIS PRA VELHOS COMÍCIOS
SOU VELHA DEMAIS PRA NOVOS VÍCIOS
Rita LeePara quem estava com saudade do sabor delicado e frutado do single malt Glenmorangie, boas-novas: ele está de volta em Terra Brasilis! Fabricado desde 1843 em uma destilaria nas Terras Altas escocesas, o whisky, pertencente ao grupo LVMH, está sendo relançado no Brasil com nova identidade visual, que decora lindamente qualquer bar. O retorno da premiada bebida – são mais de 50 medalhas de ouro em competições internacionais! – faz parte do plano de expansão da empresa por aqui. Sorte a nossa.
@glenmorangie
Envolvida com a iniciativa Science Based Targets, a Swarovski comprometeu-se a reduzir em 47% as emissões de gases com efeito estufa de suas produções até 2030. O primeiro passo é a coleção cápsula Hyperbola. São peças constituídas de Zircônia Swarovski neutra em carbono certificado e metal reciclado. A Zircônia Swarovski é fabricada utilizando-se energia renovável e emissões compensadas por meio de créditos de carbono. Muitos pontos para Swarovski! @swarovski
Com nova fórmula, mais natural e ainda mais poderosa, o já amado gloss Dior Addict Lip Maximizer ganha uma roupagem couture, desenvolvida por Peter Philips, diretor de criação e imagem da Dior Makeup. Proporcionando mais brilho do que sua versão original, graças a uma nova paleta de tonalidades, o gloss leva em sua formulação ácido hialurônico e óleo de cereja. @diorbeauty
MINHA MÃE ESTAVA CERTA: QUANDO VOCÊ NÃO TIVER MAIS NADA, TUDO O QUE VOCÊ PODE FAZER É VESTIR UM UNDERWEAR DE SEDA E COMEÇAR A LER PROUST
Jane BirkinA premiada linha de cruzeiros fluviais AmaWaterways é famosa por suas iniciativas para melhorar a sustentabilidade a bordo. Em 2019 o AmaKristina foi o primeiro navio de cruzeiro de rio a receber o prestigioso Green Award. Desde então outras 19 embarcações da AmaWaterways já receberam a certificação. São iniciativas como implementação de painéis solares, redução de papel a bordo e uso de mão de obra local na construção dos barcos. O Zambezi Queen (foto), por exemplo, que explora o rio Chobe na África, usa uma estação de purificação e emprega água do rio nos chuveiros e torneiras. “Todos os nossos navios são cuidadosamente projetados para minimizar o consumo de combustível e o impacto que temos nas comunidades locais”, declara Kristin Karst, cofundadora e vice-presidente executiva da empresa. @amawaterways | @vellerepresentacoes
Um dos mais lindos refúgios dentro da cidade de São Paulo, o Palácio Tangará – palco das fotos do ensaio de moda desta edição – inaugura o primeiro SPA Lancôme da América Latina. Com tratamentos da linha premium Absolue da marca francesa, arrematados com o creme Absolue L’Extrait e com o gadget Absolue Cryo Sculptor, o Lancôme Absolue Spa é um oásis em meio à natureza do Parque Burle Marx, que cerca o hotel. Nossa pedida favorita é o Day Spa Friends, para grupos de três a seis pessoas, com terapias corporais e acesso a piscinas climatizadas, saunas, jacuzzi, área de relaxamento e vestiários. Com direito a almoço e drinks! Para escapar um pouco da rotina corrida da metrópole.
@palaciotangara
Deixar um pouco de lado os metais nobres e as pedras preciosas e investir em joias de materiais pouco convencionais. Esta é a proposta da Tom, marca de Sharon Hess que reúne mais de 20 artistas brasileiros e estrangeiros que desenvolvem peças autorais em tecido, vidro, papel, borracha, concreto e até casulos de bicho-da-seda. Sua curadoria pode ser encontrada nas lojas do MoMA, do Malba e do Pompidou, entre muitos outros museus. Em São Paulo, no MASP e na loja Irrita. @tom_joiacomtom | @irritaoficial
Em busca de uma temporada diferente no Rio? Nossa dica é passar uns dias na Barra da Tijuca para aproveitar sem pressa e sem trânsito o lifestyle carioca nas praias de Grumari e Prainha. Ali, o Hyatt é opção certeira para entrar no clima de sombra e água fresca. Os quartos, todos com varanda, têm vista do mar ou da Lagoa de Marapendi. No Atiaia Spa &Fitness, novidades: o espaço criou uma experiência pensada para que crianças a partir de 6 anos também possam participar dos momentos de relaxamento em família. No Mini Day Spa Kids, os pequenos escolhem seus óleos e massagens favoritos. Imperdível! @grandhyatt_rio
Desejo da vez: tirar qualquer look do lugar-comum com a HardWear, nova linha de relógios da Tiffany. Feitos à mão na Suíça, os modelos representam o que há de mais especial na relojoaria de joias. Contemporâneas e sofisticadas, as peças apresentam os icônicos elos e diamantes da HardWear e um cristal de safira facetado que remete à forma do lendário Tiffany Diamond. @tiffanyandco
Quando pintava suas telas, por volta de 1880, em Paris ou em cenários bucólicos do campo, Van Gogh não imaginava que, mais de um século depois, suas pinceladas mágicas e impressionistas continuariam a inspirar as mais diversas formas de arte. Desta vez, a genialidade do pintor holandês foi parar nas canetas e em outros acessórios primorosos que a Montblanc acaba de lançar.
A maison escolheu Van Gogh para guiar a primeira edição de Masters of Art Collection, linha que irá homenagear nomes importantes de diversas frentes, assim como movimentos artísticos relevantes. Mas esqueça qualquer referência ao pintor que já tenha visto: a Montblanc fez um mergulho profundo em seu universo – dos anos em que viveu em Paris à fase ensolarada de Arles – para criar peças em parceria com o Museu Van Gogh, em Amsterdã, um verdadeiro guardião da herança do artista.
Como resultado, cinco instrumentos de escrita em edição limitada e com todo o savoir-faire único da marca. Os detalhes pensados para retratar a genialidade de Van Gogh impressionam: o corpo de uma caneta ganhou uma delicada gravura que marca 1889 para lembrar o ano em que ele se mudou para Saint-Rémy, enquanto a pena artesanal de ouro maciço Au 750, revestida de ródio, tem como inspiração seus famosos girassóis. O amor de Van Gogh por cachimbos, por exemplo, aparece no clipe de outro modelo, preenchido com uma preciosa resina amarela. Impossível não citar também seu entusiasmo pelas xilogravuras japonesas, lembradas na tampa de uma caneta feita de madeira carpa. E as paisagens naturais que muito inspiraram suas pinturas também se fazem presentes: a tampa de uma peça tem um
elaborado desenho de marchetaria artesanal incrustado em ouro branco Au 750 maciço, revestido de ródio e composto de minúsculos pedaços de madrepérola, sicômoro, tulipeira, besouro elytra e palha – uma referência aos trigais dourados de Vincent. Um trabalho primoroso que, com certeza, faria o próprio Van Gogh ter vontade de anotar seus pensamentos fantásticos em grande estilo. @montblanc
Conversamos com Catherine Petit, diretora-geral da Moët Hennessy do Brasil e uma francesa que se diz “brasileira de coração”
Carbono Donna
Como manter uma marca tradicional como a Moët & Chandon, com quase três séculos de história, bem atualizada?
Catherine Petit
Sempre colocamos o consumidor no centro de tudo o que fazemos. Dessa forma a marca consegue evoluir e abraçar as mudanças, ficando alinhada com o que importa na sociedade e no mundo hoje. Também acreditamos que os principais valores da Moët & Chandon, sucesso e glamour, são modernos e até atemporais. E a própria história da marca, a herança, o passado e o que ela representa – grandeza, generosidade e savoir-faire – são marcos que o tempo não envelhece. Tradição tem a ver com raízes que fomentam e enriquecem uma personalidade.
Carbono Donna
Quais os maiores desafios com o mercado brasileiro?
Catherine Petit
O primeiro é o tamanho da categoria de vinho e espumantes no Brasil, um país dominado pela cerveja e os destilados. Tem muito espaço para crescer! Outro desafio é o conhecimento mais limitado do brasileiro em relação ao champanhe. Gostamos de educar o consumidor sobre a qualidade e os intrínsecos da bebida, um produto de alta qualidade. O brasileiro se interessou muito mais pelo vinho desde a pandemia e achamos que é importante incluir o champanhe na pauta. Para nós, não são desafios, mas oportunidades.
Carbono Donna
Como é ser francesa morando no Brasil?
Catherine Petit
É o paraíso! Tenho quase 20 anos de vivência no País e, se sou francesa de nacionalidade, sou brasileira de coração. Gosto muito do carinho, das pessoas, da criatividade, da inovação e do otimismo. Acredito no potencial desse mercado e é uma honra liderar um time de brasileiros incríveis e construir marcas francesas que têm tudo a ver com os valores e a cultura brasileiros.
Estampa desenvolvida por KIKA SIMONSEN , da marca homônima
“Em 2021 fui ao Egito e lá visitei a tumba da grande rainha Nefertari, esposa do Faraó Ramessés II, no Vale das Rainhas. Fiquei encantada com a riqueza de detalhes, as cores e as histórias. A rainha Nefertari era altamente educada e capaz de ler e escrever hieróglifos, uma habilidade rara na época. No meu retorno, desenvolvi a pintura Deuses Egito e foi inspirada nessa obra que pintei a estampa Deusinhas Azuis, para minha marca Kika Simonsen. Incluí, junto à rainha Nefertari, as deusas Hathor, Ísis, Maat; os deuses Horus, Osíris, Anubis; e alguns hieróglifos, como o ankh (que simboliza a vida) e o seba (símbolo da estrela que representava os deuses das constelações). Mantive as cores da tumba original, mas trouxe minha releitura artística e contemporânea”, explica a artista. @kikasimonsen
“Eis que temos aqui a Poesia, a grande Poesia. Que não oferece signos nem linguagem específica, não respeita sequer os limites do idioma. Ela flui, como um rio. Como o sangue nas artérias, tão espontânea que nem se sabe como foi escrita. E ao mesmo tempo tão elaborada –feito uma flor na sua perfeição minuciosa, um cristal que se arranca da terra já dentro da geometria impecável da sua lapidação. Onde se conta uma história, onde se vive um delírio; onde a condição humana exacerba, até à fronteira da loucura, junto com Vincent e os seus girassóis de fogo, à sombra de Eva Braun, envolta no mistério ao mesmo tempo fácil e insolúvel da sua tragédia. Sim, é o encontro com a Poesia”
RACHEL DE QUEIROZ
Poesia feita em homenagem ao poema A Geometria dos Ventos, de Álvaro Pacheco
Fotos
Agradecimentos
Luz, sombra e a mais real das belezas em um dia da atriz em São Paulo
PerfilPRODUÇÃO EXECUTIVA: BIANCA NUNES; ASSISTENTE DE FOTOGRAFIA: MARIANA GABETTA; ASSISTENTE DE MAQUIAGEM: PAMELA HÜBNER; ASSISTENTE DE CAMARIM: SANDRA CÂNDIDO
Entrevista | PAOLLA OLIVEIRA
Paolla Oliveira vive um momento de quebra de paradigmas. Aos 41 anos, com quase 20 de carreira, a atriz quer intensificar suas experiências na arte e transforma as cobranças que sempre sofreu em questionamentos compartilhados, especialmente sobre o que é ser mulher nos dias de hoje
Por Raquel Fortuna“Todo mundo está ficando maluco. A gente quebra um padrão de expectativa e, quando menos espera, vem outro”
Da janela da suíte onde este ensaio foi fotografado, no hotel Palácio Tangará, em São Paulo, é possível avistar a movimentação matutina do apartamento da frente. Paolla Oliveira está sentada ao lado dessa janela, esperando a maquiagem, e observa a cena, de longe, com curiosidade. “Parece uma vizinhança, é como se a gente estivesse dentro da casa do ‘colega’ (risos). Fico imaginando isso para tentar entender por que as pessoas se interessam tanto pelo que eu falo, faço… É, nós temos algum nível de interesse pelos outros”, conclui ela.
A curiosidade alheia é algo com que ela está bem acostumada a lidar. Afinal são quase 20 anos de vida pública. E, desde que assumiu o relacionamento com o cantor Diogo Nogueira, a coisa só fez aumentar. Paolla conta que outro dia conversava sobre o assunto com o companheiro, brincando com a ideia de que as pessoas devem imaginar que eles passam o dia andando e flertando na casa. Para o desapontamento geral da nação, a atriz garante que a rotina da dupla é comum. Com direito a boletos para pagar e Jornal Hoje na hora do almoço. “As pessoas fantasiam coisas que vão além de uma vida real e com isso as curiosidades vão se sobrepondo. Diogo normalmente chega muito tarde, tem horários difíceis. Aí dorme, acorda, a gente toma café juntos, eu vou para minha vida. Faço academia, coisas da casa, produzo um ou outro conteúdo. Comum, para nós, é uma segundafeira qualquer, aquele dia em que todo mundo está correndo, sentamos e assistimos ao Jornal Hoje ou a um filme. São os bônus de quem não tem muito horário. Por outro lado, já perdemos vários momentos. Mas outro dia falei: ‘se não encontrarmos os respiros dessa vida, vamos só sucumbir a ela e ficar servindo ao trabalho’.”, diz.
Paolla está atualmente em uma entressafra de projetos. Acaba de gravar a segunda temporada da série Justiça, prevista para estrear em outubro no Globoplay, na qual interpreta Jordana, uma controversa empresária do meio musical. A trama, sucesso em 2016 na TV Globo, é construída a partir da trajetória de personagens que se interligam após episódios traumáticos. A atriz conta que experiências como essas, com uma abordagem mais subjetiva, proporcionam uma troca artística diferente, mais intensa e interessante. “É como a Manu (Dias, autora do programa) diz: eu não sei se as pessoas vão ficar mais ou menos justas, mas elas vão refletir sobre o conceito de Justiça”, explica.
O trabalho vem a coincidir com uma fase de bastante reflexão para Paolla. Algo que se intensificou com a chegada dos 40 anos – ela está com 41. Vive um momento de desconstrução, em que tratar de assuntos como maternidade, por exemplo, já não tem o mesmo peso de antes. “Agora, realmente tive coragem de dizer: talvez a maternidade não seja para mim. E talvez eu mude de ideia também, porque congelei óvulos. Então é uma possibilidade. Mas eu tirei um pouco de cima dos meus ombros [a necessidade] de ter que existir como mãe para existir como mulher. Consigo falar de um lugar de mais tranquilidade, sem as pessoas me massacrando. Esse retorno, com tanta potência, só veio depois dos 40, depois de ter sofrido com essas perguntas, de achar que eu tinha que ter a perna mais fina, que eu deveria caber melhor nas roupas ou que eu precisava me enquadrar em um padrão”, garante.
Assuntos complexos, como a própria criação, também passaram por novos olhares com a maturidade. Única mulher entre quatro irmãos (e um primo que foi criado junto), filha de pai militar, a atriz teve uma educação rígida e alinhada aos valores patriarcais. A arte, diz Paolla, foi o que trouxe novas perspectivas e possibilidades sobre o mundo e traduziu sua busca por liberdade. Coisas que a moviam e que ela não tinha consciência ainda de “que eram feminismo”. Uma das histórias mais marcantes desse universo de descobertas aconteceu no começo do curso de teatro, quando, em um dos exercícios, um professor pediu que ela “interagisse com uma parede”, criando e imaginando a partir da cena. Era, segundo Paolla, como se já tivesse vivido aquilo. O episódio foi definitivo para ela entender o que queria fazer da vida. “Quando eu tirei a responsabilidade da criação mais rígida, de que talvez em razão dela eu não tivesse condições de ver o mundo que eu gostaria, consegui entender melhor o meu pai, que era o que ele podia dar naquele momento. Agora, quando eu alço meus voos e domino esses homens todos [o pai, os irmãos], porque eles me ouvem, ficam felizes com as minhas conquistas, faz muito sentido, me sinto orgulhosa. Hoje, os tenho olhando para mim com aquele respeito que toda mulher deve ter”, pontua ela, que se preparava para fazer uma visita à família nos próximos dias em São Paulo.
Sua posição mais enfática em relação a questões como pressão estética ganhou força em fevereiro deste ano, quando a atriz viralizou na internet com um vídeo em que questionava os homens sobre como eles se preparavam para o Carnaval,
com perguntas como “você faz alguma dieta para se preparar para o Carnaval? Não tira nem um churrasquinho?”, uma crítica à imposição sofrida pelas mulheres, especialmente nessa época. “Sabe essa história de fazer algo fora do que geralmente esperam de você? A expectativa era de que eu ficasse em uma zona confortável, nesse lugar de exaltação ao meu corpo, até que fosse determinado que não poderia mais estar ali. Cheguei a ouvir várias vezes: mas por que você está fazendo isso? Não quis me apropriar de um lugar cômodo. Envelhecer é algo que não faz parte desse modelo que as pessoas criam. Só que eu também vou passar por isso. Todas nós. Então começou a ficar desconfortável para mim. Pronto, mudei antes. Antes que falem que eu não sou perfeita, que não sirvo mais. Agradeço os elogios, mas as coisas vão passar. Estou me sentindo melhor, me movo muito melhor na vida hoje. E é impressionante como as mulheres se identificam”, diz.
Mais recentemente, ela aderiu a uma campanha em que se compromete a não usar filtros em seus posts nas redes sociais. A iniciativa, fruto de uma parceria com uma marca de beleza, não envolveu produto, mas uma “causa social” com a qual diz se identificar. “Acho que todo mundo está ficando maluco. A gente quebra um padrão de expectativa e, quando menos espera, vem outro. Você faz a campanha dos filtros e aí chega a inteligência artificial, tudo o que lhe tira de perto de quem você é. Nesse trabalho mesmo, combinamos que uma das minhas fotos seria modificada. Quando recebi, eu disse: ‘eles não mexeram’. Estava com a boca gigante, o olho esverdeado e não percebi. Perdi-me ali naquelas
imagens. E olha que estamos falando de uma pessoa treinada a se ver. Imagina essas meninas que estão pautadas o tempo inteiro em filtro? Óbvio que elas odeiam seu nariz, que não gostam de quem são, das marcas que têm. Vão se odiar cada vez mais. O que a gente faz quando se odeia cada vez mais? Paga uma terapia? Mas será que todo mundo pode pagar uma terapia?”, coloca. Ao ser perguntada se seus posicionamentos não podem soar contraditórios com a imagem de musa, Paolla é direta. Não renega esse lugar. Admite que gosta de ser elogiada, de se cuidar e que
tem suas vaidades. O problema, segundo ela, está em “tornar isso um filtro para a vida”. Estamos prestes a acabar a entrevista e dar início às fotos, e a equipe de maquiagem – predominantemente feminina, assim como a maior parte do staff –acompanha atentamente as palavras de Paolla, claramente identificada com suas falas. “Se você me perguntar o que eu busco hoje, vou dizer: coerência. Acho que a palavra do momento para mim é questionar. Quero estimular outras pessoas a questionarem os seus próprios lugares. Senão você vai sendo só levado”, finaliza a atriz.
VESTIDO LOUIS VUITTON RELÓGIO ROLEX BRINCOS CARTIERMaria limpou cuidadosamente as tesouras, pegou o resto de seu equipamento e, olhando para mim, disse:
– Estou pronta. Vamos?
Subimos para o sétimo andar.
Manoel, leito 7043, cabelo e bigode –informava a fichinha.
Maria, moça singela e simpática, saía do salão cinco estrelas do qual era funcionária e dedicava uma tarde de sua semana ao trabalho voluntário no hospital.
Manoel, senhor de idade, com aparência bem conservada, era o típico português. Vindo para o Brasil quando criança, ainda conservava um leve sotaque “apertadinho”, que revelava uma provável convivência com seus patrícios.
Já instalado em uma cadeira colocada no corredor interno ao lado dos quartos, Sr. Manoel olhava no espelho improvisado à sua frente, enquanto dava as instruções. Indicava a Maria onde devia ser mais curto,
sem deixar, no entanto, a orelha à mostra. Ela escutava com atenção as instruções e procurava segui-las à risca. Durante o corte, conversaram sobre as origens de Maria, igualmente portuguesa, fato que animou Sr. Manoel a discorrer sobre as belezas de além-mar e as delícias da cozinha lusa – da qual há muito ele se privava para prevenir a chegada de uma temida diabetes. Trocaram receitas de bacalhoada, trocaram impressões sobre os fados de Amália Rodrigues e sobre muitos outros assuntos em comum que carregavam em suas linhagens. Era como voltar para um grande colo, esse de suas origens.
À primeira vista, o papo poderia parecer banal, sem maiores pretensões. Porém, visto com cuidado, era nítido que aquele encontro adquiria a importância dos grandes eventos. Era como se o Sr. Manoel voltasse à vida fora do hospital. Ele se esquecia de curativos, exames, válvulas e enfermeiros, para
Me deixa, de ENEIDA SANCHES Colagem de gravuras e desenho sobre papel da exposição Tempo, tempo... Dança com uma grelha na mão, na Galeria ArteFormatto @eneida.sanches | @arteformatto
concentrar-se em decisões como: qual era o melhor lado para jogar seu pequeno e espetado topete ou a largura ideal do bigode.
Um pequeno espaço de tempo, em que era ele quem dava as cartas, e não o Destino.
Um fragmento temporal em que o foco de sua atenção era seu visual, e não sua saúde.
Ao fim de ambos – corte e conversa –, ele pediu o espelho para examinar mais de perto o resultado. Gostou do que viu. Chegou mesmo a comentar que tinha ficado melhor do que quando cortava com o Sr. Almeida, velho barbeiro amigo da família.
Naquele dia, enquanto caminhava nos corredores, pensava que o que presenciei não fora um corte de cabelo. Testemunhei o resgate – talvez fugaz – da autonomia de um homem.
O reencontro com sua história e com sua imagem no espelho. O retorno a suas origens, a busca
eterna pelas raízes e a redescoberta do orgulho de pertencer a uma comunidade.
Deu-me vontade de reencontrar o Sr. Manoel, levando comigo dois cálices de vinho do Porto para podermos brindar esse lampejo de vida.
passou 20 anos fazendo trabalho voluntário na ONG criada por ela, a Associação Amigos do Coração, no Incor, em São Paulo. Lá acompanhou inúmeras experiências de amor e coragem. São histórias de vida, fé, superação e despedidas. No livro Corações que Falam ela relata algumas dessas memórias. Você leu aqui um trecho do conto Maria, que fala da força do feminino, de apoio e de saudade.
Para a modelo, casa com música tem outro astral, especialmente se for rock and roll e forró. A mineira, que cresceu ouvindo sertanejo raiz com o pai, também é apaixonada por vozes femininas – de Rita Lee ao gospel. Veja os trechos que não faltam na sua playlist favorita
para fluir as letras
So close, no matter how far Couldn’t be much more from the heart
Forever trusting who we are
And nothing else matters
Da janela lateral
Do quarto de dormir
Vejo uma igreja
Um sinal de glória
Vejo um muro branco
E um voo pássaro
Vejo uma grade
Um velho sinal
I guess I should’ve known
By the way you parked your car sideways
That it wouldn’t last
Lança menina, Lança todo esse perfume
Desbaratina
Não dá pra ficar imune
Ao teu amor
Que tem cheiro
De coisa maluca
One way or another, I’m gonna find ya I’m gonna getcha, getcha, getcha, getcha
One way or another, I’m gonna win ya I’m gonna getcha, getcha, getcha, getcha
One way or another, I’m gonna see ya
But if our paths never cross Well, you know I’m sorry, but If I live to see the seven wonders I’ll make a path to the rainbow’s end
the last time i did something for the first time
A psicanalista e pesquisadora da USP Maria Homem discorre sobre as sensações que surgem ao tentar algo pela primeira vez
COMO ESQUECER? RetratoFui na primavera para Boston, uma cidade bonita, rica e plana. Esperava encontrar flores e andar só de bicicleta ao longo do rio, mas tinha frio e garoa. E agora? Não tive dúvida. Minto, no começo tive sim. Assisti às pessoas correndo os 42 km de uma maratona a 10 graus na chuva, e deixei de frescura. A bike ficou sendo meu meio de transporte nessas semanas, na chuva e no sol, de dia e de noite. Afinal, a vida não é isso? Um capacete, um bom casaco e sigamos. Entendi que podemos mudar o mindset. Sobretudo esse contemporâneo, que vai nos escravizando ao que chamamos de conforto. Foi libertador saber que nosso corpo suporta bem mais do que imaginamos.
“Agora ele recebe outro sentido, só por ter reaparecido” ...
Topei tomar um café com alguém que não via há décadas. É como se um pedaço da nossa própria história, um fio solto, tivesse atravessado o tempo e retomasse a meada agora. Ele poderia ter ficado perdido lá longe, quase morto, desaparecido – ou fora da consciência. Agora ele recebe outro sentido, só por ter reaparecido. E retomamos a conversa como se tivéssemos desligado o telefone ontem à noite.
Sempre achei que meu universo era o da ordem das ideias. No entanto, está sendo interessante observar as ideias encontrarem pessoas que pensam na mesma direção e surgir a vontade de criar algo concreto. Vamos ver o que sairá desse projeto, o Instituto Cassandra.
Sair da sua realidade cotidiana e inventar outra forma de vida, mesmo que temporária – sim, é um luxo. Não necessariamente pelo eventual dinheiro envolvido no projeto. Mas porque é uma forma inédita de colocar a própria mente para funcionar. Dentro dessa categoria – sabático – caberiam várias “primeiras vezes”, como ser um visiting scholar em Harvard e conhecer várias pessoas e instituições interessantes. Para quem gosta, foi como passear numa Disney do pensamento.
Não sei se essa aventura deveria entrar nesta lista. Não se encaixa propriamente na categoria de última vez que fiz algo pela primeira vez. Seria mais na linha “primeira e única”. E já faz um tempinho, mas parece que foi neste fim de semana. Não sou paraquedista, ao menos no sentido literal. Mas foi bom me jogar no nada e saber que, mesmo assim, a gente demora um pouco a cair, pois tem a resistência do ar. Algo resiste e te ampara. Mas é sempre ideal ter a própria válvula de salvação.
UMA
OBSESSÃO DE
Tapete versão x-large, look total, puff e outros acessórios: a empresária solta suas feras e abre as portas da sua toca dominada por onças
ma.ni.ac
(noun) an obsessive enthusiast
O primeiro contato da empresária de comunicação Ana Lúcia Zambon com uma estampa de onça foi ainda na infância, em São José do Rio Preto, aos cinco anos de idade. “Não sei como foi parar na minha casa um lenço de onça. Eu fazia produções com ele na frente do espelho, já que era uma criança over, vivia de tutu de balé para cima e para baixo.” Da mesma forma que o tal lenço apareceu, ele também sumiu, mas a pequena Ana Lúcia já havia sido picada, ou melhor, arranhada pelo padrão.
“Eu sou barroca”, avisa ela ao nos receber em seu apartamento nos Jardins, em São Paulo. E o prédio neocolonial Lindenberg, da década de 60, é a prova disso. O décor, assinado pelo primo e designer de interiores Luiz Otávio Debeus, partiu de um desejo da moradora: ter um tapete de onça na sala inteira. “Quando o envio para lavar, a casa perde o aconchego”, conta Ana Lúcia.
Para ela, é impossível calcular o número de itens da coleção “pintada”, entre camisetas, lingeries, vestidos de festa e pequenos objetos
espalhados pela casa. Entre os seus padrões preferidos está o de leopardo, que não é exatamente uma onça, mas está valendo. A empresária, no entanto, tem suas ressalvas. Nada de estampa de onça misturada a flores e rosas, tons de azul e mix de animal print. “Eu tenho um pouco de medo desse bando de bicho junto. Deixa a onça ser onça!”, protesta.
Entre as imagens icônicas da estampa, muitas referências na moda, como Elsa Schiaparelli, Dolce & Gabbana, Versace, Jean Paul Gaultier, John Galliano, Cartier – “a maior difusora” – e Azzedine Alaïa, o seu preferido. Seu maior desejo, inclusive, é ter um vestido de onça vintage do estilista tunisiano.
Para Ana Lúcia, a top Naomi Campbell foi quem melhor vestiu muitas das criações dos designers citados acima. “Tem que ter personalidade para usar. Não adianta colocar e ficar insegura. Um look total de onça é o oposto da discrição. Justamente por isso que eu gosto”, cutuca ela, com vara curta. “Onça, para mim, é como preto e branco. É o básico.”
DOMINAM A VIDA DE ANA LÚCIA
ZAMBON DESDE A INFÂNCIA
ANA ZAMBON VESTE look total Paradise e cinto Isabella Giobbi
TAPETE Square Foot by Lina Miranda
SAPATO Charlotte Olympia
CAMISA Paradise
BOLS A Patrícia Vieira
ALMOFADAS Esther Giobbi
“Meu trabalho consiste em expandir as possibilidades da gravura em um processo contínuo de experimentação que abandona a clausura da perfeição, do padrão de cores e verossimilhança entre os componentes de uma série. Adotando um fazer contínuo, em que acolho o erro, o acaso e o desvio de caminho, construo um grande corpo de sobreposições de imagens, resíduos de impressões, recortes e sobras em uma obra que se consolida em constante mutação”, KIKA LEVY
Série Paisagem em Azul , gravura em metal (40 x 30cm cada), 2012 - 2023
Formada em Desenho Industrial e pós-graduada em Artes Plásticas, Kika Levy é representada pela Janaina Torres Galeria. A artista, que já ministrou workshops e cursos de gravura no Sesc Pompéia e no Sesc Belenzinho, hoje coordena cursos de gravura em metal na Oficina Cultural Oswald de Andrade. Suas obras estão em importantes coleções como a do MAC-RS e a da Bibliotheca Alexandrina, no Egito. @kikalevy | @janainatorresgaleria
Primeira mulher a narrar um jogo de futebol na maior emissora do País, a carioca Renata Silveira encarou o desafio de ser a voz oficial da Copa do Mundo de Futebol Feminino
“Se eu estiver falando muito rápido, me avisa, tá? Narradora é assim. Tem de ser ligeira para não perder o lance.” Durante a infância, o lance de Renata Silveira era acompanhar o pai, Daniel, nas peladas que ele disputava no Social Ramos Clube, no Rio. Sentada à beira do campo de futebol, ela fazia coro à torcida ao mesmo tempo que sonhava com a recompensa no pós-jogo: o churrasco. “Se me sinto confortável no meio do esporte é porque o meu pai introduziu esse tema na minha vida”, diz ela, hoje, aos 33 anos.
Renata furou uma bolha à qual apenas homens até então tinham acesso. Ano passado, a carioca se tornou a primeira mulher a narrar um jogo de futebol na maior emissora do País, a TV Globo, em 56 anos de transmissões esportivas do canal. A partida em questão foi Flamengo X Grêmio, válido pela Supercopa Feminina. Mas muito antes de soltar a voz nas telinhas, ela já havia mostrado suas credenciais, em 2014, ao vencer o Garota da Voz, concurso
promovido pela Rádio Globo, e comandar a transmissão de Argentina X Alemanha, a partida final da Copa do Mundo masculina realizada no Brasil.
A desenvoltura despertou a atenção do maior conglomerado de mídia e comunicação da América Latina e, há três anos, ela foi contratada. Renata enche o pai de orgulho. Em 2022, por exemplo, tornou-se a primeira mulher a narrar em TV aberta partidas da Copa do Mundo. Seu último desafio foi ser a grande voz de todos os duelos da Seleção Brasileira feminina de futebol na Copa do Mundo 2023. Durante o mês de julho, as partidas foram disputadas na Austrália e na Nova Zelândia. “Fiquei muito empolgada por ser a voz que levou os lances e as histórias às casas das pessoas”, diz ela. Enquanto o juiz não aciona o próximo apito, a mãe e esposa Renata aproveita o tempo ao lado de Bernardo, seu filho de 10 anos, e do marido, Leandro. Sem pressa. Sem precisar ser ligeira.
Carbono Donna
Pela primeira vez você narrou a versão feminina da Copa do Mundo de futebol. Muda algo em termos de locução as partidas serem disputadas por mulheres?
Renata Silveira
Não mudei o jeito de narrar. Fui escolhida porque eu era escalada para narrar os amistosos da Seleção Brasileira feminina. Não via a hora de contar uma bela história. Narro futebol feminino desde 2018, quando a CBF abriu as portas para a gente fazer algumas transmissões da Seleção. Estava confortável e confiante também pela luta das meninas em busca de mais espaço e visibilidade.
Carbono Donna
O telespectador, principalmente do sexo masculino, já se acostumou com a voz feminina narrando jogo de futebol?
Renata Silveira
Ainda somos novidade. E lidamos com a dificuldade das pessoas em relação às narradoras. A voz masculina sempre foi a única que os telespectadores se acostumaram a ouvir. Tanto que já li comentários como “está imitando voz de homem”. É uma questão social e não há nada que possamos fazer com a nossa voz. Mas ouço sempre as minhas transmissões após os jogos. É uma autocrítica importante. Hoje sou completamente diferente daquela que um dia fui.
Carbono Donna
O seu sotaque carioca foi uma questão?
Renata Silveira
Na Fox, eu tive que trabalhar para que o meu sotaque não fosse muito marcante. Na Globo, não há essa preocupação. Quanto mais sotaque, melhor. Eu me preparo, faço exercícios de voz e aprendo muito sobre improviso. Em consulta com a fonoaudióloga, eu sou desafiada a narrar dando destaque para tal palavra, ou narrar com outra entonação, além de buscar o melhor agudo ou o mais grave. Outro dia, ouvindo uma narração de 2014, pensei: “Como consegui terminar esse jogo?”. Porque eu gritava e não tinha noção de como colocar a voz em determinadas situações.
Carbono Donna
Quais locutores inspiram você?
Renata Silveira
Não havia referência de locutoras, quando iniciei, né? Eu gostava das narrações do José Carlos Lopes de Araújo, o Garotinho. Em 2014, já atuando na área, me dei conta de que o Galvão Bueno é uma referência. Ele é tecnicamente perfeito e ninguém vende melhor a emoção de um gol. Entre as mulheres, a Vanessa Riche. Ela narrou algumas modalidades no SporTV. A Fernanda Gentil e a Glenda Kozlowski também me inspiraram no início de carreira. E, hoje, as mulheres que trabalham com esportes, como Renata Mendonça, Ana Thaís Matos, Gabriela Moreira, Bárbara Coelho e Natália Lara são referências. O fato de haver mais jornalistas no futebol, opinando com propriedade, fortalece as discussões e apresenta análises distintas. Assim, abrimos portas para as que irão chegar.
Carbono Donna
Como administrar internamente os comentários sexistas e episódios de machismo endereçados a você?
Renata Silveira
Mensagens com esses cunhos chegam todos os dias desde 2014. Não é exagero. O fato de eu estar na Globo e contar com a visibilidade da emissora faz com que muita coisa caia sobre as minhas costas. Há narradoras em vários canais, mas, para muitos, a mulher que narra, erra e acerta é sempre a Renata Silveira. Já aconteceu de outras narradoras cometerem gafes em transmissões e as pessoas acessarem a minha rede social questionando o porquê de eu ter errado durante uma partida que eu sequer narrei.
Carbono Donna
É como se você ainda fosse a única narradora no mercado.
Renata Silveira
Exato. Também lidamos com os que acham que narradoras não prestam e têm de narrar apenas jogos femininos. Isso quando não se apoiam na clássica “voz de mulher não combina com futebol”. Não gostar do meu trabalho faz parte, mas argumentar que voz de mulher não combina com futebol é onde pega mal. Não há análise do trabalho, apenas uma generalização. É difícil lidar com isso rotineiramente e deixar passar. Antigamente eu dizia que esses comentários me davam força para continuar. Ledo engano. As críticas, hoje eu sei, são parte de um processo de desconstrução. A gente não está ali por cota, mas por capacidade! Torço para que as futuras narradoras apanhem menos do que nós, as pioneiras.
Carbono Donna
Já se emocionou em alguma transmissão?
Renata Silveira
Lembro-me de um jogo do Bahia, quando uma senhora na arquibancada levantou um cartaz procurando uma pessoa que estava desaparecida. Chorei com o microfone desligado naquele dia. Mas o jogo em que me percebi mais emocionada foi em 2018, quando narrei o primeiro título internacional conquistado pelo Athletico Paranaense da Copa SulAmericana. Não torço para o time, mas a atmosfera da partida me envolveu tanto que pensei: “É isso que quero para o resto da minha vida”. Também fiquei com a voz embargada em 2021, na partida Dinamarca X Finlândia, da Eurocopa de seleções. Eu narrava o jogo quando o (jogador) Eriksen teve um mal súbito e desmaiou em campo...
Carbono Donna
A partida ficou paralisada por mais de uma hora e você ficou no ar, sem intervalo, narrando o atendimento ao jogador, que acontecia no campo. Como conseguiu?
Renata Silveira
Fiquei uma hora e quarenta e seis minutos no ar. Quando a transmissão terminou, parecia que um caminhão tinha passado sobre minhas costas. Eu fui muito cumprimentada pelos colegas. O meu coordenador diz, ainda hoje, que tinha de ser eu para segurar aquela transmissão. Não pelo fato de eu ser mulher e ter mais sensibilidade. E sim porque,
a partir daquele dia, muita gente passou a me respeitar e gostar do meu trabalho ao perceber que dei conta daquele evento tão peculiar. Detalhe: o jogo aconteceu em junho. E eu havia estreado na emissora três meses antes. Fui a porta-voz da situação graças também ao meu coordenador, que estava no meu ponto. Felizmente, tempos depois, o Eriksen voltou para o futebol.
Carbono Donna
Como tocava a vida antes de se tornar narradora?
Renata Silveira
A escola em que estudei incentiva os alunos a participarem de várias modalidades esportivas. Aos 15 anos, comecei a trabalhar porque a empresa de materiais de construção do meu pai faliu. Três anos antes, eu havia me formado em uma academia de dança. E então eu passei a dar aula de balé em escolas junto com a minha irmã. Mas sempre me percebi encantada com a televisão. Tanto que cheguei a ser, na Globo, bailarina da Xuxa e do Faustão. Mas precisava virar a chave e conseguir dinheiro para seguir.
Carbono Donna
Qual caminho resolveu trilhar?
Renata Silveira
Queria cursar Jornalismo ou Direito. Mas eu era muito ligada em esportes e decidi pela Educação Física. Fiz uma pós-graduação em jornalismo esportivo. No meio do caminho, eu engravidei. No ano seguinte, surgiu o concurso Garota da Voz, da Rádio Globo, para mulheres. Eu gostava de rádio porque o meu pai ouvia programas esportivos no radinho de pilha. Bom, a vencedora se tornaria a primeira mulher a narrar um jogo da Copa do Mundo que ocorreu no Brasil. Meus amigos me incentivaram e eu me inscrevi.
Carbono Donna
Foi muito concorrido o processo?
Renata Silveira
As 80 candidatas tinham de enviar uma narração de um gol da Seleção Brasileira. Escolhi narrar o segundo gol do Ronaldo, na final da Copa do Mundo de 2002. Eu gravava, escutava e achava ruim. E o meu marido me ajudando enquanto eu gritava gol às 23 horas no nosso apartamento. Fui uma das aprovadas. Então passamos por uma preparação. Era uma espécie de Big Brother. Venci e narrei Uruguai X Costa Rica, na Copa de 2014.
“As críticas são parte de um processo de desconstrução. A gente não está ali por cota, mas por capacidade!”
Carbono Donna
E se transformou na primeira mulher a narrar, no Brasil, um jogo de Copa do Mundo.
Renata Silveira
Sim. Depois me escalaram para narrar Croácia X México, mas não fui contratada. E segui em frente com a pós-graduação, cuja última matéria era empreendedorismo. Graças às aulas, inaugurei a minha academia de dança, que completou oito anos, e deixei a narração. Em 2018, ano de Copa do Mundo, os canais Fox Sports e Esporte Interativo lançaram outros concursos. Fui aprovada nos dois e escolhi a Fox. Seis mulheres foram selecionadas entre as 300 candidatas e encararam uma preparação para narrar os jogos do Mundial. Nenhuma faculdade nos traria o aprendizado que tivemos na Fox. Fui uma das três escaladas para transmitir os jogos e, depois, a emissora me contratou. Começou assim a minha carreira de verdade.
Carbono Donna
Como se enxerga no papel de mãe em meio às viagens que faz por causa da profissão?
Renata Silveira
Eu tenho disposição para brincar com o Bernardo por ter sido mãe bem jovem. Ele está com dez anos e curte minha profissão. Quando ele nasceu, parei de dar aula na academia para acompanhá-lo. Hoje, o tempo ao lado dele é menor. Ele nunca deu trabalho e curte jogar futebol na quadra. Às vezes, eu o vejo jogando sozinho e narrando os lances. Mas quando está jogando com o pai, ele sempre me diz: “Narra aqui essa partida pra nós, mamãe!”
De olho no upcycling , selecionamos um time de mulheres que está usando sua força e sua sensibilidade para transformar a cadeia de consumo, impactar positivamente o mundo e ainda construir negócios rentáveis
Mulheres, maravilhosas mulheres, vocês sabiam que nós somos uma peça importantíssima na questão climática do mundo? Pesquisas mostram que temos maior consciência e envolvimento em relação à preservação do planeta, assim como aos riscos que as mudanças no clima representam para nós e para os outros. Diante disso, é importante dizer que o papel feminino na luta pela sustentabilidade é bastante relevante. Afinal, mulheres geram vidas, cuidam, nutrem, alimentam e se enlaçam como verdadeiras raízes em redes de apoio femininas desde sempre.
De olho nessa narrativa de gênero, escrevemos essa reportagem para mostrar que muitas companheiras ao nosso redor são mesmo agentes transformadoras, independentemente da área de atuação. Na moda, no design, na gastronomia, na comunicação, elas têm movimentado o mercado com ideias criativas, inovadoras, rentáveis e, ainda melhor, sustentáveis. São projetos inspirados no upcycling, que nada mais é que reutilização. Segundo Giovanna Nader, comunicadora, fashionista e ativista ambiental, “a roupa do futuro já existe e é circular, regenerativa, criativa e colaborativa. O que é velho para você pode ser novo para outra pessoa”. E é nessa linha de reutilizar, reconstruir, reformular e reusar que selecionamos iniciativas que trabalham com essas novas formas de consumo, todas comandadas por mulheres extraordinárias.
Karina Olsen, mente criativa por trás da Olsen K, é uma das joalheiras brasileiras pioneiras quando o assunto é sustentabilidade. Tanto é que, há cinco anos, quando ia às fábricas comprar metais para suas peças, mal era cobrada pois os fornecedores achavam que se tratava de descarte – muitas de suas criações são feitas a partir de lixo eletrônico e automobilístico. A outra parte é construída em cima de pedras trazidas pela clientela e, em ambos os casos, há um processo de purificação. Hoje Karina comemora a presença cada vez maior desse movimento e segue acreditando no poder das pedras. “Elas demoram anos para se formarem, acredito muito no seu poder energético”, diz a designer, que mistura o moderno e o vintage de maneira autêntica e inspiradora.
Um brechó on-line de roupas, brinquedos e acessórios infantis que atende o Brasil inteiro, lançado em 2019. Com uma curadoria apurada, a marca já recebeu dois aportes de investimentos, tem 37 mil itens em seu acervo e atende tanto quem compra quanto quem vende, formando uma cadeia circular pra lá de sustentável. O maior desafio, segundo Dani Bussab, sócia-fundadora ao lado de Marcela Coelho, é educar as pessoas que estão pouco acostumadas a comprar itens usados. “Mesmo com o negócio de second-hand bastante aquecido, com perspectivas de crescer mais do que o varejo tradicional, a gente ainda faz um trabalho de ensinar, mostrar que vale a pena para o bolso e para o mundo.” Para isso a dupla usa uma matemática básica e que toda mãe entende bem: “Nos primeiros dois anos de vida da criança, ela troca de número de roupa sete vezes, então a perda
é enorme”. Com essa lógica, a própria Dani já recuperou R$ 15 mil vendendo o enxoval do filho. Uma solução que resolve a vida das mães, educa famílias e ainda afirma o empreendedorismo feminino. Ah, as peças que não entram na curadoria da dupla são doadas para diversas ONGs – a cada ano elas escolhem uma. Faz bem para todos!
Marina Vicintin e Juliana Accioly têm suas próprias joalherias, mas, em paralelo, criaram a Reuse, uma oficina que ressignifica e transforma pedras guardadas em novas peças. E, nesse verdadeiro ateliê de upcycling, nada é comprado: só entram matérias-primas enviadas por clientes. “A gente sempre tem um pingentinho que herdou ou ganhou ainda criança que está parado. É uma joia, mas não uma joia para você. E por isso a gente ressignifica, reforma e transforma essas pedras”, pontua Marina, que cresceu vendo o pai transformar latinhas de alumínio em peças para carro e moto. “Nunca foi uma moda, sempre vi essas mudanças como um modo de viver e como algo lucrativo”, finaliza ela.
@takeme.online
Inaugurada em 2019 com um acervo de vestidos para aluguel, a marca surgiu quando as sócias Ana Maria Piva Palaia e Melissa Moraes se viram trocando dicas de estilo, de novas marcas e, para além do senso fashion, com uma preocupação com o futuro da moda de luxo. Foi então que elas entenderam a importância de compartilhar, seguindo como lema uma frase inspiradora de Coco Chanel: “Sou contra a moda que é passageira. Não consigo imaginar que se jogue roupa fora só porque é primavera”. A dupla seleciona peças que vêm de clientes desapegadas e, depois de higienizá-las e autenticá-las, coloca para alugar ou vender no melhor estilo re-commerce – o termo virou tendência porque é justamente a venda online de produtos de segunda mão. “Por meio do second-hand, promovemos a reutilização de itens icônicos, aumentando sua vida útil”, diz Ana Maria. A Take Me funciona no terceiro piso do Shopping Cidade Jardim, com hora marcada.
“Eu nunca gostei de seguir moda. Tenho um estilo só meu que é confortável e minimalista. E posso dizer que pratico um consumo consciente. Se as pessoas se conhecessem melhor, consumiriam menos porque vestiriam o que tem a ver com elas. Eu sou assim.”
“Gosto de peças que pareçam parte de mim, que sejam uma extensão da minha personalidade. E hoje em dia tem três marcas que refletem muito do que sou: a Myfots e a Gentil, com roupas chiques e modernas, porém muito confortáveis para o dia a dia, e a UMA, à qual recorro em ocasiões mais especiais.”
“Todas as manhãs, enquanto arrumo as crianças para irem à escola, eu sigo um ritual. Conecto-me com o dia, agradeço e tiro uma carta do oráculo para ver a mensagem da vez. Depois que meus filhos saem, pratico minha yoga ou faço meu treino funcional.”
“Meu consumo é bastante conservador. Uso a mesma maquiagem da MAC há quase 20 anos. Comecei com esse hábito em Nova York, quando passei uma temporada sozinha após a faculdade. Foi um momento de transição, de me conectar com o meu feminino.”
“Meu pai introduziu a arte e a literatura na minha vida. Nosso programa na infância era ir à livraria. Minhas inspirações hoje são Virginia Woolf, Matilde Campilho e Clarice Lispector.”
“Sou a louca das saias. Amo! Elas têm a ver com o feminino e com minha formação, já que estudei em colégio de freiras a vida toda. Isso também me ajudou a compor a maneira como me visto.”
“A espiritualidade é algo importante para mim e também se reflete no meu estilo. Uso uma Japamala (cordão para recitar mantras) como pulseira todos os dias.”
“A yoga está na minha vida desde os meus 24 anos. É conexão pura, uma maneira de cansar meu corpo para entrar em meditação.”
“O pôr do sol é um momento sagrado para mim. Se estou em casa, é um horário de meditação, de silêncio e conexão.”
“O presente mais legal que ganhei nos últimos tempos foi do artista plástico Jotape. Ele fez um quadro da minha vida e tenho um amor muito grande por essa obra.”
“A marca é igual a uma pessoa. Ela tem os seus territórios, o seu gosto, a sua voz e o seu estilo”
Diretora-executiva global da Arezzo & Co, Milena Penteado Ometto se divide entre Brasil e EUA e mostra que é possível conciliar ambições profissionais e pessoais
Por Humberto Maruchel Retrato Iude Richele
Milena Penteado Ometto desempenha inúmeros papéis. É mãe de Julia e André, esposa de Renato, filha de Regina e Moacir. Na carreira, outras responsabilidades de peso: ela dirige as marcas internacionais da Alexandre Birman e da Schutz, do grupo Arezzo & Co, o que faz com que esteja sempre entre o Brasil e os Estados Unidos. E, apesar de não precisar ser definida por nenhum desses papéis, Milena parece ter superado com muito estilo – e terapia – o desafio nem sempre fácil de estabelecer uma divisão saudável entre vida profissional e pessoal.
Nascida em Campinas, desde a infância ela carrega o gosto pelo empreendedorismo e a criatividade como marcas pessoais, particularidades das quais se orgulha. A veia empreendedora era grande o suficiente para causar dor de cabeça em sua mãe – ainda criança, ela vendia produtos de limpeza para quem passava na rua. Havia também as características herdadas das gerações anteriores. Do lado do pai, sua avó Lina Penteado, disruptiva para época, foi uma grande bailarina, que despertou a paixão pela dança e também a disciplina. Da avó materna, Zenaide Bonavita, uma mulher religiosa e afetuosa, puxou a delicadeza.
Ainda com 17 anos, veio a São Paulo, seguindo os passos da irmã Mariana. Enquanto estudava Publicidade e Marketing na FAAP, trabalhou na Daslu, conglomerado de luxo que marcou os anos 2000. Foi com Eliana Tranchesi que aprendeu o significado de branding e também a colocar a experiência do cliente sempre como prioridade. Em Nova York, onde estudou Marketing de Entretenimento, na NYU, recebeu um convite que mudaria sua vida. Foi chamada para trabalhar ao lado do designer de sapatos Alexandre Birman e, com ele, ajudou a fundar a grife Alexandre Birman, a marca mais premium do grupo Arezzo & Co. Atualmente, ela cuida das brands internacionais do conglomerado, sempre atenta aos hábitos e às tendências de consumo dos dois países. A seguir, Milena conta alguns dos seus insights e aprendizados.
NA MEMÓRIA “Meu diferencial como profissional é ter o marketing na veia. Quando eu era pequena, amava vender qualquer coisa que fosse. Certo dia, coloquei uma mesinha no portão de casa e decidi vender todos os
produtos de limpeza da minha mãe para quem passasse. Juntei uns R$ 50. Minha mãe nem conseguiu ficar brava.”
SONHO À VENDA “As marcas de luxo têm uma estratégia de colocar produtos com preço de entrada, uma espécie de isca para chegar ao item mais caro. O luxo está muito mais ligado ao que é escasso, pois você está vendendo um sonho. Já a marca premium, que ainda é considerada luxo, está mais atrelada à funcionalidade, à matéria-prima e às tendências do produto. O mais bonito do luxo não é quem consome, mas quem está envolvido. Ele emprega muita gente!”
IDENTIDADE “Uma marca precisa manter forte e nítido qual é seu DNA. Encontrar o seu símbolo, algo que fará com que ela seja lembrada. É necessário ter um produto que seja imediatamente relacionado à grife para alcançar seu eterno reconhecimento.”
ESPELHO “Eu sempre provoco meu time a se colocar no lugar do cliente. Afinal, é por eles que estamos aqui. Aquilo que estamos criando está alinhado com os valores da empresa? A marca é igual a uma pessoa. Ela tem os seus territórios, o seu gosto, a sua voz e o seu estilo. Quanto mais legítimo e fiel você for ao cliente, mais recorrente será sua frequência. Você estará presente na vida dele de uma forma completa, criando memórias.”
MUITAS EM UMA “Minha vida precisa ser bem planejada. Começo pelo calendário anual e sei quais são os momentos mais críticos, as semanas de moda, quando vou precisar me dedicar mais ao trabalho do que à vida pessoal. Acho importante priorizar as coisas que fazem sentido. Então sou muito organizada.”
EU VEJO A VIDA MELHOR NO FUTURO “Eu não acredito mais em plano de carreira. Hoje as empresas têm um dinamismo que não existia antigamente. Então são obrigadas a se remodelar e se reestruturar constantemente. O funcionário bem-sucedido é aquele que está disposto a viver assim, enxergando oportunidades internas e caminhos de desenvolvimento. Se for uma pessoa muito acomodada, que não aceita riscos, isso acaba sendo muito limitador.”
Apaixonadas por tricots e seus tipos de pontos, Sil Freitas e Tathi Ventre – dupla à frente da Missinclof (marca que Carbono Donna adora!) – contam de onde veio esse amor afetivo pelos fios entrelaçados e pelo trabalho artesanal
Fotos Manu Oristanio
“Cresci vendo minha avó paterna tricotando. Ela era italiana, passava as manhãs cozinhando e as tardes bordando e criando. Ela fazia muitas polainas e casacos para mim e para a minha irmã. A gente amava! Tenho alguns até hoje. Lembro-me de sair com ela para escolher as cores das lãs e ficar encantada com o processo. Acho que esse foi o meu primeiro contato com a moda. Eu ficava ao seu lado dando palpites. Ela também comprava telas pintadas em talagarça grossa para eu bordar. Minha paixão pelas lãs começou assim e acho que por isso sempre valorizei tanto tudo o que é feito à mão. Recordo-me do trabalho que dava e quantos dias eram necessários para fazer uma peça.” * Sil Freitas*
“A arte está na minha vida desde sempre. Frequentei a escola Waldorf e os trabalhos manuais estão muito presentes em sua pedagogia. A gente aprende a fazer tricot desde pequeno na escola. Lembro-me que fiz um casaco com lã rosa. E a sensação de ver a peça pronta, provar, foi demais! Eu estava materializando uma ideia! Hoje, minha meditação, meu momento de estar presente, de pensar na vida, é fazendo trabalhos manuais. Minha cabeça está sempre lotada de ideias e às vezes tenho vontade de silenciá-la um pouco. Então adoro bordar, pintar, fazer tricot, crochet Para mim, tudo o que é feito à mão tem uma energia diferente, um cuidado especial e muito valor afetivo.” *Tathi Ventre*
Os modelos que a avó da Sil fez para ela na infância Tricot da coleção 2023 da Missinclof“Ai o meu novelo de lã Já não sabe que ponto dá Se dá ponto pro Salvador Se dá ponto pro Orixá”
Trecho da música Novelo de Lã, de Alessandra Leão
* TRICOT NA MISSINCLOF * @missinclof
“Hoje com a tecnologia à máquina são reproduzidos muitos pontos de tricot. Mas o tricots feitos à mão são reconhecidos de longe! São peças que trazem um aconchego, que têm mais volume, misturas de pontos altos e pontos baixos que a máquina é incapaz de fazer. Cada vez mais inserimos peças feitas à mão na Missinclof, desde detalhes até peças 100% handmade São peças mais demoradas para serem produzidas. Mas o que poderia ser um empecilho faz com que lancemos sempre coleçõ limitadas, que vão chegando aos poucos, à medida que vão ficando prontas. São itens com muito diferencial!” * Tathi Ventre*
“Eu amo criar e usar tricots, e toda a memória afetiva que ele carrega. No dia das fotos deste ensaio, fiz questão de levar os tricots que minha avó fazia para mim na infância. Estão perfeitos até hoje. Acredito que, durante o processo, quem o faz coloca sua intenção, carinho e até um pouco da sua história ou do momento que está vivendo. É um ato de paciência e amor! Cada vez mais investimos em peças assim na Missinclof. Encanto-me com os tipos de pontos, relevos e adoramos explorar isso nas nossas coleções. Fico muito feliz de ver que as clientes também amam e valorizam esse trabalho tão artesanal e bonito.”
* Sil Freitas*
A dupla Tathi e Sil Tathi na ativa e painel de referências e memóriasA fotógrafa cearense Renata Vale, empresária à frente do espaço expositivo Casa Gabriel, imprime personalidade em sua morada paulistana ao misturar arte, design nacional, lazer e muito afeto
Por Eduardo Simões Fotos Manu Oristanio
Em abril deste ano, Renata Vale completou uma década em sua casa no Jardim Guedala, zona Sul de São Paulo. Fotógrafa e empresária, ela viveu em sua cidade natal, Fortaleza, até se casar com o conterrâneo Cláudio Vale, que atua no mercado financeiro. Com ele e as filhas, Cláudia e Lara, mudou-se em 2011 para a capital paulista, com planos de passar apenas um ano para que o marido pudesse expandir seus negócios. Tanto é que, apesar de desejar mais espaço para receber os amigos, seu primeiro endereço paulistano foi um apartamento em Moema.
Foi com a chegada da terceira filha, há dez anos, que o casal partiu em busca de uma casa: Renata chegou a ver opções no Jardim Paulista, mas Cláudio se apaixonou pelo Jardim Guedala ao visitar um amigo morador do bairro, e os Vale acabaram comprando a
atual residência. Passados alguns anos, o casal adquiriu dois terrenos adjacentes e construiu o espaço que Renata chama carinhosamente de seu “clube”.
Com projeto de Marcus Novais, conhecido arquiteto de Fortaleza e autor, por exemplo, do Museu da Fotografia, o local é um generoso anexo com sala de estar, mesa de jantar para 14 pessoas, uma farta adega e uma varanda, de frente para a piscina. O jardim e seu deck, são 1
1 – No teto do salão de festas de Renata, a foto feita por ela da Aurora Boreal
2 – A fotógrafa na varanda do espaço
os lugares preferidos de Renata para fugir da agitação de São Paulo. “Eu acordo com os passarinhos cantando. É uma delícia”, diz. É lá também que ela mantém sua rotina de exercícios, com um personal trainer. “Tenho uma vida social bem ativa e, nos fins de semana, costumamos viajar para Angra dos Reis ou Trancoso” [onde o casal também mantém uma casa, desenhada por David Bastos], conta Renata.
Não à toa, seu “clube” espelha a vida social da família e abriga, inclusive, festas das filhas. Entre as comemorações, estão eventos grandiosos, como o famoso Natal dos Vale, que chega a reunir 300 amigos, mas também almoços despretensiosos, acompanhados de delícias trazidas das viagens ao Ceará, as
quais tampouco dispensam no dia a dia. “Quando vou para lá, tenho que correr para a praia e comer caranguejos. Também não deixo de comprar feijão-verde, goma de tapioca e queijo de coalho. A gente faz questão de manter nossas raízes.”
A mudança para a nova morada fez crescer no casal o interesse por colecionar peças que gostam. De Fortaleza haviam trazido poucas obras de arte, como telas de Pancetti, Di Cavalcanti e Carybé, expostas no hall de entrada. No living, no entanto, vê-se que o interesse de Renata e Cláudio migrou dos modernistas para artistas contemporâneos: estão
3 – A arte está presente até no acesso para a garagem da morada
4 – Na sala de estar, destaque para as fotografias, paixão de Renata Vale
5 – A escada em caracol na garagem dá acesso à casa
6 – Outro ângulo da varanda do salão de festas, voltado para o deck e a piscina
“Eu acordo com os passarinhos cantando. É uma delícia”
O design modernista brasileiro pontua o décor da morada, com cadeiras de Sérgio Rodrigues e banco de Oscar Niemeyer
lá telas de Abraham Palatnik, Artur Lescher, Waltercio Caldas, Julio Le Parc, Rodolpho Parigi e Armarinhos Teixeira, por exemplo. Em tempo: o design modernista brasileiro pontua, aqui e ali, o décor da morada, com cadeiras de Sérgio Rodrigues e o emblemático banco Marquesa, de Oscar Niemeyer.
A fotografia, claro, também está presente, em trabalhos de Adriana Duque, Mario Cravo Neto e Paula Clerman, e até da própria Renata – a sala guarda um registro de sua autoria feito na Islândia, durante a
Aurora Boreal. Isso porque Renata, formada em administração de empresas, estudou fotografia quando se mudou para São Paulo e hoje é especializada em imagens de natureza e de arquitetura.
No ano passado, ela inaugurou a Casa Gabriel, na Alameda Gabriel Monteiro da Silva. Mais do que seu estúdio, a novidade paulistana se tornou um espaço expositivo, que ainda oferece auditório para cursos, espaço para eventos e um simpático terraço. O objetivo é destacar a produção artística do Nordeste e exibir trabalhos
de novos talentos. A primeira exposição realizada na Casa reuniu artistas cearenses, como Sérvulo Esmeraldo e Leonilson e, no fim de setembro, o local recebe a mostra que marcará a estreia de Renata como fotógrafa, em seu próprio espaço. Renata conta que já comercializa algumas de suas obras, ma non troppo. “Eu tenho dificuldade para vender. Não consigo mostrar meus trabalhos às pessoas”, revela. A primavera, quem sabe, vai dar um empurrãozinho para que a fotógrafa deixe, enfim, florescer, aos olhos do público, a sua produção.
7 – No living, destaque para o banco Marquesa, de Oscar Niemeyer
8 – O deck, um dos pontos de convivência da casa
9 – A piscina cercada de verde
10 – A mesa para 14 convidados é um dos destaques do generoso anexo da casa
À frente da gestão ou ocupando posições estratégicas em empresas familiares, essas mulheres constroem suas carreiras profissionais com duplo desafio: perpetuar um legado sem deixar de trilhar sua própria trajetória
Por Raquel Fortuna
Gerir um negócio de família é como um quebra-cabeça complexo. Além dos desafios intrínsecos a uma empresa, há questões como alinhamento de expectativas e objetivos, afinamento entre fundadores e líderes e laços de afeto difíceis de serem separados. Mas são esses mesmos pontos que, muitas vezes, servem de motivação para quem topa dar continuidade a um legado. “Casos de sucesso são os que contam com o claro suporte do fundador ou líderes sucedidos, no sentido de dar respaldo e autonomia necessários ao comando dos negócios. Ter um processo decisório claro, feito por meio de uma boa governança, e criar um fluxo de comunicação entre familiares, executivos e sócios para que as relações de confiança sejam mantidas e desenvolvidas ao longo do tempo também são pontos fundamentais”, explica Aline Porto, coordenadora da plataforma de empresas familiares do Insper e sócia da consultoria BanyanGlobal. Segundo Aline, de uns anos para cá, o mercado mostra um aumento da participação de mulheres em processos sucessórios. “O que vemos são elas buscando seu próprio estilo de liderança, trazendo suas fortalezas em áreas muito relevantes do negócio”, completa. A seguir, conheça a trajetória de mulheres que fizeram das empresas da família não só um lugar para construir uma carreira, mas uma missão para perpetuar histórias de vida.
DIRETORA-GERAL DO CENTRO UNIVERSITÁRIO BELAS ARTES
“Ok, amanhã é outro dia e tudo se encaixará.” A frase é comum na rotina corrida de Patrícia Gomes Cardim, 41 anos. Ela vive aquele desafio diário das mulheres que buscam equilíbrio entre a profissão e a maternidade. “Não me vejo gestora sem ser mãe, nem mãe sem ser gestora. É quase um colapso, mas tudo isso me move”, garante ela. Patrícia é diretora-geral do Centro Universitário Belas Artes, em São Paulo. Uma missão que ela assumiu aos 26 anos, após o pai, Paulo Cardim, ter sido diagnosticado com uma doença de difícil tratamento. Apesar da pouca idade, o ambiente não era nada estranho para ela, já que ingressou na instituição aos 14 anos para cuidar de seus arquivos. “Foi aí que me dei conta da importância desse legado. A Belas Artes teve o primeiro curso de arquitetura de São Paulo e, desde a fundação, no contexto da Semana de Arte de 1922, a ideia sempre foi contribuir para transformar a cidade em um polo cultural”, diz. Formada em Design e Administração, Patrícia também passou por áreas como biblioteca, tesouraria e marketing até ter contato com a diretoria, tendo sempre o pai como mentor. “Apesar de muito amoroso, ele é um gestor duro e exigente”, conta ela, a única dos quatro filhos que demonstrou interesse em assumir o posto.
Para Patrícia, a marca de sua gestão à frente da instituição é a conexão dos universos acadêmico e profissional. “É uma inquietude minha, ainda mais porque estamos na área da economia criativa, que geralmente não tem um mercado de trabalho formal”, explica. Seu objetivo é que os alunos saiam da Belas Artes com carreiras estruturadas, além de ajudar a preparar o centro de ensino para os próximos 100 anos. “Espero que as gerações futuras percebam a importância de manter vivo esse centro de excelência. Somos um país extremamente rico em termos culturais e queremos ver a cultura nacional sendo sempre valorizada”, completa Patrícia.
Na trajetória da joalheria Casa Leão, fundada em 1912, as mulheres sempre tiveram papel fundamental, conforme relembra Jessica Sayeg, 31 anos, diretora da marca e quarta geração no front dos negócios. A começar por sua bisavó Geni, casada com o fundador, o imigrante sírio Leão Sayeg. “Quando foi pedida em casamento, a minha bisa ganhou um vestido feito com tecido da Chanel bordado pelo meu bisavô com pérolas e diamantes. Era uma peça pela qual ela tinha muito carinho. Em 1932, a joalheria foi roubada e perderam tudo. Para ajudar a reerguer a empresa, ela cedeu o vestido para que o marido vendesse as pedras. E assim eles recomeçaram a história da Casa Leão, montando solitários em brincos e anéis”, conta Jessica.
Outra atuação marcante foi a da avó materna, Lea, casada com o sucessor e filho do fundador, Ivan Leão Sayeg. “Minha avó se formou em Direito no Largo São Francisco (USP), em uma época em que isso era inimaginável para as mulheres. Ela não abriu um escritório, mas ajudava meu avô a cuidar dos contratos da loja”, conta.
Formada em Administração, Jessica entrou na empresa em 2012 e, depois de passar por diferentes áreas, tornou-se o braço direito da mãe, a gemóloga Lydia Leão Sayeg, que hoje comanda a Casa Leão. Entre as principais contribuições de Jessica estão a implantação de novas ferramentas de gestão, o início das vendas on-line e a criação das mídias sociais. “Minha mãe é a artista e eu, a parte prática. Somos muito complementares”, diz. Lydia segue como sua maior referência, responsável por passar lições relevantes, como a importância de conhecer muito bem seus produtos e o cuidado com o cliente. “Não à toa, eu atendo hoje os netos dos clientes do meu avô. São relações construídas há mais de 100 anos e pretendo continuar fidelizando consumidores por gerações e gerações”, finaliza Jessica.
HEAD DE COMUNICAÇÃO CORPORATIVA E DE MARCA DA LOJAS RIACHUELO E DIRETORA DO INSTITUTO RIACHUELO
Almoçar na churrascaria e ir ao Shopping Center Norte, na Zona Norte de São Paulo, era um programa comum na infância de Marcella Kanner, 41 anos. Mas a rotina nunca foi a passeio. “Sábado sempre foi dia normal de trabalho”, explica ela, que costumava acompanhar a família na visita semanal à primeira loja em shopping da Riachuelo, rede de varejo fundada por seu avô, Nevaldo Rocha. “Meu avô saiu de casa, no interior do Rio Grande do Norte, aos 12 anos, em busca de uma chance e sempre foi grato às oportunidades que teve.”
Com esse exemplo em mente, Marcella começou a carreira aos 17 anos como assistente do departamento de moda e estilo da Riachuelo, quando ainda cursava faculdade de moda. “Cresci bastante, assumi a área infantil, mas sentia falta de entender melhor a parte de negócios. Então fui fazer um curso no FIT, em Nova York.”
De volta ao Brasil, ela ingressou no programa de trainee da Riachuelo e entendeu o impacto do negócio. Com muito esforço e sem nenhuma regalia, Marcella mergulhou na empresa, angariou prêmios e foi subindo de posto. Hoje, além de atuar como head de comunicação corporativa e de marca, a executiva é diretora do Instituto Riachuelo, que apoia projetos de pequenos e médios empreendedores no sertão nordestino. A vertente social é sua grande paixão, outra semente plantada pelo avô. Pouco antes de sua morte, há três anos, Nevaldo deixou uma carta para família em que lembrava valores como: “por trás de um emprego existe uma pessoa e por trás dela há sonhos e expectativas”. “Essa é a história do meu avô. A iniciativa privada tem papel fundamental de mudar a vida das pessoas por meio da geração de renda. Para mim, isso é uma missão”, conclui Marcella.
SANDRA HARA CHAYO
Sandra Hara Chayo, 47 anos, costuma relembrar a influência do pai em sua carreira com brilho nos olhos. “Ele teve três filhas e criou a gente para construir a nossa própria história. Sempre nos empoderou para sermos o que quiséssemos”, diz ela, sobre Nissim Hara, imigrante judeu árabe e fundador da marca de moda íntima Hope.
Sócia e diretora do grupo que leva o mesmo nome, Sandra se formou em arquitetura, mas resolveu mergulhar nos negócios da família aos 22 anos, quando percebeu que o pai precisava de ajuda com um projeto de expansão. Era fim dos anos 1990 e Sandra foi entender como funcionava cada processo. Transitou por departamentos como BI e backoffice até assumir a parte de marketing e estilo. As irmãs, Karen e Daniela, seguiram os mesmos passos e atuam na empresa nas áreas financeira, administrativa e comercial. Ao longo dos anos, o trio tem cuidado da profissionalização do negócio e da estruturação de uma governança focada na perpetuação da marca, preocupação notória do Sr. Nissim, falecido há três anos. “Temos regras bem claras, como manter um CEO que não seja da família”, explica Sandra.
Apesar de todas as funções executivas que exerce, ela é apaixonada por produto, tanto é que aprova todas as peças vendidas, cerca de mil por ano. Foi responsável, entre outros feitos, pela primeira loja monomarca em 2005.
Hoje a Hope tem 270 lojas, três mil pontos de venda e 80% de mão de obra feminina. “Minha cabeça empreendedora sempre pensou: ‘vou construir a marca que eu gostaria de usar e na qual gostaria de trabalhar’.” Quando o assunto é futuro e o que pretende deixar como legado, ela rememora Nissim: preservar o DNA inovador. “Meu pai sempre teve essa ousadia de deixar qualquer pessoa da empresa trazer novas ideias. Pensar fora da caixinha requer coragem”, encerra.
Myra Babenco não assumiu, de fato, uma empresa de família, mas não teria como deixá-la de fora desta reportagem. Afinal, a empresária cresceu com a responsabilidade de honrar não apenas um, mas dois legados de peso: ela é filha da galerista Raquel Arnaud e do cineasta Hector Babenco. Sonhou em ser atriz, mas logo percebeu sua veia empreendedora, aliada a um tato fino para “ler” as pessoas. Atuou no mercado financeiro até ir trabalhar na galeria da mãe, onde assumiu a área financeira e internacional.
Com a morte de Hector, no entanto, a empresária se viu diante de sua obra e decidiu coordenar o projeto de restauro e digitalização dos filmes deixados por ele, tendo como base a produtora HB e o auxílio de profissionais gabaritados da área. Quando o processo acabar, a ideia é conquistar o reconhecimento merecido e, assim, inspirar gerações futuras. “Não tenho pretensão nem desejo de ser diretora ou produtora de cinema, a não ser que seja algo ligado ao meu pai. E não porque é meu pai, mas porque acredito que ele foi visionário e abordou temas importantes para as sociedades do Brasil e do mundo.”
O mesmo vale para a relevância da trajetória de sua mãe, precursora no mundo da arte e ainda hoje em total atividade. “Temos o desejo de continuar com o olhar geométrico, contemporâneo, abstrato, minimalista e, acima de tudo, único dela”, diz a empresária. Por ora, o dia a dia de Myra não é mais na galeria, mas ela segue ativa no business. “Minha mãe e meu pai fizeram contribuições muito importantes para a arte. Não posso deixar que os legados deles terminem nunca”, finaliza ela, com a convicção de quem sabe aonde pode chegar.
Em um relato corajoso e honesto, a fotógrafa
Sophie Ebrard fala sobre a importância de normalizar as imperfeições da maternidade
Sophie Ebrard em depoimento a Natália
Albertoni“Eu não queria ser mãe.” Com este anúncio escrito em letras grandes nas janelas de sua própria casa, em Amsterdã, a fotógrafa Sophie Ebrard convidou os passantes a adentrarem seu território mais íntimo. A exposição imersiva e multissensorial incluiu um diário, o cheiro engarrafado de um bebê recém-nascido, um curta protagonizado pelo seio de uma mulher e o som de uma grávida dando à luz, além de retratos. O evento, em 2019, fez parte da Unseen Amsterdam, uma das mais importantes feiras internacionais de arte para a fotografia contemporânea. E também se transformou em símbolo de uma longa jornada na vida de Sophie, que foi tornar-se mãe. Fotógrafa e filmmaker reconhecida por abordar temas tabus, Sophie conversou com Donna sobre o que a levou a fazer esse trabalho tão potente quanto desafiador, que coloca em dúvida as improváveis certezas da maternidade.
A exposição Eu não queria ser mãe era sobre a complexa mudança de identidade que acontece quando nos tornamos mães. Acredite ou não, naquela época, há apenas quatro anos, não se falava tanto sobre o assunto e a maternidade era retratada como algo de pura alegria e bem-aventurança.
A realidade é que ser mãe é difícil. Não apenas por causa das noites sem dormir. É um big bang psicológico, uma das maiores mudanças pelas quais as mulheres passarão em suas vidas. Ponto fnal.
Quando me tornei mãe, me senti presa, oprimida e sozinha. Eu estava de luto pela minha antiga vida. E me senti uma péssima mãe por não amar cada momento da infância do meu flho. Há uma expectativa de que você precisa amar seus flhos e amar ser mãe. Mas nem sempre é verdade: você pode amá-los profundamente e não gostar do papel de mãe. Precisamos mudar a narrativa.
Nos primeiros momentos da maternidade, não havia ninguém com quem eu pudesse conversar, nem mesmo minhas amigas mais próximas.
Tornar-me mãe foi praticamente um tapa na cara. Quando meu flho nasceu, não tive o primeiro instinto de segurá-lo. Era tudo tão estranho. E assim permaneceu por muito tempo. Por fora eu refetia a imagem da mãe perfeita, amamentando-o e levando-o a lugares, viajando. Mas, por dentro, eu estava realmente lutando contra meus sentimentos. Eu o amava demais, mas não amava o papel de mãe.
Não queria me identifcar com outras mães empurrando seus carrinhos de bebê. Não desejava ser vista como mãe, não queria mudar. Eu só queria ser a mesma pessoa e não me parecer com mulheres que abrem mão de tudo pelos flhos. Não que haja algo de errado com isso, se esse for o desejo. Mas não era o meu.
Esse espaço intermediário me deixou muito vulnerável e bem diferente daquela mulher de antes: corajosa, independente, capaz de assumir riscos e viajar o mundo. Eu estava no meu ponto mais fraco e fquei muito isolada. Tinha acabado de me mudar de Londres para Amsterdã, sem rede
CRUSHED
de apoio. Eu me sentia inadequada como mãe e não sabia que alguém poderia estar passando pela mesma coisa que eu.
Só quatro anos depois, quando tive minha filha, é que comecei a entender todo esse rebuliço de emoções conflitantes. Comecei a ceder à maternidade e enxergar quem eu queria ser como mãe.
Em minhas pesquisas, descobri o termo matrescência. Falamos muito sobre a adolescência e todas as transições que esse período envolve. Na matrescência ocorre o mesmo, mas ninguém discute o tema. Sabemos que é normal que os adolescentes se sintam confusos. Então, por que não olhar a gravidez da mesma maneira?
A matrescência não está no vocabulário médico e não nos educamos sobre o tema. Então essa mudança acaba sendo confundida com
a depressão pós-parto. Deveríamos começar dizendo às mulheres que haverá uma mudança de identidade da pessoa que ela passou décadas tentando defnir. E que um período de transição é normal. Não é algo da noite para o dia e, quase sempre, haverá um luto pela sua antiga versão.
Dar à luz uma nova identidade pode ser tão exigente quanto dar à luz um bebê. Cada mulher que se torna mãe passa pela matrescência. Ela é profunda e difícil e precisamos conversar para normalizar o assunto. Tornar-se mãe é uma das maiores mudanças que uma mulher vai experimentar. Quando nasce um bebê, nasce também uma mãe.
WILL I EVER BE ME AGAIN, OUTSIDE OF US?
A founder e editora do Lolla, (@thelollablog, plataforma que amamos!) dá a linha e a gente puxa – sempre queremos um pouco mais do olhar fresh&cool que só ela tem! Por aqui, um pouco de brilho, um pouco de natureza. Um pouco de arte, um pouco de fusô de oncinha. Aquele mix com tudo o que precisamos para ser feliz.
AmadosEstou obcecada com as clínicas de saúde e bemestar da Suíça. São muitas opções, para terapias das mais diversas, de estética a saúde mental, e até para tratamentos avançados de doenças graves como câncer. Virou meu monotema nas minhas rodas de conversas com amigas.
myswitzerland.com
“I always say I cannot work with bitches; they block my creativity”
Alber Elbaz
O Instituto Baía dos Vermelhos é uma casa de shows belíssima no meio da Mata Atlântica da Ilhabela. Ano passado tive o privilégio de assistir a um show do Seu Jorge com Daniel Jobim apresentando músicas de Tom Jobim – um sonho inesquecível!
@baiadosvermelhos
Sei que o quiet luxury, onda fashion que prega o minimalismo, é o talk of the town. Mas estou apegada mesmo a outra tendência: a casualisation, nada mais que a normalização de usar legging de ginástica para fazer qualquer coisa e não se sentir underdressed nem por um segundo! Mesmo sendo herança da pandemia, não se engane: ela é tudo menos boring! A calça fusô de animal print da Pade D é a representação perfeita de casualisation versão Lolla Girl.
@pa_de_d
Estou acompanhando de perto algumas marcas corajosas que têm inovado ao optarem por trabalhar com lab grown diamonds. Em um segmento tão tradicional quanto a joalheria, é uma quebra de paradigmas geracionais. Por ser – a princípio – uma matéria-prima livre de conflitos, é também uma forma de expandir as nossas consciências ambiental e humana. Amo as brasileiras Gaem e Veèfe e a americana Dorsey.
@dorseyofficial | @shop.gaem | @veefe_oficial
Nazareno
Galeria Lume
Eu me apaixonei por essa obra do Nazareno na mais recente edição da SP-Arte. Acho o trabalho dele tão lúdico, mágico e delicado. É como entrar novamente em contato com a infância.
@nazarenorodrigues | @galerialume
Ruy Ohtake | 31 Mobiliário
Esta mesa de centro do Ruy Ohtake é uma das coisas mais lindas que eu já vi. O tom de verde a deixa ainda mais especial – à venda na loja de amigos queridos de Belo Horizonte, a 31 Mobiliário.
@31mobiliario
Clarissa Ward é Chief International Correspondent da CNN em Londres. Uma das jornalistas mais determinadas com o compromisso de informar ao mundo a realidade de boa parcela da população, cobrindo climate change, conflitos e, muitas vezes, zonas de guerra. Nesse podcast ela conta de forma bem pessoal como lida com a dualidade de ter uma família com crianças pequenas e encarar o trabalho de correspondente internacional. Muito forte e, sem dúvidas, coloca tudo em perspectiva.
amandadecadenet.com/podcasts/clarissaward
Osvaldo Gaia
Escritório de Arte Rosa Barbosa
Galeria Lume
Gaia é um artista paraense, da mesma terra dos meus pais. Minha mãe, a galerista Rosa Barbosa, me apresentou o trabalho dele há alguns anos e eu me encantei. Escultor e pintor, ele trabalha com elementos que remetem ao universo amazônico, à física e à natureza.
@osvaldo.gaia | @arte.rosabarbosa | @galerialume
Elas são egoístas, competitivas, mães desgostosas e, por vezes, viciadas em sexo. Conheça o movimento literário contemporâneo, que tem transformado — finalmente! — personagens femininas fora do convencional em protagonistas
Imagine a seguinte cena: uma pediatra que não gosta de crianças tira sarro de doulas que fazem reiki em mulheres em trabalho de parto e, detalhe, tem um caso com um homem casado – com uma grávida. Cena dois: dentro de sua própria casa, uma jovem entediada com uma rotina aparentemente bacana decide hibernar à base de remédios controlados com o auxílio de uma psiquiatra sem noção. E, por fim, uma jovem realiza um procedimento em um consultório médico enquanto narra, em detalhes, sua lista de desejos, que inclui fantasias sexuais com Hitler.
Mas o que essas três histórias têm em comum? Estamos falando de protagonistas de livros – A Pediatra (Andrea Del Fuego), Meu Ano de Descanso e Relaxamento (Ottessa Moshfegh) e A Consulta (Katharina Volckmer,) – que colocam em voga uma tendência cada vez mais presente na literatura: a de ultrapassar convenções limitantes e mostrar mulheres que estão longe de buscar uma vida tida como convencional.
As personagens em questão são falhas, deliberadamente desonestas e donas de uma moral questionável. Também são terrivelmente fascinantes porque nos trazem perspectivas diferentes sobre o que é ser mulher. “Preci-
Por Natália Albertoni Ilustração Monasamos compreender a complexidade do ser humano e isso passa por protagonistas mulheres e problemáticas”, avalia a escritora e tradutora Stephanie Borges. Para ela, uma personagem “desagradável” pode dar voz a questionamentos necessários sobre a violência e os tipos de restrições com as quais ainda lidamos na sociedade. “Também é uma forma de explicitar a recusa ao cumprimento de papéis de gênero que limitam a nossa sensibilidade e a nossa imaginação”, complementa.
Afinal, personagens criadas por mulheres costumam carregar dualidades próprias do ser feminino e é bom poder ver, ali no papel, que elas existem. “Gostamos de nos enxergar refletidas numa história, com nossos medos, desejos, sonhos e imperfeições. Essas personagens com caráter ‘duvidoso’ apenas refletem quem somos”, esclarece Fernanda Ávila, uma das idealizadoras do projeto Amora, clube de assinatura de livros escritos por autoras, lançado em 2022.
A tendência acompanha as movimentações da sociedade civil e também do mercado editorial. A edição mais recente do estudo Retratos da leitura no Brasil (2020), feito pelo Instituto Pró-Livro em parceria com o Itaú Cultural, aponta: mulheres (59%) leem em média mais que os homens (54%). E o percentual cresceu 7% em relação a 2015. Mas talvez o que seja ainda mais significativo é dizer que, entre 2019 e 2021, também houve um salto de 34% para 44% no número de autoras que lançaram livros (Clube de Autores), dado confirmado pela Câmara Brasileira do Livro (CBL). “Conseguimos ver uma mudança mais clara nos últimos dez anos no mercado mainstream, com o intuito de trazer narrativas mais diversificadas. Ela foi alavancada pela chamada terceira/quarta onda feminista, mas também partiu da demanda do próprio público por meio de movimentos sociais, da entrada de jovens negros, indígenas e de classes sociais mais baixas nas universidades. Esses estudantes desafiam o ‘cânone’, os professores e o status quo”, explica a historiadora e escritora Paula Carvalho.
Para ela, em termos criativos, hoje, são escritoras que têm trazido um lado mais fascinante e até inovador para o setor. Entre os exemplos, está o boom de latino-americanas usando temáticas como o horror, a perspectiva de personagens negras no centro das histórias e a revelação das ambivalências da maternidade. Em comum, as tramas tendem a repetir questões da casa, do corpo e da maternagem. “Não tem como pensar em ser mulher sem pensar nesse corpo”, afirma Paula.
E, comemoremos mais ainda, porque o sucesso comercial contribui para a chegada de cada vez mais
nomes. A mineira Carla Madeira tornou-se um fenômeno editorial brasileiro, principalmente, com o livro Tudo é Rio, o segundo título mais lido em 2021 – atrás apenas de Torto Arado (Itamar Vieira Jr.). Globalmente também vale lembrar da nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie e da italiana Elena Ferrante, que viraram febre mundial. Tudo isso impulsiona um mercado em busca de repetições desses fenômenos: cresce a procura por novas escritoras ou, em algumas ocasiões, há um resgate de nomes mais antigos, esquecidos ou nunca antes publicados. É o caso da argentina Silvina Ocampo e das brasileiras Dinah Silveira de Queiroz e Julia Lopes de Almeida.
Que venha o megafone
As mulheres sempre escreveram – algumas até alcançaram sucesso comercial nos séculos passados –, mas sabemos que foram proibidas de se educar por muito tempo e, para além disso, a história da literatura ocidental minimizou o papel dessas autoras. Então, o que vemos hoje não é fruto de um marco isolado, mas resultado de uma confluência de fatores.
Estamos vivendo um caminho aberto por um século de lutas travadas por muitas autoras que pesquisaram e atuaram para que fosse possível existir outro olhar, um contraponto àquele em que prevaleciam as relações de poder, submissão e outros padrões predefinidos. “A psicanálise nasce no início do século passado com a escuta de mulheres que estavam com os corpos em
sofrimento, causado pela opressão e pelo silenciamento. Como psicanalista, eu penso que essa amplificação de vozes é um eco dessas mulheres que sofriam no corpo aquilo que não podiam falar”, pondera a psicanalista Tatianne Dantas.
Se olharmos em retrospecto, também é possível considerar o projeto Read Women (2014), idealizado por Joanna Walsh. Depois, a versão nacional Leia Mulheres (2015), que se espalhou por todos os estados. E, ainda, editoras, livrarias e editais exclusivos para mulheres. Fora o nicho de influenciadores, que passou a fazer outro tipo de recepção literária e contribuiu para a formação de uma nova geração de leitores focada nessas obras. Há, ainda, ferramentas que facilitam a divulgação das produções e de uma participação maior das mulheres na curadoria de eventos importantes, bem como no júri. “Quando a gente expande o leque e vê diferentes mulheres, com idades diversas, em variados momentos de vida e contextos sociais, há inúmeras narrativas com perspectivas muito distintas do que significa ser mulher. E, aí há espaço para aquelas que estão desafiando a ideia da mulher boazinha”, finaliza Stephanie. Ao observarmos essa multiplicidade é capaz de nos darmos conta de que são apenas personagens humanas. Ou seja, com defeitos.
O clube de assinatura Amora indica cinco personagens que você precisa conhecer
PERSONAGEM:
ADÉLE NO JARDIM DO OGRO
Leïla Slimani
Uma mulher casada, mãe de um filho pequeno, viciada em sexo, tem uma vida aparentemente perfeita, mas seu desejo incontrolável de correr riscos, de se entregar, acaba colocando-a em um universo complexo, controverso e visceral.
PERSONAGEM:
SEM NOME
O QUARTO ALEMÃO
Carla Maliandi
Uma mulher sai de Buenos Aires em busca de si mesma e vai parar em uma cidade universitária da Alemanha, onde fica hospedada em um residencial de estudantes – sem ser estudante. Ela passa por conflitos sentimentais e vários incidentes –alguns trágicos, outros engraçados – e descobre uma gravidez que trata com total indiferença.
PERSONAGEM:
VITÓRIA
NADA DIGO DE TI QUE EM TI NÃO VEJA
Eliana Alves Cruz
Vitória é uma mulher trans, uma ex-escravizada que comprou sua própria liberdade. Africana, nascida no Congo, curandeira respeitada e temida, é a representação da liberdade.
PERSONAGEM: ELIETE
ELIETE: A VIDA NORMAL
Dulce Maria Cardoso
Mãe de duas adolescentes, Eliete é uma corretora de imóveis que vive uma vida normal e um casamento sem graça. De repente, resolve tornar-se dona do seu corpo e de seus desejos.
PERSONAGEM: LIA
NOTAS SOBRE A IMPERMANÊNCIA
Paula Gicovate
Ela vive uma história de amor sob a perspectiva da amante. É uma mulher com muitas camadas, que nos cativa e nos convida a acompanhar sua trajetória sem julgamentos.
No mundo dos vinhos, não é de hoje que as mulheres são protagonistas. Impossível não recorrer à famosa história das Viúvas de Champagne, por exemplo, para ilustrar os casos mais icônicos de superação nos espumantes, que resultaram em procedimentos inovadores e em três marcas até hoje consagradas: Veuve Clicquot, Bollinger e Pommery. “A presença feminina nos vinhos, de modo geral, se intensificou na última década”, diz Suzana Barelli, jornalista especializada em vinhos e
uma das pioneiras em escrever sobre a bebida no Brasil. “Por aqui, o mais visível é a quantidade de sommelières mulheres trabalhando no mercado. Elas têm conquistado espaços importantes em restaurantes e importadoras de vinho”, completa Suzana.
A tendência é que esse número cresça. Um levantamento da Associação Brasileira de Sommeliers mostrou que as mulheres em cursos de formação já representam hoje a metade dos alunos. Também são elas que têm consumido cada vez
mais vinhos, além de abastecerem a adega de casa.
Dentro das vinícolas, a participação feminina não ficou estacionada na história. Com originalidade, criatividade e sensibilidade aguçada, as mulheres continuam inovando em matéria de produção e no conceito de suas próprias marcas. São iniciativas que, na outra ponta, têm dado chance para os amantes do vinho viverem novas experiências com sua bebida favorita.
Como não se render, por exemplo, à produção artesanal e em
pequena escala da Casa Viccas, uma vinícola sediada nas Serras Gaúchas e comandada por duas mulheres que, por meio de microvinificações, criam vinhos livremente, sem receitas ou protocolos, chegando a resultados surpreendentes? Também é impossível não
admirar o trabalho da Martino Wines, vinícola argentina que tem uma forte ligação com o Brasil e que hoje conta com uma mulher no cargo máximo: Fernanda Martino, responsável por modernizar a imagem de uma empresa familiar que, até poucos anos atrás, se restringia
Em 2018, as amigas Sara Valar e Vivian Vitorelli começaram um trabalho que envolveu estudos e viagens para descobrir os segredos da vinificação natural. No ano seguinte, elas fizeram os primeiros vinhos da Casa Viccas, que leva em conta os mesmos procedimentos usados por seus avós – no passado, eles produziam a bebida para consumo familiar.
Os vinhos da Casa Viccas são feitos no Rio Grande do Sul sem intervenções ou correções com produtos enológicos. O resultado dessa técnica ancestral são amostras vivas, cheias de personalidade e aromas, que expressam fielmente o sabor da uva e do terroir da região.
Apaixonadas por vinhos desde sempre, Sara e Vivian acompanham de perto todas as fases do processo de fabricação. E, a cada safra, não lhes faltam coragem e ousadia para combinar tipos diferentes de uvas em novas experimentações.
aos padrões estabelecidos por seu pai. Por fim, a trajetória de Marina Santos, amante genuína da vitivinicultura e que atualmente é responsável pelos vinhos cheios de pureza e aromas da Vinha Unna. A seguir, mostramos mais detalhes dessas histórias. Boa degustação!
“Com a sensibilidade e a intensidade femininas chegamos a uma bebida única e elegante, como toda mulher”, compara Sara. “É ‘apenas’ o instinto feminino aflorando nos produtos finais da nossa vinícola”, completa Vivian.
A Vinha Unna nasceu há mais de dez anos, já com um projeto sustentável, algo menos falado na época. A grande preocupação de sua idealizadora, a viticultura e vinhateira Marina Santos, era produzir rótulos cujo único ingrediente fosse a uva (na vinificação convencional, é normal utilizar aditivos enológicos e conservantes). “Sempre fizemos vinhos naturais, com uvas de produção orgânica ou biodinâmica”, explica Marina. No processo, a fruta é fermentada somente com as próprias leveduras naturais. A bebida é pura, refletindo as características do terroir Ou, segundo a própria Marina, “um vinho cheio de camadas de aromas”.
Toda a estrutura da Vinha Unna, que está localizada acima dos 700 metros de altitude de uma pequena cidade da Serra Gaúcha (Pinto Bandeira), foi pensada para causar o mínimo impacto na natureza, com containers, ecotelhas, madeiras de demolição e tijolos de barro. A vinícola também conta com estação de tratamento de efluentes, agrofloresta e horta de ervas aromáticas que são utilizadas nos tratamentos dos pés de uva.
Para trabalhar com autoridade em um setor ainda dominado por homens, Marina revela que estagiou em praticamente todos os departamentos de uma vinícola, até abrir a mente para novos conceitos e finalmente fundar o seu próprio espaço. “O aprendizado me ajudou a entender que o novo nunca nasce da tradição”, acredita. Ainda assim, sua paixão por vinhos não é algo herdado da família. E este é mais um motivo para ela seguir quebrando paradigmas e mostrar que o vinho pode conectar as pessoas à natureza.
A GRANDE PREOCUPAÇÃO ERA PRODUZIR RÓTULOS CUJO ÚNICO
Depois de passar por praticamente todos os departamentos da premiada vinícola argentina Martino Wines, Fernanda Martino é quem hoje comanda os rótulos que levam o nome de sua família. Sua carreira na área começou há 15 anos, quando ela vendia os vinhos produzidos pelo pai nos restaurantes de seu país. “As bebidas já eram boas, mas eu não gostava da aparência das garrafas. Achava-as muito escuras, apagadas nas prateleiras.” Em 2013, já formada em design gráfico e desempenhando essa função na empresa, ela então promoveu o primeiro rebranding da Martino.
Há um ano, Fernanda assumiu totalmente o controle da vinícola fundada em 2001 pelo pai, que se aposentou e se mudou para o Brasil. A CEO já colhe outros frutos da nova gestão. Em uma fabricação de pequena escala, a Martino Wines começou a trabalhar em uma linha de vinhos orgânicos, que será lançada ainda neste ano.
O projeto, que partiu 100% dela, contará com três tipos de vinhos: branco, laranja e tinto leve. “É uma forma de continuarmos fomentando ‘práticas verdes’ e mostrarmos que não temos apenas Malbec”, explica, citando a especialidade pela qual a Martino é mais conhecida e reconhecida. Dessa forma, começaram a conversar com um público mais jovem, entre 20 e 30 e poucos anos, que dificilmente conheceria a empresa se não fosse pelas novidades.
A Martino está presente no mercado brasileiro desde 2022, mesmo ano em que inaugurou um restaurante dentro de sua vinícola, na região de Mendoza, passando a oferecer aos turistas – muitos deles brasileiros – uma experiência completa envolvendo vinho e gastronomia. É a forma mais original que Fernanda encontrou para compartilhar um pouco das receitas e do estilo de vida de sua família.
“Quebrar significa que você tentou. E, certamente, aprendeu algo com aquilo. Aqui, no Brasil, acho que as pessoas têm mais medo de arriscar”
Formada em economia e direito, Carolina Burg Terpins passou por diversas empresas antes de abraçar sua veia empreendedora para preencher uma lacuna no mercado: ela é sóciafundadora e CEO da JFL Realty, gestora e incorporadora de ativos imobiliários
Por Humberto Maruchel Retrato Cleiby Trevisan
A veia empreendedora sempre fez parte do universo de Carolina, assim como as ressalvas em torno do assunto. Tanto é que, quando chegou a vez de fazer uma escolha profissional, ela decidiu cursar direito e economia, simultaneamente. Com o tempo percebeu seu interesse pelo mundo dos números e usou sua determinação para se destacar na área.
Ainda na graduação teve sua primeira experiência como empreendedora, ao ingressar como sócia em uma marca de biquínis. “A empresa deu errado, mas entendi o que não deveria fazer numa próxima experiência.” Seguiu, portanto, para o mercado corporativo como colaboradora do Citibank, até resolver frear os planos para acompanhar o namorado em um MBA na França.
De volta ao Brasil, no ano seguinte, Carolina passou pela área de mercado de capitais de grandes empresas e bancos, além de participar do IPO das companhias Rossi Residencial e Brookfield, onde foi vice-presidente de planejamento estratégico e relações com investidores. Foi em 2011, no entanto, quando entrou como sócia no Banco Brasil Plural, que a veia empreendedora voltou a pulsar. Lá, conheceu Jorge Felipe Lemann, hoje seu sócio, com quem atentou para uma possível lacuna no mercado imobiliário: residências de alto padrão construídas não para venda, mas para locação de longo período. Juntos, fundaram, em 2015, a JFL Realty, que hoje movimenta mais de R$1 bilhão por ano. E, em meio a tantas conquistas, Carolina foi aprendendo a equilibrar a vida profissional com a pessoal – seu filho nasceu no dia da abertura do primeiro prédio idealizado pela JFL Realty. “Por muito tempo o foco estava no trabalho, e tudo bem. Até o momento que você entende não estar completa. E isso acaba até mesmo atrapalhando a sua carreira.” Para Donna, a empreendedora fala sobre delícias e desafios que regem sua trajetória.
MATERNIDADE X CARREIRA “No dia que descobri que eu estava grávida, fiquei com medo de contar para o meu sócio. Não exatamente por estar grávida, mas pelo fato de estar montando um negócio em que eu precisaria ter um superfoco. O medo não era por ele, mas por outras
pessoas que poderiam levantar questões machistas.”
EQUILIBRISTA “Construir uma família não é algo tão planejável. O casamento acontece, a gravidez também. E foi assim mesmo. Quando eu me casei, meu marido já tinha dois filhos e não queria outros. Eu estava montando a JFL e também não tinha esse desejo, mas acabei engravidando e foi a melhor coisa que me aconteceu. Percebi que não precisava escolher entre carreira e maternidade porque ter os dois traz ainda mais equilíbrio.”
CONTROLE E IMPREVISTOS “Quando fazemos um planejamento de uma obra, pensamos: ‘Vamos gastar dez e entregar no dia 2’, mas sabemos que não é assim. A questão é: quanto fora dessa data irei entregar e quanto acima desse valor estimado gastarei? São imprevistos que trazem a seguinte reflexão: ‘já que não cumpri o combinado, como faço para minimizar o que deu errado?’ Às vezes, o errado dá certo e eu acabo gastando oito e entregando no dia 1º!”
RUPTURAS “Eu era muito nova quando meus pais se separaram e tinha 13 anos quando meu pai se casou novamente. A vida mudou bastante. Eu poderia ter desmoronado, mas comecei a perceber que, até então, alguém resolvia os problemas para mim. Era hora de responder por mim mesma.”
UNHAS E DENTES “Grande parte das mulheres que trabalham comigo e têm filhos cuidam muito mais da empresa do que da família. Talvez essa seja uma característica feminina. A maternidade traz aprendizados importantes para a vida profissional, principalmente essa relação de cuidar daquilo como sendo seu.”
CAIR E LEVANTAR “Quantas empresas não quebram no Vale do Silício? Lá fora isso não é tão mal visto quando acontece. Quebrar significa que você tentou. E, certamente, aprendeu algo com aquilo. Aqui, no Brasil, acho que as pessoas têm mais medo de arriscar.”
“Produzidos em pequena escala, os sapatos da BOTTI celebram o fazer manual, priorizando sempre a qualidade, o conforto e a autenticidade”
com
Carbono Donna acompanhou a estilista em atividades do seu dia a dia. Do café da manhã em família às visitas à sua nova fábrica, na Vila Madalena, ela gosta de encarar a rotina sem pressa e com boas doses de liberdade
Por
“Ser complicada dá trabalho”, diz a designer de roupas Marisa Ribeiro. A afirmação é feita durante uma conversa sobre moda, mas poderia se aplicar à rotina da paulistana de 72 anos. Ou à falta dela, já que Marisa não gosta muito de nada do que é fixo. A sessão de ginástica, por exemplo, já estava se tornando um problema por ter hora marcada – melhor caminhar cerca de 1 km de casa até a loja que leva seu nome, na Alameda Gabriel Monteiro da Silva, no Jardim América. Caseira, costuma trabalhar o dia todo, mas, à noite, gosta de se sentar para jantar com o marido, Arthur, que cuida da área financeira de sua marca, e, depois, assistir a uma série. É quando desliga
“Gosto de livros de filosofia e física quântica, que fazem a gente entender um pouco a natureza humana”
do dia a dia corrido, que inclui visita à obra da nova fábrica, na Vila Madalena, atendimento a clientes e cuidar de todas as etapas de produção das peças com olhar atento e minucioso para atender mulheres que buscam roupas confortáveis, elegantes e de boa qualidade.
Nos finais de semana, quando não vai para sua casa na praia da Baleia, no litoral paulista, gosta de ver os netos andarem a cavalo e ficar em casa, de preferência preparando algo delicioso na cozinha. Nas próximas páginas, você acompanha com a Carbono Donna um pouco do dia a dia da designer.
“Acordo por volta de 8h e faço meu ritual diário: tomo banho, passo cremes no rosto, me massageio e uso uma maquiagem bem leve. Aí desço para o jardim e tomo meu café da manhã enquanto leio o jornal. Como frutas, pão com queijo branco e tomo café. É a minha refeição predileta.”
“Costumo visitar a obra da minha nova fábrica e loja (foto de abertura), que será na Vila Madalena. Gosto de ver como está tudo por lá e acompanhar o andamento da construção.”
“Uma vez por semana, vou ao Santa Luzia. Não tenho um dia certo para ir, porque tudo o que é fixo me dá aflição, mas gosto de fazer compras por lá. Aproveito para trazer ingredientes que uso para cozinhar. Algo que gosto de fazer aos sábados e domingos.”
“Quando não visito a obra, vou para a minha loja na Alameda Gabriel Monteiro da Silva. E se não preciso levar meu computador, percorro esse trajeto a pé (foto abaixo). Aproveito para fazer exercício e ver as vitrines da rua, que tem muita coisa legal.”
“Às vezes, depois que saio da obra, almoço no café da loja Amoreira, ali perto. Gosto das saladas e tortas, além do suco de uva com água de coco.”
“Meu autor preferido atualmente é o alemão Eckhart Tolle. Gosto mais de livros nessa linha, de filosofia e física quântica, obras que fazem a gente entender um pouco mais a natureza humana. Inclusive, sempre escuto o podcast dele.”
“Eu gosto de roupas práticas e versáteis. Adoro vestidos com bom corte e caimento, além de blazer e jaquetas. Meu armário é repleto de peças atemporais.”
“Meu senso estético vem da minha mãe. Ela sempre me levou a museus e feiras de arte. Aos seis anos, eu já ia ao Mercado Mundo Mix e amava. Acredito que minha escolha pela faculdade de moda se deve à familiaridade que tive com esse universo ainda na infância.”
“Meu perfume favorito é da marca Goutal Paris.”
“Não sou muito disciplinada com skincare, confesso! Mas adoro os produtos da linha Dior Capture Totale.”
“Gosto muito de colecionar joias! Elas sempre me remetem a sensações e momentos especiais.”
“Adoro o estilo das francesas pelo allure: estão sempre bem vestidas e com peças práticas.”
“Guardo com muito carinho um colar que meu pai deu para minha mãe quando ficaram noivos. Também tenho uma bolsa que ganhei do meu marido no meu primeiro Dia das Mães, ainda grávida. Quero passá-la para minha filha!”
“Meu sonho de consumo é a pulseira Croisillon, criada por Jean Schlumberger para a Tiffany & Co. em 1962. É uma peça que segue extremamente chique e atemporal, além de envolver histórias que nos remetem a Jacqueline Kennedy.”
“Costumo garimpar peças em feirinhas, brechós vintage, etc. Mas, hoje em dia, com a rotina corrida, acabo comprando muito a partir de e-commerce.”
“Eu amo ler! Me tranfiro para as histórias, momentos e vidas diferentes, instiga a minha imaginação! Adoro biografias. Estou lendo Finding Me, da Viola Davis.”
Os podcasts se firmaram como lugar de fala, principalmente para mulheres que apostam no formato para refletir sobre temas necessários – do empreendedorismo à maternidade. Conheça algumas vozes que devem ser ouvidas já
PorNove entre dez pessoas escutam com frequência ou já escutaram algum podcast na vida. O que pouca gente sabe é que a palavra vem de iPod – sim, aquele produto da Apple do início dos anos 2000, que agora parece nunca ter existido. Assim, o termo nada mais é do que programa de rádio na web Parece antigo, e é: o primeiro podcast brasileiro data de 2006. Mas a verdade é que o sucesso em solo nacional se fez nos últimos anos – tanto que a tendência deve seguir crescendo em termos de conteúdo, ouvintes e marcas envolvidas. Nos EUA, por exemplo, onde essa mídia bombou um pouco antes, inicialmente com programas investigativos (no melhor estilo de A Mulher da Casa Abandonada, sucesso do jornalista Chico Felitti de 2022, sobre uma senhora que vive numa mansão obscura num dos bairros mais pomposos de São Paulo), já se fala que o valor de mercado dessa mídia está na casa dos bilhões – aqui a história tem tudo para trilhar um caminho parecido.
O formato apresenta fatores interessantes, que justificam a conquista da audiência, entre eles o consumo fácil, geralmente nos momentos em que as pessoas estão se locomovendo. Ouvir um podcast no trânsito, numa viagem de carro ou até mesmo no avião faz o tempo passar mais rápido, entretém e ainda traz uma informação direcionada. “Não deixa de ser uma companhia, tanto que é mais escutado em momentos ociosos, no ônibus, no metrô, no carro”, diz Camila Fremder, escritora e podcaster (leia mais sobre ela abaixo). O que nos leva a outro ponto determinante para seu sucesso: na era da sede – e do excesso – de informação, o podcast é um jeito de consumi-la otimizando o tempo. Afinal, dá para acessar na academia ou até mesmo em casa, enquanto cumprimos tarefas cotidianas. Pode-se adicionar à conta o fato de ser um tempo sem tela – cuidado, os videocasts estão pipocando a cada dia –, ou screenless, algo precioso hoje em dia.
Não menos importante, ou talvez um dos pontos de maior destaque, é o fato de que os programas são mais do que apenas informativos, eles formam pequenas comunidades. “O podcast constrói um grupo de pessoas que valorizam as mesmas coisas”, diz Ju Wallauer, cofundadora da plataforma de diálogo Mamilos. Para entender mais profundamente a fala dela, é só pensar que o @mamilospod sempre começa com a seguinte fala: “Mamileiros e mamiletes”, o que mostra o poder dessa comunidade, e mais, a lealdade desse público. Essa profunda conexão entre ouvinte e apresentadora traz também aquela sensação de intimidade, transformando algumas podcasters em verdadeiras influenciadoras –alô, marcas! Para entender toda essa teoria, selecionamos algumas das mulheres que têm se aproveitado do poder da fala para entreter e pensar junto o mundo atual. Leia – e depois aumente o som!
Maria Ribeiro e Isabel Guerón
Atrizes e amigas há mais de 20 anos, a dupla apresenta o Isso Não é Noronha. A história começou em 2020 em plena pandemia “meio por brincadeira, meio por vontade de trabalhar juntas – e muito para sobreviver ao momento de crise”, mas ganhou peso e gerou “noronhers”, como são chamados os fiéis ouvintes das duas. No programa, elas se chamam de amiguitas e trazem discussões relevantes, cheias de sacadas inteligentes, da geleia da Shakira a política, maternidade, feminismos e séries, sempre com um convidado. Ah, a ausência de script, ou pelo menos da necessidade de segui-lo, não se mostra um problema. Afinal, Maria e Bel são a melhor rota. E ainda mais que tudo acaba em música. Real: o marido da Bel, o músico Rodrigo Maranhão, é quem faz a trilha sonora.
Prestes a completar um ano como podcaster, a designer de sapatos lançou o seu Empreendedora no Divã em um papo terapêutico com a fashionista Natalie Klein. Terapêutico justamente porque esse divã surgiu na sequência de um burnout – e também porque Tatiana é formada em psicologia. Gravado sem cortes, quase como num ao vivo, ela desabafa, troca, se abre com espontaneidade. No seu sofá se sentam outros empreendedores e o roteiro ali é meio livre: “A pessoa começa a falar e, a certa altura, chora, eu também choro, mas o programa virou minha alma, quero poder dizer o que eu quiser”, conta ela, que promete muitas histórias sobre propósito para a segunda temporada.
A paulistana, escritora há longa data, é rata de podcast e comemorou este ano o quarto aniversário do seu É Noia Minha?. Já bombou com o Calcinha Larga, ao lado de Tati Bernardi e Helen Ramos, e ainda discute (ou não) no Indiscutível, com Déia Freitas, este último prestes a voltar em uma nova edição.
Quando começou, a bolha ainda não tinha estourado, no máximo um true crime ali, outro aqui. Hoje Camila tem um contrato exclusivo com o Spotify, lança programa por temporada e traz um monte de gente preparada para debater paranoias.
“Interessa-me levantar uma discussão com vários pontos de vista para os ouvintes se identificarem com alguém.”
Ela é jovem (tem 26 anos), carioca, podcaster, ativista feminista e antirracista e jornalista, como a mãe, Flávia Oliveira, comentarista da GloboNews. Ao lado dela, Bela apresenta um de seus quatro podcasts, o @angudegrilo, em que fala de Brasil, sempre com a lente fresca da idade, mas também está em @ppkansada, @conselhosquevocepediu e #naoeumpodcast. Descontraída, Bela dá seu tom sempre com opinião firme e madura sobre maternidade e política, passando por temas menos cabeça, como dilemas do dia a dia. Para ela, estar nessa mídia é “poder se posicionar e também passar para o público seus objetivos e suas intenções de forma livre”, finaliza.
40% dos brasileiros escutaram podcast pelo menos uma vez em 2022. São mais de 30 milhões de ouvintes de podcast no País.
O Brasil é o terceiro país do mundo em consumo de podcast , atrás da Suécia e da Irlanda.
As plataformas mais utilizadas no País são: Spotify, Apple Podcasts e Google Podcasts.
O fato de o podcast ser uma maneira de consumir o digital sem tela fez com que um nicho em especial se desenvolvesse dentro desse universo: o de programas infantis. Em geral, são podcasts que trazem histórias, músicas, boas reflexões e até receitas. Para as mamães em busca de boas dicas, a gente sugere alguns para tocar no carro ou no caminho para a escola. São eles: Maritaca , Imagina Só e Contos da Capivara
O podcast da Deezer, A Playlist Da Minha Vida, estreou há pouco e já é sucesso absoluto entre os fanáticos pelo formato – e entre os mais analógicos também. Pudera. Nele a atriz Fernanda Torres recebe personalidades da música, do cinema, da literatura, da ciência e da política com a seguinte pergunta: se você pudesse escolher as músicas que marcaram a sua história, quais seriam elas? Em seu divã musical, nomes relevantes relembram memórias curiosas por meio de hits que embalaram sua infância e sua juventude.
Números de estudo realizado pela plataforma CupomValido.com.br com dados da Statista e do IBOPE
“Na minha carreira, foi importante eu ter tido a segurança de me mostrar vulnerável”
Há quase 12 anos no Iguatemi, sendo dois deles como head of Retail, Catharina Pereira prioriza a liderança pelo exemplo e vê a importância de ser uma eterna aprendiz
Não pergunte para a administradora brasiliense Catharina Pereira, 37 anos, onde ela quer estar daqui a dez anos. “Eu tenho metas e sou persistente, mas confesso que não sou a pessoa mais organizada do mundo”, diz ela. Foi assim, sem tanto planejamento, mas com muita dedicação, que ela chegou ao cargo de head of Retail do Iguatemi, onde está desde janeiro de 2022.
Na adolescência, pensava em ser advogada, mas a vida escolar em um colégio bilíngue em São Paulo e o encantamento por Nova York acabaram levando-a para o curso de Economia e Ciência Política da Columbia University, na cidade americana. Lá, não pensava em trabalhar no mercado financeiro, mas seu primeiro emprego foi no banco Safra.
De volta à capital paulista em 2011, após sete anos nos Estados Unidos, o bom pensamento analítico de Catharina a levou a procurar trabalho em consultorias. “A vida foi me mostrando caminhos e acabei na área de Planejamento Estratégico do Iguatemi que, na época, funcionava quase como uma consultoria interna”, lembra Catharina.
Hoje, quase 12 anos depois e mãe de duas crianças, ela comanda uma equipe de cerca de 125 pessoas, incluindo as das marcas que cuida, como Balenciaga e Vilebrequin. A seguir, Catharina compartilha reflexões de quem tem uma trajetória consolidada, mas não abre mão do espírito de “eterna aprendiz” para seguir em frente.
PONTO FORTE “Na minha carreira, foi importante eu ter tido a segurança de me mostrar vulnerável e falar para heads de áreas em que eu estava entrando que não tinha expertise nenhuma ali. Não tem problema poder dizer: ‘Marketing não é minha área, mas quero aprender’. É importante, claro, buscar referências e querer crescer.”
MODELO “Tento liderar pelo exemplo. A gestão de pessoas é sempre o maior desafio, porque somos muito diferentes umas das outras. Nesse sentido, procuro buscar o equilíbrio entre a pressão e o acolhimento, sempre inspirando o time.”
BAGAGEM “Além do conhecimento da parte analítica, eu trouxe do mercado financeiro a experiência em lidar
com pessoas. No banco Safra, eu trabalhava com private bank fazendo isso, lidando com gente. E gente do segmento de luxo. Eu cuidava do dinheiro deles. Então, acho que essa atenção ao detalhe, esse perfeccionismo, foi algo que eu já tinha que fazer aos 22 anos e que foi importante quando vim para o Iguatemi.”
RESPOSTAS “Uma das minhas maiores fortalezas é conseguir destrinchar um problema, fazer as perguntas certas. Isso foi algo que fui desenvolvendo na área de Planejamento do Iguatemi. É um superativo conseguir simplificar um problema e apresentá-lo em diferentes contextos para resolvê-lo de maneira simples. É algo que levo comigo: olhar para várias áreas da empresa buscando soluções.”
VIDA “Não acho que a gente equilibre o pessoal e o profissional. Tem um dia em que saio mais cedo do trabalho para levar meus filhos ao pediatra e, no outro, fico até tarde e não os coloco para dormir. As pessoas querem o trabalho que paga milhões, com um superpropósito e horários flexíveis, mas perfeição não existe. Minha prioridade são meus filhos, mas nem sempre consigo estar com eles. Olhando a big picture, estou proporcionando o exemplo de uma mulher que trabalha.”
MAESTRINA “Eu sou muito básica. Quase sempre estou de calça jeans e camisa branca. Há uma falsa percepção de que você precisa ser a pessoa mais conhecedora de moda para estar nesse mercado. Moda é um business como qualquer outro. Tem a parte financeira, a operacional, o merchandising, a importação, o marketing. E pessoas que entendem de cada área. Meu trabalho é mais orquestrar tudo isso.”
DE OLHO “Meu padrasto me ensinou a estar aberta a coisas novas, e eu sou muito curiosa. Queria ser advogada porque gosto de debater ideias. Se eu falo algo e você pensa diferente, quero que me prove o contrário. É clichê, mas tento ser uma eterna aprendiz. E não só na minha área. Busco referências em vários lugares. Curiosidade é uma chave para a vida e quero passar isso para meus filhos.”
Expert em todos os tipos de delícias e produtora de conteúdo digital gastronômico, a publicitária enxerga o surgimento das newsletters no setor culinário como uma resposta à lógica frenética das redes sociais
“Acredito que a comida não só alimenta como satisfaz o apetite, atende o desejo e evoca a memória.
Uma boa mesa une pessoas para partilhar não só a comida e a bebida, mas para promover encontros e histórias, fortalecendo as relações humanas”
Retrato Bruno GeraldiPublicitária pela ESPM e sommelière pelo Le Cordon Bleu de Paris com formação técnica em cozinha pela Escola Wilma Kovesi, Lena Mattar é especialista em comes&bebes. Nos últimos dez anos manteve uma empresa que presta serviços para restaurantes, chefs, produtos e empresas do universo de A&B e atualmente abastece um delicioso site de receitas (lenamattar.com) e uma newsletter (lenamattar.substack.com) - que já conta com 17 mil assinantes - para guloso nenhum botar defeito. “A ideia da newsletter surgiu da vontade de me conectar com pessoas que gostam de comer, beber e cozinhar de maneira despretensiosa. Lá ofereço receitas para variar um pouco a rotina na cozinha. São dicas descomplicadas para inspirar as pessoas a fazerem dos rituais em torno da cozinha uma parte importante e leve do seu dia a dia”. @lenamattar
Aqui, Lena indica – além de sua ótima newsletter – quatro leituras gastronômicas que fazem bem para a cabeça e para o estômago
O jornalista gastronômico vive viajando para degustar pratos e estudar sobre o comer. Sua newsletter aborda questões variadas do universo alimentar e gastronômico e, no final, há sempre boas sugestões de leituras.
@tononrafa
OUTRA COZINHA OUTRACOZINHA.SUBSTACK.COM
Assinada por Carla Soares, a newsletter investiga o que o cozinhar revela sobre nós. A partir de suas experiências, Carla propõe reflexões interessantes sobre nosso cotidiano que mesclam comida, arte, literatura e fotografia.
@outracozinha
FROM THE DESK OF ALICIA KENNEDY ALICIAKENNEDY.NEWS
A jornalista nova-iorquina que reside em Porto Rico escreve sobre comida no que tange cultura, política e mídia. São textos que propõem análises pertinentes. Também compartilha receitas, o que anda lendo e assistindo.
@aliciadkennedy
STAINED PAGES
STAINEDPAGENEWS.COM
Escrita pela autora de cookbooks Paula Forbes, essa newsletter é 100% dedicada aos livros de receita. Lançamentos, críticas, questões sobre o mercado editorial e entrevistas estão entre os conteúdos compartilhados.
@paula_forbes
Conhecida por criar a pipoca gourmet e transformá-la em produto desejado no Brasil, a publicitária agora tem olhos para os snacks 100% saudáveis da sua nova marca, a Flow
sobravam. Junto com a área de pesquisa e desenvolvimento, decidimos triturar esse alimento que não ‘estourou’ e transformar numa farinha”, conta. A tal farinha é o principal ingrediente de um biscoito de pipoca que não existia no mercado, supersaudável –sem glúten, sem lactose, rico em fibras. “Nos dias de hoje não dá para descartar comida e esse propósito guia a FabFoods.” Fato é que com a Flow um leque de possibilidades se abre, desde que se respeitem duas premissas: todos os produtos devem ter origem vegetal e ser funcionais. “A Pipó hoje representa prazer, indulgência, alegria. Sentia falta de também trabalhar com alimentos ultrassaudáveis e conscientes. A causa dos animais me tocou demais a partir de uma palestra da nutricionista Alessandra Luglio, que se tornou uma grande amiga e parceira e ajudou a desenvolver todo o novo conceito.” O nome Flow, que significa fluido, fluidez, fala também de um princípio da psicologia positiva que quer dizer “você em sua melhor versão, focado e em harmonia com seu ambiente”. Tudo a ver com a proposta da marca. “Trabalhamos com os superfoods , superalimentos naturalmente ricos e que entregam muitas propriedades.
driana Lotaif é o nome por trás da Pipó. Mas a primeira marca de pipoca gourmet do Brasil que começou com apenas dois sabores –lemon pepper e caramelo e flor de sal, em latas, diga-se de passagem, dignas de colecionador –, e hoje tem parcerias com Netflix e Nestlé, foi só a porta de entrada para a publicitária. “Meu lado empreendedor despertou quando eu trabalhava na Daslu e ajudei a criar a 284”, lembra ela, que antes disso tinha passado pela Dior. Isso foi há 11 anos. Hoje, aos 40, Adriana comanda a holding FabFoods, da qual a Pipó faz parte, ao lado da também publicitária Fabiana Sonder, a quem se juntou numa sociedade em 2019. Para se ter uma ideia, em 2020/21, a empresa cresceu 87%. Em 2022, 40%. Em tempos conturbados para a economia brasileira, a conquista é um feito e tanto. Não à toa, em dezembro de 2022 nasceu a Flow, segunda marca da holding , focada em produtos 100% naturais. “Sentimos a necessidade de desenvolver outros itens, além de trazer mais propósito para a FabFoods”, diz Adriana. O primeiro lançamento foi um snack pra lá de sustentável e exemplo de upcycling , já que é feito com a farinha do milho não estourado da Pipó. “A gente se incomodava com o descarte de milhos que Makers
Por Carla Julien Stagni Fotos Manu Oristanio
“Não dá para descartar comida e esse propósito guia a FabFoods”
Todos os produtos da Flow têm superfoods . Aliás, também ou usamos em pipocas, nas versões de spirulina, de cúrcuma com pimenta-do-reino e de cacau com chia”. Agora a Flow já soma cinco “famílias”. Entre elas, snacks de feijão moyachi, rico em proteína vegetal; de quinoa; de semente de abóbora e granolas. E o céu é o limite. “Posso lançar qualquer produto, desde que seja funcional e plant based . É você ter o que acredita, se alimentar daquilo que pensa. É um conceito holístico. Nosso tripé é saudabilidade, consciência e sustentabilidade”, diz a sócia, que guarda sempre uma novidade na manga. Além da farinha feita do milho não estourado, a marca criou uma pipoca com farinha de casca de uva. Descartado na produção do vinho, o insumo é rico em resveratrol. Outro exemplo é a aquafava, usada para fazer homus, que vem do grão-de-bico e que ia para descarte. “É uma água que dá liga na nossa granola e é rica em proteína vegetal. Procuramos aproveitar tudo para ter o menor desperdício dentro da cadeia produtiva.” E continua: “A Flow é feita de rituais. Viver em flow Você vai acordar, tomar aquele shot , seu chazinho, fazer meditação, beber muita água… E, então, partir para o seu dia. É uma filosofia de vida.”
Para este ano, o grande movimento da FabFoods será a mudança da fábrica para um espaço maior que, consequentemente, permitirá um crescimento da capacidade produtiva. Sobre a sua caçula Flow, Adriana admite: “Queremos ir com calma e reforçar o poder da marca antes de dar os próximos passos”.
15 perguntas para as dermatologistas mais quentes da Pauliceia. Em muitas vezes elas concordam e em outras não. Descubra o que pensam as doutoras Calu Franco e Maria Fernanda Tembra quando o assunto “tá na cara” (e também no cabelo, nas unhas e no corpo todo!)
Formada na Faculdade de Medicina Santo Amaro, em São Paulo, e pós-graduada pelo Fellowship Mount Sinai Hospital, em Nova York. Membro da SBD e também idealizadora do Congresso Skindoctors – evento experiência constituído por dermatologistas que visa multiplicar conhecimentos.
R. Groenlândia, 390 - Jardim América São Paulo, SP @dracalufranco
Formada na Universidade Federal do Rio de Janeiro e especialista em dermatologia pela SBD e AMB. É também sócia efetiva da SBD e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica e membro do Grupo Brasileiro de Melanoma e da Academia Americana de Dermatologia.
R. Dr. Renato Paes de Barros, 750 - Itaim Bibi São Paulo, SP @mariafernandatembra
Carbono Donna
Só posso fazer UM procedimento. Qual?
DRA. CALU FRANCO
Fotona 5D ou Botox. Difícil escolher!
O Fotona é uma plataforma de laser que estimula o colágeno e a melhora da textura da pele, trata vasos, rosácea, cicatriz de acne, cicatriz pós-cirurgia e capilar. Foi um dos pioneiros também no tratamento genital!
DRA. MARIA FERNANDA TEMBRA
O melhor para você! Essa resposta é individual e intransferível. Fuja de estereótipos e padrões e busque, com um bom médico, a melhor orientação para você.
Carbono Donna
Verdade que quanto mais se faz Botox, menos dura?
CF
Algumas pessoas têm mais resistência à toxina e alguns produtos são baseados em proteína animal. Sendo assim, alguns pacientes podem desenvolver certa imunidade.
MFT
Existe um tempo de duração estimado, mas varia de paciente para paciente. O que faz durar menos são fatores individuais, como mímica facial, qualidade da pele e hábitos de vida.
Carbono Donna
Até hoje temos dúvidas. Para que servem Ulthera, Ultraformer e Radiesse?
CF
Ulthera e Ultraformer são dois aparelhos de ultrassom micro e macrofocado para estímulo de colágeno, podendo compactar gordura e estimular a estrutura muscular facial. O Radiesse é um regenerador/bioestimulador de colágeno, sendo um produto injetável que cria um processo inflamatório benigno e organizado e estimula o fibroblasto a produzir mais colágeno.
MFT
Ulthera e Ultraformer são marcas diferentes de
uma mesma tecnologia que é o ultrassom microfocado. Esse tratamento visa reposicionar a face por estímulo de colágeno da fáscia muscular. Radiesse é o nome comercial de uma substância chamada hidroxiapatita de cálcio, que age como um bioestimulador. Por meio de um processo de irritação local, estimula a produção de colágeno, melhorando a espessura da pele.
Carbono Donna
Filtro solar causou acne. Usar ou não usar?
CF
Sempre usar o filtro! Hoje existem diversas ótimas opções no mercado - inclusive para pele oleosa - e com a textura superleve.
MFT
Usar sempre! Mas adequar ao seu tipo de pele. Se deu acne é porque não está correto para a sua pele.
Carbono Donna
Boca. Fazer ou não fazer? Eis a questão.
CF
Uma vez que o/a paciente tem indicação, é preciso que o profissional opte por técnica, produto, quantidade e local de aplicação corretos. A boa escolha do profissional é sempre primordial! Finalizo com uma observação: podemos até fazer técnica de aplicação com hidratação apenas!
MFT
Depende de uma boa indicação e da visão estética de cada um. Mas não deixe de fazer por medo, pois garanto que, hoje em dia, podemos fazer com resultados supernaturais e delicados. O importante é estar feliz com a sua aparência.
Carbono Donna
Sardas... sim ou não?
CF
Eu sou a dermatologista que adora sardas, porém temos que deixar claro que não é para quem quer, é para quem pode! As sardas reais são características de um tipo de pele. E esse
“ Evite carboidratos e açúcares, pois eles levam ao envelhecimento precoce de todas as células! ”
Dra. Calu Franco
fototipo tem que abusar do protetor, senão elas viram manchas. Aí perde todo o charme.
MFT
Geralmente elas estão presentes em peles mais claras, e desde a juventude. São charmosas, na minha opinião. Já as manchas aparecem com o tempo e geralmente estão associadas à exposição solar ao longo da vida. Elas podem conferir aspecto envelhecido à pele e podem ser tratadas.
Carbono Donna
Melhor investir na pele ou no cabelo?
CF
Impossível falar de maneira genérica! Melhor investir onde é a queixa real.
MFT
Em ambos. Usar os cabelos lindos como moldura para uma pele bem tratada é o ideal!
Carbono Donna
Cabelo longo com ponta dupla ou estilo Joãozinho saudável?
CF
Eu prefiro o cabelo saudável, acho mais elegante. O cabelo longo pode ser muito bonito, mas o ideal é ter cortes regulares e programa de tratamento da haste para mantê-lo com saúde
MFT
Mantenha-o saudável e liberte-se para usar da maneira que quiser!
Carbono Donna
Lavar o cabelo todo dia o deixa oleoso?
CF
Essa teoria de rebote da oleosidade não é comum. Pelo contrário. O cabelo oleoso deve ser higienizado diariamente. Com o couro cabeludo limpo evita-se dermatite ou fungo. Uma dica: aplicar condicionador no fio antes do shampoo! Assim protegemos a haste da lavagem diária.
MFT
Não. Mas cabelos oleosos geralmente precisam ser lavados com mais frequência. Cabelos secos podem espaçar mais. Para a pele vale a mesma regra. Pele oleosa lavar mais frequentemente. Oleosa, duas vezes ao dia, no mínimo; seca, às vezes não precisa nem do sabonete.
Carbono Donna
Limpeza de pele de quanto em quanto tempo?
CF
Pacientes com pele muito oleosa podem fazer mensalmente. Deixo o alerta de escolher um profissional cuidadoso para não marcar a pele.
MFT
Depende do tipo de pele e da rotina de cada um. Peles oleosas e que usam muitos cosméticos geralmente precisam de uma frequência mensal. Para outras peles sugiro semestralmente.
Carbono Donna
Homem vai em dermato?
CF
Sim, cada vez mais! A procura por autocuidado e saúde para um envelhecimento saudável é muito importante e os homens têm cada vez mais buscado os tratamentos. Uma queixa muito comum é a perda de contorno facial na região maxilar.
MFT
Cada dia mais, para fins estéticos. Estamos vivendo mais tempo e queremos viver melhor e em paz com o espelho, independentemente do sexo. Além disso, vale lembrar que tratamos também outras dermatoses. Diagnosticamos e tratamos queda de cabelos, doenças da pele e do couro cabeludo, mapeamos pintas para prevenção de câncer de pele, além de tratarmos tumores e cistos.
Carbono Donna
Bronzeamento artificial. Pode?
CF
Câmara de bronzeamento jamais! Eu costumo chamar de câmara de envelhecimento. Já o jet bronze não tem complicação e ainda ajuda o paciente a não ficar na ansiedade do sol.
MFT
Cama de bronzear, para fins estéticos, nunca! Já o bronzeamento a jato, que usa uma substância bronzeadora para pigmentar a pele, pode, sem problemas.
Carbono Donna
Chocolate causa o surgimento de espinha?
CF
Sabemos que o pico glicêmico é inflamatório para o organismo. Ou seja, o chocolate com açúcar pode sim agravar o quadro.
MFT
Depende de quem está comendo. Há pessoas que têm inflamação com mais facilidade ao ingerir lactose, gorduras e frituras. E isso se reflete, sim, na pele. O diagnóstico é observacional. Por isso é importante ficar de olho no que comemos para ver se correlaciona com alguma piora na pele.
Carbono Donna
Celulite é o maior dos males estéticos? Ou deixa estar?
“ Ame-se acima de tudo e faça o melhor por você e para você. Dito isso, use filtro solar diariamente!”Dra. Maria Fernanda Tembra
CF
É uma queixa desafiadora dependendo do grau clínico da paciente, pois esse quadro costuma englobar flacidez, gordura, retenção hídrica e inflamação local. Para quadros leves, aparelhos como Vela Shape ajudam muito, com excelente resposta.
MFT
Ninguém ama, né? Mas é uma realidade feminina da qual nunca iremos nos livrar por completo. Mas devemos objetivar o melhor que podemos ser, amenizando de várias maneiras!
Carbono Donna
Uma dica fundamental e um mito:
CF
Evite carboidratos e açúcares, pois levam ao envelhecimento precoce de todas as células!
Mito: “o colágeno via oral estimula quase igual aos tratamentos com tecnologias locais.”
MFT
Ame-se acima de tudo e faça o melhor por você e para você. Dito isso, use filtro solar diariamente!
Mito: “tratamentos estéticos deixam as pessoas modificadas ou artificiais.” O tratamento estético está aqui para lhe ajudar a bem envelhecer e podem, sim, ser delicado, conferindo beleza e naturalidade!
Com um olhar apurado para o design e a história de cada peça, uma turma de mulheres antenadas tem sacudido o mundo da decoração com seus antiquários virtuais
Por Luisa Alcantara e SilvaAté pouco tempo, comprar peças de segunda mão não era muito bem visto pelas brasileiras. As feirinhas de antiguidades que sempre existiram serviam mais como um passeio por bairros fora do eixo do que para adquirir algo. Mas o jogo virou. Ainda bem. O “velho” do passado agora é chique, já que o mindset atual se preocupa com a sustentabilidade e com um resgate histórico. Assim, abre-se cada vez mais espaço para os antiquários virtuais. “Não temos um planeta B e repensar nosso comportamento de consumo pode ser um alívio sobre o impacto que nossa existência causa no meio ambiente”, diz Camilla Wolter, sócia da Casa Era, loja on-line de peças usadas para casa, concebida em 2020. Assim como a Casa Era, há outros “antiquários de Instagram” criados por mulheres que sabem garimpar como ninguém. Reunimos aqui os imperdíveis!
Camilla Wolter e Júlia Chindler têm uma única grande regra ao compor sua curadoria. “A gente se pergunta: teríamos essa peça em nossas casas? Se a resposta for sim, levamos”, diz Julia. Os achados são divulgados às segundas-feiras, às 19 horas, na página do Instagram. Há porta-guardanapo de patinho, travessas de porcelana e toalhas de renda. O sucesso da loja é tanto que, em 2022, fizeram um evento presencial na casa em que fica o acervo, no Rio de Janeiro.
Da facilidade de Scarlett Dantas para garimpar peças vintage – algo que ela faz desde os 14 anos – nasceu a Brocanteria. O nome vem do verbo francês brocanter, que em português significa vender ou trocar objetos antigos. Quadros, copos e caixinhas fazem sucesso em sua loja. “No geral, tento priorizar peças verdadeiramente antigas e artesanais ou aquelas que, embora industrializadas, já não são mais fabricadas”, diz ela.
Cachepots, bules e castiçais estão sempre no radar de Amanda Cunha, criadora da Celeste, que se autodenomina uma curadora de objetos com história. “Vou atrás de peças com selos, assinaturas e até marcas do tempo que só contribuem para a estética do vintage”, diz. Quem busca a Celeste encontra peças únicas, numeradas e assinadas, que já não são mais produzidas, além de itens desconhecidos, com os quais se conectam, seja pelo design, seja pela história.
Ao procurar tapetes para ela mesma, Mariana Wakim se apaixonou pelas histórias que eles contam por meio de suas cores, texturas e padronagens e pelos povos que os confeccionam. Assim, criou a Tapilogie, que vende cerca de 40 peças por mês. Os tapetes Kilim são os queridinhos, mas os clientes gostam também dos que ela chama de perfeitamente desgastados. “São aqueles com visual bem vintage, cores amadurecidas, cheios de história. E acabam sendo as minhas escolhas favoritas também.”
“Quando eu buscava na internet mobiliário e peças de decoração, nunca os achava em marcas de produção em série, só ao garimpar em antiquários e brechós”, conta Geovana Cavendish, criadora da loja Pecúlia. Como um negócio de uma pessoa só, o ritmo dos anúncios depende do tempo que ela tem para procurar quadros florais, esculturas, faqueiros e tantas outras peças. “Gosto de coisas que dão vontade de ver mais de perto, sabe?”
Foto cortesia da artista e Fortes D’Aloia & Gabriel, São Paulo/Rio de Janeiro
Infinitos nós de nós de nós dois amarrados em nós cegos.
Nossas pernas e nossos braços embolados, e nós, cegos. Quanto mais embrenhados, menos provável o desatar. E assim seremos nós e todos os nós que nos amarram.
Poesia de DEBORAH KLABIN , do livro Palavras de Água & Sal @deborahklabin
Obra de YULI YAMAGATA
Eva, 2021 | Elastano, tecido Oxford, veludo, fibra siliconada e linha de costura 250 x 180 x 30 cm
A produção de Yuli Yamagata manipula materiais têxteis, resinas e objetos cotidianos prontamente reconhecíveis. O papel central ocupado pela costura na sua prática atesta seu procedimento de justaposição e aglutinação de elementos heterogêneos, dando forma a figuras situadas entre o orgânico e o artificial. Os volumes estofados e pelúcias da artista, assim como as cores sintéticas e intensas que ela emprega, fazem as suas imagens corpóreas e membros postiços projetarem-se além do quadro ou da moldura, ocupando o espaço circundante com a configuração plástica hiperbólica e fragmentada dos quadrinhos e mangás. Esses aspectos, aliados à frequente aparição de seres insólitos, os títulos sugestivos e a feição costurada de seus trabalhos levaram alguns comentadores de sua obra a aproximá-la do campo do grotesco, dos filmes de horror e da ficção científica. @yuli_yamagata
Galeria Fortes D'Aloia & Gabriel | @fortesdaloiagabriel #fortesdaloiagabriel
“Would you like an adventure now, or shall we have our tea frst?”
ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS
Mais de duas décadas depois do Renascimento Psicodélico –movimento que reativou as pesquisas medicinais voltadas a substâncias como a cetamina e o MDMA –, novos tratamentos psiquiátricos ganham força
Por Mario Mele Ilustração Angel Service (@angelservice.connection)“A viagem dela foi excelente”, vibra o anestesista Renato Lucas ao sair da sala onde acabara de realizar uma infusão de cetamina em uma mulher na casa dos 30 anos que tenta se curar da depressão. Estou em uma das unidades da Beneva, em São Paulo, a primeira rede nacional de clínicas especializadas na aplicação de terapias com psicodélicos, entre eles a cetamina.
A cetamina é utilizada como anestésico desde a década de 1960. Dias depois de visitar a Beneva, assisti a alguns vídeos de pacientes acordando de uma cirurgia sob seu efeito e eles parecem estar tão alegres quanto alguém de férias em um lugar paradisíaco. Contam sobre uma experiência prazerosa que nunca viveram antes, como um passeio de camelo no deserto, ou então têm uma lembrança boa.
Apesar de não ser um psicodélico clássico, a cetamina está entre os nomes que vieram à tona durante o Renascimento Psicodélico, uma onda de pesquisas iniciada no final do século passado e que segue mostrando cada vez mais a eficácia dessas substâncias como agentes terapêuticos.
Segundo o Dr. Igor Mariano de Melo, psiquiatra membro titular da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), ainda não se sabe ao certo se a experiência dissociativa que ocorre pela administração da cetamina é uma característica central de sua resposta antidepressiva ou simplesmente um efeito colateral. “O que observo é que os efeitos antidepressivo e antissuicida da cetamina são
reais. Não importa se a viagem foi boa ou não”, diz Dr. Igor, que trabalha com Psiquiatria Intervencionista e recentemente concluiu um curso de aperfeiçoamento profissional sobre Novas Técnicas Terapêuticas em Saúde Mental.
Nos últimos quatro anos, houve um aumento significativo do número de estudos relevantes voltados às terapias psicodélicas – além da cetamina, o MDMA (associado ao ecstasy), a psilocibina (o princípio ativo dos “cogumelos mágicos”) e a ibogaína (substância retirada da raiz de uma planta africana e que vem tendo bons resultados contra a dependência) estão no alvo de pesquisadores. O interesse crescente refletiu na expansão de clínicas especializadas que fazem alguns desses tratamentos por meio de uso compassivo – quando o medicamento ainda não possui registro, mas é promissor e por isso a Anvisa permite a importação. Se em 2019 existiam apenas 20 desses estabelecimentos espalhados nos Estados Unidos, hoje o país tem algo próximo a 500. O Brasil segue a mesma tendência, com um crescimento puxado principalmente pelas mulheres – entre os pacientes da Beneva, por exemplo, elas somam mais de 90%.
Segundo o IBGE, as mulheres vão ao médico mais do que os homens, e assim descobrem doenças com mais frequência – incluindo a depressão. Uma pesquisa feita pelo Ministério da Saúde mostrou ainda que a incidência desse
quadro, considerado “o mal do século”, é realmente maior entre elas: acomete 20% das mulheres, contra 12% dos homens.
Para Tarso Araujo, diretor de marketing da Beneva e um dos maiores pesquisadores do Brasil sobre o tema psicodélicos, esses números podem estar camuflando uma triste realidade: as mulheres estão mais sujeitas a situações traumáticas relacionadas a abusos na infância e na adolescência, o que favorece o desenvolvimento de quadros de depressão durante a vida adulta.
Cláudia*, 47, conviveu com a depressão por mais de três décadas. Independentemente do motivo – seu caso provavelmente é genético –, ela representa uma amostra real de estudos sobre os bons resultados dos tratamentos com cetamina: 75% para quadros crônicos de depressão. Depois de passar por situações que ela chama de “momentos depressivos”, Cláudia finalmente foi diagnosticada com depressão refratária (quando o paciente é resistente aos antidepressivos convencionais, mesmo após várias tentativas de acertos na medicação). “Em 2021, entreguei os pontos e comecei a abusar dos benzodiazepínicos”, diz ela, se referindo aos remédios com propriedades sedativas e ansiolíticas. “Eu só queria relaxar e dormir”, justifica. Sair de casa para trabalhar ou até mesmo cuidar dos filhos viraram sacrifícios. Até que chegou o momento em que o corpo simplesmente travou. “Não tinha mais forças nem para levantar da cama”, lembra. Percebendo o sofrimento, o irmão, que já tinha lido sobre o potencial dos tratamentos psicodélicos, trouxe a cetamina para a conversa – vale lembrar que a substância é contraindicada para mulheres com gravidez de risco e em fase de lactação, entre outras condições.
Ao todo, Claudia passou por 15 sessões. Para bloquear ruídos externos e ampliar os sentidos, o paciente é aconselhado a ouvir uma música relaxante no fone de ouvido. “Na terceira aplicação já comecei a me sentir muito melhor”, Claudia relembra. Ela não teve medo das “experiências psicodélicas” pois sabia que estava em um ambiente clínico, assistida por profissionais. “Eu chorava muito, mas não de tristeza; e não eram visões que eu tinha, mas sentimentos.” Hoje ela descreve seu processo de cura como o reencontro com uma parte individual que, por muito tempo, foi negligenciada: a espiritual. “Eu precisava ter ouvido antes, no Centro Espírita, na Igreja, no Terreiro, na Assembleia de Deus ou onde quer que fosse, que há algo maior cuidando de tudo. Em minha ‘viagem’ me
questionava: ‘será que Deus está me vendo?’. Pensava nas pessoas que passam fome, nas que têm doenças graves e traumas profundos e me achava egoísta. Depois do tratamento, passei a viver um dia de cada vez, voltei ao trabalho e agora estou no processo de diminuir o uso dos benzodiazepínicos.”
Uma das constatações da ciência é que a cetamina aumenta a neuroplasticidade por meio da neurogênese, que é a multiplicação dos neurônios e de suas conexões já existentes. É um efeito comum entre os psicodélicos, embora cada um aja de uma forma no organismo. Quando novas conexões cerebrais são criadas, elas se traduzem em novos comportamentos, novas aspirações e em novas maneiras de enxergar o mundo. Há pesquisas que sugerem ainda que o efeito antidepressivo da cetamina se dê pelo bloqueio do receptor glutamato (NMDA) no cérebro, já que seu excesso seria uma das razões para a tristeza profunda.
Em suas pesquisas, o psiquiatra Igor Mariano encontrou motivos para acreditar que o poder da cetamina vá ainda além. “A substância pode agir em outros sistemas de neurotransmissores, como a serotonina, a dopamina, a noradrenalina e o sistema opioide, que estão envolvidos na regulação do humor e da emoção”, explica. Depois de uma infusão de cetamina, é como se o cérebro virasse uma espécie de terra recém-fertilizada, e, portanto, é preciso saber o que iremos plantar. Daí a importância da psicoterapia durante qualquer tratamento com psicodélicos.
Recentemente, as expectativas deste universo se voltaram também ao MDMA e à psilocibina. Mas não só porque eles caíram no gosto recreativo e viraram, em muitos lugares, o lança-perfume da nova geração – basta uma passada em algumas festas para ver o tal cogumelo mágico sendo distribuído em saquinhos embalados a vácuo. E sim porque a Therapeutic Goods Administration (TGA), uma agência governamental australiana que define produtos para usos medicinais, permitiu que psiquiatras de seu país receitem ambas as substâncias para seus pacientes. Será mais um capítulo do Renascimento Psicodélico.
Especialistas acreditam que os psicodélicos estejam hoje no mesmo patamar que a cannabis medicinal se encontrava há uma década, quando o CBD começou a ficar famoso. Com a vantagem, no entanto, de terem menor resistência social – a maioria das pessoas talvez nunca tenha ouvido falar em nomes como cetamina e MDMA. Pelo lado da ciência, a intenção continua a mesma: curar doenças e salvar vidas humanas.
*O nome da paciente foi trocado para preservar sua identidade.
Relembre os principais acontecimentos no mundo dos psicodélicos
1947
Os laboratórios Sandoz lançam o Delysid, o LSD em forma de cápsulas de gelatina roxa (veio daí a inspiração para a música Purple Haze, de Jimi Hendrix). Até 1966 o Sandoz ofereceu gratuitamente o medicamento – usado no combate ao alcoolismo e à depressão – para pesquisadores.
1967
O LSD passa a ser proibido nos Estados Unidos sob a alegação de que o uso desenfreado da substância poderia causar danos à psique humana.
1980s
Os bons resultados dos primeiros estudos com ibogaína fomentam uma linha de pesquisas sérias sobre o psicodélico.
1991
Início do Projeto Hoasca, de Dennis McKenna e Charles Grob, que resultou nos primeiros estudos sobre os efeitos da ayahuasca em humanos.
2005
Um estudo conduzido pelo psiquiatra brasileiro Dartiu Xavier da Silveira e pelo pesquisador norte-americano Charles Grob constata: a ayahuasca diminui os níveis de ansiedade e do déficit de atenção.
2022
Uma pesquisa comparativa entre o célebre antidepressivo escitalopram e a psilocibina revela que os resultados são equivalentes, com a diferença de que o escitalopram precisou ser ministrado diariamente, enquanto a psilocibina foi fornecida apenas duas vezes, com espaço de três semanas entre as sessões.
1962
Aos 19 anos, o norte-americano Howard Lotsof relata ter perdido a vontade de usar heroína depois de conhecer a ibogaína, substância derivada de uma planta africana que é utilizada em rituais de iniciação da vida adulta, no Gabão.
196 0s . 70s
Apesar da proibição, os hippies continuam promovendo o uso regular do LSD como droga recreativa.
1987 A ayahuasca é reconhecida para uso religioso.
20 00s
A Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (MAPS) começa a liderar a pesquisa clínica mundial de terapia assistida por MDMA
2 006
Roland Griffiths é peça-chave no Renascimento Psicodélico, ministrando a psilocibina (a substância psicoativa dos cogumelos) em voluntários e relacionando a intensidade mística com as mudanças positivas de comportamento.
202 3
Um estudo feito pela Revista Brasileira de Psiquiatria sobre tratamento de microdose de ibogaína para depressão mostra remissão considerável da doença. E, na Austrália, psiquiatras passam a poder receitar MDMA e psilocibina para pacientes com transtornos psiquiátricos.
Uma jornada to be continued...
A cultura botânica, que ganhou espaço na pandemia, segue em alta e só faz crescer. A seguir, revelamos os bastidores da tendência, ideias para entrar na onda – em casa ou fora dela –e personagens que têm feito a diferença no mundo colorido, vivo e perfumado das plantas e flores
Por Natália AlbertoniÉ provável que você tenha notado. Nos últimos quatro anos, o movimento da arte foral tem ganhado cada vez mais força por aqui. Em torno dele, um leque de possibilidades: workshops para fazer arranjos, aulas personalizadas, visitas a produtores, rodas de conversa com artistas, e por aí vai. A profssionalização desse mercado é um fenômeno relativamente recente e, sim, assim como outras tendências, tem a ver com o desejo trazido pela pandemia de estar mais em casa e se conectar com a natureza. “Houve um grande aumento do consumo e da oferta de plantas, o que promoveu a criação de um hábito. Hoje é evidente que existe uma nova cultura do botânico”, afrma Raquel Franzini, da Conexão Floristas, que une consumidores, foristas e produtores do País todo.
Novo contexto, novas respostas. As fores desidratadas, por exemplo, conquistam mais espaço e a tendência é visível – das vitrines de lojas aos cursos que ensinam leigos a desidratar plantas em casa. Arranjos mais orgânicos, a paleta terracota, o mix de texturas com frescos e secos e a valorização das fores tropicais também estão entre os caminhos atuais, mas, no momento, o que mais vale é estar atualizado quanto às responsabilidades de cada um no futuro do planeta.
Embora seja complexo falar em sustentabilidade em um setor que gera bastante plástico, há um novo olhar que incentiva o reaproveitamento de materiais e o respeito ao ciclo de cada estação. Mas desafos não faltam. “Pensar estruturas de instalações com água e sem espuma foral [que pode conter materiais tóxicos] tem um custo muito alto – de material e de equipe. O orçamento dos projetos é limitado, as fores são caras e há muita oscilação de preço. Somar um valor extra para ter menos descarte não é fácil”, conta
AS ESPÉCIES MAIS VENDIDAS NO BRASIL
ROSAS • ASTROMÉLIAS
LÍRIOS BOCA-DE-LEÃO • CRAVOS-SPRAY CRISÂNTEMOS
Bárbara Chiré, uma das fundadoras da Flores Bárbaras, foricultura e estúdio de design foral. Ainda assim, é um caminho sem volta. No mundo todo, o design foral e a botânica já são usados, inclusive, como ferramentas artísticas. Prova disso é a Design Weekend 2023, que contou com representantes do setor, comprovando a relevância da arte foral dentro de um contexto de arquitetura, design e urbanismo. A seguir, selecionamos iniciativas, personagens, curiosidades e dicas para você forir seus dias.
Para se deixar hipnotizar ainda mais pelo mundo botânico, assista a Flower Punk. O documentário mostra o que está por trás do processo criativo do japonês Azuma Makoto, famoso por elaborar esculturas florais que são verdadeiras obras de arte.
Bárbara Chiré, criadora do estúdio de design floral Flores Bárbaras, compartilha tendências desse universo
Os secos e desidratados ou as flores permanentes importadas estão em alta por terem maior durabilidade. Também possibilitam diversos desdobramentos, como cúpulas, quadros e até acessórios de cabelo.
AS FLORES DE PLÁSTICO NÃO MORREM HOJE CHAMADAS DE FLORES PERMANENTES, AS FLORES ARTIFICIAIS ATINGIRAM UM NOVO PATAMAR. MUITAS DELAS SÃO PERFEITAS, PRODUZIDAS COM TECIDOS NOBRES – TANTO É QUE GANHARAM ESPAÇO CATIVO EM CONCEITUADAS INSTALAÇÕES.
A espuma floral solta microplásticos que não são filtrados no tratamento de água e acabam nos oceanos. É possível substituí-la pela nova fórmula vendida como bio, mas, ainda assim, gera impactos e não é aceita pelos floristas do movimento foam free (livre de espuma).
ADORADO PELOS FOAM FREE , O KENZAN É UMA BASE FIXADORA USADA NA TÉCNICA JAPONESA DE IKEBANA (ARTE DE ARRANJOS FLORAIS).
FLORES BÁRBARAS
R. Bernardo da Veiga, 33 Perdizes - São Paulo @flores.barbaras
A “floresta” colorida que se estende na Galeria Botânica não nos deixa mentir: trata-se de um universo paralelo na pauliceia cinzenta. Um dos responsáveis por elevar o mercado floral à categoria de arte, o espaço promove workshops que reúnem desde advogados de olho em uma nova carreira até arquitetos atrás de expertise. Ali, as aulas de Gabriela Nora, diretora de arte e ex-bailarina, parecem movimentos de um balé que envolve lírios, rosas e muito mais. “Os cursos ajudam a criar uma relação de afeto com o que estamos construindo com as plantas”, conta. @_galeriabotanica
Confira os vídeos em slow motion do florescer de diferentes espécies. A página @thegardenofbob relembra a beleza e a importância de cultivar um jardim, além de mostrar curiosidades e mitos em torno do tema.
Brasileiro baseado em Londres, Wagner Kreusch é fundador da London Flower School e conhecido por incentivar o uso da floricultura como arte e ferramenta de autoexpressão. Entre suas criações, instalações multissensoriais e esculturas inspiradas no Ikebana contemporâneo. @wagnerjk
CULTIVATED – THE ELEMENTS OF FLORAL STYLE
Christin Geall (Princeton Architectural Press) Design floral nada óbvio pelas mãos dessa fotógrafa, pintora e antropóloga focada em estudos do meio ambiente.
PRINCIPLES OF FLORAL DESIGN Gregor lersch (Donau Verlag)
O livro do mais famoso do professor da arte floral é uma boa dica para iniciantes.
THE ARTISTRY OF FLOWERS: FLORAL DESIGN
Gabriela Salazar (Rizzoli)
O colorido universo da florista mexicana à frente do estúdio La Musa de Las Flores.
THE FLOWER HUNTER
Lucy Hunter (Ryland Peters & Small) Arranjos sensíveis, feitos com flores colhidas no jardim da autora inglesa.
FRESH FROM THE FIELD WEDDING FLOWERS
Erin Benzakein (Fairplain Publications) Um guia para usar flores locais e criar eventos mais sustentáveis. Vale procurar em sebos.
“A natureza é um dos únicos espaços da arte em que os erros são permitidos. Quanto mais erro, mais natural e parecido com a vida”, diz o pintor Yuri Leal, que tem levado o universo botânico para as paredes. Começou com murais no Instituto Tomie Ohtake e na floricultura e livraria Macondo Flores e Afins e já conquistou projetos em parceria com arquitetos. “Eu me sinto um grande pincel quando estou trabalhando. Tem história, gesto, força”, conclui ele, que também é tatuador. @oyurileal
De Los Angeles, a artista Emma Bradford cria obras que confortam a alma: flores gigantes confeccionadas à mão com tecidos reciclados, veludos e plumas. Puro allure.
@dreamgiggles
Conheça Vasoh Vasorum, de Bangkok. Sob encomenda, o artista cria buquês feitos de flores de balão.
@vasohvasorum
Workshops e escolas para quem deseja entrar no mundo do design floral
Masterclass: Design Stunning Floral Arrangements
Aulas com Maurice Harris em Los Angeles. @bloomandplume
Arranjo Tropical Workshops, cursos intensivos e personalizados. @arranjotropical
Escola Brasileira de Arte Floral
Paulo Perissoto e Tanus Saab foram alunos de Alfredo Tili, precursor desse universo, e comandam essa escola em Holambra. @escolabrasileiradeartefloral
Escola de Botânica
O biólogo Anderson Santos oferece cursos que vão das práticas de manejo ecológico à aquarela botânica.
@escoladebotanica
“When you have only two pennies left in the world, buy a loaf of bread with one, and a lily with the other.”
Para algumas pessoas, viajar vai muito além de embarcar em um avião, hospedar-se em um hotel e curtir atrações que estão em todos os guias. A seguir, contamos as histórias de famílias que fogem do tradicional na hora de explorar o mundo
Por Luisa Alcantara e Silva
Fotos Mayra Abbondanza e Ernesto Abud
Apaixonada por viagens desde sempre, a ghostwriter Mayra Abbondanza tem como norte um estilo de vida livre, sem amarras preestabelecidas e isso é regra básica nas diversas andanças nada óbvias que faz mundo afora. O desejo ganhou mais força ao conhecer o museólogo mexicano Ernesto, que trabalhava viajando pela América Latina. Há cinco anos, por exemplo, quando o filho deles, León, tinha apenas seis meses, passaram 19 dias no Marrocos, com direito a pernoite no Deserto do Saara. “A gente simplesmente foi. E deu tudo certo”, conta.
Mas algumas viagens exigem uma logística um pouco mais complicada, já que Mayra tem quatro filhos do casamento anterior, com idades
entre 10 e 18 anos. Com o tempo, a família acabou percebendo que nem sempre o melhor é estarem todos juntos. “A gente soltou aquela imagem do porta-retrato, com os sete reunidos o tempo todo”, diz ela.
No ano passado, eles embarcaram em uma aventura na Ásia que passou por diferentes configurações e locais. Ernesto chegou antes e foi para Vietnã e Camboja. Mayra e León, o caçula da trupe, desembarcaram depois e, em seis semanas, o trio percorreu Tailândia e Laos. E, por 15 dias, tiveram a companhia de Julia e Felipe. “Sou adepta do slow travel, nada de ficar pingando em vários destinos só para conhecer as atrações que todo mundo vai. Gosto de explorar a
“Gosto de explorar a autenticidade de cada lugar e mostrar isso aos meus filhos”
autenticidade de cada lugar e mostrar isso aos meus filhos”, ela afirma. Por conta disso, ficaram uma semana em Chiang Mai, destino tailândes que os guias recomendam três dias de estada. Chiang Rai, que muitos turistas conhecem em um rápido bate e volta, foi a parada deles por quatro noites. Com esse tempo, puderam presenciar programas como uma exposição noturna no Jardim Botânico da cidade, que poucos conhecem. Em Bangcoc, hospedaram-se em um bairro mais afastado do centro e, nas refeições, dispensavam qualquer frescura. “Eu olhava para o León e dizia: ‘É o que tem’. Muitas vezes ele comia e, se não quisesse, depois eu dava uma banana.” No fim da jornada, a recompensa: um dos filhos de Mayra falou que a viagem realmente tinha conseguido expandir seu conceito do que é diferente. Missão cumprida.
O que importa é o caminho
O administrador e empresário José Sadek, 45 anos, e a estilista Graciana Arnus Koelle mal sabiam, mas foi a necessidade de comprar um carro que os levou a fazer viagens mais malucas, como ele diz. Pais de três meninas, de 8, 11 e 14 anos, eles estavam em busca de um veículo novo, com mais do que cinco lugares – para os cachorros e as amigas das filhas –, mas não queriam gastar muito. Ao pesquisar na internet, Graça veio com a ideia de uma Kombi e José, que adora motores potentes, enxergou a possibilidade como uma aventura.
Em agosto do ano passado, compraram uma Kombi de uma paróquia e selaram um combinado: ele reformaria a parte mecânica e, ela, fã de decoração, ficaria responsável pelo visual interno. Se não desse certo – o que ele tinha certeza –, venderiam o veículo reformado. Foram seis meses de restauro até que, no início de dezembro, o carro finalmente ficou pronto –e foi apelidado de Clotilda.
As primeiras viagens foram para locais próximos de São Paulo, onde vivem, para testar a novidade. Aí, em janeiro deste ano, partiram para a primeira grande aventura da família:
seguir com a Clotilda até Caraíva, no Sul da Bahia. ”Queríamos mostrar para as meninas que existe um mundo além da bolha em que elas vivem”, conta José. “A gente mora em São Paulo e está sempre com as mesmas pessoas, normalmente muito parecidas conosco, mas essa não é a realidade.”
E, logo no primeiro dia do roteiro, algumas surpresas a caminho de Paraty, onde passariam a primeira noite: na descida da serra pela Rodovia Oswaldo Cruz, o freio acabou. Mas nada que tirasse o bom humor da trupe – as filhas, inclusive, se divertiram fazendo selfies até o socorro chegar. Para completar, perto da entrada da cidade, José caiu com a Kombi numa fossa, deixando-os atolados. “Aproveitamos aquele momento com leveza”, lembra ele.
A maneira descontraída de enxergar as dificuldades, José conta ter aprendido com um casal que conheceu durante o restauro da Kombi. “Eles nos disseram que, em viagens longas, o mais legal são as experiências, os perrengues. E viajamos com isso na cabeça, o que foi muito legal porque as meninas também entraram nessa.”
“Em viagens longas, o mais legal são as experiências, os perrengues”
Foram nove dias até Caraíva, com direito a pernoites em campings, novas amizades e muitos momentos especiais em família. “Como diz o ditado, não importa o ponto de chegada, mas o caminho até ele”, acredita José. O próximo caminho os levará até o Chile. A família planeja um roteiro para o fim do ano, que passará por Uruguai, Argentina, Chile e Paraguai. “Já estamos curtindo a viagem desde agora, na fase do planejamento. Imagine quando começar?”
“Esses momentos criam vínculos muito importantes, principalmente nesta época, em que as famílias estão desconectadas, olhando o celular”
Os filhos de Alex Vicintin, Lara, 11, e Francisco, 9, são loucos para conhecer a Disney, mas já sabem que vão ter que esperar. Para o pai, a verdadeira Disney é o Brasil e, junto com a mulher, Julieta, o empresário gosta de levar as crianças para destinos mais rústicos e repletos de natureza. “Eles podem pagar a viagem para Orlando quando começarem a trabalhar”, brinca Alex.
Por enquanto, percorrem locais como o Parque Nacional do Itatiaia, no Rio de Janeiro, e Abrolhos, na Bahia. “Procuramos destinos com natureza, onde dê para remar, subir montanha, mergulhar…”, diz Alex.
Em 2020, por exemplo, depois de alguns meses trancados em casa por conta da pandemia, ele foi com os filhos para Itatiaia e, na sequência, passaram cinco dias na Serra da Canastra, em Minas Gerais – Julieta, que não é muito fã de camping, preferiu ficar em casa dessa vez. Lá, o trio percorreu cerca de 30 quilômetros, tomou banho de poça d’água e voltou cheio de carrapatos. “Esses momentos criam vínculos muito importantes, principalmente nesta época, em que as famílias estão desconectadas, olhando para o celular”, afirma o empresário.
Alex, que trabalha com projetos ligados ao meio ambiente, aproveita as jornadas com trilhas
para ensinar aos filhos sobre as plantas e, no fim, lidera uma “chamada oral”. Uma brincadeira que, no futuro, ele acredita fazer diferença. “Toda essa experiência trará um repertório distinto. Não é melhor ou pior do que outros, mas é diferente.”
Um refúgio imerso na Mata Atlântica pode ser um bom lugar para ensaiar alguns dias em família fora do lugar comum
Para quem gosta de aventura, mas não dispensa uma cama confortável, uma boa opção para embarcar em uma viagem menos óbvia é reservar alguns dias na Aldeia Rizoma, um refúgio que promete uma experiência imersiva em meio à Mata Atlântica, a 10 km de Paraty. O local, fundado por Thereza e Marko Brajovic, oferece oito casas abertas para a floresta e momentos de desconexão. Os viajantes podem mergulhar em rios e cachoeiras de águas cristalinas, caminhar em trilhas na mata ou relaxar na sauna, nas terapias corporais e na meditação.
Thereza e Marko Brajovic, que hoje moram no local com os filhos Zoe e Zion, são a prova de que essas experiências longe das cidades fazem bem para toda a família. “Somos muito ligados à natureza e decidimos vir morar aqui porque deixamos de nos identificar com a vida em São Paulo”, diz Teka. No lugar da vontade de ir ao shopping, entra o desejo de fincar os pés na areia ou tomar banho de cachoeira.”Aqui não tem os inputs de consumo”, finaliza ela.
Saudades do Ninho (2022)
Acrílica sobre tela
154 x 184 cm
“Como artista, proponho um diálogo visual em que a percepção da obra esteja no olhar de quem a vê. A escolha pela pintura abstrata foi desde sempre a forma mais acolhedora que encontrei para dar vazão às minhas emoções. Aprecio as belezas imperfeitas do cotidiano e assim conduzo um caminho sobre as minhas preferências. Seria impossível me expressar com afinidade, como faço quando aceito os movimentos espontâneos e respondo a eles conforme a pintura evolui. Deixo de lado a razão para imprimir no meu trabalho a minha felicidade, na esperança da obra tomar espaço na vida de alguém que aceite receber parte de mim.”
VIVIANA XIMENES , paulistana, formada em Jornalismo e Artes Cênicas, busca na pintura sentimentos que vão além da sua jornada acadêmica. Seu trabalho é experimental e livre, e, por meio da monotipia, com o uso de recortes de papel, tinta acrílica, giz de cera, giz a óleo e carvão, percorre e descobre novos caminhos. @viviximenes
A designer têxtil Ýr Jóhannsdóttir, conhecida no mundo artístico como Ý RÚRARÍ , apresenta um trabalho tricotado em que fragmentos de humor, movimentos corporais e momentos do cotidiano se encontram em impressionantes objetos feitos de lã – pasmem, usáveis! Nascida em Reykjavík, na Islândia, atualmente baseada em Berlim, Ýrúrarí imprime em suas obras um manifesto pela sustentabilidade, elevando modelos de vestuário a itens de museu. “Em meus mais recentes projetos, levanto questões sobre nossos hábitos absurdos de consumo de tecidos e experimento novas maneiras de fazer roupas durarem mais, como uma arte única, uma verdadeira peça de design”, conta. Com exposições mundo afora – Escócia, Holanda, EUA, México, e por aí vai –, Ýr está atualmente com uma mostra solo no Museum of Design and Applied Art, em Garðabær, na Islândia. @yrurari • Exposição Nærvera/Presence, em Garðabær, até 27 de agosto. Retrato Studio Fræ