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ECONOMIA CRIATIVA

Invente, tente, entre na boa onda da economia criativa

A matéria-prima são as boas ideias. E desde que o setor surgiu como conceito, em território australiano, não deixou mais de crescer. No Brasil, a cadeia produtiva já movimenta R$ 667 bilhões por ano

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Daniela Nader

POR TATIANA NASCIMENTO, IALE ALVES e MARIANA MESQUITA

Amoda já existia. O design também. Assim como o artesanato, o desenvolvi mento de softwares e jogos, a música, o cinema, a dança e mais um monte de outros setores que têm como base a criatividade. Na década de 1990, os australia nos resolveram juntar tudo em um conceito. E voilá: surgiu a Economia Criativa. Os britânicos encaparam a ideia e a desenvolveram. Hoje, o se tor que tem nas boas ideias a principal matéria-prima é um dos que mais crescem no mundo. E no Bra sil também. Um estudo da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) mostra que toda a cadeia da indústria criativa no país (toda mesmo, incluindo até o vendedor de cachorro quente da porta do teatro) movimenta R$ 667 bilhões por ano.

“A gente conhece bem a indús tria tradicional, conhece o varejo. Hoje podemos agrupar as outras frentes de trabalho que mexem com criatividade. As empresas existiam, mas não eram agrupadas. Não eram fortalecidas porque não eram percebidas como um setor. Isso mu dou sob a classificação de economia criativa. A Inglaterra hoje tem um ministério da economia criativa”, destaca Guilherme Velho, gerente da Rio Criativo. A incubadora de em preendimentos de economia criativa do estado do Rio de Janeiro con ta hoje com 19 empresas sob suas asas, escolhidas entre mais de três mil propostas. Mas que também oferece um trabalho de orientação de negócios para qualquer interes sado, através de workshops e consultorias.

Guilherme Velho lembra que, no país, o setor começou a ganhar atenção em 2005, durante a gestão de Gilberto Gil no Ministério da Cul tura. Naquele ano, o então ministro organizou em Salvador o 1º Fórum Internacional de Economia Criati va. O objetivo era criar uma iniciativa governamental, como já existia na Inglaterra. Mas a ideia demorou a pegar no tranco. Somente em 2011, o Governo Federal anunciou a criação da Secretaria da Economia Criativa dentro do Ministério da Cul tura (MinC). Agora, é correr atrás do tempo perdido e pisar no acele

rador. Um dos projetos em curso é Criativa Birô, espécie de escritório que oferece um suporte multidisci plinar ao micro e pequeno empreendedor criativo.

Nesses escritórios, os empre endedores vão encontrar informações sobre como elaborar modelos de negócios, planos de comunicação e distribuição. Também vão receber consultorias jurídicas, linhas de cré dito e formações específicas. E cada Criativa Birô vai contar com uma equipe de articuladores para fazer a interlocução com os municípios. Os primeiros convênios começaram a ser assinados ainda em 2011. Os primeiros estados a receber o proje to foram Rio de Janeiro, Goiás, Acre,

O Governo Federal criou há dois anos a Secretaria da Economia Criativa no Ministério da Cultura. Estrutura prevê suporte multidisciplinar ao micro e pequeno empreendedor

mobCONTENT equipe grava piloto do seu novo projeto Babel Hostel

Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Pernambuco. O Ministério da Cul tura entra inicialmente com R$ 1,2 milhão. O estado dá uma contrapar tida de R$ 300 mil, além de ceder o espaço físico para o escritório. O de Pernambuco vai funcionar na Casa da Cultura.

A previsão do MinC é a de que todos estejam funcionando ainda no primeiro semestre de 2013. A meta do ministério é ter um total de 11 Criativas Birôs até o fim do ano. “A ideia é que, nos próximos anos, os recursos necessários ao pleno funcionamento do Criativa Birô se jam compartilhados com diversos parceiros públicos e privados. Fará parte do processo de estruturação o desenvolvimento de um plano de sustentabilidade”, explica a secre tária de economia criativa, Cláudia Leitão. Ela também reforça que o grande negócio da economia cria tiva é transformar a criatividade em inovação. E pegar esta inovação para transformá-la em riqueza.

Coisa que um certo Steve Jobs soube fazer como poucos com seus iPhones, iPods e iPads. Um exem plo: a Apple vende o iPhone 5 desbloqueado nos Estados Unidos por quase quatro vezes o preço de custo do produto (US$ 167,50). “Hoje, a sociedade está muito mais dispos ta a pagar pela criação, pela originalidade. A economia criativa entra aí: na capacidade de criar artefatos

que encantem as pessoas, aliando geração de valor e distribuição”, afirma Francisco Saboya, presiden te do Porto Digital. E nisso ninguém é melhor do que o estado da Cali fórnia, maior Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos e endere ço justamente do Vale do Silício. E de Hollywood e seus filmes milio nários.

“Eles conseguem trabalhar bem porque entendem o setor como uma frente importante de geração de negócios, de empregos diretos e indiretos, de impostos. Temos que fazer o mesmo aqui em nossos estados. Temos que pegar o nosso potencial criativo, que é ab surdo, e tratá-lo como uma frente fundamental da economia”, afirma Guilherme Velho. Felizmente, os governos estaduais já perceberam isso e começam a fomentar suas próprias iniciativas e a desenvolver políticas públicas. Em Santa Cata rina, os investimentos no Sapiens Parque, localizado em Florianópo lis, começaram em 2009 e devem seguir por pelo menos 15 anos, quando o parque estará completo.

A meta é abrigar 50 empresas ligadas à economia criativa. Atu almente estão em funcionamento uma incubadora de negócios; um instituto de pesquisa e laboratórios ligados à Universidade Federal de Santa Catarina. Também em parce ria com a UFSC deve ser inaugurado neste ano um centro de audiovisual, com investimentos previstos de R$ 7 milhões. No Rio de Janeiro, o Rio Criativo nasceu no rastro da coorde nadoria de economia criativa, instituída pela Secretaria Estadual de Cultura em 2009. “Naquele ano, foi organizada uma missão internacio nal para conhecer outras iniciativas na Inglaterra, na Escócia e na Espa nha”, lembra a coordenadora, Joana Neves.

De acordo com Joana, a coorde nadoria conta com um orçamento de R$ 8 milhões e está elaborando um programa de mapeamento do setor e investindo na linha do em preendedorismo. Um novo edital para a Rio Criativo – que tem duas incubadoras, uma na capital e outra em São João de Meriti, na Baixada Fluminense – deve ser lançado em meados de 2014. Com uma Copa do Mundo (em 2014) e uma Olimpíada (em 2016) pela frente, a coordena dora de economia criativa chama a atenção para a necessidade de con solidar a marca do país. “Estamos em um momento de atenção voltado

Hoje, a sociedade está muito mais disposta a pagar pela criação, pela originalidade. A “ economia criativa entra aí: na capacidade de criar artefatos que encantem as pessoas, aliando geração de valor e distribuição”

Saboya, do Porto Digital

Fotos: Daniela Nader

INVESTIMENTO Centro de Artesanato custou R$ 6,5 milhões e reúne 16 mil peças

para o Brasil. Há todo um potencial para consolidar a marca de país criativo. É uma oportunidade que temos pela frente.”

Já em Pernambuco, berço do Porto Digital, considerado por mui tos o Vale do Silício brasileiro, um grupo de trabalho vem se dedican do a mapear o potencial do estado: onde e como essas ações estão dis tribuídas, e quais as possibilidades de estabelecimento de políticas de incentivo. “Esta é uma questão cha ve dentro do novo desenho econômico que o governado busca para Pernambuco, pela oportunidade de explorar novos setores estra tégicos”, adianta Verônica Ribeiro, gerente de segmentos econômicos da Secretaria de Desenvolvimen to Econômico. Além dos setores de multimídia, audiovisual e games, definiram-se como estratégicos a gastronomia, as soluções urbanas sustentáveis, as manifestações cul turais, a moda e o artesanato.

O artesanato, inclusive, ganhou mais um centro para chamar de seu. O primeiro funciona em Be zerros. O segundo foi inaugurado em setembro passado, ao lado do Marco Zero, no Recife Antigo. Com investimento de R$ 6,5 milhões, o espaço tem um acervo de 16 mil pe ças de mais de 500 artesãos de todas as regiões do Estado. A área da loja ocupa mil metros quadrados, divididos em sete setores: mestres, souvenires, artesanato contempo râneo, cestaria, têxtil, trabalhos manuais e brinquedos populares. O centro é a primeira obra do pro jeto de revitalização do Porto do Recife a ser entregue e tem como objetivo estimular a economia do estado, valorizando o trabalho dos artesãos e artistas populares. Tudo com muita criatividade.

Rio de Janeiro, Santa Catarina, Pernambuco. Estados estabelecem oportunidades para os investidores em segmentos considerados estratégicos. Tecnologia e artesanato estão na lista

Fotos: Daniela Nader

Portomídia nasce com investimento milionário

No meio do caminho tinha um porto. Um porto cheio de ideias tecnológicas. Hoje, com 12 anos de existência, esse porto de inovações já registra um faturamento anual acima de R$ 1 bilhão e reúne mais de 190 empresas, empregando 6,6 mil pessoas. Agora, o Porto Digital apresenta um braço voltado para a economia criativa. O Portomidia nasce com investimentos de R$ 12 milhões – via Ministério de Ciência e Tecnologia, Secretaria de Ciência de Tecnologia de Pernambuco e Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). O

CONCEPT ART Márcio Vieira cria artes para jogos eletrônicos

foco está nos segmentos de jogos digitais, multimídia, cinevídeo/animação, música, design e fotografia.

“Fizemos um estudo de quais seriam os segmentos mais diretamente impactados pelo design e pela tecnologia da informação e chegamos a esta lista”, explica o presidente do Porto Digital, Francisco Saboya. O irmão mais novo e criativo nasce com 16 empresas que já eram ligadas ao Porto Digital. A elas vão se juntar – através de uma incubadora – outras nove empresas que façam uso intensivo de tecnologia da informação e comunicação (TIC) e do design. Todas vão funcionar em um prédio na Rua do Observatório, no Recife Antigo, atualmente em reforma. Os trabalhos devem ser concluídos neste mês.

“Vamos focar em formação, capacitação, empreendedorismo e segmentação. Também contratamos uma pesquisa da cadeia produtiva do Recife. Com base nessa pesquisa, serão feitas sugestões de melhorias para o setor, onde podem ser feitos treinamentos e capacitações”, destaca a coordenadora de economia criativa do Núcleo de Gestão do Porto Digital (NGPD), Joana Mendonça. Os resultados da pesquisa devem estar concluídos ainda neste primeiro semestre. Francisco Saboya reconhece que o projeto é de grandes proporções e tem como meta reunir 50 empresas da economia criativa até 2014.

Grande parte das empresas do Portomidia é da área de games. Elas agregam talentosos desenhistas e concept artists, aqueles que criam o conceito visual dos jogos. Um desses criadores é Márcio Vieira, que fez arte para jogos como Star Wars Galaxies e DC Universe Online. “É engraçado ver milhares de pessoas jogando com personagens que começaram a ter vida com você.” Márcio trabalha na Playlore, criada em 2006 e apontado como o melhor estúdio terceirizado da Sony, fabricante do PlayStation. Mas a empresa não trabalha apenas para a Sony. Tem outros parceiros e lança jogos próprios, como o Soccer Town, jogo social para o Facebook.

O coordenador de tecnologia em jogos digitais da Universidade Católica de Pernambuco, Breno Carvalho, lembra que o mercado que movimenta cifras milionárias não se presta apenas para divertir. Técnicas utilizadas para fazer games podem servir, por exemplo, para trabalhar com realidade aumentada. “Ela permite desenvolver programas que possibilitam você fazer um tour em museus e galerias de arte mesmo antes de você estar lá”, explica. Mas ele reconhece que ainda faltam lugares e equipamentos para as ideias serem desenvolvidas. Um problema que o Portomidia pretende eliminar.

Os R$ 12 milhões de investimentos também estão sendo usados na compra de modernos equipamentos, que começam a desembarcar. “Queremos fazer pela economia criativa o que o Porto Digital fez pela tecnologia”, afirma Francisco Saboya, que recebeu pelo Porto Digital o prêmio de melhor parque tecnológico do país e habitat de inovação pela Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec).

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