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• Os impactos das obras de expansão do Metrô na sociedade e as estratégias de relacionamento com os públicos de interesse

CARLOS AUGUSTO DIAS DE FARIA*, MARIA CECÍLIA MARTINO**

UM NOVO CENÁRIO

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As exigências com relação ao tratamento dos impactos provocados pela implantação dos empreendimentos de expansão do Metrô têm sido cada vez maiores. Seja em decorrência do aprimoramento da legislação e das normas ambientais, que demandam eficiência e transparência das ações, seja por parte dos órgãos de controle e financiadores, cada vez mais atuantes e próximos do dia-a-dia das obras, ou, ainda, pela própria necessidade da empresa em manter a integridade da sua imagem frente à população metropolitana.

Atualmente, além da necessidade natural da empresa de interlocução com seus diversos segmentos de público (sociedade civil organizada, poderes públicos, associações e instituições representativas, colaboradores, sindicatos, formadores de opinião, munícipes em geral), esses grupos mostram-se cada vez mais numerosos e interconectados, mais críticos e refratários às mensagens que recebem.

Some-se a isso o fato de que todos esses agentes encontram, hoje, à sua disposição, uma grande diversidade de mídias de muito fácil acesso e alcances por vezes ilimitados, algumas delas com objetivos, divergentes dos objetivos da organização, o que faz com que eventuais impactos sejam disseminados numa velocidade espantosa, colocando em risco a própria reputação dos empreendedores, caso essa situação não seja adequadamente administrada.

Neste panorama, o estabelecimento de uma política consistente de relacionamento com as comunidades lindeiras às obras de expansão constitui hoje, não apenas um desafio ge-

rencial, mas também uma necessidade estratégica da empresa com vistas a assegurar a continuidade de suas atividades de expansão e a consecução dos seus objetivos estratégicos e institucionais.

A IMPORTÂNCIA DAS AÇÕES DE RELACIONAMENTO

O relacionamento com o público sempre foi uma das prioridades do Metrô, desde sua criação em 1968. Naquele momento, o objetivo principal era estabelecer um padrão diferenciado de transporte, treinar e aculturar os seus usuários, conquistar o reconhecimento e o apoio, e criar canais de relacionamento com o cidadão, investindo-se, assim, na consolidação da imagem positiva da empresa.

Observa-se, desde aquela época, que a inserção de uma linha de metrô na cidade implica em significativas alterações do meio urbano, tanto pela possibilidade de reordenação e requalificação dos espaços, como, sobretudo, pelos muitos e significativos impactos por ela gerados durante a implantação.

Nesse cenário, a prevenção de conflitos e o resguardo da reputação da empresa estão diretamente ligados à eficácia do relacionamento com seus públicos. Observa-se aqui que não basta apenas atender às demandas específicas dos públicos afetados diretamente pelo cotidiano das obras civis do Metrô, mas, em complemento a isso, é preciso estabelecer um relacionamento sistêmico, constante, trazendo a sociedade para a parceria com a empresa e intensificando o grau de credibilidade na corporação e na aceitação do empreendimento.

Assim, essa relação com a sociedade deve ser, por definição, uma relação dinâmica e maleável, que vai se adequando estrategicamente às demandas e ao cenário e, principalmente, às mudanças de perfil da própria comunidade.

O AMBIENTE ATUAL: FATORES RELEVANTES E AÇÕES DE MITIGAÇÃO

Dois fatores têm se mostrado de extrema relevância na experiência acumulada pelo Metrô nas ações de relacionamento com o conjunto das partes interessadas afetadas pelas obras de expansão da malha metroviária. 1.A agilidade no fluxo de informações

É retórico afirmar que vivemos numa sociedade cada vez mais conectada. O avanço dos meios de comunicação, em especial a Internet, os telefones celulares, e as redes sociais, elementos intimamente conectados entre si, alterou de modo extremamente significativo as relações de poder embutidas na capacidade de captar, reter e disseminar informações.

Ações até bem pouco tempo atrás restritas a órgãos de imprensa formalmente constituídos podem hoje ser exercidas por qualquer cidadão de posse de um smartphone médio, com uma conexão de dados. Isso gerou um verdadeiro processo de empoderamento da sociedade, outorgando a cada munícipe o direito de exercer, ao mesmo tempo, papéis de repórter e fiscal das ações das empresas públicas e privadas no exercício de suas atribuições institucionais.

No caso do Metrô, que transporta mais de 4 milhões de usuários por dia e cujas obras de expansão geram inevitavelmente impactos significativos nos seus entornos, dada a magnitude de suas intervenções, essa questão é latente. Da mesma forma que qualquer ocorrência operacional é muito rapidamente registrada e disseminada via redes sociais, atingindo uma capilaridade sem precedentes, impactos de obras são também registrados e disseminados, chegando inclusive aos veículos regulares de comunicação de massa em tempos exíguos, captados por cidadãos que se sentem de alguma forma prejudicados por essas intervenções.

Essa mudança de paradigma no fluxo outrora “natural” de informações gera uma série de desafios que vêm sendo enfrentados pelo Metrô de forma contundente, por meio de monitoramento constante das mídias sociais, e criação de canais de comunicação utilizando essas novas ferramentas e tecnologias disponíveis.

No que se refere especificamente às obras de expansão, não obstante as ações de monitoramento e de ampliação dos canais de captação das manifestações da sociedade, entendemos que o maior desafio resida na agilidade na veiculação das informações.

É mister, nesse caso, que as notícias referentes a intervenções e impactos relevantes sejam geradas, processadas e disponibilizadas aos canais de comunicação oficiais da Empresa em prazos compatíveis com essa nova realidade social de processamento e veiculação de informações.

A necessidade de atendimento a essa nova demanda compreende, obrigatoriamente, o realinhamento de fluxos e canais de informação, envolvendo ativamente as equipes de relações públicas e de produção das empresas responsáveis pela execução das obras, e, internamente ao Metrô, os contrapartes de comunicação das áreas responsáveis pelo acompanhamento e fiscalização das obras, a equipe corporativa de relacionamento com a comunidade e a equipe de relacionamento com os órgãos de imprensa, com o objetivo primeiro de antecipar, sempre que possível, os dados do projeto a ser implantado e a veiculação de informações sobre impactos significativos. Ou caso isso não seja possível, disponibilizar as informações necessárias para pronta resposta a questionamentos que inevitavelmente surgem na sequência dos eventos.

2.A redução do desconforto pela antecipação das informações

A imagem positiva da empresa tem como lastro a força de suas relações com os seus públicos de interesse, e a força dessas relações depende muito do nível de eficiência que a empresa tem para se comunicar e participar com eles. Nesse sentido, a adoção de estratégias de comunicação proativas, onde a empresa se antecipa a qualquer outro canal de comunicação que não seja o oficial, é uma prática que traz um ganho de imagem significativo, gerando o engajamento das partes interessadas e a simpatia do público em relação aos seus projetos.

Como estamos falando de obras civis de grande porte, é fundamental que os públicos conheçam o que irá acontecer por meio dos canais de comunicação e relacionamento da própria empresa.

Intervenções que exigem, por exemplo, trabalho noturno (muitas vezes com ruído específico associado) e/ ou interdições de viário, são, por vezes, inevitáveis, e costumam causar impactos significativos à população lindeira às obras. Nesse cenário, temos observado que, quando esses impactos são previamente informados, o volume de

reclamações e de manifestações desfavoráveis por parte da população afetada é sensivelmente reduzido.

Isso pode ser credenciado, num primeiro momento, à sensação de respeito que essa atitude denota no público impactado, e, numa segunda instância, à possibilidade de criação de alternativas por esse mesmo público para evitar a submissão a esses impactos inevitáveis.

A constatação aqui exposta exige que, cada vez mais, se busque antecipar as informações sobre os impactos previsíveis nos entornos das obras, adotando-se ações de comunicação proativas, ao invés de se pautar essas ações apenas pela reatividade da resposta às manifestações que inevitavelmente surgirão.

Para isso, o conhecimento antecipado dos seus públicos de interesse através de pesquisas e mapeamentos, e o ajuste das estratégias de comunicação adequadas aos perfis de cada público, trazem resultados consistentes, permitindo o estabelecimento do diálogo transparente e franco com a sociedade.

PERSPECTIVAS FUTURAS: INTENSIFICAÇÃO E QUALIFICAÇÃO DO RELACIONAMENTO

Atualmente, o trabalho desenvolvido junto à comunidade lindeira às obras de expansão, no que tange ao atendimento de demandas, manifestações e reclamações, à informação prévia quanto a eventos de notável impacto e às ações específicas de atendimento quando da necessidade de reassentamento de famílias vulneráveis, embora venha surtindo efeito positivo na mitigação dos impactos das obras, já não se mostra suficiente.

As demandas da sociedade são dinâmicas por natureza e isso exige que estejamos sempre atentos a elas, por meio de intenso e contínuo monitoramento, a fim de identificar eventuais mudanças nos requisitos e expectativas das partes interessadas, para que se possa realinhar as ações para o seu atendimento.

As modernas metodologias de gerenciamento de empreendimentos pressupõem que se proceda a uma identificação completa de todas as partes interessadas com algum grau de expectativa em relação ao empreendimento, incluindo avaliação do seu grau de influência e interesse, para priorização das ações de engajamento e comunicação, sendo que essa identificação deve ocorrer ao longo de todo o ciclo de vida do empreendimento, já que podem surgir novas partes interessadas a todo momento e considerando, ainda, que suas expectativas são mutáveis a todo o tempo.

Diante desse cenário, vêm sendo adotadas ações com vistas a aprimorar as técnicas e a capacidade de relacionamento com o conjunto das partes interessadas nos empreendimentos de expansão do Metrô.

1.Oficinas de Design Thinking: cujo objetivo foi realizar um diagnóstico das dificuldades de comunicação e criar protótipos que definiram soluções para essas dificuldades. Nessas oficinas, membros da sociedade impactada pelas obras do Metrô foram convidados a participar e foram ouvidos, e com isso foi possível estabelecer a dimensão dos reais problemas vivenciados.

2.Projeto Comunicação Eficaz: com o objetivo de aprimorar os meios de comunicação proativa, esse projeto se encontra em desenvolvimento por meio de metodologias ágeis de Gerenciamento de Projetos, tendo suas necessidades sido geradas a partir de Oficina de Criação, com participação de representantes de todas as áreas envolvidas com o universo das obras de expansão.

3.Gestão de Partes Interessadas dos Empreendimentos de Expansão, da Concepção à Implantação: tem por objetivo a ampliação dos conceitos e das rotinas envolvendo o atendimento às partes interessadas, tendo por referência as boas práticas consolidadas no Guia PMBOK.

Além dessas ações, é fundamental o contínuo desenvolvimento da equipe responsável pelo relacionamento e pela comunicação com os diversos públicos da empresa, sempre com o foco na empatia e nas boas práticas de acolhimento, associado ao adequado perfil dos profissionais envolvidos, cujas competências devem necessariamente estar voltadas para a complexidade e interdependência do cenário atual e, claro, envolver aspectos essenciais como capacidade de relacionamento interpessoal, boa expressão verbal, habilidade em lidar com situações de conflito e habilidade em negociação.

CONCLUSÃO

Se por um lado o Metrô de São Paulo tem se preocupado em estabelecer canais de comunicação com os vários segmentos da sociedade, por outro a sociedade demanda que a empresa se posicione de forma a ouvir seus anseios, estabelecendo-se dessa forma uma sinergia capaz de consolidar os resultados das ações de relacionamento.

O relacionamento com a comunidade lindeira atua em duas vertentes: promoção do atendimento da população para todas as questões e assuntos ligados ao empreendimento, e a possibilidade de conhecimento mais aprofundado destes públicos pela empresa, dois fatores fundamentais para que se estabeleça a conexão e o diálogo do Metrô com seus públicos de interesse.

Ainda, há mais um prisma importante a ser considerado nessa abordagem: na medida em que se fortalece a credibilidade e a confiança na empresa, abrem-se campos para a prevenção de conflitos, para a divulgação eficaz dos benefícios finais do sistema de transporte, para a compreensão e aceitação dos impactos temporários inevitáveis, para a educação e o desenvolvimento das comunidades e futuros usuários e para o respeito ao patrimônio público.

Fundamental neste processo é, também, a sinergia das informações entre as diversas áreas da empresa, o diálogo alinhado entre os diversos protagonistas, e o estreitamento do relacionamento entre os diversos agentes intervenientes na implantação das novas linhas, compreendendo interações internas e externas ao Metrô de forma a garantir-se a comunicação coerente e o discurso consistente perante a sociedade.

* Carlos Augusto Dias de Faria, PMP®, é engenheiro eletricista, Coordenador de Qualidade e Meio Ambiente da Gerência do Empreendimento Linha 17-Ouro do Metrô-SP E-mail: imprensa@metrosp.com.br ** Maria Cecília Martino é psicóloga, Coordenadora de Atendimento à Comunidade da Diretoria de Engenharia e Planejamento do Metrô-SP E-mail: imprensa@metrosp.com.br

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