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A comunicação visual das estações do Metrô de São Paulo – processo evolutivo
MARIA OLÍVIA MARTIN*, MURILO GABARRA**
INTRODUÇÃO
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No limiar da década de 1970, paralelamente aos projetos de implantação do primeiro sistema de transportes de alta capacidade do país, o escritório de design paulista Cauduro & Martino aceitou o desafio de criar também o primeiro manual de um sistema informativo para transporte de massa, que incluía a proposição da marca símbolo para a Companhia do Metropolitano e o estudo completo de comunicação visual para estações de metrô. Este estudo previa a escolha da fonte tipográfica padrão, a escala de cores para representação da rede então inexistente, uma família de signos para os serviços relacionados e o desenho de alguns objetos com destaque para o totem identificativo das estações, reconhecido como ícone referencial da cidade de São Paulo. A concepção de um moderno projeto de sinalética para orientação de pessoas em sistemas complexos como o transporte subterrâneo, introduziu, à época, o país ao patamar de inovação do design gráfico, constituindo-se referência para muitos manuais de identidade visual de serviços metroferroviários nacionais e estrangeiros, entre outros serviços (figura 1).
CONCEITUAÇÃO DE SISTEMA GRÁFICO
A identidade visual de uma instituição é constituída por elementos gráficos padronizados que representam a corporação, seus serviços e/ou produtos. Ela deve atender aos aspectos funcionais, mas também assegurar personalidade, a fim de construir uma estratégia visual atrativa e única. O Sistema Gráfico para identidade corporativa abrange, majoritariamente, a adoção de uma Marca Símbolo, um Padrão Tipográfico, um Padrão Cromático e um Padrão Simbólico, atrelados à diretrizes de aplicação embasadas em um padrão de diagramação. Entre os elementos que compõem a identidade visual do Metrô, destacamos a Comunicação Visual como item fundamental por seu importante papel de representação da instituição e de orientador para consumo dos serviços das estações e trens, que por sua vez estão intimamente vinculados à construção da imagem corporativa. Na Companhia do Metrô, este sistema compõe-se de (ver figura 2).
HISTÓRICO DO SISTEMA GRÁFICO DO METRÔ-SP
Em 1968 o escritório de design Cauduro & Martino foi contratado pelo consórcio HMD (Hochtief, DE-Consult e Montreal) para o desenvolvimento do sistema gráfico do Metrô-SP, incluindo a marca símbolo para representação da empresa que se formava. O símbolo criado pelo arquiteto João Carlos Cauduro configurava-se na junção de duas setas em sentidos opostos, proporcionando uma imagem corporativa forte, por representar múltiplas possibilidades de deslocamentos ao se apresentar horizontal ou verticalmente, vislumbrando a mobilidade proporcionada pela futura expansão da rede (figura 3).
Em 1970, Cauduro e Martino entregaram o “Manual do Sistema Informativo do Metrô de São Paulo”, com propostas de aplicação da marca em elementos de estações e trens, além de estudos para representação da expansão da rede, entre conceitos.
Em 1971 a Cia. do Metrô contratou a Unimark International para o desenvolvimento de nova proposta de comunicação visual para implantação nas estações e, após estudos, em 1973 foi implantado modelo na então futura Estação Praça da Árvore. No projeto da Unimark optou-se por manter o desenho da marca projetada por Cauduro & Martino com ajustes gráficos que incluíam o arredondamento das bordas das setas e sua inserção em fundo circular, adotou-se a fonte Helvética para grafia da marca e na comunicação visual de identificação e orientação de fluxo e seguiu-se a cartela de cores proposta por Cauduro, tanto para a marca símbolo,




Figura 3
Figura 4 - Aplicação da marca símbolo do trem da Norte Sul (1-Azul) e comunicação visual de identificação de acesso quanto para as linhas da rede futura (figura 4). Em 1979, com as estações da Linha
Norte-Sul e trecho inicial da Leste-Oeste já em funcionamento (atuais linhas 1-Azul e 3-Vermelha), o
Metrô contratou as empresas PVDI -
Programação Visual
Desenho Industrial e GAAP - Grupo Associado de Pesquisa e Planejamento, para serviços de complementação da comunicação visual e organização da documentação dos projetos existentes, o que culminou na criação de Figura 5 um padrão normativo para os desenhos e, em 1981, na publicação da edição síntese do “Manual de Identidade Visual da Companhia do Metrô” (livro azul).
Nesta ocasião, a Marca Símbolo foi redesenhada em trabalho conjunto com equipe técnica do Metrô, com sua introdução em um fundo quadrangular ou retangular de cor azul (código Pantone Reflex Blue) e a manutenção da fonte Helvética, de modo a orientar as suas possíveis utilizações como assinatura síntese, completa e o uso nas peças de comunicação visual, mitigando as possíveis distorções e aplicações indevidas (figura 5).
Em 1993, durante a escolha de nomes e cores para identificação das novas linhas em projeto, foi verificada a limitação do conceito adotado até então, uma vez que a nomeação com base em pontos cardeais se mostrava de difícil assimilação e memorização (exemplo: Linha Sudeste/Noroeste) e a utilização de duas cores representativas por linha (conceito idealizado para representar linha com seu respectivo ramal, modelo previsto no planejamento original da rede de metrô paulistana mas não adotado ao longo de sua implantação) rapidamente esgotaria as opções de cores primárias e secundárias que alcançam melhor resultado.
Foi modificada, então, a denominação das linhas do Metrô, implantadas e planejadas, mantendo-se apenas a cor de tonalidade mais forte para caracterização e nomeação, acompanhada de codificação numérica, sendo definidas as nomenclaturas: Linha 1-Azul, Linha 2-Verde, Linha 3-Vermelha, Linha 4-Amarela, Linha 5-Lilás e Linha 6-Laranja.
Após esta determinação, a comunicação visual para novas linhas do Metrô seguiu esta especificação, todavia a sinalização implantada nas estações das linhas 1-Azul, 3-Vermelha e parte da 2-Verde somente foi atualizada a partir de 1997, mas ainda hoje restam estações com o padrão de duas cores por linha (figura 6).
Mediante solicitação de renovação da identidade visual, apresentada pela Secretaria dos Transportes Metropolitanos (STM) em 2008, foi criado grupo de trabalho com áreas de operação, manutenção, marketing e projeto para diagnóstico da Identidade Visual da Cia. e proposição de sua renovação.
Em 2009, foi contratado o Consórcio Azul para projeto e implantação de nova comunicação visual para a Linha 1-Azul, concluída em 2010. Entre as alterações apresentadas nesta intervenção, está a substituição da Fonte Helvética Bold pela versão Rounded, também adotada nas setas e pictogramas, a utilização da cor branca para fundo dos painéis, independente da linha e novo design para o totem de identificação de acessos. Também foram desenhados novos uniformes para os empregados de estações. Naquela ocasião, as modificações propostas como novo padrão de totem identificativo de acesso e a sinalização na cor branca para todas as estações, independente da linha, não tive-




Figura 6 - Comunicação visual das estações após alteração para representação das linhas em cor única
ram boa aceitação pelos passageiros. Por este motivo, esta atualização não prosperou, interrompendo-se o processo de reformas da CV que ficou limitado à Linha 1-Azul, criando uma situação de exceção na padronização da rede (figura 7).
Em 2012 foi contratado, por meio do Consórcio Azul, o escritório de João Carlos Cauduro para o desenvolvimento do “Manual do Sistema de Sinalizações das Estações” com base em manual similar que havia sido elaborado para a CPTM e adotado por aquela empresa. Este novo manual passou a ser adotado como diretriz de projetos para a expansão da Linha 5-Lilás e para a Linha 15-Prata. Contudo, as estações das linhas 2 (construídas até 2012), 3 e a 4, operada pela ViaQuatro, mantiveram o padrão anterior com painéis suportes na cor representativa da linha. Esta condição adicionou-se mais um modelo de comunicação visual em estações de metrô, reduzindo a padronização inicialmente existente na rede.
Entre as alterações propostas neste novo manual, destaca-se o retorno da Marca Metrô ao seu desenho original (1968), sem o fundo quadrangular vigente até então, para aplicação nos mapas, testeiras, primas de acessos e demais painéis da CV. Também foi definida a cor azul escuro para fundo em todos os painéis, independente da linha, e a família tipográfica Frütiger como alfabeto padrão para uso em toda comunicação visual das estações. Entretanto, este novo padrão gráfico foi adotado apenas para os projetos de Comunicação Visual das estações construídas a partir da publicação do Manual (figura 8).


Figura 7 - Prisma de identificação, comunicação visual da Estação Paraíso da Linha 1-Azul e versões de fonte Helvética
A COMUNICAÇÃO VISUAL NA PERCEPÇÃO DOS PASSAGEIROS DO METRÔ
Embora a Comunicação Visual do Metrô tenha sofrido mudanças ao longo dos Figura 8 - Exemplos da aplicação da marca sem campo quadrado e CV



anos, ela é bem compreendida, conforme apontado nas pesquisas de Satisfação dos Passageiros realizadas anualmente, desde o início de funcionamento do serviço. Dados comparativos dos aspectos dessa comunicação visual do período 2015 a 2018, estratificados por sistema, linhas 1-Azul, 2-Verde, 3-Vermelha, 5-Lilás e 15-Prata, têm avaliação bastante satisfatória com notas em torno de 8, em uma escala de 0 a 10.
Também foram apresentados os resultados de manifestações de usuários sobre reclamações, sugestões e solicitações relativas à Comunicação Visual das linhas 1-Azul,

Figura 9
2-Verde, 3-Vermelha e 5-Lilás no período 2016 a 2018, sendo insignificante o número de manifestações. Ressalta-se que neste período a Linha 5-Lilás ainda era operada pela Companhia do Metrô.
Para uma aferição mais recente, e focada em aspectos específicos da CV, em junho do ano passado foi realizada pesquisa quantitativa com passageiros das estações das linhas 1-Azul, 2-Verde e 3-Vermelha do Metrô, totalizando 800 entrevistas, além de pesquisa qualitativa com grupos locais para avaliar aspectos gerais da comunicação. Nesta pesquisa as avaliações da comunicação visual para orientar o sentido da viagem, a saída das estações, a quantidade de placas, a visualização das placas, o tamanho das letras etc., também foram positivas, com médias acima de 80% de aprovação.
Poucos pontos na CV da Linha 3-Vermelha estiveram abaixo desta média e merecem maior atenção quanto ao nível de iluminamento dos painéis (76% de aprovação) e quanto à compreensão dos pictogramas, notadamente o de indicação de compra de bilhetes (71% de aprovação) – ver figura 9.
Quanto às avaliações pelos empregados, 85% afirmam que os passageiros pedem informações para se deslocar, sendo os mapas de arredores os elementos da CV que necessitam melhoria tanto em quantidade, quanto facilidade de uso, especialmente quanto aos pontos de interesse no entorno da estação. Neste sentido, devem ser concentrados esforços na melhoria dos conjuntos de informações que servem de apoio aos empregados de modo a promover maior autonomia aos passageiros (figura 10).
A COMUNICAÇÃO VISUAL EM
ANÁLISE SOB ASPECTOS TÉCNICOS
Ao logo dos 45 anos de prestação de serviços do Metrô, a Comunicação Visual sofreu contínuas modificações para atendimento às necessidades operacionais, cumprimento de normas e legislações determinadas no período, para adequação aos novos materiais e tecnologias disponíveis no mercado, especialmente impulsionadas pelos avanços de processos produtivos. Entretanto, muitas das mudanças não foram incorporadas aos documentos diretrizes utilizados na contratação de projetos, nem implementadas em estações existentes, sendo adotadas apenas em novas estações. A desatualização de documentos, acarreta retrabalhos com custos e prazos adicionais, além da despadronização da linguagem gráfica, com consequente prestação inadequada do serviço e o comprometimento da imagem da Companhia.
Neste contexto, considerando a experiência acumulada pela Companhia do Metropolitano de São Paulo em seus 51 anos de atividades e em aderência às ações previstas no Planejamento Estratégico 2019/2023, foi determinada meta para elaboração de novo documento diretriz para a comunicação visual de estações, terminais urbanos, ciclovias, saídas de ventilação e emergência, pátios, via permanente, trens e veículos de via, tanto fase de implantação, quanto nas reformas de estações em operação. Para desenvolvimento do trabalho foi formalizado o TAP - Termo de Abertura do Projeto, com conclusão prevista para outubro de 2020, e constituído um grupo de trabalho que envolve a participação multidisciplinar de técnicos representantes de áreas produtoras e clientes do processo Comunicação Visual das Diretorias de Expansão e Operação da Companhia do Metrô, além de representantes das concessionárias ViaQuatro e ViaMobilidade.
O desenvolvimento dos trabalhos segue a metodologia de Escritório de Projetos – PMO com a elaboração de uma Estrutura Analítica do Projeto - EAP, na qual se apresenta o roteiro de desenvolvimento das ações e entregas previstas, que incluem a análise crítica de toda a documentação de diretrizes de projeto produzida ao longo do tempo (Manuais, Instruções de Projeto, Projetos Padrão), a realização de pesquisas junto aos passageiros e empregados, o benchmarking com empresas nacionais e estrangeiras de sistemas de transporte entre outras, a análise e diagnóstico de to-



Figura 11 - Estudos de cores adotadas para linhas de sistemas metroviários
dos os elementos componentes do sistema gráfico aplicados na comunicação visual do Metrô e nova conceituação do Sistema Gráfico, fundamental ao desenvolvimento dos novos projetos para os componentes de identificação e orientação nas estações, visando a introdução de melhorias e inovações (figura 11).
CONCLUSÃO
A identidade visual das organizações, notadamente representada por sua Comunicação Visual, é muito importante na medida em que individualiza a empresa dentre as demais, facilitando sua identificação e memorização. Com o avanço da tecnologia nos processos de comunicação, observou-se que o ser humano é extremamente sensível e atento às imagens. Assim, a identidade visual passou a incorporar outras questões, ganhando força como estratégia para alavancar a imagem positiva perante stakeholders, uma vez que, além da função original de representação, ela contribui para o fortalecimento e reposicionamento de marcas, ao lançar mão de novas ferramentas de comunicação e marketing para aproximação e fidelização de seus públicos.
O Sistema Gráfico do Metrô, além da função de representação da empresa e identificação dos serviços, configura-se pela disponibilização de um conjunto de informações que compreende a Comunicação Visual, baseado no somatório de signos e caracteres para transmissão de orientações aos passageiros sobre a viagem durante seu trajeto, de modo a garantir o deslocamento rápido, seguro, confiável, confortável, fácil, compreensível, universalmente acessível e amigável. Seu papel é fundamental à compreensão espacial da arquitetura das edificações, diante a variabilidade e complexidade dos ambientes, além de ser vital na mitigação de riscos em situações de emergência, contribuindo para amenizar o sentimento de insegurança quando em trânsito por espaços com acúmulo de passageiros, ao prover as orientações necessárias para o bom funcionamento de equipamentos e escoamento das instalações.
Todavia, a informação comunicada pelos sistemas de sinalização pode, com o tempo, tornar-se inconsistente após a construção de extensões de linha, a adição de instalações ou melhorias na infraestrutura, como por exemplo, inclusão de pontos de interesse, ou ainda como reflexo de danos provocados por vandalismos ou desgastes naturais, comprometendo a comunicação aos passageiros, o que pode levar à hesitação e confusão, principalmente para usuários ocasionais.
Com 45 anos de funcionamento, embora de modo geral o Metrô se mantenha avaliado como o melhor serviço de transportes da cidade de São Paulo por seus cidadãos, suas instalações e subsistemas originais experimentam diferentes graus de desgastes, entre os quais está o sistema de sinalização para os passageiros de algumas estações, tornando-se imperativo o estabelecimento de processo de avaliação sistemática e abrangente do desempenho de todos os elementos da comunicação visual, para identificar eventuais deficiências e apontar medidas de melhoria, investindo em um design moderno, compreensível, amigável, de fácil produção.
O atendimento às necessidades dos passageiros do sistema de transportes públicos é o foco primordial das ações preconizadas. Neste sentido, o objeto principal do trabalho em desenvolvimento pelo grupo multidisciplinar é o estabelecimento de um conjunto de diretrizes com informações suficientes para a concepção dos projetos de Comunicação Visual, de modo a garantir sua plena eficácia e contribuir para a excelência dos serviços oferecidos, proporcionando maior confiança na relação com os distintos públicos e força à Marca Metrô de São Paulo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] HMD - Hochtief, DE-Consult e Montreal Metrô de São Paulo. “Sistema Integrado de Transporte Rápido Coletivo da Cidade de São Paulo” - Volumes 1 e 2 - SP, 1968. [2] UNIMARK INTERNATIONAL – Projeto de sistema de sinalização Metrô de São Paulo – SP, 1971. [3] PVDI / GAAP - PVDI - Programação Visual Desenho Industrial e GAAP - Grupo Associado de Pesquisa e Planejamento “Manual de Identidade Visual do Metrô” - SP, 1981. [4] LONGO, CELSO CARLOS – Dissertação - FAU/USP 2007. “Design total: Cauduro Martino - 1967-1977” - Manual do Sistema Informativo do Metrô SP - SP, 2014.
* Maria Olívia Martín é arquiteta especialista no Departamento de Projetos de Arquitetura do Metrô-SP (autora) E-mail: imprensa@metrosp.com.br ** Murilo Gabarra é arquiteto no Dept. de Projetos Executivos do Metrô-SP (colaborador) E-mail: imprensa@metrosp.com.br