Revista Fundição nº 8

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FUNDiÇÃO

Nº 8 - Julho 2019 - ASSOCIAÇÃO BARREIRO PATRIMÓNIO MEMÓRIA E FUTURO

Alburrica, Ponta do Mexilhoeiro e Quinta do Braamcamp Sitio de Interesse Municipal

Dossier: Quinta do Braamcamp


Índice

REVISTA FUNDiÇÃO Ficha técnica BARREIRO

Alburrica, Ponta do Mexilhoeiro e Quinta do Braamcamp Sitio de Interesse Municipal Editorial.................................................................Pag. 3

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Edição

Quinta do Braamcamp

Nº8

Parecer da Associação Barreiro – Património, Memória e Futuro............................................Pag. 4 - 7

Julho 2019

Em Torno de Alburrica, da Ponta do Mexilhoeiro e Quinta do Braamcamp...................................Pag. 8 - 9 Os Moinhos de Alburrica estão classificados dizer o contrário é Mentira ................................ Pag. 10

Editor ASSOCIAÇÃO BARREIRO PATRIMÓNIO MEMÓRIA E FUTURO

Quinta do Braamcamp Cronologia.................Pag. 11 - 13 O legado árabe e islâmico no Barreiro: as salinas na zona de Alburrica..........................................Pag .14 - 15 Contos e Cantos da Fábrica e da Terra...........Pag .16 - 17

Edição Composição gráfica e Fotografia José Encarnação

As Quintas da “Outra Banda”........................Pag. 18 - 20 O Património Cultural e o Desenvolvimento Local.............................................................Pag. 21 - 24 Efeito da Alterações Climáticas............................Pag. 25

Contactos: Espaço L Rua José Gomes Ferreira Antiga Estação Ferroviária do Lavradio abpmf.patrimonio@gmail.com http://associacaobarreiropatrimonio.pt http://associacaobarreiropatrimonio.pt/jornadas

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Barreiro e Braamcamp: Um Exercício de Memória.............................................................Pag. 26 O Barreiro e os emigrantes..................................Pag. 27


Patrimonio Cultural - Barreiro

EDITORIAL Alburrica, Ponta do Mexilhoeiro e Quinta do Braamcamp Sitio de Interesse Municipal

“Pelo sonho é que vamos” Sebastião da Gama

Queremos criar um Mundo Novo, mas não sabemos construir moinhos, igrejas, pontes, monumentos… não sabemos

dar asas às aves… criar os rios, mares, montanhas… fazer árvores, flores… mas queremos que o nosso mundo novo tenha, moinhos, igrejas, pontes, monumentos, aves, rios, mares, montanhas, árvores, flores,… Como é que conseguiremos que os homens apreciem os monumentos, admirem as aves, contemplem a natureza e cultivem as árvores? Vamos sonhar com um Mundo Novo, apesar de ser um longo e difícil caminho a percorrer. Temos a certeza que o nosso Mundo Novo, começa com a primeira atitude. Vamos sonhar com um Barreiro mais bonito, respeitador da sua identidade, relembrando o seu património que conta a história dos monumentos, dos usos e costumes das populações. Vamos reviver um mundo diferente na nossa cidade do Barreiro. O que vamos continuar a fazer? A Associação Barreiro, Património, Memória e Futuro, tem vindo desde há 5 anos a tentar concretizar um projeto cultural com a edição da revista Fundição. Já foram editados sete exemplares subordinados aos temas seguintes: Nº 1 – Conjunto de testemunhos sobre o Património Industrial e Arquitetónico; Nº 2 – Desporto, Património Barreiro; Nº 3 – Património, Cultura, Turismo e desenvolvimento; Nº 4 – Moinhos a Sul do Tejo; Nº 5 – A Indústria Química; Nº 6 – O Património Histórico do Barreiro que Futuro?; Nº 7 – Ano Europeu do Património Cultural. Esta edição (Nº 8 – Sítio de Alburrica) é mais um passo dado no caminho que pretendemos trilhar, que seja: - um espaço de reflexão sobre questões a nível patrimonial que afetam o nosso Concelho; - um espaço de divulgação dos acontecimentos locais sobre o património, envolvendo a população do Barreiro, que queremos mais atenta, interessada, conhecedora e exigente; - um espaço de divulgação de estudos efetuados respeitante às gentes, à história e ao património local. Esperamos que os leitores sintam a curiosidade e o desejo da leitura da nossa revista, contribuindo assim para uma maior consciencialização e valorização do património do nosso Concelho. Saudações cordiais e boa leitura. FUNDiÇÃO 3


Quinta do Braamcamp - Barreiro Parecer da Associação Barreiro – Património, Memória e Futuro

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Sítio de Interesse Municipal e a Proposta de Venda legaram e que nos cumpre preservar e transmitir. do Braamcamp a Privados para Construção Imobiliária Acreditamos que é possível neste espaço desenvolver uma actividade turística sustentável, não de turisDe forma muito sumária e para que se perceba a im- mo de massas, mas de turismo dirigido a segmentos portância do espaço descrevemos Alburrica ( palavra precisos, que têm vindo a desenvolver-se nos últimos de origem árabe, que significa brilho esplendor) Sítio anos, mas isso só será real se se conseguir criar verde Interesse Municipal, constituído por duas peque- dadeiros pólos de interesse que repeitem a história e nas penínsulas formadas por aluviões e consolidadas o património ambiental, paisagístico e cultural exissobre ostreiros, com ocupação provável desde o neo- tente no Sítio Interesse Municipal e se mantivermos lítico, de acordo com os achados em pedra, recolhi- o espaço na esfera do domínio público, negociando dos nos anos 60. Possui duas praias e um antigo sa- e trabalhando com operadores privados e fundos púpal, onde marinhas de sal deram origem a 4 caldeiras blicos nacionais e comunitários. servindo 4 moinhos de maré. Os moinhos de vento são 3 e existem vestígios de um antigo estaleiro de Esta Associação preconiza para todo o Sítio de Inteconstrução naval ao pé destes. Na Ponta do Mexi- resse Municipal as seguintes intervenções: o restaulhoeiro os restos da primeira e segunda pontes de ro do Moinho Gigante de vento, que segundo o livro embarque dos Vapores do Tejo e do Sado. Na Quinta Portugal – Terra de Moinhos, Jorge Augusto Miranda do Braamcamp há uma história muito variada a pre- e José Carlos Nascimento, é único em Portugal com servar, da moagem no moinho de maré e no desapa- o tipo de tecnologia utilizada; o restauro do Moinho recido Moinho de Vento do Barão do Sobral, passan- do Braamcamp e caldeira, com as moendas a fundo pela agricultura e pela cultura do bicho da seda cionar para centro interpretativo vivo e história das para a industria têxtil, à transformação da cortiça na unidades moageiras no nosso Concelho, bem como a Sociedade Nacional de Cortiças. O património natu- história da cortiça no Barreiro; o restauro do Moinho ral de todo o espaço de Alburrica é, como o nome Grande como centro interpretativo de toda a zona indica, deslumbrante e foi moldado pela mão do ho- classificada e do papel que o Barreiro teve na Expanmem ao longo de séculos, sempre no respeito pelos são Portuguesa, articulando com um roteiro de visiequilíbrios ambientais. É este o património que nos tas ao património do Concelho sobre esta época e a FUNDiÇÃO 4


Quinta do Braamcamp - Barreiro

recuperação da sua caldeira; a consolidação e preservação da ruína do Moinho do Cabo, como ruína e a recuperação da caldeira; a reconstituição da caldeira do que foi o Moinho Pequeno. Claro está que serão necessários apoios de restauração e hotelaria, bem como um diversificado leque de actividades culturais e desportivas de lazer e desenvolvimento cultural e educativo, com equipamentos ligeiros de ar livre e, ainda, apoios de praia; a existência de um percurso de visitação ao ar livre que integre os primeiros cais de embarque dos barcos de vapor que faziam a ligação a Lisboa, os estaleiros de construção naval, os cais de embarque da cortiça, os barcos característicos deste espaço ( o dos moios, o dos moinhos, os botes, as fragatas, os varinos e a muleta), bem como as actividades e entre estas a da pesca do cerco. No que se refere ao antigo Moinho Pequeno de maré e dado que já não será mais um moinho (um moinho de maré para o ser tem de ter casa da moagem, casa do moleiro, armazém, caís de embarque, o barco do moinho e a caldeira, tudo isto constituía um pequeno complexo povoado de gente com funções específicas) defendemos que deve ser a “Casa da Fotografia do Barreiro” que deve organizar os espólios fotográficos existentes na Câmara Municipal, promover actividade expositiva no campo da fotografia, realizar investigação e restauro de espólios degradados existentes, adquirir espólios com interesse artístico e histórico-patrimonial, manter um arquivo aberto à investigação.

tervenções, com as salgadeiras e tudo o mais que, de natural, aí se encontra”. Todo este espaço constituiria o Parque Ambiental e Patrimonial de Alburrica, no qual a componente de investigação em vários domínios deveria estar presente e ao serviço daquilo a que o arquitecto e gestor cultural Marcelo Martin, responsável pelo Departamento de Comunicação do Instituto Andaluz do Património Histórico, define como o grande desafio que “é o de manter o conhecimento sobre o património em permanente actualização ideológica, na qual prevalecem os valores humanistas, o compromisso com o desenvolvimento que não ponha em perigo a nossa herança cultural e que as actividades em torno do património sejam um factor de mais desenvolvimento social e económico.” Perante tudo o que afirmámos e pelo que ouvimos na sessão de informação sobre a venda da Quinta do Braamcamp a privados, esta Associação está muito preocupada com o futuro deste espaço. As razões desta nossa preocupação são as seguintes:

1- pensamos que não deve haver uma decisão de venda deste bem público sem os estudos multidisciplinares imprescindíveis, já referidos na primeira parte do nosso texto, pois neste momento não existe uma visão de conjunto, não se elaborou, ao menos nos seus traços gerais, um projecto, os seus valores de obra e gestão, uma previsão de custos e benefícios, pelo que não se pode garantir com total e absoE que, como Augusto Cabrita costumava dizer “que luta certeza que a venda é a única forma de permitir se proteja o ambiente e a paisagens, sem grandes in- a liberdade cabal do usufruto de todo o espaço pela FUNDiÇÃO 5


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população. Neste sentido esta proposta parece-nos extemporânea, atentatória das justas expectativas dos barreirenses e no mínimo leviana; 2- defendemos que não se pode colocar em perigo o espaço que ambientalmente já corre sérios riscos em consequência do aquecimento global, necessitando, assim, de um estudo de impacto ambiental relativamente a todo e qualquer projecto que venha a ser estruturado para o local.

estava previsto e estudado no PDM de 1994, perfeitamente desactualizado! Qual a razão desta recusa? Terá medo que, dados os actuais problemas ambientais, tal estudo negue a possibilidade de venda para construção de habitação no espaço de Quinta? Mas será que tudo isto é feito não em nome do interesse da população como se argumenta, mas no interesse do privado, que compra para ter lucro, não sendo, desta forma, mais do que um negócio?

É urgentemente um estudo/intervenção de preservação ambiental do espaço, se quisermos que o território resista à subida média do nível das águas, de acordo com a previsão cientifica internacional que existe, questão que não parece preocupar este executivo camarário;

4- outra razão ambiental para a nossa recusa do plano de venda a privados para construção de habitação na zona da Quinta do Braamcamp, por parte do actual executivo, é o facto de sabermos que parte do terreno de Alburrica pertence à Reserva Ecológica Nacional REN, sendo os espaços não integrados nesta nos parecem ser zonas vitais de protecção do classificado. Significa isto que tudo o que for feito na Quinta afecta directamente a restante área, o que nos dá razão a dois níveis: o da necessidade de um estudo de impacto ambiental e de um estudo global de todo o território classificado, hoje, como SIM (Sítio de Interesse Municipal), antes de qualquer outra acção;

3- afirmamos que este estudo de impacto ambiental é tanto mais necessário, quanto sabemos que o PDM existente é de 1994, tem praticamente um quarto de século e os PDMs perdem a sua actualidade em 10 anos. Como tal está desactualizado, e muito, sobretudo e relativamente a todas as questões que interferem com o ambiente, dado que são questões decorrentes das alterações climáticas, que só começaram a ter o merecido relevo e a ser uma preocupação pública mais evidente na viragem do século. Estranho é que o actual executivo da Câmara Municipal, que deveria ser o primeiro a promover esse estudo, tenha afirmado, na pessoa do seu vereador do Planeamento, no dia da sessão pública de esclarecimento, que não era necessária a sua realização, dado que tudo FUNDiÇÃO 6

5- defendemos que não se devem alienar bens patrimoniais públicos sem que essa decisão seja muito bem ponderada, fundamentada e, sobretudo, seja uma inevitabilidade absoluta, o que não nos parece ser o caso, dada a forma como foi apresentada e a argumentação utilizada para justificar a sua venda.


Quinta do Braamcamp - Barreiro

A apresentação foi realizada, maioritariamente, com valores em euros que se ganhavam com a venda, como se se pudesse tratar este assunto exclusivamente como um negócio. Nunca revelou nenhuma preocupação ambiental, paisagística ou patrimonial, aliás, palavras nunca referidas. Isto foi de tal forma claro, que tal facto mereceu comentário em várias intervenções dos presentes.

vendeu, mas também, com a população do Barreiro! 7- a venda da Quinta do Braamcamp, nas condições que foram referidas através da sua sua colocação em hasta pública, configura abertamente um processo de pura especulação com consequências inevitáveis para o mercado imobiliário do Barreiro, constituindo um sério encorajamento à especulação e acentuando os desequilíbrios já existentes;

Esta é mais uma das razões para, enquanto Associação de defesa do património, recusarmos veemente 8 – por último, interrogamos-nos se será possível e liminarmente o projecto apresentado. alienar por venda um espaço que está classificado e que fruto desta classificação recebeu fundos comuUm bem patrimonial como a Quinta do Braamcamp, nitários para a recuperação do moinho de maré exisintegrada numa zona classificada, e que é considera- tente e da sua caldeira? E, ainda, se é possível que da, segundo a lei, um bem de “inestimável valor cul- privados intervenham neste moinho de maré e sua tural”, coisa que os proponentes da venda a privados caldeira realizando obra? parecem desconhecer, não pode ser alienada com semelhante ligeireza. A legislação em vigor impõe A Associação Barreiro - Património, Memória e Futuque deva ser tratada como bem cultural e não como ro fará tudo o que está ao seu alcance para informar um imóvel que se coloca à venda no mercado com o a população do grave problema que teve início no único objectivo de obter o máximo lucro. Ainda que derrube do Moinho Pequeno de maré e agora bate tal não pareça, considera-se que há limites para tudo, à porta da quinta do Braamcamp e parece já estar a mas parece que não só não são respeitados, como bater à porta da caldeira do Moinho Grande de maré. nem sequer são reconhecidos; Pela defesa da nossa história e do nosso património 6- sabemos que o anterior executivo, quando nego- ambiental, paisagístico e cultural material e imaterial ciou a compra, a justificou com a intenção de destinar Pela defesa da nossa identidade todo o espaço para usufruto exclusivo da população, Pela responsabilidade que temos de transmitir o lede acordo com a informação da acta de sessão de Câ- gado que herdámos mara em que foi proposta a compra. É, por isso, no Pelo desenvolvimento integral do Barreiro mínimo estranho que aquilo que então foi decidido democraticamente em sessão de Câmara, seja ago- A Associação Barreiro- Património, Memória e Futuro ra posto em causa, especialmente da forma como se está a processar. A Câmara não deve manter os seus compromissos? Um compromisso não só com quem FUNDiÇÃO 7


Quinta do Braamcamp - Barreiro Em Torno de Alburrica, da Ponta do Mexilhoeiro e Quinta do Braamcamp

Esta Associação não pretende integrar-se na discussão

que está a ser desenvolvida em torno da venda da Quinta do Bramcamp, porque a considera confusa, demagógica e nada esclarecedora para a população. Como lhe compete, pretende unicamente reafirmar as suas posições em termos da defesa de um território único na Área Metropolitana de Lisboa, que integra o Barreiro e que é de extrema importância para o desenvolvimento futuro do Concelho, quer na sua potenciação, quer na sua concepção.

A Quinta do Braamcamp é um bem público recentemente comprado com o objectivo de ser colocado ao serviço de toda a população do Concelho. Este espaço caracteriza-se por possuir um riquíssimo património cultural/industrial e um inestimável interesse ambiental e paisagístico, que espelham parte significativa da nossa história.

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dios de 3 pisos na Quinta do Braamcamp e, ainda, a construção de um mini estádio de futebol? Este novo bairro a surgir dentro da Quinta, conjuntamente com um campo de futebol, coloca completamente em causa a qualidade do ambiente (circulação automóvel, a densidade habitacional elevada, poluição ambiental, ruído, etc.), a qualidade paisagística com a construção de uma cortina de betão a liquidar a paisagem sobre o rio. Anula-se a grande importância do espaço como reserva natural de fruição da natureza e todo o ecossistema é completamente destruído.

Argumenta-se que se trata de procurar criar condições para a fixação de uma nova população no Barreiro e responder à pressão da procura, esta última bem desmentida pelos numerosos prédios devolutos, uns em mau estado e outros recém-construídos mas totalmente devolutos, e O que verificamos é que todos estes valores estão directaem urbanizações não construídas no Concelho e na prómente a sere postos em causa pela visão exclusivamente economicista e utilitarista da utilização do espaço (a Câ- pria Cidade do Barreiro. mara Municipal pretende obter dinheiro com a venda em hasta pública), além de não se respeitarem democratica- É estranho que se queira uma nova população para o mente decisões importantes já tomadas, nem se toma- Barreiro quando os munícipes estão à espera de soluções rem em consideração precauções essenciais do uso deste para si próprios, e tal não representa qualquer tipo de deterritório caracterizado por uma grande fragilidade. É por senvolvimento, mas sim exclusivamente de especulação imobiliária de alto luxo. isso que se colocam as seguintes questões:

1 – O que significa de facto a construção de cerca de 185 Todavia, esta situação diz respeito à ABPMF, devido ao facfogos, comércio e espaços de estacionamento, em pré- to bem visível de esta hipotética fixação de novos habitanFUNDiÇÃO 8


Quinta do Braamcamp - Barreiro tes colocar em causa um território classificado, em Sessão de Câmara de 6/7/2017, por unanimidade, como Sítio de Interesse Municipal para protecção ambiental, paisagística e moageira, e em grande parte integrado na Rede Ecológica Nacional.

cerca de 10% se: (extraindo a área de construção- 7.3 hct, mais campo de futebol +-1 hct, a área da caldeira, REN5,8 hct, e a zona húmida de proteção, REN - 5 hct)!

2 – A decisão da compra da Quinta do Braamcamp teve o apoio de todas as forças políticas que integravam a Assembleia Municipal e a Câmara Municipal do Barreiro. Qual o significado da actual intenção de transformar um domínio público num domínio privado?

3 – Convêm, ainda, interrogar-nos sobre o que acontecerá a todo este território e percebermos, à luz dessa realidade, não muito afastada no tempo, o que significa vender, hoje, este território?

No entanto, por todos os exemplos observados, quer no passado, quer no presente, esta é uma perspectiva puraMas quem poderão ser estes novos habitantes? Tal como mente imaginária, mas de grande conveniência, quando é referido, as habitações a construir, para haver retorno se pretende vender o território do Concelho ao desbarato realmente lucrativo para o capital investido pelo privado, com justificações nada esclarecedoras, integrando direcserão de luxo e a custo alto. É evidente que este tipo de tamente o processo de especulação imobiliária corrente. habitações só pode ser comprado por uma população priÉ mais que evidente que o interesse de investidores por vilegiada que nada tem a ver com o Barreiro. este território só é possível se este investimento fornecer Os resultados desta pretensão de venda a privados para lucros significativos, tornando incompatíveis os dados da construção não pode deixar de ser tomada em conside- questão ( basta verificar o que se passa em Lisboa, em ração, porque representa a entrega do território à espe- Troia, etc). culação imobiliária que tem sido a grande predadora da Mas para além de toda esta situação da qual o Concelho qualidade do ambiente e da paisagem por todo o país, e do Barreiro sairá fortemente prejudicado, qual é o objeccoloca a nu uma posição absolutamente nada preocupativo da aplicação da verba resultante da hipotética venda? da com uma visão ecológica correcta, tão necessária no Há algum projecto estratégico para a sua utilização? De actual momento, em que tantos, pelo resto do Mundo facto esta venda obedece a algum projecto estratégico afirmam não haver Planeta B. para o desenvolvimento futuro do Concelho? Mas sobre estas questões essenciais, não é proferida uma única paEsta Associação, tomando em consideração todos os arlavra. gumentos apresentados, e que são essencialmente dois (a Câmara não possuir dinheiro e desejar-se a criação de Na realidade, tudo isto a concretizar-se, representará uma um novo bairro), não lhes reconhece qualquer validade enorme traição à população do Barreiro, pois basta tomar justificadora para a destruição pura e simples deste im- em consideração a planta de estruturação da operação de portante património que, de facto, pertence a todos os venda, para se verificar que a área remanescente é extrebarreirenses. mamente limitada.

Segundo o LNEC e o Grupo de Investigação Estejo, Universidade Lusíada, Lisboa ( este grupo desenvolveu, a peA Associação considera que a decisão de aquisição da dido da Câmara Municipal do Barreiro e a partir de 2012, Quinta foi correcta, na medida em que a sua justificação essencial assentava na preocupação em colocar o espaço um estudo sobre toda a zona de Alburrica, ao abrigo de ao serviço da população e protegê-lo ambiental, patrimo- um protocolo, ainda em vigor) todo a zona de Alburrica é de enorme fragilidade e numa ou duas gerações estará nial e paisagisticamente. debaixo de água, dado o aumento previsível do nível do O que justifica esta súbita alteração, tanto mais quanto já mar devido ao aquecimento global. O mesmo aquecimento que levou os jovens a sair à rua lembrando que não há existiam verbas atribuídas para este objectivo? um Planeta B.

Dizem-nos que a Câmara Municipal do Barreiro não possui os meios financeiros necessários às obras de restauro desta área. Dizem-nos, também, que privatizando o espaço, os prováveis investidores garantirão as obras de infra-estruturas e restauro de todos os edifícios, (palacetes, armazéns, moinho do Braamcamp), os arranjos exteriores e o da caldeira do moinho, bem como a possibilidade de toda a população sem restrições ou limites usufruírem de todo o espaço. Mas o que significa este espaço disponível (ver planta nº1), pois verifica-se que ele não representa os tais 95% da Quinta, mas fica limitado unicamente a

Mais uma vez, não queremos acreditar que, uma instituição pública, com responsabilidades éticas e morais acrescidas, esteja a querer vender à especulação imobiliária um território que ficará a prazo, seguramente, debaixo de água. De facto, o Secretário Geral da ONU terá razão quando afirma duvidar que haja vontade política de lutar contra o aumento das emissões de carbono! Associação Barreiro – Património, Memória e Futuro FUNDiÇÃO 9


Quinta do Braamcamp - Barreiro Os Moinhos de Alburrica estão classificados dizer o contrário é Mentira Carla Marina Santos

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Se dúvidas houvesse sobre o facto de todos os moinhos

ra Municipal do Barreiro assumiu que a classificação abrangeria todos os moinhos existentes, senão a deliberação existentes em Alburrica estarem classificados, bastava refe- final da classificação de Alburrica como Sítio de Interesse rir os seguintes factos: Municipal, aprovada por unanimidade a 6/7/2017, em sessão de Câmara, teria de explicitar quais os moinhos que não 1 – que no dia 1 de Fevereiro de 2017 foi aprovada, em ficariam classificados e não o faz. Sessão de Câmara, a abertura de procedimento de classificação ambiental, paisagísta e moageira de toda a zona de Esta classificação culmina um processo de muitos anos, ao Alburrica. O Aviso de Abertura deste procedimento é o nº longo do qual, diferentes executivos da Câmara Municipal 2964/2017 e pode ser consultado na integra na 2ª Série, nº do Barreiro foram realizando a compra de várias áreas des57 do Diário da República. Esta abertura de procedimento te território. de classificação coloca de imediato o Sítio e o Património que o integra ao abrigo do preceituado na Lei de Bases do Primeiro foram adquiridos os moinhos de vento, depois os Património Cultural, Decreto-Lei nº 107/2001 e do Decreto- moinhos de maré Pequeno e Grande, e por fim a Quinta do -Lei nº 309/2009; Braacamp, ficando por comprar o moinho de maré do Cabo, completamente em ruína. Como edifícios classificados, ao serem reabilitados, têm de cumprir as leis já referidas anteriormente e atinentes aos bens patrimoniais classificados

2 – que no dia 3 de Maio de 2017, foi aprovada, em Sessão de Câmara e por unanimidade, a deliberação nº 158/2017, relativa à reabilitação do Moinho de Maré da Quinta do Braamcamp, onde está expresso que este é um bem patrimonial em vias de classificação, devido à abertura de procedimento de classificação para todo o espaço de Alburrica;

Só mais uma curiosidade, quando se vende um bem classificado, o comprador compra o bem e o ónus de classificação que recaí sobre o mesmo, comprometendo-se a cumprir as leis já mencionadas. A não ser que, para ficar livre desse encargo, deixe o bem adquirido ao abandono até ser ruína completa. Mas saibam que nem mesmo assim é impossível restaurar, é só ver o exemplo do moinho do Montijo, que se encontrava em muito pior estado de ruína que os moinhos Pequeno, Grande e Braamcamp e foi restaurado.

O problema é que o terreno está mesmo ao abandono, não é feita a normal e natural limpeza do espaço público Quinta do Braamcamp pela Câmara Municipal do Barreiro, de acordo com as suas responsabilidades de limpeza de todo o Concelho. Será que estamos enganados e a Quinta do Braamcamp, afinal não pertence ao Concelho? Ou será que o 3 - que o texto da proposta para além de afirmar o referido actual executivo está a seguir as pisadas do anterior dono, no ponto 2, explicita que todo o procedimento de reabili- o Banco BCP, um privado que deixou a quinta ao abandono tação do Moinho do Braamcamp se desenvolve ao abrigo durante anos promovendo a pilhagem, a destruição e os indo nº 3 do Decreto-Lei 107/2001 e do nº 2 e nº 3 do artigo cêndios? nº 45 da mesma Lei de Bases do Património, bem como, o nº 2 do artigo nº 14 do Decreto-Lei nº 309/2009. Esta lei Para além disto, o novo executivo da Câmara Municipal do Estabelece o procedimento de classificação dos bens imó- Barreiro não emprega na recuperação do moinho do Braaveis de interesse cultural, bem como o regime das zonas de mcamp, na caldeira e zonas adjacentes os fundos comuniprotecção e do plano de pormenor de salvaguarda; tários garantidos com o concurso ao FEDER, porquê? Está à

espera de findar o prazo de utilização deste empréstimo? De ter de devolver o dinheiro? Mas, quando diz não ter dinheiro para recuperar a Quinta e por isso a única saída é vender, como percebermos a não utilização deste dinheiro? Será que tentam evitar o ónus que recaí sobre os edifícios classificados, dado que o dinheiro solicitado ao FEDER foi Assim concluímos que com esta última deliberação a Câma- disponibilizado por haver a dita classificação?

4 – que no dia 6 de Julho de 2017 foi aprovada, em Sessão de Câmara e por unanimidade, a proposta de Classificação de Alburrica como Sítio de Interesse Municipal, publicada em DR DE 20 DE Julho de 2017, pelo Aviso n.º 820372917;

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Quinta do Braamcamp - Barreiro Quinta do Braamcamp Cronologia de Acontecimentos José Encarnação

1788 - 29 de Março - A exploração desta quinta, será concedido por carta régia datada pelo período de doze anos, a Geraldo Venceslau Braamcamp de Almeida Castelo Branco. .Geraldo Venceslau Braamcamp foi o primeiro proprietário da quinta situada no Mexilhoeiro, no Barreiro, onde se encontrava uma unidade corticeira. A quinta do Braamcamp tornou-se em vida do seu proprietário uma importante granja de criação de bichos-da-seda, produção destinada à indústria têxtil.

tem semelhante neste reino, e que talvez não haja nas outras nações». 1837 - À morte de Geraldo Venceslau Braamcamp, passou a quinta para a posse do seu filho segundo, Anselmo José Braamcamp, que a alienou. 1837 - Anselmo José Braamcamp trocou a quinta com Abraham wheelhouse a quem ficou pertencendo.

1844 - A quinta foi vendida pelo 1804 - Os herdeiros de Vasco Veloso, venderam o moinho filho George Abraham wheea Venceslau Braamcamp, Barão do Sobral, que o ampliou lhouse e Mulher Rosa Martha de 7 para as actuais 10 moendas, transformando-o num wheelhouse á herança indivisa dos maiores moinhos de maré do estuário do Tejo. Ganha de Robert Hunter Raynolds Por a designação de Moinho do Braamcamp. 13,500$ mil-réis. Nas proximidades de Alburrica, mas no Bico do Mexilhoeiro, está o Moinho do Braamcamp. As informações que 1883 - Em Março. Tomás Reynolpossuímos referem a sua existência em meados do século ds já vivia na Quinta Braamcamp XVIII, altura em que o então proprietário, Vasco Lourenço e nesta data já era transformaVeloso, o reedificou, em virtude de ter ficado bastante dada cortiça na fábrica instalada nificado pelo Terramoto de 1755. na quinta. A maquinaria importada da Grã-Bretanha (da Baerlein e c.º em Manchester, que custou cerca de 123 1813 - O Abastado comerciante, recebeu o título de 1º ba- mil libras), como caldeiras e bombas para o fabrico de rão de Sobral. A quinta do Braamcamp tornou-se em vida pranchas, só chegou ao Barreiro no final de 1884, quando do seu proprietário uma importante granja de criação de a fábrica está em plena laboração, inclusive com horário bichos-da-seda, produção destinada à indústria têxtil. nocturno”. 1819 - Surge, um outro moinho de vento, desaparecido entretanto, o moinho do Barão do Sobral, na Quinta do Braamcamp. O engenho constituiu uma novidade, tanto ao nível da sua tecnologia de produção como da sua arquitectura. Tratava-se de um moinho de vento «que não

1884 - O moinho é vendido, já por George Abraham Wheelhouse a Robert Reynolds, compondo-se a propriedade então de: «casas de habitação, armazéns, casa que foi fábrica de bolachas, moinho e motor de água, terras de semeadura e diversas árvores» FUNDiÇÃO 11


Quinta do Braamcamp - Barreiro situação de salários em atraso, retirassem o processo de falência da empresa. O Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Corticeira do Sul denunciou publicamente esta «afronta», mostrando-se ainda mais surpreendido por o Estado ter concedido em Julho um aval de um milhão de contos, para contracção de um empréstimo.

1895 - John Reynolds vendeu o predio a The Cork Company Ltd. Pelo preço de 60.003 mil-réis. 1897- A The Cork Company Ltd. Vendeu a propriedade á Sociedade Nacional de cortiças pelo preço de 60.600$000 mil-réis. 1897 - A antiga Quinta do Braamcamp, que no final do século XIX era conhecida por Quinta dos Ingleses (por ter pertencido a diversas famílias de origem britânica), foi adquirida pela Sociedade Nacional de Cortiças em 1897, que adaptou o edifício do moinho às suas actividades industriais, função que mantém até à actualidade.

2005 - 21 de Abril, A AIEC — Associação dos Industriais e Exportadores de Cortiça, em 21 de Abril de 2005, elege para mandato de três anos o Presidente Direcção — ESENCE — Sociedade Nacional Corticeira, S. A., representada por Edmundo Luís Rodrigues Pereira.

2008 - 4 de Julho. A empresa Corticeira ESENCE Socieda1986 - O moinho do Barão do Sobral, na Quinta do Braa- de Nacional Corticeira, S. A foi declarada insolvente por mcamp, foi totalmente destruído durante o incêndio que decisão judicial proferida pelo Tribunal de Comércio de devastou a Sociedade Nacional de Cortiças. Desta cons- Lisboa. trução nada sobreviveu, a não ser a documentação que atesta a sua importância, no contexto do processo proto-industrial português.

2010 - O seu património foi vendido em leilão, sendo que 3 empresas da área de actividade sucateira adquiriram o 1973 - O Sr. Edmundo Luís Rodrigues Pereira, encarregado geral da fábrica adquire 15% da Sociedade Nacional Cor- recheio da fábrica, equipamentos, máquinas, ferramentas, etc…, e o terreno foi adquirido pelo BCP. ticeira, S. A. 2010 - 24 de Março, A Associação Barreiro- Património, Memória e Futuro, envia uma carta á CMB, para através dos Serviços Municipais competentes, desenvolver todas as acções pertinentes de modo a assegurar a recolha de alguns dos bens referidos visando preservar a Memória 1998 - 26 Novembro o responsável do Grupo Esence - futura. Foi recolhido vasta documentação e outros mateSociedade Nacional Corticeira foi acusado de actuar de riais da fabrica de cortiça que se encontram no Arquivo da má-fé, porque se comprometeu a pagar cerca de 30 mil CMB, no Espaço Memoria. contos relativos a indemnizações até 30 de Outubro, se os trabalhadores da fabrica de cortiça do Montijo Infal, obri- 2010 - 28 de Março A administradora da massa insolvengados a rescindir os contratos devido ao arrastamento da te, cessa funções e entrega a quinta ao Banco Comercial Português (BCP), ficando a quinta ao completo abandono. 1978 - O Sr. Edmundo Luís Rodrigues Pereira, comprou aos três sócios a totalidade das quotas da Sociedade Nacional Corticeira, S. A. Assumindo a administração da fábrica de cortiça.

FUNDiÇÃO 12


Quinta do Braamcamp - Barreiro 2011 - 18 de fevereiro de 2011, um incêndio criminoso, BE, do PSD, do MCI, do MRPP e de 5 eleitos do PS e a absdestruiu o célebre Moinho do Braamcamp, no Bico do tenção de 3 eleitos do PS. Mexilhoeiro. 2016 - 9 de Fevereiro, foi assinado, pelas mãos do presidente da Câmara do Barreiro, Carlos Humberto e por João Góis, diretor do negócio imobiliário do Millennium BCP, o contrato de compra e venda dos terrenos da Quinta do Braamcamp. 2016 - Dezembro de 2016, Foi realizada a escritura de venda da Quinta do Braamcamp, pelo valor de 2 milhões e 900 mil euros. 2017 - 6 de Julho A CM do Barreiro a aprova a decisão final do procedimento de classificação como SIM do Sítio de Alburrica e do Mexilhoeiro e seu Património Moageiro, 2011 - 6 de Março, A Associação Barreiro- Património, Ambiental e Paisagístico. Memória e Futuro, Indignada com a situação de abandono do património e incêndio Moinho na quinta do braam- 2017- 20 de julho é publicada no Diário da República, 2.ª camp, protesta e faz um comunicado á população e uma série — N.º 139 A Classificação do Sítio de Alburrica e petição onde recolhe mais de 700 assinaturas, que entre- do Mexilhoeiro e seu Património Moageiro, Ambiental gou ao Banco, CMB, DGPC, etc. e Paisagístico. A decisão final de classificação de Sítio de 2011 - 23 de Setembro, um grande incendio destrói a casa apalaçada, vários armazéns e uma quantidade enorme de palmeiras centenárias. Por ordens de não se sabe de quem, os bombeiros apenas assistem ao incendio, garantido a segurança. 2011- Durante este período de abandono, todo o terreno foi saqueado e limpo de metal e outros materiais, pelos “amigos do alheio”. e o seu património todo destruído.

Interesse Municipal, constitui reconhecimento do interesse Histórico Industrial, Ambiental e Paisagístico e do seu caráter emblemático.

2017 - Outubro – Eleições autárquicas, a Proposta eleitoral do PS, apontava, mais que uma promessa era “uma visão” para o território da Quinta do Braamcamp, que integrava um parque temático, com um investimento numa roda gigante. 2018 - 16 Março O presidente da Câmara do Barreiro, Frederico Rosa, afirmou que pretende ter definido, até meio de 2019, o projeto para a Quinta do Braamcamp, referindo que o espaço terá habitação, hotelaria e restauração, mas abertos à cidade. Frederico Rosa (PS) esteve presente na feira internacional de imobiliário, o MIPIM, que decorreu esta em Cannes, na França, onde aproveitou para reunir com investidores que podem estar interessados no projeto.

2015 - 4 de novembro, A Câmara Municipal do Barreiro aprovou, unanimidade no dia 4 de novembro, em reunião privada, a compra da Quinta do Braamcamp. Permitindo a abertura de 21 ha de frente de rio a fruição da comunidade - Representando a disponibilização pública de um espaço do qual não existe memória coletiva de fruição; Retirando-o do mercado imobiliário e afirmando um discurso e uma estratégia de fruição pública, generalizada, duma zona privilegiada do concelho,

2019 - 6 de Março, O actual executivo PS da CMB decide que vai colocar á venda a totalidade da Quinta, através de um concurso publico, (hasta publica), Tendo discutido na ultima sessão de câmara no dia 6 de Março 2019, as condições para a venda a privados.

2019 - 31 de Março um grupo de cidadãos do barreiro convoca uma reunião cidadã “Braamcamp é todos, bastante participada” onde foi aprovado por unanimidade a constituição de uma plataforma "Braamcamp é de todos" A iniciativa decorreu durante todo o dia com varias actividades, Birdwatching na Quinta, actividades com crianças, 2015 - 20 de novembro, Reunião ordinária da Assembleia Visita guiada à Quinta, Almoço/Piquenique e Reunião CiMunicipal Realizada em 20 de novembro de 2015 Autori- dadã, com a participação de vários oradores. za a aquisição da Quinta do Braamcamp pelo valor de € 2.900.000,00, aprovando a respectiva minuta de contrato. Aprovado por maioria, com 27 votos a favor da CDU, do FUNDiÇÃO 13


Património Alburrica - Barreiro O legado árabe e islâmico no Barreiro: as salinas na zona de Alburrica Natália Maria Lopes Nunes

Como membro da Associação Barreiro – Património,

Memória e Futuro, e colaboradora da revista Fundição, como já referi na revista anterior, irei apresentar, ao longo de alguns números da revista, o que sobreviveu, no Barreiro, do património de influência árabe e islâmica. Neste caso, sendo o novo número da revista dedicado à zona da Alburrica, considerámos importante destacar uma actividade que outrora fez parte da paisagem do Barreiro, as salinas. Para alguns investigadores, no país, a produção de sal remonta aos finais do Neolítico ou ainda ao Calcolítico. Segundo estudos arqueológicos, no Barreiro, na Ponta da Passadeira, foram encontrados vestígios dessa produção.

uma utilização, não apenas para a cozedura das cerâmicas, mas também para o processo de fabricação de salmoura. 2 Não existe abundante documentação sobre a exploração do sal no al-Andalus, mas alguns geógrafos árabes e outros autores, como por exemplo, al-Himyari, dão-nos informações sobre esta temática. Porém, os dados sobre o consumo de sal no al-Andalus são frequentes e estão presentes essencialmente nas referências gastronómicas, nomeadamente em alguns tratados de culinária, mas também em tratados agronómicos e de medicina, sobretudo na Medicina Profética.

A título de curiosidade, na Medicina Profética, o uso do sal, de forma moderada, tem diversas propriedades, nomeadamente purgativas e vomitivas, abre o apetite, conserva as carnes e o peixe e melhora o paladar de outros produtos ou substâncias. Além disso, é um excelente remédio contra as picadas de escorpiões ou de outros animais. Sobre isso, segundo os ditos do Profeta, o sal era o melhor condimento. Um autor conta que um dia, quando o Profeta se prosternava para fazer a oração, foi picado por um escorpião. Então, mandou que lhe arranjassem um recipiente com água e sal e nele mergulhou o dedo e declamou palavras do Corão até que a dor passasse. O próprio médico Ibn Sina, conhecido por Avicena, recoNa Idade Média, para os árabes, o sal continuou a ter um mendava fazer uma cataplasma de sal com grão de linho papel fundamental na conservação dos alimentos e ain- e colocar sobre a picada do escorpião, visto o sal ser um da nos banhos terapêuticos.1 A nível terapêutico, ele é antítodo para o veneno.3 também mencionado na Medicina Profética, sendo igualmente uma substância usada na magia, como elemento É ainda de referir que, durante essa época, a exploração protector (colocado nos cantos da casa). Mas, ao longo do sal estava a par da exploração agrícola de regadio e dos séculos, o sal continuou a ter um papel importante ainda da criação de gado. Essa exploração, para além das até à actualidade. zonas mais costeiras, era feita também em regiões mais

O sal é conhecido desde a Antiguidade e, ao longo das épocas, tem tido um papel fundamental, sobretudo na conservação dos alimentos, quer de carne, quer de peixe. Curiosamente, na Antiguidade, os gregos ofereciam-no aos deuses; os egípcios usavam-no nos processos de mumificação; os fenícios fizeram do sal um produto de troca a nível comercial, trocando-o por estanho, âmbar, etc.; os romanos, comercialmente, também lhe deram uma grande importância, havendo mesmo uma via conhecida por Via Salária. Na Península Ibérica, os romanos desenvolveram muito o fabrico da salmoura e do garum.

No Barreiro, segundo Joaquina Soares, relativamente ao povoado da Ponta da Passadeira, há a salientar a presença de taças carenadas e troncocónicas de fundo plano e ainda de corniformes, singulares, em cerâmica que apresentam evidências de exposição ao fogo, após o seu fabrico (SOARES, 2001, p. 119). Os dados arqueológicos mostram, então, o uso de cerâmicas para a evaporação de água salgada. Contudo, alguns fornos na zona atestam também 1

interiores, sobretudo tendo em conta uma agricultura baseada no uso da água.

Contudo, para a exploração de sal, o clima é muito importante, quer a nível do sol, quer dos ventos e, visto o nosso clima ser mediterrânico, ele foi (e ainda é) importante para esta actividade. Esta, para além de já existir em séculos anteriores, pois existem referências escritas já no século XII, teve um papel importante, sobretudo entre os

ZUHR, Abū Marwān Abd al-Malik b., Kitāb al-Agḏiya (Tratado de los alimentos), (Fuentes arábico hispanas, 4), GARCÍA SÁNCHEZ, Expiración (ed., trad.), Madrid, Consejo Superior de Investigaciones Científicas e Instituto de Cooperación con el Mundo Árabe, 1992, p. 67. 2 Cf. SOARES, Joaquina, “O povoado pré-histórico da Ponta da Passadeira: economia ribeirinha dos IV/III milénios a.C.”, in Arqueologia e História Regional da Península de Setúbal, Discursos, número especial, Língua, Cultura e Sociedade, Lisboa, Universidade Aberta, 2001, p.101 e 119. SOARES, Joaquina (2013), “Sal e conchas na Pré-História portuguesa: o povoado da Ponta da Passadeira (Estuário do Tejo)”. SOARES, Joaquina (Ed.), Actas da conferência internacional sobre a Pré-História das zonas húmidas: paisagens de sal/Prehistory of wetlands: landscapes of salt (Setúbal, 19 a 21 de Maio de 2011), in Setúbal Arqueológica, vol.14, Setúbal, Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal/Assembleia Distrital de Setúbal, p.171. 3 Cf. AS-SUYŪTĪ, Jalāl ad-dīn, La Médicine du Prophète Mouhammad, PERRON, A. (trad.), édition revue et corrigée, Bruxelles, Éditions Al-Imen, 2013.

FUNDiÇÃO 14


Património Alburrica - Barreiro séculos XIII e XV, na região de Granada. Mas, como sabemos, também em Portugal as actividades ligadas à exploração do sal tiveram uma grande importância na economia do país. A actividade salineira deveu-se também ao desenvolvimento económico e comercial das regiões, estando essa actividade também relacionada com o pescado, pois o sal era necessário para a salga do peixe de forma a preservá-lo. Exemplo disso, e como já referimos anteriormenre, é o conhecido garum, já preparado no período romano, mas que os árabes continuaram a desenvolver. Porém, estas práticas já eram conhecidas antes dos romanos, nomeadamente dos fenícios e púnicos.4 Em Portugal, e mais próximo do Barreiro, a nível arqueológico, são bem conhecidos os tanques de salga do pescado em Lisboa (Casa do Bicos, Fundação José Saramago) e, na Serra da Arrábida, nas ruínas do Creiro, ou em Tróia, actividade iniciada pelos romanos e continuada pelos árabes. Assim, a actividade salineira também esteve intimamente ligada à pesca e o comércio foi um factor fundamental que veio impulsionar a criação de salinas. Por outro lado, já nos séculos IX, X e XI, as relações com o Magrebe intensificaram o comércio e, consequentemente, a economia. Assim, com estas viagens, o comércio marítimo, que incluiu o sal, começou a intensificar-se entre a Penísula Ibérica e o Norte de África. Al-Rāzī (século X), al-Bakrī (século XI) e al-Idrīsī (século XII) são autores que nos dão abundantes referências sobre o desenvolvimento desse comércio marítimo. A produção de sal foi, pois, muito desenvolvida pelos árabes, durante o período do al-Andalus, sobretudo entre os séculos XI e XII e, depois, pelos mouriscos em séculos posteriores. Para o estuário do Tejo, há um registo da exploração de sal no século XIII, embora essa exploração já fosse feita em épocas anteriores. 5 No Barreiro, começando pelo próprio nome Alburrica, claramente de origem árabe (mesmo que este topónimo tenha surgido depois), como refere José Pedro Machado na pesquisa Vocabulário Português de Origem Árabe, publicado em 1991. Segundo esse estudo, a palavra Alburrica teria derivado do vocábulo árabe al-barriqā, cujo significado é brilho ou esplendor. A zona de Alburrica abrange uma área fluvial razoável, dela fazendo parte a praia do Clube Naval e o Bico do Mexilhoeiro. Na Idade Média, está documentada a exploração de salinas na região, cujas caldeiras foram depois aproveitadas para os moinhos de maré aí implementados e ainda presentes na paisagem actual do Barreiro. A exploração salineira de Lisboa fazia-se quer na margem

direita a Norte do Tejo (de Loures a Vila Franca), quer na margem esquerda a sul do Tejo (desde o Barreiro até Alcochete). Barreiro, Moita, Montijo e Alcochete tinham uma importante exploração salineira. Esta exploração fez nascer uma extraordinária actividade ribeirinha com efeitos económicos, quer a nível do país, quer a nível internacional. Em 1932, sabe-se que existiam ainda cerca de 61 marinhas na zona do Barreiro. Actualmente, com o seu desaparecimento, na zona de Alburrica, apenas restam alguns vestígios desse passado. Este deveria ser valorizado e preservado, talvez até numa perspectiva de musealização, para que as gerações mais novas conheçam esses espaços que constituem o património e a memória colectiva de Alburrica, ou, numa perspectiva mais alargada, do Barreiro e do próprio país.

Além disso, a actividade salineira expandiu uma série de ofícios que, com a extinção da actividade, também desapareceram. A título de exemplo e de curiosidade, destacamos o marnoteiro (encarregado geral da marinha); o contra-mestre (fazia a distribução da água, nas marinhas maiores); a seguir a este último, o repartidor de água ou redor; o amoiador (enchia as canastras de sal); o carregador (transportava as canastras à cabeça). A paisagem do Barreiro, e da zona da Alburrica em especial, era, por isso, completamente diferente, mas muito intensa. Para além da pesca, as actividades salineiras e moageiras eram as principais actividades ribeirinhas, razão pela qual houve um grande desenvolvimento dessa zona junto do rio. Como tal, antes que essa memória desapareça de vez, é urgente que toda a população do Barreiro tenha consciência da sua importância, de forma a que todo este património seja preservado e explicado aos mais novos. Por outro lado, o Barreiro, tal como outras regiões do país, foi herdeiro de um saber ancestral, a exploração salineira, desenvolvida activamente pelos árabes e mouriscos e cujo legado chegou até nós através do séculos, constituindo o património do Tejo em Portugal.

Cf. PONSICH Michel y TARRADELL Miguel: Garum et industries antiques de salaison dans la Méditerranée occidentale, Paris, 1965. DIAS, João José Alves (Ed.), Chancelarias Portuguesas: D. João I, Vol. 2, Tomo I, Lisboa, Centro de Estudos Históricos da Universidade Nova de Lisboa, 2005. 5 DIAS, João José Alves (Ed.), Chancelarias Portuguesas: D. João I, Vol. 3, Tomo III, Lisboa, Centro de Estudos Históricos da Universidade Nova de Lisboa, 2006. 4

FUNDiÇÃO 15


Património Cultural - Barreiro Contos e Cantos da Fábrica e da Terra Armando Sousa Teixeira

O cumprimento acanhado e o convite célere não tive-

como dádiva da Natureza.

As raparigas nem se dignaram responder, depois de um relance rápido pelo interlocutor, magro e alto, que não as entusiasmava notoriamente. Tinham sido mais simpáticas a dançar nos “bailaricos de garagem”, em tempos não muito distantes.

Lá estava o avião catavento que o avô Simplício oferecera a outrem e que tanta inveja lhe fizera, espetado num poste à entrada das barracas de apoio de pesca, construídas do lado da caldeira, em terrenos da Quinta Braamcamp.

* Alcançadas as últimas casas pertencentes à fábrica de cortiça dos “Ingleses”, onde morava o filho do encarregado - Não querem vir dar um mergulho ao Bico do Mexilhoei- da fabricação de aglomerados, acabava o caminho e coro? meçava o istmo das areias douradas. ram grande receptividade:

Arranjinho, pensou o viandante, que prosseguiu na direcção anunciada, com uma ponta de constrangimento pela reacção pouco amistosa. Não contava que o acompanhassem, poucos gostavam do caminho para o Bico, passando pelo “muro partido”, mas pelo menos uma dica para se juntar à “festa” teria ficado bem. Sempre seriam dois para duas e tinha, de facto, impressões para trocar com o Carlos sobre a Comissão de Jovens, em criação algo atribulada.

À velocidade “warp” como nos filmes de ficção, os pensamentos voaram para os anos da infância, não muito distantes. - Avô! Não me oferece o avião que está a construir em madeira? - Está prometido ao menino José, filho do encarregado a quem devo muitos favores!

- Mas avô … Podia fazer outro, esse está tão bonito! – o Paciência, já estava habituado às “negas” que a vida ia infante mostrava uma verdadeira predileção pelo objecto carreando, contra a vontade firme de agir em conjunto atraente. e potenciar os sentimentos gregários e progressistas da malta jovem. Estes pensamentos fluíam mais claros pelo - O prometido é devido! Depois faço outro para ti. efeito da brisa suave que acariciava o corpo em tarde de calor intenso, caminhando sobre as pedras irregulares do O ancião já estava demasiado velho para repetir a habilimuro, rumo ao Mexilhoeiro, como era tradição da malta dade de talhar em madeira um modelo de um caça inglês, desde as tardes da pré-adolescência. da 2ª Guerra Mundial, cuja hélice avantajada rodava livremente com o vento, fazendo mudar o conjunto montado O silêncio telúrico e a paisagem magnífica e luminosa do sobre um eixo solidário, indicando a direcção do sopro rio verde-escuro, raiado pelo Sol em tons doirados, e do predominante na rosa-dos-ventos. céu azul sem mácula, onde as gaivotas evoluíam em genuína liberdade, que os homens não tinham, elevavam Representava meses de trabalho delicado a partir de um profundamente a alma, num raro momento de felicidade FUNDiÇÃO 16


Patrimóno Cultural - Barreiro

tronco de madeira de pinho, levando as asas embutidas a preceito, até com a quilha da cauda airosa, tudo pintadinho com as cores e emblemas originais. A recusa fora uma grande frustração para o moço-neto, justificada pelo facto do encarregado-geral ter permitido o estacionamento do barco da família, o “Maria Emília”, na área adjacente à Sociedade Nacional de Cortiças, onde alguns funcionários foram autorizados a construir apoios de praia e de pesca. A canoa de quatro metros e meio lá apodreceria, abandonada depois do avô morrer, sem ter construído um novo modelo do avião catavento, solicitado pelo neto que mais o acarinhou nos últimos anos de vida. Um desgosto perene no meio de tanta satisfação que as suas histórias proporcionaram na formação da consciência e na compreensão do mundo. * Quando o muro acabava, para além da barraca de madeira da família do último pescador profissional do Tejo, havia uma pequena enseada com um fundão, antes das ruínas do velho ancoradouro do Mexilhoeiro, só visíveis na maré baixa. Apesar da areia dourada convidativa, a prainha tinha uma única frequentadora que acabava de sair da água límpida na maré alta. - Mabel! Não esperava encontrar-te, há quanto tempo não te via! - Olá, Luís! O que fazes por aqui?... - Este é o meu caminho habitual para o Bico! Posso fazer -te companhia? - Podes! A praia é livre!

vem sentiu um imenso remorso, uma solidão enorme, do tamanho da praia que se estendia ao longo do cordão dunar, tão frágil e tão formoso como a menina que partilhara a infância inocente e a pré-adolescência fervorosa. * Aquela restinga comprida de areia fina, em grande parte coberta por arbustos resistentes à água salgada, no vulgo denominados “salgadeiras”, formada por aluvião desde há milhares de anos, criando um sapal interior na forma de caldeira, viveiro biológico fundamental para a vida do rio, corria sérios riscos. Os novos barcos com motores de combustão, mais rápidos e com maior potência deslocada, ao serviço desde os inícios da década de 60, estavam a desenraizar as plantas endógenas e a pôr em risco aquele paraíso milenar que já tivera uma produção abundante de moluscos – os mexilhões. Outra circunstância recente e danosa estava a piorar a situação do istmo dunar: o pisoteio da cavalaria da GNR, fazendo do espaço um picadeiro para treinar os cavalos que garantiam a garupa na vigilância repressiva da vila. Omnipresente, a Guarda Nacional Republicana, ocupante militar desde 1943, fazia o que lhe apetecia e não havia quem a confrontasse, sobretudo o poder camarário situacionista e reaccionário. Restava a “vox populi”, que nos subterrâneos da liberdade, ia conspirando, criticando, denunciando, inspirada pela luta democrática e antifascista. Num ponto mais adiante, na curva do caminho arenoso e dourado, o mergulho na água fresca e límpida do Bico, acalmava o ânimo exaltado e a emoção constrangida dos vinte anos inconsequentes de amores perdidos, ou ainda não encontrados, e tão urgentes. Incluindo o intrínseco e imperativo amor pela Liberdade ainda em construção, tão perto e tão longe de Abril de todos os contentamentos.

Saiu da água mostrando um corpo cheiinho e bem delineado num fato de banho clássico, as faces rosadas e um PS. Trecho extraído do livro, “1969, NA TUA JUVENTUDE A sorriso envergonhado. Quando o encarou, bailava uma FORÇA DO POVO”, em publicação nos 45 anos da Revolupequena lágrima naqueles olhos azulados e bonitos que ção de Abril. tinham encorajado momentos de felicidade fugaz e o joAbril/2019 FUNDiÇÃO 17


Património Cultural - Barreiro As Quintas da “Outra Banda”

1

Ana Sofia Farinha da Silva Arquiteta Paisagista “Outra Banda”

A “Outra Banda” engloba os seis concelhos ribeirinhos da “Margem Esquerda do Tejo” da Península de Setúbal, que durante épocas tiveram esta designação, em oposição à grande Lisboa, e compreende os concelhos de Almada, Seixal, Barreiro, Moita, Montijo e Alcochete.

História

A “Outra Banda” é um território que se destaca pela sua história e evolução singular, intimamente relacionada com o Tejo e com a capital, tendo tido um papel fundamental no desenvolvimento da grande urbe de Portugal. Essa particularidade é uma permeância no desenvolvimento das povoações da “Margem Sul do Tejo”, que até ao início do século passado, se caracterizavam principalmente pela sua ruralidade. Da vila do Seixal à vila de Alcochete, todo o solo é uma quinta seguida; é o jardim da margem esquerda do Tejo, recortado por variados seios, cujas beiras são banhadas pelas águas do rio (…). Carlos Ribeiro, Descrição do Terreno Quaternário das Bacias dos rios Tejo e Sado, Mem. Com. Geol Portugal, 6, 1866, p.162.

Quintas

Até ao início do século XX, as paisagens da “Outra Banda” estruturavam-se em diferentes tipos de unidades de exploração, como as cercas, as quintas e os casais, das quais se destacavam as quintas, quer pela quantidade, quer pela diversidade de tipologias. Nessas unidades estruturantes de paisagem, de entre as várias atividades e produtos, predominava o cultivo da vinha, a extração do sal e a madeira, para a lenha e construção, tradicionais produtos da “Margem Esquerda do Tejo”, essenciais à subsistência da capital. Devido às condicionantes locais das paisagens, estas unidades apresentavam dimensão e distribuição distinta de acordo com a sua posição geográfica: a poente da “Outra Banda” as unidades de exploração eram no geral pequenas e mais densas (minifúndio); já a nascente da “Outra Figura 1 - Jardim de buxo e vinha, Quinta da Estalagem, conceBanda”, as unidades eram maiores e em menor quantida- lho do Barreiro (Ana Sofia Silva, 2018) de (latifúndio), concentrando-se geralmente nas proximidades das linhas de água. As restantes unidades distribuíam-se geralmente ao longo das principais linhas de água, criando uma faixa que acompanha as margens do Tejo e esteiros, tirando partido das condições locais. O Tejo servia tanto como meio de ligação direta, entre margens, como também de separação, permitindo o distanciamento da “Outra Banda” da vida agitada e, por vezes, pestilenta da grande urbe, uma vez que sempre que necessário, a navegação podia ser suprimida por decreto Real. Este isolamento, intencional e procurado, levou a que algumas quintas da “Margem Esquerda do Tejo” incorporassem para além das componentes produtivas, outras de recreio, dando forma às Quintas de Recreio. 1

O seguinte artigo tem como fonte a minha tese de mestrado, “As Quintas da “Outra Banda”: de um passado rural a um futuro cultural”, disponível para consulta em: http://dspace.uevora.pt/rdpc/handle/10174/23977.

FUNDiÇÃO 18


Património Cultural - Barreiro À volta das cidades, de Norte a Sul de Portugal, relacionadas com a vida urbana e elo desta com o mundo rural, encontramos as «quintas de recreio» que são microcosmos que repetem, num lugar ameno e com muita água, os elementos fundamentais da grande paisagem: a horta, o pomar, a mata, o jardim de flores e aromas. Gonçalo Ribeiro Telles, “Conservar a Paisagem”, in Gonçalo Ribeiro Telles, Testos Escolhidos, Lisboa, Argumentum, 2016, p.148.

Quintas de Recreio

As Quintas de Recreio, que se difundiram pelos arredores de Lisboa, serviram assim para o recreio dos membros de grupos sociais dominantes, que habitavam a capital. Independentemente da época, estrutura, componentes e feições estilísticas, mata, pomar / horta e horto de recreio são os componentes fundamentais de todas as Quintas de Recreio. A articulação destes diferentes subespaços fazem com que a Quinta de Recreio se apresente estruturada e compartimentada por zonas de produção e lazer. Nestas unidades privilegiam-se as panorâmicas sobre a envolvente rural, a intimidade, resguardada por vezes por janelas gradeadas e, principalmente a amenidade, atenuando o rigor do sol e das elevadas temperaturas, típicas do sul de Portugal.

Figura 2 - Pátio, Quinta dos Pianos, concelho de Almada (Ana Sofia Silva, 2018)

Numa típica Quinta de Recreio identificam-se as “arquiteturas do prazer”, como os caramanchões e as casas de fresco, entre outros elementos, como os miradouros ensombrados, as latadas, as conversadeiras e alegretes, revestidos muitas vezes a azulejos, quando não rebocados e pintados, por vezes justapostos a peças de água como poços, tanques, fontes, bicas e cascatas, quando não a outros artifícios hidráulicos originais, eficazes moderadores climáticos. Nestas quintas, soluções arquitetónicas, grupos escultóricos e exemplares botânicos raros, entre outros, demonstravam mais do que o requinte, o quanto abastados eram os seus proprietários. A “Outra Banda” foi assim lugar de eleição para o lazer Figura 3 - Zona de estadia, Quinta do Álamo, concelho do Seixal tanto pelo isolamento garantido, como pela amenidade (Ana Sofia Silva, 2018 climática, qualidade paisagística, potencialidades recreativas e até mesmo condições excecionais para práticas venatórias.

Contemporaneidade

Atualmente, do passado rural e de recreio da “Outra Banda”, subsistem poucas quintas intactas. O seu valor patrimonial nem sempre foi reconhecido, tendo as mesmas sido esquecidas, desvalorizadas e destruídas. Recorde-se a fragilidade destas unidades mutáveis: sujeitas a contextos ambientais, sociais e económicos críticos; condicionadas pelo envelhecimento e desgaste natural dos componentes; construídas por vezes com materiais locais pouco resistentes e duráveis; dependentes de ações de manutenção e conservação continuada; muitas vezes integrando estruturas efémeras; dependentes da mutação das componentes vivas; objeto de saque dos elementos arquitetónicos; sujeitas mais do que a pressões urbanísticas, ao desdém humano pelo seu património. Urge salvaguardar este património, estudando, inventariando, classificando, recuperando, gerindo e divulgando, envolvendo sempre a população e agentes locais. FUNDiÇÃO 19


Património Cultural - Barreiro Os exemplares que conseguiram perdurar até à contemporaneidade são casos excecionais, raros, testemunhos da resiliência da “Outra Banda”. Ainda se destacam alguns exemplos de quintas, por vezes adaptadas às necessidades de novos proprietários / entidades gestoras e cumprindo funções distintas. Atualmente constata-se na “Outra Banda” que as quintas sob domínio público são as unidades mais bem conservadas, embora deixado de ter função de Quinta de Recreio, mas substituindo em contexto urbano como polos culturais, onde se tenta preservar os sistemas e as dinâmicas associadas, nos quais para além das atividades pedagógicas, se tenta preservar o património histórico, paisagístico, arquitetónico local e regional, potenciando os saberes ancestrais, as tradições e as memórias de um passado muitas vezes ignorado, e cada vez mais afastado dos cenários rurais. Nesse sentido é de mencionar a Quinta dos Pianos (Solar dos Zagallos), no concelho de Almada, e a Quinta da Fidalga, no concelho de Seixal. Com principal destaque para a Quinta da Fidalga, que surpreende pela identidade e coerência conceptual, pela originalidade, integridade, quantidade, diversidade e complexidade de elementos e soluções nos diferentes sistemas, afigurando-se como notável dentro de um contexto regional e até nacional.

Quinta da Fidalga Grande parte das construções e estruturas que integram

os jardins, as hortas e os pomares da quinta são resultado de intervenções profundas de meados século passado, sob projeto de Raul Lino. Nesta intervenção, o arquiteto recorreu a materiais tradicionais e a soluções convencionais procurando recriar a “Casa Portuguesa” e o “Jardim Português”, integrando contributos de várias épocas, muitos deles resultantes de reaproveitamentos e reintegrações.

As intervenções realizadas por Raul Lino procuraram também conciliar novas correntes estéticas com as componentes do passado. Neste sentido é de mencionar, pela originalidade, a icnografia utilizada em algumas peças da quinta, na qual está evidente uma ideologia concreta de época associada à propaganda desenvolvida pelo Estado Novo, onde sobressai a importância de Portugal nos Descobrimentos.

Figura 4 - Jardim de buxo e Casa de Fresco, Quinta da Fidalga, concelho do Seixal (Ana Sofia Silva, 2018)

Também pela originalidade e singularidade se evidencia na estrutura da Quinta da Fidalga o tanque de maré, alimentado pela água do esteiro na maré cheia, podendo ser esvaziado na maré baixa. Esta estrutura de recreio era utilizada, no passado, para as pescas de recreio e passeios de barco, e também servia de viveiro. É de referir que, para além desta estrutura de recreio, só conhecemos outras três com algumas afinidades na “Outra Banda”: o tanque de maré na Quinta do Antelmo, também referido como a “piscina da rainha D. Amélia”, em muito mau estado de conservação; o lago de maré na Quinta da Princesa e Infanta, onde sobressaem os pequenos ilhéus edificados no seu centro; e o lago de maré na Quinta da Atalaia, ao abandono.

Figura 5 - Taque de maré e Casa de Fresco, Quinta da Fidalga, concelho do Seixal (Ana Sofia Silva, 2018)

A importância destes elementos acresce, uma vez que fora da “Outra Banda”, até à data, não conhecemos estruturas semelhantes, sendo o tanque de maré da Quinta da Fidalga o único exemplar que se preserva em bom estado de conservação.

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Património Cultural - Barreiro O Património Cultural e o Desenvolvimento Local A. Melo de Carvalho

1- A desvalorização do património cultural A compreensão de que o património cultural e industrial pode constituir um importante factor de desenvolvimento local, está longe de ter sido adquirida por parte das populações e dos seus representantes políticos. Em Portugal, é bem visível que ainda há um largo caminho a percorrer, para que o património cultural comece a ser tomado em consideração como instrumento privilegiado, capaz de fornecer uma contribuição importante para o desenvolvimento global e local, e não somente como instrumento de crescimento económico da comunidade. Contudo, mesmo tomando unicamente em consideração a integração do património na dinâmica económica, este valor potencial assume uma importância indiscutível em termos de recurso turístico/cultural.

nifesta qualquer tipo de respeito quer pela defesa do ambiente, quer por um turismo cultural que deve ser colocado ao serviço das populações. Esta situação é particularmente visível no Algarve, em que, em muitas situações, a especulação imobiliária pôs em causa o próprio turismo com um mínimo de qualidade atractiva, quando afinal, era este que se pretendia temas de produção proto- desenvolver. Mas, na reali-industriais e industriais e dade, encontra-se por todo de formas culturais de vida o país. passada, deve-se a uma visão com falta de conhe- 2- As novas formas de rescimento histórico, e que é posta ao desenvolvimento marcada pela indiferença perante os valores identi- O processo de mundialitários da comunidade local. zação da economia verifiTrata-se de uma situação cado nas últimas décadas, que se exprime por todo o que levou à deslocalização país, sendo bem demons- acentuada da industria, trada pelo estado de gene- provocou graves prejuízos ralizado abandono em que na vida das cidades mais muitos destes vestígios industrializadas: o desemse encontram. Olhados prego, a perda da capacidano presente, como ruínas de de desenvolvimento e imprestáveis, reduzidas a o retrocesso da qualidade muros caídos, madeira po- de vida. Em praticamente dre e cacos, são abatidos todo o “mundo ocidental sem hesitação, devido à desenvolvido”, as cidades ignorância do seu real valor historicamente marcadas patrimonial, e à voracidade pelo processo de indusdos oportunistas promoto- trialização, perderam essa res do imobiliário. característica e tiveram de

É por isso que é necessário chamar a atenção para uma atitude marcada fortemente pelo oportunismo político, pela falta de cultura e pela ausência de conhecimento daquilo que deve estruturar o procesA desconsideração gene- so de desenvolvimento ralizada dos vestígios pa- de uma comunidade, cetrimoniais em ruína, que dendo, quase sempre, aos representam testemunhos interesses da especulação de vida, de trabalho, de sis- imobiliária, que não ma-

recorrer a novas perspectivas de desenvolvimento.

Entre estas novas formas, encontramos a utilização dos recursos patrimoniais que resultaram da desactivação de antigas fábricas, ou dos legados de um passado mais ou menos longínquo, que passaram a ser considerados como formas de valorização do turismo

cultural. De facto, estes vestígios, representados por edifícios com maquinarias, estruturas e peças de produção característicos de várias fases de industrialização, a que se juntam vestígios de construções várias vezes centenárias de cariz proto-industrial, religioso ou social, quando devidamente tratados em termos de um restauro correctamente concebido, interessam de modo acentuado a certos grupos de cidadãos com elevada capacidade económica, que os desejam visitar com o objectivo de conhecerem a sua história. Trata-se de uma população que está em acentuado aumento nas duas últimas décadas, podendo constituir um importante factor de obtenção de recursos, se for devidamente motivada a nível local. Esta valorização turística do património cultural, industrial, paisagístico e de natureza, passou a desempenhar um importante papel no relançamento dos processos de desenvolvimento sócio-económico e cultural. Contudo, tal só acontecerá se os recursos existentes forem devidamente valorizados num sentido dinâmico acolhendo novas formas culturais ( centros interpretativos, apresentação multimédia da história, museus especializados, centros didácticos e de investigação, etc.), constituindo poderosos centros de atracção para certos grupos de indivíduos, à escala internacional. FUNDiÇÃO 21


Património Cutural - Barreiro

É importante tomar em consideração que não se trata de um turismo de massas, frequentemente caracterizado pelo seu baixo poder de compra, mas especialmente caracterizados pelo seu poder destrutivo dos recursos e por servirem normalmente o interesse de investidores exteriores à própria comunidade. Esta situação, a predominar, assume sempre características contrárias às necessidades do desenvolvimento, na medida em que dá lugar, pelo menos, a três características negativas: exerce uma pressão ambiental destrutiva pondo em causa a qualidade do ambiente, afastando os turistas que procuram melhor qualidade; desrespeita a população local (“gentrificação”,ou seja, exclusão dos habitantes); aceita a imigração dos resultados financeiros obtidos, na medida em que é normalmente promovido por investidores externos à comunidade. O desenvolvimento deste tipo de turismo nos últimos tempos tem sido de tal modo intenso, e tem provocado estragos de tal monta, que tem levado à tomada de medidas drásticas de controlo dos visitantes.

ções que assumem um carácter puramente consumista, assentes exclusivamente na fruição recreativa, normalmente explorando as potencialidades locais sem qualquer preocupação cultural, e somente dirigidas à obtenção de lucros financeiros que pouco ou nada, se fixam na própria comunidade. O que se tem verificado quando prevalece esta situação, é que o próprio turismo assim concebido, acaba por se destruir a si próprio.

estratégias realistas, estruturando um projecto que parta da análise das potencialidades locais e defina ponderadamente uma estrutura faseada da acção a empreender. Por outro lado, quando se refere a necessidade da “sustentabilidade” deste projecto, tal significa que é indispensável concebe-lo de forma a respeitar integralmente o ambiente e os valores que caracterizam os elementos patrimoniais existentes, de modo a não comprometer o futuro desenvolvimento de todo o processo.

3- A necessidade de um projecto coerente e sustentado contra o oportu- Não é preciso realizar um nismo demagógico esforço especial, para compreender que uma persEspera-se que estas consi- pectiva de acção como derações tornem claro que aquela que é aqui defena visão aqui defendida, que dida, encontra pela frente parte do estudo daquilo um conjunto de obstácuque se tem passado nos los que, com demasiada últimos 30 anos à escala frequência, impedem que europeia, não é compatível ela se desenvolva. A prescom uma actuação precipi- são dos interesses exercida tada, casuística e elaborada pela especulação imobiliá“a olho”. Ou seja, não pode ria, constitui um deles. Toresultar de simples opi- davia, o mais importante niões mais ou menos ela- encontra-se na atitude daboradas, mas sem possuí- queles políticos que estão, rem a indispensável solidez, acima de tudo, preocupaque só um estudo pondera- dos com a “obra do mandado pode fornecer. to” e com a criação de uma imagem de um (falso) diDesta forma, quando se namismo, que em nada se fala de “coerência”, isto preocupa com o serviço púsignifica que é indispensá- blico democrático a prestar Isto significa que o que vel partir de um conceito à população. Alguns defendeve ser procurado não orientador, definir objec- dem que é preciso decidir consiste em promover ac- tivos concretos e elaborar com rapidez, sem estar

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com delongas complicativas, quando são confrontados com a necessidade de não se tomarem decisões sem a devida fundamentação, sem se aperceberem de que, desta forma, não só a decisão tomada só por mero acaso não é francamente negativa, como quase sempre põe em causa o futuro desenvolvimento da comunidade. Esta falsa capacidade de decisão, que tudo quer decidir sem análise crítica democrática, procura abrir caminho para todos os oportunismos políticos e pessoais. O país está cheio destes caudilhos ocasionais, que eleitos democraticamente, entendem que o poder que lhes foi confiado, deve servir os seus próprios interesses de afirmação política, considerando demagogicamente serem os seus interesses os que a população deve partilhar e defender. O argumento que é apresentado quase sempre por estes políticos, para se oporem com toda as forças à elaboração de um projecto devidamente estruturado por técnicos com provas dadas de competência, é de que “não há dinheiro”. Trata-se de um argumento sofismado, que é constantemente desmentido pelo vastíssimo conjunto de


Património Cultural - Barreiro

construções monumentais, autênticos “elefantes brancos”, que custaram milhões e milhões de euros, que pululam pelo país, em detrimento de um verdadeiro processo de desenvolvimento devidamente ponderado em termos locais. Recusam também considerar que um projecto desta natureza, se desenvolve faseadamente, de acordo com os meios disponíveis. Como estão empenhados fundamentalmente na sua afirmação a curto prazo ( é preciso ganhar as próximas eleições!), recusam pensar para além do mandato em que se encontram, procurando a todo o custo actuar a curto prazo, nada se preocupando com as consequências das decisões que tomam, para o futuro desenvolvimento da comunidade que os elegeu. De facto, põem-no directamente em causa, atraiçoando plenamente a razão de ser da sua eleição pela população.

aplicação, especialmente quando se pensa no Poder Local.

O que se pode começar por dizer, é que o desenvolvimento é um processo que parte do conhecimento da realidade e dos recursos que ela pode fornecer, para responder às necessidades de melhoria da qualidade de vida das populações locais. Trata-se de um processo de transformação concretizado por fases, ou etapas, cujo significado se deseja alcançar de antemão, a partir de um conjunto de hipóteses elaboradas a partir do estudo dos recursos que foram identificados como existentes. É, portanto, o contrário da acção improvisada a partir de interesses de sobrevivência política, concretizada essencialmente por decisões precipitadas, sem assentarem num estudo minimamente estruturado, tendo como resultado mais evidente o comprometimento das possibilidades futuras 4-Património, turismo e de um desenvolvimento desenvolvimento local: sustentado e coerente. mas afinal o que é isso? Evidentemente que as aqui designadas novas formas O leitor mais interessado de desenvolvimento, não mas desprevenido, per- podem deixar de respeiguntar-se-á: mas o que é tar a doutrina orientadoisso do desenvolvimento? ra dos processos de deTrata-se, de facto, de um senvolvimento global dos conceito corrente, mas que territórios. De uma forma é muito pouco utilizado no sintética, esta doutrina asnosso país em termos de senta nas seguintes linhas

básicas de orientação, da seguinte forma:

cesso de desenvolvimento que se deseja concretizar;

1- definição política, nos órgãos políticos democraticamente eleitos, das finalidades a alcançar pelo desenvolvimento que se deseja para a comunidade;

5- elaboração de uma proposta final, por parte da equipa técnica, dos objectivos orientadores para o futuro desenvolvimento da acção a empreender, integrando-os numa visão 2-estudo dos potenciais re- global do território; cursos de que o território em causa dispõe, sendo de 6- análise crítica, concretigrande importância asso- zada pelos órgãos políticos ciar as populações residen- existentes no território, do tes, na elaboração deste relatório que deve resuldiagnóstico; tar desta fase preparatória, de forma a corrigir, aper3-elaboração de um pré- feiçoar e estabelecer uma -projecto definindo ob- perspectiva de acção devijectivos e estratégias de damente estruturada; acção, que deve ser cuidadosamente apresentado à 7-decisão política final. população, criando condições capazes de garantirem É certo que esta forma de a sua participação demo- referir o desenvolvimencrática, depois de serem to é esquemática e simdevidamente esclarecidas plificadora do processo, em termos de uma real in- caracterizando-se por um formação prestada às insti- acentuado grau de comtuições e aos seus órgãos plexidade quando é posto sociais representativos- as- em prática. O que aqui nos sociações, comissões locais interessa consiste em fazer formadas ad hoc, participa- sobressair um conjunto de ção individual, etc. ; princípios que devem ser respeitados, para que ele 4- estudo rigoroso por par- se possa concretizar a favor te de uma equipa de téc- da comunidade. nicos reconhecidamente competentes, de cada um Em primeiro lugar, é indisdos recursos detectados e pensável compreender que dos resultados da consulta se trata de um processo alargada, com a finalida- globalizante, integrando de de determinar qual a necessariamente seis comcontribuição que possuem ponentes essenciais: ecopotencialmente para o pro- nómica, tecnológica, social, FUNDiÇÃO 23


Património Cutural - Barreiro política , cultural e ambiental. Em seguida, é indispensável partir da análise da própria realidade, definindo com clareza quais os recursos de que se dispõe. Em terceiro lugar, é necessário elaborar um projecto e definir estratégias de acção. Todavia, acima de tudo, é determinante a participação democraticamente elaborada. Como bem se sabe, a democracia pode assumir diversas configurações. E devemos ter especial atenção as que são referidas por aqueles que dela se pretendem apropriar em seu benefício. Assistimos demasiadas vezes ao simulacro da participação, em que, por exemplo, é convocada uma reunião da população, sem que esta saiba ao que vai e para o que vai. Cada um dos presentes fica com 5(!) minutos para intervir, não podendo voltar a fazê-lo, mas em que o político fica com o essencial do tempo para tecer as suas próprias considerações e impor os seus pontos de vista. O contraditório não é sequer permitido. Trata-se de um logro de que a democracia sai seriamente enxovalhada, pondo em causa o futuro da comunidade. 5- Utopia, ou simples realismo? O leitor pode responder a tudo isto afirmando que se trata de uma forma utópica de colocar a questão do desenvolvimento. Outra das objecções frequentemente levantadas, defende que “cada caso é FUNDiÇÃO 24

um caso”, e, por isso, não deve ser encarada a possibilidade de tratamento idêntico de realidades que são diferentes. Na verdade o número de objecções levantadas para se seguir um caminho idêntico àquele que foi defendido, são inúmeras: uns, afirmam que a democracia existe somente dentro dos órgãos eleitos e as populações só devem manifestar-se durante as eleições. Outros, consideram que a participação dos munícipes não se deve proporcionar porque eles não estão preparados para tal. Ainda outros, consideram que tudo isto não passaria de uma perda de tempo sem resultados práticos, e o que interessa é que a força política que detém o poder cumpra o que constava no seu programa eleitoral. Etc. Cada um colocar-se-á de acordo com a noção de democracia que defende. Todavia, por cima de tudo isto, paira um conjunto de dúvidas em relação a determinadas situações. Há municípios que possuem muito poucos recursos, sendo essencial analisarem com redobrado cuidado aqueles que possuem. Por exemplo, o turismo pode ser um desses recursos, constituídos simultaneamente pela beleza paisagística natural, e pela existência de um valoroso património cultural e industrial com séculos de existência, que, se devidamente tratados, restaurados e enquadrados, podem atrair um significativo fluxo de turistas.

Ora o que é que se está assistir em numerosas destas situações? A venda em hasta pública, em total desbarato, destes recursos, deixando aos investidores a capacidade de definirem o que pretendem concretizar nesses espaços e com essas estruturas patrimoniais. Para onde vai o desenvolvimento local nestas circunstâncias? Tal como se pode verificar o que se “desenvolve” são os bolsos dos tais investidores, que ficam de posse do que, afinal foi pago por todos, pertencendo por isso a todos. Todavia a gravidade da questão não se fica por aqui: o que é que determina uma tão grande azáfama em várias câmaras municipais, de delapidação deste tipo de recursos com tanta rapidez? O que é que pode determinar esta atitude, sem terem sequer apresentado qualquer estudo ou justificação plausível, para uma tomada de decisão que contraria o simples bom senso? O que é que as leva a violarem frontalmente o que está determinado na Lei (Lei de Bases do Património Cultural), que impõe que as autarquias locais sejam moral e juridicamente responsáveis pela defesa do património herdado do passado, e do próprio ambiente natural? O que é que as leva a evitarem analisar com o indispensável cuidado e atenção, todo o processo de utilização dos magros recursos de que dispõe o território, mas que possuem um valor inestimável em termos da resposta às

necessidades do desenvolvimento futuro da comunidade? O que é que as impede de elaborarem um estudo global, justificador destas decisões, capaz de garantir a sua coerência? O que é que justifica que se afirme, como está a acontecer, que uma operação de venda imobiliária ao desbarato,de territórios riquíssimos em valor ambiental, paisagístico e patrimonial, constitui um processo de desenvolvimento local, sem para tal se apresentar qualquer estudo minimamente consistente, capaz de o justificar? É bem evidente que quem toma este tipo de decisões, sem fornecer qualquer tipo de resposta às questões aqui colocadas, conta com a passividade das populações que, mal esclarecidas devido à habitual falta de informação que habilmente lhes é negada, se abstêm de participar. Todavia, o problema levanta-se em toda a sua nudez e gravidade: uma vez concretizadas, estas decisões determinam inteiramente o futuro da comunidade. Ou seja, uma vez tomadas com a evidente ligeireza das coisas decididas levianamente, as suas consequências são irrevogavelmente empobrecedoras da capacidade de resposta às necessidades do desenvolvimento, delapidando alguns dos parcos recursos existentes para sempre. Seremos nós tão ingénuos, que não percebamos que por detrás de tudo isto, se perfilem interesses não explicitados. Mas que interesses serão esses?


Quinta do Braamcamp - Barreiro Efeito da Alterações Climáticas Carla Marina Santos

Alburrica, Ponta do Mexilhoeiro, Quinta do Braamcamp Território em Perigo

com uma simulação de subida das águas à cota +4,50m, no qual desaparece todo o território de Alburrica, o Barreiro Velho, a Miguel Pais e toda a zona dos Caminhos-de-ferro; um último quadro com uma simulação de subida situação de perigo em que se encontra toda a zona das águas à cota +5,00m, cenário climático extremo onde é de enorme gravidade, se consultarmos o estudo, coor- toda esta área fica mais submersa ainda. denado por Rodrigo Reis Ollero das Neves e mais tarde por Maria de Fátima Silva Freire e realizado pelo Grupo de Investigação Estejo, publicado em 2012, no Repositório das Universidades Lusíadas, com o título “Workshop Estejo: Alburrica”, trabalho realizado no âmbito do Centro de Investigação em Território, Arquitectura e Design, da Universidade Lusíada de Lisboa, verificamos que o risco Ilust. 1 – Alburrica, Barreiro: situação actual, simulação da de submersão do território é real, e passamos a citar: “Depois de uma análise crítica de propostas urbanas para subida do nível das águas à cota +2,00m e à cota +4,50m. o concelho do Barreiro reflectiu-se sobre a sua ineficácia (FONSECA, 2012). (...) na verdade existe em todas uma carência na falta de propostas sustentáveis que tenham em conta questões ambientais numa realidade futura próxima. Como é já fato adquirido o aquecimento da atmosfera está a causar o degelo dos calotes polares na Antárctica e a expansão das águas oceânicas, o que sendo uma mudança ambiental catastrófica transformando o equilíbrio ambiental, causará a subida do nível das águas num horizonte não tão longínquo como se pode pensar. As previsões não são iguais para todo o globo, tendo ligeiras alterações entre zonas. A subida do nível das águas porá em perigo as zonas costeiras com a perda de território e a erosão da costa assim Ilust. 2 – Simulação de subida do nível das águas à cota como a população e construções que se encontram nes- +5,00m, cenário climático extremo. (FONSECA, 2012). se limiar. Em diversos casos as alterações climáticas são acompanhadas por fenómenos meteorológicos, designa- A ilustração 3 mostra, numa projeção para 2100, o futuro damente tempestades e secas e, com elas, inundações e intervalo de subida de água com a intercalação da subida escassez de água. e descida das marés, que será entre o nível 2.00 (azul) e a Foram elaborados estudos com base nos dados do GCM subida normal diária da maré até ao nível 4.50 (azul claro) e IPCC, com projeções quantitativas para a temperatura, que num caso decenário climático extremo (ondulação, precipitação, subida do nível das águas e casos de cená- cheias e o pior cenário de subida das águas) chegará ao rios extremos. Tal como noutros casos à volta do globo, à nível 5.00 (azul muito claro). medida que o nível das águas sobe, os casos de inundação associados a tempestades são mais prováveis de aumentar na sua intensidade, frequência e duração. As alterações climáticas constituem um desafio importante nas primeiras décadas deste século, assim como é emergente ter uma visão a médio e longo prazo de impactos e soluções.” (Alterações Climáticas e Construções Resilientes – Ecolodges, Vilas Pescatórias e Percursos Pedonais,págs 140,141, 142, Fonseca, 2012). Apresentam de seguida 4 quadros: um primeiro com o território como é actualmente e os 3 seguintes com simulações de subida do nível médio da água, no primeiro apresentam uma simulação da subida do nível das águas Ilust. 3 – Simulação de inundação da Quinta Braancamp e à cota +2,00m, no qual desaparece grande parte do terri- praias de Alburrica. (FONSECA, 2012).” tório de Alburrica e da própria Miguel Pais; um segundo Fim de citação, sem mais comentários!

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Património Cultural - Barreiro Barreiro e Braamcamp: Um Exercício de Memória André Carapinha

Fapostou ui criança no Barreiro dos anos 80. Nesse tempo, em que se pela última vez na indústria pesada, resultado da nacio-

ra, era tudo menos pacífica e que os barreirenses sabiam bem dos custos desse modelo de desenvolvimento. Nesse movimento de 1998 estava, creio, já contida uma ideia sobre o futuro do Barreiro.

nalização da CUF e da sua transformação em Quimigal, o normal para uma criança desta terra era a poluição. Nunca me esque- Esta ideia que no fundo é o resultado do passado do Barreirocerei da nuvem que cobria o Barreiro e em que eu mergulhava -fábrica, não deixa de nos aparecer, uma e outra vez, sob a fortodas as noites de terça e quinta feira quando descia da Quinta ma de dilema: o conflito entre a recuperação do Barreiro para os da Lomba para ir treinar futebol de cinco no histórico clube 31 seus cidadãos e a nostalgia de uma cidade “desenvolvida”, ou seja, de Janeiro, “Os Celtas”, e também da diferença que havia entre onde há emprego e criação de riqueza. Para além disso, a inserção os dias de semana dos treinos e os fins de semana dos jogos, na- do Barreiro na Área Metropolitana de Lisboa tem sido mais difícil quilo a que nuvens carregadas e mal cheirosas dizia respeito. Es- do que a de outras terras devido a este passado, uma vez que a ses tempos gloriosos em que fui titularissmo e ídolo da torcida sua suburbanizaçáo começou mais tarde quando comparado com do “31”, se bem me lembro ou quero lembrar, foram também, e localidades que sempre foram subsidiárias da capital. disto não tenho quaisquer dúvidas, os responsáveis pela doença asmática que carregarei até ao fim da minha vida, e que, sabemo- Desde o inicio dos anos 2000, o Barreiro beneficiou de uma série -lo, afecta um número desproporcionado dos meus conterrâneos de obras que devolveram à cidade muitos espaços, que abriram a desses tempos que, como eu, cresceram a jogar à bola no meio cidade ao rio, que criaram locais de lazer de qualidade. A criação do nevoeiro dos fumos da fábrica, e que ainda hoje identificam ao de ETARs ao longo de todo o estuário do Tejo, ao mesmo tempo longe o cheiro de uma descarga de amoníaco. que as quase todas as indústrias da sua margem iam desaparecendo transformaram esse rio poluído e cheio de coliformes onde Outra coisa que esses meus amigos dessa altura se lembrarão mergulhávamos quando putos num Rio Tejo onde a vida marinha bem, é do rio. Nós ali pela Quinta da Lomba, e em especial na regressou, onde pescamos e comemos sem medo robalos e corviQuinta dos Arcos, onde eu cresci, era só vir o calor da primavera nas. Apesar de tudo o que falta fazer, a qualidade de vida do Bare começavam os banhos, os saltos da muralha e os passeios no reiro actual em termos ambientais e de espaços de usufruto para barco da minha mãe. Conhecemos tudo daquelas margens do rio, a sua população não tem qualquer comparação com os anos 80. aquelas que mudaram e aquelas que ainda são como eram. Entre aquelas que mudaram, estão os esgotos que lá desaguavam sem No entanto, de tempos a tempos, eis que surge o fantasma: um tratamento algum, e que não eram um, nem dois, nem três, eram projecto qualquer, uma ideia suprema, um “investimento”. Eis exactamente cinco naquele troço que vai entre a antiga muralha que se quer fazer da frente ribeirinha um terminal de contentoque agora faz parte do Polis e outra parte que foi arroteada a ca- res, dos céus do Lavradio as traseiras de um aeroporto, ou de um minho da Verderena, onde o Polis ainda está por terminar, e onde qualquer espaço nobre da cidade um grande projecto imobiliário. havia uma pequena praia que desapareceu. Isto não é de some- Serão, diz-se então, estes investimentos que irão resolver a quanos, porque nós, crianças dos anos 80 deste nosso Barreiro, mer- dratura do círculo entre a ideia mais ou menos real do passado de gulhávamos literalmente no meio da merda, do lixo dos esgotos uma cidade vibrante e cheia de “actividade económica” e aquilo sem tratamento. Isto que nós fazíamos na “Praia da Copacabana”, de que os cidadãos do Barreiro já não abdicam, que é o de serem faziam os outros putos todos, na Recosta, na Alburrica, na Aveni- habitantes de uma cidade moderna, com as suas particularidada da Praia, na Barra-a-Barra. Mergulhos no Rio Tejo desse tempo. des e as suas idiossincrasias, e não dos arrabaldes de uma fábrica onde deixaram o seu esforço, a sua saúde e o melhor das suas Nos anos 90, quando era adolescente e quando a fábrica come- vidas. çou a fechar e foi fechando muito depressa, lembro-me de outras coisas desta cidade: de haver muita pobreza e muita malta agar- Aqui chegados, a 2019, a miríade é outra: inspirados muito prorada à heroína, de amigos meus que morreram por causa disso, vavelmente no exemplo que infelizmente chega da grande capide uma vida nocturna vibrante no Barreiro Velho, de o barco para tal, os actuais poderes públicos parecem acreditar que o grande Lisboa demorar muito tempo e por isso a malta ficar toda por cá, maná é o investimento imobiliário, e por isso pretendem, entre de gostarmos de música e de arte em geral e de não haver quase outras coisas, vender o terreno da Quinta do Braamcamp, uma nada a passar-se e de por isso começarmos a organizarmo-nos das últimas áreas, e a mais importante, que o Barreiro necessita para fazer coisas acontecer. Também de ir para a faculdade no de recuperar para si mesmo de modo a completar-se como cidabarco da 8 da manhã, onde encontrava amigos que iam trabalhar de virada para o rio que se consiga diferenciar pela qualidade vida para Lisboa, porque não havia trabalho no Barreiro, e iam para as que oferece aos seus cidadãos. obras em Sacavém ou para o escritório em Picoas. Entretanto, em 1998, tentou-se instalar por aqui uma unidade de co-incineração Há muita coisa para fazer no Barreiro, e muito pode e deve ser de resíduos tóxicos. Nessa altura, e isto é importante que se lem- feito para fazer esta cidade crescer de um modo sustentado, mas bre, perante certas hesitações dos poderes municipais desse tem- não será certamente vender as suas zonas nobres aos pedaços, po, foi a população do Barreiro que se levantou e mobilizaram-se como acontece neste momento, e não só quanto à Quinta do mais ou menos à revelia dos partidos políticos centenas ou milha- Braamcamp. Os poderes públicos que elegemos tem obrigação res de pessoas, entre escolas, colectividades e associações, que de ser mais do que isso, e se não conseguem entender o que sigajudaram a impedir esse projecto. Já nessa altura se notava que a nifica um território daqueles para uma cidade como o Barreiro, herança do passado industrial do Barreiro, que construiu esta ter- não servem.

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Património Cultural - Barreiro O Barreiro e os emigrantes Henrique Correia dos Santos

O Barreiro foi, desde sempre, terra de acolhimento

MALATO — Borrego de um ano; MIUFA— Medo; MARAFAÇÂO — irritação, zanga, fúria; PANTANAS — Queda de costas; PONTO — Aquele que, num grupo coral alentejano, inicia o canto; SERIGAITA — Menina desembaraçada; TAPUIHO — Rolha; TER GALO — Ter azar.

Fixaram-se, criaram raízes, tiveram filhos e netos, enfim instalando-se e passando a fazer parte da comunidade barreirense. Mas, ao se instalarem não perderam os seus costumes ancestrais, a sua vivência anterior, mantiveram os laços que os ligavam à terra-mãe, foram-se adaptando ao novo meio ambiente e, logicamente, a sua própria linguagem. Esta, a pouco e pouco foi-se transformando “,ou melhor, interligando com a local. Assim, os diversos falares passaram a fazer parte do falar barreirense e vice-versa.

O CARACTER INTERNACIONALISTA DO POVO PORTUGUÊS

de naturais de outros países e de diferentes regiões de Portugal, nomeadamente Alentejo, Algarve e de paragens nortenhas. Aqui vinham procurar um modo de vida que não encontravam nos seus locais de origem, através de atividades laborais que por cé se desenvolviam, a saber, fabricas de laboração de cortiça, moageiras, caminhos-de-ferro, a CUF com os seus fabricos de tecidos e tapeçarias, produtos químicos, etc. É TÃO SÓ UMA PEQUENA AMOSTRA!

Se tem um problema intrincado — Vê-se grego Se não compreende alguma coisa — Aquilo é chinês Se trabalha de manhã à noite— Trabalha que nem um mouro Se vê uma invenção moderna — É uma americanice Se alguém fala muito depressa — Fala que nem um espanhol Há ainda em uso algumas expressões fruto dessa Se vivi com luxo — Vive à grande e à francesa mescla, outras desapareceram, contudo ainda se Se alguém quer causar boa impressão — É sé para ouve alguma dessa mistura, principalmente entre os inglês ver Se alguém tenta regatear um preço — É pior que mais idosos. cigano No se pretende elaborar um «dicionário “sobre ta! Se alguém é agarrado ao dinheiro — É pior que judiatéctica, apenas dar a conhecer algumas expres- deu sões mais curiosas e que, ocasionalmente, alguém Se vê alguém a divertir-se — Está a gozar que nem utilize no seu diálogo corrente ou se recorde de ter um preto Se vê alguém com um fato claro vestido — Parece ouvido dizer. um brasileiro Se vê uma loura alta e bonita — Parece urna autênEsta pretensão não é mais que uma pequena homenagem aos primeiros emigrantes que debandaram tica sueca esta terra e que, a seu modo, contribuíram para o Se quer um café curto — Pede urna italiana desenvolvimento do património industrial e cultural Se vê os horários serem cumpridos — É pontualidade britânica deste burgo à beira Tejo plantado. Se vê um militar bem fardado — Parece um soldado ALMAREADO — Pessoa pouco kicida, que perdeu alemão Se uma máquina funciona bem — É como um relófaculdades intelectuais, enjoado; gio suíço ALOQUETE — Cadeado; Mas quando alguma coisa corre mal — É “À PORTUCHIMBALAU —Grande prejuízo; GUESA!” ENGULHO — Peso na consciência; ESTUCHA — Coisa aborrecida; INDROMINAR — Enganar; FUNDiÇÃO 27


A Braamcamp é de Todos!


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