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Candidatura para dirigir o CBPF
MEMORIAL
CANDIDATURA PARA DIRIGIR O CBPF
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Rio de Janeiro, 15 de abril de 2020
Apresento-me a este Comitê de Busca para seleção do próximo diretor do CBPF com a experiência, ao longo de minha vida profissional, de quatro anos de direção, iniciada em 2015; a de cinco anos de direção substituta, na gestão integral do Prof. Ricardo Galvão; dois anos na gestão do Prof. Fernando Lázaro; e experiência de vários anos de gestão de projetos científicos, nacionais e internacionais. Descrevo, a seguir, atividades que me parecem relevantes para a apreciação deste Comitê.
Sou paulista (paulistano) de nascimento e carioca por adoção. Tenho 71 anos, sou casado, tenho três filhos, dois enteados e seis netos. Ao longo de minha carreira científica, trabalhei no Instituto de Física Teórica (hoje, associado à Unesp), no Departamento de Física da PUC-Rio, no CERN e no CBPF, onde estou desde 1994.
Um tema recorrente ao longo de minha vida profissional tem sido sempre o de criar, estruturar ou fortalecer instituições, pois são elas os instrumentos que possibilitam avanços na sociedade.
Em 1978, voltei de meu doutorado na UCLA, para trabalhar no Instituto de Física Teórica, onde fiquei até 1983. Nesse período, fui um dos fundadores dos Encontros Nacionais da Física das Partículas e Campos, tendo participado da organização das duas primeiras edições – e de várias outras, ao longo das 40 edições desse evento. Fui um dos fundadores, também, da Escola de Física Jorge André Swieca, quando também organizei as duas primeiras da série, tendo como tema ‘Física das Altas Energias’. Esse evento, promovido pela SBF, está em operação até hoje, já tendo chegado à 20ª edição.
Nos experimentos científicos dos quais participei – por exemplo, colaborações internacionais de grande porte, como o Delphi (detector instalado no anel de colisões LEP, no CERN) e o Observatório Pierre Auger, na Argentina –, tive várias posições de liderança que podem ser identificadas em meu Lattes. No Auger, presidi o Conselho da Colaboração. Sou, atualmente, um dos mentores de um projeto de colaboração internacional criado originalmente com o nome Lattes (Large Array Telescope for Tracking Energetic Sources), cujo objetivo é construir um detector de partículas geradas por raios gama com energias acima de 100 GeV, em altitudes de 5000 m, na América do Sul. Este projeto juntou-se, recentemente, a outra iniciativa semelhante, que hoje tem o nome SWGO (Southern Wide-field Gamma-ray Observatory). Faço parte do Steering Committee do projeto.
Em 2013, fui o organizador da 33rd International Cosmic Rays Conference, no Rio de Janeiro (RJ), uma das conferências de maior visibilidade em todas as áreas da física naquele ano e a principal sobre o tema de raios cósmicos no mundo. Tive papel central ao propor e realizar uma mudança na estrutura da conferência, quebrando uma tradição de décadas e, acredito, modernizando-a. Desde então, essa série de conferências seguiu rigorosamente essa mudança.
Ao longo das últimas décadas, servi nos Comitês Internacionais de várias das mais importantes conferências em física das partículas e astropartículas. Neste período, tive a oportunidade de servir em várias missões internacionais, das quais destaco ter coordenado o Grupo de Trabalho que negociou as condições de adesão do Brasil ao CERN como país-membro associado, nomeado ainda na gestão do ministro do MCT, Sérgio Machado Rezende. Essa missão, com várias etapas, foi concluída de forma satisfatória até o estágio no qual o Conselho do CERN convidou o governo brasileiro a fazer parte daquela instituição.
Com a crise econômica, esse processo ficou suspenso. Atualmente, o ministro Marcos Pontes retomou essa iniciativa, tendo visitado aquela instituição em junho passado, quando o acompanhei. Servi também como ‘sherpa’ (terminologia diplomática para assessor) do ministro Marco Antônio Raupp, na reunião do grupo Carnegie (formado pelos ministros de Ciência e Tecnologia dos países que formam o G8 e os Brics), em Constança (Alemanha), em 2012.
Tive, ao longo de minha carreira, atuação de serviço à comunidade de física, em várias funções diferentes. Servi no Comitê Assessor (FA) do CNPq, em Comissões de Avaliação da Capes e como consultor de várias FAP’s do País, bem como de várias agências de fomento internacionais. Fui Editor de Ciências Exatas da revista Ciência Hoje por seis anos e editor adjunto ao Brazilian Journal of Physics.
Servi como vice-presidente da Sociedade Brasileira de Física (SBF) em dois mandatos, entre 2009 e 2013, bem como, em diferentes ocasiões, como membro do Conselho da SBF. Destaco minha contribuição a dois estudos realizados pela SBF que tiveram impacto relevante na discussão dos temas que associam Ciência, Tecnologia e Inovação. O primeiro, Física para o Brasil, publicado em 2005, procurou fazer uma projeção do papel da física no desenvolvimento do País na década seguinte; o segundo, Física para um Brasil Competitivo, foi um estudo encomendado pela Capes em 2007, no qual procuramos identificar os gargalos que dificultam um impacto mais expressivo do desenvolvimento científico no processo de inovação brasileiro – este último motivou a criação da Embrapii. Fui também Secretário Regional da SBPC no Rio de Janeiro.
Em 2016, fui eleito membro titular da Academia Brasileira de Ciências, tomando posse no ano seguinte.
Claramente, a direção de uma instituição da envergadura e importância do CBPF, nestes tempos difíceis, não é tarefa para alma pequena. Apresento-me para continuar essa tarefa com a clareza das dificuldades que enfrentaremos e com a experiência de um período passado – que já foi bastante delicado.
O primeiro desafio a ser enfrentado é a questão recorrente do envelhecimento dos pesquisadores e servidores da instituição. Fração significativa do quadro de servidores deverá aposentar-se ao longo da próxima gestão. Há dois problemas associados a esse tema. O primeiro é a substituição dos aposentados por novos servidores; o segundo, a expansão de quadros, para atender a uma demanda crescente de desafios. Em um horizonte imediato, tendo como pano de fundo o atual quadro econômico do País, essas duas questões parecem sem solução óbvia – pelo menos, no futuro imediato.
No entanto, são os períodos difíceis que, com frequência, acabam orientando as soluções
que tenham caráter duradouro. Nesse sentido, vale citar que, no momento, faço parte de um grupo de diretores de institutos de pesquisas do MCTIC que tem a missão de desenhar um planejamento estratégico para os institutos, sob a coordenação do CGEE. Nesse grupo, estamos estudando novas alternativas para superar o problema da limitação de servidores nas nossas instituições.
Essa questão, a meu ver, tem contornos mais dramáticos, pois o problema extrapola em muito a mera substituição ou expansão do quadro de pesquisadores, tecnologistas, técnicos e pessoal administrativo. Quando o Brasil é comparado com qualquer país onde a ciência está avançada, nota-se enorme disparidade entre o número de pesquisadores trabalhando nas universidades e nos institutos de pesquisa. Enquanto, naqueles países, a relação oscila em torno de dois; ou seja, para cada dois pesquisadores atuando na universidade, em países como EUA, Alemanha, Reino Unido, França, Itália etc., há um trabalhando em um instituto de pesquisa, no Brasil, essa relação está completamente distorcida: temos, pelo menos, 20 pesquisadores na universidade para cada um deles nos institutos de pesquisa, segundo dados encontrados na página do MCTIC – sem querer afirmar que temos excesso de pesquisadores nas universidades.
Esse enorme fosso deve ser vencido para seguir com o processo de colocar a ciência brasileira em um patamar de competitividade com os países avançados. Institutos de pesquisa são elos importantes na cadeia de transmissão do conhecimento científico e das tecnologias geradas em busca de respostas às grandes questões científicas. Estabelecem, também, conexão entre a universidade e o setor produtivo, apoiando o desenvolvimento, por exemplo, de instrumentação científica e de software avançado.
Éóbvio que uma expansão significativa dos institutos de pesquisa deve estar associada a um protocolo bem definido de relação com as universidades. A meu ver, os institutos devem ser vistos como elementos da infraestrutura para a pesquisa no país, trabalhando em consonância com as universidades.
O CBPF tem papel central nessa redefinição por duas razões: i) seu papel histórico, central e emblemático na concepção de modelos de estruturação de novas instituições; ii) o papel ímpar que tem a física na liderança de transformações da política científica do País, somado ao fato de que o CBPF é tido como referência, no país, no campo da pesquisa e pós-graduação em física no Brasil.
O CBPF tem como missão realizar pesquisas em física básica e desenvolver suas aplicações. Esses objetivos são perfeitamente consistentes com a ênfase que a administração atual e as anteriores do País têm dado ao tema da Inovação. Programas ambiciosos de pesquisas nas áreas de física das altas energias, cosmologia, desenvolvimento e caracterização de novos materiais, nanociências, biofísica etc., quando ancorados no desenvolvimento de instrumentação científica, têm desdobramentos relevantes para a área de Inovação.
Coloco a ênfase na atividade experimental nos institutos – e, certamente, ela é central –, mas deve-se atentar igualmente para o papel estruturante que deve ter a atividade teórica. A missão central do CBPF é o desenvolvimento de física – em seu mais amplo escopo –, buscando, assim, respostas para os problemas de fronteira, sejam em física básica, sejam em aplicada.
Um elemento-chave em um programa ambicioso de pesquisa do CBPF é instrumentação científica. A meu ver, um dos calcanhares de Aquiles da ciência brasileira é nossa fragilidade na infraestrutura de apoio para o desenvolvimento da instrumentação científica em todas as áreas da ciência. Devemos reconhecer os progressos recentes nessa área – em particular, com o sucesso do projeto Sirius –, mas, certamente, eles estão muito aquém das necessidades de um país com uma economia diversificada como a do Brasil, com pretensões de exercer um papel relevante na produção de bens e serviços para o mundo.
Outro desafio que enfrentará o novo diretor será o de continuar a mobilização dos pesquisadores e tecnologistas jovens para desempenharem papel de maior relevância nos mecanismos de decisão no CBPF. Esse é um problema que permeia toda a estrutura de decisões (científicas) do Brasil. Os pesquisadores jovens têm pouca voz ativa hoje. Claramente, há razões históricas para essa deformação, mas é tempo de iniciar um programa para corrigi-lo e gerar novas lideranças científicas. Porém, mais relevante ainda, será o de conseguir ampliar a participação de mulheres nas atividades do CBPF. Temos ainda, em nossa instituição, um desequilíbrio de gênero muito agudo, refletindo situação que, infelizmente, caracteriza a física, tanto no Brasil quanto no mundo.
O desenvolvimento dessas ideias de forma mais abrangente pode ser encontrado no meu ‘Projeto de Gestão e Visão de Futuro para o CBPF’. Estive envolvido na concepção e redação dos ‘Planos Diretores do CBPF’ de 2006-2010, 2011-2015 e aquele que cobre o período de 2017-2021 – este último em vigor. Reafirmo aqui meu compromisso em aderir à orientação estabelecida pelo Plano Diretor, caso seja indicado para continuar dirigindo o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas.