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Graduação
Do ‘drogas, álcool e rock’n roll’, ficou com a opção do meio e, segundo colega de longa data, gostava de um rock na graduação, mas sem fanatismo. Já adulto, decidiu, para desespero de alguns, ouvir música caipira tradicional (não eletrificada), o que fazia em alto volume.
Acredito que ele tenha sido típico jovem de classe média alta: aventuras, mas até certo limite; brincadeiras, só as inocentes, como o clube que ele fundou com colegas da adolescência em que o estatuto obrigava os membros a “praticarem, pelo menos, uma maldade por dia”.
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No ensino médio, parece ter sido bom aluno – apesar de nunca ter se vangloriado disso. Na vida adulta, a formação religiosa do Santo Américo ficou distante – ou ele a abandonou por completo: nunca o ouvi manifestar crença metafísica. Minha impressão, no entanto, é que ele estaria mais para agnóstico do que ateu.
Esses estudos da juventude o marcariam de forma positiva. Lembrava-se dos dias de escola com certo saudosismo e, por vezes, falava dos diálogos provocadores que mantinha com os padres – semelhantes aos que costumava ter com a mãe, acho. Só para irritar.
Mais tarde, já nos EUA, ele aparece em fotos com cabelo e barba longos, vestindo roupas informais. Camisetas e calças, ambas ‘sem grife’, o acompanharam ao longo da vida adulta, ainda que sob o protesto de sua terceira esposa e artista plástica, Maria Elisa Shellard, que reformou o guarda-roupa dele com vestimentas ‘mais adequadas’ aos cargos que o marido passou a ocupar. Mas, nos momentos de folga, voltavam a vigorar o ‘chinelão’, a camiseta e bermuda.
A barba nunca voltou a ser tão grande, e os cabelos foram minguando com o passar das décadas – a ponto de ele mesmo dizer que, no alto da cabeça, havia sobrado só uma “chuquinha”, que ele gostava de comparar com a de colega físico com o mesmo cenário capilar.
Shellard sempre teve interesse – ainda que não muito expresso – por filosofia, e chegou a cursar aulas com o filósofo e professor de origem tcheca Vilém Flusser, dadas na casa deste último para pessoas interessadas no tema. Creio que o contato com Flusser tenha se dado com base no fato de este último ter sido professor de filosofia na Escola Politécnica da USP na década de 1960, período justamente no qual Shellard frequentou a instituição.
Shellard pouco falava desse período curto de graduação na engenharia. Ainda no segundo ano da Politécnica – onde cursava eletrônica, a mais disputada à época e com maior carga de matérias de física e matemática –, prestou vestibular para a física, com o colega José Bonilha, com quem manteve amizade ao longo da vida.
Shellard, por um ou dois anos, cursou simultaneamente as duas graduações. Seus currículos não citam esse período, restringindo-se a citar apenas o título “Bacharel em física pelo Instituto de Física da USP”.
A entrada de Shellard na Escola Politécnica mostra que ele estava bem preparado para vestibular, pois o número de candidatos por vaga para essa tradicional instituição de ensino paulistana sempre foi alto – no Brasil, o mesmo sempre ocorreu com duas outras profissões ditas ‘imperiais’, medicina e direito. Shellard e Bonilha se conheceram na Politécnica e juntos cursaram à noite a graduação em física. Lá pelo terceiro ano, ambos desistiram da engenharia. Shellard terminou o novo curso em quatro anos, com notas muito boas. Nesse período, tinha já inclinação pela esquerda (ou, talvez, pelas causas sociais), mas nunca foi militante – apesar de ter sido amigo de vários deles à época.
Arrisco dizer que, para um filho de classe média alta de São Paulo, com tendência às ciências exatas – na juventude, tinha, como hobby, construir e soltar foguetes, por exemplo –,