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Estudos e pesquisas
Itaú Cultural

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Eduardo Saron
Superintendente Cultural da Fundação e Diretor do Itaú Cultural
\ MENSAGEM DA SUPERINTENDÊNCIA \ O nosso mantra: Fruição, Formação, Fomento
Em 2021, o Itaú Cultural pôde, com todas as cautelas que a pandemia exige, consolidar a volta do público às atividades presenciais – iniciada no final de 2020, e expandida ao longo do ano passado. O retorno, no entanto, não representou um afastamento do mundo digital, que sempre esteve presente no DNA da instituição e foi intensificado com os aprendizados do ambiente da Covid-19.
Unindo estes dois mundos, o híbrido configurou-se como uma nova forma de se fazer e de se consumir cultura. Graças ao virtual, o Itaú Cultural conseguiu fortalecer as suas práticas, atrair novos artistas, estimular novas experiências e alcançar novos públicos em todo o país.
Um dos projetos emblemáticos desta nova fase foi o lançamento do Itaú Cultural Play, a nossa plataforma de streaming voltada à produção audiovisual brasileira, com centenas de filmes, documentários, curtas e experimentações, assinadas por realizadores de todas as regiões do Brasil, que pode ser acessada gratuitamente pelo público.
Levar cultura a um contingente maior de brasileiros é essencial num país tão marcado pelas desigualdades. A experiência cultural, como mostram estudos em várias partes do mundo, tem enorme impacto positivo sobre a saúde mental, o bem-estar, a qualidade das relações familiares, a diminuição da violência e até mesmo sobre o aprendizado e a criatividade, atributo cada vez mais demandado no mundo contemporâneo.
A expansão do acesso, no entanto, não foi um objetivo isolado. Além de estimular a fruição, com uma oferta consistente e diversificada de conteúdos culturais, nós também atuamos em outras duas frentes estruturantes na área da Cultura: a formação e o fomento.
No campo da formação, nós criamos a Escola Itaú Cultural, que passou a reunir todos os cursos oferecidos pela instituição, o que inclui cursos para o público em geral, e programas especializados stricto e lato sensu de formação de gestores, em parceria com grandes instituições de ensino superior, como a USP, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a Universidade de Girona, na Espanha, o Insper e o Instituto Singularidades. No campo do fomento, seguimos com intensa atividade no nosso Programa Rumos, a plataforma mais longeva do país de articulação e apoio à produção de artistas brasileiros, com apresentações dos projetos selecionados na 19ª edição (2019-2020).
Também na seara do fomento, realizamos mais uma edição do Prêmio Oceanos, um dos principais reconhecimentos da produção da literatura em língua portuguesa, e seguimos reafirmando nosso apoio a projetos culturais de relevo, como a mostra de documentários Tudo é Verdade, e o Projeto Ancestralidades, criado no ano passado em parceria com a Fundação Tide Setubal, para valorizar heranças culturais do Brasil.
E, cumprindo nosso papel estruturante, também demos especial ênfase à produção de estudos e pesquisas sobre os hábitos culturais e a economia criativa no Brasil, gerando dados e informações para subsidiar políticas públicas e o trabalho de gestores da área da cultura.


Um dos pilares de atuação do Itaú Cultural é a fruição, que consiste em promover o encontro entre o repertório do público com os conteúdos apresentados pela instituição. Para fortalecer este diálogo, buscamos aprofundar ações e atividades relacionadas à diversidade, acessibilidade e representatividade de todas as regiões do país. Também estimulamos debates, articulação e difusão de conhecimentos, experiências e saberes ancestrais e contemporâneos nos mais diversos segmentos da expressão artística e cultural brasileiras. Neste quesito, o Itaú Cultural também aposta na construção de vínculos com públicos no ambiente digital e presencial.
fruição
\ EXPOSIÇÕES \ Grandes artistas revisitados de ponta a ponta
Mostras de Beatriz Milhazes, Geraldo de Barros e Tunga marcam o retorno das atividades presenciais
Após a bem-sucedida abertura, em dezembro de 2020, da exposição Beatriz Milhazes: Avenida Paulista, que permaneceu em cartaz até maio de 2021, o Itaú Cultural seguiu apostando no ano passado na retomada presencial das grandes mostras de artes visuais nos três andares de seu espaço expositivo, na avenida Paulista. Estas exposições são tradicionalmente dedicadas a nomes-chave das artes e da arquitetura e pensadas de forma a dar conta da totalidade da trajetória dos artistas. Em 2021, foram contemplados o paulista Geraldo de Barros (1923-1998), expoente do movimento concretista, e o pernambucano Tunga (1952-2016), um revolucionário da forma. Viabilizadas em plena pandemia, as montagens destas exposições implicaram em desafios operacionais inéditos, mas conseguiram reunir uma vastíssima produção, oferecendo ao público uma perspectiva raramente vista da arte produzida no Brasil entre a segunda metade do século 20 e o início do século 21.
Beatriz Milhazes: Avenida Paulista
| Foto | Vicente de Paulo A exposição de Beatriz Milhazes, que permaneceu em cartaz nos cinco primeiros meses de 2021, foi realizada em parceria com o Museu de Arte de São Paulo (MASP) e reuniu cerca de 170 obras produzidas ao longo de três décadas. Foi a maior exposição dedicada à artista já feita no país.
Na sede do Itaú Cultural foram exibidas gravuras, colagens, algumas acrílicas e um minidocumentário realizado pela equipe do Itaú Cultural. Ao MASP, couberam, entre outras obras, as pinturas em grandes dimensões. O olhar do curador Ivo Mesquita evidenciou o diálogo entre diferentes materiais, técnicas e linguagens usados pela artista.
Em agosto, foi a vez de Geraldo de Barros – imaginário, construção e memória, na qual o artista foi apresentado de uma forma como nunca tinha sido visto antes. A mostra abarcou um arco temporal de cinco décadas - de 1940 a 1990 -, revelando as várias facetas da produção do homenageado, que foi gravador, pintor, fotógrafo, artista gráfico, designer de móveis, pai e amigo de muitos artistas com os quais compôs grupos e escreveu manifestos.
A curadoria de Lorenzo Mammi e Michel Favre mostrou Barros por inteiro, sem recortes ou ênfases específicas. Por meio de mais de 400 itens, foi possível conhecer o seu processo de reinvenção e sua aposta no cruzamento entre diferentes linguagens. A mostra incluiu imagens do artista pertencentes ao acervo do Itaú Cultural e presentes na mostra on-line Fotografia Modernista Brasileira, do Google Arts & Culture.
Geraldo de Barros, 1981
| Foto | Fabiana de Barros - Arquivo Geraldo de Barros



Tunga, 2014
| Foto | Romulo Fialdini
Por fim, o Itaú Cultural trouxe para o público Tunga: Conjunções Magnéticas, inaugurada em dezembro, com 300 obras bidimensionais e tridimensionais, algumas inéditas, outras raras e muitas até então só vistas em coleções privadas.
Feita em parceria com o Instituto Tunga e com curadoria de Paulo Venancio Filho, a exposição estendeu-se para o Instituto Tomie Ohtake, que apresentou dois dos mais importantes trabalhos do artista, Gravitação Magnética, de grande porte e dimensão, e Ão.
Essa exposição, assim como as demais, foi ambiciosa em termos cronológicos, mostrando desde os trabalhos iniciais, feitos por Tunga aos 18 anos, até as criações do crepúsculo de sua vida, além de cadernos do artista, esboços e materiais. Tunga: Conjunções Magnéticas se desdobrou ainda em um Catálogo Raisonné a ser publicado em 2024. Com apoio do Itaú Cultural e patrocínio do Banco Itaú, o Instituto Tunga está reunindo e catalogando toda a obra do artista.
Por fim, também em dezembro, entrou no ar a exposição on-line Filmes e vídeos de artistas na coleção Itaú Cultural, que procurou tornar acessível ao público parte do acervo de arte da instituição. Primeira mostra totalmente on-line realizada pela instituição, foi completada por uma série de vídeos sobre artistas, muitos deles produzidos pelo próprio Itaú Cultural.

_Exposições dedicadas a nomes-chave das artes
\ OCUPAÇÃO \ Mostras destacam artífices negros da cultura brasileira
A maestrina Chiquinha Gonzaga, a filósofa Sueli Carneiro e o palhaço Benjamim de Oliveira foram destaques em 2021
Em 2021, o Itaú Cultural deu continuidade à série Ocupação, com quatro mostras dedicadas ao resgate de grandes nomes da cultura brasileira, que levaram mais de 80 mil pessoas à sede da instituição, em São Paulo. O objetivo deste projeto é fomentar o diálogo do público, da nova geração de artistas e intelectuais com os criadores que os influenciaram.
Seguindo o formato memorabília, com a reunião de documentos, depoimentos, objetos pessoais, cartas e outros elementos da história dos homenageados, as Ocupações de 2021 trouxeram à tona a trajetória de alguns dos nomes mais representativos da cultura negra no país, como a compositora e maestrina Chiquinha Gozanga (1847-1935), a filósofa Sueli Carneiro e o palhaço Benjamim de Oliveira (1870-1954). O filósofo e educador Paulo Freire (1921-1997), também teve uma Ocupação dedicada a ele, concluída em 30 de janeiro deste ano, com um público de mais de 50 mil pessoas, a mais vista da série durante a pandemia.
O mergulho de 2021 em personagens negros essenciais para a cultura brasileira teve início com a Ocupação Chiquinha Gonzaga, em março. Nascida na época do Império, ela compôs mais de duas mil canções e escreveu a trilha de mais de 70 peças teatrais.
_Série também revisitou a obra e a história do educador Paulo Freire, autor do clássico Pedagogia do Oprimido
Foi a primeira mulher a reger uma orquestra e a compor uma marcha carnavalesca no Brasil – a famosa Ó Abre Alas.
Sua profícua criação foi representada por meio de 120 itens, entre documentos, partituras, capas de discos, objetos – aí incluída uma réplica do piano no qual tocara –, fotos e vídeos que buscaram recuperar sua rica biografia.
A filósofa Sueli Carneiro, nome-chave na luta e no debate sobre feminismo negro, passou a ocupar o Itaú Cultural em agosto. Para retratá-la e ajudar o público a compreender os significados mais íntimos
Chiquinha Gonzaga, em 1877, aos 29 anos
| Foto | Acervo Instituto Moreira Salles Coleção Edinha Diniz


de seu pensamento, a mostra apresentou a homenageada, que em junho completou 71 anos, explorando suas origens, o encontro com o Candomblé e sua simbologia, o desenvolvimento intelectual, suas influências e pessoas influenciadas, além de memórias e afetos da infância, juventude e vida adulta, como a paixão pelo futebol.
Para receber o público, a curadoria recriou um jardim, com mais de 700 plantas e ervas, que dividiram o espaço com livros, textos e vídeos com depoimentos de representantes do movimento negro, contextualizando a importância da homenageada para o enfrentamento do racismo no Brasil.
Em setembro, foi a vez da Ocupação Paulo Freire, que celebrou o centenário de nascimento do autor de Pedagogia do Oprimido e criou as bases de um novo pensamento sobre a educação. O método de alfabetização criado por ele viajou o mundo e ganhou reconhecimento internacional.
A Ocupação não apenas deu a Freire sua real dimensão como contribuiu para a compreensão da força de suas ideias. Paralelamente à ocupação, houve uma série de encontros on-line com intelectuais e educadores para debater sua obra.
Encerrando o ano, o espaço expositivo da série Ocupação ganhou, em novembro, ares de circo com a homenagem ao palhaço, acrobata, músico, dançarino e empreendedor circense Benjamim de Oliveira. Embora pouco conhecido do grande público, ele foi uma das figuras mais importantes em um tempo inovador e agitado no circo nacional, entre o final do século 19 e o começo do 20.
Benjamim de Oliveira, 1910
| Foto | Arquivo Erminia Silva

\ ESPAÇO OLAVO SETUBAL \ Coleção Brasiliana pelo olhar de Ailton Krenak
Líder indígena revisita acervo da exposição permanente, ampliando significados para o público e para a instituição
O Espaço Olavo Setubal – Coleção Brasiliana Itaú, que ocupa, de forma permanente, dois andares da sede do Itaú Cultural, voltou a receber o público de forma presencial em 2021 e contou com 41.200 visitantes.
A coleção, composta por 1.300 itens, é um dos mais completos acervos da produção artística sobre o país e reúne imagens, obras e peças que vão da época da chegada dos colonizadores até o início do século 20. Há desde o Povoado numa planície arborizada, produzido por Frans Post, entre 1670 e 1680 – primeira peça adquirida por Olavo Setubal para a coleção – até dezenas de gravuras de Rugendas e Debret, além de livros, documentos, mapas e moedas.
Ao longo do ano, mesmo tendo sido reaberta para a visitação ao vivo, a Coleção Brasiliana Itaú seguiu sendo explorada de forma virtual. Um dos eventos mais marcantes aconteceu no mês de agosto, quando o líder indígena, filósofo, poeta e escritor Ailton Krenak foi convidado para comentar as peças da coleção em uma live, sob a mediação de um educador.
A conversa de Krenak com o público tomou por base dois temas. O primeiro deles passava pelas obras do século 16, que integram o módulo da coleção chamado Brasil Desconhecido, marcadas pela ideia de canibalismo e por índios trajados tal e qual europeus. O outro módulo debatido foi Brasil dos Naturalistas, que reúne obras do século 18, momento no qual ganha corpo a representação da exuberância da flora e da fauna brasileiras.
O olhar de Krenak sobre as imagens criadas por europeus que, por séculos, dominaram a representação dos indígenas, insere-se em um amplo trabalho que o Itaú Cultural tem realizado junto aos povos originários, seja dando visibilidade e fomentando suas produções artísticas, seja ampliando os debates em torno das ancestralidades brasileiras.
41.200
visitantes
1.300
itens da coleção