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Trabalhadores: uma carga maior sobre os não qualificados

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formal no Brasil e no Equador. Uma explicação desse efeito é que há menos concorrência por empregos qualificados devido à relativa escassez de pessoas com formação superior na região da ALC. Ou seja, a análise sugere que o efeito cicatriz provavelmente exacerba o alto nível de desigualdade salarial na região.

Passando para a perspectiva da eficiência, este capítulo mostra que há três formas principais de ajuste de empresas e setores na ALC às crises que podem alterar sua eficiência no longo prazo. Primeiro, o ajuste do trabalhador varia de acordo com as características de seu empregador/empresa: trabalhadores de empresas maiores e mais bem administradas lidam melhor com os efeitos das crises (Fernandes e Silva, 2021). Isso tem implicações para a produtividade das empresas e a demanda de trabalho. Na região da ALC, os mecanismos de ajuste às crises incluem o efeito depurador; o efeito cicatriz que reflete a falta de oportunidades; e choques que afetam as distorções, levando a rendas com potenciais efeitos positivos no longo prazo.

Além disso, os resultados apresentados neste capítulo nos levam a questionar o impacto de fatores institucionais e de mercado externos aos trabalhadores sobre o efeito cicatriz e, em geral, sobre as perspectivas de recuperação do emprego no longo prazo. Os resultados deste capítulo mostram que o emprego em empresas protegidas, definidas como aquelas que enfrentam menos concorrência, é menos afetado pelas crises do que o emprego em empresas menos protegidas. Em setores onde algumas empresas detêm uma grande parcela do mercado, os choques não levam a nenhum ajuste de salário real para baixo. Em vez disso, podem causar aumentos no emprego – o contrário do que se esperaria de mecanismos econômicos normais. Pela mesma lógica, o emprego responderá menos a choques negativos de exportações se a empresa for estatal do que se for do setor privado.

O capítulo termina considerando o terceiro elemento do triângulo: localidades. Os resultados indicam que os trabalhadores em localidades com menos formalidade se saem melhor após a crise do que os trabalhadores em outras localidades. A presença de um grande setor informal pode proteger alguns trabalhadores contra choques. Por exemplo, este estudo conclui que há menores perdas de empregos e salariais em resposta a crises entre os trabalhadores formais do setor privado que vivem em localidades com maiores taxas de informalidade (Fernandes e Silva, 2021). Isso sugere que a informalidade pode ser um importante amortecedor do emprego no médio e longo prazo, quando os trabalhadores podem fazer a transição do desemprego para a informalidade; esse efeito foi demonstrado por Dix-Carneiro e Kovak (2019) no caso do ajuste à liberalização comercial. De fato, nos dados brasileiros as transições do desemprego para a informalidade são duas vezes mais prováveis que as transições do desemprego para a formalidade.

Finalmente, as conclusões indicam que os trabalhadores em localidades com mais oportunidades de emprego (alternativo) se recuperam melhor das crises. As perdas de emprego (e às vezes de salários) são maiores e mais duradouras para os trabalhadores formais em localidades com setores primários maiores, setores de serviços menores, menos empresas grandes e uma produção altamente concentrada no mesmo setor em que os trabalhadores estavam empregados antes da crise (Fernandes e Silva, 2021). Nestes casos, as perdas de rendimentos persistentes desses trabalhadores podem refletir a falta de oportunidades disponíveis na fase recuperação, não apenas o “efeito cicatriz” no sentido tradicional de uma perda persistente de capital humano associada a um período de desemprego ou a empregos de qualidade inferior.

O objetivo desta seção é melhorar nossa compreensão das implicações de longo prazo das crises para os trabalhadores da região da ALC. O foco principal do capítulo é caracterizar a incidência e a magnitude do efeito cicatriz na região. Efeito cicatriz

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se refere aos impactos de longo prazo da perda de emprego sobre os rendimentos do trabalhador, devido à deterioração do capital humano do trabalhador e a mudanças na qualidade de seu emprego. Desde a documentação dos primeiros efeitos salariais duradouros da perda de emprego nos Estados Unidos por Jacobson, LaLonde e Sullivan (1993a, b), estudos em todo o mundo constataram que os efeitos salariais da perda de um emprego são de longa duração. A decadência do capital humano e a realocação de trabalhadores e empresas entre os setores são dois canais importantes pelos quais as crises podem ter implicações de longo prazo para as perspectivas de bem-estar e crescimento econômico na região da ALC.

Esta seção responde a dois conjuntos de perguntas. Primeiro, qual a extensão do efeito cicatriz na América Latina e no Caribe e que formas ele assume? Esta sessão considera o efeito cicatriz a partir de suas três dimensões causais: a perda de emprego, as piores condições iniciais de ingresso da força de trabalho e os ajustes motivados pelas crises. Segundo, como o efeito cicatriz varia entre os diferentes tipos de trabalhadores?

O efeito cicatriz implica uma redução do capital humano e da produtividade do trabalhador, levando a piores resultados de emprego e salários mais baixos ao longo do tempo. O capital humano pode ser considerado de duas formas. O capital humano geral inclui habilidades que são valiosas em muitos setores da economia (como nível de escolaridade, alfabetização e algumas habilidades de informática). O capital humano específico está relacionado a habilidades específicas a um setor ou empresa, e é gerado por meio de experiência profissional e treinamento no local de trabalho que tornam o trabalhador mais produtivo nessa empresa ou setor. O efeito cicatriz resulta da deterioração de um desses tipos de capital humano (ou de ambos). Quando os trabalhadores perdem seus empregos, eles perdem o que aprenderam e construíram em seus empregos na forma de habilidades e relacionamentos específicos à empresa. Burdett, Carrillo-Tudela e Coles (2020) constataram que a perda de capital humano é o fator mais importante na determinação dos custos da perda de emprego para os trabalhadores, mas Carrington e Fallick (2017) sugerem que outras pesquisas são necessárias para avaliar o grau de contribuição desse fator.

Contudo, o efeito cicatriz não exige estritamente a perda do emprego. Na medida em que o treinamento e a experiência no local de trabalho geram capital humano, evitam que o capital humano existente se desgaste e servem como um sinal da qualidade do trabalhador para outros empregadores, a qualidade da correspondência de emprego inicial de um trabalhador pode ter efeitos significativos em seu acúmulo de capital humano e sua trajetória profissional. Já foi demonstrado que os trabalhadores que ingressaram no mercado de trabalho em tempos difíceis têm rendimentos mais baixos do que trabalhadores semelhantes que ingressaram no mercado de trabalho em tempos bons.

Esta seção revê a literatura e relata os resultados de três novos estudos de referência desenvolvidos no contexto deste projeto de pesquisa emblemático sobre o tema do efeito cicatriz no mercado de trabalho na América Latina. Dois dos estudos usam dados de compatibilidade trabalhador-empresa para examinar o efeito cicatriz após a perda do emprego e as cicatrizes causadas pela exposição das empresas a crises. O terceiro usa pesquisas sobre a força de trabalho para analisar o efeito cicatriz para além dos empregados no setor formal, considerando o impacto das condições no momento de ingresso no mercado de trabalho sobre os resultados de emprego dos trabalhadores durante a primeira década de suas vidas profissionais.

Esta seção também examina se diferentes tipos de trabalhadores são afetados pelas crises de maneiras diferentes. Nem todos os trabalhadores sofrerão perdas motivadas pelo efeito cicatriz. As perdas se concentram em alguns tipos de trabalhadores. Esta seção identifica alguns desses grupos que merecem atenção especial dos formuladores de políticas para reduzir os custos econômicos e sociais das crises. Compreender as diferenças nas respostas às crises entre os tipos de

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trabalhadores é importante porque permite que os governos direcionem o apoio para onde ele é mais necessário.

Gravidade dos efeitos de longo prazo

Efeito Cicatriz causado pela perda de emprego

A perda do emprego tem custos significativos a curto e longo prazo. Os primeiros estudos sobre esse tema se concentraram nos Estados Unidos. Jacobson, LaLonde e Sullivan (1993a, 1993b) mostram que os trabalhadores dos Estados Unidos incorrem em períodos prolongados de salários perdidos após perderem o emprego. Também demonstram que uma amostra de trabalhadores na Pensilvânia sofreu perdas de rendimentos de aproximadamente 25 por cento em relação aos rendimentos anteriores à perda involuntária do emprego, que persistiram por cinco a seis anos após a perda do emprego (Jacobson, LaLonde, e Sullivan 1993a). Outros estudos constataram o mesmo fenômeno em outros países.2 Períodos de desemprego mais longos ou mais frequentes têm consequências negativas maiores sobre os salários ( Arulampalam 2001; Gregg e Tominey 2005; Gregory e Jukes 2001). Além disso, o efeito cicatriz da perda do emprego pode durar gerações. Oreopoulos, Page e Stevens (2008) constataram que os canadenses cujos pais perderam o emprego tinham rendimentos anuais 9 por cento mais baixos do que canadenses semelhantes cujos pais não sofreram choques semelhantes no emprego. No entanto, a maioria das pesquisas nessa área concentrou-se em países desenvolvidos.

Um dos sintomas mais marcantes das crises econômicas são as demissões em massa devido ao fechamento de empresas. A análise de eventos de demissão em massa ajuda a abordar a endogeneidade potencial dos trabalhadores que deixam as empresas voluntariamente, porque o motivo para deixar uma empresa (mesmo no contexto de uma demissão em massa) tem um efeito significativo sobre os rendimentos e empregos subsequentes (Flaaen, Shapiro e Sorkin, 2019). No entanto, o número de estudos sobre o efeito cicatriz entre trabalhadores que perderam o emprego após o fechamento de empresas na América Latina é surpreendentemente pequeno. Amarante, Arim, e Dean (2014) e Kaplan, González e Robertson (2007), estudando o Uruguai e o México, respectivamente, são exceções importantes. Amarante, Arim e Dean (2014) encontraram perdas salariais superiores a 14 por cento um ano após a separação do emprego para trabalhadores uruguaios com alta estabilidade. Essa redução de salário é ainda maior para os trabalhadores que perderam o emprego durante uma retração. Para o México, Kaplan, Gonzalez e Robertson (2006) usam dados administrativos de compatibilidade empresa-trabalhador para acompanhar os trabalhadores que deixam a empresa durante “demissões em massa” - eventos em que uma grande parcela dos empregados deixa a empresa. Eles constataram uma redução salarial maior esses trabalhadores e reduções maiores para os trabalhadores que deixaram a empresa em épocas de retração.

Com base nessa abordagem, Arias-Vázquez, Lederman e Venturi (2019), em uma análise de referência para este relatório, constataram que os trabalhadores que perderam seus empregos quando a empresa foi fechada sofreram perdas salariais grandes e duradouras. Eles usam dados mexicanos de 2005 a 2017 (informações retrospectivas sobre emprego no nível de trabalhador da Pesquisa Nacional de Ocupação e Emprego do México) que lhes permitem identificar as perdas de empregos resultantes do fechamento de empresas. Os resultados indicam que levou em média 10 anos para o trabalhador que perdeu o emprego devido ao fechamento de uma empresa recuperar seu salário. Esse tempo médio de recuperação é bem maior do que para um trabalhador que se demite voluntariamente (três anos) ou para quem fecha seu próprio negócio (quatro anos). A Figura 3.1 ilustra a magnitude e a duração do impacto do fechamento de uma empresa sobre os salários reais de um trabalhador que perdeu involuntariamente o emprego em comparação com um trabalhador que não perdeu o emprego involuntariamente. Inicialmente, os salários são 11 por cento mais baixos nos

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