9 minute read

Conclusão

Rumo a uma política de R esposta integ R ada 133

Este capítulo discutiu as implicações deste estudo para as políticas e o contexto atual na região da ALC, argumentando que a política de resposta dos países da região precisa abordar diretamente três dimensões fundamentais. Essas dimensões não são inconsistentes e têm pesos diferentes em cada país / cenário, requerendo um tripé de políticas.

A primeira linha de resposta às crises inclui políticas que levem a menos crises e que, no nível agregado, suavizem seu impacto. Reduzir o número de crises requer um ambiente macroeconômico mais estável e a criação de “estabilizadores automáticos” adequados que forneçam apoio contracíclico à renda financiado pelo setor público para pessoas afetadas negativamente pelos ajustes do mercado de trabalho. Macropolíticas (fiscais e monetárias) prudentes evitam certos tipos de crises e garantem o espaço fiscal necessário para proporcionar apoio e evitar tensão financeira em todo o sistema caso ocorram outros tipos de crises. Além disso, esquemas de proteção de renda administrados nacionalmente, como o seguro-desemprego, suavizaram o consumo e funcionaram como estabilizadores automáticos na maioria dos países da OCDE. Os custos desses programas e a base tributária menor da região da ALC podem necessitar de uma abordagem diferente para a expansão desses programas na região - combinando, por exemplo, a poupança individual e a mutualização de riscos.

Possíveis mecanismos alternativos poderiam incluir, por exemplo, a transformação dos esquemas de retenção de emprego adotados na crise de COVID-19 em características permanentes das economias do países da ALC, tornando-os dependentes do Estado e ativando-os automaticamente quando, por exemplo, o desemprego atingir um determinado nível ou a recessão piorar. Complementando os mecanismos de assistência ao ajuste existentes com apoio contracíclico à renda financiado pelo poder público para indivíduos afetados, a região da ALC poderá ter ajustes mais suaves e de melhor qualidade em relação às crises, além de recuperações mais céleres.

Mas algumas crises são inevitáveis, e melhores resultados podem ser obtidos nessas situações se, além disso, a região fizer a transição para programas de proteção social mais ambiciosos, que reduzam os efeitos cicatriz. A existência desses efeitos significa que a região pode aumentar sua taxa de maior crescimento a longo prazo se a queda de capital humano induzida pela crise, no nível do trabalhador, fosse reduzida. Isso exigiria apoio à renda para amortecer os impactos de curto prazo da crise, protegendo o bem-estar, além de políticas de proteção social direcionadas para a construção de capital humano e promoção de uma transição mais rápida e de melhor qualidade entre empregos para trabalhadores que perderam seus empregos. Os sistemas de proteção social que não apenas fornecem apoio à renda, mas também ajudam a construir capital humano. Por essas razões, a segunda linha de resposta inclui reformas profundas nos programas de proteção social e trabalho existentes na região da ALC.

Tradicionalmente, as crises eram vistas como choques sistêmicos (que afetam toda a economia) transitórios (em oposição a permanentes). Embora choques sistêmicos permanentes - como a liberalização do comércio e a mudança tecnológica - também afetem o emprego e a produtividade, eles o fazem durante horizontes de tempo mais longos. Forças independentes do ciclo (“seculares”) tornam alguns empregos permanentemente inviáveis; esses empregos não se recuperarão na mesma empresa, setor ou localidade. Em contrapartida, os efeitos da oscilação da taxa de câmbio ou mudanças nas condições comerciais tendem mais a ser temporários. Cada vez mais, sabe-se que as crises podem ter efeitos de rigidez nos mercados de trabalho e na produtividade, que são diferentes daqueles gerados pela tecnologia ou pela globalização. No entanto, visto que os efeitos da crise ocorrem quando mudanças nas tendências e fatores estruturais e na rotatividade normal da economia já estão em andamento, é difícil distinguir esses efeitos e encontrar uma forma melhor para implementar programas de assistência para os trabalhadores.

O conselho-padrão na presença de choques negativos permanentes adversos é

134 e mp R ego em cR ise

proteger os trabalhadores e não os empregos- preparar os trabalhadores para a mudança em vez de evitar a mudança. Permitir uma reestruturação setorial ou espacial certamente aumentará a eficiência; em contraste, os subsídios de retenção e os programas de emprego temporário atrasam (enquanto dura o apoio), mas não evitam, a destruição de empregos. No entanto, esse conselho não se aplica a choques sistêmicos que são temporários. Nesses casos, os programas temporários de retenção podem evitar a dissolução de compatibilidades empregador-empregado que levaram muito tempo para ser construídas e encontram-se ameaçadas por choques temporários e podem causar perda de produtividade decorrente da destruição desnecessária de capital humano específico do trabalho.19

Quando as crises levam a mudanças permanentes na demanda e/ou oferta de trabalho, no entanto, as iniciativas de requalificação para o emprego e o estímulo à demanda podem ser respostas mais adequadas. Além disso, embora as crises sejam choques sistêmicos, geram efeitos altamente heterogêneos entre trabalhadores inicialmente semelhantes. Portanto, programas adaptativos, geralmente implantados para enfrentar choques mais individuais or idiossincrásicos (por exemplo, intermediação personalizada e apoio à busca por emprego) podem ser adequados para tratar esses choques. Passar de programas com orçamentos fixos e “cotas” racionadas para garantias de proteção (ou seja, da assistência apenas para os cronicamente pobres para redes de proteção que beneficiam todas as pessoas necessitadas), evitar o surgimento de “guetos” assistenciais e estruturar benefícios para incentivar o retorno ao trabalho são passos fundamentais para garantir que a proteção social amorteça melhor os impactos de curto prazo das crises. Embora seja óbvio que sem vagas não haverá colocações, a recuperação econômica normal da crise incluirá a criação de empregos, e a procura ativa é fundamental para preencher essas vagas de trabalho. Portanto, são necessário serviços de emprego mais robustos e coordenados, com maior foco em resultados e consequências não intencionais.

Mas será que os macroestabilizadores e as reformas nos sistemas de proteção social e trabalho serão capazes de criar empregos suficientes para promover melhores recuperações? Com base nas evidências apresentadas neste relatório, na região da ALC há uma necessidade premente de resolver questões estruturais para melhorar a resposta da região às crises. As reformas necessárias precisam abordar as dimensões setoriais e espaciais por trás dos ajustes inadequados do mercado de trabalho. Sem enfrentar esses desafios essenciais, a recuperação da região continuará sendo caracterizadas pela criação lenta de empregos. Nesse contexto, políticas de concorrência, políticas regionais e regulamentações trabalhistas são uma terceira dimensão fundamental da resposta de política. Este estudo destaca, por exemplo, a dicotomia entre as empresas protegidas e desprotegidas na região da ALC e o impacto da baixa mobilidade geográfica dos trabalhadores; ambas servem para ampliar os efeitos das crises. O estudo também destaca bolsões de rigidez trabalhista que dificultam as transições e os ajustes necessários no mercado de trabalho.

As implicações de políticas dessas constatações e da literatura relacionada são que, mesmo que os sistemas macroeconômicos, de proteção social e do trabalho sejam implementados de forma impecável e sem falhas, eles serão insuficientes se não forem complementados por políticas setoriais e baseadas no local, que abordem as questões estruturais subjacentes que impedem fortes recuperações de crises. As experiências da literatura e de políticas existentes sugerem que políticas baseadas no local poderiam abordar a falta de mobilidade geográfica e maximizar o potencial de realocação dos trabalhadores. Reduzir os bolsões de rigidez trabalhista (flexibilizando as restrições às decisões sobre recursos humanos por parte das empresas e indivíduos) poderia acelerar os ajustes e encurtar as transições. Da mesma forma, abordar o protecionismo e

r umo A um A P olíti CA de re SP o S t A integr A d A 135

as condições de mercado injustas por meio de melhores leis de concorrência, menos subsídios e menor participação do Estado e práticas mais sólidas de aquisição, poderia promover recuperações mais fortes. As políticas de resposta dos países da ALC precisam enfrentar essas questões, que terão pesos diferentes dependendo do país, do período e de outras circunstâncias.

A pandemia de COVID-19 é uma crise convulsiva e catastrófica que está cobrando um preço cruel dos mercados de trabalho da região da ALC. A região está vivenciando uma taxa extraordinária de destruição de empregos, choques negativos de renda maciços e níveis crescentes de pobreza. e poderá ter entre 35 e 45 milhões de novos pobres em 2020 como resultado da pandemia. Embora a classe média da região tenha crescido significativamente desde 2000, a crise poderia reduzi-la em 5 por cento, expelindo entre 32 e 40 milhões de pessoas da classe média (Diaz-Bonilla et al., 2020). Esse encolhimento da classe média e o aumento da pobreza são impulsionados por perdas de renda do trabalho. Estima-se que a crise será a recessão mais severa do mercado de trabalho na história de alguns países. Milhões de trabalhadores na América Latina e no Caribe perderam seus empregos e milhões mais sofreram reduções significativas de seus salários. Não se espera que essas perdas sejam partilhadas de maneira uniforme na distribuição de renda. Ao contrário, a crise pode aumentar substancialmente a desigualdade, empurrando o coeficiente de Gini regional de 51,5 para até 53,4 (Diaz-Bonilla et al., 2020).

Embora essa crise - desencadeada pelos imperativos de saúde pública de mitigar uma pandemia global - seja de certa forma excepcional, também é mais um em uma longa série de choques de demanda agregada que atingiram os países da ALC. Por um lado, a crise tem vários fatores distintivos importantes. Primeiro, o confinamento (lockdown) motivado pela pandemia foi ruim para muitos empregos e pior ainda para aquelas pessoas para as quais o trabalho em/de casa (ou o acesso de boa qualidade à internet) não é uma opção. Segundo, a incerteza prolongada sobre a crise, particularmente em relação a como o emprego se recuperará, tem atrasado os investimentos. Terceiro, alguns países da ALC responderam à crise com fortes políticas de resposta, mas a efetividade dessas medidas tem variado muito.

Por outro lado, essa crise não é tão diferente das que a antecederam. Grande parte dos efeitos da crise na região da ALC decorre da recessão global, da queda acentuada da demanda durante muitos meses e de possíveis crises financeiras em alguns países. A região tem tido um histórico notável de desacelerações econômicas frequentes e, muitas vezes, severas. O que acontece com os trabalhadores nesses períodos de desaceleração é, em grande parte, determinado por oscilações da demanda agregada (embora algumas crises internas tenham sido auto infligidas devido à má gestão).

Essa crise profunda chegou no momento em que muitos governos da região da ALC enfrentavam desafios estruturais conhecidos. Acelerou algumas mudanças estruturais de longa data que vêm mudando a natureza do trabalho, ampliando o potencial desta crise de reduzir ainda mais as oportunidades de emprego no que tradicionalmente eram considerados “bons empregos” - o emprego padrão, estável e protegido, associado ao setor formal (Beylis et al., 2020).

Considerando-se a dinâmica de emprego já observada em muitos países da ALC, esta crise causará efeitos cicatriz consideráveis no trabalho. As características setoriais e de local provavelmente ampliarão ainda mais esses efeitos para alguns trabalhadores. No entanto, o marco de políticas tridimensional proposto, apresentado neste estudo, fornece um roteiro que poderia levar a uma recuperação mais resiliente. A forma como as políticas públicas e empresariais enfrentarem os desafios atuais moldará o progresso das economias dos países da ALC e o bem-estar de seus trabalhadores e cidadãos durante décadas. O desafio é imenso e o momento de enfrentá-lo é agora.

This article is from: