Olha a Miss Paripueira!

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CULTURA

O DIA ALAGOAS l 27 de julho a 2 de agosto I 2014

Projeto Vidas Anônimas

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FIGURA SINGULAR das décadas de 70 e 80, Ambrosina Maria da Conceição tornou-se uma das personagens mais famosas de AL

Olha a Miss Paripueira! Francisco Ribeiro Repórter

T

odos os dias, A m b r o sina Maria da Conceição saía de casa vestida com roupas coloridas e adornada com acessórios extravagantes. As ruas da atual cidade de Paripueira, até 1988 uma vila agregada ao município de Barra de Santo Antônio, eram a sua passa-

rela. E por onde caminhava, ou melhor, desfilava, recebia aplausos e gracejos dos moradores e convites de turistas para tirar fotos. Sua peregrinação diária transcorria sem maiores aborrecimentos, até os “maloqueiros” azucrinarem a sua paciência. Eles a chamavam de Sabiá ou Canela de Sabiá, apelidos que ela detestava. Ambrosina, uma senhora

de origem negra, magra e de estatura baixa, perdia a calma e gritava: “Meu nome é Miss Paripueira!”, alcunha pela qual se tornou conhecida e como ainda permanece viva na lembrança de muitos alagoanos. Quando avistada pela criançada, Ambrosina não tinha sossego. Uma das brincadeiras que mais a desagradava era quando a garotada

arrancava a sua peruca. A reação dela sempre rendia boas gargalhadas e também carreiras dos meninos para evitar uma pancada com a sua sombrinha. Miss Paripueira transitava entre a lucidez e o delírio. Figura singular das décadas de 70 e 80 no pequeno município onde residia, sua fama não tardou a chegar à capital. Vez ou outra, quem andasse

pelo Centro de Maceió poderia se deparar com Ambrosina, que logo se tornava uma grande atração. O advogado e professor universitário Carlos Ramiro Basto registrou o início da jornada para a fama da ilustre moradora de Paripueira em artigo publicado no livro Arte Popular de Alagoas, cuja pesquisa e organização são de Tânia Pedrosa.

Antes do estrelato, Miss fazia-se de “beata”. Conhecida por Vizinha, ela percorria as praias, aos domingos e feriados, com uma bandeja repleta de flores, onde repousava a imagem de uma santa, pedindo contribuições em dinheiro para uma infindável “novena”, realizada em sua casa. “Num domingo de Carnaval, quando ela estava na praia pedindo espórtulas [doações], várias jovens, inclusive minha filha Elizabeth, perguntaram se ela não queria ser candidata a Miss Paripueira. Ela ficou satisfeita com a proposta e respondeu afirmativamente. Imediatamente, as jovens improvisaram uma fantasia com a faixa de miss e uma coroa, e colocaram-na num jipe sem capota, que seguia o caminhão da orquestra. Foi aclamada miss durante todo o percurso do corso. E, daí por diante, a Vizinha deixou de ser ‘beata’ e passou a ser Miss Paripueira”, escreveu Carlos Ramiro Basto. Tomado pela vontade de registrar a história da Miss, o então diretor alagoano José Márcio Passos, 63, documentou em Super-8 o cotidiano da personagem. “Acompanhei o dia a dia dela. Desde o momento em que saía de casa, pedia dinheiro para as pessoas, era xingada pelas crianças.

Celso Brandão

Aclamada num domingo de Carnaval Todas as suas reações”, lembra. CURTA METRAGEM “Miss Paripueira se considerava a mulher mais bonita da cidade. Era um delírio maravilhoso. E a convivência com ela foi fantástica”, conta Márcio Passos, lamentando a perda da única cópia do filme que tinha. O curta recebeu o terceiro lugar para Melhor Filme no Festival Nacional de Cinema de Aracaju (Fenaca), em 1978, e a mesma colocação no IV Festival do Cinema Brasileiro de Penedo. O cineasta recorda alguns episódios engraçados protagonizados por Ambrosina, como quando falava sobre a paixão dela por um certo capitão Salgado, ou por um personagem da novela Antônio Maria, exibida pela TV Cultura, em 1985. Há quem diga que o tal capitão existiu e há quem afirme que era só mais uma invenção da sua cabeça. Ela também não descuidava da aparência, pois, caso contrário, Lulu da Barra, invejosa, poderia roubar a sua coroa e o seu título. Lulu, segundo Miss Paripueira, não sabia desfilar e nem tão pouco dançar o Carnaval. Somente ela conhecia o “passo da onça”, um estilo de dança com o qual pretendia desafiar a invejosa rival.

A Miss Paripueira foi tema de um documentário em 1978, dirigido pelo ator e cineasta alagoano José Márcio Passos


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