Diário de viagem

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DIÁ RIO DV E I A EM


19.09.19 . diário de viagem . dia 1

Helsinki. Bairro Arabia. Reconhecimento do lugar, arte para todos os lados. Quando não é arte, nem design, é a natureza exuberante que nos rodeia. Se de um lado há a praia, de outro há o parque. A rua é silenciosa apesar do movimento. Muros pintados, esculturas

metálicas, e uma língua que não se entende uma só palavra. Ainda bem que é possível falar inglês por aqui! Saímos com tempo nublado, veio o sol, passou a chuva e enfim o arco-íris. Me parece que o tempo por aqui é bem eclético. Chegamos a uma temperatura de 1 grau logo pela manhã e o céu colorido do amanhecer. Estamos agora com 11 graus.



20.09.19 . diário de viagem . dia 2

A manhã fria: 2 graus. Uma caminhada pelo centro de Helsinki, feira de rua (cogumelos, artesanato local, berries e outras coisinhas mais), sauna de frente pro mar, piscina semi olímpica no porto, navios que fazem trânsito de um país ao outro, e até uma roda gigante na qual uma das cabines é uma sauna, dá para acreditar! Um tempinho para descanso e um almocinho no Kapelli, no parque da Esplanada. E, por fim, uma caminhada de fim de

tarde com paisagens exuberantes às margens do mar Báltico em companhia de uma legião de patos migratórios.



21.09.19 . diário de viagem . dia 3

Minhas impressões aqui são as melhores. Uma cidade de uma arquitetura ímpar, muito moderna e interessante. O dia foi de passeio por uma

região bem central da cidade onde estão algumas das construções de arquitetura mais incríveis: a biblioteca pública Oodi, o Museu de Arte Contemporânea Kiasma e a Capela do Silêncio, que dialogam de maneira interessante, por exemplo, com o prédio Helsinki Central Station, uma construção de design romântico, feito por Eliel Saarinen e inaugurada em 1919. Almoçamos no Helsinki Music Center, onde fomos atravessados por violinos, pianos e flautas. Um lugar amplo repleto de famílias e crianças sentadas, quietas, ouvindo música clássica. Um dia para todos os sentidos. Algumas coisas me chamam atenção por aqui. As crianças que, desde muito pequenas, andam sozinhas de um lado para o outro nas ruas. A organização dos lugares e a hospitalidade. Me parece que há motivos de sobra para que aqui seja o lugar onde as pessoas sejam mais felizes, embora saiba que tudo tem dois lados. A Capela do Silêncio é uma estrutura alta oval de madeira no centro da cidade que se propõe a ser um lugar para meditar.



22.09.19 . diário de viagem . dia 4

Amanheceu gelado: 6 graus com sensação térmica de 1 grau. Mesmo assim o dia estava lindo. Sol, nuvens e o céu azul. Fizemos um passeio ao ar livre por Porvoo, uma cidadezinha medieval, que fica a 30 minutos de Helsinki. Pacata, repleta de casas de madeira coloridas, chão de pedra, barcos no canal que cerca a cidade e a catedral que fica bem no alto e no coração da cidade velha. Poucas pessoas caminham pela rua e um grande grupo de ciclistas. No final da tarde uma visita a incrível a igreja de pedra, feita pelos irmãos Timo e Tuomo Suomalainen, em 1969. Construída a partir de uma única rocha de granito que foi escavada de forma circular mantendo as paredes de pedras despida. O teto em cobre é a única parte visível da igreja vista pelo lado de fora.

A sensação de estar aqui e ver a paisagem é sublime. Sentar no silêncio e sentir a energia das pedras. Olhar para o horizonte na praia e ver uma sequência de horizontes: o horizonte de água, o horizonte de margem e o horizonte de árvores. O silêncio paira dentro e fora de mim.



23.09.19 . diário de viagem . dia 5

O dia começou gelado 1 grau. Gelado e lindo. O passeio hoje foi para a ilha Suomenlinna, uma das ilhas do arquipélago de ilhas situadas ao redor de Helsinki, caracterizada por ter uma muralha de pedras ao redor de toda a ilha. Sua importância é ter defendido três países consecutivamente: a Rússia, a Suécia e a Finlândia. Hoje é um dos patrimônios da UNESCO. Atravessei o canal de barco. Sentada no banco observei as ilhas, a cidade que ia ficando para trás, o mar e o céu. As pessoas aqui são suaves. Me parece que há uma delicadeza no ar. Os sons da cidade também são suaves. É possível ouvir o silêncio mesmo no meio da cidade. Em poucos minutos cheguei à ilha. Precisamente 10 minutos. Uma longa caminhada entre chegada e o fim da visita. Apesar do vento gelado o corpo

continuava quente. Subindo e descendo os caminhos, observando as casas, algumas construções de pedras outras de madeira e por fim a natureza. A deslumbrante natureza que se instalou ao meu redor. O mar, a vegetação exuberante, as pedras, tudo na mais perfeita ordem como num filme. Sentei no banco para ouvir o som do silêncio. Ora era vento ora era silêncio. Ora eram palavras ora era o corvo. Caminhando eu pude observar o mar dos dois lados, as pequenas reservas de água eram o lugar perfeito para as fotos. Parando aqui e ali reconheci em mim um estado de ilha. De estar em si mesmo e ao mesmo tempo pertencer a algo maior. Sentei-me de volta na barca, agora exausta. Exausta e feliz.



24.09.19 . diário de viagem . dia 6

Hoje o dia começou azul e frio. O sol da manhã durou até o meio do dia. Logo depois do almoço, o dia nublou e, mesmo assim, fui dar uma volta a uma ilha chamada Lammassaaren Pitkospuut, separada de Arabianranta por uma ponte. Nessa ilha há uma série de casinhas de verão no meio da floresta onde os moradores daqui costumam passar o verão. Caminhada longa e divertida por entre caminhos de madeira e de terra envolto de plantações e mata fechada. Cogumelos de tipos variados,

troncos, ovelhas, e muitos tipos de pássaros incluindo corvos. Estar em contato com a natureza é mágico, me fez lembrar os contos de fadas, lendas celtas e das histórias de João e Maria; bruxas, fadas, duendes, todos eles ao mesmo tempo misturados numa só história. Viajar é deixar-se levar pelo que os lugares trazem pra você. Os sons da natureza, as cores, as formas, o cheiro... Há de se estar disponível para perceber os lugares por sua alma e não só pelo que se pode ver. Ah, caçar cogumelos no outono é uma atividade bastante comum por aqui, mas é preciso conhecer bem os tipos de cogumelos.



25.09.19 . diário de viagem . dia 7

Apesar da chuvinha fina hoje o dia estava mais agradável. Saímos então para visitar galerias numa região chamada Punavuori. Inicialmente fomos na galeria Huuto e Ranka, localizadas no mesmo prédio, uma construção antiga. Depois fomos ao Exhibition Laboratory que, pela característica do lugar e das exposições, me pareceu um espaço de arte vinculado a uma universidade e por fim o Museu do Design chamado Design District Helsinki. Andar pelas ruas da cidade observando o movimento, as pessoas, o funcionamento do trânsito e a energia é a melhor maneira de conhecer um lugar. Buscar as galerias e ateliês não

convencionais é uma forma de me aproximar da arte feita aqui nesse momento. De perceber sintomas que circundam os processos criativos e principalmente questões investigadas pelos artistas locais.



26.09.19 . diário de viagem . dia 8

Nem só de passeios é feita uma viagem. Estar em outro país é uma experiência em si. Não é necessário estar fazendo coisas o tempo todo, até porque se manter ocupado com compromissos de visitas a lugares o tempo todo nos desvia da possibilidade de sentir o lugar. Perceber o seu ritmo, o ar que paira, o tempo das pessoas do lugar, os detalhes. Viajar é ser um outro por alguns dias. Ser uma outra versão de si mesmo, num tempo estendido. É um estar quase isento de memória, de vestígios, é ampliar os sentidos e possibilitar que o lugar entre em você. Que deixe novos vestígios, que provoque as memórias, que aguce os sentidos. Hoje no final da tarde peguei o navio para Estocolmo. Uma noite no navio. A

paisagem me atravessa. Centenas de ilhas. Uma após a outra, cada uma com sua paisagem, com seus habitantes. Ora casas de verão ora habitantes de um tempo estendido. Me ponho a pensar o que é viver numa ilha... só consigo pensar em um tempo estendido e em um contato maior com a natureza. O mar calmo faz flutuar os olhos até acariciar as margens, pedras, vegetações, cais, embarcações. Tudo me parece descansar. De uma suavidade e beleza que acalmam. Acho que isso é ser ilha, ficar repleto dessa suavidade e flutuar no mar como quem deita suavemente sobre uma flor.



27.09.19 . diário de viagem . dia 9

Estocolmo tem uma energia diferente. Um pouco mais agitada. Aqui transpira arte. A cidade velha é bucólica, mas interessante. Tem um movimento diferente. Os prédios coloridos, as fachadas de lojas divertidas, turistas caminhando, gente bonita e um espaço reduzido de ruas de pedra que, ao mesmo tempo que abrigam pequenos estabelecimentos, abrigam grandes lugares. Um passeio pelas ruas me fez perceber

que se eu caminhar um pouco mais devagar vou me deparar com coisas interessantes. Subi a rua de pedra observando as vitrines/janelas. Não sei bem ao certo dizer qual das duas. Ora vitrine ora janela. Quando eram janelas pareciam uma exposição de arte contemporânea dos depósitos das casas, quando eram vitrines carregavam elementos que se repetiam incansavelmente como os ursinhos, ou imagens do Papai Noel ou souvenir. Andei um pouco mais e encontrei um sebo. Um senhor delicado tomava conta dos livros e logo se aproximou me perguntando, em sueco, se eu procurava algo especial. Não pude entender as palavras, mas sei que disse isso. Agradeci em inglês e disse que estava só olhando. Abri vários livros em sueco e em cada um deles as palavras escorregavam pelo meu olho e não me diziam nada. Olhei poesias, cartas, eu podia imaginar o que poderia estar escrito, mas não sabia de fato. Estava decidida a comprar um livro. E olhando mais um pouco encontrei o exemplar perfeito: um pequeno livrinho que dizia 'Two short stories - scandinavian words'. A capa era cinza com uma imagem de água escorrendo sobre um vidro. Peguei o livro, abri e não entendi o preço. O senhor que me atendeu também não entendeu, mas logo encontrou um valor. Paguei o livrinho e sai contente. Pequenos encontros são cheios de intensidade. De rua em rua continuei coletando pequenos encontros que fizeram nascer mais um dia de viagem.



28.09.19 . diário de viagem . dia 10

O dia acordou chuvoso. Não muito frio, mas chuvoso. Resolvi fazer um programa de museus um pouco diferentes dos museus de arte que fui até agora. Primeiro fui no Vasa Museu. Vasa foi um navio de guerra sueco, do início do século XVII, que naufragou assim que deixou o porto em sua primeira viagem. O fato causou uma comoção nacional à época e depois de 333 anos debaixo da água foi recuperado e tornou-se acessível ao público. Foi uma experiência bem interessante. Logo em seguida fui a um outro museu chamado Junibaken. Junibaken é um mundo do conto de fadas. As ilustrações de livros infantis são reproduzidas com cenários onde as crianças podem brincar. Possui a maior biblioteca infantil da Suécia. É um passeio incrível para fazer com crianças. E para terminar o dia fomos a um Coral Gay muito divertido e muito emocionante. Eu adorei.

O clima por aqui é agitado embora o dia chuvoso pareça amornar o dia. Muitas pessoas nos museus o que me fez pensar que lugares menos turísticos me interessam mais. Ao mesmo tempo parada sob um abrigo, me escondendo da chuva, eu comecei a observar a natureza. Os jardins são tão incríveis quanto a natureza dos arredores. O mar está de todos os lados, e barcos, e navios e árvores. Numa dessas árvores de berries havia uma quantidade enorme de passarinhos pulando de galho em galho. Quanto mais olhava a árvore mais passarinhos eu conseguia ver. Nem a chuva tirou-lhes a disposição. A caminho do coral a cidade estava cheia, trânsito e muitas luzes já acesas pela chegada do final do dia. Termino o dia com o coração aquecido pelo encontro com a música.



29.09.19 . diário de viagem . dia 11

O dia estava cinza mas logo ficou azul. Comecei com uma visita a City Hall. Para minha surpresa o prédio estava repleto de trepadeiras multicoloridas. Belezas de outono. Uma visita ao interior do prédio trouxe revelações interessantes e uma arquitetura muito especial. Do lado de fora os jardins

labirínticos, esculturas, a paisagem equilibrada repousa sobre o olhar. Ao redor o mar e o desejo de ser ilha. De novo o desejo de ser ilha. Por aqui a arte se estende para todos os lados. Árvores com as folhas coloridas, jardins cheios de flores. Tudo muito bem cuidado. Andando pela cidade a troca da guarda do parlamento, lambe-lambes nas divisórias de madeira do canteiro de obras e, por fim, desenhos no metrô. Encontrar a cidade é poder observar lentamente. Caminhar sem pressa ou sem ter onde chegar. Lentamente ouvir o som das palavras que não se pode entender, perceber os diversos tipos de pedras no chão das ruas, observar o céu e todas as paisagens que nos atravessam o tempo todo. Ser cidade é ver a arte nos jardins, nas paredes das construções, na arquitetura, estar vulnerável para perceber o que o caminho me traz. Encontrar desenhos na estação de metrô foi uma grata surpresa. Desenhos lindos e gigantes. O caminho de volta pra casa foi de metrô. Rápido e quase ausente de paisagem.



30.09.19 . diário de viagem . dia 12

Passeio pela feira de rua de Estocolmo me fez lembrar como andar pela cidade é bom. Paisagem urbana, vitrines, monumentos, o ritmo da cidade. Terminei o dia num bairro parecido com o Soho, em NY, chamado Sofo. Mas hoje eu quero falar sobre o meu estado de flor. Ao caminhar pelo

parque onde os jardins estão floridos eu teço as linhas coloridas do tempo. Da semente ao primeiro botão de onde ela vai surgir. Num movimento suave vai romper as membranas e tornar-se flor. As pétalas vão se abrir, se estender, encostar umas nas outras e mostrar suas cores de maneira suavemente escandalosa ou escandalosamente suave. Olhando de um ramo a outro, de uma pétala a outra me dou conta de quantas cores são feitas uma mesma flor que é chamada de vermelha ou de laranja. Quando meus olhos encontram a flor me pedem para ficar, para estender o olhar, observar cada forma, os contornos, as texturas que de tanto olhar ordinariamente se perderam com o tempo. Me esqueci como são as flores. Tive vontade de chorar quando me dei conta de quão rápido tenho olhado para as flores. O quanto não tenho estado verdadeiramente com elas. De tanto e muito e sempre eu parei de me demorar o tempo necessário e passei a olhar sem ver. Ah sinto muito por isso! E por tantas outras coisas que me dou conta. Pelo pouco tempo que me permito não fazer nada e simplesmente sentir. Viajar me faz ampliar esse tempo. Eu costumo observar árvores. Por aqui as árvores são multicoloridas. As folhas coloridas fazem a paisagem parecer ainda mais viva. De um dia para o outro a cor da árvore muda. O ser efêmero inerente a natureza se apresenta em folhas, no tapete colorido do chão, nas ruas que ficam diferentes a cada mudança da paisagem. O meu estado de flor me fez olhar. Fez brotar em mim o sentimento de florescer. Fez nascer em mim um ser suave com olhar aguçado para as nuances de cor de quase tudo que se chama azul, verde, vermelho, roxo, laranja, amarelo. Fez dormir em mim o olhar desabitado de paisagem, o olhar desabitado de ser flor. Desenhar as flores me faz ser ainda mais flor. Me aproxima dos seus contornos e novas flores surgem do poder do estado de flor. A combinação das flores de espécies diferentes me faz criar novas formas do ser flor. Uma forma um pouco mais humana, mas, afinal o que é o estado de ser flor senão a humanização da flor? Continuo a caminhar pelo parque e mesmo quando não vejo mais as flores as carrego comigo. Eu e meu estado de flor.



01.10.19 . diário de viagem . dia 13

Cheguei ontem à noite a Riga, capital da Letônia. Riga é uma cidade grande de um milhão de habitantes. A opção foi a cidade velha. Old Town. Fiquei apenas um dia e foi muito bom. Sai a pé na cidade sem a intenção de ir a lugar algum. Andar, observar, sentir, e descobrir o que a cidade iria me trazer. Um pequeno ateliê aberto de gravura. A artista que estava no ateliê muito simpática disse que as pessoas podem usar o ateliê e deixar os trabalhos acredito que para serem vendidos, as crianças saem da escola e vão ao ateliê. Continuar caminhando me fez observar as ruas de pedras, esculturas, vitrines divertidas, e construções interessantes. Porque faz muito frio por aqui há muita

arte na cidade. Faz -20 graus no inverno e as pessoas ficam em casa produzindo arte. Há lojas de roupas feitas com tear, objetos em vidro, artesanatos locais, muita cerâmica e peças em âmbar. No caminho fomos a uma exposição interativa 'de Monet a Kandinsky' e por fim almoçamos num lugar que eles chamam de Lido, que é uma espécie de self service com comidas típicas do local. Um pouquinho antes do almoço fui surpreendida por um som de violino na praça vindo de dois jovens. Me pareceu um momento especial, de entrega. A cidade é muito simpática, e merece uma visita.



02.10.19 . diário de viagem . dia 14

Cheguei a Tallinn, na Estônia, ontem à noite. Terminei a noite com uma deliciosa sopinha de peixe para esquentar. A previsão era de chuva para o dia seguinte, mas nada que pudesse me abalar. Estava decidida a caminhar por Old Town mesmo assim. E assim foi. Apesar de ora garoar, o dia passou tranquilo. A cidade de prédios coloridos, poucas igrejas, muitas lojinhas de souvenir e ruas de paralelepípedo é envolta por um muro de pedra e é o centro cultural do país. A natureza, como todos os lugares por onde estive por aqui, se mistura com a cidade. Árvores de outono, de muitas cores e formas.

Quase em cada rua abrem-se pequenos becos que abrigam lojas e pequenos comércios. Há uma rua de ateliês, um ao lado do outro que estão ligados por portas internas que no inverno ficam abertas para que as pessoas possam se deslocar de um ateliê ao outro sem ter que sair na rua. Por aqui come-se muita carne (de porco, de javali, de rena, de alce) e também peixe, afinal há mar para todos os lados. O que é bem interessante é que vários países da Escandinávia não cultivam a religião. Há igrejas, mas não cultos. Isso não significa que não tenham espiritualidade, muito pelo contrário. Eles tem uma profunda relação com a natureza e com as leis espirituais o que é muito claro pela maneira como se relacionam entre si, com a natureza e com a cidade. Chegando ao final do dia vou indo de volta a Helsinki, de barco.



03.10.19 . diário de viagem . dia 15

Depois de dias intensos de viagem o dia começou frio e chuvoso. A ideia era pensar em lugares fechados, mas acabei resolvendo andar pelas ruas da região deixando a garoinha fina cair. O movimento da cidade não muda, aqui a maior parte da população usa transporte público. Tentei a ida em um museu de arte contemporânea que estava na minha lista chamado Amosrex, estava fechado para montagem de uma exposição. Depois passei no Kiasma para tomar um chá antes de continuar a caminhada. Entrei num prédio que acolhe 15 cinemas e parece muito divertido, e atravessando o corredor dei de cara com o HAM, Museu de Arte de Helsinki, que também estava na minha lista. Entrando no museu gostei de 2 mostras a primeira chama Old Age, onde eram apresentados desenhos, pinturas, gravuras e dois vídeos. Um dos vídeos muito

bonito que alternava a imagem de um senhor que permanecia calado e a vista que ele tinha da janela com falas sobre a vida e o tempo. E por fim a artista Tovi Jansson, que é uma artista finlandesa que além de suas obras murais, e outras pinturas, fez uma pintura nas paredes do hospital infantil de Helsinki que deu origem ao Moomin, o mascote do país.



04.10.19 . diário de viagem . dia 16

A viagem chegou ao fim. Último dia. Fiquei por aqui perto do apartamento. Dia frio, gelado, 3 graus, sensação de -2. Comecei o dia como uma caminhada no parque. Mais uma vez me surpreendi com a cor das árvores. Me parece que

me surpreender se tornou um hábito. Depois uma visita ao museu do design. Instalações feitas com objetos do cotidiano. Uma nova maneira de ver o ordinário. Mais um passeio por outro parque bem perto daqui. Saí caminhando e observando as plantações que as pessoas fazem em espaços públicos, o bosque cheio de passarinhos, as flores, o movimento das folhas e de repente começou uma chuva. Agradeci a chuva e comecei a ver uns floquinhos de uma quase neve. Agradeci mais uma vez. Acho que o que eu mais tenho feito nesses dias é isso. Sinto uma imensa gratidão por estar disponível para perceber todas as belezas que o mundo tem me oferecido. Saio daqui repleta, descansada e de alma lavada. Levo comigo as paisagens, o descanso das pedras no mar, o monte fugi que se formou no céu ao entardecer, as partículas de neve que surgiram repentinamente na janela enquanto eu descansava o olhar, o acolhimento das amigas queridas, e a cores das folhas.

Para viajar é preciso estar plena. Aberta para receber. Disposta a trocas e com o olhar atento as pequenas coisas.



24.09.19 . diário de viagem . helsinki / arabia

Esculturas e instalações do complexo residencial de Arábia, um bairro de Helsinki. Uma grande área arborizada e repleta de árvores frutíferas, parques infantis e obras de arte é o bairro onde eu estou instalada aqui, na casa de uma querida e muito gentil amiga.

Andando ao redor das ruas há arte para todos os lados; ora nas fachadas das casas e prédios ora nos intervalos entre um prédio e outro. Uma sensação de pertencimento. De perceber a um lugar que se importa com a cultura e a insere de tal forma no cotidiano que fica entranhado nas pessoas. Uma das coisas lindas que tem aqui é que tudo solo que não é particular é de todo mundo, todos podem colher frutas e qualquer outra coisa que tenha sido plantada em solo público. Assim também há um cuidado com a rua e com todos os espaços públicos, que afinal pertencem a todos.



21.09.19 . diário de viagem . oodi

Oodi é a mais nova biblioteca pública de Helsinki que é uma cidade que conta com 40 bibliotecas públicas. Com um conceito inovador o design do prédio é uma combinação entre o moderno e o contemporâneo. Foram ouvidas 2000 ideias

sobre qual seria a biblioteca dos sonhos dos possíveis frequentadores. Assim surge Oodi. No terceiro andar livros, todos os que é possível imaginar. O segundo andar todo dedicado a atividades interativas, lugares para reunião, estudos, aula e um grande laboratório de experimentação que conta com as mais diversas impressoras, máquinas de costura, guilhotinas de todos os tamanhos. Impressoras 3D, jogos, salas de gravação com todos os instrumentos, saias de filmagem de filmes. Tudo à disposição da população que deve pagar somente pelo material que for usar. E para terminar a escada foi projetada, pelo arquiteto Otto Karvonen, em dupla-hélice, baseada no projeto de Leonardo da Vinci na qual é possível que duas pessoas usem a escada sem nunca se encontrarem. Me parece que a construção da cultura e o compartilhamento dos espaços é algo relevante por aqui, assim como a educação, que é a primeira do mundo.



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DIÁ RIO DV E I A EM O projeto 'diário de viagem' foi elaborado a partir da experiência de viajar, observar e escrever. Eu não sai daqui imaginando que o faria, mas as circunstâncias me levaram a escrever, havia uma relação profunda com a natureza, o que de certa forma me aproximou do lugar. Essa foi uma viagem sem check list. Foi uma oportunidade de conhecer dois países da Escandinávia (Finlândia – Helsinki e Suécia - Estocolmo) e dois países bálticos, do norte da Europa (Letônia - Riga e Estônia Tallin). Uma viagem de amigas, em um ritmo lento que me proporcionou um olhar delicado sobre a paisagem e um encontro com o silêncio desses lugares.

Textos e imagens: valeria scornaienchi Design gráfico: fabiana pacola ius 2019


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