corpopedrapaisagem

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corpopedrapaisagem

valéria scornaienchi


Corpopedrapaisagem fala dos percursos, os quais eu coleciono imagens, sensações, objetos e reflexões, busco um contato mais profundo, que me adentre à natureza e aos seus mistérios. Só assim me vem as perguntas. Pensar em lugares de passagem é como pensar em viajar. Eu chamo de viagem não somente lugares distantes, mas tudo aquilo que me carrega para fora do meu cotidiano, e ativa em mim um desejo de estabelecer conexões ora verdadeiras, ora inventadas. Colecionar imagens, escrever, desenhar, fotografar, escutar as pedras, atravessar todas as barreiras invisíveis me levam ao lugar do viajante. Seja aquele de Alain de Botton, que sempre viajou sem jamais sair de casa, ou aquele que atravessou mares, desertos e cidades vivendo realidades que jamais poderão ser traduzidas em palavras ou imagens. Me interessa pensar a partir desse lugar do viajante. Do lugar de alguém que é atravessado por paisagens, por palavras não compreendidas, por sentimentos desconhecidos e ainda assim encontra conexão com o lugar e com si mesmo. Como pensar o lugar como potencial dispositivo de uma vivência carregada de percepções que são resumidas em linhas, palavras e desenhos? Será que cada vez que alguém olha essas linhas, é capaz de carregar a si mesmo para outros lugares de passagem? Será possível ativar o dispositivo de memória como aquele que eu senti quando avistei esses fragmentos de granito na praia do mar Báltico e fui levada a pensar no chão das estações de trem de Milão e nos túmulos das igrejas de Florença. Que dispositivos afinal são necessários para ativar a memória? Os textos foram escritos depois, quando eu não estava mais lá. Textos construídos a partir da relação que eu criei com os lugares, e do tempo em que me demorei ali.


Aves migratórias





Todos os dias pela manhã elas estavam ali. Deitadas sobre as águas do mar Báltico. Ora como esculturas imóveis na estrutura e no reflexo, ora como coadjuvantes do cenário poético da praia. Aqui o mar parece o rio. Movida pelo vento a água relata seus poemas, ou cala-se no silêncio.



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Todos os dias ele estava ali. Chegava lentamente com sua vara de pescar, chapéu cinza, e um casaco listrado de amarelo e preto. O silêncio era a sua melhor companhia. Ninguém poderia imaginar que dentro dele havia um sentimento tão profundo. A estrutura forte e delineada do seu corpo escondia a fragilidade de um amor não correspondido







O livro da natureza, de Fritz Kahn, de 1952, foi encontrado em um sebo há alguns anos atrás, e em determinado momento do processo ele se tornou essencial para pensar desdobramentos da própria natureza, das experiências vividas e de outras conexões entre o ser, o seu autodesenvolvimento e a natureza. Era quase como um viajar sem sair do ateliê que me permitiu associar imagens e olhar para o mundo descrito pelo autor como um elemento do meu próprio trabalho que se resumiu em palavras, textos grifados e imagens. Allan de Botton diz que a mobília insiste em que não podemos mudar porque ela não muda, ela traz o ambiente doméstico que nos mantém amarrados em quem somos na vida cotidiana, mas talvez não na essência. De qualquer maneira continuamos atados a esses dois lugares, a casa e ao lugar de passagem. Seja como protagonistas da nossa própria história, seja como personagem transitório que deixa vestígios e carrega consigo a experiência de por algum tempo ser um outro.



















As vitrines são como a imaginação. Criam um universo real ao mesmo tempo onírico. Os elementos se misturam e mesmo quando parecem nada interessantes sugerem o oposto.



O que é a ilha? A que arquipélago pertenço? Será o cosmo a casa da ilha? Que conexão é necessária para o cosmo e a ilha sejam um? Eles já não são um? Haverá ilha no cosmo?


Imagens, texto e edição valéria scornaienchi valeriascornaienchi.com


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