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Natal
from Revista UERN 54 Anos
by UERN Agecom
Uma universidade inclusiva e includente
Localizada no coração da Zona Norte de Natal, o campus da Uern é a única Instituição de Educação Superior (IES) pública a atuar na localidade. Com uma vocação para a extensão, especialmente através da arte e da educação, o Campus conta com uma série de projetos e ações voltados para a comunidade que reside e/ou trabalha em seu entorno.
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Em visita ao Campus, a reitora Cicília Maia conversou com Tiago Campos, integrante do grupo Cinese, de dança contemporânea; com David Fonseca, do grupo Baobá, de teatro; com Dona Marlene Santana, da Fundação Julieta Barros e com a professora Irene van den Berg, coordenadora da Escola de Extensão da Uern (Educa), unidade responsável por organizar e gerenciar a oferta de cursos e atividades de extensão no campus de Natal.

Tiago mora próximo à Uern Natal e conheceu o grupo Cinese a partir de outros integrantes do grupo. Ao assistir o espetáculo Pindorama, ele, que nunca imaginou fazer parte de um projeto artístico de dança contemporânea, ou qualquer outro projeto artístico, resolveu ingressar no grupo, buscando uma forma de se expressar através de seu corpo. Como pessoa trans, Tiago encontrou no Cinese uma forma de se entender, de entender seu corpo e saber que ele pode ser incluso e está apto a fazer qualquer atividade. “Eu posso dizer com propriedade que a arte salvou a minha vida. Eu estava perdido, ansioso, e quando eu entrei em contato com o Cinese, eu pude entrar em contato também com a minha sensibilidade, e fiz isso com uma forma totalmente ligada com o social, com a forma como eu queria que as pessoas me chamassem. Eu pude explorar o meu corpo, explorar minha sensibilidade. Todas as pessoas como eu, ou diferentes de mim, que estejam inseridas nessa multiplicidade de identidades também conseguem ser inseridas nesse tipo de projeto”.
O grupo Cinese existe desde 2018 com a proposta de incluir a diversidade. Seu edital de seleção passou a ter expressamente o termo “pessoas trans” entre o perfil dos candidatos. Essa simples atitude foi vista como um convite à participação no grupo. “Não é que antes as pessoas trans não pudessem participar do grupo Cinese, é que ao colocar expressamente no edital, essas pessoas se sentiram convidadas a participar do grupo. Muitas vezes esses corpos estão silenciados e a dança, especialmente a dança contemporânea, promove a experiência de experimentar seu próprio corpo, de desafiar o corpo, seja de uma pessoa trans, ou de uma mulher madura, negra, periférica, como temos muitas com esse perfil também no grupo”, explica a professora Irene, coordenadora da Educa.
David também morava no entorno do campus de Natal quando ingressou nas oficinas de teatro da Educa. Ele já buscava ingressar em um curso de teatro, porém não havia encontrado ainda uma opção acessível, do ponto de vista financeiro e da própria localização, uma vez que não existiam grupos de teatro na Zona Norte da capital. A partir das oficinas surgiu o grupo Baobá, no qual ele está desde o início. Hoje ele é aluno do curso superior de Teatro da UFRN, já não mora próximo ao Campus da Uern, mas continua no grupo. “Subir no palco pela primeira vez, no espetáculo “O Santo e a Porca”, foi um
Só
Agradecer
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divisor de águas na minha vida. Naquele momento eu me encontrei aqui. Eu sabia que era o que eu queria fazer o resto da minha vida. A gente levar a arte para as pessoas e ter esse conjunto trabalhando para que a arte chegue até a comunidade, chegue até as cidades localizadas no interior do estado, é muito revigorante, é mais forte que qualquer coisa”.
No Baobá, além das técnicas do teatro, são trabalhadas também outras características que são fundamentais para o artista: a produção e a captação de recursos via projetos culturais para a realização dos espetáculos, que reflete também na formação dos profissionais.
“Muitas vezes a universidade é o espaço que a população dispõe para o encontro com a arte e com a cultura. Me chamou a atenção quando uma estudante nossa, em um evento que participamos em Mossoró, me disse emocionada, que aquela era a primeira vez que ela entrava em um teatro. Eu entrei com ela no teatro, mas aquela fala me tocou de uma forma muito especial e me fez refletir que eu, enquanto aluna de graduação, também passei a ter contato com artistas, com a arte e a cultura, aqui, na própria Universidade. E tenho certeza de que essa é a realidade de muitos estudantes. É por isso que tenho muito orgulho em dizer que a nossa Universidade é espaço que acolhe as pessoas em condições de vulnerabilidade”, afirmou a reitora Cicília Maia.
Após o momento com os meninos do grupo Cinese e do grupo Baobá, a reitora visitou a sede da Fundação Julieta Barros e do Grupo de Artesanato Rosa Mística, que funciona em frente ao Campus da Uern. Ela conversou com a simpática Dona Marlene, presidente da Fundação que reúne aproximadamente 50 idosos e é parceira da Universidade através de vários projetos, como o Catavento e o Reciclar e Inovar. “A associação cresceu bastante com a parceria com a Uern. Conseguimos recursos através da Lei Adir Blanc graças ao apoio que a Universidade nos deu no sentido de elaborar o projeto e a partir daí conseguimos comprar mesas, tendas, cadeiras, reformar os banheiros para torná-los acessíveis. Participamos de diversos cursos nas áreas de informática, dança, teatro. Só tenho a agradecer à Uern porque tudo o que a gente procura, a gente encontra acolhimento lá”, afirmou Dona Marlene. e denil S on Torre S
A associação comercializa produtos de artesanato, como o sabão ecológico, que começou a ser produzido através de capacitações do Projeto Reciclar e Inovar. Já a Catavento tem apoiado a associação através de ações no sentido de como empreender, precificar, agregar valor ao produto, divulgação, entre outros.
“Através dessa parceria conseguimos ver a integração realmente acontecendo, conseguimos identificar através dessa parceria a pesquisa, a extensão, a inovação e empreendedorismo. Você vê, de verdade, a integração com a sociedade. Tudo isso tendo a Universidade como esse equipamento de transformação e oportunidade. E isso é muito significativo para nós, porque entendemos que é fundamental que a sociedade tenha essa visão de que ela pode e deve se alimentar da própria estrutura acadêmica, da própria estrutura universitária, e nós ficamos bastante satisfeitos quando vemos tudo isso acontecendo”, finalizou a reitora.

Oanalfabetismo é ainda uma realidade no Rio Grande do Norte e no Brasil. Escrever o próprio nome, ler uma palavra ou uma frase pode parecer simples, no entanto, é um direito negado a uma considerável parcela da população.
No bairro Barrocas, em Mossoró, através de parceria com a Fundação Casa do Caminho, a Uern tem atuado junto a idosos para mudar essa realidade.
Através do projeto Uern Ação, a professora Anairam Medeiros tem apresentado o mundo das letras a um grupo de idosos que acreditam que nunca é tarde para aprender. Em apenas oito meses, o grupo fez uma belíssima apresentação em forma de jogral no Teatro Municipal Dix-huit Rosado.
As motivações para aprender a ler e escrever são muitas, desde ajudar os netos na tarefa das escolas até ter a autonomia para assinar um documento. Uma dessas idosas, Dona Maria de Fátima Gomes, tinha um objetivo muito claro: aprender a escrever seu próprio nome para que, ao comprar a sua tão sonhada casa própria, pudesse assinar o contrato. “Eu aprendi a escrever meu nome, mas como nos meus documentos só tinha o dedo, não pude assinar. Mas valeu a pena porque foi a motivação que eu precisava e agora não quero mais parar de aprender”.

Outro relato emocionante é o de Dona Maria da Conceição Soares. “Minha filha acabou de se formar e eu consegui ler tudo o que estava lá escrito, e antes eu não conseguia. Ficava muito tempo tentando juntar as letras para tentar entender, e de repente, olhei e já li tudo correto. Foi a felicidade da minha filha estar se formando e a felicidade de eu ler tudo o que tava no quadro. Só tenho a agradecer a Deus e à oportunidade que vocês estão trazendo para nós”, comenta.
O fato da Universidade ir ao encontro da comunidade foi primordial para que essas idosas tivessem a oportunidade de participar do projeto. Dona Raimunda Freire afirma que tinha vergonha de ir para a escola aprender a ler, mas na Fundação, conseguiu alcançar seu sonho. “Se dissesse assim, vocês vão para o colégio. A gente não ia, porque a gente tinha vergonha de ir lá para o colégio e se misturar com um bocado de jovens. E aqui, na Fundação, é a nossa casa, porque há muitos anos a gente convive aqui. Nós agradecemos demais vocês terem vindo aqui para a nossa Casa do Caminho”.


Para a professora Anairam, chamada carinhosamente na turma por professora Ana, a experiência e o contato com essas mulheres tem ressignificado sua trajetória enquanto educadora. “Essa é a nossa turminha. É aqui que eu fico toda quarta e sexta e na minha semana, é o melhor momento. Aqui a gente consegue ver o impacto da educação, do mundo das letras, na vida das pessoas. É uma experiência desafiadora mas também muito prazerosa. Eu aprendo muito mais do que ensino com essas mulheres maravilhosas”.
A reitora Cicília Maia diz que: "não é só o fato de vocês começarem a ler uma palavra. É o que esse ato de coragem vai representar em casa, na igreja, no círculo de amizade de vocês. Através das experiências de vocês, a gente leva uma força, uma energia, que vocês não tem noção. A idade não foi um limitador para vocês terem vontade de aprender algo novo. Quando a gente olha para cada uma de vocês, a gente se inspira. Vocês são inspiração para a gente. Para a professora Ana, para Cicília e para todos aqueles e aquelas que vêm aqui no projeto conhecer um pouquinho de cada um de vocês. A gente consegue ver como vocês são sensíveis e fortes ao mesmo tempo! Muito obrigada a todas vocês por entenderem que essa universidade, de alguma forma, pode transformar a vida de vocês", destaca a reitora.