Tribuna Cultural Novembro 2018

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ANO V - Nº 192

FEIRA DE SANTANA-BAHIA, SEXTA-FEIRA, 30 DE NOVEMBRO DE 2018

Amélio Amorim e a fantasia concreta que remodelou o sertão Fotos: Reprodução

Ísis Moraes

Meados da década de 1950. Um jovem e talentoso arquiteto começa a remodelar o perfil arquitetônico da terra que escolheu para viver. Homem à frente de seu tempo, Amélio Amorim desafiou as correntes de pensamento de sua época e inseriu Feira de Santana, até então provinciana, dona de uma paisagem que unia, harmonicamente, o cenário rural a um imponente casario de estilo eclético, na atmosfera moderna vivenciada nacionalmente, reflexo das convulsivas mudanças iniciadas, dois séculos antes, em terras europeias. “Amélio é um dos arquitetos mais importantes de Feira de Santana. Influenciou todas as gerações que o sucederam. Criativo e sempre em sintonia com as novas tendências nacionais e mundiais, foi o pioneiro do modernismo na cidade. E é justamente essa visão modernista que marca a sua obra. Mas ele nunca deixou de lado o regionalismo, sempre procurando criar projetos adequados à realidade da região, introduzindo em construções materiais característicos do cenário sertanejo. Daí ter se tornado um referencial para a categoria”, avalia o arquiteto e artista plástico Juraci Dórea. Filho do casal João Amorim e Maria Otília Teixeira de Amorim, Amélio nasceu em 21 de abril de 1929, na cidade de Coração de Maria. Desde a infância, revelou-se um desenhista talentoso. Das mãos hábeis e visionárias do jovem ar-

Um dos projetos mais arrojados de Amélio Amorim, o Complexo Carro de Boi, do qual faz parte a Boate Jerimum, está em ruínas e segue abandonado, mesmo sob a tutela do Estado quiteto, nasceram projetos inusitados, revolucionários, como a casa suspensa, localizada na Avenida Getúlio Vargas, construída em plano elevado, sobre pilares que a mantém distante do solo. Símbolo de arrojo e genialidade, o nome de Amélio Amorim ficou conhecido em todo o país. O arquiteto realizou importantes projetos em várias cidades brasileiras, como é o caso das 400 casas que planejou para a cidade de Ilha bela, no litoral paulista. Também é de sua autoria uma imponente residência situada em Londrina, no Paraná, famosa pelo belo painel que ornamenta a sua fachada. Em Feira de Santana, trabalhando com os cal-

culistas Alberto Santana e Renée Otávio Dantas, que o acompanharam durante toda a sua vida profissional, Amélio executou uma série de projetos brilhantes e inovadores, que revolucionaram os conceitos de cidade e moradia. Um novo modelo de construção começa a se delinear a partir do momento em que o arquiteto começa a atuar no município. Em 1956, o arquiteto inicia a sua carreira com a concepção da Galeria Caribé, localizada na Praça da Bandeira, e com a residência de Francisco Fraga Maia, primeira casa que projeta na cidade. Posteriormente, executa o projeto da Casa das Lâmpadas, do empresário Lício Silva, na esquina da Rua Direita,

atual Conselheiro Franco. O edifício, bastante moderno para a época, ainda existe, embora descaracterizado, como tantos outros prédios feirenses desrespeitados pela voracidade imobiliária. De espírito inquieto e imaginação fértil, Amélio buscava inovar constantemente. Altamente criativo, muitas vezes excêntrico, imaginava projetos grandiosos e transformava em arte tudo o que chegava às suas mãos. Em 1965, o arquiteto deu vida ao Clube de Campo Cajueiro, construção arrojada, que tem como destaque um grande salão circular, cujo teto não apresenta pilares de sustentação ao longo de seu vão. Além de moderno, o projeto se destacava pela plasticidade ímpar.

Vanguardista, determinado, ávido por conhecimento, Amélio Amorim percorreu o mundo, absorvendo novos conceitos e buscando inspirações para construir o que ninguém ainda havia edificado. Fez vários cursos fora do país. Em Lima, capital do Peru, cursou jardinagem e decoração. Queria oferecer, aos clientes, mais que meros jardins. Fazia questão de elaborar e de acompanhar de perto todo o processo de construção. Tinha, em torno de si, uma equipe numerosa, composta por profissionais extremamente reconhecidos e valorizados por ele. Empreendedor destemido, Amélio recorria a todo tipo de técnica e de material para concre-

tizar uma ideia. Sonhava executar, integralmente, o projeto do Hotel e Restaurante Carro de Boi, grande obra de sua vida, que imortalizou seu nome e sua história. Projetado para abrigar um importante polo turístico, o Complexo Carro de Boi não chegou a ser concluído. A morte precoce, aos 53 anos, provocada por um acidente automobilístico, ocorrido em 15 de maio de 1982, impediu o arquiteto de levar o empreendimento adiante. Em vida, ao lado de sua amada Irma Amorim, escritora e produtora cultural, Amélio viu parte de seu projeto ser reconhecido. O Restaurante Carro de Boi e a Boate Jerimum, trabalhos que marcam uma das fases mais excêntricas do


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