Apontamentos sobre a Ponte da Ribeira de S. Sebastião – Caria

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Apontamentos sobre a Ponte da Ribeira de S. Sebastião – Caria

(1758 – 1845)

* Ponte do Rio Ocreza – Notas *

Vítor M. M. de Sousa

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Apontamentos sobre a Ponte da Ribeira de S. Sebastião – Caria (1758-1845)

* Ponte do Rio Ocreza – Notas *

VITOR M. M. DE SOUSA

FICHA TÉCNICA

título: Apontamentos sobre a Ponte da Ribeira de S. Sebastião – Caria (1758-1845)

* Ponte do Rio Ocreza – Notas *

autor: Vitor Manuel Mendes de Sousa

edição: edições ex-Libris ® (Chancela Sítio do Livro)

ilustração da capa: Ponte de S. Sebastião – Caria contracapa: Inscrição sobre pedra (imagem editada)

arranjo de capa: Ângela Espinha

paginação: Alda Teixeira

Lisboa, junho 2025

isbn: 978-989-9198-33-3

depósito legal: 545861/25

© Vitor Manuel Mendes de Sousa

Todos os direitos de propriedade reservados, em conformidade com a legislação vigente. A reprodução, a digitalização ou a divulgação, por qualquer meio, não autorizadas, de partes do conteúdo desta obra ou do seu todo constituem delito penal e estão sujeitas às sanções previstas na Lei.

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publicação e comercialização:

www.sitiodolivro.pt publicar@sitiodolivro.pt (+351) 211 932 500

À minha Família. Um obrigado a meus pais.

A CARIA CENTENÁRIA

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ÍNDICE

Introdução .................................................. 9-10

I – A propósito da Ribeira de S. Sebastião...................... 11-47

II – A propósito da Ribeira de Sant’Ana – Caria .................. 49-60

III – Ponte do Rio Ocreza – Notas .............................. 61-74

V – Fontes e Bibliografia......................................

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INTRODUÇÃO

O intuito e as aspirações cívicas deste trabalho estão na mesma linha de pensamento que norteou o outro meu livro – Contributos e Reflexões para a História de Caria, julho 2020. Num empenhamento de continuidade, aprofundei um tema que já abordara anteriormente. Procurei coligir mais elementos tentando, ao mesmo tempo, situá-los na cronologia dos mais de sete séculos da História desta Vila.

Não é tarefa fácil, dadas as limitações que resultam da interioridade como é o caso da distância aos grandes centros. Ainda assim, conseguiram-se mais alguns conteúdos ligados a Caria e ao Distrito de Castelo Branco, recorrendo a uma razoável bibliografia, bibliotecas, fontes digitais e um ou outro arquivo nacional e regional.

Desta vez, deixo, nestas páginas, detalhes sobre a construção e reparações da ponte de S. Sebastião; alguma informação, considerações e curiosidades referentes à ribeira de Sant’Ana bem como algumas notas sobre uma ponte do rio Ocreza. Também, a menção de alguns pormenores sobre a realidade da rede viária nacional e o caso concreto da Beira Baixa, na primeira metade do século XIX.

Referir ainda que há neste trabalho alguns conteúdos fora da “janela de tempo” anunciada na capa, mas que se considerou serem pertinentes e de interesse.

No que diz respeito à transcrição de documentos, houve o cuidado de que fosse o mais fiel possível. No entanto, para facilitar a compreensão, modernizou-se, aqui e ali, a ortografia e pontuação.

Dizer também que se respeitou o sentido global de tudo o que se trabalhou a par de alguma prudência em opinar nos aspetos de engePreview

nharia ou arquitetura dos quais não se tem o devido conhecimento e competência.

Para melhor esclarecimento dos conteúdos, foram incluídas notas explicativas.

Manifestar, ainda, o anseio e a expectativa de que outros tragam novos contributos que ajudem a completar e a compreender melhor o passado desta terra e suas gentes.

Possivelmente acontecerá aos poucos, já que a História de um lugar nunca se esgota ou conclui. Como ciência que se reporta ao passado, haverá sempre a possibilidade de novos dados, novas interrogações, novos indícios que nos levam a uma ilação ou descoberta. Oxalá apareçam, para bem do conhecimento e regozijo dos carienses.

Porque não tem este livro qualquer pretensão de historiador (que não sou), a terminar, apelo ao leitor, benévolo, que desculpe algum equívoco, omissão ou imprecisões.

CARIA, dezembro de 2024

A propósito da Ribeira de S. Sebastião

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Caria nasceu entre duas ribeiras – S. Sebastião e Sant’Ana.

Numa outra obra – “Contributos e Reflexões para a História de Caria, Sousa, Julho de 2020” – já constavam estas duas ribeiras; no entanto, por razões objetivas da estrutura deste livro, achou-se por bem, incluí-las, novamente. A iniciar, abordar-se-á a mais importante delas, a qual, ao longo de séculos, foi apelidada de ribeira de Lavacolos, de Inguias, de Caria e, também, de S. Sebastião

(A maioria dos carienses estranhará, possivelmente, o nome Lavacolos; no entanto, este já figurava no século XII, no texto dos forais de Centum Cellas e de Belmonte. Também o encontramos no século XIII em cartas de foro e vários documentos de compra e venda de herdades, celebradas entre o mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, bispos e alguns moradores e homens-bons 1 de Belmonte. Consta, ainda, em fontes documentais dos séculos XVI e XVII, citadas na publicação de 2020, acima mencionada.

Mais adiante, incluir-se-á um novo testemunho que faz parte da Memória Paroquial de Valverdinho, vol. 38, n.º 70, págs. 355 a 360, de 7 de maio de 1758, onde o cura, António da Fonseca dos Reys, faz referência à ribeira de Lavacolos.

Referir ainda que há registos em que este nome tanto aparece a designar um topónimo2 como um hidrónimo3 . 4 )

4 Sobre este assunto, consultar: “Um outro Cartulário da Sé de Coimbra”, de Maria do Rosário Barbosa Morujão; “Appendice de Noticia Histórica”, de Miguel Ribeiro de Preview

1 Homens-bons – A documentação medieval caracteriza-os como os mais ricos, os mais notáveis, os mais respeitáveis chefes de família, as pessoas honradas por excelência dentro de cada povoado.

2 Topónimo – Nome de um lugar, sítio ou povoação.

3 Hidrónimo – Nome de rios e outros cursos de água.

Voltando, agora, aos quatro nomes atrás referidos, escolheu-se um dos mais antigos mas também dos mais usados no presente, que é: ribeira de S. Sebastião.

Outrora, este curso de água era uma bênção para os terrenos ribeirinhos; mas, em tempo de maior invernia, era causador de aflição, sobressalto e isolamento. A força da sua correnteza galgava as margens e levava consigo passadiços e as frágeis pontes de madeira.5 As inundações duravam dias e a aldeia de Caria era como se fosse uma ilha.6 Com tão grandes contrariedades, a vida dos moradores e das gentes que por aqui faziam caminho era de grande incómodo e impedimento.

(Durante séculos, parte das povoações portuguesas viviam como que isoladas, tendo em conta a péssima qualidade das vias de comunicação. Se os caminhos e carreiros eram péssimos e de muitos perigos, a passagem entre margens multiplicava os riscos e as dificuldades. Pese embora a força das águas e a maior ou menor profundidade, a verdade é que a vida e o dia a dia das gentes obrigava à travessia de cargas, pessoas e animais; daí, o aparecimento de poldras, passadiços e frágeis pontes sendo, a grande maioria, de madeira.)

Não se encontraram fontes históricas que descrevam a realidade de Caria em tempos mais longínquos; ainda assim, sabe-se que, em abril de 1758, a ponte que abraçava as margens da ribeira de S. Sebastião Vasconcellos, pág. 33, doc. n.º 9 e pág. 35,36 doc. n.º 12; “Cartulários das Cathedraes”, de Gabriel Pereira; ” Forais de Belmonte” – José Manuel Vargas, 2001; “Bonus Rex ou Rex inutilis, As Periferias e o Centro, Redes de Poder no Reinado de D. Sancho II (1223 –1248) ”, de José Varandas, 2003.

5 Durante muito tempo, na maioria dos cursos de água das redondezas, a travessia era feita por pontes de madeira, as quais eram, muitas vezes, arruinadas e levadas pela força das águas conforme os rigores de cada inverno.

6 Em abril de 1758, nas Memórias Paroquiais de Caria, o prior Gervásio Campos retrata bem a situação quando lamenta as pontes arruinadas pelas enchentes: “… caudalosas no tempo de inverno, que não dão passagem, para se sair ou entrar no dito lugar, e assim fica totalmente mortificado este povo, e bem se lhe pode chamar ilha, quando enchem as ribeiras todas.”

era de madeira e estava em estado bastante degradado. A convicção desta afirmação baseia-se nas Memórias Paroquiais7 desta vila, donde se fez a seguinte transcrição:

“A primeira e principal ribeira se chama de S. Sebastião,8 que tem seu princípio por cima do lugar da Bendada, nas serras chamadas da Frágua. Não tem ponte alguma, mais que a de S. Sebastião, junto a este lugar (Caria), com três olhais, a qual é de pau, e está totalmente arruinada e precisa de grande conserto.“ 9

Certamente que os homens de Caria devem-lhe ter valido com o devido arranjo. Porém, com novas cheias, as preocupações e reparações iriam continuar durante mais de três dezenas de anos até ao reinado de D. Maria I, período em que a atenção real se concentrou na condição miserável em que se encontrava a quase inexistente rede de estradas (diga-se, carreiros, caminhos) portuguesa.10

10 A propósito da condição das vias de comunicação, em 1816 dizia-se que…” Na maior parte do Reino, principalmente na Beira Baxa, são ellas tão ruins, que Preview

7 As Memórias Paroquiais de 1758 foram o maior levantamento histórico-geográfico feito no nosso país em meados do séc. XVIII. Nelas se resume o “Estado da Nação”, três anos decorridos sobre a destruição causada pelo trágico Terramoto de 1755.

As respostas a 60 perguntas específicas foram desequilibradas, dependendo da cultura, interesse e zelo dos párocos. Umas longas, detalhadas e bem redigidas, outras sintéticas e apressadas, apenas para dar cumprimento a uma solicitação. Ainda assim, elas constituem uma descrição muito próxima da realidade de Portugal, à época.

8 É curioso verificar que as Memórias de Caria referem a ribeira com o nome de S. Sebastião, ao passo que nas Memórias de terras vizinhas, uns chamam-lhe ribeira de Inguias e outros, ribeira de Caria. É crível que, à época, os carienses denominassem a ponte e a ribeira deste modo pelo facto de existir uma capela em honra de S. Sebastião, nas proximidades.

9 É pena que o autor das Memórias não tenha referido a dimensão da ponte e mais pormenores sobre a sua localização a qual, mais para cá mais para lá, deveria ser a dos tempos de hoje, tendo em conta o que dissemos na nota anterior.

Nesta época de necessária mudança, os constantes arranjos devido à fragilidade da estrutura das pontes em madeira levariam a que se começasse a pensar na utilização de outro material. Em várias regiões do país seriam, assim, construídas novas pontes, mas de pedra. Foi o caso de Caria, em finais do século XVIII.

É sobre esta travessia que se deixam, nestas páginas, alguns apontamentos que proporcionam informação importante.

A Ponte de S. Sebastião (de cantaria)11

Importa, em primeiro lugar, desfazer alguma confusão e acabar com afirmações escritas e ditas, ainda nos dias de hoje, que não são exatas. Talvez tenham sido geradas pelo simples facto de ter havido, nesta travessia, uma intervenção com arranjos importantes no tempo de D. Maria II; porém, a verdade é que esta ponte fora construída muitos anos antes.

Daí que, em modesta opinião, não se considere correto nem rigoroso, referir a ponte de S. Sebastião como oitocentista e continuarem a apelidá-la de D. Maria II, já que, na realidade, foi construída no reinado de D. Maria I. Muito provavelmente depois de 1780, época em que se começou a observar em Portugal um conjunto de ações e obras, como sejam a construção de pontes e medidas para a construção e conservação de estradas.

Acredita-se, pois, que esta ponte de pedra já estivesse ultimada em 1793, fazendo fé num documento de 1 de janeiro de 1843, no qual o nem ainda a cavalo se podem transitar.” Ver Extracto de Huma Memória de João de Macedo Pereira da Guerra Forjaz – Sobre o estado da Agricultura da Comarca de Castelo Branco. In Historia e Memórias da Academia R. das Sciencias de Lisboa. Tomo IV. Parte II. Lisboa, 1816.

11 Sobre as pontes de pedra de maior relevância das redondezas, há mais de 200 anos, havia apenas referências à Ponte de Valhelhas (Filipina 1631) e Ponte de Pedrinha, ambas sobre o Rio Zêzere.

Diretor das Obras Públicas do Distrito de Castelo Branco, tenente Plácido António da Cunha e Abreu, afirma o seguinte:

“Ha cincoenta annos foi construída uma ponte para atravessar a Ribeira de S. Sebastião, que corre ao norte da Villa de Caria…”

Não se conseguiram elementos históricos onde se pudessem ver pormenores sobre o lançamento da obra. No entanto, noutras fontes há informações que indiciam a configuração desta ponte como sendo a mesma dos dias de hoje, ainda que, à época, com aspeto e acabamentos mais toscos e a pedra, presumivelmente, menos aparelhada.

A robustez desta nova estrutura tornou a travessia mais tranquila em tempos de invernia e permitiu melhor vida e circulação entre concelhos circunvizinhos, durante uma série de anos.

Acontece, porém, que por dificuldades económicas do Reino e por falta de meios das autoridades locais,12 as manutenções 13 devem ter rareado, trazendo, assim, alguma ruína. Ora, como esta ponte da nossa ribeira fazia parte da estrada real de Castelo Branco à Guarda, o seu mau estado preocuparia a Inspeção Geral dos Serviços de Obras Públicas do Reino.

Esta inquietação e outras informações consideradas bastante interessantes, podem constatar-se numa correspondência dirigida ao Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Reino, António Bernardo da Costa Cabral, por parte do Inspetor Geral das Obras Públicas

13 José Acúrsio das Neves (magistrado, político, historiador…) em 1820, referindo-se aos transportes no interior do país, dizia que […] as estradas de Portugal sejam com mui poucas excepções, as piores da Europa; que as pontes e outras obras de publica utilidade estejam em abandono ou sejam raras na maior parte do Reino. Preview

12 Uma portaria/circular de 11 de Outubro de 1836, já obrigava as Câmaras e Juntas de Paróquia a promoverem o conserto e melhoramento das estradas, caminhos, calçadas, pontes e fontes, a seu cargo.

do Reino, Mouzinho de Albuquerque, de que se deixa, aqui, a transcrição “ipsis litteris”.

“Tendo o meu Delegado no Districto de Castello Branco o Tenente Placido Antonio da Cunha e Abreu passado a examinar meudamente o estado da ponte de Caria, na estrada real14 de Castello Branco à Guarda, estrada esta sobre cuja importância insisti, tanto no meu Relatorio Geral de 7 de Dezembro de 1840, como naquele que ultimamente tive a honra de submetter a V.ª Ex.ª e acabando agora de receber o resultado dos exames feitos por aquelle Official, é do meu dever levalos ao conhecimento de V.ª Ex.ª, acompanhados das seguintes observações.

1.ª – Em vista da natureza das ruinas da ponte de Caria, é evidente que, em pouco tempo, esta ponte se arruinará de todo, ficando interceptada, no hinverno, uma estrada de primeira importância, ou se considere como via comercial ou como via militar, e que, arruinada ella de todo, a sua reedificação total será incomparavelmente mais dispendiosa do que a reparação parcial, que ora exige.

2.ª – Os povos circunvizinhos reconhecem por tal forma a urgente necessidade desta reparação, que as Cameras Municipaes de Belmonte e Caria se comprometem a auxiliar a Obra, e é de esperar que do mesmo modo contribuirão para ella as Cameras Municipaes do Fundão e da Covilham.

3.ª – Des da creação desta Inspecção Geral e desde muitos tempos antes, nenhuma somma tem o Governo dispendido em Obras Publicas, no vasto Districto de Castello Branco, e em geral na parte denominada Beira Baixa; quando a maior parte dos outros Districtos já tem começado a sentir benefícios, na escala compatível com os meios desta Inspecção, o que determina, a meu ver, a necessidade de começar imediatamente algumas Obras mais urgentes para serviço de aquellas partes do Reyno.15

14 Em 1910, a designação de “estrada real” foi substituída pela de “estrada nacional”.

15 O desequilíbrio e abandono das regiões do Interior continuaram. Atente-se no que dizia António Lopes do Rego (Corregedor de Chão de Couce) em 1846: [parece] que Lisboa e Porto é que são Portugal, porque é onde, depois da restauração se tem gasto muitos e grandes cabedais**; [...] tudo feito á custa do Preview

4.ª – Do Orçamento, que tenho a honra de apresentar por cópia, se vê que a dispeza provável de toda a obra é de 9$594$700 rs. mas que deduzindo desta somma os matteriaes que já existem em ser 16 e os subsídios das Cameras já offerecidos, fica a dispeza reduzida a 7$740$820 rs.

5.ª – Vê se também do Orçamento que se calculão percizos para effectuar a Obra 610 dias; isto é proximamente 20 mezes e que, dividindo por concequencia a dispeza pelo tempo, poderá a Obra empreender se logo que o Governo de Sua Magestade me assegure na Recebedoria Geral de Castello Branco uma consignação mensal de 387$000 rs. ou de 400$000 rs. em números redondos, e isto enquanto durar a Obra.

Em vista de todo o exposto, da importância da Obra em si mesmo, da modicidade da prestação que requeiro, dos princípios de economia e justiça que determinão a sua imediata execução; não posso duvidar que o Governo de Sua Magestade se dignará quanto antes habilitar me com a prestação pedida e com a devida autorização para dar principio a esta pequena mas importante Obra, e sobre este ponto fico esperando com impaciência a determinação do Governo para expedir ao Diretor das Obras Publicas naquele Districto as ordens e instrucções necessárias.

Deus Guarde a V. E. Quartel em Lisboa aos 7 de janeyro de 1843

Mmo. e Exmo. Sr. António

Bernardo da Costa Cabral

Luis da Silva Mouzinho de Albuquerque Inspetor Geral das Obras Públicas do Reino”

thesoiro e provincias. Do mesmo modo estradas e mais estradas, até algumas de luxo e para divertimentos e mudanças de outras; e nas provincias só se tem cuidado em lhe chupar o sangue e beneficio nenhum até agora receberam que se veja. (...) Goze muito embora Lisboa e Porto [...] de optimas estradas e commodidades, mas seja tudo feito á custa de quem goza, e não de quem não goza, nem d’isso recebe interesse algum. Fora de Lisboa e Porto também há gente, e que paga tantos e mais tributos (…)

** Cabedais – refere-se a recursos financeiros, capital, dinheiro.

16 Existem em ser – subsistem, permanecem…

Nota: Se alguém escrevesse algo como 9$594$700 rs, estaria a misturar formatos, o que poderia causar confusão, mas não era necessariamente errado. À época, o uso de cifrões ($) podia variar dependendo do contexto ou da pessoa que escrevia.

Neste caso: 9$594$700 rs poderia ser interpretado como 9 contos, 594 mil e 700 réis.

Explicação: 1 conto = 1.000.000 de réis.

Então, 9 contos = 9.000.000 réis, e os restantes, 594.700 réis, seriam somados a esse valor.

No entanto, essa notação não era a mais comum ou clara. Normalmente, seria preferível algo como:

• 9:594$700 rs (onde o “9:” indicava os contos).

Ø A escrita monetária da época não era tão padronizada como hoje; os dois cifrões juntos ($...$) ou o uso de “:” para separar contos e réis eram práticas comuns.

O documento atrás transcrito é rico em informação e, sobretudo, revelador de uma censurável realidade local e regional no que diz respeito às vias de comunicação. Atente-se, pois, ao que é dito na 3.ª observação salientada pelo Inspetor. Está ali, com clareza que, à época, obras públicas no nosso distrito – zero! Quanto a manutenções, mais ou menos a mesma desgraça…

Não é difícil de imaginar as adversidades, os martírios, os perigos que espreitavam os almocreves e simples viajantes, de Castelo Branco à Guarda, tendo em conta o relevo da região, o clima (inverno), a péssima qualidade das vias e a insuficiência de pontes sobre rios e muitas ribeiras… 17

17 No Relatório Geral sobre as Obras Publicas do Reino de 8 de Julho de 1840, sobre Castelo Branco, dizia que “pode sem exageração chamar-se no inverno incomunicável com Lisboa: os rios e ribeiras sem pontes, que atravessavam a determinada estrada, perdem os váos* com as chuvas e interceptam inteiramente a comunicação.”

*vau – sítio pouco fundo de um rio, onde se pode passar a pé.

Mouzinho de Albuquerque que até vivera alguns anos no Fundão seria conhecedor desta e outras realidades, já que pelo decreto de 22 de junho de 1836 ficou responsável pela Divisão do Centro (distritos de Aveiro, Coimbra, Castelo Branco, Leiria e Santarém) até ser nomeado Inspetor-Geral dos Serviços de Obras Públicas do Reino, pelo decreto de 7 de março de 1840… 18

Ora, destas circunstâncias e fatores, poder-se – á inferir a sua grande preocupação com a estrada real e, por conseguinte, com alguma ruína na ponte de S. Sebastião, em Caria, que fora construída, como já se referiu, cinquenta anos antes.

Dizer ainda que a solidez do argumentário desta correspondência dirigida ao ministro Costa Cabral baseava-se na experiência e algum conhecimento de causa do Inspetor Geral, mas sobretudo nas informações emanadas da Direcção das Obras Publicas do Districto de Castello Branco que constam num registo documental que se transcreve, na íntegra, a seguir.

18 Opositor de Costa Cabral, Mouzinho de Albuquerque seria exonerado do seu cargo ainda em 1843. Preview

Orçamento da despesa, que poderá importar a reparação da ponte, que atravessa a Ribeira de S. Sebastião em Caria.

(A mando da Inspecção Geral de Obras Públicas do Reino, o oficial, Tenente Plácido António da Cunha e Abreu, esteve em Caria para observar, minuciosamente, a dita ponte que relatórios anteriores diziam estar em mau estado, procurando, ao mesmo tempo, fazer uma estimativa de custos relativa à sua reparação.)

“Ha cincoenta annos foi construída uma ponte para atravessar a Ribeira de S. Sebastião, que corre ao norte da Villa de Caria. Esta ponte é na verdade muito importante, por que dá continuação à estrada real

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