Revista Ecológico - Edição 84

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ANO 7 - Nº 84 - 28 DE SETEMBRO DE 2015 - R$ 12,50

EDIÇÃO: TODA LUA CHEIA


Homenagem Especial: Carlos Drummond de Andrade


A Revista Ecológico agradece a todos que se inscreveram ou fizeram suas indicações à premiação deste ano. Conheça os vencedores no próximo dia 10 de novembro!

www.premiohugowerneck.com.br


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EXPEDIENTE

FOTO: ALFEU TRANCOSO

Em toda lua cheia, uma publicação dedicada à memória de Hugo Werneck

DIRETORA DE GESTÃO Eloah Rodrigues eloah@souecologico.com EDITOR-EXECUTIVO Luciano Lopes luciano@souecologico.com DIRETOR DE ARTE Sanakan Firmino sanakan@souecologico.com CONSELHO EDITORIAL Fernando Gabeira, José Cláudio Junqueira, José Fernando Coura, Maria Dalce Ricas, Mario Mantovani, Nestor Sant'Anna, Patrícia Boson, Paulo Maciel, Ronaldo Gusmão e Sérgio Myssior CONSELHO CONSULTIVO Angelo Machado, Célio Valle, Evandro Xavier, Fabio Feldmann, José Carlos Carvalho, Roberto Messias Franco, Vitor Feitosa e Willer Pos REPORTAGEM Cristiane Mendonça, Luciana Morais e Vinícius Carvalho EDITORIA DE ARTE André Firmino COLUNISTAS Alfeu Trancoso, Antonio Barreto, Déa Januzzi, Marcos Guião, Maria Dalce Ricas e Roberto Souza

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REVISÃO Gustavo Abreu CAPA Arte: Sanakan DEPARTAMENTO COMERCIAL Fábio Vincent fabiovincent@souecologico.com Sarah Caldeira sarah@souecologico.com

ASSINATURA Ana Paula Borges anapaula@souecologico.com IMPRESSÃO Log & Print Gráfica e Logística S/A PROJETO GRÁFICO-EDITORIAL Ecológico Comunicação em Meio Ambiente Ltda ecologico@souecologico.com

Representante Comercial Brasília Forza CM - Comunicação e Marketing sdonato@forzacm.com.br

REDAÇÃO Rua Dr. Jacques Luciano, 276 Sagrada Família - Belo Horizonte-MG CEP 31030-320 Tel.: (31) 3481-7755 redacao@revistaecologico.com.br

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Assistente Comercial Silmara Belinelo silmara@souecologico.com

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MARKETING Janaína De Simone janaina@souecologico.com EMISSÕES CONTABILIZADAS

DIRETOR-GERAL E EDITOR Hiram Firmino hiram@souecologico.com

3,14 tCO2 e Julho de 2015

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IMAGEM DO MÊS

FLOCOS DE POLUIÇÃO O que você está vendo na foto não é neve. Mas sim a espuma de poluição do Rio Tietê tomando as ruas da cidade de Pirapora do Bom Jesus (SP). No início deste mês, o município de Salto, a 105 km da capital paulista, também teve suas ruas invadidas. A força da correnteza e das quedas d'água remexem a sujeira que está no rio fazendo com que a espuma seja formada em grande quantidade. Que vergonha, São Paulo!

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FOTO: RAFAEL PACHECO

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ÍNDICE

CAPA

NO MÊS DEDICADO À PREVENÇÃO DO SUICÍDIO NO BRASIL, A ECOLÓGICO MOSTRA POR QUE ESCOLHER A VIDA É A MELHOR OPÇÃO CONTRA O AUTOEXTERMÍNIO.

18 PÁGINAS VERDES JORGE SAMEK CONTA A EXPERIÊNCIA POSITIVA DE ITAIPU BINACIONAL AO PROMOVER NOVAS ALTERNATIVAS ENERGÉTICAS E A CONSERVAÇÃO DE ÁGUA E FLORESTAS

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ESPELEOLOGIA A IMPORTÂNCIA DAS CAVIDADES SUBTERRÂNEAS PARA O MEIO AMBIENTE E O TURISMO SUSTENTÁVEL NO BRASIL

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E mais... CARTAS DOS LEITORES 08 CARTA DO EDITOR 10 GENTE ECOLÓGICA 12 ECONECTADO 14 SOU ECOLÓGICO 16 ESTADO DE ALERTA 24 CÉU DE BRASÍLIA 26 COMPORTAMENTO 36 ESPECIAL ITAIPU 40 AGROTURISMO 47 ALMA PLANETÁRIA 48 PRESERVAÇÃO 50 ESPECIAL MINERAÇÃO 56 ARTIGO 62 PAISAGISMO 64

94 MEMÓRIA ILUMINADA O PROTESTO ECOLÓGICO DO MÚSICO NEIL YOUNG CONTRA A MONSANTO, FABRICANTE DE SEMENTES TRANSGÊNICAS

CÉU DO MUNDO 67 HISTÓRIA 68 RESPONSABILIDADE SOCIAL 74 ECOLÓGICO NAS ESCOLAS 76 VOCÊ SABIA? 84 OLHAR POÉTICO 86 NATUREZA MEDICINAL 88 ENSAIO FOTOGRÁFICO 90 CORAÇÃO DA TERRA 98

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CARTAS DOS LEITORES

l PÁGINAS VERDES - SIDEMBERG RODRIGUES “O trabalho feito pelo Sidemberg, juntamente com a ArcelorMittal, deveria ser adotado por outras empresas. Concordo plenamente com ele, principalmente na questão dos funcionários: pessoas felizes rendem mais, trabalham com mais atenção, e, consequentemente, há menos riscos de acidentes. Resultado: pessoas mais satisfeitas! Em todos os pontos, as 6Ds são muito interessantes e deveriam ser mais divulgadas. A atitude de preservação como a do presidente da ArcelorMittal Brasil, Benjamin Baptista, e o conselheiro do 'Minas pela Paz', Jefferson de Paula, em relação à bacia hidrográfica do Rio Doce, deveria ser imitada pelos nossos políticos e empresários. Parabéns pela matéria!” Jéssie Vieira, via site l AQUECIMENTO GLOBAL - UM BRASIL QUE ESQUENTA “Grande novidade... O Brasil não tem preocupação com meio ambiente. A maioria dos brasileiros nem sabe o que é CO2. Esse país tupiniquim não é sério!” Hélio Augusto Gomes, via Facebook

l MATÉRIA DE CAPA - LEÃO CECIL “Algo deve ser feito! O dentista Walter Palmer vai sair ileso, pelo jeito... Se ele não for punido, quantos virão atrás deste exemplo de criatura?” Liege Silva, via Facebook “Que gosto será que esses irracionais têm de dar um tiro e ver um animal lindo e indefeso morrer?” Donizeti Delalibera, via Facebook “A legislação ambiental deveria ser mundial para acabar com esse absurdo da caça esportiva.” George Batista Stephenson, via Facebook “A caçada é deplorável! Só porque foi esse leão estão fazendo esse alarde todo. E se fosse outro, tudo bem? Quantos não já morreram e ninguém fez nada? As pessoas são muito hipócritas, essa que é a verdade! A caça deveria ser algo inexistente no mundo, mas só quando começa a extinção de espécie que o homem resolve ficar preocupado!” Diogo Patzlaff, via Google+

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“Esses empresários de madeira gananciosos desmatam a floresta e quem paga somos nós, com esse calor absurdo. Eles têm de ser presos e o dinheiro que ganharam com o desmatamento ser usado para reflorestar as áreas danificadas.” Jonias Costa, via Google+ “O problema é que somos todos responsáveis, direta ou indiretamente. Se não mudarmos nossa atitude, não temos como cobrar! E isso é em tudo: desde ‘pequenas’ coisas do dia a dia até as grandes. Pensem: somos responsáveis pelo mundo que criamos. Se não estamos satisfeitos com ele, devemos rever o que estamos fazendo!” Juliano Coelho, via Google+ l O FAZENDEIRO DA NATUREZA - FÁBIO SANTOS “O mundo precisa de mais pessoas assim. Parabéns pela iniciativa Fábio Santos, tenho certeza de que você sempre terá retorno pelo trabalho que está fazendo!” Paula Sienna, via Facebook “Que todos os agropecuaristas do Brasil copiem o modelo sustentável e ecológico de Fábio.” Marianna Mendes, via e-mail


FA L E C O N O S C O

Envie sua sugestão, opinião ou crítica para cartas@revistaecologico.com.br Por motivo de clareza ou espaço, as cartas poderão ser editadas.

EU LEIO “Adoro ler a Revista Ecológico, pois, no momento em que o Brasil se encontra, com a crise hídrica, as informações sobre a área ambiental são muito importantes para nos despertar um olhar mais crítico e o sentimento de fazermos algo para mudar nosso futuro e criar um mundo mais sustentável.”

FOTO: ARQUIVO PESSOAL

l CÉU DE BRASÍLIA - POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS “Isso acontece no Brasil o tempo inteiro. Não sei por que o povo insiste em continuar descartando material reciclável junto ao lixo comum. Se isso não ocorresse, seria muito mais fácil resolver a absorção dos orgânicos.” Carlos Loredo, via Google+ l SOU ECOLÓGICO - EMBALAGEM SUSTENTÁVEL CRIADA PELA HOMEOPATA MINEIRA RITA GOMES “O nome deste exemplo é sustentabilidade. Além disso, neste produto, o frasco e o rótulo também são recicláveis. E, por sua vez, tem como princípio ativo uma planta da Amazônia, a Arrabidaea chica, não tem conservantes, corantes, parabenos, derivados de petróleo. Todos os ingredientes da formulação seguem as diretrizes internacionais para produtos orgânicos. O produto tem o DNA da dra. Rita: delicado, natural, eficaz e equilibrado. Parabéns!” José Alexandre S. Abreu, via Facebook

l ENSAIO FOTOGRÁFICO “Fantásticas as fotos de Nick Brandt. Que classe, que luz. São imagens inspiradoras, que provocam um desejo imediato de preservar a natureza.” Ana Paula Gomes, via e-mail

“Parabéns à doutora Rita, que está contribuindo para o bem-estar do planeta!” Meg Lemos, via Facebook

“O trabalho de Nick mostra o quanto a fotografia e a arte têm poder e podem transformar a humanidade para melhor.” Aurélio Gonzalez, via e-mail

Alline Roberta de Oliveira, maquiadora e estudante

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FOTO: SANAKAN

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CARTA DO EDITOR

HIRAM FIRMINO | hiram@souecologico.com

VIVER É PRECISO.

MORRER, NÃO... P

arafraseando Gonzaguinha, chega de tentarmos dissimular e disfarçar e esconder que os agrotóxicos não fazem parte do nosso dia a dia. Eles fazem sim, a uma média de 5,2 litros ingeridos por cada brasileiro/ano, segundo ambientalistas. Enquanto já foram abolidos em vários países desenvolvidos, aqui eles nos causam um dano vital a mais, e covarde, quando manuseados e inalados pelo homem do campo. São a maior causa de morte por suicídio, acredite, entre os jovens no meio rural. O que também não dá mais para ocultar é o crescimento do número de suicídios, por desencanto com a vida, no Brasil e no mundo. Uma média de um autoextermínio a cada 40 segundos. Foi o que motivou os brasileiros a iluminar o Cristo Redentor de amarelo, não por causa da chegada de mais uma primavera, mas devido à campanha “Setembro Amarelo”, idealizada pelo Centro da Valorização à Vida (CVV) em prevenção do suicídio, que você vai ler na página 28. Gonzaguinha não para de nos inspirar. É ele, a sua voz viva, cantando no rádio: “Chega de temer, chorar, sofrer, sorrir, se dar. E se perder e se achar e tudo aquilo que é viver. Eu quero mais é me abrir e que essa vida entre assim como se fosse o sol desvirginando a madrugada. Quero sentir a dor desta

manhã, o meu amor se derramando”. Esse politizado e rebelde filho do Rei do Sertão estava certo. Não dá mais para segurar. Mas antes de explodir o nosso pátrio-azul e ainda verde coração, temos de aceitar e acreditar que nem tudo está irremediavelmente perdido. E não está mesmo, é o que confirmam duas reportagens especiais nesta edição primaveril da sua Ecológico: sobre o livro “Viver é a Melhor Opção”, escrito pelo jornalista e ambientalista André Trigueiro, e que mostra que a prevenção do suicídio é possível; mais a experiência bem-sucedida do programa “Cultivando Água Boa”, de Itaipu Binacional, no oeste do Paraná. Lá, haja saúde, pequenos agricultores familiares apostam e se agigantam na luta desigual contra os agrotóxicos. Você vai ler também que até o veterano cantor de rock Neil Young, hoje na sabedoria dos seus 69 anos, vem prestar apoio à canção-manifesto de Gonzaguinha pela vida. São dele os versos capazes de implodir qualquer mente ou coração contra a multinacional Monsanto. São de todas as flores, enfim, abrindo-se como sempre na multicolorida primavera que nos encanta, a nossa explosiva esperança. Boa leitura! Até a próxima lua cheia. 

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GENTE ECOLÓGICA

FOTO: RAFAEL RIBEIRO / CBF

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“Concedei-me, Senhor, a serenidade para aceitar as coisas que não posso modificar; coragem para modificar aquelas que posso; e sabedoria para distinguir umas das outras.”

FOTO: P.D JANKENS

REINHOLD NIEBUHR, teólogo norte-americano

“A humanidade não se divide em heróis e tiranos. As suas paixões, boas e más, foram-lhe dadas pela sociedade, não pela natureza.”

“É dever de todo brasileiro e de todo ser humano olhar pela Amazônia, cuidar de nossas florestas. Precisamos devolver para a natureza tudo o que ela nos deu até hoje e é através da preservação que precisamos nos unir.” NEYMAR JR., jogador de futebol, que recentemente firmou parceria com a ONG WWF-Brasil, por meio de seu instituto, para um programa de conservação do bioma

“A mulher é um efeito deslumbrante da natureza.” ARTHUR SCHOPENHAUER, filósofo alemão 12  ECOLÓGICO | SETEMBRO DE 2015

FOTO: GLOBO / ALINE MASSUCA

FOTO: JACOB SEIB

CHARLES CHAPLIN, ator e diretor britânico

“As crianças precisam ser ouvidas. A sustentabilidade está nelas porque os adultos estão estragados.” XUXA, apresentadora de TV


FOTO: TOMAZ SILVA / ABR

ZIRALDO, cartunista

“O dinheiro obtido com a venda das armas é um dinheiro encharcado de sangue.”

FOTO: MANOEL MARQUES

FOTO: MARCELO CASAL JR / ABR

PAPA FRANCISCO, durante visita ao Congresso norte-americano

ANA PRIMAVESI A agrônoma brasileira de 92 anos recebeu, este mês, a “One World Award”, principal premiação da agricultura orgânica mundial, conferida pela International Federation of Organic Agriculture Movements (Ifoam). O prêmio reconhece e homenageia ativistas da agricultura orgânica cujo trabalho impactou positivamente a vida dos produtores rurais.

“A sociedade precisa se conscientizar que lixo é matéria-prima fora do lugar. E pode ser reutilizado na fabricação de outros produtos e na geração de energia.” CARLOS MINC, deputado estadual e ex-secretário estadual de Meio Ambiente do Rio de Janeiro

“Ainda sonhamos que um dia viveremos num mundo sustentável, em que a agroecologia se multiplique e o Brasil se torne o maior celeiro de produtos orgânicos do mundo.” MARCOS PALMEIRA, ator e produtor de orgânicos

MARTIN WINTERKORN O presidente mundial da Volkswagen renunciou ao cargo após o governo dos EUA descobrir que a marca, sob sua gestão, adulterou testes de emissão de poluentes em motores a diesel de 500 mil veículos vendidos no país. Segundo a Agência Ambiental Americana (EPA), a montadora utilizava um software que controlava a emissão de poluentes apenas no momento em que os veículos eram submetidos a vistoria, e não durante a rodagem normal.

FOTO: VOLKSWAGEN SWEDEN

MINGUANDO

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FOTO: ANTÔNIO CRUZ / ABR

VIRGÍLIO VIANA O superintendentegeral da Fundação Amazonas Sustentável (FAS) foi convidado neste mês para se tornar co-presidente da SDSN Global na América Latina. Dessa forma, terá papel fundamental na busca por soluções para o desenvolvimento sustentável nesta região em contato direto com a direção da rede. Além disso, poderá representar a SDSN em reuniões de alto nível na América Latina.

FOTO: REPRODUÇÃO YOUTUBE

“O governo brasileiro precisa fazer uma campanha pública pelo banho frio. A medicina já provou que faz bem à saúde, além de economizar energia elétrica.”

FOTO: LEANDRO MOLINA AL / ALRS

FOTO: DIVULGAÇÃO

FOTO: RAFAEL RIBEIRO / CBF

CRESCENDO


ECONECTADO

CRISTIANE MENDONÇA

ECO LINKS

l “Eu tenho verdadeira alucinação pelo Velho Chico, assim como muitos brasileiros que o respeitam. Mas, adoraria que esse respeito por ele fosse de TODOS!” @luciaverissimo – Lúcia Veríssimo, atriz

FOTO: REPRODUÇÃO TWITTER

TWITTANDO

l “Prefeitura de BH atinge meta de

redesenhar a vida, um risco pequeno, um traço qualquer, já é começar!” @pefabiodemelo – Padre Fábio de Melo, sacerdote católico

l “Acordo ambicioso

em mudanças climáticas na COP21 em Paris pode evitar aumento de refugiados.” @rubensborn Rubens Harry Born, ex-coordenador do Vitae Civilis

FOTO: REPRODUÇÃO FACEBOOK

l “Caso queira

FOTO: SUELEN MIRANDA

água e economiza 147 milhões de litros. Volume que daria para abastecer uma cidade de 30 mil habitantes por um mês.” @deliomalheiros – Délio Malheiros, vice-prefeito de Belo Horizonte

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FOTO: DIVULG. / MARKOS FORTES

Melo de sua casa. Para quem não a conhece, Melo está para o Xingu como Chico Mendes estava para o Acre.” @brumelianebrum - Eliane Brum, jornalista l “Sou Amazônia n’alma e na carne. Um viva aos verdadeiros ambientalistas!!! Viva o índio brasileiro!” @DiraPaesCom - Dira Paes, atriz

ASTRONOMIA Imagine apontar seu celular para o céu e saber, em tempo real, os nomes das estrelas e constelações que cintilam sobre nossas cabeças? A ideia é ótima, e o melhor de tudo, é que o aplicativo para conhecê-las já existe também. Criado pelo Google, o Sky Maps permite visualizar a Via Láctea à noite, dá os nomes dos planetas, além de oferecer a opção zoom para que você fique mais perto das estrelas! Gratuito, ele pode ser baixado no site do Google Play para celulares com Android. Para os donos de aparelhos IOS, há também o app gratuito “Carta Celeste”. Você não tem mais desculpa para não viajar pelos céus!

MAIS ACESSADA A matéria sobre a caça e a morte do leão Cecil foi o texto mais clicado no site e também o mais comentado nas mídias sociais da Ecológico durante o mês de setembro. O extermínio do animal considerado símbolo do Zimbábue repercutiu mundialmente e suscitou o debate sobre a caça ilegal de animais. Se você ainda não leu a reportagem que foi a capa da edição 83, acesse o link: http://goo.gl/xNYvKM FOTO: DAUGHTER#3

l “Belo Monte expulsou Antônia

NOVOS IDIOMAS Sabe aquela antiga promessa de aprender inglês, ou ainda, de manter em dia a fluência? Pois saiba que no mundo dos aplicativos para celulares a aprendizagem de novas línguas também é uma possibilidade. Ou, pelo menos, a chance de praticar via exercícios. E se você ficou interessado, o Duolingo é considerado um dos melhores. O app funciona em forma de jogo, dividido por fases que precisam ser vencidas para que novas etapas sejam desbloqueadas. O programa também oferece curso de espanhol e inglês. O download é gratuito e está disponível nos sites do Google Play e da Apple Store. FOTO: JOHAN LARSSON / FLICKRCC

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Conjunto Moderno da Pampulha candidato a patrimônio A Pampulha é uma paixão dos belo-horizontinos. cultural da humanidade. E um orgulho para todos os brasileiros. Por isso, a Prefeitura de Belo Horizonte tem trabalhado vamos abraçar essa ideia.

pela revitalização e preservação desse patrimônio. São inúmeras ações para deixar a Pampulha ainda mais encantadora. Agora, ganhamos mais um motivo para nos orgulhar: o Conjunto Moderno da Pampulha é candidato a Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO.

É o mais famoso cartão postal de BH rumo ao reconhecimento mundial. Uma paixão de bh e do brasil para o mundo.

Algumas das obras realizadas pela Prefeitura na Pampulha: Inauguração da nova iluminação da orla • Restauração dos 11 km de ciclovia e pistas • Restauração do patrimônio arquitetônico • Inauguração do Museu Casa Kubitschek • Início da despoluição da lagoa com as obras de desassoreamento.

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SOU ECOLÓGICO FOTO: MARTIN ST-AMANT

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MAIOR PREMIAÇÃO AMBIENTAL DO PAÍS ENTRA NA RETA FINAL Foram encerradas, no último dia 21, as inscrições e indicações para o Prêmio Hugo Werneck 2015. Ao todo, foram selecionados 81 projetos inscritos de 13 estados brasileiros – Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Santa Catarina e São Paulo-, mais Distrito Federal, um aumento de 64% de participação nacional em relação ao ano anterior. Os vencedores serão anunciados em solenidade a ser realizada no próximo dia 10 de novembro, às 18h, no Teatro Francisco Nunes, coração da capital mineira, e contará com as presenças da ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, do governador de Minas, Fernando Pimentel, e do prefeito de BH, Marcio Lacerda, representando a Frente Nacional de Prefeitos (FNP). Sob o tema “Pelas Águas do Planeta – da Caixa D’Água do Brasil à Terra das Cataratas”, a sexta edição do prêmio também homenageará a obra poética e ecológica do escritor itabirano Carlos Drummond de Andrade.

“O Prêmio Hugo Werneck é um compromisso pela vida e pelo planeta. E isso faz muita diferença no Brasil.” IZABELLA TEIXEIRA Ministra de Meio Ambiente

GRATIDÃO HÍDRICA: na versão contrária à crise hídrica, o tema escolhido para a 6ª edição da premiação, este ano, exalta a junção dos rios Grande, Paraná, Iguaçu (foto) e Uruguai. São eles que formam o estuário do Prata, considerado o maior desemboque de água doce e ainda farto no mar do planeta. 16  ECOLÓGICO | SETEMBRO DE 2015

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“O amor vencerá! A vida não tem sentido sem a existência do homem em interação respeitosa com a natureza.” HUGO WERNECK Fundador há mais de 30 anos da primeira ONG ambientalista na América Latina a empunhar a bandeira hoje chamada de sustentabilidade

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Acesse o blog do Hiram:

PILAR CULTURAL O secretário de Estado de Cultura de Minas, Angelo Oswaldo, recebeu das mãos da prefeita Vilma Diniz, acompanhada do presidente do Instituto Espinhaço, Luiz Cláudio Ferreira Oliveira, o primeiro exemplar do belíssimo e ricamente informativo livro “História Viva”, sobre a cultura, memória, sustentabilidade e antecipação do futuro de Morro do Pilar. O município, localizado na Serra do Cipó, é emblemático também na história do setor mínero-metalúrgico do país. Foi nele que surgiu, há 200 anos, a primeira fundição de ferro em alto-forno no Brasil. A publicação, como condicionante ambiental, teve o patrocínio da Manabi e foi entregue de maneira personalizada a cada um dos moradores da cidade. A propósito, o slogan da atual administração da prefeitura, por causa do licenciamento em curso, é “transformação sustentável e participativa”. Tudo a ver.

FOTO: RONALDO GUIMARÃES

PEDRO BORREGO E ALDO SOUZA: transição sustentável

de uma reconhecida atuação pela melhoria da imagem pública do setor no Comitê de Comunicação do Ibram, em Brasília, coordenado pelo jornalista Fernando Künsch.

FOTOS: DIVULGAÇÃO

TROCA MINERÁRIA Vida que segue. Após ter ficado anos de luta à frente da implantação operacional do Projeto Minas-Rio, na região de Conceição do Mato Dentro, Pedro Borrego já está em nova missão: foi transferido para a sede da Anglo American em Londres, como novo diretor global interino de Gestão de Talentos e Transição. Quem responde agora pela diretoria de Saúde, Segurança e Desenvolvimento Sustentável da Unidade de Negócios de Ferro Brasil é Aldo Souza, com o mesmo e visível entusiasmo: “Nosso maior objetivo é manter e ampliar a construção de uma relação harmoniosa com o meio ambiente e as comunidades à nossa volta. Disso não abrimos mão” – adiantou. Engenheiro de Minas, Aldo vem

FOTO: FLAVIA VALSANI

hiramfirmino.blogspot.com

LUIZ CLÁUDIO, ANGELO OSWALDO E VILMA DINIZ: parceria em prol de Morro do Pilar

MEIRELLES ECOLÓGICO Poucos nomes brasileiros têm a força e credibilidade que Fernando Meirelles possui no cenário do cinema internacional. Consagrado por filmes como “Cidade de Deus”, “Ensaio sobre a Cegueira” e “O Jardineiro Fiel”, o diretor, produtor e escritor paulista vem encarando um novo desafio: comunicar a temática ambiental, uma de suas paixões, de forma envolvente e criativa. É dele essa declaração feita durante o Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação, recém-realizado em Curitiba, com apoio da Fundação Grupo Boticário:“A comunicação, não apenas no cinema, quando se fala de meio ambiente tem sido muito bio-desagradável e eco-chata. É preciso mostrar para as pessoas a importância da conservação da natureza sem focar apenas no catastrófico” - exatamente a linha editorial da Revista Ecológico. Em tempo, o nome de Meirelles vem sendo indicado ao Prêmio Hugo desde o ano passado, pelo emblemático documentário “A Lei da Água”, que ele produziu sobre o novo e polêmico Código Florestal Brasileiro.

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FERNANDO MEIRELLES: indicação natural

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PÁGINAS VERDES

“NOSSO FUTURO

É SOLAR” Hiram Firmino

redacao@revistaecologico.com.br

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FOTO: DIVULGAÇÃO

á exatos seis anos, o engenheiro agrônomo Jorge Samek, diretor-geral brasileiro da Itaipu Binacional, a maior hidrelétrica em geração de energia limpa do planeta, deu uma entrevista corajosa à então Revista JB Ecológico. Visionário e se dizendo portador da sustentabilidade em seu DNA, ele surpreendeu os jornalistas ao afirmar que, com o advento irreversível da energia solar, um dia tanto o reservatório quanto as turbinas de Itaipu, “mesmo com todo seu apogeu em termos de engenharia e produção de energia renovável”, ambos iriam fazer parte do passado. Virariam um grande museu a céu aberto, como um testemunho histórico de como a humanidade ainda usava e dependia da energia hidráulica no século 21. Nascido e criado nas barrancas do Rio Paraná – inclusive atravessando o Iguaçu a nado, quando jovem, até avistar as Cataratas no lado argentino - ele disse mais: “Daqui a uns mil anos, as populações futuras virão aqui conhecer como produzíamos energia elétri-

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JORGE SAMEK: “Nada tem mais força no mundo do que a ideia da sustentabilidade, cujo tempo chegou”

ca a partir da matriz hidráulica, então ultrapassada pela energia solar, mais limpa, abundante, fácil e barata de ser utilizada. Neste tempo futuro, nós já teremos sido convencidos a abrir todas as comportas de Itaipu e fazermos o Rio Iguaçu voltar ao seu tamanho original, sua calha natural. E aí, até as Sete Quedas que já maravilharam o mundo e entristeceram a humanidade quando tivemos de inundá-las, vão ressurgir na paisagem planetária”. Seis anos depois da Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP15) na capital dinamarquesa, e ao lado de Nelton Friedrich, coordenador do “Programa Cultivando Água Boa”, Samek voltou a apostar num futuro sustentável. Ele presidiu de 15 a 17 de setembro, em Foz do Iguaçu, o “I Encontro de Experiências Pioneiras e Inovadoras de Iniciativas Sociais na Gestão da Água – Criando uma Rede Global”, com a participação de autoridades e representantes de 18 países também vencedores do “Prêmio Water for Life”, da ONU Água, na última década, como os melhores exemplos de gestão hídrica do planeta. Seu positivismo e crença numa humanidade e planeta sustentáveis continua o mesmo. É o que você confere a seguir:


JORGE SAMEK

Diretor-geral brasileiro de Itaipu Binacional

O senhor mantém o que disse naquela época? Não só mantenho como acredito mais ainda no que estamos fazendo aqui. Quanto à energia solar, a sua adoção é inexorável. Apenas uma questão de tempo. Nada tem mais força no mundo do que uma ideia cujo tempo chegou. E chegou o tempo da sustentabilidade. Ninguém vai deter isso. O Brasil vai continuar tendo importância no petróleo, no gás. Mas chegaremos ao fim deste século com a energia solar em primeiro lugar em matriz energética no mundo. Em relação à biomassa, outra aposta de Itaipu, o que esperar? Isso é outra coisa fantástica, porque transforma um problema em uma solução. Vivemos um verdadeiro milagre aqui na região oeste do Paraná nos últimos 15 anos. Éramos um grande produtor de grãos, de proteína vegetal. Estamos transformando tudo isso em proteína animal. Hoje o nosso agricultor planta milho e colhe frango temperado pré-cozido pronto para consumo. Planta soja e colhe presunto, colhe iogurte. Esse milagre da transformação gera emprego e renda. Temos cidades prósperas de classe média numa região que não tem desemprego, nem criança fora da escola, fruto dessa transformação. Mas, claro, toda transformação gera problemas. Esses animais, principalmente os suínos, comem demais. E, por isso, defecam muito também, criando um “bostômetro” de uma dimensão extraordinária. Se isso não for bem tratado, vira problema, contamina água, lençol freático, rios e até o nosso reservatório. Como evitar que isso aconteça? Transformando em uma outra grande fonte alternativa energética. Cada agricultor pode ser au-

REPRODUÇÃO da entrevista de Jorge Samek à JB Ecológico, em setembro de 2009: "Eu mantenho o sonho"

tossuficiente na sua produção de energia. É isso que estamos fazendo e vem ganhando uma aceleração fantástica na região. Guarde o que estou falando. Em pouco tempo, os agricultores vizinhos e afetados por Itaipu terão toda a energia necessária produzida dentro das suas propriedades. Suas cooperativas também vão usar boa parte desta energia oriunda dos dejetos de suínos, aves e gados de leite. Essa região é a maior produtora desses insumos do Paraná. Isso se aplica no exemplo pontual do município de Entre Rios, que tem uma população de cinco mil habitantes e... 150 mil porcos? Sim. Já estamos com um projeto já aprovado em parceria com a Copagaz e a Copel, de ajudar a transformá-lo num município 100% autossustentável. É verdade. Toda a sua necessidade energética vai ser abastecida com cocô de porco. Vamos criar uma nova espécie de entidade estatal, a Bostobrás, que dará um salto do ponto de vista do aproveitamento de de-

jetos. Está prevista para os próximos anos a triplicação do nosso número de animais. O que se vê no Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, em Goiás, é que todas essas regiões estão se transformando em grandes produtoras de proteína animal. Isso é uma extraordinária fonte de renda e ainda há outro benefício: o que estava sendo jogado fora como lixo orgânico, poluindo os rios, quando você trata, tira o metano. Depois, por purificação, após a retirada de nitrato e nitrito, esse adubo volta para a lavoura como um extraordinário material fertilizante natural. O agricultor gastará menos com adubo químico. Só com o fertilizante NPK, por exemplo, hoje se gasta milhões, uma vez que boa parte dele é importada. Como conciliar o orgânico e o fertilizante? Esses dejetos, depois de tratados, podem substituir 50% do uso de fertilizantes e biocidas químicos. E com um ingrediente a mais, já que o que retém água no solo é maté-

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PÁGINAS VERDES

ria orgânica. Quem não usa essa técnica natural em sua produção agrícola, num período de seca de 10, 15 dias, ainda mais com o sol intenso que temos aqui na região, vai ver as suas plantas definharem. Isso é visível. Você passa pela estrada e vê, pelo milho plantado, se o agricultor preserva ou não matéria orgânica no solo. Aqueles que a usam, tipo deixando a palha do milho no chão, também chamado plantio direto, as plantas cultivadas suportam 15, 20 dias sem chuva. Elas não sofrem prejuízo algum exatamente porque a água, a umidade trazida pelas chuvas, fica sob a palha, retida ecologicamente no solo. Mas, do ponto de vista de produção de energia, isso não é pouco? Sim. Todo o cocô de suíno produzido na nossa região inteira vai dar menos de 1/3 do que produz uma turbina de Itaipu. Por outro lado, não olhando somente o dado da energia, do megawatt/ hora, teremos o suficiente para abastecer todos os pequenos produtores, suas casas, seus fogões, automóveis. Nós acabamos de adquirir 40 carros movidos a... titica de galinha. Já temos uma série de outros automóveis movidos por metano e energia solar. Ou seja, temos as duas experiências muito bem-sucedidas. Meu carro é elétrico, faz três anos que eu não uso veículo a gasolina. Na usina só andamos de carro elétrico. São conquistas pontuais que nos apontam para um futuro comum sustentável. O que antes era visto pelos agricultores tradicionais só como poluição, incapaz de lhes trazer renda, agora está virando uma fonte de ganho financeiro a mais. Como sensibilizar todos os agricultores e seus respectivos 20  ECOLÓGICO | SETEMBRO DE 2015

“Vamos criar uma nova espécie de entidade estatal, a Bostobras, que dará um salto do ponto de vista do aproveitamento de dejetos.” prefeitos para aderirem ao programa? Naturalmente, uma vez que já perdemos o controle. Antes tínhamos sete projetos-piloto localizados. Agora, via cooperativas, ele ficou economicamente viável, se multiplica e caminha com as próprias pernas. Como as cooperativas daqui estão com um portfólio de investimentos para triplicar a sua produção nos próximos dez anos, eles vão precisar ter um tratamento adequado para os dejetos de seus animais. E, obviamente, é aí que oferecemos a solução. São sete, oito anos de estudos que viabilizaram o desenvolvimento da tecnologia apropriada. E a sua aplicabilidade na prática, como acontece? Tem áreas, onde trabalhamos com pequenos produtores, que a melhor tecnologia é instalar um gasoduto. São 40 produtores. Famílias que têm 30, 50 vacas, 200 ou 500 porcos, e cada uma delas tem seu próprio biodigestor, de acordo com aquela quantidade de animais que possui. Todo o gás produzido é canalizado para uma única usina central para fazer o refino, retirar os nitratos e nitritos, deixando-o puro, para movimentar a cadeia. Qual o perfil do agricultor paranaense alcançado por Itaipu? Nossa região é formada por pequenas propriedades; 90% das do

oeste do Paraná têm até 50 hectares e, 70%, 20 ha. Como um agricultor desses tem esse bom padrão de vida? A resposta é simples. Em apenas 10, 15 hectares eles conseguem produzir 60 mil frangos, ou têm mil porcos, o que lhes dá condições de terem seus filhos na faculdade, uma casa bonita na cidade, automóvel, carro, trator, internet. É exatamente esse o milagre da transformação da proteína vegetal em proteína animal. E nessa composição, capaz de triplicar os lucros da atividade, não há outra alternativa que não seja transformar tudo isso em energia, em adubo. Sobre o “Cultivando”, o senhor acha que ele chegou ao ponto máximo? Nunca a questão relacionada à sustentabilidade vai chegar a um ponto máximo. Cada santo dia aparece um novo problema e uma nova solução. O que estamos fazendo e trabalhando, e temos absoluta certeza e convicção, é que temos um sonho em comum cada vez mais realizado: o de ver todos os nossos rios, nascentes e matas ciliares recuperadas, as nossas estradas rurais alteadas para segurar e infiltrar a água da chuva, evitando o processo de erosão continuada dos solos. Ao contrário, e isso é possível de se replicar em todo o país, todos os nossos solos agrícolas já são em curva de nível. Onde o “Cultivando Água Boa” acontece, você não vê mais trator nem arado removendo a terra, expondo os nutrientes ao sol inclemente. Isso é prática de um passado hoje distante, por ser insustentável. Nossa alternativa ecológica é a prática do plantio direto em que, no exemplo do milho, após sua colheita, a palha fica de propósito no chão, para manter a umidade e a fixação dos nutrientes para a próxima safra.


JORGE SAMEK

Diretor-geral brasileiro de Itaipu Binacional

Mais outros sonhos? Sim. O sonho da agricultura orgânica, da escolha e ampliação cada vez maior dos fitoterápicos para que o brasileiro deixe de tomar, comer e beber tanta droga química utilizada na lavoura convencional. O sonho aqui já praticado de toda a nossa merenda escolar ser à base de produtos 100% orgânicos, produzidos e consumidos nos próprios municípios aderentes à nossa causa: a da sustentabilidade que veio pra ficar e ajudar a salvar o planeta. Além da agricultura familiar ambientalmente correta, continuamos viabilizando a sustentabilidade dos nossos quilombolas, assentamentos e pequenos produtores. Tudo isso faz parte de um movimento permanente. A certeza de que há muito a fazer em parceria com o planeta, e não contra ele. Não existe crise? Essa crise que se abate no Brasil você não vê na nossa região. Seja no oeste e sudoeste do Paraná, no oeste de Santa Catarina, ou no Rio Grande do Sul, a crise não acontece. O plantio de soja, que irá abrir o mercado com sua colheita em fevereiro do ano que vem já teve início. Ou seja, o agricultor vai começar a plantar agora, com o preço da saca em R$ 70. Isso é de uma viabilidade econômica extraordinária! Os agricultores estão sorrindo! Abriu-se também a venda do milho, cuja safra só será entregue no ano que vem, lá pra agosto, a R$ 26 o saco. Para quem não é do ramo, pode não entender o que esses números representam. Mas, para se

produzir um alqueire de soja com a produção média aqui da região, está em torno de R$ 30 a R$ 32. O que se ganha em 120 dias? 125%. Você vende a soja a R$ 70. Não há nenhuma atividade no Brasil que tenha hoje a condição que a agricultura está tendo. O mundo está comendo mais, a China, Índia, os EUA, Brasil. Enfim, é um produto que tem mercado bom. Mas nós queremos qualquer tipo de produção? Não!

Qual o modelo ideal, então? O que estamos implantando aqui ao longo desses anos todos do projeto. Com sustentabilidade, preservação do solo, da água. Trabalhamos fortemente com o conceito de que água, terra e o ar, toda a natureza e o meio ambiente que dispomos não foram herdados dos nossos pais. Como eles, nós apenas os pegamos emprestados para deixar depois aos nossos filhos e netos que virão. Temos a obrigação de entregar uma qualidade de vida e um mun-

do melhor do que nós recebemos. Temos tecnologia para isso. É um espetáculo você conversar com os jovens nas escolas. A cabeça deles já é diferente, é evolutiva, parece uma febre benigna que veio para ficar. Como nós, eles sabem que fazem parte de uma sociedade hoje bem mais consciente do que a de seus pais. E que seus filhos serão mais conscientes e atuantes ainda. Toda a humanidade, enfim, está percebendo que só existe um planeta. Tem backup hoje para tudo. Só não tem para o planeta, porque ele é um só. Por isso temos de cuidar. O presidente da Agência Nacional das Águas (ANA), Vicente Andreu, lembrou que a maioria quase absoluta das hidrelétricas brasileiras não tem mata ciliar em volta dos seus reservatórios. Por que o exemplo de Itaipu não é copiado pelo setor? Se você pegar “n” usinas você vai ver que as coisas andaram e muito. Mas nenhuma delas é verdade, tem um projeto de preservação ambiental e desenvolvimento sustentável local com tantas alternativas, 65 ações ao todo, como nós fizemos. Aqui conseguimos juntar todas as prefeituras lindeiras com o nosso reservatório que também difere dos demais, e nos permite reflorestá-lo melhor, por sermos a fio d’água. Itaipu faz isso por quê? Não porque somos bonzinhos e temos algumas pessoas preocupadas com a questão ambiental.

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FOTO: ALEXANDRE MARCHETTI

PÁGINAS VERDES

“O Nelton (Friedrich, coordenador do 'Cultivando Água Boa') é um profeta da água. Quando se é militante, no exemplo maior dele, toda e qualquer pessoa bem informada e sensibilizada se apaixona pragmaticamente pela causa.” Mas, sim, porque a nossa matéria-prima é agua. Itaipu só produz energia porque tem água. E para ter água tem de ter reservatório. Para ter reservatório não pode ter assoreamento. Tem que ter mata ciliar. Não pode receber veneno, produto químico, matéria orgânica dos dejetos. São coisas que fazemos para proteger o nosso próprio negócio, mas que também dá uma resposta extraordinária para o meio ambiente, para a renda do agricultor e a consciência de mundo. É um jogo de ganha-ganha para todos os envolvidos.

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Podemos sonhar que o que acontece aqui em Itaipu pode acontecer na Cantareira e em Minas, que é a caixa d’água do Brasil? Por duas vezes a candidata à presidência da República Marina Silva chacoalhou a roseira. Ela deu um susto na turma, demonstrando que a agenda ambiental já deveria estar forte e irreversivelmente calcada na política. Os governadores de São Paulo e Minas Gerais, por exemplo, com esse estresse hídrico atual, estão sendo obrigados a dedicar parte de seu tempo à questão ecoló-

gica, trazer projetos e lutar por recursos para melhorar a gestão de suas águas. Trata-se de algo novo que veio para ficar e a população irá cobrar cada vez mais. Internacionalmente, é possível identificarmos os países que estão se destacando por colocar meio ambiente na cabeça de suas agendas políticas. Dinamarca e Alemanha, por exemplo, viraram referência mundial em função do bom uso de energia, seja solar, eólica, de mar, de biomassa, bem como de outros cuidados ambientais, recuperando antigos rios que foram canalizados e agora estão sendo trazidos à vista da população, na forma de parques públicos e lineares para a consciência, informação e lazer gratuito das suas populações. Podemos imaginar um Tietê assim, em São Paulo? Eu gostaria muito e é possível sim vê-lo cheio de peixes. Sei que algumas pessoas podem dizer “pare de sonhar”, mas eu acredito. Basta fazermos a sua recuperação ambiental à semelhança do que a Mãe Natureza nos ensina. Seguir o seu modelo natural, começando pela preservação das suas cabeceiras. Chamar os produtores rurais e dizer “vamos cercar esta área, aqui tem de ter mato, árvores. Boi não pode entrar, nem receber mais qualquer tipo de dejeto, humano, industrial, animal”. Isso acontece assim até em Nova York, onde os moradores tomam água direto da torneira. O custo do tratamento é baixíssimo. Se há esse exemplo tão emblemático de Nova York, como de outras capitais europeias improváveis, por que não se consegue replicar a correta gestão das águas no Brasil?


JORGE SAMEK

Diretor-geral brasileiro de Itaipu Binacional

“Tem backup hoje para tudo. Só não tem para o planeta, porque ele é um só. Por isso temos de cuidar.” Porque burrice não doi. Se doesse, tudo isso estaria resolvido. Na hora em que o bom senso imperar, isso vai acontecer naturalmente, não há mais como reter a onda da sustentabilidade. Nós já temos muitos bons exemplos no país, como o município de Extrema, no sul de Minas, onde a recuperação de nascentes e o consequente aumento da produção de água pura é uma realidade, com os agricultores sendo incentivados e remunerados pela prefeitura local. Temos o exemplo do Sebastião Salgado, através do seu Instituto Terra, que recuperou a quase extinta Mata Atlântica na região onde nasceu, na divisa de Minas com o Espírito Santo; e hoje está à frente de um projeto compartilhado com a Arcelor Mittal para a recuperação de 400 mil nascentes na Bacia Hidrográfica do Rio Doce. É um trabalho fantástico, tão sonhador como possível, a exemplo da transformação que estamos conseguindo aqui. O senhor está se referindo ao “Programa Cultivando Água Boa”? Sim, nós o começamos com a participação de 16 municípios lindeiros. Hoje já passamos para 29 e estamos envolvendo um total de 54 prefeituras, mais agricultores, estudantes e populações na defesa de seus recursos hídricos. O Nelton (Friedrich, coordenador do programa) é um

profeta da água. Quando se é militante, no exemplo maior dele, toda e qualquer pessoa bem informada e sensibilizada se apaixona pragmaticamente pela causa. Ele viaja pra tudo que é lugar, convida as pessoas, governos e instituições para virem conhecer o que acontece em Itaipu. O segredo da felicidade humana é fazer o que você gosta. O nosso pessoal gosta, militantes que nos tornamos da causa ambiental. É isso que dá consistência, resultado, reconhecimento e reaplicação mundo afora. Os municípios e seus prefeitos, quando adotam as práticas do programa, veem que isso é bom. E também se entusiasmam. Já existe uma demanda real de outras partes do país de seguir este exemplo? Sim. O “Cultivando” foi adotado pelo Governo de Minas, através da Copasa, com quem já estamos mapeando e trabalhando uma área imensa de municípios fortemente afetados pela crise hídrica. Para nós, esta parceria faz todo um sentido especial, pois quase toda a água que chega a Itaipu vem de Minas. A bacia do Rio Grande é nossa principal fornecedora. Quando Deus fez o mundo, acho que Ele pensou: ‘Aqui vai ter uma hidrelétrica’. Chove em Brasília, chega água aqui. Choveu em Paranoá, no Rio Grande, no Tietê, no Paranapanema, chove aqui por indução. O próprio Rio Grande nasce nas montanhas de Minas. A primeira usina hidrelétrica lá se chama Camargos. De lá, se chega em Itutinga. Em Itutinga você tem Funil. Funil chega em Furnas, Mascarenha de Morais, Luiz Carlos Barreto, Igarapava, Jaguara, Volta Grande, Porto Columbia, Marimbondo, Água Vermelha. Aí

SAIBA MAIS

O Programa “Cultivando Água Boa” é um conjunto de 20 projetos executados na Bacia do Paraná – Parte 3, um território de 800 mil hectares e um milhão de habitantes, distribuídos por 29 municípios no entorno do reservatório de Itaipu Binacional. Ao todo são 217 microbacias hidrográficas que contam com diversas ações para a proteção e recuperação de nascentes e dos cursos dos rios, com iniciativas voltadas a novos meios de produção (principalmente agropecuária) e consumo, conservação da biodiversidade, educação ambiental, atenção a segmentos vulneráveis (como indígenas, agricultores familiares, pescadores e catadores de materiais recicláveis), entre outros. No início deste ano, o programa recebeu o “Prêmio Water for Life”, da ONU Água, como a melhor prática de gestão de recursos hídricos do mundo. A exemplo de Minas, ele já está sendo estudado pelo governo paulista para ser adotado também no Sistema Cantareira.

o Rio Grande junta com o Rio Paranaíba e, no final disso tudo, passa pelas Cataratas, onde os rios Paraná, Iguaçu e Uruguai se juntam para formar o estuário do Prata, o maior desemboque de água doce no mar do planeta. As águas são como as pessoas; crescem porque se encontram. É esta a esperança, o sonho real que está dando certo em Itaipu e queremos compartilhar com o Brasil e o mundo.  SAIBA MAIS itaipu.gov.br cultivandoaguaboa.com.br

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ESTADO DE ALERTA MARIA DALCE RICAS (*) redacao@revistaecologico.com.br

ABANDONADOS

À PRÓPRIA SORTE

I

nvestigamos cinco municípios que, por abrigarem atende às demandas que lhes são solicitadas. em seu território unidades de conservação, receItabirito, mesmo recebendo menos de R$ 4 mil de bem um incremento no repasse do ICMS (Imposto ICMS Ecológico, é o melhor exemplo: mantém unisobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias dade do Corpo de Bombeiros municipal que atua no e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interesta- combate a incêndios. dual e Intermunicipal e de Comunicação), ou seja, são O princípio de “compensar por espaço territorial beneficiados pelo ICMS Ecológico. Apenas dois de- ocupado” só vale para os parques estaduais e Reserles auxiliam o Instituto Estadual de Florestas (IEF) no vas Particulares de Patrimônio Particular (RPPNs). combate a incêndios florestais. A lei não os obriga a in- A desenfreada criação de centenas de APAs, que vestir qualquer parcela do recurso também geram ICMS, mostra isto. Com "E se os parques para proteger as áreas de preserexceções que não chegam a 10% do tovação, por partir do princípio lital, a existência delas não vai além do estaduais estão quase mitado e nada inteligente de que ato que as criou. jogados à própria sorte o valor é uma compensação pelo Cabe ao IEF preparar a documentação devido à falta de recursos fato de a unidade de conservação base para o repasse de ICMS Ecológico. e interesse do governo, o Enviada à Fundação João Pinheiro, ela ocupar parte de seus territórios. Buenópolis recebe mensalmen- que esperar de seriedade deveria ser, no mínimo, acompanhada te em torno de R$ 45 mil por duas de registros que comprovem a proteção no repasse do Áreas de Proteção Ambiental (APAs) de ambientes naturais nessas centenas ICMS Ecológico?" municipais e pelos parques Naciode APAs. Mas isso depende de fiscalinal das Sempre Vivas e Estadual da zação in loco. E se os parques estaduais Serra do Cabral. A prefeitura não auxilia no estão quase jogados à própria sorte devido à combate a incêndios e considera que falta de recursos e interesse do governo, a responsabilidade é somente do o que esperar de seriedade no repasse governo estadual. do ICMS Ecológico? São Gonçalo do Rio Preto Assim, esse imposto, que podetem direito a cerca de R$ ria funcionar como estímulo à 60 mil todo mês pelo preservação de áreas prioritáParque Estadual do Rio rias para proteger a biodiversiPreto, além de arredade e a água foi desmoralizacadar indiretamente do e desvirtuado. A lei precisa com a visitação de tuser mudada para que se torne ristas, que movimenrealmente justa e premie os mutam pousadas e comérnicípios que merecem.  cio. A prefeitura admite que a cidade não auxilia no (*) Superintendente-executiva da Associação combate a incêndios, mas “às veMineira de Defesa do Ambiente (Amda). zes” ajuda na manutenção de estradas. As exceções ficam por conta de Araponga e Itabirito. O primeiro recebeu no mês de fevereiro cerca de R$ 47 mil pelo Parque Estadual da Serra do Brigadeiro e por uma APA municipal. A prefeitura não tem brigadistas contratados, mas, de acordo com depoimentos de funcionários do parque, sempre 24  ECOLÓGICO | SETEMBRO DE 2015


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CÉU DE BRASÍLIA

VINÍCIUS CARVALHO

PREVENÇÃO DE RAIOS

FOTO: VALDEZRL

Um sistema inédito vai prever, com antecedência de 24 horas, a incidência de raios em todo o país. A ferramenta, lançada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), tem margem de acerto de 85% em uma área de até dez quilômetros – o que permitirá a geração de alertas para os municípios.

DESMATAMENTO AMAZÔNICO

FRENTE DO CERRADO

CERTIDÃO PARA OS ÍNDIOS

OPERAÇÃO MALHA VERDE

A Justiça Federal atendeu ao pedido do Ministério Público Federal para que a Fundação Nacional do Índio (Funai) passasse a emitir certidão de atividade rural para indígenas que não moram em aldeias, os chamados não-aldeados. Na ação, o órgão apontou que a Funai se recusava a emitir a certidão para fins de prova de condição de segurado especial junto ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

VAI, TAMAR!

Boa notícia para as tartarugas brasileiras. De acordo com dados do Projeto Tamar, criado há 35 anos para proteger as espécies que passam pelo país, houve crescimento de 86,7% no número de filhotes nascidos de 2010 a 2015 em relação ao quinquênio anterior.

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A Frente Parlamentar Mista em Defesa do Cerrado foi lançada na Câmara dos Deputados no “Dia Nacional do Cerrado” (11 de setembro). Ela reúne 201 deputados e três senadores e tem como objetivo salvaguardar os interesses do bioma no Congresso Nacional.

O Ibama realizou na região de Alta Floresta, a 800 km de Cuiabá, mais uma etapa da “Operação Malha Verde”, que desarticulou um esquema criminoso de comercialização de créditos e guias florestais. Segundo a investigação, a fraude começou há quatro anos e permitiu que fossem colocados no mercado mais de 60 mil metros cúbicos de madeira de origem ilegal. FOTO: RAFA TECCHIO

O sistema Deter (Detecção do Desmatamento em Tempo Real) identificou um desmatamento 68% maior na Amazônia no último ano. No período 2013-2014, ele captou 3.035 km² de florestas derrubadas. No período 2014-2015, o número subiu para 5.121 km².


Cada brasileiro consome em média 5,2 litros de agrotóxicos por ano

Até quando vamos engolir isso? Segundo dados do Sindicato Nacional para Produtos de Defesa Agrícola (Sindage), em 2009, foram comerciados legalmente 1 bilhão de litros. Distribuindo a quantidade de veneno utilizado chegamos à média de 5,2 litros de agrotóxicos por habitante ao longo do ano.

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CAMPANHA PERMANENTE CONTRA OS AGROTÓXICOS E PELA VIDA

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1 SAÚDE

VIVER É A Este mês, o Brasil se pintou de amarelo para a prevenção contra o suicídio. E ganhou o apoio do jornalista e ambientalista André Trigueiro que, em seu novo livro, mostra o que cada ser humano pode fazer para ajudar aqueles que, em momentos de fragilidade, acreditam que o autoextermínio seja a saída Luciano Lopes

redacao@revistaecologico.com.br

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FOTO: JACKSON ROMANELLI

uem olhou para o Cristo Redentor na Cidade Maravilhosa, no dia 10 de setembro, se emocionou com a estátua de 38 metros de altura em tons amarelos. A iniciativa marcou o lançamento da campanha “Setembro Amarelo”, idealizada pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), para estimular a prevenção do suícidio por meio da informação. A iniciativa reverberou em todo o país e também chegou a Minas,

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que, meses antes, começou a jogar luzes sobre o tema. Foi no auditório recém-inaugurado do Hospital Mater Dei Contorno, na capital mineira, onde o amarelo da consciência deu lugar ao silêncio produtivo. Todos o acolheram para ouvir, com atenção e interesse, o jornalista e ambientalista André Trigueiro falar sobre... a vida. Melhor: sobre como escolher viver sempre será a melhor opção, principalmente para aqueles que acreditam que o fim de si mesmo é a solução dos problemas. “A primeira lição a se fazer é enamorar-se da vida”, disse Trigueiro logo no início da palestra, que integrou mais uma edição do “Projeto Sempre Um Papo”. E o amor, ressaltou o jornalista, é o sentimento que mais deve ser trabalhado na prevenção do suicídio. “Falar disso pode salvar vidas. A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera o suicídio como um problema de saúde pública. Noventa por cento dos casos são preveníveis e estão associados a patologias de ordem mental diagnosticáveis e tratáveis. Especialmente o transtorno de humor, popularmente conhecido como depressão”, afirma. Enquanto eu ouvia a palestra,

TRIGUEIRO: “A primeira lição é enamorar-se da vida”

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MELHOR OPÇÃO reparava também nos rostos das pessoas que estavam, assim como eu, sentadas nas cadeiras do auditório. E fiquei imaginando quantos milhões de seres humanos, mundo afora, já poderiam ter pensado em tirar a própria vida. “O que alguém com este pensamento estaria sofrendo?” “O que é preciso fazer para evitar o risco de suicídio?”, foi o que me perguntei. Apegado à última pergunta, abri o livro “Viver é a Melhor Opção”, que Trigueiro estava lançando no mesmo dia em BH. Caí direto na página 12. Inacreditavelmente, a resposta veio: é preciso uma “revisão urgente dos protocolos de atendimento, tratamento e acompanhamento das pessoas em situação de risco, bem como de suas famílias e amigos. Se de cada 10 suicídios nove são preveníveis, há muito o que fazer para que essas pessoas não desistam da vida e prossigam suas existências com saúde e equilíbrio”. DADOS ALARMANTES A ideia de escrever um livro sobre o tema surgiu em 1999, para instigar e pesquisar o fenômeno do suicídio no país. “Não é mais possível ignorar os preocupantes casos de extermínio no Brasil e no mundo, os impactos dessas estatísticas na área da saúde pública e o abalo profundo que traumatiza familiares e amigos mais próximos do suicida. É preciso igualmente estar atento à maior incidência de jovens que desistem da vida, à falta de visibilidade das redes de proteção que agem sem apoios consistentes dos governos e das empresas, à ausência de qualquer informação sobre esses assuntos nas mídias em geral, entre outros problemas que têm origem na desinformação”, res-

saltou o jornalista em seu livro. Os dados sobre suicídio são, de fato, alarmantes. No segundo semestre do ano passado, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou um dos mais importantes e atuais relatórios produzidos sobre prevenção do autoextermínio – “Preventing Suicide – A Global Imperative”. Nele, a OMS estima que 804 mil pessoas tiraram a própria vida em 2012, o que equivale a 2.200 casos por dia ou um a cada 40 segundos. E define o comportamento suicida como “um fenômeno complexo causado por vários fatores inter-relacionados: pessoais, sociais, psicológicos, culturais, biológicos e ambientais”. Segundo a organização, o suicídio representa 1,4% do total de óbitos registrados no planeta. Mais. A tentativa de suicídio, informa a organização, é a sexta causa de incapacitação nos indivíduos entre 15 e 44 anos. “Para cada caso consumado de suicídio, entre cinco e seis pessoas próximas ao falecido sofrem consequências emocionais, sociais e econômicas”, informa a OMS. No Brasil, foram 11.821 ocorrências apenas em 2012, período que compreende o estudo realizado pela OMS. E, segundo dados oficiais do Ministério da Saúde, entre 2002 e 2012, o índice de crescimento do autoextermínio no país foi de 33,6%. E ultrapassa a taxa de vítimas mortais de acidentes de trânsito (24,5%).

O CRISTO AMARELO: desta vez, refletindo e conscientizando a todos para a prevenção do suicídio

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FOTO: SVETA

1 SAÚDE "O silêncio em torno do assunto alimenta a passividade, quando o momento deveria ser de ação."

dor da categoria “Melhor Documentário de Curta Duração”: “Quero dedicar este prêmio ao meu filho. Nós o perdemos para o suicídio. E precisamos falar claramente sobre esse tema em alto e bom som e trabalhar contra o estigma e o silêncio em relação ao assunto. A melhor forma de prevenir o suicídio é nos conscientizando e discutindo. E não varrendo o problema para

FOTO: DIVULGAÇÃO

O PAPEL DA MÍDIA O jornalista também alertou a postura excessivamente cautelosa da mídia em tratar o assunto, uma vez que ela “desmobiliza um aparato que a sociedade só teria condições de acionar se devidamente informada e conscientizada a respeito do problema do suicídio no país. O silêncio em torno do assunto alimenta a passividade, quando o momento deveria ser de ação”. Ou seja, em vez de usar linguagem sensacionalista, focar detalhes sobre o método utilizado e mostrar fotos, o caminho deve ser sempre o positivo: abrir espaço para os exemplos de superação, de pessoas que procuraram ajuda e venceram o desespero. Durante a cerimônia de entrega do Oscar este ano, por exemplo, dois momentos jogaram mais luz ao movimento de prevenção ao suicídio. E foram maciçamente divulgados na imprensa mundial. Um deles foi o depoimento de Dana Perry, produtora de “Crisis Hotline: Veterans Press 1”, filme vence-

debaixo do tapete”. O documentário mostra o serviço de ajuda telefônica para veteranos de guerra dos Estados Unidos, que recebe 22 mil ligações por mês. Poucos minutos depois, o escritor e produtor Graham Moore, premiado na categoria “Melhor Roteiro Adaptado” para o filme “The Imitation Game”, sensibilizou o mundo ao contar sua experiência: “Quando eu tinha 16 anos, tentei me matar porque me sentia estranho, diferente, sem pertencimento. E agora estou aqui. Gostaria de dedicar esse momento para aqueles garotos lá fora que não se sentem encaixados na vida. Sim, você se encaixa. Continue estranho. Continue diferente. Quando chegar a sua vez, e você permanecer firme, por favor, passe a mesma mensagem positiva para a pessoa seguinte”. ACOLHIMENTO AMOROSO “O suicídio é uma situação de crise na vida que é absolutamente evitável. É uma eventualidade que ocorre geralmente na vigência de uma doença mental. E é importante que cada cidadão se sinta responsável pelo vizinho ou parente que ele perceba estar em crise”, afirmou o psiquiatra José Manoel Bertolote em entrevista ao blog “Suícidio: Conhecer para Prevenir”. Para que isso seja possível, é preciso “abrir caminho para políticas públicas mais eficientes e assertivas, que promovam o atendimento digno e combatam o preconceito contra esse segmento numeroso da população. A própria OMS afirma que o estigma social associado a essas doenças ou transtornos impede essas pessoas de procurar ajuda e, dependendo do caso, aumenta o risco de suicídios”, complementa André Trigueiro. Além do desafio de construir “redes de cuidado” capacitadas e interligadas, tanto em instituições médicas públicas quanto particu-

O JORNALISTA cedeu os direitos autorais do livro para o CVV 30  ECOLÓGICO | SETEMBRO DE 2015

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FOTO: LUCY NICHOLSON / REUTERS

GRAHAM MOORE e seu Oscar: recado consciente e motivador

lares, para atender todos os que se encontram fragilizados e vulneráveis, é importante estimular também o crescimento (e o fortalecimento) de organizações voluntárias de apoio a essas pessoas. Afinal, elas são essenciais para que o suicida recupere a autoestima e a família reencontre o equilíbrio, principalmente emocional. “Mais amor cristão e menos preconceito. Caridade em lugar da condenação sumária”, adverte. O Centro de Valorização da Vida (CVV) é exemplo disso. Fundado há 53 anos em São Paulo (SP), oferece apoio por meio de atendimento telefônico e online. Tem 70 postos espalhados pelo país, 1.800 voluntários e recebe mais de 800 mil ligações por ano, sendo que metade delas dura, em média, 50 minutos. Para os que desejam ser voluntários na instituição, só há dois requisitos a serem atendidos: ter boa vontade e idade acima de 18 anos. “O principal aprendizado é o da escuta amorosa. Os voluntários aprendem a perceber o valor da escuta numa sociedade onde a maioria absoluta das pessoas simplesmente não tem tempo nem paciência para ouvir o outro”, afirma Trigueiro, que vem acompanhando o trabalho do CVV há anos. A escuta amorosa permite que as pessoas conversem ou desabafem, compartilhem seus medos e sentimentos, evitando que se sintam solitários ou angus-

tiados. E mais: quem liga para o CVV só se identifica se quiser. Lá, sigilo e o respeito absoluto à autonomia de quem ligou são os princípios fundamentais. Nesse momento, Trigueiro saudou voluntários do Centro que acompanhavam a palestra. E citou um depoimento comovente da atriz Cássia Kiss sobre a instituição, que também está registrado no livro: “Há mais ou menos 20 anos precisei de ajuda especial. Tinha vontade de desaparecer (coisa normal no mundo de quem não tem compromisso, responsabilidade comunitária). Chamei o CVV. Estou viva e integrada”. Um belo exemplo de que a ajuda para escolher a vida pode estar mais perto do que imaginamos. E começa dentro de nós. MENSAGEM POSITIVA Pouco antes de encerrar a palestra, o ambientalista respondeu às perguntas de algumas pessoas da plateia. Uma delas era uma senhora, de aproximadamente 60 anos. Ela contou que três familiares haviam cometido suicídio. E que a dor era tão grande que ela se sentia fracassada por não ter conseguido ajudar a evitar os acontecimentos, mesmo sem ter qualquer envolvimento neles. “Falar disso é muito difícil. E desconheço, inclusive, que haja algum órgão ou entidade que ajude a família do suicida em Minas Gerais. Porque o tabu maior está nas pessoas, que não

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FOTO: DIVULGAÇÃO - TV GLOBO

1 SAÚDE

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CÁSSIA KISS: ”Estou viva e integrada”

querem falar contigo sobre o assunto”, disse ela. Trigueiro respondeu: “Que tal você pensar na possibilidade de encabeçar um movimento que resulte na abertura de uma rede de apoio às famílias que passaram pela mesma experiência? Quem sabe você possa compartilhar e transformar também essa dor em conforto para centenas de outras pessoas?”. Naquele momento, o rosto da senhora pareceu ter se iluminado. E seu sorriso almejou a saída reconfortante, o fim de uma angústia. Saí da palestra ciente de que, resguardadas a missão e a expiação de cada ser humano, cada um de nós tem a oportunidade de escolher o melhor caminho para a nossa evolução espiritual, ainda que a sua conquista seja individual. E que, no caso daqueles que pensam no autoextermínio, o mais importante é perceber que nenhuma dor ou sofrimento dura para sempre. É essa a mensagem que Trigueiro quer que levemos no coração e na mente: “Por mais assustadora que seja a tempestade, ela sempre passa. Se o hoje te parece desagradável e angustiante, espera e confia. A melhor saída é a vida”. SAIBA MAIS www.correiofraterno.com.br/loja www.mundosustentavel.com.br

RELAÇÃO SUICÍDIO-AGROTÓXICOS “Infelizmente, o Brasil é um dos mercados mais vulneráveis do mundo à comercialização de pesticidas de elevada toxicidade sem a devida fiscalização”, informa o livro. Mesmo com os alertas dos profissionais de saúde quanto aos riscos para a saúde humana, milhares de trabalhadores rurais continuam utilizando agrotóxicos nas lavouras sem equipamento de proteção. “No que diz respeito especificamente ao suicídio, a ameaça vem tanto da relação, apontada em vários estudos, entre a contaminação e os danos ao sistema nervoso (levando a pessoa a se deprimir).” Nas regiões onde a agricultura é

PANORAMA TRISTE TRISTE l Para cada pessoa que consegue se suicidar, mais de 20 tentam se matar sem sucesso uma ou mais vezes. l Para a OMS, o principal fator de risco é a primeira tentativa de suicídio. l O número de pessoas que se matam no mundo hoje já é superior ao registrado de óbitos por homicídio (437 mil). l O Brasil está abaixo da média mundial (11,4 mortes por 100 mil habitantes) de suicídios: 5,8 mortes por 100 mil habitantes. l Rio Grande do Sul é o estado brasileiro com maior número de casos registrados: 10,9 por 100 mil habitantes. l Entre 2002 e 2012, Paraíba foi o estado que mais registrou crescimento de suicídios, com 142,9%. l Das capitais do país, Salvador (BA), João Pessoa (PB) e Manaus (AM) registraram crescimento assustador das taxas de suicídio entre jovens, com 98,8%, 76,8% e 65,5%, respectivamente. l Segundo o relatório “Mapa da Violência 2014 – Os jovens do Brasil”, alguns dos municípios que aparecem nos primeiros lugares nas listas de mortalidade suicida, como São Gabriel da Cachoeira (AM), são locais de assentamentos de comunidades indígenas. l As taxas de suicídio entre homens (84,9%) no Brasil é quatro vezes maior que entre as mulheres (15,8%). l A maior parte dos suicídios (75,5%), segundo a OMS, acontece em países com economia de renda baixa ou média. Já a menor parte dos casos (24,5%) é registrada em países onde a renda é alta.

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uma atividade econômica de alta importância, como África e América Central, a OMS recomenda que várias medidas preventivas sejam adotadas. São elas: l O CUMPRIMENTO de convenções internacionais que regulam a comercialização e o uso de produtos químicos; l A RETIRADA do mercado de pesticidas com alta toxicidade e risco para a saúde; l MAIOR controle e fiscalização das autoridades competentes; l A POSSIBILIDADE de oferecimento de socorro imediato e adequado aos que sofrem efeitos nefastos do veneno (contato com a pele, vias respiratórias etc.).

PANORAMA POSITIVO POSITIVO l 90% dos casos de suicídio estão associados a patologias de ordem mental e são diagnosticáveis e tratáveis, como transtornos de humor e de personalidade, dependência de álcool e drogas e esquizofrenia. l Em nenhum outro momento da história, quanto agora, a medicina esteve tão preparada para enfrentar a depressão: já existem medicamentos que restauram a função metabólica dos neurotransmissores e o atendimento psicológico e terapêutico têm papel cada vez mais importante na prevenção do suicídio. l O Código Penal Brasileiro já contempla penas (Artigo 122) para quem induz, instiga ou auxilia alguém a se matar: reclusão de dois a seis anos, se o suicídio se consumar; e de um a três anos se a tentativa resultar em lesão corporal grave. A pena ainda pode ser duplicada se o crime foi praticado por motivo egoístico ou se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência. l Segundo a OMS, países como Austrália, Nova Zelândia, Noruega, Reino Unido e Canadá reduziram taxas de suicídio após a aplicação de leis restritivas ao uso de armas, gases (como os de cozinha) e remédios. l Nos Estados Unidos, quem clica a palavra “suicídio” em sites de busca como Google e Yahoo, acessa automaticamente, nos primeiros resultados, os serviços de ajuda na internet. l Nos últimos 15 anos, multiplicaram-se os cursos que capacitam pessoas a participar de diferentes programas de prevenção em escolas, presídios e ambientes domésticos. l Dos 90 países que participaram de um levantamento feito pela OMS em 2013 sobre as políticas de prevenção ao suicídio, 53% identificaram uma ONG dedicada ao tema, 61% consideraram o suicídio um problema importante de saúde pública e 42% informaram existir grupos de apoio mútuo. 

Confira, na próxima edição, a visão espírita do suicídio.

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UM FILME DA CONSERV AÇ

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RV AÇÃO INTERNACIONAL

es maiores do que vocês. do que vocês passarem fome.”

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1 COMPORTAMENTO

Compartilhando o bem Jornalista mineira mostra como a adoção de práticas saudáveis e sustentáveis podem trazer benefícios para o ser humano e o planeta Cristiane Mendonça

redacao@revistaecologico.com.br


O RECADO DA YOGA: "Uma vida melhor a cada dia"

Q

uantas vezes no nosso dia fazemos aquilo que realmente acreditamos? Quantas vezes por semana praticamos atividades físicas ou temos o privilégio de comer algo colhido em uma horta orgânica? Ou se alguma vez na vida, já paramos, um minuto que seja para sentir o nosso estômago - não pela fome, mas pelo simples sentir? Se as respostas para essas perguntas passam por “falta de dinheiro” ou “vida corrida”, talvez seja a hora de você parar e dar atenção à pessoa mais importante do seu mundo: você mesmo. Parece difícil? Para a fotógrafa, bióloga e jornalista Fernanda Mann, que mora no Retiro das Pedras, na zona sul da capital mineira, a resposta é não. “Basta fazer uma boa escolha todo dia”, conta ela com um sorriso. Praticante de yoga há 15 anos, Fernanda é adepta do ciclismo e sempre se identificou com temas relacionados ao bem-estar e à qualidade de vida. Nos últimos dois anos tem cultivado uma horta orgânica

onde ela produz, entre outros alimentos, couve, rúcula, brócolis, tomate e abobrinha. Sem contar a compostagem, que Fernanda também realiza, uma experiência diária de perceber como a natureza é harmônica e como tudo pode ser reaproveitado. Entusiasmada, ela conta que na composteira onde deposita todos as sobras de alimentos naturais, as minhocas são sempre bem-vindas e até o chorume gerado tem efeitos fantásticos para as plantas. “Dia desses, um amigo me ligou pedindo choru-

PARA FERNANDA, a alimentação saudável também contribui para preservar a natureza

me da minha composteira. Para regar as plantas, é só misturar um copo desse líquido com 10 de água. O efeito é rápido! O verde é incrível e até há agilidade no amadurecimento dos frutos. Às vezes estão verdes em um dia e no outro já dá para comer”. E completa: “Com o uso da composteira, você não precisa comprar terra e nem fertilizantes, pois as minhocas produzem húmus, um dos adubos mais ricos em nutrientes que existe”. REDES SOCIAIS Como comunicadora praticante, Fernanda percebeu que era preciso compartilhar com outras pessoas essas experiências sustentáveis. Por meio de postagens no Facebook, onde ela tem mais de 700 “amigos”, e no Instagram, com mais de mil seguidores, Fernanda vem postando belíssimas fotografias de tudo que faz parte de um dia a dia equilibrado. Os alimentos colhidos na horta, as minhocas que aparecem pelo quintal, as refeições e os sucos preparados com alimentos naturais, e até mesmo as pedaladas SETEMBRO DE 2015 | ECOLÓGICO  37

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1 COMPORTAMENTO ENTENDA MELHOR

“Se você escolhe o alimento orgânico, está ajudando a gerar renda para o pequeno produtor rural e dizendo não ao uso de agrotóxicos.” ALIMENTO ORGÂNICO

pela Serra da Calçada, na Região Metropolitana de BH, onde está sempre acompanhada da parceira fiel: sua cachorra Fauna. YOGA Além da boa alimentação, Fernanda também publica nas redes sociais (por meio da #nossajornadayoga), junto à amiga Simone Las Casas, imagens de estúdios e salas de yoga em Belo Horizonte e região. Ela conta que “a ideia é mostrar para as pessoas variados espaços capazes de conciliar as necessidades de cada um”. Sejam elas relacionadas a demandas corporais trabalhadas pela yoga, ou questões mais práticas, como a escolha de lugares longe do barulho da cidade. Além das salas, Fernanda também registra diferentes posturas da yoga que ela mesmo pratica ao ar livre ou dentro de casa: “É uma prática que pode ser exercitada em qualquer lugar com, no mínimo, dois metros de largura”. A grande mídia, afirma Fernanda, diariamente nos bombardeia com notícias ruins, promovendo produtos prejudiciais à saúde. “Se você escolhe o alimento orgânico estará contribuindo para gerar renda para o pequeno produtor rural, dizendo não ao uso de agrotóxicos e impedindo que os rios e os solos sejam contaminados. E, consequentemente,

É aquele isento de qualquer tipo de contaminante que ponha em risco a saúde ambiental ou humana, seja de produtores ou consumidores. Por ser produzido livre de insumos artificiais, como adubos químicos, agrotóxicos, drogas veterinárias, aditivos sintéticos (corantes, aromatizantes e emulsificantes), hormônios, antibióticos e de organismos geneticamente modificados, é considerado mais saudável.

CORPO E MENTE “Yoga” ou “ioga” significa controlar, unir. É um termo de origem sânscrita, uma língua presente na Índia, em especial na religião hinduísta. É uma filosofia que trabalha o corpo e a mente por meio de disciplinas tradicionais de quem a pratica. Relacionada ao budismo e ao hinduísmo, com práticas como exercícios e meditação para trabalhar a parte física e também a mente. Existem diversas ramificações da yoga, como a rajaioga, carma-ioga, jnana-ioga, bacti-ioga e hata-ioga, e cada uma delas possui ações e atividades diferentes a serem trabalhadas.

está ajudando o planeta! Ou seja: é bom para seu corpo, a economia e a natureza!” COMPARTILHE TAMBÉM Todas as ações sustentáveis de Fernanda são compartilhadas por meio de inúmeras hashtags. Mas você pode descobrir as mais

recentes por meio de: #cozinhadafre, #freyoga, #freyogatour, #sucodafre.  SAIBA MAIS www.instagram.com/ fernandamann www.facebook.com/ fernanda.mannazevedo

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CHANCES DE GANHAR NA LOTERIA 1 EM 50 MILHÕES*

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NÃO CONTE COM A SORTE. CÂNCER. QUANTO MAIS CEDO SE SABE, MAIOR A CHANCE DE CURA. Realizar os exames preventivos regularmente é a única forma segura de detectar o câncer de mama. Diagnosticado precocemente, a chance de cura chega a 95%. Se você tem entre 40 e 69 anos, faça a mamografia. Fale com um médico e previna-se.

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1 ESPECIAL ITAIPU

O CORREDOR de biodiversidade em meio às culturas de Santa Maria (PR): a volta do verde e da água

CULTIVANDO A ESPERANÇA

A Ecológico revisita a experiência hídrica de Itaipu Binacional, recém-adotada em Minas e já em estudo para o Sistema Cantareira, em São Paulo Hiram Firmino De Foz do Iguaçu (PR)

redacao@revistaecologico.com.br

M

eia dúzia de anos depois, voltamos a Foz do Iguaçu, na região oeste do Paraná. Fomos conferir os resultados do programa “Cultivando Água Boa”, recém-eleito, com o prêmio “Water for Life 2015”, da ONU Água, a melhor prática de gestão de recursos hídricos do mundo. E que será homenageado hors concours no Prêmio Hugo Werneck de Sustentabilidade & Amor à Natureza 2015. A visita integrou o “I Encontro de Experiências Pioneiras e Inovadoras de Iniciativas Sociais na Gestão da Água – Criando uma Rede Global”, que reuniu autoridades e representantes de 18 países, com 11 outros projetos

também premiados pela ONU ao longo da “Década da Água”, em busca de uma rede mundial de soluções a serem compartilhadas. E, assim, fazer frente à crise hídrica planetária. Ao final do encontro, a esperança se fez presente com o “Cultivando Água Boa”, um conjunto de 20 subprogramas, que já acontece em 29 municípios da Bacia Hidrográfica do Rio Paraná – Parte 3, abrangendo um território de 800 mil hectares e um milhão de habitantes, situados no entorno do reservatório de Itaipu. Ao todo, são 217 microbacias hidrográficas que contam com diversas ações e técnicas para a proteção e recuperação de suas

nascentes e cursos d’água, com iniciativas voltadas a novos meios de produção agrícola e animal, consumo, conservação da biodiversidade e educação ambiental. Além de atenção especial a segmentos socialmente vulneráveis como indígenas, agricultores familiares, pescadores e catadores de materiais. Uma esperança, enfim, que pode e está sendo reaplicada em outros países e estados brasileiros, a exemplo de Minas e São Paulo (leia mais a seguir), como um modelo simples, inclusivo e possível de sustentabilidade hídrica para o mundo, vasto mundo, também poetizado por Carlos Drummond de Andrade. Acompanhe!

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FOTOS: ALEXANDRE MARCHETTI

COMEÇANDO PELO CORREDOR É terça-feira, 15 de setembro, oito dias antes da entrada da primavera. Faz um calorão danado na próspera e fervente Foz do Iguaçu. A van que leva os jornalistas para conhecer um ecológico “corredor de biodiversidade” implantado no município vizinho de Santa Maria, com 22 mil habitantes, passa ao lado do Parque Nacional das Cataratas do Iguaçu, a maravilha da natureza mais molhada do mundo, com um total de 183 mil hectares de florestas resilientes. Do lado brasileiro, são 123 mil hectares de árvores e cursos d’água preservados, a maior reserva de Mata Atlântica OBSERVADO por Nelton Friedrich ao fundo, o cacique Daniel dá as boas vindas à diretora do “Programa Década da Água”, da ONU, Josefina Maestu: parceria mundial do sul do país. A van deixa o asfalto e segue por estradas de terra nada conven- Parque Nacional das Cataratas particular, aos nossos jovens cionais. Todas elas também são até Ilha Grande, no litoral flumi- que, há 20 anos eram crianças e ecologicamente preparadas; mais nense. Religar as matas ciliares nos ajudaram a replantar as áraltas que o chão, para reter a água do reservatório implantadas na vores hoje também já crescidas da chuva e evitar erosão nas suas década de 1970, durante a cons- e cumprindo sua função ecolómargens e terrenos afora. As plan- trução da hidrelétrica de Itaipu, gica. Nosso município já recolhe tações também são diferentes. até o que resta de vida natural no e recicla 90% das embalagens de agrotóxicos. Nossos resíduos sóNão se vê mais um só trator aran- Morro do Diabo, em São Paulo.” Nelton continua lembrando o lidos não passam mais nas mãos do o solo sagrado da natureza ali. Mas, sim, as palhas todas do mi- poder único e agregador da água: de atravessadores, que escraviza- “Estamos falando de biopolí- vam a população. Graças a Itaipu, lho já colhido deixadas no chão, também modelado sobre curvas tica. A gente só consegue isso to- aqui nós os abolimos. Quarenta de nível. É para manter a umida- cando, de maneira convincente, famílias, e não mais a prefeitura, de, aumentar e preservar os nu- as mentes e os corações das pes- através da associação local de catrientes orgânicos naturais. Uma soas envolvidas. Não há outro ca- tadores, é quem separa e recicla prática chamada de cultivo direto. minho. Elas têm de compreender todo o lixo da cidade. Temos água Quem nos recebe efusivamente, que salvar ou fazer rebrotar um potável saindo 100% de nossas em meio às outras lavouras planta- filete de água em suas proprieda- torneiras. Isso, quando até pouco das a colorir a paisagem, é o coor- des faz parte de uma nova cultura tempo, mais de 80% dos nossos denador do “Programa Cultivando de paz no planeta. Paz para água poços rasos estavam contaminae água para a paz.” dos. Enfim, não podemos desistir Água Boa”, Nelton Friedrich: O prefeito de Santa Terezinha, nunca da esperança. Santa Maria - “Estão vendo esse corredor ecológico que conseguimos im- Cláudio Eberhard, já no seu ter- também aposta e cultiva a cultuplantar aqui, fruto do convenci- ceiro mandato, fala do desafio ra da sustentabilidade. Quem mais faz perguntas mento junto aos proprietários da persistente que é mudar a cultura terra, hoje nossos parceiros? Ele local e o comportamento dos fa- técnicas, não à-toa, são os retem 200 metros de largura, em zendeiros para que eles assimilas- presentantes de países africamédia, e se une a outros corredo- sem a importância socioambien- nos. Simples, eles também são res, perfazendo uma linha reta de tal do corredor de biodiversidade. os que mais sorriem, como os vida, fauna e flora com 1,34 mil E, assim, cedessem parte de suas representantes da ONU, satisquilômetros de extensão. Equi- propriedades para o replantio de feitos com as respostas ali pravalente a irmos e voltarmos de árvores e a recuperação conjunta ticadas. De volta à van, fomos conhecer outras experiências Vitória, no Espírito Santo. Isso das suas microbacias: - Só temos de agradecer. Em bem-sucedidas. significa religar a fauna e flora do

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1 ESPECIAL ITAIPU FOTOS: ALEXANDRE MARCHETTI

RECADO DO MUNDO

Rede de boas práticas da ONU impulsiona a nova “Década da Água” A necessidade de renovar e ampliar os esforços para a preservação dos recursos hídricos foi um dos principais pontos relatados pelas autoridades internacionais presentes (foto). Embora tenha havido avanços durante a “Década Internacional para a Ação Água, Fonte de Vida”, ou simplesmente “Década da Água (2005-2015)”, várias das metas estabelecidas não foram alcançadas. “Conseguimos, por exemplo, reduzir pela metade o número de pessoas que não têm acesso à água potável. O contingente atual é de 750 milhões. Mas falhamos na meta de serviços sanitários. Nada menos que 2,5 bilhões de pessoas ainda não contam com eles no planeta”, afirmou o representante do Ministério das Relações Exteriores do Tadjiquistão, Idibek Kalandarov. O Tadjiquistão é integrante do G77, formado pelas 77 nações mais pobres do planeta, e foi o propositor da “Década da Água”. Entre as principais dificuldades encontradas no período estão a pouca coordenação entre os governos e a falta de transferência tecnológica dos países mais desenvolvidos para os em desenvolvimento. Segundo ele, a nova temática da “Década” deverá ser “Água para o desenvolvimento sustentável”, o que contribuirá, também, para colocar ênfase no cumprimento do item 6 dos “Objetivos do Desenvolvimento Sustentável”, definidos na Conferência Rio+20, que é assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todos. Nesse contexto, disse, a criação de uma rede das melhores práticas globais de gestão de água será um instrumento de “importância fundamental”.

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A opinião é compartilhada por Leo Saldanha, representante do Environment Support Group, de Bangalore, Índia. Ele representa uma das 11 iniciativas premiadas pela ONU e que vem viabilizando a proteção de lagos no sul do país. “As soluções que receberam o prêmio 'Water for Life' podem parecer simples, mas carregam profunda sabedoria ecológica.” Para Blanca Jiménez Cisneros, vice-presidente da ONU Água, mecanismo de coordenação do tema dentro das 30 organizações que compõem o sistema da Organização das Nações Unidas, a rede que está sendo criada terá como princípio facilitar a participação das pessoas de várias formas, como indivíduos, instituições e ONGs. “É importante que as pessoas tenham conhecimento sobre a problemática global da água, mas é somente se elas assumirem responsabilidades e atuarem localmente é que esses problemas serão tratados. Se tomarmos, por exemplo, a questão das mudanças climáticas, aqueles que estão provocando os desequilíbrios não são os mesmos que estão sofrendo as consequências. Então, é preciso identificar e envolver os responsáveis”, completou Blanca.

Blanca Jiménez, da ONU: ação local

Perguntada sobre como, então, é possível envolver as pessoas, que muitas vezes esperam uma solução por parte dos governos ou agências internacionais, ela respondeu que os comunicadores e meios de comunicação têm um papel fundamental nesse processo. “As pessoas que criam esses bons projetos de gestão da água têm um enfoque técnico. Os políticos, muitas vezes, não têm credibilidade. Então, muito do trabalho da rede será focado na comunicação das boas práticas.”


CULTIVANDO SUSTENTABILIDADE O calor só aumenta. Estamos chegando à propriedade de produção orgânica de Luis Antonio Arruda, o seu Arruda, como é mais conhecido, onde vamos almoçar comida natural. Ele e outros 175 pequenos assentados rurais são assistidos pela Associação dos Produtores Rurais de São Miguel do Iguaçu (Aprosmi). Na contramão do uso dos agrotóxicos em larga e criminosa escala, 35% de todos os alimentos que produzem, do mel à merenda que é servida nas 22 escolas da região, são totalmente orgânicos. Não fazem mal à saúde humana e ainda são subsidiados, via prefeituras, pelo Ministério do Desenvolvimento Social, através da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Ou seja, os pequenos agricultores familiares são remunerados e estimulados a prosseguir na luta desigual contra os grandes ruralistas, mecanizados e munidos de biocidas químicos. O que também faz mal comer está denunciado pelas nutricionistas e professoras locais numa mesa ao lado. São vários produtos primários e manufaturados que, mesmo condenados pelos médicos, a maioria da população brasileira, incluindo as escolas e seus alunos, ainda consome. Entre eles, doces, salgados, refrigerantes e outras guloseimas. Antes de entrar no sítio do seu Arruda, fomos recebidos por indígenas de uma das cinco comunidades da etnia guarani com alta vulnerabilidade social no oeste do Paraná. Elas também são apoiadas pelo “Cultivando Água Boa”. Cada visitante recebe um colar de sementes, ouve e é envolvido pelo seu cantar e dançar de boas-vindas. Segundo Nelton, quando o programa começou na região, as poucas comunidades avá-guarani ali existentes estavam ameaçadas de extinção, pelo alto índice de mortalidade infantil. Somente na co-

A “COP-21” DO SEU ARRUDA, mostrando o antes e o depois de sua propriedade: “Eu fiz o verde e as águas voltarem”

munidade Ocoy havia 35 crianças subnutridas, uma delas no CTI por fome crônica: “O maior indicador que temos é que, antes ameaçadas de extermínio, essas famílias assistidas hoje têm seis filhos em média. E, claro, nenhum caso mais de subnutrição. Pelo contrário, até frequentar casas de reza e escolas bilíngues elas têm direito, além de outros benefícios médico-sociais e de inclusão cultural. DESFILE VERDE O desfile de bons resultados tem início. Graças a um arranjo produtivo local, os agricultores, adeptos da agricultura familiar, também foram estimulados a se apostarem na fitoterapia. Por isso já plantam, colhem, consomem e vendem uma média de 40 tipos diferentes de plantas medicinais no mercado de São Paulo. Outros 87 tipos são produzidos, como matrizes nem tanto comerciais, no horto de Itaipu. São remédios advindos diretamente da natureza, indicados para os casos de hipertensão,

diabetes, tabagismo, cárie, depressão e outras patologias. Para quem não sabe, o segundo agrupamento humano que mais comete suicídio hoje no Brasil, depois dos índios, é formado principalmente por jovens que trabalham no campo. Contaminados pelos agrotóxicos que aplicam, eles têm o seu sistema nervoso central afetado de maneira irreversível, o que depois aparece na forma de depressão continuada, levando-os ao autoextermínio. As professoras, nutricionistas e técnicos agrícolas que assistem as comunidades locais exaltam com fé: “Essa é a diferença. Por meio das plantas medicinais e de outros saberes culturais, aqui nós tratamos a pessoa e não a doença. A fitoterapia é preventiva, mais barata e acessível. O capim-limão brasiliense é tido como campeão nessa disputa inglória com os remédios alopáticos da indústria farmacêutica convencional. E, asseguram os profissionais, previne até 78% de diferentes tipos de câncer”.

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1 ESPECIAL ITAIPU Como Minas, governo paulista tambem deverá adotar o programa

FOTO: MARCELO CAMARGO / AGÊNCIA BRASIL

S.O.S. CANTAREIRA

Durante o evento, o diretor da Agência Nacional de Águas (ANA), Vicente Andreu, confirmou que o programa “Cultivando Água Boa” (CAB) também deverá ser adotado pelo governo do estado de São Paulo para proteger os reservatórios do Sistema Cantareira. A proposta foi feita após uma conversa com o secretário de Recursos Hídricos de São Paulo e o presidente do Conselho Mundial VICENTE ANDREU: exemplo da Água, Benedito Braga, como uma para as outras hidrelétricas estratégia importante para combater a escassez de água que acomete os paulistanos. “O Benedito já conhece o CAB e afirmou que irá acertar uma cooperação com Itaipu para levar a iniciativa para lá. Evidentemente, ainda há um caminho a ser percorrido para se firmar essa cooperação e para se criar uma articulação com os programas e recursos que já existem”, afirmou Andreu. “O CAB é uma experiência única em termos de resultados, que são muito consistentes. É claro que, para ser aplicado na Cantareira, que tem as margens bastante devastadas, tem que se ter em vista um horizonte de longo prazo. Não é porque hoje se plantam algumas mudas para recuperar as matas ciliares que se deve esperar um aumento do nível dos reservatórios amanhã. Mas é um trabalho complexo que certamente passará pela proteção das nascentes”, disse Andreu. Para ele, um dos pontos fortes do programa está na gestão compartilhada e no envolvimento das comunidades na condução das ações. “Não adianta os órgãos reguladores dizerem o que a sociedade tem que fazer. É a sociedade, como no CAB, que tem que dizer o que precisa ser feito”, completou. Na opinião do diretor da ANA, as demais hidrelétricas no país deveriam seguir o exemplo de Itaipu, que reflorestou todo o redor do seu reservatório, trazendo a biodiversidade de volta: “Infelizmente, em sua maioria, elas ainda mantêm suas margens degradadas, sem matas ciliares nem replantio de árvores”.

O RESERVATÓRIO de Itaipu com as matas ciliares de volta e preservadas: é possível!

MILAGRE DOS PEIXES O próximo testemunho é dado pelo pescador Estevão Martins, de 48 anos, morador de Foz: “Hoje eu não pesco mais. Eu produzo peixes nas águas públicas de Itaipu, em vez de retirá-los da natureza. Isso me honra muito. Ser um produtor responsável, sustentável. Saber que vou deixar para os meus filhos algo melhor que tive na vida, em termos de opções de trabalho, consciência ecológica e qualidade de vida”. Estevão também pesca uma esperança ampliada. Ele tem dois filhos, um formado em desenvolvimento rural. E outra em comunicação e marketing. O destino tradicional deles seria deixar a roça, o campo improdutivo e pouco assistido, dar adeus à família e tentar a sorte na cidade. Mas eles não vão mais seguir este roteiro da história agrária brasileira. Graças ao sucesso de criação e vendas de peixes, tilápias e pacus, conseguido pelo pai, eles resolveram aplicar seus conhecimentos no próprio negócio da família, ajudando-o se tornar uma empresa de fato no chamado mercado mais saudável de carne branca. RECADO FINAL A última mensagem é dada, de forma emocionante, pelo seu Arruda. Ele fez curso de agricultura orgânica, conhece e também não aplica mais agrotóxicos em sua pequena propriedade de 4,7 hectares. Quando a adquiriu, em 2003, quase não havia nada, nem de natureza nem de plantação. Graças à assistência técnica conseguida via Itaipu, a sua vida mudou. Hoje ele ganha quase R$ 20 mil por mês, graças à multiplicidade do que faz: planta e vende hortaliças e frutas. Produz, congela e comercializa sucos de 40 tipos diferentes de

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OS PESQUEIROS de tilápias e pacus: emprego e renda nas águas públicas de Itaipu

consegue esconder, é quanto a alguns vizinhos seus, que ainda não aderiram ao programa e continuam isolados numa prática antiga, aplicando agrotóxicos em suas propriedades: - “Não acho isso certo não. Quem tinha de fazer uma barreira de árvores para evitar a chegada do veneno pelos ventos aqui nas nossas plantações livres de produtos químicos, tinha de ser eles, e não nós.” Politizado e crítico, ele agora nos convida para conhecer o que ele ama e gosta de mostrar: a sua agricultura ecológica, onde, em se plantando junto ou separado,

toda e qualquer espécie de legumes, frutas ou flores prospera a olhos vistos, sem necessidade de veneno. Andar no seu sítio é o mesmo que andar num jardim agrícola improvisado de tudo. E de propósito. Ele vai mostrando e explicando, pelo trajeto: é cravo-de-defunto entremeando os pés de goiabeira, para evitar o surgimento de uma praga que aprodece suas raízes. É feijão guandu plantado nos pés de uva, em parreirais já secas, intencionalmente para as futuras ramagens subirem nelas. São bananeiras plantadas entremeadamente para dar sombra FOTOS: ALEXANDRE MARCHETTI

frutas preservando 100% das colheitas. Ainda fornece refeições típicas e saudáveis da região a quem visita o programa, como representante voluntário do turismo rural receptivo. - “Já fui chamado de louco pelos meus vizinhos, por ter aderido ao programa de Itaipu. Eles diziam que não ia dar certo eu mexer com plantação de produtos orgânicos, sem usar veneno e seguir técnicas alternativas. Até hoje não entendem porque virei um próspero sitiante, não tenho falta d’água nem preciso de mais espaço para plantar o que consigo. Tenho orgulho e amor no que faço. E minha propriedade fica cheia de visitantes de todas as partes do Brasil e do mundo que vêm aqui para aprender com o que fazemos. Hoje eu sou como o ‘Cultivando Água Boa’, um homem-andorinha atuando no coletivo.” - Como assim? - pergunto. - “É o que sempre o pessoal de Itaipu nos dizia no início do programa. Que uma só andorinha não faz verão. Mas um conjunto associado delas, sim. Eu mesmo tive muita dificuldade, no início, para colocar na minha mente que é possível fazer uma agricultura diferente, ecológica, que não agrida o meio ambiente, que respeitando e protegendo a natureza, o troco de Deus é certo.” A revolta de seu Arruda, ele não

O AGRICULTOR politizado mostrando suas técnicas alternativas: “Hoje eu sou um homem-andorinha atuando no coletivo”

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1 ESPECIAL ITAIPU

FOTO: ECOLÓGICO

ao cultivo de palmito. É todo tipo de folhas secas não recolhidas. Mas deixadas igualmente no chão para manter a umidade e se transformar em adubo orgânico natural. São pés de mamonas, cujos talos e folhas são usados para combater as formigas. E por aí afora, embelezado por um roseiral também misturado e lindíssimo. A descontinuidade feia e nada estética dos canteiros tem o propósito de confundir a visualização dos insetos. - “Tão vendo esse pé de ca-

qui-chocolate aqui? Vocês não vão acreditar. Uma árvore como esta me dá uma receita de R$ 300 ao ano. Posso reclamar de quê se a natureza é nosso maior doutor e parceiro?” Nem tudo, porém, é alegria na vida desse homem-propaganda de Itaipu. No final da visita ao seu diversificado e frutificado pomar, seu Arrudas arranca uma ramagem de Santa Bárbara, uma espécie vegetal que tanto fornece madeira e lenha na roça, quanto produz uma substância repelente natural, que espanta a praga chamada “vaquinha do feijoeiro”. Ele a mostra, com pesar, pra gente. As folhas já estão retorcidas nas pontas. É como se algo estranho as fizesse encolher em si mesmas. O agricultor ainda lembra, com mais tristeza nos olhos, do “24D”. Trata-se de um esfoliante químico semelhante ao “agente laranja” que os Estados Unidos lançaram nas florestas do Vietnã, para fazer murchar as folhas das árvores e os vietcongues serem vistos e mortos depois, com bombas de napalm. Seu Arruda abraça o tronco de um cedro gigante que produz muita sombra e alivia o calor escaldante. Ele faz as contas de si mesmo, da sua idade e de seu destino no planeta: - “Eu já estou com 45 anos, o que significa que terei mais 15 anos de saúde pela frente para tocar essa minha propriedade de maneira sustentável. Até lá, como tenho constatado ano a ano, o clima só vai piorar, haja vista que as boas chuvas que continuam ocorrendo ainda muito regular aqui, já não encharcam o solo como antigamente. É muito sol secando a terra, aumentando e acelerando a infiltração da água.”

A CORTINA de árvores que não protege o sítio do seu Arruda, à esquerda, do veneno dos vizinhos

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- Qual é o seu sonho, então? - “É poder plantar mais árvores para dar mais sombra na minha propriedade e melhorar a umidade natural. E, assim, com mais conforto e qualidade de vida, meus descendentes poderem assistir e enfrentar melhor as mudanças climáticas, esse tal de aquecimento global.” A visita termina. Estamos deixando a propriedade de seu Arruda. Ele tem razão. A cortina de árvores, principalmente pinus, que ele implantou na divisa de seus terrenos com os vizinhos que aplicam agrotóxicos, pouco impede a chegada destrutiva deles pelo ar. - “Esse veneno não é meu! Tá certo isso? Por que a bancada ruralista não olha isso, estuda uma solução qualquer pra gente, lá em Brasília?” A van retoma a estrada até um mirante panorâmico no município de Itaipulândia, de onde se avista o grande e maior reservatório do mundo. Ali, debaixo da estátua gigantesca de Nossa Senhora Aparecida, é possível vislumbrar a quantidade de terrenos cultivados de maneira ecologicamente correta, margeados por faixas de florestas nativas ou plantadas que os protege e faz a água brotar novamente. De volta a Foz, a memória de seu Arrudas, reclamando do veneno no campo, não me sai da cabeça. Nem a canção “The Monsanto Years”, de Neil Young, que a Ecológico reproduz na página 94. Os versos que mais doem são: “Seu próprio filho doente cresce perto das culturas envenenado enquanto eles trabalham./ Não me importa agora quando a Bíblia diz que há muito tempo./ Dai-nos o nosso pão de cada dia e não nos deixe com a Monsanto./ As sementes da vida não são o que antes eram./ A Mãe Natureza e Deus não as possui mais”. 


FOTO: REPRODUÇÃO / NOSSAROCATUR.BR

1 AGROTURISMO

NOSSA ROÇA

Primeiro negócio social agroturístico de Minas resgata a essência da simplicidade por meio de experiências de lazer e diversão no campo

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á coisa melhor do que um fim de semana na roça, sentindo o cheiro de mato, nadando em rios limpos ou saboreando uma autêntica refeição feita no fogão a lenha? Não! E, se você mora na cidade grande e sente falta de momentos como esses, agora tem mais um motivo para buscar lazer e diversão no campo. Trata-se do projeto “Nossa Roça”, primeiro negócio social de Minas Gerais no segmento do agroturismo e que faz parte do “Programa Dignidade”, da Fundação Dom Cabral. Funciona assim: por meio do site www.nossaroca.tur.br, o participante escolhe quais atividades quer fazer com o perfil descrito (ideal para descanso,

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excursões, pessoas com deficiência etc.). Na sequência, o site redireciona para o local e as famílias rurais que poderão recebê-lo. Os anfitriões, muito hospitaleiros, recebem os visitantes com simpatia e estão sempre disponíveis, explicando a rotina com suas criações, plantações e atividades. A comida é simples e deliciosa, à base de produtos locais, livres de agrotóxicos. Para aqueles que desejam apenas descansar, não faltam sombras de árvores, paisagens belíssimas e um riacho para molhar os pés. E quem quiser participar de atividades cotidianas do campo não ficará de fora: tem muito biscoito para enrolar, doce para fazer, animal para alimentar, verdura para colher e semente para plantar!

As famílias que participam do “Nossa Roça” estão localizadas em municípios próximos a Belo Horizonte (MG). Fazem parte dessa etapa inicial do projeto os municípios de Lagoa Dourada, Barbacena, Itabira, Barão de Cocais, Itaverava, Piranga, Caranaíba e Betim. A atividade agroturística possui um inestimável valor social, pois fortalece as comunidades na luta contra as drogas, trabalho infantil, exploração sexual de crianças e adolescentes e reforça a agricultura familiar e o cuidado com o meio ambiente, sendo ainda uma das alternativas ao êxodo rural.  SAIBA MAIS

www.nossaroca.tur.br www.fdc.org.br


LEONARDO BOFF (*) www.leonardboff.com

ARTE: SANAKAN

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ALMA PLANETÁRIA

PARA CHORAR E PENSAR

O

pequenino sírio de três a quatro anos jaz afogado na praia, pálido e ainda com suas roupinhas de criança. De bruços e com o rosto voltado ao lado, como quem quisesse ainda respirar. As ondas tiveram piedade dele e o levaram à praia. Os peixes, sempre famintos, o pouparam porque também eles se compadeceram de sua inocência. Ayslan Kurdi é seu nome. Sua mãe e seu irmãozinho também morreram. O pai não pôde segurá-los e lhes escaparam das mãos, tragados pelas águas. Querido Ayslan: você fugia dos horrores da guerra na Síria, onde tropas do presidente Assad, apoiado pelos ricos Emirados Árabes, lutam contra soldados do cruel Estado Islâmico, que degola quem não se converte à sua religião, tristemente apoiado pelas forças ocidentais da Europa e dos Estados Unidos. Imagino que você tremia ao som dos aviões su-

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persônicos que lançavam bombas assassinas. Não dormia com medo de que sua casa voasse pelos ares em chamas. Quantas vezes você não deve ter escutado de seus pais e vizinhos quão temíveis são os aviões não pilotados (drones). Eles caçam as pessoas pelas colinas desérticas e as matam. Festas de casamento, celebradas com alegria, apesar de todo o horror, também são bombardeadas, pois se supõe que no meio dos convidados deverá haver algum terrorista. Talvez você nem imagina que quem pratica essa barbaridade e está por trás disso tudo é um soldado jovem, vivendo no Texas num quartel militar. Ele está sentado tranquilo em sua sala diante da imensa tela da televisão. Através de um satélite que mostra os campos de batalha da sua terra, a Síria, ou do Iraque. Conforme a sua suspeita, com um pequeno


“Você não pôde chegar a um lugar de paz. Mas agora, apesar de toda a tristeza que sentimos, sabemos que você, tão inocente, chegou a um paraíso.” toque num botão dispara uma arma presa no drone. Nada sente, nada escuta, nem chega a ter pena. Lá no outro lado, a milhares de quilômetros, são mortas subitamente 30 a 40 pessoas, incluindo crianças como você, pais e mães como os seus e pessoas que nada têm a ver com a guerra. São friamente assassinadas. Lá do outro lado, ele sorri por ter acertado o alvo. Por causa do terror que vem pelo céu e pela terra, pelo pavor de serem mortos ou degolados, teus pais resolveram fugir. Levaram toda a família. Nem pensaram em arranjar trabalho. Apenas não queriam morrer ou serem mortos. Sonhavam em viver num país onde não precisavam ter medo, onde poderiam dormir sem pesadelos. E você, querido Ayslan, poderia brincar alegremente na rua com coleguinhas cuja língua você não entende. Mas nem precisa, porque vocês, crianças, têm uma linguagem que todos, os meninos e meninas, entendem. Você não pôde chegar a um lugar de paz. Mas agora, apesar de toda a tristeza que sentimos, sabemos que você, tão inocente, chegou a um paraíso onde pode enfim brincar, pular e correr por todos os lados na companhia de um Deus que um dia foi também menino, de Untitled-1 nome Jesus, e que, para não1 deixá-lo só, voltou a ser de novo menino. E vai jogar futebol contigo. Você vai poder pegar no colo um gatinho e correr atrás de um cachorrinho; vocês vão se entender tão bem como se fossem amigos desde sempre; juntos vão fazer desenhos coloridos, vão rir dos bonecos que fizerem e vão contar histórias bonitas, um ao outro. E se sentirão muito felizes. E veja que surpresa: lá estará também seu irmãozinho que morreu. E sua mãe vai poder abraçá-lo e beijá-lo como fazia tantas vezes. Você não morreu, meu querido Ayslan. Foi viver e brincar num outro lugar, muito melhor. O mundo não era digno de sua inocência. E agora deixe que eu pense com meus botões. Que

mundo é esse que assusta e mata as crianças? Por que a maioria dos países não quer receber os refugiados do terror e da guerra? Não são eles, nossos irmãos e irmãs, habitando a mesma casa comum, a Terra? Esses refugiados não cobram nada. Apenas querem viver. Poder ter um pouco de paz e não ver os filhos chorando de medo e saltando da cama pelos estrondos das bombas. Gente que quer ser recebida como gente, sem ameaçar ninguém. Apenas quer viver o seu jeito de venerar Deus e de se vestir como sempre se vestiu. Não foram suficientes dois mil anos de cristianismo para fazer os europeus minimamente humanos, solidários e hospitaleiros? Ayslan, o pequeno sírio morto na praia é uma metáfora do que é a Europa de hoje: prostrada, sem vida, incapaz de chorar e de acolher vidas ameaçadas. Não ouviram eles tantas vezes que quem acolhe o forasteiro e o perseguido está anonimamente hospedando Deus? Querido Ayslan, que a sua imagem estirada na praia nos suscite o pouco de humanidade que sempre resta em nós, uma solidariedade remanescente, uma lágrima de compaixão que não conseguimos reter em nossos olhos cansados de ver tanto 14:40:38 sofrimento inútil,06/03/2014 especialmente, de crianças como você. Ajude-nos, por favor, senão a chama divina que tremula dentro de nós pode se apagar. E se ela se apagar, então afundaremos todos, pois sem amor e compaixão nada mais terá sentido neste mundo.

Sustentabilidade é a nossa pauta! Leia e assine!

De Leonardo Boff, um vovô de um país distante que já acolheu muitos de seu país, a Síria, e que se compadeceu com sua imagem na praia e lhe fizeram escapar doloridas lágrimas de compaixão. (*) Professor e teólogo.

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FOTOS: ARQUIVO VALE

1 FAUNA O FILHOTE tem plumagem branca, que só deve ficar acinzentada após os quatro anos de vida

O NÚMERO UM

Parque Zoobotânico Vale comemora nascimento de gavião-real em cativeiro

D

epois de um longo período de convivência, o casal de gaviões-reais (Harpia Harpyja) que vive no Parque Zoobotânico Vale (PZV), em Parauapebas (PA), deu cria ao seu primeiro filhote. Um presente da natureza, ele nasceu no ano em que o PZV comemora 30 anos de funcionamento. O nascimento é motivo de alegria não só para os pais, mas também para toda a equipe técnica do parque, que se dedicou aos processos de agrupamento, enriquecimento e adequação de um recinto especial para as aves. Segundo o veterinário André Mourão, mesmo com o ambiente adequado, o nascimento de

filhotes é difícil. “A reprodução de harpias em zoológicos é extremamente rara, principalmente em se tratando de animais que ficam em áreas de exposição”, explica. Outro ponto desafiador e positivo sobre esse processo de reprodução foi o fato de os pais terem chocado o ovo. “Existem criatórios especializados que costumam tirar o ovo do cuidado dos pais e completam a encubação artificialmente para aumentar a chance de sucesso da eclosão e de sobrevivência do filhote. Nós optamos por deixá-los fazer a incubação, vendo o ovo eclodir para que tenham a oportunidade de criar laços parentais, assim como acontece na natureza”, relata Mourão.

A harpia é a maior águia encontrada no Brasil, a mais potente do mundo, considerada uma espécie rara e que está na lista de animais ameaçados de extinção no país. Em sua fase adulta, pode ultrapassar dois metros de envergadura (maior distância entre as pontas das asas). O recinto construído no Parque Zoobotânico Vale para abrigar o casal considerou essas proporções. “Investimos em uma estrutura moderna que considera o tamanho e os hábitos da espécie. A área tem 300 m² e 10 metros de altura”, explica o biólogo Leandro Maioli. Além de grande, o recinto possui elementos que reproduzem o clima da Floresta Amazônica presente em todo o

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entorno do parque. “Colocamos lá troncos robustos e vegetação rasteira natural e construímos uma fonte que garante a circulação de água que necessitam para consumo e banho”, detalha Maioli. OBSERVANDO A HARPIA A família hoje passa mais tempo no ninho criado num dos lugares mais altos do recinto. E o visitante que se interessar pode passar um tempinho por perto observando a rotina deles. Mesmo estando a sete metros de altura, com paciência, é possível ver o filhotinho no ninho com os pais. Ele tem plumagem branca, que só deve ficar na mesma cor da dos pais quando chegar aos quatro ou cinco anos de idade. Seus primeiros voos devem acontecer entre os 141 e 148 dias de vida. Uma cena que, com certeza, muita gente vai querer presenciar. CONSERVAÇÃO DE ESPÉCIES O parque desenvolve um programa voltado à reprodução, em cativeiro, de espécies do bioma amazônico que estão ameaçadas de extinção. Em 2013, a equipe comemorou o nascimento dos primeiros filhotes de ararajuba e em fevereiro deste ano chegaram mais dois filhotes. Já em 2014, foi a vez da onça-pintada dar cria. Pandora e Thor, um casal de onça-pintada e preta nasceram no PZV. A dupla di-

OS PAIS e o filhote vivem em um recinto de 300 m2 e dez metros de altura que reproduz o clima da Amazônia

vide hoje o recinto com os pais e seu crescimento é acompanhado por quem circula por lá.  SAIBA MAIS

www.vale.com Parque Zoobotânico Vale Est. Raimundo Mascarenhas, S/N, Km 26, Núcleo Urbano de Carajás (PA). Funcionamento: aberto ao público todos os dias, das 10h às 16h30.


1 ESPELEOLOGIA

FOTO: MAÍRA FIGUEIREDO GOULART

GRUTA JANELÃO Parque Nacional Cavernas do Peruaçu

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cavernas O mundo das

As cavidades subterrâneas têm papel fundamental para o meio ambiente e o turismo sustentável Cristiane Mendonça

redacao@revistaecologico.com.br

U

RELÍQUIAS HISTÓRICAS Em 1996, por exemplo, foram encontrados na cidade de Pains

(MG), terceiro maior município brasileiro em número de cavernas, restos de uma ossada de mastodonte, uma espécie antepassada dos elefantes que teria vivido há mais de 10 mil anos. Na mesma região, também foi encontrada uma urna indígena com a ossada de um ser humano com um pedaço de flecha entranhado na costela. Relíquias que sobreviveram graças à química do carbonato de cálcio - componente do calcário comum nessa região - que contribui na conservação dos fósseis. Além de sua importância histórica e ambiental, as grutas

também são espaços com alto potencial turístico. E não faltam bons exemplos no Brasil, como a Caverna do Diabo, no município de Eldorado Paulista (SP). Considerada uma das cavernas mais bonitas do país, nela os turistas têm a possibilidade de descer e subir as escadarias para apreciar também a beleza milenar de estalactites, estalagmites e cortinas de pedras. Outro bom exemplo é a Gruta do Maquiné, em Cordisburgo (MG), descoberta no século 19 e que tem uma infraestrutura completa para os amantes da geologia.

FOTO: ATIVO AMBIENTAL

m universo que vai muito além dos olhos e guarda, ao mesmo tempo, passado, presente e uma biodiversidade raríssima. Estamos falando das cavernas, ou grutas, ambientes ainda pouco conhecidos pelo grande público e que protegem registros da evolução das espécies e de como a vida cria sempre os próprios caminhos. No Brasil, existem atualmente 6.286 cavidades subterrâneas registradas, segundo o Cadastro Nacional de Cavernas (CNC). Minas Gerais é o estado com maior número de grutas do país: 1.940 no total, seguido por Pará (744) e São Paulo (741). Essa quantidade de maravilhas ecológicas escondidas em rochas, montanhas e no solo de nosso país não consegue, entretanto, traduzir a beleza e o mistério que esses locais proporcionam a quem os visitam. Particularmente com pouca ou nenhuma luminosidade, elas escondem não apenas espécies animais que já conhecemos, como os morcegos, mas também outras, como os troglóbios, animais adaptados ao ambiente cavernícola que podem ser muito pequenos.

A COLETA e o estudo de invertebrados é uma das ações contempladas nos estudos de relevância espeleológica

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FOTO: ATIVO AMBIENTAL

1 ESPELEOLOGIA SAIBA MAIS

SEGUNDO Leandro Maciel e Flávia Evangelista, da Ativo Ambiental, o plano de manejo das cavidades subterrâneas é essencial para definir as diretrizes de visitação, segurança e preservação ambiental

LEGISLAÇÃO E PRESERVAÇÃO Outro fator que determina a importância da preservação dessas formações rochosas é que, além dos atrativos naturais, as cavernas fazem parte de áreas de exploração mineral, representando um ativo importante para a economia. Por isso, a atual legislação ambiental as protege de maneira rigorosa. Para se ter uma ideia, se houver um impacto ambiental em uma gruta, é preciso compensá-la com duas outras na mesma unidade morfológica. Caso não existam na mesma região onde a compensação será feita, é necessário compensar em uma unidade de conservação estadual ou nacional. Essas conquistas só foram possíveis por meio de um avanço da legislação anterior a 2008, que determinava que nenhuma caverna poderia ter impacto irreversível. Com a nova legislação (Decreto nº 6.640/08 e Instrução Normativa MMA 02/09), o mercado da espeleologia – ciência que busca conhecer e estudar a formação geológica das cavernas, o meio ambiente onde estão inseridas, as formas de vida que as habitam, características e formas de preservação – ganhou ainda mais força.

CONSULTORIA ESPECIALIZADA A legislação que garante a preservação das cavernas contribuiu para o surgimento de empresas que oferecem serviços técnicos e de consultoria profissional para empreendimentos que têm projetos de exploração próximos a áreas cársticas. A Ativo Ambiental é uma delas. Fundada há cinco anos pelos geógrafos Leandro Maciel e Flávia Evangelista, a empresa é formada por uma equipe de biólogos, ecólogos e geógrafos - todos espeleólogos com experiência na área de licenciamento – que, juntos, realizam pesquisas in loco para a elaboração de diagnósticos e planos de manejo. Esses documentos orientam, a priori, se existe ou não a possibilidade de explorar essas áreas de forma sustentável e atendendo aos parâmetros da legislação vigente. A Ativo Ambiental elabora, também, inventário de cavidades subterrâneas, estudos de relevância espeleológica, arqueologia, diagnósticos e monitoramentos espeleológicos e ambientais, além de soluções sustentáveis que se adequam tanto ao negócio que necessita da exploração quanto para a comunidade do entorno. “Hoje, a exploração de cavernas é o que

A França é considerada o berço da espeleologia no mundo. Suas cavernas são íngremes e formam imensos abismos, ao contrário das grutas brasileiras, que são mais antigas, e por isso mais rasas. Para se ter uma ideia, a caverna Toca da Boa Vista, na Bahia, é a maior da América do Sul, com 120 quilômetros de extensão na horizontal. A cavidade possui salões que atingem até 29ºC em seu interior. Na França, as temperaturas das cavidades são muito mais baixas, em torno de cinco graus.

realmente paralisa o empreendimento de qualquer empresa. Por isso a importância dos estudos espeleológicos, que contribuem para conhecermos mais sobre o mundo subterrâneo”, pondera Leandro. Todo esse trabalho é necessário para evitar, também, que regiões cársticas sejam exploradas clandestinamente e sem o mínimo de segurança. “Pessoas acabam entrando nas cavidades sem os equipamentos e procedimentos de segurança adequados, ignorando que ali há riscos de animais peçonhentos ou formação de gases tóxicos. Sem contar, ainda, com a fragilidade do ambiente cavernícola, que pode sofrer impactos com a visitação desordenada. O plano de manejo orienta, por exemplo, sobre quantas pessoas devem entrar e quanto tempo podem permanecer lá. E, principalmente, quais regras devem ser seguidas para preservar ambientalmente o local e garantir a segurança dos visitantes”, ressalta Flávia. 

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ESPECIAL MINERAÇÃO FOTOS: EVANDRO FIUZA E DÉBORA FREITAS

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MAIS de 60 mil visitantes e delegações de 25 países participaram da Exposibram 2015

INOVAR PARA

TRANSFORMAR

Décima sexta edição da Exposibram e do Congresso Brasileiro de Mineração aposta na inovação do setor para retomar o crescimento J. Sabiá e Cristiane Mendonça redacao@revistaecologico.com.br

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contribuindo para o desenvolvimento do país. Mas, principalmente em tempos de crise, FOTO: DIVULGAÇÃO IBRAM

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esponsável por 5% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil em 2014, a indústria extrativa mineral emprega mais de 214 mil pessoas no país e tem importância estratégica para a economia. Ano passado, por exemplo, o setor movimentou quase US$ 40 bilhões e a produção de minério de ferro nacional bateu recorde: foram quase 400 milhões de toneladas. Para se manter em crescimento, investir parece ser a palavra chave para que o setor continue

como a que vivemos agora, é preciso mais. E a solução estratégica que o setor encontrou é a inovação. Ela foi o ponto que permeou os debates da décima sexta edição da Exposibram e do Congresso Brasileiro de Mineração, realizada este mês na capital mineira. Foram mais de 60 mil visitantes, 400 expositores e delegações de 25 países - incluindo Alemanha, Índia e França. “É com inovação que faremos frente à atual crise. E é com muito otimismo que temos de nos

FERNANDO COURA: “É com inovação que faremos frente à crise”

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O EVENTO reuniu representantes das maiores mineradoras do planeta

SAIBA MAIS A MINERAÇÃO EM NÚMEROS Empresas mineradoras no Brasil: 8.870. Lavras em atividade: 1.820. Produção: agregados de construção civil, 673 milhões de toneladas; minério de ferro, 400 milhões; bauxita, 32 milhões; alumínio primário, 962 mil toneladas; fosfato, 6,8 milhões; potássio concentrado, 460 mil; zinco concentrado, 250 mil; cobre, 219 mil; liga de nióbio, 80 mil; níquel contido, 80 mil; ouro, 80 toneladas. Empregos diretos: mais de 214 mil. Previsão de investimentos (2014-2018): US$ 53,6 bilhões.

planejar para gerar oportunidades para a indústria da mineração. Cada segmento relacionado ao setor mineral tem que encarar esse desafio de superação de frente, com a mente aberta para vislumbrar, via propostas inovadoras, os caminhos que nos levarão novamente a um ciclo virtuoso nos negócios”, afirmou José Fernando Coura, presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram). Logo no primeiro dia da Exposibram, o público tomou conhecimento de algumas dessas propostas. Foi, por exemplo, o que a empresa canadense Solex Thermal Science mostrou ao apresentar uma solução para aquecimento e resfriamento de minérios que utiliza água como condutor térmico. O diferencial dessa tecnologia é que o recurso, quando atinge temperaturas elevadas, é reaproveitado em processos de aquecimento de material mineral no forno siderúrgico.

A empresa alemã Flottweg demonstrou como é possível fazer a separação mecânica de resíduos sólidos e líquidos por meio de uma nova tecnologia que reduz o volume de rejeitos gerados com a operação e, consequentemente, o risco da atividade. “As empresas do setor são inovadoras não só em tecnologia voltada aos processos produtivos”, destacou Coura, “mas também em investimentos na promoção social, na educação, na cultura, nas atividades desportivas, nas economias regionais e na geração de divisas e progresso para todo o país. Inovação e sustentabilidade são temas transversais, mantras na moderna gestão dos empreendimentos de mineração, no Brasil e nas demais nações competitivas neste setor”, disse Coura. Ele destacou que no Brasil a tecnologia tem proporcionado, inclusive, avanços no reaproveitamento de minérios que até en-

Estimativa de movimentação em 2015: US$ 38 bilhões.

tão eram considerados inapropriados para a transformação industrial. “Novas técnicas para reduzir o uso de água, bem como a intensificação de técnicas de reúso dos recursos hídricos são respostas de nosso setor em prol da sustentabilidade. E também merece destaque o compromisso sólido de redução contínua da emissão de gases de efeito estufa pelas indústrias de mineração.” Como apontou o presidente do Ibram, embora a crise internacional venha arrefecendo momentaneamente as expectativas das mineradoras, as perspectivas para o segmento são positivas. E, para entender melhor como esse caminho de retomada do crescimento pode ser construído, há outros temas tratados na Exposibram que também merecem ser destacados. É o que você, caro leitor, confere a seguir.

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ESPECIAL MINERAÇÃO

Tendências e desafios

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talk show mediado pelo jornalista William Waack, da TV Globo, com a participação do governador de Minas, Fernando Pimentel, do presidente da Vale, Murilo Ferreira, e do presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Olavo Machado Jr., foi um dos mais concorridos. Waack não poupou os convidados na hora de fazer perguntas e questionou sobre a crise política e econômica e como o setor está se adaptando a esse cenário. Pimentel foi o primeiro. Sobre a reclamação das empresas em relação aos processos regulatórios que travam o andamento dos projetos, ele admitiu a morosidade dos licenciamentos ambientais em Minas. “Quando assumi o governo em janeiro, 4.600 processos estavam paralisados na Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad). Nossa primeira ação foi chamar os grandes empreendimentos em busca de solução para os processos paralisados. E encaminhamos para a ALMG um projeto de lei que descentraliza os processos de licenciamento. Vamos passar para a competência dos municípios, que têm conselhos municipais de Meio Ambiente e que atendam

WILLIAM Waack, o mediador, mais Olavo Machado, Fernando Coura, Murilo Ferreira e Fernando Pimentel: debate minerário

aos requisitos básicos da legislação ambiental, os projetos de até grau 4 de complexidade.” ENTRAVES MINERÁRIOS Segundo Murilo Ferreira, diante da baixa do minério no mercado internacional de commodities, as cidades enfrentam outro desafio. “Quando o minério está com o preço valorizado, a prefeitura gasta o dinheiro vindo dos tributos sobre exploração em custeio. Mas quando o minério desvaloriza, ficam todos desesperados. É preciso seguir o exemplo de países como Austrália e China. Eles realizaram mudanças importantes, em nível comercial e municipal, nos pagamentos e participação nos direitos minerários. Mas, nossos municípios, infelizmente, ainda acreditam que tudo será resolvido com aumento de alíquota”, critica. Ferreira também apontou entraves que vão além da questão local. “A mineração trabalha num ambiente de competição. Precisamos da agilidade, comum aos outros países, para enfrentarmos os desafios. Um empreendimento minerador no Brasil leva de oito a dez anos para fazer a primeira perfuração, já que é necessário fazer o projeto, o desenvolvimento de malha, o

estudo de viabilidade, compra dos equipamentos, entre outras ações. Quando o projeto começa a funcionar, o cenário está completamente diferente de oito ou 10 anos atrás. Então, para isso, fazemos um planejamento estratégico anual, onde se vai rotulando esse projeto, fazendo melhorias nele, tornando-o cada dia mais competitivo e tentando eliminar incertezas. Uma dessas incertezas é o processo regulatório, principalmente no caso brasileiro.” INOVAR SEMPRE Uma das medidas apontadas para enfrentar o baixo preço do minério é a automatização dos processos. Segundo o presidente da Vale, “de 300 a 400 caminhões serão eliminados em Carajás (PA), que implicam, entre outras questões, em menos combustível e menos uso de água, para que, assim, a empresa consiga se manter competitiva”. Segundo o presidente da Fiemg, Olavo Machado Jr., questões como essa exigem das indústrias e seus funcionários soluções mais inovadoras. “Os empresários não inovaram no período das ‘vacas gordas’ e agora o grande problema da indústria mineira e nacional é a produtividade.” Nesse cenário, há ainda a preocupação com a instabilidade política do país. “O tempo político é diferente do tempo das empresas e os ajustes do governo federal ainda são tímidos. Nós não vamos desenvolver se não tivermos linha de crédito, tanto para as micro e pequenas empresas quanto para as indústrias, que precisam comprar equipamentos novos”, analisa. Porém, mesmo diante da atual realidade, Machado acredita que é preciso ser otimista.


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escassez de água que assola o Brasil tem preocupado o setor minerário. O recurso é um dos principais insumos da mineração, pois as usinas de beneficiamento de minério geralmente são implantadas em locais com grande disponibilidade de água. Isso explica o fato do crescimento no número de projetos de mineradoras que focam diretamente a gestão sustentável da água. Esse foi o tema do painel “Água como fator de interação entre o econômico e o ambiental”, mediado pela ambientalista e superintendente-executiva da Associação Mineira de Defesa do Ambiente, Maria Dalce Ricas. “Enquanto ambientalistas, estamos muito preocupados com a gestão da água territorialmente, porque percebemos que o que é básico para a sobrevivência da água, que é a questão das florestas, não é levado em conta. Ela continua a ser tratada pelo poder público apenas do ponto de vista da distribuição, de novas captações, sem se preocupar com a geração do recurso”, ressaltou Dalce. E deu um puxão de orelha nas mineradoras: “Sabemos que o setor de mineração tem bons exemplos de responsabilidade socioambiental, estão investindo em gestão ambiental e melhor uso da água. Mas ainda há representantes de empresas, e algumas delas de forma isolada, que ainda continuam encasteladas nas defesas de seus interesses. Quando a questão da água surge, elas se manifestam. Mas quando afetam seus interesses, não”. Tácito Ribeiro de Matos, advogado especialista em Recursos

FOTOS: EVANDRO FIUZA E DÉBORA FREITAS

Gestão de recursos DALCE RICAS: “O governo fala em contingenciamento. A gente fala em sequestro”

Hídricos da LOB-SVMFA, ressaltou que ainda faltam critérios objetivos para definir a cobrança do uso da água. Ele defendeu a importância de que os valores dessa cobrança sejam fiscalizados e aplicados diretamente na gestão e manutenção do recurso. E lançou uma ideia que merece mais discussão entre empresas, poder público e sociedade: a concessão de bacias hidrográficas para melhor preservação das águas. “Hoje temos concessão de rodovia, elétrica, de aeroportos, de telecomunicação. Por que não discutir a possibilidade de se fazer concessão de bacia hidrográfica? Não é privatizar o recurso hídrico. A concessão é da gestão do recurso, da mesma forma que a rodovia não se torna um bem privado.” Dalce completou: “Essa ques-

tão da insegurança jurídica em relação à água ainda é grande. Os problemas relativos à pouca aplicação dos recursos recolhidos da cobrança também estão atrelados às funções de desempenho das redes que estão responsáveis pela gestão desses recursos”. E fez uma ressalva a um dos comentários de Tácito sobre a parte da arrecadação que não é aplicada corretamente. “Isso não significa que o recurso não tenha sido desviado, você está sendo muito generoso. Porque em Minas está sendo desviado mesmo. O governo fala em contingenciamento, a gente fala em sequestro. Hoje mesmo a Fetaemg e nós, ambientalistas, pedimos no plenário do Copam que o Estado devolva R$ 103 milhões aos comitês de bacias hidrográficas”, concluiu.

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ESPECIAL MINERAÇÃO

“A construção de confiança é algo central na mineração. E isso só é possível se interagirmos de maneira aberta e parceira com a sociedade.” Quando Ricardo Vescovi, diretor-presidente da Samarco, iniciou a sua participação na Exposibram com essa frase, o auditório já estava cheio. E, mais uma vez, ele prendeu a atenção dos presentes ao ressaltar a importância da ferramenta organizacional “Development Partner Framework” (DPF), que propõe uma abordagem que visa construir valores sustentáveis, em longo prazo, para toda a cadeia da mineração. Para isso, Vescovi reforçou, confiança é essencial. E apontou como exemplo quatro diretrizes estratégicas que têm fortalecido a relação entre a Samarco e a sociedade. “A primeira delas é liderar pelo exemplo. É preciso praticar a sustentabilidade e a segurança no nível mais alto possível.” O segundo passo, aponta ele, é formar redes colaborativas. “Ninguém tem a verdade por si só. A mineração já venceu esse tempo de arrogância. Uma solução só nasce por meio de um alinhamento, uma união entre as pessoas. É perguntar para a comunidade o que é importante para ela e não o que ela quer de nós. Na Samarco, temos 200 stakeholders e todos enxergam a sustentabilidade conosco. Em vez do medo de compartilhar as coisas, mostramos que estamos abertos ao compartilhamento. É assim que se constrói uma relação de confiança.” É dessa relação, ele aponta, que nasce, também, as oportunidades de empreendedorismo

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FOTO: DIVULGAÇÃO

A gestão da confiança

RICARDO VESCOVI: “Tomo decisões de acordo com os valores que acredito”

responsável. “As mineradoras precisam entender que as comunidades estão dentro do próprio território. Devem ser incorporadas à rede de negócio, que é circular e agregadora. É ir até à natureza, retirar sustentavelmente o que se precisa, reconstruí-la e compartilhar o valor do negócio estimulando a geração de novos empreendedores sociais.” Alinhado com o tema da Exposibram, o diretor-presidente da Samarco fechou sua apresentação falando de inovação. “As soluções inovadoras são tecnológicas. Isso é um exemplo marcante na empresa, principalmente com o aproveitamento de subprodutos para gerar novos produtos. Inovação é isso. Agregar valor ao que, aparentemente, não tem valor.” Perguntado sobre que legado gostaria de deixar para a mine-

ração, Vescovi disse que ela foi o caminho que escolheu para deixar o mundo melhor. “Existem momentos na vida e no trabalho em que a decisão é sua. É isso que me encanta na posição de líder. Eu tomo minhas decisões de acordo com os valores que acredito. Gosto de usar a definição de ética, pois ela remete à busca de um bem comum. Todas as pessoas querem deixar uma marca no mundo. Mas o trabalho com a mineração, que iniciei há 22 anos, é a forma que encontrei para mudar a minha vida e a das pessoas para melhor.” A ovação que ele recebeu do público ao fim do painel mostra que confiança é realmente algo que se conquista. E, no caso da mineração, também contribui para a construção de um futuro sustentável para todos.

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FOTO: DIVULGAÇÃO / ANGLOGOLD

Outros destaques GESTÃO INTEGRADA “O ser humano hoje tem um nível de exigência muito alto. Por isso, a aceitação e a absorção de uma mineradora pela comunidade é muito difícil. É imprescindível que as empresas do setor sigam sempre os princípios básicos da sustentabilidade. E não serem autorreferentes e arrogantes, implantando seu modelo a todo custo e sem seguir o que foi proposto. Governança é mais que isso. É preciso ouvir e interagir com a sociedade para prosperar e avançar, com gestão integrada e sustentável. Porque, no fim, a gente trabalha é pelas pessoas. E a inovação é uma nova maneira de enxergar a visão compartilhada desse propósito.”

Hélcio Guerra, CEO da AngloGold Ashanti Brasil FOTOS: EVANDRO FIUZA E DÉBORA FREITAS

ESPERANÇA MINERÁRIA “As mineradoras não podem achar que pintar uma praça ou participar das festas das comunidades de sua área de influência são o legado que irão deixar. É muito mais do que isso. Lidamos com a esperança das pessoas, que sonham em ver o lugar onde moram transformados para melhor. Não podemos ser confundidos com o poder público, mas é preciso que as empresas de mineração sejam consistentes em seus valores para não perder a confiança da sociedade e do governo. O caminho correto é planejar sustentavelmente para ter visão de futuro. ”

Rodrigo Vilela, diretor da Unidade de Negócio Minério de Ferro Brasil da Anglo American

TERRAS RARAS “A CBMM nunca parou de tentar separar as terras raras do minério que a sociedade permitiu que explorássemos. Não é simples fazer essa separação, pegar uma peneira. Na extração, vem óxido de ferro, monazita... Como é que você agrega valor para aplicar nos produtos finais? O segredo é a tecnologia. E o nosso gargalo é educação, formação de pessoal. Falta um programa de desenvolvimento em longo prazo para criar conhecimento sobre terras raras.”

Tadeu Carneiro, presidente da Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM)

PANORAMA DA MINERAÇÃO “Os municípios produtores de minério de ferro em Minas Gerais participam, em média, com 13,1% do PIB do estado. Geram uma renda per capita anual 91,% maior que a média estadual e concentram mais de 20% da população. Mais de R$ 1 bilhão foram gerados em contribuição para a Cfem no estado em 2013, sendo que Minas representa 51% da arrecadação nacional.”

Maria Alice Veloso, assessora da Superintendência de Clientes Institucionais do Ibre/Fundação Getulio Vargas

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FOTO: GUALTER NAVES

FOTO: DIVULGAÇÃO

1 ARTIGO - IZABELLA TEIXEIRA E BARBARA HENDRICKS (*)

APOIO MULTILATERAL

PARA O MEIO AMBIENTE “Q uando todos os Estados membros das Nações Unidas acordaram a Agenda de Desenvolvimento Sustentável 2030, em Nova Iorque, no dia dois de agosto, o embaixador Kingsley Mamabolo, da África do Sul, expressou os sentimentos de muitos ao citar Nelson Mandela: ‘É sempre impossível até que seja feito.’ A decisão sobre a Agenda 2030 é de fato uma conquista histórica. Há três anos, quando chefes de Estado e de Governo, reunidos no Rio de Janeiro, decidiram criar um conjunto de ‘Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)’, muitos duvidaram de que o processo negociador multilateral poderia produzir metas verdadeiramente ambiciosas. A decisão de lançar processo relativo aos ODS, entretanto, revelou-se o resultado mais importante da Conferência Rio+20, pois resultou no desenvolvimento da Agenda de Desenvolvimento Sustentável 2030, adotada formalmente em Cúpula da ONU

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realizada este mês. Essa Agenda caracteriza-se pela profundidade e pela abrangência sem precedentes. Tenciona libertar a humanidade da tirania da pobreza e promover o desenvolvimento sustentável em todo o planeta. Abrange 17 ODS e 169 metas, incluindo, de modo integrado, temas como nutrição, saúde, educação, igualdade de gênero, direitos humanos, crescimento econômico, energia, mudança do clima e proteção ambiental. A Agenda 2030 aplica-se a todos os países. É o primeiro catálogo de objetivos e metas universais com prazo estabelecido que confere igual importância aos desafios sociais, ambientais e econômicos, ao reconhecer que todas essas esferas são interligadas e inseparáveis. O processo para elaborar essa Agenda foi saudado como o esforço multilateral mais inclusivo já empreendido, com a participação de todos os países, do sistema das Nações Unidas e de incontáveis organizações da sociedade civil, representantes

do setor privado e da academia e milhares de indivíduos. Estamos especialmente gratos de registrar que a proteção do meio ambiente deste planeta é parte integrante e central dessa agenda. Os ODS refletem, no conjunto de suas metas, o imperativo de desvincular o crescimento econômico da degradação ambiental, de alterar padrões de vida insustentáveis e de proteger ecossistemas para as futuras gerações. Isso faz com que a Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável seja adequada aos tempos atuais e também aos próximos 15 anos. Todos percebemos que não podemos continuar nas nossas usuais trajetórias de desenvolvimento, destruindo a natureza e utilizando padrões insustentáveis de recursos ao longo do caminho, ao passo que a maioria da humanidade continua a viver em pobreza extrema. Precisamos de uma transição global rumo ao desenvolvimento verdadeiramente sustentável, ao crescimento econômico social-


FOTO: REUTERS / PAUL MCERLANE

mente inclusivo que assegure a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais. Os ODS têm o potencial de nos colocar nessa direção. Mas esses objetivos poderão ser atingidos até 2030 somente se todos nós – países e indivíduos – trabalharmos juntos, reconhecendo nossas distintas realidades nacionais, capacidades e níveis de desenvolvimento. Alguns países não podem continuar a crescer em detrimento de outros. Existe apenas um planeta com recursos naturais finitos que devem ser compartilhados de forma equitativa e usados de maneira sustentável. Em última análise, isso significa que temos que desvincular crescimento e uso de recursos, conforme apontado no ODS 8. Isso também faz sentido econômico, pois existe ampla evidência de que a eficiência na utilização de recursos pode reforçar o crescimento econômico, criar empregos e erradicar a pobreza, ao passo que contribui para a proteção ambiental. O uso responsável e eficiente dos recursos naturais por meio do consumo e produção sustentáveis, como refletido no ODS 12, deverá constituir tarefa central para qualquer sociedade. No entanto, países da OCDE, como a Alemanha, têm responsabilidade especial para demonstrar que são capazes e estão dispostos a adotar estilos de vida que, se replicados mundialmente, não usariam os recursos planetários além de sua capacidade de sustentação. Países em desenvolvimento também dispõem de exemplos positivos nesse contexto, e o intercâmbio de experiências de ambos os lados poderá contribuir para levar a cabo essa tarefa crucial. A adaptação à mudança de clima e sua mitigação representa outro imperativo em que nós, como governos, devemos atuar em prol da equidade, da justiça intergeracional e da economia.

INSPIRAÇÃO em Nelson Mandela: “Tudo é sempre impossível até que seja feito”

O ODS 13 conclama os Estados a tomar medidas urgentes para combater a mudança do clima e seus impactos. O próximo passo será celebrar acordo legalmente vinculante sobre o tema em Paris, em dezembro próximo, sob a égide da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, que seja aplicável a todos os países e que reflita o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, e respectivas capacidades, em vista das diferentes circunstâncias nacionais. Tanto o Brasil quanto a Alemanha estão comprometidos a reduzir suas emissões de gases de efeito estufa e empreendem esforços conjuntos nas áreas de energias renováveis, eficiência energética, mitigação e adaptação à mudança do clima. Em última análise, é imperativo que todos os países adaptem suas economias para padrões de baixo carbono o mais rápido possível. A declaração conjunta entre o Brasil e a Alemanha sobre mudança do clima, que foi anunciada no contexto das negociações do dia 20 de agosto, reflete a ambição compartilhada de que as negociações na Conferência de Paris sejam exitosas. O Brasil e a Alemanha também cooperam a fim de alcançar o ODS 15, que busca, inter alia, o manejo sustentável de florestas e a interrupção da perda de biodiversidade. A vasta floresta ama-

zônica brasileira não só é bela e megadiversa em termos de biodiversidade, mas também tem papel relevante na regulação do sistema climático global e regional. Se a floresta for destruída, tanto as pessoas quanto a biodiversidade sofrerão perdas. O Brasil já forneceu uma grande contribuição à mitigação de emissões de gases de efeito estufa por meio da redução do desmatamento e da aplicação de sua legislação doméstica. A implementação de políticas públicas brasileiras permitiu reduzir em 83% o desmatamento no bioma amazônico, desde 2004. Durante as primeiras consultas intergovernamentais de alto nível realizadas entre nossos dois governos em Brasília (DF), foram anunciadas várias novas iniciativas conjuntas para proteger a biodiversidade marinha, desenvolver esquemas de contabilidade verde, unir investimento público aos esforços de adaptação à mudança do clima e adotar estratégias para transição regional para o desenvolvimento rural com baixa emissão de gases de estufa. Estamos desejosas para continuar e aprofundar a colaboração entre nossos países nas agendas de mudança do clima e desenvolvimento sustentável. Brasil e Alemanha já embarcaram no caminho para alcançar os ODS e compartilhamos o espírito de parceria global que deve permear a Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável, para que seja exitosa. Estamos determinadas a continuar nesse caminho, juntas e também com outros parceiros, para provar ao mundo, mais uma vez, que Mandela estava correto – pode parecer impossível, mas pode ser feito. Nosso principal desafio é tornar possível o que agora parece impossível.”  (*) Ministras do Meio Ambiente do Brasil e do Meio Ambiente, Proteção da Natureza, Construção e Segurança Nuclear da Alemanha.

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FOTO: SANAKAN

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SUCESSO ENTRE FLORES A história da paisagista Denise Magalhães, que teve as rosas de Caxambu como inspiração para a vida e a profissão Déa Januzzi

redacao@revistaecologico.com.br

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ão a chamem de flower designer, mas simplesmente de florista. É assim que Denise Magalhães gosta. “Minha alma é barroca”, confessa. Nem tentem pedir números da Verde que te quero Verde, empresa de sucesso que dirige há 35 anos, em BH, porque ela só fala de sonhos. E de

porções quase mágicas, como a de caminhões que chegam, todos os dias, carregados de flores e param na porta da loja, à rua Sergipe, 1.180, na região da Savassi, diretamente das Centrais de Abastecimento de Minas e de São Paulo. Com um vestido estampado de folhagens verdes, Denise, de

61 anos, nascida em Caxambu, Sul de Minas Gerais, parece ter sempre vivido entre as flores que vão enfeitar as festas da sociedade mineira, brasileira e até internacional. Quando menina, ela frequentou muito a chácara dos avós. De lá, sempre voltava com braçadas de flores colhidas nos jardins.

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FOTO: GUSTAVO LOVALHO

De trabalhos manuais, ela entende muito. Toda a família sempre bordou, teve dom para o artesanato. Mas foi com a mãe, Mariazinha, que está com 88 anos, que ela hoje tem esse olhar diferenciado para a natureza. Certo dia, dona Mariazinha disse para a filha: “Vamos montar uma loja de flores?” Denise gostou da ideia e as duas foram para São Paulo, passearam pela Avenida São João, visitaram a Ceasa, mas o que ela viu cortava o seu coração. “Para fazer um arranjo, eles enfiavam um arame na flor”. E em silêncio pensava: “Deve ser uma dor, eu nunca vou fazer desse jeito. Quero fazer do jeito que vejo na natureza. Do jeito que ela é”. Denise montou a primeira loja, que durou quatro anos, em Caxambu, mas percebeu que não dava para vender flor no interior de Minas. “Lá, todo mundo tem um jardim, pega uma mudinha com o vizinho. Não precisa de flora. Então, decidi vir para Belo Horizonte aos 23 anos.” Denise desabrochou junto com a flora, pois fazia arranjos que ninguém

“O perfume das angélicas me leva ao paraíso. E particularmente gosto de ranúnculos, que parecem rosas e florescem em agosto e setembro, numa profusão de cores." DENISE MAGALHÃES

ousava fazer. Nada de pirâmides certinhas, de arames violentando flores, de mesmice. Ela começou a fazer diferente. VERDE, A COR DO SUCESSO Ela faz questão de destacar o nome de uma pessoa que ajudou a Verde que te quero Verde a ser o sucesso que é hoje – a jornalista e editora do “Caderno Feminino e Masculino” do jornal Estado de Minas, Anna Marina Siqueira. “Um dia”, recorda-se Denise, “a Anna Marina, que eu nem conhe-

cia ainda, entrou na minha loja e disse que ia fazer o aniversário do marido dela, o Cyro Siqueira. E pediu que eu fosse a responsável pelos arranjos da festa. Ela não falou como queria, mas que eu fizesse do meu jeito”. No domingo seguinte, “me avisaram que meus arranjos estavam na capa e nas páginas centrais do ‘Caderno Feminino’. Daí para frente, não tive mais sossego. Os pedidos explodiram na loja. Foi a partir da divulgação da Anna Marina que teve início a minha trajetória, que incluiu também uma sociedade com outro florista, o também conceituado Ronaldo Maia”, ela reconhece e agradece até hoje. O sucesso da Verde que te quero Verde foi tanto que ter uma festa assinada por Denise Magalhães se tornou sinônimo de sucesso, porque ela continua fazendo diferente e realizando sonhos, seja em noite de grande evento ou para um petit comitê. Chegou um momento, porém, que ela sentiu necessidade de crescer, estudar e unir a profissão de florista à arte da cenoSETEMBRO DE 2015 | ECOLÓGICO  65

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1 PERFIL

grafia. Ela adubou e regou os seus sonhos. Saiu do Brasil, foi para os Estados Unidos e Japão em busca de conhecimento, pois os arranjos pediam uma construção, exigiam um ambiente cenográfico. A contragosto, Denise Magalhães revela que faz de 90 a 95 eventos anuais. “Números rotulam”, repete ela, pois persegue “sonhos e a vontade de realizar os desejos das pessoas”. Quem tem o privilégio de conhecer Denise Magalhães, que nasceu sob o signo de Libra, sabe que, por natureza, ela é uma amante das flores. “Acho injusto quando alguém diz que não gosta de uma determinada flor, por exemplo, cravos e crisântemos. Toda flor tem a sua beleza e função.” Mas ela também tem as suas preferidas. “O perfume das angélicas me leva ao paraíso. E particularmente gosto de ranúnculos, que parecem rosas e florescem em agosto e setembro, numa profusão de cores.” Denise Magalhães teve sua única filha aos 16 anos. Roberta, de 44, vive hoje nos Estados Unidos importando móveis com design brasileiro e o bom do artesanato. Reconhece que respeitar a natureza é uma questão de educação. “A gente era criança quando minha irmã arrancou um girassol do jardim. Minha mãe a colocou se-

A DESCOBERTA “Denise Magalhães fazia anúncios pequenos na coluna de Maria José Medeiros, no ‘Caderno Feminino’ do jornal Estado de Minas. Um dia, passei na loja dela, na Savassi, para ver pessoalmente. Fiquei apaixonada pelo seu trabalho e pedi que ela fizesse a festa de aniversário do meu marido, Cyro Siqueira, que estava completando 50 anos. Ela foi lá em casa, pegou todas as jarras, vasos e fez uma decoração deslumbrante. Na época, o governador de Minas era o Francelino Pereira. Ele e sua esposa, dona Latife, estavam no aniversário do Cyro. Ela gostou tanto que passou a chamar a Denise para fazer todos os eventos no Palácio da Liberdade. A partir daí, a Verde que te quero Verde pegou, foi para a frente e nunca mais parou. Hoje, ela é chamada para fazer eventos nos Estados Unidos, na Europa, em todos os cantos do mundo. Fez até um casamento em Nova York que foi um tremendo sucesso. Hoje, sou amiga da Denise, que eu adoro e que é muito criativa. O resto só a copia.”

FOTO: JUAREZ RODRIGUES / EM /D.A PRESS

ELES DISSERAM...

Anna Marina Siqueira, jornalista e editora do jornal Estado de Minas INSUPERÁVEL “Escrever sobre Denise Magalhães não tem a menor dificuldade, pois, além de minha amiga, assim posso dizer, é uma das maiores artistas brasileiras – que chamo de insuperável – em decoração de festas não só em Belo Horizonte (MG), mas em todo o Brasil e até mesmo no exterior. Denise tem o toque de Deus em suas mãos e na cabeça, para sair tão belos projetos. Já cheguei várias vezes, numa noite, a ir em três festas feitas pela Denise, completamente diferentes e todas maravilhosas. O detalhe é que ela tem o orçamento para todo bolso contrariando a fama de ‘careira’. E agora tem a seu lado o querido Edson Bacci.”

FOTO: DIVULGAÇÃO

Por ano, a Verde que te quero Verde realiza entre 90 e 95 eventos em todo o Brasil

Paulo César de Oliveira, diretor-geral da VB Comunicação

gurando a flor por um bom tempo, para dizer que ninguém pode destruir o que não fez.” A lição serviu para sempre. “Mesmo com essa febre ecológica, hoje a gente vê o planeta se danar, porque tem que aprender é de pequeno.” Cita crianças e adolescentes que não querem nem saber de bichos, árvores e plantas e preferem “ir para Disney”. Mas faz questão de ilustrar o caso do filho de um amigo, de seis anos, que fez essa viagem e depois surpreendeu os

adultos ao dizer que a “fazenda do avô era muito melhor”. É o que tenta ensinar ao seu neto, Nico, também de seis anos, com programas junto à natureza, passeios em fazendas antigas para pescar, caminhar e ver os bichos, árvores, flores e plantas. “Não tem outra forma de educar. É dar o exemplo”, completa Denise.  SAIBA MAIS www.verdequetequero.com.br

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CÉU DO MUNDO VINÍCIUS CARVALHO

“CENSO” DAS ÁRVORES

O planeta possui, aproximadamente, 3,04 trilhões de árvores. Realizado pela Universidade de Yale a pedido do Pnuma, o “censo florestal” aponta o Brasil como casa da terceira maior população arbórea do mundo (9,9% das árvores do planeta), atrás da Rússia (21,1%) e do Canadá (10,5%).

FOTO: SAN724

PÓS-FUKUSHIMA

O governo do Japão autorizou o regresso da população para a cidade de Naraha, que fica a 20 km ao sul da usina nuclear de Fukushima. Depois do acidente nuclear ocorrido em 2011, cerca de 7.400 residentes deixaram a cidade. No entanto, 53% das pessoas afirmam que não estão prontas para voltar, muitas por receio de radiação.

NÍVEL DO MAR

Alerta da Nasa: o nível do mar subiu quase oito centímetros em todo o mundo desde 1992 devido ao aquecimento global. O aumento foi, em média, de 7,62 centímetros, apesar de o panorama variar em diferentes regiões. Em alguns casos, o nível chegou a superar os 22 centímetros.

LIXO DO MUNDO

FOTO: MICKYSO

As zonas urbanas do mundo produzem, anualmente, entre sete e dez bilhões de toneladas de lixo. A afirmação é do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), que também informa que três bilhões de habitantes do planeta ainda não têm acesso a locais apropriados para descartar os resíduos.

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1 HISTÓRIA

ILUSTRAÇÃO de Lagoa Santa feita por P.A. Brandt, desenhista de Lund, datada de 1845

UM OLHAR NO PASSADO DE

LAGOA SANTA Cástor Cartelle (*)

redacao@revistaecologico.com.br

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agoa Santa é sinônimo e berço de nossa pré-história. Foi numa gruta, localizada à entrada da cidade, onde Peter W. Lund (1801-1880), “pai” da arqueologia, paleontologia e espeleologia brasileiras, primeiro encontrou restos dos mais antigos brasileiros. Além dessa característica, poucas são as cidades de Minas em que, no retrovisor da história mais moderna, o caminho desaparece na distância do tempo. Em 1749, foi publicado em Lisboa um opúsculo [pequeno livro]: “Prodigiosa lagoa descoberta nas Congonhas das Minas de Sabará, que tem curado a varias pessoas dos achaques, que nesta relação se expõem”. É esta a primeira referência e representação, uma vez que também foi publicado um desenho da lagoa que daria nome à futura Lagoa Santa. O opúsculo (nas citações será respeitada a grafia original) descreve que “...na Capitania de Minas Geraes, Comarca do Rio das Velhas, seis léguas da Villa do Sabará há hum grande lago, chamado vulgarmente a Lagôa Grande... Todas as águas que cahem nos 68  ECOLÓGICO | SETEMBRO DE 2015

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campos vizinhos para ela correm... Tem o seu nascimento no meio da mesma lagôa em vários olhos... Na maior altura terá trinta e cinco palmos de fundo,... podendo muito bem navegar iates. He tão crystallina que os que a surcão em canoas, quando há calmaria, lhe vão vendo o fundo, como se entre este e a embarcação não houvesse mais que huma transparente vidraça, o que melhor se percebe pelas nove da manhã e trez da tarde... Sinco castas de peixes se tem nella descoberto. He de se notar que sendo todas as lagôas frequentadas de muitas aves, nesta nenhuma aparece, como também nem mosquitos, nem moscas se vem nas suas margens... o seu desaguadouro... se incorpora com o Rio das Velhas; e a cento e vinte braças... se acha huma engenhoca de fazer aguardente de cana... que no anno de 1733 foi fabricada por Filippe Rodrigues... sendo o primeiro a cultivar aquele sitio, onde ainda existe”. FAUNA ANTIGA Entram nessa história um médico, Simão Pereira de Castro, português que PRINCESA ISABEL aboliu a escravidão 139 anos depois que o opúsculo foi escrito

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fora até lá para aconselhar Filipe Rodrigues na venda da fazenda, e o padre Frei Pedro Antônio de Miranda, que fora saudar o doutor, amigo dos tempos da Universidade de Coimbra. O doutor “... padecia por causa de hum formigueiro, que lhe sobreviera nas nádegas haveria oito anos, havendo-se já exahurido a Medicina... se resolvêra a tomar banhos naquelas aguas;... e se achava com conhecida melhora e reflectindo o dito Padre... assentou que o benefício destas águas havia produzido aquelle efeito”. A fama da Lagoa cresceu com outras curas a ela atribuídas: surdez, chagas, gota, verrugas, rins, cancro, sarna... sessões de banhos que tudo curavam. O opúsculo registra 107 curas. Uma das narrativas, a de número 72, é assim reproduzida: “... Pedro da Silva padecia grande falta de vista, por haver hum anno que não podia ler, nem escrever sem óculos, com quinze dias de banhos se achou restituído da vista”. A notícia, qual rastilho de pólvora, espalhou-se e, pouco tempo depois, mais de três mil pessoas ocupavam as margens para tomar banhos medicinais. Na apreciação do doutor Simão Pereira, o do formigueiro nas nádegas, “...as águas eram impregnadas de dois utilíssimos mineraes como erão vitriolo (= sulfatos) e aço, aquelle volátil, e em pequena quantidade, e este em maior porção”.

Após a descoberta da lagoa, passaram-se 82 anos. O Arquivo Público Mineiro guarda um precioso manuscrito: “Relação dos habitantes do Destricto da Parochia de Nossa Senhora da Saude da Llagoa Santa. Termo da Fidelissima Villa de Sabará, Provincia de Minas, postado pelo Juiz de Paz do sobre dito Destricto, assinado in fine em observância das ordens do Exmo Presidente da Provincia. Seguem-se 19 páginas assinadas, no fim (= in fine), no dia 24 de 8bro (= outubro) de 1831, por Carlos Jose de Moura, juiz de Paz”. Quatro anos depois, Peter W. Lund estabelecer-se-ia na localidade na qual acabaria morrendo 45 anos mais tarde. Esse documento caracteriza os vizinhos da localidade que o ilustre morador definiu como sendo “um lugar bom para se viver”. O documento fornece uma série de dados que são um retrato da localidade realizado pelo “IBGE” da época. No arraial, moravam 1.824 pessoas. Destas, 632 eram crianças menores de 16 anos. Não sem razão, Dr. Lund acabaria por se preocupar com a educação doando, ao morrer, sua casa para servir de escola. Pouco tempo depois, tornou-se médico do arraial. Na Universidade de Copenhague estudara história natural e medicina. As idades registradas minuciosamente no documento traduzem as dificuldades que eliminavam os mais fracos. Dessas crianças, 70 tinham até um ano de vida; 46, até dois anos; 29, três anos, e 36, quatro anos. Aproximadamente, somente a metade dos nascidos atingia os quatro anos de idade. O arraial e seu entorno contavam com 268 moradias, sete habitantes, em média, para cada uma delas, dos quais 35% eram menores de 16 anos.

IGREJA MATRIZ Foi necessária uma licença do “... Excellentissimo, e Rever. Senhor Bispo destas Minas Dom Fr. Manoel da Cruz, primeiro prelado delas,...” para celebrar missas campais, assim “...atendendo ao A PRODIGIOSA lagoa incommodo, que padecião as suas anunciada em 1749 CARTA BEM-HUMORADA ovelhas na falta de pasto espiritual, por não haver naquele sitio Capella...”. Mas no Quando se estabeleceu no povoado, no início de local haveria de se “...erigir a Igreja que terá Invoca- 1835, Lund alugou uma moradia. Um ano depois, comprou a casa definitiva onde moraria até 1880, ção de Nossa Senhora da Saude...”. Logo depois, veio até o local o “...Capitão Manoel data de sua morte, e que descreveu como sendo Nunes Velho...” o qual, depois de examinar “...a pa- “...uma casa muito bonita e bem organizada”. Ela firagem propria para formarem o dito arraial, que as- cava na praça à frente da igreja e tinha um quintal sentarão se fizesse para sima do sangradouro... lugar que chegava até a lagoa. A descrição da primeira moradia foi feita em carmais commodo, para que as imundícies não conspurta bem-humorada a seu primo Peter, irmão do céguem a agua da lagôa...”. A notícia chegou a Lisboa onde era vendida água lebre filósofo Sören Kierkegaard. A maior parte das proveniente da prodigiosa lagoa. Foi esse o início da casas do então povoado seria do feitio descrito por futura cidade que surgiu em volta da lagoa que era Lund. “Minha moradia constitui-se de uma cabana inacabada de barro onde vento e água entram sem santa porque curava.

2

SETEMBRO DE 2015 | ECOLÓGICO  69


1 HISTÓRIA impedimento... eu a aluguei com móveis que consistem em duas mesas velhas... minhas malas e caixas fazem o papel dos outros móveis, ou seja, em lugar de cadeiras, armários... Minha cama é o móvel mais completo na casa... Ela é composta de... quatro partes: estrado, que é a terra; colchão de baixo e cobertura... que é uma pele de boi; lençol com edredom e cobertor que é minha capa; travesseiro, que é minha sacola... não posso evitar descrever minha cozinha... dou aulas práticas... para meu cozinheiro cujo... círculo de conhecimentos... compreende um único prato... feijões-pretos... em um recanto... está um cubículo..., a cozinha. O fogão é o chão; o coletor de fumaça e o tubo da chaminé é o teto. No fogão,... uma fogueira acessa dia e noite; sobre ela está pendurada uma trempe, um caldeirão de lata com os recém-mencionados feijões-pretos. A bateria de cozinha... (está) no chão, em algumas varas que a impedem de tocar na terra. Ela consiste em ... pratos, ...assador, a cafeteira, colheres e algumas facas e garfos: todos de lata. Alguns potes de barro ficam em outro recanto.” Constam no precioso documento, guardado no Arquivo Público Mineiro, os empregos mais comuns exercidos por uma minoria dos moradores do distrito. Além de um padre vigário, um professor e um encarregado do Correio, as principais ocupações

eram: negociantes, lavradores, caixeiros (=vendedores), rendeiras, fiadoras (=tecelãs), feitores, jornaleiros (=diaristas), alfaiates, carpinteiros, ferreiros, costureiras, cangalheiros (=carroceiros), pedreiros... Mas a maior parte dos moradores, todos eles registrados com o nome, não tinha registro de ocupação. Sete moradores atingiram a idade de 70 anos; dois, 75; um, 79. Serafim e João chegaram aos 81 e Joaquim do Fraga, 86 anos. Surpreendentemente figuram como frequentadores da escola somente oito meninos, entre 8 e 13 anos. Nenhuma menina. Outros dados são explicitados na relação. Eles são realidade chocante ao nosso olhar. Na listagem, é conservada a terminologia que figura no documento que caracteriza os moradores: “Brancos: 346. Pardos livres: 656. Pardos captivos: 59. Crioulos livres: 190. Crioulos captivos: 338. Pretos livres: 25. Pretos captivos: 210. Totalidade: 1.824. Livres: 1.217. Captivos: 607.” Destes, 169 eram crianças, entre 1 e 16 anos, escravas. Esse documento foi escrito 56 anos e 201 dias antes da promulgação da Lei 3.353, de 13 de maio de 1888, assinada pela Princesa Isabel. 

(*) Paleontólogo e curador da Coleção de Paleontologia do Museu de Ciências Naturais da PUC Minas.


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RESPONSABILIDADE SOCIAL

RUA DO RESPEITO Projeto da Prefeitura de Belo Horizonte em parceria com o Servas, TJMG e ArcelorMittal promove a inclusão social de pessoas em situação de rua Cristiane Mendonça

redacao@revistaecologico.com.br

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egundo o último “Censo de População de Rua”, realizado pela prefeitura da capital mineira em 2013, 1.827 pessoas vivem em situação de rua na cidade. A maior parte delas (52%) diz estar nessa circunstância por problemas familiares e 43,9%, por abuso do álcool ou outras drogas. Mais preocupante que as razões que levam essas pessoas a abandonarem ou perderem uma habitação convencional, é o fato de que, nessas condições, elas estão mais vulneráveis ao preconceito e à violência. Atentos a isso, o Ministério Público de Minas Gerais, o Serviço Voluntário de Assistência Social (Servas) e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), com o apoio

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da ArcelorMittal, lançaram o projeto “Rua do Respeito: todos temos direito a ter direitos”, cujo objetivo é garantir a inclusão social dos moradores de rua. A iniciativa trabalhará em três eixos: o primeiro é a divulgação e o esclarecimento sobre a condição social dos moradores de rua para a mídia e grupos de interesse. O segundo é a promoção do acesso desse público a direitos básicos como documentação, serviço de saúde e orientação previdenciária. E o terceiro é a busca de parcerias com a iniciativa privada para que o mercado de trabalho se abra para essas pessoas. Segundo a presidente do Servas, Carolina Oliveira Pimentel, o pro-


FOTO: EDUARDO ROCHA / RR

SUZANA FAGUNDES (no púlpito), Mauro Brandão, Áurea Brasil, Nilmário Miranda, Luzia Ferreira e Carolina Pimentel: parceria em prol da inclusão social

jeto é “muito especial para a entidade, assim como para o MP e TJ, porque mostra a união da sociedade civil, do poder público, do Judiciário e do setor privado em prol de um tema tão delicado que merece tanto respeito, atenção e ações”. A presidente conta que “dos quase dois mil moradores de rua em BH atualmente, 94% dizem que querem sair”. Esse dado demonstra que morar na rua não é uma escolha, mas uma condição temporária que pode levar muitos anos. Representando a iniciativa privada, a diretora Jurídica e de Relações Institucionais da ArcelorMittal Brasil, Suzana Fagundes, conta que a união de todas as esferas nesse projeto colabora para uma melhor compreensão dessa questão social. “Embora seja um tema de vocação pública, dada a sua complexidade e o alcance de seus efeitos, a intervenção sistêmica da iniciativa privada, em especial, por meio de ações de mobilização social e articulação, potencializa e acelera o desenvolvimento social.” LANÇAMENTO OFICIAL Para marcar oficialmente o início do projeto, foi feita a assinatura de

termo pelo procurador-geral de Justiça Adjunto Administrativo do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Mauro Flávio Ferreira Brandão; pela juíza auxiliar da Presidência do TJMG, Lílian Maciel; pelo secretário de Estado de Direitos Humanos, Nilmário Miranda; pela presidente do Servas, Carolina Pimentel, e pelos representantes de projetos nas áreas sociais Alex Maciel, Claudenice Rodrigues Lopes, Geraldo Melo e Soraya Romina. Também participaram do lançamento do projeto “Rua do Respeito” a desembargadora do TJMG, Áurea Brasil; e a secretária municipal de Direito e Cidadania, Luzia Ferreira. Durante o evento também foi lançada a segunda edição da obra “Direitos Fundamentais das Pessoas em Situação de Rua” organizada por Ada Pellegrini Grinover, Gregório Assagra de Almeida, Miracy Gustin, Paulo César Vicente de Lima e Rodrigo Iennaco. Com 800 páginas, o livro (foto à esquerda) nasceu a partir de uma necessidade do “Centro Nacional de Defesa dos Direitos da População em Situação de Rua”, uma vez que não havia literatura específica sobre o tema. 

SAIBA MAIS

RAIO-X l 1.827 pessoas em situação

de rua em BH

l 54,5% delas fazem suas refeições

diárias nos restaurantes populares

l 43,4% dormem nos abrigos

municipais

l 44,2% utilizam a rede municipal

de saúde

l 94% diz estar interessada em

deixar a vida nas ruas

l 64,2% das pessoas vêm do

interior de Minas

l 12% dos entrevistados afirmam

trabalhar com registro em Carteira de Trabalho

l 72% trabalharam um dia

com registro

l 86,8% dos entrevistados

são do sexo masculino

l Mais da metade dos entrevistados

tem entre 31 e 50 anos

l 52% vivem nas ruas por problemas

familiares; 43,9% pelo abuso de álcool e/ou drogas; 36,5% por falta de moradia; e 36% por desemprego. Fonte: Terceiro Censo de População de Rua de BH (2013).

SETEMBRO DE 2015 | ECOLÓGICO  75


FOTO: REPRODUÇÃO / PBH

PARQUE Américo Renné Giannetti,no coração verde de BH: exemplo


Nยบ 33


1 ECOLÓGICO NAS ESCOLAS - ARBORIZAÇÃO URBANA

CIDADES MAIS

VERDES

Importantes para o microclima de um município, as árvores são uma estratégia sustentável para amenizar impactos ambientais e a artificialidade do concreto, trazendo mais beleza e harmonia ao meio urbano Luciano Lopes

redacao@revistaecologico.com.br

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FOTO: AROLLDO COSTA OLIVEIRA

egundo a Organização das Nações Unidas (ONU), em 2050 mais de 70% da população mundial estará vivendo em cidades. Para isso, é fundamental que elas estejam cada vez mais preparadas para oferecer serviços básicos e, principalmente, ambientais, incluindo desde espaços verdes para lazer e contemplação da natureza até a preservação dos

78  ECOLÓGICO | SETEMBRO DE 2015

recursos naturais que garantam a sobrevivência das pessoas. Nesse sentido, a implantação e o manejo da arborização nas cidades vem se tornando um aliado importante para a melhoria do microclima. E contribuem para que zonas urbanas não se tornem ilhas de calor – quando as atividades humanas, a grande quantidade de construções e a baixa densidade de material que possa refletir os raios solares nesses lo-

cais colaboram para o aumento da temperatura. As árvores são um bem público. E para realizar seu plantio e manutenção correta é preciso planejamento. Para que uma árvore possa se desenvolver bem na cidade, uma vez que seu ciclo de vida pode ser reduzido por causa de características como forte insolação, solo alterado e iluminação artificial, deve-se avaliar boas condições para ela receber luz (energia solar), dióxido de carbono, água e minerais em quantidades necessárias. E, claro, avaliar o local de plantio tendo em vista o


tamanho que cada espécie pode atingir, uma vez que o crescimento se dá de forma longitudinal (alongamento de ramos e raízes); e lateral, observando-se o aumento do diâmetro do tronco. Segundo o “Manual de Arborização”, elaborado pela Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) com coordenação da Fundação Biodiversitas, os aspectos biológicos e morfológicos são os primeiros a serem considerados. “Uma árvore é um vegetal lenhoso (que produz madeira), com ciclo de vida prolongado, tronco e copa bem definidos. Possui, no mínimo, cinco metros de altura, com diâmetro de tronco a partir de cinco centímetros à altura do peito e 1,30 m acima do solo”, define a cartilha. PLANEJANDO A ARBORIZAÇÃO Há vários parâmetros a serem seguidos para a seleção das espécies arbóreas que irão compor as áreas verdes (parques, praças e jardins) e a arborização viária (canteiros separadores de avenidas e passeios) de uma cidade. Para isso, considerar as árvores já existentes

é o primeiro passo. Mesclar várias espécies é importantíssimo, mas há espaços, por exemplo, em que plantar um único tipo é mais indicado, pois isso facilita o planejamento de intervenções e dá efeito paisagístico. Entre as espécies mais utilizadas no paisagismo urbano estão o ipê- amarelo (Handroanthus serratifolius), a tipuana (tipuana tipu) e a quaresmeira (Tibouchina granulosa). “Sempre que possível”, informa a cartilha, “deve-se privilegiar espécies que produzam copas expressivas, proporcionando conforto ambiental às áreas; diversificadas, considerando diferentes épocas de floração e frutificação, o que favorecerá a paisagem e a presença da fauna;

optar por espécies nativas da flora brasileira; com folhagens que criem sombreamento excessivo; e resistentes a pragas e doenças”. Deve-se evitar, ainda, o plantio de árvores de baixa resistência, porte excessivamente grande em passeios e que contenham flores e frutos venenosos. Não é recomendado plantar também perto de sacadas e varandas e da rede elétrica. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a área verde por habitante em uma cidade deve ser de 12 m2. Para termos centros urbanos ecologicamente mais harmônicos e com suas árvores preservadas, é importante também que os órgãos públicos de planejamento e de meio ambiente atendam corretamente à legislação específica, elaborando projetos paisagísticos adequados. Realizem vistorias periódicas nas espécies arbóreas existentes, removendo os exemplares com risco de queda ou doentes, e ainda façam a irrigação e as técnicas necessárias para a correta manutenção do solo, garantindo assim a saúde da vegetação. A população também pode ajudar. É papel de todos preservar o meio ambiente urbano para garantir mais qualidade de vida e continuarmos vivendo em harmonia com a natureza!

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SETEMBRO DE 2015 | ECOLÓGICO  79


1 ECOLÓGICO NAS ESCOLAS - ARBORIZAÇÃO URBANA

Por que plantar árvores nas cidades? l Elas contribuem para a

estabilidade do clima.

l Trazem conforto térmico

associado à umidade do ar e à sombra.

l Melhoram a qualidade

do ar.

l Reduzem a poluição. l Melhoram a infiltração

da água no solo, evitando erosões associadas ao escoamento superficial das águas das chuvas.

l Contribuem para a proteção

dos corpos d’água, do solo e o direcionamento do vento.

l Contribuem para a

conservação genética da flora nativa.

l Concedem abrigo à fauna,

equilibrando as cadeias alimentares e diminuindo pragas e agentes vetores de doenças.

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l Formam barreiras visuais

e sonoras, proporcionando privacidade aos habitantes e ambientes.

l Funcionam como elementos

referenciais marcantes para a população.

l Embelezam a cidade,

proporcionando prazer estético e bem-estar psicológico.

l Contribuem para a

melhoria da saúde física e mental dos moradores.


Quanto vale uma árvore?

Considerando o grande potencial das árvores em minimizar os efeitos negativos que ocorrem no meio urbano, para atribuir um valor monetário a elas também é preciso levar em consideração quanto melhor ou pior estará o bem-estar da população com as alterações de bens e serviços ambientais que as árvores podem oferecer. Para isso, é preciso:

l Avaliar o patrimônio que

a cidade possui relativo à sua arborização.

l Estabelecer multas por danos causados às árvores. l Estabelecer indenizações,

deduções e/ou isenção de impostos e taxas como resultados de ações punitivas ou compensatórias. l Estimar um seguro, seja

da própria árvore ou da propriedade relacionada com a presença da árvore no imóvel. l Mensurar os benefícios

e custos dos programas de arborização na busca de recursos orçamentários. l Valorizar um imóvel,

com consequente aumento do patrimônio real de seu proprietário, do corretor e dos envolvidos.

FIQUE POR DENTRO CIDADES MAIS ARBORIZADAS No Censo de 2010, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) elaborou um ranking com os índices de arborização em todas as cidades brasileiras. Para isso, os agentes observaram a quantidade de árvores na rua (quadra) onde estava o domicílio e, se existissem, se elas estavam próximas à residência: - Das quinze cidades brasileiras com mais de um milhão de habitantes, Goiânia ocupou a primeira posição, com 89,5% das ruas arborizadas. Na sequência estão Campinas (SP), com 88,4%; Belo Horizonte (MG), com 83%; Porto Alegre (RS), com 82,9%; e Curitiba, com 76,4%. Na lanterna do ranking, ficaram Manaus (AM), com 25,1%; e Belém (PA), com 22,4%. - Entre as cidades com menos de um milhão de habitantes com maior percentual de domicílios com árvore por perto estão Victor Graeff (RS), com 99,8%; Vitória Brasil (SP), com 99,6%, Almirante Tamandaré do Sul (RS) e Alvorada do Sul (PR), com 99,7% e Analândia (SP) com 99,6%. - Paraná é o estado brasileiro com cidades com maior índice de arborização: são 146 municípios com mais de 95% de ruas arborizadas. A média do estado (77,1%) também superou a nacional (67,4%).

Árvores: são vegetais formados por raízes, tronco, copa, ramos e frutos. Elas surgiram há milhões de anos e apresentam alto grau de complexidade e de adaptação ao meio ambiente.

FONTES/PESQUISA BIBLIOGRÁFICA “Manual de Arborização”, Cemig/Fundação Biodiversitas; BBC; Revista Nature; “Características das Ilhas de Calor em Cidade de Porte Médio: Exemplos de Presidente Prudente (Brasil) e Rennes (França)”, de Margarete Cristiane de Costa Trindade Amorim, Vincent Dubreuil, Hervé Quenol e João Lima Sant’Ana Neto/ Universidade Estadual de Londrina.

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SETEMBRO DE 2015 | ECOLÓGICO  81


1 ECOLÓGICO NAS ESCOLAS - ARBORIZAÇÃO URBANA TRÊS PERGUNTAS PARA...

BENEDITO ABBUD

PLANTAR E CUIDAR Que avaliação o senhor faz dos projetos paisagísticos das cidades brasileiras hoje? O ideal é que as cidades tenham mais parques lineares e sejam planejadas contemplando calçadas mais largas, onde se possa plantar mais árvores e arbustos. Atuo em muitas cidades contemporâneas brasileiras, como São Paulo, com o objetivo de garimpar espaços e oportunidades para implantar projetos de paisagismo com vegetação mais exuberante. É muito importante resgatar a proximidade das pessoas com a natureza, em especial no caso dos habitantes de centros urbanos fortemente adensados, onde o aumento da presença do verde pode proporcionar mais sombra, mais beleza e uma série de benefícios socioambientais - como melhora da qualidade do ar, conforto térmico e acústico, além de proporcionar lindos visuais na paisagem urbana. Em meus novos projetos, procuro adotar soluções para minimizar os efeitos das ilhas de calor nas cidades. Os muros, por exemplo, podem receber jardins verticais e as coberturas, por sua vez, telhados verdes. Como a arborização urbana pode contribuir para uma temperatura mais amena? Nesse sentido, ela é fundamental, porque 90% das cidades brasileiras são de clima predominantemente quente. Por outro lado, há uma questão cultural que precisa ser transformada. Em diversas cidades brasileiras, muitas localizadas no interior, as pessoas ainda acham que plantar árvore pode ser sinônimo de “sujar o quintal”. Esquecem de lembrar que folhas que caem no chão fazem parte de um processo da natureza. Muitas dessas pessoas, inclusive, adoram ir a Paris contemplar as lindas alamedas de árvores que existem na Cidade Luz. Gostaria de ressaltar que a arborização é fundamental porque traz vários benefícios: estabiliza a temperatura, nutre o solo com água regulando o ciclo hídrico, e consequentemente, das chuvas, melhora a umidade e diminui a poluição por partículas, como poeira. Os jardins verticais também são uma boa opção. Neste caso, existem diver82  ECOLÓGICO | SETEMBRO DE 2015

sos tipos de soluções, desde as mais acessíveis, como trepadeiras (falsa-vinha e unha-de-gato), até sistemas que envolvem tecnologia mais avançada. Também há a questão estética que a arborização proporciona: ela harmoniza a paisagem urbana, traz flores, beleza para a cidade. E isso gera dignidade, pois todo mundo gosta de morar em um lugar bonito. De que forma as pessoas podem colaborar para a manutenção de um urbanismo mais sustentável? Plantando mais árvores, preservando o verde. É preciso ter natureza nas cidades e as escolas têm um papel importante nisso. Recentemente, fizemos um levantamento da vegetação municipal em São Paulo e existem locais em que há pouquíssimas árvores, o que resulta em muita aridez. E descobrimos que nesses pontos da cidade, geralmente, tem uma instituição de ensino perto, que fez o plantio dessas poucas árvores que lá existem exatamente para celebrar uma data ecológica, tal como o “Dia da Árvore”. As pessoas precisam seguir esse exemplo, plantar nos quintais, que ainda são pouco usados. Principalmente frutíferas, que atraem pássaros, dão sombras e frutos. Outra dica é estimular as crianças a adotarem uma árvore, plantando-a em casa e dando seu nome a ela. Aí você cria uma identidade forte com a natureza, em que se pode cuidar e ajudar o meio ambiente a se desenvolver. Isso só traz benefício para todos.  SAIBA MAIS www.beneditoabbud.com.br

Nós apoiamos esta iniciativa!

FOTO: DIVULGAÇÃO

Arquiteto paisagista, mestre em Arquitetura e Urbanismo pela USP


Nosso bate papo é com o jovem. Programas temáticos, matérias, bandas e muito mais.

Apresentação Simone Moreira

CALEIDOSCÓPIO ao vivo toda segunda, quarta e sexta, às 17h

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1 VOCÊ SABIA?

BICHO DO MATO

O lobo-guará (Chrysocyon brachyurus) é considerado o animal símbolo do Cerrado. Pode atingir um metro de altura e pesar até 30 kg. Vive cerca de 15 anos na natureza e cada gestação da fêmea dura pouco mais de dois meses, dando origem, em média, a dois filhotes. Além do Brasil, essa espécie pode ser encontrada em regiões da Argentina, Bolívia, Paraguai, Peru e Uruguai.

EM RISCO

O lobo-guará está na “Lista de Espécies Ameaçadas de Extinção” do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio), na categoria “Vulnerável”. Isso significa que o animal enfrenta risco elevado de desaparecimento num futuro bem próximo, caso as circunstâncias que o ameaçam, tal como o desmatamento, a expansão desordenada da agricultura e os atropelamentos, não diminuam.

84  ECOLÓGICO | SETEMBRO DE 2015

FAMA DE MAU

Apesar de carregar o nome temível de “lobo”, o animal é tímido, solitário – anda em companhia apenas na época de reprodução – e é praticamente inofensivo. A fama de atacar galinhas dos proprietários rurais se justifica porque com a destruição de seu hábitat, é cada vez mais difícil encontrar suas presas naturais, como roedores, tatus e perdizes. E, como diz o ditado: “Quem tem fome, tem pressa!”.


O lobo e a lobeira Cristiane Mendonça

redacao@revistaecologico.com.br

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etembro é o mês em que se comemoram duas importantes datas ambientais: “Dia do Cerrado” (11), bioma que concentra oito das 12 bacias hidrográficas do país, e o “Dia da Árvore”(21), que celebra este elemento natural tão importante para o equilíbrio ecológico. Por isso, a Ecológico apresenta dois símbolos que, juntos, mostram como árvores e animais são interdependentes e biodiversificamente integrados: o lobo-guará e a árvore lobeira. Confira:

O BICHO E A PLANTA

Nem só de carne vive o lobo-guará! Ele é onívoro, o que significa que se alimenta também de vegetais. Entre eles, o araticum e, em especial, o fruto da árvore lobeira (Solanum lycocarpum), espécie que carrega esse nome graças à predileção do animal pela planta. E não é apenas o gostinho da lobeira que agrada o guará! O vegetal também exerce no lobo uma atividade vermífuga, fazendo com que ele consiga exterminar um verme que se aloja nos rins e poderia levá-lo à morte! Portanto, os lobos também entendem de alimentação saudável!

FOTO: MARCOS GUIÃO

SIMBIOSE

Como equilíbrio é o segundo nome de natureza, o lobo-guará também é um importante dispersor das sementes da lobeira por meio das fezes. O que significa que, onde falta lobo, falta lobeira. E vice-versa.

SETEMBRO 2015 | ECOLÓGICO  85

ARTE: SANAKAN

LOBEIRA

Se você não conhece essa árvore típica do Cerrado, nós te contamos um pouco mais sobre ela: a lobeira é um vegetal com caule espinhento que pode atingir de três a cinco metros de altura. Produz flores de tom lilás e seu fruto é arredondado, podendo atingir de oito a quinze centímetros. A árvore, também conhecida na cultura popular por suas propriedades medicinais, pode ser encontrada com facilidade nas pastagens. Basta dar uma olhada mais atenta!


ANTONIO BARRETO (*) redacao@revistaecologico.com.br

ARTE: SANAKAN

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OLHAR POÉTICO

CARTA À RE-PRESIDENTA Senhora Re-presidenta, Em primeiro lugar, me desculpe já chamar a senhora assim desse modo meio “de casa”, sabe? Mas é porque o meu pai me explicou que o “re” a gente só usa pra quem gosta muito, muito mesmo, de uma coisa que já fez e aí a gente bota o “re” na frente do nome... Por isso eu imagino que a senhora deve ter gostado pra dedéu de ter sido “presidenta” uma vez e agora virou “re-presidenta”, né? Deve ser que nem aquele tantão de re-deputados e re-senadores que têm aí em Brasília, é ou não é não? Só não entendo uma coisa: por que é que não chamam minha professora de re-professora, a diretora de re-diretora e o meu pai de re-pai ou re-jornalista e a minha mãe de re-mãe? Bom, deixa pra lá. Depois a gente conversa mais sobre isso, tá? Olha, eu estou lhe escrevendo estas mal traçadas linhas porque o ambiente aqui em casa tá irado, muito pinel, parecendo mesmo coisa de maluco de hospício. Tudo por causa dum negócio que aquele outro re-presidente barbudo, antes da senhora, chamou de “marolinha”. E de um tal de “cinto apertado na classe média”. É o que escuto o tempo todo por aqui, sabe? Meu pai tá nervoso. Vive falando que vai arrancar do dicionário a página onde fica o verbo querer e o verbo comprar. E que aqui, agora, todo mundo tem que conjugar é o verbo vender. Ele proibiu também a palavra shopping e as palavras batatas fritas, que são as que eu mais adoro, sabe? Apesar disso, ele ainda tá tomando, devagarzinho, o restinho do seu uísque falsificado que sobrou. E mais: fumando o cotoco do seu

último charuto cubano, que ele ganhou de um amigo que ia pra lá de férias, todo ano. Minha mãe, a única que vive rindo à toa (mas é de nervoso... e acho isso um perigão pras clientes dela, pois ela é manicure), disse que vai aproveitar pra fazer regime obrigatório e emagrecer 11 quilos, já que não tem outro jeito. Minha irmã tá uma arara porque não pode mais viajar pra Miami. Nem pagar a prestação do Palio de 80 vezes que comprou no ano passado. Diz também que se arrependeu de ter acreditado no programa do Flex, porque a gasolina agora tá pelos olhos da cara e muito misturada com álcool, o que tá fazendo o motor dela pifar e engasgar toda hora... sei lá, não entendo bem dessas coisas, sabe? Mas estou te falando assim mesmo porque, sabe?... é que a Carol também disse que não dá mais pra namorar aquele tênis Reebok que ela viu na vitrine. E tou morrendo de dó dela, porque ela é muito namoradeira. Sei que é meio difícil pra uma garota ficar namorando um tênis. Mas é bem possível disso acontecer, nesses casos de desespero da Carol, entendeu? Isso, porque a Carol é fogo na roupa! E quando ela se incendeia, sai dibaixo! Diz ela também que nem dá mais pra usar o perfume importado que a mamãe prometeu pra ela se passar de ano e terminar o namoro com o tal do Bigodão, um cara que só aparece aqui pra azucrinar o Vasco. O Vasco? É o nosso cachorro que não tem mais comida de cachorro. Agora só come o que sobra do almoço, quando sobra. Por isso ele tá muito triste, uivando pra gataria da vizinhança e querendo comer o Dólar, nosso peixinho flutuante do aquário.

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“Se a gente que era da classe média B (e agora virou C), como é que os pobres da classe D (que era E) vão poder continuar a comer frango ou mandar fazer dentadura?” Tem mais. Vó Biluca, coitada, fala que tudo é culpa da da esquina já vende. Tem até alface de japonês lá. Umas falta de religião. E desse tanto de mulher pelada que apa- azuis, outras roxas. E como vou virar padeirinho? Até já rece na televisão. Vô Alcides jura que a TV virou coisa do pesquisei na internet pra ver se tem curso de padeiro diabo que anda solto por aí. Mas ele bem que adora ver lá, mas não achei. Aí, um belo dia, pedi pro meu pai me a mulherada rebolando e tirando uma casca na galera, ensinar. E olha o que ele disse: “Se vira, seu estorvo!”. Eshehehe! E meu primo André? Pra senhora ver, ele nem torvo? Depois ele falou outra coisa esquisita: “Ah, comé conseguiu terminar a sua coleção de figurinhas da Copa que a Ana Maria deixou você escapulir naquela pócue agora já tá obrigado a parar, também, a coleção de la?”. Ana Maria é minha mãe, que agora também só fala boné importado. Coitado! E o tio Bené? Esse tá cuspindo outra palavra esquisita: litigioso. Isso deve ser coisa de marimbondo porque não tem como pagar as prestações intelectual. Meu pai é um intelectual, saca? Desses de da van coreana, uma que ele financiou pra poder fazer oclinhos... Minha mãe também: era psicóloga, antes de transporte alternativo, ou algo assim... Diz que vai de- virar manicure. Mas papai tá mais arara mesmo é porcretar uma tal de moratória até ver se o Banco do Brasil que um amigo dele do governo não avisou que o dólar ia empresta um dinheirinho pra ele, mas com juros justos. subir. Ou ia descer. Na época daquele outro presidente Sei lá o que é isso. Mas deve ser muito sério, pois disse o doido de Alagoas (um que foi impixado, é isso mesmo?), tio Bené que o nome dele já foi cagado no SPC... Me des- o amigo dele avisou. E o papai salvou sua poupança das culpa o palavrão, saiu sem querer. Mas garras da ministra Zélica. Nessa conesse tal de SPC deve ser uma coisa muito fusão toda só tem um tio que tá alegre “Quando crescer, séria mesmo, né? Pois nunca ouvi o tio da vida, o tio Bidu. Isso porque ele tem Bené dizer um palavrão. Foi a primeira um amigo que é amigo de um amigo quero ser um vez. E a tia Zilá? Essa, que é muito fervo- re-presidento. Dá pra dele, que é amigo de um político imrosa com Deus, falou que tá preocupada portante de Brasília. Que por sua vez é com os pobres. Tipo assim: se a gente senhora me dar umas é ligado com um tal de Senhor Menque era da classe média B (e agora virou dicas de como é que se salão e outro tal de Senhor Petrolão... C), não consegue mais pagar as coisas, não entendi bem. Mas deve ser genfaz para chegar lá?” te muito influente mesmo, pois o tio como é que os pobres da classe média D (que era E...) vão poder continuar a coBidu não está nem aí pra nada. Ufs! mer frango, iogurte e mandar fazer dentadura nova ou Finalizando, senhora re-presidenta, só queria lhe botar implante? E pediu pra falar também que dó mes- pedir mais uma coisa que pra mim é fundamental. mo ela tem é da sua empregada (a Bilurdes), que não tem Não sei mais viver sem shopping e, principalmente, mais como passar as férias no exterior, no Haiti, se não sem batatas fritas. Por favor, manda abaixar o preço me engano... Ô, coitada! Disse que aquilo foi tudo culpa dos produtos importados, como as batatas fritas da de um colega seu, um tal de Efeagacê, que também já foi China! Em troca eu prometo que, quando chegar a re-presidente e coisital. É isso mesmo? hora e eu já estiver na idade de votar, eu voto na seÓ. Só pra senhora ter uma ideia, o papai tá uma pi- nhora! Ou em quem a senhora mandar votar. Meslha tão grande que já ameaçou cortar a assinatura da TV mo que a senhora não tenha mais nenhum partido, a cabo, da internet banda larga e do jornal. Disse que viu? Um abraço do Birica, que é o meu apelido aqui quer virar bicho do mato, ripi... cabeludo, ignorante. Ou de casa. Mas pode me chamar de Biribinha, que é o avestruz... Não entendi bem. Papai aí re-falou que não meu outro apelido lá da escola. Aliás, pra agradar a suporta mais ver tanta propaganda mentirosa do gover- senhora, vou confessar uma coisa. Mas fica só enno. Que não aguenta mais trabalhar seis meses do ano tre nós, viu? (Porque senão a turma da escola cai de só pra pagar imposto e que o impostômetro já passou gozação em cima de mim...) Pssssssssssiu! Chega o dos três zilhões. E que não sabe como me declarar nos ouvido aqui: quando eu crescer, também quero ser abatimentos do Imposto de Renda, pois eu não tenho um re-presidento... Dá pra senhora me dar umas direnda nenhuma de dependente. Eu bem que podia es- cas de como é que se faz pra chegar até aí? Obrigado, tar trabalhando, que nem ele, quando tinha a minha desde já, pela sua ajuda. E prometo que, quando eu idade. Ele era engraxate, vendedor de alface e padeiri- for re-presidento, eu respondo as suas cartas, viu?  nho... E naquele tempo não tinha o Estatuto da Criança, né? Então eu fico me perguntando: como vou fazer pra engraxar tênis? Todo mundo só usa tênis, não é? E tênis (*) Autor de “A Noite é um Circo sem Lona” (Editora RHJ). antonioba@uol.com.br | facebook.com/antonio.barreto.12139 não leva graxa. Como vou vender alface? O sacolão ali

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NATUREZA MEDICINAL MARCOS GUIÃO (*) redacao@revistaecologico.com.br

MIL-EM-RAMA

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plantar a mil-em-rama lá na escola! Meus colegas machucam demais...”. De outra feita, uma moça da capital se arranchou numa pequena casa da vizinhança por uns meses, trazendo consigo sua filhinha de uns três anos, menina linda de cabelos ruivos cacheados, aparentada com um anjinho barroco. Sem maldade no olhar e encantada em suas descobertas, logo nos primeiros dias levou a mão numa colorida lagarta de fogo. De repente, a mãe entrou lá em casa em polvorosa com a criança aos prantos. Mais uma vez lancei mão da mil-em-rama e quase imediatamente a garotinha cessou o choro, enquanto olhava maravilhada para a pasta esverdeada em seus dedos. Pois é assim, no simples do remédio está o alívio. Inté a próxima lua!  (*) Jornalista e consultor em plantas medicinais.

FOTO: MARCOS GUIÃO

iver na roça muitas vezes significa se tornar um faz-tudo em pequenos reparos do dia a dia. Numa dessas, resolvi lixar um antigo móvel na esperança de melhorar sua aparência. Consegui uma lixadeira elétrica emprestada e lá fui dar jeito na coisa transvestido de marceneiro. Num demorou minutos e tomei uma ralapada por riba do dedo indicador da mão esquerda, que me deixou sem assunto e descabeceado com a tanteira da dor. Quando olhei, a pele tinha sumido e, no lugar, tava branco. Era o osso! Mas quase imediatamente deu de brotar uma mina de sangue ardido que queimava feito brasa. Tive de interromper a faina e saí na busca de recurso para estancar meu sofrimento. Ao passar ao lado da horta, já colhi um maço das folhas de mil-em-rama (Achilleia millefolium), piquei miúdo, despejei dentro de um pilão e soquei. Aos poucos foi brotando o sumo, que aumentei com um tiquim de água filtrada. Numa gamelinha à parte, coloquei uma colher de argila, abrindo no meio como se fosse fazer uma massa de pedreiro. Despejei ali o sumo da planta, misturei bem até virar uma pasta homogênea e maleável, envolvendo meu dedo naquela mistura. Ufh! Que alívio... A queimação aos poucos foi desaparecendo com a friagem da argila e a ação analgésica da mil-em-rama, também chamada de mil-folhas e de novalgina, devido justamente a essa propriedade de aliviar os quadros de dor. Me deitei na rede da varanda e fiquei remoendo as muitas vezes em que usei esta planta nos casos de dor intensa. Certa vez, meu filhote Chico saiu pelo quintal com uma varinha cutucando tudo que via, até se dar numa touceira de bromélia. Deu uma varada numa delas e de lá saiu uma ruma daqueles marimbondos da bunda amarela, que lhe aplicaram meia dúzia de doloridas pregadas. Berrando, Chico veio pelo quintal me mostrando o braço cheio de calombos avermelhados enquanto grossas lágrimas desciam pelo rosto e ele tentava me falar alguma coisa ininteligível. Imediatamente compreendi a situação, e o conduzi até a touceira de mil-em-rama, onde arranquei umas folhas, levei até a boca, mastiguei e despejei aquela pasta por cima dos calombos. Aos poucos, ele foi sossegando o choro. E, me olhando com a “seriedade” de seus oito anos, disse: “Pai, temos de

MIL-EM-RAMA (Achilleia millefolium)


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1 ENSAIO FOTOGRÁFICO

"PNEUS", SESEÑA, TOLEDO, ESPANHA Pedro Armestre

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INSUSTENTÁVEL

DISPARIDADE Mostra fotográfica apresenta imagens que exibem a dualidade entre a miséria e o desperdício em várias regiões da Terra Cristiane Mendonça

redacao@revistaecologico.com.br

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e concentrássemos a história do nosso planeta em um único ano, os humanos teriam surgido nos últimos 23 minutos. Mas, e infelizmente, teriam consumido um terço dos recursos terrestres nos últimos dois décimos de segundo. Essa informação poderia ser mais um daqueles dados estarrecedores que esqueceríamos no dia seguinte ao sabermos de novas notícias. Mas ela acompanha mais de 60 imagens e vídeos de 34 fotógrafos, de 14 países, que integram a mostra “Escassez/ Desperdício” - uma coletânea visual que retrata a crueza do impacto negativo que o ser humano deixa pela Terra, gerando tristes disparidades. A mostra trouxe imagens que foram produzidas para a segunda edição do “Prêmio Syngenta de Fotografia”, um concurso internacional realizado em Londres (Reino Unido) e que visa promover a conscientização dos desafios que nós,

seres humanos, impomos à nossa casa comum, o planeta Terra. Dividida em quatro salas temáticas, com os títulos “Planeta sob pressão”, “Nossa pegada”, “Desperdício de alimentos” e “Moldando nosso futuro”, a exposição apresenta fotografias que mostram o cotidiano distinto de vários lugares e pessoas. Por exemplo, mulheres em Serra Leoa - aglomeradas num valão – lutando para pegar a única água (que é suja) disponível. Uma americana de 273 kg que vive em Nova Jersey (EUA). O lixo transbordando de um contêiner em um festival de rua em Ohio, também nos Estados Unidos, em contraste com a imagem de crianças brincando na Baía de Manila, nas Filipinas, com toneladas de lixo que chegam por dia em seus arredores. Impossível não se perguntar sobre o que realmente é essencial para vivermos bem. A Ecológico selecionou algumas imagens da exposição para que você também reflita sobre a

FIQUE POR DENTRO A exposição passou por São Paulo e Belo Horizonte e agora segue para o Rio de Janeiro, onde permanecerá até 11 de outubro. Para ela se tornar ainda mais marcante para os participantes, foi criado um programa educativo que oferece visitas mediadas, oficinas e outras atividades que utilizam a fotografia como ferramenta para desenvolver um pensamento crítico e reflexivo sobre o mundo em que vivemos. Para agendar visitas em grupo, é preciso entrar em contato pelo e-mail: escassez-desperdicio@ tudocultural.com.br

SAIBA MAIS

www.syngentaphoto.com.br

pegada ecológica que deixamos pelo planeta. Acompanhe a seguir.

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1 ENSAIO FOTOGRÁFICO

"MONTANHA SMOKEY", MANILA, FILIPINAS Lasse Bak Mejlvang

"DONNA SIMPSON GLOBESIDADE NOS ESTADOS UNIDOS", NOVA JERSEY (EUA) Bénédicte Desrus

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"SECA NO QUÊNIA", Stefano De Luigi

"LIXÃO DE FREETOWN", SERRA LEOA Mustafah Abdulaziz

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MEMÓRIA ILUMINADA - NEIL YOUNG

FOTO: SANAKAN

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OS ANOS MONSANTO Em novo disco, astro do rock canadense critica diretamente a fabricante de agrotóxicos e sementes transgênicas Luciano Lopes

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FOTO: NEIL MEN ALIVE

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unca um artista da música internaUm dos ícones da contracultura, Neil cional condenou tão forte e dire- Percival Young nasceu em Toronto, Canatamente uma empresa, a ponto de dá, em 1945, e tem um histórico de canções ela ser o tema principal de um disco, como de protesto. “For What It’s Worth” (“Por que Neil Young. Em seu novo álbum, “The Mon- vale a pena”), por exemplo, lançada em santo Years”, ele utiliza a própria arte como 1967 quando o cantor ainda pertencia à manifesto: as letras profundas e reflexivas banda folk Buffalo Springfield, tornou-se são uma crítica voraz e justificada à gigante símbolo contra a Guerra do Vietnã e conmundial das sementes transgênicas e dos frontos civis e foi trilha de filmes como agrotóxicos (e ao impacto que eles causam “Forrest Gump” (1994). à saúde humana e ao meio ambiente). Mas a metralhadora poética de Young no O álbum, gravado com a banda Promi- novo álbum, que tem forte apelo ambiense Of The Real, começa com a ótima “A tal, não mira apenas na Monsanto. AcerNew Day For Love” (“Um Novo Dia para ta também a Starbucks, que comercializa Amar”), um convite para que os ouvintes, produtos cuja matéria-prima são alimenespecialmente aqueles que são produto- tos geneticamente modificados comprares rurais, mantenham suas terras longe dos da Monsanto. E ainda políticos, juízes, da ganância – de empresários e políticos leis e a sociedade corrompidos pelo dinheiantiecológicos que só enxergam um dos ro. “Eles não querem cair/ e quando caem/ lados no tripé da sustentabilidade no tra- caem em você. Muito grandes para falhar/ to com a terra: o econômico. ricos demais para serem presos.” Isso fica ainda mais evidente quando a A seguir, a Ecológico coletânea de canções inéditas atinge seu selecionou alguns treápice com o hit que dá nome ao disco: chos das canções “Você nunca sabe o que o futuro reserva no de “The Monsolo raso da Monsanto”, destila a primeira santo Years” e linha da música. E emenda: “As sementes de entrevistas da família que eles costumavam guardar de Neil Young eram presentes de Deus, não da Monsanto/ que revelam Seus filhos ficam doentes perto das colheiseu espírito tas envenenadas/ Enquanto trabalham, contestador. não conseguem encontrar um jeito simples Confira: de parar a Monsanto”. NEIL YOUNG: Logo “É nisso que acredito: que o na natureza” álbum saiu, a empresa emitiu uma nota à imprensa: “Muitos de nós da Monsanto somos fãs de Neil Young. Infelizmente, para alguns, o seu álbum atual deixa de refletir as nossas crenças fortes no que fazemos todos os dias para ajudar a tornar a agricultura mais sustentável. Reconhecemos que há muita desinformação sobre quem somos e o que fazemos – e vários desses mitos parecem ser capturados nessas letras”.

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MEMÓRIA ILUMINADA - NEIL YOUNG FOTO: ECOLOGICO

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“O que vai acontecer quando todas as casas próximas ao mar forem destruídas? Para onde essas pessoas vão? Vão se voltar contra os que continuam tendo casa. Vai ser um tumulto. Ninguém vai ajudar seus semelhantes.” l UM NOVO DIA “É um novo dia para o planeta/ um novo dia para o amor. É um dia ruim para fazer nada/ com tantas pessoas precisando de sua ajuda/ para manter suas terras longe dos gananciosos/ que saqueiam para si o mundo inteiro.” l LIBERDADE “Nas ruas, as corporações do capital estão assumindo o controle./ A democracia esmagada em seus pés/ o dinheiro flui livre no céu para aqueles que vêm junto com ele./ Mas, de alguma forma, nós vamos prevalecer./ E agora/ como podemos recuperar a nossa liberdade/ que perdemos com as nossas próprias leis que devíamos obedecer?/ Quando é que vamos ter de volta nossa liberdade/ para escolher a maneira como vivemos e morremos?” “Dos campos de Nebraska às margens do Ohio/ os fazendeiros não estão livres para fazer germinar o que eles querem/ quando as corporações assumem a fazenda americana/ com os políticos fascistas e as gigantes químicas caminhando de braços dados./ Monsanto, deixe os nossos agricultores cultivarem o que quiserem.” l CONTRADIÇÃO “Se eu não sei o que estou fazendo/ e todas as minhas grandes ideias falham/ por que gostar de construir uma barragem contra a água do rio que morre?/ Se eu não sei o que estou fazendo/ e todos os sonhos do mundo se tornarem realidade/ por que procurar petróleo e disparar veneno no solo? As veias têm o sangue da Terra.”

l AMOR “As pessoas querem ouvir canções de amor./ Não fale sobre os milhões da Chevron indo para os políticos de gasodutos./ Não fale sobre o belo peixe que está morrendo no profundo mar azul./ Não fale sobre as corporações que sequestram todos os seus direitos./ Não diga que pesticidas estão provocando autismo nas crianças./ Não diga que as pessoas não votam porque eles não confiam nos candidatos./ As pessoas querem ouvir sobre o amor.” l SEMENTES “Ninguém é dono da semente sagrada/ lei nenhuma pode mudar isso./ As sementes são vida que não pode ser detida/ nem mesmo pela Monsanto./ As pessoas devem ser livres para crescer.” l NATUREZA “É nisso que acredito: na natureza. Esta é a minha igreja. Quando vou à floresta, a um grande campo verde ou à água, não preciso de nenhum pregador.” l LUA “Sempre me identifiquei com os ciclos da lua. E era isso que os índios faziam: ‘Faz quantas luas que você esteve aqui?’. Tem tudo a ver com a lua. Se estou gravando, espero a lua. Sempre tem algo lá, um tipo de energia, nos três ou quatro dias que antecedem a lua cheia. Assim que ela começa a minguar, você perde a concentração. Então, paro nessa época.”

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“Você nunca sabe o que o futuro reserva no solo raso da Monsanto. A lua está cheia e as sementes são semeadas, enquanto o agricultor labuta para a Monsanto. Quando essas sementes crescerem, elas estarão prontas para o pesticida. E o Roundup vem e traz a maré de veneno da Monsanto. O agricultor sabe que ele tem de aumentar para poder vender. Assim, ele assina um contrato com a Monsanto, que faz da vida um inferno. Cada ano ele compra a semente patenteada, veneno pronto que é o que a Monsanto precisa. Quando você for comprar o pão de cada dia e andar pelos corredores da Safeway, procurando a mercadoria que prenda seus olhos e te faça sorrir, escolha a imagem de um velho celeiro vermelho em um campo verde, com o fazendeiro, sua esposa e seus filhos para completar a cena. Sonhos do passado vêm à tona na mente do fazendeiro, seu pai e sua mãe. Sementes da família que eles usaram para salvar e eram presentes de Deus, não da Monsanto. Seu próprio filho doente cresce perto das culturas, envenenado. Enquanto eles trabalham, não conseguem encontrar uma maneira fácil de parar a Monsanto. Não me importa agora quando a Bíblia diz que há muito tempo. Dai-nos o nosso pão de cada dia e não nos deixe com a Monsanto. As sementes da vida não são o que antes eram. A Mãe Natureza e Deus não as possuem mais.”

l HIPPIES “Os hippies exerceram alguma influência? Claro que sim - paz e amor. Nós éramos isso. Mas hoje é fácil fazer graça com qualquer coisa. A mídia parece um pátio de escola gigantesco. Um garoto manco entra ali e todo mundo começa a chutá-lo. Fazemos piada com pessoas que são diferentes. Você pode fazer a mesma coisa que faz com um hippie ou um caipira.” l MUDANÇA “Nosso país [Canadá] é um dos últimos a perceber

FOTO: REPRODUÇÃO

“THE MONSANTO YEARS”

que o aquecimento global é causado pelas pessoas. Não vai sobrar muito para os nossos netos se prosseguirmos nesse caminho. Quando a minha filha estiver com 50 anos e os filhos dela estiverem crescidos, a diferença entre o mundo agora e como ele era nos anos 1960 vai parecer três dias na comparação com o que vem por aí. O que vai acontecer quando todas as casas próximas ao mar forem destruídas? Para onde essas pessoas vão? Vão se voltar contra os que continuam tendo casa. Vai ser um tumulto. Ninguém vai ajudar seus semelhantes. Paz e amor? Isso não vai acontecer, não nesse ambiente. Muita gente precisa mudar.” l IDEOLOGIA “A vida é assim. Você precisa estar envolvido em alguma coisa com várias outras pessoas, identificando-se com algo que só você e elas compreendem. É isso que os jovens estão sempre tentando achar: algo que os separe de seus pais e do resto da cultura dominante.” l MENSAGEM “Não tem nada específico que eu possa dizer, além de ‘faça aquilo em que você acredita e tente acreditar em tudo que faz’. Funciona para mim até hoje.”  SAIBA MAIS www.neilyoung.com

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CORAÇÃO DA TERRA DÉA JANUZZI (*) redacao@revistaecologico.com.br

NÉCTAR DA VIDA E

la tem uma estranha mania: não pode receber rosas vermelhas de presente. Começa a coçar o corpo todo, fica toda empolada. A língua engrossa, as mãos se agitam. Ela, então, tira pétala por pétala, despedaça a rosa com fervor, quase em êxtase, e come uma por uma, como se degustasse um pão com manteiga. A mania de comer rosas começou no dia em que o pai dela morreu. No velório, para fugir da dor que começava na ponta dos pés, subia pelo estômago, invadia o coração e arrepiava os cabelos, ela fixava os olhos nas corbelhas de rosas, até ver nuvens de pétalas. Sem olhar para os lados nem para frente, ela se perdia entre o mar de rosas vermelhas e a agonia de ter perdido o pai. Sem entender a ânsia de voar até as rosas, ela se escondeu atrás de uma corbelha e puxou a primeira rosa. Esgueirando-se dos presentes no velório, ela foi se esconder no banheiro com uma rosa inteira. Sem entender bem, começou a devorá-la, pétala por pétala, com uma fome nova, dessas que deixam um buraco no estômago e na alma. Comeu a rosa inteira, num ritual de deixar qualquer um boquiaberto. Farta de rosa, saiu do banheiro plena, perfumada, adocicada, sem aquela angústia que adormecia todas as partes do corpo dela. A rosa foi um bálsamo, como se depois de devorá-la tivesse trapaceado a morte e a dor. Conseguiu sobreviver, então, até o final, com aquela sensação de que as rosas queriam dizer algo mais. Seguiu o féretro. Viu cada rosa descer sobre a sepultura, em sinal de despedida, de amor, de respeito. Os olhos pingaram de dor, os gritos cortaram o ar, pois não existe nenhum adeus pior do que o da morte.

Dias depois, ela continuava com aquele estranho desejo de comer as rosas que recebia de presente, em aniversários, datas importantes. Não importava de onde e de quem viessem as rosas. Ela adorava recebê-las, em sinal de amor, de comemoração, de felicitações, de bem-querer. As rosas são como chocolates, servem de presente quando não se sabe o que oferecer ao outro. Não são personalizadas. Parecem ser a melhor opção para agradar alguém que não se conhece. Uma flor roubada pode dizer mais do que mil palavras. É melhor do que cartão, é como beijo roubado, surpreendente. Quem sabe do outro, se está de dieta ou não, se prefere um convite para jantar no japonês, se é a presença que agrada mais do que o próprio presente, ninguém sabe como presentear pessoas que não são íntimas. Vem sempre esse negócio de flor e chocolate, como se todas as mulheres agradassem desses presentes tão impessoais. Mas ela quer dizer que há muito tempo não come rosas. Passou boa parte da vida devorando pétalas para espantar a dor de ter perdido o pai, mas hoje só come flor em dias muitos especiais, como o “Dia Internacional da Mulher”, em que as flores surgem do nada, só para marcar uma data. Aí, ela pensa, olha para a rosa e tem vontade de devorar uma por uma, para deixar de sentir tanta dor escondida no peito. Aí, tudo volta. Ela lembra que a dor é vermelha e tem cheiro de flor. Ela sente no corpo toda a dor de ter perdido o pai em meio a tantas rosas. E devora, sem pensar, cada pétala, como se pudesse sugar o néctar da vida. 

(*) Jornalista e escritora.

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O ponto de encontro dos

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sustentabilidade

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