Revista ECOLÓGICO - Edição 60 - Amor de Fotógrafo

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olhar poético Antonio Barreto

JOGAI POR NÓS, SENHOR! (Oração do torcedor que sofre, mas vence!)

l Senhor, eu que só como o pão que o diabo amassa, que só bebo água com veneno e fumaça, que só levo chumbo e bala de borracha, que já pago imposto do próprio oxigênio, que respiro desgraça com gás lacrimogêneo (em suas mãos me entrego)... E de coração aberto, ajoelhado, confesso: sou torcedor-sofredor, mas sofro calado. Yes, I C.A.M. Sou Cock, sou Crazy! Sou Galo, sou doido! Já gastei até o meu último trocado pra ver se esse time dá algum resultado e no final da rodada seja classificado... Porém, se necessário, Senhor, eu Vos faço outro sacrifício: nunca mais espero que alguém me repasse o dinheiro perdido (remédio e farmácia). E o salário comido de imposto e trapaça. Sou voto vencido, batido de pronto. Mas passado do ponto, rebato o meu ponto de camelô na praça, arranhado de gato, correndo igual lebre, roendo desgrama e tremendo de febre, perrengue de dengue, mas ficando de pé, molengo de banda, ou machão-jacaré, pregado no chão e fugindo da raia, nadando na terra... ou morrendo na praia. Vos peço, Senhor: um pouquinho de sucesso. E que esse time-em-tormento, com tal sofrimento, se torne feroz, atacante e veloz! Escutai minha voz, Senhor! E JOGAI POR NÓS!

l Fazei com que o goleiro do meu time continue sempre em seu dedicado regime. E nunca mais degluta nas suas redes aqueles perus assados, aquelas farofas de frango. E se transforme, da noite para o dia, num homem-de-borracha. Ou num orangotango! E JOGAI POR NÓS! l Fazei com que os beques do meu time nunca mais pensem na grana, naquelas meninas e naquelas canjebrinas. E se transformem, da noite para o dia, em quatro muralhas da China! E JOGAI POR NÓS! l Fazei com que os volantes do meu time não voltem nunca mais a passear na grama quais caranguejos mancos, de marcha a ré. E se transformem, da noite para o dia, em carregadores de piano, com a bola no pé! E JOGAI POR NÓS! l Fazei com que os atacantes do meu time não chutem mais, e de graça, nossa esperança pra fora. Ela não acabou! Transformai-os, Senhor, da noite para o dia, em maestros de uma ópera: a Ópera do Gol! E JOGAI POR NÓS! l Finalmente, Senhor, eu Vos peço, um milagre aritmético: pelas minhas cicatrizes! Quero vencer o jogo, o campeonato. Quero dias felizes! Para isso, ajoelhado, imploro: iluminai com seu halo a matemática rococó da cabeçaminhocuçu dos cartolas e dos juízes! Que eu ainda quero cantar de Galo, Senhor! Mas não esse cantar minhococó, ou esse piu-piu discreto de pinto-sem-lixo! Eu quero o luxo, Senhor, de um torcedor raçudo, porém correto, de competição. E direto e reto ribombar no estádio repleto os gritos do meu coração: SOU CAMPEÃO! SOU CAMPEÃO! SOU CAMPEÃO!  BRUNO CANTINI

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os felizes sofredores: Ronald Claver, Vivina de Assis Viana, Antonieta Cunha e Ronaldo Guimarães, galodoidos que nem eu. À memória do amigo Roberto Drummond, que mudava a direção do vento quando o Galo entrava em campo. Para São Vitor, guardião e anjo-da-guarda-mor, voador e pegador de pênalti! E para todos os torcedores do Clube Atlético Mineiro, que na noite de 24 de julho de 2013 se sagraram Campeões da Copa Libertadores da América!

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