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MÉDICOS ESTRANGEIROS

Sou Renato Bandeira de Mello, 40 anos, de Porto Alegre, capital do Estado mais ao sul do Brasil. Sou médico geriatra, professor da UFRGS, preceptor das residências de clínica médica e geriatria do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Além da contínua ação assistencial junto às equipes médicas em linha de frente, como diretor científico da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, trabalho continuamente para garantir visibilidade, qualidade de cuidado e prevenção ao etarismo para a população mais afetada pela pandemia: os idosos.

Atuei junto a sociedades médicas e prestei consultoria voluntários a organismos governamentais durante desenvolvimento de protocolos e programação de ações de prevenção e combate ao coronavírus, sobretudo aquelas direcionadas ao público idoso.

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O que acha da abordagem socio-política políticas, uma crise entre poderes não vista do Brazil perante esta pandemia? desde o golpe militar de 1964. Não bastasse

A abordagem sócio-política no país tem tudo isso, surgem notícias sobre corrupção sido muito heterogênea e motivo de atritos ativa de governadores estaduais na compra políticos em momento tão complexo para a de ventiladores mecânicos para o tratamento sociedade. Houve mobilizações maciças dos da COVID-19. governos estaduais e prefeituras para garantir Apesar disso tudo, a mensagem que quero distanciamento social, prevenção e tratamenpassar é positiva, pois vê-se como nunca a deto através de árduo preparo. Inicialmente o dicação do povo aos seus semelhantes, a sogoverno federal, na figura do então ministro lidariedade e, sobretudo, a esperança de dias da saúde, desenvolveu e promoveu ações sómelhores. lidas e transparentes para guiar as secretarias estaduais de saúde; o ministério da fazendo Quais as maiores diferenças de combate desenvolveu ações de apoio financeiro aos ao COVID-19 que encontrou entre o Brasil e mais pobres, sobretudo aqueles que depeno resto do mundo? diam de trabalhos informais para sustentar Em um país continental, com tantas distinsuas famílias (cerca de 40% dos brasileiro não tas culturas e desigualdade social, financeira tem trabalho com vínculo empregatício). Ene educacional, fica difícil apontar diferenças tretanto, lamentavelmente, aquele que fora no combate à COVID-19 em relação a outros eleito para ser o maior líder do país, presidenpaíses, pois internamente há distintas resposte Jair Bolsonaro, em um dos momentos mais tas ao desafio. Contudo, alguns excelentes difíceis da história sanitária do Brasil, baseado exemplos surgiram: em meu Estado natal, em suas crenças, seus instintos paranóides o governo, apoiado por médicos, cientistas, e ignorando a comunidade científica nacioeconomistas e tantos outros profissionais técnal e internacional, constantemente advoga nicos, montou plano de ação baseada na incontra a gravidade da situação - inclusive tacidência da doença e no equilíbrio entre núxou a condição de “gripezinha”, minimizou a mero de casos e estrutura de suporte crítico perda de vidas. Demitiu o ministro da saúde, (leitos de CTI disponíveis). Com tais parâmeque ofuscava seu “brilho”; De forma dura ao tros estabelecidos, as cores verde, amarelo povo brasileiro, criou cenário de desavenças e vermelho sinalizam o nível de medidas de contingenciamento e distanciamento social. Assim, conseguiu-se controlar a propagação da doença com maior segurança sanitária e econômica. O modelo agora ganhou visibilidade e está sendo adotado por outros estados da federação nacional e, inclusive, por outros países (Inglaterra estuda sua implementação). Porém, nos estados com menos recursos concentram-se as maiores barreira; lá se percebe descontrole da doença e número significativo de perdas. O Norte e Nordeste do país, principalmente a região amazônica, detém as maiores taxas de morte para cada 100 mil habitantes. A carente estrutura de saúde rapidamente entrou em colapso e o cenário foi devastador. Por outro lado, em São Paulo, estado mais rico, mesmo diante do suporte estatal, a alta concentração demográfica e desigualdade social alçaram números alarmantes da doença. No estado do Rio de Janeiro, em que as mazelas sociais são incontáveis, a COVID-19 “atropelou” o sistema de saúde, colocando seu povo em situação de relevante vulnerabilidade. A cidade do Rio de Janeiro, outrora valorizada por suas belezas naturais, ganha manchetes tristes e impactantes mundo a fora.

Como a pandemia chegou aqui muito depois do que na Europa, tivemos tempo para nos prepararmos com equipamentos de proteção individual e aparelhagem dos hospitais, tanto que o colapso do sistema é restrito a dois ou três pontos do Brasil. As condições de trabalho, em linhas gerais, apesar de árduas pela própria característica da doença, tem sido favoráveis no que tange a proteção dos trabalhadores.

Qual será, na sua opinião, o maior desafio que o Brasil vai enfrentar para a estabilização da pandemia?

O maior desafio para estabilização da pandemia por aqui é, sem dúvidas, a desigualdade. Enquanto cidades e Estados e seus nichos mais ricos têm acesso aos EPIs, às informações e ao sistema de saúde, uma grande população pobre pena para, além de se proteger da doença, conseguir sustentar suas famílias e colocar comida na mesa. A desaceleração econômica e a necessidade de distanciamento social atingiram em cheio os que menos resiliência tinham. Não bastasse o desafio de frear a pandemia, a maior dificuldade talvez será enfrentar a onda de fragilização sócio-econômica advinda da crise peri-coronavirus.

Que impacto é que esta pandemia terá para o futuro da Humanidade?

Não sou dos mais preparados filósofos para responder a essa pergunta! Mas minha percepção como indivíduo é que o mundo e a humanidade se transformarão. Em perspectiva positiva, vejo a valorização das relações interpessoais como maior legado da pandemia. A aproximação afetiva será uma “sequela” do distanciamento agora imposto. Haverá também maior valorização das produções locais; maior conscientização para suporte das economias locais. Talvez o globalismo seja posto em xeque e tenha que se reinventar.

E certamente a conexão digital, as reuniões à distância, o home office vieram para ficar e se desenvolver. Vejo nisso uma grande oportunidade para o desenvolvimento sustentável da humanidade.

Entrevista a Dr Chunming Yan, médico de Medicina Tradicional chinesa, e diretor do Centro de Europeu de Cultura de Medicina Tradicional Chinesa, que tentou sensibilizar os portugueses usando todos os meios ao seu alcance, assim que regressou das suas férias na China, onde teve contacto com a realidade do Covid-19, antes mesmo de este atingir Portugal. Atuei junto a sociedades médicas e prestei consultoria voluntários a organismos governamentais durante desenvolvimento de protocolos e programação de ações de prevenção e combate ao coronavírus, sobretudo aquelas direcionadas ao público idoso.

Como o Dr. Yan diz nas suas recentes entrevistas, as pessoas ao início estavam um pouco indiferentes e despreocupadas em relação ao COVID-19. Porque é que acha que isto aconteceu? Estará, de certa forma, relacionado com alguma falha a nível de literacia em saúde?

Penso que o primeiro é a falta de conhecimento do sistema saude público da China, pensavam que o sistema saúde da China é muito fraco e, por engano, e achavam que o sistema saúde público da UE é muito bom. Mas, na verdade, não é, o sistema saude da China já é relativamente forte e o na Europa não é tão bom. O segundo ponto é o engano de especialistas médicos ou especialistas em vírus. As pessoas comuns não têm um bom entendimento desta doença epidêmica, mas alguns especialistas fizeram conclusões aleatórias sobre esse novo vírus na ausência de conhecimento suficiente, esses comentários inadequados podem engananar muitas pessoas. tal como um médico e professor catedrático em Saúde Pública na Universidade Nova, falou ao JN sobre o novo coronavírus. “Covid-19 “é menos perigoso do que vírus da gripe”;e outra pneumologista referiu ainda que “não faz nenhum sentido que a população use máscara”. Agora a realidade confirmou que eles eram errados.

Quão importante é a sensibilização por parte dos médicos para a população em geral?

Como mencionei acima, as declarações erradas de médicos ou especialistas enganaram muitas pessoas comuns. Posso dizer que muitas vidas inocentes morreram, e esses médicos e especialistas têm certas responsabilidades. É um novo vírus: até hoje, os cientistas de todo o mundo ainda estão cheios de dúvidas sobre esste. Em Fevereiro, esses supostos especialistas não tiveram contato direto com o vírus. Como eles poderiam facilmente chegar a uma conclusão? A resposta de Portugal à epidemia foi muito lento no início: por exemplo, sobre o uso de máscaras, foi dito repetidamente que não era necessário, e que era necessário, e as pessoas estavam perdidas. A equipa dos médicos e enfermeiros trabalham muito pela crise, como habitante português, temos de agradecer aos profissionais da saúde.

Quais as maiores diferenças que encontrou entre a China e Portugal na maneira de lidar com o Covid-19?

Os sistemas da China e de Portugal são completamente diferentes, não precisamos discutir qual sistema é melhor, mas acredito que cada sistema tem seu lado bom e o lado menos bom. Quando a China começou o surto, tomou rapidamente medidas nacionais, como isolamento e estabelecimento de hospitais da campanha para tratar não apenas pacientes confirmados, mas também os suspeitos, e depois controlaram um pouco o movimento das pessoas. Em primeiro lugar, cortou a fonte de infecção e a via de transmissão e protegeu as pessoas susceptíveis; e, em seguida, no tratamento, a China usou a medicina moderna e a medicina tradicional chinesa para tratá-lo ao mesmo tempo.A prática provou que o efeito é melhor. Hoje, olhamos para trás e vemos que o controlo da epidemia pela China é muito bem-sucedido. Um país com uma população de 1,4 bilhão tem apenas mais de 80.000 pacientes; enquanto Portugal tem apenas 10 milhões de pessoas, já teve mais de 30.000 casos; Portugal não é o melhor exemplo do mundo, mas fez um bom trabalho relativa aos outros países europeus. A situação do outros países prova que a resposta da Europa à epidemia falhou em geral no início.

Qual será o maior desafio que Portugal enfrentará com a estabilização da pandemia no país em comparação com a China?

Pode-se dizer que a China ultrapassou a epidemia, embora existam alguns casos, mas em geral, a está gradualmente retornando à vida e ao trabalho normais. Muitas cidades já não há necessidade de usar uma máscara e não há casos de covid-19.

Portugal, acho que é imprevisível, as pessoas não serão mais isoladas de suas casas em nome da liberdade, e o governo começará a reabrir atividades sociais devido à economia, por isso os casos continuarão a aumentar a curto prazo. Não podemos prever quando desaparecerá completamente. Pessoalmente, espero que desapareça em agosto ou setembro. Mas se não for bom, haverá um segundo surto. No início, a crise era só pandemia; mas agora também é economia, Portugal terá uma fase de 2 ou 3 anos muito difícil.

Entrevista ao Doutor Ciro Lamberti, especialista em Medicina de Emergência em Itália.

Em que hospital trabalha e como é a sua rotina diária como médico? Também trabalha em medicina de emergência pré-hospitalar?

Sempre trabalhei em medicina pré-hospitalar em Salerno, mas durante a emergência de Covid-19 tive de ir para o hospital “San Giovanni di Dio e Ruggi d’Aragona”, na mesma cidade. Todos os dias enfrento turnos de 12 horas, durante dia ou noite, com muitas visitas a dezenas de pacientes.

Já que a Medicina de Emergência é uma especialidade médica que não existe em muitos países, como Portugal, por exemplo, quais considera serem as vantagens de ter médicos desta especialidade num hospital?

A importância da especialidade já está presente na sua definição: fornece uma preparação adequada para enfrentar e gerir todas as emergências na medicina, evitando a intervenção dos médicos de reanimação, já ocupados com outras emergências.

Quais foram as principais dificuldades que encontrou com a chegada da Covid-19 a Itália?

A única dificuldade que encontrei foi o tratamento de pacientes com Covid-19, em isolamento. É muito complicado ter em atenção todos os procedimentos para evitar o contágio.

Houve algum caso de paciente ou experiência pessoal durante esta pandemia que foi mais memorável para si, que gostaria de compartilhar conosco?

Sim, infelizmente, tive uma experiência negativa: um paciente de 48 anos chegou com febre, mas, após algumas horas, as suas condições de saúde não melhoraram. Teve uma insuficiência respiratória e, após sete dias, morreu em terapia intensiva.

Mas também tive uma experiência positiva: um colega infetado, seguindo o protocolo do professor Ascierto, recuperou em cerca de 25 dias.

Nota: Um agradecimento especial à Sofia Cerruti por ter feito as traduções necessárias de italiano.

My name is Liz Rascón, I’m 25 yo, living in Veracruz, Mexico; I’m an undergraduate medicine student doing my internship year (6th of 7th) which consists of being in a hospital for a year, from 5 to 6 days a week for 8 to 10 hours per day and having a 24-hours shift every 4 days. The role I have developed during the COVID-19 pandemic is as a doctor who takes care of noncovid patients at the gynecology & obstetrics and pediatrics area.

What were the biggest challenges that you felt while battling against Covid-19?

Well even if I am not directly battling against COVID-19, I have the necessity to keep giving the best medical service to all the patients even if I am not sure they are COVID-19 patients who are asymptomatic or lying about their symptoms (which is very common), so I guess my biggest challenge is to keep trying to do my best with all the patients while not getting infected.

How did the Mexican people deal with this situation? What was the gratitude from Mexican people toward health professionals?

Sadly, the non-health professionals believe that we (doctors, nurses, etc.) are lying about the impact of the pandemic in the health system. They have this idea that “we are stealing them the synovial fluid from their right knees to sell them in the black market to get about 10.000 dollars per knee”, which makes us feel angry and powerless about the whole situation, because they don’t get to see the entire picture; they don’t see the health professionals wearing every day the PPE (Personal Protection Equipment), almost without eating or getting a sip of water in 8 hours, not being able to go to the toilet, with the face full of marks because of the mask and all the safety items and leaving their family to live alone where they can not spread the virus if they get sick. They just believe that we want to kill them, that we want to let them die, that we make money with their sickness, that we are soulless people who don’t care about them so they just start setting hospitals and ambulances on fire, they have already killed doctors who lived in small towns, threaten their families and stealing their goods. It is so unfair that this is the way they think of the people who are trying and helping save their lives every day, during the pandemic or not.

Only a part of the civilians (maybe half of them) show their gratitude, bring food to the hospitals, share in their social media that they support us, help the doctors by making their laundry or going to the supermarket because some are afraid to even go out to get food when they are not at the hospital. But I also have to say that those who show their gratitude are a blessing to the health professionals; they are who make them (us) keep fighting and don’t give up even if sometimes feels that COVID-19 is winning the battle.

What are the biggest differences of battling the pandemic, that you found between México and the rest of the world?

Positive

WE DO WHAT WE CAN WITH WHAT WE HAVE: As a third world country I get to notice that even if we have less resources (equipment, medicines, ventilators, etc.) we don’t give up, our health professionals do their best, sacrifice everything to bring the best to all the patients, merging their knowledge and improvising with what they have in their hands.

THE PROFESIONALISM: It also brought the health professionals community together, I never thought I could see gynecologist, surgeons, pediatricians, urogynecologist, intensivists and so on working hand by hand in the same area, developing themselves as together.

THE SOLIDARITY: This crisis has taught some of us that we need to be together even if everything is going from bad to worse, that the ones who less have are the ones who will extend their hand to help you; that we need to consume local in order to help our people; that if we fall together we can also rise together, the only hard part of this is to keep together.

Negative

THE VIOLENCE: As health professionals we notice that civilians believe we need to give our lives in order to save them, basically that our lives matter less than theirs, because if we choose this careers is because our humanity should be that big, that we should even die battling diseases if necessary, and if we decide to put our health first (like not intubating patients if we don’t have the PPE) we are monsters who don’t deserve to be happy, to get paid or even be alive, that is why the violence against us is increasing that much (they have thrown bleach to colleagues, damage their cars, make them left the places where they rent, threaten them and their families, etc.)

THE IGNORANCE: I’m also concerned with the problem of the education, even if our first job is to prevent sickness, civilians just don’t care about our indications, they just ignore them; that is why I believe this virus will stay in Mexico much longer that in other countries.

BAD PAYMENT: Sadly health professionals are not well paid in Mexico, despite what Mexicans believe that we become rich working in hospitals and clinics; well, nowadays we get paid even worse, the government doesn’t give us PPE (they stole equipment so it never arrived to the hospitals), they want us to work from 8 to 36 hours with 12 to 24 hours rest for around 1.000 dollars a month, some even less (for example, me as a medical student in her internship, I get 100 dollars a month, which of course isn’t enough to live by myself, not even to get enough food and take the bus for a month); and this pandemic just showed us that we are going to get even worse paid, because civilians demand medical attention and medicines for free and all of this is wanted quickly, and in the place and at the time they want it and if that doesn’t happen, they attack us; and the government is promoting this.

What is the impact of this pandemic on the future of humanity?

I strongly believe this is going to change us forever from small things like washing our hands much more to making us understand that when doctors and scientist say to us “hey watch out, this is going to happen, foresight now that you still can” we actually have to hear them and follow their instructions. I also believe that it showed us how fragile humanity and health services actually are.