3 minute read

A VIOLA NÃO SE ENSINAVA, APRENDIA-SE

Já ouvi esta afirmação proferida por mais do que um Tocador da “velha geração”.

O ensino da Viola foi sendo feito por transmissão oral ao longo dos séculos. Há quem denomine de “ensinar de ouvido”, “ensinar por imitação”, “ensinar ponto a ponto”, havendo designações diferentes de acordo com as expressões de cada local.

Advertisement

Nos nossos dias, a transmissão oral continua a ser a principal forma de ensinar os instrumentos tradicionais portugueses. No entanto, em relação ao passado, a grande diferença será terem surgido escolas de Violas, aulas em associações ou outras Instituições que passaram a promover o ensino destes instrumentos.

No passado não existiam escolas de Violas, não havia locais nas freguesias ou aldeias onde as pessoas se podiam dirigir para aprender estes instrumentos. O ensino era feito dentro da mesma família de Tocadores e quem não tivesse alguém na família que soubesse tocar dificilmente teria acesso à aprendizagem.

Mesmo entre familiares seria frequente não haver um momento de ensino propriamente dito. O pai poderia passar a noite a tocar, mas não dedicar tempo a ensinar o filho. Como é que o filho aprendia? Via, ouvia, fixava, memorizava auditivamente. Depois, na ausência do pai, lá experimentava colocar os dedos na Viola e produzir sons. Muitas vezes esse atrevimento de tocar na Viola do Pai resultaria numa grande reprimenda.

Alguns aprenderam ouvindo tocar na rua ou espreitando pela porta do vizinho, indo depois para casa experimentar na Viola, persistindo até conseguirem reproduzir um som que se assemelhasse ao que escutaram. Muitas variações que conhecemos hoje, sobre o mesmo tema tradicional, surgiram devido à forma de aprendizagem de ouvido e quase autodidacta de grande parte dos tocadores.

O Tocador era uma pessoa que tinha algum estatuto em cada freguesia, pois sem ele não havia festa, não havia convívio e bailarico. Ser convidado para tocar em alguma festa podia garantir mais alguma comida em cima da mesa para a família e até mesmo uma refeição oferecida fora de casa, e isso era, em tempos de grande pobreza do nosso País, uma mais‑valia para qualquer lar. Neste contexto é de compreender a grande resistência das pessoas em partilharem os seus conhecimentos musicais, como em qualquer outra profissão.

Felizmente, os tempos foram mudando e alguns “Mestres” passaram a ensinar em escolas de violas, em grupos folclóricos que tinham interesse em formar novos Tocadores, casas do povo e sociedades recreativas, que queriam ter escolas de Violas, ou tunas que fizessem apresentações musicais. Os instrumentos tradicionais passaram a ser ensinados com mais regularidade por um Tocador conhecedor do instrumento e do repertório e já com abordagens de ensino menos “restritivas”. A aprendizagem passou a estar ao alcance de mais pessoas, as próprias

instituições passaram a adquirir instrumentos para emprestar aos alunos, que não os pudessem adquirir, e foi‑se criando uma estrutura de continuidade na oferta do ensino destes instrumentos.

Não há Escolas de Violas em todas as Ilhas dos Açores, mas tem‑se assistido a um acréscimo de interesse dos mais novos em frequentar este tipo de cursos, fruto de um trabalho de divulgação da Viola cada vez maior por parte de diversos músicos e algumas entidades. É de aproveitar o momento de grande dinamismo que vivemos com as nossas Violas para tentar potenciar, em todas as Ilhas, o aparecimento dessas Escolas.

No entanto, uma das afirmações que mais tenho ouvido ao longo dos meus anos de estudo da nossa Viola é a seguinte: é muito difícil aprender a tocar Viola! As justificações vão variando, mas a afirmação mais comum é de que “é difícil a sua aprendizagem por ser um instrumento que tem muitas cordas”.

Este preconceito foi ficando tão enraizado na mente e cultura das pessoas que é frequente ouvir o mesmo comentário da boca de jovens, de amantes da Viola e até de desconhecidos quando tomam o primeiro contacto com o instrumento.

Defendo que a Viola é um instrumento que está ao alcance de qualquer pessoa que decida investir o seu tempo na sua aprendizagem. O aperfeiçoamento de conhecimentos, repertório, técnicas, esse, sim, como em qualquer outro caso, exige muitos anos de estudo.

Fig. 11 – Audição do Dia da Criança na Igreja do Colégio

É difícil tocar Viola como é difícil tocar Trompete, Piano, Violino, Violão, Clarinete, Bandolim… Não é mais difícil aprender a tocar Viola do que nenhum outro instrumento. É preciso vontade e motivação, uma Viola (com cordas) e alguém com vontade de partilhar conhecimentos.