3 minute read

LITTERA - TEREZA "CONTO DE PEDRO PAIVA

Tereza

Tereza voltava para sua casa, em sua mão uma sacola com uma garrafa de pinga e outra de conhaque. Sua pele manchada e corpo obeso escondiam a beleza de outrora, apenas seus olhos verdes ficaram.

Advertisement

O trabalho de gari foi árduo, o pior era quando a molecada caçoava.

— Tereza cafetina!

— Terezinha cafetina!

Sua história era conhecida em toda cidade.

Chegou em casa, deixou as duas garrafas em cima de uma mesinha de canto, foi à cozinha e voltou com um copo americano, abriu a garrafa de pinga e tirou uma dose da metade do copo, tomou em um gole só, fechou os olhos e respirou, voltou para a cozinha e requentou a sopa do almoço.

Após a sopa, foi com seu copo até a mesinha, colocou outra dose de pinga e tomou.

— Mãe!Olhou de um lado, de outro.

— Mãe!

E finalmente viu o fantasma de sua filha maior num dos cantos do cômodo. E disse:

— O que você quer? Já falei para vocês não aparecerem mais aqui!

— Por que você fez aquilo com a gente?

— Você Cátia? Disse Tereza, colocando mais uma dose — Nunca quis nada com nada, só queria namorar; sair com os meninos; não trabalhava e nem me ajudava em casa.

— Eu só tinha dezessete anos!

— E era uma vagabunda! Em vez de ser puta aqui, foi ser em São Paulo.

— E minhas irmãs mereciam o mesmo? Elas estão atrás da senhora!

Tereza se virou e viu os fantasmas de suas outras duas filhas.

— Cássia! Carla!

— Cássia tinha quinze anos, e eu apenas treze! Disse Carla.

— Vocês iam virar putas mesmo!

— Talvez, mas estaríamos vivas! Disse Cássia.

Tereza colocou mais uma dose de pinga.

— Quanto recebeu pela gente? Perguntou Carla.

— Foram cinco mil e cinquenta reais e mais um litro de “Red Label”, que bebi na mesma noite.

Tereza sorriu e continuou:

— O dinheiro durou três meses, gastei no forró com homens e bebidas.

Cássia se aproximou.

— Mamãe! Vi Carla tossir e tossir nas madrugadas, em semanas seu catarro era só sangue, morreu em uma calçada às cinco da madrugada.

Tereza esvaziou sua garrafa de pinga em um só gole. Cássia continuou.

— Cátia morreu em seu ponto, espancadas pelos carecas nazistas, os malditos usaram correntes, a calçada ficou suja de sangue por dias.

— E você, Cássia, como morreu? Pergunta Tereza.

— Fugi de meu cafetão, ele me encontrou, apanhei tanto que fui parar no hospital, três dias depois morri.

Tereza abriu o conhaque e tomou no bico da garrafa.— O que vocês querem de mim?

Carla se aproximou e disse:

— Viemos te buscar, mamãe!

Tereza soltou a garrafa de conhaque, que se quebrou no chão, caiu de joelhos nos cacos, em seu cérebro veias explodiram, olhou as filhas, elas sorriram e desapareceram. Tereza morreu.

Foi enterrada em uma cova rasa no cemitério da cidade.

Um ano depois, uma bela moça parou em frente à cova rasa de Tereza e disse:

— Foram seis anos, queria te ver viva, desculpa, mas não consigo chorar.

Tirou um celular do bolso e digitou alguns números.

— Alô! Carla! Ela está morta, agora viva, sou só eu e você.

— Cátia! Quando você volta? Perguntou Carla pelo celular.

Disse uma e outra palavra para a irmã, desligou, olhou para a cova e disse:

— Adeus, mamãe!Cátia foi embora sem olhar para trás.

Pedro Paiva:

Contista, Cronista e Poeta

This article is from: