LITTERA REVISTA
Contos Poemas
Entrevistas
LITERATURA SEM FRONTEIRAS
PETER H. E. GOGOLIN
JAN OLDENBURG
ERICA VAN DOOREN
AFONSO VALENTE BATISTA
Profissão: Literatura COM GLÁUCIA MIDORI
EDITORA-EXECUTIVA DA HAIKAI EDITORA
JOÃO GUIMARÃES ROSA, O ENCANTADOR DE PALAVRAS
HAICAI: DO ORIENTE AO TROPICAL opoemaqueeterniza omomentobreve.
Parceria entre a LITTERA e “Cônego José Bento”.As produções dos jovens constituem um interessantemosaicodegênerosetramas,quedão vozaosdilemas,percepçõesequestionamentosde suageração.
Perguntas para duas POETISAS e um POETA
BRUNA LARISSA
CARLOS GUEDES
LARISSA FERREIRA
Quadrinhos Crônicas Nº 3
PREZADO LEITOR:
Editorial–março/2022
Chegamos,nesseiníciodeoutono,aoterceironúmerodarevistaLITTERA.
Pretendemos novamente trazer a você, leitor(a), textos de qualidade, e reflexões interessantes sobre a literaturaeouniversocultural.Naliteratura,sabemos,cabemtodosostemas,eumagamainfinitadeexperiências humanas.Então,ésobretudoissoquequeremosconversar.Porqueentendemosaliteraturanãocomoumfimemsi mesma,mascomoelementodepercepçãodarealidadeedeintervençãosocial.Nãoumenfeitenaparededomundo, maspartedela.
Trazemos três entrevistas imperdíveis, que compõem um diálogo entre diferentes perfis e gerações de artistasdapalavra:CarlosGuedes,autorde“EsparsosNoturnoseoutros”(poesia),escritor,ator,diretordeteatro, críticoliterário,ganhadordoprêmio“MestreCulturaViva2021”,concedidopelaFundaçãoCulturaldeJacarehy; BrunaLarissaSouza,atrizeescritora,queidealizouerealizouoprojetodegrandesucessoerepercussão“Conteme seu sonho e ganhe um livro”; e Larissa Ferreira , jovem poetisa e articuladora cultural, autora do livro “EntrelinhasRetintas”.Valeapenaconhece–los(as)!
ComofrutodaparceriaentreaLITTERAeacomunidadeescolarlocal,divulgamostextosdealunos(as)do cursodeAdministraçãointegradoaoensinomédio,daETEC“CônegoJoséBento”-Jacareí:OtávioRaphaelda Silva Santos, Júlia deAmorim Filó, Pedro Paulo da Silva Moraes e Vitor Gustavo Candido de Souza.As produções dos jovens constituem um interessante mosaico de gêneros e tramas, que dão voz aos dilemas, percepçõesequestionamentosdesuageração.
Entendemosqueéimportantevalorizararededeapoioqueatuaaoladodo(a)escritor(a),paraqueoesboço possachegaràcondiçãodelivropublicado,comqualidade.Contemplandoessapremissa,teremos,apartirdesta edição,aseção“Profissão:Literatura”.EainiciaremoscomodepoimentodeGláuciaMidori,editora-executivada Haikai Editora, que atua no segmento das editoras independentes.Gláuciaanalisa com muitalucidezo mercado editorialnaatualidadeenosmostraopapeldoeditornacadeiadeproduçãodaobraliterária.
EDITORIAL
Naseção“DicadeLivro”,CamilaNavarroMotta,professoradeLiteratura,apresenta-nosossurpreendentes “ContosDaTartarugaDourada”remanescentesdosescritosproduzidospelopoetacoreanoKimSiSeupnofinaldo séculoXV, obraconsideradaoprimeiroregistrodeprosaficcionaldaliteraturacoreana.
Destacamosaindaosartigos:EstherRosadoescrevesobreouniversopeculiardograndeGuimarãesRosa, querevolucionoualinguagemnaliteraturabrasileira;eaindanosapresentaumahomenagemoriginaleapaixonadaàs mulhereseàcondiçãofeminina,nomêsemquesecomemorao“DiaInternacionaldaMulher”.E,numterceiroartigo, Vera Figueiredo aborda didaticamente o gênero haicai, mostrando suas origens, evolução e adaptação à língua portuguesa.
Em“LiteraturasemFronteiras”,temoscontribuiçõesvaliosasdeAfonsoValenteBatista,escritorportuguês; Erica Van Dooren, escritora holandesa; Jan Oldenburg, escritor e tradutor holandês; e de Peter H. E. Gogolin, escritoralemão.
O(A) leitor(a) poderá ainda visualizar uma paleta de variadas cores literárias, em artigos, contos, crônicas, poemasequadrinhos,produzidosporPedroPaiva,RóbinsondaSilvae VeraFigueiredo.
Finalizamos renovando o convite a você, caro (a) leitor (a): se desejar ter seu texto (conto/crônica/poesia/artigo/resenha)publicadoemnossarevista,envie-oparaoe-mail cestadetextos@yahoo.com, com uma breve biografia. Você poderá ser o (a) autor (a) convidado(a) da próximaedição.Atébreve!!
“Soupelocombate,sempreeemtodaparte,dostrêsassassinos:aignorância,ofanatismoeatirania.” (FernandoPessoa)
Oseditores
PedroPaiva
VeraFigueiredo
05 22
HAICAI: DO ORIENTE AO TROPICAL
JoãoGuimarãesRosa,oencantadordepalavras EstherRosadodesvendaosmistériosda escritadestegrandebrasileiro. .
HAICAI:DOORIENTEAOTROPICAL opoemaqueeternizaomomentobreve. VeraLúciaFigueiredonosmostraabeleza destaarteoriental.
38
Dica de Livro 37 24
Profissão: Literatura ENTREVISTA COM GLÁUCIA MIDORI
Contos: 12 O ESPELHO 14
Compadre Luiz e o Lobisomem. (Como Nascem os mitos)
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Perguntas para duas POETISAS e um POETA
Parceria entre a LITTERA e “Cônego José Bento”.As produções dos jovens constituem um interessantemosaicodegênerosetramas,quedão vozaosdilemas,percepçõesequestionamentosde suageração. BRUNA LARISSA CARLOS GUEDES LARISSA FERREIRA
poesia: 08 PóLEN 09
Folclore 10
AS CORES DOS DIAS 30
ÍNDICE ARTIGOS:
JAN OLDENBURG ERICA VAN DOOREN AFONSO VALENTE BATISTA LITERATURA SEM FRONTEIRAS
PETER H. E. GOGOLIN
EXECUTIVA
EDITORA
DA HAIKAI EDITORA ( São Paulo) 33
CRÔNICAS: Eparrey Iansâ, Marielle Franco e todas as mulheres 32
JOÃO GUIMARÃES ROSA, O ENCANTADOR DE PALAVRAS
TrêsdiasapóstertomadopossedaAcademiaBrasileira de Letras, em novembro de 1967, o escritor mineiro João Guimarães Rosa estava sozinho em casa quando foialcançadoporuminfartofulminante. Adiara por quatros anos a posse na ABL, estava emocionado demais por aqueles dias: o recebimento do fardão, a posse e o comparecimento do expresidente JK à diplomação, seu amigo pessoal e colega médico na Santa Casa de BH e da Revolução Constitucionalistade32,quandoambosforamservirno setor do Túnel. Ali muito mais a amizade se estreitou; essa foi a razão de Rosa ter feito discretamente um cumprimentomilitar aJKnadiplomaçãodaABL:“Com amãonapala,meucoronel”.
Nascidonapequenacidadede Cordisburgo(MG), em 1908, opaieravereadorecomerciante; aos10anos, foi morar em Belo Horizonte com os avós ; recebeu a influênciadoavômaterno,médico,professorefilósofo ecursoumedicinanaFederaldeMinasGerais.
O primeiro idioma aprendido, dos 9 que falava fluentemente, foiofrancês,aos6anos.
“Falo: português, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano, esperanto, um pouco de russo; leio: sueco, holandês, latim e grego (mas com o dicionário agarrado); entendo alguns dialetos alemães; estudei a gramática: do húngaro, do árabe, do sânscrito, do lituânio, do polonês, do tupi, do hebraico, do japonês, do tcheco, do finlandês, do dinamarquês; bisbilhotei um poucoarespeitodeoutras.Mastudomal.E acho que estudar o espírito e o mecanismo de outras línguas ajuda muito à compreensão mais profunda do idioma nacional Principalmente, porém, estudando-se por divertimento, gosto e distração ”(trecho de entrevista brincalhona concedidaaumaprima)
Caso não encontrasse amparo nas palavras já existentes, inventava uma nova a partir de outras,dalínguaportuguesa,dolatim,detantas outras: delicadezas chamadas neologismos. Eleeratambémuminventa-línguas.
Todasosneologismos,reinvençõesdalínguae brincadeirasnãoformais foramtranscritaspor estaautora apartirdoscontos deSagarana:
“Coisandoportristeslembranças,decerto...” (Conversadebois)
“E ele ficou entibiado e pegou a saudadear.”( Avoltado maridopródigo)
“Na baixada, mato e campo eram concolores.” (São Marcos)
“Mais do que isso, era o seu complemento: juntos centaurizavamgloriosamente.”(Corpofechado)
“Grilos finfininhos e bezerros fonfonando.” (Corpo fechado)
“Eu me desdebrucei um pouco da janela.” (Corpo fechado)
Além disso, em sua linguagem existem recursos típicos da poesia, tais como aliterações, assonâncias, musicalidade:
“E pupulam, entre-chocados, emaranhados; os cornos –longos, curtos, rombos, achatados, pontudos como estiletes, arqueados, pendentes, pandos” ( O burrinho pedrês)
Mais, ainda, os ditados populares aparecem em profusão:
“Joá com flor formosa não garante terra boa!” (O burrinhopedrês)
“Cachorro lambeu a vergonha da cara dele!” (Avolta do maridopródigo)
“Quanto maior é a raiva tanto melhor e com mais calma raciocina.”(Duelo)
“ÉmelhorentregarpraDeus.”(Duelo)
“Porque faz mal a gente ficar espiando um enterro até elesesumir.”(Conversadebois)
“Coso a roupa e não coso o corpo, coso um molambo queestároto...”( SãoMarcos)
(Na posse daABLcom o amigo JK, em 1967)
5 LITTERA
Aproximaçõesinesperadas:
“A sobra do cedro sem se encostar no cocho ” (Sarapalha)
“E ele teve uma vontade virgem, uma precisão de contar sua desgraça, de repassar as misérias de sua vida. Mas mordeu a fala e não desabafou.” (Ahoraea vezdeAugustoMatraga)
“Manhã noiteira, sem sol, com uma umidade de melar por dentro as roupas da gente. A serra neblinava, açucarada...”(Oburrinhopedrês)
“E o cheiro de mato moço.” (A volta do marido pródigo)
“Passou ainda uma borboleta de páginas ilustradas, oscilando no voo puladinho e entrecortado das borboletas.”(SãoMarcos)
Em 1930, já formado, publicou seus primeiros contos na revista O Cruzeiro e, ali, ganhou os primeiros dinheiroscomliteratura,participandodeconcursos.
Optou por ser médico no interior e atendia seus pacientes na zona rural, viajando no lombo de um cavalo.Ouviahistórias,causos,acontecimentos.
Muitosdestinoshumanosforam,então, bordadoscom as cores e paisagens do sertão de Minas e desfilam diante dos nossos olhos como esquecê-los tão facilmente?
O universo rosiano é feito de delicadezas fundas, de brutalidades e descompassos (Hermógenes, Augusto Matraga,porexemplo);masneleháaharmoniapoucas vezesencontradaemoutrasnarrativascontemporâneas.
As paisagens das Gerais, seus montes, veredas, estradinhas, vales, fazendas e despenhadeiros, encruzilhadas, rios e riachos, pequenas cidades e montanhas, tudo foi aprendido e guardado naquela ocasião para se transformar em espaço geográfico de seus contos e de seu único romance, Grande sertão: veredas.
Suas personagens, aparentemente, são capiaus, coronéis, jagunços,valentões, funcionários,gentedo eito, vaqueiros; no entanto, vistos “de perto” por nós, são homens como quaisquer outros, habitantes do mundo, criaturas humanas com suas ambições, vaidades, jogos de poder, seus amores perdidos e reencontrados, olhos lânguidos, pressa insana, delicadezas ribeirinhas, cinturas e esporas, à beira da fogueira,nogrupoquesedeslocaparaalgumlugardo sertãodasMinasGerais.
Sesaiu dointerior aos 10anos,carregou-onopeito com suas paisagens e seres; mais tarde, ao encontrar Manuelzão Nardi e fazer a viagem mais do que conhecida em busca de causos, acrescentou às lembranças de menino as vivências do médico e à psicologia do observadordegenteseacontecimentos eosconsagrouparasemprenasnarrativasquecompôs.
Oque,sentadoàescrivaninha,pensouantesdemorrer, naquele átimo de segundo em que o relógio .interior paroueosolhosficaramolhandoparaalgumlugar?
Talvez tenham desfilado diante dele o menino Miguilim de Campo Geral, míope e triste, irmão do Dito. Quem sabe apareceu-lhe o jagunço Riobaldo TataranaouosolhosverdesdeDiadorim, talqualos buritizaisdeMinas?
Quem sabe , a figura inesquecível do moço muito branco, sem nome, aparecido depois da uma tempestade? Mas pode-se considerar ainda que tenha se mostrado a figura de um certo burrinho pedrês, miúdoeresignado.DiantedosolhosparadosdeRosa, Tiãozinho,cujopaifalecerananoiteanterioraosfatos narrados em Conversa de bois, foi caminhando na estradinhadeterraechorando,guiandoosbois,mofino demagreza. Podeter-lheaparecidoAugustoMatragae seu tino para injustiças e mortes, mas também para grandezasdeliberadas.
Aos 59 anos, João encantou-se como escreveu Carlos DrummonddeAndrade.
Aos 59, às 20h do dia 19 de novembro de 1967, o coraçãode MinasparoudebaternopeitodeGuimarães Rosa.
Asnarrativas deRosaeoregionalismouniversal Comoseobservounabiografiadoescritor,Guimarães Rosa levou Minas Gerais consigo por onde quer que andasse,emborasejasabidoquetornou-se diplomata depoisdeprestarconcursonoItamaratyaconselhode umamigorussocomquempraticavaalíngua: -“Se você gosta tanto de estudar línguas, por que não prestaparaoItamaraty?”
Estudoumuitoe,em1934,veioparaoRio:passouem segundolugar.
E deixou de ser médico para seguir carreira diplomática, mas jamais se afastou da literatura. Em 1936, ganha o Prêmio da ABLetras com o livro de poemas Magma (o escritor não gostava muito de imaginarvê-lodisponibilizado.)Sóem1997,équefoi publicado.
(IlustraçãodePotyparaa 1ª. EdiçãodeSagarana,em1946)
6 LITTERA
Alaranjado
No campo seco, a crepitar em brasas, dançam as últimas chamas da queimada, tão quente, que o sol pende no ocaso, bicado pelos sanhaços das nuvens, para cair, redondo e pesado, como uma tangerina temporã madura…
Sagaranatrouxeparaoautor umregionalismo detom universal. Suas personagens, mesmo que inseridas no sertãodeMinas,têm umacentopsicológicoestendido; poderiam estar em qualquer lugar de nosso planeta desdeumaBolsadeValoresdeLondres ouNYorque, no Japão ou na China, nos campos do mundo. Seus sofrimentoshumanos,oamorqueguardamnopeito,a deslealdade que praticam ou sofrem, a violência, a devoção ao feminino, inveja, ciúmes, raiva, desesperança,amordemaisoudemenos,solidão. O temas discutidos em Sagarana são os que doem na alma , alegram o coração,os mesmos em qualquer ser humano,emquaisquerlugaresdestemundo.Afilosofia das aflições ou a ternura, misérias ou ignorâncias atravessam as páginas, tal como borboletas ou capivaras,nohalldoMuseudeHistóriaNaturalemNY, no avião que pousa em Antananarivo. Na guerra da RússiacontraaUcrânia.
Ainda:noiníciodoseuúnicoromance Grande sertão: veredas (1956),JoãoGuimarãesRosa,pelabocadeseu narrador, diz o que se achará permeando sua obra do começoaofim:“Osertãoestáemtodaparte.”
Masquesertãoéessecheiodejagunços,boiseburros, mulas e cavalos, buritis e vaqueiros, acontecimentos e mortes,malandrosmaridos,mulheresdeolhosdecabra tonta,DeLurdes,DasDoresdeolhoscordechuchu? Que sertão construíram Rosa e suas personagens de carne, pele, ossos, músculos e nervos, gente simples e intensa,cheiadehistóriasparacontar?
Enfatizando: “O sertão é o mundo.”, sabe-se que ele escreveu. E é verdade. Sua prosa, dita vulgarmente “regionalista”,sobretudomineira,,guarda,emverdade, um regionalismo outro, o universal. Seus matutos, capiaus e sertanejos, como mencionamos, sofrem as dores e fazem as reflexões que qualquer humano, em qualquer lugar deste planeta fariam. Pequenos acontecimentoscomoumaviagemparalevarboispara embarque numa estação, uma visita a parentes, um marido malandro e ladino, a conversão de um homem ou a crença numa reza que fecha o corpo das pessoas, valentõesesuasousadias,qualquerumdessesassuntos é motivo para que nasça um conto ou uma novela, tal como desabrocha uma flor nas Minas Gerais. Ou da mesmamaneiraquesopraoventolevee,ainda,sepesca um peixe, corre um rio, rebrilha uma lagoa, todas as coisassãomotivoparacantaravidaesuascriaturas. LerGuimarãesRosaéprivilégio.
Pinheiro,daAcademia JacarehyensedeLetras.
“Osertãoéomundo”
EstherRosado: Psicanalista,professora,ocupaa cadeira17,Profa.Philomena
7 LITTERA
PóLEN Poemas
Uma abelha criança
Voava feliz, como quem dança, Pairando de flor em flor.
Inocente no seu bailado, Trazia consigo o pólen dourado
Que costumam chamar amor.
Essa abelhinha desastrada
Que ri e canta por nada, Fez uma grande confusão:
Encontrou meu coração
E pensou mais que depressa Que fosse uma rosa carmim;
A porta estava destrancada
E a abelhinha, na pressa, Atirou seu pólen em mim.
Depois ela correu pela manhã nascente, Foi brincar com um cravo, Provar gota a gota de um favo, Ver germinar com vontade a semente.
Enquanto isso eu me olhava no espelho, Procurava redescobrir meu rosto, Não sabia se era março ou agosto, Se eu vestia verde ou vermelho, Se era doce ou amargo aquele gosto, Se o sol ardia no asfalto
Ou se a chuva cobria o mato.
Sabia apenas que o pólen cor de ouro, Amarelo como cabelo louro, Me fez ver novos encantos
Num dia como outros tantos. Arrancou as brumas e mantos
Que me impediam ver fadas e santos.
Ainda que por engano, O pólen criado sem ciência
Reduziu minha resistência
À de uma boneca de pano.
E , assim, com sutil paciência, Plantou em mim branca roseira, Me fez renascer inteira, Sem armas ou bandeiras.
Apenas embalada
Pelas batidas cadenciadas
Do meu coração sem fronteiras, Regado pelo pólen do amor, Aberto em suave flor.
5
VeraLúciaFigueiredo: Contista,CronistaePoeta 8 LITTERA
Diziam os velhos:
“Ela come boi!”
“Ela come bezerro!”
“Até homem já comeu!”
Passeava pelo nosso rio Paraíba.
Uns diziam!
“Tinha oito metros”.
Outros: “Mais de mil”
Alguns Católicos Exclamavam.
“O dragão bíblico!”
Indígenas: “Um ser encantado!”
E o padre gritou: “Só Maria para vencer o dragão!”
E a imagem branca se fez pelas boas mãos do artesão.
O povo da vila de Nossa Senhora da Conceição
Deu-lhe um manto da mesma cor do manto de Vosso Senhor
PedroPaiva:
E o povo da vila riu
Da negrinha Maria. Neste momento
Talvez, por providência divina, O barco decorado
Afundou em nosso Paraíba.
O mau capitão jogou pau. Seus jagunços, pedras.
Negrinha Maria parecia estar protegida e continuou sua peregrinação ao encontro do dragão
Passaram-se Sete dias...
Um pescador encontrou
Morta a cabeça
Pequena parte
Dacobragrande, Aoladodocesto DeMaria.
A negrinha Maria
Por ali nunca mais Foi achada Afundou no rio, ou aos céus elevada.
Uma imagem foi achada, Alguns disseram
“Parece a Negrinha Maria” conhecida hoje como Nossa “Senhora Aparecida.”
Contista,CronistaePoeta
AViladeJacarehynoiníciodoséculoXIX.
TeladeJean-BaptisteDebret.
9 LITTERA
Hoje Divino, sagrado
Amanhã somente popular
Mosaico de memórias
Tradições e histórias
Contadas pelos ancestrais
Algumas vividas
Outras, pura imaginação...
Herança transmitida
De geração em geração
Cultos, rezas, danças e festas
Manifestações das três raças
Revelando o verdadeiro Brasil
Elo entre aqueles
Que ergueram esta nação
No folclore cantam, dançam, rezam...
Unidos numa só cantoria
Carregam seus andores
Fazem suas promessas
Com tristezas, dores
Saudades e recordações
Mas também com orgulho
Alegria e comemorações
Folclore
O folclore é a pura magia
Que amalgama as etnias
No livro da vida
Vivida, contada e recontada...
Na beleza dos dias
Aliança de Gente
Ponte de luz
Que une
E até nos faz sonhar
Na sua mais pura manifestação
Com um Coração
Para este país
Pulsando uno, HUMANO!
Indígena-Afro-Lusitano.
10 LITTERA
RóbinsondaSilva(Robinho): Poeta
Frutificar Vida
Estelivroéminha vidanumalinha temporalpoética. Umespelhono qualme redescubro, relendoomeu passadocomum olharpresente, construindoomeu futuroapartirdo sonhoedalutade queépossívelse construirum mundomais
HUMANO.
Livrofísico
https://haikaieditora.com.br/produto/frutificar-vida/
eBookKindle
https://www.amazon.com.br/Frutificar-Vida-R%C3%B3binson-Silva-ebook/dp/B09Q81M2Z1
Contos
Compadre Luiz e o Lobisomem. (Como Nascem os mitos)
Era uma noite de céu enluarado. Na varanda da casa de compadre Luiz estavam sentados CompadreTonico,suaesposaJaneeda,odonodacasae sua mulher Tatiana. Compadre Tonico estava terminando de contar seu "causo" sobre a mula sem cabeça.
— Intão! Eu tava sentado na bicha sem cabeçadesdeládobairrodoSãoJoãoeaíelacomeçou emumgalopefumegante.Doscascosaíafogoefaísca, e isso lá pelas três horas da madrugada. Só sei que passemoporestenossobairro,atravessemoGuararema efomoparáemMogiesóparemoláporqueosolnasceu eamula,abichasemcabeçasumiu.
— Como o cumpadi fez pra vim pra cá di novo?PerguntouComadreTatiana.
— Empresteiumdinheirodumjaponêsevim diônibus!
— É..., faz sentido galopar na bicha sem cabeça!Masemprestádinheirodijaponêsquiocênão conhece,issopareceestória!DisseCompadreLuiz.
— Ocê acha que não existi japonês bom! RetrucouCompadreTonico.
— Japonês bom existi o que não existi é japonêsbobo,seeleimprestôdinheiro,cumcertezaocê nãovortôprapagá!
— Éééé, ocê si acha isperto, mas ainda não contôseucauso!
CompadreLuizpegouseuchapéuecolocouna cabeça,olhouparaaluaecomeçousuahistória.
— Faz tempo qui aconteceu! Tavam construindo a fábrica Papel Simão, casa tinha pouca, mas todo sábado tinha arrasta - pé lá na casa do véio falecido Camargo. E foi nesse arrasta-pé qui tudo começô. Já tinha tomado umas pinga quando aparece uma polaca do cabelo vermeio. Dancemo quase que a noitetoda,apolacanãoeradeJacareí,eradeSãoJosé dusCampo.Dancemotantoqueperdiacaronadicaroça quioJaninhoiamidar.
—Não tem assombração neste causo! Resmungou CompadreTonico.
—Tá chegando! Intão tinha um primo da polaca qui tinhaumciúmidanadodela.Eleveiodifacãonamão.
—O Cumpadi não ficou cum medo? Disse Comadre Janeeda.
—Os seis sabem qui fui capuerista desde muleque, e deioquiopessoarchamadivoadoraeosujeitofoipará nochão.
—E o qui aconteceu depois? Perguntou Comadre Janeeda.
—Aí o qui ocê fez, Cumpadi? Perguntou a Comadre Janeeda.
—Ai eu corri, e o bicho tava atrás! Correu pra dondi? PerguntouCompadreTonico.
—CorrinadireçãodopomardoNelsinhodoBar,subi numamanguera,masobichodeuumpuloquiquaseme pegô.Eunumsabiaquilobisomisubiaemárvore.Dei um pulo da árvore pra aquele laguinho. Nadei até a outramargieobichãotavacontornandoolaguinho,aí euviuabananera.
—Bananera! O qui bananera tem a vê cum lobisomi. RetrucouCompadreTonico.
—Calma, cumpadi! Continuando, o lobisomi tava quase perto e eu tirei o prego do borso e enfiei na bananera e o bichão começou a virá de um lado pro outroe...
12 LITTERA
—Calma, cumpadi! Continuando, o lobisomi tava quase perto e eu tirei o prego do borso e enfiei na bananera e o bichão começou a virá de um lado pro outroe...
—Pregonabananeramatalobisomi?GritouCompadre Tonico.
—Cumpadi!Eraumpregodeprata!
—Sifôdiprata,aípódi!
—Intão,elecomeçôavirádeumladoprooutroeum tipodifumaçasaiudeleefoientrandonabananera. Nãoéquiabananeraficômurchaeobichovirô gente.
—Iquemeraobicho?PerguntouJaneeda.
—Adivinha,cumadi!
—Oprimociumento!Exclamouela.
—Claroquinão!Disse sorrindoo CompadreLuiz.
—Apolacona!GritouCompadreTonico.
—Ondejáseviumuiélobisomi,cumpadi?Vôdizê! EraofalecidoCamargo!
—Por quêocênuncadisseque eraele?Questionou exaltadoCompadreTonico.
—Siachaquisôdedoduro,agorapossofalá!O falecidotámorto!
—Iopregodeprata?InsistiuoCompadreTonico.
—Mostrapraele,amor EaComadreTatianacolocouamãonobolsoetirouum enorme prego de prata e o segurou nas pontas dos dedos.
—É, chega di causo! Ocê não disse qui tinha uma cachaça boa aí!Agora vamô bebê. Disse o Compadre Tonico.
E os dois casais continuaram a conversa saboreando umaboapingadealambiqueeváriasvezesoCompadre Tonicocomentouqueo"causo"deleeraverdadeiro.
PedroPaiva: Contista,CronistaePoeta
AViladeJacarehynoiníciodoséculoXIX.
TeladeJean-BaptisteDebret.
Fim
13 LITTERA
O ESPELHO
Olheinovamenteojardimàminhavolta,verificando pela milésima vez se não haveria algum som ou movimento que denunciasse a presença de alguém no casarão antigo. Nada. Eu estava sozinha e precisava vencerapenasmeuprópriomedo,quenaquelemomento dominava por inteiro o meu ser, ofuscando mais que o sol.
Entrei vagarosamente na sala, onde não existiam maisascores,aluzouacruezadojardim.Osilêncioeo escuro pareciam-me protetores, envolventes. Observei, fascinada e quase tonta, que o lugar abrigava uma variedade inacreditável de objetos. Vasos, bibelôs, estátuas, almofadas, flores de veludo, outras de cetim, pedrascoloridas,animaisempalhadosequadrosantigos conviviam ali de forma aleatória e absurdamente harmônica. Ansiando por um pouco de luz que me permitissedistinguirosobjetos,tenteiacenderumabajur de cúpula empoeirada, mas não tive sucesso, já que a lâmpada azul revelava estar queimada há tempos. Na mesadepedraclara,aoladodoabajurinútil,sentavauma boneca de porcelana, que me olhava passiva, como se fosse eu parte integrante daquele mundo, não sua invasora.
Aproximei-me da estante, esperançosa de que os livrosdessem-mepistassobreoshabitantesdolugar,que já figuravam em minha densa imaginação como anjos, duendes ou simplesmente loucos Qualquer coisa distante do meu inocente e primário conceito de normalidade. Mas, ao invés de grandes descobertas, fiz deixar cair um livro, enorme, solene, que bateu pesadamente no chão gasto de madeira. O impacto fezmevoltaràrealidadee,instantaneamente,sairdoefeito inebriante, quase anestésico, que aquela estranha combinaçãodecoreseformashaviatrazido.Porpouco não corri para o jardim e escapei de vez àquele louco pesadelo.Parei,respireicomforça,useitempoparame habituaroutravezàsituação.Penseinomotivopeloqual chegaraali.Eseguimeucaminho.
Alcancei rapidamente a porta do quarto, entrei decidida e surpreendentemente calma. Abri a primeira gavetadacômodadecerejeira, comoquemviraapágina de uma revista ou aperta um botão de elevador. Naturalmente. Apanhei a caixinha forrada de veludo vermelho, um vermelho pálido, fosco, rosado, sem sangue. Segurei em minhas mãos a pedra verde que ela há tanto tempo guardava, como uma esfinge. Eu tinha sidoaúnicacapazdechegaraela,quemeesperavadesde o começo Tudo agora estava acabado, completo, cumprido.
Saí.Tinhaconseguidofazeralgodequejamaisme julgara capaz. Só então notei um espelho redondo, claríssimo,colocadoinesperadamenteatrásdaportaque eulogofecharia.Retomeiaesmeralda,coloquei-ajunto a meu rosto.Apedra brilhava, gigante, esverdeando a minha pele. E eu já era outra. Brilhante, transparente, perfeita. Só não sabia como voltar a viver depois que passasse pelo jardim, atravessasse o sol e retornasse à rua,quemeconduziriaaomundocomum,àminhacasa, ondeestariameuoutroespelho,aindanãomarcadopelo brilhoverde.Seriacapazdeolharparaeleoutravez?Não sei!
VeraLúciaFigueiredo: Contista,CronistaePoeta
14 LITTERA
SARAU
A Rede Graúna de Cultura, Diversidade e Solidariedade promoverá no dia 30/4, sábado, a partir das 16 horas, o sarau “Graúna Autoral- Encontro de Compositores e Poetas”, com a participação de Carlos Guedes, Alison Silva, Pedro Paiva, Róbinson da Silva, Cecília Dellape e Vera Figueiredo. O evento
será aberto ao público.
O Centro Cultural Rede Graúna fica na Rua Conselheiro
Antônio Prado, 393 – Parque Itamarati, em Jacareí - SP.
15 LITTERA
Perguntas para duas
POETISAS e um POETA
Destavezescolhemosentrevistarumpoetaeduaspoetisasdaregiãodegeraçõesdiferentes, CarlosGuedes,LarissaFerreiraeBrunaLarissaSouza.Eassimentenderosprocessosde escritaeprincipaisidéiaseideaisdestesartistasdacanetaeteclado!
BRUNA LARISSA SOUZA
Littera:Conte-nosdesuatrajetórianomundoda arteedaliteratura.
Bruna Larissa: Não sei dizer ao certo com quantos anos isso começou, porque eu lembro de fazershowparaasplantasdaminhamãefazendo do controle do rádio de microfone.Com a literatura, assim que comecei a ler já quis reproduzir as histórias que ouvia. Eu pegava as folhas de sulfite, dobrava e grampeava e ali eu escrevia histórias do meu jeito, e dava para minhamãedizendo“olhamãe,escreviumlivro”, sinceramente, acredito que aquilo já era meu início.
Littera: Você foi a realizadora do projeto itinerante “Conte-me seu sonho e ganhe um livro”. Como foi estar à frente dessa iniciativa? Vocêpretenderetomá-laemalgummomento?Há desdobramentosaindadoquefoicolhidonaquele período?
Bruna Larissa: O Conte-me é algo que tenho muito orgulho de ter criado. A Sol é uma personagem que brilhou dentro do meu coração como uma nova paixão e eu acho lindo o quanto eupudeextraircoisaslindasdasoutraspessoasa partir de vibrar o amor, o Sol. Esse projeto carrega uma militância que muitas pessoas não conseguiram enxergar, mas o que eu queria na
épocaéqueagentenãosedeixasseesmorecermesmo comumgovernoquetinhacomoobjetivonosdeixarno limbo dos sonhos.Acho que é um projeto necessário queeupretendoretomarembreve.
Littera ( Cecília Dellape): Lembro quando você divulgouseuprojeto“Conte-meseusonhoeganheum livro”, Confesso que fiquei com muita vontade de te procurar para contar algum sonho, pura vaidade, logo desistidaideia,foiumapena,perdiaoportunidadede conhecê-la.
Bem,porquevocêcomeçouaescrevereporque resolveuescreversobreossonhosdaspessoas?
Bruna Larissa: Amo ouvir todos os sonhos. Nosso sonho é a chama que nos mantém vivos,portanto não é vaidade. Que o universo permita nosso encontro, pois quero muito ouvir esse sonho. Retomando, na época eu queria que as pessoas olhassem para si, para seus desejos e questionassem sobre o que as mantém feliz, a motivação de vida, sobre as coisas que a vida adulta foi tirando, e no caso das crianças, queria que pensassem sobre o futuro que elas construirão pra si da maneira de criança, claro. Hoje, prestes a completar três anos de projeto, eu vejo a questão antropológica por trás de você tirar uma fotografia dos sonhos das pessoas no mundo pré- pandêmico e agora. Resta descobrir como manter-se sonhando.
16 LITTERA
Littera (Cecília Dellape): Quais foram os escritores queteinfluenciaram,equalogêneroliterárioquemais fervenasuaveia?
Bruna Larissa: Fernando Pessoa logo de cara. A profundidade desse homem é incrível e me inspira a escrever mais e mais.Também Cecília Meireles, Carlos Drummond deAndrade, Clarice Lispector que foram os autores que mais vi na escola e já adulta tive contato com Carolina de Jesus, que é uma mente brilhante,eporsuahistóriatrazumimpulsodentrode mim de querer criar histórias a partir dela, por sua existência que foigrandiosa!Então, não há um genero exatamente, mas sim as conexões que crio com cada autorqueamo.
Littera:Vocêtambéméatriz.Emsuaopinião,deque formaocontatocomaliteraturapodecontribuirparao trabalhodoator/atriz?
BrunaLarissa:Emtudo.Nomeucaso,pensoqueéum casamento, e é a partir da literatura que me inspiro parapensarteatro.
Littera: Existeumaliteraturapopular,produzidapor autores de imenso sucesso, como Harlan Coben, NicholasSparks,JohnGreen,MarianKeyes,Lucinda Riley, Nora Roberts, Danielle Steel, por exemplo. Você acha que é possível aliar grande sucesso comercial com qualidade e originalidade? Podemos encontrar bons textos na chamada “literatura de entretenimento?”
Bruna Larissa: Vou tentar desenvolver meu ponto, e vamos ver se faz sentido. Não acho que o sucesso comercial de um livro faz dele um livro bom ou ruim. Tambémnãosaberiadizeroqueexatamenteclassifica os livros, exceto pelas fake news, porque um livro que se apoia em cima de mentiras sem dúvida é um livro ruim.
Fora isso, vou usar o exemplo da música. Nós temos músicasdemuitaqualidadequeconquistaramatodos e músicas boas que não estouraram, porque isso é muito relativo. O objetivo da literatura é conectar-se ao leitor e fazer dele alguém capaz de formar um pensamento crítico acerca do que está lendo,ou não, se é algo simples,tá tudo bem também,porque o hábito daleituraébom,entãoseolivroestáagregandovalor ao leitor, ao meu ver, ele cumpriu seu papel. Fez sentido?
Littera: Sabemos que você foi premiada na adolescênciacomopoetisa.Vocêcontinuaproduzindo poemas ou textosliteráriosdeoutrosgêneros?Tem algumplanonessaárea?
Bruna Larissa: Sim, mas mais como desabafos de coisas que vivo.Talvez um dia eu lance esses poemas, por agora, são textos dramatúrgicos para minha próxima peça, ou serão transformados em musicas queescrevoparameuamigosàsvezes.
Littera (Camila Navarro Motta)Como os autores do séculoXXIpodemutilizaratecnologiaparadivulgara literatura?
Bruna Larissa: Excelente pergunta, mas tenho pouco desenvolvidosobreisso.Acreditoqueénecessárioque os autores se conectem a linguagem e às tecnologias, as plataformas que surgem a cada dia, mas ainda pensoquenãoésóisso.Énecessáriomais.Aspessoas não querem mais ler mais que 180 caracteres. A escrita se mesclou com outras linguagens, e uma poesia do tik tok com uma música bonita atrás atinge mais que pessoas que um texto publicado no facebook.É uma percepção, mas essa receita muda a medidaacadadia,entãosinceramente…nãosei!RS!
Littera:Vocêcontinuaescrevendopoesia?Temalgum projeto nessaárea?
Bruna Larissa: Sim, como disse, somente como desabafo.Vamosverseumdianãopublicoalgo.
17 LITTERA
CARLOS GUEDES
Littera (Cecília Dellape) :Carlos, sei o quanto és um escritorvoraz,comumaimensabagagemnaarteliterária bem como em outras artes, como cinema, fotografia, teatro,dança,críticaemúsica,masgostariadesaber:
Com o envolvimento em diversas artes, a literatura semprefoioseuobjetivomaiorouanteshaviaumsonho de seguir outra carreira, por exemplo, de ator, diretor cinematográfico ou outras em que sei que tem experiência,masnãosobressaiucomoaquevocêé:um poeta,escritor?
Como é a sua rotina de escritor? Escreve quando tem vontade?Escrevecomoumtrabalhoaserrealizado?Ou escreve se inspirando quando acontece algo novo, um fato na vida, um acontecimento qualquer ou uma intuição?
Carlos Guedes: Cecilia Dellape, sempre acreditei que a literatura é uma soma de fatores culturais, teria que buscar em suas manifestações uma forma de aprimorar meu olhar para outras formas de encontro comigo mesmo;olhavaquadrosdegrandespintorescomoGoya, Bosch , Tarsila , Dali , e sentia que existia na arte o processo criativo , fiz teatro inicialmente, pois buscava sentir como as palavras eram ditas e interpretadas , as palavraseramemoçõesaseremencontradas.Nocinema tinhaadescobertadosmovimentos,tomeicontatocomo neorreralismo italiano ; principalmente filmes europeus , russo, tcheco , alemão com o neoexpressionismo, principalmente, tentava trazer luzes e sombras , o surrealismo de Buñuel, as propostas de Pasolini, Fellini, Fassbinder , Herzog , eram encontros que estruturavam meu futuro para dentro da fotografia; depois surgiu o Cinema Novo com Nelson Pereira dos Santos,GlauberRocha,MarioPeixoto.
Depois deste aprendizado , comecei a escrever, poesias que tivessem uma caracteristica própria , trazer para dentro da escrita uma angústia , um abismo que pudesse ser os pedaços de minha alma , eram os penhascos que arranhavam meus dizeres, queria transmitir toda a leitura adquirida pelas diversas formas de aprendizado, sempre me considero um aprendiz , não uso da inspiração, sinto que sou alcançado quando escrevo por sombras diversas, as palavras me encontram como se fosse uma loucura preservada, uma intuição de que podemostrazerarealidadedeumavaziaexistênciapara dentro de nosso tempo , existe o dentro de quem busca escrever o mistério de tentar ser um entendimento , para isto não existe um momento certo , escrever é se traduzir dentro de variados sentimentos , principalmente não estarsódentrodestaprisãoraiz-terra!
Littera: Você, como apreciador e divulgador de novos escritores, percebe a existência de muitos talentos desconhecidos? Poderíamos afirmar que qualidade e famanemsemprecaminhamjuntas?
CarlosGuedes:Vejoafamacomoconsequênciadeuma literatura que nem sempre apresenta alguma qualidade, existem grandes escritores aparentemente desconhecidos com alta qualidade , nos dias atuais se pensammaisemestruturascomerciaisquepodemterum grande retorno de venda , acabamos ficando exilados por este olhar mercantilizado, então qualidade fica num plano subalterno, e a fama se torna o grande estimuladordevendas!
18 LITTERA
Littera:Conte-nossobreointercâmbioquerealizacom autores(as)deoutrospaíses,especialmentePortugal
Carlos Guedes: Nunca tive a intenção de acreditar que minha escrita pudesse atravessar mares e continentes , como Portugal, África; fui convidado a participar de alguns blogs e o retorno foi imediato , acreditava que meu estilo trazia alguma forma de identificação com a cultura literária daquele país, tinha lido toda a obra completa do Eça , Antonio Lobo Antunes , Mário de Carvalho , Vergilio Ferreira, até o encontro com o fabulosoescritorquesetornouumamadoirmão:Afonso Valente Batista , autor de 9 livros que foi me enviando com dedicatória e aconteceu que meus comentários tinham a precisão de entender o alcance da sua escrita, umaintensacorrespondênciaquearquiveideumaforma humana, olhávamos o mundo atolado na lama do poder, num de seus livros um agradecimento e no livro “ A GAleria dos Notáveis Invisíveis” tive o privilégio de fazer o prefácio, e contar com a amizade de Maria Cantinho, Agostinha Pópulo, Alvaro Giesta , Jorge.C.Ferreira , Maria Manuela Pacheco, Maria Tereza Horta , Pedro do Santos, do Instituto Cultural de ÉvoraeCarlosBondosoBondoso!
Littera:Comofoiaexperiênciacomapublicaçãodeseu livrodepoemas “EsparsosNoturnoseOutros”,lançado em 2021? Poderíamos considerar que essa obra é uma compilaçãodetodasuavastaobraliterária?
CarlosGuedes: Não pensava em ter meu livro publicado , foi graças a ter participado do Grupo Littera, ter conhecido queridas pessoas , como Vera Lucia Figueiredo, Michele Correa e Thaís de Godoi Morais, que organizou uns esparramados poéticos e contos jogadosnoface,elafoiagrandeartesãdestapublicação , não considero uma compilação, mas minhas tentativas de estar na poesia , a olhar um mundo corrompido de mentiras em que apenas a solidão é a única resposta de estarmos no mundo e ficarmos nus de tanto desejo de sermoshumanosnostortosdavidaquenosfoientregue!
Littera:Comovocêdefinesuapoesia?
Carlos Guedes: Uns definem minha poesia como marginal, acredito ser mais um grito, aqueles gritos que ficam agarrados dentro de uma imensa solidão, um olhar para o dentro da desumanidade , muitas delas vividas dentro da minha pele, me considero um humanista que ainda mantém estes trapos de uma difícil esperança remendadas num tempo em que os donos do poder perderam a solidariedade para com o próximo. Minha poesia é ser a dor de ser eu amarrado num planetadesgovernadopelopoderosos!
Littera: Como leitor apaixonado, quais são seus (suas) autores(as),gêneroseobraspreferidas?
Carlos Guedes: Guimarães Rosa, Lúcio Cardoso, Clarice Lispector, Autran Dourado, Adonias Filho , José Condé, Julio Cortázar, Juan Rulfo , Osman Lins , Afonso Valente Batista Nélida Pinon , Thomas Mann e RobertMusil,MarcelProust emuitomaisromancistas! E poetas Ascendino Leite, Sérgio de Castro Pinto , Carlos Drummond de Andrade, Adelia Prado, Cora Coralina , Renato Suttana, Carlos Nejar , Ledo Ivo, ManuelBandeira,JoãoCabralTodososgênerosemque o escritor se faz em obras tão bem trabalhadas em palavras!
19 LITTERA
Littera Cecília Dellape: Larissa, conte-nos sobre sua t r a j e t ó r i a n a a r t e e n a l i t e r a t u r a
Larissa Ferreira: Escrevo desde criança, aos oito anos já fazia histórias nos meus cadernos no terceiro ano do fundamental. Já no ensino médio em 2015, após ler o livro “Os sofrimentos do jovem Werther” despertei aindamaisminhapaixãopelapoesia,gostavadecomoo autor descrevia as paisagens e sentimentos, desde então não parei de escrever. Participei de muitos Saraus desde 2017, Participei três anos seguidos de feira literária da biblioteca municipal de Jacareí, nos anos de 2018, 2019 expus meus poemas e em 2020 apresentei uma roda de conversa junto ao projeto “Literatura em travessia”, também em 2020 e depois em 2021 participei de duas edições da antologia “Escreva como uma mulher” ,, em 2020fuicontempladapeloeditalCas@commeuprojeto ' A liberdade da poesia” pela fundação cultural de Jacareí, e em 2021 publiquei meu primeiro livro “entrelinhas retintas” com o edital Aldir Blanc.
LitteraCecíliaDellape:Jovempoeta,nãoteconheço enãoconheçosuaobra,mastratando-sedepoesia, querosaber:
Como é o seu processo de criação?
Q u a i s o s s e u s p o e t a s p r e f e r i d o s ?
A sua poesia é intuitiva, por inspiração ou técnica, obedecendo regras gramaticais, rima, verso e métrica?
Larissa Ferreira: O meu processo de criação vem a partir das minhas vivências e sentimentos, daquilo que me encanta ou causa revolta, começo pensando sobre qual mensagem quero transmitir ao meu leitor, penso em palavras chaves e vou construindo minha linha poética na maioria das vezes com rimas, outras vezes em prosa.
Carolina Maria de Jesus, Upile Chisala, Adriana Ortega, Lucas Lins, Conceição Evaristo e Eduardo Galeano.
Intuitiva, porém, sigo regras de rimas sempre nas últimas palavras do verso, intercalando uma com a outra.
Littera Camila Navarro Motta: Você é autora do livro “Entrelinhas Retintas”. Fale-nos sobre essa obra…
Larissa Ferreira: Um livro que antes era apenas um sonho. Nele trago questões sociais e raciais das quais luto no dia a dia, porém não deixo de falar dos sentimentos bonitos da vida, sobre o amor, seja ele o próprio ou por outra pessoa. Carrego também escritos que remetem a lugares do Brasil como, por exemplo, Minas Gerais, Bahia, São Paulo e principalmente a nossa cidade. A primeira poesia fala sobre uma menina que mora numa cidade do interior e deseja desbravar o m u n d o p o r m e i o d a s p a l a v r a s
Littera Camila Navarro Motta: Como os autores do século XXI podem utilizar a tecnologia para divulgar a literatura?
Larissa Ferreira: Divulgando seus textos em perfis nas redes sociais, blogs e sites de escrita
Littera: Para você, qual o papel social da literatura e do(a)escritor(a)?
LarissaFerreira:Compreenderedescreveromundoem que vivemos a partir de sua perspectiva. O meu mundo é de uma mulher negra, jovem periférica e futura professora, sendo assim é impossível não ter um papel social dentro da literatura. Eu luto por equidade com o auxílio das palavras, espero que no futuro outras jovens escritoras negras vejam que é possível, no fim não é um papel individual, mas sim coletivo. Apesar disso, é válido lembrar que a poesia pra mim é também um processo terapêutico, posso falar nela de amor, fazer intertextoscomasmúsicasdoBelchioroudoCaetanoou falar metaforicamente sobre o processo de preparação de um pudim comparando as virtudes do tempo.
Littera: Você tem outros projetos artísticos para um futuropróximo?
Larissa Ferreira Sim, estou com um livro infantil em produção,esperopublicá-loaindaem2022
LARISSA FERREIRA
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20 LITTERA
Entrelinhas
Retintas épara quemencontra naartedapoesia suaredençãoe umaválvulade escapedesse mundotão intensoemque vivemos.Acada poemaum sentimentonovo, desderevoltaao apreço,paraque comecemose enxergara realidadedeuma maneiramais clara,porémsem perderoencanto. Hátambém escritosdeamor, poisoqueseria davidasemele.
Poesiabrasileira deumajovem mulhernegra.
LivroFísico https://www.amazon.com.br/Entrelinhas-retintas-Larissa-Ferreira/dp/6586022460
HAICAI: DO ORIENTE AO TROPICAL
"
Que vossos pequenos poemas venhamdocoração.”(Basho)
"HAICAIdeveserlidodamesma maneira que uma abelha se debruça sobreumgrãodepólenouumabrisa ligeira sacode uma folha de ameixeira."
Poema de origem japonesa composto detrêsversos,surgidono séculoVII,Ohokku(depoishaikuou haicai, em sua forma abrasileirada), atingiuoapogeunoséculoXVIIcom Bashô(1644-1694),poeta,samuraie praticante do zen-budismo. Matsuó “Bashỏ” estudou poesia sob orientação do mestre Kitamura Kigin (1624-1705) Em 1672, mudou-se para Edo (atual Tóquio) capital do império, para se aperfeiçoar nas artes da pintura e da poesia.
Reconhecido em vida como um mestreinigualável,Bashofundousua própria escola (a Shômon) e teve diversos seguidores. O grupo liderado por Bashô ficou conhecido como "haicai Jittetsu" (os dez mestresdohaicai).
Poema conciso, o haicai busca sugerir, insinuar, em vez de expressar.Tentacaptarummomento efêmero, que em breve deixará de existir.
“Haicai é a arte de escrever não escrevendo.Éummomentoúnicona eternidade: não se repete, nem se desvanecenunca.”
(Bashô)
Queéhaicai? Éopoemaqueeterniza omomentobreve.
(MassauSimizo)
Filosófico, engraçado, crítico, romântico. Por meio do haicai, muitodaexistênciahumanapodeser concentradoemtrêsversos.
Oqueéhaicai? Éamenormorada,onde apoesiamora.
(MassauSimizo)
No modelo tradicional , o haicai nãotemtítuloeutiliza-sedachamada kigo,palavraquerepresentaumadas quatro estações ( por exemplo, “margarida”, representando a primavera,ou“cigarra”,indicandoo verão). O kigo é a chave do haicai, e sintetiza a brevidade do momento que se quis apreender por meio do poema:
CamposdoJordão Soldeoutonoacende Fogueiradeplátanos.
(MassauSimizo)
Em1906,ohaicaifoiintroduzido no Brasil por Monteiro Lobato, que traduziu e publicou seis poemas desse gênero no jornal O Minarete. Em 1919, o poeta e critico Afrânio Peixoto estabeleceu o que pode ser considerada a primeira forma do haicai à brasileira: três versos, com cinco, sete e cinco silabas, respectivamente, num total de dezessetesilabasmétricas.
22 LITTERA
No ano memorável de 1922, o haicai (então grafado haikai, ou haikai, por influência francesa)era não apenas produzido , como também discutido por poetas modernistas. A revista Klaxon, principal veículo de divulgação das ideias modernistas, publicouoartigo"Apoesiajaponesa contemporânea", assinado por Nico Hourigoutghi, ensaista e poeta de sofisticados tanka (outra forma poética japonesa que tem forte ligação com o haicai). Em 1925, Carlos Drummond de Andrade, influenciado pela efervescência criativadomomento, publicouseus primeiros haicais na revista de variedadesParaTodos.
Nos anos 1940 e 1950, Guilherme de Almeida, conhecido como “príncipe dos Poetas”, popularizou o pequeno poema japonês,pormeiodeartigosnojornal O Estado de S. Paulo e de poemas reunidos em sua obra Poesia Vária (1947) e O Anjo de Sal (1951). Também redesenhou a forma abrasileiradadohaicai:trêsversosde dezessete silabas métricas, o primeiroversocomcinco,osegundo comsete,eoúltimonovamentecom cinco silabas. E, a exemplo de Afrânio Peixoto, incorporou uma cadênciaderimasnasúltimassilabas tônicas dos primeiro e terceiro versos, acompanhada por uma rima internanosegundoverso.
Guilherme de Almeida estabeleceuumintercâmbioinéditoe significativo sobre o hacai com os imigrantes japoneses, seus descendentes e poetas locais, deixandoumlegadoimportantepara asgeraçõesseguintes.
Posteriormente , autores tão diversos como Manuel Bandeira, João Guimarães Rosa, Mario Quintana, Oldegar Vieira, Erico Verissimo e Haroldo de Campos produziram, traduziram e comentaram o pequeno poema. Nos anos1960e1970,levandoàsúltimas consequências a temática modernista, Millôr Fernandes projetouohaicainopaís,expondo-o em revistas de grande circulação , como O Cruzeiro e Veja. Nas duas décadas seguintes, o haicai se consolidou como uma das mais populares formas poéticas em nosso país. Destacam-se Alice Ruiz, Olga Savary e Paulo Leminski, que cativaram novos leitorespara o gênero, renovando-o Cabe mencionaraindaosnomesdeEunice ArrudaeTerukoOda. Assim,como passar do tempo, o haicai, ganhou múltiplos e surpreendentes formatos em nosso país. Tingiu-se de cores tropicais. Aseguir,algunsexemplos dehaicaisàbrasileira
HORADETER SAUDADE
Houveaqueletempo... (Eagora,queachuva chora, ouveaqueletempo!) (GuilhermedeAlmeida)
Avidaéumsaque Quesefaznoespaço Entreoticeotac. (MillôrFernandes)
tudodito, nadafeito, fitoedeito (PauloLeminski)
"HAICAIdeveserlidoda mesmamaneiraqueumaabelhase debruçasobreumgrãodepólenou umabrisaligeirasacodeumafolha deameixeira.”
(Bashô)
Fontes paraartigosobre HAICAI:
GUTTILA,RodolfoWitzig (org.).HaicaisTropicais (trecho). SãoPaulo:BoaCompanhia,2018. Disponívelem https://www.companhiadasletras.co m.br/trechos/33340.pdf.Acessoem: 18fev.2022.
SIMIZO,Massau.Asquatro estaçõeseoutroshaicais.Curitiba.: Aymará,2009.
MACHADO,Carlos.OMestre doHaikai.Poesia.net.2003. Disponívelem: http://www.algumapoesia.com.br/po esia/poesianet017.htm.Acessoem: 1
OSDEZMANDAMENTOSdo Haicai.Disponívelem: https://aquialidanca.com.br/2019/06 /16/os-10-mandamentos-dohaicai/#:~:text=I%20%E2%80%93 %20O%20Haicai%20%C3%A9%2 0poema,ver%C3%A3o%2C%20out ono%20ou%20inverno).
Miranda,Antônio.Millôr Fernandes.Disponívelem: http://www.antoniomiranda.com.br/ haicai/millor_fernandes.html. Acessoem:
DEZHAICAISDELEMINSKI. PreparaEnem.Disponívelem: https://www.preparaenem.com/port ugues/dez-haicais-pauloleminski.htm#:~:text=Os%20haicais %20de%20Paulo%20Leminski,dos %20destaques%20na%20literatura %20brasileira.&text=O%20haicai% 2C%20como%20observamos%2C %20tem,forma%20sucinta%20de% 20escrever%20poesia.Acessoem:
VeraLúciaFigueiredo: Contista,CronistaePoeta 23 LITTERA
Poemaintimista,sobreacomplexaecontraditória relaçãoquetemoscomnossosprópriossentimentos
Eu sem mim
Discuticomminhaalmaontem
Naverdade,brigamos
Naverdadebrigávamostodososdias
Eeuachandoqueeraumlancenosso
brigarporcoisastriviaisdavida
Euatéviaessasbrigascomoumarotina
pravocêver
Eomaisengraçadodissotudoéque nóssemprebrigávamospelomesmomotivo
Équeminhaalmasentedemais
Eeuquerosentirdemenos
Eparasersincero
Eunãomelembrodeumtempoemque eueminhaalmaestivéssemosdebem
Écomosesemprefôssemosinimigos naturaisumdooutro
Masessanossaúltimabrigafoidiferente
Poisminhaalmaafirmouqueiriaembora
Eelarealmentefoi,acheiaudaciosodaparte dela
Masnãoestousurpreso
elagostadeviverintensamentecadaemoção
Acheiatébomelair nãoestoumaisprendendo-aemmim
Oproblemaéquemetornei, literalmente, umcorpoambulantequesegueseusinstintos parasobreviver
Massobrevivernãoéviver
Edentrodemimhásimplesmentenãoum montedenada,e,sim,montanhas
Oquenãoéparamenos,euperdiumaparte muitoimportantedemim
minhametade,digamosassim
Eusintoumvaziotãograndequecomuma mãopoderiaseratravessado
E,mesmoassim,eunãosentirianada Poisafunçãodesentireradaminhaalma
Eagora,tecnicamente,conseguimosoque queríamos
Elapodesentirdemais
Eeu,demenos
EnsinoTécnicoemQuímicaIntegradoaoMédio
EtecCônegoJoséBento-Jacareí
OtavioRaphaeldaSilvaSantos
LITTERA
24 LITTERA
Pequenothrillerpsicológico,paraleitoresdispostosa encararoladomaisobscurodamentehumana.
Cativeiro
Abri meus olhos e não vi nada além da escuridão, o silêncio era agonizante e fazia-me querer vomitar. Definitivamente, não imaginava que ia terminar assim, asmãosamarradasnascostaseminhavozsendoabafada pelamordaça.
Acordei de manhã me sentindo estranha, como se todo o meu corpo indicasse que algo estava errado, mesmo assim, peguei minhas coisas e apressei-me para que chegasse a tempo na faculdade. Com certeza, a escola de artes não era o caminho que minha mãe esperavaqueeuseguisse.
Ela planejou minha vida toda: escola, balé, piano, faculdadededireito,ummaridoricoedoisfilhos.Minha mãe era obcecada e nada que fosse fora do que ela esperavaseriaosuficiente.
Oproblemaéqueelanãosabiadaminhadecisãoeeu não pretendia contá-la.Até uma vontade súbita de tirar todoopesoqueeucarregavanasminhascostasaparecer eeudecidirarriscarmeupescoço.
—Srta.Jones,estáprestandoatenção? será1/3dasuanota!-Disseoprofessorde Sempreodiei
—Perdão, pingodeanimação.
Volteiparacasaantesqueminhamãeaparecesse,pelo menostinhaumtempoparaprepararomeupsicológico diante da situação desconfortável que aconteceria. Enquantoesperava,comeceiotrabalhodaauladehoje. Elabatiaàporta.
—Oi,mãe.—Largueiatesouraàmesa.
— O que você quer? — Ela me respondeu com desconfiança.
— Não é nada, e-eu queria falar com você — gaguejei,eumarrepiomepassoupelaespinha.
Reuni o resto da coragem que me sobrou e contei a ela a verdade sobre o que faria da minha vida. Ela me retrucou com um olhar de desprezo, mas, logo em seguida,trouxe-meumcopocomumcháamarelo.
—Oqueéisso?—perguntei.
—Éparateacalmarumpouco.
Tomeiumgole.Começamosaconversarnovamente, masumsonoavassaladortomouminhaconsciência.Caí nochão.
LITTERA
25
LITTERA
Tenteilevantar-me,masminhavisãoestavaturva,de repenteviaquilo.Minhamãe,ousejaláoqueeraaquela coisa, derrubou-me abruptamente com uma fo descomunaldotipoqueeunãoesperavaqueelativesse.
Elacomeçouameatacareeupossotercertezadeque seus olhos brilhando, vi a tesoura na mesa e tentei soltar, esgueirando-me por debaixo da mesa e correndo até a outra ponta. Quando ela tentou me imobilizar novamente, segurei a tesoura com toda a coragem conseguireuniredesferiumgolpeemseuolhoesquerdo. Aquele monstro não pareceu se sentir abalado, então, repeti o golpe no outro olho e em sua barriga, ainda assim, mesmo sangrando, ela sorria. Desma novamente.
Um tempo depois, a polícia me acordou sem delicadezaeeufuilevadadiretamenteparaadelegacia, alegueilegítimadefesaedissequeelahaviameatacado, mas não acreditaram na minha versão Por alg motivo, todos os hematomas e machucados desferidos emmeucorpohaviamsumido.
Tentei convencê-los, mas acabei alterando-me; segurar\am-meetrancaram-menessasalaemqueestou agora.Maluca,transtornada,assassina,ouçooquefalam demimportrásdasportas.
Elaconseguiuoquequeria,amulherquemedeu à luz nunca morreu e não morrerá, ela sempre me assombrará até que eu me acabe em meus próprios delírios.Elanãoteveoqueesperava,entãodestruiutudo aquiloqueeuhaviaconquistado.E,nofim,estousendo perseguidaporela,ondesempreestive:emumcativeiro.
JúliadeAmorimFiló
EnsinoTécnicoemQuímicaIntegradoaoMédio EtecCônegoJoséBento-Jacareí
26 LITTERA
Um conto fantástico, em clima de pesadelo:
O PINGAR
Euestavavoltandoparacasaquandominhanoite começouaficarestranha.Eucaminhavalentamentepela ruavazia,jáeratardedanoite,ecomeceiaescutarpassos vindosdetrásdemim.Aprincípio,nãoligueimuito,isto é,atéeuvirarumaesquinaedepoisoutraemaisoutra,e os passos continuarem, não aumentavam nem diminuíamafrequência,foiquandoeuresolviolharpara trás. No instante em que me virei, tive um espanto, não por haver alguém ali, mas, pelo contrário, não havia ninguém.Perguntei-mesehaviaimaginadoaquelesom, enquantoiaparacasaemsilêncio.
Quandochegueiemcasa,penseiemirdiretopara a cama, mas resolvi tomar um banho e colocar comida paraomeucachorroantes,umpastor-alemão,chamado Rex.Apósisso,fuidiretodeitar-me,Rexdormiadebaixo da minha cama desde que era filhote, então, não me surpreendi ao não vê-lo em casa, provavelmente estava dormindo.
Mas,quandomedeitei,meupesadelocomeçou. De início, coloquei minha mão embaixo da cama para Rex lamber, como de costume, e ele lambeu; logo em seguida, comecei a ouvir algo pingando, tentei ignorar, mas não consegui; levantei-me e fui ao banheiro, pensandoterdeixadoochuveiropingando.Então,fuiláe apertei mais a válvula; depois, deitei-me de novo e coloqueiamãoembaixodacama,Rexlambeueeutentei dormir.
Mas o barulho continuou. Levantei-me outravezeaperteitodasastorneirasdecasa.Nada... o barulho continuou. Comecei a procurar goteiras pela casa toda. Nada... nenhuma goteira. Então, volteiadeitar-me,Rexlambeuminhamãoembaixo da cama e fiquei tentando me convencer de que aquiloerafrutodaminhaimaginação,masopingar continuava, gota por gota, sem parar. Eu estaria enlouquecendo? Em seguida, ouvi um rangido vindo do meu guarda-roupa. Eu me levantei para olhar, assim me distraindo do pingar incessante; mas,acadapassomeu,maisaltoosomficavae,de repente, vi-me pisando em algo molhado e, assim queabriaportadoguarda-roupa,entreiemchoque, o que vi abalou-me profundamente: Rex estava lá dentro pendurado e aberto, escorrendo sangue por todo o guarda-roupa. No fundo, uma mensagem escrita com sangue; "humanos também sabem lamber".
LAMBER MÃO
EnsinoTécnicoemQuímicaIntegradoaoMédio EtecCônegoJoséBento-Jacareí
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PedroPaulodaSilvaMoraes
CÃO\
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O GAROTO DE AMARELO
Meugrandeobjetivoeraescreverumromance,um romance tão perfeito que viver nele seria o sonho de qualquergarotohomossexual.Narealidade,euestavano meio da aula de Matemática, obviamente entendendo pouca coisa, com uma tremenda sorte de o menino de quemeugostavatersesentadoaomeulado,eeraóbvio queiriameinspirarneleparaescrevermeuromance.
Segundo lugar na primeira fileira, camiseta amarelaeumacalçapreta,eleestavaaomeuladoenão pudedeixardenotarcadafalaemovimentodele.Talvez eufosseocaramaisiludidodaquelasaladeaula,afinal, elenãoerameuamigo,talveznemsoubessemeunome,e eutinhaumacertezainternadequetodoaqueleamorque sentia fosse uma grande ilusão vinda da minha imaginação;entretanto,erafatoquemeusentimentopor aquele garoto de amarelo era grande, talvez momentâneo,masgrande!
Escrever o romance foi algo extremamente revelador para mim, numa hora eu estava nas nuvens, apaixonado por um adolescente perfeito, na outra, eu finalizava um lindo conto de amor, completamente reflexivocomoqueérealsomadoaotantodetempoque perdi com o irreal. No final da aula, olhei para o lado, tinha terminado minha história e fui surpreendido por ele, que me olhava, estava sorrindo, acenou e fiquei paralisado em meu lugar, “finalmente a lei da atração funcionandocomigo”,pensei.Quandoeleveioandando tododesajeitado,comosempre,meucoraçãoaceleroue parou ao mesmo tempo, passou por mim, virei-me acompanhando-o, e lá estava meu príncipe encantado, beijandoumagarotaloiraemagranaportadasala.
VitorGustavoCandidodeSouza
EnsinoTécnicoemQuímicaIntegradoaoMédio EtecCônegoJoséBento-Jacareí
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Umacrônicasobreasluzesesombrasquese revezamnabuscapeloamor
1/3/2022
Prezados alunos da Cônego José Bento: ETEC
Li seus poemas, crônicas e contos achei muito interessantes: alguns belos, outros arrepiantes; gostei muito, mas não posso fazer nenhuma crítica, pois sou apenas um escritor. Creio que escrever é transportar o que está dentro de nós para o mundo e, a meu ver, vocês conseguiram. Abaixo, algumas dicas:
Leiam “Carta” de Quintana, leia as cartas de Rilke. Escreva o que venha de dentro, nunca facilite para o leitor, não subestime. Se o leitor entender seu texto de um outro jeito ou significado, alegre-se, pois você, que é escritor , poeta, não mais é dono de donos de seus textos, eles voam de cabeça a cabeça. Nunca os expliquem, é como jogar pedra em um pássaro, você os mataria, acabaria com as várias interpretações!
Leiam Poe e Neruda, Leia Drummond e Mia Couto e tenha paciência com Machado. Leia para ser diferente, seja simples e requintado, escreva para quem nunca leu e para quem leu muito, o que se escreve não tem cor, religião, sexo ou raça. Por mais triste que seja, procure sempre a beleza.
O que motiva? O que inspira? O que te faz escrever?
A paixão e a revolta! Tomem cuidado com as duas, elas às vezes nos dão uma visão única sobre a situação, sua visão naquele momento. Então escrevam e depois reflitam sobre o que escreveram. Coloquem-se no lugar dos outros e refaçam seu texto, todo primeiro conceito é um pré-conceito! Existem mais coisas no mundo que a paixão e a revolta. Lembrem-se da infância, das brincadeiras de criança, fiquem com olhos atentos em sua adolescência, de cada momento pode nascer um poema, crônica ou conto. E prestem atenção nos risos de sua avó e também de seu avô, observe por que eles sorriem. Olhe para o mundo e escreva sobre ele!
Finalizando, existem grandes engenheiros, químicos, médicos e embaixadores que foram grandes escritores. É bom ter sempre uma outra profissão, viver da escrita é muito difícil, mas não é impossível!
Sinceras saudações, Pedro
Paiva
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AS CORES DOS DIAS CRÔNICAS
Cadadiadasemanatemumgosto,umatextura,uma cor,umsabor.Atéosrestaurantessabemdisso,fazendo afeijoadanaquarta-feira;ealasanha,naquinta.Como seoscardápiostentassempersonificarogostodecada dia. Todosnós,écerto, temoshábitosqueserepetem conformeotempocaminhanessaconhecidatrajetória desetedias.Claroqueasexperiênciasvariam,como tambémasrotinasdaspessoaseomodocomovivem cada24horasdesuaexistência.Achoquecadaum poderiaescreversobrecomosenteessepassardo tempo.Paramim,comoparatantosoutros, talvezseja esseopercursousual:
Amanhãdesegundaésempreumsairdacasca, romperocasulo,enfrentarosolescaldante,anévoalá fora,ouachuvaqueencharcaasapatilha.Éodiadas decisõespráticas.Decomeçaradieta,fazera matrícula,levarocurrículo,buscaroutroemprego, resolveroproblemapendenteeincômodoqueficoulá nocomputador,ounagavetadamesadetrabalho.Éo diaquenosobrigaaenfrentaroqueficouescondido, ocultoouimplícito.
Naterça-feiraenaquarta,jáháarotinaestabelecida,o iníciovencido.Háacontinuidadedasações,ofluirdo trabalho,astarefasdiáriasquesesucedem.
Naquinta,oprenúnciodealgoquesefinda,quese aproximadodesfecho.
Paraasexta-feira,criaramatéumverbo,“sextou”, indicandoummomentoapoteótico.Devoltarparacasa eolharomovimentomaiornasavenidas,asluzesque parecemmaisintensas,adeliciosasensaçãodedever cumpridoedediasprazerosospelafrente.A expectativa,nagrande maioriadasvezes,émaiordo queosprópriosacontecimentosaguardados,abemda verdade.Mas,deilusõestambémsevive.E precisamosacreditarqueaalegriadanoitedesextafeiraserápermanente.Equealgomágicopoderá acontecer,mudandotodanossahistória,ouda humanidade,atéquechegueapróximasegunda.
ViníciusdeMoraeseternizouosábadoemseupoema “ODiadaCriação”,doqualcitoalgunsversos:
“Todososnamoradosestãodemãosentrelaçadas
Porquehojeésábado
Háumrenovar-sedeesperanças
Porquehojeésábado.
Háumaprofundadiscordância
Porquehojeésábado.
Háumaimpassívelluacheia
Porquehojeésábado.
Háasensaçãoangustiante
Porquehojeésábado.
Háacomemoraçãofantástica
Porquehojeésábado.”
Háaperspectivadodomingo
Porquehojeésábado.”
O sábado é, portanto, o momento em que caem as máscaras profissionais e sociais, , em que se troca o crachápelocolar,eocoquepelocabelãoesvoaçante.Ou talvez amultidãoindesejada pelosofádasala,comsua solidãoacolhedora.Éahoradecadaumseroqueé.Nas baladas, nas ruas, num quarto simples ou numa festa glamourosa.
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domingo?Nãofizestudoarespeito,elongedemima pretensão de ser porta-voz da humanidade. Talvez muitosdiscordemdemim. Masvejoodomingocomoo dia em que se misturam todos os outros, numa salada mista e agridoce: as preocupações da segunda, que já começamatomarospensamentos;arotinadaterçaeda quarta,quejásevislumbra; odesejodequevenhaoutro fimdesemana,antesmesmoqueesseacabe.Domingoé recheado de clichês: tem a alegria da manhã de sol, de umalmoçodiferente,dapreguiçadatarde,ocinemaouo encontro à noite. Para muitos, é o dia de um contato próximo com Deus, de exercer sua fé religiosa; ou de visitaratia,reverumprimo,voltardaviagem,despedirse da praia. E o domingo carrega, para tantos, uma pontinha de melancolia, principalmernte depois do pôr do sol. Por minutos, contemplamos uma incompletude, umpedacinhoquefaltanoquebra-cabeçada vida.Vemnos uma ligeira inquietação, para a qual não há um motivovisível.O(a)leitor(a)podechamardefaltadoque fazer, ou invencionice, “frescura” Nos livros de autoajuda, haverá técnicas infalíveis para fugir disso, não se deixar arrastar pelo negativismo improdutivo, típico dos perdedores, e sempre ignorado por quem nasceuparaser“líder”.Osescritoresromânticos,porsua vez, que nunca pretenderam liderar coisa alguma, chamavam essa coisa de "spleen” , uma sensação inexplicável de perda, semque fosse conhecido, no entanto, oobjetoperdido.RenatoRusso,maisadiante, odefinecomperfeição:“...essasaudadequeeusinto/De tudooqueeuaindanãovi”.Aívemanoitededomingo,a preparação para recomeçar. Vencemos! E recebemos a dádiva decomeçar tudooutravez...
segundaTerça QUARTE QUINTA SEXTASÁBADODOMINGO
Eo
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Eparrey Iansâ, Marielle Franco e todas as mulheres
Comosaudaressasmulheresnoseudia?Então, imagineidividirem10itensoquetenhoadizersobre nós,mulheres,pessoas,habitantesdestequaseabrilde 2022.Eis,pois,asminhassaudaçõesaindaque caboclasesubdesenvolvidas:
1.SaúdoaquiasBeneditas,asMarias,asMartas,as Selmas,asAnas,Isabelas,Angélicas,Dolores, Letícias,Renatas,Isauras,Clotildes,Betes,Lucianas, Danielas,Gabrielas,Eloísas,Cristinas,Iones,Killians, Neides,Cleides,Sôniasecompanhialtda.Saúdo-te, InezValezi,amigatãoquerida,nomesingular,sem pluralporqueteimosa,forte,destemida.SaúdoLígiae LígiaLis,Salette,Luna.SaúdoRosa,minhamãe direitaebraçoesquerdo.
2.Saúdoasmulheresdetodasasraçasecores,alturas, donasdetodasasloucuras;asmulheresquefazem partosnormais,cesarianas,mulheresquetecempanos desonhoequepassamfomedeverdade;destemidas, semmedo.
3.Saúdoasfortes,asparideiras,asquepassaramfome esedenosdesertosdavidatãosemgraça;
4.Saúdoasquesedespiramdetodasasmáscarase souberamchorarcomdignidadenafrentedoscortejos;
5.Saúdoasqueperderamseusmaridos,companheiros ,filhos,asquesabemdecorqueapalavrainjustiça, nestepaís,jáfoirevisitadamilhõesemilhõesdevezes;
6.Saúdoasmulheresambiciosas,assimples,as humildesdetodososlugares.Asquelavaramroupa,as quefizeramsabãonotacho,asquevenderamdoces pelarua;masmaisintensamente,saúdo-teprofessorinha pequenaefrágilcomofolhaaovento.Aquelaqueensinaas primeirasletras,queganhapouco,queamaosmeninos maluquinhoseasmeninastãotímidas;
7.Saúdoasgenerosas;asquenãonegampalavraseouvidos, asquenosseguramforteamão,nossorriemenosguiam pelaestradadavida(pormaisbanalqueissopossanos parecer);
8.Saúdoasque,quandoafomebateu,adespeitode tudo,mantiveramacabeçaerguida.Asquenunca souberamoqueeraafomedecomida,masafomeque geranomundoaforçaeaalegria;
9.Saúdoasquehumildementecuidamdacasadas outrasmulhereseque,dedicadasedestemidas,tiramo pódamobília,fazemcaféepõemamesanumacasa quenemésua,longedosfilhosquemuitasvezes passamnecessidades;
10.Saúdo,porfim,asmeninas,essasquepassamtão lindasequeumdiaserãomãesdeoutrasmeninas. Saúdo-asemnomedeDeus,doPaiedoFilho,do EspíritoSanto,essesnomesmasculinosparacriaturas criadorasdoCéuedaTerra,doUniverso, deMercúrio edePlutão,deSaturno-todosnomesmasculinos... Mas,porincrívelquepossaparecer,saúdo-asemnome daEsperança,daBondadeedaJustiça-todosnomes femininos.Saúdo-asemnomedaLiberdade,daVidae daMisericórdia.
QueDeusasconservecomforça,dignidadeealegriae queosdiaspassemcéleres,felizes.Ajoelhadasdentro denósmesmas,mulheres,rezemos,finalmentepara outrasmulheres:asqueapanham,sofrem,choramese calam.Queelaspossamserdonasdetodososdiase quesaibamoquantoédifícilatravessaravidasem os frutosquenós,mulheres,tecemosdoidaemansamente pela vida.Amém.
11.Nãoeramonzeosdesejosesaudações,massaúdoteMarielleFranco,mortanodia14.3.18,há4anos. Teusgritosporjustiça ecoampelasruas doRio,fazer oquê,porenquanto?.Teutrabalhonãofoiemvão, nemtuamorte.EparreyIansã,tuamãeetuairmã, SalveSantaBárbara,asenhoradetodososventos, raiosejustiçasterrenas.
Eparrei,Oyá.
MULHER
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EstherRosado: Psicanalista,professora,ocupaa cadeira17,Profa.Philomena Pinheiro,daAcademia JacarehyensedeLetras.
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Profissão: Literatura ENTREVISTA COM GLÁUCIA MIDORI
EDITORA-EXECUTIVA DA HAIKAI EDITORA ( São Paulo)
Gláucia,conte-nosumpouco sobresuaformaçãoe suaexperiêncianouniversoeditorial.
Iniciei no mercado editorial em 2013, fazendo trabalhos de diagramação dos CADs da Editora Unesp pela Atarukas Produção Editorial, foi o início de uma paixão! Em todos esses anos, acompanhei e aprendi todos os processos da produção editorial de livros e didáticos, fiz cursos de Design Gráfico e de Produção Editorial. Eu me dividia em duas áreas (bem diferentes...rs) até 2018, quando eu resolvi focar e me dedicar apenas a autores independentes na Editora Haikai, que fazia parte do grupo editorial Atarukas. Também sou formada em Farmácia Bioquímica (2009).
Qualé exatamenteopapeldoeditor-executivona cadeiadeproduçãodolivro?
O editor-executivo supervisiona todas as operações e processos diários de editoração. Faz os treinamentos e contratações dos colaboradores. Na Haikai, eu e o Eduardo, que divide essa função comigo, temos contato com todos os autores, avaliamos suas obras e projetamos o livro com as caracteristicas que eles sonharam.
Comovocêvêomercadoeditorialindependentehoje noBrasil?Eomercadodetrabalhoparaos profissionaisdolivro,osqueatuamnos“bastidores” daproduçãocultural?
O mercado editorial está crescendo muito, hoje em dia está cada vez mais fácil para publicar um livro. Os livros digitais e audiolivros ganham espaço para atingir um público cada vez mais amplo. É um mercado que está em movimento de expansão, cabe a nós, profissionais do livro, fazer um trabalho de qualidade nesse processo para que os livros publicados sejam agregadores aos leitores.
Comovocêpercebenaatualideapossibilidadedeum indivíduoobterseusustentosomente atravésda literaturae/oudomercadoeditorial?
É possível, mas com muita dedicação. O mercado está concorrido, é necessário ter um diferencial, fazer um trabalho respeitoso e bem feito. Acredito que isso não seja apenas no mercado editorial ou literário. Estamos em um momento que vivemos um excesso de tudo, a oferta está sempre acima da demanda.
Quaisosmaioresobstáculosenfrentadosnodiaadia deumaeditora?
O mercado editorial que está cada vez mais “abarrotado”, perdendo um pouco da sua riqueza. Temos hoje uma concorrência que nem sempre garante um trabalho bem feito, mas tem baixo custo; isso acaba desvalorizando o mercado e enchendo prateleiras de livros com pouco valor literário ao leitor
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Fale-nosda .Qualsuapropostade Haikai Editora atuaçãoe/ouseusdiferenciais? Quaissãoosprojetos paraofuturo?
A Haikai Editora nasceu em 2015, como selo da Atarukas Produção Editorial, com propósito de dar voz aos autores brasileiros e acreditar na literatura brasileira.
A editora segue realizando o sonho dos autores, em transformar histórias, textos e estudos em obras literárias.
Com atendimento personalizado e da forma mais humana possível, nossas edições são textualmente bem lapidadas, e o projeto gráfico confere leveza e excelência visual, trazendo a público uma edição primorosa e de alta qualidade. Oferecemos uma forma econômica, rápida e moderna de publicação, viabilizando o sonho do autor de escrever uma obra e colocá-la à venda no mercado. Cuidamos de todas as etapas do processo editorial com carinho e dedicação, pensando sempre nos melhores caminhos para dar visibilidade ao livro. Nosso projeto é crescer cada vez mais, realizando o nosso trabalho da melhor forma, ganhando uma visibilidade maior no mercado literário, com qualidade e dedicação.
Qualseuconselhoparaeditorasindependentes iniciantesnomercado?
Façam seu trabalho com dedicação e amor monetização é consequência disso. O mercado literário antes de tudo é arte, criatividade e sentimento.
Qualopapeldaseditorasindependentesemreavivaro meioculturalbrasileiro?
Para nós da Editora Haikai, é produzir um livro de qualidade. Hoje em dia, com a facilidade de publicar um livro, temos no mercado infinitas opções de leitura, porém, muitas vezes, de livros mal produzidos, sem conteúdo e pobre em escrita... excesso de informação irrelevante para o leitor. Da mesma forma que é maravilhoso ter essa abertura para aflorar cada vez mais autores, precisamos tomar conta da qualidade de conteúdo que vamos entregar aos leitores.
Comoleitora,quegêneroseautores vocêmais aprecia? Como leitora, tive algumas fases, vou citar alguns autores que me marcaram de alguma forma. Gosto muito de romances literários, haicais, ficção e, atualmente, livros sobre terapias naturais. Gosto dos dramáticos livros de Álvares de Azevedo e Oscar Wilde aos sonetos de Vinícius de Moraes, das histórias de Machado de Assis e a da mente brilhante de J.K. Rowling e de Dan Brown.
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5.000anosatrás
Zeus se aproxima, andando.
O que queres, titã?
Explique-se!
Cortar todo contato, eles decidiram o futuro de sua raça, as belas humanas não devem ser mais cobiçadas, suas guerras devem ser decididas por eles, entre outras coisas.
Eu aceito! Diga quem será ela.
A filha do deus Nereu, de nome Tetis!
O que devo fazer?
Case-a com o rei Peleu, e a mantenha longe e sempre à sua vista.
LIBERDADE - PARTE III
A humanidade livre dos d e u s e s o l í m p i c o s e minha liberdade.
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Será feito! Mas...! Sua liberdade e a dos humanos, só após estas coisas acontecerem.
Concordo! Que as correntes e esta águia me acompanhem por mais algumas décadas, que são décadas perto de milênios?
Responda-me, meu primo, morreria por eles?
Até mesmo para nós, morrer é apenas um detalhe, quando se vive por algo! Alguns seguiram meu exemplo, viveram e morreram por menos...
Como você! Serão tolos!
Zeus caminhou e desapareceu.
Trinta anos depois, Hércules liberta Prometeus.
Pedro Paiva
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CONTOS DA TARTARUGA DOURADA - KIM SI - SEUP
Estão reunidos neste livro cinco “Contos Da Tartaruga Dourada” remanescentes dos escritos produzidos pelo poeta CoreanoKimSiSeup,nofinaldo século XV Essa obra é considerada o primeiro registro de prosa ficcional da literatura Coreana. São Histórias fantásticas, onde homens e divindades interagem, fantasmas procuram pessoas solitárias ou emcriseexistencial.Ondemagia e realidade são registrados igualmente válidos, nas quais ensinamentos morais e análise sociológica se fundem , sutilmente.
Os fundamentos expressam nos contos são retirados do Budismo,doConfucionismoedo Taoismo. A influência é sempre chinesa, especificamente dos clássicos Chineses, na escrita, nas histórias que se contam e inspiram ospersonagensnosmitos,masoautorédistinto doschineses,elepertenceao“ReinoDourado” (oAutorviveunostemposdograndereiSejong ,opromulgadordocódigodeescritodoalfabeto Coreano).Sãoescritosemprosa,mashálongas seções poéticas nelas (talvez um quarto ou um terço total do livro). A poesia é na verdade o instrumento utilizado pelos personagens quando interagem entre si, nenhuma ideia, nenhum conceito é verbalizado em prosa, quando não fazem reflexões para si mesmas, eles expressam seus sentimentos através da poesia,háumjogolicenciosoemquasetodosos enredos,umasexualidadecamuflada,umduplo sentidoqueelideamecânicadoatosexual.
Em geral são deidades femininas que se apresentamaoshomens,mashátambémdeuses que ficam curiosos pelo destinohumanoeconvocamo vivente para um colóquio divino,honradonelessemprea sabedoria e a capacidade poética. Em “um jogo de Varetas No Templo Das Mil Fortunas” um rapaz pede ao poderoso budaumanoiva.Em “YI Espreita Por Cima Da Mureta” um rapaz seduz uma garota que vive encarcerada em uma espécie de pavilhão dourado; Na História
“Embriaguez No Pavilhão Do AzulSuspenso”umbelomoço se embebeda e passa a noite com uma “mulher que não faz parte do reino dos homens”; frase sempre repetidanashistóriasdeSi-Seup;Em“AVisita À Terra Das Chamas Flutuantes Do Sul” um sábioestudiosodoconfucionismoéconvocado para visitar o reino dos mortos e de alguma forma preparado para tomar o lugar do rei. “O Banquete Esvanecido No Palácio Do Fundo Das Águas” um outro estudioso é levado a um reino mágico, dessa vez, como convidado de honra como se o Rei quisesse mostraraosseussúditosque há sabedoria no mundo dos homens.
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Dica de Livro
LITERATURA SEM FRONTEIRAS
A ESPERA
Para o senhor Onofre o tempo era uma
virtualidade que não estava quieta, avançava sempre,mesmoquenãodesseporisso.Sabia quejátinhatantotempoquantootempolhotinhaquerido daroquejáiaparacimadeumafarturadeanos.Àsvezes diziaparasiqueaquantidadedecoisasqueotempolhe tinha ensinado se quisesse enlouquecer tinha enlouquecido.Porém,sóocansaço,maleitasmileaquela ideiaqueselevantavacomeletodososdiasmalasdores acordavam
«soucadavezmaisumtipocheiodenãopresta» prevalecia.
Resolveuiraomédico. Vestido com o casacão preto surrado pelo uso, aconchegado por um cachecol axadrezado cinzento e verdeporqueamanhãarrefecera,osenhorOnofreentrou norecém-inauguradoCentrodeSaúdeeesbarroucoma modernicedeumamáquina,comsimpatiamecânica,lhe dizia, num ecrã com cores apelativas, que para ser atendido tinha de tirar uma senha de acordo com o seu estado. Obediente, o senhor Onofre, mesmo sentindo o incomododafiladeutentesqueiaengrossandoatrásde si, lá foi soletrando resignadamente com o dedo indicadoraseguirasletrascadaumadasalternativaspara escolheraquelaquemelhorselheadequava;
-AtendimentoPreferencial Pensou que esta opção era-lhe dirigida, não só pelo muito tempo que já tinha de vida como pelo dinheirão quedescontaraparaaCaixadePrevidênciasemqualquer proveito Mesmo assim carregou a medo na tecla Surgiram sorridentes várias opções e os conselhos para escolher a que melhor se lhe adequava. Seguindo o alvitre da máquina que o informava, eufórica, que para reduzir o tempo de espera deveria escolher o estado etárioondeseenquadrava;
-Sexagenário
-Septuagenário
-Octogenário
-Pré-moribundo
-Moribundo
Com o indicador da mão direita a tremer o senhor Onofreescolheuapenúltimahipótese–pré-moribundo – por considerar que o tempo que já levava de «cá andar»ocolocavamuitopertodafestadadespedida.De uma ranhura da máquina saiu uma senha azul celeste com o número 236. O senhor Onofre sentou-se num lugar vago na sala de espera e paciente, como sempre fizeranavida,esperouqueotempochamasseonúmero 236.
Passou o tempo que o tempo entendeu que devia passarequandootempojulgouqueeraotempoexato ouviu-seumacampainhaeumavozmelodiosachamar:
«Senha azul celeste número duzentos e trinta e seis»
Ninguémrespondeu.
Avozmelodiosainsistiu:
«Senha azul celeste número duzentos e trinta e seis»
Silêncio.
AesperatinhasidolongaeosenhorOnofresentado nacadeiranasaladeesperatinhagastadootempoque lhe estava destinado para o seu estado de prémoribundo.
A espera fizera-o passar ao estado seguinte e ao seguintesemdarporisso.Pacientementecomosempre fizera.
Nada de anormal se passou no moderníssimo CentrodeSaúde.
AFONSOVALENTEBATISTA
Escritorepoeta portugues
Sóhaviaumcadáverpararemoverdasaladeespera.
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Ele voa pelo meu peito novamente. Agite a vibração. Em todas as cores do espectro. Ele é grande e forte, atingindo todas as paredes da minha armadura. Invisível no espelho sorrindo na minha cara, me sinto bonita hoje. Pegorímeldabolsadetoalete,pisco para me concentrar. Pensamentos, sonhos, memórias latejam atrás das minhas sobrancelhas. É uma grande bagunça, nenhuma unidade à vista. O dia está longe de raiar, mas está tudo bem. Mesmo no caos o vento sopra.Eucorroopincelaolongodos cabeloseospintomaispretodoque jáeram.Umolharfresco.Vocêsabe queeuvouescrever,euvouescrever para você. O texto que percorre minha vida, o fio delicado. Palavras que não consigo esquecer, goles de vinho que bebi Algum dia, em algum lugar, um terraço depois é o que farei dele, porque mais inquietação não cabe no meu corpo hoje. Limpo o vapor da respiração, jogoorímel,meviroefechoaporta.
Pássaro do pânico
Meu carro é velho, a porta reclama quando entro. Eu apito de volta,eunãovouserrepreendidopor umtricotador.Naverdade!Vaihaver algum engasgo, mas estamos a caminho! Para onde? Esse pânico também, eu me vejo no espelho, acho meu destino, qual era o meu destino de novo? Com uma mão no volante, sinto minha coxa. Será que se transformaria em um hematoma?
Ohbem,orádiotocaumamúsica,o Dafzinhocantarolaalegremente.Eu não me importo com sua bomba rom Mas uhh , aquela última bomba rom não fazia parte disso! E por que de repente estou parada no meiodaestrada?
Eupegominhasmeiasaltas,não adianta.Oelásticoqueestourou,tiro ,saltos altos e as meias. O vento sopra entre minhas pernas. Apenas uma agradável surpresa depois do calor desta noite. Um telefone de emergência que oferece ajuda. A assistência na estrada, se eu tenho paciência? A umidade garantiu o trânsitoparaumaembolia.Euchuto o Daf um perseguidor de putas verdedesbotadocomsuspensório.
Ele estava prestes a quebrar e quebrouatéomeu.Osfragmentosda noite. Sexo e raiva. Eu estou descartada e quebrada cozinhando aolongodoasfaltopreto.ODafque não ferve mais. Minha cabeça é um caminhão estacionado em um Daf. Euagarrominhavirilhaeamaldiçoo o mundo. Amaldiçoe quem você é. Quem eu sou. Estou , acabei bêbada dedirigir.DieDaféumautomático, com jogo de direção de um peixe galho Seaomenoseutivessefugido daponte.
Eu tenho que manter a calma, a assistêncianaestradaestáchegando. Mas não estou calma, me rendo a pensamentos sonhadores. A cadeira reclinada,aluzdoposteiluminameu corpo.Meudivinoeu.Voudeitarna sua porta, bipolar, eu me importo. Tremendo de prazer Feche essa porra de porta. Uma vez que você temqueirparafora.Eentãovocêvai me encontrar, aqui, despida, talvez decapitada. Passe por cima de mim setivercoragem.
Original em holandês
h ps://www.eldersliterair.nl/paniekvogel/
EricavanDooren
LITERATURA SEM FRONTEIRAS
ESCRITORA 39 LITTERA
LITERATURA SEM FRONTEIRAS N a do escritor
Vontadedeexplodiraminhacabeça.fonesnosouvidos eumbomRocknomaisaltovolume.Infelizmentenão hácatuaba(queéumaespéciedegindeervas,porassim dizer) à mão para ferver a massa cefálica com um ato vigoroso Amanhã, qualquer dia destes, eu irei a Benevidesparapegarumapetecadeskunk.Afebreque percorreumeucorponasemanatodanãomebasta.Por quêdiaboseutinhaquerecomeçaraescrever?Comose não soubesse que ia me custar a cabeça. Sempre faz. Simplesmente escrever obviamente não me está permitido, por algum motivo que ainda não consigo entender,minhaescritasempredeveviràcustadapaz deespírito.Escrevoporhorasafio,pulosemproblema noites inteiras para os dias depois vagar pelas ruas da cidadecomoumfantasmadurante.
Alguémdementesãdiriaagoraqueseriamelhorse euparasse.Parar,deumavezparasempre.Masissojá não é possível. Agora que comecei de novo, a merda tem que sair do meu corpo E isso somente vou conseguirseescrevo.Abagunçatodadeumavez,seria legal.Aquelepequenothrillerquenãoviráumthriller, mas participará da competição mesmo assim. "Tinta sobre papel" –meulivro,aúnicacoisaqueaindamedá algum prazer enquanto os meus pensamentos correm alegres. Não obstante ver-mos-ei se consigo produzir umsaltomortalestanoite.Edepoisaindatenhoqueter umbuquêprontoparaesobreMarianoDiaMundialda Mulher Ademais,eucomeceicomestacarta.Bestaque sou.Emvezdemenos,tudosetornamais.Nemumfio de cabelo na minha cabeça pensando em desistir. Fuligem na comida – apenas se a carne estiver queimada,casocontrárionão.
Porqueeucomeceidenovo,euperguntei?Por covardia,oupordelíriosdegrandeza,ouporalgum tipoestranhodecasamentomistodosdois.Umtrecho dumtextocolocadonainternetemumgrupo,para mostrarqueeurealmentepossolidarcomletrase palavrasenãoapenascriticarostextosqueoutros produzem.Claroque,alguémdogrupotinhaqueme perguntarseomeutextopretendiaserummanuscrito. Eeudisse'sim'porqueeracovardedemaispara explicarquequasenãoescreviamais.Porcausa daquelacabeçafervente,éclaro.
Masjáfoi.
40 LITTERA
Maisumaveznestaminhavidaaalucinaçãoatacaas células cinzentas. Mais uma vez as visões febris tornam-semonstrosdepapelesperandopormim,pois não podem viver sem mim por muito tempo. Quando escrevo,passoporumdelírioborbulhante,uminferno que me dá um prazer que só posso comparar com espasmos eróticos De novo Maria, que sussurra incessantementeemmeusmembros.
E tornou-se noite e tornou-se dia, o dia da noite seguinteealgumdeusviuqueasmassastinhamficado abaixo do ponto de ebulição. Tudo estava bem, o céu estavaazulatéqueodilúviotropicalexatamenteàstrês horas da tarde esmagou todos os caminhos visíveis. O que eu estou fazendo? Puxando a corda –desembainhando a palavra tampão e me machucando comela.Autoflagelação,idiossincrasiaobstinada.
Claro, minha escrita é um ato de automancha, mas não importa porque com um pouco de sabão em pó é bem fácil de sair. Minhas camisas poderiam ser bem alvejadas!' Só que ele não pode ser um homem porque ele não fuma. O mesmo disse de vermelhos e verdes. Eu não consigo não, nenhuma satisfação '- os Rolling Stones em meus ouvidos entendem do que estou falando.Aindabem,porqueeumesmoestouumpouco sobachuva.
Ecomisso,éhorademergulharodelírionovamente na"Tinta".Estetextochegouaoseufim.
Original em holandês h ps://www.eldersliterair.nl/noot-van-de-schrijver/
ESCRITOReTRADUTOR 41 LITTERA
JanOldenburg
SEM
Estação chuvosaCuscoem
Nomeiodachuva,seistrabalhadoresdaestrada estavam de pé à uma sopa de pobres, onde venderamsopademacarrãocomcarnedeporquinho daIndia.
Ruppert estava sentado sozinho no ônibus, exceto por uma mulher baixinha com correntes de ouro a quem Moni e ele desde o começo da viaje simplesmente chamaram de "a convertida" . e observoucomoosclientescomeramdepratinhosde plástico apesar da chuva, divertindo-se com isso. Uma jovemmulherCetchuacarregandooseufilho nas costas em uma colcha tipo Inca listrado azul, vermelhoebranco,dividiaasopadedoisSolespor prato e limpou os pratos que retornaram com um pano. Ela tinha colocada a panela de sopa num bancoverdepertodeumafaixadegramaquecorria ao longo da estrada; para mante-la quente tinha embrulhado a panela em várias camadas de cobertores e jornais velhos. Depois de cada porção queelaserviu,apanelafoicobertodenovo.
A criança nas sua costa não estava completamente coberta, como é de costume, talvez por que já tinha uns anos de idade. Tinha a cabeça para fora e olhou para Ruppert com grandes olhos pretos pela janela do ônibus. Ele não consegia distinguir se era menina ou menino. Ele acenou a criança, sorriu exageradamente para ela, mas a criançanemreagiu.Pensouquetalvezeranadamas nasuaimaginaçãoqueacriançalheestavaolhando. MasentãoelelembrouqueMikhail,oguiaturístico, tinhacontadoqueasmulheresindigenascostumama amarrar as maõs das crianças dentro da funda para comqueficaremquietinhos.
Ele considerou brevemente que o rosto molhadodacriançaporsisójádariaumafotoboa, maselenãoestavanoplantão,ealuzrealmentenão foisuficiente.
"Deveria-seperguntaraestamãeoquepassana cabeçadela",dissenestemomenteaconvertidaatras dele.
"Comoé?"perguntouRuppert.
"Mas, isso não é horrível? Observe aquela criança!Davontadedenemolhar""Entãonãoolhe." Já a primeira noite Moni lhe tinha lhe falado não escapar a impressão que ela era uma convertida evengélica. Mas ela não explicou o que exatamente queriadizercomisso.
"Com pessoas igual ela", choco-se a convertida,"opadrãodavidadessascriançasmudará nunca.VoudizeraMikhailqueestouindignadacom isso."
"Michailtambémnãovaipodeajudá-la",disse Ruppert.'Eleprovavelmentediráqueétípicoparaa região.«
Aconvertidabufoucomraiva.Comcertezaela já tinha a ideia que Ruppert foi pessoalmente responsávelparaasituaçãoemqueacriançaestava.
Ao chegar em Cusco, seu guia tinha se apresentadocomaspalavras:MeunomeéMikhail, MikhailSérvia.ÉumnomebemcomumnoPerú,né, ao que todos fingiam um sorriso. Afinal, todos os viajantes eram pessoas capazes de reconhecer uma piada quando for apresentada. Faz vinte anos que deixeiSarajevoparavisitarumanamoradaemLima.
Agora já tenho dezessete anos de guia turística em Cusco.Cuscoéumalindíssimacidade,Mikhailtinha adicionado.
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LITERATURA
FRONTEIRAS
Um nome de guerra, Ruppert pensou espontaneamente. E vinte anos não poderia estar certo. Se for rápido, ele saiu da Sérvia inmediatemente depois de Dayton, mas seguramentenãoantes.
"Eu vou eu mesmo se você não for", disse a convertida. Ruppert ficou tentado a responder que afinal, não foi por isso, que não tinha desistido da estúpida caminhada pela cidade, que absorvou Michailcomogruponoiníciodamanhãno bairro artístico,parasairagoranachuvaemisturarcomos peruanosparacomersopa.
"Seissolhefazsentirmelhor",disseele.
Elaselevantou,saiudoônibuspelaportados fundos, e Ruppert teve que limpar o interior da janela para poder ver o que ela ia fazer. A possibilidadedeelafalarsequerumasópalavrade Espanholeraparasercompletamentediscartada.
Aconvertidapertoficouàbeiradogrupoque estavamcomindode.Oshomensficaramdecostas para ela, se divertindo, pegando com colher a sua sopa,nosupérficedequal,seolhavabem,davapara verpequenoscirculos;poçinhasnachuva.
Original
Suacompanheiradeviagemtirouumlençode papeldobolsodasuajaquetaetentouaproximar-se àcriança.Elarealmentedesejaenxugarorostroda criança,pensouRuppert.Quandoelaentãobateaua mão contra o ombro de um dos homens, o lenço caiunasopadeleeeleaempurrou. Elacaiucontra abarreiradafaixaverde.
Ruppert desviou o olhar e contou até trinta. Quandoeleterminoudecontar,viuaconvertidajá estavaaocaminhodevoltaparadentrodoônibus.
»Essas pessoas simplesmente não têm qualquer tipo de coração«, disse ela desprezando, sentando-seatrasdele."Masissovaletambémpara osbrancos."
"Bom que você possa julgar isso", retrucou Ruppert.
"Olha você quanto estou ensopada." Tinha algodechoronasuavozagora.
"Bem,depoisvocêpoderápelomenosdizer", disse Ruppert, »que você vivenciou o início da estaçãochuvosaemCusco."
A porta do motorista abriu com um suspiro. "Vamosencontrarcomogrupo”,disseomotorista. Elesejogouatrasdovolanteeligouorádio.Uma estação tocava comerciais e Ruppert ouviu que Machupichu Pharma oferece um comprimido contra o mal de altitude às turistas. Quando o ônibus se começou a afastar-se do meio-fio, Ruppert acenou novamente para a criança. Desta vez, ela puxou a mão de debaixo dos cobertores, acenou de volta e sorriu para ele. Claramente era umamenina.
PeterH.E.Gogolin
ESCRITOR
43 LITTERA
em alemão. h ps://www.peter-gogolin.de/
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