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O monte de Santo Antonino
from OsmusikéCadernos 2
by osmusike
Armindo Cachada32 cachada.armindo@gmail.com
Há alguns dias, aproveitando um fim de semana solarengo, embora um pouco nebuloso, escolhi, como local de passeio, o Monte de Santo Antonino, na freguesia de Mesão Frio Guimarães. No alto do monte, que faz fronteira com a freguesia de Arões, no concelho de Fafe, há um pequeno planalto com uma capelinha dedicada a Santo Antonino, de paredes ameadas e com torre sineira quadrangular, mas sem sinos. Dizem-me que, pelo mapa, o cruzeiro que se ergue a poente no planalto pertence a Guimarães e a Capela de Santo Antonino, a nascente, está situada já em terrenos da freguesia de Arões - Fafe. As medições, no entanto, podem não corresponder à descrição. De qualquer modo, do topo do monte, tem-se ampla visibilidade circular (360 graus), em todas as direções, designadamente sobre as cidades de Guimarães e Fafe.
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A Capela. a Pedra do Santinho e o Milagre da Cura da Asma
Nesta capela, cuja construção primitiva é atribuída ao século XVI, há romaria e festa, todo os anos, no início de Setembro. Os romeiros e devotos acorrem ali para que Santo Antonino os cure dos seus problemas respiratórios, provocados pela asma e bronquite, além de fazer desaparecer também, como o São Bento das Peras (de Vizela), os «cravos» das mãos. Junto à capela há um pequeno rochedo, conhecido como a “Pedra do Santinho”, pedra essa que o sábio arqueólogo vimaranense Francisco Martins Sarmento, depois de ter visitado o local, descreve como “calhau informe”,(1) furado obliquamente, com um dos orifícios virado para terra e outro para ar. Lendariamente, a pedra é considerada milagrosa contra o “cansamento do peito”.(2)
Martins Sarmento recolheu, junto da população local, a forma de operar para obter o milagre solicitado pelo romeiro: tapa-se o orifício que volta para chão e, depois que o doente bafejou nele, tapa-se também o que volta para o céu. Parece que, com o hálito do doente assim encarcerado, ele fica despenado do seu mal”. Mas há que ter sorte, pois, adianta o arqueólogo, “a pedra só faz um milagre por ano e precisa-
32 Ex-jornalista JN
mente quando começa o dia da festa do santo, portanto ao bater da meia noite do primeiro de Setembro”.
A Ciência e a Crença
A propósito desta curiosa limitação da ocorrência milagreira, Martins Sarmento comenta: “É de crer que em antigos tempos a concorrência dos devotos originasse alguns conflitos”. Estamos a falar do ano de 1888, altura da publicação destas observações de Sarmento na “Revista de Guimarães”, ainda hoje uma das publicações mais conceituadas nacional e internacionalmente, tendo em conta as largas dezenas de permutas que tem com revistas científicas similaImagem 35 - Capela de Santo Antonino com torre sineira quadrangular acastelada, mas res, nacionais e internacionais. Como sem sino. O “Penedo do Santinho” está ao lado esquerdo. cientista, Martins Sarmento atém-se, nos seus registos, aos factos observáveis, mas não deixa de fazer também uma interessante recolha de lendas, crenças e tradições ligadas aos materiais arqueológicos que investiga, pois neles recolhe também muita informação de caráter etnológico e antropológico.(3)
Mas, neste caso, não resiste a tecer o seu comentário humorístico à limitação da ocorrência milagreira, comentando: “hoje, esse perigo (de conflitos de concorrência) desapareceu. Quem quer bafejar no milagroso buraco mete-se com o tesoureiro da festa e uma bandeira, içada de véspera, na cruz da capela, anuncia que está tomada a vez para o afilhado daquele magnate”.
Um sítio a visitar
No dia da minha subida ao Monte de Santo Antonino, que não era de festa,(4) não tive a oportunidade de confirmar, junto da Comissão Organizadora da Romaria, se tais costumes ainda se mantêm. Provavelmente, não. Mas que o “Penedo do Santinho” ainda lá está intacto, como o descreve Martins Sarmento, está. Quem quiser confirmar, é só subir ao Monte, pois tem bons acessos de estrada, uma vista magnífica sobre toda a região envolvente e mesas para merendeiros. É um dos miradouros naturais de Guimarães que recomendo. ACSC
(1) SARMENTO, F. M. Materiais para a Arqueologia do Concelho de Guimarães, Revista de Guimarães, ano de 1888, vol. V, pp 114115. (2) Entenda-se “asma” (3) Apesar da situação privilegiada do local, com fácil defesa perante eventuais assaltos nos tempos pré-históricos, Francisco Martins Sarmento não encontrou no local vestígios de qualquer fortificação, apenas fragmentos de louça antiga e restos de uma possível mamoa, que não confirmou, por estar muito destruída. (4) Há vários santos com o nome “Antonino”, mas o que é venerado no Monte com este nome é um mártir, sobrinho de Teodorico,
Rei de Aragão, com festa a 2 de Setembro.