UMA (NOVA) VISÃO DO FUTURO N.º4 | JUN



Distrai te: pg. 24 e 25

Manifesta te: pg. 26 a 31
Aproxima te: pg. 8 a 13 Escl t pg
Índice 1 2 3 4 5
Informa te: pg. 4 a 7

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Assim, fizemos uma seleção de alguns dados que considerámos importantes para ilustrar o panorama político atual


INFO
Este número não poderia começar sem olharmos para os resultados das últimas eleições legislativas
Eleições anteriores:
Em Po

Em 2022, as maiores taxas de abstenção foram registadas em zonas descentralizadas, e as menores, em zonas mais urbnanas.
Em 2022 os resultados das eleições legislativas registaram a primeira descida da taxa de abstenção desde 2005 Ainda assim, a taxa de abestenção de 2022 48,6% é um resultado aproximadamente 6 vezes superior à taxa de abstemção em 1975 8,5% (esta comparação é apresentada apenas para delinear o crescendo da taxa de abstenção. Uma comparação entre as duas taxas pode ser enganadora, pela diferença de circunstâncias entre os panoramas políticos das duas alturas).
RMA-TE rtugal
TAXA DE ABESTENÇÃO

Já nas formas convencionais de participação política, especialmente no exercício de voto, há de facto um menor envolvimento por parte dos jovens portugueses, não só comparativamente a restantes concidadãos, mas também comparativamente com jovens de gerações anteriores e jovens de outros países europeus.
C o m b a s e n o E s t u d o s o b r e a P a r t i c i p a ç ã o P o l í t i c a d a J u v e n t u d e e m
Deste declínio de participação política, achamos ainda importante a análise da participação política da juventude portuguesa
Entre os jovens portugueses, há uma maior aderência a formas “não convencionais” de participação política, de dimensão cívica, o que engloba comportamentos como doações, recolha de fundos para uma atividade social, cívica ou política, comprar ou boicotar certos produtos por razões políticas e ambientais, assinar petições, participar em manifestações
Comparativamente a anos anteriores há um aumento do número de jovens a envolver se, por esses meios, na vida política
Importa, contudo, notar que o declínio no exercício de voto é transversal a todas as faixas etárias, em Portugal.
P o r t u g a l r e a l i z a d o p e l a F u n d a ç ã o C a l o u s t e G u l b e n k i a n

A taxa de abestenção em Portugal, em eleições legislativas, tem sido, na sua generalidade, crescente
...
O pico de abstenção registou se em 2019, com um resultado de 51,4%, o que representa mais de metade da população portuguesa.
Há uma mobilização clara dos jovens relativamente a certos temas (ambientais, feministas e antirracistas) o que demonstra o interesse da juventude por questões políticas, ainda que não se revejam nos fóruns políticos convencionais fala se de uma “revolução participativa”.
Sofia Scarlat, 18
Nupol Kiazolu, 22

Nupol Kiazolu é a presidente da Youth Coalition for Black Lives Matter of Greater New York e fundadora e CEO da Vote 2000. Com apenas 13 anos realizou o seu primeiro protesto em que levou vestido para a escola um hoodie preto com as palavras “DO I LOOK SUSPICIOUS?” pintadas nas costas, em reação ao assassinato de Trayvon Martin pelas mãos das forças policiais.
No Mu
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INFO
Sofia Scarlat, estudante romena de 18 anos, é a fundadora da Girl Up, a primeira organização de igualdade de género para adolescentes da Roménia A Girl Up promove a igualdade de género trabalhando para a prevenção de violência doméstica, violência sexual e tráfico humano.
Em outubro de 2020, Sofia foi anunciada enquanto novo membro da UN Women Generation Equality Youth Task Force

Nyombi Morris, 24
No ano anterior em setembro de 2020 a sua conta de Twitter foi suspensa, durante 1 mês e meio, pelo Governo da Uganda
RMA-TE ndo...
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Em março de 2021 Morris e o seu irmão foram detidos pela Polícia Nacional da Uganda enquanto protestavam pela justiça climática

Ainda assim Morris continua a protestar pelas causas que o movem, em especial pela justiça climática, desde que a sua família teve de ser deslocada após extremas cheias que ocorreram onde viviam e que estão ligadas às alterações climáticas Uganda está especialmente vulnerável a fenómenos climáticos extremos consequentes da crise climática.

Deixamos ainda uma nota de apoio e admiração a todos os jovens ativistas, ucranianos e russos, que continuam a protestar contra a presente guerra, arriscando a sua liberdade e a sua vida.
Nyombi Morris, proveniente de Uganda, é um ativista pela crise climática conhecido por advogar pela justiça climática assim como pela igualdade de género e liberdade expressão.
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aprox

Não pretendo explicar a guerra a sua origem, as diferentes estratégias e movimentações, os avanços e recuos dos militares, quem financia cada país, o perfil dos líderes políticos, os possíveis desfechos, vai ou não vai haver guerra nuclear? Deixo essa tarefa para quem percebe, ou diz perceber, do assunto: os comentadores que ocupam diariamente os nossos ecrãs e nos explicam tudo bem explicadinho. Com pouco tempo e pouca nuance, é nos apresentado diariamente um caldo de notícias cuja receita passa por despejar tudo o que tiverem à mão nesta cozinha caótica. Intercala se uma notícia sobre a condecoração de um cão soldado pelo exército ucraniano com as imagens do discurso de Putin no “Dia da Vitória ” Mais tarde, teremos um debate sobre o que significa o conceito de genocídio seguido por um comentário acerca do acolhimento de refugiados vindos da zona de conflito. Pelo meio, fala se da inflação e do gás. Aos poucos, a linha que divide o que se passa lá e o que se passa cá começa a dissiparse. À primeira vista, o desaparecimento desta linha faz todo o sentido: a guerra é um assunto de todos e ninguém pode ficar indiferente Se alguém morre ali, a dor deve ser sentida aqui. Somos humanos, logo sentimos empatia pelo próximo. Claro está, esta é uma perspetiva ingénua se assim realmente fosse, todos os alis recebiam a merecida atenção aqui. Não é o caso, como sabemos. Há muitos alis que ficam esquecidos pelo caminho, os alis do além-Europa, do “outro lado.”
A Monte Lavre, de guerras, só chegavam notícias de jornal, e essas eram para quem as soubesse ler Os outros, se viam subir os preços ou faltarem até os géneros grosseiros da sua alimentação, se perguntavam porquê, É por causa da guerra, respondiam os entendidos. Muito comia a guerra, muito a guerra enriquecia. É a guerra daquele monstro que primeiro que devore os homens lhes despeja os bolos, um por um, moeda atrás de moeda, para que nada se perca e tudo se transforme, como é lei primária da natureza, que só mais tarde se aprende E quando está saciada de manjares, quando já regurgita de farta, continua no jeito repetido de dedos hábeis, tirando sempre do mesmo lado, metendo sempre no mesmo bolso. É um hábito que, enfim, lhe vem da paz.
A FALSA INEVITABILIDADE DA GUERRA ima-te
João Moreira da Silva
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José Saramago (Levantado do Chão, 1980)

Atenção não proponho que deixemos de falar sobre a guerra ou que se silencie quem quer que seja Muito menos proponho que se desvalorize a sua importância Esta é uma crítica à forma como falamos sobre a guerra e às possibilidades de discurso que estamos a excluir Por outras palavras, trata se de uma análise às restrições dos discursos sobre a guerra No centro de poder destes discursos estão, claro, a comunicação social e os órgãos políticos, mas tais conversas também acontecem em universidades, escolas ou mesas de jantar. A nossa óbvia necessidade de falar sobre a guerra - seja por medo, por empatia com aqueles que sofrem, por repulsa e choque - é acompanhada por um profundo sentimento de impotência, que todos sentimos.

Em muitos destes debates, a guerra deixa de ser apenas a guerra e torna se numa arma de arremesso para denunciar alguns ou elogiar outros; deixamos de ter capacidade para pensar de forma crítica sobre o que se passa à nossa volta porque estamos condicionados com a pressão de estarmos do “lado certo” em discussões, de sermos virtuosos Claro que o “lado certo” é o lado dos inocentes que estão a morrer e sofrer nas mãos de militares que seguem ordens de órgãos políticos Mas será que é desejável conformarmo nos com um espaço público onde se fica do “lado certo” por razões puramente estéticas ou clubísticas, para demonstrar aos pares a virtude de ser boa pessoa, ou queremos debates onde pensamos criticamente sobre o que significa a guerra?
Devemos perguntar-nos: porque será que nos sentimos impotentes com a guerra, e porque tentamos usar os debates como forma de expressar esta impotência?
Perante as imagens de bombas a cair e pessoas inocentes a sofrer, muitos de nós sentem necessidade de agir, sentimo nos egoístas pelo facto de assistirmos a tudo isto por um ecrã Promovem se ações de recolhas de bens para enviar para as zonas de conflitos e alguns viajam até às fronteiras para assistir as vítimas Contudo, o sentimento de impotência mantém se. A guerra continua e as bombas parecem indiferentes a estas ações de solidariedade. Este sentimento de impotência generalizado é assim canalizado para o debate na televisão, na escola e no café, uma vez que é necessário racionalizar a frustração e tristeza que se sente com a guerra. Precisamos de sentir que podemos ajudar ali. Ninguém nega que este é um sentimento genuíno, de tristeza e frustração. No entanto, ele traz consigo presentes envenenados.
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Insisto na importância de ques guerra porque acredito que, ao f sobre o que ela significa. Leiamos Goldman em 1917, no qual ref América na primeira grande guer Se a guerra é não Até Presidente dos EUA tem o direito de declarar guerra; negarei que o Presidente ou aqueles que apoiam o Presidente têm o direito de levar os nossos filhos, maridos, irmãos e amantes para o outro lado do Oceano em busca de poder e dinheiro para os EUA Podem dizer que é a lei Eu nego a vossa lei Eu não acredito nela A única lei em que acredito é aquela que vai de acordo com as necessidades da humanidade, que nos torna melhores seres humanos
Proponho que abandonemos esta conceção quase religiosa das estruturas sociais e da guerra. Devemos interiorizar que somos nós que as fazemos; somos nós que temos o poder de as mudar. Quando nos é apresentada a opção entre dois lados beligerantes nestes debates, é nos apresentada uma falsa escolha. Se é óbvio que, perante esta escolha, ficarei do lado que quem está a ser invadido e em posição mais frágil, recuso me a ficar reduzido a este binário quando falamos sobre a guerra. Não fui eu, nem foi (provavelmente) nenhum dos leitores deste texto, nem foi nenhuma das pessoas com que temos estes debates acesos sobre a guerra à mesa do café, nem foi nenhum dos comentadores que quase se matam em direto na televisão portuguesa, que começou esta guerra. Não foi, certamente, nenhum dos “ comuns cidadãos” russos ou ucranianos. Foi uma minoria de pessoas, um pequeno núcleo de líderes políticos, burocratas e demais funcionários que tomou a decisão de começar uma guerra
As palavras de Goldman abrem portas para o meu argumento: acredito que nos sentimos impotentes porque percecionamos a guerra como uma inevitabilidade.

No ar, paira uma ideia de “não há nada a fazer” - como se os Estados, os sistemas políticos e as próprias armas com que se faz a guerra não fossem criadas por nós, mas sim por alguma entidade transcendente sobre a qual não temos qualquer tipo de controlo, uma espécie de deus.

Se não são os cidadãos comuns a escolher a guerra acredito que ninguém, ou muito pouca gente, tenha interesse em matar desconhecidos ou ser morto , por que razão deveremos ser nós a apoiar cegamente a destruição? Estamos perante a contradição: quem paga a guerra não foi quem a começou No entanto, quem a paga perde o seu latim em debates para disfarçar o sentimento de impotência perante a mesma. Proponho por isso que utilizemos este sentimento de impotência para, em vez de nos perdermos num discurso viciado que divide o mundo em preto e branco, questionar quem lucra com a guerra e quem decide a guerra Estar do “lado certo” nestes acesos debates não vai terminar o conflito Estão os dois do mesmo lado; o inimigo não é aquele que debate contigo no café, mas aqueles que se sentam em confortáveis salas por várias partes do mundo a aproveitar o espetáculo enquanto decidem quando começam e acabam as bombas Como avisava Saramago, a guerra tira sempre do mesmo lado e mete sempre no mesmo bolso Utilizemos as energias que gastamos nestes debates efémeros para, coletivamente, formarmos uma posição anti guerra e anti militarista, segundo a qual a luta pela liberdade e igualdade não se faz através do sacrifício de quem nunca teve uma palavra a dizer sobre a guerra. A mudança não vai acontecer de um dia para o outro; não teremos militares a baixar as l t já hã M i ã dif ã d ta id i ã ciais não
Podem levar um cavalo até à água, m podem obrigar a beber. Podem pôr americano no seu uniforme. Podem arrastá-lo até ao campo de batalho. Mas não podem obrigar um ser humano a matar outro se lhe rem a hipótese de raciocinar e de pensar, de gar e analisar. E isso é precisamente aquilo que as autoridades deste país não querem. mma Goldman (Speech Against Conscription and War, 1917)
Se é verdade que o mal está feito e que devemos reunir todos os esforços para ajudar e acolher quem sofre com a guerra, não devemos esquecer quem escolheu fazer a guerra. Como nos diz Eduardo Galeano, “ os que decidem sobre a guerra nunca dizem a verdade aos que têm de lutar na frente, que a guerra é para roubar, matar e morrer, que a guerra é por dinheiro, recursos ou território, eles dizem nos sempre que a guerra tem razoes nobres, que ela se trava por causa da Pátria, da Paz, da Justiça ou de um Deus.”


JoãoMoreiradaSilva12









Por outro lado, as trepadeiras e as tamareiras, as verdadeiras beldades do jardim, simbolizam tudo o que há de bom, as que são regadas pela água limpa e cristalina
Caros leitores, sejam bem vindos à viagem até ao jardim dos Corleones Este jardim é bastante invulgar, tendo tanto de belo como de perigoso De um lado, observamos uma área perigosa e pantanosa, com ervas daninhas e plantas carnívoras. Do outro, temos as trepadeiras e as tamareiras. Esta é a caricatura perfeita da política portuguesa
As trepadeiras caracterizam se pela sua beleza, pelo facto de nascerem no chão e caminharem em direção ao sol, sem ajudas, favores ou favorzinhos, apenas caminham por aquilo em que acreditam, baseando a sua ação na seriedade, na honra e na correção.

Continuando esta nossa viagem, chegamos agora à seção das tamareiras, o caso paradigmático do altruísmo e da justiça Há uma velha frase que refere: “ quem planta tamareiras, não colhe as suas tâmaras. Apenas os seus filhos e netos o farão”. Este pensamento transpõe o sacrifício em prol dos outros, das gerações vindouras, as boas intenções, servindo como guias para os presentes e futuros guardiões do jardim
Por vezes, o mais importante não é ter a arvore mais alta da vizinhança, mas sim plantar a semente que dará a árvore que conseguirá fazer sombra a toda água contaminada que rega as ervas daninhas e as plantas carnívoras
As ervas daninhas caracterizam se por crescerem nos locais indesejados, por destruírem as culturas e os solos. Já as plantas carnívoras, são bastante bonitas e parecem ser amáveis, abrindo a boca de forma afável, até ao momento em que nos apanham desprevenidos e nos mordem o dedo Bem sabemos que estas fazem parte do ecossistema e que o Homem se tem de adaptar, com todo o cuidado e zelo, sob pena de verem as suas culturas destruídas ou as suas mãos engolidas. Estas representam tudo o que há de mau e os principais defeitos dos Homens na política. Falo de todos os “Corleones” que se aproximam de nós, com conversas sorridentes e eloquentes, mas que, se nos deixarmos levar, poderemos acabar por ser regados pela água contaminada dessa mesma parte do jardim.
Jardim dos Corleones
Na sociedade atual, de forma mais ou menos vincada, a figura do político é vista como um “cadastro”, como alguém que quer “ganhar a vida à custa dos contribuintes”, como se costuma dizer popularmente. Talvez esta descrença também explique as elevadas taxas de abstenção e algum afastamento dos jovens face à política
Nós, jovens, jamais poderemos deixar que os portões deste jardim nos assustem, nos afastem ou nos diminuam A nossa missão também é essa Sem querermos ser o Ícaro, que acabou por queimar as suas asas até ao sol, esquecendo os conselhos do seu pai, pela sua ambição desmedida, teremos de ter a ambição de querer salgar a terra, o metro de terra que nos rodeia, com a teimosia de não querer largar o púlpito quando águas escuras não se tornarem cristalinas no primeiro dia de rega
A árvore dos favores e dos favorzinhos tem de deixar de florescer, bem como os seus frutos envenenados que ameaçam a saúde do Estado de direito democrático, inibindo o justo e regular funcionamento das Instituições. Acredito que, desta forma, o interesse e a envolvência dos jovens na vida política seja maior No entanto, não poderemos deixar de assinalar que, muitas vezes, estes acabam por entrar pelos portões já condicionados pela beleza aparente das plantas carnívoras e pela força das ervas daninhas. A esses, cabe nos acreditar que se irão aperceber, mais tarde ou mais cedo, que a água poluída os acabará por intoxicar. Terminando esta curta reflexão, cabe me deixar um desejo que sonho ver concretizado: que as ervas daninhas e as plantas carnívoras passem a ser regadas com a boa água, que as trepadeiras e as tamareiras não tenham receio de florescer e que os Corleones deixem de brilhar no jardim da nossa democracia. Pela democracia, pelos jovens e pelo futuro!

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Armando Reis Vieira

Ao homem serve a política para que a vida em coletividade seja possível. Da polis (cidade estado), evoluímos para pensar num contexto de Estado Soberano e, mais tarde, numa Ordem Internacional A ascensão de determinados conflitos a uma escala global, como é o caso das alterações climáticas, leva nos a poder concluir que apenas em esforços comuns podemos assegurar a sobrevivência da nossa espécie, e também do planeta que habitamos.
A participação democrática dos cidadãos é a ferramenta mais importante de todo este processo de constante construção da sociedade. A privação voluntária deste direito político representa, inevitavelmente, a não participação neste trabalho coletivo Se são os jovens o futuro da sociedade, a falta de envolvência destes no projeto coletivo projeta nos um caminho mais pobre Onde há sociedade, há Direito mas para resolver as lacunas da participação democrática não basta legislar. Se é facto que é necessária a criação e desenvolvimento de políticas públicas que promovam a cidadania, também a academia tem um papel a desempenhar na construção da sociedade do futuro Para isso, necessitamos de ir mais além da defesa ao acesso ao Ensino Superior Só o acesso, por si, traduz se num elevador social avariado, onde só alguns serão capazes de chegar a melhores resultados e, consequentemente, melhores oportunidades. É necessário alargar o leque de oportunidades disponíveis, tornando possível o ajuste para cada realidade
Face a 1975, a abstenção passou de 8,5% para 48,6% [dados da Pordata] Se temos hoje uma das maiores taxas de abstenção, é importante questionar o que distancia os eleitores das urnas. Essa questão tem particular relevo no caso do abstencionismo jovem, já que segundo o Instituto Português do Desporto e da Juventude, a faixa etária entre os 18 e os 30 anos é aquela em que a taxa de abstenção é mais elevada
O elevador social com falta de peças?
É no Anfiteatro 1, com as aulas de primeiro ano, que recebemos uma das maiores lições destes corredores: ubi societas, ibi jus onde há sociedade, há Direito. Por sermos constantes na procura da vida em comunidade, torna se inevitável a existência do conflito, e, por se tornar inevitável o conflito, é necessária uma ordem jurídica que regule a conduta humana. Nada de novo?
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Mais que ação política de poucos, a resolução dos conflitos da sociedade passa pela própria mobilização da sociedade, nem que seja, a nomeação de quem governa e impera sobre o conflito É a sociedade que determina a organização política, o sistema político. No contexto atual Português, e desde abril de 74, a haver política, há um Estado Democrático. No entanto, esse Estado Democrático necessita de cuidados que o mantenham forte.
De facto, nenhuma novidade Essa ideia é coligada à nossa essência Antes dos Romanos, já Aristóteles nos definia como animais políticos, também devido a essa constante procura da vida em comunidade.
É pertinente repensar a necessidade de estatutos especiais para estudantes que queiram conciliar os seus estudos com outras condições: quer seja no caso dos estudantes que se dediquem ao movimento estudantil, estudantes atletas, estudantes bombeiros, estudantes militares, ou mesmo os estudantes trabalhadores, quer exerçam a sua atividade profissional por necessidade ou para aquisição de experiência curricular (veja se o exemplo da nossa Faculdade, com os estágios em escritórios de advogados).
Catarina Silva
Assim, porque não adaptar todo o sistema académico, facultando num regime geral comum a todas as condições excecionais de direitos que de facto permitam a conciliação dos dois universos, acrescendo a valorização académica à existência destes fatores, através, por exemplo, de créditos adicionais?
Para estes casos tipificados, não se verifica pela academia uma valorização das competências adquiridas, não facultando esta situação, numa grande parte das ocasiões, qualquer benefício ao aluno. Na verdade, a existência destes estatutos nem sempre logram em melhor aproveitamento escolar: a tendência ao abandono académico acentua se nestes casos, em consequência do maior nível de exigência e complexidade, em consequência da maior pressão psicológica
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Para além da valorização das situações já previstas, é possível ir além do leque de opções existentes, e valorizar academicamente, também, os estudantes que se dedicam ao associativismo, à cidadania ativa ou à participação política Facilitar o acesso e a consolidação destas atividades cívicas com a frequência académica poderão resultar numa academia mais progressista e mais diversificada, enquanto levamos os cidadãos a procurar ativamente a participação cívica e o desenvolvimento social. A sociedade não necessita somente de cidadãos mais qualificados em termos quantitativos, com maior número de graus académicos e médias de conclusão mais altas, mas também de jovens que retenham competências que possam acrescentar uma vantagem coletiva à comunidade ou às cidades e vilas onde residem e/ou trabalham.
Mais que garantir o acesso, é necessário garantir a qualidade e adaptabilidade do ensino, mas não somente numa ótica de melhor acesso ao mercado de trabalho e consequente rentabilidade financeira. A academia é fundamental no processo de desenvolvimento do cidadão, pelo que devemos ir além da aquisição de conhecimento pela via da programação curricular, sendo necessário promover e valorizar academicamente os meios alternativos de obtenção de competências.

No entanto, essa desigualdade não advém de nenhuma incapacidade inerente, mas sim da própria condição social em que se encontram A exclusão de grupo, desigualdade de poder económico, estereótipos, ou falta de oportunidades de aprendizagem, traduzem se em menos oportunidades de fazer ouvida a sua voz. Votam menos, militam menos, associam se menos.
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No nº2 do Artigo 13º da Constituição da República Portuguesa lê se que “Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.”. A Constituição é clara independentemente de quem sejamos, temos direitos iguais. Contudo, e se a letra da lei não deixa margem para dúvidas a realidade é bem diferente Os jovens participam menos na construção da nossa sociedade, apesar de, numa perspetiva mais informal, observarmos os jovens em manifestações ou a assinarem petições, estes exercitam menos o seu direito de participar formalmente na política. São desiguais.
Um dos fatores que também sabemos ser importante para a participação é a socialização política, maioritariamente a socialização familiar, mas também entre os pares e no ambiente escolar. No entanto, reforçamos que as pessoas são politicamente pouco informadas e sofisticadas. A nosso ver, o investimento que o ensino português faz nesta área tem sido insuficiente, quando deveria ser o principal mecanismo para uma maior participação política dos jovens Se desejamos que à saída da escolaridade obrigatória os jovens se sintam preparados e motivados para a cidadania, então não podemos esperar que se autoeduquem.
Temos que dar a todos os jovens os conhecimentos e ferramentas para uma boa preparação, e fazê lo com uma linguagem adequada para motivar a sua participação O acesso à educação política é imprescindível para permitir aos jovens e futuras gerações de se tornarem politicamente mais sofisticadas e, consequentemente, mais envolvidos politicamente nas suas comunidades, moldando assim o panorama político para um que seja mais justo e participativo.

Existem vários projetos e medidas já implementados que visam aumentar a participação política dos jovens. Iniciativas como o Parlamento dos Jovens, Orçamentos Participativos Jovem (seja o nacional ou os vários autárquicos que existem pelo país), plataformas como o myPolis e o Política para Todos que criam formas facilitadas de interagir e aceder aos programas políticos através da internet, e não só. Neste âmbito surge também a nossa associação, a Associação Política para Ti. Surgimos da vontade de demonstrar que a juventude é ativa e interessada em política, e da necessidade de combater o sentimento de desconfiança face à política que é partilhado pela maioria dos jovens no panorama atual, e que resulta numa elevada taxa de abstenção eleição após eleição.
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Desejamos que, de futuro, possamos contribuir para um sistema educativo que informa e educa politicamente os jovens, para que tanto as gerações atuais como vindouras possam ter as ferramentas, conhecimentos e motivação necessários para fazer da sua voz uma presente na política portuguesa

O Panorama Político Atual e Perspetivas de Futuro

Além disso, a Comissão Europeia prevê que, no conjunto de 2022, a taxa de inflação atinja 4,4% o que, apesar de ser a taxa de inflação mais baixa da UE em 2022, não deixa de ser um valor especialmente elevado para Portugal.
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Dissecando o panorama político atual conseguimos identificar um conjunto de acontecimentos que, acompanhados por uma mudança de paradigma a nível internacional, comprometem o presente, hipotecando o futuro O cenário não é animador Portugal detém um nível de endividamento que resvala a insustentabilidade, favorecendo um desequilíbrio nas contas públicas a curto, médio e a longo prazo Segundo dados do Gabinete de Estatística da UE, o nível de endividamento Português era, no terceiro trimestre de 2021, cerca de 130,5% do PIB (o terceiro maior da UE), sendo apenas ultrapassado por Itália (155,3% do PIB) e pela Grécia (200,7%). Além disso, em março de 2022, o Banco de Portugal dava conta de que a dívida pública portuguesa totalizava 276 mil milhões de euros, mais 45 mil milhões de euros que em 2015, ano em que Passos Coelho cessou funções como primeiro ministro e o executivo de António Costa assumiu o poder.
A isto acresce a inflação, desencadeada pela atipicidade da situação pandémica e agravada pela invasão russa à Ucrânia. Para um tecido económico frágil, a inflação é particularmente gravosa, uma vez que contribui para uma rápida erosão dos rendimentos das famílias que, com salários tendencialmente estagnados, não conseguem fazer face ao aumento dos preços. Por outro lado, são também afetadas as empresas e outros meios de produção e distribuição de bens e serviços, uma vez que, sendo o custo da matéria prima e das transportadoras mais elevado, estas não terão outra solução senão o aumento dos preços. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), no passado mês de abril, a taxa de inflação atingiu 7,2%, mais 1,9 pontos percentuais que em março do mesmo ano e o valor mais elevado desde 1993.
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A acrescer, podemos ainda falar de uma “envergonhada” ou até “ sonsa ” austeridade. A nosso ver, a “austeridade” não é um conceito passado que se deva “ arrumar ” em prateleiras políticas, é algo que impregna, de forma tímida e discreta, as políticas dos últimos anos Se atendermos aos dados mais recentes relativos ao poder de compra dos portugueses, verificamos, como demonstra o estudo da Kantar para a Centromarca, que o “carrinho de compras dos portugueses é o mais pequeno dos últimos 4 anos ” (agravado pela situação pandémica e pela inflação) Ainda assim, de acordo com dados do Relatório do Orçamento do Estado para 2022, a receita do estado ultrapassará os 100 mil milhões de euros, crescendo a receita fiscal em cerca de 3 mil milhões de euros. Por outras palavras, num cenário de perda geral de poder de compra, o governo resolve cobrar mais 3 mil milhões de euros em impostos, tendo a tradição de executar menos despesa do que orçamentado Não obstante, é possível encontrar uma réstia de esperança No passado dia 24 de Março, contabilizámos 17500 dias em democracia, ultrapassando o tempo em que Portugal esteve subjugado a um regime ditatorial (17499 dias), o que reforça o caráter de estabilidade e robustez das instituições democráticas.

Artur Pina Sampaio

A 11 de Maio do presente ano, em declarações na Assembleia da República, o Ministro do Ambiente e Ação Climática referia que Portugal reunia condições para antecipar essas mesmas metas (47% de energia de fonte renovável no consumo final bruto de energia até 2030). Portugal tem atraído grandes investimentos no que toca à otimização energética e à produção de energia de fonte renovável, como é exemplo disso o investimento superior a 1,3 mil milhões de euros, a cargo da empresa luso holandesa Madoqua Ventures, da dinamarquesa Copenhagen Infrastructure Partners e da holandesa Power 2X, para produzir hidrogénio e amoníaco verde em Sines, ou o investimento realizado pela EDP de instalar a maior central fotovoltaica flutuante da Europa (12000 painéis solares) numa albufeira do Alqueva.
Além disso, temos também o desempenho português no combate às alterações climáticas. Segundo um relatório da Comissão Europeia de 2020, Portugal é o país da União Europeia que melhores condições reúne para atingir as metas climática 2030 (relativamente a níveis de emissões de 2005)
Os salários mensais de um jovem que acabou de entrar no mercado de trabalho não serão muito elevados, possivelmente mais baixos do que o rendimento médio base em Portugal (segundo dados da PORDATA de 2020, o rendimento médio base em Portugal é de 1042 euros, não sendo sequer 200% do salário mínimo nacional), como consegue um jovem entre os 20 30 anos comprar casa própria? Por conseguinte, os preços dos imóveis em Portugal são acentuados pela carga fiscal média afeta ao setor da construção que, segundo o economista Paulo Pereira, representará cerca de 50% no custo final do imóvel, e à carga fiscal média sobre o trabalho em Portugal, que, segundo a OCDE, subiu em 2022 para 41,8%, passando para o seu top 10
A realidade atual reflete uma saída cada vez mais tardia dos jovens de casa dos seus pais, devido ao preço acentuado das rendas e da necessidade de entradas para o pagamento da habitação muito elevadas. Este fenómeno intensifica se com a crescente dificuldade em aceder a um crédito à habitação. Além disso, a entrada cada vez mais tardia dos jovens no mercado de trabalho significa, inevitavelmente, o adiamento na compra de uma casa, tendo menos anos para a pagar A habitação é encarada como um mal em si mesmo, um problema isolado, mas, na verdade, é uma questão mais profunda, um problema que advém da atual conjuntura política, que tem na sua base baixos rendimentos líquidos, uma carga fiscal elevada (direta e indireta), licenciamentos morosos e um deficiente ordenamento do território
No que respeita ao futuro, poderíamos apontar diversas questões, mas optámos por nos focar na habitação
Para finalizar, também a reconfiguração da Assembleia da República, com o surgimento de novos partidos políticos, principalmente à direita, significa uma mudança do paradigma político Revela, em primeiro lugar, que a fórmula existente do sistema partidário está gasta e desatualizada, significa que existem novos nichos eleitorais, com novas preocupações e de índole reformista. Assistimos à eclosão de novos partidos com novas caras e novas ideias, tanto à esquerda como à direita, com o entusiasmo de quem, pelas circunstâncias em que existe como português, democrata, cidadão e jovem, apela à inovação, ao vanguardismo possível na política e a um sistema político tão eclético quanto o eleitorado que diz representar Este reforço do multipartidarismo, da diversidade política e da disponibilidade de ouvir, reter e debater novas ideias, satisfaz o apetite democrático de todos aqueles que rogam por esperança, inovação e liberdade
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Como se vê, embora o problema da habitação seja discutido em sede de poder local, é um problema cuja raiz surge a nível nacional, tendo por detrás outras questões associadas, como as que viemos a enunciar. Posto isto, a resolução deste problema passa não pelo tratamento isolado do tema “Habitação”, mas pela sua compreensão como tema inserido num âmbito mais alargado que passa pela resolução de outros problemas mais profundos, como o da carga fiscal ou dos rendimentos baixos
Natacha Ariana Ribeiro

O Instituto Nacional de Estatística procedeu a uma comparação ao preço médio do m2 nos diferentes trimestres nos concelhos da Área Metropolitana de Lisboa, que se estendem do quarto trimestre de 2019 ao quarto trimestre de 2021 e as observações são chocantes Por exemplo, em Alcochete que no quarto trimestre de 2019 tinha um m2 a um preço de 1350 euros e que no período homólogo de 2021 esse mesmo m2 passou a assumir um preço de 1951 euros, o que perfaz um crescimento de 44,52% no preço do m2 Foi também o caso da Amadora, que, embora tenha uma variação menor, passou de 1499 euros por m2 em 2019 para 1820 euros por m2 em 2021, tendo um aumento de 21,41% no preço do m2.
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SOBRE A SLIBERDADE OBRE A LIBERDADE (DE EXPRESSÃO (CONTEMPORÂNEA) DE EXPRESSÃO CONTEMPORÂNEA)



A liberdade de expressão, tão polarizada, tanto estudada e desgastada por quem dela não conhece, data de uma longa herança, predominantemente, e, orgulhosamente, europeia. Platão ordenou nos para que saíssemos da caverna, pediu nos para que não fôssemos inertes ao que nos rodeia, ensinou nos que mais vale queimar os olhos vezes e vezes sem conta do que viver na passiva ignorância e na falsa crença de ideias enganosas Mais tarde, no fim do século XVIII, o povo francês decidiu atrever se, atrever se a quebrar um regime que ditava estarem as suas vidas escritas antes dos seus pais nasceram, onde Deus enviava um delegado à terra que por Sua graça decidia quem viveria na miséria e quem por um mérito que só Ele conhecia, não. “Liberté, Égalité, Fraternité”, não foi assim há tanto tempo que se gritava, num pranto histérico e desenfronhado, de que nasceria uma nova França e daí uma nova Europa No entanto, questiona se se hoje os gritos de 1789 ainda se ouvem ou se ainda ecoa a célebre frase revolucionária, “Fascismo Nunca Mais, 25 de Abril Sempre!”. Será que, em 2022, a rica herança da liberdade de expressão terá sido trocada, reduzida e limitada por um discurso conformista. Ou será esta, como sempre se pretendeu e se construiu para que fosse, uma liberdade absoluta?
A liberdade de expressão está consagrada no art. 37º da nossa Lei Fundamental, mas a sua origem não vem dos corajosos que se atreveram a confiar que o executivo funcionaria sem que fosse necessário que o homem médio andasse com um trapo a cobrirlhe o rosto, de mão dada com os seus pares, embutidos no medo das repercussões de terem pensamentos próprios Para Portugal, fatidicamente, apenas em 1975, os heróis da primavera marcharam para que, hoje, eu, uma mulher do século XXI, possa estar a escrever sobre o que penso, e até poderia estar a expor as maiores inépcias, mas relembrando as minhas antecessoras, não o vou fazer. Tomara a elas que pudessem ter pensado por si próprias, sem o filtro do marido ou do pai, ou sem terem os lábios tingidos de azul por quem em Portugal as controlava.
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Em qualquer discussão das limitações da liberdade de expressão é imperioso começar por delimitar que a única limitação à liberdade de expressão é a lei Assim sendo, a lei diz nos que todos temos o direito à liberdade de expressão, pela palavra, imagem, ou qualquer outro meio sem impedimentos nem discriminações. Contudo, existem limites legais. Pense se um caso em que viesse a ser publicado nos meios de comunicação social em que um presidente de uma certa câmara municipal, que vive constantemente sobre o escrutínio da opinião pública, andava a utilizar os dinheiros públicos para fins de interesse privado Para além de esta denuncia pelos meios de comunicação ser uma prova de que vivemos, de facto, num regime democrático onde há um controlo efetivo público aos órgãos que nos governam, está também dentro do que é a liberdade de expressão da imprensa No entanto, fosse essa mesma notícia comunicada com o post scriptum de que o mesmo presidente da câmara municipal se teria envolvido num escândalo de adultério, isso seria uma violação grotesca não só do seu direito ao bom nome tal como um abuso flagrante da sua liberdade de expressão. A exceptio veritatis não opera como válvula de escape em favor de maldade gratuita No campo penal, por exemplo, está estipulado que quem publicamente vilipendiar ato de culto de religião ou dele escarnecer, é punido com pena de prisão ou multa. Dito de outra forma, é dada uma proteção penal à liberdade religiosa. Sendo o nosso país, apesar de laico, maioritariamente composto por cristãos católicos, como delinear um limite à liberdade de expressão quanto às várias religiões que convivem no mesmo ecossistema? Este é um problema bem maduro para uma cabeça tenra de 20 anos, daí que, por enquanto, seguirei os Doutores. A jurisprudência entende, maioritariamente, que a ofensa a sentimentos religiosos, como utilizar um discurso blasfémico não é critério penalmente relevante e ainda bem que não. Penso que será relevante remeter para um caso, com um cunho tanto de interessante como de macabro, julgado pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) O caso, “E S c Áustria”, centra se na disputa entre um partido de extrema direita austríaco que oferecia seminários sobre introdução ao islamismo. Num desses seminários, uma das oradoras, denominada de “E.S” comentou que, Maomé, o profeta e figura do culto islâmico de maior importância, seria, segundo a sua interpretação dos livros e da história e cultura islâmicas, pedófilo Acredito que aqui se cruzou os limites do que é o possível alcance da liberdade de expressão. É de enorme gravidade organizar um seminário com o intuito de informar, consciencializar e educar a quem queria aprofundar os seus conhecimentos na religião islâmica e que, na realidade, (para grande espanto de ninguém) esse mesmo seminário seja um meio de demagogia, de discurso blasfémico e de transmissão de falsas informações Num país maioritariamente católico, como é a Áustria, difundir ideias falsas e altamente ofensivas, sobre uma minoria, em particular usando uma plataforma que se publicitou como educativa, é um claro abuso da liberdade de expressão




Todas estas situações são promotoras do medo e do caos, onde a democracia fala mais baixo e onde estamos a abrir espaço para que decisões unilaterais e tiranas nos abalem. Indissociável, nos dias de hoje, dos órgãos de comunicação social é a relevância das redes sociais, são o primeiro contacto que muitos, principalmente os jovens, têm com a informação e também o principal meio de desinformação

Tendo tentado delinear e sustentar a aceitabilidade das limitações legais da liberdade de expressão, questiono me, agora, se as limitações legais à liberdade de expressão têm conotação moral Se, apesar de nos últimos 40 anos termos, incansavelmente, juntando esforços para lavar roupa suja, imunda de opressão, com buracos de desinformação, manchada de vinculações religiosas a tradições tendenciosas seguidas por uma pequena fração da população que nem a sua origem conhece ou pretende conhecer, estas limitações podem estar vinculadas a algo mais do que a lei Com efeito, creio que do ponto de vista dos limites morais, vemos, por vezes, a essência da limitação da liberdade de expressão na violação de deveres ético sociais. Efetivamente, há uma atitude enraizada no espírito da generalidade das pessoas, em que as limitações legais, muitas vezes desconhecidas, constituem a tradução no mundo terreno das noções de pecado e de castigo vigentes na ordem religiosa, ou, de imoralidade e de censura da consciência, vigentes na ordem moral Indiscutivelmente, não é função do direito tutelar a moral, sendo esta realidade assegurada pelo 41º da nossa Constituição que prevê a liberdade de consciência, negando qualquer possibilidade de o direito tutelar os nossos pensamentos, ou de outro modo, a nossa moral



Assim, a liberdade de expressão faz parte do elenco de liberdade e garantias constitucionais, apesar de que podem de certo e estrito modo, apenas em circunstâncias que o exigam, ser legalmente condicionadas. Nas palavras de Stuart Mill, em Sobre a Liberdade, “The only freedom which deserves the name is that of pursuing our own good in our own way, so long as we do not attempt to deprive others of theirs, or impede their efforts to obtain it” O autor sumariza distinta e sucintamente, o que deve ser a limitação legal aceitável do direito à liberdade de expressão.
Releva ainda referir, no que toca aos comportamentos que podem levar a que se encarare a moralidade como fonte de punibilidade, que o papel dos órgãos de comunicação social é transmitir de uma maneira independente e despida de conotações, a informação Um setor de tão grande importância na nossa sociedade, que têm o primeiro contacto com as decisões, acontecimentos ou omissões que impactam a nossa vida, não devem deixar nunca de advogar pela transparência da informação que nos passam. É mais urgente do que nunca que se fomente o espírito de procura da verdade, de irreverência e de inconformidade, nos cidadãos portugueses Vivemos numa altura trágica de guerra, de “fake news ” , de pandemia

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De facto, estas limitações, deixam algumas questões no ar. Afinal, de que serviu a luta dos nossos antecessores e antecessoras para que pudessem ter o direito ao uso livre da palavra e expressar as suas ideias, se agora existem limitações legais à liberdade de expressão. É difícil de conceptualizar uma democracia funcional e eficiente, com limites a liberdades Deste modo, é certo que qualquer limitação à liberdade de expressão pode ser vista como opressão, ou como uma forma de exercer tirania calando as minorias ou até mesmo a maioria, calada por quem nunca se saciará de poder e controlo.
Mariana Costa e Silva
Os órgãos de comunicação social devem reivindicar o seu ancestral papel central de difusores de informação fidedigna, para que as redes sociais possam ser utilizadas para tudo o que têm de bom e não para cegar as gerações futuras com ideias extremistas e notícias descabidas, das quais aceitamos sem pensar e seguimos em frente, acreditando e deslizando o polegar até nos debatermos com a próxima publicação Assim, que das trevas se faça luz, que da desunião e do caos vivido nos últimos tempos nasça uma comunidade unida onde a prioridade seja a troca de ideias, a pluralidade e a clareza, onde todos se possam expressar da maneira que entenderem e o que entenderem. Importa acrescentar ainda que o Governo desempenha um papel importante em, por um lado, promover a liberdade de expressão, e por outro, internamente, promover a transparência e a acessibilidade dos cidadãos à informação, para que estes, independentemente e sem filtros, possam formular as suas opiniões e expressá las.





De regimes opressores está a história repleta, nenhum deles tendo nunca sido uma verdadeira democracia, apesar de tanto o tentarem disfarçar Ensinou nos o “grande líder” vermelho, Mao, que a melhor forma de governar é que o povo partilhe dos mesmos pensamentos, da mesma forma que igualmente partilham a comida e os recursos, sendo desta maneira, todos iluminados iguais, e ser bem mais fácil de eliminar os desviantes

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Reconheço que é descabido comparar as limitações à liberdade de expressão com que vivemos em 2022 em Portugal ou até mesmo as que vivemos sobre o nosso próprio “grande líder”, que preferia o azul ao vermelho às atrocidades vividas na Revolução Cultural No entanto, do mesmo modo que não é concebível imaginar uma democracia sem a liberdade de expressão, também não o é sem limitações à liberdade de expressão. Retomando e parafraseando o pensamento de Stuart Mill, temos essa liberdade absoluta e inderrogável até que impedimos os outros de a realizarem ou criarmos obstáculos para tal. Não só as limitações legais à liberdade de expressão não fragilizam a democracia, como até a tornam mais espessa e entroncada.
Em forma de conclusão, reitero que a liberdade de expressão é, sem hesitações, uma liberdade constitucionalmente consagrada e um dos principais pilares de um Estado de Direito Democrático que advoga e se caracteriza pela absoluta prioridade da dignidade da vida humana e do bem estar social Contudo seguem a existir limitações que se mostram necessárias para que esta liberdade possa ser disfrutada em pleno. Nos tempos que decorrem, importante é que nos asseguremos e que nos assegurem que ainda se pode dar opiniões, já que as opiniões são o que levam a soluções democráticas e impugnáveis e que a livre troca de ideias é o que faz a máquina democrática continuar a evoluir e a autocorrigir os seus erros Sim, a liberdade de expressão é uma liberdade absoluta porque essencial à própria existência da democracia mesmo se, por vezes, o bom funcionamento de um sistema democrático justifica a sua limitação. Mas só e apenas quando desta limitação dependa a convivência pacífica das pessoas que o integram e quando o seu exercício atinja a esfera de liberdade do outro, não sendo suficiente a mera diferença de opinião
Flee A Fuga Restrepo Modern Love The Minimalists: Less is now Para ver: distrai-te







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