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Entre araras e marginais

Apesar da presença da Polícia Militar, a falta de segurança preocupa frequentadores do Passeio Público. Uma mulher de verdade

Brechó moda vintage

Pryscila Vieira é uma das precursoras no mundo das charges.

Um verdadeiro paraíso para quem gosta de artigos e artefatos antigos no centro da capital paranaense.

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pág.9

pág. 6 e 7

Pressa de casar Noivos preferem as igrejas tradicionais para se casarem em Curitiba. pág.10

Claudia Bilobran

JORNAL-LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO UNINTER – ANO IV – NÚMERO 28 – CURITIBA, MAIO DE 2013


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Número 28 – Maio de 2013

OPINIÃO

Equipe Marco Zero

O Marco Zero Na Praça Tiradentes, bem em frente à Catedral, está o Marco Zero de Curitiba, que oficialmente é tido como o local onde nasceu a cidade, além de ser o ponto de marcação de medidas de distâncias de Curitiba em relação a outros municípios. Ao jornal Marco Zero foi concedido este nome, por conter notícias e reportagens voltadas para o público da região central da capital paranaense.

É som de preto, de favelado Funk, um gênero musical cheio de pré-conceitos. Divulgação

Nesta edição de maio, o Marco Zero, como sempre, trata de assuntos de grande interesse. Um dos repórteres da equipe se aventurou em algumas linhas do transporte coletivo de Curitiba e Região Metropolitana. Quem usa este serviço, diariamente, não vai achar estranho, mas com certeza não vai deixar de ficar impressionado com as histórias dos usuários dos ônibus. Um outro repórter pegou uma carona e percebeu o quão lotadas estão as ruas e avenidas de Curitiba. Também, um carro para cada 1,3 cidadãos da capital paranaense não é pouco, ou melhor daqui a pouco ninguém mais sai do lugar. O Marco Zero entrevistou a primeira curitibana a se aventurar em um universo bem masculino. A chargista Pryscila Vieira conta sua trajetória profissional, e como surgiu Amely, a boneca infalível, ops, inflável. E na segunda reportagem da série “Curitiba como ela é”, nossas repórteres tomaram um bom susto ao visitarem o Passeio Público para dar continuidade à matéria. E como mês de maio é o “mês das noivas”, confira a reportagem sobre a pressa que algumas pessoas têm em subir ao altar. Boa leitura a todos!

Susan de Paula

O que você tem a dizer sobre a poluição sonora no centro de Curitiba? A poluição sonora no centro é muito intensa. Temos que respeitar os espaços e Diego Eloir, os limites de 25 anos, gestor todos. Cada operacional. pessoa tem o direito de ouvir, ou fazer o barulho que seja, desde que não ultrapasse os limites e invada a área de conforto de outros.

Vinícius Camilo

A

discussão sobre o valor cultural agregado ao funk é antiga e o tema já chegou ao desgaste. Há aqueles que dizem que esse tipo de música é som de criminoso e que incentiva a perversão sexual. Outros teóricos que defendem que o ritmo é uma expressão da cultura popular, assim como o samba, a bossa nova e o baião de Luiz Gonzaga. A questão não é o gosto pessoal e sim o ritmo como produto da cultura nacional. Pois as críticas ao funk geralmente são rasas, superficiais e baseadas no “achismo”. Quando alguém diz que ouve esse tipo de música, é tachado de inculto, “gente da ralé”. E se for mulher então nem se fala. É chamada de fácil, sem vergonha pra baixo. Quem vos fala não é nenhum apreciador do gênero. Entretanto é importante compreender esse fenômeno e sua gênese sociológica. Assim como o samba, o funk veio dos morros cariocas e passa pela mesma segregação que seu antecessor passou no início do século vinte. Para quem tiver curiosidade, no livro Iniciação à Música Popular Brasileira, o autor Waldenyr Cal-

Expediente

Ao Leitor

das conta como o samba se transformou de um subproduto musical em um produto da aristocracia intelectual brasileira. Caldas relata que o ritmo, que é considerado por alguns como o mais brasileiro de todos, veio com os negros escravos de algumas regiões da Nigéria e sofreu influência da música indígena e do canto gregoriano do homem branco europeu. Filho do lundu, que é outro gênero originado dos rituais tribais da África, o samba foi proibido de ser executado por ter movimentos muito sensuais para época. Uma parte da igreja o considerava imoral, escandaloso e indecente. Alguma semelhança? É notório que uma grande parte dos bailes funks estão recheados de obscenidades, e negar isso é como negar que existe “acerto” em partidas de futebol. Isso é um fato. Todavia se for colocar na balança o que realmente é cultura popular brasileira, a MPB certamente ficaria de fora. No popularesco, cultura popular é aquilo que é criado pelo povo e para seu consumo. Agora, que parte desse povo tem acesso a um show de Chico Buarque, que é considerado um ícone da Música Popular Brasileira? Não seria um exagero dizer que uma micro partícula da massa consegue isso. Diferente

O jornal Marco Zero é uma publicação feita pelos alunos do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Uninter Coordenador do Curso de Jornalismo: Nívea Canalli Bona Professor responsável: Roberto Nicolato

Diagramação: Cíntia Silva e Letícia Ferreira

do funk, em que os frequentadores dos bailes que acontecem nos morros, pagam em média 15 reais e ainda ganham um copo de refrigerante “na faixa”. O mais novo pesadelo dos escolásticos é uma dissertação de mestrado sobre a funkeira carioca Valesca Popozuda. No trabalho apresentado, pela aluna MarianaGomes da Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói, uma das mais importantes instituições de ensino do estado do Rio de Janeiro - a autora defende o caráter feminista das mulheres que estão envolvidas nesse meio. Em um vídeo que circula na internet, a jornalista Rachel Sheherazade, do SBT de São Paulo, desdenhou do trabalho da aluna e classificou o funk como produto de baixa cultura. Ora! Como se define se algo é de alto ou baixo nível cultural? O que se sabe é que é cultura. A cada um é reservado o direito de gostar ou não, mas é impossível pré-conceituar isso. Apesar desse tipo de música ter virado mainstream, assim como o samba e a bossa-nova, e ser apreciado desde os favelados cariocas até os bem nascidos de Jurerê Internacional, o funk tem sua raiz na cultura de massa popularesca. Goste ou odeie, os smartphones xing-ling de cor pink se perpetuarão exalando cultura nos corredores do busão lotado. Uninter Rua do Rosário, 147 CEP 80010-110 – Curitiba-PR

Projeto Gráfico: Cíntia Silva e Letícia Ferreira

E-mail comunicacaosocial@grupouninter.com.br

Telefones 2102-7953 e 2102-7954.

É um mal dos tempos modernos, que nos traz transtorno e efeitos negativos tanto João Paulo psicologicaJonavaci, 19 mente quanto anos, estufisicamente. dante. Para quem está no centro, atrapalha o rendimento das aulas e do trabalho em determinadas situações. A poluição sonora no centro afeta, além do seu limite, o de quem está próximo a você. Vinicius Hen- Isso interfere rique Rieping, principalmen22 anos, estu- te na hora da dante. aula. É preciso respeitar a sua liberdade sem interferir na de outra pessoa.

Marcia Rodrigues, 36 anos, secretária.

Esse problema no centro atrapalha o trabalho. Altera o humor e concentração, assim caindo o desempenho das nossas

atividades. No centro ou nos bairros, a poluição sonora se mostra como consequência Juliana Pisde um mundo tun, 32 anos, globalizado, de advogada. uma sociedade capitalista e inegavelmente mal educada e egocêntrica.


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CIDADANIA

O ônibus nosso (lotado) de cada dia Pablo Bandeira

Janaína Menegusso

Em cada viagem uma “surpresa” diferente para o passageiro em Curitiba Quem precisa do ônibus para ir trabalhar já chega cansado do trajeto

tado? Se a cada novo tubo o tempo para embarque e desembarque aumenta devido à dificuldade de trânsito das pessoas? Sim, porque a lotação extravasa os limites do ônibus e chega aos tubos também. Mais alguns metros, a conversa continua e Sueli Nunes, uma assistente social de 59 anos, aquela senhora que havia se pronunciado no episódio dos idosos, volta a falar. Dessa vez, ela relata uma prática dos motoristas que é consentida pelos fiscais. Na hora do rush, quando os tubos estão cheios, alguns ônibus não fazem as primeiras paradas logo após o terminal e

Quem está dentro quer que a gente feche a porta e siga viagem. Quem está no ponto quer embarcar Eliane Jacinto, cobradora

seguem vazios. “A gente fica um tempão esperando, quando o ônibus vem passa direto. Agora ele só vai parar vários tubos para frente”, diz ela indignada. O motorista argumenta que isso é feito para que o veículo vazio comece a recolher quem está esperando. Isso faz com que o ônibus, que já saiu carregado do terminal, encontre tubos vazios e faça somente desembarque. A ideia é boa, mas parece não agradar quem a ouve.

Ariadne: Mais do que conforto, um assento é uma prevenção contra o assédio

Região Metropolitana Quem utiliza o transporte coletivo na Região Metropolitana de Curitiba também passa pela mesma situação. Estes ônibus, na grande maioria, são menores e contam com um cobrador. Mas isso não significa menos problemas. Segundo a cobradora Eliane Jacinto, 34, quando o ônibus está muito lotado, fica difícil enxergar as portas, o que aumenta o risco de alguém ficar preso no momento do desembarque. Também os usuários acabam se irritando. “Quem está dentro quer que a gente feche

Lotação começa já nos tubos e dificulta o embarque

Janaína Menegusso

i motorista! Um casal de velhinhos não conseguiu descer. - Me desculpe, mas agora só no próximo tubo ou no Cabral. Outra senhora, que acabara de embarcar ouviu tudo e ficou irritada. Por quê? Porque não é a primeira vez que presenciava uma cena dessas. Na verdade, o ocorrido é costumeiro. Tanto que basta perguntar para qualquer um no ônibus para ouvir histórias de pessoas presas na porta, deixadas no tubo, que não conseguiram desembarcar, entre outras. Em comum, estas histórias têm o mesmo cenário: um ônibus lotado. Segundo a norma 15570, de 2009, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), a ocupação máxima em transporte coletivo é de seis pessoas por metro quadrado. Mas, na prática, mais do que sofrer com a falta de espaço, um ônibus muito cheio oferece outros incômodos. No caso do casal de idosos que não conseguiu desembarcar, o problema não foi chegar até a porta, mas o fato de o motorista não tê-los visto na zona de desembarque. Questionado, o motorista, que preferiu não se identificar, disse que não há como enxergar as cinco portas somente por um retrovisor externo. O relato dele se estende a outras dificuldades diárias. Além dos já conhecidos fiscais da URBS que anotam horário de chegada e partida, agora os veículos vêm equipados com um aparelho de GPS, que registra via satélite a hora e a localização exata do ônibus. Isso pressiona ainda mais quem precisa dirigir pelo trânsito da capital, levando em consideração o tempo. Mas como manter o cronograma de viagem, se a cada parada o biarticulado fica mais lo-

Pablo Bandeira

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a porta e siga viagem. Quem está no ponto quer embarcar”, diz. Mas enquanto houver uma única pessoa no ponto querendo embarcar, o ônibus não pode arrancar, são as ordens. Em meio a esse impasse os passageiros reclamam com motoristas e cobradores. Seguindo viagem e indo “matéria adentro”, os problemas vão aparecendo. Como buracos ocultos numa curva da estrada, a superlotação sempre reserva surpresas, a grande maioria desagradáveis. É o caso de uma adolescente que teve sua privacidade invadida e seus direitos mais básicos desrespeitados. Como de costume, Ariadne Rozenente havia acordado cedo e às 6h já estava no ponto. Quando o ônibus parou não havia mais lugar e o jeito foi se apinhar por entre tantos outros passageiros. Ao longo do trajeto, outros passageiros embarcaram e o espaço foi ficando cada vez menor e mais disputado. Num certo momento um ho-

mem parou atrás da adolescente de 17 anos. Aproveitando-se da circunstância, ele foi chegando cada vez mais perto, até que os dois estivessem “colados”. Mesmo quando pessoas começaram a descer e não havia mais necessidade de permanecer tão perto ele não se afastou. Foi nesse momento que Ariadne percebeu o que estava acontecendo, ela acabara de ser vítima de assédio sexual. Tal experiência acarretou certo medo de andar de ônibus, ao menos nos que estão lotados. A questão de superlotação parece estar longe de ser solucionada. Mesmo com a diminuição populacional, que em 2007 era de 1.797.408 e passou em 2010 para 1.751.907, segundo dados do Instituto Brasileiro e Geografia e Estatística (IBGE), os coletivos parecem estar cada dia mais cheios.


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PERFIL

Pryscila, uma mulher de verdade Chargista paranaense seduz com tirinhas da boneca inflável Amely Bilobran

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la é dona de um senso de humor agridoce e desenha desde criança. Começou cedo em uma carreira pouco comum entre as mulheres, num gênero que, até pouco tempo atrás, era visto basicamente como masculino, em que as mulheres apareciam mais como tema do que como autoras de piadas. A curitibana Pryscila Vieira é a primeira chargista do Brasil e faz muito sucesso com a personagem Amely, que é fruto de um relacionamento frustrado. Diz que criou a boneca inflável apenas para extravasar suas emoções. “Para dar vazão aos meus piores sentimentos”, brinca Pryscila. A personagem foi selecionada pelo concurso de novos talentos da Folha de São Paulo, em 2006. “Participo de salões de Humor desde os meus 17 anos”, lembra Pryscila. Em 2008 ficou entre os dez melhores desenhistas de humor profissionais do país, o Salão de Humor Carioca. Durante sete anos ilustrou as vinhetas animadas da Rede Globo (Plimplim). Atualmente suas tirinhas são publicadas no jornal Folha de São Paulo, na revista Ideias e na newsletter do site sextoy. Ela tem também uma agência de ilustrações que presta serviços para agências de publicidade, assessorias de imprensa, jornais e clientes diretos. A chargista afirma que também faz macarrão Miojo e chá-de-saquinho como ninguém. Como foi sua infância, o que você gostava de fazer? Tenho uma história comum entre vários cartunistas: desenho

pasquins, livros de piadas de poucos anos atrás como o Status Humor. Repare que nestes veículos que representaram o humor gráfico por tanto tempo, a mulher sempre é objeto, representada por um estereótipo sem voz, é a gostosa, ou a

Se você já tinha o dom de desenhar, porque escolheu ser cartunista? Parece tedioso, não? Mas acredito na sabedoria milenar chinesa: “Escolha um trabalho que tu ames e não terás que trabalhar um único dia em tua vida”. Particularmente, nunca trabalhei. Sua família apoiou sua escolha profissional desde o começo? A partir do momento que quis seguir carreira profissional, ficaram preocupados com meu futuro. Não tinham sequer ideia das infinitas possibilidades que um desenhista pode optar ao longo de sua carreira. Na verdade, nem eu tinha. Segui instintos e confesso que sou feliz por fazer o que gosto. A sua escolha profissional não é algo comum e tampouco fácil. Como foi para você encarar este universo masculino? Problema é que o humor sempre foi feito por homens e para homens. Por conta disso, claro, sempre foi muito machista. Vide

procurar por este tipo de arte. Sentem-se agredidas, caçoadas e jamais gastariam seu dinheiro para comprar um livro em que são reduzidas a mero objeto de piada. É a hora de caçoar das infinitas possibilidades de piadas que o universo masculino nos proporciona, não?! Só que onde estão estas desbravadoras?! Temos algumas no país, mas ainda vejo uma lacuna da voz feminina no humor, tal como faz Amely. Ela representa a mulher de verdade, que pensa, fala e é independente, mas que apesar de tantas qualidades intelectuais e de caráter, ainda é vista como um mero objeto sexual. Ainda vivemos isso, muito menos no humor que na sociedade, infelizmente. Quais são suas referências para criar? O que te inspira? Quem te inspira?Como é a sua relação com o Ziraldo? Com 14 anos, já trabalhava em jornal. Fiquei lá por algum tempo aprendendo “mágicas” com o chargista dessa época. Ele me presenteou com alguns exemplares da revista Chiclete com Banana. Meu primeiro grande contato com quadrinhos foi com esta publicação. Foi aí que eu encontrei exatamente o que eu queria fazer: humor aliado a um desenho descompromissado com o realismo. A partir daí comecei a fazer fanzines do mesmo gênero da Chiclete para vender na escola e comprar Eduardo Macarios

Cláudia

desde criancinha. E continuo com idade mental de 10 anos. Só que eu desenhava melhor aos dez anos... eu acho. Meus familiares adoravam que eu desenhasse quando criança, porque assim ficava “quieta”. Minha mãe olhava para meus desenhos e achava tudo lindo. Meu pai ao contrário, sempre achava um defeito. Por causa da minha mãe me achava o máximo, mas ia logo cair na real com a crítica contundente de meu pai.

Pryscila Vieira, senso de humor e inteligência na medida certa

burra, ou a bonitinha que está sendo enganada para ir para a cama com um homem. Então, condicionadas a pensar que todo humor gráfico segue este padrão machista, as mulheres acabam por sequer

as bobeiras da minha adolescência como por exemplo ingressos para shows de punk rock e cuba libre. Passei a apreciar o trabalho do Angeli, Glauco e da geração anterior como o Jaguar, Millor, Ziraldo, Borjalo, Fortuna, Henfil etc... mas para mim, o papa é o Ziraldo que dá show de versatilidade fazendo do cartoon infantil até o safadinho para a Playboy sem nunca perder a elegância ou ser condenado por isso. É um exemplo. E, além de tudo, fazemos aniversário no mesmo dia. Bonita coincidência. Qual a história da Amely? Como ela surgiu? Amely é uma boneca inflável que foi batizada sob esta graça por conta do samba de Mário Lago intitulado “Ai que saudades da Amélia”. A tal Amélia deixava saudades por ser uma mulher de verdade, ou seja, um exemplo de resignação feminina. Só que Amely destrói o mito de que a “mulher de verdade” deve se anular em prol do seu parceiro. Amely chega por encomenda à casa de seu comprador com dois grandes e irreversíveis “defeitos de fabricação” segundo o público masculino: o primeiro é que ela pensa. O segundo defeito é que ela fala... e muito! Isto a transpõe do patamar de “mulher inflável” para o de “mulher infalível”. Amely torna-se “a mulher de verdade”. Adquire vontade, iniciativa e independência apesar de seus “proprietários” não esperarem nada dela além do que um objeto sexual proporciona. Os quadrinhos da Amely tratam dos sentimentos e pensamentos de alguém que não esperamos que os tenha, muito menos que os expresse tão veementemente. Infelizmente no mundo machista que vivemos, algumas mulheres ainda se deparam com situações semelhantes na sociedade e no mercado de trabalho. A internet para você... Em relação à internet o que você acha do jornal impresso? Acho que o jornal impresso, principalmente os mais conceituados, ainda mantém um pouco de glamour. A internet é democrática e por isso tem tanta coisa boa, quanto ruim em se tratando de cartoons, desenhos, textos. Ainda acho que o papel filtra


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CIDADANIA

(um pouco) melhor as ideias. Lembra-se da história do Solda com a charge do Obama? O desenho trazia a seguinte frase: “Almoço para Obama terá baião de dois, picanha, sorvete de graviola. E BANANA, MUITA BANANA”. Para completar a charge, um macaco faz um gesto que simboliza uma “banana”. Que acarretou na demissão do jornal O Estado do Paraná. Como vc vê a questão do chargista ter que ser politicamente correto? O planeta está tomado por uma horda de analfabetos visuais, incapazes de decodificar as verdadeiras mil palavras implícitas numa imagem. Deveríamos ter nas escolas, no ensino fundamental, a interpretação de imagens na grade curricular, bem como temos a interpretação de textos. E a sua experiência com a revista Playboy? Não posei para a Playboy... quem dera. Apenas respondi à uma entrevista bem curta, cujo resultado foi superficial, ilustrada por uma foto com minha fuça feia e corpo coberto de roupa. Mas se

Quais são os seus projetos para o futuro? Talvez a dramaturgia, explorando personagens como Amely. Em seguida: 1- Vou prestar um concurso público para garantir um futuro financeiramente seguro. 2- Tendo passado nesse concurso, vou fazer como quase todo funcionário público: enrolarei meu chefe. Nas horas vagas vou desenhar bobagens com lapiseira Pentel 07 num bloquinho de anotações que caiba no bolso. Vou fazer isso por pelo menos cinco horas das oito que devo trabalhar. 3- Na sequência vou publicar um blog postando minhas bobagens desenhadas em horário de trabalho e vou divulgá-lo por toda internet. Farei isso nas outras três horas que me restam de trabalho na firma. 4- Depois de ficar rica, bonita e famosa enquanto cartunista-humana, vou dar um jeito de me aposentar do serviço público. (Pesquisas comprovam que fazer coco no corredor da repartição entoando “Macarena” em Ré Menor atesta insanidade mental, seguida de incapacidade para o trabalho. É aposentadoria na certa!) 5- Pronto! Depois desses quatro passos básicos, terei me tornado uma grande cartunista e ainda vou ganhar dinheiro. Não é genial?! Dicas para quem está começando... Siga as instruções da resposta acima. Caso não queira fazer isso, estude muito sobre tudo, leia muito, aprenda a escrever antes de escrever, aprenda a desenhar como Michelângelo antes de desenhar como Millôr Fernandes, procure os profissionais gabaritados para pedir opiniões sinceras sobre o seu trabalho mesmo que isso provoque dores em seu coração egocêntrico, desenhe muito, sempre e sem parar. Acima de tudo seja humilde, escove os dentes e tome banho direitinho.

@

Para conhecer o trabalho de Pryscila, acesse: http://pryscila-freeakomics. blogspot.com.br e obrapryma.blogspot.com.

Vai de carro? Certeza? A cada ano que passa o número de veículos aumenta e o trânsito fica cada vez mais caótico na cidade

Cláudia Bilobran

falar “Playboy” o povo já imagina a Pamela Anderson com umbigo vetado pelo Photoshop.

Sandro César

O

trânsito é um dos pontos fracos de todas as grandes cidades do Brasil, e em Curitiba não é diferente. O número de veículos no município cresce a cada ano. Segundo dados do Departamento Estadual de Trânsito do Paraná (Detran), em 2007 a quantidade de veículos registrados na capital paranaense era de 966 mil. Já em janeiro de 2013 o número de carros, motos, caminhões e demais meios que compõem o trânsito curitibano, chegou à marca de 1 milhão e 307 mil. Com essa frota, o município é a quinta cidade do Brasil quando o assunto é número de veículos, e a primeira levando em conta só a região sul do país. Com uma população de mais de 1 milhão e 700 mil de pessoas, Curitiba tem uma média de aproximadamente um carro para 1,3 de habitante. Apesar do grande crescimento de veículos na capital do Paraná, o que não tem aumentado é o número de ruas e avenidas para suportar todos esses carros e, com isso, o resultado é um trânsito cada vez mais problemático, principalmente nos “horários de pico”. Para aqueles que precisam fazer parte diariamente do trânsito de Curitiba, como o motorista de transporte escolar, Calos Baggio,

a situação está se tornando cada vez pior. “A cada ano que passa os congestionamentos aumentam. Em locais próximos a faculdades e na região central, como na Avenida Visconde de Guarapuava, é preciso ter paciência para ser motorista em Curitiba”, conta. Com tantos problemas, o trânsito curitibano é um dos assuntos mais discutidos pela população e pelo poder legislati-

Curitiba tem uma média de aproximadamente um carro para 1,3 habitante vo da cidade. Várias opções para viabilizar um trânsito melhor são estudadas pelos vereadores de Curitiba. “Hoje se sabe que a região central de Curitiba está sendo esvaziada e os moradores (a maioria da terceira idade) estão deixando o local para morar em bairros, o que aumenta ainda mais a pressão sobre o trânsito. Uma das opções para resolver o problema é investir na revitalização da área central, incluindo a região da UFPR, Rua XV, Riachuelo, Largo da Ordem e Passeio Público. Com isso vamos atrair novamente moradores para a região central evitando assim grandes deslocamentos diários. Isso se chama contra-fluxo”, explica o vereador

Helio Wirbiski, do Partido Popular Socialista (PPS). Outra opção que pode melhorar o trânsito em Curitiba e frear o aumento de carros circulando pela cidade, é um investimento no transporte coletivo. “O sistema de ônibus na nossa cidade atingiu um nível de saturação, precisamos adotar outros modais. O metrô seria uma saída, mas o custo é elevadíssimo. Outra alternativa que vem ganhando força é o VLT (Veículo Leve sobre Trilhos). Precisamos também incentivar a utilização dos meios de transporte alternativos, como a bicicleta”, sugere o vereador Tito Zeglin, do Partido Democrático Trabalhista (PDT). Um novo formato de transporte coletivo é também uma opção defendida pelo vereador Jonny Stica, do Partido dos Trabalhadores (PT). “A população, com renda média maior tem mais acesso a carros e sempre vai preferir usá-los. No entanto, temos que trabalhar por um transporte público confortável, mais rápido e barato que o automóvel. Além disso, temos que construir em Curitiba calçadas adequadas para os pedestres e um efetivo maior de quilometragem de ciclovias e ciclo faixas”, salienta o vereador. No Brasil apenas as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília contam com uma frota de veículos maior do que Curitiba.


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ESPECIAL

Como livrar o Passeio Público da decadência? Segurança é o principal fa

uma amostra expressiva da fauna e flora mundial compõem o espaço. Eni Atualmente circula uma camSantana panha em um dos maiores veículos de comunicação impressa de Curitiba para a reocupação e revitalização do Passeio Público, Laura que completa 127 anos em maio. Weiss Porém, durante o tempo em que a nossa equipe permaneceu no parque (dois dias na semana e um sábado, totalizando dez horas) enMarcos contramos marginais, drogados, Ferradin prostitutas e descaso para com os cidadãos que visitam o local. “Gosto muito do Passeio, sempre que venho ao centro de Curipraia dos curitibanos são as tiba aproveito para visitar o lugar, praças e parques. Nos finais mas a frequência com que visito de semana, feriados, na folhoje é bem menor do que há alga do trabalho, nas férias, em dias guns anos. A segurança é péssima, quentes ou no friozinho do outono, virou ponto de prostituição, uso e estes lugares ficam tomados por venda de drogas e conheço pessopessoas procurando um lugar ao as que foram assaltadas dentro do sol, ou à sombra. parque. É uma pena porque um loNa segunda reportagem da sécal lindo, público, de lazer aonde rie “Curitiba como ela é”, a equipe as pessoas vêm com sua família do Marco Zero foi apurar as condeveria ser mais seguro, nunca vi dições do parque central de Curium policial rondando por aqui”, tiba, o Passeio Público. Lago com desabafou Aislan Tiago Vaz, 25 ilhas, animais silvestres, aquário e anos, colocador de azulejos e morador de Colombo, que estava no Passeio com a namorada. No interior do parque há uma academia ao ar livre, bem equipada e várias pessoas aproveitando os aparelhos para cuidar da saúde do corpo e da mente. Arminda Soares, telefonista com 62 anos, moradora da região, vem ao parque duas vezes por semana para caminhar e fazer exercícios físicos, mas confessou Aislan Tiago que fica ressabiada ao Vaz costuma visitar o circular pelo local. “Tem Passeio com coisas que a gente prea namorada cisa fingir que não vê. ou amigos. Passo rapidinho e sigo Eni Santana

A

Eni Santana

Um passeio passeio entre entre araras, araras, Um macacos ee marginais marginais macacos

Homem que abordou a repórter e duas mulheres no interior do Passeio Público

meu caminho. As pessoas entram e fazem o que querem. Tem sempre viatura policial ali no módulo, mas policial que é bom só fora do parque”, declarou. Um comerciante que trabalha há 20 anos dentro do Passeio Público e que pediu para que sua identidade não fosse revelada por medo de repressão, contou que o trabalho ali tem sido árduo. “Os malandros vem aqui, me pedem alguma mercadoria, saem sem pagar e eu não posso fazer nada. Eles saem rindo. Sinto saudades de quando o parque era seguro e isso faz muitos anos”.

Abordagem obscena Na tarde do dia 10 de abrail último, uma repórter da equipe foi abordada por um sujeito enquanto fazia uma entrevista com duas moças que estavam admirando as araras no parque. Um homem negro, de aproximadamente 45 anos, de calça jeans e camisa laranja xadrez parou ao lado das entrevistadas e começou a despejar palavras obscenas. Uma das entrevistadas de nome Solange começou a gritar, o

sujeito se assustou e saiu correndo. Completamente atordoadas e assustadas, as moças se desculparam e se retiraram do parque. A repórter se dirigiu até o módulo policial que fica dentro do Passeio Público onde havia duas viaturas estacionadas, três motos e um policial, o cabo Zacharias. Descrito o acontecimento, o cabo informou que acabara de registrar uma ocorrência sobre um elemento com as mesmas características e que estava molestando mulheres na Praça 19 de Dezembro, que fica em frente ao parque. O mais incrível foi que o policial nada pode fazer, pois segundo o cabo, a segurança do parque é responsabilidade da Guarda Municipal e que o módulo está ali como uma unidade de apoio, para atender a ocorrências feitas através do 190 (Polícia Militar). A equipe foi então até o posto da Guarda Municipal e conversou com o guarda Floriano. De acordo com ele, a segurança do parque deveria ser feita em parceria entre a Polícia Militar e a Guarda Municipal, mas não é o que acontece. Depois que a repórter fez a narrativa do ocorrido, o guarda com 54 anos, que trabalha há 26 na corporação e há 18 anos dentro do parque, desabafou: “Eu já levei ao meu superior que somente um guarda dentro do parque nada pode fazer para assegurar o bem estar dos visitantes. Quanto à prostituição, certa vez recebemos uma ordem para ‘desocupar’ o parque, mas começaram a acontecer protestos, defendendo o direito de todos de ir e vir e a ordem foi revogada. Mas e o direito dos cidadãos de se sentirem seguros dentro do parque? É isso que as pessoas me perguntam”.

A responsabilidade Entramos em contato com a Secretaria de Praças e Parques que informou que a responsabilidade pela segurança do Passeio Público é da Guarda Municipal de Curitiba. Por telefone, o vice-diretor da corporação, Inspetor Cubas, esclareceu que a incumbência era realmente da Guarda, cuja sede é em frente ao Passeio Público, mas que há algum tempo a Polícia Militar tomou frente desta atividade, incluindo no parque um posto Policial para facilitar o trabalho. Não satisfeita, a equipe do Marco Zero fez contato novamente com a 1ª Cia do 12º Batalhão da Polícia Militar, localizado dentro do Passeio Público e conseguimos conversar com o capitão Luiz Fernando, responsável pelo contingente do posto. “A polícia Militar é responsável pela segurança do parque e diariamente alguns policiais fazem o patrulhamento”. Já quanto à prostituição, o capitão explicou: “Pela lei brasileira, prostituição não é crime. Mas se alguma pessoa se sentir ameaçada ou sofrer alguma abordagem deverá encaminhar a ocorrência através do número 190”. O capitão tem razão. No Brasil prostituição não é crime, não importa se é mulher, homem, brasileiro ou estrangeiro. Mas é considerado crime: Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público; Importunar alguém, em lugar público ou acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor.


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ator para que o parque volte a ser dos curitibanos Mais segurança para o Passeio

bom

Acompanhe a situação do Passeio Público e os aspectos que precisam melhorar:

médio Fotos: Eni Santana

grave

O Passeio, de lá para cá Segurança: A 1ª Cia do 12º Batalhão da Polícia Militar é responsável pela segurança, embora nem mesmo os policiais soubessem desta obrigação, mas, ainda assim, crimes como pequenos assaltos são cometidos contra os visitantes e os comerciantes do local.

O primeiro parque da cidade de Curitiba e também do Paraná tem tantas histórias que seria impossível colocá-las no papel, porém algumas delas valem a pena ser contadas. Criado a partir de uma necessidade de acabar com o mau cheiro e o acúmulo de resíduos no Rio Belém, o Passeio Público viria para evitar possíveis epidemias de malária, varíola e cólera. O parque pioneiro da capital paranaense surgiu lá, sobre aquele terreno pantanoso e mau visto no ano de 1886. Um dos principais acontecimentos foi em 1888, logo após a inauguração completa do parque, com a chegada de um carrossel à cidade de Curitiba. Foi o evento! Todos curiosos e ansiosos para saber como funcionava aquela “máquina de cavalinhos”. Nos curitibanos, que não tinham lazer algum, o carrossel causou uma mistura de sentimentos, magia e alegria, como na música “A Banda”, de Chico Buarque de Holanda. A segunda vez em que o Passeio Público recebeu uma multidão foi em um dia de frustração e muito calor. A população esperava ansiosa pelo momento em que a primeira mulher subiria aos céus em um balão. Porém, logo após sair do chão o balão enroscou-se no topo da Catedral de Curitiba, deixando os espectadores decepcionados. Entre dias de revoluções, inovação, frustração e também de muita cultura e literatura aconteceram fatos que hoje fazem parte da história da capital paranaense. Em 1911, no auge do helenismo, foi no pioneiro parque Passeio Público que Emiliano Perneta foi nomeado e coroado como “príncipe dos poetas paranaenses”. Poeta que no ano seguinte participou da fundação e se tornou presidente do Centro de Letras do Paraná e, mais tarde, ganhou uma rua no centro de Curitiba com seu nome. O ambiente do parque tornou-se mágico, a população que o frequentava era culta, bem educada, porém lá existia espaço para todos. Foi no Passeio Público que surgiu o primeiro parque infantil da cidade, além do viveiro de macacos, pedalinhos no lago e o Restaurante do Estudante, que anos depois foi totalmente destruído por um incêndio. Hoje, infelizmente, o Passeio Público perdeu muito do que já significou para os curitibanos; um local agradável, cheio de gente, mas com segurança, organização e principalmente qualidade. Porém, com o que se vê hoje no primeiro parque de Curitiba é possível perceber que aquele espaço de cultura e lazer ficará apenas na história da cidade.

Prostituição: No Brasil prostituição não é crime, mas atentado ao pudor e favorecimento à prostituição, sim, e acontece o tempo todo, não importa o horário.

E

Cuidado com os animais: Os animais do parque aparentemente são bem tratados.

Preservação do parque: a água aparentemente está suja por causa das folhas que caem no outono, mas não afeta a beleza do parque.

Drogas: Aliciador corrompe os adolescentes sem se preocupar com o módulo policial que fica próximo. Wikimédia Commons

Estacionamento: Não existe estacionamento no parque. Ocorre nas ruas próximas e os estacionamentos privados são poucos.

Lazer: Mesas para jogar baralho ou dominó, restaurante e pedalinho são boas opções aos turistas no parque.

Portão do Passeio Público - foto da década de 1930


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CRÔNICA

Um voo sobre o Passeio Público Parque guarda muitas recordações. Entre elas, voos frustrados, um banho inusitado e até a coroação de um príncipe. Flyssak

P

edrinho mais uma vez não conseguia dormir. Seu avô, já com 90 anos de idade, estava cuidando dele por uma semana, já que os pais da criança tinham ido viajar. Como já era um senhor de idade, gostava de dormir cedo. Mas desde que seu neto chegou, não conseguia descansar tão cedo. O menino tinha um sério problema para dormir. Achava que era inútil, uma completa perda de tempo. Só fechava os olhinhos depois de uma longa história, e essas o seu avó tinha aos montes. Então, numa noite fria de quarta-feira, num quarto mal iluminado o seu avô contou uma história que fez ele viajar para o século XIX. Começou assim: “Em uma pequena Curitiba de apenas 15 mil habitantes, havia um enorme terreno pantanoso. Era coberto por mato, água e barro que se misturavam e formavam um grande banhado abandonado no meio da cidadezinha. Era conhecido por banhadão do Bittencourt. Até que no ano de 1858, Dr. Muricy, deputado da Província por três mandatos seguidos, passou por ali e viu uma ameaça a população. Segundo o médico, aquele lugar representava um perigo para os cidadãos, pois Palco flutuante

“A ideia de criar o Passeio Público foi aprovada em 1885” Fontana e com o sucessor de Taunay, Joaquim d’Almeida Farinha Sobrinho, foram os que fizeram com que a ideia do Passeio Público virasse uma realidade”. Vovô, eu não estou entendendo essas palavras difíceis. Fala mais fácil? Tudo bem. - Respondeu o avô com um sorriso e passou a mão nos cabelos castanhos e lisos do garoto. Saneamento básico, meu filho, é para deixar a cidade mais limpa. Já imaginou que bagunça se o mundo inteiro fosse um banheiro? Para isso que serve o saneamento, para organizar esFotos: Divulgação

Juliani

havia grandes chances de acontecer uma epidemia do mosquito da cólera, que se reproduz pela água parada. Francisco Fasce Fontana, administrador das obras do Passeio Público, chegou a chamar o lugar de “pequeno tanque Bittencourt, nojento receptáculo de todas as imundícies”. Então, ele encaminhou um projeto com a ideia de criar o Passeio Público foi aprovada em 1885. O seu principal argumento era o saneamento básico. O presidente Taunay, presidente da província da época, juntamente com Francisco Fasce

goto, fazer com que a água limpa chegue na nossa casa. Entendeu, Pedrinho?” - O garoto concordou sorrindo com um gesto movendo a cabeça. O avô prosseguiu com a história. “Aconteceram muitas histórias curiosas no Passeio Público. Já ouviu falar da Maria Aída? Meu Deus! Na escola a professora nunca comentou? Para ver como anda a educação nesse país. Mas bem, Maria Aída era uma balonista. Há muitos anos atrás, em 1909, quando o Passeio Público ainda era o único parque da cidade, essa moça voava de balão. Sabe aqueles balões gigantes que a pessoa fica num cesto? Então, aqueles lá. O dela se chamava Granada. Ela foi no Passeio e encrespou que aquele negócio ia voar. O parque lotou. Maria tentava e tentava levantar voo, mas não conseguiu. Marcou para o próximo domingo. Era uma tarde insuportavelmente quente, lembro-me como se fosse hoje. Vi um homem tirando algumas vestes e os policiais correndo atrás dele, porque ele pensou que dava para se banhar no Rio Belém, que passa ali dentro do Passeio. Eu ri muito aquele dia. Porém, Maria ainda não tinha voado. Adiou para o próximo domingo. Então ela conseguiu. O balão levantou voo e foi direto para a igreja que tem ali na Praça Tiradentes, sabe aquela grandona, Pedrinho? Ela ficou presa ali, feito um caqui!” O avô agora ria alto junto com o neto. “Muitas coisas aconteceram ali. Teve até um grande evento. A coroação de Emiliano Perneta como Príncipe dos Poetas Paranaenses. Nesse dia eu não estava lá. Sei que foi muita gente inteligente e depois volta e meia eles voltavam para escrever suas obras. Todos estavam na Ilha da Ilusão, nome que deram por causa do livro que Emiliano escreveu. Procuravam inspiração, mal sabem eles que tudo isso tem que vir do coração”. “Vish! Logo depois começaram a trazer um monte de animais para o Passeio! Daí sim virou uma festa. O primeiro casal de pavão deu a maior confusão. O povo da época achava que os pobres animais traziam azar. Tiveram que ser doados, coitados”.

Balão granada

“Anos depois começaram os shows no palco flutuante no...” - Palco flutuante? - Sim, um palco flutuante no meio do rio. Nossa, como era divertido. Eu levava seu pai ali. A gente almoçava feijoada e ficava até entardecer. Ele ficava nos pedalinhos com os amigos, enquanto eu e sua avó ficávamos namorando ao som de uma boa música, vendo no céu a pequena lua minguante. - Namorando? - Sim, namorando! O garoto arregalou os olhos. - Mas um namorar diferente do que a gente vê nos dias de hoje. Você também vai fazer isso um dia, Pedrão. Coroação de Emiliano Perneta

- Não vou, não. “Mas anos depois tiraram os pedalinhos dali. As crianças e até os adultos sentiram falta daqueles brinquedos. Falaram que era por causa da segurança. Bobagem, na minha opinião. Agora vieram com uma história de reviver o Passeio Público. Espero que dê certo. Adoraria ver todos os curitibanos aproveitando aquele espaço”. Pedrinho já estava dormindo. O avô saiu do quarto e sentou na cadeira de balanço na varanda. Estava sem sono. Levantou-se, pegou um álbum de fotos e ficou por horas relembrando um tempo que não volta mais.


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COMPORTAMENTO

Lugar de dar adeus a objetos antigos é no brechó Acessórios de todos os tipos à venda.

Leticia Mueller

Decoração temática contribui para a atmosfera vintage dos brechós.

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cheiro que preenche o ambiente lembra casa de vó. Por todo o lado, um mix de texturas, estampas e cores aponta para alguma década que se perdeu no passado, mas ganha vida em meio a cabides e objetos decorativos hipsters. O visual é democrático, como se o passado ali fosse respeitado com suas devidas lembranças, ainda que misteriosas. Tudo isso é um convite para que saudosistas enxerguem o brechó como o lar perfeito para objetos que marcaram sua vida. São roupas, sapatos, bolsas, instrumentos musicais, secador de cabelo e até um gravador de fita cassete que ganham valor ao serem expostos não como velharias, mas como relíquias. A tendência vintage nos brechós ganhou força e criou um novo conceito para lojas especializadas na venda de roupas usadas. Os itens precisam estar em bom estado e corresponderem à linha de estilo cultuada. Basta passar os olhos pelas prateleiras para perceber que não se tratam de peças velhas, e sim de achados retrôs datados da própria época do estilo. “Um senhor passou na frente da loja e ficou observando a vitrine por um bom tempo. Depois ele voltou para deixar um gravador de fita cassete da época em que ainda era adolescente, quando tinha 17 anos”, conta Rafael Gomes Savae, sócio-proprietário do brechó Libélula. Segundo ele, é comum pessoas de idade serem criteriosas na escolha do lugar

em que finalmente dirão adeus aos objetos que os acompanharam por longas etapas da vida. Entre as mais de 20 mil peças angariadas pela loja, que vende desde roupas e acessórios até instrumentos musicais, Savae elege um quadro do Elvis de quando o cantor era vivo como seu item preferido. “Encontramos o quadro em um bar que estava sendo fechado. É o meu xodó e não está à venda. O valor é inestimável”. A loja Balaio de Gato é mais um exemplo de estabelecimento que adaptou o conceito de brechó. “Há dois anos, o que era velho e antiquado ganhou uma releitura com o vintage. A moda pegou, mas os curitibanos ainda têm muito preconceito com roupas usadas”, afirma a proprietária Estela Adamo Almeida. Para quebrar os paradigmas, a loja costuma fazer eventos mensais, desde vendas de discos de vinil até shows com bandas locais.

Exclusividade

Das patricinhas em busca de marcas famosas e “brechozeiros” ávidos por roupas baratas, até indies e pessoas com estilo alternativo, quem frequenta o brechó vintage está em busca da

Como a rotatividade dos produtos é grande, gosto de ir direto nos brechós para garimpar coisas interessantes

Bolsa da década de 50 feita de baquelite, uma resina sintética que antigamente era usada para fabricar telefones. R$69,90 no Balaio de Gato

- Carina Selhorst exclusividade e originalidade que só o passado tem. É o exemplo da designer de interiores Carina Selhorst. Dona de um estilo alternativo que mistura o hippie com o retrô, ela conta que é no brechó que encontra roupas com a sua cara. Para ela, não há nada melhor do que achar uma peça exclusiva por um preço acessível. “Todas as minhas roupas preferidas vieram de brechós. Essa mistura de tendências, estilos, estampas e tecidos é o que dá um ar original para as peças antigas. Não vemos nada assim em lojas convencionais, a grande maioria prefere seguir a moda atual para garantir as vendas”. Carina costuma ir aos brechós pelo menos uma vez por mês para não deixar nada especial escapar. “Como a rotatividade dos produtos é grande, gosto de ir direto nos bre-

chós para garimpar coisas interessantes. Cansei de pedir algo específico e escutar a vendedora falar que tinha exatamente o que queria até o dia anterior, quando vendeu a peça. Quem gosta de roupa antiga sabe que é pegar ou largar.” O passado ganha vida no corpo e na casa dos consumidores de produtos antigos, enquanto as modas atuais também vão se tornando obsoletas para daqui uns anos, serem elas a preencher as prateleiras dos brechós. Parafraseando Mário Quintana, “o passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente”, inclusive na moda.

Gravador de fita cassete Panasonic da década de 20. R$150 no Libélula Brechó.

Fotos: Bruno Barreto

Estilo vintage transforma lojas de roupas usadas em pontos de tendência da moda


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COMPORTAMENTO

Pressa para subir ao altar Davi Oliveira

Fotos: Davi Oliveura

Igrejas tradicionais são as mais buscadas para cerimônias Igreja do Rosário, a segunda construída em Curitiba, no século XVIII

Interior da Paróquia da Ordem, decorada para cerimônia.

A

s paróquias tradicionais de Curitiba, como a Igreja da Ordem e do Rosário, no centro da cidade, têm uma agenda concorrida devido ao grande número de casamentos marcados. Isso faz com que as igrejas se vejam obrigadas a realizar mais de uma cerimônia no mesmo dia. Na Igreja da Ordem ocorrem normalmente três casamentos nas sextas-feiras e dois aos sábados. Mesmo com a grande demanda, não contam com lista de espera, comenta Bernadete Almeida, secretária da paróquia há alguns anos. Isto significa que os noivos que fazem questão de se casar nestas paróquias marquem primeiro a data do casamento no religioso, e só depois a festa. Foi o que fez o casal Vinicius Albino, 21 anos, analista de crédito e Lucilene Camila de Souza, 23 anos, agente de atendimento. Eles tinham o desejo de subir ao altar necessariamente na Igreja da Ordem, pois foi nas proximidades deste local que se conheceram. A vontade de ambos foi realizada no dia 16 de fevereiro deste ano. Já para casais que marcam o jantar e o baile antes da data na igreja, ocorre a possibilidade de terem que procurar outros locais para a cerimônia religiosa, já que

Muitas pessoas que se casam no religioso não são católicos praticantes, porém como essa data é considerada especial, elas gostariam que fosse inesquecível, utilizam esta opção - Padre Silvino a data desejada pode estar “ocupada”. Mesmo que aumente a procura por locais tradicionais católicos, nem todas as pessoas que desejam realizar o enlace dentro das igrejas seguem rigorosamente a doutrina. “Muitas pessoas que se casam no religioso não são católicas praticantes, porém como essa data é considerada especial, elas gostariam que fosse inesquecível e utilizam esta opção", conforme explica o padre Silvino, responsável pela Paróquia do Rosário. Informa também que a maioria das datas é marcada com um ano de antecedência. Evandro Coelho, fotógrafo que trabalha com casamentos, menciona que notou o au-

mento pela procura de trabalhos dentro das igrejas, pois hoje em dia algumas pessoas acham "glamouroso" fazer casamento em igrejas tradicionais. Porém, para casais que têm um pouco mais de pressa, o sonho do casamento pode não ser realizado de maneira completa. A espera causada por tamanha procura e algumas exigências que são feitas por certas paróquias -- como prova de batismo dos pretendentes cursos de noiva e de padrinhos acabam fazendo com que optem por casamentos com juízes de paz em locais alugados. Ou simplesmente acabem procurando paróquias menores e menos tradicionais.

Um pouco de história

A Igreja da Ordem Terceira de São Francisco das Chagas, mais conhecida simplesmente como Igreja da Ordem, foi construída pelos portugueses em 1737 e é a igreja mais antiga de Curitiba. Originalmente, era a Igreja de Nossa Senhora do Terço. O nome atual foi dado com a chegada à Ordem de São Francisco em Curitiba, em 1746. A atual Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos de São Benedito é uma construção de 1946. Foi construída no mesmo local da antiga igreja, demolida em 1931.

A primeira igreja do Rosário foi construída por escravos e para os escravos, inaugurada em 1737. Era a terceira de Curitiba, depois da Matriz e da Igreja da Ordem. O antigo nome era Igreja de Nossa Senhora dos Pretos de São Benedito. Com a abolição da escravatura, a igreja perdeu sua razão original de ser. Serviu de matriz de 1875 a 1893, durante a construção da Catedral, na Praça Tiradentes.

O casal Vinicius e Lucilene se conheceu a poucos passos da igreja, onde celebraram a união.


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ESPECIAL

Não tem pão velho, nem jacaré

@ TÁ NA WEB Claudia Bilobran

Leticia Mueller

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laudia está sentada na beira da cama com os dedos trabalhando em uma camisa. As mãos mexem incessantemente, enquanto a filhinha de quatro anos procura os defeitos que clamam por conserto. Não há furos, rasgos ou manchas. Criança curiosa que é, pergunta: Mãe, o que você está fazendo? E ela responde: Tirando o jacaré da camisa Lacoste do teu pai. Porque? Porque vamos doar essa roupa. Huuuuum. A criança faz que entende com a cabeça e volta para o seu quarto. Alguns anos depois, a menininha fica sabendo que sua família começou com essa história depois de ver um peão trabalhando na roça com a camisa Lacoste que seu pai havia doado. Aquilo magoou profundamente o brio do homem que via no réptil uma forma de status. Para ele, o peão estava sendo ingrato, denegrindo a imagem da marca que estampava o seu peito orgulhoso de gente rica. Muita gente acredita que é um desperdício doar roupa “grifada” para pessoas carentes. Por que doar uma roupa boa? Afinal, elas só precisam se vestir, não se “arrumar”. Pobre não vai para a festa, pobre não tem entrevista de emprego, pobre não precisa se vestir bem. Pobre só existe. Sendo assim, antes de doar sua Polo retire todos os vestígios que revelem o valor da peça para o pobre não se sentir como um rico. Um pobre grifado é uma ofensa a toda raça dos que têm grana para gastar mais de um salário mínimo em uma calça jeans. Se antes, ter um Dolce & Gabbana garantia a continuidade da hierarquia da sociedade, com essas doações irresponsáveis tudo vira uma bagunça. É uma troca de valores vergonhosa ver sua diarista no shopping trajando aquele casaco Gucci comprado nas europas. Um usuário inato de roupas de marca sente-se ultrajado ao ver

alguém com poder aquisitivo inferior vestindo o que antes lhe garantia o status de Classe A. É a banalização das grifes. O fim dos tempos de ouro dos mais abastados. Como se destacar em uma multidão que também usa Louis Vuitton, Victor Hugo e Chanel? É exatamente a mesma lógica quando o assunto é pão velho. Se o pobre toca a sua campainha e pede pão velho, não dê o pão fresquinho que você acabou de tirar do forno. Dê o pão duro que ia virar – junto com um pouco de carne moída, é claro - a comida do seu Labrador. O bom é que o pobre já entende bem como as coisas funcionam. O moço da roça recebeu aquela roupa como se recebe um pão velho. Para ele, a camisa não era uma Lacoste na plantação. Era só mais uma peça qualquer que poderia lhe proteger do sol durante os períodos que ficava na lavoura. Era mais um uniforme de trabalho, trapo velho doado por algum cara da cidade. Por isso, continuou frequentando festas e eventos mais formais com suas velhas camisas baratas. Se você concorda com tudo que foi dito anteriormente, garanta a continuidade da espécie grifada. Preserve as grifes, doe somente roupas sem etiquetas. Ajude a manter uma sociedade cada vez mais hipócrita e preocupada com as aparências, enquanto muitos sofrem com o frio e a fome.

Guria para de ser jaguara e olha lá na internetE GentE, na internetE, tem muita coisa legal, principalmentE quando se trata de “Curitibanidades”. Capazzzz que você não conhece este termo? Deixa de ser jacu. Curitibano que é curitibano de verdade, toma leitE quentE, daí vai para a rua soltar raia. E é com este dialeto tipicamente curitibano que um grupo de jovens resol- veu parodiar alguns costumes linguísticos dos habitantes da capital paranaense. Vale boas risadas. @:http://www.youtube.com/channel/UCynj0HQPgo_l_xHZPL-EF5Q @:https://www.facebook.com/TesaoPia

Porque adotar faz bem Miniaturas, gigantes, de raça, vira-latas, não importa, só quem tem um animal de estimação sabe como são preciosos. Existem estudos que mostram que ter um bichinho de estimação faz muito bem à saúde física e mental. Com tantos pontos positivos e tantos animais abandonados por donos que não são respeitam a vida, por que não adotar um gato ou um cachorro? E para adotar um “cãopanheirinho” ou um “bichano” existem vários sites que você pode escolher, por tamanho, peso, adulto, a filhote. É só querer! @:http://www.adotebicho.com.br/ @:http://www.caopanheirocuritiba.com.br/ @:http://www.animaisos.org/?link=adote.ph

CHARGE ZERINHO ASSALTADO SEU POLÍCIA SOCORRO! FUI ASSALTADO, LEVARAM TUDO

DESCULPE JOVEM, NÃO POSSO SAIR DAQUI, ESTE É O MEU PONTO TÁTICO

O QUE VOCÊ PODE FAZER ENTÃO?

POSSO CHAMAR A POLÍCIA BRINCOU?


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IMAGENS QUE INTERVEM NO COTIDIANO DE QUEM PASSA.

ENSAIO FOTOGRÁFICO

Rodrigo Brito

N

o ir e vir pelas ruas de Curitiba, encontra-se uma mostra de rabiscos e pinturas de pessoas que por ali passaram e deixaram suas mensagens. Qualquer espaço serve como tela para que artistas ou meros cidadãos comuns os utilizem para passar seus recados.

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