Jornal da ABI - 90 anos na Trincheira da Liberdade

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atividade de jornalista não era considerada como uma atividade “trabalhista”. Tratava-se de uma ocupação, nobre por poder informar ao público, meia sacerdotal pois exigia dos jornalistas uma certa abnegação, mas jamais um trabalho no sentido da venda de uma força de trabalho. Era, na verdade, um meio de arranjar prestígio e, invariavelmente, de ingressar na política. Não viviam exclusivamente do jornalismo, de modo que o jornal acabava sendo uma ponte para chegar-se com mais facilidade aos donos do poder e, com isso, angariar favorecimentos futuros. Contudo, o tempo iria demonstrar que a combatividade e a determinação de Gustavo de Lacerda tinham seu fundamento. E a razão viria rápido. Até a época da imprensa artesanal não havia salário. Pagava-se sob a forma de “vales”, remunerações que por vezes levavam meses para serem saldadas. Com a criação dos linotipos, os operários responsáveis pelos textos impressos constituíram seus sindicatos. Os ideais socialistas e anarco-sindicalistas, bastante influentes à época, passaram a comandar a defesa desses trabalhadores. Os jornalistas começaram a perceber que os linotipistas recebiam seus salários regularmente, ao passo que eles, jornalistas, ainda recorriam ao expediente dos “vales”. Em pouco tempo, a consciência profissional da categoria dos jornalistas retoma suas origens do século XIX, quando a imprensa teve um papel

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destacado na defesa de ideais de revoltosos nas diversas manifestações havidas durante o período regencial, principalmente. Destaque semelhante ocorreria posteriormente por ocasião das primeiras lutas sindicais da República, nas quais os jornais operários circulavam com a regularidade possível a apoiar as demandas dos trabalhadores. Assim, a origem histórica da hoje consagrada ABI foi marcada pelo processo de agravamento das contradições da sociedade brasileira, cujo eixo fora marcado pela combinação estrutural de uma economia agroexportadora de base latifundiária e o progresso das relações capitalistas de produção a apontar na direção de uma superação desse quadro a curto prazo, o que se deu parcialmente em 1930. Durante esse período, a ABI foi pouco a pouco integrando-se à problemática nacional de modo a conquistar o respeito de todos os que se encontravam ao lado das causas mais nobres da democracia e das liberdades. Desse modo, acompanhou a primeira eleição competitiva para a presidência da República, a envolver Rui Barbosa e o seu Civilismo e Hermes da Fonseca, o eleito, e o seu Salvacionismo, em 1910, mesmo ano em que ocorreu a Revolta da Chibata liderada pelo marinheiro João Cândido; assistiu ao evoluir do movimento sindical e operário em sua primeira década de existência como órgão de amparo dos jornalistas, até a famosa greve de 1917 em São Paulo; o ecoar distante da Guerra de 1914/18,

de caráter interimperialista, e a Revolução dos sovietes russos de Outubro (calendário Juliano) de 1917. Tanto no quadro nacional quanto no internacional, a conjuntura dos primeiros anos da ABI foi assinalada por reivindicações democráticas, mudanças políticas e conquistas sociais que a tornaram partícipe de uma história das liberdades do homem, independente de seu caráter estritamente nacional, posto que esta condição se afirma também na solidariedade aos pleitos internacionais. Em 1908, os fundadores participantes do ato de criação da Associação de Imprensa - Gustavo de Lacerda, presidente (O Paiz); Francisco Souto, vice-presidente (Correio da Manhã); Alfredo Seabra, tesoureiro ( O Paiz); Luís Honório, primeiro-secretário (Jornal do Brasil); Artur Marques , secretário(Gazeta de Notícias); Noel Batista, procurador (Jornal do Brasil); Belisário de Souza (O Paiz); Amorim Júnior e Mário Galvão do Jornal do Commercio - iniciaram uma trajetória de incomparável êxito em se tratando de uma entidade associativa, cuja seriedade e dedicação, desde essa época até hoje, garantiram a credibilidade junto a opinião pública democrática do país.

A origem histórica da hoje consagrada ABI foi marcada pelo processo de agravamento das contradições da sociedade brasileira... pouco a pouco foi integrando-se à problemática nacional de modo a conquistar o respeito de todos os que se encontravam ao lado das causas mais nobres da democracia e das liberdades

Lincoln Abreu Pena é professor titular de história do Brasil da Universidade Severino Sombra (USS) e professor aposentado do IFCS/UFRJ. ○

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