ABI
INSISTIMOS NA LIBERDADE
A Associação Brasileira de Imprensa, fundada em 7 de abril de 1908, é considerada organização de utilidade pública, nos termos dos decretos 3297, de 11/07/1917, da União, e 1897, de 10/11/1917, do Distrito Federal. Funciona em sede própria, no Edifício Herbert Moses, prédio tombado em 29/05/ 1984 pelo Instituto do Patrimônio Histórico Nacional, na rua Araújo Porto Alegre, 71(Castelo), Rio de Janeiro (RJ) - CEP 20030010, telefone (021) 282-1292 e fax (021) 2623893. Inscrição no CGC 34.058.917/0001-69. Mesa do conselho administrativo: presidente, Fernando Segismundo;1º secretário, Arthur Ferreira de Souza Filho; 2ª secretária, Maria Lúcia Amaral. Diretoria: presidente, Barbosa Lima Sobrinho, 1º vicepresidente, José Chamilete; 2º vice-presidente, José Gomes Talarico; secretário Cícero Sandroni; 1ª subsecretária, Ana Arruda Callado ; 2º subsecretário, Paulo Motta Lima; tesoureiro, José Teixeira Peroba; subtesoureiro, Alcino Soeiro; diretor da biblioteca, Oliveiros Litrento; diretor da sede, Henrique Miranda; diretor de atividades culturais, Ary Vasconcelos. Representante em São Paulo: José Marques de Melo - tel: (011) 883-6591. Representante em Brasília: Carlos Chagas - tel: (061)248-0604.
JORNAL DA ABI EDIÇÃO ESPECIAL 1998 Concepção e coordenação geral de projeto, André Motta Lima; diretor responsável, Barbosa Lima Sobrinho; editor, André Motta Lima (Departamento de Intecâmbio e Divulgação da ABI); subeditora e revisora, Glória Esperança; programação visual e editoração, Cecília Castro; coordenação de digitação,Queli Cristina; apoio administrativo, Tharcisio Pires e Igor Paixão; estagiários (Convênio ABIUniversidade), Adriana Bilate (relações públicas-UERJ), Carla Alves (relações públicas-UERJ) Danielle Nogueira (jornalismo UFRJ), Fernanda Novaes (jornalismo-UFRJ), Patrícia Matheus (relações públicas-UERJ), Verônica Nicácio (relações públicas-UERJ); suporte de informação, Fernando Segismundo e Biblioteca Bastos Tigre (ABI-12º andar); comercialização, Unimarket/Spire - tel: (021) 294-2811 e Casa do Vídeo - tel: (021) 2623011. Esta edição especial anual é enviada gratuitamente, em mala direta, a todos os sócios da ABI e a deputados, senadores, ministros de estado e à Presidência da República. A critério da direção da entidade, é enviado também a escolas e professores de Comunicação Social, a bibliotecas, a sindicatos e associações de jornalistas, a assessorias de imprensa, a embaixadas brasileiras e a orgãos de imprensa em geral. É, ainda, expedido a sindicatos e associações de jornalistas no exterior. Tiragem desta edição especial: 10.000 exemplares. Fotolitos e impressão: Imprensa Oficial do Estado do Rio de Janeiro - Rua Marquês de Olinda, 29 Niterói. CEP24.030-170.Tel: (021) 620-1122.
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liberdade de imprensa com direito do povo à informação. Pela mesma coerência que nos une, historicamente, na trincheira das causas populares e cívicas. Associação que somos, trazemos a particularidade de um enfoque centrado nas intenções comunitárias de seres humanos idealistas. Ideal comungado que se mescla por dentro de amizades e hereditariedades. Morel tem filho e neto jornalistas e dedica seu livro a um "pai" que é o meu avó, ainda lembrado por uma quarta geração de sobrenome jornalístico. Todos nós assistidos em vida, há mais de século, pelo mais novo e mais antigo presidente da ABI, Barbosa Lima Sobrinho, ele também pai de jornalista. Defasados ou atuais, mais participantes ou não, somos, família das afinidades do sentimento jornalístico, o recorte de uma só e imutável verdade: como o ser humano, queremos e discutimos liberdade. Há exatos noventa anos. Com a vivência acumulada que nos permite supor simbólicamente permanentes, por ideal absoluto, insistimos na liberdade - assunto que é notícia atual em plena discussão, democrática, na casa de representação popular e na sociedade, de mais uma proposta de lei de imprensa. A nossa já foi proposta - e aceita - pela história. André Motta Lima
No início era o adjetivo no lugar do verbo. Opinião também era informação, sem as culpas impostas pelas ideologias de regras jornalísticas capazes de confundir a objetividade do porquê, das causas e efeitos, com a suposta imparcialidade do factual. É assim, parcialmente, que se escreve a história, primos irmãos que somos, nós jornalistas, dos historiadores. Tratar dos 90 anos da Associação Brasileira de Imprensa é falar da própria história do jornalismo no país, com a compreensão do peso da versão sobre os fatos que viram notícia. Imprimimos a versão de Edmar Morel, em livro esgotado, vencedor de concurso da própria entidade e publicado em 1985. Versão de um brilhante repórter dos tempos da emoção participante - que, talvez por isso mesmo, incorpora na narrativa a clara objetividade da opinião assumida. Procuramos, portanto, outras versões em colaboradores e a eles agradecemos a participação. Pelas próprias origens do jornalismo que se praticava quando de sua fundação, a cultura da ABI é a versão da liberdade de imprensa amalgamada com a possibilidade da emissão de opiniões conflitantes. Nossa versão, até hoje, difere da liberdade de impressão. Queremos a responsabilidade ética para poder ser coerente com a comunhão da
Departamento de Intercâmbio e Divulgação Associação Brasileira de Imprensa
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Jornal da ABI
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CONSTRUÍDOS COM Barbosa ESFORÇO DO POVO, Lima DEFENDEMOS A NAÇÃO Sobrinho Discurso na solenidade dos 90 anos, em 7 de abril de 1998
Neste aniversário de 90 anos da Associação Brasileira de Imprensa, não posso deixar de recordar o momento em que ingressei na ABI, convidado por um grande caricaturista que era o Raul Pederneiras, presidente da entidade. Foi no início do ano de 1921, quando eu cheguei ao Rio de Janeiro, e pouco tempo depois Pederneiras me convidava para ser presidente da Associação Brasileira de Imprensa, talvez pela minha atividade no Jornal do Brasil como representante na Câmara dos Deputados e, depois, pelos editoriais de que eu fui incumbido. Nessa ocasião eu tinha a idéia de que a Associação Brasileira de Imprensa fosse uma grande instituição. Mas a minha decepção foi maior pelos aspectos materiais, quando Raul Pederneiras me levou à sede da Associação Brasileira de Imprensa, que funcionava naquela ocasião no 2º andar da rua Primeiro de Março. Foi uma batalha que eu tive depois que travar para conseguir efetivar a doação do terreno que, quando da demolição da área do Morro do Castelo, tinha se reservado para a Associação Brasileira de Imprensa. Quando eu fui me dirigir a uma autoridade para que, de certa maneira, fosse autorizada à Associação Brasileira de Imprensa usar e construir um prédio naquele terreno, a resposta foi a de que não era possível deferir o meu requerimento, uma vez que havia três associações de imprensa no Rio de Janeiro: a Associação Brasileira de Imprensa, a Associação da Imprensa Brasileira, que nós chamávamos de invertida, e o Clube de Imprensa, que era uma instituição de grande significação naquele momento pelos elementos com que se compunha. Mas quando me disseram que realmente havia uma possibilidade de uma competição, ou pelo menos de uma contestação do direito da Associação Brasileira de Imprensa, eu achei que a primeira providência a tomar seria a de procurar os representantes das outras entidades para que eles concordassem que o terreno fosse doado à Associação Brasileira de Imprensa. Só que isso não era possível sem que eu próprio renunciasse à presidência da Associação Brasileira de Imprensa, o que eu não tive dúvida em fazer, desde que eles também renunciassem à presidência do Clube de Imprensa e à presidência da Associação da Imprensa Brasileira, para que todos nos congregássemos
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Especial 90 anos
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Acima, Barbosa Lima Sobrinho(de terno branco,sentado) no Morro da Urca, com seus colegas de diretoria, pouco antes de renunciar, em 1931,para unificar a ABI. Abaixo, novamente presidente, aos 102 anos, no ato de aniversário, entre Mário Barata e Fernando Segismundo, vendo-se ainda,ao fundo, seu filho Fernando Barbosa Lima.
aqui, na construção de uma grande sede para a Associação Brasileira de Imprensa, que tinha direito a isso, por ser de todas as entidades a mais antiga. Desse modo, com a renúncia dos três presidentes, foi possível que a Associação Brasileira de Imprensa pudesse dispor desse terreno na área do Morro do Castelo. E, graças a isso, com a renúncia do presidente da Associação da Imprensa Brasileira, foi possível depois a construção desse prédio e a posse dele para que servisse à Associação Brasileira de Imprensa, como entidade mais antiga da reunião dos jornalistas brasileiros. Quero dar essa explicação para que se veja como de fato a reunião das três entidades propiciou que elegêssemos o meu candidato à presidência da Associação Brasileira de Imprensa, que foi Herbert Moses (a quem coube realmente tomar todas as providências depois para a construção do prédio). Contamos com a boa vontade da prefeitura do Distrito Federal, que forneceu, no período de Getúlio Vargas, todos os recursos necessários à construção desse prédio, que na verdade não custou nada a ○
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comunhão dos jornalistas brasileiros. Foi construído todo ele com reservas autorizadas pelo presidente Getúlio Vargas. Esse ligeiro histórico que estou fazendo é para mostrar como realmente a Associação Brasileira de Imprensa representa uma série de lutas, de trabalhos, de esforços até chegarmos ao momento atual. Defender as instituições brasileiras no momento em que elas não estão sendo levadas a sério pelo governo: é nesse trabalho que estamos empenhados aqui na Associação Brasileira de Imprensa, para, de certa maneira, se fazer justiça aos jornalistas brasileiros, se fazer justiça à história tradicional da nação brasileira, desse esforço imenso para construir alguma coisa nesse país à custa do auxílio, da cooperação e, muitas vezes, do sacrifício de todos os cidadãos brasileiros. Não tenho outras palavras, nesse momento, do que agradecer a presença de todos os que aqui se acham, porque acho que todos têm compreendido que a Associação Brasileira de Imprensa, no momento atual, é um baluarte realmente em defesa das instituições brasileiras, para que elas representem de fato a tradição do Brasil, o respeito do Brasil às grandes normas de sua orientação e de sua atuação. Eu agradeço a todos a presença e quero dizer que estou aqui, nesse momento, já numa idade mais do que avançada, para cumprir o dever de presidente dessa Casa no momento em que ela comemora 90 anos de luta, de serviço e, sobretudo, de esforço em benefício da prosperidade do Brasil.
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A primeira notícia da fundação, publicada em O Paiz, nomeia uma diretoria diferente da consagrada em outros documentos. Mas se faltou exatidão na divulgação do fato, sobrou entrosamento com a realidade do momento histórico. Uma das primeiras associações criadas no Brasil, a dos jornalistas nasceu ajustada a seu tempo.
NA CRIAÇÃO, O PURO RETRATO DA REALIDADE repúdio no Segundo Congresso Operário realizado no ano anterior. A legislação A ABI completou em abril noventa punitiva, no entanto, não impediu que anos de existência. Situar o momento se expandissem as lutas sindicais contra histórico de seu surgimento, fruto da a indiferença patronal, inclusive com a abnegação de seus fundadores, multiplicação de jornais representativos jornalistas solidários e conscientes de das categorias profissionais em defesa seu papel social, é o objetivo dessas de direitos já alcançados em outras linhas. As circunstâncias e as influências partes do mundo onde as indústrias que envolveram aquele ano distante, se proliferavam. Os “dois brasis” que seriam não explicam as razões que levaram o pequeno mas determinado grupo de consagrados pelo geógrafo Pierre profissionais da imprensa a criar uma Monbeig, anos mais tarde, encontravamAssociação de Imprensa, primeiro nome se bem visíveis ao observador, nessa da entidade, oferecem elementos para se primeira década do século que prometia progresso à humanidade. Governava o compreender a época. O Brasil do ano de 1908 era um país país o mineiro Afonso Pena, depois de que vivia a contradição de ser moderno três mandatos sucessivos de presidentes sem abrir mão de seu atraso estrutural, a gosto dos interesses da oligarquia tocado por uma elite que ansiava pelos paulista. Mas a administração de Afonso benefícios do progresso material embora Pena, embora apoiada pelos paulistas, temerosa diante do novo. Mas o Brasil não fortaleceu como era de se esperar o desse início de século era também uma setor cafeeiro. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ O sociedade que se presidente e seu modificava ministério “jardim independente da de infância”, vontade dos formado por conservadores. E políticos sem isso ocorria em grande expressão, razão de uma não satisfizeram dinâmica que fez do os apetites dos contingente de g r u p o s i m i g r a n t e s oligárquicos, pelo europeus um fator ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ menos na medida de impulso das lutas operárias, que já preocupavam o em que desejavam, e tampouco mudaram o panorama do país. Isto talvez explique patronato da época. A criação de uma entidade os arranjos que os grandes estados, São associativa de defesa da liberdade de Paulo e Minas, acertaram com vistas a imprensa foi uma construção histórica, repartir o domínio político da República. pois não nasceu com este objetivo. Na Assim, em 1913 surge o Pacto de Ouro verdade, inscrevia-se no contexto de Fino, o qual instituiu a conhecida política expansão do mutualismo, movimento que do “café com leite”. Ao lado dessa medíocre gestão, deu sentido aos primeiros órgãos coletivos de defesa dos trabalhadores, porém, surgia - em paralelo a grande significativamente representado nos política - um conjunto de forças sociais círculos sindicais, onde cresciam os e políticas novas, ainda que marginais órgãos de classe irmanados, todos, em no jogo político mais geral. É neste torno de demandas que começavam a contexto que se dá a criação da ABI. Ela agitar o cenário de uma república se insere no outro Brasil que busca uma oligárquica. Em razão de inúmeros casos identidade em meio aos processos de de agitação ocorridos no início deste exclusão permanente das forças século, fez-se a Lei de Residência de detentoras do poder econômico e 1902. Com ela tornava-se mais fácil a político. Entre a resistência dos grupos deportação sumária de estrangeiros conservadores e o entusiasmo de forças envolvidos em movimentos de rua, em sociais dispostas a participar dos decisórios, ganhava geral de cunho reivindicativo, mas para processos as autoridades arrolados como consistência a idéia de que o progresso não podia prescindir das instituições “arruaças”. Aliás, desde 1893 era costume das democráticas e representativas da autoridades expulsar operários por sociedade civil. Era a tese dos motivos políticos. Esta prática acabou “industrialistas” em seus debates com transformando-se em lei em 1913, a os “agraristas”. Burguesia e latifúndio famigerada Lei Adolfo Gordo, motivo de disputavam a hegemonia política num
país onde a contradição entre capital e trabalho ainda não assumira o papel principal. O mutualismo está presente nos primeiros tempos da ABI, pois seu objetivo consistia em criar e manter uma caixa de pensões e auxílios para os seus associados e familiares. A ausência de uma política pública voltada para o amparo de ○ ○ ○ ○ ○ trabalhadores por parte do Estado obrigava as e n t i d a d e s classistas a desempenhar esse p a p e l assistencialista. Muito embora surgisse com o intuito de proporcionar aos seus membros o ○ ○ ○ ○ ○ respaldo até então inexistente, a entidade nasceu com poucos adeptos, em 7 de abril de 1908. Tirando o jornal O Paiz, os demais simplesmente ignoraram a Associação de Imprensa, fundada por oito profissionais, sendo a metade deles do jornal aludido, onde, por sinal, ocorreu a assembléia de fundação da entidade, que em seguida, 1911, passaria a se chamar de Associação de Imprensa dos Estados Unidos do Brasil e, finalmente, sob a presidência de Belisário de Souza, em 21 de julho de 1915, de ABI. Mas, seu primeiro presidente, Gustavo de Lacerda, repórter de O Paiz, trazia para a entidade um ○ ○ ○ ○ ○ i d e á r i o construído quando estudou na Escola Militar da Praia Vermelha, foco desde os primeiros anos de República das manifestações de insubordinação contra os ○ ○ ○ ○ ○ “casacas”, isto é, os políticos das diversas facções da oligarquia brasileira que detinham os poderes do regime (que nascera para os cadetes da Escola como a possibilidade de implantação da verdadeira res publica). Republicano radical, jacobino e florianista, costumava designar os jornalistas de “proletários intelectuais”, convencido estava de que a luta pela defesa da liberdade de imprensa atendia
Lincoln Abreu Penna
Ela se insere no outro Brasil que busca uma identidade em meio aos processos de exclusão permanente das forças detentoras do poder econômico e político
A criação de uma entidade associativa de defesa da liberdade de imprensa foi uma
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aos interesses das classes exploradas de uma sociedade aristocratizada e excludente, e que trazia o legado de quatro séculos de latifúndio e escravidão. Gustavo de Lacerda foi, antes, um dos fundadores do Partido Socialista Coletivista, de 1902. Este partido produziu uma proposta de legislação trabalhista que viria a ser ponto de referência, mais ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ tarde, para os sindicalistas do Rio de Janeiro e de São Paulo, cidades onde o movimento s i n d i c a l encontrava-se mais bem organizado e atuante. Desta proposta, cabe salientar dois ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ pontos: o segurodoença e um outro tipo de seguro que hoje leva o nome de seguro-desemprego. Neste, participariam, de acordo com a citada proposta, patrões, empregados e o Estado, em partes iguais. Portanto, o primeiro presidente da ABI era um lutador da causa dos trabalhadores, com os quais não só se identificava como era parte integrante de seu universo. É verdade que a defesa de teses bem populares e absolutamente antagônicas àquelas sustentadas pelas elites intelectuais e políticas da época tinha pouca receptividade junto a seus companheiros. Assim, por exemplo, a idéia de transformar a entidade num ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ instrumento de defesa de seus direitos econômicos contava com certa reserva na maioria de seus contemporâneos, pois a grande maioria provinha de famílias bem abastadas. Viam com certo desprezo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ o apelo pelas reivindicações de caráter salarial, justamente para não se assemelharem aos operários das fábricas - em geral imigrantes ou de origem social, quando brasileiros, bem humilde-, num país onde o trabalho ainda era considerado uma atividade pouco enobrecedora em face de sua associação com a escravidão. Para a maior parte dos profissionais que atuavam nos jornais, a
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Gustavo de Lacerda, o fundador, já defendia os seguros salário e desemprego e não contou com muito apoio dos colegas oriundos das elites
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atividade de jornalista não era considerada como uma atividade “trabalhista”. Tratava-se de uma ocupação, nobre por poder informar ao público, meia sacerdotal pois exigia dos jornalistas uma certa abnegação, mas jamais um trabalho no sentido da venda de uma força de trabalho. Era, na verdade, um meio de arranjar prestígio e, invariavelmente, de ingressar na política. Não viviam exclusivamente do jornalismo, de modo que o jornal acabava sendo uma ponte para chegar-se com mais facilidade aos donos do poder e, com isso, angariar favorecimentos futuros. Contudo, o tempo iria demonstrar que a combatividade e a determinação de Gustavo de Lacerda tinham seu fundamento. E a razão viria rápido. Até a época da imprensa artesanal não havia salário. Pagava-se sob a forma de “vales”, remunerações que por vezes levavam meses para serem saldadas. Com a criação dos linotipos, os operários responsáveis pelos textos impressos constituíram seus sindicatos. Os ideais socialistas e anarco-sindicalistas, bastante influentes à época, passaram a comandar a defesa desses trabalhadores. Os jornalistas começaram a perceber que os linotipistas recebiam seus salários regularmente, ao passo que eles, jornalistas, ainda recorriam ao expediente dos “vales”. Em pouco tempo, a consciência profissional da categoria dos jornalistas retoma suas origens do século XIX, quando a imprensa teve um papel
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destacado na defesa de ideais de revoltosos nas diversas manifestações havidas durante o período regencial, principalmente. Destaque semelhante ocorreria posteriormente por ocasião das primeiras lutas sindicais da República, nas quais os jornais operários circulavam com a regularidade possível a apoiar as demandas dos trabalhadores. Assim, a origem histórica da hoje consagrada ABI foi marcada pelo processo de agravamento das contradições da sociedade brasileira, cujo eixo fora marcado pela combinação estrutural de uma economia agroexportadora de base latifundiária e o progresso das relações capitalistas de produção a apontar na direção de uma superação desse quadro a curto prazo, o que se deu parcialmente em 1930. Durante esse período, a ABI foi pouco a pouco integrando-se à problemática nacional de modo a conquistar o respeito de todos os que se encontravam ao lado das causas mais nobres da democracia e das liberdades. Desse modo, acompanhou a primeira eleição competitiva para a presidência da República, a envolver Rui Barbosa e o seu Civilismo e Hermes da Fonseca, o eleito, e o seu Salvacionismo, em 1910, mesmo ano em que ocorreu a Revolta da Chibata liderada pelo marinheiro João Cândido; assistiu ao evoluir do movimento sindical e operário em sua primeira década de existência como órgão de amparo dos jornalistas, até a famosa greve de 1917 em São Paulo; o ecoar distante da Guerra de 1914/18,
de caráter interimperialista, e a Revolução dos sovietes russos de Outubro (calendário Juliano) de 1917. Tanto no quadro nacional quanto no internacional, a conjuntura dos primeiros anos da ABI foi assinalada por reivindicações democráticas, mudanças políticas e conquistas sociais que a tornaram partícipe de uma história das liberdades do homem, independente de seu caráter estritamente nacional, posto que esta condição se afirma também na solidariedade aos pleitos internacionais. Em 1908, os fundadores participantes do ato de criação da Associação de Imprensa - Gustavo de Lacerda, presidente (O Paiz); Francisco Souto, vice-presidente (Correio da Manhã); Alfredo Seabra, tesoureiro ( O Paiz); Luís Honório, primeiro-secretário (Jornal do Brasil); Artur Marques , secretário(Gazeta de Notícias); Noel Batista, procurador (Jornal do Brasil); Belisário de Souza (O Paiz); Amorim Júnior e Mário Galvão do Jornal do Commercio - iniciaram uma trajetória de incomparável êxito em se tratando de uma entidade associativa, cuja seriedade e dedicação, desde essa época até hoje, garantiram a credibilidade junto a opinião pública democrática do país.
A origem histórica da hoje consagrada ABI foi marcada pelo processo de agravamento das contradições da sociedade brasileira... pouco a pouco foi integrando-se à problemática nacional de modo a conquistar o respeito de todos os que se encontravam ao lado das causas mais nobres da democracia e das liberdades
Lincoln Abreu Pena é professor titular de história do Brasil da Universidade Severino Sombra (USS) e professor aposentado do IFCS/UFRJ. ○
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Anuncio 1/2 EDITORA ABRIL
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Jornal da ABI
A TRINCHEIRA DA LIBERDADE
GUSTAVO DE LACERDA, O FUNDADOR, SUA VIDA E SUA OBRA
por Edmar Morel
História da ABI
“A sala onde se realizou a hoje memorável reunião foi por mim mandada limpar e arrumar, a pedido de Gustavo. “Aclamado Gustavo de Lacerda presidente, depois de uma exposição sucinta dos objetivos da reunião e da leitura das bases do estatuto escritas por ele. À medida que Gustavo declinava nomes para a diretoria eram os presentes considerados empossados, embora em caráter provisório. “A predicação de Gustavo não encontrou eco. Tanto assim que, no ato da
Manoel Lourenço de Magalhães, apesar de não ter participado da cerimônia, relatou o acontecimento, com maiores detalhes, num opúsculo: “Foi na primeira sala do terceiro andar do edifício de O Paiz, sede da Caixa Beneficente dos Empregados do mesmo jornal, da qual era eu secretário, edifício então apontado como uma das belezas arquitetônicas da época, o qual se erguia à esquina da rua Sete de Setembro e avenida Rio Branco, essa, outrora, denominada
“Está fundada nesta capital, a contar de 7 do corrente (abril de 1908), a Associação de Imprensa, tendo por fins principais: “Criar e manter uma caixa de pensões e auxílios para os sócios e suas famílias; manter um serviço de assistência médica e farmacêutica; instalar o Retiro da Imprensa, com enfermaria e residência para velhos e enfermos; manter, no centro da cidade, a sede social, com biblioteca, salões de conferência e diversões, etc.; habilitar, por meio de título de capacidade intelectual e moral, o pretendente a colocação no jornalismo; prestar pública homenagem a Gutenberg, o fundador da imprensa, por meio de uma festa anual, para a qual procurará associar o governo da República. “A Associação de Imprensa publicará um anuário da mesma, com o nome e idade de todos os sócios, detalhes de todos os interesses sobre artes, ciências e letras, e instituirá a carteira de jornalista, como atestado de identidade e recomendação do portador. A primeira diretoria compõe-se dos srs. Gustavo de Lacerda (presidente), Francisco Souto, Luís Honório, Artur Marques, Alfredo Seabra e Alberico Doemon. “Da administração farão parte, ainda, as comissões que serão nomeadas brevemente e são as seguintes: “De organização do anuário, de propaganda, de festa, de economia e finanças, de auxílio e assistência.” Esta foi a nota publicada em O Paiz, na sua edição de 9 de abril de 1908, primeira página, noticiando a fundação da ABI. Muitos jornais não tomaram conhecimento do fato.
Manhã; Alfredo Seabra, tesoureiro, de O Paiz; Luís Honório, primeiro-secretário, do Jornal do Brasil; Artur Marques, secretário, da Gazeta de Notícias; Noel Batista, procurador, do Jornal do Brasil; Belisário de Souza, de O Paiz; Amorim Júnior, de O Paiz; Mário Galvão, do Jornal do Commercio.” Na última década do século, no apogeu da chamada boêmia literária, quando Bilac, João do Rio, Emílio de Menezes, Patrocínio, Paula Ney, Artur de Azevedo, Guimarães Passos, Bastos Tigre e outros pontificavam nos cafés Papagaio, Java e Paris e nas confeitarias Colombo e Pascoal, Gustavo de Lacerda, de há muito imbuído de idéias socialistas, vivia inteiramente afastado das rodinhas literárias, entregue de corpo e alma ao jornalismo, profissão que exerceu como um sacerdócio, embora explorado torpemente. Brito Broca, em A vida literária no Brasil - 1900, descrevendo os salões, os cafés e portas de livrarias, não menciona uma só vez o nome de Gustavo como seu freqüentador. Modesto por índole e por origem, era tido como filho de Manoel Batista de Oliveira e Maria das Dores Lacerda, nascido na cidade de Desterro, atual Florianópolis, a 21 de fevereiro de 1853, data que serviu para ser comemorado, erroneamente, o seu primeiro centenário de nascimento. Começa que o seu primitivo nome não era Gustavo de Lacerda e sim “Gustavo Adolfo Fraga, filho de pais incógnitos, natural da província de Santa Catarina, nascido a 18 de maio de 1854, cor parda, cabelos crespos, olhos pardos, solteiro”. É o que existe no Arquivo do Exército.
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O Grande Ausente Este livro é dedicado a memória de Pedro Motta Lima. Ele encontrou a morte de maneira trágica no exílio, num desastre aéreo, em 1967, na Tchecoslováquia. Era o redator brasileiro da Revista Internacional, em Praga. Muito aprendi com Pedro Motta Lima a amar a Liberdade. Era um líder comunista que, com seu entusiasmo, irradiava fé. Não entendo por que até hoje seus despojos não foram trasladados para o Brasil, terra que ele tanto amou e na qual tanto sofreu por ter idéias, por ser um homem digno e patriota como poucos. Suas cinzas estão num mausoléu existente numa dependência da Revista Internacional. Tive a honra de ser seu amigo. Considerava-me como um filho. NR: Por decisão da família, Pedro Motta Lima ficou no solo de Praga, cidade que o acolheu no exílio e onde ele foi feliz. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
fundação da ABI, ele contou apenas com a presença de oito companheiros, dos quais quatro, com ele, eram do próprio O Paiz, como se vê dos nomes a seguir: Francisco Souto, vice-presidente, do Correio da
Central, que teve lugar a reunião onde se fundou a Associação Brasileira de Imprensa, constante ideal acalentado por Gustavo de Lacerda que, como sabeis, era repórter do aludido jornal junto à Prefeitura.
"CASSADO MAS NÃO C ASTRADO", SE DEFINIA V OVÔ CASTRADO", VO Marco Morel Acompanhei de perto os momentos em que meu avô Edmar Morel acabou de escrever o livro A Trincheira da Liberdade – História da ABI e não canso de lembrar como ele realizou o trabalho com a seriedade, rigor na pesquisa, empolgação e paixão de mudar o mundo que sempre caracterizaram suas atividades. O livro foi fruto, em primeiro lugar, da convivência e militância do autor na ABI, desde 1948. A luta pela liberdade de expressão, pelos direitos humanos, pela defesa da soberania nacional e pela radicalidade dos ideais democráticos na construção de uma sociedade socialmente mais justa era a marca desta paixão e a ABI o espaço privilegiado onde ele atuava. A ABI também como lugar de sociabilidade, de encontros, de bate papo, discussões que fazem parte desta teia cotidiana que é fazer política e estar no mundo. As famosas “rodinhas” com Eneida, Álvarus, Jota Efegê; com calejados e competentes militantes comunistas como Antônio Mesplê, Pedro Motta Lima, Gumercindo Cabral; escritores que freqüentavam a
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os grandes jornais fechavam as portas para ele e outros grandes jornalistas numa demonstração de totalitarismo político, que Edmar Morel começou a fazer as pesquisas que resultaram no livro sobre a ABI - que recebeu o Prêmio Gustavo de Lacerda, instituído pela Casa, como a melhor monografia sobre o assunto no difícil ano de 1968. Nos anos seguintes, até 1984, ele elaborou pacientemente a pesquisa e a redação do texto, quando sobrava tempo na busca pelo ganha-pão, pois a aposentadoria de jornalista era insignificante e não dava para viver. Sem nenhuma propriedade privada além dos livros e de um fusca usado, Edmar faleceu no Rio de Janeiro aos 77 anos, nas vésperas da eleição de 15 de novembro de 1989 , abatido pelas doenças mas ainda guardando a mesma têmpera do “foca” que viera do Ceará cavar um lugar ao sol no Rio de Janeiro.
Cícero - o santo do Juazeiro (1944) que representa a primeira visão crítica e desmistificadora publicada em livro sobre o polêmico sacerdote Sem falar do Dragão do mar - o jangadeiro da Abolição (1949) que coloca de maneira instigante a presença e participação de setores da sociedade brasileira no processo abolicionista, que não é visto apenas como “elitista”. O famoso A Revolta da Chibata (1959), ainda hoje a mais completa obra sobre a revolta dos marinheiros em 1910 liderada por João Cândido e que acabou com os castigos corporais na Marinha - livro que lhe custou a cassação dos direitos políticos e perseguição durante a ditadura militar a partir de 1964. Sem recuar, na bravura lúcida e irredutível que o caracterizava, publica no primeiro aniversário da quartelada O golpe começou em Washington, título sugerido pelo editor Enio Silveira, onde mostra de maneira clara as ramificações internacionais e os personagens históricos brasileiros que urdiram e executaram o referido movimento. Cassado mas não castrado, como costumava brincar (era sempre brincalhão, de bom humor), foi neste contexto, onde
entidade, como Carlos Drummond de Andrade, Guilherme Figueiredo, Raimundo Magalhães Júnior e tantos outros. Edmar, nos anos 40 e 50, era assim uma espécie de “repórter das multidões”, cujas reportagens tinham a característica (dentro dos limites da imprensa que se transformava em indústria cultural) de tocar em temas candentes, de protestos e insatisfações populares, de denúncias corajosas, de revelações que empolgavam os leitores, onde a sensibilidade social aliava-se ao gosto pela aventura e pelas descobertas. Foi assim nos “Diários Associados”, onde foi o repórter preferido de Assis Chateabriand entre 1938 e 1947; foi assim na Última Hora do qual foi um dos fundadores ao lado de Samuel Wainer em 1952. Da mesma forma na imprensa oposicionista, de esquerda, nacionalista, como Diretrizes, Panfleto e O Semanário, este último fechado pelo golpe militar de 1964. Mas o vovô Morel, como era chamado pelos netos, prolongou e aprofundou sua atividade de jornalista escrevendo livros que se tornaram pioneiros na historiografia. Destacam-se Padre ○
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Marco Morel, filho e neto de jornalistas, é jornalista e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
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Todos os que escrevem sobre Gustavo apontam-no como combatente no Rio Grande do Sul contra os fanáticos protestante alemães conhecidos por Muckers. Gustavo Adolfo Fraga entrou no Exército a 8 de março de 1870, quando assentou praça voluntariamente no Depósito de Instrução de Desterro, com destino ao 13.º Batalhão de Infantaria, sendo desligado da tropa a 10 de agosto de 1881, no posto de primeiro-sargento, por conclusão de tempo. A guerra dos Muckers ocorreu entre 1872 e 1874. No Arquivo no Exército nada há que prove a participação de Gustavo na campanha contra os Muckers, os quais, na cidade de São Leopoldo, distante uma hora de Porto Alegre, passaram a dar trabalho à polícia no início de 1872. Os livros Os Muckers, do padre Ambrósio Schupp, e Fanáticos de Anjor Ãvila da Luz, não registram a presença de Gustavo no cenário da luta. Na certidão de assentamentos consta que passou a usar o nome de Gustavo de Lacerda a partir de 20 de julho de 1876, portanto com 22 anos, por decisão de portaria do Ministério do Exército, que deu permissão para suprimir o nome Adolfo e o sobrenome Fraga, assinando-se, dali por diante, Gustavo de Lacerda. Bom aluno em francês e português, foi, sem dúvida, o mais indisciplinado de todos os soldados do Exército do Império. Graças à boa vontade do cel. Renato Neves Gonçalves Pereira, diretor do Arquivo do Exército, na época desta pesquisa, o autor conseguiu as anotações sobre o jovem Gustavo, entre as quais um fato curioso: burlando a vigilância, Gustavo de Lacerda assentou praça como menor. Tinha 16 anos ao ingressar na caserna. É o que informa a certidão, com dados colhidos nos acervos do 13.º e 18.º Batalhão de Infantaria, sediado em Desterro. Diz: “PrimeiroSargento 86, Gustavo Adolfo Fraga , filho de pais incógnitos, com 55 polegadas de altura. Foi transferido para o 18.º Batalhão por ordem do presidente da província, transmitida em ofício de seu ajudante-deordens sob o número 912. Foi promovido a cabo-de-esquadra em 23 de janeiro de 1871, a furriel a 15 de março, a segundo-sargento a 15 de julho e a primeiro-sargento em 15 de agosto.” Embarcou com seu batalhão para o Rio no mês de setembro daquele ano e, em outubro, ainda com a tropa, desceu na Bahia. Até 5 de outubro de 1871, quando saltou na cidade de Salvador, tinha magnífico comportamento. Depois caiu na indisciplina, sofrendo várias prisões, muitas das quais por proteger soldados. Os recrutas, por sua vez, não levavam a sério a autoridade de um sargento com cara de menino, bastante franzino. Suas prisões foram muitas, nenhuma, porém, por motivo grave. Diz o documento: “Preso por apresentar uma praça pedida para um funeral em estado de relaxação.” “Preso por deixar de apresentar o número de praças completo pedido para a guarnição, tudo no referido mês de fevereiro de 1872.” “Cadeia por ter apresentado um soldado na parada da guarnição sem a bainha do sabre e baioneta, e apresentando-se, também, sem ○
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30.000 cópias. A Gazetinha era impressa na tipografia da rua São José, 14, e no quarto número comunicava que abriria escritório em plena rua do Ouvidor. Não citava os nomes dos seus diretores. Fazia, apenas, uma vaga referência a Artur Azevedo: “A peça é de autoria do nosso companheiro Artur Azevedo.” Sentia-se nas páginas da Gazetinha a influência do teatrólogo maranhense. O jornal, com quatro páginas, formato tablóide, dava destaque ao noticiário de teatro. Publicava, também, um folhetim de sua autoria. O segundo período teve a direção de Henrique Stepla e era destituído de interesse. Ernesto Sena, considerado o maior repórter da época, trabalhava no Jornal do Commercio. Jamais Gustavo poderia ter trabalhado com Artur Azevedo, na Gazetinha. No ano em que o jornal começou a circular Gustavo matriculava-se na Escola Militar de Santa Catarina, obtendo vaga na Infantaria. Foi aprovado plenamente, em português com grau 8, em história universal, com grau 6, em francês, com o grau 6, simplesmente, em geografia, com grau 5. Marchou com a ○ ○ ○ ○ ○ ○ escola para Pedras Brancas a 22 de dezembro de 1880, fim de ali fazer exercícios práticos. Neste tempo saiu a Gazetinha, no Rio. O que existe de real é que Gustavo, como praça de pré, sargento e aluno de duas escolas militares, estava nas fileiras do Exército a partir de 8 de março de 1870, ainda menor, sendo ○ ○ ○ ○ ○ ○ desligado da caserna a 10 de agosto de 1881. O rebelde Gustavo não recebeu o soldo e gratificação a que tinha direito, relativos ao último mês que passou na tropa. Gustavo não tinha maiores horizontes em Desterro, cuja província, na época em que ele servia ao Exército, era presidida pelo major Alfredo d’Escragnolle Taunay, que viria a ser o historiador e o romancista de Inocência. A capital de Santa Catarina “possuía 8 praças, 47 ruas, 4 travessas e 8 becos, com 8 igrejas e capelas, cerca de 1.750 prédios urbanos, dos quais 136 de sobrados”. É certo, também, fora de qualquer dúvida, que Gustavo recebeu cuidadosa educação primária, levando em conta que Desterro era uma cidade das mais atrasadas do Brasil, com poucas escolas. Daí a facilidade com que fez carreira na tropa, obtendo as divisas de primeiro-sargento, com 15 meses de caserna. O diabo era o comportamento... Não existe documentação que assinale a presença de Gustavo em Santos, a partir do seu desligamento do Exército, em 1881. É quase certo, contudo, que tenha estado no Rio Grande do Sul, onde fez largo círculo de relações. O fato é que Lacerda, a 1.º de janeiro de 1884, fez circular na corte o seu jornal Meio Dia. Era impresso na tipografia da rua 7 de Setembro, 65, onde funcionava a
Gustavo Adolfo Fraga, filho de pais incógnitos, natural da Província de Santa Catarina, nascido a 18 de maio de 1854... aos 22 anos passou a usar o nome de Gustavo de Lacerda ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
o seu respectivo.” “Foi considerado maior (a 18 de maio de 1872), visto sujeitar-se à primeira condição do Aviso do Ministério da Guerra, obrigando-se por 6 anos, a contar do dia em que completou 18 anos.” Seguiram-se outras prisões, todas por indisciplina, lendo-se “Preso por ter faltado ao toque de sargento para a ordem”. “Preso por não ter recolhido ao xadrez um soldado que se achava preso.” “Preso por ter ido acompanhar um primeiro-sargento preso e abandoná-lo na casa de uma meretriz.” “Preso por ter extraviado o seu armamento e pedir emprestado o de um soldado.” “Preso por não ter ido ao hospital ver as altas.” Da sua índole pacífica falam os próprios assentamentos. Durante os longos anos que passou na tropa foi detido uma só vez por agressão, quando deu uns pescoções num soldado, no Natal de 1872. Acontece que Gustavo tinha grande vivacidade e, por possuir conhecimentos gerais, era estimado pelos seus superiores, a despeito da sua ojeriza pela Ordem e Progresso ... Veio, finalmente, para a corte, a fim de estudar na Escola de Tiro de Campo Grande, a 16 de novembro de 1876. Tendo sido reprovado no exame para instrutor de tiros, ficou engajado, com direito a repetir o primeiro ano. Em meio dos estudos, pediu transferência para a Escola Militar de Desterro e foi atendido. Trabalhou como amanuense no Comando da Brigada e Fronteira de Missões, “sendo louvado por sua conduta tanto civil como militar que mostrou no período do referido emprego”. Na nova vida, sem corneta, sem tambor, Gustavo se deu bem, tanto que chegou a trabalhar na secretaria do batalhão, recebendo elogios. Durou pouco nessa função, voltando ao posto de amanuense a 28 de fevereiro de 1876, quando, para atender a dispositivos militares, fez exame prático de arma de Infantaria, sendo aprovado. Como escrevente teve ocasião de aprender princípios de contabilidade que muito serviram na sua propalada carreira de guarda-livros improvisado, na cidade de Santos. Apresentam-no sempre ao lado de Artur Azevedo, na fundação da Gazetinha, cujo primeiro número saiu a 29 de novembro de 1880, anunciando: “Não temos programa. O leitor que faça depois de ler as nossas colunas. Oferecemos hoje 30.000 exemplares gratuitamente e de amanhã em diante o exemplar custará um vintém.” Deve haver exagero. A corte, em 1880, não tinha condições de alfabetização para nenhum jornal tirar
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redação. Custava o exemplar dois vinténs. Assinatura anual, dez mil-réis. Seis meses, seis mil-réis. O seu nome figurava no cabeçalho. Não poderia fugir ao figurino, e publicava o Segredo do Tirã, de Xavier de Montepin, autor de muitos folhetins que tinham feito sucesso. O Jornal do Commercio noticiou o aparecimento do Meio Dia como de “propriedade de Gustavo de Lacerda e redigido por moços esperançosos”. Também a Gazeta de Notícias, Folha Nova, Brasil, Diário do Brasil e Gazeta da Tarde registraram o surgimento do Meio Dia. O primeiro número esgotou-se rapidamente, “a despeito da chuva que começou anteontem às tantas horas do dia, atravessou toda a noite com uma impertinência de credor obstinado, encheu de lama e de tédio todo o dia de ontem e não sabemos se continuará até hoje. “Não obstante este mau tempo com que se emporcalhou o ano-bom, esgotouse inteiramente a edição da nossa folha. Alguns patifes de ragazzionos levaram mesmo a sua deliciosa velhacaria comercial ao ponto de vender o Meio Dia, em Botafogo e em outros países, a tostão o n ú m e r o ! ○ ○ ○ ○ ○ ○ Encantadores tratantes!” Na edição seguinte, em suelto, Meio Dia estranha que, tendo convidado todos os jornais da cidade para uma reunião na redação, apenas tenham aparecido os representantes da Gazeta de Notícias, Gazeta da Tarde, Cosmopolita e O Mequetrefe, ○ ○ ○ ○ ○ ○ acrescentando: “Os demais colegas, ou porque não receberam a tempo o convite que acabamos de reproduzir, ou porque chovia a potes, ou ainda por outros motivos que nos proibimos discretamente indagar neste momento de despreocupação de alma e de repouso de espírito, não compareceram à nossa festa. “O Meio Dia tem a felicidade de colocar a solidariedade coletiva acima de todo o ponto de vista crítico, de todo o interesse pessoal, subjetivo e egoísta, e para todo e qualquer posto em que se lhe agite um lenço palpitante de simpatia, seja qual for a sua colocação distintiva, ela voltará constantemente os olhos no eterno reconhecimento saudoso de uma consolação ou de um impulso.” Anunciava a criação da “Seção Musicana”: “As estações líricas fazem-se de ano a ano, mas os concertos, as festas de igreja, operetas e as musicatas de todo o país, inclusive as que pelas ruas andam a fazer os artistas ambulantes de nacionalidades diversas, dão assunto de sobra para prender a atenção dos nossos inúmeros leitores. A crítica musical cá de casa não se há de jamais pautar pelos moldes convencionais de todas quantas críticas soem (reparem bem neste soem, é clássico e fora do vulgar) aparecer nas colunas dos contemporâneos da imprensa jornalística. Anda por aí muito pianista de meia-tigela a
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Mestiço, sem maiores recursos financeiros, conseguiu fundar um jornal e ter entre os seus colaboradores nomes de projeção
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publicar umas senhoras polcas, umas senhoras valsas, uma família inteira de schotischsredovas, mazurcas, quadrilhas, modinhas, tango e fantasias-capricho. Esses apaixonados menestréis, assassinos da profissão, que sem dó nem piedade nos cravam o rombudo punhal de melomania bem no âmago (façam o favor de apreciar este âmago) do nosso tímpano, estragandonos o bojo harmônico da trompa de Eustáquio, serão recebidos neste tugúrio hospitaleiro com todas as honras de estilo: a toque de caixa.” A linguagem, até certo ponto, era pitoresca. Quando havia necessidade de causticar homens públicos, responsáveis por gastos supérfluos, Gustavo não temia conseqüências. Criticando o esbanjamento de dinheiro no Ministério da Guerra, escreveu: “As folhas de ontem publicaram uma daquelas portarias que nos fazem arfar o peito de comoção por seis meses. Esta portaria podia muito bem passar sem comentários, se o nosso repórter, que tem um faro sensibilíssimo, não nos houvesse feito uma exposição clara e expressiva dos fatos que o motivaram. “Contou-nos ele, e provou-o com vários retalhos de fazendas finas, que os diretores das repartições a cargo do Ministério da Guerra, em lugar de mandarem comprar canetas superiores, de ébano ou cantchu, mandavam comprar vestidos de gorgorão, guarnecidos de rendas da Inglaterra. Em vez de pedirem aos fornecedores resmas de papel almaço, pediam desbragadamente peças de cetim cor-de-rosa. Em vez de bons tinteiros de cristal, compravam gravatas de seda, frousca, cor de morango esmagado. Havia nas repartições longos cortinados de reps de Bruxelas, vasinhos de cristal de Baccarat, com lavores delicadíssimos de plantas raras, para violetas e para heliotrópios; jarras da Boêmia, trasfloradas de formas extravagantes, representando golfinhos e monstros das idades primitivas, animais pré-adamitas, umbráticos, fantasias estupendas, em alto-relevo, coloridos a matizes e vasos chineses, para ramalhetes monumentais de camélias rubras e magnólias de uma brancura de neves alpinas; estatuetas de diaspório caprichosíssimas, em atitudes bíblicas, pequenas figuras de gesso e terracota, modelados por Grévin, representando mulheres vaporosas, de linhas suaves, corpos que lembram colibris e borboletas, ovejantes, suspensas por arames tenuíssimos, imperceptíveis. “De uma feita, o Sr. Conselheiro Rodrigues Júnior foi visitar uma das repartições a cargo do seu Mistério e ficou a um tempo deslumbrado e indignado. Achou-se em um vasto salão atapetado de soberbos gobelinos; paredes forradas de veludo de retrecht cor de pescoço de faisão, consteladas de espelhos venezianos e um cristal diamantino e ofuscante; a mobília era do mais casto erable cor de gema de ovo e leite, com incrustrações de paurosa e marfim amarelo, as jardineiras eram de puríssima porcelana do Japão, com pés delgados como fios telegráficos. Por toda parte se rolava um perfume deliciante de essência de couro da Rússia de Atkinson. Delicioso, inebriante, escandaloso. “O Sr. Ministro concluiu pelo aspecto ○
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lá vai o joio para o poder. Ainda bem! O Imperador, com seu processo maquiavélico de destruir o Partido Republicano, não faz mais do que expurgá-lo das excressências viciosas; O joio sai, mas o trigo vai ficando mais desimpedido e mais limpo. É desta depuração que há de surgir a organização republicana. Esperemos. “Além disso, quais são os meios de combate empregados até hoje pelos partidos? Não há programas, não há princípios, não há união, não há idéias - há chapas. O Ministério arrasta-nos para um pélago insondável. O país caminha a passos agigantados para a bancarrota! Essa situação é a mais desastrada que tem ocupado o poder.” Gustavo era mordaz nos comentários: “Consta-nos que S. Ex.ª, o Sr. ministro da Guerra, por portaria de 30 do mês findo, mandou assentar praça no Exército a alguns dos presos que ultimamente se revoltaram na Casa de Detenção e que se acham retidos na Fortaleza de Santa Cruz. Os novos soldados seguirão para as províncias do Pará, Amazonas, Mato Grosso e Rio Grande do Sul, que foram as mesmas escolhidas pelo antecessor. do Sr. Rodrigues Alves para exílio de alguns oficiais antipáticos. A ser exata a notícia, é realmente com uma chave de ouro que o gabinete Lafayette fechou o ano de 1883.” No editorial do lançamento do Meio Dia foi anunciado o Comitê de Redação, formado por Silvestre de Lima, Filinto de Almeida e Antônio Figueira, enquanto o corpo redacional era constituído por Aluísio Azevedo, Valentim Magalhães, Raimundo Correia, Artur de Azevedo, Cardoso de Menezes, Paula Ney, Alencar Araripe, Gonzaga Filho, Silva Araújo, Fontoura Xavier, Lopes Cardoso, Luís Murat e outros, declarando, especificamente, que “estamos autorizados pela sua benevolência a declinar aqui nomes de outros colaboradores: Conselheiro Saldanha da Gama, Dr. Ubaldino Amaral, General Tibúrcio, Pedro Ferreira Viana”. Dos colaboradores de Gustavo, posteriormente, cinco participaram da Academia Brasileira de Letras: Filinto de Almeida, Valentim Magalhães, Artur de Azevedo, Luís Murat e Raimundo Correia. Acusa-se Gustavo de não ter a menor participação no movimento abolicionista, justamente em 1884, quando saiu o Meio Dia e a campanha já estava nas ruas, inflamada pelo verbo de Patrocínio. O artigo publicado na edição de 28 de janeiro daquele ano diz o contrário: “O problema da abolição da escravatura exige que não poupemos esforços para que ele solucione-se com toda a rapidez e, principalmente, com toda a dignidade. "À luz da propaganda abolicionista vitoriosa, à luz dos acontecimentos de todos os dias, tem atualmente o escravo o valor que já teve? Não e não. Esse valor está tão depreciado que os próprios escravocratas, se falam muito, não mais se atrevem a abrir sua bolsa para comprar, à razão de 200$000 que seja, o mais robusto dos ainda em cativeiro.” Comentando as transferências de oficiais do Exército para longínquas províncias, como castigo, fez forte crítica ao governo, afirmando:
FOTO DO gustavo de lacerda
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Somos republicanos, mas não temos compromissos de partido, não obedecemos a nenhum centro e a nenhum clube. A nossa opinião é exclusivamente nossa Gustavo de Lacerda
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Oriente, que anunciava o quilo do produto a 800 réis, Novidades Musicais, de Bucgamann e Guimarães, Cerveja Petrópolis, Curso de Línguas (método Ollendroff) pelo professor Carlos Hoeffer, pequenos avisos dos médicos Valentim Magalhães e Gonzaga Filho. Havia uma publicação do Jornal da Agricultura, em duas colunas, possivelmente permuta. Diga-se que, um ano antes, o atrevido Apulcro de Castro, diretor do pasquim O Corsário, por ter atacado um regimento de cavalaria, foi miseravelmente assassinado, com sete facadas, por um grupo de oficiais do Exército, à porta da chefatura de polícia. Euclides da Cunha, em Os Sertões, focaliza a ação do cel. Moreira César, derrotado pelas hostes de Antônio Conselheiro, em Canudos, ligando o nome do oficial à morte de Apulcro. Definindo a sua posição de republicano, Gustavo escreveu: “Somos republicanos, mas não temos compromissos de partido. Não obedecemos a nenhum centro e a nenhum clube. A nossa opinião é exclusivamente nossa. Trataremos de derrocar, tanto quanto nos for possível, os edifícios das situações monárquicas, não procuraremos destruir nem desmoralizar os partidos políticos porque eles são por si mesmos os principais agentes da própria destruição, quer estejam na posse do poder, como o Liberal, ou na oposição sistemática, como o Conservador. “O Partido Republicano está por organizar, e quase que só tem servido para fornecer maus ministros, maus diplomatas e maus deputados à monarquia. De quando em quando é procurado pelo Imperador e
interior do salão que se achava em um boudoir caprichoso, do mais requintado luxo europeu, e perguntou ao diretor da repartição: “_ Para que é este boudoir? “_ Perdão, Ex.ª, isto não é boudoir, isto é a 2.ª Seção. “_ A 2.ª Seção da Secretaria da Guerra! Com esse luxo? “Assombrado pela afirmativa do diretor, o Sr. Ministro desgalgou-se pelas escadas e enfiou-se no coupé, de esfuziote. No dia imediato publicava-se a seguinte portaria: “_ Convido que haja a maior economia no dispêndio dos dinheiros públicos, chamo a sua atenção para a despesa da verba-expediente da repartição a seu cargo, a qual deve limitar-se ao estritamente necessário, tendo-se em vista a qualidade e não o luxo dos artigos fornecidos.” Uma amostra do nacionalismo caboclo de Gustavo. Dava notícia de pequenas ocorrências policiais, mencionando sempre a nacionalidade do criminoso: português. “Para começar o ano, o português José dos Santos Pereira, estabelecido à rua da Carioca, espancou o nacional José de Oliveira Ramos.” “Depois de ter agredido a Elias Teixeira, na rua Gonçalves Dias, foi preso o português Firmino Alves Pinto Ferreira.” “Por ter provocado desordem, na rua General Câmara e depois de tenaz resistência, foi recolhido ao xadrez o português Narciso Alves." Os melhores anunciantes de Meio Dia foram: Farmácia Bragantina, Café ○
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“A fraqueza que o Ministério revelou diante do conflito que motiva estas transferências e que seria inútil rememorar nesta ocasião, aconselhava-o que procurasse um motivo qualquer para retirarse do poder. Não se podia exigir dele que tivesse a abnegação e a grandeza d’alma de confessar que fora pusilânime ou cúmplice, e que se retirava para que outros melhor o colocassem, mas o que o patriotismo mais indicava aos Ministros era que procurassem um pretexto e saíssem decorosamente. “Governo que usa de uma arma destas, ou que permite que outros o façam, arrisca-se a recuar diante da classe militar justamente ofendida nos seus brios, anima com a sua provocação a indisciplina do Exército. “Ao passo que assim procede, esquece-se de que só ela tem a responsabilidade que agora procura atirar por sobre condutas imaculadas. Um governo nestas condições é um perigo, uma calamidade pública. A obediência militar tem um limite - a honra.” Houve uma crise no jornal, já com boa aceitação pelo público. Demitiu-se o Comitê de Redação, que contava com a solidariedade de quase todos os companheiros. Gustavo, na primeira página, escreveu um artiguete assinado: “Forçado, em começo, a prender-me de preferência à administração desta folha, que na sua iniciação na imprensa foi por mim entregue aos srs. Silvestre de Lima, Antônio Figueira e Filinto de Almeida, cujas aptidões conhece o público que, como eu, faz justiça ao talento desses jornalistas. Menos ocupado, agora, com o que é inteiramente administração e gerência, cabe-me portanto vir tomar ao lado dos distintos moços que até aqui têm redigido a folha o lugar que na qualidade de proprietário me compete. “Para cumprir o programa previamente a mim mesmo imposto precisarei sempre e muito que eles me dispensem os seus poderosos auxílios. E ao assumir a responsabilidade da redação em chefe desta folha conto que os terei sempre ao meu lado.” É o canto do cisne do Meio Dia, que não poupa Sílvio Romero, apontando-o como o advogado de escravocratas e escritor a serviço de causas antinacionais. O Meio Dia foi tragado pelo déficit, que começou com o primeiro número. Não durou um mês. Sempre às voltas com ○
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problemas financeiros, que afetavam inclusive a sua já precária alimentação, Gustavo fazia bicos em vários jornais, lecionava francês e trabalhava em revisão, levando vida difícil, de 1884 até sua entrada em O Paiz, em 1897, quando tem ordenado certo, um salário de fome. Com a saída de A Imprensa, de Rui Barbosa, em outubro de 1898, pegou um biscate no jornal do político baiano, nele permanecendo até abril de 1901, quando Rui deixou a direção do órgão, seguindo-se a segunda fase, de 1907 a 1914, com Alcindo Guanabara. Em 1900, Gustavo funcionou no Jornal do Brasil. Pobre e sem emprego público, chegou a trabalhar, de uma só vez, em três jornais.
A despeito de ser o “mestiço tão admirado por José do Patrocínio”, não esteve nas folhas do Tigre da Abolição, nem na Gazeta da Tarde, no seu apogeu em 1884, quando o Meio Dia, único órgão que Gustavo dirigiu, deixou de circular. “Homem reto e um modesto e esforçado trabalhador da imprensa, a quem serve com entusiasmo pouco comum”, não é possível aceitar a versão de que Gustavo colaborou no Carbonário, pasquim que circulou de 16 de julho de 1881 a 1890, saindo duas vezes por semana. Somente por má fé ou ignorância pode-se atribuir a Lacerda a condição de fundador ou diretor do Carbonário - que se intitulava “órgão do povo”. Este órgão era, na verdade, um
arauto da chantagem e permanente ameaça aos políticos e , sobretudo, aos opulentos comerciantes da rua da Alfândega, que mantinham amores clandestinos, prometendo publicar os nomes e endereços das “ditas cujas”, com os clássicos “continua” e “amanhã tem mais”. Embora o diretor não figure nos primeiros quatro anos no frontispício do jornal, sabe-se que era João Manuel Soares Paiva, indivíduo sem qualquer escrúpulo que, a partir de 1884, passou a ter o seu nome no expediente. Quando saiu o Carbonário, Gustavo ainda estava servindo o Exército, em Santa Catarina, como consta dos seus assentamentos. Notável, sob todos os aspectos, foi o desenvolvimento intelectual de Gustavo, entre fins de 1881 e o começo de 1884. Moço totalmente desconhecido na corte, sem maiores recursos financeiros, conseguiu fundar um jornal e ter, entre os seus colaboradores, nomes de projeção nacional. Pelos seus registros militares observa-se que havia certo empenho de pessoas amigas em querer fazê-lo um oficial. Gustavo jogou todas as oportunidades pela janela, durante os 11 anos que passou nos quartéis. Sofreu castigos por proteger inferiores, porém, ao prestar exames, obtinha sempre boas notas. O que causa estranheza é que Gustavo, ao pedir permissão ao ministro da Guerra para abolir o apelido Adolfo Fraga, não tenha revelado a identidade dos pais, os quais, nos arquivos do Ministério do Exército, continuam como incógnitos. Nunca é demais esclarecer que o honesto Gustavo de Lacerda não conheceu o esplendor da profissão, como Alcindo Guanabara, Eduardo Salomonde e outros. Outra confusão é com o jornal O Meio, que alguns apressados pesquisadores apontam como fundado por Lacerda, juntamente com Coelho Neto, Pardal Mallet e Paula Ney. Um equívoco. O Meio tinha a direção de Mallet, Coelho Neto e Paula Ney, cujos nomes figuravam no cabeçalho, lendo-se ainda: “Órgão social, político e artístico.” Era uma publicação nos moldes da atual Seleções, impressa em 16 páginas, em papel de ínfima qualidade, na tipografia de F. Reunand, à rua da Alfândega, 77. Comentava os acontecimentos em
ANUNCIO ESSO
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Jornal da ABI
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linguagem literária, em matéria corrida, sendo os assuntos separados por asteriscos. Era vendido a 100 réis, preço demasiadamente caro. A capa era sempre um desenho de um mau gosto. Pelo estilo literário, por excelência, é certo que Gustavo de Lacerda não colaborou em O Meio. Não era seu gênero de jornalismo. O provável foi a sua passagem por A Imprensa, de Rui Barbosa, que teve vida efêmera. Quando deixou de circular, Gustavo já estava em O Paiz, funcionando como repórter credenciado na sala de Imprensa da Prefeitura. O Paiz, pelas suas ligações com os latifundiários e o governo, gozava na última década do século de grande influência, ostentando no cabeçalho: “Órgão de maior circulação na América do Sul.” A partir da saída de Quintino Bocaiúva, em 1901, passou a ser controlado pelo português João de Souza Lage, que, ávido de dinheiro para jogar nas patas dos cavalos, acabou transformando o tradicional jornal num balcão dos mais sórdidos, fazendo toda sorte de concessões, ligando-se ao que havia de mais corrupto no mundo político e econômico. Com o dinheiro fácil do Banco do Brasil, O Paiz mudou-se da rua do Ouvidor para a recém-inaugurada avenida Central. “Na reportagem trabalhavam, ainda, Jarbas de Carvalho, Virgílio de Sá Pereira e Gustavo de Lacerda, tão bons repórteres quanto Ernesto Sena e Júlio de Medeiros, ambos do Jornal do Commercio.” Luís Edmundo traçou o perfil do diretor de O Paiz: “Na orientação da folha, Lage, amigo incondicional de todos os governos, serveos com diligência e com agrado. Dá, de uma banda, e, de outra banda, tira ... É dá cá, toma lá. Usa, porém, de processos inéditos para melhor vazar a teta do Tesouro. Sabese, por exemplo, que em casa de certo político, forte jogador de pôquer, de quando em quando, perde somas enormes: cem, cento e cinqüenta, duzentos contos de réis... Por que a má sorte o desajuda? Nada disso. Perde porque quer. Perde para depois ganhar... Estratégia de homem esperto. Velhacaria refinada... Uns dias após o gesto voluntário, procurado, consciente, vai ele ao que ganhou no jogo, ao parceiro feliz e, sem lhe recordar o desastre, com lábia, pede-lhe então, choramingando, a ajudazinha em um negócio de polpa... Estáse a ver que o homem não perde tempo. Os cofres públicos arreganham-se aí, para servir ao pedinchão. Perdeu dando ao parceiro duzentos contos? Pois vai levar seiscentos, ou oitocentos ou mil. E se lhe parece pouco, Lage recomeça. E tome mais poquerzinho, e outro negociozinho... Por isso, viram-se políticos aflitos, solicitandolhe para pôqueres em família. E ele a venderse caro...” Em O Paiz só progrediam os redatores que faziam o jogo de Lage. Para os repórteres não havia oportunidade para nada. Impossibilitados de promover campanhas populares, vistos os seus vínculos com a classe dominante, O Paiz dava ao repórter a condição de pária dentro da redação, com salário de fome. Gustavo, por exemplo, percebia 50 mil-réis por mês, o mesmo ordenado de Amorim Júnior, fundador da ABI e de quem, no fim da vida, pelos idos de 1932, fui seu auxiliar como ○
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Especial 90 anos
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O Meio Dia foi tragado pelo déficit, que começou com o primeiro número. Pobre e sem emprego público, chegou a trabalhar, de uma só vez, em três jornais. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
repórter de polícia, no Jornal do Brasil. Enquanto os outros editores lançavam seus repórteres em coberturas jornalísticas de grande estilo, O Paiz sepultava-os. João Lage não podia ver dinheiro. Alugava parte da loja de O Paiz á Associação de Imprensa, pedindo seis meses de aluguéis adiantados. O tesoureiro Alfredo Seabra foi ao ministro Miguel ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Animador do Centro Operário Radical em 1892. Fundador do Partido Socialista Coletivista em 1902. Sempre tentando, sem apoio da classe, fundar a Casa do Jornalista. Só conseguiu em 7 de abril de 1908. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Calmon, da Viação, de quem era amigo, e expôs a situação. O ministro mandou dar 3 contos de réis pela verba de Serviços Prestados e o Lage embolsou a importância. Apetite de tubarão! Já doente, sem família, Lacerda foi posto fora de casa pela cunhada, Maria Fagundes, casada com seu irmão, por parte de mãe, o primeiro-tenente Augusto Fagundes. Era o desfecho das discussões políticas e domésticas. A cunhada, num acesso de fúria, rasgou seus livros, originais, fotos, jogando tudo pela janela. Diz um relato antigo: “Homem da imprensa, vivendo para o jornal, Gustavo sempre teve na Casa do Jornalista a criação mais acalentada. Internado na Santa Casa, ao ser visitado pelo colega Nicolau Ciancio, pediu-lhe que levasse uns papéis para outro redator. Explicou ser o esquema de um projeto de fundação da entidade para os repórteres. “- É o Clube dos Repórteres, da rua do Teatro? - perguntou-lhe o confrade. “- Ah, aquilo era uma casa de jogo. A polícia deu lá há algum tempo e mandou fechar.” Mesmo doente, se preocupava com a agremiação. - Sociedade entre repórteres não fica bem - comentava. - Parece-se com Associação Protetora dos Animais; Clube dos ○
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Jornalistas... também não, lembra coisa de inglês. Não faz mal. o nome virá depois. Fez outras tentativas para fundar a Associação de Imprensa, não encontrando apoio na classe. Agora, duas eram suas obsessões: a Casa do Jornalista e um partido político. A 28 de agosto de 1902, fundou, com Vicente Silva, o Partido Socialista Coletivista, sem maior receptividade. Fernando Segismundo, em Imprensa brasileira - vultos e problemas, diz que Astrogildo Pereira, perfeito conhecedor da história do socialismo no Brasil, assegura que Lacerda participou dos primeiros movimentos operários de certa importância que se desenrolaram no país logo após a proclamação da República, tendo publicado, em 1901, o opúsculo O problema operário no Brasil, com o subtítulo Propaganda socialista. Astrogildo, em artigo divulgado a 26 de fevereiro de 1953, teceu maiores considerações sobre o fundador da ABI e fez uma análise mais segura: “Foi um dos animadores do Centro Operário Radical, que funcionou no Rio, por volta de 1892, e para o mesmo formulou um programa de reivindicações econômicas e políticas, algumas das quais válidas ainda hoje. Por exemplo - o problema da terra e da reforma agrária, o combate aos monopólios e privilégios, limitação das horas de trabalho, interdição do trabalho aos menores de 14 anos, fiscalização das condições de higiene dos locais de trabalho e das habitações operárias, assistência por conta dos empregadores nos casos de acidentes e doenças contraídas no trabalho, remodelação do regime forense com a gratuidade da justiça.” No seu idealismo, não concebia o jornal como empresa industrial, dando lucros aos seus acionistas. O jornal, dada a sua alta e sagrada missão social, deveria ser uma cooperativa de cujos interesses participassem todos os seus membros, desde os diretores até os seus mais modestos colaboradores. Gustavo usava outra linguagem, outra maneira de redigir. Melhorou muito. O conteúdo do seu manifesto socialista é uma prova. Abandonou o jocoso para encarar os problemas do povo com seriedade. Não criticava, apenas, indicava os caminhos. Insistem em apontar Gustavo como um jornalista inculto e visionário. No programa de fundação da ABI, entretanto, expõe reivindicações que só seriam obtidas com o advento da revolução de 1930. E algumas, como habilitar por meio de título de capacidade intelectual o pretendente à colocação no jornalismo, não deixam de ser a base dos atuais cursos de comunicação social. Múcio Leão, em artigo publicado no Suplemento Literário de A Manhã, em outubro de 1943, enalteceu a figura singular de Gustavo, dizendo: “Uma vida bem modesta. Contudo, a obra que conseguiu criar, na obscuridade de sua banca de repórter, trazia em si mais garantias de perdurabilidade do que a de muito jornalista orgulhoso que redigia suculentos artigos de fundo enquanto ele rabiscava suas notas humildes.” Múcio confessa que desconhecia, por completo, a vida de Gustavo. O seu
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Programa de fundação da ABI: habilitar por meio de título de capacidade intelectual o pretendente à colocação no jornalismo. Quarenta anos antes do primeiro curso ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
artigo é inspirado no livro A Fundação Gustavo de Lacerda, de Dunshee de Abranches. Os anos se arrastam com lentidão e Gustavo, com quase 50 anos, era um homem enfermo. Sem trato, ganhando mal, enquanto o dono do jornal perdia fortunas na tavolagem, via chegar o fim da vida sem um emprego público sequer para assegurar uma velhice tranqüila. Fundada a Associação de Imprensa, meses depois recaiu em grave doença, mais desnutrição do que enfermidade propriamente, voltando à Santa Casa da Misericórdia. O seu mal era incurável. Esperava recuperar a saúde a exemplo das crises anteriores. A última, porém, teve como palco a própria redação, onde o repórter caiu rolando pelas escadas. Era o começo do fim. O Paiz limitou-se a publicar esta nota nas Sociais da edição de 27 de julho de 1909: “Enfermo. Requerendo cuidados assíduos o seu estado, recolheu-se ontem a um quarto particular do Hospital da Santa Casa o nosso velho e querido companheiro de redação Gustavo de Lacerda.” O jornal mentiu. Gustavo foi internado como indigente. No leito, lia os jornais. Um crime deixou-o profundamente abalado. Foi o assassinato de Euclides da Cunha, pelo aspirante Dilermando de Assis, a 15 de agosto, em Piedade. Os últimos momentos da Lacerda foram assistidos por uma irmã de caridade vicentina. Gustavo estava irreconhecível. Era um feixe de ossos. Sua morte foi comunicada à imprensa pelo mordomo Manoel Dias que vestiu o corpo, transladando-o para o necrotério da Santa Casa. Isto ocorreu a 4 de setembro de 1909, segundo o arquivo daquele nosocômio. “Registro Civil da 4.ª Pretoria. Certifique que a fl. do Livro de Registro de Óbitos, número 143, desde Cartório, consta sob o número ... o de Gustavo de Lacerda, que deu-se às 3 e meia horas da tarde, de 4 de setembro de 1909, na Santa Casa da Misericórdia, cor branca, idade 55 anos, solteiro, profissão repórter, brasileiro, natural de Santa Catarina, residente à travessa da Barreira, número 45.” O atestado de óbito foi firmado pelo dr. A. Goulart e tinha como causa arteriosclerose. Foi enterrado no dia 5, no Cemitério de São João Batista, sendo o corpo transportado em veículo número 3, em caixão número 3, de 65 polegadas, Sepultado na quadra 1, cova rasa, recebendo o número 1342. O enterro custou 30$000. ○
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A Gazeta de Notícias, de 5 de setembro, publicou, quando o corpo ainda estava insepulto: “Morreu Gustavo de Lacerda. Tinha cinqüenta e seis anos. Certo não era ser velho, mas parecia ter muito menos idade, ativo, como ele era, nervoso bastante ainda para agitar uma idéia e levá-la avante, como a que, no fim de sua vida, ele viu, felizmente resolvida, e a caminho do seu ideal, a Associação de Imprensa, de que ele era o presidente, primeiro. “Os tempos corriam e Gustavo de Lacerda era sempre o mesmo. A sua cor bronzeada não deixava perceber que ele vinha de longe. Era um moço, entretanto, porque era um trabalhador constante, um combatente firme nessa campanha de fazer jornal.” O Paiz fazia o necrológio: lágrimas de crocodilo ... “Apesar de esperada, em um tempo mais ou menos próximo, pelo caminho da moléstia insidiosa, que derribou ontem infatigável lutador, a morte de Gustavo de Lacerda, o excelente jornalista que doze anos de trabalho vinculou fortemente à vida de O Paiz, causou entre todos nós uma dolorosa sensação. “Para os que o não conheceram de perto, esta mágoa não pode ser tão vivamente sentida: era preciso, porém, terlhe acompanhado a figura, tão modesta quanto vigorosa, de trabalhador através das lides do jornal, seguindo o traço liso da passagem pelos vários acidentes da intimidade ou ação cívica, para sentir realmente, quanto essa perda é dolorosa.” O Jornal do Commercio, como sempre, parcimonioso nos elogios: “Era um ótimo coração e um homem reto.” O Correio da Manhã, na primeira página: “A morte de Gustavo de Lacerda causou dolorosa impressão e o corpo, durante a noite inteira, foi visitado por muitas pessoas, ficando iluminado por seis tochas. Foi um esforçado batalhador da imprensa que, na vida absorvente do jornal, gastou o máximo de suas energias e talentos. “Conduziram o caixão para o coche mortuário os Srs. Celso Bayma, deputado por Santa Catarina; Carvalho Azevedo e Julião Machado, de O Paiz; Baldomero Cerqueira, do Jornal do Commercio; Brício Filho, redator-chefe do Século, e Guilherme Ribeiro, do Clube dos Democráticos. “Do carro para o túmulo pegaram nas alças os Srs. João Souza Lage, diretor de O Paiz; Henrique Hasslocher, Lindolfo Azevedo, Noel Batista, Lino Santiago e Toletano de Araújo. “Falaram à beira da sepultura o operário Honório de Figueiredo, em nome de sua classe; dr. Celso Bayma, pelo povo de Santa Catarina; Baldomero Cerqueira, pela Associação de Imprensa; e Melchior Pereira Cardoso, pelo partido Operário Socialista e Associação dos Cocheiros, Carroceiros e Classes Anexas. “Além de muitos ramos de flores naturais, a reportagem viu muitas coroas; a mais bela coroa foi enviada pelos cocheiros.” Torna-se necessário estabelecer a ligação entre Gustavo e os carroceiros. No dia 15 de janeiro de 1900, o Rio amanheceu sem transportes. Os cocheiros e ○
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carroceiros, responsáveis pela condução à tração animal, cruzaram os braços, em protesto contra um regulamento do Chefe de Polícia, que os obrigava a um pagamento de vinte mil-réis para cada exame de cocheiros e exigia duas fotografias de candidato, sendo que uma ficaria no arquivo da polícia. Diga-se que a greve teve o patrocínio do Jornal do Brasil, contra quem o governo investia. A parede teve notícia de página inteira do matutino e o repórter
Ambos desapareceram no anonimato da cidade. A morte colheu Gustavo quando o Brasil era agitado pela campanha civilista, que redundou na derrota de Rui Barbosa em favor do marechal Hermes da Fonseca. Vivo fosse e tivesse saúde, Gustavo teria formado, certamente, ao lado do seu antigo companheiro de A Imprensa, o qual, a despeito do convívio diário com o velho repórter, nem sequer enviou um telegrama de pêsames à redação de O Paiz, que era, na verdade, a sua família. Rui não secundou o gesto de Quintino. Gustavo, mesmo na época da fundação do Partido Socialista Coletivista, não falava nas associações de classe, tarefa desempenhada pelo seu companheiro Vicente de Souza, médico paladino da campanha abolicionista e que figura na mesma galeria de Patrocínio, Quintino, Luiz Gama, Lopes Trovão, Silva Jardim, Rebouças, Clapp e tantos outros. A atividade de Gustavo era outra. Conhecendo o francês, matéria em que foi aprovado na Escola Militar, traduzia artigos e reportagem de jornais de Paris, entregando o material a Vicente de Souza, na impossibilidade de publicá-lo na imprensa. Vicente aproveitava tudo nas conferências que fazia nos círculos operários. A máquina que fornecia os elementos explicativos das palestras era o modesto repórter. Dunshee de Abranches, que substituiu Gustavo na ABI, lembra que ele lia jornais estrangeiros, sobretudo trabalhos firmados por repórteres que
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Enfermo. Requerendo cuidados assíduos o seu estado, recolheu-se ontem a um quarto particular do Hospital da Santa Casa o nosso velho e querido companheiro de redação Gustavo de Lacerda O jornal mentiu. Gustavo foi internado como indigente ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
designado para fazer a cobertura foi Gustavo de Lacerda, muito interessado no assunto, uma vez que surgiu a magnífica oportunidade de expor suas idéias socialistas entre os grevistas. Sua situação foi das mais importantes, a ponto de o Jornal do Brasil atacar Epitácio Pessoa, ministro da Justiça do governo Campos Sales, denunciando-o como tendo mandado “dois encostados da polícia atirarem para matar o nosso repórter Gustavo de Lacerda na Ladeira do Castro, que anunciou as violências praticadas por ordem do governo contra carroceiros em greve”. A Associação dos Cocheiros, Carroceiros e Classes Anexas, grata ao seu defensor, decretou luto por 15 dias, inaugurando posteriormente o seu retrato na sede social. Fez mais. Incorporou coches ao enterro, conduzindo jornalistas e políticos que acompanharam os funerais, destacando-se inúmeros militares e civis que fizeram as campanhas abolicionistas e da República. Até de Campos veio uma delegação. Félix Pacheco, Alcindo Guanabara, Emílio de Menezes, Irineu Marinho, Figueiredo Pimentel e Patrocínio Filho assistiram à missa de 7.º dia, rezada na matriz do Sacramento. Centenas de telegramas chegaram à redação de O Paiz, destacando-se a mensagem de Quintino Bocaiúva, expedida de Pindamonhangaba. O chefe do Partido Republicano e ministro do governo provisório de Deodoro da Fonseca inclinava-se diante do modesto companheiro. Sepultado com enterro de primeira classe e com missa cantada, sabese que Gustavo ao morrer tinha vários meses de aluguel atrasado da sede da Associação de Imprensa e devia outros dez ao seu senhorio, de modesto cômodo perto da praça Tiradentes. Deixou no mundo um filho, fruto de sua união com uma francesa. ○
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século, muito contribui para Gustavo insistir na formação de uma associação que defendesse os seus interesses sem distinção de categorias, sujeitos que estavam, na maioria dos casos, às sobras dos manjares dos diretores e gerentes. Estes só mantinham em dia o pagamento do pessoal das oficinas graças à vigilância de suas instituições, inclusive o bravo Sindicato dos Linotipistas, conquista até hoje mantida. A redação vivia permanentemente em atraso, com miseráveis vales fornecidos pelos gerentes, alguns sócios de agiotas que cobravam 5% de juros por semana. Alfredo Neves foi o único jornalista aliado à condição do antigo presidente da ABI, ao peso de mais de 86 anos, em condições de falar sobre Gustavo de Lacerda. O senador pelo Estado do Rio estava na mais perfeita lucidez. Eis o seu depoimento: “Convivi alguns anos com Gustavo de Lacerda. Entrei para O Paiz como tipógrafo, passando, em seguida, para linotipista. Ele costumava ir às oficinas em missão de catequese para as suas idéias socialistas. Era alto, meio mulato, e vestiase pobremente. Durante muitos anos foi repórter credenciado no gabinete do Prefeito Municipal, então uma das grandes fontes de informação política. Ganhava, salvo engano de memória, 50 mil-réis por mês. Costumava-se dizer que João Lage, diretor de O Paiz, não escrevia. Como tipógrafo e linotipista, compus vários artigos de sua autoria. Lage disse, ao confiar-me a redação: “- Você é o novo secretário. Ë preciso manter o prestígio de O Paiz. É possível que o Correio da Manhã (seu maior concorrente) seja mais lido do que nós, porém, não tem o bafejo das rodas do Jóquei Clube ... “E fez esta solicitação: “- O nosso Gustavo anda muito irritado e quer deixar o jornal. Não o deixe sair. Precisamos dele. É um grande companheiro.” Durante os 12 anos em que viveu em O Paiz, foi explorado como ninguém. Ganhava uma migalha. O dinheiro mal dava para comer. Não tinha vida mais miserável porque fazia tradução de folhetins do francês para o português, material muito usado pelos jornais. Morava numa cabeça-de-porco, uma das muitas da travessa da Barreira, freqüentada pela gente humilde do teatro. Seus velhos sobrados, de um andar, diziam da sordidez do ambiente. Ficava ao lado da praça Tiradentes. A princípio foi travessa da Barreira, depois beco do Carioca, e, em seguida, uma viela, pois teve fechada a saída para o Morro do Santo Antônio. Das 52 habitações, quase todas tinham conservado as características da era colonial, apenas três com telefone. Havia duas placas, uma de bronze, outra de ágata esmaltada: rua Gustavo de Lacerda. Com a abertura de vias de acesso ao antigo Morro de Santo Antônio, a rua Gustavo de Lacerda foi destruída pelos tratores. Desapareceu para sempre. Gustavo de Lacerda não tem rua, nem túmulo. Até a causa-mortis foi deturpada. Arteriosclerose, nunca. A verdadeira foi: desnutrição, fome.
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4 de setembro de 1909. Morreu Gustavo de Lacerda. Não tem nem túmulo. Até a causamortis foi deturpada. Arteriosclerose, nunca. Desnutrição, fome ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
varavam o mundo. Ainda é Dunshee que diz do interesse de Gustavo pelas instituições de profissionais de imprensa ao pedir estatutos de associações existentes na Europa, tarefa que o bom e já cansado repórter confiou a Dunshee, aproveitando uma viagem do parlamentar maranhense e redator de O Paiz ao Velho Mundo, em missão confidencial do nosso governo. O deputado, pelos seus afazeres, não tinha maiores contatos com os dirigentes sindicais, o que não o impediu de recolher informações sobre a Associação Sindical Profissional dos Jornalistas Republicanos Franceses, sob a presidência do senador Paul Strauss, fundada em 1881, sobre a Associação dos Jornalistas Parisienses, dirigida por outro senador, Alfred Mesiére, da Academia Francesa, sobre o Sindicato da Imprensa Estrangeira, criada em 1879. O material serviu para Gustavo lançar as bases do programa de fundação da ABI. A miséria dourada em que viviam os profissionais da imprensa, no começo do
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Jornal da ABI
ATÉ COM ARMAS NAS MÃOS OS PRIMEIROS PRESIDENTES SALVARAM A IMPRENSA E A ABI FRANCISCO SOUTO (De setembro de 1909 a maio de 1910) O vice-presidente da ABI, Francisco Souto, um dos dirigentes do Correio da Manhã, completou o mandato de Gustavo na novel sociedade, sem prestígio, uma vez que quase todos os donos de jornais a sabotavam. Destaque-se que o próprio presidente em exercício, Souto, não compareceu ao enterro de Gustavo de Lacerda, fazendo-se representar pelo seu filho Oswaldo. Alguns diretores proibiram que seus redatores participassem da instituição. Francisco Souto não podia fazer nada. O seu mérito foi impedir que a associação sucumbisse por inanição. A mensalidade de dois mil-réis era insuficiente para manter a Casa, sem ajuda de quem quer que fosse. Devia tudo. Aluguel, empregados, luz etc. Francisco Souto foi um gentleman. Depois do Correio da Manhã foi para o Jornal do Commercio, sempre com a mesma função: repórter no Palácio do Catete.
DUNSHEE DE ABRANCHES (De 1910 a 1913) Nos primeiros meses de 1910, Amorim Júnior e outros fundadores da ABI lembraram o nome de Dunshee de Abranches, o colega de O Paiz que Gustavo convidara para presidir os destinos da ABI, logo após a sua fundação. João Dunshee de Abranches Moura era um dos homens fortes do governo, sendo mesmo elemento de absoluta confiança do barão do Rio Branco, o demarcador das nossas fronteiras. Em sua terra natal, no Maranhão, fizera jornalismo de combate, na cidade de Barra do Corda, onde redigiu O Norte, difundindo idéias abolicionistas e republicanas. Freqüentou as escolas de medicina e direito, porém, não concluiu o curso em nenhuma, o que não impediu de ser doutor honoris-causa da Universidade de Heildelberg, na Alemanha, onde pronunciou conferências sobre direito público americano. Deputado federal de 1905 a 1917, autor de vários livros, editorialista de O Paiz, alguns diretores de jornais da oposição não acolhiam seu nome com simpatia, dadas as suas ligações públicas e notórias com a situação dominante. Machado de Assis, em junho de 1898, o convidara para membro fundador da Academia Brasileira de Letras. Recusou a imortalidade. Tinha menos de 30 anos de idade. O grupo que controlava a associação resolveu apoiá-lo de maneira maciça. Daí a sua votação unânime para substituir Gustavo de Lacerda, fazendo-o com
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pedindo enérgicas providências. O beleguim, revoltado com a posição de Dunshee, ameaçou invadir a sede da Associação, o que deixou de fazer pela atitude varonil assumida pelos seus diretores. Tudo era pretexto para pôr em jogo o prestígio da classe. Três redatores, um do Século, de Brício Filho, e dois do Correio da Manhã, de Edmundo Bittencourt, foram envolvidos num incidente com um alto funcionário do ministério da Viação, cujo titular era amigo de Dunshee, provocando um estremecimento na velha amizade existente entre os dois homens públicos. Um sócio que ocupava posto de relevo na vida política do país planejou o empastelamento de O Paiz e do Século. Comprovada a indignidade do associado, chefe de uma malta de desordeiros, Dunshee convocou uma assembléia geral para expulsá-lo, o que foi feito com o apoio de 67 votos contra 17. Outra ameaça de depredação da sede. Nova noite de vigília, com os diretores da Casa à espera do pior. À frente da resistência, o próprio Dunshee de revólver em punho. Foi assim o começo da ABI. Egressos do esgoto social,
dignidade, e, sobretudo, bravura. No dia da posse, a 13 de maio de 1910, Dunshee de Abranches fez verdadeira profissão de fé, jurando defender a liberdade de pensamento a qualquer custo, o que o levou, em certos casos, a arriscar a própria vida. Vale a pena transcrever um trecho do seu discurso de posse: “Destruir prelos, derramar mesa de tipos, quebrar compositores, espatifar móveis e bobinas, arrastar tudo para a rua e aí fazer de tudo uma rubra e vingativa fogueira, quer escapem ou não à sanha dos assaltantes, redatores indefesos ou tipógrafo inofensivos - tal é o processo sumário e a justiça política das castas que se julgam privilegiadas no país, herdeiros dos últimos anos do Império e com que se têm continuado a desacreditar a República desde o seu alvorecer.” A associação ganhou sede, embora modesta. Ocupava o primeiro andar de um prédio da avenida Central, esquina de Assembléia, onde funcionou, no térreo, por muitos anos, o Café Suíço. A tesouraria era ocupada por João Mello, repórter do Jornal do Commercio. Mobilizados todos os recursos disponíveis e com a ajuda pessoal dos sócios, as contas foram pagas. Numa reunião de diretoria, Dunshee de Abranches revelou que a Associação tinha um saldo no British Bank of South America. Com a força do seu prestígio na Câmara dos Deputados e o apoio dos seus colegas José Bonifácio de Andrada e Silva e Cristiano Brasil, logrou a apresentação de projeto de lei, convertido em lei a 30 de dezembro de 1910, que concedia uma subvenção anual de 20 contos à Associação, auxílio que muito contribuiu para a entidade viver, durante algum tempo, sem maiores atropelos financeiros... Dunshee, embora comprometido com o governo - agora sob a batuta de Pinheiro Machado, que manobrava o presidente marechal Hermes da Fonseca como um boneco - jamais deixou de prestar solidariedade aos jornais e jornalistas, vítimas da prepotência das autoridades, incompatibilizando-se com certos setores governamentais. Sentia-se, na verdade, muito feliz com a sua dupla qualidade de parlamentar e presidente da Associação de Imprensa, duas funções que o credenciavam para defender, com maior vigor, a liberdade de pensamento. A princípio teve atritos com beleguins e delegados, aos quais jamais se dirigiu, encaminhando sempre os protestos ao ministro da Justiça. Esta maneira altiva de tratamento, evitando o contato com autoridades arbitrárias que quase sempre têm o beneplácito do Chefe de Polícia, aumentava a animosidade entre jornalistas e policiais. De uma feita, um delegado mandou espancar um repórter, recolhendo-o ao xadrez. Dunshee não só requereu habeascorpus preventivo para o colega ameaçado, como levou o fato, pessoalmente, ao conhecimento do ministro da Justiça,
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organizada, para encaminhamento e solução dos mais sérios e importantes problemas sociais.” Em A Fundação Gustavo de Lacerda (reminiscências dos primeiros dias da Associação de Imprensa), Dunshee voltou a exaltar a bravura da Casa do Jornalista: “O espírito de classe, todavia, não nos cegava a consciência nem nos perturbava as ações. Antes de tomar deliberações ou de assumir atitudes, estudávamos ponderadamente os casos em apreço para nos não enfraquecermos perante a opinião nem sermos acusados de energúmenos e turbulentos.” Dunshee dirigiu os destinos da Casa do Jornalista de 1910 a 1911, quando foi reeleito até 1913, dois períodos atribulados em face da agitação na vida nacional. Na sua gestão foi instituída a Carteira do Jornalista, regularizados os serviços médicos, criados fundos para assistência jurídica e funerais, sendo elaborados, ainda, os projetos da escola de Jornalismo e do Anuário da Imprensa Brasileira, reivindicações do programa proposto por Gustavo de Lacerda. Modificados os estatutos, a sociedade ganhou o pomposo nome de Associação de Imprensa dos Estados Unidos do Brasil, o que de resto não era novidade, pois a Associação dos Maquinistas também era dos Estados Unidos do Brasil ... Entre seus livros destaca-se o volume de memória A esfinge do Grajaú, no qual relatou sua posição de promotor público nomeado quando estudante de direito, para pacificar a luta sangrenta entre libertadores e conservadores, no interior maranhense. Escreveu A Revolta da Armada e A revolução sul-riograndense, este editado em 1914, após publicação parcial, em O Paiz em 1901, Governos e congressos da República, ensaio biográfico das figuras marcantes do início da República até 1917. É autor, ainda, de um livro muito consultado nas bibliotecas: Atas e Atos do Governo Provisório, no qual fez análise profunda do alvorecer da República, com todo o seu cortejo de intrigas de um regime que destronou um Império com 67 anos e que levou o próprio Deodoro da Fonseca a renunciar a 23 de novembro de 1891. realizou obra de autêntico sociólogo e jurista. A condessa Pereira Carneiro, diretorapresidente do Jornal do Brasil, já falecida, foi sua filha. Era neto do famoso jornalista Antônio Garcia de Abranches, fundador de O Censor, no qual verberava os desmandos do governo e estigmatizava Lord Cochrane, o mercenário marinheiro inglês contratado por d. Pedro I para sufocar as insurreições da Bahia e Maranhão, que não aceitaram o 7 de setembro de 1822. Cochrane, de garrucha, assaltou o Tesouro do Maranhão, levando 424 contos, não escapando da rapinagem nem o Fundo Financeiro dos Órfãos.
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Outra ameaça de depredação da sede. Nova noite de vigília, com os diretores da Casa à espera do pior. À frente da resistência, o próprio Dunshee de revólver em punho. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
transformados em autoridades, insuflados por irresponsáveis chefes de policia, várias vezes tentaram quebrar a ABI. Das ameaças, contudo, a instituição saia mais forte, cercada pela admiração popular. O prestígio crescia. Para comemorar o primeiro aniversário da sua administração, os amigos promoveram um almoço: “O banquete”. escreveu Dunshee, “não visava exprimir, apenas, o regozijo da nossa classe por ver a fundação de Gustavo de Lacerda florescer e consolidarse cada vez mais no conceito público. O que, sobretudo, imagináramos fora provocar uma demonstração coletiva em que os órgãos imediatos da opinião brasileira, exaltando a sua solidariedade e harmonia de vistas na defesa da liberdade de pensamento e no amor a sua profissão, mais uma vez fizessem ver bem claramente que, de fato e de direito, constituíam uma força preciosa, necessária e bem
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O Censor foi fechado e o velho Abranches deportado para Lisboa, a bordo do veleiro Aurora, escrevendo um libelo dos mais violentos, atacando Lord Cochrane, o gângster foragido da justiça da Inglaterra pago para dar um banho de sangue nos que não aceitaram a “Independência ou Morte”. A notoriedade de Dunshee de Abranches começou quando ficaram famosas as Cartas de um sebastianista, folhetins em versos, com o pseudônimo de Barão de S. Bibiano, publicados no Jornal do Brasil, sátiras que foram atribuídas a Carlos de Laet, colaborador do mesmo matutino. Na mesma época e com o mesmo sucesso, apareceram as Memórias de um histórico, assinadas por Lúcio Pestana e uma série de artigos firmados por Lobo Cordeiro, todos de autoria do jornalista maranhense, cujo retrato já o Jornal do Brasil publicara com a última carta, revelando, assim, que era o barão de S. Bibiano. Sabe-se que foi o intelectual que usou o maior número de pseudônimos, como narra Raimundo de Menezes, no Dicionário literário brasileiro. “Oscar de La Tour, Foy, Sediciocrata, Cajulabrega, D. de A., Barão de São Bibiano, Lúcio Pestana, Lobo Cordeiro, Ferreiro de Andrade, Rababas, Xisto Pancada, Severo Sátiro, Hermano Fonte, Abelhudo, Franklin, Brasil, I. Williams, F. G., Cosme de Sales, Pacífico Guerra, Matias Simplório, A. Z., Eurico, o Cirineu, Rui Brás, J. das Neves, Madj, Chico de Paula, Proteu da Silva, Puxavistas, Tácito Júnior, J. Biela, Holley Júnior, Nonato Proteu e Platão Júnior.” A atividade jornalística de Dunshee de Abranches já abrangia A Federação, de Porto Alegre, A República, do Pará e A Federação, de Manaus, além do Jornal do Brasil, A Notícia e o Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro. Publicou Crepúsculo de século - a política mundial, em 1899, no Jornal do Brasil, de cuja redação se desligou para dedicar-se, com Garcia Seabra e outros, à organização de O Dia, um moderno jornal, cujo primeiro número saiu a 1.º de janeiro de 1901, mas teve curta duração. Nelson Werneck Sodré, em História da Imprensa no Brasil, relata a entrada de Dunshee de Abranches, no Jornal do Brasil: “A 15 de novembro, voltava a circular o Jornal do Brasil, vendido à firma Mendes & Cia., ex-proprietária do Diário do Commercio. Era agora redator-chefe Fernando Mendes de Almeida, com Cândido Mendes na secretaria e Gregório Garcia Seabra na gerência. Reaparecendo no aniversário da República, firma posição, apresentando-se como defensor dos pequenos e dos oprimidos, batendo-se pelo voto do analfabeto e pela nacionalização das companhias de seguros, como pelo reatamento das relações com Portugal, rompidas quando da Revolta da Esquadra Tomava iniciativa jornalística arrojada para a época: a ida de Felisberto Freire a Buenos Aires e Montevidéu para entrevistar o almirante Custódio José de Melo e outros elementos ali exilados. São colaboradores do jornal, nessa fase, Virgílio Várzea, Carlos de Laet, Araripe Júnior e Dunshee de
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Abranches.” A partir de 1902, Dunshee intensificou sua atividade jornalística e produção literária, tendo ascendido em O Paiz, de simples colaborador a redator político, função que exerceu até 1914. Publicou a história da cisão do Partido Republicano Federal, intitulado O livro negro, seguindo-se O livro verde, análise e documentário sobre a formação do partido organizado para apoiar Prudente de Morais na presidência da República. Escreveu ainda O livro branco, encerrando a série de estudos em torno dos dois primeiros governos civis da República. Em 1904 e 1905, o Governo Federal atribuiu a Dunshee de Abranches os encargos de proceder a um inquérito nas instituições de ensino secundário e a uma inspeção sobre a organização e o funcionamento das faculdades livres, respectivamente. Os relatórios que apresentou tiveram grande repercussão, levando-o desenvolvê-los e publicá-los sob a forma de livros, com os títulos Exames gerais de preparatórios, ensino superior e faculdades livres. Escreveu Reforma da justiça militar, expondo os defeitos dos Conselhos de Guerra e demonstrando a necessidade de modificação da respectiva legislação, do que resultou a apresentação ao Congresso, de um projeto de Código Penal Militar. Quando integrava a redação de O Paiz, jornal que apoiava a orientação do barão do Rio Branco, como ministro das Relações Exteriores, cabia a Dunshee de Abranches coligir as notas enviadas pelo barão e redigir a réplica aos ataques formulados pela oposição. O seu trabalho era freqüentemente elogiado por Rio Branco, de quem se tornou porta-voz. Ao ascender à presidência da Comissão de Diplomacia e Tratados da Câmara dos Deputados, elaborou os pareceres que levaram à aprovação, pelo Congresso, de tratados e outros acordos internacionais negociados pelo barão como ministro das Relações Exteriores. A maioria desses pareceres e discursos foram publicados em forma de livros sendo depois reunidos nos volumes II e III das obras completas de Dunshee sob o título - Rio Branco e a política exterior do Brasil. Em 1905 e 1913, Dunshee realizou demoradas excursões à Europa, que deram origem aos livros Espanha e Côte d’Azur, Lourdes e Côte D’Argent e Pela Itália, publicados em Barcelona. Deflagrada a I Guerra Mundial, 1914, assumiu, na imprensa e no Congresso Nacional, a defesa intransigente da neutralidade do Brasil. Vencido nos exaltados debates que estão se travaram, fundamentou ele longamente o seu voto contra a participação do nosso país no conflito. Papel de maior importância teve o deputado socialista francês Jean Jaurés, pacifista que empolgou grande parte do povo francês e foi assassinado em 1914. Tinha a mais alta condecoração da CruzVermelha alemã e, em setembro de 1929, chefiou a delegação brasileira à solenidade de lançamento da pedra fundamental da Basílica de Santa Terezinha, em Liseux, na França. ○
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De 1914 a 1917, publicou longos trabalhos, culminando com o livro A ilusão brasileira (justificação histórica de uma atitude). Em 1917 renunciou à atividade política e retornou ao jornalismo e aos seus estudos de história e ciência política, lançando, entre outros, dois livros que ocupam lugar destacado em sua bibliografia - Governos e congressos da República, dois volumes com 1.827 páginas obras única no seu gênero em nosso país, que consumiu seis anos de pesquisas, e Garcia de Abranches, o Censor (seu avô). Dois livros e trabalhos, dessa última fase de sua vida, destacam-se A setembrada, romance histórico (1933) e O cativeiro, memórias e pesquisas sobre o movimento abolicionista no nordeste, editado em 1938. Como musicista, compôs várias peças, especialmente de música sacra, parte das quais foram publicadas e se esgotaram. A Ave Maria, de sua autoria, é ainda hoje ouvida na Rádio Jornal do Brasil. Poeta, jornalista. pesquisador, precursor da ciência política no Brasil, cultor do direito, musicista, faleceu em Petrópolis no dia 11 de março de 1941, com 74 anos. Este foi o terceiro presidente da ABI, deixando uma bibliografia com 165 títulos. Sua filha, a condessa Maurina Dunshee de Abranches Pereira Carneiro tornou a si a tarefa de publicar as Obras Completas de Dunshee de Abranches, das quais já saíram os seguintes volumes: A reforma da Justiça e do Código Penal Militar; Rio Branco e a política exterior do Brasil (2 volume); Atas e Atos do governo provisório, O golpe de Estado (atos e atas do Governo Lucena); A Revolta da Armada e A revolução sulriograndense; Como se faziam presidentes.
Discípulo de Quintino Bocaiúva, redatorchefe de O Paiz Paiz, Belisário de Sousa enfrentou lutas internas e acabou renunciando no segundo mandato. Mas, antes, teve a iniciativa de adotar o nome Associação Brasileira de Imprensa ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
iniciativa passou a chamar-se Associação Brasileira de Imprensa. Teve uma administração das mais agitadas, de 1913 a 1916. Fundador da Casa, sendo um dos nove que assinaram a ata de 7 de abril de 1908, tinha tudo para seguir a rota traçada por Gustavo de Lacerda, seu amigo e companheiro de redação. Acontecimentos imprevistos chocaram a sensibilidade do jornalista político, que sofreu influência da literatura francesa, tão em moda. Tentou, em vão, pacificar as correntes. Até os funcionários da ABI participaram das contendas. Existia o Boletim da Biblioteca, de Ulisses Brandão, que não era um simples bibliotecário, tinha mais de 30 obras publicadas, oito em colaboração com Rui Barbosa. O autor não localizou um exemplar do Boletim que, em última análise seria um retrospecto das administrações da ABI. Extratos de Boletim apareciam publicados na mais completa desordem, a ponto de o secretário do conselho administrativo, Manoel Lourenço de Magalhães, que teve premiada a sua monografia sobre a ABI, omitir a gestão de Dario de Mendonça e ignorar a renúncia de Barbosa Lima Sobrinho, em 1931. Belisário não escondeu suas mágoas, segundo Ulisses Brandão: “Empossada a diretoria e nomeadas as comissões auxiliares e, de acordo com os estatutos, começaram os regulamentos, os trabalhos que, pouco depois, sofreram interrupções e irregularidades lastimáveis, devidas, principalmente, ao inexplicável afastamento ou, antes, à deliberada recusa por partes de alguns membros da administração, essenciais ao seu normal funcionamento, de auxiliarem em suas respectivas atribuições os esforços da diretoria.” Aconteceu o inesperado. Ao terminar o seu mandato em 1915, contra a sua vontade, Belisário foi reeleito, certo de que, com o decorrer do tempo, contornaria a situação. Puro engano. Cresceram ainda mais os desentendimentos e Belisário, espírito dos mais brilhantes de sua geração, probo como poucos, renunciou a 11 de janeiro de 1916, quando o seu mandato terminaria a 13 de maio, assumindo a
BELISÁRIO DE SOUSA (De 1913 a 1916, renunciando antes do fim do mandato) Belisário de Sousa foi o quarto presidente da ABI, levando em conta que Francisco Souto concluiu o mandato de Gustavo. Tinha um nome de projeção na vida jornalística, quando assumiu aquelas funções. Era discípulo dileto de Quintino Bocaiúva. Brito Brocca o coloca, sem favor, ao lado de Gilberto Amado, Gregório Fonseca, Anibal Teófilo, Alcides Maia, Lindolfo Collor, Goulart de Andrade, Leal de Sousa e outros. “ Malgrado algumas incursões pela política”, disse Nelson Werneck Sodré, “Belisário de Souza foi toda a sua vida um homem de imprensa.” Com 27 anos de idade substituiu Dunshee de Abranches. Nasceu a 12 de agosto de 1886 em Niterói. Jovem, cheio de ardor e entusiasmo pela política, redatorchefe de O Paiz, Belisário, pelo seu temperamento, não pôde, de imediato, conciliar as correntes antagonistas dentro do novel sociedade, a qual, por sua
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Jornal da ABI
presidência o vice, Raul Pederneiras. Festejava-se o 1º de maio de 1915, quando os restos mortais de Gustavo de Lacerda foram levados para o ossário comum, já que terminara o prazo de uma sepultura rasa. Vários sindicatos prestaram homenagem à memória do fundador da ABI, apontando-o como líder incontestável das lutas operárias. O Jornal do Brasil, por exemplo, divulgou uma nota ilustrada, com o seguinte texto: “Entre os paladinos da causa operária, em nosso país, nesta capital, que foi o campo de ação, devem ser relembrados os nomes de Vicente de Sousa, médico e orador, que se salientou na devassa dos direitos operários; França e Silva, operário e jornalista, um dos mais ardorosos lutadores em prol do operariado, e Gustavo de Lacerda, jornalista, iniciador dos centros operários e fundador da ABI. “Publicando seus retratos, o Jornal do Brasil presta uma homenagem à memória destes batalhadores intemeratos e dedicados à defesa dos interesses do proletariado.” A ABI, em virtude das suas lutas internas, não oferecia clima para cultuar a memória do seu próprio fundador, como faziam inúmeras sociedades do Rio e de São Paulo. E, o mais triste, a ABI, por falta de recursos financeiros, não comprou um carneiro para guardar os despojos de Gustavo no cemitério São João Batista. Belisário voltou a sua banca de redator de O Paiz e foi uma das figuras de maior projeção do 1.º Congresso Brasileiro de Jornalistas, servindo como secretário e relator da 4.ª comissão, justamente a que verberava a censura à imprensa e à publicidade comercial nociva à saúde pública. Eleito deputado pelo estado do Rio de Janeiro, à Assembléia Legislativa, em 1916, e à Câmara Federal em 1928, foi curto o seu estágio na política. Retornando logo à imprensa, trabalhou em A Tribuna, A Noite e, por fim, no Jornal do Brasil, onde assinava artigos. A revolução de 1930 cortou sua carreira, tornando-o um desencantado pela política. Exilou-se na Europa, embora com função na secretaria do Senado Federal, da qual pediu licença. Faleceu a 29 de dezembro de 1946, com 60 anos. Trabalhara na noite anterior no Jornal do Brasil, quando entregou o seu artigo, que saiu publicado no dia em que morreu, na 5ª página, subordinado ao título “Fatos e Nomes”, e no qual Belisário investia contra a ditadura deposta. Escreveu-o na própria redação, entregandoo ao secretário Martins Alonso, que posteriormente publicou sua memórias. Alta madrugada, em casa, foi acometido de um ataque cardíaco, que o fulminou antes da chegada do médico. Uma nota de O Globo traçou o perfil do terceiro presidente da ABI: “Belisário de Sousa não era apenas o profissional de uma geração de que conservava galhardamente a flâmula, e de que sempre foi um dos nomes mais ilustres pelas suas origens e pelo vigor de seu espírito, em que refloriam constantemente todas as graças da cultura e da influência ○
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Especial 90 anos
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tenha participado da reunião de fundação da ABI, para cujo quadro social entrou um mês depois. O problema principal da associação era a sede, que funcionava em local desapropriado, sem nenhuma comodidade para seus associados, em número superior a 400. Com o prestígio de professor de desenho, várias vezes laureado em exposição, sendo de destacar a de 1908, quando conquistou a Medalha de Ouro, Raul obteve a transferência da sede da avenida Rio Branco para o Liceu de Artes e Ofícios, na rua 13 de Maio, contando com a inestimável colaboração de Bethencourt da Silva, diretor do Liceu. O novo presidente introduziu modificações nas instalações e criou uma sala de reportagem que informava aos jornais tudo que acontecia no setor policial e de pronto-socorro, repórteres ali credenciados, em revezamento, faziam a chamada corrida, que consistia em telefonar para os distritos, bombeiros, hospitais públicos, sem esquecer o “rabecão”, cuja saída indicava sempre morte violenta ou suspeita. Era, em última análise, uma experiência do sonhado cooperativismo almejado por Gustavo.
francesa, e esses dons de clareza e simplicidade que sempre tornaram seu estilo inconfundível, e a sua palavra escrita tão sugestiva e sedutora como a falada. Militante na imprensa desde os tempos áureos de O Paiz, quando radiava de mocidade e de talento e vivia para as suas esperanças.”
RAUL PEDERNEIRAS (Completou o mandato de Belisário de Sousa e foi presidente em 1916, 1917 e de 1920 a 1926) Raul Pederneiras terminou o mandato de Belisário de Sousa a 13 de maio de 1916. Presidente de 1916 a 1917 e de 1920 a 1926, seu nome era dos mais populares e respeitados na classe, como jornalista, caricaturista e professor de direito. Estreou na revista ilustrada Mercúrio em 1895, surgindo ao lado de Kalixto. Marcharam juntos pela vida afora. Raul concluiu o curso de direito em 1885, justamente quando ingressou no Mercúrio. Em 1901 entrou para a redação
Ao assumir a presidência, em 1916, Raul completava 42 anos, com extraordinária capacidade de dialogar com os jovens. Ilustrava, escrevia e dava aula de direito internacional. Seu chapéu preto de abas levantadas e o farto bigode marcavam seu físico por onde passava. Poucos homens de imprensa gozaram de tanta popularidade. Nem mesmo Emílio de Menezes, no fausto. Probo e trabalhador, cedo granjeou as simpatias de seus colegas. Realizava duas reuniões de diretoria por semana, com o objetivo único e exclusivo de “conservar sempre elevado o nível da classe, aproximar os jornalistas entre si e ampará-los moral e materialmente, no limite do justo e do possível, com especialidade na vida jornalística”. Concluiu seu mandato em 1917, sendo reeleito, em sucessivos pleitos, a partir de 1920 até 1926. Aproximava-se o fim do governo da Epitácio Pessoa, e já se sabia que seu sucessor, Artur Bernardes, era um inimigo ferrenho das liberdades públicas. Em 1922 surgia a primeira grande dificuldade. O Liceu de Artes e Ofícios precisava ser reconstruído e a ABI, a toque de caixa, arranjou outro lugar. Aconteceu o absurdo dos absurdos. O general Silva Pessoa, comandante da Polícia Militar, amigo de Raul e de muitos outros jornalistas, ofereceu-se para alojar a ABI numa das alas do Quartel dos Barbonos, à rua Evaristo da Veiga. A idéia não foi bem recebida, porém encontrou esta justificativa por parte de Raul: “Só a urgência da mudança faria com que a Associação transferisse a sua sede social, ainda que provisoriamente, para uma dependência do Quartel da Polícia Militar, o que vinha repercutir no seu patrimônio moral, sobretudo em uma época em que a imprensa, num período de suspensão de garantias, vivia atormentada e angustiada com a censura, apreensão e suspensão de jornais e prisão de jornalistas, pois, à sombra do estado de sítio, praticavam-se atos inomináveis de ditadura policial”. Fernando dos Santos, que entrou para o quadro de funcionário da ABI em dezembro de 1924, nele permanecendo até 1971, afirmou que a diretoria era constituída por Pederneiras, presidente; Neto Machado, secretário; Ireneu Veloso, tesoureiro; e Carlos Rubens, bibliotecário. Numa só sala funcionavam: biblioteca, secretaria, reuniões e reportagem, a qual continuava nos mesmos moldes da existente no Liceu, sendo suprimidos, por falta de espaço, o restaurante e o bilhar. Raul fez das tripas coração para viver em harmonia com os seus generosos senhorios. A coexistência pacífica entre policiais e jornalistas, em regime de estado de sítio, não foi conseguida em nenhuma parte do mundo. E não seria no Brasil que este fenômeno iria ocorrer. Nem ali a ABI pôde ficar acomodada, porque, a pedido do ministro da Justiça a sua sede teria de mudar-se, e isto teria de ser feito, embora com sacrifício de seu patrimônio moral e material. Artur Bernardes não escondia o seu ódio pela imprensa. Mandava espancar jornalistas e fechar jornais. O Correio da Manhã foi um exemplo. O governo em
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Caricaturista e professor de direito, Raul Pederneiras fortaleceu a entidade e chegou a criar uma central de notícias, seguindo o sonho cooperativista de Gustavo de Lacerda. Mas também teve que aceitar uma sede dentro de um quartel da Polícia Militar ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
A associação contava com biblioteca, restaurante, bilhares, salão de estar etc. E diga-se que os últimos remanescentes da chamada boêmia literária, de há muito diluída, encontraram na nova sede da ABI um dos mais agradáveis pontos de reunião. Paula Ney havia morrido em outubro de 1897, Pardal Mallet, três anos antes. Patrocínio faleceu na mais extrema miséria a 29 de janeiro de 1905. Artur de Azevedo e Guimarães Passos desapareceram em 1909. Aluísio de Azevedo era cônsul do Brasil em Londres. Coelho Neto ocupava uma cadeira na Câmara Federal. Bastos Tigre, de há muito, andava às voltas com a publicidade comercial. Os moços que surgiam na imprensa, na fase da sua industrialização, viam a ABI como um ponto de encontro central e com relativo conforto. Pode-se dizer que Raul, na sua primeira presidência, deu 10 anos de rejuvenescimento a ABI, tamanha foi a movimentação e, sobretudo, o elevado número de sócios admitidos, aumentando, assim, a renda da Casa. Raul conseguiu arregimentar o que havia de melhor na imprensa para os hostes da sociedade trazendo, entre outros, M. Paulo Filho, Barbosa Lima Sobrinho, Gabriel Bernardes, Herbert Moses e Danton Jobim, que mais tarde seriam eleitos presidentes.
do Jornal do Brasil, onde trabalhou 52 anos, responsável, muito tempo, por uma charge, na primeira página. Assinava seu trabalho como Raul ou simplesmente com um R maiúsculo, colocando ainda, um pequeno cão ao lado. Foi um dos fundadores da Revista da Semana. Licurgo Costa e Barros Vidal, em História e evolução da imprensa brasileira, exaltaram a colaboração de Raul ao lado do barão de Tefé, fundador da Revista da Semana, a 20 de maio de 1900: “E, como encorajador dos seus esforços no sentido de que à nova publicação não faltasse matéria-prima para suas demonstrações de sensibilidade gráfica, encontrou Álvaro de Tefé em Raul Pederneiras o mais dedicado cooperador. Raul executou ilustrações para contos, desenhos, charges aos costumes, realizou a caricatura individual, tudo fez para que os processos sucessórios da reprodução pela litografia oferecessem matéria sugestiva, interessante.” No governo do Marechal Hermes da Fonseca viu suspenso o seu diário Última Hora, que fundara com Olegário Mariano, Casper Líbero e Luís Peixoto. Criou Kosmos, outra publicação das mais interessantes. Havia sido companheiro de Gustavo de Lacerda em O Paiz, embora não ○
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JOÃO GUEDES MELLO
permanente estado de sítio, tendo como Guarda de Honra, constituída por egressos das penitenciárias e recrutados nos basfonds, os famigerados Cravos Vermelhos, não via, com bons olhos, a permanência da ABI num quartel de polícia. Mais uma vez a entidade juntou os trastes e alugou o pardieiro n.º 24, da rua 1.º de Março (2.º andar), onde se alojou de qualquer maneira. O problema maior era a sobrevivência da Casa, ao léu dos acontecimentos que tumultuaram o país, ensangüentando-o. A ira de Bernardes recaiu sobre os militares e jornalistas altivos, deportando-os para a execrável Clevelândia e ilhas de Trindade e Fernando Noronha, sendo a primeira inabitada. Os jornais, com censura permanente. Homens de imprensa viviam seus piores dias, desde o advento da República, inclusive, no governo de Floriano Peixoto, que confinou jornalistas, escritores e militares nas selvas da Amazônia, onde muitos encontraram a morte. Raul, com mais de 50 anos, dos quais 30 vividos na imprensa, atormentado pelos problemas de sobrevivência da Casa, contraiu grave enfermidade que aumentou a sua surdez. Passava dias e dias na ABI sem ir à Faculdade de Direito, cujas aulas despertavam especial atenção. Aproveitava a ocasião para mostrar os malefícios dos prussianismo, apontando-o como elemento contrário à cultura. “Aí está o prussianismo desenhado pela propaganda e pela ação. Essa maléfica forma de conduta, pela honra das verdadeiras democracias, está no caminho do fim; a vertigem foi longa, mas já se desenha a alvorada promissora da paz entre os povos, a paz vitoriosa em todos os sentidos, a banir para sempre a obra satânica dos propagandistas do mal.” Falava o caricaturista, como o desassombrado professor de direito que defendia, antes de mais nada, a cultura e a liberdade do pensamento. Estes comentários que tanto impressionaram os nossos futuros juristas foram, posteriormente, coordenados no artigo O Prussianismo, publicado pelo Jornal do Brasil, em 1942, em plena II Guerra Mundial, quando Hitler revivia o prussianismo com o nazismo, levando a Alemanha à segunda derrota. O espírito democrático de Raul Pederneiras foi a rota da ABI em toda sua vida. Raul morreu a 9 de março de 1953, publicando seus últimos trabalhos na Revista da Semana. A vida de Raul marcou uma etapa do jornalismo brasileiro, exercido com dedicação, cultura, coragem e, o essencial, com devotado amor à democracia. Em A história da imprensa no Brasil, a admirável obra de Nelson Werneck Sodré, lançada em 1966, Raul aparece de corpo inteiro. Reuniu os melhores trabalhos publicados na Revista da Semana e no Jornal do Brasil, em dois álbuns, que apareceram, respectivamente, em 1924 e 1935, com o título Cenas da vida carioca, edições esgotadas.
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sinistra do Führer alemão. O comentador falou nos precedentes de Hitler e no que resultou de suas atitudes: tornou-se um caso de polícia. E comparou-o a Antônio Conselheiro, velho taumaturgo e chefe de uma horda de jagunços, que heroicamente resistiram ao cerco de numerosa força militar. Achei pouco feliz a comparação, que deprime a memória do maluco nacional, desde que é equiparado ao bandido que comanda os fanáticos germânicos. Hitler é um aventureiro sem escrúpulo, que vem enriquecendo à custa do sacrifício do povo do Reich, ainda crente em suas virtudes e em seu patriotismo. É um megalomaníaco, pretendente a tudo dominar, embora da humanidade fique, apenas, em torno dele um lençol de cadáveres. “Comparar Hitler a Antônio Conselheiro é, pois, macular a memória do valente e desambicioso chefe dos jagunços de Canudos. Comentando o discurso de um ministro na Hora do Brasil, em pleno Estado Novo, estranhou que fosse executada uma fantasia sobre o Hino Nacional, de Gottschalk, em arranjo para piano e banda
(De 1917 a 1918 e 1919 a 1920) Ao receber a ABI das mãos de Raul Pederneiras, em 1917, mal sabia João Mello que voltaria a dirigir os destinos da Casa em 1919 e 1920, quando entregaria, novamente, o bastão a Raul. João Mello nasceu na capital da Bahia, em 24 de setembro de 1869. Entrou para a imprensa diária do Rio de Janeiro como redator do Diário do Commercio, dirigido por José Avelino, em julho de 1891. Depois redator de O Tempo, de Frederico Borges; do Jornal do Brasil, sob a chefia de Fernando Mendes de Almeida; de A Notícia, de Oliveira Rocha; de O Século, de Henrique Blatte; da Cidade do Rio, dirigida por José do Patrocínio; de ATarde, de que acabou sendo um dos diretores; de A Tribuna, de Alcindo Guanabara; de O Paiz, dirigido por Quintino Bocaiúva, de cuja redação fez parte desde dezembro de 1900 até fim de agosto de 1905. Em 1.º de setembro de 1905 ingressou na redação do Jornal do Commercio, que fundado a 1.º de outubro de 1827 e era impresso na oficina da rua da Alfândega, 17, sendo o prelo movimentado a braço, por seis negros. De mão em mão o jornal caiu na propriedade da família Villeneuve até 1890, quando passou para José Carlos Rodrigues, seu antigo cronista de Nova Iorque, com colaboradores do porte de barão do Rio Branco, Olavo Bilac, Coelho Neto, Emílio de Menezes e outros. Em 1915, quando ficou sob controle de Antônio Pereira Botelho, que o transferiu, em 1923, a Félix Pacheco e Oscar da Costa, o repórter João Mello já ali trabalhava há um decênio, sendo portanto, um dos mais velhos do Jornal do Commercio. Ao assumir a presidência da ABI, em 1917, contava 48 anos de idade. Tinha algo de semelhante com Gustavo de Lacerda, de quem foi companheiro em O Paiz. Humilde, pouco participava das rodinhas literárias às portas dos cafés e livrarias. Desde jovem manifestava tendência política que pendia para o nacionalismo. A partir de 1938 criou a seção Rádio, no Jornal do Commercio, assinando seus trabalhos, de larga repercussão, apenas com a letra M. Ficou famoso seu artigo Uma comparação infeliz, onde condenava o paralelo feito por um locutor de BBC, que colocava no mesmo pé de igualdade o nosso modesto Antônio Conselheiro, de Canudos, e o então senhor do mundo, Adolf Hitler: “Sou apreciador de Bento Fabião, palestrador brasileiro da BBC, de Londres”, escreve João Mello. “Nas terças-feiras, regularmente, e em outras oportunidades, o locutor patrício difunde excelentes comentários. Como eu, há por aí muitos radiouvintes que estimam sua prosa ágil, espirituosa, reveladora, a todos os instantes, de uma grande reserva de bom senso. É um locutor que honra a classe, com o qual, quase sempre, os ouvintes são levados a concordar. Escrevo aquele quase porque há dias discordei de parte de uma análise de Fabião, relativamente à pessoa ○
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político-partidárias. Exemplo vivo de dedicação à Casa fundada por Lacerda, não deixou de comparecer à sede um só dia, o que fazia, mesmo enfermo. Promoveu o Primeiro Congresso Brasileiro de Jornalistas, em 1918, quando viu aprovada a sua tese que criava a Escola de Jornalismo, item formulado no programa de Gustavo. Estabeleceu as famosas Palestras Jornalísticas assistidas sempre por elevado número de associados e eram proferidas por Azevedo Amaral, Carlos Fernandes, Júlio Lopes de Almeida, Pinto da Rocha e outros bons profissionais. João Mello, pela sua simplicidade, perdido num canto de jornal, em cujas colunas colaboravam os expoentes da vida nacional, em todos os setores, inclusive no comércio e na indústria, não tinha a popularidade de Raul Pederneiras e muito menos o prestígio político e social de Dunshee de Abranches, o que não o impedia de manter bem vivo o espírito de independência da Casa do Jornalista, não cansado de pleitear dos Poderes Públicos o respeito à instituição, já, então, considerada de utilidade pública, duas vezes, por decretos assinados, respectivamente, em 11 de julho e 10 de dezembro de 1917, e para cuja aprovação muito trabalharam Belisário, Raul e o próprio João Mello. Faleceu aos 89 anos de idade, a 20 de junho de 1958, numa clínica de cardíacos, cercado pelo carinho de vários bisnetos. Trabalhou 67 anos na imprensa carioca. No fim da vida, o Congresso Nacional aprovou uma mísera pensão mensal de mil cruzeiros para o velho repórter. A máquina burocrática do Ministério da Fazenda, dificultava o pagamento. João Mello foi chamado ao guichê e recebeu, pela primeira e última vez, três meses atrasados. Ao sair do Tesouro, em companhia de seu jovem colega Mário Barbosa, do Jornal do Commercio, num gesto de contentamento, esfregou as mãos e disse: “Que tal a gente comemorar com um vinho verde português...” Morreu tão pobre que o deputado Eurípedes Cardoso de Menezes pediu ao governo que revertesse a pensão à família. Um vereador conseguiu que a cidade homenageasse o velho jornalista, dando o seu nome a uma rua, em Campo Grande. Na verdade, nem era rua. Era um pedaço de estrada, quando a rua certa seria no Rio Comprido, onde Mello residiu mais de 30 anos. Hoje já não existe a rua João Mello. Homens como João Mello escreveram, no anonimato, a história do jornalismo brasileiro do alvorecer da república aos nossos dias, numa lição de altruísmo. Lamentavelmente, do I Congresso Brasileiro de Jornalistas, realizado a 9 de setembro de 1918, não ficaram anais. Mas a ABI tinha seu órgão oficial: Boletim Mundial, com redação e administração à rua 7 de setembro, 145, 1º andar. Os números 32,33 e 34 saíram dedicados exclusivamente ao congresso, instalado sob a presidência de honra do senador Fernando Mendes de Almeida, redatorchefe do Jornal do Brasil, decano dos jornalistas militantes. Um jornal da época falou do fausto
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O primeiro Congresso Nacional de Jornalistas, em 1918, defende a criação de um curso. A ABI é considerada de utilidade pública. Realizações de João Mello, presente todos os dias na sede da entidade ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
de música sob a batuta de um tenente. E censurou: “A audição foi deveras agradável, que me fez recordar um decreto, deste ano e deste semestre, em que se proíbe a execução do Hino Nacional, as variações sobre o Hino Nacional e, naturalmente, os arranjos sobre as variações do Hino Nacional. O que vale ao citado arranjo é que ele foi executado ao microfone do DIP.” João Mello foi extremado patriota, sem cair no ridículo de verde e amarelo de Afonso Celso, que intoxicou a minha geração com um falso “porque me ufano”. No outro dia, a Hora do Brasil esclareceu que o decreto estava em vigor. Isto mostrou o prestígio da coluna de Mello. As suas crônicas não eram agressivas, mas tinham o senso necessário para a devida consideração do público. Temperamento calmo, nunca alterando a voz, sua presença imprimia respeito. Baixo, gordo, um tanto corado, sem emprego público, com mais de cinqüenta anos de Jornal do Commercio, ganhando um salário de fome, fazia plantão, à noite, na redação, para perceber mais alguns mil-réis, reclamados para a sua manutenção. João Mello, durante suas duas administrações, foi um prodígio de trabalho, mantendo a ABI eqüidistante das lutas
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Jornal da ABI
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da reunião: “Revestiu-se de verdadeira imponência a sessão solene de abertura do 1.º Congresso Brasileiro de Jornalistas, no salão de conferências da Biblioteca Nacional. O aspecto da vasta sala era magnífico. Muitas senhoras: a maior parte dos cavalheiros de casaca. Estavam presentes inúmeros senadores, deputados. O presidente da República se fez representar. “O senador João Luís Alves, por delegação dos representantes dos estados, falou em nome da imprensa do interior, terminando a sua oração com um hino ao jornalista da província: “Mas, senhores, agora me relembro que estou falando em nome da imprensa dos estados e que ela é parte da imprensa nacional, não ficando bem elogio em boca própria. Lá o jornalista é - muitas vezes - redator, tipógrafo, revisor, paginador, impressor e distribuidor.” No relatório referente à sua primeira administração, João Mello confessou que gastou com um dos maiores congressos de jornalistas realizados no Brasil a importância de pouco mais de mil e oitocentos mil-réis, e apresentou depósitos no Banco da Província do Rio Grande do Sul e na Caixa Econômica. Dois fatos corriqueiros falam de sua vida. Por ocasião de uma calamidade pública, o ministro da Justiça, Carlos Maximiliano, entregou dez contos à ABI para que o dinheiro fosse distribuído entre os necessitados nos subúrbios. João Mello desincumbiu-se da missão, pessoalmente, prestando contas do último vintém. O relatório que enviou ao ministro da Justiça revela uma peça de edificante humanismo e honestidade. De outra feita, o Cine-Palais comunicou que a carteira da ABI não dava mais direito a ingresso naquele cinema, porém mandou dez permanentes para distribuição entre os diretores. A resposta de João Mello é outro documento de altivez: “Continua acreditada a nossa carteira de jornalista, visto que a diretoria só a dá aos profissionais em atividade. Recusamos os cartões permanentes porque não podemos concordar com a desvalorização daquele nosso documento, em muitos casos mais sério como carteira de identidade do que as carteiras de oficiais.”
Independência e valores éticos na gestão de Dario de Mendonça impedem a doação de um terreno para o Retiro dos Jornalistas: era um golpe do doador para escapar da falência ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
ABI. Seu trabalho limitou-se aos serviços internos, não tendo maior realce. Na sua administração estourou o chamado escândalo da Chácara das Palmeiras, do qual o Jornal do Commercio, de 17 de abril de 1919, publicou longo memorial, sem assinatura, pedindo uma assembléia geral para tratar do assunto, e do qual destacamos os seguintes trechos: “Dada a situação atual, em que, para possuirmos definitivamente o terreno da Chácara das Palmeiras, só é necessário lavrar a escritura de doação, formalidade que o doador tem o maior interesse em ultimar; nesta situação, dizer que não se aceita o donativo eqüivale a alienar o patrimônio social, e aliená-lo sem vantagem e com desprestígio da instituição é atirar pela janela, num momento de insônia, o móvel riquíssimo que tanto nos custou a entrar em casa pela porta da rua. Sabe o ilustre sr. presidente que o artigo 38 dos nossos Estatutos estabelece que os fundos do patrimônio ‘não podem ser alienados, arrendados ou hipotecados’, senão por dois terços de votos de uma assembléia geral extraordinária, que para este fim, expressamente anunciada em todas as folhas desta capital, será convocada pela diretoria, com antecedência de 15 dias, pelos menos de sua reunião e de acordo com o disposto no capítulo VII.” “A Associação Brasileira de Imprensa, reunida em assembléia geral extraordinária, não aprova a proposta do sr. Eustáquio Alves, na sessão de diretoria de 15 de abril de 1919, no sentido de se declarar que ela não aceita de proprietário da Chácara das Palmeiras, no Riachuelo, o grande terreno e a casa em ruínas que ali há, doados pelo mesmo para a construção do Retiro dos Jornalistas. Esta assembléia geral entende que desprezar aquele donativo, que não vale menos que vinte contos de réis, equivale a abrir mão de fundos do patrimônio social. É um ato inconveniente, descortês, ilegal e prejudicial.” O caso vinha desde o ano anterior. Um esperto cidadão, à beira da falência, ofereceu uma chácara no Riachuelo e um terreno para ser edificado o Retiro dos Jornalistas, desde que a ABI conservasse a capela existente e não fosse divulgado o nome do doador. Tinha mais. AABI pagaria ou conseguiria o perdão de uma dívida de imposto que agravava a propriedade, da ordem de 48 contos, quando o terreno não valia 20. Depois que obteve a aprovação da planta, o proprietário deu o golpe. O
DARIO DE MENDONÇA (De 1918 a 1919) Eleito para o ano social de 1918-1919, já havia sido três vezes vice-presidente, na diretoria que findou o mandato. Pertencia ao Jornal do Commercio, para cuja redação entrou em 1912. Fundou A Comarca, em Valença, e trabalhou em vários jornais de São Paulo e colaborava em A Atualidade, em Gazeta, do interior fluminense, e no Resistente, de São João Del-Rey. Redator-chefe de O Economista e de outros jornais, repórter credenciado na Sala de Imprensa do Catete, amigo de João Mello, não teve maiores dificuldades em vencer a eleição. Assumiu a presidência com 47 anos. Participou do 1º Congresso Brasileiro de Jornalistas, como vice-presidente da ○
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Especial 90 anos
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terreno não tinha mais as dimensões oferecidas. Era, agora, uma nesga de terra com 101 metros de frente com 125 de fundos. O embuste foi desmascarado. A diretoria da ABI não aceitou a dádiva, o bastante para provocar aquele manifesto dos associados. A discussão derramou-se pelos jornais e o prestígio da ABI ressentiu-se. Tomou o sentido de luta eleitoral, quando todos os recursos são usados. A ABI, infelizmente, estava cheia de adventícios, egressos fracassados de outras profissões. Daí certos processos incompatíveis com o nível cultural da classe, postos em prática por um pequeno grupo, sempre derrotado nas eleições. A questão da Chácara das Palmeiras foi explicada e a chamada oposição, mais uma vez, sentiu que não tinha chance no pleito eleitoral à vista. A eleição seria no dia 27 e o manifesto saiu a 17. “Isto é uma reles advocacia administrativa”, gritou o procurador Eutáquio Alves. E completou: “Não assino esta imoralidade, negociata indecorosa.” Aproximavam-se as eleições num clima dos mais hostis. A arma da oposição era o Retiro dos Jornalistas jogado pela janela... A ABI contava com 740 sócios, dos quais 503 em atraso. Quinze foram demitidos por falta de pagamento, inclusive, dois signatários de ata de fundação, em abril de 1908, quando o certo seria lhes conceder título de sócio benemérito. Dos 237 sócios em condições de votar, mais de 100 apoiavam João Mello. Um grupo de associados, 48 horas antes do pleito, resolveu escolher João Mello para presidente. E o repórter do Jornal do Commercio, mais uma vez, dirigiu a ABI, de 1919 a 1920, quando passou a presidência a Raul Pederneiras. Dario de Mendonça faleceu a 9 de janeiro de 1932. O Jornal do Commercio fez o necrológio nas sociais, dizendo que o “companheiro era muito estimado e ao seu sepultamento compareceram o ministro Lindolfo Color, do Trabalho, seu amigo pessoal, Herbert Moses, João Luzo e João Mello, seus companheiros de redação”. Vinte anos de pé-de-boi no Jornal do Commercio e apenas 15 linhas de pesar. Pobre Dario Mendonça!
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BARBOSA LIMA SOBRINHO (De 1926 a 1927, de 1930 a 1931, 1978-1980, 1980-1982, 1984-1986) Raul terminou o mandato a 13 de junho de 1926, depois de dirigir os destinos da Casa por sete anos. O novo presidente foi Barbosa Lima Sobrinho, que tinha como companheiros de diretoria, entre outros, M. Paulo Filho e Alfredo Neves, futuros presidentes. Raul, no discurso de despedida, evocou Gustavo: “Um dia, pequeno número de homens de imprensa lançou a pedra inicial desta Casa. À testa achava-se Gustavo de Lacerda, que a ingratidão do meio nunca deixou passar da condição de repórter modesto, quando possuía ele cultura e descortino para maiores e melhores
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conquistas. “Muito tempo lutamos contra a má vontade de donos de jornais, que julgavam impossível uma associação de que participassem jornalistas de empresa antagônicas, quer em matéria política, quer em assuntos de caráter pessoal. “É difícil ou impossível, em matéria de gestão, contentar todo mundo. Assim vemos, como temos visto sempre, que as vozes contrárias, quando injustas, são abafadas pela eloqüência dos fatos concretos, quando justas, acoroçoam e provocam a ação, melhor orientada pelas sugestões que se oferecem. Assim se vence em qualquer luta, porque vencer sem perigo é triunfar sem glória. A bondade dos sufrágios quatro vezes nos colocou à testa do nosso grêmio, com pequenos intervalos e da última vez tivemos quatro anos seguidos, num terremoto de dúvidas, de incertezas, de vicissitudes; algumas horas de bonança.” Barbosa Lima Sobrinho iniciou sua carreira de jornalista no Recife, onde colou grau de bacharel em 1917. Nasceu a 22 de janeiro de 1897. Colaborador do Diário de Pernambuco, e principalmente no Jornal do Recife, com uma crônica dominical de 12 de outubro de 1919 a 3 de abril de 1921. Ao assumir a presidência da ABI, com menos de 30 anos, era redator-chefe do Jornal do Brasil, onde trabalhava desde abril de 1921. Moço, dono de extraordinária força de vontade, com elevado espírito associativo, Barbosa tinha uma meta ao substituir Raul Pederneiras: servir à classe. A nação voltava aos dias de inquietação vividos no tempo de Bernardes. O presidente Washington Luís seguia política surda ao clamor público, governando de uma torre de marfim, sem perceber os descontentamento que iam crescendo, valendo-se da incompreensão dos governos. Dinâmico e contando com o apoio da diretoria, inclusive de João Mello, que era o vice, Paulo Filho, procurador, Barros dos Santos, tesoureiro, convocou uma assembléia geral para reformar os estatutos, regulamentou a concessão da carteira e título de sócio, estabeleceu intercâmbio com as associações de imprensa dos estados, criando-se, desta maneira, um elo entre os jornalistas brasileiros. Atraiu novos valores para a ABI, na certeza de que, em breve , os quadros seriam renovados. Exercendo influência na antiga prefeitura do Distrito Federal, da qual o Jornal do Brasil era órgão oficial, reiniciou as démarches para obter a escritura definitiva do terreno doado à ABI pela prefeitura, para a sua nova sede social, num pedaço de Morro do Castelo, que há anos vinha sendo demolido. Existiam sobre o assunto duas leis dúbias de 1921 e 1922. Baseado num parecer contrário do procurador Miranda Valverde, Adolfo Bergamini, interventor no Distrito Federal, não dava solução ao caso. Note-se que Bergamini era jornalista, tendo participado do primeiro congresso da classe em 1918. Todavia, em face dos obstáculos criados pela máquina burocrática da municipalidade, apoiada num documento várias vezes contestado, o caso do terreno caiu em ponto morto. Barbosa Lima não desistiu. Voltou ao
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assunto e o processo foi desarquivado. Meio caminho andado para a ABI ter sua atual sede na esplanada do Castelo. Ao terminar o seu mandato, em 1927, quando foi eleito Gabriel Loureiro Bernardes, não escondeu o seu desencanto: “Há uma ilusão curiosa a respeito da Associação Brasileira de Imprensa. Acreditam todos que ela possui elementos de incomparável prestígio, por ser um núcleo de jornalistas e por se presumir que a favor da Associação se manifeste a força irresistível da publicidade. Eis um engano completo. Se há uma sociedade sem prestígio junto ao jornalismo é a sociedade de jornalistas. Mais facilmente conseguiremos publicar nas gazetas a notícia de um clube carnavalesco do que o relato sumário e impessoal dos nossos trabalhos. “Junte-se à quase inacessibilidade da divulgação, a constância e a minuciosidade da crítica. Os menores atos desta Casa são investigados sem espírito de tolerância. Como se não bastassem esses obstáculos, temos ainda que vários dos nossos consócios desejam que a Associação seja para eles como que uma caixa de repercussão de suas atitudes. Se a Associação cede a esses intentos, embaraça-se num cipoal de interesses e de paixões; se resiste, desagrada o solicitante que por isso lhe moverá guerra. Creio que esses fatos são comuns a todas as sociedades. Uma circunstância, porém, se destaca e agrava em nosso caso particular: é que somos uma associação onde as menores divergências se ostentam livre e espetacularmente pela publicidade. Eis porque o principal encargo de uma diretoria será menos administrar do que atenuar e reduzir esses conflitos, resolver os incidentes pessoais, amansar a reação das vaidades feridas, fornecer favos de mel aos melindres...” Eleito presidente para um segundo mandato na ABI (1930-1932), seu primeiro cuidado foi cogitar de uma boa instalação para a nossa entidade que, na ocasião, tinha a sua sede na rua do Rosário, depois de haver ocupado um segundo andar na rua 1.º de Março. Foi, então, que vagou o primeiro andar na rua do Passeio, em que até então havia funcionado o Clube dos Democráticos, que ali realizava os seus bailes extraordinariamente concorridos. Alguns diretores visitaram o local achando-o excelente, e a ABI não demorou em fechar o contrato de locação. O bibliotecário, que era o escritor e poeta Carlos Dias Fernandes, não contendo o seu entusiasmo, exclamou, com a voz poderosa que o caracterizava: - Aqui caberiam os exércitos de Xerxes! Barbosa Lima passou a considerar o problema da unidade da classe de jornalistas. Havia, naquele tempo, além da ABI, duas outras entidades: o Clube da Imprensa e a Associação da Imprensa Brasileira. A primeira contava com o grande prestígio da família Motta Lima, com os irmãos Rodolfo e Pedro, e com seu presidente, que era Carvalho Neto, em plena atividade na chefia da redação de A Noite. A Associação da Imprensa Brasileira, fruto de uma dissidência numa das eleições da ABI, tinha à sua frente um médico baiano muito atuante, Alvim Horcades. A presença ○
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das três entidades prejudicava a ação de todas. Bastava uma delas tomar uma atitude e corria o risco de se ver desautorada pelas outras. Barbosa Lima ficou muito impressionado quando, por ocasião de um congresso de História do Brasil, ao verificar que a ABI não recebera nenhum convite, tomou a liberdade de indagar a razão dessa ausência, e Max Fleiuss, secretário perpétuo do Instituto Histórico respondeu que havia três associações de Imprensa e não sabia a qual delas deveria dirigir o convite. Isso levou o presidente a pensar que a perplexidade dele deveria ser generalizada, transformando-se em perda de prestígio e de significação para toda a classe de jornalistas. Resolveu, então, lutar pela unidade da classe e foi procurar Carvalho Neto e Alvim Horcades, propondo a união das três entidades numa só que, pela antigüidade, bem poderia ser a ABI. E, para que não houvesse nenhum constrangimento, propôs que todos renunciariam aos ○ ○ ○ ○ ○ ○ cargos que e x e r c i a m , acompanhados das diretorias a que pertenciam, organizando-se, então, uma nova diretoria, por comum acordo entre os três presidentes das diretorias que representavam. O plano foi aceito, redigiu-se um protocolo e, por comum acordo de todos, foi escolhido o futuro presidente da ABI rejuvenescida, como candidato unânime, o então diretor-tesoureiro ○ ○ ○ ○ ○ ○ de O Globo, Herbert Moses. Mas no acordo figurava uma condição, que seria a eleição dos três presidentes resignatários para membros natos do conselho administrativo da nova ABI. Na assembléia geral para a aprovação do acordo, o nome de Alvim Horcades foi combatido por uma numerosa corrente que o conseguiu vencer. Carvalho Neto e Barbosa Lima Sobrinho foram eleitos membros natos da ABI. E essa exclusão criou uma situação difícil. Barbosa Lima Sobrinho empenhou-se quanto pôde pela eleição de Horcades. Mas, uma vez derrotado, não queria que se pudesse pensar que tivera qualquer responsabilidade pela derrota que atingira Horcades. E para isso só encontrou uma solução, que seria também o seu afastamento da ABI, não tomando posse no conselho. Manteve-se afastado enquanto viveu Alvim Horcades, em testemunho de sua solidariedade. O golpe de estado de 1964 trouxe-o de novo à nossa velha entidade. Barbosa Lima compreendeu que estava em causa a necessidade da unidade de toda a classe. No longo período em que estivera afastado da ABI, não via razão para combatê-la. Também não fazia restrições a Herbert
Moses que soubera atravessar períodos difíceis, sempre interessado na sorte dos jornalistas, como defensor da liberdade de imprensa. O que mais prestigia a ABI é a certeza de que, em todos os tempos, ela sempre lutou em favor da classe e em prol da liberdade de imprensa, com uma tal continuidade e persistência que nos dá o direito de esquecer os nomes de seus dirigentes, para pensar, apenas, na firmeza de um corpo social que impõe a todos a defesa dos nossos ideais. A ABI, temporariamente, perdeu Barbosa Lima, já colaborando nos maiores jornais do país. Dedicou-se mais à imprensa e à literatura, com incursões pela política. Sufragado deputado federal por Pernambuco para o triênio 1935-1937, foi em seguida eleito membro da Academia Brasileira de Letras, ocupando a cadeira de Teixeira de Melo, da qual Casimiro deAbreu é patrono. Presidente da ABL, em 1953, foi reeleito no ano seguinte. Deputado à ○ ○ ○ ○ ○ ○ Constituinte, em 1946, renunciou à cadeira para tomar posse do cargo de governador de Pernambuco. Mais uma vez eleito deputado federal, jamais deixou o jornalismo, sempre no Jornal do Brasil. Professor de História Econômica na Escola de C i ê n c i a s Econômicas Amaro Cavalcanti, e membro de diversas sociedades científicas e literárias, ao largar o governo de Pernambuco, em ○ ○ ○ ○ ○ ○ 1951, mergulhou fundo nos angustiantes problemas do povo, tornando-se, sem favor, um dos mais destacados líderes das campanhas nacionalistas, lutando de peito aberto contra os trustes estrangeiros que asfixiavam a economia nacional. É autor de dezenas de trabalhos, assim divididos: LITERATURA - Árvores de bem e do mal, Rio, 1926; O vendedor de discursos, São Paulo, 1933; Recepção na Academia Brasileira de Letras, 1938; Recepção de A. Carneiro Leão na Academia Brasileira de Letras, A língua portuguesa e a unidade do Brasil, Editora José Olímpio, 1958; A timidez de Machado de Assis; Antônio José, o judeu, e o teatro do século XVIII; Sílvio Romero e reação anti-romântica; O conto urbano; O jornalismo e a literatura; Euclides da Cunha e a Academia; Euclides da Cunha, sociólogo. HISTÓRIA - Centenário do tratado de paz argentino-brasileiro; Pernambuco e o rio São Francisco; A Bahia e o rio São Francisco; O devassamento do Piauí; A verdade sobre a revolução de outubro; A ação da imprensa na primeira constituinte; O centenário da chegada de Nassau e o sentido das comemorações pernambucanas; A Revolução Praieira; A
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comarca do rio São Francisco; Capistrano de Abreu, historiador; Artur Jaceguai; Prefácio sobre a questão religiosa no Brasil e a colonização portuguesa; Conferência sobre a República de Piratinin e Evaristo da Veiga; Aspectos do sebastianismo no Brasil; Ensaio e estudos sobre Oliveira Lima e Entre o romance e a história; (A Época das Rosas) Mitre e a unidade argentina; A função e a história do rio São Francisco; O Amapá e o Brasil, Diogo Grasson Tinoco; O cônego Fernandes Pinheiro e o Judeu e outros; Guerra dos mascates, Universidade do Recife e Alexandre José Barbosa Lima (discurso parlamentares); Pernambuco, da Independência à Confederação do Equador. DIVERSOS: O problema da imprensa; Interesses e problemas do sertão pernambucano; A responsabilidade pelo dissídio político em Pernambuco; Problemas econômicos e sociais da lavoura canavieira; Álcool-motor; Oito anos de administração no Instituto do Açúcar e do Álcool; Mensagens à Assembléia Legislativa de Pernambuco (em 1948 e 1950); Discursos, Recife; A nacionalização dos seguros; Cuba e o dever do Brasil; Discursos do centenário de nascimento de Alexandre José Barbosa Lima; A experiência de uma reforma agrária setorial; Máquina para transformar cruzeiros em dólares; Estados Nacionalistas. DIREITO: O regime dos bens dos súditos inimigos; A ilusão do direito de guerra; Questões do direito eleitoral; As transformações da compra e venda; Constitucionalidade do imposto de cessão; Artigos na revista de Direito Administrativo; Em defesa da autonomia do município do Recife; Sistemas eleitorais e partidos políticos; A nacionalidade da pessoa jurídica; A autodeterminação e a não-intervenção.
Com menos de 30 anos, Barbosa Lima Sobrinho é o mais jovem presidente da ABI. Começa a luta pelo terreno da atual sede no primeiro mandato. No segundo, consegue uma boa sede e unifica todas as entidades de jornalistas em torno da ABI
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Barbosa Lima Sobrinho passou o mandato a Gabriel Bernardes, em 1927.
GABRIEL BERNARDES (De 1927 a 1928) Assumiu a presidência da ABI em junho de 1927, com o mandato de um ano. Membro de uma família de juristas, Gabriel Bernardes entrou para sócio da Casa em 9 de maio de 1922, por proposta de Rubens Braga e Joaquim Rodrigues, na qualidade de redator da Gazeta dos Tribunais. Seus companheiros de diretoria foram Jarbas de Carvalho, vice; Raul Borja Reis, primeiro-secretário; Custódio de Almeida, segundo-secretário; Alberto Figueiredo Pimentel, terceiro-secretário; Herbert Moses, primeiro-tesoureiro; Luís Jordão, segundo-tesoureiro; Carlos Rubens, primeiro-bibliotecário; Adolfo Bergamini, procurador; e Alencastro Guimarães, subprocurador. A ABI funcionava na rua do Rosário n.º 172, ao lado da sede de A Vanguarda, matutino de Oséas Mota. Ao receber o cargo das mãos de Barbosa Lima Sobrinho, em 1926, abordou ○
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Jornal da ABI
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abril de 1919, rejeitando a oferta, não foi aprovada pela assembléia geral, anunciada através de manifesto divulgado pelo Jornal do Commercio. Moses não via obstáculos. Recebeu duas subvenções, por adiantamento, vendeu algumas apólices da dívida pública da União, mobilizou amigos e arrumou a sede, malgrado a má vontade de alguns associados. A oposição crescia e os atritos chegavam às brigas corporais: Gabriel Bernardes, magistrado dos mais conceituados, tenta harmonizar as correntes, promovendo várias reuniões. Tudo em vão. Moses não parou. Comprou mais poltronas e mesas, tapetes e cortinas. Isto aumentou a cisão. Moses sentenciava: “Os sócios precisam de conforto. Chega de pardieiros.”(Rua da Assembléia, 1.º de Março, rua do Rosário, Quartel de Polícia etc.) O presidente, homem com sensibilidade à flor da pele, tem momentos de desânimo. A renda diminuía e a oposição atingia as raias da intolerância, com incidentes dos mais desagradáveis. Estes episódios chocavam Gabriel Bernardes, animado dos melhores propósitos, empenhado em resolver problemas dos mais importantes como a legalização do terreno, o restabelecimento dos descontos das passagens, combates à Lei de Imprensa etc. Fez o que pôde, com denodo e sacrifício da sua própria saúde, já abalada. Passou o cargo, em 1928, a M. Paulo Filho, redator-chefe do Correio da Manhã, eleito num pleito dos mais disputados. Gabriel Bernardes faleceu em Teresópolis a 1.º de março de 1935, como diretor de O Jornal, o líder da cadeia dos Diários Associados. Foi um homem que sempre desdenhou as posições políticas, muito embora elas estivessem ao seu alcance. Acompanhou, durante muitos anos, o senador Paulo de Frontin, e muito trabalhou pelo Distrito Federal e pelo país. Na Aliança Liberal foi um dos vanguardistas da campanha. E quando o movimento culminou com a vitória da revolução de outubro de 1930, a ele coube a tarefa mais árdua, no Rio; restabeleceu a ordem após a deposição do presidente da República . Foi, assim, por alguns dias, o ministro da Justiça da Junta Governativa, que passou o poder às mãos de Getúlio Vargas. Havia, na ocasião, o delírio natural da vitória e Gabriel Bernardes, como ministro da Justiça, restabeleceu a ordem e a tranqüilidade públicas, impondo o respeito e a confiança na ação dos novos governantes do país. Tivesse tomado posse horas antes e teria evitado os incêndios que destruíram O Paiz, a Gazeta de Notícias, A Noite, A Crítica, A Vanguarda e outros jornais. Da sua atividade jornalística nada é preciso dizer. Basta essa obra que ele ajudou a erguer, com a sua energia moça e toda a sua dedicação aos Diários Associados. Como jurista deixou nos seus luminosos pareceres e em inúmeros arrazoados sua mais brilhante obra. Desempenhou as funções de procurador dos Feitos da Fazenda Municipal do Distrito Federal. Figura de destaque nos meios intelectuais e culturais, por isso mesmo ocupava posição de relevo no Instituto dos Advogados e outras entidades de cultura.
Preocupação com a sede, abatimento nas passagens para jornalistas e muita luta interna na gestão de Bernardes ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
os problemas fundamentais da classe: “Assim, a mudança imediata da nossa sede, que para aqui veio, de fato, em caráter provisório, não pode deixar de ser a primeira preocupação da nova diretoria, que procurará também instalá-la com conforto, embora sem luxo, e adaptá-la melhor a uma série de utilidades para os nossos associados e para a imprensa em geral, fazendo da sua sede um centro facultativo de informações interessando a todo os jornais. “Outro ponto que terá nossa atenção cuidadosa será o de legalizar a situação jurídica do terreno que nos foi doado pelo Conselho Municipal desta cidade, para nele edificar a sede definitiva da Associação de Imprensa. “Como sabem quantos se interessam pelos nossos negócios, o prefeito Alaor Prata, após promessas, deixou sem limites a área desse terreno. O ex-presidente Barbosa Lima Sobrinho não descurou do assunto e fez magnífica réplica às evasivas do Prefeito; cabe agora a nós prosseguir no caminho das negociações amigáveis junto ao atual governador da cidade, Sr. Antônio Prado Júnior, de quem, tudo leva a crer, será fácil obter o reconhecimento do bom direito que assiste à Associação Brasileira de Imprensa. “Também não pode esta diretoria retardar-se no prosseguimento dos trabalhos que já estão começando junto ao Congresso Nacional e ao governo, para o restabelecimento do favor legal do abatimento nas passagens das estradas de ferro da União, para os sócios que exibem carteira desta Associação, favor esse que, por equívoco, não figura no orçamento relativo ao exercício atual.” Gabriel Bernardes, muito sóbrio e, por temperamento, calado, achava, todavia, que os móveis da ABI não eram dignos da Casa. Não havia uniformidade. Mesas claras e pretas, armários e estantes comprados de segunda mão, enfim, um mobiliário que não atendia, em absoluto, ao bom nome da sociedade, agora melhor instalada e recebendo visitas ilustres. Moses, com facilidades de crédito no comércio, deu roupa nova à ABI. Os trastes vendidos não renderam cinco contos. Moses começou a ser o vendaval. A sede modesta, mas condigna, e os móveis modernos não agradaram a um grupo de sócios, sobretudo quando foi tornado público que os gastos atingiram 97 contos. Novos desentendimentos, com a saída de inúmeros associados. A tempestade maior foi provocada pela venda do terreno do Retiro do Jornalistas, ante o parecer do procurador Adolfo Bergamini, firmado a 6 de abril de 1926. O valor: 120 contos. Chegou-se à conclusão de que a decisão da diretoria de Dario de Mendonça, a 15 de ○
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Especial 90 anos
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social da ABI. Homem de jornal, conhecendo todos os seus problemas, não conseguiu realizar o seu intento: pacificar a família jornalística. Os ânimos ainda estavam agitados e o governo Washington Luís fazia pressão sobre o Correio da Manhã, que estivera suspenso de agosto (De 1928 a 1929) de 1924 a maio de 1925, como conseqüência Foi o presidente que substituiu da falta de garantias imposta pelo estado Gabriel Bernardes, com o mandato previsto de sítio de Artur Bernardes. O Catete não via com bons olhos a para 1928 a 1929. Herdou um triste legado: a desunião da classe, embora a mesma presença de Paulo Filho na ABI. vivesse período de paz na gestão de Hostilizava-o, certo de que atingia, também, Barbosa Lima Sobrinho. a fabulosa figura de Edmundo Bittencourt, Manuel Paulo Teles de Matos Filho, fundador do Correio da Manhã e do qual na imprensa e na literatura era mais Paulo Filho foi uma das colunas mestras. conhecido por M. Paulo Filho e por João Edmundo era indomável. Nascido no Paraguaçu, pseudônimo de longa data. Ele Rio Grande do Sul, depois de trabalhar ao mesmo, no seu livro de memórias, explicou lado de Silveira Martins e Rui Barbosa, a razão de adotar a suposta designação fundou o Correio da Manhã a 15 de junho Paraguaçu: de 1901, com material adquirido de A “É um rio que banha, às vezes Imprensa. inunda, a minha terra natal, Cachoeira do A ira dos governantes contra Recôncavo Baiano. Contemplando-o e Bittencourt não tinha limites. O seu valente mergulhando constantemente em suas jornal esmagava O Paiz, abjeto, serviçal de águas, lá deixei a melhor parte de minha todos os governos, enquanto o Correio vida, que foi a de minha infância. Não da Manhã via crescer o seu prestígio nas consigo esquecê-lo. Era natural que o camadas populares. João Lage, diretor de trouxesse para este livro de recordações.” O Paiz, desafiou Edmundo Bittencourt para Nasceu naquela cidade pioneira das um duelo. A resposta foi fulminante: “Não lutas da Independência, que o governo aceito! O desafiante é um crápula. Não tem imperial condecorou com o título de idoneidade moral. ” heróica, a 22 de Anos depois, João ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ março de 1890. Ali Lage renovava o realizou o curso desafio. Nova primário na escola recusa: “É um do professor patife, o que não Loureiro e da qual impede de receber faz a caricatura umas chicotadas!” risonha, num dos Edmundo, capítulos do seu todavia, aceitou livro Tempos Idos. duelar com o Aprovado caudilho Pinheiro no vestibular, Machado, saindo matriculou-se na ferido. Faculdade de Paulo Filho Direito da Bahia, ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ esbarrou em cujo diretor, uma d i f i c u l d a d es figura venerada, intransponíveis, prejudicando o seu era o conselheiro Carneiro da Rocha, ministro liberal num dos últimos gabinetes trabalho à frente da ABI. Irritava-o o caso do terreno doado pela prefeitura e que da Monarquia. Naquela época, em 1909, Paulo Filho continuava na estaca zero, desabafando: “Se não o resolvo é porque a vitória fazia jornalismo. Foi um dos fundadores do Grêmio Lítero-Jurídico e redator do seu da nossa causa não depende órgão oficial, A Justiça. Pertencia, também, exclusivamente do meu carinho e do aos quadros literários de A Nova Cruzada. interesse a que me devoto pela sorte da Entrou para a redação do Diário da Bahia, ABI.” Fora da presidência, Paulo Filho então dirigido por Severino Vieira e Aurelino Leal. Em fevereiro de 1910 foi jamais deixou de participar da vida da ABI, nomeado promotor público no alto sertão como vice-presidente e conselheiro. Em da Bahia. Disso ele dá notícia 1929 foi designado diretor do Correio da pormenorizada nas Memórias de João Manhã, cargo que ocupou até a sua morte. Paraguaçu. Não se aclimatou no interior. Deputado pela Bahia à Assembléia Voltou para Cachoeira, onde pretendia Constituinte em 1933-1937, votou a advogar. Depois seguiu para Salvador. Constituição que seria derrubada pelo Embarcou a 2 de julho de 1911 para o Rio golpe de 1937. Fez parte das comissões de Janeiro. O primeiro emprego: escriturário técnicas dessa casa do Congresso, da Fiscalização do Porto do Rio de Janeiro. inclusive da de Finanças. Por convocação da ONU, Encaminhado, mais tarde, por amigos de representou a nossa Imprensa no seu pai, na Bahia, ao deputado e professor Leão Veloso (Gil Vidal), redator-chefe do Congresso de Jornalistas em Genebra, com Correio da Manhã, entrou para esse jornal, a presença de 75 jornalistas de todo o como repórter, no dia 11 de novembro de mundo. Foi um dos fundadores do Tribunal 1911, início de uma carreira das mais de Contas da Guanabara e seu procurador. brilhantes. Seis anos depois, pela mão de Foi professor catedrático de português, por Raul Pederneiras, ingressou no quadro concurso, da Escola Amaro Cavalcânti, presidente de Academia Carioca de Letras,
MANUEL PAULO FILHO
Diretor do Corr Correio eio Manhã, Paulo da Manhã Filho não contava com as simpatias do governo e enfrentava a desunião da classe.
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ALFREDO DA SIL VA NEVES SILV
sucessivamente reeleito para cinco mandatos e um dos presidentes do sindicato dos professores do antigo Distrito Federal. Sócio fundador e presidente do Instituto Histórico e Geográfico da Cidade do Rio de Janeiro, foi reconduzido em vários exercícios. Um dos maiores animadores da construção e do levantamento da estátua de São Sebastião que se acha na praia do Russell. Conferencista, novelista, ensaísta, crítico e historiador, colaborou em diversos jornais. Publicou livros, bem recebidos e aplaudidos pelos críticos, como Fronteira abandonada, longo estudo sóciogeográfico das condições do Brasil nos seus limites com os países vizinhos: Literatura e história, volume consagrado às investigações de crítica literária e histórica; Ensaios e estudos, que são capítulos de crítica de arte, literatura e história do Brasil e, em 1964, publicou Memórias de João Paraguaçu. Dois episódios vividos no decorrer do movimento militar de 31 de março de 1964 revelam a dignidade do antigo presidente da ABI. Um major intimou, pelo telefone, Paulo Filho a comparecer a um IPM qualquer. Paulo foi categórico: “O diretor do Correio da Manhã só presta declarações no seu gabinete. Procure a minha secretária para marcar hora.” De outra feita, a polícia resolveu prender, novamente, o velho jornalista Henrique Cordeiro, solto depois de passar longa temporada no fundo de um execrável cárcere policial, de onde saiu com a saúde abalada. Paulo Filho, do conselho administrativo da Associação Brasileira de Imprensa, saiu em defesa do colega ameaçado, de quem sempre discordou politicamente e, numa atitude que precisa ser conhecida pelos homens de imprensa, já que o fato permaneceu em sigilo, pediu a proteção do embaixador do Chile, sr. Marcelo Ruiz-Solar, em favor do principal redator da revista Problemas da Paz e do Socialismo, enviando-lhe uma carta: “Venho pedir-lhe para o colega constrangido o seu amparo e asilo, certo de que a mim mesmo fará um ótimo favor.” O asilo foi concedido imediatamente e o conselheiro da ABI, com 66 anos e pobre, unicamente pelo crime de ter uma idéia, amargou longo exílio no Chile. M. Paulo Filho faleceu a 16 de março de 1969, sendo o corpo velado no saguão do Correio da Manhã, uma sombra do jornal dirigido por Edmundo Bittencourt. Perseguido e sabotado pelo mundo oficial, o velho matutino, que foi uma das glórias da imprensa brasileira de há muito, sem o pulso forte de Paulo Bittencourt, não resistiu aos embates e pediu concordata, sendo depois decretada a falência e, por fim, os seus bens levados a leilão. Entre 1964 e 1977 desapareceram grandes jornais, bastando citar A Noite, Correio da Manhã, O Jornal, O Diário da Noite, Diário Carioca, Diário de Notícias, Diretrizes, Correio da Noite, O Radical, A Manhã, A Nação e revistas do porte de O Cruzeiro, Revista da Semana, Realidade, Flan, Noite Ilustrada, Carioca, Vamos Ler e outras tantas.
(De 1929 a 1930) Paulo filho entregou a ABI a Alfredo da Silva Neves, que exerceu o mandato de 1929 a 1930, sem dúvida, um ano social dos mais agitados, com a imprensa dividida em dois grupos distintos: os que apoiavam a Aliança Liberal, com a revolução à vista, destacando-se a atuação do Correio da Manhã, Diário de Notícias, Diário Carioca, O Jornal e o austero Jornal do Commercio, enquanto O Paiz, Vanguarda, Gazeta de Notícias, A Crítica, A Noite e poucos outros ficaram com o moribundo governo de Washington Luís. A exaltação entre os homens de imprensa atingia as raias do irracional. A honra do adversário era levada ao pelourinho. Alfredo Neves, que desde a última década do século passado fazia jornalismo, tendo começado a carreira na Reação, de Barra Mansa, em 1898, passando para O Paiz, em 1905, na condição de aprendiz de tipógrafo, encontrou sérias dificuldades para manter a neutralidade da ABI, ante o movimento político que agitava o Brasil, agravado com o assassinato de João Pessoa, verdugo transformado em herói nacional, no Recife. Moço pobre, trabalhava de noite em oficina gráfica e estudava de dia na Faculdade Nacional de Medicina, dando, ainda, plantões nos hospitais para aumentar a renda de 50 mil-réis, o quanto ganhava em O Paiz, onde privou com Gustavo de Lacerda. Ao assumir a presidência, Alfredo Neves, com 49 anos de idade, estava assoberbado de serviços concernentes às suas quatro atividades: médico, jornalista, político e funcionário público. Deputado estadual fluminense, ocupando a presidência da Assembléia em 1927; professor de medicina em várias faculdades e presidente de sociedade anônima de O Paiz, já às voltas com dificuldades financeiras insolúveis, agravada com a morte de João Lage, o gângster da imprensa oficiosa. A despeito do clima revolucionário que agitava o Brasil, Alfredo Neves conseguiu a neutralidade da ABI e defendeu jornais e jornalistas da pressão policial. Foi mais longe. Organizou uma comissão de juristas para defender os associados ameaçados. Diz o presidente ao terminar a sua administração: “Aqui dentro, o nosso pensamento, o nosso maior anseio deve ser o de nos aglutinarmos todos num só e sincero desejo, qual o de trabalharmos pela prosperidade crescente da ABI, cuja existência se vem arrastando sob as maiores dificuldades, justamente por freqüentes dissenções no seu corpo associativo. Demais, tudo faz crer que já nos tenhamos aproximado de uma situação material definitiva, perfeitamente compatível com a finalidade moral da ABI, na coletividade brasileira.” Alfredo Neves, que tanto lutou para manter a ABI fora das paixões partidárias viu, em seguida, o seu jornal, O Paiz, in○
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1927. A despeito do gabarito moral e intelectual do candidato, as eleições foram das mais agitadas. Venceu Barbosa Lima que saudou Alfredo Neves, declarando: “Se algum intuito me faz capitular diante do apelo do dr. Alfredo Neves, foi o desejo leal de congraçamento e de paz. Não quero outro programa. Não é outro o pensamento de meus dignos companheiros de diretoria. A eficiência de qualquer administração está subordinada a essa condição de paz e de harmonia, dentro de uma sociedade onde os embaraços são maiores que os recursos. Por isso não aceitaria a presidência desta Casa para diminuí-la em conflitos de que eu próprio fosse a causa. “Não esqueci, mesmo nesse momento, que somos uma sociedade cuja autoridade não corresponde aos elementos que a formam. E os culpados somos nós ou é a nossa profissão, que desenvolve em seu adeptos a faculdade de crítica e esquece comumente o senso de cooperação? Para evitar esses males, convém batalhar cada vez mais para que esta Associação se firme, como um campo neutro, onde devem morrer todas as divergências que alimentam a vida dos jornais. Aqui, não há partidos, não há religiões, nem preferências. Mas é preciso que cada um de nós colabore nesse esforço, policiando as nossas iniciativas e evitando, sempre e sempre, que por trás delas se dissimulem os nossos próprios interesses.” Meses depois, estourou a revolução de 30. Seguiu-se um rosário de crimes contra a imprensa, impossíveis de serem contidos ante uma multidão enfurecida, com o beneplácito do governo provisório que se instalava. A sede da ABI continuava na rua do Rosário. Alfredo Neves faleceu a 22 de junho de 1975.
Às vésperas de revolução, a maior preocupação de Alfredo Neves era impedir que as disputas políticas refletissem dentro da entidade ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
cendiado por uma multidão tomada de ódio. Hélio Silva, em A revolução traída, 3.º volume do Ciclo de Vargas, narra a destruição dos jornais governistas: “Lideres improvisados e conhecidos políticos aliancistas concitavam à baderna. Apareceram latas de gasolina que eram derramadas às portas do edifício, ateandose os incêndios. O edifício de O Paiz, construído com a própria avenida Central, em sua esquina com a rua 7 de Setembro, converteu-se num intenso fogaréu. Menores invadiam o prédio, arrancando os móveis, livros e coleções, espatifando tudo e jogando material para a fogueira. A Agência Americana, instalada em um dos andares superiores, A Notícia, mais além, na mesma avenida, a Gazeta de Notícias, na rua do Ouvidor, A Crítica, de Mário Rodrigues, A Vanguarda, de Oséas Mota, empilhadas e queimadas. A Noite, no edifício da praça Mauá que tem o seu nome, sofreu o vandalismo da revolução. O alto prédio foi tumultuado, os elevadores parados e um rico e lindo lustre que havia no hall desapareceu misteriosamente. Pelas ruas, estendiam-se passadeiras brancas de bobinas de papel de jornal. A polícia, impotente, omitia-se.” Professor emérito de inúmeras faculdades, dedicou-se de corpo à medicina, voltando, porém, ao jornalismo, para dirigir O Estado, de Niterói. Por concurso, ganhou um lugar de redator de debates no Senado Federal, chegando a chefiar a secretaria, de onde pediu licença, várias vezes, para cumprir missões confiadas pela revolução de 1930, inclusive secretário-geral do governo do estado do Rio de Janeiro, presidente do conselho administrativo, interventor federal e, por fim, senador, eleito em 1945. Jamais deixou de comparecer às reuniões do conselho administrativo da ABI, do qual era membro nato, sendo reeleito várias vezes, vice e secretário. Meses antes de terminar o seu mandato, sugeriu o nome de Barbosa Lima Sobrinho para substituí-lo na ABI, indicação que encontrou a maior receptividade, sobretudo pelo fato de se ter revelado um grande presidente, na gestão 1926-
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Jornal da ABI
MOSES E A ARTE DE CONCILIAR OS INTERESSES DE JORNALISTAS,PATRÕES E TAMBÉM DO GOVERNO Barbosa Lima Sobrinho presidiu a última reunião da diretoria, a 29 de abril de 1931, quando renunciou. Seu mandato terminava em maio de 1932. Na sessão extraordinária do conselho administrativo de 23 de maio de 1931, sob a presidência de Alvaro Moreyra, Herbert Moses foi eleito presidente, com 25 votos. Um grupo queria Ernesto Pereira Carneiro, do Jornal do Brasil. O outro, Oscar da Costa, do Jornal do Commercio, que foi logo queimado, por ser português. A diretoria ficou assim constituída: ○ ○ ○ ○ ○ ○ Moses, presidente; João Mello, vice; Costa Rego, primeiro-secretário; Pascoal Ferrone, tesoureiro; Carlos Manhães, bibliotecário; e Edmir Pederneiras, procurador. O sistema eleitoral da ABI é diferente das eleições sindicais. ○ ○ ○ ○ ○ ○ Os sócios elegem o c o n s e l h o administrativo, composto por 45 membros e, anualmente, renovado em um terço, juntamente, com a comissão fiscal. O conselho administrativo elege a diretoria, constituída por 11 companheiros, com mandato de dois anos e, também, em votação secreta, escolhe a mesa do conselho, formada por um presidente e dois secretários. Moses dirigiu a primeira reunião de diretoria a 2 de junho de 1931. Moses não era novato na ABI. Seu ingresso data de 5 de julho de 1917, sendo proponentes João Mello, Dario de Mendonça e Castro Meneses. Entrou como redator da revista Souza Cruz e secretário da Associação Comercial, onde se tornou amigo de Heitor Beltrão, que viria a ser seu braço direito na ABI. Da sua ficha consta: nasceu a 27 de julho de 1884, filho de Inácio Moses, austríaco, e de d. Ida Moses, norteamericana. O que pouca gente sabe é que Moses teve atuação destacada no movimento reformista político, no começo do século, sendo um dos fundadores da Federação de Estudantes, que começou a agitar a mocidade acadêmica. Nelson Werneck Sodré, em História da Imprensa no Brasil relata a sua presença na Federação: “Ingressaram logo na organização estudantil Levi Carneiro, Herbert Moses, Eduardo Rabelo, Oscar Rodrigues Alves, Aloísio de Castro e Heitor Lira. O manifesto inicial da Federação dos Estudantes achava ‘duvidoso no Brasil a existência de uma
ficam confiadas a Manfredo Brandão e os serviços da secretaria da ABI a Júlio Moreira. Numa pequena autobiografia disse do seu encanto pelos jornais: “Na minha juventude tive uma infecção nos olhos e fiquei, por algum tempo, proibido de ler. Minha mãe lia todos os jornais e revistas, deixando-me a par do que ocorria no mundo. Mesmo doente, nunca deixei de ler os jornais.” O carinho que Moses dispensava à sua mãe, sócia da Livraria Britânica, atingia a idolatria. Aos sábados enviava-lhe três livros em inglês. Era mulher culta, com quem aprendeu as primeiras noções de inglês, francês, alemão e espanhol. Estudou, depois, o hebraico e o italiano. Diretor de diversas companhias, rico, com posição social definida, este era o Herbert Moses, quando assumiu a presidência da ABI, em maio de 1931. Embora diretor de uma fábrica de cigarros, Moses não fumava, não jogava, e bebia apenas o essencial nos banquetes. Seu hobby, desde quando colou grau, era enviar um dólar, no fim do mês, à sua progenitora, juntamente, com uma flor. A ABI, logo no primeiro ano da gestão de Moses modificou-se por completo. Ele reformou as instalações da rua do Passeio para oferecer mais conforto aos associados. A ABI teria sede própria e condigna. O trabalho era duplo. Organizava a Casa e a mantinha vigilante, a ○ ○ ○ ○ ○ ○ qualquer preço, contra os atentados à imprensa. Um incêndio destruiu parte do arquivo da ABI, quando tinha sede na rua do Passeio. Os primeiros meses da administração Moses foram difíceis. ○ ○ ○ ○ ○ ○ O Brasil, na época, fora dividido em capitanias e seus donatários eram os tenentes, quem mandavam e desmandavam. Promoveram o empastelamento de jornais e prendiam jornalistas. A nação não tinha Constituição, não tinha leis. O livre-arbítrio era exercido pelas esporas e patas de cavalo. Magalhães Barata era o dono do Pará; Martins de Almeida, do Maranhão; Landry Sales, do Piauí; Carneiro de Mendonça, do Ceará; Maynard Gomes, de Sergipe; Juraci Magalhães, da Bahia; a desordem lavrava em toda a nação. Num clima de expectativa, com as naturais violências de uma revolução vitoriosa, Moses conduziu a ABI com bastante habilidade, a ponto de conseguir, com o auxílio de Barbosa Lima, que o prefeito Pedro Ernesto, a 9 de janeiro de
opinião nacional.’.” Aprendeu as primeiras letras no Colégio Americano Fluminense, fez o secundário no Externato Aquino e o curso de direito na Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro. Sua carreira de jornalista mirim tem início aos 11 anos, quando lançou O Estudante, com oito páginas, com os colaboradores Luís Delfino, Maurício de Medeiros, Antônio Austregésilo e Castro Menezes. Durante dez anos foi diretor da Revista Moderna, s e n d o companheiro de ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Irineu Marinho na fundação de O Globo, em 1925. Formado em direito, em 1905, no ano seguinte, foi distinguido para secretário da delegação brasileira à III Conferência dos Jurisconsultos, q u a n d o inaugurou o ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Palácio Monroe, sob a presidência do barão do Rio Branco. Um dos congressistas era Joaquim Nabuco. Moses, por sua conta, promove uma espécie de contato entre jornalistas e juristas, estabelecendo um clima de cordialidade, do qual muito lucrou o certame. Do pai tinha a amenidade e da mãe o dinamismo. Lançou-se na advocacia, montando um escritório com seu companheiro de turma, Justo de Morais, constituindo uma das maiores bancas do Rio, que ocupava um andar inteiro na rua do Rosário, 117. Tinha uma equipe de dez advogados. Já, então, era diretor-tesoureiro de O Globo, cargo que ocupou até a morte. Fez alguma incursões pelo mundo dos automóveis e do hipismo, vindo a ser, respectivamente, presidente do Automóvel Clube do Brasil e diretor do Jóquei Clube Brasileiro. Homem de mil afazeres, inclusive presidente da Sociedade Brasileira das Nações Unidas e da Cruz Vermelha, Moses sentia a necessidade de um conselheiro na sua mesa de causídico. Escolheu seu amigo, dr. José Siqueira Alves Borgerth, 3.º procurador da Fazenda Municipal. Eleito para o conselho consultivo do antigo Distrito Federal e mais tarde para o Conselho Técnico de Economia e Finanças do ministro da Fazenda, foi diretor do Instituto dos Advogados do Brasil e dirigente de inúmeras entidades culturais, inclusive do Instituto Brasil-Israel, no qual chegou à presidência. A ABI empolgou Moses desde o dia da posse. Suas atividades particulares
Com pai austríaco e mãe norte-americana, Moses foi educado em português, inglês, francês, alemão e espanhol. Aos onze anos já criava um jornal
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Especial 90 anos
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1932, passasse à Associação, a escritura, o terreno do Castelo, doação que se arrastava desde 1921. O nome de Pedro Ernesto subiu às nuvens, como benemérito da classe. Antes, Getúlio Vargas, ao visitar a sede da ABI, ainda na rua do Passeio, em fins de 1931, teve consagração semelhante. Vargas prometeu um substancioso auxílio financeiro à ABI, para que a sociedade começasse as obras de construção de sua futura sede na esplanada do Castelo. Moses estava na redação de O Globo, quando chegou a notícia do empastelamento do Diário Carioca. O atentado ocorreu, precisamente, a 25 de fevereiro de 1932, às 23 horas, quando se escreveu “a mais triste página da história republicana, enodoando barbaramente a civilização brasileira”. A ABI convocou uma reunião de diretoria e Moses expôs os fatos. Recebendo favores, inclusive valioso terreno, a ABI tomou, entretanto, atitude frontal de solidariedade ao Diário Carioca. A ata da reunião é um documento edificante, levando-se em conta que, na época, era temerário discordar do vandalismo praticado por qualquer autoridade. O então chefe de polícia Batista Luzardo, velho jornalista e político gaúcho, sentindo que o governo não tinha interesse em punir os o f i c i a i s ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ indisciplinados, pediu demissão do cargo, seguido de Maurício Cardoso, ministro da Justiça, Lindolfo Collor, ministro do Trabalho e João Neves da F o n t o u r a , consultor jurídico do Banco do Brasil. Foi a primeira crise entre ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ os gaúchos que amarraram seus cavalos no obelisco da avenida Rio Branco, em 1930, proeza atribuída aos filhos de Flores da Cunha. Impossibilitado de conceder entrevista à imprensa carioca, sob o guante da censura, Luzardo rumou para Porto Alegre, prestando a seguinte declaração: “O jornal que tanto pregara a lei eleitoral seria o atestado vivo de repulsa que a decretação dessa lei despertava aos que ambicionavam poderes discricionários indefinidos. Ficou decidido o vandalismo. Dentro do Clube 3 de Outubro e sob a inspiração dos seus maiorais foi engendrado o plano sinistro. Foi em automóveis e caminhões da prefeitura carioca e do Ministério da Guerra que os assaltantes se transportaram. Cerca de cento e sessenta homens participaram da
Indicado por Barbosa Lima Sobrinho para unificar os jornalistas em torno da ABI, logo teve que enfrentar empastelamentos de jornais e prisões de jornalistas
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empreitada aviltante, sendo cinqüenta oficiais do Exército brasileiro. É preciso corrigir neste ponto uma assertiva em curso. Não eram delegações dos diversos corpos e regimentos, que partiam do 1.º Regimento de Cavalaria Divisionária, sediada na avenida Pedro Ivo, mas a oficialidade desta, acompanhada de muitos outros oficiais, pertencentes ao 3 de Outubro, servindo em outras unidades e nos diversos departamentos. Essa diferença, que insisto em frisar, é sensível e expressiva para o bom nome de guarnição federal. Tudo fora previsto. E, como o comandante do 1.º de Cavalaria, o coronel Pires Coelho, não estivesse a par da trágica revolução e morasse perto do quartel, foi prévia e manhosamente atraído por um chamado do ministério da Guerra. Mesmo assim esse oficial superior se apercebeu do que se preparava. Mas nada pôde tentar ante a tropa e a oficialidade revoltada. Consumouse o barbarismo.” E, momentos depois, no ministério da Guerra, ao telefone, o general Leite de Castro, em presença de várias testemunhas, teria respondido ao sr. Getúlio Vargas: “Houve o que eu há muita previa. Os tenentes fizeram o que eu faria, se tivesse 20 anos.” Danton Jobim ainda não era do Diário Carioca, onde entrou como secretário, quando o jornal reapareceu em abril. Homem de ação e gozando da estima geral da classe, mobilizou todos os recursos para obter a condenação da opinião pública contra ato tão bárbaro, praticado em plena capital federal. Na reunião da ABI de 27 de fevereiro de 1932, ficou decidido o apoio ao manifesto de São Paulo que culminou com a greve de todos os jornais, os quais deixaram de circular por um dia. A solidariedade maciça da imprensa ao Diário Carioca irritou o governo. O caso do Diário Carioca estremeceu as relações da ABI com Vargas. Aqui está o teor da ata: “Aos vinte e sete dias do mês de fevereiro de 1932, na sede da Associação Brasileira de Imprensa, à rua do Passeio n.º 62, reuniu-se a sua diretoria, sob a presidência do sr. Herbert Moses, estando presentes os srs. João Mello, Artur Guaraná, Edmir Pederneiras, Nestor Guimarães, Carlos Manhães e Pascoal Ferrone. Aprovada em discussão a ata da sessão anterior, o sr. Moses declarou que o momento grave por que passa o país tomaram maior gravidade com os acontecimentos conseqüentes ao empastelamento do Diário Carioca. Sob este aspecto, a atuação da Associaçào Brasileira de Imprensa deveria tomar o caráter que se lhe impõe por estar em foco, em princípio, a liberdade de imprensa e depois, em si, o brutal atentado a um jornal com as tristes características de ataque a um órgão de publicidade e à propriedade particular, crime que repugna a nossa consciência de jornalistas e de homens. Assim, ante a gravidade do momento e, tendo em vista a urgência no modo de agir por parte da diretoria, no sentido de tomar as providências que o caso exige, o sr. Herbert Moses propõe que se adiem todos
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os assuntos que não reclamarem solução imediata, ocupando-se a diretoria só com os últimos acontecimentos e para tanto propõe que a mesma diretoria se mantenha em sessão permanente. A idéia foi aceita, passando-se a deliberar nesse sentido. Depois de discutidas as medidas que a Associação Brasileira de Imprensa deveria adotar, os srs. Herbert Moses e Artur Guaraná apresentaram consubstanciadas em duas fórmulas separadas, as
atitude se coaduna com os sentimentos de todos os jornalistas e da Associação que os representa. Rio de Janeiro, 27 de fevereiro de 1932. A Diretoria.” A crise política causada pela depredação do Diário Carioca teve duração, refletindo mormente no Rio Grande do Sul, onde ficaram Luzardo, Collor , João Neves da Fontoura e Maurício Cardoso. Reapareceu o Diário Carioca com a mesma linguagem, combatendo o tenentismo. Moses, em pessoa, renovou a solidariedade da ABI a Macedo Soares, na época, o maior jornalista político, galardão que conservou por muitos anos. Moses tentou suspender a censura imposta a : O Estado de São Paulo, O Globo, Diário Carioca, Correio da Manhã, O Jornal e outros órgãos. Com a dissolução do Congresso Nacional, das assembléias legislativas e das câmaras municipais, nota-se a disposição de Getúlio Vargas de fazer funcionar o rolo
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Hábil, logo consegue, com ajuda de Barbosa, que o prefeito assine a escritura do terreno no Castelo, doação que se arrastava desde 1921
compressor contra a imprensa, desejo que concretizou com antecedência, aproveitando a deflagração do movimento revolucionário, em São Paulo, a 9 de julho. Para cada jornal foi nomeado um censor, de um modo geral saído das galerias subterrâneas do Palácio da Relação. Incidentes sem conta ocorreram nas redações, onde o censor era um preposto do governo, sem critério de espécie alguma para examinar qualquer texto, levando em conta que era ignorante. Moses protestou em vão. Procurou ministros e pediu a liberdade de jornalistas. Trabalho inútil. Nem sequer os jornais publicavam os protestos da ABI. A Censura não deixava. Esta situação continuou, com ligeiras interrupções, por muitos anos. O governo esmagou a rebelião de São Paulo e dezenas de jornalistas foram levados ao desterro, com suas famílias, inclusive crianças de tenra idade. Viajaram nos navios Raul Soares e Siqueira Campos e entre eles figuravam Prudente de Moraes, neto, Austregésilo de Athayde, Júlio de Mesquita, Casper Líbero, Oswaldo Chateaubriand, Paulo Duarte, Simões Filho, Francisco Mesquita, Ibrahim Nobre, Vivaldo Coaracy e muitos militares, entre eles, o cel. Euclides Figueredo. Assis Chateaubriand, bravamente, não procurou o caminho do exílio, preferindo enfrentar o governo. Foi preso e colocado à força num navio japonês, cujo comandante, em face do seu protesto, apoiado em leis nipônicas, fez o barco retornar ao Rio, desembracando o diretor de O Jornal.
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Antes do terreno, conseguiu de Getúlio Vargas a promessa de auxílio financeiro para a construção da futura sede
deliberações da Associação. Como em torno deste assunto se tivesse travado debate dilatado, ficou resolvido que cada diretor, tomando em consideração o momento e atendendo à difícil situação, formulasse uma nota destinada à publicidade, reunindo todas as medidas e deliberações da diretoria. Assim ficou determinado, suspendendo-se a sessão. A sessão continuou às 17 horas, do mesmo dia. O sr. Moses deu a conhecer aos demais diretores todos os passos realizados na véspera como presidente da Associação, passando-se logo a deliberar. Foram recebidas as sugestões resumindo as providências apontadas na véspera, acrescidas de novas fórmulas da autoria dos srs. Nestor Guimarães e João Mello. Depois de longamente discutidas foram resumidas, numa só fórmula, as sugestões dos quatro diretores a que se faz alusão acima, sendo redigida a seguinte nota destinada à publicidade: A Associação Brasileira de Imprensa, que tem por dever precípuo e indeclinável defender e sustentar a liberdade de imprensa sem prejuízo das responsabilidades legais pelos abusos praticados, condena com veemência o inqualificável atentado contra o Diário Carioca e espera que as medidas tomadas pelos responsáveis pelas liberdades públicas resultem no sentido de ser reparada semelhante afronta à conciência jurídica nacional. Em conseqüência, positivando a sua mágoa e a sua revolta, resolve a diretoria de Associação Brasileira de Imprensa manterse em sessão permanente, hastear a sua flâmula a meio pau, representar ao Chefe do Governo Provisório, protestando contra o atentado à imprensa em geral, e especialmente aos diretores do Diário Carioca, expressando toda a censura pelo ato de violência ao mesmo tempo que lhes hipoteca inteira solidariedade extensiva aos seus redatores e demais auxiliares. Resolve ainda aplaudir a resolução da União dos Trabalhadores Gráficos e da União dos Trabalhadores do Livro e do Jornal, cuja
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ANUNCIO 1/4 PREFEITURA
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O matutino, entretanto, foi tomado de assalto por um grupo ligado a Vargas, destacando-se o jornalista Maciel Filho. Das oficinas ocupadas saiu A Nação. Desgraçadamente, a torpe manobra teve o apoio de alguns líderes sindicais. Moses, reeleito, estava numa rodavida. O governo não atendia a seus pedidos, o que não impedia Moses de chamar à ABI a responsabilidade da chefia do movimento que surgia no país inteiro, contra a opressão que atingia, frontalmente, a liberdade de imprensa. Lançou manifesto solicitando suspensão da Lei Infame, como era chamada a Lei de Imprensa, elaborada nos porões do Catete. Protestou, veementemente, contra o fechamento de jornais como o Correio do Povo, A Nação e O Dever, todos do Rio Grande do Sul, sendo que o Correio do Povo circulava desde 1895. Do Maranhão, da Bahia, do Ceará e de outros estados chegavam pedidos de SOS ao presidente da ABI. Em Salvador, O Imparcial era fechado pelo interventor Juraci Magalhães. Armando Salles de Oliveira, donatário da capitania de São Paulo, por ato mesquinho demitiu vários redatores do órgão oficial Jornal do Estado. Moses gritava. No Paraná era preso e espancado o jornalista Petrarca Calado. Na cidade baiana de Conquista era destruído O Avante, enquanto, em Nova Friburgo, surravam o diretor da Esquerda. Foram fechados diversos jornais na Paraíba, em Santa Catarina, Ceará e no Espírito Santo. Escreveu um matutino da época na primeira página, num desafio à censura: “Apesar dos protestos da ABI, a Censura continua asfixiando a imprensa. Foram postos em liberdade vários jornalistas, após enérgica intervenção da ABI.” O autor havia chegado ao Rio, vindo do Ceará, em 1932, quando foi levado pela mão carinhosa de Maurício de Lacerda ao Jornal do Brasil, sendo recebido por Barbosa Lima Sobrinho. Não tinha ordenado. Recebia vales de caixinha dos generosos secretários Martins Alonso e João Guimarães, o bondoso Rito. Peço desculpas ao leitor por tratar de um caso pessoal, mas o mesmo reflete o panorama dos jovens que começaram a fazer imprensa, no Rio, na terceira década do século. O Jornal do Brasil tinha como proprietário Ernesto Pereira Carneiro. O secretário da sociedade anônima era Rocha Fragoso, um Pão-de-Açúcar de insensibilidade, despido de qualquer sentimento de humanidade. O Conde tinha vontade de reformar o jornal. Homem de indústria, suas empresas progrediam sem cessar, inclusive uma campanha de navegação marítima. Mas Rocha Fragoso, obtuso, preferia somar no fim do dia os anúncios domésticos. Certa noite, o autor assistiu no Jornal do Brasil a um espetáculo que jamais se apagou de sua mente. Entrou pela redação um jovem alto e moreno. Despiu a camisa e mostrou o corpo lanhado. Era Nelson Carneiro, espancado a fio elétrico pela polícia baiana. Depois entrou o jornalista Genaro, do Pará, que tirou o chapéu e exibiu a cabeça raspada e pichada por ordem de Magalhães Barata.
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Durante dois dias e duas noites, a soldadesca embriagada, carregando lanternas acesas nas pontas dos baionetas, festejou o bárbaro assassinato do almirante rebelde, abatido com golpes de lança pelo mercenário Salvador Pinheiro, a 24 de junho de 1895, nos grotões de Campo dos Osórios. Ripoll tinha profunda admiração pelo chefe revolucionário e chegou a escrever um esboço biográfico do intrépido Saldanha, que desfraldou a bandeira de revolta da Marinha contra Floriano Peixoto, em 1893. O ministro Antunes Maciel, da Justiça, preparou por sua vez, condições para a nova Lei de Imprensa. Surdo aos apelos da ABI, agora, o governo, com a faca e o queijo nas mãos, investia contra a União dos Trabalhadores em Livros e Jornais, conhecidas por UTLJ, várias vezes assaltada pela política, com sede na rua dos Andradas. Chegavam à ABI aplausos à sua ação decisiva na luta pela liberdade de pensamento. A censura continuava férrea e exercida por tipos desclassificados, que entravam para os quadros da polícia pela janela. O governo usava de outros meios de pressão, inclusive fazendo com que a Light cortasse a energia dos jornais. O papel importado de há muito era controlado pelo Banco do Brasil. A polícia empastelou O ○ ○ ○ ○ ○ ○ Interventor, de São Paulo. Preso Marcial Maciel, diretor de O Estilete, no Paraná. O Jornal, de Natal, era despredado. Lima Cavalcanti suspendeu O Estado, do Recife. Assassinado, em Goiás, João Jardim, redator do Atenas. Crime político, ○ ○ ○ ○ ○ ○ igual ao de Waldemar Ripoll. Diariamente vinham telegramas à ABI. Jornais fechados e jornalistas presos que pediam providências. O ministro da Justiça, agora, era o vendurgo Vicente Rao, de cujo cérebro doentio saíram as leis mais execráveis contra os direitos do Homem. Seu companheiro era Chico Campos, que de resto dispensa apresentação. Getúlio eleito presidente da República, em 1934, pelo voto indireto do Congresso Nacional, quando Borges de Medeiros teve 62 sufrágios, prometeu assinar decreto concedendo meios para a construção da sede própria da ABI. O presidente, com o dinheiro, pensou amaciar Moses e conquistar a ABI. Quem abrir as coleções dos jornais da época, sem maiores dificuldades, tomará conhecimento da atitude enérgica da ABI com respeito às sucessivas prisões de Nelson Carneiro, na Bahia, Amorim Pargas no Maranhão, e Pedro Motta Lima, no Rio, sem favor, um dos homens mais dignos de uma geração de jornalistas que desaparece.
"Apesar dos favores oficiais, liderou uma greve de jornais contra o empastelamento do Carioca, Diário Carioca irritando o presidente Getúlio e causando a demissão dos ministros do Trabalho e Justiça" ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
O Globo, em fevereiro, foi suspenso, recebendo manifestações de solidariedade da imprensa brasileira e continental. Um crime que abalou a consciência do Rio Grande do Sul foi o assassinato do cambativo jornalista Waldemar Ripoll, um dos dirigentes do Partido Libertador e articulista do Estado do Rio Grande, de Porto Alegre. Exilado em Rivera, foi abatido a golpes de machado quando dormia. A autoria intelectual do assassinato foi atribuída ao coronel Chico Flores irmão de Flores da Cunha e um dos maiores fazendeiros gaúchos. Quem armou o braço mercenário foi Camilo Alves, outro homem importante na região. Ripoll era uma legenda de bravura, culto e responsável, em parte, pela renovação do ensino em nosso país. Generosamente acolheu em sua casa, no Uruguai, o criminoso, um falso lenhador que não tendo onde comer e dormir pediu para pernoitar. De noite cometeu o crime. A ABI em vão pediu a punição dos mandantes. Era gente de prestígio e dinheiro e nada aconteceu. A excessiva bondade do jornalista Ripoll o levou à morte, quando deu dormida a um marginal que morava em Santana do Livramento. O capanga do senhor feudal Chico Flores era muito conhecido na cidade fronteiriça, ligada a Rivera apenas por uma rua, o parque Internacional, caminho da liberdade para os perseguidos políticos, desde o Império aos dias de hoje, principalmente depois do regime militar implantado em 1964. A presença de Waldemar Ripoll no Uruguai incomodava o governo do general Flores da Cunha e seus apaniguados. A trama sinistra foi arquitetada nos porões do Palácio Piratini. Prender ou não o criminoso era uma questão de somenos. O essencial era fazer calar o homem de imprensa que, com pseudônimo, colaborava nos jornais, inclusive, em A Platéia, de Livramento. Anos depois, seus despojos voltaram à pátria. Livramento, no final do século, foi teatro de um espetáculo macabro, promovido pela tropa federal, em regozijo pela morte do almirante Saldanha da Gama, cujos restos mortais deveriam ter sido sepultados no Rio Grande sendo, entretanto, levados para Rivera que, em funeral, chorou o desaparecimento de uma figura da Renascença.
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Os tenentes continuavam mandando e empastelavam A Imprensa, de Maceió, e a Trincheira, de Jaguarão. Fecharam O Estado de Goiás, o Jornal do Caicó, do Rio Grande do Norte, A Semana, do estado do Rio. Simões Filho, líder do governo deposto em 1930, foi seviciado dentro do seu próprio jornal, A Tarde, em Salvador. Agredir jornalistas tornou-se uma rotina no governo de Vargas. Anibal Fernandes, diretor do Diário de Pernambuco, foi barbaramente espancado no Recife, a cano de ferro, pela polícia do interventor Agamenon Magalhães, de Pernambuco, desembarcando no aeroporto Santos Dumont com as roupas encharcadas de sangue. Quando tomava chá na Cinelândia, José Eduardo Macedo Soares, diretor do Diário Carioca, foi agredido por elementos do Catete. Antes a vítima fora Carlos Lacerda, selvagemente espancado à porta da Rádio Mayrink Veiga, a mando do então prefeito, general Mendes de Morais, sofrendo hematomas nos olhos. Visitei-o e vi o seu estado lamentável. Chega-se ao ano de 1935, quando uma minoria, sem o senso da realidade, tomada de verdadeiro delírio, desfechou uma revolução, sob os auspícios da Aliança Nacional Libertadora, da qual Carlos Lacerda era o orador e lançara ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ o nome de Luíz Carlos Prestes, como Presidente de Honra, sob o a p a r e n t e comando de Hercolino Cascardo, Roberto Sisson e Beijamin Soares Cabello. A revolução não vingou e foi esmagada no Rio ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Grande do Norte, Pernanbuco e no Rio. São inenarráveis as cenas de banditismo praticadas contra jornalistas indefesos, envolvidos pelos acontecimentos da Aliança Nacional Libertadora. Lares são invadidos, homens de imprensa aparecem mortos nas florestas da Tijuca, outros são encarcerados em condições animalescas na Casa de Detenção. A posição de Herbert Moses era cada vez mais difícil. Os cárceres estavam cheios de jornalistas. Na Ilha Grande, entre os presos, estava Graciliano Ramos, que escreveu Memórias do Cárcere. Neste momento dramático, Moses criou um grupo para proteger os jornalistas em desgraça e que mais tarde se transformaria em Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa, e que voltou a funcionar por ocasião do golpe militar de 1.º de abril de 1964, sendo Heitor Beltrão o presidente da primeira fase. Moses, a despeito de ser um comensal do Catete e do Itamaraty, não
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subordinava a ABI à sua intensa vida social. Nisto tinha algo de Dunshee de Abranches. Participou de um almoço do ministério das Relações Exteriores e, à tarde, telefonou para o autor e Gumercindo Cabral, ambos com seus direitos políticos cassados e membros do conselho administrativo da Associação Brasileira de Imprensa, convidando-os para Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa, atitude digna de um presidente da Casa de Gustavo de Lacerda, porém, não foi compreendida pelos efêmeros detentores do poder e que exigiram o afastamento dos dois jornalistas do conselho administrativo e da Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa. Moses não recuou um milímetro de sua posição. Moses não tinha medo. A posição de Moses foi atacada por muitos e elogiada por poucos. Criticaramno por receber favores do governo, quando este mesmo governo esmagava a liberdade de imprensa. O seu argumento, até certo ponto, é válido: recebendo ou não auxilios oficiais para a construção da sede da ABI, o Governo não recuaria no seu propósito de enquadrar a imprensa na Lei Infame. As atas das sessões da diretoria e do conselho administrativo são documentos de ontem. Em todas as reuniões, os atentados à imprensa são minuciosamente detalhados, obtendo a total repulsa da Casa do Jornalista. Esta é a técnica da ABI, desde a sua fundação, em 1908, aos dias de hoje. Com maior intensidade, é claro, a partir de 1922, no governo de Artur Bernardes, quando teve início toda sorte de crimes contra a imprensa. Getúlio não faz mais do que continuar a obra calamitosa de Bernardes e Washington Luís. A partir do fracasso do movimento armado ANL, os integralistas, sob a chefia de Plínio Salgado, passam a ter ascensão no governo, em franco idílio com o nazismo de Hitler. O próprio chefe de polícia, major Filinto Müller, desertor da Coluna Prestes, não escondia suas simpatias pelo sigma, nomeando dezenas de galinhas-verdes para os quadros da Censura. Em dado momento, Plínio Salgado tomou ares de Mussolini, tendo Getúlio como refém... Dirigia o jornal A Ofensiva, que comandava uma cadeia de diários pelo Brasil afora. O integralismo tinha prestígio na Marinha e no Exército. Getúlio, a 11 de novembro de 1937, deu um golpe e criou o Estado Novo. Os integralistas assaltaram o Palácio Guanabara a 11 de maio de 1938, sendo rechaçados. Nove jovens cheios de idealismo foram fuzilados pela famigerada Polícia Especial, às vistas de Bejo Vargas, o irmão do Ditador. Plínio Salgado embarcou para Portugal, onde foi tratado carinhosamente por Salazar, enquanto os redatores e repórteres dos jornais integralistas entraram no pau. A ABI inclusive, promoveu démarches junto às embaixadas, em busca de asilo para os mesmos. O pombo-correio do golpe chamavase Francisco Negrão de Lima, que justificava: “Por um triz, o Brasil estaria mergulhado no fascismo e Plínio Salgado tomaria conta do Governo. O nazismo
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ocupava, a cada dia, vários setores públicos, até da Marinha que já contava com aproximadamente 95%. Mas, graças às mesmas Forças Armadas, a pretensão integralistas, assim como a comunista, não vingou.” O falecido general Mourão Filho, em suas reminiscências, afirma que foram quatro os consolidadores do golpe de 37: o ministro da Guerra Eurico Gaspar Dutra; o chefe de polícia, Filinto Müller; o general Góis Monteiro e o comandante da Vila Militar, general Newton Cavalcânti, notórios simpatizantes do Eixo BerlimRoma. O Plano Cohen, apontado como tendo sido elaborado pelo Komintern para orientar a ação dos comunistas no Brasil, não era mais do que um exercício literário da Ação Integralista Brasileira, na qual Mourão Filho atuava como chefe do serviço secreto. Assim, baseado num documento reconhecidamente falso, Vargas liquidou com a democracia, instalando no Brasil um
e bom Pedro Motta Lima, sendo submetido a julgamento pelo execrável Tribunal de Segurança Nacional. Quase todos foram condenados. Paulo Motta Lima foi levado para Fernando de Noronha, penando na chamada Ilha Maldita. Seu depoimento é, portanto, valioso: “Fernando de Noronha, onde cheguei no porão do Campos Salles poderia ter sido pior que a sinistra Detenção do Recife. Explica-se por quê. Nenhum sentimento humanitário moveu homens como Vicente Rao e outros, que nos despacharam para tão longe. Projetou-se mandar também Luíz Carlos Prestes para lá. O carcereiro-mor seria o famoso tenente Caneppa. Mas João Alberto, querendo evitar o sacrifício de seu antigo companheiro da Coluna, conseguiu que se substituísse a administração de Caneppa pela do caudilho gaúcho Nestor Veríssimo. “Quem era Nestor Veríssimo? Nada mais nada menos que o valente Rodrigo dos livros de Érico Veríssimo. Duas pessoas distintas e uma só verdadeira. O Rodrigo da ficção literária e o gaúcho Nestor de vida real configuravam a bravura rio-grandense. Nestor tinha o corpo marcado por cicatrizes de bala, o que lhe valeu a alcunha de ‘Paliteiro’. E, como os valentes de coração limpo não cultivam a crueldade nem maltratam os vencidos, houve um acordo de cavalheiros entre a direção do presídio e os presos. Organizou-se um sistema voluntário de trabalho. O diretor fornecia o material necessário e nós garantíamos a mão-de-obra. Nosso trabalho era dirigido por nós mesmos e dessa forma conseguiase tanto quanto possível humanizar as condições de existência na ilha. Podíamos assim dividir o tempo entre o trabalho braçal e o estudo. Hilcar Leite, com a saúde abalada pelo que passou nas unhas do carrasco Serafim Braga, era da turma de serviços menos grosseiros. Catava aratu para melhorar a comida. Eu, com o que me restava de vigor de um passado de remador do Flamengo, descarregava navio, pescava em grupos, para o abastecimento de cento e tantos companheiros de prisão, ou escalava morros no corte de forquilhas para os canteiros da horta dirigida pelo futuro vereador carioca Iguatemy Ramos. Nesse trabalho, fazia parte da turma de Gregório Bezerra, o mais esforçado de todos. Exinstrutor de educação física do 29º BC, ainda em boa forma atlética, os feixes de forquilhas que Gregório cortava e carregava eram descomunais. A horta de Iguatemy evitou a carência de vitaminas e enquanto estivemos na ilha não houve entre nós nenhum caso de beribéri, tradicional espantalho de Fernando de Noronha.” Diretores dos principais jornais do Rio foram levados à Vila Militar, cujo comandante, o general Newton Cavalcânti, galinha-verde dos mais graduados, desabafava seu ódio nos homens de imprensa, humilhando-os de maneira torpe. Moses foi uma dessas vítimas. De 1935 a 1945, a liberdade foi reduzida a zero. Líderes da mais alta respeitabilidade, como João Mangabeira, Abguar Bastos, Otávio Silveira, Domingos Velasco e Abel Chermont, jornalistas com
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A ABI estava manietada pela censura. Jornais fechados, jornalistas assassinados e espancados eram atos de rotina da ditadura. Os protestos da ABI não ecoavam. Morriam nas cestas de lixo das redações ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
regime que suprimiu as últimas franquias das liberdades públicas. “Nunca, nem mesmo nos mais negros dias de dominação colonial, o Brasil conheceu época tão vesânica, tão obscurantista, tão violenta. Nenhum direito permanece de pé, nenhuma liberdade foi poupada”, disse o mestre Nelson Werneck Sodré, referindo-se ao período. A ABI estava manietada pela censura. Jornais fechados, jornalistas assassinados e espancados eram atos de rotina da ditadura. Os protestos da ABI não ecoavam. Morriam nas cestas de lixo das redações. Homens de pensamento, embora pertencendo a facções políticas antagônicas, ficaram irmanados no sofrimento. Muitos foram recolhidos a Fernando de Noronha e Ilha Grande onde se agigantou a figura do integralista Belmiro Valverde, médico e jornalista que criou um serviço de socorro aos prisioneiros, independente dos seus credos políticos. Sócios da ABI foram retirados dos seus lares, alta madrugada, e enviados à Ilha Grande, onde já se encontrava o bravo
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assento no Parlamento, foram levados às masmorras da polícia e sofreram vexames ignóbeis. No presídio da rua Frei Caneca estavam Antônio Mesplé, Oswaldo Costa, Maurício Lacerda, Jean Etcheverry, Castro Rebelo, Otávio Malta, Lourenço Moreira Lima, Newton Freitas, Cascardo, Nemo Canabarro, Beijamim Soares Cabello, Luiz Werneck de Castro, e outros como Eneida Moraes, Nieta Campos da Paz, Nise Silveira, Olga Benário, Elisa Berger etc. O mestre do miserável cerimonial era Serafim Braga, português boçal, arvorado em inspetor do Setor Trabalhista da Ordem Política e Social. Monstro na arte de espancar, inclusive, crianças e velhos, tudo fez com o beneplácito de Filinto e de Getúlio, o último já sócio benemérito da ABI, título conferido por uma assembléia que carecia de validade. Até Serafim Braga, que, criou a rendosa indústria do anticomunismo na ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Moses, criou um grupo para proteger os jornalistas em desgraça, que mais tarde se transformaria em Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
imprensa editando o pasquim A Situação, votou no chefão. Triste do comerciante de secos e molhados que não anunciasse em A Situação. Seria mais um na lista dos comunistas... Moses sofreu campanha tenaz por parte de alguns conselheiros, apoiados por reduzido número de sócios. Exigiam o rompimento daABI com Vargas.Aditadura, com todo seu cortejo de misérias, era um fato. A classe estava dividida em duas correntes: uma apoiava Vargas e outra condenava. Moses, na verdade, não tinha forças para enfrentar uma situação cujas conseqüências eram imprevisíveis. José Carlos de Macedo Soares, era o titular da Justiça, um dos raros ministros com quem Moses entabulava conversações, obtendo, em doses homeopáticas, melhoria para os prisioneiros da ditadura. Vargas voltou à ABI, percorrendo suas obras, sendo vaiado à saída do edifício. De quem parte o apupo? Das esposas e dos filhos dos confinados em Fernando de Noronha e Ilha Grande, nas catacumbas das ruas Frei Caneca e Relação. No outro dia, mais um “nada pode ser publicado sobre o incidente à porta da ABI”. Durante os primeiros anos da segunda conflagração mundial, quando o nosso governo ficou em cima do muro, esperando aderir ao vencedor,
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Jornal da ABI
aparentemente, o Eixo, muitos intelectuais e militares, como homens livres, não esconderam suas simpatias pelo nazismo. Era um indiscutível direito que tinham, sobretudo pelo fato do Brasil ainda não ter declarado estado de guerra à Alemanha. O execrável Tribunal de Segurança Nacional, um esgoto, condenou ○ ○ ○ ○ ○ as personalidades mais destacadas do país, envolvendo-as em tramas diabólicas, forjadas nos porões do palácio da Relação, cujo chefe era o verdugo major Filinto Müller. Foram condenados o coronel Euclydes Figueiredo, tenente Severo Fournier, senadores e deputados federais, ○ ○ ○ ○ ○ escritores do porte de Gerardo Mello Mourão, Rolando Corbisier, o médico Belmiro Valverde, excepcional figura humana e outros, considerados inimigos do regime - não esquecer que a Nação, desde 1937, estava mergulhada nas trevas do Estado Novo - e encarcerados no presídio da rua Frei Caneca, a despeito dos esforços de Herbert Moses para libertá-los. O povo, sob a influência de gigantesca publicidade oriunda dos Estados Unidos, a partir do afundamento dos nossos navios no Nordeste, formou ao lado dos aliados, já sob o comando de Truman que, em desgraçada hora, com o falecimento de Roosevelt, assumiu a presidência dos Estados Unidos. A guerra terminou a 8 de maio de 1945, com o aniquilamento do nazifascismo, deixando um saldo de milhões de mortos, obra sinistra de Hitler e seus asseclas Mussolini e Hirohito. Três meses depois, precisamente a 6 e 9 de agosto, Truman mandou jogar bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki, matando 140.000 pessoas inocentes, mais da metade volatizada, enquanto milhares foram transformadas em tochas humanas. 15.000 crianças foram reduzidas a cinzas, 90.000 japoneses ficaram feridos e sucumbiram com o decorrer do tempo. Moses protestou contra o bombardeio. Qual o maior assassino? Hitler ou Truman? Moses não via cor política e credos religiosos entre os profissionais de imprensa. Moses tem a sua mémoria reverenciada por jornalistas que tomaram partido, uns a favor do Eixo e outros contra. Todos foram torturados pela gestapo de Filinto Müller. A história guardará os nomes dos dois genocidas: Hitler e Truman. Moses não esperou pela conclusão da nova sede. Da rua do Passeio saiu para o Castelo. À proporção que os andares ficavam prontos ia ocupando as dependências de qualquer maneira. A sua mesa estava no
2.º pavimento. Isto em 1940, quando anunciou o movimento da secretaria 34.693 documentos redigidos. O quadro social era constituído por 3.880 sócios, dos quais 2.225 quites. A biblioteca, tão desfalcada pelo incêndio da rua do Passeio, contava com 6.000 volumes. Moses abordava a crise de papel: ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ “Verdade é que reservam dias sombrios para a vida econômica da i m p r e n s a brasileira, com as expectativas de um colapso pela carência de papel, crise essa que perdura.” O s estatutos s o f r e r a m reformas. A ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ guerra chegou ao Brasil, quando os submarinos do Eixo atacaram nossos navios mercantes, arrastando à morte de centenas de patrícios indefesos. O Brasil declarou guerra ao Eixo a 22 de agosto de 1942, iniciando-se a mobilização geral do povo. Mesmo nesta emergência que exigia o máximo de colaboração da imprensa, a censura continuava ainda mais violenta, impedindo, inclusive, o noticiário de sucessivos afundamentos de corsários do Eixo pela FAB recém-formada. Prevaleciam as normas políciais, executadas por beleguins, alguns com carteira de jornalista. Eram os trânsfugas da profissão. Moses pedia uma audiência ao ditador para tentar o afroxamento da censura, Getúlio, sempre diabólico, deu mais do que foi pedido. Dirigiu-se mais uma vez à ABI, onde almoçou com alguns membros do conselho administrativo e diretores de jornais. Visitou andares inacabados e Moses, diplomaticamente, não tocou no assunto, fazendo uma rápida exposição de motivos sobre o andamento das obras. A idéia da edificação da Casa do Jornalista encontrou, por parte de Vargas. a maior receptividade. Mas o assunto não era tão fácil assim. Só para a elaboração do anteprojeto lançou-se um concurso com prêmio de 50 contos de réis, naquele tempo uma fortuna. Dele surgiu o projeto dos irmãos M.M.M. Roberto. No que se referia ao interior, a opinião se manifestava unânime, entre os membros do júri. Mas a fachada, de arrojado estilo moderno, provocou as maiores reclamações. Moses bateu-se, então, quase sozinho, pela adoção do traçado em seu conjunto. Para confirmar sua antevisão do sucesso daquele estilo arquitetônico, as grandes revistas especializadas do mundo iriam apontar o caráter exemplar do edifício. A Enciclopédia Britânica publicou a sua fotografia como modelo de estilo. Uma publicação técnica deu a seguinte definição da sede da Casa do Jornalista: “The most dignified modern bullding in the world”.
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A Associação Brasileira de Imprensa se afirmava pioneira da construção em arte moderna, não só no Rio de Janeiro, mas em toda América do Sul. Contrariando os hábitos do tempo, Moses pugnou para que os jovens e iniciantes arquitetos permanecessem como fiscais da própria contrução, de modo a manter a fidelidade do traçado. Foi assinado o contrato de construção da estrutura metálica, que consumiria 25% da importância doada pelo governo - 4.000 contos de réis. Anos depois, a ABI ofereceria ao ministro Guinazu um almoço um almoço, no qual o diplomata argentino declarou, perante Oswaldo Aranha, a facilidade de ser ministro das Relações Exteriores, quando se conseguia o apoio de jormalistas tão empreendedores. Em 1940, no quinto ano da construção, instalava-se a secretaria da ABI. Já aí, os quatro mil contos tinham sido despendidos. Mil, na estrututa metálica; mais mil, para os elevadores, ainda mil, para o arcondicionado - e o resto? Foi então travada nova batalha financeira. Moses, contudo, saiu de pires na mão, com a preocupação constante de defender a dignidadde da classe, para obtenção dos recursos necessários à amortizada letra que emitira, no valor de 2.000 contos, com aval pessoal, seu e de Hugo Barreto. As doações atingiram a 6.000 contos. Faltavam, ainda, 50% do valor da obra. Mesmo assim, o presidente da ABI não recuou e exigiu a execução completa dos trabalhos, de acordo com o projeto dos arquitetos. Foram contraídos novos débitos e encargos, tendo a ○ ○ ○ ○ ○ ABI sabido merecer numerosas doações. O fato é que as linhas arquitetônicas da ABI revolucionaram a rotina das construções do Rio. Era o marco inicial de uma etapa, sem dúvida audaciosa e ainda não superada, da engenharia brasileira. Melhoraram bastante as relações entre a ABI e a ditadura, a começar de 1944, quando a vitória dos aliados estava à vista. A ABI ○ ○ ○ ○ ○ era órgão técnico e consultivo do Estado, por lei de 11 de novembro de 1940 e, posteriormente, reconhecida como instituição de educação e assistência social. Antes de sua deposição, a 29 de outubro de 1945, o ditador voltou à ABI, em 1944, para assistir à inauguração de um busto de Pedro Ernesto e uma efígie de Oswaldo Aranha, beneméritos de classe. A deposição de Vargas e a ascensão
Moses entabulava conversações, obtendo, em doses homeopáticas, melhoria para os prisioneiros da ditadura.Vargas voltou à ABI, percorrendo suas obras, sendo vaiado à saída do edifício
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A idéia da edificação da Casa do Jornalista encontrou, por parte de Vargas, a maior receptividade. O presidente, com o dinheiro, pensou amaciar Moses e conquistar a ABI. Mas o assunto não era tão fácil assim.
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do Poder Judiciário, na pessoa do ministro José Linhares, que assumiu o governo, encontraram a imprensa com a sua liberdade quase resgatada - garroteada que fora desde 1930. Quinze anos de opressão, 15 anos de luta, de sacrifício e de sangue. Moses respirava. E, com ele, a imprensa em geral. A liberdade era um fato. A ABI retomou o seu prestígio em todas as esferas. O nome de Moses voltou a ser incluído nas mais diferentes delegações do governo brasileiro conferências de chanceleres, da imprensa e outras, realizadas no exterior. Moses intensificou seu programa de viagens ao estrangeiro. Visitou a Europa, a América do Sul, em geral, os Estados Unidos, o Canadá etc. Transmitiu suas impressões em crônicas leves, em forma de flash, em O Globo. A ABI projetava-se definitivamente no mundo, ante as visitas que seu presidente realizava através de 30 países. A queda da censura em 1945 não pode ser tomada como um gesto isolado. Foi conseqüência de uma série de pronunciamentos de líderes políticos, que aproveitavam brechas abertas na censura, ante a vitória iminente dos aliados, entrevistas que causaram sucesso no Rio e São Paulo. Granjeia a ABI uma situação semelhante à das maiores organizações estrangeiras, equivalente à do National Press Club, de Washington. Sem caráter partidário defendendo sempre os interesses superiores do país, a atuação da Casa do Jornalista era de especial destaque no que se refere às relações do Brasil com o exterior. Cada vez que uma personalidade visitava nosso país, a ABI, em colaboração freqüente com o ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Itamaraty, promovia seus contatos com os jornais brasileiros e a aproximava, num ambiente sem formalidade, dos nossos círculos intelectuais. A anistia geral, a 18 de abril de 1945, decretada antes do término da guerra, devolveu dezenas de jornalistas à liberdade, entre eles, Pedro Motta Lima, que reassumiu o seu lugar no conselho ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ administrativo da ABI (que Moses jamais considerou vago), após a ausência forçada de 10 anos. M e r e c e destaque o papel de Moses e Danton Jobim, o primeiro arrancando a censura das garras da polícia, e o último como elemento de ligação entre a imprensa e o ministro da Justiça, do qual era assessor. Moses, Macedo Soares e Danton conseguiram transferir a censura dos esbirros de Filinto
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Müller para o ministério da Justiça. Meio caminho para liquidá-la, sem ferir os sentimentos germanófilos de pequeno grupo atuante. Filinto e seus aliados estavam de pernas quebradas. A censura não tinha mais o controle do nefasto grupo da rua da Relação, o que não o impedia de fazer pressão sobre Macedo Soares e o próprio Lourival Fontes, diretor do DIP. O Diário Carioca, por ○ ○ ○ ○ ○ exemplo, foi a vítima predileta, por dois motivos: o diretor da folha era o José Eduardo, irmão de José Carlos, o ministro da Justiça, e Danton, assessor de José Carlos, era o redator-chefe do Diário Carioca. O Globo muito sofreu com rigor da censura. Um tipo ligeiramente alfabetizado foi ○ ○ ○ ○ ○ designado para censurar o vespertino de Irineu Marinho, sem a mínima condição de dialogar com a redação. Não lia os originais. Soletrava o suficiente para atrasar o jornal, em benefício de A Noite, Diário da Noite, A Notícia etc. Um dia Roberto Marinho perdeu a paciência e esbofeteou o censor. Foi aquele corre-corre e um boato tomou conta da cidade: Roberto Marinho asilou-se na Embaixada da Itália. Na verdade, ele jogava bilhar ao lado da redação, quando o Alves Pinheiro, chefe da reportagem de O Globo, amigo de Filinto Müller, lhe transmitiu um convite do chefe de polícia para ir ao seu gabinete. No outro dia o censor já era outro. A surra serviu para alguma coisa. Tudo era pretexto para tentar a volta da censura aos infectos porões da rua da Relação, submundo dos crimes contra a imprensa, sob o comando do médico recémformado Civis Müller, sobrinho de Filinto e que até usava um bigodinho à Hitler. O pano não demorou a cair. Com a vitória dos aliados, encerrou-se um capítulo dos mais negros da história da nossa imprensa. E a imprensa voltou a sua plenitude. Por algum tempo, apenas... O presidente Eurico Gaspar Dutra, ao assumir o governo, prometeu liberdade de imprensa e elogiou os jornalistas como soldados da verdade. Dutra imitou Getúlio, mandando abrir um crédito de dois milhões de cruzeiros, a 28 de setembro de 1946, pelo ministério da Justiça, para a ABI concluir as obras da sede. Almoçou com os jornalistas e perdoou a dívida. Depois caiu de rijo sobre a imprensa, retornando o país ao clima de violência contra a liberdade de pensamento. A Gazeta Literária, de Moscou, publicou um artigo tido como insultuoso ao general Eurico Gaspar Dutra que, por extensão, considerou feridos os brios das nossas forças armadas. O Brasil rompeu relações com a URSS.
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A 21 de abril de 1947 quando o embaixador Gueorgi Sokilov, recebeu a nota do Itamaraty. Repete-se, à luz do dia, no coração da cidade, às 16 horas, a mesma cena de vandalismo do empastelamento do Diário Carioca. A polícia, às ordens do general Lima Câmara, isolou dois quarteirões, na rua do Lavradio e avenida Antônio Carlos, e reduziu a um montão de ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ escombros a Tribuna Popular, jornal comunista. As oficinas eram próximas do palácio da Relação, e a redação ficava em frente à Câmara dos Deputados e ao Palácio da Justiça, de onde parlamentares e juristas, das s a c a d a s , assistiam ao ato ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ de selvageria. O povo boquiaberto contemplava o espetáculo dos bárbaros. Feriram a bala jornalistas e gráficos. Os tiras impediram que as ambulâncias prestassem auxílio às vítimas e os bombeiros foram mantidos a distância. A destruição durou duas horas. Moses deixou a ABI e rumou para o gabinete do ministro da Justiça, que outro não era senão Benedito Costa Neto. Pediu providências imediatas para cessar o empastelamento. Moses voltou à ABI confiante na promessa do ministro. Os feridos procuraram a ABI em busca de socorros médicos, sendo presos à porta do edifício. Banditismo igual nunca houve. Os policiais do general Lima Câmara, empunhando uma bandeira do Brasil, haviam desagravado a honra nacional, levando máquinas de escrever e até o dinheiro da caixa. Pobre honra nacional. A imprensa inteira verberou o assalto. A Tribuna Popular tinha fôlego de sete gatos, a edição do dia seguinte, circulou em quatro páginas, em formato de livro. Os tiras prendiam para saber que oficina imprimiu o número 735 da Tribuna, que narrou a destruição de suas oficinas e redação. Encontrei este exemplar num arquivo particular. Saíram apenas 300 cópias. Reuniram-se o conselho administrativo e a diretoria da ABI e, em protesto, Moses permaneceu na ABI até a madrugada, assistindo aos companheiros do jornal saqueado, e forneceu esta nota à imprensa: “O presidente da Associação Brasileira de Imprensa tão pronto teve conhecimento, por uma comunicação de um dos diretores, do atentado contra a Tribuna Popular, entrou em contato com as autoridades. Encaminhando-se aos representantes do Departamento Federal de Segurança Pública, tanto na repartição central como na delegacia local, solicitou medidas que evitassem o agravamento da situação e se interessou pelo livramento
dos jornalistas e profissionais gráficos detidos. Dirigindo-se ao ministro da Justiça, dr. Costa Neto, recebeu o presidente da ABI garantias reiteradas de que haviam sido adotadas providências enérgicas para preservar a liberdade de imprensa. Fiel ao seu programa e coerente com a sua invariável atitude em ocasiões semelhantes, a ABI condena os atentados à liberdade de imprensa e à livre manifestação de pensamento.” O ataque à Tribuna Popular foi o começo de uma nova onda de crimes contra a imprensa. A ABI ficou reunida em sessão permanente para acompanhar os selvagens atentados. O governo ordenou que a Light suspendesse a energia para alguns jornais, entre eles, A Imprensa Popular, prestes a substituir ATribuna Popular, que circulou em fins de dezembro com impressão feita em prelo movido a braços. Horas depois, o ministro da Justiça suspendeu o jornal por 30 dias. A Imprensa Popular foi impedida de circular por seis meses. O governo do general Dutra deu uma colher de chá, deixando passar o projeto de lei que assegura prisão especial aos profissionais de imprensa, durante a fase de julgamento. Em compensação, vetou um aumento salarial dos jornalistas, já aprovado pelo Congresso. A palavra do ministro da Justiça não valia nada. Sempre era uma mentira. Foi convocada uma assembléia geral na ABI
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Por ter sempre defendido os comunistas, ficou furioso quando a sede foi pichada depois de uma visita do secretário norteamericano ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
nos primeiros dias de maio de 1948 e, por aclamação, aprovada uma moção de protesto contra o cerceamento da liberdade de imprensa, recuperada após 15 anos de ditadura de Vargas e novamente violada nos seus alicerces fundamentais. A assembléia exigiu que o texto fosse enviado à ONU, bem como à União Mundial de Jornalistas. 1948 foi um ano de dificuldades na ABI, agravadas com a morte de Hugo Barreto, tesoureiro da Casa, falecido a 12 de junho. Dotado de excepcional dedicação, era uma das suas colunas mestras. Sua morte deixou Moses sem um braço. Hugo Barreto era definido com
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justiça como: “the right man in the right place”. Naquele ano, já funcionavam na sede nova todos os serviços da ABI, do 6.º ao 13.º andar. A Clínica Pedro Ernesto, no 6.º, tinha 10 médicos e era seu orgulho. No 7.º, ficava a administração. A biblioteca, no 8.º; no 9.º, auditório, com capacidade para 800 pessoas. A discoteca no 10.º andar; sala de estar, no 11.º; restaurante, no 12.º e bar no terraço, no 13.º. Os sócios contavam, ainda, com barbearia, salão de leitura, bilhares, jogos de salão e, pouco tempo depois, também TV. Chega-se a 1950 com Moses cada vez mais integrado na ABI. Estava com 66 anos de idade. Não parecia. Era um dínamo. Trabalhava diariamente dez a doze horas, sendo o homem de vida social mais intensa e variada do país, comparecendo às vezes, com 20 minutos de intervalo, a três almoços diários. Raramente dispunha de duas horas livres, mas nunca se negou a receber qualquer pessoa que o procurasse. Não trabalhava no seu gabinete pessoal, onde somente guardava papéis. Preferia o amplo salão da secretaria no 7.º andar, entre os funcionários, à vista do público. A qualquer hora atendia. Diplomata de tato, sob aparência um tanto ruidosa, não era inimigo de ninguém. Alguns dos seus melhores amigos foram seus antigos adversários. Vitória ou adversidade, nada o imprenssionava por mais de vinte e quatro horas. Era tão hábil que, a despeito de ser diretor do Fluminense, torcia por cinco clubes: Fluminense, Flamengo, Botafogo, Vasco e Bangu. Ganhava, pelo menos, um jogo em cada rodada. Seu prestígio se alastrava no mundo oficial. Seu nome era um abre-te-sésamo. Ninguém sabia onde Moses acabava e a ABI começava. Os dois se confundiam. Estamos em 1951, com Getúlio de volta ao governo. Moses beirando os 70 anos sente que deve renovar os quadros da Casa. Elege repórteres para o conselho e diretoria. Pela generosidade de Moses , o autor entra para o conselho administrativo, onde encontra outros colegas de reportagem e vultos da maior respeitabilidade. Alguns repórteres servem de assistentes a Moses na parte de manhã, quando lia todos os jornais e ordenava as primeiras providências do dia. O conselho e a diretoria resolveram comemorar, com uma semana de homenagens, o 20º aniversário de Herbert Moses na presidência da ABI. Moses nem sempre dirigia a ABI em mar de rosas. Um fato é ilustrativo e revela sua paixão pelos debates. Jorge Amado anunciou uma entrevista e convidou, em particular, os conselheiros, enviando-lhes atenciosa carta. O conselheiro Ivo Arruda remeteu o convite ao chefe de polícia, general Ciro de Resende, e estranhou que a ABI servisse de quartel-general para os comunistas. Moses responde: “Dentro de um princípio liberal, que é motivo de honra para todos nós, só exigimos dos que nos procuram para solicitar a cessão de uma sala, o amor ao Brasil e o respeito aos princípios legais de hoje.” O general Ciro de Resende agradeceu
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a Ivo Arruda: “Trata-se, sem dúvida, de louvável conduta, cuja comunicação me permite manifestar a V. Sª a estranheza que me causou o fato daquela conceituada Associação haver cedido o seu auditório para propaganda comunista.” O episódio ocorreu, justamente, no mês de junho de 1952, quando os comunistas, revoltados contra a presença do secretário de Estado norte-americano, Dean Acheson, na ABI, onde concedeu uma entrevista coletiva, picharam o edifício com o surrado go-home. Moses perdeu o controle e distribuiu uma nota, usando de uma linguagem candente. O Boletim da ABI, números 2 e 3, tratam do caso, com o título: “Todos os jornais verberaram o atentado.” Moses, pela primeira vez em sua presidência de 20 anos perdeu a calma. Ficou intolerável. Agressivo. Sentia-se desrespeitado e, ainda mais, via a ABI enxovalhada pelo piche dos comunas. O chefe de polícia era o mesmo que, meses antes, permitiu a invasão de beleguins na sede da ABI, durante a coroação de uma rainha eleita em concurso popular. Anos depois, o general Ciro de Resende, já afastado do cargo, arranjou um atestado gracioso e pediu inscrição na ABI. Sua proposta foi recusada pelo conselho administrativo. Mais uma eleição para a renovação do terço do conselho. Um sócio distribuiu prospecto de oito folhas, denunciando o abandono do patrimônio de imóveis da Casa, constituído, principalmente, por 8 terrenos doados, voltando à baila o caso do Retiro dos Jornalistas, na Chácara das Palmeiras. A assembléia foi das mais agitadas. Valeu tudo. Todos os golpes foram usados para derrotar Moses. Realizou-se a assembleía geral e Moses recebeu uma consagração. Elegeu, sem maiores esforços, o terço do conselho e ainda ganhou uma moção de confiança. A prova de fogo de Moses foi o almoço que ofereceu ao ministro da Guerra, general Espírito Santo Cardoso, em agosto de 1952, sob a presidência de Getúlio Vargas, com a presença de 42 generais. Macedo Soares, no Diário Carioca, de 19 de agosto, desancou: “Triste homenagem comandada!” A Tribuna de Imprensa intrigou: “O sr. Elmano Cardim procurou o sr. Herbert Moses e disse: - “Não tem cabimento a imprensa servir de alcoviteira de encontros entre o sr. Getúlio Vargas e seus fiscais, que são os generais.” A Imprensa Popular: “Afronta os jornalistas o banquete de Vargas na ABI.” Carlos Lacerda, num violento artigo, denunciou que o almoço era manobra para envolver os generais: “Portanto, se o sr. Moses está com fome e quer comer com Vargas, sirva-se, mas não em nosso nome. Não em nome da imprensa independente que está sendo comida pela corrupção, e pela intervenção descarada do Estado na liberdade de
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imprensa, primeiro passo para a subversão do regime democrático.” Osório Borba, com veemência: “Que o sr. Moses realizasse a empreitada em seu nome e por sua própria conta, era um direito. Seria mesmo um dever de sua profissão subsidiária de camelô oficial.” E 12 dos 45 conselheiros não participam do almoço. Na época, funcionavam, no Rio, 16 matutinos e 12 vespertinos. Moses, dispondo do Boletim da ABI
se irritava. Fingia que estava zangado. Aumentava a voz, gritava, mas a cólera simulada era logo percebida, quando ele ensaiava abraçar o contendor. A proproção que os anos passavam, tomava posições das mais corajosas, quando deveria ser o contrário, levandose em conta a idade de 70 anos. O autor relata três fatos que dizem da bravura de Moses, já com os primeiros sinais da enfermidade que o faria abandonar a arena. Aparício Torelly, em outubro de 1934,
nova onda de repressão ao comunismo. Telefonou a Moses e pediu sua presença no Galeão, certo de que seria incomodado pela Ordem Política e Social. O avião chegou alta madrugada. A primeira pessoa que o repórter viu na escada de desembarque foi Moses. Veio ao meu encontro e perguntou simplesmente: - Você trouxe algum material de propaganda da Rússia? - Não. Moses abominava a mentira e por isto confiava cegamente nos seus companheiros. Entrelaçou seu braço ao meu e desfilamos por entre duas filas de façanhudos tiras. Moses era o habeascorpus. Ele assumiu a responsabilidade pelo conteúdo da bagagem. Nem abriram as malas. Com a crise política provocada pelo assassinato do repórter Nestor Moreira, morto a pontapés, na delegacia de polícia de Copacabana e o atentado contra Carlos Lacerda, no qual tombou o major Rubens Vaz, crime arquitetado nos porões do Catete, a posição de Vargas corria perigo. Getúlio não era mais aquele ditador deposto em 1945. Seu governo estava marcado por uma série de empreendimentos, com bases populares, destacando-se o surto industrial do país, do qual Volta Redonda era a vedete. Prestigiava uma ala nacionalista, fixou melhores salários para os trabalhadores e, a 3 de outubro de 1953, dispondo sobre a política nacional do petróleo, criou a Petrobrás. Era a exploração do nosso petróleo por brasileiros natos, medida que irritou o embaixador ianque no Brasil, Adolf Berle, que ousou ir ao Catete pedir uma explicação sobre o assunto. Getúlio ordenou a sua retirada da sala, incidente contornado pela habilidade de Oswaldo Aranha. Quando Vargas visitou a ABI, pela sexta e última vez, excepcionalmente não discursou. Nem foi vaiado à saída do edifício. Pelo contrário. Recebeu entusiásticas aclamações. O povo aplaudia o presidente que enfrentava os trustes, numa luta desigual. Três dias antes de seu suicídio, a 24 de agosto de 1954, Vargas recebeu Moses, em audiência e perguntou a Oswaldo Aranha, que estava próximo: - O presidente da ABI ainda não é embaixador? Moses jamais quis função alguma fora da sua ABI. Getúlio suicidou-se com um tiro no coração e uma onda de pusilanimidade dominou o país. A traição montou o seu quartel-general no próprio Catete, à frente o próprio vice-presidente Café Filho. Herbert Moses não só acompanhou a trasladação dos despojos de Vargas do Catete ao aeroporto Santos Dumont, como dedicou o número 29, do Boletim, à memória do presidente morto. Atitude como esta dignifica uma instituição. Na hora da adesão em massa ao novo governo, rendia uma homenagem pública ao seu benemérito, embora na sua ditadura tenham sido praticados inúmeros crimes contra a liberdade de imprensa, provocando protestos os mais veementes, por parte de Moses. Não há nisso nenhuma contradição. Era, apenas, a coragem de
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A ABI participou das conversações para acordos salariais, servindo de mediadora entre os sindicatos dos empregados e donos de empresas jornalísticas ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
cujo primeiro número saiu a 31 de maio de 1952, não respondeu aos ataques e deu uma esplêndida lição de democracia, publicando, na íntegra, os artigos pró e contra o almoço. Recuperava-se da crise surgida com o almoço dos generais, o que não impediu de ser desconsiderado pelo Itamaraty, que não incluiu seu nome na representação brasileira às festas da coroação da rainha Elizabeth II. Explica-se: o ministro João Neves da Fontoura tinha ciúmes de Oswaldo Aranha, o chanceler que recebeu as maiores honrarias da Casa do Jornalista, onde tem, inclusive, a sua efígie, em lugar de honra. João Neves não perdoava, também, ter sido preterido por Getúlio, ao designar Aranha para o governo do Rio Grande do Sul, quando estourou a revolução de outubro de 1930. Aranha, a despeito de suas simpatias pelos norteamericanos, colocava os interesses do Brasil acima de tudo. João Neves era advogado da Standard Oil. Órgão sem nenhum vínculo com a Previdência Social, não estando, portanto, sujeito às normas do ministério do Trabalho, a ABI, todavia, participou, várias ○ ○ ○ ○ ○ vezes, das conversações para acordos salariais, servindo de mediadora entre os sindicatos dos empregados e donos de empresas jornalísticas. De físico acanhado, com 1,56 m de altura, andando na ponta dos pés, com passos curtos, ○ ○ ○ ○ ○ porém, velozes, corado como um pimentão, Moses, à primeira vista, dava a impressão de um homem comum, um tanto assustado, falando com estranho sotaque que os seus inimigos diziam ser préfabricado, unicamente, para dar a impressão de que fora educado na Inglaterra ... Não
tentou escrever uma série de reportagens sobre a revolta dos marinheiros de 1910, chefiada pelo bravo e generoso João Cândido. Saíram apenas duas no Jornal do Povo. Aporelly era uma das figuras mais populares do Rio, fazendo humorismo com o pseudônimo de barão de Itararé. Oficiais da Marinha seqüestraram-no, à porta de sua residência, e conduziram-no às matas da Tijuca, onde foi seviciado. Quanta torpeza! Quis o destino que eu fosse, o biógrafo de João Cândido, em A revolta da Chibata, livro do qual tenho orgulho. Moses solidarizou-se com Aporelly e ofereceu-lhe todas as garantias, colocando o próprio gabinete da presidência da ABI à sua disposição, a fim de evitar novos vexames, já que os agressores não ficaram satisfeitos com a torpeza. O presidente da ABI recebeu inúmeras ameaças de morte. Jantava, quando a sua esposa foi chamada ao telefone: “Avise ao imundo do judeu seu marido que ele será surrado na porta do Municipal.” Moses faz humor: ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ “Quem quer pegar galinha não diz ‘xô’...” Vestiu-se e partiu para o teatro sozinho. Não portava uma arma. Moses jamais usou um canivete, quanto mais um revólver. Um ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ grupo tentou uma vaia à sua entrada. Moses parou nas escadarias e ninguém atirou. O autor estava na União Soviética, em missão jornalística. De regresso ao Brasil, ficou alguns dias em Roma, o bastante para ler nos jornais do Rio sobre a
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Num gesto de bravura, Moses exigiu a renovação do mandato de conselheiros cassados em 64, quando poucos ousavam enfrentar a situação
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Jornal da ABI
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confessar que a classe recebeu favores de um ditador deposto, o qual voltou ao governo como presidente eleito pelo povo, tomando medidas que preservam o patrimônio econômico da nação. Moses, mesmo doente, não deixava de trabalhar. Mobilizou a classe para indultar jornalistas condenados pela Lei de Segurança. Viu sancionada a Lei de Imprensa com alguns dispositivos redigidos pela ABI e que suavizavam o novo diploma. O Boletim atinge o seu clímax, com as colaborações de Peregrino Júnior, Gilberto Amado, Austregésilo Athayde, Barbosa Lima Sobrinho, Fernando Segismundo, Orígenes Lessa, Raymundo Magalhães Júnior, Murílo de Araújo, Múcio Leão, Paulo Filho, Josué Montello, Anderson Magalhães, Manuel Bandeira, Hélio Viana, Martins Alonso, Dionísio Silveira, Carlos Drummond de Andrade e muitos outros. Destacou-se na Conferência Interamericana de Caracas e, ao saltar do Galeão, em vez de ir para casa, dirigiu-se à residência de Carlos Lacerda, agredido na véspera. Lacerda sofria o primeiro atentado de uma série interminável. Ninguém era obrigado a concordar com suas idéias, especialmente, com as suas bruscas mudanças de opinião, mas não se pode negar o seu talento e a sua bravura. Em junho de 1948, Moses viu partir um dos seus melhores colaboradores, Heitor Beltrão. Homem digno o Heitor Beltrão, que após ocupar postos dos mais destacados na vida pública, inclusive, na Associação Comercial, doente, alquebrado, com o organismo roído por grave enfermidade, tinha necessidade de trabalhar para viver. A história da ABI precisava ser escrita. Os melhores subsídios estão no seu Boletim. Não há número que não denuncie fechamentos de jornais e agressões a jornalistas, censura ao arbítrio de autoridades irresponsáveis, intervenção de Moses em todos os assuntos correlatos à classe. Acontece que o Moses, já não era o Moses de 1950, quando atingiu o apogeu da vida. Certa manhã, ao deixar sua residência, no Flamengo, rumo à ABI, teve um desmaio e caiu. Seu médico particular, dr. Theobaldo Viana, num comunicado à imprensa, a 21 de outubro de 1968, não escondeu a gravidade do caso: “O sr. Moses foi acometido de um espasmo celebral de grau leve. Sua recuperação dar-se-á, em grande parte, à força de sua vitalidade, e energia de uma personalidade privilegiada. O doente será submetido a um tratamento de massagens e fisoterapia.” O dínamo entrava em pane. Vieram
do Estado. Era o segundo enfarte. A arteriosclerose evoluía. Mesmo assim, sentado numa cadeira de rodas, dirigiu os destinos da Casa. O campeão precisava descansar, mas ele preferia morrer na sua mesa de trabalho. Passou a usar o modesto gabinete particular, onde fazia refeições. De há muito deixara de comer no restaurante. Tinha dificuldade para se movimentar. Aproximava-se a época da renovação do mandato de 15 conselheiros, dois dos quais com seus direitos políticos cassados pelo Alto Comando Revolucionário, que transforma o presidente Raniere Mazzili num boneco. Moses, num gesto de bravura, exigiu que os dois companheiros fossem reconduzidos. Estamos em abril de 1965, quando a um simples telefonema para o ministro do Trabalho, eram destituídas as diretorias de sindicatos, impondo-se uma intervenção, a qual, em certos casos, dilapidava o patrimônio da entidade, como ocorreu com o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio de Janeiro que, de descalabro em descalabro, acabou despejado por falta de pagamento dos aluguéis, sendo acolhido generosamente, pela ABI. P o u c o s ○ ○ ○ ○ ○ ○ ousavam enfrentar a situação. Moses contemplava angustiado o panorama sombrio. Teve forças, ainda, para reestruturar a Comissão de Defesa da Liberdade de I m p r e n s a , confiando a presidência a Elmano Cruz. Quatro chapas disputaram as eleições. Moses, no dia do pleito, num esforço hercúleo, votou e permaneceu no saguão, até a anoitecer. Venceu a ○ ○ ○ ○ ○ ○ chapa que ele prestigiava. Um dia o velho Moses sentiu-se abatido. Faltaram-lhe as forças. Estava com 80 anos e bastante enfermo. Convocou a diretoria e comunicou a sua inabalável decisão de renunciar. E a 21 de agosto de 1964, o conselho administrativo aceitou o seu pedido. Lá estava Moses alquebrado, uma sombra do Moses de outrora. Não falava. Tomado de emoção, caiu em pranto. Elmano Cruz leu esta proclamação, assinada por todos os conselheiros: “Considerando que Herbert Moses dedicou metade de sua existência às lides da imprensa, sendo que 33 anos decorridos na direção suprema da Casa do Jornalista; considerando que são inestimáveis, ao longo desse período, os benefícios de ordem material e espiritual por ele prestados à Associação Brasileira de imprensa, que ajudou a projetar dentro e fora de nossas fronteiras; considerando o
Dinâmico, foi homem de mil afazeres: diretor da Souza Cruz, do Jóquei Clube Brasileiro; presidente do Automóvel Clube, da Cruz Vermelha e da Sociedade Brasileira das Nações Unidas ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
os governos de Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart. A mesma vigilância, o mesmo devotamento pela causa da imprensa. A mesma batalha contra o cerceamento da liberdade. Moses estava com 78 anos e tomava enérgicas atitudes, visando moralizar a classe. Mandou inserir no Boletim os processos criminais movidos contra chantagistas, proprietários dos pasquins O Liberal, O Grito, Correio de Notícias, O Apito, O Combate e outros órgãos da imprensa marrom. Provou que um contrabandista doublé de jornalista que lutou contra um outro chefe de gang pelo domínio da Praça Mauá, não era jornalista. E por isso não tinha direito à prisão especial. Os gângsteres Fernandinho e Zica não entraram para a ABI. Combateu tenazmente pela lei de aposentadoria dos jornalistas, com 30 anos de serviços, hoje uma realidade. Jogaram uma bomba no edifício da ABI. O petardo não foi dirigido contra a ABI e sim contra a Cofap que ocupava vários andares. Nem por isto o episódio deixou de entristecê-lo, quando é sabido que na Casa da Cultura falaram personalidades, como os presidentes Truman, Prado, Sukarno, Gronchi, Mateos e dirigentes da política internacional, como Robert Kennedy, Dean Acherson, Pinay, Fidel, Guevara etc. A sua revolta contra a doença era comovente. Não aceitava os conselhos médicos. Mantinha o mesmo ritmo de trabalho. Jango convidou-o para a comitiva presidencial que ia aos Estados Unidos. O chefe da nação fez questão que ele estivesse ao seu lado. Em Nova Iorque, Moses foi encontrado sem sentidos, num quarto de hotel. Providenciaram seu regresso num avião particular do presidente dos Estados Unidos. Moses recusou e pediu para ficar. Havia melhorado e podia cumprir o resto do programa. Ainda ia ao México, em visita a um casal amigo. Chegou ao Rio e recaiu, sendo recolhido, com urgência, ao Hospital dos Servidores
espírito eminentemente democrático de Herbert Moses e a unidade da classe que ele invariavelmente perseguiu e consolidou; considerando que somente em razão de sua idade avançada e do desejo por ele manifestado de afastar-se voluntariamente da presidência da ABI, concordamos com a sua renúncia a esse posto: propomos que o conselho administrativo da ABI conceda a Herbert Moses o título único e excepcional de presidente de honra, que lhe assegurará, entre outras regalias, o de conselheiro da diretoria e o uso de um gabinete exclusivo nas dependências da Casa.” O grande presidente deixou a Sala Heitor Beltrão, por entre alas formadas por seus companheiros. O enfermeiro empurrou, lentamente, a cadeira de rodas. Muitos choraram, enquanto outros conduziram o consolidador da ABI até a porta do elevador. Moses, cada vez mais doente, fez valer as prerrogativas do cargo de presidente de honra. Ainda compareceu ao 7.º andar e trancava-se no seu pequeno gabinete. Recolheu-se, enfim, ao convívio da família tão sacrificada, desde a sua posse em 1931. Ao deixar ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ o prédio, contemplou uma placa de bronze: “ P a r a celebrar 30 anos de dedicação à liberdade de imprensa na vida de Herbert Moses, o povo carioca, pelo seu governo, mandou fazer esta placa, em 1961.” Era o canto do cisne do velho lutador. Viveu 10 anos prisioneiro de uma cadeira de rodas. Seu sofrimento era imenso. Falava com dificuldade e, aos poucos, foi ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ perdendo a memória. Morreu no dia 11 de maio de 1972 e, se o óbito tivesse ocorrido no apogeu de sua agitada carreira jornalística, o tráfego teria sido desviado no centro da cidade, entretanto, no velório, apenas, 150 amigos. A família, envolvida por intrigas, não permitiu que o corpo saísse da ABI, preferindo uma capela no São João Batista. Moses está morto há 13 anos e tem uma rua com seu nome, na praia de São Conrado. Sua obra, no entanto, está imortalizada na ABI.
O grande presidente deixou a Sala Heitor Beltrão, por entre alas formadas por seus companheiros. O enfermeiro empurrou, lentamente, a cadeira de rodas. Muitos choraram, enquanto outros conduziram o consolidador da ABI até a porta do elevador.
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Um dia o velho Moses sentiu-se abatido. Faltaram-lhe as forças. Estava com 80 anos e bastante enfermo. Convocou a diretoria e comunicou a sua inabalável decisão de renunciar ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
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O prestígio da ABI transformava a sede em ponto de referência para visitantes ilustres e políticos em busca da notoriedade. Mas era na luta intransigente pela liberdade de imprensa, independentemente das posições políticas, que a entidade construía o legado, que permanece até hoje, de defensora permanente das liberdades e dos direitos humanos
COM O DIP, UMA CENSURA EM NOME DO NOVO da opinião nacional sobre as diretrizes doutrinárias do Estado Novo, em defesa da cultura, da unidade espiritual e da civilização brasileira”. Cabia ao DIP promover a censura aos meios de comunicação, mas, também, encarregar-se da promoção do governo, cultura, do turismo, da importação de papel de imprensa, do rádio, do cinematógrafo, do teatro e até do circo, tudo regulado por novo decreto, de 30 de dezembro, sob o número 1.949. O artigo 3 determinava que a Seção de imprensa do DIP seria assistida, no exercício de suas atribuições, “como no caso de aplicação de penalidades às empresas jornalísticas, por um Conselho Nacional de Imprensa, composto por três membros livremente nomeados pelo presidente da República entre jornalistas profissionais de notória reputação, um indicado pela Associação Brasileira de Imprensa, outro pelo Sindicato dos Proprietários de Jornais e Revistas do Rio de Janeiro, e outro pelo Sindicato dos Jornalistas profissionais da mesma cidade”. Pelo decreto, o governo não poderia suspender, fechar ou ocupar jornais “sem o consenso do Conselho, a ser presidido pelo presidente da República e, na sua ausência, pelo diretor-geral do DIP”. Porque Lourival Fontes? O depoimento é, outra vez, de Rivadávia de Souza. Ele lembra que nos idos de 1934 Luis Aranha, filho de Osvaldo Aranha, era presidente da Confederação Brasileira de Desportos, e organizava a delegação que seguiria para Roma com o nosso selecionado de futebol, para disputar a Copa do Mundo. Indicaram a “Lulu” Aranha um jovem advogado que tinha vindo do Piauí e era procurador da Prefeitura do Rio, hábil, preciso e brilhante em seus pareceres. O jovem foi incluído na delegação mas, na capital italiana, apresentou uma peculiaridade: não assistiu a nenhum jogo do nosso selecionado. Ao invés de freqüentar os estádios dedicavase em tempo integral a estudar as técnicas de propaganda do regime fascista de Benito Mussolini. Quando o ditador recebeu a delegação brasileira, Lourival Fontes estava presente, e dedicou depois altos elogios ao porte de Mussolini, “que apesar de baixinho, impressionava”. Na volta ao Brasil, o advogado começou a doutrinar os altos escalões do poder com o modelo de propaganda oficial que tinha criado, uma cópia do italiano. Passaram-se anos até que conseguiu chegar a Getúlio Vargas. Sustentava a criação de um ministério da Propaganda, mas contentouse com o DIP. Lourival Fontes travou sua primeira batalha como diretor-geral ao tirar a censura das atribuições do Chefe de Polícia, o todopoderoso Filinto Müller, que por isso jamais o perdoou.
Carlos Chagas Não há ineditismo nas ditaduras. Todas elas se parecem. O ditador fala pela população, imaginando interpretá-la, mesmo sem consulta. Por isso deve sufocar opiniões e manifestações contrárias às suas determinações. Assim, a censura à imprensa tem sido, com monótona repetição, uma constante em todos os regimes não democráticos. Como regra, as ditaduras se valem de estruturas anteriores, já existentes, para distorcê-las e ampliá-las. Maximizá-las e travesti-las. Logo após a revolução de 30, ainda durante o governo provisório de Getúlio Vargas, funcionava no ministério da Justiça a Imprensa Nacional, tendo sido criado como um de seus braços o DOP Departamento Oficial de Publicidade, dirigido pelo jornalista Salles Filho. Contou décadas depois em “ O Estado de S. Paulo” o jornalista Helio Damante que, sendo Osvaldo Aranha ministro da Justiça, o DOP nasceu para funcionar em moldes democráticos. Só que não dava, porque o regime era discricionário. Mais tarde, com Antunes Maciel no Ministério, o DOP virou DNP - Departamento Nacional de Propaganda, voltado para a radiodifusão. O rádio já tinha entrado em campo e foi naquele período que mais se desenvolveu. A 10 de julho de 1934, às vésperas da promulgação da nova Constituição, surgiu por decreto do ainda presidente provisório o Departamento de Propaganda e Difusão Cultural, também na órbita da pasta da Justiça. Deu-se, no entanto, uma inversão: a Imprensa Nacional passava a ficar subordinada ao DPDC, que por sua vez gerou um filhote, a Agência Nacional, encarregada de distribuir o noticiário oficial para jornais e estações de rádio, cobrindo as atividades do presidente da República e de seus ministros. Nesse período nasceu a “Hora do Brasil”, de transmissão obrigatória por todas as emissoras do país, entre 19 e 20 horas. Seguiu-se o período democrático, com Getúlio Vargas eleito presidente constitucional por quatro anos, pelos constituintes de 34. O próximo passo foi a ditadura de 37, depois da revolta comunista de 35, da decretação do Estado de Guerra (interna) e da criação do Tribunal de Segurança Nacional. Apenas em 1939, através do decreto 1.915, de 27 de dezembro, é que nasceu o DIP - Departamento de Imprensa e Propaganda, tirado da estrutura do ministério da Justiça e subordinado diretamente à presidência da República. Seu inspirador foi Lourival Fontes. Quem relata a exegese do DIP em suas memórias é o veterano repórter Rivadávia de Souza, lembrando-lhe a finalidade: “a elucidação ○
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Uma das maiores manifestações de força e poder do DIP foi sua localização. Onde se instalaria? Não havia fartura de prédios públicos no Rio, no final de 1939, e como o recém extinto DPDC funcionasse num pardieiro, Lourival Fontes conseguiu que Vargas cedesse o palácio Tiradentes, vazio desde 1937, com o fechamento da Câmara dos Deputados. Era de lá, instalado no gabinete cujo último inquilino fora Pedro Aleixo, que Lourival Fontes movia seus cordéis. Na prática, o DIP promovia férrea censura aos jornais e ao rádio, mantendo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
A censura não se limitava à imprensa, pois atingia a música popular, o cinema e o teatro ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
um censor instalado em cada redação, de início funcionários da Polícia. Depois, passaram a ser nomeados integrantes da mais nova carreira criada pela ditadura. A censura, porém, não se limitava à imprensa, pois atingia a música popular, o cinema e o teatro. Faz parte do folclore nacional a alteração que o DIP obrigou fazer na marchinha “O Bonde de São Januário”, que na versão original “levava mais um otário para trabalhar” mas que, quando veio a público, tratava de “mais um operário, sou eu que vou trabalhar”. Concursos de música popular entusiasmavam o Rio, como aquele em que Orlando Silva se imaginava vencedor, com “A Jardineira”, mas acabou vencido por Silvio Caldas, com produção inferior, “A Florisbela”, mas votos a mais. O povo, se não votava para presidente, votava nos concursos do DIP. Pior do que a censura e até do que a propaganda, se é que isso é possível, destacava-se como função do DIP deter o monopólio da importação de papel de imprensa. O Brasil não produzia papel, que vinha todo da Escandinávia, do Canadá e dos Estados Unidos. Com o monopólio, fez-se a felicidade dos donos de jornal, e com ela, veio mais “compreensão” para com a ditadura. Explica-se. Apesar da censura, sempre era possível burlar o censor, até porque, todo censor é burro. Assim, quando nas entrelinhas se publicava algo que contrariava o regime, Lourival Fontes convocava o dono do jornal. Oferecia-lhe cafézinho, laranjada e todo um ritual de boas maneiras. Não tocava na nota ou burla à censura, mas dizia, em dado momento, ter
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uma notícia ruim a relatar. Qual? - indagava o já temeroso empresário. “O navio que vinha da Suécia trazendo suas bobinas foi torpedeado (durante a guerra) e o senhor terá que passar pelo menos um mês sem papel”. O infeliz suava frio, gemia, chegava a chorar, pois vai à falência um jornal que passar um dia sem papel, quanto mais um mês. Lourival Fontes estendia o sofrimento, falava de outros temas, referia-se à bravura com que o governo enfrentava os mais variados problemas, com ênfase para a subversão, e terminava dando a solução : “Acontece que chegou ao porto, ontem, um navio com bobinas para o jornal Tal, e quem sabe o seu diretor nos ceda algumas? “ Seguia-se o jogo de cena, com um telefonema para o dono de outro jornal, que já o estava esperando, e a cessão da ansiada matéria prima para que o interlocutor não fosse à falência. Em nenhum momento o diretor-geral do DIP queixava-se da matéria que havia contrariado o governo, mas quando o dono do jornal chegava à redação, era inexorável: “estão demitidos todos os que fizeram essa brincadeira de mau gosto, que tentaram ridicularizar o nosso querido governo, seus comunistas de uma figa...” Assim funcionaram as coisas até que, em Março de 1945, um jornalista então desempregado - Carlos Lacerda - fez uma entrevista com um político então escanteado - José Américo de Almeida. Depois de perambular pelas redações, o jovem acabou obtendo que Costa Rego, redator-chefe do “Correio da Manhã” publicasse o texto, de críticas ferinas à ditadura. A guerra na Europa estava terminando, o Brasil havia-se aliado ás democracias e à União Soviética para derrotar o nazifascismo e o próprio ditador, consultado pela manhã, resolveu não mandar apreender a edição do jornal. “Deixa para lá”, foi sua reação. Naquele mesmo dia os vespertinos também se livraram da censura, valendo referir o que aconteceu na redação do “Diário de Minas”, em Belo Horizonte. O secretário da noite, que fechava o jornal e era encarregado de submeter as matérias ao censor, chamava-se Carlos Castello Branco. Avisado pelo Rio de que a censura havia acabado, esperou chegar o agente policial, e antes que ele tirasse o paletó, avisou: “Olha aqui, Ataliba, a partir de hoje, se você quiser ler o jornal, vai ter que comprar na banca...” O censor percebeu a situação, ia se retirando, mas, da porta, sentenciou para o Castelinho: “Eu vou, mas eu volto...” E voltou mesmo, a partir de 1964, mas essa é outra história.
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Carlos Chagas
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PEDRO APARECE ESCONDIDO NA AMBULÂNCIA Luiz Motta Lima Na ABI a defesa da liberdade nunca foi frase de retórica. Nestes 90 anos, as administrações sucessivas exercitaram atos persistentes que colimaram em determinar a tradição democrática que hoje a caracteriza. Sem discriminações ideológicas, sem partidarismos políticos, sem casuísmos, a simples e destemida defesa das liberdades democráticas. Em fins de 1942, o governo Vargas declarou-se em guerra contra as potências do Eixo nazi-fascista. Por julgarem questão de coerência, os aliancistas e comunistas exilados, principalmente na Argentina e no Uruguai, deliberaram retornar ao país para integrar-se ao esforço de guerra. Se estavam sendo perseguidos, condenados e presos, justamente porque se haviam sublevado, em 1935, contra o fascismo nativo, achavam de seu dever prosseguir em sua luta, ainda que ao lado de um governo que lhes perseguia e processava. Pedro Motta Lima, meu pai, constava da lista dos exilados, embora, em verdade, estivesse militando clandestinamente na cidade de Santos-SP. Também ele resolveu acatar a resolução de seus companheiros. Mas Pedro orgulhava-se de ter toda uma vida de militância de oposição, alvo da ira política dos dominantes, sem nunca ter sido capturado ou detido pela polícia. Sempre usava de meios e modos para enganar os “beleguins”, como eram tratados na época os agentes da Ordem Política e Social. Isso lhe dava certa satisfação pessoal. As únicas detenções sofridas, quando ainda muito jovem, tinham sido acidentais e não dirigidas especificamente à sua pessoa. Uma, como repórter, ao protestar contra o espancamento de populares na rua; outra quando toda a redação do jornal em que trabalhava foi apresada. Seus companheiros exílados, vinham sendo vítimas de truculências ao se apresentarem. Recebidos até com certa festividade nos Estados do Sul, ao chegarem em São Paulo e Rio eram trancafiados como criminosos e não como voluntários da luta ○ ○ ○ ○ ○ anti-fascista. E Pedro considerava isso inominável. V i n d o clandestinamente para a casa de sua família, no bairro da Tijuca, no Rio, estabeleceu contato com dois de seus irmãos, Rodolfo e ○ ○ ○ ○ ○ Paulo, também jornalistas, e com eles arquitetou sua apresentação. Escolheram a ABI, para salvaguardar a cidadania e dar maior repercução ao ato. Hebert Moses, presidente na época, prontamente entendeu e atendeu à gestão dos Motta Lima. Não apenas por sua formação pessoal, como e principalmente por coerência à tradição da Casa dos Jornalistas, que presidia. E assim foi feito. Rodolfo, funcionário
graduado da Prefeitura do então Distrito Federal, mercê de suas amizades, conseguiu uma ambulância pública para o transporte. Desta forma, previamente acertados, levaram Pedro à presença de Moses, em seu gabinete no 7° andar da ABI. Ali onde, hoje, funciona a Secretaria. ○ ○ ○ ○ ○ ○ Era janeiro de 1943. Pedro entregou a Moses uma carta em que explicava o motivo de seu ato e sua intenção de ser acompanhado pela ABI, na apresentação às ○ ○ ○ ○ ○ ○ autoridades governamentais. Acredito que Moses teve satisfação em atender à vontade dos Motta Lima. Pedro Motta Lima cumpriu prisão na Ilha Grande, de onde saiu indultado por movimento nacional dos jornalistas, encabeçado por Herbert Moses. Foi recepcionado em almoço realizado na sede da Araújo Porto Alegre e, ao destacar o papel da ABI em sua liberdade, conclamoua à continuidade, pela anistia de todos os presos políticos de então. O nome da ABI está gravado nas lutas democráticas de nosso povo. No vocabulário popular, ABI é sinônimo de liberdade. Basta ver mais um caso. Sabemos que a imprensa comunista sempre sofreu perseguições. Posso afirmálo porque Pedro Motta Lima sempre esteve à frente dos sucessivos órgãos que a representaram. E, ouvida ou vivida, de alguma forma participei dessa história. Perseguição política, policial e econômica. Esta última caracterizada por intimidação política e policial sobre os anunciantes. Estes rareando até a exaustão do jornal. E embora bom veículo de propaganda, pela sua aceitação em ampla camada da população, acabava não tendo como sobreviver. A perseguição policial era continuada e não se restringia aos profissionais que nela trabalhavam. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Atingia eventuais assinantes, jornaleiros e até ao desavisado leitor que ousasse ler tais folhas em locais públicos. A t i n g i a , principalmente, aqueles que visitavam suas ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ redações. Ainda que, sem conotações partidárias, para encaminhar queixas ou reclamações, como ainda hoje é usual em qualquer órgão noticioso. No final da década de 40, princípio de 50, o jornal dos comunistas, no Rio, tinha redação na rua Gustavo de Lacerda. Feliz coincidência, ter sede na rua do fundador da ABI. Quem conhece o Rio de Janeiro, sabe que essa rua, situada perto da Praça
Tiradentes e paralela à rua da Carioca, é, na verdade, um beco sem saída. Só tem uma saída, pela rua Silva Jardim. Jornal matutino (não tenho certeza se “A Cidade” ou a “Folha do Povo”), tinha com Diretora a saudosa e combativa jornalista Maria da Graça Dutra. Meu ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ pai, creio que por motivo de um dos i n ú m e r o s processos judiciais políticos a que respondeu, desta vez não figurava como diretor. E m b o r a participasse da ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ direção. Pois bem. Certa noite a polícia política postou-se na esquina da Silva Jardim. Nada opunha a quem se dirigisse ao jornal, mas os que dele saissem eram detidos. Puro arbítrio, sem qualquer justificativa. Não havia como avisar os visitantes, porque o logradouro era de grande movimento e a freqüencia, ao jornal, heterogênea. Alguns frequentadores mais conhecidos ainda se podia evitar. Mas o povo e os menos conhecidos iam caindo na armadilha. Dado o alarme, ninguém mais ousou sair. Em pouco tempo as dependências do jornal, que não eram muito espaçosas, ficaram
Clandestino na cidade de Santos, Pedro Motta Lima combinou com Moses se apresentar ao governo para forçar
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Pediu a substituição do censor por um outro que aos menos soubesse ler, nada conseguindo. Um dia, perdeu a paciência e deu uns tabefes no infeliz. Trecho inédito do livro "A história de um repórter", a sér publicado este ano pela Editora Record. pediu a substituição do censor por um outro que aos menos soubesse ler, nada conseguindo. Roberto Marinho, um dia, perdeu a paciência e deu uns tabefes no infeliz censor, botando-o para fora da redação. Foi um Deus nos acuda. Chegou a correr o boato de que o jornal seria fechado e seu proprietário se exilara numa embaixada. A tarde Roberto Marinho foi localizado jogando bilhar no salão ao lado da redação. Aí ele recebeu convite para comparecer à Polícia, missão desempenhada pelo Alves Pinheiro. Os tabefes tiveram efeito positivo. Mandaram novo censor e o jornal parou de atrasar. Anos mais tarde, fazendo uma reportagem sobre o tráfico de tóxicos na Lapa, encontrei aquele censor lambe-lambe atirado numa sarjeta, um farrapo humano.”
Edmar Morel “O Globo muito sofreu depois que a censura passou a ser exercida pelos fascistas brasileiros, com gente recrutada no que havia de pior na sociedade. O chefe da odiosa censura neste período era o galinha-verde-mor Pacheco de Andrade, com gabinete na Polícia Central. O censor destinado a O Globo era um pobre fotógrafo lambe-lambe, que fazia ponto no Passeio Público: analfabeto, ferrava o próprio nome com dificuldade e a cada minuto telefonava para saber se determinada matéria podia ser publicada. Ele não enxergava um palmo diante do nariz. O objetivo era fazer o jornal capitular, isto é, deixar de atacar a doutrina do Sigma, exportada da Alemanha e que um jornalista de Paris revelou que o Sigma, em M deitado, fora marca de um produto sifilítico ... Ante os sucessivos atrasos - pois a primeira edição saía às 11 horas - o diretor
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Luiz Motta Lima, bancário e economista, fundador de vários jornais da imprensa sindical, é sócio colaborador da ABI.
E ROBERTO MARINHO AGREDIU O CENSOR
Cumpriu prisão na Ilha Grande, de onde saiu indultado por movimento nacional dos jornalistas, encabeçado por
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abarrotadas. Houve confabulações entre os confinados, para encontrar-se uma solução. Alguns, mais ousados, chegaram a propor o confronto. É que o número de confinados já superava, de muito, o dos tiras bloqueantes. Os mais ponderados, entretanto, lembraram que, naquele momento, a operação poderia ser exitosa. Seria até um motivo de satisfação derrotar o arbítrio policial. Mas, e no dia seguinte? A vida seguiria e o jornal alí estaria. Foi, então, que alguém se lembrou da ABI. Faltava meia hora, para a meia noite. Telefonema dado para Pedro Motta Lima, que por motivos óbivios não comparecia à sede do jornal, narrou a situação e pediu que a ABI fosse acionada. Pedro telefonou para a residência de Hebert Moses, então Presidente da ABI. Antes da meia noite a polícia tinha sido retirada e a violência cessara. Todos sabemos que Herbert Moses, diretor de “O Globo”, nunca foi comunista. Sequer um esquerdista. Era um dinâmico homem de empresa que poderia ser classificado como um democrata, um liberal. Mas, acima de tudo, era o Presidente da ABI e, como tal, assumira obrigações com a tradição democrática da Casa. Tinha compromisso com a liberdade o que, justiça lhe seja feita, praticava com prazer.
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Jornal da ABI
LACERDA INVADE "A NOITE" , A ABI LIBERA NA HORA Heck, e da Aeronáutica, Grum Moss, vetaram sua posse, constituíram uma junta militar e assumiram o comando do país, com Ranieri Mazzili, presidente da Câmara, ocupando interinamente o Planalto. Para da um verniz de legalidade ao ato de força, exigiram do Congresso o impedimento de Jango. A reação ao golpe militar foi imediata. No Rio Grande do Sul, o governador Leonel Brizola levantou-se em defesa da posse de Jango, conseguindo a adesão do general Machado Lopes, comandante do poderoso III Exército, e formou a “Cadeia da Legalidade”, com rádios dos estados do Sul, através das quais irradiava para todo o país a mensagem da resistência. Outros governadores, como Mauro Borges, de Goiás, e Nei Braga, do Paraná, somaram-se ao movimento. O país estava à beira da guerra civil. No Rio, a situação era delicadíssima. Lacerda, então governador, apoiou o veto à posse de Jango, mas os sindicatos, as entidades estudantis e a intelectualidade mobilizaram-se em defesa da legalidade. A imprensa dividiu-se. Embora alguns jornais tenham assumido uma postura favorável ao golpe, outros como Última Hora, Correio da Manhã, e A Noite ficaram ao lado da Constituição, o que lhes valeu a presença da censura nas redações, comandada por Ascendino Leite, jornalista e intelectual que assumira a direção do Serviço de Censura. Graças à minha experiência de luta contra a censura durante o Estado Novo, lancei uma série de táticas para driblar a tesoura. A primeira delas foi pedir aos censores, sempre que queriam cortar uma
Mario Martins O batismo de fogo da Noite veio em agosto com a renúncia de Jânio e a tentativa dos ministros militares de impedir a posse do vice-presidente João Goulart, que constitucionalmente deveria assumir o cargo. Como disse antes, Jânio não pretendia renunciar para valer, mas apenas fabricar uma crise política da qual pensava em sair com a autoridade reforçada. Apostou que os ministros militares não aceitariam a ascensão de Jango, em quem viam simpatias pela esquerda, e cerrariam fileiras a seu lado, pressionando o Congresso e os partidos a aprovar novos e mais amplos poderes para o presidente. Calculou mal, porém. Sua base parlamentar estava desnorteada pelos seus seguidos ziguezagues - especialmente a UDN, então desencantada e abúlica. Já os adversários, como o PSD e o PTB, agarraram imediatamente a possibilidade de retornar ao poder através de Jango. A opinião pública , que Jânio imaginava que exigiria a sua volta, ficou simplesmente chocada com o gesto estapafúrdio e deu as costas ao presidente que elegera , menos de um ano antes, com votação consagradora. Quando Jânio desembarcou na Base Aérea de Cumbica, em São Paulo, vindo de Brasília, não o esperavam multidões, como supunha, mas tão somente um punhado de seguidores. O Brasil virando uma página. Outra estava prestes a ser escrita. No momento em que Jânio renunciou, Jango encontrava-se no Oriente, chefiando uma missão econômica brasileira à China. Aproveitando-se disso, os ministros da guerra , Odílio Denis, da marinha, Sílvio
notícia, que assinassem um termo de responsabilidade pelo ato. Como a situação política ainda era incerta, eles, com medo de se expor, limitavam-se a passear pela redação. Além disso, inverti o esquema de distribuição dos jornais, começando a reparti-los pelos subúrbios e não pelo Centro. Assim, quando a polícia partia para a apreensão da Noite, a edição já estava praticamente esgotada. Chegamos a vender quase cem mil exemplares naqueles dias, uma marca espetacular para um jornal que, meses antes, costumava encalhar nas mãos dos jornaleiros. Irritado, Lacerda mandou a PM invadir a sede da Noite. Os soldados chegaram pela manhã.
bater na porta errada. O caso tem que ser tratado nos feitos da Fazenda e não na Ordem Política e Social - explicou. A argumentação não me convenceu muito e pareceu-me firula de advogado, mas, de qualquer forma, assinei o documento. O rapaz, porém, sabia do que estava falando. Uma hora depois, estava de volta, com uma ordem do juiz mandando a polícia evacuar a redação. Naquele dia, tiramos uma edição espetacular denunciando a invasão e a atitude de Lacerda. Na primeira página, desancamos o diretor do Serviço de Censura, com um editorial debochado intitulado “Ascendino, Ascendino”. O jornal foi disputado a tapa na cidade. A intensidade da reação popular e a divisão da área militar ao golpe acabariam garantindo a posse de Jango. Cada vez mais isolados, Denis, Heck e Moss foram obrigados a recuar. Como solução de compromisso, fechou-se um acordo no Congresso instituindo o parlamentarismo e limitando os poderes do presidente. Para os ministros militares, era uma saída honrosa; para Jango, que acompanhava a evolução da situação de Buenos Aires e Montevidéu, era uma alternativa aceitável, especialmente porque afastava o espectro da guerra civil. No dia 7 de setembro, duas semanas depois da renúncia de Jânio, João Goulart tomou posse, em Brasília, como presidente da República.
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Saí direto para a ABI. Lá discutimos formas de desalojar a polícia da redação ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Fiquei sabendo da notícia em casa, onde acordou-me um telefonema de Hermes Lima, que falava da Associação Brasileira de Imprensa. - Estamos aqui em vigília - disse-me. Saí direto para a ABI. Lá discutimos formas de desalojar a polícia da redação. Entre os presentes estava um jovem advogado, Marcelo Dória, filho de um exeditor do jornal. - Dê-me uma procuração que tiro a polícia de lá. Não adianta nada entrar na Justiça alegando razões políticas. Isso é
Mario Martins, jornalista e senador, presidiu por vários anos o Conselho Administrativo da ABI. Este é um trecho do seu livro de meórias ("Valeu a pena histórias de um político que nunca foi do contra") publicado após sua morte, ocorrida em 1994.
O QUE ERA IMPORTANTE ACONTECIA NA ABI
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Especial 90 anos
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O presidente Eurico Gaspar Dutra assina, em 28 de setembro de 1949, no Palácio do Catete, lei concedendo à ABI auxío financeiro para saldar a dívida contraída durante a construção do edifício-sede.
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Na sua história foram muitas as vezes em que os próprios jornais não podiam publicar nada sobre as iniciativas da ABI. Mas sempre que chegava uma personalidade importante no país, a entrevista coletiva era marcada na sede da entidade. O restaurante, no décimo-segundo andar, era ponto de encontro dos políticos e jornalistas até a capital se transferir para Brasília. ○
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Não fosse o prestígio da própria entidade, a localização bem no centro da cidade, entre o Senado (na Cinelândia) e Câmara dos Deputados (no Palácio Tiradentes, ao lado da Praça XV), propiciava que a ABI se transformasse no local ideal para o encontro dos políticos com os jornalistas. Por isso mesmo, quem estava à procura da notoriedade cuidava de marcar as entrevistas coletivas para o prédio da ABI. Atos públicos e lançamentos de candidaturas também buscavam espaço na sede, o que ainda hoje acontece. No 12º andar do edifício era comum o desfile de deputados, senadores, escritores, artistas, altos industriais e comerciantes, a compor o cenário do restaurante criado por Herbert Moses, na década de 50, e que se tornara um importante centro de encontros e decisões da capital do Brasil. “Nessa época era muito comum o Itamarati reservar lugares para visitantes, como na passagem do Che Guevara, do Robert Kennedy, Fidel Castro, entre outras personalidades internacionais. Essas pessoas eram muito bem acolhidas e ajudaram a promover a casa”, lembra Fernando Segismundo, presidente do Conselho Administrativo da ABI, que hoje lamenta o fechamento do mais famoso e mais bem frequentado restaurante do Rio de Janeiro, após a transferência da capital para a Brasília. Os jornalistas e artistas também se faziam notar. Haviam espaços cativos de figuras importantes. Era muito comum encontrar com o Costa Rego, redator-chefe do Correio da Manhã, que já havia sido governador do estado de Alagoas, e o compositor e maestro Villa-Lobos, que além de almoçar, jogava bilhar no salão da ABI. Os melsmos bilhares e mesas de sinuca que ainda hoje animam o lazer do sócios no 11º andar do edifício-sede. “Luís Guimarães, diretor de A Gazeta de São Paulo, rico e solteiro, era outro de mesa cativa, que vinha acompanhado de lindas mulheres, às quais presenteava com jóias”, lembra Segismundo. Entre as 13 e 14 horas era difícil acharse um lugar no restaurante. Cheios, os comensais deixavam-se ficar em conversas e fechamento de negócios. Aos jornalistas de salários modestos destinavam-se lugares menos vistosos. E o preço por refeição era reduzido. Por exceção, um ou
O presidente Getúlio Vargas torna-se sócio benemérito da ABI e recebe de Herbert Moses a carteira durante almoço em sua homenagem em 1936.
outro que era chamado a sentar-se à mesa de um notável político ou empresário. Eram estrangeiros a negócios, jornalistas em missão de intercâmbio, líderes nacionais da indústria e do comércio, que eram atendidos pelo Balbis, o excepcional maitre, que havia sido trazido do Copacabana Palace por Herbert Moses, presidente da ABI na época. “O Balbis vestia casaca para superintender o serviço, um sucesso de contínua repercussão no meio social”, afirma Fernando Segismundo, que recorda a presença de figuras de grande notoriedade na época, como, por exemplo, Peregrino Júnior, cronista social, médico e, depois, membro da Academia Brasileira de Letras, que reunia-se diariamente com os amigos no restaurante. Outra lembrança marcante é a da famosa mesa de Moses, que era bastante disputada. “A cada vez compareciam convidados especiais, exigentes de comida e bebida; às vezes ele almoçava com a mulher de um diplomata europeu, com a atriz Henriete Morineau ou com uma jovem candidata a emprego no O Globo”, completa Segismundo, sem esconder a saudade daqueles tempos.
O alvoroço das grandes notícias nas visitas de Fidel Castro, em 5 de maio de 1959, para entrevista coletiva; do governador gaúcho Leonel Brizola, em homenagem ao comportamento dos jornalistas na crise de 1961, e o senador Robert Kennedy discursando para multidão na porta da ABI. ○
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UM MARCO DA ARQUITETURA BRASILEIRA "The most dignified modern building in the word" , como dizia a revista técnica americana, acompanhando a iniciativa da Enciclopédia Britânica de publicar a fotografia do edifício-sede da ABI como modelo de estilo. Muito discutido em início, o projeto dos jovens irmãos Roberto, da nascente M.M.M. Roberto, baseado na estética de Courbisier, despontou no centro no Rio simultâneamente ao projeto de Oscar
Niemeyer para o Ministério da Educação. Era o início do movimento de renovação que iria deixar sua marca na arquitetura mundial. Os brise-soleil moldam a fachada do prédio, criando varandas internas que circundam todos andares antes das molduras e portas de madeira e vidro, que permitem a montagem de divisórias nos amplos espaços conforme as necessidades de uso. Não raro é possível assustar-se com o desfile de jovens estudantes de arquitetura, de todas as partes do país, circulando pelo prédio, formalmente inaugurado, antes mesmo de totalmente concluído, há 60 anos, em 10 de julho de 1938, e inscrito no Livro de Tombo das Belas Artes, Volume II, sob o nº 559, a fls. 6, em 29 de maio de 1984. Construído com a doação de dinheiro público e particular, sempre perseguido pela perseverança de Herbert Moses, mesmo assim o prédio não chegou a ter seu projeto inicial, vencedor de concorrido concurso, totalmente respeitado: eram previstas áreas de esporte e lazer em partes subterrâneas. Antes do tombamento algumas modificações significativas eliminaram o terraço com bar, onde Moses recebia personalidades e candidatas dos concursos de miss, e
também o restaurante do 12º andar. Atualmente o prédio tem andares alugados que possibilitam a independência financeira da entidade, utilizando a associação os seguintes espaços: subsolo, com área para empregados; sexto andar, com as clínicas do serviço médico gratuito; sétimo andar, abrigando as atividades administrativas, sala da presidência, sala do conselho administrativo e um pequeno auditório; nono andar, onde fica o auditório de dois pisos e amplo saguão de exposições; décimo andar, com consultório médico e sala de entidades cívicas; 11º andar, acolhendo a área de lazer e jogos dos sócios, além de cabelereiro, cantina, sala de redação e a Diretoria de Atividades Culturais, e o 12º andar, com a Biblioteca Bastos Tigre, especializada em temas da comunicação, e o Departamento de Intercâmbio e Divulgação.
À esquerda,a primeira sede, no jornal O Paiz, e a sede, de 16 a 22, no Liceu. Em cima,o sobrado dos anos 20, na Rua do Rosário. À direita, a da Rua do Passeio, onde funcionou o Clube dos Democráticos. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Moses lança a pedra fundamental do edifício da ABI em 30 de setembro de 1935, sempre com o prestígio das autoridades que também participaram da inauguração oficial há 60 anos, em 10 de julho de 1948, embora só poucos anos depois o prédio ficasse totalmente concluído. ○
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ABI É A ORIGEM DOS CURSOS DE COMUNICAÇÃO Na ata de fundação da ABI já constava a intenção de "habilitar, por meio de título de capacidade intelectual e moral, o pretendente a colocação no jornalismo". O decreto que inclui o curso destaca a "cooperação da ABI", que foi efetiva, através da ação de Moses, conseguindo verba da Souza Cruz, onde era diretor, para pagamento dos primeiros salários de professores. O vínculo continua, com encontros e susgestões para a melhora dos A idéia da criação de um curso de Brasil. jornalismo Em 1938, ou seja, 20 anos depois, o cursos.no Brasil nunca foi nova. Ela se confunde com a própria história da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) que desde sua fundação, em 1908, tornoua como uma de suas prioridades. Porém há registros de que, em 1900, Teófilo Guimarães já tenha articulado discussões a respeito da viabilidade e importância de um profissional de jornalismo com diploma à mão e visão ampla. Isso tomando como exemplo casos como o da França, que contava com um curso em Paris desde 1889, e da Inglaterra, onde, no início do século, se inaugurou um curso exclusivo para mulheres. “Desde o surgimento da imprensa entre nós, era jornalista quem o quisesse, bastando o ato expresso da escrita e os meios de transmiti-la, multiplicada, a determinado público”, lembra Fernando Segismundo, presidente do Conselho Administrativo da ABI. Era desejo de Gustavo de Lacerda, fundador da ABI, que se criasse um estabelecimento que viabilizasse a educação moral do futuro jornalista, que lhe apurasse a vocação e lhe incutisse e ampliasse os preceitos de uma conduta ética . Gustavo faleceu logo depois de fundada a Associação e sem saber que ainda seriam necessários mais de quarenta anos até que seu sonho se concretizasse. Mas a idéia de um curso de jornalismo não esmoreceu. Os demais presidentes da ABI, se não conseguiram, elaboraram planos futuros. Raul Pederneiras (presidente da entidade no biênio 1915/ 1917) foi um dos grandes defensores da idéia na época. Em sua concepção, o nível cultural do jornalista seria muito superior se refinado em escola própria: “acabaria a má fé, a ignorância disseminada e os processos indecorosos de fazer imprensa”. João Guedes de Melo - um dos grandes expoentes da casa e presidente em 1918/19 - era mais um dos que se preocupavam com a integridade do profissional. Queria ele que os jornalistas de fato se unissem e cultivassem a profissão com seriedade e contra “os aventureiros, os inconscientes, os analfabetos da profissão”. Foi por mérito exclusivamente dele que se realizou o I Congresso de Jornalista Brasileiro, em 1918. Entre as discussões e debates, abordou-se a necessidade de uma escola de jornalismo. Saiu das mãos de João Guedes de Melo o primeiro esboço de um currículo básico . Nele se previa uma cadeira só para estudar a história das instituições de poder do ○
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Pompeu de Souza, ministraram a primeira aula sobre lead no país. Uma comissão de bacharéis dessa primeira turma iria, tempos depois, encontrar-se com o presidente Getúlio Vargas e entregar um documento reivindicando, entre outras coisas, a criação da carreira de jornalista. Mas foi somente em 1961, exatamente três dias antes da renúncia de Jânio Quadros, que se criou normas para o desempenho da função de jornalista. O Decreto nº 51.218 ditava que o direito ao desempenho da profissão ficaria a cargo dos diplomados ou daqueles que recebessem certificado de habilitação de ensino de jornalismo. Para que não se fizesse uma injustiça com os profissionais atuantes, não seriam prejudicados aqueles que exercessem a profissão há mais de dois anos e fossem registrados nos departamentos pessoais de suas empresas, bem como aqueles filiados aos sindicato ou à ABI. Apesar de bem recebido, o decreto de Jânio teve que ser revogado pois feria um princípio. “O Decreto que tencionava regulamentar o Decreto-Lei número 910 foi
Decreto-Lei n.910, promulgado por Getúlio Vargas - que fora jornalista no Rio Grande do Sul - estabelece a criação de escola preparatória para a profissão e que seus registros profissionais se dariam com a aquisição dos diplomas ou por exames prestados nestes locais. Os interesses opostos ao DecretoLei n.910 acabaram por transformá-lo apenas em promessa vazia. Herbert Moses, já então presidente da ABI desde 1931, não mede esforços para que o Governo baixe, em 13 de maio de 1943, o Decreto-Lei n.5.840, instituindo o curso de jornalismo como parte do sistema de ensino superior. O Decreto diz em seu artigo terceiro: “O curso será ministrado na Faculdade Nacional de Filosofia com a cooperação da Associação Brasileira de Imprensa e dos sindicatos representativos das categorias de empregados e empregadores das empresas jornalísticas.” Com o Ministério da Educação ficava a responsabilidade de fixar as matérias que fariam parte do currículo do curso. Mas a indecisão e a lentidão dos serviços públicos permitiram que o proprietário de A Gazeta de São Paulo, Cásper Líbero, fundasse uma escola de jornalismo agregada à Faculdade de Filosofia, Ciência e Letras São Bento, da PUC-SP, em 1947. O Decreto n.28.923, de 1950, finalmente deu origem ao primeiro curso oficial de jornalismo, no Rio de Janeiro, vinculado à Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil (atual UFRJ) que, segundo Fernando Segismundo, “contava com professores indicados pela ABI e recursos financeiros obtidos junto à Companhia de Cigarros Souza Cruz, da qual Herbert Moses era diretor”. Como conseqüência de Decreto-Lei n.5.480, ficava a cargo do Ministério da Educação a formulação dos programas de curso, tolhendo dessa forma a sua autonomia. A primeira turma foi liberada dos exames de vestibular e contava com cerca de 300 alunos. Alguns professores eram profissionais renomados mas nunca haviam tido experiência em sala de aula. “A nossa turma era a maior e as aulas eram dadas no Salão Nobre, único lugar onde cabia a turma toda”, conta Maria Cecília Carneiro, profissional formada nesta primeira turma. Foi nesta mesma época que Danton Jobim, professor de Ética e Técnica Jornalística, junto com o também professor
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inconstitucional porque inovava em um de seus artigos, com a exigência do curso de comunicação para o jornalista ser admitido em empresa. O Decreto presidencial apenas regulamenta ou dirime dúvidas mas não pode extrapolar o que está previsto na lei ou no Decreto-Lei”, argumenta Reinaldo Santos, assessor jurídico da ABI. Em conseqüência disso, Tancredo Neves, à época chefe do conselho de Ministros, levou à apreciação da ABI uma proposta do governo para a reunião de um grupo fechado que pudesse rever a legislação e ouvir novas idéias. O que resultou no decreto número 1.177 de julho de 1962, assinado por Tancredo Neves e pelo Ministro da Justiça da época, Alfredo Nasser. Essa lei reconhecia os jornalistas autodidatas nas localidades onde não houvesse escolas ou cursos de jornalismo, mas exigia o registro profissional para diplomados e não diplomados. Por fim, em 17 de outubro de 1969, durante o governo dos ministros militares que substituíram o presidente Costa e Silva (em fim de mandato e afastado por motivos de saúde), é promulgado o Decreto-Lei número 972 que criou a obrigatoriedade de possuir um curso superior de comunicação social para o ingresso em empresa jornalística. Abriu também quatro exceções que persistem até hoje: ilustrador, repórter fotográfico, repórter cinematográfico e diagramador. Para essas quatro exceções não é exigido o diploma de nível superior. O último diploma legal relacionado à área de comunicação social, de 1979, esmiuça e esclarece o Decreto-Lei 972. O inciso IV do artigo oitavo dita que para o registro de provisionado é necessária a apresentação de certificado de conclusão do segundo grau, isto é, nas localidades onde não houver escolas de comunicação.
ANUNCIO 1/4 SCANIA
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Jornal da ABI
HÁ 47 ANOS, A PRIMEIRA TURMA DE JORNALISMO não manifestaram maiores reações com relação ao curso. “Havia um certo desdém porque o diploma não era obrigatório, então, não fazia muita diferença”. Na opinião de Maria Cecília, “o curso era absoluta novidade e foi até um pouco ridicularizado”. Desde o início, o curso atraiu um número muito grande de pessoas. Segundo nos conta Maria Cecília, “a turma de Jornalismo ocupava praticamente a faculdade inteira. Éramos mais de 300”. Funcionando no prédio tomado da Itália na Segunda Guerra, as aulas eram dadas
Jacqueline Lavôr A criação do curso de jornalismo, a primeira turma a se formar na UFRJ e a modernidade da imprensa brasileira história de épocas as mais diversas - se fundem em um só momento e local, todas as tardes dos dias úteis, no 11o andar da Associação Brasileira de Imprensa. Os cumprimentos em voz alta e o jeito espalhafatoso de Barra Sobrinho, bastante jovial aos 75 anos, não coincidem com a resposta discreta, corpo magro e curvado, de Ítalo Saldanha da Gama, aos 82 anos. Menos ainda como o recato e compenetração de Renato Jobim, não aparentando os 66. “O Barra já era agitadão assim, só que bem mais magrinho”, lembra com sorriso esperto Maria Cecília Ribas Carneiro, 74. Com a concordância também risonha de Ary Nepomuceno, preservando o topete todo branco aos 93. Há 47 anos estes freqüentadores assíduos da ABI posavam juntos, no salão do Clube Militar, para a foto oficial de formatura da primeira turma do curso de Jornalismo da Faculdade Nacional de Filosofia. Falar da primeira turma e do que era, naquela época, o ofício do jornalista não foi sacrifício. A oportunidade foi ao mesmo tempo disputada e repartida com assombroso entusiasmo por cada um deles. Maria Cecília, apesar de ter enveredado por outra áreas, como Direito e História, começou num jornal chamado Brasil Portugal. Assim como a grande maioria da turma, em 1948 ela já atuava como jornalista, antes mesmo de fazer o curso. Os primeiros alunos de Jornalismo não precisaram prestar vestibular. A medida foi utilizada pelo Governo durante três anos para incentivar os jornalistas que já atuavam no mercado a se inscreverem. O único prérequisito era ser profissional de imprensa, com carteira assinada e registro no Ministério do Trabalho. Aos 17 anos, Renato Jobim já escrevia para jornais. Trabalhando no Diário Carioca, sua entrada para o curso também se deu precocemente, antes mesmo de terminar o científico, como permitia a lei. “A minha turma era quase toda de pessoas mais velhas do que eu. A grande maioria era de homens feitos, que já estavam trabalhando”. Segundo Renato, os jornais
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Especial 90 anos
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Quatro dos formandos de 1950 são conselheiros da ABI e lembram que, dos 300 inscritos, menos de um terço se formou. Uma comissão foi a Getúlio pedir a obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
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no Salão Nobre, “único lugar onde cabia a turma toda”, acrescenta. Com apenas três anos de duração, o curso de Jornalismo começou de forma peculiar. As disciplinas de caráter geral como História do Brasil, Literatura, Geografia Humana e Francês eram predominantes. Barra Sobrinho era um dos que questionavam não só o formato do curso como também o conteúdo que alguns professores davam às matérias. Os professores, entre os quais havia acadêmicos e jornalistas reconhecidos,
decisivo para a imprensa brasileira. “O Jornal do Comércio, publicava discursos na íntegra e o Jornal do Brasil era basicamente de anúncios”. Ary Nepomuceno foi um dos convidados presentes à festa que inaugurou o prédio da ABI, em 1938, e se orgulha de ter organizado a comissão de bacharéis que em 1951 foi recebida por Getúlio Vargas no Palácio Guanabara para fazer a primeira reivindicação da turma. O documento entregue a Getúlio solicitava a criação da carreira de jornalista para os
foram recrutados especialmente para o curso, mas muitas vezes nunca tinham dado aula. Segundo Maria Cecília, esse caráter extremamente abrangente e teórico do curso o tornava muito árido, o que fez com que apenas um terço dos inscritos chegassem ao final, em 1950.”A turma era bastante heterogênea e muitos que se inscreveram achavam que era só chegar lá e assistir as conferências. Quando viram que teriam que estudar e fazer provas , os que já trabalhavam desistiram do curso”. Conselheiro da ABI, além de membro da Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa, Ítalo Saldanha, 82 anos, relembra que “a primeira aula sobre lead no Brasil foi dada na turma de 1948 por Pompeu de Souza e Danton Jobim, na disciplina chamada Técnica de Redação “. Começava nesta época a transformação dos jornais em empresas, com a adoção de novas técnicas de redação e apresentação gráfica. Para Maria Cecília, a ruptura com o caráter formal que era adotado nas redações foi
serviços de imprensa dos ministérios, autarquias e órgãos especializados como a Agência Nacional. Segundo Maria Cecília, que também fez parte da comissão, este grupo procurou ainda saber se o Presidente pretendia tornar o curso obrigatório. Embora a resposta tivesse sido positiva, somente em 1961 isso veio a ocorrer de fato. Na opinião de Barra Sobrinho, “o jornalismo era um bico, uma espécie de trampolim para um outro emprego que de fato nos sustentasse”. Segundo Barra, embora o formato do curso não fosse o ideal, ele foi importante para valorizar o trabalho do jornalista. Na avaliação de Maria Cecília, apesar dessas deficiências, os cursos os deixou aptos à pesquisa, aguçando a tendência que todo jornalista deve ter para conhecer e entender um fato ao invés de simplesmente relatá-los: “fazer uma matéria só com o que viu passar na rua, não serve. Você tem que saber o porquê daquilo tudo”.
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Jacqueline Lavôr, do Núcleo de Imprensa da Escola de Comunicação/ UFRJ, no Jornal da UFRJ, em 1995. ○
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JORNALISMO E UNIVERSIDADE: UMA LONGA HISTÓRIA DE CONFLITOS Quando Tobias Peucer defendeu sua tese de doutorado sobre o jornal diário (Leipzig, Alemanha, 1690), a Universidade e o Jornalismo iniciaram uma convivência nem sempre harmoniosa As tensões naturais decorreram do descompasso entre a lentidão da vida universitária (cujo rigor cognitivo pressupõe maturidade analítica) e o ritmo veloz da atividade noticiosa (cuja desafio permanente é o de converter-se em espelho da vida cotidiana). Tanto assim que as primeiras incursões acadêmicas no âmbito do Jornalismo limitaram-se a projetos de pesquisa e a programas de educação avançada de cidadãos motivados para interagir criticamente com a impressa de massas. Mas a notícia deixa de ser, em meados do século XIX, um artefato exclusivo para a tomada de decisões das elites. Convertendo-se em mercadoria, passa a ser consumida avidamente pelas classes trabalhadoras, ora com propósitos meramente escapistas, ora com intenções politicamente construtivas. As emergentes fábricas de notícias demandavam recursos humanos capacitados para registrar os fatos, transformando-os em produtos de difusão coletiva. Por isso mesmo, ao criar, em 1908, na Universidade de Missouri (Estados Unidos), a primeira escola destinada à formação de jornalistas profissionais, a preocupação basilar de seu fundador, Walter Williams, foi a de estabelecer mecanismos capazes de neutralizar a defasagem entre a vida universitária e o mundo jornalístico. Nesse sentido, ele implanta um jornal laboratório The Daily Missourian -, com estrutura similar à de uma empresa. Ela pretendeu a um só tempo abastecer a comunidade local de notícias e buscar autosustentação financeira através da ○
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A experiência, contudo, mostrava-se insatisfatória. Tanto assim que uma das metas perseguidas pelos profissionais e empresários reunidos no I Congresso Brasileiro de Jornalismo (Rio de Janeiro, 1918) foi a criação de uma escola de jornalismo, à semelhança do que existia na Europa e na América do Norte. A essa causa dedicou-se incessantemente a ABI - Associação Brasileira de Imprensa. Sua estratégia foi a de acionar o aparato burocrático do Estado, dele esperando a solução. Como a máquina estatal é lenta, foram necessárias três décadas para que a medida fosse transformada em lei. Em 1939, o ditador Vargas baixou decreto instituindo o ensino de jornalismo no quadro da nossa educação superior. Mas só em 1947, por iniciativa de uma empresa privada de São Paulo - o grupo jornalístico Cásper Líbero a idéia seria materializada, em convênio com a Pontifícia Universidade Católica. No ano seguinte, a universidade pública, ou seja, a Universidade do Brasil, hoje UFRJ, acertaria o passo com a história, legitimando o campo midiático. A assimilação do Jornalismo pela universidade brasileira seria, contudo, problemática. Primeiro, porque os cursos ficaram subordinados aos institutos destinados à formação de professores de língua e literatura. Notabilizando-se pela ênfase humanística, eram carentes de atividades profissionais, na teoria e na prática. Segundo, porque a profissão reagiu negativamente, em certo sentido refugando os jornalistas diplomados. Estes buscaram opções de trabalho no serviço público, nutrindo a cultura das assessorias de
funcionando também como vigilantes da indústria cultural (media watching), observando criticamente seu comportamento sócio-político e municiando as lideranças da cidadania para coibir os eventuais abusos. Jornalismo e universidade/ JMM - 3
José Marques de Melo O modelo de formação de jornalistas, aí testado e validado, em nível de graduação, ancorou-se na linha do pragmatismo pedagógico (aprender fazendo). Mas foi evidentemente complementado pela transmissão de conteúdos culturais, que os alunos assimilavam optativamente, frequentando aulas nos departamentos de filosofia, ciências e artes cultivadas no campus universitário. Paralelamente ○ ○ ○ ○ ○ a essa experiência de treinamento de repórteres/redatores de informação geral, implantou-se na Universidade de Columbia (NewYork) um outro modelo, patrocinado pelo empresário Joseph Pulitzer. Com a intenção de formar j o r n a l i s t a s especializados, a escola capacita pessoas já ○ ○ ○ ○ ○ graduadas em outros campos do conhecimento, conferindo-lhes o título de Mestre em Jornalismo. Durante todo o século XX, as universidades norte-americanas aperfeiçoaram esse duplo modelo de formação de jornalistas. O passaporte para a profissão pode ser o diploma de Bacharel em Jornalismo (geralmente cobiçado pelos jovens repórteres) e o grau de Mestre em Jornalismo (demandado pelos candidatos a postos de redatores nas editorias especializadas). Além disso, foram estimulados programas permanentes de pesquisa sobre os fenômenos jornalísticos, tanto financiados pelas empresas (desejosas de equacionar problemas editoriais ou mercadológicos) quanto subsidiados pelas fundações culturais (geralmente preocupadas com as distorções da mídia e seus impactos negativos sobre a sociedade). A integração da universidade com as empresas jornalísticas, tanto nos Estados Unidos quanto em países industrializados como Austrália, Canadá, Japão, Inglaterra, tem se mantido de forma dinâmica, através de programas de estágios de estudantes e reciclagem de professores na indústria midiática. Por sua vez, as universidades abrem suas portas para receber profissionais e empresários, em busca de atualização de conhecimentos. Mas essas relações nem sempre são harmômicas. As universidades tem buscado preservar sua autonomia,
Da mesma forma, as empresas e as associações profissionais atuam como fiadoras da boa qualidade do ensino e da pesquisa jornalística, participando dos conselhos de credenciamento e avaliação dos cursos, ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ oferecendo subídios para os rankings de q u a l i d a d e acadêmica. Mas não se esquivam de c r i t i c a r publicamente as universidades que incorrem em desvios ou p r e s e r v a m e s t r u t u r a s anacrônicas. Muitas vezes elas exercem seu poder ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ de pressão, cortando subsídios ou reduzindo os incentivos. Trata-se de uma permanente tensão dialética, que tem sido útil para neutralizar o gap entre as demandas do sistema produtivo e as prioridades universitárias, sem esquecer os interesses da cidadania.
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Os primeiros cursos nos Estados Unidos já apresentavam o conflito entre privilegiar a prática ou a teoria. Restou espaço para as duas opções, com a adoção de dois tipos de formação.
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A assimilação do Jornalismo pela universidade brasileira seria problemática, porque os cursos ficaram subordinados aos institutos destinados à formação de professores de língua imprensa, posteriormente também e literatura
Impasses brasileiros A tradição brasileira de formação de jornalistas começa agora a conquistar solidez. Desde o século passado conhecemos iniciativas destinadas a capacitar jovens bacharéis para o exercício de atividades noticiosas. As primeiras incursões foram feitas pelas faculdades de direito, no Rio de Janeiro, criando disciplinas curriculares voltadas para o conhecimento da retórica verbal e da argumentação jornalística. Depois, as instituições católicas, preocupadas com os desvios éticos cometidos pelos jornais, organizaram cursos intensivos ou colóquios filosóficos. Sua finalidade era disseminar a mística da “boa imprensa”, comprometendo os jornalistas com a difusão da “verdade”. Mas a verdadeira formação dos jovens jornalistas brasileiros dava-se no interior das redações, através da “pedagogia do batente”. Profissionais gabaritados instruíam os “focas” a realizar as tarefas rotineiras de captação de notícias, redação de textos, diagramação de jornais etc.
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absorvida pelas empresas privadas e ONGs. Somente nos anos 60 reduziu-se o gap universidade-empresa, justamente quando a nossa indústria jornalística dinamiza-se e moderniza-se. Impactada pelo expansionismo da mídia eletrônica, ela recruta estagiários provenientes das universidades. Este é um período em que a profissão de jornalista adquire um novo perfil. Deixa de ser “bico”, convertendo-se em emprego de tempo integral, sobretudo nas empresas do eixo Rio-São Paulo. Mas é também o momento em que a liberdade de imprensa enfrenta obstáculos poderosos. O regime político pós-1964 ○
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constrange as universidades, transformando-as em bastiões de resistência. Os cursos de jornalismo tornam-se focos de contestação, disseminando informações/opiniões contrárias ao governo. Por isso, os donos do poder não hesitam em cortar o mal pela raiz, tentando até mesmo a extinção de tais cursos. O palco dessa batalha foi o antigo CFE - Conselho Federal de Educação. Se não logram êxito imediato, os adversários dos jornalistas formados pelas universidades conseguem resultados
Estado, inclusive a flexibilização da “reserva de mercado” (combatida pelos sindicatos), as empresas buscaram soluções paliativas. Criaram cursos de reciclagem para os recémformados na tentativa de superar as deficiências oriundas dos bancos universitários. Mas os resultados mostramse insatisfatórios. Enquanto isso, o jornalismo brasileiro padece de uma crônica endemia. Profissionais mal treinados produzem informações deficientes, frustando as expectativas dos consumidores midiáticos. Quem sofre as consequências é a população, ávida de conhecimento, mas insatisfeita frente às opções informativas disponíveis no mercado.
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Os cursos de jornalismo tornamse focos de contestação, disseminando informações/opiniões contrárias ao governo. Por isso, os donos do poder não hesitam em cortar o mal pela raiz, tentando até mesmo a extinção de tais cursos indiretos. Minaram na base a auto-estima corporativa dos jovens estudantes, através de uma manobra pouco sutil. Suprimiram a autonomia dos cursos de jornalismo, transformando-os em apêndices do megacurso de Comunicação Social. Como habilitação profissional de uma carreira desenhada academicamente, o Jornalismo perdeu sua identidade. Confundiu-se e entrou em conflito com as fronteiriças profissões midiáticas. Não demorou muito a reação das empresas, desqualificando e/ ou recusando os jornalistas egressos das universidades. Estas evitam o caminho do diálogo, adotando a “estratégia da avestruz” ao converter-se em guetos. Na raiz da questão está a “lei do diploma”, que, desde 1969, tem mantido a reserva do mercado de trabalho jornalístico para os egressos das universidades. Embora propiciem razoável base cultural e em alguns casos estimulem a prática jornalística nos laboratórios didáticos, falta aos cursos de comunicação vontade política para negociar programas de cooperação com as empresas. A proibição do estágio tem sido fator de estímulo à formação de jornalistas despreparados para enfrentar o primeiro emprego. A situação agrava-se com a velocidade com que as novas tecnologias de comunicação são absorvidas pelo mercado. Impotente, isolada e pauperizada, a universidade não tem tido condições para acompanhar as inovações vigentes no mundo do trabalho. Há evidentes exceções à regra, mas o panorama nacional é desalentador. Enquanto aguardam as “reformas” do ○
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pacificamente. Nesse sentido, não basta ter informações gerenciais sobre o campo, sendo indispensável formação científica especializada, acumulando evidências sobre o conhecimento midiático disponível nas universidades e no sistema produtivo. São temáticas que ○ ○ ○ ○ ○ ○ suscitam ações ao nível da pesquisa e da pós-graduação stricto sensu, resgatando a tradição da zeitungwisenchaft, ideal perseguido por tantos estudiosos do jornalismo como disciplina científica, desde Peucer e ○ ○ ○ ○ ○ ○ Fischer (século XVII) a D’Esther, Groth, Kayser, Clausse, De Gregorio, Nixon, Suarée, Jobim ou Beltrão (século XX). Para tanto é imprescindível recorrer à cooperação internacional, superando o isolacionismo em que as universidade brasileiras tem se mantido no âmbito midoológico. Apesar dos esforços realizados por indivíduos ou por instituições, trata-se de uma postura coletiva a ser adotada pela comunidade acadêmica do Jornalismo. Tudo se torna mais fácil com o uso da internet e outros canais de comunicação à distância. A internacionalização da vida acadêmica constituiu um desafio enfrentado historicamente pelas nações que lograram acelerar seus processos de desenvolvimento econômico, sem renunciar às respectivas identidades culturais. Em outros campos do conhecimento o Brasil tem dado passos significativos. Trata-se, agora, de criar essa consciência entre os docentes e pesquisadores do Jornalismo e da Comunicação de Massa.. E de transmiti-la como legado às novas gerações, inspirando-lhes atitudes de auto-estima no tocante às contribuições brasileiras para o campo da midiologia, tão significativas quanto aquelas produzidas em países que se modernizaram precocemente.
A parceria com as empresas midiáticas é a única saída para superar o impasse da falta de recursos das universidades
Idéias para o debate A ultrapassem da crise depende fundamentalmente da capacidade das lideranças acadêmicas, empresariais e sindicais para negociar soluções de interesse público. Trata-se de romper o imobilismo que nos enfraquece, priorizando os sonhos do contingente de pelo menos 10.000 jovens que, anualmente, disputam vagas nos vestibulares de mais de uma centena de cursos de jornalismo existentes nas universidades brasileiras. No terreno universitário, as perspectivas são favoráveis. A vigência da nova LDB - Lei de Diretrizes e Bases - enseja reformas pedagógicas que apontam na direção da autonomia universitária e da liberdade curricular. É hora de reconquistarmos a identidade dos cursos de jornalismo, superando a condição subalterna de “habilitação” profissional no âmbito comunicológico. Trata-se de reforçar o perfil profissionalizante do ○ ○ ○ ○ ○ currículo da graduação, mantendo a convivência com as outras profissões midiáticas, mas reconhecendo com nitidez as fronteiras que nos aproximam, mas muitas vezes nos separam. A meta deve ser o resgate da interdisciplinaridade com as outras áreas do saber (filosofia, artes, ciências), superando a dependência cognitiva que hoje ○ ○ ○ ○ ○ nos atrela ao p e n s a m e n t o comunicacional não-empírico. Isso significa interagir dinamicamente com a pós-graduação, abrindo espaços para o desenvolvimento de programas no âmbito do jornalismo especializado. De um lado, é necessário atender às demandas dos profissionais de outras áreas, dotados de vocação jornalística, que pretendem aprender a produzir notícias ou interpretá-las adequadamente. De outro lado, é imprescindível corresponder aos anseios dos jornalistas diplomados que
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anseiam aprofundar-se numa área de conhecimento específico para melhor atuar em determinada editoria. Ao mesmo tempo é urgente restaurar o estágio nas empresas. Sem testar os conhecimentos adquiridos na universidade n e n h u m ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ profissional se habilita ao ingresso no mercado de trabalho. Na prática, a proibição do estágio para estudantes de jornalismo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ tornou-se “lei para inglês ver”. Os mais bem relacionados valem-se do “jeitinho brasileiro”. Mas há parcelas de jovens que não tem acesso às empresas, diplomando-se sem experiência e em função disso são recusados no primeiro emprego. Trata-se de um círculo vicioso. Ao invés de continuar adotando a tática de “empurrar com a barriga”, cabe aos sindicatos estaduais e à federação nacional dos jornalistas encontrar uma saída para o impasse, negociando-a com as organizações patronais e a universidade. O mercado de trabalho para os jornalistas adquire cada dia maior complexidade. A globalização exige novas habilidades - linguísticas, culturais, tecnológicas - que as atuais gerações não possuem. A virtualização ensejada pela telemática configura novos segmentos ocupacionais que não estão sendo preenchidos pelos jornalistas em exercício porque falta-lhes competência tecnológica. As universidades não estão preparadas para enfrentar o ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ p r o b l e m a isoladamente. Faltalhes recursos financeiros e humanos capazes de encontrar soluções imediatas. A parceria com as empresas midiáticas é a única saída para superar o impasse. Elas p o s s u e m competência gerencial e tecnológica, que pode ser transferida ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ às universidades, aí potencializando-se para gerar produtos de vanguarda. No entanto, a mútua desconfiança que historicamente vem separando os dois segmentos sociais permanece como obstáculo intransponível. A mediação dos sindicatos profissionais pode ser uma alternativa razoável. Contudo, o maior desafio é a preparação dos jovens jornalistas para compreender o jornalismo como um negócio (sem perder o caráter de serviço público), idéia nem sempre aceita
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São Paulo, 21 de março de 1998
José Marques de Melo, representante da ABI em São Paulo, é Doutor e Livre-Docente em Jornalismo, professor da ECA-USP, pesquisador do Laboratório de Jornalismo da UNICAMP e presidente do Comitê de Pesquisa da ORBICOM (Rede Mundial de Cátedras UNESCO de Comunicação).
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ABI PROMOVE UMA PROPOSTA DE PARCERIA Felizmente o I Encontro Universidade-Empresa de Jornalismo revelou desde o início mais pontos de dissenso que de consenso. Antes mesmo que os representantes dos veículos, das empresas, fossem sucedidos pelos representantes das escolas de comunicação, era possível verificar as diferenças de pontos de vista quanto a quase todas as questões suscitadas. Essas divergências tornaram-se ainda mais acentuadas a partir do momento em que se manifestaram os representantes das escolas. Essa multiplicidade de diferenças confirma o acerto e a oportunidade da realização deste encontro e legitima seu título oficial: I Encontro Universidade-Empresa de Jornalismo. Se fosse apenas para inventariar pontos de convergência, não seria necessário convocá-lo. E muito menos prever que ele seja sucedido por um segundo, um terceiro e quem sabe quantos mais. Os principais pontos de divergência revelados pelo debate poderiam ser assim resumidos: 1. Obrigatoriedade do diploma específico e do registro profissional. Nem entre os representantes dos veículos nem entre os das escolas houve unanimidade. Dois jornais têm posição firmada contra a obrigatoriedade do diploma: mas “O Estado de São Paulo” só contrata portadores do diploma de comunicação, enquanto a “Folha de São Paulo” exige apenas algum diploma, qualquer diploma de curso superior. 2. Os processos de recrutamento profissional de jornalista. Quase todos os ve-
ículos representados evoluíram nos últimos anos para os chamados processos formais de recrutamento - cursos e concursos abertos a jornalistas, recém-formados ou não. Na maioria dos casos, porém, esses processos formais convivem com os chamados processos informais - o recrutamento e a contratação em decorrência do conhecimento, da experiência prévia e da reputação do profissional. Os representantes das escolas deixaram claro, de modo geral, que prefeririam ver universalizar-se a prática dos processos formais - inclusive pelo recurso ao currículo escolar dos pretendentes. 3. Processos de treinamento, complementação de formação e reciclagem. Quase todos os veículos representados mantêm alguma forma de treinamento e complementação e começam a considerar experiências de reciclagem. Tais sistemas já configuram a existência de verdadeiros bancos de talentos à disposição de outros veículos, de cidades menores e mesmo concorrentes. 4. Expectativas em relação à qualidade e ao conteúdo da formação oferecida pelas escolas e deficiências do ensino. O mais importante é esclarecer equívocos. Achar dispensável o registro não significa necessariamente considerar possível a formação de profissionais sem curso superior. Essa formação, de preferência, deve resultar de cursos mistos, interdisciplinares. Por exemplo: economia e jornalismo. A crítica aos cursos não significa, também, que as empresas estejam decididas a liquidálos. Outra deficiência a registrar: a formação de professores. Em muitos casos se tornam professores pessoas com formação acadêmica e quase nenhuma experiência
profissional. Há, além disso, um fosso que separa a empresa, o veículo, da universidade. Os jornais criam cursos a que dão o nome de reciclagem, mas na verdade são de formação: cursos de português, cursos sobre a realidade brasileira etc. Não é esse o melhor caminho: o melhor seria fazer isso em parceria com a universidade. Paralelamente à exposição das divergências, verificou-se grande esforço em busca de alternativas para as situações discutidas, o que permite indicar não só pontos de convergência como verdadeiras conclusões deste debate: 1. É preciso acabar com o fosso entre os veículos e a escola, assim como entre diferentes veículos. 2. A universidade deve abrir-se mais, mostrar-se mais sensível às demandas do mercado de trabalho. A empresa deve abrirse mais para a universidade, apoiá-la e integrar-se com ela. Uma proposta exemplificadora: convênios que possibilitassem a troca de profissionais, num período de tempo, entre empresas e universidades. Professores ganhariam vivência atualizada da profissão, ajudando didaticamente os cursos das empresas; jornalistas dinamizariam a prática profissional nas escolas, inclusive na orientação a pesquisas acadêmicas mais ajustadas à realidade do mercado. 3. As empresas controladoras dos veículos estão em busca de bons profissionais, mas sentem necessidade de completar a formação oferecida pela escola. 4. As deficiências dos recém-formados no manejo da linguagem não podem ser debitadas à universidade. Depois de
oito anos de ensino de primeiro grau e mais três de segundo grau, nas condições a que o ensino básico foi reduzido no país nas últimas décadas, não é possível que a universidade recupere em quatro anos os estragos dos onze precedentes. É lamentavelmente baixo o grau de interesse, entre os alunos, pela leitura de livros e mesmo de jornais. Uma das explicações para isso é que boa parte dos alunos não está em busca de capacitação profissional, mas sim de um diploma que confira status social. 5. Currículos. Os veículos prefeririam que os alunos saíssem das escolas senhores de uma gama de conhecimentos maior, mais interdisciplinar. As escolas verificam que a lei é excessivamente rigorosa na definição do currículo mínimo. Modificações de currículos devem ser estimuladas, com a participação das empresas. 6. Uma pergunta final: como fazer na prática para tornar realidade as propostas que se revelaram consensuais no encontro? Essa pergunta já tem uma primeira resposta: a Associação Brasileira de Imprensa inclui entre suas preocupações permanentes a questão da capacitação profissional, com vistas à qualidade do jornalismo praticado no país. Através da entidade podem ser criadas atividades de interesse para as empresas e universidades. Esse debate não deve ficar confinado aos jornalistas e às escolas de comunicação, mas deve ser levado à sociedade e suas instituições representativas. Rio de Janeiro, 14 de outubro de 1993.
ANUNCIO 1/2 CORREIO BRASILIENSE
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Jornal da ABI
A TRINCHEIRA DA LIBERDADE
RESISTÊNCIA E RECONSTRUÇÃO MARCAM A ABI A PARTIR DE 1964
por Edmar Morel
História da ABI
CELSO KELL Y KELLY
O autor faz um esclarecimento para melhor conduzir o leitor aos fatos ocorridos no período de 1964 - ano da renúncia de Herbert Moses - a 1984, quando a ABI sofreu uma série de impactos na sua vida administrativa. Dois presidentes renunciaram: Celso Kelly (1968), e Elmano Cruz (1975). Três faleceram no exercício do cargo: Líbero de Miranda (1975), Prudente de Moraes, neto (1977) e Danton Jobim (1978). Quatro vices assumiram a presidência: Luís Ferreira Guimarães, Elmano Cruz, Lauro Reis Vidal e Fernando Segismundo.
(De 1964 a 1966) Com a renúncia de Moses, assumiu a presidência o vice, Luís Ferreira Guimarães. Não era a primeira vez que um vice dirigia a Casa. Raul Pederneiras, por exemplo, completou o mandato de Belisário de Sousa. Moses, numa de suas viagens ao estrangeiro, entregou o comando a Heitor Beltrão. Luís Ferreira Guimarães, com mais de 60 anos de jornal, era diretor da sucursal de A Gazeta, de São Paulo, antigo presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio de Janeiro e conselheiro da ABI há 20 anos. A situação da ABI era difícil e Guimarães não desejou molestar Moses, que continuou comparecendo ao seu gabinete. A 11 de setembro de 1964, Celso Kelly foi eleito presidente da Casa do Jornalista, para onde entrou a 1o de janeiro de 1931. Um presidente diferente dos outros. Não era um jornalista de combate e sim um crítico de arte, professor, poeta e teatrólogo. Tinha uma tarefa das mais árduas, que era substituir um presidente que governou por 33 anos, criando, pela idade e pelo natural desgaste de tão longa administração, problemas que exigiam solução imediata. Não vai aqui nenhuma crítica ao fabuloso Moses, que, a partir de 1958, quando sofreu o primeiro enfarte, teve sua espantosa capacidade de trabalho reduzida em 50%. O segundo, tirou mais 20%. O comando geral fraquejou e surgiram as inevitáveis crises que ocorrem, nessas ocasiões, em todas as associações de cunho democrático. Celso Kelly iniciou no jornalismo, em 1924, quando viu os seus primeiros artigos publicados no Correio da Manhã e na Tribuna de Petrópolis. Formou-se em direito em 1928. Depois ingressou como redator de A Manhã e A Noite, sendo que, no último, fez carreira completa, atingindo o cargo de diretor. Dirigiu a Rádio Nacional. Professor do curso de jornalismo da Faculdade Nacional de Filosofia, do qual foi um dos fundadores, destacou-se, ainda, na posição de educador e de presidente do Pen Clube do Brasil. Seus livros e peças de teatro, para falar apenas de alguns como o Profeta Aleijadinho, Educação social, Temperamentos, Tendência da Cultura Contemporânea, Conflitos sentimentais, A beleza perturbada, O homem feliz, Morre uma mulher, sem esquecer de Obrigatoriedade do ensino, Assistência técnica e Educação, Política e Cultura, revelam o intelectual voltado para os problemas da literatura, teatro e educação. A situação sempre agravada com o ambiente político criado com o golpe militar de 31 de março de 1964, fez com que a ABI deixasse de ser a Casa do Jornalista, a qual não tinha resposta para os apelos de centenas de brasileiros, vítimas da prepotência. Muitos dos seus sócios
CRONOLOGIADOSPRESIDENTES 1964 - Renúncia de Herbert Moses, a 21 de agosto. - É eleito, Celso Kelly, em agosto. 1966 - Celso Kelly renuncia a 8 de fevereiro. - O vice Elmano Cruz completa o mandato de Celso Kelly, que termina em maio. - Danton Jobim é eleito em maio. 1968 - Danton é reeleito e preside a ABI por mais quatro anos. 1972 - Eleito Adonias Filho que cumpre mandato regular de dois anos. 1974 - Elmano Cruz volta à presidência, eleito em maio. 1975 - Elmano Cruz renuncia em agosto. - Líbero de Miranda, eleito em agosto, falece uma semana depois, a 6 de setembro. - Eleito Prudente de Moraes, neto, em setembro. 1977 - Morre Prudente de Moraes, neto, a 21 de dezembro. - O vice Fernando Segismundo assume a presidência em dezembro. 1978 - Danton Jobim é eleito em 5 de fevereiro e falece 21 dias depois. - Fernando Segismundo, como vice, volta à presidência em fevereiro, exercendo-a até maio, sendo o único vice eleito para ocupar o cargo de presidente. - Eleição de Barbosa Lima Sobrinho, em maio. 1980 - Reeleito Barbosa Lima. 1982 - Barbosa Lima é reconduzido à presidência. 1984 - Reeleito Barbosa Lima.
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Especial 90 anos
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foram cassados e arrancados dos seus lares. A Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa trabalhava dia e noite. A cada instante eram enviados ofícios ao ministro da Justiça, Milton Campos, e ao ministro da Guerra, general Costa e Silva, pedindo a liberdade de jornalistas encarcerados. O então governador da Guanabara, Carlos Lacerda, jornalista acima de tudo, teve a preocupação de sair do bolo, não permitindo que sua polícia praticasse qualquer violência contra jornais e jornalistas. “A culpa é do Exército, da Marinha e da Aeronáutica”, dizia Carlos Lacerda, e o jogo de empurra durou meses. Elmano Cruz, presidente da Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa, sugeriu que a mesma estendesse sua proteção aos que vivem do livro, sendo convidados para fazer parte da CDLI, a União dos Escritores do Brasil, os sindicatos dos Editores e dos Livreiros, Sociedade Brasileira de Autores Teatrais e até a Academia Brasileira de Letras. Ao todo eram onze representantes de entidades culturais, numa luta sem trégua, em defesa da liberdade de pensamento,
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Antônio Evaristo de Moraes e Evaristo de Moraes Filho. A Comissão reunia-se, diariamente, em duas sessões. Este era, realmente, o preço da vigilância da liberdade. Neste clima de luta com a ABI dividida em grupos, Celso Kelly procurou estabelecer contato com os ministros militares, aumentando o clima de tensão reinante na Casa. Justificou-se dizendo que era presidente de uma associação cultural, sem cor política e que não podia deixar de dialogar com quem quer que fosse, sobretudo com as altas autoridades do país, responsáveis por um governo reconhecido por quase todos os países do mundo. Moses fez o mesmo. Jamais deixou de visitar Costa Neto e Filinto Múller e outros declarados inimigos da liberdade pública. Quase todos os presidentes da Casa seguiram esta norma. Elmano, por sua vez, telefonava para o general Costa e Silva, de quem era amigo. Ia ao chefe de polícia, o neurótico cel. Gustavo Borges, e falava de igual para igual. Elmano era desembargador e gozava da estima de sua classe. O fato é que esses contatos serviram para melhorar as condições dos jornalistas encarcerados, que passaram a receber a visita da família e até escreveram livros nas execráveis enxovias da rua Frei Caneca, como Joel Silveira, Sebastião Nery, e outros. Não resta dúvida que Celso Kelly teve uma administração das mais difícies. Conseguiu reabrir o restaurante da ABI, antes considerado a sala de visita do Rio. Agravou-se a situação financeira da ABI e a diretoria propôs alugar mais um andar à Sunab (ex-Cofap). Novas crises. Novos debates. O assunto foi matéria obrigatória de sucessivas reuniões da diretoria e do conselho. As simples decisões tomavam aspecto político. O governo reclamava a presença de Celso Kelly no Departamento Nacional de Ensino, do Ministério da Educação, nomeando-o seu diretor-geral. Não era esta a primeira vez que o governo o convocava para prestar serviços no campo educacional, levando em conta seu trabalho na literatura, no jornalismo e no magistério, em prol da educação moral e cívica da mocidade. Basta lembrar que, no Instituto de Educação, introduz a prática de patronos para as turmas, com comemorações em torno das principais datas da vida de cada um, instituiu uma série de conferências, buscando despertar o sentimento de brasilidade entre alunos e mestres. Faltando três meses para completar o seu mandato, renunciou a 9 de fevereiro de 1966. Procurou restabelecer a situação financeira da Casa e buscou novas fontes de renda, com a recuperação do auditório. O restaurante tinha o simbólico aluguel de 4 mil cruzeiros antigos por mês. Remodelou a Clínica Pedro Ernesto e
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Com a ABI dividida em grupos, Celso Kelly procurou estabelecer contato com os ministros militares. Quase todos os presidentes da Casa seguiram esta norma ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
porém, em espantosa inferioridade, ante os vitoriosos da revolução. Agigantava-se a figura de Elmano Cruz, usando de todos os meios ao seu alcance e pondo em jogo o seu prestígio de magistrado, no sentido de quebrar a incomunicabilidade de jornalistas e escritores. Conseguiu levar a palavra de fé e de conforto a Henrique Cordeiro e a Carlos Casanova, conselheiro da ABI, encarcerados na Casa de Detenção; João Etcheverry, outro conselheiro preso na Polícia do Exército; Astrogildo Pereira, ao peso de mais de 75 anos, morrendo num hospital da Polícia Militar, Costa Pinto, também conselheiro, asilado na Embaixada do Chile, onde encontrou Ib Teixeira e Samuel Wainer; Raul Ryff, Bocaiúva Cunha e Maria da Graça Dutra tinham a proteção da Iugoslávia; Batista de Paula e Franklin de Oliveira conseguiram asilo na Embaixada do Paraguai. Ao todo, 36 companheiros refugiados em representações diplomáticas. Foram presos os advogados
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entregou a sua coordenaçào ao conceituado médico Azevedo Barros, de livre escolha dos demais, e que ficaram com a responsabilidade de despesas de manutenção, seguros, impostos etc. Transferiu a biblioteca do 8o para o o 9 andar, usando a parte relativa à galeria de exposição. Revelou que as dívidas estavam pagas, tendo elevado a receita de 34 milhõespara 186 milhões,deixando um superávit de 60 milhões, pagando contas de ordem de 90 milhões de cruzeiros antigos. Não esqueceu de mencionar o reconhecimento legal da isenção das contribuições da Previdência Social, num montante de 10 milhões, aproximadamente. Fez dois convênios: com o Reembolso da Polícia Militar e com a Policlínica do Rio de Janeiro, os quais deveriam proporcionar vantagens aos associados, porém, no fim, foram peças mortas, nada de positivo. Promoveu três concursos jornalísticos, com prêmios aos vencedores, instituídos pela Fundação Ottocar Rosários, de Buenos Aires, por uma refinaria de petróleo e por um industrial. Realizou um seminário de jornalismo, sob os auspícios da Ciespal, órgão da Unesco sediado em Quito, no qual foram discutidos, em profundidade, o problema do ensino do jornalismo em todas as modalidades, dele resultando a Declaração do Rio de Janeiro, que bate nas duas teclas essenciais da profissão: a informação autêntica, como direito de todos, facilitando o acesso do jornalista às fontes; a liberdade de opinião e expressão com a conseqüente responsabilidade dos que as emitem, o autor e o veículo. Ao assumir a presidência da ABI, tinha 41 anos de jornalismo e 39 de magistério. Celso Kelly faleceu a 23 de junho de 1979.
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fórum. Mesmo assim, nesta roda-viva, realizou obras no edifício da ABI, visando proporcionar maior conforto aos associados. Chegava à ABI antes das 7 horas, para despachar o primeiro expediente, iniciando então, penoso vaivém aos lugares onde a sua presença era indispensável. Jamais deixou de atender a uma convocação extraordinária da Comissão de Defesa da liberdade de Imprensa e do Livro, durante os três meses de sua administração, o bastante para ter um esgotamento físico que o levaria ao hospital. Em 1974, entretanto, Elmano Cruz, por grande maioria de votos, foi eleito presidente para substituir Adonias Filho, que exerceu o mandato de 1972 a 1974. Foi, sem dúvida, o presidente mais resoluto nas suas decisões, herança de uma longa vida jurídica, onde o juiz tem a palavra como definitiva, escrevendo simplesmente: cumpra-se, intime-se, faça-se etc. etc. Difícil, assim, trabalhar com espírito de equipe. Por causa de seu temperamento, entrou em choque, várias vezes, com alguns companheiros de diretoria. No final das discussões, entretanto, confraternizava-se com os demais dirigentes e tudo voltava à santa paz. Ressalte-se que, naquela ocasião, Elmano ainda era obrigado a comparecer às reuniões de uma das câmaras cíveis da Justiça da Guanabara. Teve uma administração das mais discutidas, todavia, quando se lançava a um empreendimento ia até o fim, pouco ligando para as conseqüências. Quando faltava dinheiro nos cofres da ABI para atender aos seus projetos, recorria aos amigos e completava a obra. Transferiu o restaurante do 12º andar para o 11º, decorou os salões, mudou lustres, enfim, deu roupagem nova ao interior. Um traço caracterizou Elmano Cruz na presidência da ABI: Honestidade! Combatido por uns e elogiados por outros, o presidente Elmano Cruz, muitas vezes, a exemplo de Moses, pagava determinadas despesas do seu próprio bolso. A doença, na verdade, quebrou um pouco a velocidade daquele dínamo,
ELMANO CRUZ (De fevereiro a maio de 1966 - maio de 1974 a agosto de 1975) Com a presidência vaga, o 1o vice, Paulo Filho, enfermo, não tinha condições para substituir Kelly. Assumiu o 2º vice, Lauro Reis Vidal. Biógrafo do Padre Cícero, Lauro militou por longos anos na imprensa cearense, capixaba e carioca. Teve o mais curto período presidencial, isto é, cinco dias, quando foi eleito Elmano Cruz, a 16 de fevereiro de 1966. A rigor, Elmano não dirigiu apenas a ABI, assoberbado como estava com os graves problemas levados à Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e do Livro e ao conselho administrativo, dos quais era presidente. Elmano não dormia. Chamavam-no alta madrugada para comunicar atentados à liberdade pensamento. Continuava o massacre aos jornalistas. Elmano começou a sua vida de imprensa no Diário do Rio, de Alvim Horcades, em 1932, passando para o Jornal do Commercio, de 1930 a 1945. Entrou para a ABI em novembro de 1941. Era redator dos arquivos do ministério da Justiça e tinha, ainda, obrigações inadiáveis no
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sempre em alta rotação. Era arrebatado no ardor dos debates, mas tinha um imenso coração, que jamais negava auxílio a quem quer que fosse, amigos ou inimigos. Tinha a volúpia de fazer o bem. Exausto pelas sessões da câmara cível, começou a faltar às reuniões do conselho administrativo. A individualidade de Elmano não pode, porém, ser apreciada num simples relato. Privei de sua amizade na Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e do Livro. Acabou com certos privilégios na área do estacionamento de automóveis na sede, comprou TV a cores para o 11º andar, (salão de estar), mandou restaurar o arcondicionado e procedeu a uma limpeza geral no porão, transformando-o num pequeno salão de refeições para os funcionários de menor categoria. Não podia ver sujeira e ele, presidente, transformavase numa vassoura. Sempre eleito presidente do conselho administrativo, tinha a solidariedade de todos, o que nem sempre acontecia na diretoria. Seus choques foram muitos e nessas ocasiões, embora enfermo, lutava como um leão. Sua saúde piorou. Sentiu necessidade de descansar e renunciou a 27 de agosto de 1975, numa das mais agitadas sessões do conselho administrativo, no qual já contava com uma oposição que, por vezes, tentou envolvêlo. Fez o que era possível, em permanente atrito com os companheiros da diretoria. Pelo menos limpou e arrumou a casa, oferecendo condições para receber qualquer personalidade importante. Nos festejos de Natal fazia questão de enviar seu donativo, o primeiro a chegar no Livro de Ouro. Era um d’Artagnan, dono de imenso coração. Faleceu a 11 de janeiro de 1984 depois de longa enfermidade que o fez prisioneiro de uma cadeira de rodas, repetindo o destino de Moses.
Elmano não dormia. Chamavam-no alta madrugada para comunicar atentados à liberdade de pensamento. Continuava o massacre aos jornalistas...o bastante para ter um esgotamento físico que o levaria ao hospital
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DANT ON JOBIM DANTON (De 1966 a 1972 e fevereiro de 1978) ○ ○ ○ ○ ○ Danton foi eleito, pela primeira vez, em 10 de maio de 1966, sendo reeleito até 1972. A 12 de fevereiro de 1978 foi reconduzido à presidência da ABI, porém, surpreendido pela morte 14 dias depois, não chegou a tomar posse. D a n t o n concorreu com ○ ○ ○ ○ ○ Paulo Filho, dois profissionais dos mais dignos e conselheiros com relevantes serviços à causa pública. Nasceu em Avaré, no interior de São Paulo, a 8 de março de 1906. Era sobrinho, pelo lado materno, do caudilho Pinheiro
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Machado. Iniciou seus estudos no Rio, onde, após terminar o secundário, matriculou-se na Faculdade de Direito, diplomando-se, em 1938, sob o terror do Estado Novo, com eminentes professores presos pela ditadura. Ingressou no jornalismo aos 17 anos de idade em A Noite, trabalhando, aanda, com Irineu Marinho. Transferiu-se para A Manhã, de Mário Rodrigues, ascendendo à secretaria. Nessa época, já contribuía ativamente para a introdução de novas técnicas jornalísticas, contando com a colaboração de uma equipe de diagramadores argentinos, à frente André Guevara, a quem nossa imprensa tanto deve. Era o braço direito de Mário Rodrigues na fundação de A Crítica, jornal que, se ainda circulasse, conservada a sua diagramação primitiva, ainda estaria moderno, suprimida, é claro, a escabrosa 8ª página, que não tinha o apoio de Danton e de outros redatores. Daí a sua saída de A Crítica, cuja tiragem ultrapassava 100.000 exemplares, isto em 1929. A 8ª página, dos escândalos, custou a vida do jovem Roberto, filho de Mário, assassinado pela poetisa Silvia Tibau. Trabalhou em diversos jornais, tais como o Diário de São Paulo, O Jornal, Esquerda e Batalha, os dois últimos fundados pelo bicheiro, João Pallut, para combater o governo de Washington Luís e que se transformaram em centro de conspiração, no qual não faltava a presença de Pedro Ernesto e outros líderes. Em abril de 1933, por ocasião do reaparecimento do Diário Carioca, Danton ingressou nesse matutino como secretário, sendo promovido, em seguida, a redatorchefe, diretor e, posteriormente, seu proprietário. Neste jornal sustentou uma coluna política na primeira página. Foi à Inglaterra durante a guerra, a convite do governo britânico, a fim de testemunhar o esforço daquele país, e escreveu uma série de reportagens enfeixadas no livro Para onde vai a Inglaterra? Foram seus companheiros de viagem Mário Martins, Alfredo Pessoa, Joaquim Ferreira e Jorge Maia. Visitou os Estados Unidos, também durante a guerra, escrevendo reportagens sobre ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ o New Deal que compõem o volume A experiência Roosevelt e a r e v o l u ç ã o brasileira, traduzido para o inglês. Fez diversas viagens em missão jornalística e diplomática a países latino○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ americanos, aos Estados Unidos e Europa, destacando-se a sua presença na delegação do Brasil à Assembléia das Nações Unidas, em 1950. “Neste ano”, diz Nelson Werneck Sodré, “é possível apontar, como esforço pioneiro de reforma na técnica de
Jornalista desde os 17 anos, deu cursos no exterior e foi considerado pioneiro de reforma na técnica de apresentação de notícias entre nós
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Jornal da ABI
apresentação de notícias entre nós, o que foi realizado no Diário Carioca, quando o jornal tinha Danton Jobim na direção.” Sempre fez jornalismo. Detentor da Medalha de Ouro do Prêmio Moors Cabot (1954), foi professor de técnica de jornal e história do jornalismo do curso de jornalismo da Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil, hoje desmembrado da referida faculdade e transformado na Escola de Comunicação da UFRJ de onde era professor. ○ ○ ○ ○ ○ Convidado pela Universidade do Texas, em 1953, para reger um curso sobre j o r n a l i s m o c o m p a r a d o , destinado aos graduados da escola de jornalismo d a q u e l a Universidade, teve ○ ○ ○ ○ ○ oportunidade de mostrar o alto nível intelectual do homem de imprensa do Brasil. Como catedrático do Centro de Estudos Superiores de Jornalismo da América Latina, da Unesco, com sede em Quito, deixou marcada a sua presença no Equador, com uma universidade de fama internacional. Saibam todos que os cursos da Ciespal eram dados por especialistas dos Estados Unidos, Europa e Ásia e freqüentados por mais de 2.000 jornalistas e professores de todos os países do hemisfério, imprimindo, ainda, obras de história, de ética e de legislação de imprensa. Nesta Universidade, Danton Jobim, um dos seus fundadores, era professor emérito. Autor, ainda, dos livros Problemas do nosso tempo, José Bonifácio, O ciclo da doutrina de Monroe, Espírito do Jornalismo, Introduction au journalisme contemporain e outros. Esteve na França a convite da Sorbonne, onde ministrou o curso Introduction au journalisme contemporain, sendo eleito membro do conselho diretor da Association Internationale de Recherches sur I’Information, de Paris. Eis, em rápidas linhas, como um jornalista brasileiro foi ensinar jornalismo nos Estados Unidos e na França. Ao entrar para ABI, a 5 de abril de 1926, na administração de Raul Pederneiras, proposto por André Romero e Vitório da Costa, tinha o seu nome firmado na imprensa e no movimento nacionalista que empolgava o país participando da redação de manifestos que marcaram época, sendo o jornalista das famosas Resistências Operárias e, em particular, dos estivadores, carroceiros e classes anexas e mais algumas entidades que funcionam à orla marítima. Nas mãos de Danton, o Diário Carioca, com as inovaçòes introduzidas, adaptadas à precariedade do material gráfico do jornal, chegou a tirar 45.000 exemplares nos dias de semana e 70.000 aos domingos. A futura capital federal ainda estava em construção e Danton fez o D. C. Brasília, considerado o primeiro jornal de Brasília, embora impresso no Rio. O D. C. Brasília circulou durante anos na nova
capital federal, com chegada certa no primeiro avião. O velho Diário Carioca desapareceu a 31 de dezembro de 1965, após 37 anos de existência, projetando nomes, como os de Pompeu de Sousa, Luís Paulistano, Marcial Dias Pequeno e outros. Um dos seus redatores, Délio Matos, numa reportagem retrospectiva, explicou que o “jornal fora fundado e funcionara sempre dentro de uma concepção romântica de jornalismo e ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ não poderia sobreviver, em termos de empresa industrialmente organizada”. Danton era disputado por vários jornais. Preferiu a Última Hora, que tinha muito do seu ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ espírito renovador e, sobretudo, de combatividade, sendo eleito diretor-presidente do vespertino fundado em 1951 por Samuel Wainer e empastelado, em 1964, por uma turma de playboys de Copacabana. Escrevia, diariamente, o editorial cujos conceitos refletiam o amadurecimento de um jornalista com mais de meio século de exercício da profissão, com dignidade e altivez. Seguiu a trilha traçada por Moses, na defesa da liberdade de imprensa. Não era homem de rompantes. Agia serenamente, porém com firmeza. Era de ontem o seu apelo aos jornais, buscando a formação de uma frente única para combater a Lei de Imprensa, a qual, finalmente, foi imposta pela força, no governo Castelo Branco. Danton esforçava-se, lutava com toda a sua energia contra o projeto. Protestou com veemência contra a prisão de Hélio Fernandes, diretor da Tribuna de Imprensa. Solidarizou-se com o Jornal do Brasil, vítima de graves insinuações oficiais. A despeito de não mencionar nomes, um ministro de Estado afirmou que todos os artigos sobre o aniversário da revolução russa eram matéria paga. Não se deve esquecer que o Jornal do Brasil foi um dos órgãos que publicou magníficos suplementos e longas reportagens retrospectivas sobre os 10 dias da revolução russa, acontecimento que abalou o mundo. A casa retomou o seu prestígio
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internacional, gloriosamente vivido no período de fausto de Herbert Moses. Começou a receber visitantes ilustres para entrevistas coletivas, entre os quais os cosmonautas Richard Gordon e Neil Armstrong. Fez voltar, em setembro de 1966, à circulação o Boletim da ABI, interrompido no número 128. Prestava conta dos atos da diretoria nas reuniões mensais do conselho administrativo e sujeitava-se ao debate, como norma das mais democráticas. Sua atuação à frente da ABI foi apenas um prolongamento de sua longa vida de jornalista de combate, consciente de que nenhum povo pode viver sem liberdade de imprensa. Suas aulas nos Estados Unidos, na França, no Equador e no Brasil, nos mais diferentes cursos de jornalismo, obedeceram a esta tônica. No seu primeiro relatório como presidente da ABI, proclamou: “Muitos acontecimentos, em nossa vida pública, repercutiram no seio da classe jornalística e na ABI. Travamos uma vez mais a batalha pela liberdade de imprensa, que exige habilidade, sangue-frio e firmeza da atitudes. “A presidência da Casa assumiu posições claras, reconhecidas de todos, pois a imprensa brasileira deu-lhes farta repercussão. Mas ao mesmo tempo não perdeu contato com as autoridades. Várias vezes visitou o ministério da Justiça no cumprimento de missões ligadas à proteção das prerrogativas da imprensa livre. Interpelamos os Poderes Públicos com sobranceria, mas sem jactância, dispostos a manter as gloriosas ○ ○ ○ ○ ○ tradições da nossa ABI, que, nos seus tempos áureos, jamais se conformou com as violências cometidas contra jornais e jornalistas. “Considerando as mudanças havidas na atmosfera política ○ ○ ○ ○ ○ e na atuação do governo, com a posse do novo presidente, decidimos estender a nossa ação ao Congresso e aos tribunais. “Começamos por constituir uma comissão de juristas de alto nível, ligados à atividade da imprensa, para estudar detidamente as leis em curso.” Um simples relato das atividades da secretaria, da Clínica Pedro Ernesto, da biblioteca e do departamento cultural dá uma idéia do primeiro ano de gestão Danton Jobim. Antes da morte do general Costa e Silva, a exemplo do que fizera Herbert Moses com os presidentes Vargas e Dutra, Danton lhe ofereceu um almoço na ABI, homenagem que motivou vários protestos sem a menor repercussão em face da censura reinante na imprensa. A despeito do sistema de segurança, o generalpresidente foi vaiado à saída do prédio. Na realidade, a idéia do almoço foi infeliz. O presidente da República banqueteava-se na ABI, quando havia dezenas de jornalistas presos e exilados, alguns torturados bestialmente.
Buscou a formação de uma frente única para combater a Lei de Imprensa, a qual foi imposta pela força no governo Castelo Branco
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Sua atuação foi um prolongamento de sua vida de jornalista de
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A casa retomou o seu prestígio internacional. Começou a receber visitantes ilustres para entrevistas coletivas, entre os quais os cosmonautas Richard Gordon e Neil Armstrong 4 3 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
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A despeito de tantas despesas imprevistas, foi possível transferir do exercício de 1967 para o de 1968 um saldo real de Cr$ 74 milhões em números redondos, sendo o patrimônio da ABI calculado em mais de dois bilhões de cruzeiros antigos. A recuperação parcial do prédio foi indiscutível. Funcionavam na sede da ABI, em salas especiais, sem pagamento de espécie alguma, a Ordem dos Velhos Jornalistas, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais da Guanabara, a Associação Brasileira dos Escritores e Jornalistas do Turismo etc. Danton, por coincidência histórica, foi o presidente eleito para assistir ao 60º aniversário da casa fundada por Gustavo de Lacerda, ambos jornalistas do batente, participantes das chamadas Resistências Operárias e de movimentos socialistas, irmanados, também, numa só obsessão: a defesa da liberdade de imprensa. O ano de 1968 viu a passagem do 60º aniversário da ABI, encontrando a imprensa brasileira em fase áurea. O jornalismo atual não é mais feito com aquela dose de amadorismo. O jornalista deixou de ser um faz-tudo para especializar-se num assunto. A notícia é objetiva e redigida de maneira sintética. Cada centímetro vale ouro. Já não existe a imagem romanesca do repórter boêmio. Desapareceu a figura do repórter aventureiro que competia com o detetive para descobrir casos intrincados. Morreram os subtítulos e o nariz-decera. O copydesk encarrega-se de reduzir e melhorar o texto. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Às vezes, não melhora. Piora... O público sente que o jornalista de hoje é, antes de mais nada, um pesquisador, um analista, um estudioso dos ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ problemas econômicos, sociais e políticos. As escolas de jornalismo, espalhadas pelo Brasil inteiro, contribuem para o aprimoramento da nova geraçào de jornalistas. Entretanto, por falta de recursos das universidades e do mercado de trabalho, muitos ganham o diploma e continuam desconhecendo o principal: a técnica e a vivência, que só são ensinadas nas redações e oficinas. Existem legiões de jornalistas diplomados, doutores em teoria. Têm até um sindicato. Muitos, porém, nunca viram uma linotipo, um fotolito. Na verdade, alguns recebem o anel e o diploma, sem vocação para a profissão. Querem apenas um título. Não há exagero em afirmar que alguns jornais do Rio e de São Paulo podem competir com os maiores órgãos do mundo. A industrialização da imprensa, com a introdução de novas técnicas, liquidou com o amadorismo. Dos 27 jornais que circulavam no Rio, em 1952, restam apenas, 8, em 1985, que saturam o mercado de publicidade. Cidades como Londres, Nova Iorque e Moscou, com o triplo da população carioca, não têm maior número de matutinos. Danton foi senador do M. D. B., eleito pelo Rio de Janeiro.
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Trinta anos depois, 1968 ainda causa debates e polêmicas. Tentando um diálogo em época de enfrentamentos, a ABI recebeu em sua sede o ditador Costa e Silva, sem abrir mão da defesa das liberdades e da luta pela anistia. Um processo de participação que sempre permitiu acolher em sua sede os mais importantes movimentos sociais.
O POLÊMICO BANQUETE PARA UM DITADOR Gaspar Dutra tinham visitado a Casa que ajudaram a erguer com auxílios financeiros oficiais. E em seus governos verificaramse fatos que a ABI condenou com veemência. Não poderia ter sido pior sem a intercessão da entidade? Heráclio Sales, secretário de imprensa de Costa e Silva e companheiro de alguns dirigentes da ABI, a começar por Danton, intermediou o convite ao presidente e se incumbiu da parte protocolar; do resto encarregou-se a ABI. No dia 7 de abril, domingo, 200 comensais entraram no Palácio da Imprensa, como era então designada a sede da ABI. O presidente da República e ministros de Estado, os presidentes do Senado, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal, o governador da Guanabara e secretários, o Núncio Apostólico, diplomatas estrangeiros, diretores de jornais, adidos de imprensa e dirigentes da instituição serviram-se de um coquetel no terraço ajardinado por Burle Max. Costa e Silva, de maneira informal, respondeu a perguntas de jornalistas. O banquete decorreu com apuro. Na proximidade da ABI, tendo como limite a
Fernando Segismundo O movimento militar de 1964 perseguiu jornalistas e cassou-lhes os direitos civis; destruiu oficinas impressoras e desarvorou os veículos de comunicação. Houve desaparecidos e assassinados. De apreensão e violência era o ambiente geral. Jornais havia que, de motu próprio, colaboravam com o sistema, dificultando a atividade dos empregados; outros, raros, empenhavam-se em sobreviver à fúria e ao ódio das autoridades e de seus colaboradores espontâneos, movidos pelo reacionarismo e por vingança ou motivos sórdidos outros. Jornalistas, professores, intelectuais, sacerdotes eram os mais visados. A cada dia escasseavam as condições de sobrevivência da comunicação livre e as possibilidades de trabalho dos profissionais. Nesse clima de insegurança, acudiu a Danton Jobim, presidente da Associação Brasileira de Imprensa, convidar o Marechal Artur da Costa e Silva, presidente da República, para o almoço comemorativo dos 60 anos da Casa (1968). Costa e Silva entremostrava certa tolerância ante os protestos estudantis e outros contra o
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Circulavam notícias alarmantes: o estado de sítio iminente e a imposição de um ato institucional destinado a extinguir os últimos vestígios da democracia. Se os boatos se confirmassem , muito pior seria a sorte da imprensa. Pensou Danton que o congraçamento dos jornalistas, presente o Marechal, poderia obstar aquelas medidas ou diminuir-lhes os efeitos ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
rua México, jornalistas protestaram contra a presença de Costa e Silva naquela Casa. Sobressaíram Antônio Callado (conselheiro), Oto Maria Carpeaux, colaborador do Correio da Manhã (cuja diretora, Niomar Muniz Sodré Bittencourt, compareceu ao banquete), e José Machado, presidente do Sindicato do Rio de Janeiro e apontado como entusiasta do regime. Faixas e cartazes hostis ao Marechal estavam pregados em frente ao prédio. Primeiro a falar, Danton Jobim recordou a tradição de luta da ABI, sua independência em face do poder público, mas receptiva a contatos no interesse da classe e do País. Sem disfarçar sua posição política em franca divergência com a situação, pleitea do Governo a liberdade
regime. Sabia-se que a “linha dura”(militares extremados) tentava livrarse dele, por discordar do que imaginava ser a sua simpatia pelos jovens contestadores. Circulavam notícias alarmantes: o estado de sítio iminente e a imposição de um ato institucional destinado a extinguir os últimos vestígios da democracia. Se os boatos se confirmassem , muito pior seria a sorte da imprensa. Pensou Danton que o congraçamento dos jornalistas, presente o Marechal, poderia obstar aquelas medidas ou diminuir-lhes os efeitos. Assim o compreenderam, também, conselheiros e diretores da ABI, a tempo consultados. Havia precedentes: Getúlio Vargas e Eurico
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de imprensa, condição essencial da comunicação eficaz e honesta, cumprindo na íntegra o papel que lhe cabe numa sociedade aberta e democrática. “Nas economias semidesenvolvidas como a nossa, a imprensa transforma-se no foro para os debates das grandes teses e dos grandes problemas nacionais, com vistas à formulação de soluções para tais problemas”. Após historiar os 60 anos da entidade, exalta-a como sendo a “consciência democrática do País”. Ela acha-se destinada a ser decisivo instrumento na reconstrução política. Rebatendo os manifestantes contrários à recepção de Costa e Silva, reconhece que a celebração do aniversário ocorre em condições excepcionais e adversas para a imprensa. “Insistimos em realizar este almoço porque em circunstâncias graves como esta é que a ABI se afirma confiante em si mesma, acima das contingências e das paixões, desempenhando com seriedade, mas também com firmeza e sobranceria, a missão que lhe cumpre.” Danton encerra o discurso convicto de que o Marechal Costa e Silva poderá conduzir o grande processo de pacificação dos espíritos, do esquecimento de ódios e dissenções, do restabelecimento dos direitos negados a quaisquer brasileiros e, por fim, da união de todos nós. Em resposta o presidente da República afirma sentir na imprensa o complemento da missão de governo. Ela nos traz os ecos da opinião pública. Aprecia como “gratíssima” a oportunidade de conviver algumas horas com os homens que fazem e comandam a imprensa livre do nosso País. Louva as liberdades essenciais formuladas por Franklin Roosevelt e enfatiza a primeira delas: a liberdade de palavra e expressão. À missão da imprensa entende como “complemento da missão de governar”. Ajuda-nos a imprensa no passado, e ainda hoje, a conhecer “os ecos, os anseios, os temores e as aspirações da opinião nacional. Para isto é preciso que haja liberdade”. Atentos devem estar os jornalistas para “a estreita conexão existente. entre o direito à liberdade e o dever da responsabilidade”. Robustece suas sentenças com citações do Papa Adriano, do padre Manuel Bernardes, de Machado de Assis, Roosevelt e Kennedy. Encerrando o discurso, o Marechal elogia Danton Jobim, “professor de ética e jornalista dos mais notáveis que já apareceram em nossa imprensa”. Finaliza. recitando um setenário de fé na imprensa livre. Análise superficial das duas orações
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Costa e Silva morreu vítima da "linha dura". Seu propósito de nova Constituição malogrou-se. E a imprensa e o País inteiro, mergulharam em fase podre ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
leva à conclusão da superioridade de Danton; superioridade ressentida. Longe de ser uma afronta ao regime - ele conhecia de sobra o terreno em que pisava -, o pronunciamento tem instantes de rigor. Quando dele conheceu em Brasília, enviado para sua orientação, o Marechal exclamou: “Danton bate duro. Eu podia responderlhe em tom igual ou vetá-lo. Não o farei: precisamos familiarizar-nos com certas verdades “. E não cortou sequer uma palavra. Por conhecer o espírito compassivo de Costa e Silva apoiei a iniciativa de Danton . Ele aspirava ao que, depois, se conheceu por “abertura política”. Acreditou que o Marechal poderia minorar a sufocação em que se debatia a imprensa livre e partir para a pacificação nacional mediante, inclusive ou sobretudo, pela elaboração de uma Carta Constitucional. Dessa perspectiva, dissentiram os confrades citados. Na assembléia de abril, ulterior ao banquete, os três e outros voltaram a criticar, a insultar Danton e seus colegas de Diretoria. Nossa resposta foi o ato presidencial, a rogo da ABI, que anulou a punição de Antônio Callado, impedido até ali de praticar seu ofício e garantir a subsistência. Ato único do sistema ao longo de toda sua constância. Callado não se mostrou impressionado com a providência da Casa e nunca mais voltou ao Conselho Administrativo, o que lamentamos. Costa e Silva morreu vítima da “linha dura”. Seu propósito de nova Constituição malogrouse. E a imprensa, como tantas outras instituições, e o País inteiro, mergulharam em fase podre. A culpa não foi de Costa e Silva e, muito menos, de Danton Jobim. Fernando Segismundo é o presidente do Conselho Administrativo da ABI.
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QUANDO SEU AR TUR TEVE QUE V OLTAR ATRÁS ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
possa escrever qualquer coisa. E garantolhe que posso conseguir isso. O prisioneiro tentou argumentar: - Mas, coronel, escrever é a única coisa que sei fazer. De que vou viver, com que vou sustentar minha família, se for proibido de escrever? - Então me diga: o que eu vou fazer, se o Exército for dissolvido? - foi a resposta rápida do interrogador. Callado achou tão pertinente e bemhumorada a resposta que nunca mais a esqueceu; relembrava sempre o episódio. O fato é que, semanas depois, é assinado pelo presidente Costa e Silva um Ato Institucional tão original, digamos assim (já que não é possível comparar o grau de violência deste com o dos anteriores), que espantou os brasileiros: os jornalistas Antônio Callado e Leo Guanabara estavam não só cassados em seus direitos políticos, isto é, não podiam votar nem ser votados, como também proibidos de trabalhar em jornais, revistas, emissoras de rádio e de televisão, de escrever livros e de dar aulas. Enfim, tinham
Ana Arruda Callado Preso, em 1968, por ter escrito um artigo no seminário Brasil em Marcha (um jornal tão estranho que as colaborações eram freqüentemente pagas em gravatas Hermès ou relógios Mondaine) no qual pregava a dissolução pura e simples do Exército, o jornalista, romancista e dramaturgo Antônio Callado foi interrogado por um certo coronel Acrísio. De início, com toda a cordialidade, o coronel tentou fazer o prisioneiro afirmar que não tinha tido de fato a intenção de pregar o fim das forças armadas brasileiras, que não tinha sido bem interpretado. Uma vez que o autor do artigo insistia em dizer que pensava exatamente o que havia escrito, e que achava bom para o Brasil que o Exército desaparecesse, assim como as outras armas, como havia sido feito na Costa Rica pelo presidente “Don Pepe” Figueres, o coronel se irritou. e ameaçou: - Eu não me chamo Acrísio se o senhor não receber uma punição exemplar. Vou me empenhar para que nunca mais o senhor
ser usado era o de que não se podia punir ninguém com a fome. Heráclio Sales, amigo de Segismundo e que tinha sido colega de Callado no Jornal do Brasil, prometeu falar com o general-presidente. As gestões da ABI ganharam logo em seguida um aliado de peso. Ibrahim Sued, que diariamente em sua coluna exibia sua intimidade com Costa e Silva chamando-o de “Seu Artur”, deu uma nota protestando contra o ato absurdo e editado apenas para punir duas pessoas. “As famílias não podem pagar pelos erros de seus chefes, “Seu Artur”, advertia Ibrahim. Callado foi demitido formalmente do Jornal do Brasil, de onde era editoralista, como mandava a “lei excepcional”. Mas a direção do JB teve uma atitude “fidalga”: mandou o jornalista para casa, mas continuou pagando seu salário, esperando que aquela ordem absurda fosse passageira. De fato, um mês depois, a punição era anulada. Este foi o único ato institucional revogado pelo próprio governo que o emitira.
Um Ato Institucional impediu Antonio Callado de exercer a profissão. Gestões da ABI fizeram Costa e Silva revogar o absurdo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
perdido o direito de trabalhar. A direção da Associação Brasileira de Imprensa imediatamente se reuniu para ver o que era possível fazer naqueles tempos de endurecimento. O presidente, Danton Jobim, com quem Callado tivera uma divergência séria por causa do almoço oferecido em abril a Costa e Silva, consultou Fernando Segismundo e combinaram que este falaria com Heráclio Sales, secretário de imprensa da Presidência. O argumento a
Ana Arruda Callado, jornalista e professora, é conselheira e subsecretária da ABI.
1968, O ANO DOS ESTUDANTES E DA REBELDIA ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Franklin Martins
Jornalistas cariocas caminham pelo centro do Rio de Janeiro ao encontro de outros grupos de manifestantes para formar a "Paseata dos 100 mil", em 1968. Na primeira fila, da esquerda para a direita, Ziraldo(1º), Fernando Gabeira(5º), Marcos de Castro, Neusa Miranda, Nélson Lemos e Estela Lachter.
Em boa parte do mundo, 1968 foi o ano dos estudantes. Foi assim em Paris, em Praga, nos Estados Unidos, na Coréia e na Cidade do México. E foi assim também no Brasil, especialmente no Rio, centro das maiores manifestações de rua e dos choques mais violentos entre os jovens e a polícia, que abalaram e mexeram com a alma do país. O ano político de 68 começou com uma morte e terminou com outra. A que lhe deu início, em fins de março, foi a do jovem Edson Luís de Lima Souto, abatido a tiros na porta do Calabouço, restaurante administrado pelos própios estudantes, que servia refeições, a preços módicos a universitários e secundaristas pobres. O assassinato chocou a juventude e a sociedade em geral, sendo a senha para um movimento que sacudiria o Brasil de ponta a ponta. Nos meses seguintes, centenas de milhares de jovens ocuparam suas escolas e saíram às ruas em todo o país, no Rio e em Feira de Santana, em São Paulo e Caruaru, em Porto Alegre e Sobral, em Belo Horizonte e Campina Grande -, deixando claro que o país estava farto de prepotência e do arbítrio e que a ditadura militar só se mantinha (e só se manteria) no poder pela força. Já a morte que encerrou aquele ano turbulento foi a democracia. Moribunda desde o golpe militar de 64, ela foi enterrada sem choro nem vela no dia 13 de dezembro, com a edição do AI-5,que instituiu o terror de Estado e a mais selvagem das muitas ditaduras que este país conheceu. Por que lutaram os estudantes em 68, no Brasil? Basicamente, por liberdade e democracia, pelo fim da ditadura. Para muitos, porém, o ponto de partida do movimento foi algo bem mais prosaico: ○
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mais vagas na escola, mais verbas nas universidades, melhores professores nas salas de aula. Foi na luta por suas reivindicações específicas que dezenas de milhares de jovens ainda sem consciência política formada descobriram que as autoridades não estavam interessadas na solução de seus problemas . No aparelho de Estado, só a polícia não se fazia de rogada na relação com os estudantes. Nas escolas, espionava-os; nas portas das escolas, prendia-os a três por dois; nas ruas, descia a borracha e mandava bala em quem se atrevesse a protestar. Nesse laboratório prático de política, muitos estudantes que, antes, só queriam estudar aprenderam que, para fazê-lo, tinham de ○
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padrões de relacionamento sexual até então vigentes, implodidos pela chegada da pílula anticoncepcional, ou o nacionalismo estreito que produzira duas guerras mundiais, corroído pelo impacto das novas tecnologias que dissolviam fronteiras físicas e culturais, por que não se podia sonhar com um mundo sem injustiça, opressão e discriminação? Como já disse em outra oportunidade “Era um tempo diferente. Um em cada três homens vivia, então, num país socialista. Não eram poucos os que apostavam que o capitalismo, incapaz de resolver os grandes problemas da humanidade, estavam cambaleantes. Quanto a União Soviética, não só estava de pé como vinha de humilhar
graduar-se também como cidadãos - e foram à luta. Para muitos outros jovens, porém, 68 foi mais do que um movimento por melhores condições de ensino ou pelo fim da ditadura. Para boa parte dos estudantes mais ativos na época, o ME, sigla pela qual se conhecia o movimento estudantil (diziase “eme-é”no Centro-Sul do país “mê-é” no Nordeste) foi também a porta de entrada para a luta por um mundo novo, a luta pelo socialismo, fosse lá qual fosse o seu matiz (o romântico, como o de Cuba, o espartano, como o da China, o possível, como o da União Soviética). Se tantas coisas estavam desaparecendo no planeta, como os rígidos
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ABI SEMPRE NA LUTA POR ANISTIA
os Estados unidos, ao colocar o primeiro homem no espaço. Se a Terra era azul, como dissera Gagárin, o futuro parecia vermelho. A Revolução estava na ordem do dia”. Mas, sendo principalmente dos estudantes, 68 não foi apenas deles. Em pouco tempo, o movimento dos jovens catalizou e estimulou o descontentamento generalizado da sociedade, especialmente o da classe média. À medida em que as manifestações estudantis ganhavam força e abrangência, médicos, advogados, artistas, intelectuais, religiosos, funcionários públicos, jornalistas etc passaram a se organizar, tanto para apoiar os jovens, como para levantar suas própias bandeiras. No caso dos jornalistas, esse apoio deu-se não só em concorridas assembléias da categoria, que aprovaram manifestos e notas de solidariedade, mas no própio exercício da atividade profissional. Quantos não levaram suas cacetadas da polícia ao buscarem o detalhe que enriqueceria a matéria do dia seguinte ou a foto que fixaria a brutalidade da PM ou do Dops? Poucas imagens falam tanto sobre a garra profissional dos jornalistas em 68 quanto a foto em que Alberto Jacob, então fotógrafo do JB, máquina na mão, aparece prestes a levar um golpe de sabre de um cavalariano da PM na porta da Candelária. As fotos da época, especialmente as da passeata dos Cem Mil, não deixam dúvidas também sobre a extensão da aliança entre os universitários e secundaristas e a fina flor da classe média carioca. Meu pai, Mário Martins, senador pelo Rio que viria a ser cassado depois do AI-5, pelo apoio que dedicou ao movimento estudantil e pelo combate que deu à ditadura militar, em seu livro “de memórias”, descreveu bem o que ocorreu naquela passeata: “É o que mais houve naquele dia foi discurso. Falaram os estudantes, falou cineasta, falou cantor, falou advogado, falou médico, falou arquiteto, falou um operário catado a laço, falou mãe de família, falou desempregado, falaram representantes de outros estados - falou todo mundo, menos é claro, os parlamentares”. Nesse sentido, 68 teve de tudo um pouco. Sem donos, sem regras, sem camisas-de-força. 68 foi, na verdade, uma formidável pororoca, uma grande e impetuosa corrente rebelde, dessas que surgem raramente na vida dos países e dos povos. Arrastou pelo caminho a todos que não queriam se deixar levar rio abaixo. É verdade que não chegou muito longe. Foi vencida pelo caudal dominante, muitas vezes mais forte. E daí? Vencer nem sempre é o mais importante e, às vezes, subir o rio é o que faz a diferença.
Chico Buarque, o senador Teotônio Vilella e Evaristo de Morais Filho na ABI, em ato público pela anistia, em 18 de julho de 1979
A ABI nos seus noventa anos de existência participou das campanhas e dos movimentos em favor das liberdades individuais e coletivas, da liberdade de imprensa, da livre manifestação do pensamento, contra todo o tipo de censura, de reunião, da autonomia universitária, de defesa dos direitos humanos e das reformas constitucionais e, principalmente, das anistias. Considera-as atos de soberania em pról da paz e em bem da harmonia. Suas campanhas nesse sentido constituíram sempre medida de elevado alcance visando a conciliação sem ressentimentos. A sua missão tem sido a convocação para o entendimento, sem ódio e malquerenças, inspirada tão somente na pacificação e no apaziguamento dos brasileiros. No Brasil são inúmeras as anistias, não somente no Império como na República. Leis imperiais anistiaram os farroupilhas em 1835, no Rio Grande do Sul; os revolucionários de 1842 em Minas Gerais, São Paulo e Pernambuco, e os rebeldes da revolução de 1849. A vários movimentos revolucionários na velha República se seguiu a anistia. Pode-se dizer que, na nossa história, a cada revolução firmou-se uma anistia. Listemos as principais: 1892: anistia aos revoltosos das fortalezas de Laje e de Santa Cruz, que intentaram contra Floriano Peixoto, e os revolucionários de Mato Grosso e Rio Grande do Sul. 1895: Lei n.º 310, anistiou os envolvidos em movimentos revolucionários até agosto daquele ano. 1930: um dos primeiros atos da revolução vitoriosa foi anistiar os praticantes de atos de contestação política antes do seu surgimento. A ABI teve grande participação nesse ato. Getúlio
Franklin Martins, jornalista, foi um dirigente do movimento estudantil no Rio em 1968.
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trabalhavam nas autarquias e empresas de economia mista; - trabalhadores que foram demitidos de órgãos estatais; - beneficiados por anistias anteriores que foram desanistiados; - mortos e presos desaparecidos, cuja situação não tinha sido assumida; - os que faleceram durante o período de afastamento, e consequentemente suas viúvas e filhos deveriam ser beneficiados.
Vargas, cinco dias depois de ter assumido a Chefia do Governo Provisório, em 1930, assinou o Decreto 19.395, concedendo essa anistia. Proclamou nesse ato: “A convicção da imperiosa necessidade da decretação da anistia está hoje, mais do que nunca, arraigada na consciência nacional”. E decretou: “Ficam em perpétuo silêncio, como nunca se tivesse existido, os processos e sentenças relativas a esse mesmos atos e aos delitos políticos da imprensa”. Outras anistias consumou Vargas: 1934: anistiou a todos os que tivessem cometidos crimes políticos. 1945: Decreto-lei n.º 7.474, concedendo anistia aos crimes comuns praticados com fins políticos e que tinham sido julgados pelo Tribunal de Segurança Nacional. 1951: Decreto Legislativo n.º 18, anistiando os trabalhadores demitidos por participação em movimentos políticos. No Governo Juscelino Kubitschek de Oliveira diversos atos de anistia foram estabelecidos a favor de militares, políticos, servidores públicos e trabalhadores. 1957-1958: a Lei de anistia em favor dos servidores da Administração do Cais do Porto do Rio de Janeiro, de nossa autoria quando no exercício parlamentar, reintegrando os demitidos e condenados pelo Tribunal de Segurança Nacional.
José Gomes Talarico
A ABI sempre disposta a cooperar na superação de episódios e problemas políticos, nas últimas décadas pagou pesados tributos pelas suas posições e conduta. Nas ocorrências a partir de 1.º de abril de 1964, já no primeiro dia da “revolução”, teve a sua sede ocupada militarmente por contigente da Marinha. Entre as centenas de atingidos por atos de suspensão de direitos políticos e aos direitos de trabalho, entre os milhares de presos, exilados e banidos, como entre os “desaparecidos”, estão um sem número de jornalistas, inclusive diretores e militantes da entidade. Mantendo a sua posição de luta, em 1965 na sua assembléia de abril, a ABI aprovou a execução da campanha em favor da anistia geral, ampla e irrestrita, que representou a conclamação-base até que se conquistasse esse ato. Na interpretação do pensamento e das aspirações da imprensa brasileira e na preservação da dignidade profissional, a ABI deu um grande realce, com os fatos históricos revelam, à consumação das anistias, que estão incorporadas a sua memória.
Na campanha pela Lei n.º 6.683, de anistia aos atos de punição entre 1964-1982, a ABI promoveu campanhas no sentido de que se alterasse o seu texto, considerando que a mesma não beneficiara a milhares de pessoas que foram atingidas por atos punitivos, entre os quais estavam: - antigos sub-oficiais, sargento cabos e praças (entre esses marinheiros e fuzileiros); - funcionários e servidores que
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José Gomes Talarico é vicepresidente da ABI e presidente da sua Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos
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SEMPRE UM ABRIGO DAS CAMPANHAS CÍVICAS Naquele 4 de abril de 1948 parecia difícil entender o que fazia Moses, o renomado presidente da ABI, no comando da mesa do ato público de criação do Centro de Estudos e Defesa do Petróleo e da Economia Nacional. Já em meio a uma acalorada discussão nacional, sabia-se que Moses não compartilhava da tese do monopólio estatal do petróleo. Mas lá estava ele, fiel aos seus amigos e assessores da ABI, todos integrados na histórica campanha "O Petróleo é nosso". Foi assim que pela ABI sempre passaram os atos e campanhas cívicas da sociedade brasileira. Independente das posições políticas, todos procuram espaço na entidade para marcar a importância que atribuem às suas teses. Algumas aparentes contradições podem acontecer, como a curiosa constatação do uso do auditório do 9º andar para lançamento da campanha à presidência do "caçador de marajás" Fernando Collor. O mesmo auditório que viria abrigar os mais elouqüentes atos da crescente mobilização pelo impeachment do já Presidente Fernando Collor, em processo final comandado pela primeira assinatura de Barbosa Lima Sobrinho, em ambos os momentos presidente da ABI. Antes mesmo da campanha do monopólio estatal do petróleo, inúmeras outras campanhas e manifestações marcaram época nos auditórios do edifíciosede, notadamente a pela entrada do Brasil na guerra contra o nazismo. A primazia de nascimento de movimentos pode ser reivindicada por muitos. Mas dois podem se orgulhar de nascer sob a influência direta da entidade, por iniciativa de seus integrantes. Foi numa assembléia geral e num grande ato público que pela primeira vez se formalizou o pedido de anistia após o golpe de 64. Foi também numa reunião interna que o diretor Augusto Villas-Boas, recentemente falecido, foi designado para representar a ABI e coordenar a nascente campanha das "diretas já". Ainda hoje o diretor de sede Henrique Miranda, que foi secretário geral do Centro do Petróleo, costuma se referir com orgulho ao "hospital cívico" - o pequeno mezanino
Ato de campanha nacionalista em defesa do monopópio estatal do petróleo no auditório do 9º andar em 6 de julho de 1987 que se eleva em parte do saguão do auditório do 9º andar. Alí se abrigam movimentos castigados pelo rigor dos novos tempos, sem grandes recursos para a própria manutenção. Ocuparam recentemente o andar que já sediou, logo após 64, o Sindicato dos Jornalistas Profisionais do Município do Rio de Janeiro, entidades como o Condepaz, o movimento dos militares não anistiados e o Conselho de Defesa da Amazônia. E é na sala do conselho administrativo que se reúne semanalmente o Movimento em Defesa da Economia Nacional - o Modecon. (André Motta Lima)
ANUNCIO 1/4 GDF
Tancredo Neves discursa na ABI durante sua campanha à presidência em 1984 ○
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Jornal da ABI
A TRINCHEIRA DA LIBERDADE
CHEGA A HORA DE ENFRENTAR O BRAÇO ARMADO DA 'LINHA DURA'
por Edmar Morel
História da ABI
ADONIAS FILHO (De 1972 a 1974) Voltemos ao ano de 1972, quando foi eleito presidente Adonias Filho, então diretor da Biblioteca Nacional, onde marcou uma época, pelo devotamento à entidade. Entrou para a ABI como redator do vespertino Vanguarda, de Oséas Mota, a 30 de janeiro de 1947. Adonias Filho, uma das grandes expressões da nossa literatura, durante anos foi articulista do Diário de Notícias, quando o jornal ainda era de comprovada idoneidade moral. Natural de Ilhéus, na Bahia, Adonias Filho nasceu em berço de ouro, a custa das imensas fazendas de cacau do seu pai, Adonias Aguiar. ○ ○ ○ ○ ○ Contemporâneo de Jorge Amado no Internato Ginásio Piranga, onde foi um péssimo aluno que, inclusive, fugia das aulas, estreou no jornalismo ainda e s t u d a n t e escrevendo no Diário de Notícias e O Imparcial, de Salvador. Na mocidade, escreveu o romance Cachaça, que destruiu. Viajou por toda a Bahia, para melhor conhecer a sua gente, a sua terra, iniciando o ensaio Renascimento do homem, lançado em ○ ○ ○ ○ ○ 1936, quando transferiu residência para o Rio e logo fez relações com Tasso da Silveira,. Andrade Murici, Lúcio Cardoso, Octávio de Faria, Rachel de Queiroz e outros intelectuais. Começou então a escrever no Correio da Manhã e A Manhã. Homem de profunda sensibilidade, seus romances Os servos da morte (com cenário da fazenda de cacau onde nasceu), Memórias de Lázaro, O forte, Corpo vivo e outros, revelam um espírito amadurecido, sem ter jamais usado o palavrão nas suas obras literárias. Fez uma incursão na política em 1950: candidatou-se a deputado federal, não sendo, porém, eleito. Usando o pseudônimo de Djalma Viana, assinou centenas de artigos e, por longo tempo, fez a crítica em Jornal de Letras, dirigido pelo heroísmo de Elísio Condé. Editorialista do Diário de Notícias, diretor do Instituto do Livro e, posteriormente, da Agência Nacional e da Biblioteca Nacional, foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras, em 1965, na vaga de Alvaro Moreyra, sendo recebido por Jorge Amado. Sucedeu na Academia Brasileira de Letras a dois jornalistas do porte de Joaquim Serra e José
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Adonias foi o mais literato de todos os presidentes da Casa do Jornalistas, mas, mesmo assim, não descuidou da sua administração. Teve atuação das mais brilhantes, na defesa de jornalistas presos e jornais censurados.
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A gestão de Líbero foi interrompida pela morte e ele não chegou, na verdade, a presidir uma reunião sequer, falecendo 10 dias depois de eleito, acontecimento que causou consternação nos meios jornalísticos
LÍBERO DE MIRANDA (De 27 de agosto a 6 de setembro de 1975)
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Elmano Cruz renunciou a 27 de agosto de 1975, sendo eleito para completar seu mandato o conselheiro Líbero de Miranda que, durante longos anos, fora primeiro-secretário da mesa do conselho administrativo. Era engenheiro e ocupou os mais altos cargos da vida pública, inclusive, diretor dos Correios e Telégrafos e presidente da Comissão do Plano do Carvão Nacional. Ingressou na ABI em 1936, como redator da revista Controle Magazine e, posteriormente, durante mais de 15 anos, foi redator da sucursal de A Gazeta de São Paulo, no Rio e, correspondente de A Notícia, de Joinvile, Santa Catarina, tendo sido redator, ainda, do Observador Econômico e Financeiro e de A Nação, ambos do Rio. Sua gestão foi interrompida pela morte e ele não chegou, na verdade, a presidir uma reunião sequer, falecendo 10 dias depois de eleito, acontecimento que causou consternação nos meios jornalísticos e, em particular, na engenharia nacional, onde se destacou por inúmeros trabalhos publicados na imprensa. No dia de sua eleição era visível seu abatimento físico. Sentado numa poltrona assistiu a aclamação do seu nome para presidente e pronunciou rápidas palavras de agradecimento. Para vice-presidente, o conselho administrativo elegeu Prudente
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de Moraes, neto. Espírito voltado para a música clássica e apreciando a literatura francesa, Líbero de Miranda foi uma das colunas mestras da ABI. Às vésperas de falecer, 6 de setembro de 1975, recebeu o primeiro exemplar do livro Beethoven de Romain Rolland, que traduzia meses antes. Não era apenas uma tradução, pois fazia comentários sobre a obra do imortal autor de Testamento de Heiligenstadt, escrito sob grande angústia. Líbero de Miranda estudou a fundo
Murilo Mendes. Lidar com poesia é uma coisa, com dinheiro, é outra. É preciso conhecer o Adonias Filho acadêmico e o Adonias Filho presidente da ABI. Os dois nunca se casaram... Foi o mais literato de todos os presidentes da Casa do Jornalista, mas mesmo assim não descuidou da sua administração. Nas horas de folga traduzia George Sand, Robert de Traz e Jacob Wasserman e, em colaboração com Octávio de Faria, escreveu a novela Léguas da promissão. Agüentou a presidência da ABI até o fim do mandato, em 1974, período em que teve atuação das mais brilhantes, na defesa de jornalistas presos e jornais censurados. Foi presidente do Conselho Federal de Cultura. Calmo, incapaz de aumentar a voz, entretanto era de uma energia fora do comum, batendo às portas dos poderosos para falar de igual para igual em favor da liberdade dos companheiros confinados ou ameaçados de prisão. Tal trabalho de profunda solidariedade humana dignificou o jornalista e o escritor de O forte, já traduzido em vários idiomas.
do Patrocínio e três poetas do gabarito de MárioAlencar, Olegário Mariano e, por fim, Alvaro Moreyra. Com o advento da revolução de 1964, Adonias Filho, pela sua cultura e responsabilidade, tinha livre trânsito nos altos escalões do governo. Em 1972, convidado para dirigir os destinos da casa fundada por Gustavo de Lacerda recusou, a princípio, alegando múltiplos afazeres. Na verdade, homem de gabinete, mergulhado dia e noite na leitura dos livros da sua rica biblioteca, não era indicado para presidir a ABI, que exigia um cidadão acostumado às lutas políticas. Era um temperamento forte, capaz de contrariar amigos em pretensões absurdas. Basta lembrar a sua gestão no Instituto Nacional do Livro e na Biblioteca Nacional, dois órgãos de cultura, sem maiores problemas internos. Na ABI o ambiente era ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ justamente o contrário, com sessões das mais agitadas, tanto na diretoria, como no c o n s e l h o administrativo. Na sua gestão, em dezembro de 1972, muito contribuiu para quebrar a incomunicabilidade de Fernando Segismundo, João Antonio Mesplê, Moraes Coutinho (médico da ABI), João Cabral Va s c o n c e l o s , e n q u a n t o Gumercindo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Cabral, com uma infecção nos olhos, ficou preso em casa, com policiais à porta. Foram processados, porém o juiz não atendeu ao pedido do promotor, mandando arquivar o processo. Danton Jobim, embora não fosse presidente, deu o melhor dos seus esforços para que os companheiros tivessem um tratamento condigno. O governo de general Emílio Garrastazu Médici exerceu a censura a ferro e a fogo, atingindo a todos os meios de comunicação. Até discursos de ministro foram censurados. Adonias, no fundo, sentia mágoa por tudo isto. Seu mundo era outro. Saia da placidez do chá das 5 da tarde na Academia Brasileira de Letras e ia participar das reuniões da ABI, muitas com discussões que entravam pela noite, um verdadeiro saco-de-gatos. Nasceu para ser ministro das Relações Exteriores ou embaixador. Detentor de vários prêmios literários, como era de esperar, fracassou como empresário, ao fundar a editora Ocidente, iniciando as atividades com um livro de
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as primeiras composições do mestre, tendo deixado inéditas duas traduções: As sinfonias de Beethoven, de Hector Berlioz, e a IX sinfonia de Beethoven, de Matos Barroso. Seu enterro, a despeito da notícia não ter alcançado as edições de domingo, foi uma consagração. Homem simples, porém de invulgar cultura, deixou vários livros técnicos, alguns editados pelo Clube de Engenharia, do qual foi um dos diretores. Tinha 72 anos de idade, quando foi abatido por um enfarte. Nasceu a 19 de abril de 1903, na cidade de Itajaí, em Santa Catarina. Modesto por natureza, demonstrando o maior desinteresse econômico em qualquer em qualquer empreendimento, nunca quis ser político, embora tenha sido o subchefe do Gabinete Civil da presidência da República, ocupada, em caráter interino, pelo deputado Nereu Ramos, nos anos de 1955 e 1956. Seu mundo era o jornalismo e a engenharia, tendo concluído o curso de geógrafo e de engenheiro civil e de mecânica e eletricidade da Escola Politécnica da Universidade do Brasil, respectivamente em 1928 e 1931. Homem de profunda sensibilidade artística, Líbero era um apaixonado pela música clássica e deixou inédito, além de duas traduções de Beethoven (caderno de memórias), um documentário intitulado Voz Clamantis in Deserto. ○
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foi um grande bebedor de cerveja e caipirinha e torcedor do Madureira. A ABI não tinha um poeta na presidência. Tinha um jornalista respeitado em todos os setores civis e militares. Comemorou-se, em 1976, seu aniversário com um almoço, no qual compareceram 300 convivas, dos quais pelo menos 180 velhos dromedários, como somos chamados, os antigos repórteres. Tomaram parte mais de 100 jovens profissionais, em pleno exercício do jornalismo. Muita gente quer saber porque o “neto” é minúsculo, precedido de uma vírgula. Um professor do Colégio Pedro II o convenceu de que a palavra neto não era sobrenome, mas simples aposto. E, assim, surgiu Prudente de Moraes, neto. Não era mais criança e fez uma operação de catarata. Mas a sua presença na ABI era diária e vigilante. Acompanhava todos os movimentos da Casa e exerceu o cargo com uma dignidade invulgar. Quando foi anunciado o “suicídio” do infortunado jornalista Wladimir Herzog, foi a São Paulo, em visita ao Sindicato dos Jornalistas Profissionais do estado a fim de hipotecarlhe a solidariedade da ABI pela conduta modelar daquela entidade no referido e doloroso episódio, crime monstruoso que continua impune, praticado pelos órgãos de segurança de São Paulo. Na gestão de Prudente de Moraes, neto, foram presos em março de 1976 o conselheiro Maurício Azedo, e Luíz Paulo Machado, enquanto Fichel Davit Chargel e mais 20 companheiros foram chamados a depor nos órgãos de segurança, num inquérito que teve algo da Inquisição, com interrogatório que emendavam o dia com a
PRUDENTE DE MORAES, NETO (De 1975 a 1977) Imediatamente, assumiu o posto o 1º vice, Fernando Segismundo, um nome que dispensa apresentação, realizando-se a eleição para o preenchimento do cargo, em caráter efetivo, a 30 de setembro de 1975, quando foi eleito Prudente de Moraes, neto. Deve o seu ingresso no jornalismo a Mário Rodrigues, diretor de A manhã. Com o pseudônimo Pedro Dantas, assinava suas crônicas. Redigiu uma seção de turfe, a partir de 1944, na Folha Carioca, depois no Diário Carioca e em O Globo, revolucionando a crônica especializada. Prudente de Moraes, neto, era contaminado pelo germe do jornalismo político. Candidatou-se a deputado federal e teve pouco mais de 200 votos. Dono de admirável estilo e participando do cotidiano do jornal, tornouse uma figura das mais conhecidas e requisitadas, desde que foi redator-chefe da Folha Carioca, com sede na rua da Constituição, tendo como diretor Aderbal Novais e como secretário Gomes Maranhão. O porteiro da redação, Barbosa, tinha ordem para não sair do posto. Prudente pedia para que ele fosse comprar uns charutos. Barbosa dizia: - Desculpe, dr. Prudente, mas recebi ordem do dr. Maranhão para não sair do meu posto. No decorrer dos anos, quando Prudente encontra-se com Maranhão, fazia blangue: Respeitemos o Barbosa... Tendo deixado a Folha Carioca, Macedo Soares o convidou para o Diário Carioca, a fim de fazer, além da página de turfe, a cobertura da Constituinte de 1946, revelando-se, então, primoroso comentarista político. Participou da chamada boêmia literária, com Di Cavalcanti, Pedro Nava, Manuel Bandeira e outros. Além de ser jornalista, fez incursões pela poesia, ficando famoso seu poema “A Cachorra”. Com o decorrer do tempo e ante suas novas atividades jornalísticas no campo político, deixou de ser poeta bissexto com poemas em diversas antologias. Participou do movimento modernista, fundando e dirigindo a revista Estética, de efêmera duração. Fernando Sabino descobriu que ele virara torcedor do Madureira, “por imperativo de modéstia, quando soube que o clube era sustentado por um banqueiro de bicho”. Foi amigo dos bambas da música popular, como Pixinguinha, Ismael Silva, Donga, João da Baiana e outros. No Colégio Pedro II começou a fazer poesia e, no convívio com alguns professores, entre eles José Oiticica, o neto do primeiro presidente civil da República dos Estados Unidos do Brasil foi anarquista... Quem conheceu Prudente de Moraes, neto, entre 1930 e 1940, não podia saber que aquele cidadão alto e esguio, chamado de Prudentinho pelos íntimos e simplesmente Pru, por Mário de Andrade,
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diretoria e do conselho administrativo ignoravam, certamente, que Prudente de Moraes, neto, não quis aceitar a presidência, em hipótese alguma, alegando seus múltiplos afazeres como consultor jurídico da Light. Antes fora ○ ○ ○ ○ ○ convidado Barbosa Lima Sobrinho. Na ABI existe de tudo: ateus, c a t ó l i c o s , protestantes, monarquistas, socialistas e, vez por outra, por falta do que fazer, a polícia d e s c o b r e subversivos... Queiram ou não ateus, cristãos e mouros, foi o destino ○ ○ ○ ○ ○ que apontou Prudente de Moraes, neto, para presidente e Barbosa Lima Sobrinho para presidente do conselho administrativo, duas personalidades que se irmanavam em todos os princípios da dignidade humana. É difícil saber qual o mais intrépido, o mais intransigente defensor da liberdade de imprensa, o mais inconformado com situações que, freqüentemente, no Brasil, garroteiam o direito de pensar, garantido pela Constituição. É fato por todos reconhecido a nova dimensão que Prudente deu ao Boletim da Casa, uma das publicações mais disputadas em seu gênero, refletindo com objetividade o cotidiano da comunicação jornalística
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entre nós. Prudente de Moraes, neto, faleceu a 21 de dezembro de 1977 e o 1º vice, Fernando Segismundo assumiu. Foi na gestão de Prudente que o terror tentou ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ silenciar a ABI, fazendo explodir uma bomba, a 14 de agosto de 1976, de alta potência, destruindo quase todo o 7º andar, c a u s a n d o prejuízos da ordem de 50 milhões de cruzeiros. A consciência nacional gritou: chega de terrorismo! ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Mesmo com as dependências arrasadas pela dinamite, a diretoria e o conselho administrativo jamais deixaram de realizar suas reuniões. Não foi esta a primeira ação do terror contra a ABI. Jogaram bombas de gás lacrimogêneo e foi até invadida por fuzileiros navais, a pretexto de que havia subversivos no terraço, jogando prospectos. Procurado por um repórter para falar sobre o atentado na ABI, Prudente de Moraes, neto, foi incisivo: - A provocação não é à ABI; é ao governo. O atentado causou viva indignação nacional, com discursos veementes no Congresso Nacional.
Uma gestão marcada pela explosão da bomba terrorista na sede e pelo episódio da morte de Valdimir Herzog nos porões da ditadura ○
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Prudente conseguiu quebrar a incomunicabilidade dos presos e, após longas démarches, obteve a liberdade dos companheiros
ANUNCIO 1/4 PAGINA HELIO ALONSO
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noite. O processo armado nos porões dos órgãos de segurança foi uma farsa. Prudente conseguiu quebrar a incomunicabilidade dos presos e, após longas démarches, obteve a liberdade dos companheiros. Todos foram absolvidos por falta de provas. José Gomes Talarico, por ser amigo do presidente deposto João Goulart, foi preso por mais de 10 vezes. Foram, presos ainda, Samuel Wainer, Carlos Lacerda e Hélio Fernandes, todos por crime de opinião. Nas reuniões de conselho administrativo abordava os problemas com clareza e prestava conta de suas démarches junto às autoridades sobre a situação de cada jornalista preso. Gostava do diálogo. Os sócios que não participavam da
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Jornal da ABI
Foram momentos difíceis os que marcaram o assassinato de Vladimir Herzog, trazendo a repressão para o meio profissional dos jornalistas. O conflito, dentro do governo, entre os adeptos da abertura e a 'linha dura' acabou resultando na explosão de bombas terroristas que tentavam impedir a luta da sociedade brasileira pelas liberdades.
O AUDITÓRIO REPLETO, DEZ MINUTOS DE SILÊNCIO E O CLIMA DE MEDO SOLTO NO AR homens e mulheres cultos plasmava-se a irrefutável conclusão: se mataram o Vlado (era assim que os amigos, carinhosamente, chamavam Vladimir Herzog), qualquer um de nós pode ser o próximo... E (por que não?) todos nós que aqui estamos poderemos não sair com vida deste ato. De repente, era como se tivesse se perdido o fio que, imperceptivelmente, conduz a lógica do pensamento. E não havia como se alegar desconhecimento da realidade. Ao contrário. Para a grande maioria dos presentes, repressão, prisão e até mesmo tortura não eram termos abstratos. Para alguns até (a ausência de nomes é para evitar alguma omissão imperdoável). estar presente, ali, poderia significar um imediato retorno às masmorras da repressão, de onde tinham saído dias antes, após períodos de incomunicabilidade absoluta. O mais provável é que começara a surgir, nos últimos meses, por um destes saudáveis mecanismos de autodefesa, a esperança de que os tempos dos assassinatos brutais já tivessem ficado para trás; de que faziam parte de um passado
Jalusa Barcellos Em “É...”, uma de suas mais conhecidas comédias, Millôr Fernandes observa: “quando tinha 20 anos, achava meu pai um completo idiota; quando fiz 25, fiquei surpreso com tudo que ele tinha aprendido nestes cinco anos...” Ao recordar o dia 31 de outubro de 1975, ou melhor, ao repassar na memória as imagens daquele encontro de 700 cidadãos e cidadãs, na sede da ABI, no centro do Rio de Janeiro, vale o questionamento: será que agora, passados quase 25 anos, ainda somos capazes de exprimir o que significou para cada de um nós, em particular, e para a nação como um todo, aquela enlutada aglomeração de pessoas? A resposta, por mais que se deseje diferente, vem na forma modelar do exemplo dialético. Sim, porque aí estarão sempre os historiadores, os estudiosos e (por que não?) os eternos nacionalistas, que se incumbirão de repassar a informação. E não, porque - pelo menos em se tratando especificamente daquele culto simbólico - é improvável que se consiga descrevê-lo com absoluta isenção, se lá não se esteve presente... A informação rígida dos fatos diz que, a exemplo do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, a Associação Brasileira de Imprensa decidira realizar uma missa na igreja Santa Luzia, no centro do Rio de Janeiro, em memória do jornalista Vladimir Herzog, brutalmente assassinado na sede de DOI-CODI paulista, em 25 de outubro de 1975. E que mediante a proibição deste ato religioso, por ordens expressas do cardeal D. Eugênio Salles, o então Presidente da ABI, Prudente de Moraes Neto, resolvera transferir para a sede própria Associação tal ato de repúdio. Foram 10 minutos do mais ardoroso silêncio, interrompido apenas pelas sirenes da repressão que, do lado de fora do prédio, faziam questão de mostrar sua presença e poderio. E que o final do ato, o mesmo Prudente de Moraes Neto convidou os presentes a que se retirassem em ordem. O que significava dizer: saiam diretamente para suas casas, de preferência em pequenos grupos, e não aceitem nenhum tipo de provocação. Mas para quem esteve lá, a história tem uma outra dimensão. Foi, sim, a mais ardorosa das manifestações silenciosas. Mas foi também - e principalmente - a mais concreta prova de vulnerabilidade coletiva. Nunca esteve tão próximo da emoção e do entendimento de todos que ali se encontravam que a vida de qualquer um estava, irremediavelmente, a mercê deles, como eram designados os homens da repressão. Nas fisionomias daqueles ○
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Especial 90 anos
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“linha dura”. Mesmo assim, a perspectiva era de que, no geral, a situação do país tenderia a melhorar. Torturas, prisões arbitrárias, assassinatos brutais, cassações, perseguições, censura ampla, geral e irrestrita contra tudo e contra todos, pareciam ter ficado para trás. Até porquê, os piores “inimigos”- grupo de jovens que buscaram na luta armada uma forma de combater a ditadura - tinham sido quase todos assassinados e/ou desaparecidos . Aparentemente, os algozes tinham exterminado todos os pretextos que justificassem a babárie. Mas a realidade se apresentou, novamente, de uma forma sanguinária e estupefatos, constatamos que a repressão não se considerava satisfeita. Pelo menos aquele grupo que, pela força das armas, continuava sequioso por sangue e morte. Vlado levou consigo os “motivos” pelos quais foi “chamado” para depor no DOICODI e de onde nunca mais saiu com vida. E, hoje, mais do que nunca, se tem a clareza que toda especulação nesse sentido não tem o menor importância. Mas ali, quando estavam todos reunidos, num desolador e paralisante silêncio, os olhares e expressões buscavam um entendimento. Para os amigos e colegas mais próximos, que desesperadamente buscavam uma justificativa (como se fosse possível explicar atrocidades), a “culpa” poderia estar na sua provável filiação ao Partido Comunista Brasileiro - naquele momento tão clandestino como todo e qualquer partido político que não respondesse pelas siglas oficiais de Arena e MDB. Também havia o fato de que, aproveitando-se das pequenas brechas, o Sindicato de Jornalistas de São Paulo, que elegera recentemente uma chapa de oposição, presidida por Audálio Dantas, não só começava a tratar de política salarial, como também esboçava tímidas reações contra a censura e a prisão de jornalistas. Haveria ainda uma terceira e mais inusitada hipótese: a de que no comando do telejornal da TV Cultura de São Paulo, Wlado pudesse ter ‘exorbitado” em suas pautas... E aí, então, mesmo inadvertidamente, poderia ter atingido os “donos dos nossos corpos e mentes”... Conjecturas dessa ordem passavam pela cabeça de todos que, naquele fim de tarde, se reuniram na ABI para homenagear o colega assassinado. Mas o sentimento mais avassalador era uma mistura de revolta e medo! Era como se aquela massa de homens e mulheres lúcidos e esclarecidos tivessem retornado a seu estágio mais primitivo: o de viverem como bichos,
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Se mataram o Vlado qualquer um de nós pode ser o próximo... ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
recente, quase impossível de serem retomados. Pelo menos até aquele instante. Pelo menos até o assassinato de Vlado... Afinal, mesmo que a cautela - naquele momento histórico - fosse condição imprescindível para a sobrevivência, a realidade apontava para dados novos. Já em 1974, o recém empossado ditador Ernesto Geisel acenava com o início do processo de desmilitarização do país. Nada gratuito - diga-se de passagem. Temerosos diante da perspectiva de fracasso do modelo econômico - e já podendo perceber o descontentamento da classe média urbana e do operariado em geral - os militares procuram comandar o processo de redemocratização, como alternativa para se manter no poder e, ao mesmo tempo, aliviar as tensões sociais. Uma decisão que não seria aceita, por unanimidade, pelas ditas Forças Armadas que, a partir daquele momento, passam a conviver com o incitamento de seu conflito principal: de um lado os que apregoavam o discurso da distensão, de outro os algozes da chamada
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acuados pelo medo e pela dor. Pois naquele instante, qualquer um poderia ter ocupado o lugar de Vlado. Afinal, não precisava ser filiado a este ou aquele partido para que se iniciassem as perseguições. Tudo era pretexto! O certo é que, mesmo descontado o distanciamento histórico, fica difícil supor que profissionais da área das humanas possam compactuar com um regime ditatorial. Assim como é muito difícil conceber que quem deseja a melhoria da qualidade de vida do homem possa aceitar uma sociedade tão brutalmente injusta. E mais: que todas estas constatações só tendem a crescer, quando a elas se juntam toda a sorte de arbitrariedade, cometida em nome de uma canhestra ordem vigente. Em síntese era mais ou menos este o perfil daqueles cidadãos que lá estavam reunidos. Aqueles “comunistas”, como nos chamavam os “donos do país”, padeciam única e exclusivamente desta “culpa”: queriam uma outra forma de organização social, onde houvesse liberdade, igualdade e fraternidade! Relatado assim, depois de quase 25 anos, até parece uma tentativa de fantasiar a história. E por isso mesmo, a citação de Millôr se torna tão oportuna. Afinal, não se pode perder a esperança de que, passados quase 25 anos, cresça a possibilidade de que as novas gerações, mesmo totalmente incrédulas, acreditem que nós, os seus pais, tivemos muitos amigos torturados e mortos, porque não abdicavam do direito de pensar. Exatamente isso: pensar! Se preferirem, pensar diferente daqueles que se apoderaram do poder. Mas pensar no bem. Pois se há um crédito que esta mesma história jamais arrancará desta geração, é a de que ela não teve limites nas tentativas de que, hoje, pudéssemos viver num país melhor. E que a grande maioria de nós, que estivemos lá para não deixar que o sacrifício de Vlado fosse esquecido, jamais utilizou outro tipo de arma, que não fosse a paixão pelo seu semelhante. Uma paixão tão grande que almejava que todos, mas que todos mesmo, fossem iguais; que todos, mesmo, tivessem idênticas oportunidades; que todos, enfim, vivessem como cidadão. Resta saber, agora, se foi possível fechar o raciocínio. Vlado era um de nós, um destes seres humanos que, provavelmente, a julgar pelo processo acelerado de desumanização, quase não se fabricam mais. Wlado, como todos nós que estivemos lá naquele dia, carregava consigo a convicção de que não dava para ser feliz sozinho!... Um sentimento muito forte de que, até hoje, mesmo na contramão da história, a maioria de nós não consegue se desfazer. ○
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USO DE BOMBAS PARA INTIMIDAR repressão, foram a ABI e não deixaram que mais ninguém entrasse no prédio. Segundo eles, a medida, que durou 2 meses, foi estabelecida para que se pudesse ser feita a perícia. O resultado da perícia considerou a bomba como de alto teor. No dia do atentado, a diretoria da ABI - da qual faziam parte Prudente de Moraes Neto, na época presidente, os vices Fernando Segismundo e Odílio Costa Filho e como diretores, eu, Mário Cunha, Nélson
Fichel Davi Chargel No dia 19 de agosto de 1976, às 10 horas da manhã, eu era o diretor da sede da ABI e estava no 11º andar, junto com a funcionária e jornalista Dulce Alves, quando escutamos um barulho muito forte. Descemos pela escada para ver o que tinha acontecido, quando constatamos que uma bomba tinha explodido dentro do banheiro masculino do 7º andar, onde funcionava a comissão de sindicância, que analisava as propostas dos sócios, e a sala da presidência da ABI, onde se reunia a diretoria. Felizmente na hora não havia ninguém nas proximidades da explosão. Ao chegar próximo ao local onde a bomba explodiu encontramos um folheto em que estava escrito: “Chegou a hora de começar a escalada contra a comunização do Brasil que está em marcha, A ABI totalmente dominada pelos comunistas foi escolhida para essa primeira advertência. De agora em diante, tomem cuidado seus lacaios de Moscou”. Nesse dia, estavam no prédio funcionários da Sunab, que na época funcionava do 2º ao 5º andar, e alguns funcionários da ABI, que estavam trabalhando na secretaria e na tesouraria. Como ainda era cedo, o movimento era muito pequeno, pois os associados só chegavam mesmo depois das 11 horas. Apesar do corre-corre ocasionado pelo pânico diante do barulho e da fumaça não houve vítima da bomba, mas o estrago causado foi tão grande que a ABI só conseguiu dinheiro para recuperar a área atingida 8 meses depois. A coluna de 30 centímetros estourou e foi parar em cima do elevador, o cano onde passava a hidráulica derreteu com o impacto e o calor da bomba, a porta do banheiro foi parar em cima da mesa onde trabalhava o diretor de sindicância. No mesmo dia, uma hora depois, o Dops e o DGIE, que eram órgãos legais de
imprensa. As acusações eram todas em cima dos jornalistas que eram chamados de comunistas infiltrados na imprensa brasileira. A situação começou a ficar tão tensa que várias ameaças de bombas eram feitas em todo o país. A censura era cada vez maior, inclusive os últimos jornais a serem liberados da censura foram os jornais O São Paulo, dirigido por Dom Paulo Evaristo Arns, e a Tribuna da Imprensa por Hélio Fernandes. Principalmente no período de 68 a 76, a censura era muito violenta. Nesta época os jornais eram obrigados a entregar toda parte editorial - matérias, fotos e charges - aos departamentos da polícia ou exército, para que fossem lidos e liberados para serem publicados ou não. A censura era ainda mais cruel no rádio, onde certas palavras, nome de pessoas etc eram proibidos de serem citados no ar. Eram também colocadas bombas em bancas de jornais como forma de repressão a venda de publicações alternativas como o Pasquim. A evolução da ABI no cenário brasileiro e o destaque que ela teve nesse período em que era mais que fundamental defender a liberdade de expressão, representava uma ameaça ao regime militar e acabou chamando a atenção dos órgãos da repressão. No meu ponto de vista a bomba colocada na ABI foi um ato de desespero das forças de repressão que se sentiram acuadas porque o movimento de luta pela anistia, liberdade de imprensa e direitos humanos com a morte de Vladimir Herzog que tiveram um impulso muito grande. Recentemente com a abertura dos arquivos do General Bandeira, em que são reveladas informações sobre as guerrilhas, ficamos sabendo que esse mesmo pessoal que atuou nos porões da ditadura, foi responsável pelas bombas na ABI e na OAB, que ocasionou a morte de uma funcionária, como também a carta bomba da Câmara Municipal, onde um funcionário teve sua mão dilacerada.
telegramas de em solidariedade, para ABI inclusive o presidente do Congresso na ocasião, Magalhães Pinto, e o líder do governo no Senado, Petrônio Portella. Mesmo após o caso da bomba, a perseguição aos jornalistas foi muito grande. Muitos companheiros foram presos, tanto em São Paulo quanto no Rio de Janeiro, alguns deles torturados e dezenas indiciados. Tudo isso fazia parte de um esquema para tentar abafar a
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Lemos, Henrique Cordeiro, Armando Peixoto, Arthur Cantalice, Alberto Dines, Fausto Cupertino - com a presença do presidente do Conselho Administrativo, Barbosa Lima Sobrinho, se reuniu fora do prédio para escrever uma nota sobre o caso da bomba. Por ser a ABI o baluarte da luta pela liberdade de imprensa e direitos humanos, o fato causou uma explosão de indignação em todo país. Parlamentares, governadores, assembléias legislativas, personalidades, entidades de clásses - todas elas enviaram
A bomba colocada na ABI foi um ato de desespero das forças de repressão que se sentiram acuadas com o impulso das lutas por liberdade
Fichel Davi Chargel é jornalista e era diretor de sede na época do atentado.
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E A TRIBUNA DA IMPRENSA CONSEGUIU RODAR Helio Fernandes A violenta demolição das oficinas e redação daTribuna da Imprensa, no dia 26 de março de 1981, completou 17 anos. Foi um fato indescritível, inacreditável, irreparável. Aconteceu exatamente às 4,10 da madrugada. E às 5 horas da manhã, com o fogo destruindo tudo, entre centenas de pessoas que, assustadas, assistiam a tudo, láestavam:BarbosaLimaSobrinho,Sobral Pinto e Alceu Amoroso Lima. Os três, com idade, credibilidade, dignidade e conhecimento da História, disseram a mesma coisa: “Foi o mais violento ataque já sofrido por um jornal em toda a História”. Eu estivera de 9 da noite até 1 da manhã num debate com Luiz Carlos Prestes, na Faculdade Nacional, no Centro Acadêmico Cândido de Oliveira (CACO). Foi um encontro interessantíssimo. Acabada a lição de História, fui para a ○
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Imediatamente uma parte importante dos membros dessa CPI se transportou para o Rio. E todos eles conversaram comigo, no lugar mais indicado: sala de Barbosa Lima Sobrinho, na presença do grande lutador de todas as horas, de todas as causas, de todas as lutas. Lá, o então senador Franco Montoro (que seria eleito governador no ano seguinte), falando pela CPI, me disse: “O jornalista Helio Fernandes já estava incluído na lista dos que iriam ser ouvidos por nós. Seu depoimento era considerado importante. Agora é ainda mais importante e urgente”. Então pediram que eu marcasse uma data para ir depor na CPI, IMEDIATAMENTE.Marqueipara48horas depois, eles concordaram e então no dia seguinte fui depor na CPI. Meu depoimento (espontâneo ou respondendo a perguntas) durou 6 horas exatas. Aplaudido de pé quando terminou.
intimidação: “Quem rodar a Tribuna da Imprensa, terá o mesmo destino”. Como chegaram na frente, quando íamos procurar as gráficas, a recusa apavorada não encontrava espaço para os apelos, e até para o faturamento, importante para eles. Conseguimos imprimir o jornal em Nova Iguaçu, numa gráfica pertencente a grupos católicos, que não tiveram medo. E o jornal saiu em formato tablóide, com a manchete que irritou ao máximo o pessoal do SNI: “A DITADURA VAI ACABAR, NÓS NÃO”. Estava funcionando então, no Congresso, uma Comissão Mista, chamada de CPI do Terror. Composta de senadores e deputados, investigava os vários atentados. Contra a OAB, a Câmara Municipal, e evidentemente contra a própria ABI, vítima desses alucinados que não conseguem conviver com a Democracia.
Tribuna. Muitas vezes dormia lá, quando tinha encontro muito cedo. Era o que ia fazer essa noite. Mas, como não avisara a Rosinha e a essa hora ela já estava dormindo, fui para casa. Se tivesse ficado no jornal, dormindo num sofá que havia na minha sala, não poderia dar este depoimento. Pois toda aquela parte foi virtualmente pelos ares, não escapou coisa alguma. E eu não teria escapado, o que daria ainda maior repercussão ao fato. Começou então a tremenda batalha para rodar o jornal, para que ele saísse no dia seguinte, não como habitualmente, pois estava tudo destruído, mas pelo menos que saísse. Dois grupos passaram a visitar as gráficas que viviam e vivem de imprimir para os outros. Da nossa parte, queríamos encontrar quem imprimisse o jornal. O pessoal do SNI, que comandara toda a operação-demolição, também percorria as gráficas, fazendo a advertência-
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Jornal da ABI
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O homem que serviu de guia para essa operação de destruição era o capitão Wilson Luís Machado. Pois esse mesmo oficial, 35 dias depois, participaria do monstruoso atentado conhecido como a loucura do Riocentro ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Não por mim, nem era esse o objetivo. Mas pela exatidão das respostas. Pela colocação, sem fugir um milímetro dos nomes, dados, onde trabalhavam os 13 militares do SNI que acusei frontal e nominalmente. Mostrei a hora em que tomaram o avião de Brasília para virem ao Rio e praticarem o atentadoexecução-demolição. Pois não queriam que ninguém do Rio tomasse parte, para que a preparação e o ato não ficassem expostos à identificação. Só um oficial servindo no Rio foi chamado para participar da operação. E assim mesmo para orientar os oficiais de Brasília, que não se movimentavam muito bem no Rio. Precisavam se localizar em relação ao prédio da Tribuna da Imprensa, por onde fugiriam, a melhor forma de chegar ao aeroporto, pois precisavam estar em Brasília o mais cedo possível, participar do expediente desse mesmo dia 26 que surgia. Que melhor álibi do que esse? Trabalharam no dia 25, no dia 26 já estavam à vista no expediente. Como acusá-los de terem vindo ao Rio? O homem que serviu de guia para essa operação de destruição era o capitão Wilson Luís Machado. Pois esse mesmo oficial, 35 dias depois, participaria do monstruoso atentado conhecido como a loucura do Riocentro. Pela graça de Deus esse ato criminoso não se consumou, se
Lavradio. A Constituição de 1967 colocou um artigo precisamente para me atingir. Dizia: “Jornalista cassado não poderá ser diretor de jornal”. Era uma aberração. Mas como eu era o único diretor de jornal cassado, não podia colocar meu nome no expediente. Por outro lado, como era obrigatória a colocação do nome do diretor no cabeçalho, tinha que recorrer a outras pessoas. PS 4 - Mas a perseguição era inacreditável. E então, jornalistas da Tribuna da Imprensa, muito compreensivelmente, não ficavam mais do que algum tempo. Até que foram acabando os nomes disponíveis. Além disso, em junho de 1968 começou a censura prévia na Tribuna, mesmo sem o AI-5, que só surgiria em 13 de dezembro de 1968. Essa censura durou exatamente 10 anos, até junho de 1978. Nenhum jornal, rádio, televisão ou revista sofreu isso, foi tão duramente reprimido. PS 5 - Vieram também as perseguições. Três confinamentos (caso único na História do Brasil), em Fernando de Noronha, Pirassununga, Mato Grosso do Sul. As prisões sem conta. A proibição de escrever com meu nome, que eu substituí por João da Silva. (Nome de um pracinha-herói que morreu na FEB). As idas ao DOI-Codi, um terrível antro de tortura e selvageria. As discriminações e violências, que não nos abateram. E que duram até hoje. E a “massificação” do ódio dos que não conseguem nos calar. E que estão muito perto de conseguirem aquilo que mesmo a ditadura de uma época não conseguiu. Apesar do terror e do terrorismo.
Antes da explosão das bombas, espalharam ácido pelas Linotipos (naquela época ainda não existia a informatização em lugar algum), e assim o que não foi atingido pelo fogo, foi destruído pelo ácido e depois pela água. Desastre total. E a investigação policial? Farsa completa, farsa que seria repetida no inquérito sobre o atentado de 1º de Maio, que traumatizou o País. O Secretário de Segurança do Rio era o coronel Waldir Muniz, ligadíssimo ao SNI. Sua principal insistência: me chamar para depor. Na terceira vez disse a ele que não iria mais. Também não insistiu, o que interessava era não criar problemas, nem para ele nem para o SNI, que eu culpava com depoimentos cada vez mais detalhados. O inquérito jamais saiu do lugar e portanto não chegou a conclusão alguma. PS - Essa história poderia ser desdobrada indefinidamente. Esses dois atentados, o de preparação-execução contra a Tribuna da Imprensa, e o outro, do Riocentro, que era para intimidar a opinião pública, não deveriam prescrever jamais. Deveriam criar o museu dos atentados, para que ficassem para sempre na memória dos brasileiros. PS 2 - A Tribuna da Imprensa foi a grande sacrificada de tudo. Não tendo deixado de combater um só instante, sofreu de todas as maneiras. A Tribuna da Imprensa em 1964, quando o golpe foi implantado, circulava com 60 páginas, diariamente. Para sobreviver e continuar a luta, como Prometeu acorrentado, teve que se alimentar das próprias vísceras. E quando veio o chamado “período de transição” (que dura até hoje), a Tribuna da Imprensa estava com apenas 12 páginas. Era a forma de não fechar. PS 3 - Qualquer um que conheça o sistema sabe o que isso significa. A intranqüilidade dominava a Rua do
transformou no que era: crime hediondo e monstruoso, que passou a fazer parte da nossa História. Não foi por acaso que esse oficial participou das duas missões criminosas. Ele tinha tudo para a missão. Não morreu (como o sargento que o acompanhava, Guilherme Pereira do Rosário) porque existe alguém que protege os incompetentes. Continuou no Exército, sua vida foi salva milagrosamente, ninguém esperava que escapasse, ferido como estava. Mas viveu e sobreviveu. Salvou não só a vida como a carreira. De capitão foi sendo promovido por antigüidade (quem teria a audácia de promovê-lo por merecimento, embora sem dúvida alguma ele “merecesse” naquela época?). Até que chegou a coronel e passou para a reserva. Ninguém teria a coragem de transformá-lo em general. Todo o atentado contra a Tribuna da Imprensa foi minuciosamente preparado, montado e executado pelo SNI. Mostrei tudo isso, nome por nome, na CPI do Terror. Os 13 nomes estão lá, e ninguém foi punido. Por que seria? Provei também que tudo foi testado e examinado numa chácara em Jacarepaguá. E que fotos foram tiradas de todo o interior da Tribuna, das máquinas, suas localizações, redação, as partes que ficavam em cima do local das máquinas.
Helio Fernandes, conselheiro da ABI, é .......... da Tribuna da Imprensa.
GRANDES ABSURDOS DA CENSURA: PEQUENA HISTÓRIA DENTRO DE UM PEQUENO DRAMA Um contato de publicidade da Gerência Comercial do Jornal do Brasil entrou na minha sala na Redação e me contou uma história: - Lemos, a empregada da minha irmã estava grávida, mas ninguém sabia. Hoje, no quarto dela, ela deu a luz e jogou a criança recém-nascida pela janela do oitavo andar. Minha irmã está muito chocada, nervosa e eu queria te pedir para não publicar a notícia. Respondi: - Fulano, ainda não tenho está matéria. O repórter está na rua, quando ele voltar vou ler, saber a repercussão, ver como foi e avalio. Se for possível eu lhe atendo. Senão, prometo minimizar a notícia. O rapaz agradeceu, ficou de me procurar mais tarde e saiu. Quinze ou vinte minutos depois, o repórter ainda estava escrevendo a matéria quando toca o telefone. Era o inspetor da Polícia Federal que costumava determinar
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Especial 90 anos
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a proibição desta ou daquela matéria que avisava: - É proibido dar qualquer notícia sobre o caso de uma empregada que teve um filho e jogou pela janela. Fiquei intrigado. O que tinha a censura a ver com aquilo, pura simplesmente - ainda que lamentável - caso policial ? Liguei para o contato e quis saber o que estava se passando. - Ah, é, meu cunhado o oficial da Marinha. Vai ver é por isso. Era. Até em coisas deste tipo os órgãos de repressão se metiam. Esta história que parece tão singela é um claro retrato da extensão, do poder, do discriminatório, do violento, da terrível ação da censura durante os anos que ela atuou. Foram anos. Primeiro, para todos os veículos, com os censores dentro das redações. Depois com telefonema e umas poucas vezes, por escrito. Para outros, eles ficaram anos dentro das redações ou exigindo, o que era pior, que os originais
Carlos Lemos
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coisa ele serve - além das más recordações que me traz - para ajudar algumas pessoas a escrever a história daqueles anos negros, os chamados anos de chumbo. Toda sorte de proibições estão no caderno negro. Desde a história que contei até a ordem de não publicar o nome de Dom Helder Câmara, Bispo de Olinda e Recife. Aparelhos estourados, mortes, negação de morte e tortura. Epidemias de dengue e sei lá mais o que. Quantas vezes soubemos de notícias através da sua proibição. Mandávamos apurar ainda que não se pudesse publicar. A ordem no Jornal do Brasil sempre foi publicar tudo, mas respeitar o que fosse proibido. Assim o fizemos. Não deixamos de publicar nada que não fosse claramente proibido. E isto me custou muitos aborrecimentos e constrangimentos. Era só publicar uma notícia que não agradasse as forças da ditadura que o telefone tocava cedo na minha casa, convocando-me para ir a uma delegacia da Polícia Federal. Lá ia eu ser interrogado, depois de levar horas esperando numa sala. Diante de minha
É proibido dar qualquer notícia sobre o caso de uma empregada que teve um filho e jogou pela janela - até em coisas deste tipo os órgãos de repressão se metiam. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
fossem para Brasília antes de serem publicados. Guardo, até hoje um caderno negro simbólica e literalmente - onde estão catalogadas todas as ordens da censura. De quando em vez um pesquisador me procura e deixo consultá-lo. Para alguma
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BEM QUE TENTARAM CALAR A IGREJA, MAS NÃO CONSEGUIRAM
explicação que publicáramos por que não havia sido proibido, escutava um inspetor de polícia me dar aulas sobre responsabilidade dos jornalistas. Fui um sem número de vezes até o dia em que me aborreci demais e comuniquei ao Diretor da Redação, Alberto Dines, e ao Dr. Nascimento Britto que não iria mais. Os dois concordaram e daí para frente me recusei a ir. Quando era coisa grande, uma autoridade maior conversava com o Dines ou com o Dr. Britto. Sei que outros jornalistas - só pelo exercício da profissão, não falo em ação política - sofreram mais do que estes meus modestos mas insuportáveis incômodos, constrangimentos e humilhações. Em comparação com outros, os meus podem parecer pequenos, mas são meus e me violentaram me fizeram sofrer muito. Grandes ou pequenos incômodos, constrangimento e humilhações, não podem ser esquecidos nem pelos que passaram por eles nem pelas gerações que nos sucedem. Eles devem estar sempre presente, não para revanche, vingança ou forra. Apenas para que nos lembremos sempre - os antigos e os novos - de que a liberdade de imprensa é um bom inestimável e imprescindível num país democrático como queremos que o nosso seja, como é agora, e para sempre.
Dom Paulo Evaristo Arns
torturar, matar, cercear o direito de informar e de receber informações. A Igreja pagou caro a suspensão do apoio inicial aos militares. Pagaram caro os bispos que gritaram que não era lícito o que se fazia em nome da segurança nacional. Particularmente a Igreja de São Paulo iria sofrer, a partir de 1968, uma perseguição sem tréguas. Seus agentes de pastoral foram presos, torturados. Sua rádio foi cassada, seu jornal semanal posto sob dura censura que se estenderia por dez anos. Um de nossos padres, hoje editor do jornal O SÃO PAULO, registrou estes tempos de perseguições à Igreja de São Paulo. Valho-me de seu trabalho e do que me ficou indelevelmente na memória para falar um pouco daqueles tempos. Vale a pena lembrá-los sempre para que não se repitam jamais.
O regime autoritário instalado no Brasil em 1964 foi igual a todos os outros, de direita e esquerda, que se instalam pelo mundo afora ao longo da história. Para manter-se, fez o que todos fizeram e fazem: utilizou-se da concentração cada vez maior de poder, do aparato policial com duas faces, uma oculta e outra ostensiva, da promulgação de leis coercitivas, de tenaz e cruel perseguição às forças de oposição, passou por cima dos mais elementares direitos e garantias individuais. Como os outros, o regime militar brasileiro procurou desde cedo criar uma imagem simpática de si. Para formar uma opinião pública favorável, utilizou-se de técnicas refinadas de persuasão, que exploravam as grandes paixões de nosso povo como a música, o futebol e até mesmo a fé. Controlou, enfim a imprensa, sabedor de que ela, quando livre, favorece o debate e a consciência política. No esforço de fazer crer que o melhor caminho para o Brasil naqueles anos era o proposto pelo movimento de 64, nem a Igreja foi poupada. Porque ela, a certo ponto, percebeu que os caminhos tinham se tornado descaminhos, que o atalho proposto se tornara beco sem saída. Ela entendeu, felizmente, que em nome de Deus era preciso gritar que não era lícito prender,
Carlos Lemos
isso era pouco na lógica do regime militar. Era preciso silenciá-la. A censura à Igreja foi implacável. O que ela fazia em benefício do povo não podia ser contado nem mostrado pela imprensa. Os seus pronunciamentos não podiam ser reproduzidos nos jornais, nas rádios, e na televisão. A Igreja, porém, tinha seus meios de comunicação. Se a grande imprensa era obrigada a fechar-se para ela, ao menos podia falar a seus fiéis das perseguições que sofria. Podia também ajudá-los a entender que havia direitos legítimos sendo desrespeitados, que havia sonhos de um Brasil diferente sendo desfeitos. Não pôde mais. A censura estendeu-se aos meios de comunicação da própria Igreja. Boletins, jornais e rádios da Igreja Católica passaram a viver sob o implacável olhar da censura em todo o Brasil. Em São Paulo, como arcebispo conseguimos reunir um grupo de homens e mulheres, religiosos, juristas, políticos, sindicalistas, jornalistas, gente simples do povo para resistir ao arbítrio. Era impossível calar diante de tantas violações dos direitos humanos. Era preciso dizer, com a palavra e com a ação, que o que acontecia no Brasil nos envergonhava aos olhos de Deus e do mundo. De duas maneiras a censura tentou
A Igreja censurada Para calar a Igreja não bastaram os ataques difamatórios a seus bispos: as invasões de sedes de bispado, as prisões de padres, religiosos, seminaristas, bispos brasileiros e estrangeiros; a tortura, morte e seqüestro de pessoas da Igreja; os processos. os inquéritos militares, as intimações a pessoas e grupos de padres e agentes de pastoral e as expulsões a líderes religiosos brasileiros; as proibições. Tudo
ANUNCIO 1/2 O DIA
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Jornal da ABI
nos silenciar. Fechando nossa rádio, mutilando nosso jornal.
BREVE HISTÓRIA DA CENSURA NO ESTADÃO
À cassação da Rádio 9 de julho somava-se a censura ao jornal arquidiocesano O SÃO PAULO. De modo definitivo ela começou no mesmo ano do fechamento da rádio, mas já vigorava desde 1971 através de telefonemas. Em 1972, começou a censura tipográfica. Em maio o jornal saiu com um espaço em branco por ter sido cortada matéria sobre acontecimentos envolvendo dom Pedro Casaldáliga e o padre Jentel, da diocese de Conceição do Araguaia. Em dezembro, um censor passou a freqüentar a redação iniciando censura permanente e prévia ao jornal. Depois os redatores deveriam enviar as matérias à sede da Polícia Federal. Uma vez censuradas por inteiro, ou em palavras, linhas ou parágrafos, eram devolvidas para publicação. O que fazer para driblar a censura? Felizmente a Fundação Metropolitana Paulista, mantenedora do jornal, editava também um boletim informativo. Nele, a redação do jornal publicava os artigos censurados. Assim ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ os leitores não deixaram de ser informados. Uma outra forma de reação à censura foi publicar o jornal com espaços em branco, indicando que ali devia estar uma matéria proibida ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ pela censura. Dentro do espaço, apenas uma frase: “Leia e divulgue O SÃO PAULO”. Os motivos para a censura eram os mesmos da cassação da Rádio. Foram cerca de 10 anos de uma prática censória absurda que negava à Igreja o direito de informar e ao povo o direito à informação. De nada valeram os nossos protestos nem o recurso à justiça, feitos por homens do peso de Hélio Bicudo, André Franco Montoro, José Carlos Dias e Arnaldo Malheiros Filho. A censura acabou em junho de 1978 por um telefonema à redação. Um funcionário da Polícia Federal, identificando-se como “Dr. Richard”, sem maiores explicações avisava que dali para frente não necessitávamos enviar nossos originais à censura. Terminamos por aqui. Esta reprodução do que foi um dos capítulos da história da luta pelos direitos humanos no Brasil fique como homenagem nossa à ABI, celebrando 90 anos de presença na linha de frente desta luta. À Associação Brasileira de Imprensa, tão ativa na hora, extremamente dolorosa, da morte do jornalista Vlado Herzog, como também em todas as outras ocasiões em que estavam em jogo a liberdade de informação aos cidadãos que lutavam pela liberdade e pela volta da democracia brasileira. Evoco ainda, e com muita gratidão, a concessão da honra ao Arcebispo de São Paulo, da carteira de jornalista militante que me foi conferida na Catedral Metropolitana de São Paulo, cenário das reações mais recordadas contra o regime opressor. Parabéns, ABI!
Transmissores lacrados A Rádio 9 de julho foi fechada pelo governo militar em 1973. Criada em 1954 para divulgar as comemorações do quarto centenário da cidade de São Paulo, foi presenteada à Arquidiocese pelo presidente Café Filho. O cardeal- arcebispo dom Carlos Carmelo Vasconcelos Mota recebeu com júbilo o presente. O termo de doação foi assinado por Juscelino Kubitschek em agosto de 1955. Em 1970, o Papa Paulo VI nos promoveu a Arcebispo Metropolitano de São Paulo. A Igreja nos pediu que substituíssemos dom Agello Rossi. Imediatamente, passamos a nos utilizar da Rádio para falar à cidade. O nosso programa semanal aos sábados, o “Encontro com o Pastor”, alcançou alto índice de audiência e aceitação. Havia um programa dirigido aos jovens ( “Tempo e contratempo”) e à ○ ○ ○ ○ ○ ○ população em geral (“A Igreja é a notícia”). Milhares de pessoas, entre as quais idosos e e n f e r m o s , participavam da missa dominical irradiada e da reza diária do rosário. Era uma rádio ○ ○ ○ ○ ○ ○ potente. Suas ondas médias e curtas cobriam toda a região de São Paulo e grande maioria dos Estados do Brasil a até mesmo alguns países latino americanos com duas horas diárias de programação religiosa. Como todas as rádios, nunca se furtou, nem podia, a veicular em rede os programas governamentais “A hora do Brasil”, o “Projeto Minerva” e as freqüentes “Alocuções presidenciais”. Em outubro de 1973, dois decretos sucessivos do Presidente Emílio Garrastazu Médici cancelaram a concessão das ondas médias e curtas da nossa rádio. Era a resposta dos militares à Igreja que relativizava os princípios da Doutrina da Segurança Nacional. A Igreja em São Paulo era atingida; seu arcebispo também, punido por defender os direitos humanos. Guardamos de memória o que dissemos na catedral no dia 1º de novembro, quando celebrávamos o nosso 3º aniversário de ministério episcopal em São Paulo : “A Igreja de São Paulo conserva um sentimento e uma grande mágoa por ver que alguns não compreendem seu trabalho e sua ação em favor dos pobres e dos humildes”. Na tarde do dia 5 de novembro os transmissores foram lacrados. Durante 23 anos jamais perdemos a esperança de reaver nossa rádio. Foi uma esperança ativa, feita de insistentes ações no campo político e jurídico. Até que agora, o Presidente Fernando Henrique Cardoso decidiu no-la devolver. No momento solene de assinar a devolução, no dia 9 de julho de 1996, disse o Presidente a nós e a tantos amigos que foram conosco a Brasília, que não estava nos fazendo um favor, estava, O Cardeal dom Paulo Evaristo Arns, sim, reparando uma injustiça. sócio militante da ABI, aposentou-se recentemente do cargo de arcebispo da Jornal amordaçado e mutilado Arquidiocese de São Paulo
Oliveiros S. Ferreira Não é fácil escrever sobre a censura que se abateu sobre os meios de comunicação em dezembro de 1968. A tomada de partido poderá fazer que se deturpem os fatos; a imposição da imparcialidade poderá levar a que se esqueçam coisas que no momento tiveram importância, depois se verificaram menores. Ainda assim, é preciso que fique, em algum lugar, um registro dos fatos – tais quais a memória é capaz de reconstituí-los. Não usarei, assim espero, adjetivos para qualificar o que se passou no Estado de S. Paulo da madrugada de 13 de dezembro de 1968 até a noite de 3 de janeiro de 1975. A um qualificativo, porém, tendo a perspectiva de tempo, não posso me furtar: a censura foi, essencialmente, burra. É preciso fixar datas; melhor dizendo, é preciso refazer a história – ou seria escrevê-la? – para que se possa compreender o que aconteceu. O deputado Márcio Moreira Alves havia proferido o discurso que desencadeou as fúrias: no clima de liberdade que a Constituição de 1967 havia restabelecido depois do fim da vigência do Ato Institucional nº2 - e levado pela maré das manifestações estudantis contra o governo Costa e Silva - ele propusera que aos militares fosse reservada a sorte que as mulheres paulistas tinham reservado a seus maridos quando voltaram das Gerais sem dar combate aos que lá se tinham fixado em busca do ouro, no século XVIII: a negação do tálamo. O discurso foi proferido no chamado pequeno expediente. Nenhum jornal, rádio ○ ○ ○ ○ ○ ○ ou televisão – então nos seus começos – tinha prestado atenção ao que ele dissera, mesmo porque não era hábito cobrir o pequeno expediente. Os repórteres não tinham prestado atenção, mas alguém fizera isso por eles – e de corpo presente, ou compulsando o Diário do Congresso, encontrou a peça que permitiria, difundida pelos quartéis, criar o clima que colocou o presidente Costa e ○ ○ ○ ○ ○ ○ Silva entre a cruz e a caldeirinha: a tropa exige a cassação do deputado Márcio Moreira Alves, mas a Constituição estabelece seus ritos para que tal se faça. A tensão subia dia a dia, os ministros militares incapazes de conter a agitação do grupo da chamada “linha dura” – que ninguém era capaz de identificar nos quartéis, embora todos intuíssem a que
Boletins, jornais e rádios da Igreja Católica passaram a viver sob o implacável olhar da censura em todo o Brasil
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Especial 90 anos
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pretendiam – e o Congresso disposto a resistir. Finalmente, chegou-se a um acordo entre a Presidência, os ministros militares e as lideranças do governo no Congresso: a Câmara votaria licença para que o Supremo Tribunal Federal processasse Márcio e todos aceitariam o veredicto do Judiciário. A votação foi marcada para a manhã do dia 13 de dezembro, quando o presidente Costa e Silva estaria cumprindo compromisso oficial em Belo Horizonte. No dia 12, as Forças Armadas entraram de prontidão. Aí, começa minha participação na história. Por volta das 23 horas do dia 12, o general R/1 Sílvio Corrêa de Andrade, que chefiava a Polícia Federal em São Paulo, telefonou-me perguntando qual era a manchete do jornal. Não me dou ao trabalho de buscar nos arquivos o título preciso; era algo como Aumenta a tensão; Forças Armadas de prontidão. Nada mais perguntou, nada mais lhe foi dito. Fechei o jornal e fui para a casa. Pela manhã, repito, manhã do dia 13 de dezembro, convém ter presente, comunicaram-me que o jornal tinha sido apreendido. Por desses azares da sorte, a PF apreendeu o jornal nas docas da rua Major Quedinho, esquecendo-se de que havia uma saída das rotativas para a rua Martins Fontes. O que significou que alguns poucos milhares de jornais circularam. Se insisto em que a apreensão se deu na madrugada do dia 13, é porque os fatos dramáticos que tudo precipitaram só vieram a acontecer na manhã de 13 e porque o Ato Institucional nº5 só foi editado, pelo rádio (!), às 23 horas do dia 13. Em outras palavras, a apreensão foi um ato de força, vigente a Constituição. Posteriormente, ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ soube que o general Sílvio viera às rotativas pela madrugada, lera o e d i t o r i a l “Instituições em frangalhos” e d e c i d i r a , pessoalmente, apreender a edição. Para dr. Júlio de Mesquita Filho, que muito tempo depois recebeu as explicações do general Sílvio, o chefe da PF não poderia ter feito o que fizera sem ordem superior. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ A apreensão deve ter trazido à lembrança da família Mesquita o que haviam sofrido nos anos de 32, 37 e 40; sabiam que o jornal seria dali para frente objeto de represálias. O velho como o chamávamos na intimidade acompanhado dos filhos, foi ao governador do Estado e lhe disse, claramente, que autocensura não faria; se o governo
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quisesse, que pusesse censores na redação. Eles chegaram à noite, antes que o AI-5 tivesse sido lido pelo ministro Gama e Silva por volta das 23 horas. O que se seguiu de 13 de dezembro de 68 a 3 de janeiro de 75 foi rotina. Não muito rotineira, porém. A censura exerceuse de diferentes maneiras: homens na redação, lendo apenas a seção política; telefonemas da PF proibindo isto ou aquilo; homens na tipografia - era o fim da sempre lembrada era do chumbo - lendo provas de páginas, quando a situação se tornava mais crítica do ponto de vista político. Os censores eram recrutados em diferentes meios: os primeiros vieram do serviço de diversões públicas da Secretaria de Segurança Pública do Estado; depois, a PF destacou um único homem para transmitir as determinações censórias, centralizadas no estado-maior da II Região Militar; finalmente, a PF assumiu o comando das operações, ela própria, ligada à chefia em Brasília, que deveria responder ao que começou a ser chamado de “comunidade de informações”. Essa rotina prossegui até 1972. Um dia, o jornal publicou pequena notícia sobre a sucessão presidencial, a qual mencionava o nome do general Ernesto Geisel como um dos possíveis sucessores do presidente Médici. À tarde, o chefe da Polícia Federal convocou-me a seu gabinete, fazendo um apelo para que não publicasse coisa alguma sobre a sucessão. Transmiti a mensagem a Júlio de Mesquita Neto, que a recusou de plano. Às 20 horas, a PF telefonou,
na atividade privada, um que, de quando em quando, sem que ninguém soubesse por que, dormia no jornal no 6º andar do prédio da Major Quedinho, 28. Às vezes, vinham policiais à tipografia, exibindo as armas que portavam na cintura. Os censores traziam sempre uma lista do que não podia ser publicado. Certa feita um coronel da 5ª Seção do 2º Exército disse que tinham interesse em censurar fatos que podiam gerar idéias, não as idéias. O que não era bem verdade, pois apreenderam outra edição - em que sob o mesmo título “Instituições em frangalhos”, o jornal comentava a sucessão da Junta Militar, que se decidiu em votação nos quartéis, com o Alto Comando das Forças Armadas escolhendo o general Médici para ser presidente. No fundo, porém, o coronel tinha razão: era uma censura tópica e por isso burra. Foi nesse período que o jornal viveu seus grandes dias; e foi nesse período que a denúncia do que havia de errado no país ganhou força. Certa noite, na Faculdade de Filosofia da USP, onde dava aulas, vi um quadro-negro recheado de títulos aprovados pelos censores na oficina. Minha reação foi imediata: “Que jornal subversivo !” Na noite do dia 3 de janeiro de 1975, véspera do centenário do jornal, Richard Bloch telefonou: “Oliveiros, esta noite eu não irei aí”. João Luiz, secretário gráfico, mandou o censor ao cinema e o pobre só se convenceu de que sua missão terminara depois de telefonar a seu superior. A
"Foi nesse período que o jornal viveu seus grandes dias; e foi nesse período que a denúncia do que havia de errado no país ganhou força. Certa noite na Faculdade de Filosofia da USP, onde dava aulas, vi um quadro-negro recheado de títulos aprovados pelos censores na oficina. Minha reação foi imediata: Que jornal subversivo ! " ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
proibindo a publicação de qualquer referência à sucessão. Às 22 horas, entraram em força na redação: o encarregado da censura e policiais. Desceram à tipografia, onde passaram a ler não mais provas de páginas, mas o flan - a última fase do processo de pré-impressão. Nele, cortavam o que julgavam dever cortar - e viam de novo o flan com cartas, poesias, o que fosse. Os censores se revezavam a cada dia; havia os bem formados do ponto de vista intelectual, os que exerciam funções
censura no Estado havia terminado, talvez em homenagem ao centenário. Há episódios, lembranças, figuras que mereciam registro. Não cabem neste artigo. Registro, porém, a altaneira de Júlio Neto e Rui Mesquita, para não dizer o estoicismo de dr. Júlio de Mesquita Filho, suportando aquilo que foi para ele um dos piores pedaços de sua vida de lutador. A dedicação dos colegas de redação, empenhados em vencer o reinado da estupidez que se instalara; a dedicação sem par de João Luiz Guimarães, secretário gráfico, que teve de entender-se, sempre, com aqueles que cumpriam ordens - às vezes deixando entrever que votavam na oposição - e sobretudo suportar a prepotência dos que julgavam que exibir revólveres era a maneira de constranger jornalistas e operários gráficos. Os gráficos foram os personagens anônimos dessa longa história, que espero não se repita para que não aconteça o que sucedeu certa feita, quando, depois de publicar em latim, no lugar de um editorial, parte da Primeira Catilinária, recebemos elogio por carta pelo fato de estarmos difundindo a cultura . Oliveiros , ............
JOVEM QUE NÃO CONHECEU A CENSURA ENTREVISTA JORNALISTA COM EXPERIÊNCIA Acompanhando a revolução no telejornalismo que foi o “Jornal da Vanguarda” aprendi a admirar o comentarista político José Augusto Ribeiro que, junto com Newton Carlos, Fausto Wolff e grande elenco, botava para quebrar nas madrugadas da TV Bandeirantes. Profissionais como ele – e a influência de meu pai, Aluísio Gentil Branco, colega de redação de J.A.R. em O Globo – me fizeram optar pela faculdade de jornalismo. Fazendo questão de ressaltar que não tem a menor intenção de aparecer com essa entrevista (“quero mais é me esconder, fiquei anos me expondo na televisão”), J.A.R. me recebeu no seu apartamento em Copacabana para esse relato de episódios do período mais negro de nossa história, alguns sinistros, outros, por sua bisonhice, até engraçados. ○
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Arnaldo Branco – Parece que a censura à imprensa não foi tão radical nos primeiros anos do golpe. José Augusto Ribeiro – Não, embora sejam conhecidos episódios de desrespeito à liberdade de imprensa na época. Eu trabalhava no Diário Carioca, que tinha mais problemas de ordem financeira do que com a censura (risos). A situação se agravou mesmo quando fui para o Jornal do Brasil, em 69. Já havia sido promulgada a Lei de Imprensa, em 67, e o AI – 5, em dezembro de 68. O caso mais grave desse período foi a prisão de Hélio Fernandes em Fernando de Noronha – sobre o qual ele escreveu um ótimo livro. A.B. – Quem era o responsável pela censura? J.A.R. – O Ministério de Justiça. Aliás, é preciso desfazer uma injustiça histórica, a de que os militares eram os únicos responsáveis pelo cerceamento à imprensa. Para isso vou contar um episódio: na época, era costume descontar na Editoria de assuntos internacionais a frustração de não poder falar das nossas mazelas. Não podíamos falar mal da nossa ditadura? Pau na Argentina. Perseguição racial nos Estados Unidos? Manchete para as manifestações dos negros americanos. Então, em 69, quando ocorreram
protestos dos estudantes durante passagem, pela a Venezuela, de Nelson Rockefeller, emissário de Nixon, em uma escala de sua visita ao Brasil, recebemos farto material fotográfico da repressão policial e militar aos manifestantes venezuelanos. A censura, dirigida por civis, imediatamente vetou a publicação das fotos. Mas, nessa época, trabalhava na Fatos & Fotos o jornalista Sérgio Ross, que tinha relações com os militares porque era gaúcho e boa parte dos generais golpistas era do Rio Grande do Sul. O Sérgio foi ao Ministério de Guerra e, falando com os generais, conseguiu a libertação de quase todo o material fotográfico – só vetaram uma foto que mostrava um policial chutando a cara de um estudante. Quer dizer, havia no setor civil do governo indivíduos mais realistas que o rei. Um general foi muito mais liberal que um burocrata amedrontado do Ministério da Justiça. A.B. – Era arriscado enfrentar a censura? Muitos jornalistas foram presos e torturados na época, algum deles por tentar furar o bloqueio? J.A.R. – Era arriscado, sim. Me lembro quando chegou ao Jornal do Brasil a notícia de que um guerrilheiro havia sido morto em um determinado “aparelho”
depois de trocar tiros com os agentes da repressão. Então veio falar comigo o repórter da polícia, Otávio Ribeiro... A.B. – O “Pena Branca”. J.A.R. – O “Pena Branca”. Ele me pediu para não contar para ninguém, poucas pessoas na redação estavam sabendo: os médicos, naquele momento, estavam tentando embalsamar o corpo do guerrilheiro – cujo nome era Xael Chaves (?) – para que dali a, sei lá, vinte anos, as pessoas pudessem ver o que realmente o ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Havia no setor civil do governo indivíduos mais realistas que o rei. Um general foi muito mais liberal que um burocrata amedrontado do Ministério da Justiça ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
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Jornal da ABI
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matou: havia marcas de tortura por todo o corpo, o Xael (?) estava todo arrebentado. Então a gente procurava, formar dentro da redação, uma rede de pessoas que soubessem desse tipo de informação para proteger o Otávio, que estava sempre testemunhando coisas assim. Ele poderia ser preso, morto. A.B. – Foi o AI-5 que realmente piorou a situação, não é? Foi a partir dele que o cerco se fechou mais ainda sobre a imprensa? J.A.R. – Foi pior ainda depois da morte do Costa e Silva que, apesar de ter assinado o ato, era completamente contra. Costa e Silva foi sabotado por seu Ministro da Justiça, Gama e Silva, que era o verdadeiro “doutor Fantástico”. Andava com o ato, numa pasta, debaixo do braço, louco por uma brecha para – como se dizia? - editá-lo. O discurso do Márcio Moreira Alves na Câmara foi uma desculpa, já estava tudo armado. Depois disso veio o Médici, que era um homem do aparelho de segurança, estava lá para cumprir uma missão. Sua época foi da prosperidade econômica, a época do milagre brasileiro, mas de completa repressão política. Diziase que ele não cassou nenhum mandato. Mas para que? Não precisaram desse expediente, bast a ver por exemplo, como o deputado Rubens Paiva. Ele foi assassinado, por um motivo dos mais estúpidos: um amigo dele mandou uma carta do exílio no Chile que falava de coisas triviais, inocentes. Mas acharam que aquilo era uma mensagem escrita em código e o Rubens desapareceu. Depois quiseram divulgar a notícia de que ele morreu durante um tiroteio entre a polícia e um grupo guerrilheiro que tentou resgatá-lo no Alto da Boa Vista. A.B. – Antes da entrevista, você me falava que a pior época foi esta, do governo do Médici, no período de 71 – 73. Como a censura trabalhava? Havia censores dentro das redações? J.A.R. – Fui para O Globo em 71 e foi nesta época que começou meu convívio diário com a censura. Havia uma pilha de notícias censuradas e seu pai, como secretário de redação do jornal, tinha uma bela coleção delas. Censuravam tudo, em especial as notícias de política. Proibiam até a publicação de discursos de deputados governistas na Câmara e, certa vez, proibiram a divulgação da fala de um ministro do governo! Mas a censura tinha seu aspecto interessante: ela era nosso melhor repórter. Descobrimos a guerrilha do Araguaia através dela, por exemplo. Eles diziam : “é proibido falar daquela região” e nós ficávamos a par de tudo que estava acontecendo. Da mesma maneira a morte da estilista Zuzu Angel, uma figura que incomodava a repressão com sua luta para investigar o assassinato de seu filho Stuart pela ditadura militar. Fomos proibidos de falar sobre ela, antes mesmo de saber sobre a capotagem do seu carro em São Conrado. Como acreditar na hipótese de acidente? O chefe da censura – e eu espero que ele esteja vivo e lúcido para ler isso – era uma espécie de sub-chefe de reportagem do Globo, era nosso melhor informante. A.B. – Havia uma certa paranóia do governo militar da época, não? Censuravase tudo sem muito critério. Por que?
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ser o caso, o pai do menino era um pequeno comerciante, não nos parecia uma ação política. O Dr. Roberto simplesmente disse: - “Desobedeçam.” Apurou-se que o menino tinha fugido de casa com medo de apanhar porque fora reprovado na escola. O Globo publicou uma matéria com o apelo dos pais para que ele voltasse, o que ocorreu. Esse tipo de coisa irritava o Roberto Marinho. A.B. – Você dizia que o primeiro ato de enfrentamento à censura foi iniciativa dele... J.A.R. – Foi, E mesmo aqueles que não concordam politicamente com ele (entre os quais eu me incluo) tem que reconhecer isto. Aliás, faço questão de deixar claro que não estou contando esse episódio para ter algum ganho, como voltar a trabalhar no O Globo ou na TV Globo, até porque eu já recebi esse convite três vezes antes – um deles formulado pelo próprio Roberto Marinho – e não vai ser agora, quando estou cuidando da minha aposentadoria que eu vou ficar bajulando quem quer que seja. O episódio: em setembro de 73 a crise política tinha se agravado no Chile e chegavam as primeiras notícias: o Palácio de La Moneda invadido, Salvador Allende assassinado. Às 6:00 da tarde do dia do golpe, liga para O Globo o Alberico de Souza Cruz, chefe da redação de O Jornal, avisando que o agente da censura tinha proibido que se desse manchete para os acontecimentos do Chile. Seria impossível. Afinal, este era o principal assunto em todos os jornais do mundo. Imediatamente liguei para o Roberto Marinho e ele me disse: “Comunique ao censor que não vamos obedecer essa determinação”. E depois acrescentou: “mas só não vá fazer como eu fiz no tempo do Getúlio”. Fiquei intrigado, perguntei-lhe a respeito e ele me contou: “ sabe como é, eu era moço, a censura era exercida pelo DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) e um sujeito de lá esteve na redação do Globo com uma ordem de proibição. Era 1942 ou 43 e nós acabamos nos atracando. Mas não vá fazer isso, viu? Primeiro porque é preciso ter calma para negociar essa manchete . E, depois, porque naquele tempo eu era atleta, fazia boxe e você está meio fora de forma.” (risos) A.B. – E houve briga afinal? J.A.R. – Não. Apesar da ordem vir para as redações através da Polícia Federal (e, por isso O Jornal era o primeiro a receber a visita do portador das determinações da censura, pois a PF tinha uma sede na rua Rodrigues Alves e o “orgão líder dos Diários Associados” ficava ali perto, com uma entrada pela rua Venezuela e outra pela Sacadura Cabral), quem trazia os ofícios eram os motorneiros ou cobradores da Light. A Polícia Federal não queria se envolver com a censura, ela era mais do interesse do SNI, DOI-CODI, CIE, CISA, do CENIMAR. O homem com quem falei não sabia nada sobre o que estava escrito naquele papel. Ele só pediu para relatar nossa recusa a seu superior – e nesse momento ele se traiu, quando o chamou de “coronel” pelo telefone – mas, mesmo assim, quando me transmitiu o OK do seu chefe, me disse ameaçador: “Essa vocês ganharam, mas vai Ter volta”. Acho que a boçalidade é contagiosa (risos).
O problema é que a censura se tornou interessante para alguns, porque acobertava uma série de irregularidades. Um bom exemplo são as ações da polícia ligadas à repressão política.Volta e meia uma matéria da editoria de polícia era censurada, porque por trás de determinadas notícias do setor havia casos de extorsão, de corrupção ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
J.A.R. – Havia um critério, sim. Mas um critério maluco. O critério de um governo que mandou prender Sófocles, autor de uma peça subversiva. O problema é que a censura se tornou interessante para alguns, porque acobertava uma série de irregularidades. Um bom exemplo são as ações da polícia ligadas à repressão política. Volta e meia uma matéria da editoria de polícia era censurada, porque por trás de determinadas notícias do setor havia casos de extorsão, de corrupção. Um exemplo que posso lhe dar é o bandido “Marta Rocha”, um marginal “feito” pela própria polícia, que depois de algum tempo nas manchetes, virou assunto proibido pela censura. Polícia, repressão, Esquadrão da Morte, tudo estava ligado nesta época. Aqui um parágrafo: essa “paranóia” dos censores foi extremamente daninha, e posso citar um caso grave: fomos proibidos, por aquela época, de noticiar um surto de meningite no Estado do Rio. Quer dizer, não é que não se podia falar no surto, não era permitido escrever qualquer coisa sobre meningite. Depois de 15 dias, os médicos do Ministério da Saúde se deram conta que a coisa já descambava para uma epidemia, e então, veio a ordem contrária: os jornais eram obrigados a convocar os leitores para a vacinação em massa. Nesse episódio, a censura não só foi prejudicial à população, como afetava a credibilidade dos meios de comunicação. A.B. – Você trabalhava no Globo e o jornalista Roberto Marinho sempre teve uma imagem muito ligada ao governo militar. Como ele reagia ao ver o seu próprio jornal censurado? J.A.R. – Em alguns casos como na censura às notícias da guerrilha do Araguaia, ele não reagia violentamente, porque podia-se dizer que era um caso de segurança nacional. Mas episódios como esse da meningite realmente o irritavam. Houve um caso parecido, de um menino que sumiu de casa. A repressão logo interpretou como sequestro, achando que o resgate seria a libertação de presos políticos – e vetou a matéria. Mas não podia
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Fui preso porque o Roberto Marinho demitiu uma jornalista que era filha e sobrinha de dois membros do setor militar do governo A.B. – Você chegou a ser ameaçado por se opor à censura? J.A.R. – Eu fui preso, foi um dos episódios mais sinistros, nesse mesmo ano de 73, mas por outro motivo. Nesse ano – não quero citar nomes – o Dr. Roberto demitiu uma jornalista que era filha e sobrinha de dois membros do setor militar do governo. Obviamente, essa jornalista não teve nada a ver com isso, mas bateram na minha casa e me deram voz de prisão, alegando que havia uma denúncia de porte de drogas - no caso, maconha. Me encapuzaram, me jogaram em uma viatura e quiseram me fazer acreditar que estavam me levando para algum lugar no Méier. Mas eu sentia o carro subindo ladeiras, sentia o cheiro de mato – eles me levavam para o Alto da Boa Vista. Eu estava deitado com a cabeça apoiada no colo de um dos policiais e sentia que este contato constrangia o homem. Ele me disse: “pode deitar que é perna de macho”, creio que para descontrair. Me colocaram numa sala que tinha todas as características de uma sala de torturas: uma janela com um vidro chamado de “manjamento”, com o qual você não conseguia enxergar o que se passava fora da cela, mas podia ser visto. Havia um aparelho no canto da cela, que parecia servir para ministrar eletro-choques. Falei para eles: “Olha, vocês estão cometendo um engano. Eu sou chefe de redação do Globo, um dos maiores jornais do país. e logo, os meus colegas vão querer saber onde estou”. Senti que isto os deixou balançados. Me colocaram de volta no carro, disseram que tudo não passara de um mal-entendido e queriam me deixar em algum lugar na cidade, mas pedi que me deixassem em casa. Haviam revistado tudo, com especial interesse em livros de autores de esquerda – curioso, eles procurarem maconha dentro dos escritos de Marx. Fui para a redação, comuniquei o ocorrido ao Dr. Roberto Marinho e ele foi taxativo: “Te prenderam por algo que eu fiz. Levaram você porque não tiveram coragem de me levar”. Depois ele telefonou para alguém, provavelmente dos altos escalões, e me garantiu que isso nunca mais aconteceria. A.B. – E o período Geisel, que veio depois, como foi? J.A.R. – Com o Geisel veio o relaxamento, o início do processo de abertura. Tínhamos passado pelo pior, mas ainda sofremos. Ocorreu o assassinato do jornalista Vladimir Herzog em 75, que juntamente com o massacre do operário Manoel Fiel Filho, precipitou a “distensão lenta e gradual” e o recrudescimento da linha dura. Repare que a censura já não tinha a mesma força, já que as duas mortes foram cobertas pela imprensa, sendo que O Globo foi o primeiro jornal a publicar a notícia da morte de Herzog. ○
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A TRINCHEIRA DA LIBERDADE
COM SEGISMUNDO E A VOLTA DE BARBOSA LIMA SOBRINHO, NOVAS LUTAS NA REDEMOCRATIZAÇÃO
por Edmar Morel
História da ABI
FERNANDO SEGISMUNDO
fundou e contava com a colaboração de Otávio Malta, Joel Silveira, Fernando Segismundo, Francisco de Assis Barbosa e o autor destas linhas. Diretrizes era a válvula de escape da democracia garroteada. No Diário de Notícias, Fernando Segismundo dirigiu o “Diário Escolar”, foi redator-substituto de teatro e rádio, colaborou no suplemento literário e acabou por ser, nos últimos dez anos de existência do órgão, um dos mais assíduos editorialistas. Quando Prudente de Moraes, neto, entrou para o Diário de Notícias, Segismundo era encarregado dos tópicos. Fundador e membro do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio de Janeiro, antigo Distrito Federal, lecionou, ali, durante vários anos, a disciplina de história econômica e política no pioneiro curso de capacitação jornalística, por ele ajudado a criar. Ë conselheiro e diretor da Associação Brasileira de Imprensa desde 1949. Foi diretor-secretário da Associação Brasileira de Escritores, ao tempo em que Alvaro Moreyra e Graciliano Ramos exerciam a sua presidência. Afora o jornalismo, exerce o magistério no Colégio Pedro II, educandário por onde se bacharelou em ciências e letras. Mediante concurso de título e provas desempenhou, por longo tempo. o cargo de técnico de educação do Ministério da Educação e Cultura. É bacharel em ciências jurídicas e sociais pela antiga Universidade do Brasil. Leciona na Faculdade de Humanidades Pedro II. Depois de mais de 30 anos dedicados de corpo e alma ao Diário de Notícias, foi pungueado pelo bando que assumiu a direção. Um bando de escroques. De suas atividades na ABI, Segismundo gosta de relembrar a secretaria-geral que lhe coube, em 1957, do VII Congresso Nacional de Jornalistas, certame que reuni 600 trabalhadores da imprensa, inclusive estrangeiros. Em seu livro Imprensa brasileira - vultos e problemas, Segismundo elaborou um retrospecto da ABI, de Gustavo de Lacerda a Vargas, e dedicou capítulos a “Cripiano Barata, jornalista político; Frei Caneca,
(De 7 de julho a 7 de setembro de 1976 e de dezembro de 1977 a fevereiro de 1978) Fernando Segismundo já havia ocupado a presidência da ABI por motivo de licença do presidente Prudente de Moraes, neto, para tratamento de saúde, no período de dezembro de 1977 a fevereiro de 1978, completando o período de Prudente de Moraes, neto, que faleceu a 21 de dezembro de 1977. Danton Jobim foi eleito em 12 de fevereiro de 1978, sendo colhido pela morte a 26 de fevereiro. Fernando Segismundo, como vice, voltou à presidência, sendo eleito para o período que terminou em maio de 1978. Foi, sem dúvida, um dos períodos mais agitados da ABI, sendo eleito Barbosa Lima Sobrinho, reeleito em 1980, 1982 e 1984 com o término do mandato previsto para 1986. A nova geração, infelizmente, parece não conhecer Fernando Segismundo, embora ele tenha mais de 50 anos de tarimba. Adolescente, ainda com a farda do Colégio Pedro II, estreou em A Pátria, o jornal fundado por João do Rio, considerado o Papa da Moderna Reportagem. Todavia, na época em que Segismundo entrou naquele matutino, com redação na rua do Chile, o órgão era dirigido por Antenor Novais. Materialmente, a redação era pobre, porém, dispunha de um primeiro time de trabalhadores, sendo de destacar as figuras do secretário Sady Garibaldi, Hégio Sarmento, Otávio Malta, Brasil Gérson, Pascoal Carlos Magno, Benigno Fernandes, Alziro Zarur etc. Segismundo encarregou-se da página escolar, ajudou o redator de teatro e cinema e assinava uma coluna versando sobre os assuntos do dia. Segismundo foi, depois, para O Paiz, que, pela terceira vez, tentava sair dos escombros de um jornal enterrado pela desonestidade de um dos seus donos, João Lage, o maior de todos os velhacos que a imprensa brasileira produziu. Embora dirigido por uma equipe honesta, à frente Gastão de Carvalho, O Paiz naufragou. Em 1937, ingressou no Diário de Notícia, dirigido por Orlando Ribeiro Dantas, que soube fazer um jornal de alto nível técnico e cultural, reunindo, em torno de si, o que havia de mais expressivo no jornalismo, como o brilhante articulista Alves de Sousa, Osório Borba e Ricardo Pinto, panfletários, a poetisa Cecília Meireles, Luis Luna, Barros dos Santos, os irmãos Requião e outros. Naquele tempo o Brasil estava mergulhado nas trevas do Estado Novo e, a despeito da censura, saiu Diretrizes, o valente semanário que Samuel Wainer
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jornalista patriótico; Hipólito da Costa, jornalista venal; e Joaquim Serra, jornalista da Abolição”. Fernando Segismundo é autor, ainda, dos livros Castro Alves explicado ao povo, História popular da Revolução Praieira, Imprensa e democracia, Didática especial da história, Trabalhos manuais no currículo secundário e do jardim à universidade. Em conseqüência de suas atitudes, foi vítima de uma felonia: acusaram-no de subversivo, ○ ○ ○ ○ ○ juntamente com os outros dedicados companheiros da ABI. Dois dias depois de ter saído do cárcere, em i m p o n e n t e solenidade realizada no Teatro Municipal, discursou como paraninfo dos alunos do Colégio Pedro II. Muitos pensavam que ele iria fazer uma ○ ○ ○ ○ ○ oração patética. Nada disto. Teceu um hino à mocidade para sustentar o estandarte da liberdade, fundamental ao pleno exercício do regime democrático, sendo aplaudido, de pé, por mais de 2.000 pessoas. O jornalista, por lei, tem direito à prisão especial, na fase do julgamento. Segismundo a teve, porém, da maneira mais torpe possível, num processo digno do regime militar instituído em 1964. Foi metido num infecto xadrez, com cadeado, e na grade colocaram um papelucho: “Prisão especial.” A ditadura militar cassou os direitos políticos de dezenas de Jornalistas, seviciou barbaramente outros tantos e alguns foram torturados até à morte como Wladimir Herzog, Mário Alves, etc. Muitos procuraram o caminho do exílio, como Neiva Moreira, Samuel Wainer, Batista de Paula, Ib Teixeira, Mário Pedrosa, Henrique Cordeiro, Maria da Graça Dutra, Costa Pinto, Saldanha Coelho, Maia Neto, Edmundo Moniz, Raul Riff, Beatriz Bandeira, José Maria Rabelo e algumas dezenas de probos homens de imprensa, como Flávio Tavares, etc. Hélio Fernandes foi desterrado para Fernando de Noronha com a roupa do corpo. Hélio tem o orgulho título de campeão de prisões e processos. Em março, o terror oficial jogou uma bomba nas oficinas da Tribuna da Imprensa, destruindo-as. Como de costume foi “aberto rigorosos inquérito”, nada ficando apurado. Mais uma farsa da ditadura. Quem primeiro chegou à sede do matutino, vítima permanente de toda sorte de sabotagens, foi Barbosa Lima Sobrinho. Mesmo com as máquinas reduzidas a um montão de ferro retorcido, a Tribuna não deixou de circular um só dia.
Repetia-se em 1982 o mesmo ato de vandalismo praticado contra o Diário Carioca, em 1932, covarde proeza realizada por oficiais do Exército, com o apoio do então ministro da Guerra. Repetia-se o mesmo banditismo de 1947, no governo do general Eurico Gaspar Dutra, quando uma polícia de vândalos destruiu, à luz do dia, a Tribuna Popular com sede em frente à Câmara dos Deputados e do Fórum. Os atentados ao Diário Carioca, à ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Tribuna Popular e à Tribuna da Imprensa retratam os regimes de triste memória, exercido por ditadores. Os déspotas, detentores efêmeros do poder, ignoravam o libelo de Dunshee de Abranches, quando presidente da ABI em 1910. “Destruir ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ prelos, derramar mesas de tipo, quebrar compositores, espatifar móveis e bobinas, arrastar tudo para a rua e aí fazer de tudo uma rubra e vingativa fogueira, quer escapem ou não à sanha dos assaltantes redatores indefesos ou tipógrafos inofensivos - tal é o processo sumário e a justiça política das castas que se julgam privilegiadas no País, herdeiras dos últimos anos do Império e que têm continuado a desacreditar a República desde o seu alvorecer.”
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Em conseqüência de suas atitudes acusaram-no de subversivo, juntamente com os outros dedicados companheiros da ABI
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Dois dias depois de ter saído do cárcere, discursou como paraninfo dos alunos do Colégio Pedro II. Teceu um hino à mocidade para sustentar o estandarte da liberdade
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AV OL TA DE VOL OLT BARBOSA LIMA Em capítulo anterior, o autor focalizou a gestão de Alexandre José Barbosa Lima Sobrinho, nos períodos de 1926 a 1927 e de 1930 a 1931, quando fez de sua renúncia uma condição essencial para promover a união dos três associados de jornalistas existentes no Rio de Janeiro. Eleito com o objetivo de pacificar a classe, um tanto tumultuada, voltou à presidência da ABI em maio de 1978, sendo reeleito em 1980, 1982 e 1984. Ao assumir, fez o elogio público de Danton Jobim, como jornalista e político. Os dois se confudiam no extremado amor pelas Liberdades Públicas, sobretudo, pela preservação dos Direitos Humanos. A última gestão de Danton Jobim foi interrompida pela morte, não completando sequer uma quinzena. O óbito ocorreu, no Hospital dos Servidores, quando já recebera alta e se preparava para deixar o nosocômio. Seu estado, a princípio, não oferecia nenhuma gravidade. Recolheu-se ao hospital para fazer uns exames, quando surgiu uma virose. Foi uma perda
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irreparável para a classe. Era, realmente, um jornalista na expressão máxima da palavra, um intransigente defensor das liberdades públicas. Com a eleição de Barbosa pela primeira vez na história da ABI um jornalista ocuparia a presidência por seis períodos intercalados, no espaço de 56 anos. Entre muito ○ ○ ○ ○ ○ serviços prestados por Barbosa Lima Sobrinho à ABI, merece destaque a sua atuação como procurador da Prefeitura do antigo Distrito Federal, em que usou de todo seu prestígio pessoal para obter a concessão do terreno da esplanada do Castelo, onde hoje se ergue a ○ ○ ○ ○ ○ majestosa sede da ABI, cujas linhas marcaram uma nova etapa na arquitetura brasileira. Incrível como pareça, uma máquina burocrática entravou a doação, alegando que a cessão do terreno contrariava dispositivos de leis municipais. Barbosa Lima Sobrinho mostrou que tudo não passava de equívoco e, por fim, o prefeito Pedro Ernesto sancionou a lei, doando o terreno à ABI. Na presidência da casa fundada por Gustavo de Lacerda e consolidada por Herbert Moses, dedicou-se a uma política
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tempo levou Barbosa Lima Sobrinho a solicitar do governador Chagas Freitas, veterano homem de imprensa, uma doação especial para restaurar o edifício Herbert Moses. O governador enviou uma mensagem à Assembléia Legislativa pedindo uma verba de 60 milhões de cruzeiros, aprovada por unanimidade. As obras foram feitas pela Secretaria de Serviços Públicos, sendo reparado, com propriedade, o sistema hidráulico e elétrico. Comparece diariamente à ABI, dentro de uma política de portas abertas, participa dos encontros promovidos pelos jovens, incentivando-os à vida cultural e à luta pela emancipação econômica. Foi candidato a vice-presidente da República pelo antigo MDB nas eleições indiretas, em 1974. Aos domingos escreve um artigo no Jornal do Brasil. Concede entrevistas e redige o editorial do Boletim, com circulação dirigida, num total de 10.000 exemplares. Está sempre com a maleta pronta para viajar com destino a Brasília, atendendo ao convite do ministro da Justiça para participar das reuniões do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, do qual é vice-presidente. Pela corajosa atuação da ABI, na sua luta contra a prepotência que não respeita os Direitos Humanos, o povo brasileiro entregou à ABI o Estandarte da Liberdade. Dedicado de corpo e alma à luta nacionalista, nem sempre percorreu caminhos floridos e foi um dos perseguidos pelo regime instaurado no país, a 31 de março de 1964.
de confraternização, convidando para a diretoria companheiros que representavam as mais diferentes correntes partidárias. Reestruturou o Boletim da ABI, que deixou de ser um órgão classista, transformandoo numa vigilante sentinela dos Direitos Humanos. Suas páginas refletem as atividades da instituição que abriu suas salas e auditórios ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ às entidades c u l t u r a i s , permitindo a realização de assembléias de anistiados e de família que clamam pela presença de seus entes queridos, de há m u i t o desaparecidos. Ampliou a biblioteca, que é hoje a sala de visita ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ da ABI, e deu maior importância ao departamento cultural. Tem 85 anos de idade, porém, movimenta-se como se fosse ainda aquele jovem que começou a trabalhar com 17 anos, no Diário de Pernanbuco, do Recife. Viaja pelo Brasil inteiro, atendendo convites para pronunciar conferências e participar de debates jornalísticos na TV. O prédio da ABI tem quase meio século, inaugurado, parcialmente, em 1940, quando Moses instalou o seu gabinete no 2o andar. O desgaste das instalações pelo
Pela corajosa atuação da ABI, na sua luta contra a prepotência que não respeita os Direitos Humanos, o povo brasileiro entregou à ABI o Estandarte da Liberdade ○
Nos últimos anos escreveu mais de dez livros, inclusive Pernambuco: da Independência à Confederação do Equador, A língua portuguesa e a unidade do Brasil, uma biografia de Alberto Torres, a Antologia do “Correio Brasiliense”, No Japão, o capital se faz em casa, e, por fim, Estudos Nacionalistas. Pelo que li nos arquivos públicos e particulares muito aprendi sobre ABI e a vida dos seus presidentes. Suas pelejas pelas liberdades públicas foram empolgantes. Achei que devia apresentar um esboço biográfico de cada presidente, na presunção de que cada um representa uma etapa decisiva na Casa do Jornalista. Chego à conclusão, ante as vicissitudes que a ABI passou nestes longos anos de lutas, de que, como disse Dunshee de Abranches, ao tomar posse em 1910, “a ABI não pode morrer, nem mesmo se a quisessem matar”. Aí está o maior elogio à obra fundada por Gustavo de Lacerda. A ABI não capitulou e nem capitulará. As bombas estouram e a fumaça desaparece no espaço. E a ABI, a trincheira inexpugnável, continua de pé, enfrentando e vencendo o terror e a intolerância pela afirmação dos direitos humanos. NR: De 1985, quando o livro foi publicado, até os dias de hoje, Barbosa Lima Sobrinho continua exercendo sucessivos mandatos de presidente, colocando a entidade sempre na linha de frente das questões nacionais, como na campanha das diretas e no impeachement.
ANUNCIO 1/2 A TARDE
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Jornal da ABI
Uma carta de Fernando Segismundo, nas negociações da abertura política, e o discurso de Barbosa Lima Sobrinho no plenário da Câmara dos Deputados, na qualidade de primeiro signatário do pedido de inmpeachment de Collor, permitem traçar um quadro das posições históricas da ABI em defesa das liberdades públicas e dos direitos humanos
UMA RECEITA EXATA DAS LIBERDADES PÚBLICAS Durante o ano de 1977, em plena ditadura militar, a ABI, através do senador Petrônio Portella, enviou ao presidente Ernesto Geisel uma proposta de restauração do estado de direito.
como no episódio da Lei Adolfo Gordo de 1922, asseguraram à ABI larga projeção nacional e internacional como a Casa da Liberdade de Imprensa. Embora tenha também destacada atuação no plano cultural, com iniciativas em favor do aprimoramento técnico e profissional dos jornalistas e promoções de caráter artístico, e na assistência social ao pessoal de imprensa, através de amplos serviços médicos, é no campo da liberdade de imprensa sobretudo que a ABI justifica sua existência e se engrandece, pois o direito de opinião, como já assinalara Evaristo de Moraes na primeira grande batalha judiciária travada em torno da interpretação da Lei Adolfo Gordo, é nas democracias a maior expressão da liberdade. Jamais como nos últimos anos, Senhor Senador Petrônio Portella, a ABI foi tão chamada a exercer esse papel de guardiã da liberdade de imprensa, tal a extensão e o volume das restrições que passaram a condicioná-la em nosso País. O mais grave, Excelência, é que o clamor contra tais limitações, partindo tanto da ABI, de respeitáveis órgãos de imprensa e de toda a comunidade jornalística, como de diferentes instituições, infelizmente não tem encontrado ressonância nos altos escalões do poder público. Prova-o o silêncio que se segue às manifestações encaminhadas ao titular da Pasta política do Governo, o Excelentíssimo Senhor Ministro da Justiça, que não se permite sequer acusar o recebimento dos repetidos expedientes que lhe são dirigidos pela ABI e por outras associações de jornalistas do País. Não fora essa diferença, sem precedente mesmo no período mais aziago para as liberdades ○ ○ ○ ○ ○ ○ públicas no Brasil, o longo regime do Estado Novo, em que, apesar de tudo, a cortesia não foi eliminada das relações entre as associações de imprensa e o poder público, o Governo que Vossa ○ ○ ○ ○ ○ ○ Excelência representa poderia ter dados passos importantes ainda no sentido da restauração completa da liberdade de imprensa no País. É dever de justiça reconhecer que sob o Governo do eminente Presidente Ernesto Geisel houve progressos nesse campo, mas temos a convicção de que estes teriam sido mais largos e profundos se o Ministério da Justiça tivesse acolhido ou pelo menos considerado as inúmeras manifestações que lhe foram encaminhadas a respeito.
ODOCUMENTO Rio de Janeiro, 21 de novembro de 1977 Exmo. Senador Petrônio Portella A Associação Brasileira de Imprensa tem a honra de se dirigir a Vossa Excelência, atendendo ao convite com que foi distinguida, para expor algumas questões que a Casa do Jornalista considera fundamentais para a desejada restauração plena do Estado de Direito no País, objetivo da alta missão que lhe foi atribuída pelo Governo a que Vossa Excelência serve com superior qualificação. Essas questões envolvem aspectos relacionados com as liberdades civis em geral, campo pelo qual a ABI, mesmo sendo uma instituição apolítica e apartidária, sempre teve especial interesse, pela relevância de que as liberdades públicas se revestem no quadro da liberdade de imprensa, a qual só pode prevalecer e se afirmar num clima de integral respeito às demais liberdades. Ao longo de 70 anos de existência, que completará em abril próximo, a ABI fez da defesa da liberdade de imprensa e da defesa da pessoa do jornalista seu permanente e incansável apostolado, sem jamais indagar as convicções do jornalista ou as idéias do jornal por acaso vítima de restrições a seu direito de expressão. Ao mesmo tempo, proclamou com a mesma clareza sua adesão ao princípio da liberdade com responsabilidade, pois não pleiteou jamais nem pleiteia o privilégio da impunidade pelos excessos em que seus representantes possam porventura incorrer. Essa posição tradicional da ABI foi reiterada recentemente por nosso Presidente, Prudente de Moraes, neto, que, ao discursar nas comemorações do 69º aniversário da Casa do Jornalista, assinalou com precisão o alcance dessa doutrina: “A ABI sempre reivindicou, porém, e reivindica ainda, as necessárias garantias para que qualquer eventual repressão de abusos não possa jamais atingir o direito fundamental da livre manifestação do pensamento, nem muito menos o direito que tem toda pessoa humana, como é reconhecido internacionalmente, à garantia da integridade de sua pessoa física e de não sofrer cerceamentos de liberdade senão nos casos, na forma e sob a proteção da lei”. A firmeza e a isenção reveladas nessa pregação, que data da República Velha, quando se amiudaram tentativas de coibir a liberdade de informação e de opinião,
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À ABI não passa despercebido, Excelência, que tais restrições e a naturalidade com que elas são encaradas defluem de um quadro mais amplo de inexistência de franquias democráticas, das quais a liberdade de imprensa parece-nos a primeira e mais relevante, mas não a única. Foi por assim entender a situação atual da imprensa que o ○ ○ ○ ○ ○ C o n s e l h o Administrativo da Associação Brasileira de Imprensa, presidido por esta figura venerável da nossa vida pública que é Barbosa Lima Sobrinho, decidiu em sua sessão de agosto, por unanimidade, ○ ○ ○ ○ ○ “manifestar sua solidariedade com as aspirações nacionais pela restauração do Estado de Direito, a começar pela extensão do habeas-corpus a todos os casos de violação de direitos individuais, complementado com o restabelecimento das prerrogativas que asseguram a independência do Poder Judiciário”. Proposta por Barbosa Lima Sobrinho e avalizada pelo voto de todos os integrantes do Conselho Administrativo da ABI, cenáculo que reúne personalidades destacadas da cultura nacional, essa importante declaração da Casa do Jornalista acentuava que "... a Associação Brasileira de Imprensa faz questão de proclamar que a vocação do povo brasileiro, afirmada em 155 anos de vida de nação independente, é uma vocação democrática, que só se realiza através de todas as instituições que complementam o ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Estado de Direito, tanto mais quando o respeito à Lei, fundamento da ordem pública, impõe, como condição prévia, que a lei emane dos órgãos legítimos da soberania nacional. A ordem ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ é, como todos reconhecem, um desejo universal, assim como a repulsa a qualquer tipo de subversão. Mas essa ordem há de ser a ordem jurídica legítima, fruto da vontade soberana do povo, manifestada de forma livre, direta e garantida". A posição da ABI está portanto definida nessa declaração de seu órgão supremo de decisão, o Conselho Administrativo. E por isso a ABI julga oportuno reafirmar sua convicção de que a
reorganização jurídico-política do País, magna tarefa que leva Vossa Excelência a ouvir órgãos representativos de diferentes setores da sociedade brasileira, exige antes de tudo a restauração da soberania popular, de maneira que esta possa expressar-se de “forma livre, direta e garantida”, o que não é possível no âmbito e sob o império das instituições que ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ atualmente regulam a vida política do País. O passo primeiro para esse fim, no entender da ABI, é a revogação do corpo de leis especiais e ordinárias que hoje impedem a livre ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ manifestação da vontade popular, medida a que se devem seguir iniciativas destinadas à reconciliação do País consigo mesmo, através de uma anistia ampla e sem restrições; ao estabelecimento da liberdade de expressão e de organização, a fim de que todas as tendências da sociedade brasileira possam oferecer sua contribuição à reordenação constitucional; à segurança individual, exposta a ações praticadas à margem da lei por organismos que violam tanto os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil no campo dos Direitos do Homem como os declarados propósitos do Governo - que já deu provas de seu empenho nesse terreno - de assegurar o respeito às garantias elementares que são devidas à pessoa humana. A dissolução desses organismos, ou a sua submissão aos estritos limites das leis do País e das convenções internacionais, é condição essencial para o êxito de qualquer esforço governamental no sentido da reestruturação democrática do País. Agindo como se fossem um poder paralelo, esses órgãos têm violado normas da convivência civilizada e, o que é grave para o próprio poder constituído, desrespeitam as normas da hierarquia, inclusive as de natureza militar, que são o princípio básico e o cerne das instituições castrenses. Os jornalistas brasileiros, Senhor Senador Petrônio Portella, apreenderam esta verdade à custa de amarga experiência a qual tem como episódio mais doloroso a trágica morte do jornalista Vladimir Herzog, ocorrida a 25 de outubro de 1975 numa dependência do DOI-CODI de São Paulo, em circunstâncias até hoje não esclarecidas. Além das questões gerais relacionadas com a restauração democrática no País, a comunidade jornalística tem interesse especial em
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A ABI reafirma sua convicção de que a reorganização do País exige a restauração da soberania popular ○
O mais grave é que o clamor contra tais limitações, não tem encontrado ressonância nos altos escalões do poder
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aspectos particulares que dizem respeito não apenas à sua atividade profissional, mas também à sua função social, de vez que o jornalismo constitui uma forma específica de múnus público, porquanto são os jornalistas delegados e agentes da vontade social, que eles apenas interpretam, em seus diferentes matizes. Para a ABI é confortador verificar que é este também o entendimento que Vossa ○ ○ ○ ○ Excelência tem da natureza e significação da atividade jornalística, conforme a magnífica definição contida no brilhante discurso que pronunciou ao presidir, a 22 de junho do corrente ano, à sessão solene de instalação da Representação da ABI em Brasília e que nos permitimos relembrar agora, pela lucidez e ○ ○ ○ ○ oportunidade dos conceitos então expedidos por Vossa Excelência: “Nós políticos procuramos interpretar os anseios do povo e conduzi-lo. A vós cabe modelar, nas influências multiformes de todas as horas, o homem, nas diversas fases da vida e opinar sobre os intrincados problemas dos indivíduos e da coletividade. Os meios de comunicação antecipam, madrugam. E à nossa chegada temos ante nós um mundo pré-constituído, formado”. “Somos profissionais do livre exame, do debate sem preconceito. Nossos desafetos são os que, apegados a falsas crenças, não as expõem à luz do dia, no temor de as exibirem pouco vistosas ou frágeis demais no confronto com as alheias”. “Não tendes compromissos com o fazer, mas com o dizer e o pregar. O certo, no entanto, é que, onde a intolerância asfixia o meio social, desfiguramo-nos ou perecemos. Políticos e jornalistas, vivemos em comunhão com a liberdade - eis um vínculo que não se dissolve”. Entre essas questões de significado essencial para a “comunhão com a liberdade” referida por Vossa Excelência, os jornalistas entendem que devem ser consideradas as seguintes, pelo caráter agudo que assumiram neste momento de vida do País:
particularmente naqueles a que está presente o Excelentíssimo Senhor Presidente da República, bem como a cessação dos constrangimentos e violências a que os profissionais de imprensa, mesmo após a aprovação de seus nomes, são com freqüência submetidos no decorrer destes trabalhos jornalísticos. Suspensão imediata da censura prévia aos programas ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ jornalísticos de emissoras de rádio e televisão e subseqüente revogação dos dispositivos reguladores d a s concessões de exploração d e s s e s veículos que conflitam com ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ a liberdade de informação e de opinião, como o Código Nacional de Telecomunicações. Restabelecimento pleno da liberdade de opinião pelos meios de expressão da palavra oral, com a revogação da legislação que impede ou cerceia tal liberdade, em particular a lei que regula a propaganda eleitoral dos partidos políticos (Lei Falcão). Revisão das leis que regulam os delitos de imprensa, notadamente a Lei de Imprensa e a Lei de Segurança Nacional, para abrandamento das sanções nelas cominadas, sem prejuízo do princípio da liberdade com responsabilidade. Estabelecimento de um sistema impessoal e isento de atribuição de verbas de publicidade de órgãos oficiais e de instituições estatais, para-estatais ou mistas, para impedir que a manipulação desses recursos - que, por sua magnitude, transformaram o poder público no maior anunciante do País - seja feita de forma que condicione ou coíba a liberdade de informação e de opinião. Instalação do Conselho Superior de Censura criado pela Lei no 5.536, de 21 de novembro de 1968, do qual participam instituições culturais públicas e privadas, entre as quais a ABI, a fim de se criar uma instância de recurso e revisão das restrições e interdições impostas a criações intelectuais e artísticas sujeitas a exame prévio de organismos oficiais de censura.
Cessação imediata das prisões irregulares com características de seqüestro, como as efetuadas contra cidadãos sob suspeita de atividades opostas ao regime, e promoção da responsabilidade administrativa e penal dos agentes do poder público que se envolverem nessa prática ou a permitirem. Respeito à disposição legal, contida no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, de que a incomunicabilidade do preso não se estende à pessoa de seu advogado, em nenhum momento em que se encontrar privado da liberdade. Incorporação à legislação de dispositivo que estabeleça que não produzirá qualquer efeito jurídico, seja para início de ação legal, seja como meio de prova, a confissão obtida de preso sem assistência de advogado por ele livremente constituído. Regularização do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Lei Bilac Pinto), com a normalização de suas reuniões e garantia do livre exercício da ação fiscalizadora de seus integrantes. Revisão da composição do Conselho, a fim de evitar que o poder público, que por seus prepostos é o principal agente de violação ou inibição dos direitos humanos, tenha maioria que impeça ou obste a apuração das denúncias encaminhadas ao CDDPH.
As proposições expostas constituem o ponto de partida para um debate que, desejamos, seja franco, livre e aberto a toda a sociedade brasileira
Liberdade de imprensa Restabelecimento pleno da liberdade de imprensa, para que esta possa ser exercida dentro de quatro princípios básicos: direito de informação, direito e acesso à informação, direito de opinião e , inerente a este, direito de crítica. Suspensão imediata da censura prévia, de caráter discriminatório, imposta a vários veículos de expressão da palavra escrita, como o diário Tribuna da Imprensa, os semanários Movimento e O São Paulo e as revistas mensais Ele & Ela, Status, Revista do Homem e Lui, entre outras publicações. Eliminação do sistema de triagem política para a concessão de credenciais em coberturas de atos oficiais,
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Liberdades públicas Restabelecimento pleno das garantias e franquias que sempre figuraram nas Constituições republicanas, em particular no regime primitivo da Constituição de 1946, e incorporação de novas franquias à Carta Constitucional,
ANUNCIO 1/4 VEIGA ALMEIDA
Direitos Humanos Restauração imediata do instituto do habeas-corpus para todos os casos de constrangimento da liberdade individual, sem exceções que objetivem discriminar o preso por motivo político ou por qualquer delito de confissão. Respeito à integridade e à incolumidade física e moral de todos os presos, qualquer que seja a natureza do delito que lhes seja imputado, e promoção da responsabilidade penal, após inquérito regular efetuado com assistência de representantes do ministério público, dos autores de ofensas a preso sob custódia de qualquer dependência oficial ou autoridade pública.
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para aperfeiçoamento e ampliação dos direitos individuais e liberdades públicas. Anistia ampla e irrestrita a todos os presos, condenados, processados, exilados e banidos por crimes de natureza política, para a pacificação da família brasileira. Concessão de passaportes a todos os brasileiros que se encontram afastados do solo pátrio por motivo político e garantia de seu retorno ao País sem qualquer ameaça, constrangimento ou violação de sua liberdade individual. Reintegração na plenitude de seus direitos civis de todos os brasileiros atingidos, por motivos políticos, por atos de privação de direitos inerentes à cidadania, seja por decreto do Poder Executivo, seja por sentença judicial. São estas, Senhor Senador Petrônio Portella, as questões que a Associação Brasileira de Imprensa considera oportuno encaminhar a Vossa Excelência, no momento em que, investido de tão altas e honrosas responsabilidades pelo Governo Federal, Vossa Excelência procura auscultar os sentimentos de diferentes áreas da vida nacional para formulação de um projeto político. Acreditamos que as proposições expostas constituem o ponto de partida para um debate que, como Vossa Excelência, desejamos seja franco, livre e aberto a toda a sociedade brasileira, pois só esta, em seu conjunto, poderá oferecer contribuições que permitam o desejado aprimoramento dos costumes políticos do País e o crescente desenvolvimento nacional. Peço-lhe que aceite, Excelência, as manifestações do mais alto apreço da ABI, bem como nossos votos de que sua missão chegue ao melhor resultado para o País, que não é outro senão o bem-estar do nosso povo. Cordialmente, FERNANDO SEGISMUNDO Presidente em exercício
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Jornal da ABI
O DISCURSO DE BARBOSA NO IMPEACHMENT Senhor Presidente e senhores República? Podíamos membros da Câmara dos Deputados, é com perguntar a ele aonde estava uma grande honra que me sinto aqui a sua assinatura nos cheques presente nessa tribuna. Eu, que sou homem que chegavam à secretária da mais da mesa de redação, mais habituado a Casa da Dinda. E, de certo, ele escrever do que propriamente a ocupar não o poderia fazer, não tribunas tão importantes como essa tribuna saberia fazer e até agora não da Câmara dos Deputados, mas represento compareceu à segunda de uma maneira a sociedade civil, estou aqui intimação, porque preferiu em nome da Associação Brasileira de tomar parte em uma regata na Imprensa, que tem na direção do seu Ilha de Fernando de Noronha, Conselho Administrativo a grande figura talvez por uma questão de de Mário Martins e entre seus membros, subconsciente, ignorando que juristas tão eminentes como Raimundo ali foi por muito tempo a sede Faoro e Clóvis Ramalhete. Eles é que me de um presídio político. Que valeram no exame do processo que iria foi um presídio político nos iniciar a ação promovida contra o Presidente tempos do presidente da República. Represento a sociedade civil Prudente de Moraes, mas que e, como meu companheiro Marcelo foi,por longo tempo, sob os Lavanére, não pertencemos a partido auspícios de Pernambuco, a político, não temos nenhum interesse de sede dos crimes comuns. Num natureza política, mas representamos a presídio que ali se organizava sociedade brasileira e achamos de nosso e que, de vez em quando, dever, toda vez que houver um pleito entre voltava a se transformar num a corrupção e a honestidade, achamos de presídio político. nosso dever tomar partido e reocupar as Éis porque senhores, posições que nos cabem em defesa da com o meu companheiro sociedade civil e, também, como Marcelo Lavanére, estamos conseqüência, em defesa do poder político aqui como representantes da do Brasil. sociedade civil, porque assim é que Lamento a idade em que estou, mas é recebemos o convite dos partidos políticos ela que me dá alento para vir me dirigir a que nos convidaram e é assim que estamos esse auditório da Câmara, com a tradição aqui diante da Câmara dos Deputados para de longos anos de vida nesta Casa. Se há dizer que se há um momento grave para a um momento em que cabe realmente um vida brasileira, é esse que temos de pronunciamento definitivo do poder apresentar ao Brasil. É essa a função que legislativo do Brasil, é essa a hora em que me traz nesse momento à Câmara dos nos encontramos e que temos diante de Deputados, quando a idade já me coloca nós a necessidade de reagir contra os em dúvida se eu poderei chegar a ter a glória “fernandos”, contra a ordidura de de ser uma presença centenária, porque já expedientes que têm constituído a ação estou com 95 anos, mas com 95 anos faço política do atual Presidente da República, questão de dizer que não admito a o que justifica de certo a apresentação do aposentadoria no serviço do Brasil. E é no processo de impeachment, porque, na serviço do Brasil que aqui estou presente, verdade, esse processo de impeachment neste momento, perante a Câmara dos não precisou de palavras, não se apoiou Deputados num processo de impeachment em necessidades retóricas, porque tem o que se baseia num levantamento de provas seu fundamento nos fatos, nos fatos que inumeráveis de uma exemplar comissão de foram apurados pela Comissão Parlamentar inquérito que apurou tudo que chegava ou de Inquérito. Que fazer com essa podia chegar ao seu conhecimento. E imensidade de cheques que se viam? Como ouviam todos os elementos que podiam explicar a presença de todos eles, quando dizerse alguma coisa em benefício ou em eles vieram exatamente para apoiar favor desse governo. Não omitiu nenhum despesas da casa do Presidente da depoimento. E se isso levanta agora a tese República, despesas das pessoas da sua de que há necessidade de mais provas , eu intimidade? Pessoas como a sua própria pergunto o que faziam aqueles dez ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ esposa, com os deputados que na trinta e oito milhões C o m i s s ã o de cruzeiros de PC Parlamentar de Farias, da sua exI n q u é r i t o mulher, dos seus cumpunham a filhos, através da representação do pensão que era paga p r e s i d e n t e através da sua exF e r n a n d o mulher, da sua Henrique? Eram dez genitora inteligente, senadores e enferma e em risco deputados que de vida até este estavam presentes. momento. E esses Podiam ter pedido os cheques que depoimentos que vinham, todos eles entendessem, as não tinham a diligências que assinatura do a c h a s s e m secretário do necessárias e, Presidente da entretanto, meus ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
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(Collor) preferiu tomar parte em uma regata na Ilha de Fernando de Noronha, talvez por uma questão de subconsciente, ignorando que ali foi por muito tempo um presídio
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Sou um homem de imprensa e represento aqui a imprensa brasileira, que tem na Associação Brasileira de Imprensa seu órgão máximo
senhores, em vez de exatamente se colocarem no exercício dessa função, o que chegava ao conhecimento deles não teve outra missão do que converter muitos desses dez representantes do governo em partidários da causa do impeachment. Aí está que na votação final, quando se falava de dez a doze, o que verificamos foi uma votação de dezesseis a cinco. E teria sido de dezessete a quatro se não tivessem afastado da comissão de inquérito um parlamentar honrado como é o José Múcio Monteiro , meu conterrâneo e meu velho amigo de Pernambuco. E será que esses dezessete a quatro na Comissão Parlamentar de Inquérito não dizem alguma coisa a todos os senhores deputados, a todo o Congresso Nacional, a todo o povo brasileiro? De onde vêm exatamente esse extraordinário movimento de rua que se nota por todo o Brasil ? Vêm exatamente das provas apresentadas e reunidas pela Comissão Parlamentar de Inquérito. E vêm sobretudo daquela multidão de cheques que foram lidos em parte pelo relator e depois pelo professor Maurício Côrrea. Eram tantos, tantos cheques, que a gente chegava a ter a impressão de um disco de vitrola com defeito que ficava sempre repetindo cheques e mais cheques , que não tinham termo e nem final nenhum. Senhores deputados, há muito estou afastado das lides advocatícias que em grande parte exerci. Sou um homem de imprensa e represento aqui a imprensa brasileira, a imprensa que tem na Associação Brasileira de Imprensa seu órgão máximo, como a mais antiga associação de imprensa de todo o Brasil, com uma tradição gloriosa porque resistiu a todos os desmandos e autoridades e não se intimidou diante de nenhuma ameaça e de nenhum perigo. É em nome desse jornalismo que eu aqui estou nesse momento para dizer, senhores deputados, que todos estamos convencidos de que as
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provas apresentadas são mais do que exuberantes, são todas contundentes, são provas que não podem deixar nenhuma possibilidade de resposta porque consistem em cheques, cheques que nunca chegaram a correr pelos responsáveis pelas despesas da Casa da Dinda, estas figuras estranhas, fantasmas que apareciam no momento como emitentes de cheques que eram devidamente descontados em bancos que não tinham o cuidado de exigir nem o CPF nem a carteira identidade desses fantasmas. Estou certo por isso de que este processo seguirá seu curso natural. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcelo Lavanére me sucederá nessa tribuna. Dirá os argumentos jurídicos que podem ser apresentados em contestação ao que aqui pudesse ser dito em defesa do Presidente da República. Mas o que me cabe aqui invocar apenas é a palavra do humilde, a palavra de um simples motorista, a palavra de um homem que, interpelado na Comissão de Inquérito pelo deputado que o procurava confundir, dizendo que ele estava traindo seus patrões, referiu-se serenamente e tranquilamente com essas palavras imortais : “Meu patrão é o Brasil!” . É isso que desejo nesse momento, que esse processo vá até o fim , não tenha outro papel do que os interesses supremos do Brasil no combate à corrupção e no combate à impunidade.
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A simples existência de uma lei sobre a imprensa já permite supor restrições ao livre exercício da profissão. Mas a defesa dos direitos do cidadão, especialmente quando todos concordam que não funciona bem o direito de resposta, faz crescer a polêmica na sociedade brasileira, contra e a favor de um projeto de lei em tramitação no Congresso
LIBERDADE DE IMPRENSA À LUZ DA LEGISLAÇÃO Luiz Maranhão Filho Quando um cidadão lusitano quis deixar a Corte e estabelecer-se no Recife com uma modesta prensa, a reação foi imediata, sob a forma de uma Carta Régia proibitiva. O registro histórico diz que a ocorrência é do ano de 1703, mas o historiador Pereira da Costa consigna o ano de 1706. A divergência é secundária, porque o procedimento se repetiu no Rio em 1747, com outro lusitano, Antonio Isidoro da Fonseca que foi instado a fazer a viagem de volta levando a sua tipografia, às próprias expensas. O que fica evidente é que o controle da informação no Brasil teve raízes coloniais. Os prelos eram uma ameaça em potencial, ao serem implantados nas colônias, visto que Lisboa teve sua primeira tipografia em 1487, anteriormente à sortida do almirante Cabral. Desde então, a colônia jamais desfrutou da sonhada “liberdade do pensamento e da informação”, tardiamente apregoada em 9 de fevereiro de 1967, no preâmbulo da Lei n°. 5.250, ainda em vigor, enquanto o Congresso promove a gestão de novo diploma legal. A Corte que aqui se instalou sob a égide de Dona Maria I, em debandada sob os tacões dos batalhões napoleônicos, trouxe na bagagem o espírito censório, logo revelado nos Avisos do Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, Rodrigo de Souza Coutinho, ao intimidar os da terra com a advertência de que “nada se imprima contra a religião, governo e costumes”. A censura teve a certidão de batismo datada de 24 de junho de 1808, alguns meses antes do surgimento de “A Gazeta do Rio de Janeiro” (10.09.1808), nascida com quase um século de atraso no Mundo Novo, posto que o México já fazia circular a sua “Gaceta” desde 1°. de junho de 1722. Vencer tal dependência foi o propósito de um pioneiro – Hipólito José da Costa Pereira Furtado de Mendonça – ao editar o “Correio Braziliense” no prelo de W. Lewis em Londres, pelo longo período de 6 de agosto de 1808 até dezembro de 1822, num total de 175 números, como forma de manifestar oposição aos métodos autocráticos, vigentes no país. Se a liberdade de Imprensa é uma batalha, esta foi, sem dúvida, a primeira trincheira, fonte inspiradora de toda a resistência que se seguiu. É uma história rica em que se inserem o “Typhis Pernambucano”, de Frei Joaquim do Amor Divino Caneca, as muitas “Sentinelas da Liberdade”, do médico baiano Cipriano Barata, culminando com a nossa maior casamata, erguida por Gustavo de Lacerda e que teve seu ápice na longa gestão de
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do Código Penal, chegou a admitir que o começo de tudo veio das Leis de Manu, ao exercer o controle do uso da palavra. O historiador Pedro Calmon, na sua consagrada “História do Brasil”, edição de 1959, à pág. 183, chegou a exaltar a postura imperial ao afirmar: “fez-se a Independência ao vozear dos jornais. Imprensa e liberalismo associam-se na elaboração política do Império”. Mas os fatos que se sucedem, as muitas sedições que pontuam o nosso evoluir como nação, não apagaram dos seus registros, os jornalistas que conheceram as masmorras. Veio a República com o manifesto de Quintino Bocayuva em 1870, criando, praticamente pela imprensa, o partido antimonarquista. E nessa república, veio o Estado Novo, veio o DIP – Departamento de Imprensa e Propaganda – e veio, enfim, a 30.11.1938, o temível Decreto-Lei 910 que, no seu intróito, continha o engodo: “esses trabalhadores intelectuais são merecedores do amparo do Estado”. O que o regime forte queria era cadastrar e registrar todos os profissionais da informação. Está no
Herbert Moses. O exercício de um controle sobre a informação jamais esteve ausente da legislação brasileira, por mais díspares que fossem os momentos de repressão ou de liberação. A censura esteve presente com Pedro de Alcântara, príncipe regente (o Decreto de 18.06.1822) e com o mesmo Pedro Imperador (Decreto de 22.11.1823). Esteve na Carta de Lei de 02.10.23, renovada em 20.09.1830, sem se ausentar dos códigos, quer seja o Código Criminal do Império (16.12.1830), quer seja o Código Penal da República (1890). Postura que chegou a ser mantida pela tão decantada Revolução de 30, através do Decreto 24.776, de 14.07.1934. É curioso notar que uma das formas de pressão universalmente conhecidas – a proibição de anonimato na imprensa – jamais deixou de figurar nas nossas Constituições, a partir da República: 1891, 1934, 1937, 1946, 1967 e 1988. A clandestinidade sempre ensejou, na ótica do poder, o instrumento da apreensão. O mestre Nelson Hungria, jurista de nomeada, nos comentários que fez em torno
artigo 14 o prazo de 120 dias para que todos comparecessem à repartição policial para preencher a sua ficha. Exalta-se aí a resistência da entidade. Veio uma prorrogação em cima da outra. (Decretos-Lei 1.341, de 12.06.39 e 1.574, de 08.09.39). Nada de registros, pois seria entregar uma categoria inteira a um fichamento policial, capaz de repetir a lei infame de outubro de 1932 que deportou do país, entre outros, Júlio de Mesquita, Líbero Badaró, Austregésilo de Ataíde. Sugeria o poder a criação de escolas, no artigo 17 do decreto censório. O ministro Gustavo Capanema chegou a apelar à A.B.I. para prestigiar a Faculdade Nacional de Filosofia que deveria abrigar o curso, caminho aberto para a ditadura do diploma. A resistência foi de Moses, diante dos apelos de Getúlio. Jamais o poder abandonou a postura de aliciamento, em torno dos homens de jornal. Tabelas foram criadas em 10.11.44, pelo Decreto-Lei 7.037. O parlamentarismo de 1962 trouxe o Decreto 1.177, o governo de João Goulart repetiu a postura pelo
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RESUMO COMENT ADO DAS LEIS DE IMPRENSA COMENTADO 18/05/1822 Lei de Imprensa das Cortes Portuguesas Decretou a liberação da imprensa, visando atingir a corrente mais democrática na pessoa do jornalista João Soares Lisboa. 22/11/1823 Lei de Imprensa da Assembléia Constituinte
20/09/1871 Lei da Reforma Judiciária A confusão reinante cessa nesse período. Heráclito Graça retorna ao tema na Câmara, com especificações dos responsáveis nos delitos de imprensa, mas a cidade do Rio de Janeiro os retirava da polícia e passava aos juizes de direito.
30/09/1830 Lei de Imprensa Liberdade de imprensa O aviso de 15 de janeiro de 1851 declarou nula esta lei A lei de 1830 estava em plena vigência (apesar da desobediência geral a alguns artigos), enquanto eram sancionadas leis com artigos relacionados à comunicação. a) Código Criminal 16/12/1830 b) Código do Processo Criminal, 29/ 11/1832 c) Ato Adicional de 1834 d) Em 18/03/1837 Feijó decretou melhor inteligência das disposições legais, em virtude do desordenado julgamento nos decretos de imprensa. e) O decreto de Feijó foi anulado pelo novo Regente, Araújo Lima, em 24/9/ 1837. ○
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12/11/1953 Lei de Imprensa 2.083 Votada a constituinte de 46, que garantia a livre manifestação do pensamento. Propiciou maiores condições de liberdade e responsabilidade, regulando a liberdade de Imprensa. O rádio passou a ser regido pela Lei 4.117 de 27 de agosto de 1962, Código Brasileiro de Telecomunicações, que consistia na equiparação à atividade do jornalista profissional a busca, a redação, a divulgação ou a promoção através da rádio difusão de notícias reportagem, comentários, debates e entrevistas.
03/12/1841 Lei de Imprensa Esta lei remetia para a polícia os delitos de pena até 100 mil réis. Os delitos de imprensa até aquela quantia não foram executados e a confusão que reinava na justiça, com relação à revogação ou não da Lei de 30 de setembro, continuou.
09/02/1967 Lei de Imprensa 5.250 Ato Institucional nº 2, de Castello Branco Esta lei condenava toda propaganda de guerra ou subversão da ordem ou de preconceitos de raça ou de classe. Batista Pereira apresentou a proposta de lei determinando que continuassem a ser da alçada das autoridades policiais os abusos da liberdade de imprensa cujo máximo de pena lhes coubessem.
14/07/1934 Lei de Imprensa 4.743 de Adolfo Gordo Inovou o direito de comunicação dando somente à brasileiros o controle total das empresas. Esta lei atuava em conjunto com o DIP criado pelo decreto lei 1.915 de 27/12/ 1939, que fazia o controle administrativo e político e tentava fazer a vendagem do Estado Novo e do ditador nos veículos de comunicação (quando foi criada a Hora do Brasil, hoje a Voz do Brasil).
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Decreto 53.263/63, os anos de chumbo foram pródigos em legislar para a imprensa: Lei 972/69, Decretos 65.912/69, 68.629/71, 5.696/71. Mas a trincheira respondia a todos com o artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos: “Todo homem tem direito à liberdade de opinião e expressão”. Interessante é que, em 1824, a Carta Magna, de feitura imperial, muito se aproximava do ideal universal: “Todos podem comunicar os seus pensamentos, por palavras e escritos, e publicá-los pela Imprensa, sem dependência de censura; contato que hajam de responder pelos abusos que cometerem no exercício deste Direito, nos casos e pela forma que a Lei determinar”. É o texto da Constituição Imperial em seu artigo 179, inciso IV. “Ao estatuir a liberdade e exteriorização do pensamento, em 1824, o Imperador do Brasil não fez mais do que consagrar um princípio que estava contido nas Ordenações de 1603. Afinal, a colônia cumpria peças de um sistema jurídico do próprio Reino; Aqui não se criou a imprensa nem a profissão de jornalista” (Legislação e Comunicação – Direito da Comunicação – Editora LTR – São Paulo – 1995 – Luiz Maranhão Filho – Pág. 26). Da mesma forma, ao debater e votar o substitutivo ao Projeto de Lei n°. 3.232, de 1992, relatado pelo deputado Vilmar Rocha, a Comissão de Constituição e Justiça e de Redação do Congresso Nacional não está criando a imprensa nem a profissão de jornalista. Está – ou deveria estar – revogando um diploma eivado do ranço do regime autoritário que ainda
críticos. É bom que venham à lume tais dispositivos, como por exemplo, o seu artigo 2°.: “É vedada a apreensão de jornal ou revista e a suspensão de transmissões de rádio e televisão, salvo publicações não identificadas, transmissões anônimas e situações previstas na Lei n°. 8.069, de 13 de junho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente”. O legislador vinculou o ato a uma ordem judicial e à análise do Ministério Público. É postura nova em relação ao arbítrio que sempre se praticou. Da mesma forma, há inovação no capítulo da responsabilidade civil, prescrita no artigo 4°.: “É assegurado direito de indenização por dano material ou moral, inclusive à imagem, a todas as pessoas, físicas ou jurídicas, atingidas por publicação ou transmissão, devendo a ação ser proposta no prazo de seis meses, contados da data da publicação, sob pena de decadência”. Ninguém quer uma imprensa irresponsável. Trata-se de uma possibilidade de apuração de culpa ou dolo, de primariedade ou reincidência, considerando-se, inclusive, a capacidade financeira do ofensor. No momento em que um texto legal se propõe a medir a extensão do prejuízo à imagem do ofendido, abremse os horizontes para uma indenização justa às vítimas de pessoas inidôneas que ocupam espaços nos meios de comunicação, violentando a ética, a conduta reta e a verdadeira missão do jornalismo. O que se propõe é a aplicação consciente do Código Civil vigente, onde
O texto em discussão contém posturas que devem representar bandeiras de luta para os profissionais agregados a entidades do porte da ABI ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
vigora, a Lei 5.250, para colocar no seu lugar, um instrumento democrático que é requerido pela atual Constituição. “O ideal seria que não houvesse uma lei de imprensa”, já se disse em inúmeras oportunidades, como uma loa de exaltação à liberdade. Mas, conforme acentuou em suas obras e pronunciamentos, o saudoso jornalista, professor e parlamentar, José de Freitas Nobre, uma vez que os constituintes remeteram a uma lei ordinária o exercício do jornalismo, que se crie um texto democrático, fiel à prática responsável e ética do direito da informação. O texto em discussão, sofrido, procrastinado e remendado, contém posturas que devem representar bandeiras de luta para os profissionais agregados a entidades do porte da ABI. Muito se tem dito e comentado sobre uma lei futura que, em muitos casos, é desconhecida pelos
se prescrevem punições para a calúnia, a injúria e a difamação. Haverá quem se insurja contra a penalização de quem injuria a memória de pessoa morta? (art. 8°. inciso IV). Ou quem abala o conceito e o crédito de pessoa jurídica? (inciso V). Ou quem viola indevidamente a intimidade ou a vida privada de alguém? (inciso VII). É evidente que a desinformação ou a deturpação do texto em análise poderá escamotear do comentário a previsão de redução de pena nos casos em que esta puder causar ao condenado e a sua família privações de caráter alimentar. É uma lei moderna que aborda o direito de assinatura do profissional, que mantém o sigilo da fonte, que resguarda a charge, que assegura a prova da verdade, não se admitindo a sua limitação sob nenhum fundamento. O direito de resposta é regulamentado em seus detalhes, a pluralidade de versões é exigida. Se o desejo de todos os profissionais é exercer, na plenitude, a liberdade de expressão, que isto seja feito, à luz de legislação constitucional. Que não se revele temor à lei, porque as leis são feitas para o cidadão. Só assim poderemos proclamar, como o fez Cipriano Barata, que constituímos, nos dias de hoje, a “Sentinela da Liberdade na Esplanada do Castelo”. Luis Maranhão Filho é jornalista e professor de Ética e Legislação do Jornalismo, na Universidade Federal de Pernambuco.
ANUNCIO 1/2 ABEN
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Jornal da ABI
DENTRE 44.865 LEIS DO REGIME MILITAR, AINDA SOBREVIVE A LEI DE IMPRENSA DE 67 Barbosa Lima Sobrinho em várias oportunidades tem repetido que fica assustado quando se fala em modificações da Lei de Imprensa: “Minha experiência demonstra que, toda vez que se fala em modificação, não é para melhorar ou conceder maiores liberdades e garantir o direito do público de ser informado mas, ao contrário, para agravar os castigos e facilitar a reação do governo contra a imprensa”. Os sistemas autoritários tratam de subjugar a imprensa, recorrendo a disposição administrativas e disciplinares que, na maioria das vezes, ultrapassam os princípios gerais do Direito. O jurista Nelson Hungria resalta: “Liberdade de Imprensa é o direito de livre manifestação do pensamento pela imprensa; mas, como todo o direito, tem o seu limite lógico na fronteira dos direitos alheios. A ordem jurídica não pode deixar de ser um equilíbrio de interesses: não é possível uma colisão de direitos, autenticamente tais. O exercício de um direito degenera em abuso, e torna-se atividade anti-jurídica quando invade a órbita de gravitação do direito alheio. Em quase todo o mundo civilizado, a imprensa, pela relevância das idéias e opiniões, tem sido objeto de regulamentação especial”. É bem certo que, de todas as liberdades, a de imprensa é mais necessária e a mais notável. Segundo Rui Barbosa, desde que ela não ultrapasse a do cidadão, pois não pode haver liberdade excessiva a uns em detrimento de outros, gerando o desequilíbrio ao princípio de isonomia. Os abusos de imprensa são punidos pelo nosso Código Penal e pelas leis gerais do país, como o de incitação ao crime, calúnias, difamação, injúria, constrangimento ilegal, extorsão ou chantagem. A Constituição Federal assegura a livre manifestação de pensamento de convicção política ou filosófica, bem como a prestação de informação por meio de publicação de livros, de jornais e de periódicos. Porém, as liberdades de critíca, de manifestação e de expressão não estão dissociadas dos direitos inerentes à
Valdenizio Petrolli Associação Brasileira de Imprensa está completanto 90 anos de existência como um símbolo de defesa da liberdade de pensamento e de expressão. Durante nove décadas vem atuando na defesa do regime democrático e da liberdade de imprensa. A liberdade de imprensa tem suas limitações em muitos países, principalmente nos latino-americanos, nos quais persistem os mecanismos tradicionais de manutenção do poder, com o Estado utilizando-se, com maior ou menor eficiência, de instrumentos para o controle dos meios de comunicação social. A situação da imprensa brasileira não difere de contexto mundial. No transcorrer de sua história tem registrado momentos amargos e de triste recordações, como o malfadado DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) que, durante o Estado Novo, acumulou a imprensa de louvações oficiais; ou ainda, nos dias difícies da década de 1968, quando a censura no tocante aos assuntos políticos-institucionais foi violenta e arbitrária. A atual Lei de Imprensa é de 1967, é um dos últimos textos de conteúdo ditatorial ainda em vigor, entre os 44.865 documentos legais baixados aos 21 anos militar. Um novo projeto de Lei de Imprensa que substituirá o texto atualmente em vigor, já está sendo debatido na Câmara Federal. Uma das principais inovações introduzidas por esse substitutivo, é o fim da pena de prisão para os crimes de injúria, calúnia e difamação nos jornais, rádios e televisão. Em seu lugar, o projeto adota a pena pecuniária a empresa a o autor da matéria considerada ofensiva, ou seja, o pagamento de multa no valor de até 20% do faturamento anual da empresa. Esse limite é acrescido em 50%, levando-se em consideração o faturamento da empresa. Se esse projeto de lei for aprovado, volta-se à censura prévia de ordem econômica, ao mesmo tempo que pode incentivar a indústria das indenizações, porque qualquer um pode se dizer ofendido e requer a reparação por danos morais, visando apenas o dinheiro. É bom lembrar que com a Constituição Federal de 88, o número de processos por danos morais aumentou. Até então, das ações sofridas pelas empresas e jornalistas, 85% eram criminais e 25 civis. Agora, essa situação inverteu-se e pode-se agravar ainda mais com a nova Lei de Imprensa, se aprovada. Há profissionais da comunicação que defedem a revogação pura e simples da Lei de Imprensa, entendendo que a legislação atual, ordinária, é suficiente para proteger os direitos dos cidadãos e da comunidade contra eventuais excessos. Outros acham acentuado risco remeter ao Código Penal delitos de imprensa que muitas vezes são mais políticos do que propriamente criminais. ○
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Especial 90 anos
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personalidade humana. Assim, o comunicador social não pode transcender os limites de sua esfera de ação para ferir a honra dos indivíduos e sua privacidade. E, quando isso ocorre, está no direito de qualquer cidadão repetir, pelos meios legais, a menor ofensa à sua dignidade. Porém, os crimes definidos como calúnias, difamação e injúrias, previstos no Código Penal, são muito polêmicos, pela dificuldade de se definir objetivamente o que pode ser realmente considerado “fato ofensivo à reputação” de uma pessoa. Portanto, esses crimes contra a honra de redação e interpretação discutível permite o arbítrio, ficando a critério do julgador o enquadramento de comunicadores nesses artigos e restringindo ainda mais a liberdade de imprensa, por um lado, ou prejudicando o ofendido em sua defesa, em outro. Os delitos mal caracterizados e de
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Se esse projeto for aprovado pode incentivar a indústria das indenizaçòes, porque qualquer um pode se dizer ofendido e requer a reparação por danos morais, visando apenas o dinheiro. Com a Constituição de 88, o número de processos por danos morais aumentou. Até então, das ações sofridas pelas empresas e jornalistas, 85% eram criminais e 25 civis. Agora, a situação inverteu-se e pode-se agravar ainda mais se for aprovada a nova Lei de Imprensa ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
vaga definição tornam-se flexíveis o suficiente para enquadrar ou não qualquer cidadão, ou intimidando-o com duras penas. A liberdade de imprensa é o direito de permitir a todo os cidadão a livre comunicação entre seus semelhantes, através dos meios disponíveis, sem a necessidade de censura prévia ou de outros mecanismos de pressões e coerção que prejudiquem, na sua essência, a verdade e as aspirações populares. A liberdade de imprensa é a liberdade de informação e de expressão, sem que haja desvio para os caminhos dos interesses de grupo dominantes ou dos que aspiram à sua participação nesse setor. A imprensa é responsável pela manutenção da democracia, informando com objetivo e criticando com imparcialidade, servindo de canal para debate livre e para a formação de opinião pública. A liberdade de expressão é um direito fundamental do homem de agir dentro de uma sociedade organizada e democrática,
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Os sistemas autoritários tratam de subjugar a imprensa, recorrendo a disposição administrativas e disciplinares que, na maioria das vezes, ultrapassam os princípios gerais do Direito ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
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sem que seja coagido por ideologias políticas, econômicas, religiosas ou raciais. Dentro dessa órbita de liberdadedemocracia-comunidade situa-se a imprensa como meio de fecundar a consciência e dos direitos nela consignados. O homem tem o direito de informar e ser informado com o objetivo de orientar o desenvolvimento social da comunidade em que ele vive, em seu conjunto. A respeito desse assunto escreveu o historiador e político inglês. Thomas Bablgton Macauly (in História da Inglaterra) no século passado, que a momentosa questão de princípio sobre a liberdade de imprensa é, no seu todo, uma benção ou uma maldição para a sociedade. O famoso comediógrafo, Richard Brinsley Sheridan (1751-1816), autor da peça A Escola de Escândalos, escreveu: Dê-me só
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a liberdade de imprensa e eu darei ao ministro uma Câmara de Lordes venal.. e uma Câmara dos Comuns subserviente... Eu lhe darei todo o poder que o cargo lhe pode conferir para obter a submissão e intimidar a oposição. E, no entanto, armado com a liberdade de imprensa... atacarei o poderoso sistema que ele contribuiu... o enterrarei entre as ruínas dos abusos que pretendeu proteger. A censura da imprensa morreu de velhice e de abandono na Inglaterra com o aparecimento do sistema bipartite, depois da Revolução de 1688, com a separação entre a Coroa e o Parlamento. Cada lado, há mais de 300 anos, procura proteger seus membros, portavozes, oradores, jornalistas e a imprensa conservadora, liberal e sensacionalista.
Valdenizio Petrolli, jornalista e advogado, é professor de Legislação e Ética do Radialismo da UMESP Universidade Metodista de São Paulo.
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A IRRELEVÂNCIA DA LEI, NO MERCOSUL OU EM QUALQUER OUTRO LUGAR DESTE PLANETA públicos à censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2” ? Sim, responderia um leitor desatento. Complicado, diria o que fosse até o inciso 2, e lesse o seguinte: “O exercício do direito previsto no inciso precedente (liberdade de expressão e opinião)2 não pode estar sujeito à censura prévia, mas as responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei e ser necessárias para assegurar: (...) b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde e moral públicas. Os jornalistas mercosulinos acumulam más recordações do que a ordem, a moral e a saúde públicas podem significar, de acordo com o contexto. Contradições dessa natureza podem ser encontradas em outras Constituições, como a brasileira. Ao tratar dos direitos e deveres individuais , no primeiro capítulo do Artigo 5º, define, no inciso XXXIII, que “todos têm direito a receber dos órgãos públicos , informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo e geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado”. À primeira vista o texto indicaria um dispositivo integrante do direito à comunicação, o de acesso à informação, significando que o jornalista tem direito de receber, dos órgãos públicos, os dados necessários para o cumprimento de sua missão de informar. No entanto, sob inspiração do jurista argentino, Damian Loretti , ao analisar o Artigo 43 da Constituição de seu país, o texto apenas tangencia o direito mencionado. Primeiro
Juçara Brittes Não se trata de heresia. Apenas de direito. O de comunicar - cujo conceito, de escassa difusão entre os jornalistas, encerra tão expressiva gama de prerrogativas, que remete a indispensável liberdade de imprensa a um âmbito secundário na hierarquia dos direitos universais da humanidade. A liberdade de imprensa, tomada em seu aspecto conceitual, fica em segundo plano, não resolve a questão. Sua existência, consagrada por todas as Constituições Federais dos países componentes do Mercosul, não garante (para citar-se aleatoriamente alguns dos pressuposto indissociável do direito à comunicação) a ausência de censura, a liberdade de expressão, ou a de opinião. Não associa, por exemplo, o direito ao sigilo da fonte de informação jornalística, ou o de resposta, ou o pluralismo informativo ao estado de bem-estar que tais elementos propiciam aos cidadãos. E com tais dispositivos legais, que a adoção do direito à comunicação garantiria, nenhum Estado-Parte do Mercosul pode contar, na sua totalidade. A busca de liberdades e direitos responde à necessidade emancipatória dos seres dentro do emaranhado de relações que são criadas no ambiente social. E por tratar-se de procura, de caminho traçado, avança, ainda que retroceda de acordo com as regras estabelecidas em dado momento do jogo. Assim ocorre com a liberdade de imprensa. Se em determinado contexto histórico correspondeu à mais alta aspiração que o indivíduo pudesse almejar - hoje, publicar fatos, idéias e opiniões, por qualquer meio de comunicação, independente do suporte tecnológicos adotado para tal fim, é muito pouco. Não é suficiente porque uma leitura atenta às Constituições vigentes1 no Brasil, na Argentina, no Uruguai e no Paraguai mostra que sim, a liberdade de imprensa está prevista, na qualidade de direito inalienável de todos os cidadãos. No entanto, apenas o Paraguai prevê, por exemplo, a independência dos meios de comunicação, o acesso e o sigilo da fonte de informação, o direito autoral, o acesso à informação verdadeira e o direito de resposta na mesma ordem de importância que a liberdade de opinião e de expressão. Tais direitos e liberdades, ou não estão previstos, ou são apenas tangenciados pelas nações em pauta. (veja quadro) É possível entender que um país, no caso a Argentina, rechace plenamente a censura quando escreve, em seu texto constitucional, que “... a lei pode submeter os espetáculos
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porque, de forma como é redigido, depende da interpretação de juizes, que podem considerar determinadas informações como sigilosas ou não. Pode, ainda , tratar-se do recurso de “habeas data”, uma forma especial de solicitar amparo legal contra violações de direitos reconhecidos pela constituição.
aparição dos meios de comunicação de massa e a proclamação, pela comunidade universal, do direito do homem à informação. Em um prazo relativamente breve, o pleno desenvolvimento de instrumentos tecnológicos mais complexos trará consigo a formulação de um novo direito: o direito do indivíduo à comunicação”. Mas o que tem este direito de tão especial ? Constitui o elo aglutinador de uma série de direitos, liberdades e deveres envolvendo os indivíduos em sua esfera comunitária, no âmbito da comunicação social. Encerra relações hierárquicas entre direitos e liberdades, cujo núcleo é fundado pelos princípios universais da liberdade de opinião, de expressão e de informação , todas elas adstritas ao direito individual de proteção à honra e à intimidade. Destes derivam-se direitos secundários, ou manifestações práticas das prerrogativas anteriores: liberdade de imprensa, ausência de censura e independência dos meios de comunicação social. A soma de uns e outros engendra uma série de faculdades aos atores situados em dada comunidade, as quais diferem conforme o papel que desempenhem cidadãos, profissionais, empresários, governantes... E tem mais. A existência de mecanismos legais, garantidores dos componentes do direito à comunicação é essencial. São modalidades de mediação, equilíbrio e contrapesos para guiar a ação do Estado. Delimitar o campo de movimentação do poder público e dos cidadãos . São dispositivos diferentes daqueles existentes na maioria dos países do Mercosul. São contrários à submissão de todas as liberdades ao “interesse da nação”, “às razões de Estado”, sem esclarecer o que querem dizer com isso. Estes, ao contrário, são fissuras nas Constituições Federais por onde podem escorrer todos os avanços no sentido da liberdade e da emancipação. O quadro demonstrativo que acompanha este artigo exibe uma síntese do conteúdo do Direito à Comunicação e indica quais, de seus componentes, são adotados pelos países do Mercosul. Salvo o Paraguai, as Constituições não se pautam por ele. O fato mostra os diferentes graus de democracia pactuados entre as nações e suas populações, tendo como paradigma o conceito do direito à comunicação.
Direito à comunicação O conceito de direito à comunicação resulta de uma evolução histórica que se internacionaliza a partir da proclamação da liberdade de expressão e de opinião pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. O Artigo XIX do documento determina que as liberdades referidas incluem a de receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independente de fronteiras. As implicações e as complexidades das noções contidas nestas determinações geraram e continuam suscitando polêmicas de difícil resolução, tendo a UNESCO como principal promotora dos debates desde a época de 40. A instituição indica , em diversos fóruns constituídos para tratar do assunto, o direito à comunicação como ideal a ser perseguido tanto pelas comunidades nacionais quanto internacionais, na esfera da comunicação . Entende que seu conceito se sobrepõe aos demais, por abarcar maior gama de princípios e encontrar-se em consonância com as mudanças estruturais aportadas pelas tecnologias recentes.Jean d’Arcy, citado por Desmond Fischer em “The Right of Man to Communicate: A Philosophical Framework for the Debate” esclarece: “Foram necessários trezentos anos entre o inverno de Gutemberg e o reconhecimento do direito correspondente a este, a liberdade de imprensa. Não passaram mais do que trinta anos entre a
AS CONSTITUIÇÕES E O DIREITO À COMUNICAÇÃO Prerrogativas nucleares liberdadedeopinião liberdadedeexpressão direitoàinformação direitoàhonraeaintimidade secundárias liberdadedeimprensa inexistênciadecensura independênciadosmeiosde comunicação FACULDADES profissionais acessoàfonte sigilodafonte direitoautoral cláusuladeconsciência cidadãos acessoàinformaçãoverdadeira pluralismoinformativo direitoderesposta poderpúblico administraçãoaberta insumostécnicos ○
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Megarregião Situação ainda mais controvertida ocorre no âmbito da megarregião, ou seja, no interior do bloco econômico. Um tema de tamanha importância como a comunicação, seja para a integração econômica, seja por suas implicações para as identidades locais colocadas em situação inusitada em vista da ordem maior da globalização , é tratada de forma periférica e fragmentada . O assunto não aparece em nenhum dos Tratados constitutivos do mercado comum. Só é
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Jornal da ABI
O DIREITO DE RESPOSTA: UMA QUESTÃO ÉTICA OU DE VONTADE?
agendado em 1995, quando da formação do Subgrupo de Trabalho número um SGT1 - comunicações. Tem função essencialmente técnica, como demonstram o estudo de suas pautas negociadoras. Em 1996 é retomado, com a instalação da reunião Especializada de Comunicação Social. A função aqui é de Assessoria de Imprensa, mantendo a circulação da informação entre os países em uma única direção – das instâncias decisórias para leitores de jornais e revistas, ouvintes de rádios, espectadores de TV e navegadores da Internet. Mesmo assim com uma periodicidade inquestionável. Em 97, data da realização da pesquisa que deu origem a este artigo, os dados na Internet estavam com um ano de atraso e só havia títulos anunciando os assuntos debatidos. A comunicação surge , tratada com um pouco mais de lucidez, em seu cruzamento com a cultura, por meio de intenções da Reunião Especializada de Ministros de Cultura dos quatro países. Prevê o ensino do espanhol e do português nas escolas da megarregião, questões sobre o patrim6onio histórico, criação de símbolos que traduzam a preocupação com uma identidade visual, entre outras iniciativas. Mas fica por aí,sem contemplar a questão dos fluxos informativos, as relações de trabalho para o segmento, códigos de ética, ou instâncias onde o receptor “comum”, o titular último das conseqüências da integração, possam se expressar. Apenas uma parcela muito privilegiada da sociedade tem assento às instâncias deliberativas do Mercosul. Os governos, seus fumcionários de confiança e os empresários, apesar da existência do Fórum Consultivo Econômico e Social, entre os órgãos decisórios. Este, por força de tratado, dá assento a sociedade civil, que pode encaminhar sugestões, mas não vota. Para se ter notícias sobre a liberdade de imprensa basta analisar o veículo impresso porta voz do Mercosul _ a Gazeta Mercantil Latino-Americana. É o único jornal de circulação expressiva na região, editado nas duas línguas predominantes, esquecendo o guarani, falado pela maior parte da população paraguaia. Mas ele só trata de negócios. De grande negócios. Pode ser que exemplifique a existência de liberdade de imprensa, já que os textos são bem-construídos , as reportagens são amplas , cheias de informações e críticas. Mas onde fica o direito à comunicação. Há quem ande perguntando por ele e se empenhando por sua concretização . Nos mesmos lugares onde a questão foi tantas vezes formulada em décadas passadas, quando de tentativas de integração já abortadas. Nas universidades, nos fóruns constituídos por profissionais de comunicação, nas associações do porte de uma ABI.
O direito de resposta, de importância às vezes vital para os cidadãos, nem por isso é correspondido pelas empresas de comunicação social. Qualquer pessoa natural ou jurídica, atingida por menção caluniosa, difamatória, injuriosa ou errônea, inexata, desnaturalizada feita em jornal ou transmissão de radiodifusão, tem o direito de exigir imediata resposta ou retificação, guardadas as devidas proporções. É um direito natural do indivíduo. Lembra Terrou que “pode ser exercido mesmo que o artigo não contenha nenhuma inexatidão ou imputação difamatória. Aquele que o exerce ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ é o único juiz da utilidade de forma e do teor da resposta, que não pode ser recusada a não ser que seja contrária ao legítimo interesse de terceiro ou à honra do jornalista”. Apesar de todo um capítulo dedicado ao Direito de Resposta existente na atual Lei de Imprensa, a publicação da ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ retificação ou resposta, de forma imediata e capaz de aclarar situações ou de reduzir algum enfoque ao tamanho que deve ter, fica mais na dependência da vontade e/ou princípios morais dos diretores dos meios de comunicação do que da eficácia da lei. O governador do Rio de Janeiro Leonel Brizola em 1994, conseguiu fazer valer o seu direito de resposta no Jornal Nacional da TV Globo, depois de 2 anos, 1 mês e 9 dias de disputa judicial. A nota de desagravo em seu favor foi lida no dia 15/3/94, em resposta a trecho de um editorial lido no dia 6/2/92, quando Brizola foi chamado de “senil, bajulador e paranóico”. Pela primeira vez uma rede nacional de televisão foi obrigada a conceder direito de resposta a alguém, vítima de comentários ofensivos ou de falsidade de informação. O rito processual da lei de Imprensa é sumaríssimo, mas permite recursos ao Tribunal de Alçada Criminal e, deste, para o Superior Tribunal Federal. O teor da resposta ou retificação pode dar causa a muita discussão judicial. Existem mecanismos utilizados pelo advogado para protelar ou criar embaraços ao andamento do processo ajuizado. Teme-se pelo sucesso daqueles que se esforçam no sentido de fortalecer o exercício desse instituto na nova Lei de Imprensa. Processo mais sumário do que é hoje não será possível. Mesmo tirando-se o efeito suspensivo das apelações. Sempre haverá a possibilidade de liminares em instâncias superiores. O direito de resposta tem um objeto ético. A preocupação de lutar contra as
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as queixas) em todas as redações. Infelizmente frustraram-se as tentativas de institucionalizar a figura do ombudsman no Brasil, pelo que se percebe do texto do substitutivo ao projeto da nova Lei de Imprensa. Talvez fosse esse o agente capaz de assegurar o acesso ao meio de comunicação de um maior número de membros de uma comunidade. Barbosa Lima Sobrinho faz sérias restrições ao direito de resposta “concedido com largueza”. Vale-se de uma crítica de Prunet sobre o instituto: “uma verdadeira expropriação, uma ofensa direta à propriedade, permitindo a quem quer que seja agir como dono da casa alheia e usar e abusar disso até algumas vezes imprudentemente”. Mais uma razão para torná-lo autoaplicável pelos meios de comunicação e sob intermediação de um ombudsman. A própria lei prevê a hipótese de “retratação espontânea”. Se o jornal toma a iniciativa de corrigir a falsidade, evita a ação penal por injúria, difamação ou calúnia. No início do século os jornais brasileiros adotavam a “Errata”, como forma de remediar suas falhas de informação, erros de grafia e até de conceito. Pena que essa seção, embora sempre escondida nos cantos menos lidos, tivesse acabado. Foi revivida nos anos 70 com outras denominações: “Veja errou”. “Correção” (Jornal do Brasil): “Erramos” (Folha de S. Paulo). Mesmo assim continuam escondidas e parcimoniosas nas explicações. Nos Estados Unidos os editores já aprenderam que essas seções, além de muito lidas melhoram a credibilidade
A publicação da retificação ou resposta fica mais na dependência da vontade e/ou princípios morais dos diretores dos meios de comunicação
Juçara Brittes é professora de comunicação na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), mestre em comunicação social pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), jornalista
Especial 90 anos
falsas informações não é nova. Théophraste Renaudot, considerado pai do jornalismo francês, já declarava no primeiro número de sua La Gazette, em 30 de maio de 1635: “Os que possivelmente se escandalizavam com duas ou três notícias falsas que não foram dadas como verdadeiras, são convidados a expor ao público, com a minha pena (que para esse fim lhes ofereço) as novidades que acreditarem mais verdadeiras e como tal mais dignas de publicidade” (in O problema da imprensa, de Barbosa Lima Sobrinho). O direito de retificação ou resposta nasceu como uma conseqüência imediata do exercício da liberdade de expressão. Os cidadãos e especialmente os ○ ○ ○ ○ ○ ○ jornalistas podem informar, comentar ou criticar praticamente sobre qualquer assunto mas são responsáveis pela, conseqüência dos seus atos. O jornalista também pode se equivocar. E tem o direito de ser corrigido, ante o erro cometido no esforço de oferecer ao público, a todo momento, a informação ○ ○ ○ ○ ○ ○ ágil, oportuna, fresca e equilibrada que todos nós desejamos para ir formando um critério pessoal, que engrossará a Opinião Pública necessária em toda democracia. A razão humana firmou esse princípio como necessário à vida civilizada. A resposta se faz mais imperativa ainda no plano da comunicação pública, quando uma instituição tem o poder de falar a todos. A mídia brasileira parece ter grande ojeriza ao direito de resposta, tentando, por todos os meios não admití-lo, nem de direito nem de fato. Na verdade deveria ser autoaplicável, sem necessidade de imposição legal, como já acontece em muitos países. O Conselho de Imprensa da Austrália, por exemplo, reconhece que a liberdade de imprensa é importante mais por causa das obrigações de informar bem o público de que dos direitos que a ela são atribuídos “O jornal deve dar oportunidade para resposta imediata, com o destaque apropriado e com razoável espaço, sempre que a equanimidade o exigir”- diz a Declaração de Princípios do Conselho que acolhe a examina as reclamações dos leitores. O órgão torna públicas suas censuras aos meios que agem em desacordo com seus princípios éticos. Durante o governo Tatcher a Inglaterra iniciou uma discussão para implantação de dispositivos legais a fim de garantir ao público direito imediato de réplica ou/e retratação. Antecipando-se à lei, as empresas de comunicação britânicas decidiram criar o seu próprio código de ética que implantou ou ombudsman (representantes dos leitores para lidar com
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Leonel Brizola, em 1994, conseguiu fazer valer o seu direito de resposta no Jornal Nacional da TV Globo, depois de 2 anos, 1 mês e 9 dias de disputa judicial ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
do veiculo. Leitores mais atentos costumam mensuara seriedade do jornal que lêem, pelo padrão de respostas para informações publicas erroneamente. A sistematização para diminuir erros técnicos, de informação e desvios éticos, é a grande preocupação da imprensa moderna. Não se trata de prurido morais mas de estratégia de marketing. A lista de correções publicas diariamente na página 2 do The New York Times é tão minuciosa que já se transformou num cult para os seus leitores. Nos Estados Unidos as publicações ampliaram as seções de Carta do Leitor, instituídas, justamente para preencher a lacuna legal relativa ao direito de resposta. As pesquisas revelam que se trata de seção muito lida pelo público. No Brasil, comentários em forma de tréplica do tipo “N.R. O jornal mantém as informações ○
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NO PROJETO, O CÉU NÃO É O LIMITE
divulgadas”, somente avivam as querelas. Anulam o potencial da seção de resolver eventuais conflitos com o leitor e de prevenir o efetivo exercício da resposta pelo ofendido. Ao propor a obrigatoriedade de versões simultâneas o projeto da nova Lei de Imprensa democratiza o debate. “A pluralidade de versões está respaldada pela ética mínima na medida em que as pessoas não podem ouvir todos os jornais, nem ouvir todos os programas de noticias”, observou o professor José Carlos Rocha. Guarda o sentido de que os veículos devem prestar a informação completa, ouvindo todas as pessoas diretamente envolvidas. Ao incorporar sempre os lados contraditórios, a invocação do direito de resposta torna-se desnecessária. Habermas conceituava que todo campo de atividade de comunicação pública, e de modo especial, do jornalismo, é constituído a partir de relações de comunicação, se mantém através de relações de comunicação e se destina à atualização do processo da comunicação social. Tais conceitos se chocam com a realidade brasileira quando sabemos que nos nossos 50 anos de televisão só conhecemos uma resposta publicada. Somente a ética é capaz de alcançar o que a lei não dá conta. Renaudot já se apercebera disso, 363 anos atrás.
incapaz de disciplinar a matéria, mesmo porque a sua orientação é em sentido contrário, uma vez que foi inspirada na Doutrina de Segurança Nacional e veio justamente para conter a liberdade de imprensa. É quando torna-se ainda mais imperioso a edição de uma lei nova, atualizada e de acordo com esses tempos democráticos, sob pena de continuarmos vivendo sob a égide eterna de um conflito
Vilmar Rocha O legislador constituinte soube com muita propriedade consagrar o conceito de liberdade na Carta de 88. No que se refere à manifestação do pensamento nos veículos de comunicação houve a adoção do postulado como um princípio, sendo vedada qualquer espécie de censura. A consolidação desses parâmetros tem contribuído sobremaneira para aperfeiçoar as relações institucionais brasileiras, particularmente aperfeiçoando as regras, os usos e costumes da convivência democrática. Mas ainda falta um diploma infraconstitucional que desenvolva o pensamento do constituinte tendo em vista os direitos fundamentais da cidadania e a liberdade de expressão. O meu projeto de lei de imprensa, já aprovado na Comissão de Constituição e Justiça, procurou equilibrar exatamente esses postulados: de um lado amplia o sentido da liberdade de expressão e de outro cria freios e contrapesos para que sejam garantidas as prerrogativas do cidadão concernentes à honra e a privacidade. É preciso que se entenda que o Brasil precisa de uma lei que consagre o sentido amplo da liberdade de imprensa, mas que, ao mesmo tempo, sirva de um referencial ético para a conduta jornalística, já que hoje há desproporção descomunal entre o poder da mídia e o cidadão comum. A atual lei de Imprensa, de 1967, é
Zarcillo Rodrigues Barbosa é jornalista e professor do Departamento de Comunicação da UNESP/Campus de Bauru
gira em torno da não fixação do teto indenizatório. O projeto segue o que preconiza o Código Civil, estabelecendo como princípio a proporcionalidade da indenização à medida do agravo ou da ofensa . Preconizo, no projeto, postulados claros para o magistrado dose a reparação material ou moral conforme a razoabilidade e a proporcionalidade. Postulados, estes, vetoriais do sistema jurídico e também consagrado na Constituição de 1988. Há um equívoco quanto ao projeto sob o argumento falacioso de que a minha proposta estabelece o céu como limite indenizatório. A recomposição pecuniária. Não é verdade, uma vez que a matéria estabelece os critérios que devem ser seguidos para a reparação de um dano advindo do exercício da liberdade de imprensa, É preciso que fique claro que não há novidade alguma nesses critérios, pois a regra em matéria de reparação civil no direito brasileiro caminha por aí e aonde há leis especiais estabelecendo quantum indenizatório as injustiças são flagrantes. Uma vez aprovada a lei conforme está sendo proposto, empresas e profissionais de imprensa serão regidos por um diploma que garante a liberdade de comunicação, mas cuida para que esta atividade seja conduzida de forma responsável, como é a grande maioria dos casos, porque a ninguém é permitido estar acima da lei.
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"Meu projeto de um lado amplia o sentido da liberdade de expressão e de outro cria freios e contrapesos para que sejam garantidas as prerrogativas do cidadão" ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
de interesses insanável ; temos uma lei anacrônica, que contraria a liberdade como princípio e é incapaz de assegurar as prerrogativas do cidadão no que se fere as imagens das pessoas e à vida privada. Para atingir esse objetivo, o projeto da nova Lei de Imprensa fixa parâmetros objetivos de indenização quanto às ofensas à honra e à moral. Sobre a matéria tem havido muita confusão interpretativa do que propõe o projeto. A grande polêmica
Vilmar Rocha, deputado federal(PFL-GO) , é o relator do projeto de lei de imprensa
ANUNCIO 1/2 REV. IMPRENSA
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Jornal da ABI
UMA NOVA LEI DAS ELITES, PARA E PELAS ELITES porque não há limites para essas liberdades. Antes que me arremessem um Código Penal, é exatamente com ele que vou argumentar. Assim como o meu direito constitucional de ir e vir não me permite invadir um domicílio, meu direito de opinião não me permite macular a honra alheia. Quer seja na imprensa ou na mesa do bar. Os crimes de calúnia, injúria e difamação estão descritos no Código Penal, ao alcance de quem presumir que um direito seu, tutelado pela Lei, foi agredido por quem quer que seja, não importando a qualidade profissional ○ ○ ○ ○ ○ ○ do acusado. Mas o Código Penal manda para a prisão os condenados por esses delitos, quanto uma nova Lei de Imprensa criaria a alternativa de penas comunitárias. Errado. Na reforma de 1958, o Código Penal já substituiu a pena ○ ○ ○ ○ ○ ○ restritiva de liberdade por penas alternativas para os delitos a que são cominadas penas de até um ano de prisão. No caso, essa já é a pena máxima para injúria e difamação. Resta a calúnia, à qual é cominada a pena máxima de dois anos de detenção. Já aprovado na Câmara, tramita no Senado projeto de Lei que aumenta para dois anos o limite ao qual é compulsoriamente substituída a pena restritiva de liberdade por uma alternativa. Restaria a batalha pelas indenizações previstas nos diversos projetos de Lei de Imprensa que estão na Câmara e aí talvez
Miro Teixeira Depois de conhecer na pele os efeitos do controle que a corte inglesa exercia sobre a imprensada colônia, os independentes norte-americanos fizeram rapidamente constar da Constituição a proibição à existência de qualquer norma restritiva à liberdade de manifestação de pensamento e de opinião. No Brasil deu-se o contrário. Logo nos primeiros passos, o Império providenciou uma Lei de Imprensa que vigorou por 101 anos, iniciando-se, então, o convívio íntimo com a anormalidade e, por tanto tempo, que a aberração passou a fazer parte da normalidade do dia-a-dia. E assim vamos indo. Temos uma Lei de Imprensa porque tínhamos uma Lei de Imprensa e devemos ter uma nova Lei de Imprensa porque existe a atual produzida pelo regime militar e faz parte do entulho do autoritarismo. Em vez de se remover o entulho, reescreva-se o entulho. Procuro e não acho em democracias estrangeiras mais consolidadas, à exceção das latino-americanas, tentativas legais de restrição à liberdade de pensamento e de opinião. A Inglaterra foi palco de uma autoregulamentação cujo texto, volumoso, tem servido como peça de coleção para os aficionados, desde março de 1992, quando foi homologadas pelo Parlamento. O horror genérico à existência de uma lei de imprensa tem razões conhecidas e múltiplas . A principal é singela e definitiva: Ninguém detém o conhecimento a ponto de estabelecer regras justas para limitar a liberdade de pensamento e de opinião
resida a maior excitação no âmbito da crescente indústria indenizatória da cultura globalizada. Quanto custa a honra de cada um? Seria possível produzir uma tabela com multiplicadores variados, segundo grau de instrução do ofendido? Ou quem sabe segundo o cargo que ocupa? Qual a honra que vale mais: a do doutor ou a do analfabeto? Se consultarmos, no anuário estatístico do IBGE, o perfil da população carcerária, teremos retrato exato da administração da Justiça no País. Lá, na cadeia, estão os negros, ○ ○ ○ ○ ○ ○ os analfabetos, os autores de crimes de execução pouco sofisticada. A elite quando delinqüe, não vai para a cadeia. As leis são feitas pelas elites e para as elites. A Lei de Imprensa não é diferente. ○ ○ ○ ○ ○ ○ O principal alvo da fiscalização e da denúncia da imprensa são os políticos e, de um modo geral, os agentes públicos espalhados pelos três poderes. São os poderosos, os homens de grandes negócios. Os que mandam. Exatamente os que fazem as leis e para quem as leis são feitas. E são exatamente essas as pessoas que se exaltam quando demonstramos que não existe lei de imprensa democrática ou, como já disse Jorge Amado: a melhor Lei de Imprensa é a que não existe. Ressalvados os de boa fé e os
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conformados com o fato de termos leis de imprensa desde o Império, os que defendem sua existência querem protegerse e, para tanto, criar um instituto legal que obrigue a denúncia jornalística aos mesmos pressupostos processuais da denúncia penal. A denúncia jornalística está vinculada à notoriedade do fato, à credibilidade da fonte e à responsabilidade do profissional e do órgão que a veicula. Não fosse assim, não teriam sido denunciados pela imprensa Collor de Melo e os anões do orçamento. A prova processual surge, na maioria dos casos, após a denúncia jornalística. E se os cartunistas pensam que estão à salvo, ledo engano. O substitutivo ao qual estão apensados os projetos tem com eles um carinho especial: a reprodução, por traço, de imagem de pessoas deve obedecer fielmente às suas características físicas. Defendo a pura e simples revogação da Lei de Imprensa. Em seu lugar, a definição de prazos para requisição judicial do direito de resposta, quando indeferido pela publicação. Quem se julga também materialmente prejudicado por algum crime contra sua honra, poderá valer-se do Código Civil, já disponível a todos os cidadãos, estabelecendo-se limites temporais específicos para o exercício do direito. O exercício ético da atividade jornalística é fiscalizado pela sociedade. A multiplicidade de órgãos de imprensa e a concorrência entre eles facilita o controle. Quem for irresponsável, perde.
"Quanto custa a honra de cada um? Qual a honra que vale mais: a do doutor ou a do analfabeto?" ○
Miro Teixeira, jornalista, deputado federal(PDT-RJ)
é
A LEI QUE GARANTE A DEFESA DOS CIDADÃOS ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Américo Antunes
O desafio, em síntese, é o de fixar na Lei os princípios que devem reger o direito à informação pluralista e democrática
Na polêmica em torno da nova Lei de Imprensa, que se arrasta no Congresso Nacional desde 1991, a existência ou não de uma legislação específica para o setor tem sido um dos focos de maior controvérsia. De um lado, aliam-se aqueles que entendem que uma Lei de Imprensa fere a própria liberdade de imprensa, bastando o Código Penal para as responsabilidades e as punições daqueles que cometerem crimes de injúria, calúnia e difamação. De outro lado, perfilam-se aqueles que consideram indispensável a existência de uma legislação específica para a imprensa, sobretudo para proteger os cida dãos diante do poder que os meios de comunicação adquiriram na sociedade comtemporânea. Embora vencido no Senado e nas comissões de Comunicação e de Justiça da Câmara, onde o projeto de reforma da Lei de Imprensa de 67 já foi votado, o debate sobre a necessidade ou não de uma legislação específica é atual e permite uma saudável reflexão sobre a regulação das relações entre a mídia e a sociedade. A Federeção Nacional dos Jornalistas (FENAJ), por exemplo, é contrária à tese de que o Código Penal é suficiente para tratar ○
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imprensa ou se tais normas poderiam colocar em risco a liberdade de expressão, 60% dos 790 entrevistados em 115 municípios brasileiros manifestaram-se favoráveis à primeira tese e 38% contrários. A mesma pesquisa da Vox Populi, realizada por encomenda da Federação, revelou que 51% da opinião pública nacional considera insuficiente o direito de resposta para a proteção de pessoas ou instituições atingidas pela mídia, enquanto 45% manifestaram que o direito de resposta é insuficiente. Reconhecida a necessidade e a urgência de uma nova Lei de Imprensa para o país, é preciso ressaltar que o projeto relatado pelo deputado Vilmar Rocha (PFL/ GO) na Comissão de Constituição e Justiça e que agora aguarda a votação em plenário na Câmara, representa enormes avanços em relação à legislação em vigor, elaborada sob os suspícios do regime militar, em 1967. Ao revogar esse entulho autoritário, o projeto introduziu também importantes inovações, tais como a obrigatoriedade da pluralidade de versões sobretudo em matéria controversa, o direito de recusa de assinatura do jornalista em matéria alterada no processo de edição, a agilidade do direito de resposta e a substituição da pena privativa de liberdade pela prestação de
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dos crimes de imprensa. Na verdade, o que está em questão no debate em torno de uma Lei de Imprensa é muito mais do que a caracterização das punições de jornalistas e empresários de comunicação. O desafio, em síntese, é o de fixar na Lei os princípios que devem reger o direito à informação pluralista e democrática., estabelecendo ao mesmo tempo mecanismos ágeis para a reparação de eventuais danos causados aos cidadãos e instituições e definindo as responsabilidades específicas dos jornalistas e das empresas, em particular. Pesquisa Nacional feita pela Vox Populi em novembro do ano passado comprova que a opinião pública brasileira partilha desta posição defendida pela FENAJ. Quando consultados se a favor da criação de normas para evitar abusos da ○
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serviços à comunidade e multa, entre outras. Apesar disso, a proposta da nova Lei de Imprensa continua em compasso de espera na Câmara dos Deputados desde agosto do no passado. E as razões para esta lentidão são as mais variadas, a começar pela resistência dos empresários de comunicação à falta de limites objetivos as indenizações por danos morais devidas pelos veículos que cometerem crimes de imprensa, tais como injúria, calúnia e difamação. Além disso, a FENAJ tem sustentado que o valor estipulado para a multa do jornalista - de até cem mil reais não condiz com a realidade de uma categoria cujo piso-salarial está em R$ 650 reais, sendo necessário ainda introduzir dispositivos novos no projeto, como a responsabilização da fonte oficial que tenha prestado informações falsas. Caso estas mudanças sejam introduzidas, não temos dúvidas que a nova Lei de Imprensa poderá assegurar o que a sociedade reclama: a garantia da mais ampla liberdade de expressão e manifestação, com responsabilidade. Américo Antunes é presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ). ○
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LEITORES, VEÍCULOS E JORNALISTAS: CONFRONTAR DIREITOS É A MELHOR SAÍDA co-autor do Ato Institucional nº 1. Sobre esse artesão de leis sinistras disse o cronista Rubem Braga: “Toda vez que acende a luz do Sr. Francisco Campos há um curto-circuito na democracia.” A questão principal é a propriedade da lei . Leis de imprensa não devem regular, muito menos controlar ou sequer definir a imprensa. O capitulo clássico “Dos princípios” deve limitar-se a repetir os postulados do artigo 220 da Constituição que garante a manifestação de pensamento, proíbe a “censura de natureza política, ideológica e artística”, assegura o direito de resposta e protege a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. E mais: “Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social,
informações de interesse público jamais podem ser invocados como imunidade para crimes e erros. E os cidadãos e instituições têm todo o direito de apontar os crimes, reclamar dos erros e, sem embaraçar previamente a mídia, pleitear reparações. A questão de se fazer ou não uma lei específica para a imprensa é irrelevante, desde que algum diploma legal disponha sobre aspectos essenciais ignorados pela legislação penal, tal como o rito do direito de resposta. A lei específica é a tradição jurídica brasileira, e parece mais fácil fazer uma lei nova do que alterar o velho e resistente Código Penal, basicamente o mesmo texto outorgado pela ditadura do Estado Novo, em 1940, sob a orientação do jurista e ministro da Justiça Francisco Campos (1891-1968), redator da Constituição fascista de 1937 e, em 1964,
Sérgio Buarque de Gusmão “Caso, algum dia, venha a ocorrer um aperfeiçoamento do gênero humano, os filósofos, teólogos, legisladores, políticos e moralistas descobrirão que a regulamentação da imprensa é o problema mais importante, difícil e perigoso que eles terão de resolver.” John Adams, presidente dos Estados Unidos de 1797 a 1801. Uma das questões mais barulhentas que o carcomido século XX legará ao terceiro milênio é a da liberdade de imprensa e as tentativas de cerceá-la. No Brasil, caímos novamente na encruzilhada filosófica de Adams. De um lado, pulsam na sociedade movimentos e reivindicações por uma imprensa digna, honesta, precisa e, ainda que seja uma tautologia, informativa. De outro, entrincheira-se uma indústria jornalística que tende a confundir liberdade de imprensa com liberdade de impressão. A liberdade de imprensa não pertence aos donos de jornais e aos jornalistas. É um valor democrático da sociedade. Seu conceito é irrestrito: liberdade de imprensa é o direito de informar, sem embaraço ou restrições, mas é também o irrestrito direito do público de ser informado. As leis e o pacto social que conterem a mídia o poder de apurar e divulgar
observado o disposto no art. 5, IV, V, X, XIII e XIV” (esses incisos vedam o anonimato, garantem o direito de resposta, asseguram a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem, garantem direito a indenização por dano moral e o acesso a informação e permitem o resguardo da fonte). O projeto de lei que está sendo discutido há seis anos no Congresso, agora na versão dada pelo relator Vilmar Rocha, deputado pelo PFL de Goiás, repete esses postulados, mas insiste no erro de pautar a imprensa. Exorbita ao dar definições e sugerir responsabilidades para os meios de comunicação. O artigo 3º, por exemplo, determina que é dever dos meios de comunicação “verificar a veracidade da informação a ser prestada” e “não fazer referências discriminatórias sobre raça, religião, sexo, preferências sexuais, doenças mentais, convicções”. É o justo fora do lugar. Tais mandamentos ficam bem como verbetes de códigos de ética, não como artigos de lei. OS DIREITOS DOS LEITORES Leis de imprensa devem ter um único e exclusivo objetivo: regular as relações da sociedade com a mídia de notícias, ou seja, assegurar os direitos constitucionais dos cidadãos e das instituições no campo da informação pública. Esses direitos estão no mesmo território e têm a mesma estatura
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Fazer ou não uma lei específica para a imprensa é irrelevante, desde que algum diploma legal disponha sobre aspectos essenciais ignorados pela legislação penal, tal como o rito do direito de resposta ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
ANUNCIO 1/2 O GLOBO
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democrática da liberdade de imprensa. A lei deve garantir irrestrita liberdade, e, para que seja de fato efetiva, deve garantir simultaneamente a reação pronta e eficaz contra o mau jornalismo, e com ele a calúnia, a injúria, a difamação, a imprecisão, a falta de ética, a falta de checagem das versões e dos fatos, a deficiente apuração, a distorção, o boato profissionalizado, o truque, a montagem, a manipulação, a chantagem, a extorsão, os linchamentos morais, e a corriqueira negação do direito de resposta. Se os cidadãos (os consumidores-leitores) não puderem reagir a esses desatinos, a liberdade de imprensa deixa de ser um valor democrático de mão dupla, para estreitar-se em pista única onde a mídia passeia a última palavra. Na substância, leis de imprensa não devem tratar da imprensa. Devem transcrever os postulados constitucionais que asseguram a liberdade e regulamentar, isso sim, as relações da sociedade com a mídia, assegurando, por exemplo, o vago e desrespeitado direito de resposta. Numa era em que a informação viaja à velocidade da luz, o direito de resposta exigido em ação penal pede tribunais rápidos e rito sumário. Instituído na França, em 1882, o direito de resposta foi introduzido no Brasil pela Lei Adolpho Gordo, de 1923 - e sempre foi um enfeite jurídico. Em geral, as leis de imprensa determinam que, a pedido do interessado , a resposta seja publicada (gratuitamente) no mesmo local e com idêntico destaque dado à matéria que se quer responder, mas, enquanto as emissoras de rádio e TV ignoram as reclamações, jornais e revistas criaram seções de carta onde reduzem e confinam as retificações, quando não as jogam na famosa cesta seção. Em vista disso, o que se espera de um instrumento democrático é que, negada a retificação espontânea, a lei garanta um rito sumário para o procedimento judicial da resposta. A liberdade de imprensa não autoriza a mentira, a distorção, a calúnia ou a injúria. Não endossa a ilação no lugar da apuração, o ouvir dizer ao invés do testemunho. Não dá o direito de omitir fatos e notícias. Não pode ser uma casamata da leviandade, nem gazua para o negócio da notícia em prejuízo do interesse da notícia. A imprensa está certíssima e zela pelas liberdades públicas quando afirma que ninguém deve dizer-lhe o quê e como publicar - antes da publicação. Mas, depois da publicação, a mídia e os jornalistas não têm imunidades. A rigor, quando um cidadão ou uma instituição se insurge contra erros ou pede reparação, não instala querela na órbita da liberdade de imprensa e sim na jurisdição dos direitos civis, iguais para todos. A função da lei é garantir plena liberdade e reciprocidade. A imprensa deve ser absolutamente livre para publicar o que achar que é notícia, e os cidadãos devem ser igualmente livres para receber informações precisas e honestas, exigir controle de qualidade, rigor ético e, sobretudo, devem ter o direito de contestar e cobrar retificações e reparações. O confronto de direitos é o melhor dos embates. Como receitou há três séculos o poeta inglês John Milton, numa defesa eloqüente da liberdade de imprensa, “deixemos que a verdade e a falsidade se batam. Quem jamais viu a verdade levar a pior num combate franco e livre?”
Para a ABI, liberdade de imprensa não é só o combate à censura, mas a garantia da livre manifestação dos pensamentos. Um programa de ação que inclui também preservação da memória do jornalismo brasileiro, atendimento aos sócios e prestação de serviços à comunidade
DEPOIS DA BOA LUTA CONTRA DITADURA, A HORA DA LUTA ÉTICA Não sou sócio da Associação Brasileira de Imprensa, nem pretendo vir a sê lo; não vejo muito sentido numa organização que mistura patrões e empregados, pessoas físicas e pessoas jurídicas, o dr. Roberto e o foca que começou ontem na redação. Esta geléia geral impede ações rápidas e eficientes; e, quando a entidade age, como no caso do pedido de impeachment de Fernando Collor, certamente o faz contra a vontade de parte substancial de seus associados. Qual o papel da ABI, então? Representar o Quarto Poder? Mas que diabo de Quarto Poder, tão submetido aos três outros e mais alguns? Embora não consiga exergar claramente o papel que caberá à ABI nos seus próximos 90 anos, arrisco-me a sugerir algumas iniciativas. Uma delas: iniciar as discussões sobre a utilização ética do poder da imprensa. Hoje, basta um repórter implicar com uma pessoa que não tenha muito destaque para causar-lhe problemas imensos. E basta o dono do jornal implicar com uma pessoa ou empresa qualquer, tenha destaque que for, para que a vítima seja enquadrada pela artilharia da imprensa. Direito de resposta? Não funciona: há pouco tempo, uma revista publicou a resposta de um político a uma reportagem publicada vários anos antes. Detalhe: este político morreu já faz muito tempo.
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Carlos Brickmann é jornalista
CONVÊNIO COM MIS PRESERVA A MEMÓRIA DO NOSSO JORNALISMO Depoimentos individuais ou mesas temáticas possibilitam um acervo especializado que pode ser consultado, em áudio e vídeo, por pesquisadores e estudantes. O Governador Marcelo Alencar partcipou do projeto em abril de 98.
Sérgio Buarque de Gusmão é diretor do Instituto Gutenberg - Centro de Estudos da Pesquisa
Especial 90 anos
publicação não é critica a ABI: é homenageá-la. Para mim, é difícil fazê-lo, pelos motivos já expostos. Mas é justo homenagear o dr. Barbosa Lima Sobrinho, ativo e coerente, trabalhando e pensando no país - pois, se é lícito dele discordar, ninguém pode negar a retidão de seus motivos. É justo homenagear o dr. Barbosa Lima Sobrinho não apenas pelo que ele faz hoje, mas pelo que ele fez no seu passado, sempre correto, sempre limpo, sempre apoiado em princípios e estudos e por seu filho jornalista, Fernando Barbosa Lima, cujo trabalho na TV, forçando as pequenas janelas da censura imposta pelo regime militar até conseguir abri-las, é um dos mais notáveis exemplos de competência e coragem de nossa profissão. É bom lembrar, ainda, o bom papel desempenhado pela ABI nos tempos da ditadura, quando aliada a outras entidades da sociedade civil, resistiu ao poder militar e denunciou seus excessos. Só que, esqueçamos, a ditadura terminou. Talvez não tenha mais sentido uma organização moldada como as guildas, as corporações da Idade Média, que se dedicavam exclusivamente à manutenção com o mundo que existia à sua volta. Esta é mais uma sugestão: por que não debater, dentro da ABI a sociedade moderna?
Imaginemos outra cena: num desses programas jornalísticos sensacionalistas, o repórter diz que uma determinada empresa - um consórcio, uma seguradora, uma financeira (banco não, que ele não é doido) - está prejudicando seus clientes. Pode-se dar a resposta que for, que não adianta: o prejuízo já está causado. Outra iniciativa interessante seria estudar a propriedade cruzada de veículos de comunicação. É bom para o país que uma determinada empresa ou pessoa ser dona de emissoras de TV, emissoras de rádio, jornais e revistas? Há vários lugares do mundo em que isso é proibido. E o controle externo da TV, proposto pela deputada Marta Suplicy (PT-SP), pode ser exercido sem que se transforme em censura? Este seria um tema excelente para debate, principalmente dentro de uma organização que abria simultaneamente patrões e empregados. Quanto ao capital estrangeiro nos veículos de comunicação, talvez seja tarde para estudá-lo. O fato é que, embora ainda proibido (há projetos que o liberam), o capital estrangeiro participa abertamente de grandes empresas de comunicação. Mas talvez o debate sirva para informar as leis que deverão reger esta área, e dê argumentos para enquadrar as empresas que hoje violam a lei no arcabouço legal. São algumas poucas sugestões, talvez inoportunas. Afinal, o objetivo desta
Carlos Brickmann
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FOTO MARCELLO ALENCAR
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O governador Marcello Alencar gravou depoimento no dia 16 de abril de 1998 com a mediação do jornalista Andrë Motta Lima, do Departamento de Intercâmbio e Divulgação da ABI, responsável pelo projeto, e com a participação do vice-presidente da ABI, José Gomes Talarico, do assessor de imprensa do governador, Antonio Cunha, e do ex-secretário estadual da cultura, o jornalista Leonel Kaz. A seguir, alguns momentos do depoimento: A primeira experiência “ Meu ingresso no jornalismo aconteceu por circunstâncias da minha vida. Quando meu pai morreu, a vida da minha família mudou muito. Eu já estava na faculdade de direito e achei que deveria procurar um emprego. Naquela época, o estudante de direito tinha dois caminhos para garantir sua sobrevivência : ser jornalista ou policial. Eu não fugi à regra. Não tinha vocação para polícia, mas o jornalismo me entusiasmava. Por sugestão da minha mãe, procurei um grande amigo de meu pai, o José Pessoa de Queiroz, que dirigia o Jornal do Commercio de Pernambuco, para pedir uma oportunidade no jornal. Ao dizer a ele o que eu queria, ele reagiu da seguinte maneira : “ Você acha que vou deixar um filho de Mário Alencar, meu dileto amigo, ser repórter de jornal?! Ao dizer isso, ele estava demonstrando o desapreço que existia em relação à atividade jornalística, o conceito social que um jornalista tinha naquela época. Os jornais pagavam muito mal e às vezes até nem pagavam. Atuação durante a ditadura “Por volta de 1969, quando eu já estava inscrito como uma pessoa indesejável pela ditadura militar, tive uma passagem pela clandestinidade. (...) Naquela ocasião eu era um advogado atuante e militante e havia defendido acusados de crimes políticos, militares, jornalistas, estudantes, como Fernando Gabeira e Vladimir Palmeira. Fui preso muitas vezes, processado e julgado na Primeira Auditoria da Aeronáutica, mas acabei sendo absolvido. (...) Quando voltei da clandestinidade, o meu irmão Maurício, que era um empresário vitorioso, havia arrendado o Correio da Manhã, que estava em concordata. (...) Antes, porém, o Correio da Manhã havia sido um dos jornais mais importantes e influentes do país”. (...) O Correio da Manhã “Presidi várias reuniões do conselho editorial, que foram para mim uma escola maravilhosa de aprendizado. Nossas discussões eram notáveis, tínhamos que analisar se os editoriais poderiam ser ou não objeto de censura. Vivíamos medindo as palavras sem poder recuar. Nessa época convivi com a expressão mais alta do jornalismo brasileiro, homens brilhantes e inteligentes, com Franklin de Oliveira, Raul Ryff, Paulo de Castro e muitos outros. (...) O Mário Pedrosa era um dos que também contribuía na redação do Correio da Manhã, que era então um grande jornal. Eu presidi várias reuniões do conselho editorial onde as discussões eram notáveis porque a gente tinha que medir até onde aqueles editoriais seriam ou não objeto de censura ou repercussão. Era um verdadeiro trabalho de magia. Nós ○
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“Nós quando estamos no poder não temos coragem... Essa submissão ao jornalista tem feito mal a ele, porque dá a idéia ao jornalista de um poder de fazer mal, que sempre foi uma constante no jornalismo. O sujeito acha que tem poder porque pode dar uma notícia. É uma deformação profissional que eu combato como jornalista. Todo dia me entrevistam, eu dou duro, não faço concessão por isso. É para dar uma contribuição.” A imprensa carioca hoje Houve uma fase em que O Dia pretendeu assumir o Jornal do Brasil. Não foi possível. Estava perdendo sua posição porque contratou todos aqueles jornalistas do JB e fracassou. O Dia começou a perder a circulação e eles voltaram a ser um jornal leve, ligeiramente barato, com muita publicidade. Hoje, com uma chave que é o negócio do prêmio. O brasileiro hoje, tudo que for prêmio fatura. As televisões estão vivendo do telefonema. É uma mudança cultural que muitos não se apercebem. A verdade é que a gente nota as mudanças que estão ocorrendo, com facilidade. Imprensa e mercado “A imprensa televisada está sendo um demarcador, uma cerca entre o público da classe A e B e as outras classes, porque a televisão por cabo ou satélite tem 100 estações. Vejam as questões de mercado. O bolo é um só, a publicidade é uma só. Significa tantos milhões. Ter que dividir entre três jornais é uma coisa. Ter que dividir entre 100 já é outra... o bolo não dá pra todos comerem. Então vêm as disputas. O jornal O Globo lança o Extra a R$ 0,25, com o mesmo esquema editorial do outro e com prêmios: o carro e a panela. Tenho uma empregada maravilhosa, inteligente pra burro, que está fascinada pela panela. Ela está comprando o Extra todo dia. Essas são realidades que você está vivendo. Que programas atingem a classe A e B? Globonews, tevês a cabo, filmes, etc. Têm publicidade. Têm que viver de quê? De publicidade. mas tem as outras, que são as tradicionais, você entra na favela está cheia de antena. Alí eles captam as mensagens das tevês tradicionais. Essas estão com programa quase o dia inteiro, do Ratinho, Márcia, Joaquina, Manoela, retratando os fatos da vida.” Eu até não sou muito crítico do Ratinho. Porque o Ratinho tem uma tendência de ficar do nosso lado. Mas se tiver que criticar eu diria que aquilo tinha que ser um pouco mais profundo. O Ratinho encontrou o veio. O Ratinho faz com os fatos da vida A mulher que foi trocada por uma televisão, que depois foi enjeitada e devolvida. É sério isso. As pessoas não entedem mas acontece isso. É um impacto da vida. Parece que isso era absurdo acontecer, mas está lá. Você olha as caras, estão sendo honestos. O cara sai no pau: “Tu não é homem, tu viu a mulher e não fez nada com ela”. Isso num programa de televisão que a gente está assistindo! Eu ontem, por acaso, fiquei fascinado ao ver aquela locura. Que sociedade é essa? Nós não temos controle sobre essas coisas. Não estamos tendo. Isso gera disputa meio irresponsável, no meu entender. Está se fazendo o diabo. A imprensa está passando por um momento muito dificil, no meu entender, onde os jornalistas de peso estão se sentindo acanhados."
Brizola e Roberto Marinho "Um dia Brizola me liga e diz: 'Marcello, vamos almoçar com o velho’ ‘Que velho, ô Brizola?’ ‘Esse doutor Roberto’. ‘Ah é,?’ Esse inimigo dele. ‘Eu sou o governador, tu és o prefeito, ele é o maior empresário daqui, nós temos que ir.’ ‘O senhor fez bem, vamos lá.’ E fomos. Nós passamos três meses, de dias em dias almoçando com o Roberto Marinho. No dia que eu contar isso eu ganho até um dinheirinho, porque eu vou vender livro. Delicioso o confronto dos dois. Os dois estavam se admirando de uma maneira particular. Estava um meio apaixonado pelo outro. Até que explodiu esse sentimento de saber quem tem poder. Explodiu por causa de uma bobagem, o tal do Rock in Rio. ○
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vivíamos medindo as palavras sem poder recuar, mas sem poder agravar. Era um exercício para homens inteligentes. Tínhamos na internacional aquele português, o Paulo de Castro, um brilhante jornalista, fugido da ditadura de Salazar, que era um talento incrível, que produzia os editoriais da parte internacional. Correspondente na ONU “Eu tive a felicidade de ter sido credenciado na ONU, o que me permitiu atuar numa fase muito produtiva para o jornalismo. Eu cobri eventos muito interessantes como o ingresso da China na ONU. Vi uma sociedade modificada de uma hora para outra. Quando houve o entendimento americano-chinês, houve uma mudança no comportamento do americano. As lojas de Nova Iorque estavam enfeitadas com o livro vermelho de Mao-Tse-Tsung e ele a aparecer como um demônio com uma faca nos dentes para matar as pessoas, com a imagem do chinês violento. Eu peguei o resto do processo do Serpico, aquele policial que denunciou a corrupção na polícia de Nova Iorque. Tive a oportunidade de ver uma diligência em que se abria o cofre onde se guardava a cocaína e cocaína não era cocaína. Não era maisena (risos), mas era um talco que eles botaram lá. Foi uma época muito forte em que o incidente do subcontinente indiano também foi uma coisa muito estranha. Essas questões que só chegaram ao Brasil muito recentemente como a poluição, a questão urbana. A vinculação da questão urbana com a violência já se estudava lá. A comunidade científica internacional se reunia e discutia todos esses problemas. Depois eu tive a experiência de correspondente estrangeiro em outro país. Eu fui à África portuguesa. Por vocação, fofoquei lá também. Eu notei logo que essa revolução ia sair sem muito sangue, porque os portugueses que lá existiam e se constituíam na elite, já tinham interesses arraigados, que recomendavam ficar ao lado da liberdade das colônias. Estive tanto em Angola como em Moçambique. Conheci gente esplêndida, homens desprendidos, homens revolucionários na sua concepção. Foi um momento que vivi muito. Depois estive na Europa fazendo várias coberturas. Era uma época muito boa. Teve o new prospect na época do Nixon. Era um programa econômico que debilitou Breton Woods, quer dizer, o Fundo Monetário Internacional. Depois disso tive oportunidade de seguir vários eventos até
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chegar ao Watergate. Eu vim com a abertura do Watergate. O jornalismo me deu isso. Foi uma espécie de janela que se abriu na minha vida para uma atividade que não era a minha. Eu sempre fui um atuante e vitorioso advogado, mas me dediquei muito ao jornalismo nessa fase ruim da minha vida. O jornalismo foi a minha saída onde eu absorvi muito conhecimento, por convivência. Guerra fria (...) “Essa perplexidade da esquerda hoje em relação aos acontecimentos da União Soviética, sobre a queda do Muro de Berlim e do Leste Europeu e não tive porque eu estava informado da realidade que estava acontecendo. Isso o jornalismo me ajudou muito. A convivência com os jornalistas do setor intenacional me ajudava a compreender os fatos que estavam aconrtecendo. Eu pude compreender que a guerra nas estrelas era um instrumento de debilitação soviética que o americano lançou com inteligência para fazer com que a economia soviética se dedicasse exclusivamente ao esforço de guerra, enquanto que os americanos fingiam que estavam nessa guerra nas estrelas e os soviéticos tentando chegar às estrelas antes deles e, enquanto isso, produziam menos trigo, menos geladeira, menos fogão, etc.” Relação imprensa/estado “Hoje a imprensa chamada moderna não tem uma linha editorial de afirmação política. Os meios editoriais estão sofrendo uma grande influência da tecnologia avançada. Eu estudei muito o jornalismo lá fora, sobre as grandes empresas jornalísticas que naufragaram. O que houve foi uma tremenda revolução. Hoje, o veículo jornal, por exemplo, não informa mais nada. Quando o jornal sai amanhã, com todo o noticiário de hoje - aquilo que era a nossa pauta - você saia para responder a ela. A pauta do jornal de hoje é o acontecimento já divulgado pelo rádio e televisão ontem. Os jornais tiveram que se adaptar a uma novidade editorial. Eu sou do tempo em que uma partida de futebol era descrita no Jornal dos Sports ou em qualquer jornal. Hoje os jornais ocupam seis ou oito páginas de esportes sobre a vida do técnico, sobre a vida do jogador, sobre o quanto ele ganha , se ele usa brinco, se não usa, quais são as mulheres que ele conquistou, quais são as que ele está traindo. Enfim, faz-se uma novela.” Deformação profissional
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Jornal da ABI
NEM SÓ DE ADRENALINA VIVEM OS JORNALISTAS Depois de anos e anos de trabalho estressante nas redações de revistas e jornais, nos estúdios de rádio e TV ou mesmo no corre corre das ruas, o que fazer quando nos despedimos dos jatos de adrenalina típicos do dia a dia do jornalista? Um grupo de profissionais já encontrou a solução. Ela fica na Rua Araújo Porto Alegre, nº 71, 11º andar. Conhecido como Praça XI ou simplesmente onze, o espaço é um ponto de encontro de jornalistas. Muitos são atraídos pelo cheiro de informação, principalmente aqueles que ainda estão exercendo a profissão. À disposição dos freqüentadores estão os principais jornais do Rio, os dois de maior circulação de São Paulo e até alguns periódicos do interior. Mas maioria, constituída de aposentados, vai mesmo para passar o tempo. E não é preciso ficar mais de duas horas no andar para conhecer os freqüentadores mais exóticos. Entre eles está Silvio Melo, um redator aposentado do serviço público que passa o dia inteiro andando de um lado para o outro e subindo e descendo os elevadores do prédio. Nascido no Pará, vive dizendo que sua terra natal é que sustenta a Europa e que as tropas do estado já estão prontas para um levante armado contra as forças norte-americanas. Outro que bate ponto diariamente no onze é João Duque Estrada Meyer, conhecido apenas como Duque. De cabelos e bigodes brancos e sempre com um livro debaixo do braço, chega e logo se dirige para sua cativa poltrona. Antes de tirar um cochilo, dá uma lida nos jornais ‘a procura de erros cometidos por jornalistas. Quando os encontra, comenta: “Tá vendo só - e eu tô aqui desempregado”. Mas se uns procuram erros nos jornais, há quem procure endereços de exposições e vernisagens. E não pense que é para admirar obras de arte não. O que eles querem é saborear os quitutes servidos durante os coquetéis de inauguração. Já foram até apelidados de Grupo Militante do Coquetel (GMC). Edir Macedo é um de seus integrantes. além da vontade de comer, essa simpática senhora carrega consigo uma inseparável companheira, a máquina fotográfica. Ela registra cada evento de que participa e se gaba de ter fotografado importantes personalidades, como o presidente das Organizações Globo, Roberto Marinho. Edir também é leitora compulsiva do JB. Quando pega o jornal não larga mais e é capaz de passar horas lendo durante festas, enquanto o som está tocando. Leonor Guedes é outra que se destaca no meio das poucas mulheres que freqüentam o local. Muito enérgica, apesar dos 70 anos, fundou, em 1960, a Orbe-Press Agência de Notícias, que divulgava assuntos técnico-científicos e culturais em vários países do mundo, inclusive na antiga URSS, o que lhe valeu a acusação de espiã russa, estampada em páginas do jornal O Globo, em 1967, quando o Brasil
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de 8h às 16h, no 12º andar. Em vez de ficar jogando papo fora, ele pode aproveitar o tempo que ainda resta do horário do almoço para ampliar seus conhecimentos, consultando os 11.300 volumes do acervo bibliotecário, que abrange 16 áreas Comunicação Social, Imprensa, Jornalismo, Propaganda, Publicidade, Relações Públicas, Televisão, Rádio, Cinema, Informática, Literatura, Psicologia, História, Economia, Cibernética e Biografias em geral. Segundo a bibliotecária-chefe, Vilma Oliveira, só em março o número de consulentes foi de 553, uma média de 35 a 40 pessoas por dia. A maioria deles é composta por estudantes, o que explica o reduzido movimento nos meses de férias escolares. E se alguém está um pouco atrasado com relação aos acontecimentos mais recentes, tem a chance de consultar as publicações dos últimos três meses de vários jornais, entre eles O Globo, Jornal do Brasil, O Dia, Jornal dos Sports, Folha e Estado de S. Paulo. Este serviço funciona como suporte para a Biblioteca Nacional, que, há aproximadamente dois anos, período em que tomou conhecimento da existência dos jornais na sede da ABI, através de um aviso informal dos próprios funcionários da casa, vem encaminhando aqueles que batem à sua porta para consultar periódicos à Associação. Somente os sócios podem levar livros para casa, no máximo três de cada vez, mediante a apresentação da carteira da ABI. Os interessados em fazer a carteirinha, devem apresentar o diploma de jornalista juntamente com duas fotos 3x4 e estar registrado no Ministério do Trabalho. São os chamados sócios militantes. Há também os sócios colaboradores, aqueles que não são necessariamente formados em comunicação, mas que colaboram com a Imprensa escrevendo artigos. Estudantes de Jornalismo no último ano também podem se tornar sócios da Associação. Todos devem pagar uma taxa de matrícula de R$15,00 e mensalidades de igualmente R$15,00 ou anuidade de R$150,00. Além das vantagens nos serviços acima descritos, os sócios também contam com algumas facilidades como assessoria jurídica e assistência médica. A ABI põe à disposição de seus associados 20 profissionais de variadas especializações da Medicina, que atendem em seus consultórios particulares, situados no Pavimento Pedro Ernesto, 6ºandar , e no Posto de Atendimento Paulo Roberto , no 10ºandar. O serviço é viabilizado por um contrato chamado Direito de uso com prestação de serviços. Ele estabelece que os médicos podem usufruir do espaço desses dois andares sem o pagamento de aluguel, permitindo, inclusive, o atendimento de pacientes particulares, desde que atendam os sócios da ABI gratuitamente. Segundo Henrique Miranda, integrante da Comissão Diretora do Departamento de Assistência Social (DAS) , foram expedidas 2.117 guias para
estava em plena ditadura militar. Leonor entrou com uma ação na justiça contra o jornal e ganhou a causa. Como indenização, exigiu que o jornal firmasse contrato com sua agência, publicando matérias da agência noticiosa russa Novotisni, a qual tinha acusado de espionagem. O onze é isso, um pedaço da história. Por ele passaram Gontijo Teodoro, o Repórter Esso da TV Tupi, e Villa Lobos, que se debruçava sobre uma das duas mesas de bilhar do andar, diariamente. Mesma mesa em torno da qual, hoje, um grupo de senhores fica horas jogando, todas as tardes. Preocupados em não sujar a roupa com o giz, não dispensam o avental. A elegância, aliás, é uma característica dos freqüentadores. A calça e a blusa social é quase um uniforme. Mas o onze não é só um espaço de lazer. Numa das três pequenas salas que completam o andar funciona a agência fotográfica Prisma. Na outra fica a diretoria de atividades culturais, responsável por diversos eventos que ocorrem na ABI, e há ainda a sala de redação dos frilas, com quatro máquinas de escrever, usadas por alguns jornalistas para a confecção de artigos para a imprensa. O andar também oferece serviço de cabeleireiro e dispõe de uma cantina, ambos abertos a quaisquer pessoas, não necessariamente sócios. O barbeiro, com dez anos de casa, é Mário Marques, um senhor que tem paixão por cinema. Em cinco minutos de conversa, é incapaz de não tocar no assunto. Faz menção a dezenas de filmes e sabe de cor todo elenco, sem falar nos diretores. Já a cantina tem como atração o licor de leite e o preço, é claro. Uma refeição sai a R$4,00 para sócios e R$6,00 para os não-sócios. Apesar do preço em conta, há quem prefira comida caseira. Nilton Sacramento, jornalista veterano com passagens pelo Jornal do Comércio e pela Última Hora e atual revisor das revistas Lide e Cinemais, abandonou o hábito de almoçar na cantina desde que ingressou na arte culinária, o que não significa que ele tenha dispensado a companhia dos amigos. Sacramento leva a comida de casa e a degusta ao lado dos colegas. Tudo isso acontece sob os olhos atentos de Jorge Vianna Bastos, um dedicado funcionário que há 51 anos toma conta do onze. Entre um telefonema e outro, é ele que, das 11h às 21h, faz companhia aos mais carentes e resolve algumas briguinhas que surgem em torno de quais programas assistir na TV, como o eterno dilema entre a novela das oito e o telejornal.
Danielle Nogueira/Fernanda Novaes
ABI a serviço da população Para desfrutar de alguns serviços prestados pela ABI, não há necessidade de que o interessado se torne sócio da instituição. Estão à disposição do público os serviços de cabeleireiro e de cantina, ambos localizados no 11º andar, com apenas uma irrisória diferença de preço. O corte de cabelo sai a R$6,00 para sócios e a R$8,00 para não-sócios. Além disso, o cidadão pode fazer uso da biblioteca, a Biblioteca Bastos Tigre, aberta de segunda a sexta,
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consultas médicas, no período de março de 97 a fevereiro de 98. Desse total, 1.517 destinaram-se aos profissionais, cujos consultórios localizam-se no Pavilhão Pedro Ernesto. As demais dirigiram-se aos médicos e dentistas conveniados, que atendem fora da ABI. Em geral , são especialidades de que a ABI não dispõe. Nesses casos, os serviços são cobrados com desconto, variando de 10% a 50%, dependendo do profissional. Estão em vigor 362 convênios, incluindo laboratórios e instituições hospitalares. Em casos graves, como cirurgias e internações, a ABI faz uma carta endereçada à diretoria de uma dessas instituições, comumente a Santa Casa de Misericórdia, que autoriza a internação gratuita. Parentes de 1ºgrau podem fazer uso dos serviços na condição de sócios dependentes. As atividades culturais Há vinte anos atrás o cinema da ABI, no auditório do 9º andar, era um espaço tradicional dedicado à exibição de filmes fora do circuito comercial. Fizeram história o Cineclube da União Metropolitana dos Estudantes, em 57, e o Cineclube Macunaíma, em 73. “Já tivemos aqui festivais de grande importância. Depois foi ficando tudo abandonado e voltou a estaca zero”, explicou o responsável pela retomada do cinema e coordenador da Diretoria das Atividades Culturais da ABI, Ary Vasconcelos. A recuperação da sala de cinema foi um processo demorado e caro. O espaço teve que ser completamente reconstruído: novas telas, novas máquinas, pintura, assoalho etc. O cinema foi reinaugurado com O Canto da Saudade (Brasil, 1952. Ficção . Com Claúdio Montenegro, Mário Mascarenhas, Humberto Mauro e Nicete Bruno). “Como é uma casa muito nacionalista vamos começar com o cinema brasileiro. Não terá um aspecto comercial, serão sempre obras de qualidade artística. A idéia é essa” disse Ary. A cada sessão serão distribuídas apostilas com informações sobre os diretores, opiniões da crítica e ficha técnica. A música popular brasileira continuará tendo espaço garantido na ABI. O projeto Seis e Meia na ABI há quinze anos, sempre às segundas-feiras, divulga artistas brasileiros pouco conhecidos. O maior problema do projeto é a divulgação: “Esta é uma batalha a ser travada, trazer o público para conhecer. Porque eu tenho certeza que depois que vierem vão gostar.” No mês de abril foi realizada uma mostra em comemoração aos 90 anos da ABI. Segundo a curadoura da exposição, Gioconda Cavalieri, diretora do Grupo de Trabalho de Exposição de Arte (GEA) uma subdivisão do Departamento de Atividades Culturais - o objetivo é expor as obras de artistas sócios da casa, complementadas com as de alguns convidados. Danielle Nogueira e Fernanda Novaes são estagiárias do Núcleo de Imprensa da Escola de Comunicação/ UFRJ.
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Presidentes da ABI em 90 anos Gustavo de Lacerda (1908-1909), Francisco Souto (1909-1910), Dunshee de Abranches (1910-1913), Belisário de Sousa (1913-1916), Raul Pederneiras (1916-1917 / 1920-1926), João Guedes Mello (1917-1918 / 19191920), Dario de Mendonça (1918-1919), Barbosa Lima Sobrinho (1926-1927 / 1930-1931 / 1978-1998), Gabriel Bernardes (1927-1928), Manuel Paulo Filho (1928-1929), Alfredo da Silva Neves (1929-1930), Herbert Moses (1931-1964), Celso Kelly (1964-1966), Elmano Cruz (1966 / 1974-1975), Danton Jobim (1966-1972 / 1978), Adonias Filho (1972-1974), Líbero de Miranda (1975), Prudente de Moraes, neto (1975-1977), Fernando Segismundo (1976 / 1977-1978)
selo ziraldo
DIRIGENTES DA ABI EM 7 DE ABRIL DE 1998 José Gomes Talarico, José Motta Maia, José Teixeira Peroba, Maria Cecília Ribas Carneiro, Maria Lúcia Amaral, Mário Barata, Mário Saladini, Milton Coelho da Graça, Milton Souza, Moacir Werneck de Castro, Oliveiros Litrento, Paschoal Antonini, Paulo Motta Lima, Reinaldo Santos, Renato Jobim, Roland Corbisier, Teresinha de Fátima dos Santos e Wilson Meireles.
MESADO CONSELHOADMINISTRATIVO Presidente: Fernando Segismundo 1º Secretário: Mário Barata 2ª Secretária: Maria Lúcia Amaral CONSELHEIROS Amaury Fonseca de Almeida, Ana Arruda Calado, Antônio Domingues Calvo, Antônio Nogueira Lyra, Ariosto da Silva Pinto, Armando Peixoto, Ary Nepomuceno, Ary Vasconcelos, Augusto Villas-Boas, Barbosa Lima Sobrinho, Carlos Arthur Pitombeira, Cícero Sandroni, Conrado Ribeiro da Silva, Dahas Zarur, Domar Campos, Fernando Segismundo, Fichel David Chargel, Francisco de Paula Sá, Frederico Teixeira Filho, Hélio Fernandes, Henrique Miranda, Ismênia Dantas, Ítalo de Saldanha da Gama, Jorge Nunes, José Augusto Ribeiro, José Barra Sobrinho, José Chamilete, José Fernando Miranda Salgado,
Pedro do Couto, Gerdal dos Santos, Germano de Oliveira Gonçalves, Ítalo de Saldanha da Gama, Jorge Nunes, José Barra Sobrinho, José Gomes Talarico, Kleber Alves Borges, Mário Saladini e Olga Savary.
Divulgação: André Motta Lima Departamento de Educação e Ciência: Gerdal dos Santos Departamento de Artes: Júlio Camargo
COMISSÃO DE SINDICÂNCIA Carlos Arthur Pitombeira, Iarly Goulart, José Resende Neto e Nilo Braga.
DIRETORIA Presidente: Barbosa Lima Sobrinho 1º Vice-Presidente: José Chamilete 2º Vice-Presidente: José Gomes Talarico Secretário: Cícero Sandroni 1º Subsecretário: Paulo Motta Lima 2º Subsecretário: Domar Campos Tesoureiro: José Teixeira Peroba Subtesoureiro: Augusto Villas-Boas Diretor de Sede: Henrique Miranda Diretor da Biblioteca: Augusto Villas-Boas Diretor de Atividades Culturais: Ary Vasconcelos
DEPARTAMENTO DEATIVIDADESCULTURAIS Departamento de Intercâmbio
OBS: O conselheiro e diretor Augusto Villas-Boas faleceu em 15/03/98, não chegando a ser substituído em seus cargos.
DEPARTAMENTO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL Agis Mendonça Pereira, Henrique Miranda, Itamar Guerreiro, Leda Acquarone de Sá, Luiz Ignácio Dominguez, Maria Nilza P. da Silva Portocarrero, Michel Simão, Reinaldo Santos, Roberto Carneiro e Sebastião Saldanha Marinho.
COMISSÃO FISCAL Carlos Vieira Barros Leite, Lenin Novaes, Loris Baena Cunha, Octavio Floro Barata Costa e Paulo Parisi Rappoccio. COMISSÃODEDEFESA DALIBERDADEDEIMPRENSA EDIREITOSHUMANOS Antônio Rodrigues de Paula Filho, Ariosto da Silva Pinto, Ary de Azevedo Nepomuceno, Beatriz Bissio, Francisco
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CAMPANHA FESTEJA 90 ANOS No horário nobre das televisões de todo o país, no dia 7 de abril de 1998, o toque de um surdo acompanhava as mudanças das letras no vídeo: "Toda a história de 90 anos de luta da imprensa no Brasil pode ser escrita com apenas três letras...A...B...I". A voz do ator Mário Lago complementava: Associação Brasileira de Imprensa; há noventa anos liberdade se escreve assim." As chamadas, de 30 segundos, foram veiculadas gratuitamente por praticamente todas as cadeias de televisão, inclusive os sistemas de tv por cabo e de assinatura. As principais rádios do eixo Rio-São Paulo
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também divulgaram, sem nada cobrar, chamadas de 15 segundos com os mesmos dizeres. Nos jornais, o material ocupou 1/4 de página. Foram mais de 20 dos principais veículos do país, nas cidades do Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Natal, João Pessoa e São Luís. A campanha, projetada e dirigida pelo Departamento de Intercâmbio e Divulgação da ABI, sob a coordenação de André Motta Lima, teve a participação na criação da Agência Tática, do Rio de Janeiro, e não gerou nenhum tipo de despesa para a entidade.
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Jornal da ABI