O Bolchevique # 3

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proletariado, sendo o direito ao trabalho, a fórmula primeira, embrionária, acanhada, em “que se condensavam as exigências revolucionárias do proletariado, [...] um desejo piedoso, miserável, mas por detrás do direito ao trabalho está o poder sobre o capital, por detrás do poder sobre o capital, a apropriação dos meios de produção, a sua submissão à classe operaria organizada, portanto, a abolição do trabalho assalariado, do capital e da sua relação recíproca”. (As lutas de classes na França de 1848 a 1850) O mesmo pode se dizer do conjunto das revoltas populares árabes nestes últimos meses, que são levantes espontâneos, desorganizados, sem consciência nem independência de classe, mas, sem dúvida, como as lutas contra a fome de 2007-2008 que as precederam, são escolas de luta política para as massas de toda a região. Na Arábia Saudita, Omã, Iêmen, Jordânia, Kuwait e no Bahrein os governos títeres do imperialismo, temendo que a intensidade dos protestos em seus países alcancem os níveis que ocorreram na Tunísia e Egito, tratam de realizar pseudo-reformas democráticas, conceder miseráveis aumentos salariais e “pôr as barbas de molho”. No entanto, a espontaneidade que num primeiro momento propulsiona o movimento, em breve se constitui seu calcanhar de Aquiles, ficando as massas rebeladas a mercê das articulações palacianas controladas pelo imperialismo. Sem um programa claro, sem uma estratégia de conquista do poder político e menos ainda organismos para isto, o movimento está condenado a um beco sem saída. Desgraçadamente, a heróica luta dos trabalhadores gregos acaba de comprovar, pela enésima vez, que sem teoria revolucionária fusionada com a luta da população trabalhadora, através de um partido político de vanguarda com influência de massas, não há movimento revolucionário. Mesmo as maiores greves gerais e as mais selvagens ocupações de fábrica não são capazes de resolver o problema da crise de direção revolucionária. Se no processo da luta as massas não encontram um rumo claro para sua emancipação e atendimento de seus objetivos, se não tiverem a sensação de que suas fileiras se tornam mais robustas e coesas, inevitavelmente, se inicia o processo da desmoralização. O combustível inicial, o agravamento da miséria, não é uma fonte regular e permanente de disposição de luta das massas para reagir coletivamente contra seus exploradores. Muitos setores que fazem sua primeira experiência cairão na passividade. Em meio à crise dos governos interinos, as direções sindicais se incorporam ao regime. Sem a direção resoluta do proletariado de forma altiva, vencendo as batalhas, a pequena burguesia tende a conformar-se com a falsa democratização. Na vanguarda, e particularmente na vanguarda da juventude desempregada e sem esperanças de futuro, diante do refluxo da resistência coletiva começarão a surgir tendências ao aventureirismo ou ao protesto de grupos isolados, alvos fáceis da repressão seletiva de grupos fascistas patrocinados pela burguesia, armados pelo aparato repressivo estatal e recrutados no lumpemproletariado, até a proliferação desesperada de novos protestos individuais como o de Bouazizi.

Mulher egípcia grita palavras de ordem contra o aparato policial

A REAÇÃO PLANIFICADA E ESTRATÉGICA “COM FORMA DEMOCRÁTICA” DO IMPERIALISMO Enquanto as massas sublevadas permanecem carentes de um plano estratégico e de organismos próprios, independentes para executá-lo, o imperialismo aproveitase da turbulência para realizar uma nova ofensiva com a finalidade de otimizar seus lucros na região. Como de costume, fingindo-se amante da liberdade e defensor da democracia, os EUA tratam de conduzir, por cima, um reordenamento de seu domínio na região, apoiando-se em cada país e, antes de tudo, na espinha dorsal de seus regimes títeres, nas Forças Armadas cipaias de suas semicolônias, controladas, em primeira instância, pelo Pentágono, CIA, M19 e Mossad. A “democratização” imperialista da África e da Ásia, controlada pela casta militar umbilicalmente ligada aos amos do grande capital, reedita, de forma ainda mais burlesca no século XXI e naquela parte do globo, os processos de transição das ditaduras militares para as democracias tuteladas, de abertura lenta e gradual da América Latina nos anos 1980 sob a pressão de jornadas de greves operárias e levantes populares em nosso continente. Todavia, o que acontece com o desvio da luta de nossos irmãos africanos e asiáticos expressa justamente o espirito reacionário de nosso momento histórico e a desfavorável correlação de forças para os trabalhadores na guerra entre as classes, criadas com o triunfo da contrarrevolução nos antigos Estados Operários da URSS e Europa e o AVANÇO DESIGUAL E COMBINADO DA RESTAURAÇÃO CAPITALISTA na China, Vietnã, Cuba e Coréia do Norte. Guardadas suas diferenças, a atual ofensiva imperialista contra a Líbia disfarçada de guerra civil tem o mesmo significado como divisor de águas da esquerda mundial que a guerra das Malvinas representou. Incomparavelmente mais importantes do que as ONGs patrocinadas pela CIA, as novas tecnologias da comunicação (internet, facebook, twitter, etc.), os organismos internacionais e profissionais da contrarrevolução estão tratando de apropriar-se dos destinos da turbulência para impor uma nova derrota as massas e realizar uma recolonização sob o tacão de Obama, mais profunda e consistente do que a ofensiva militar de Bush. Se os novos governos não conseguirem impor a estabilização política pela via do engano e das promessas “democráticas”, o farão pela repressão tão ou mais truculenta do que nos piores dias dos ditadores que deixaram a cena política. O Bolchevique - Jan-Mar de 2011

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