MARANHAY - Revista Lazeirenta - 62 - JUNHO 2021

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MARANHAY (REVISTA DO LÉO) EDITADA POR

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Prefixo Editorial 917536

NUMERO 62 – JUNHO - 2021 MIGANVILLE – MARANHÃO


A presente obra está sendo publicada sob a forma de coletânea de textos fornecidos voluntariamente por seus autores, com as devidas revisões de forma e conteúdo. Estas colaborações são de exclusiva responsabilidade dos autores sem compensação financeira, mas mantendo seus direitos autorais, segundo a legislação em vigor.

EXPEDIENTE MARANHAY REVISTA LAZERENTA Revista eletrônica EDITOR Leopoldo Gil Dulcio Vaz Prefixo Editorial 917536 vazleopoldo@hotmail.com Rua Titânia, 88 – Recanto de Vinhais 65070-580 – São Luis – Maranhão (98) 3236-2076

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Nasceu em Curitiba-Pr. Licenciado em Educação Física (EEFDPR, 1975), Especialista em Metodologia do Ensino (Convênio UFPR/UFMA/FEI, 1978), Especialista em Lazer e Recreação (UFMA, 1986), Mestre em Ciência da Informação (UFMG, 1993). Professor de Educação Física do IF-MA (1979/2008, aposentado); Titular da UEMA (1977/89; Substituto 2012/13), Convidado, da UFMA (Curso de Turismo). Exerceu várias funções no IF-MA, desde coordenador de área até Pró-Reitor de Ensino; e Pró-Reitor de Pesquisa e Extensão; Pesquisador Associado do Atlas do Esporte no Brasil; Diretor da ONG CEV; tem 14 livros e capítulos de livros publicados, e mais de 350 artigos em revistas dedicadas (Brasil e exterior), e em jornais; Sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão; Membro Fundador da Academia Ludovicense de Letras; Membro da Academia Poética Brasileira; Sócio-correspondente da UBE-RJ; Premio “Antonio Lopes de Pesquisa Histórica”, do Concurso Cidade de São Luis (1995); a Comenda Gonçalves Dias, do IHGM (2012); Premio da International Writers e Artists Association (USA) pelo livro “Mil Poemas para Gonçalves Dias” (2015); Premio Zora Seljan pelo livro “Sobre Maria Firmina dos Reis” – Biografia, (2016), da União Brasileira de Escritores – RJ; Diploma de Honra ao Mérito, por serviços prestados à Educação Física e Esportes do Maranhão, concedido pelo CREF/21-MA (2020); Foi editor das seguintes revista: “Nova Atenas, de Educação Tecnológica”, do IF-MA, eletrônica; Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, edições 29 a 43, versão eletrônica; editor da “ALL em Revista”, vol. 1 a 6, eletrônica, da Academia Ludovicense de Letras; Editor da Revista do Léo, a que esta substitui (2017-2019). Condutor da Tocha Olímpica – Olimpíada Rio 2016, na cidade de São Luis-Ma.


EDITORIAL

A “MARANHAY – REVISTA LAZEIRENTA” é sucessora da “REVISTA DO LÉO”, e continua em seu formato eletrônico, disponibilizada através da plataforma ISSUU – https://issuu.com/home/publisher. Temos sócios-atletas fixos: Ceres Costa Fernandes, Fernando Braga (Brasília), e lá de Portugal, Jorge Bento. Alguns outros sócios-atletas aparecem devezenquandamente: José Neres, Antonio Ailton, Mhario Lincoln... Grato pela confiança... O Laércio, é sócio-proprietário... E assim segue... Fiquei na dúvida onde colocar o conto do Nonato Reis: se na sessão de lazer ou na de história(s) do Maranhão... cabe em ambas... essa é uma dúvida que sempre me assalta dada a qualidade dos escrivinhadores, em rememorar os fatos e atos de uma São Luís que não existe mais... acho que vou abrir – ou substituir – por uma nova, que bem retrata a vida da cidade: “JÁ TEVE...” ou “SÃO LUIS JÁ FOI ASSIM”; o que acham? Rafael – antes conhecido como o filho do Lino, e hoje, o Lino é conhecido como o pai do Rafael... – e JoãoZinho Freire – ambos ‘nordestinos’: Rafael, do Maranhão, João, da Paraíba – escrevem sobre dois temas que me são caros e aqui expressos nesta Revista: Esporte e Literatura... Já escrevemos sobre esse assunto – inclusive com apresentação de trabalhos em diversos congressos internacionais... Depois de charmarmos a atenção, inúmeros trabalhos começaram a aparecer em dissertações, teses, nas mais diversas áreas, não só educação física e esportes... Quanto à Fran Paxeco, na edição anterior coloquei sua contribuição para a fundação e fortalecimento da Faculdade de Direito de São Luis, atos e fatos; desta edição, e quem sabe, na próxima, assuntos relacionados com outros eventos -que não sobre a Faculdade de Direito – em que participou nos anos de 1918 e 1919; se houver espaço, vamos até 1920... Parece-nos que nada acontecia em São Luis, desde de festas de estudantes à recepção de autoridades, desde auxílio à náufragos, à implemento de atividades agrícolas, hospitalares, enfim, tudo, sem que ele estivesse presente, seja como jornalista, Consul, acadêmico, professor... elogios à sua importância, tanto para o Maranhão, quanto para Portugal, estão sempre relatadas nos jornais, daqui, do Rio, de Pernambuco, enfim, por todo o País...

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ EDITOR


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EXPEDIENTE EDITORIAL SUMÁRIO

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LAZER, ESPORTE, EDUCAÇÃO FÍSICA RAIMUNDO DA PALMELA E ZÉ BRITO, LENDAS DO RIO MARACU NONATO REIS O FUTEBOL DE RUA E A LITERATURA RAFAEL CASTELLANI & JOÃO BATISTA FREIRE CONSTRUÇÃO DE UMA ANTOLOGIA DE TEXTOS DESPORTIVOS DA CULTURA BRASILEIRA: PROPOSTA E CONTRIBUIÇÕES LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ; DELZUITE DANTAS BRITO VAZ ESPORTE & LITERATURA - MARANHÃO LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ; DELZUITE DANTAS BRITO VAZ O “SPORTMAN” ANTONIO LOPES DA CUNHA LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ ESPORTE & LITERATURA - ALUÍSIO AZEVEDO LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ ESPORTE COM IDENTIDADE CULTURAL LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ UM MUNDO ÀS AVESSAS JOSÉ MANUEL CONSTANTINO ATLAS DO ESPORTE NO MARANHÃO - CIDADES: TURIAÇU LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

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HISTÓRIA(S) DO MARANHÃO PADRE GABRIEL MALAGRIDA, O APÓSTOLO DO MARANHÃO: TORTURADO E MORTO PELO MARQUÊS DE POMBAL! DIOGO GAGLIARDO NEVES AÇAILÂNDIA, 40 ANOS EDMILSON SANCHES MANÉLIS E AS TARÔAS DO MARANHÃO!!! RAMSSES DE SOUSA SILVA HEMETÉRIO, O PROFESSOR ABOLICIONISTA DE CODÓ ANTONIO CARLOS LIMA OS REFRESCANTES SABORES DA ILHA E SEU MAGO CERES COSTA FERNANDES

NAVEGANDO COM JORGE OLIMPIO BENTO P’RA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DE POESIA... E DE POETAS NOITES DE VERÃO. AYMORÉ ALVIM “SEM TÍTULO” ROBERTOFRANKLIN

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NOTA DE REPÚDIO E EM SOLIDARIEDADE AO CONFRADE JEANDERSON MAFRA 4 POEMAS DE JEANDERSON MAFRA CARVALHO JUNIOR RAPAZ, OBRA RARA COM GOSTO DE SEMENTE E SÊMEN LEILA MICCOLÍS A DATA LITERÁRIA DA POESIA: EM 14 DE MARÇO, DIA DA POESIA NACIONAL. WYBSON CARVALHO RIQUEZA LITERÁRIA DO MARANHÃO: LUIZA CANTANHEDE A PRESENÇA DA MULHER NA LITERATURA MARANHENSE Maria Firmina Presente! DILERCY ADLER A IMPRENSA COMO LUGAR DE MEMÓRIA: a obra de Maria Firmina dos Reis nos jornais oitocentistas do Maranhão DILERCY ADLER FERNANDO FERREIRA DE LOANDA, UM POETA ESQUECIDO FERNANDO BRAGA

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MONOLOGO DA SOLIDÃO LUIZA CANTANHEDE O “MATERIALISMO DIALÉTICO” IMPLÍCITO NA POÉTICA DE JOÃO BATISTA DO LAGO JOÃO BATISTA DO LAGO A MORTE TRANSFORMADA CERES COSTA FERNANDES "O MAPA DA TRIBO", DE SALGADO MARANHÃO PAULO RODRIGUES EDMILSON SANCHES, O ENCONTRO DAS PEDRAS (POEMAS) NATANAEL LIMA JR O MULATO: UM ROMANCE MARANHENSE FERNANDO BRAGA

MEMÓRIAS & RECORTES LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ FRAN PAXECO – RECORTES & MEMÓRIAS – PARTE XVII

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LAZER, ESPORTE, EDUCAÇÃO FÍSICA


RAIMUNDO DA PALMELA E ZÉ BRITO, LENDAS DO RIO MARACU NONATO REIS Escritor - Autor de Lipe e Juliana, A Saga de Amaralinda, A Fazenda Bacazinho e Ossos do Ofício Sempre que viajo de carro para Viana e aquelas paisagens de campos e planícies verdejantes tomam a visão de assalto, a partir de Arari, vejo-me como que transportado para uma época remota. Quando a vida parecia girar numa rotação muito mais lenta e o cotidiano se resumia a um punhado de obrigações e brincadeiras. Não necessariamente nessa ordem, porque, sob a ótica de menino prestes a ingressar no mundo dos adultos, as diversões se sobrepunham aos deveres, como se o universo fosse um mundo encantado de riso e prazer. Até mesmo quando o compromisso assumia a ordem do dia, dava-se um jeito de suavizá-lo com as cores alegres da infância. Assim era na coivara do rio Maracu, onde novos e velhos se reuniam para pescar e vadiar. Se os peixes, enfastiados, corriam do anzol, alguém quebrava um pedaço de pau, danava-se a bater nas bordas da canoa. Outro mergulhava nas águas turvas do rio. De repente contava-se uma história engraçada... No rebuliço que se seguia, ninguém ficava normal, e até os peixes, como que fascinados por aquela aura de magia, voltavam a morder as iscas. Terminado o “compromisso” na coivara e entregue a pescaria para o tratamento devido, era a hora da ganzola na enseada de Atanásio Muniz. A ganzola é uma brincadeira em que se tenta atingir um ponto demarcado do rio, mergulhando, sem ser notado por aquele que faz o papel de sentinela. O cerco se prolongava até que, já pelo meio-dia, os pais, das janelas das casas, chamassem os filhos para o almoço. Depois da ceia – servida invariavelmente com peixe cozido, arroz branco e pirão de farinha de mandioca, entregavam-se todos à sagrada “sesta” que, ao contrário de outros lugares, no Ibacazinho se prolongava até as três da tarde, quando então se dava início ao conserto das tarrafas e redes de pesca. Lá pelas quatro e meia, um baque surdo, ritmado, no campo de Ribamar Cidreira, anunciava a pelada de todos os dias. Se era noite de lua, havia brincadeiras de sobra: casamento oculto, “cair no poço”, pegador, roda e por aí vai. Se não, a opção era o jogo de cartas na casa de Dudu Mendonça ou a reunião em volta do bule de café na cozinha da patriarca dos Mendonça, a minha avó Mariana. Havia, porém, em meio a esse leque de diversões, uma em especial que me atraía o olhar. Eram as porfias (apostas) em canoas ao longo do rio Maracu. A prática, passada de geração a geração, constituía uma herança indígena, numa época em que as margens do rio eram habitadas pelos Tupinambás e Tremembés. Nos anos setenta, o costume era de tal modo difundido que na ascensão de Nossa Senhora, em maio, organizavam-se torneios em Viana com dezenas de concorrentes. Entre os atletas do Ibacazinho, Zé Brito e Raimundo da Palmela construíram fama dentro e fora do município e não havia quem não os conhecesse pela exímia habilidade com os remos. Zé Brito era forte como um touro, pernas e braços atarracados. Remava num ritmo frenético do Ibacazinho a Viana e atingia o destino como se fosse um simples passageiro, calmo e risonho. Raimundo da Palmela parecia um gentleman, com sua voz tranquila e suave. Alto e esguio, quando pegava o remo ou a vara, sua figura forte e impávida fazia lembrar um príncipe. Ninguém se atrevia a dizer quem dos dois detinha supremacia sobre o outro. Como arqueiros que se medem e se reconhecem, eles próprios faziam de tudo para evitar um confronto direto. Até que um dia, fartos de tantas provocações, decidiram brindar os moradores do Ibacazinho com uma solene apresentação. Colocaram-se observadores na partida do Porto do Padre e também no destino, na Gurguéia, em Viana. Ao longo do trajeto de quatro quilômetros sobre as águas montaram guardas para aferir as prévias.


Eu, que sempre me declarei fã de Raimundo, cruzei os dedos por ele, o coração disparado, entre ansioso e preocupado. Não poderia jamais admitir uma derrota daquele que fora o meu primeiro ídolo. Um tiro de espingarda anunciou a partida. Remos a postos, lá se foram eles naquela corrida alucinada. Minutos depois, a notícia correu beirada, como se costuma dizer no Ibacazinho. Zé Brito e Raimundo da Palmela tocaram o chão lamacento da Gurgueia, precisamente no mesmo instante. Viajando num barquinho a motor, ainda cheguei a tempo de ver Raimundo se abanando com a aba do inseparável chapéu de palha, o suor a escorrer pelo rosto, e Zé Brito, ao seu lado às gargalhadas, como quem diz: “entre mortos e feridos, todos escaparam, meu compadre”.


O FUTEBOL DE RUA E A LITERATURA RAFAEL CASTELLANI & JOÃO BATISTA FREIRE

Em textos anteriores abordamos as contribuições da Pedagogia da Rua para a educação e, sobretudo, debatemos o que a Rua tem a nos ensinar, para o bem ou para o mal, para uma prática que seja mais significativa e prazerosa para os meninos e meninas que praticam o futebol em nosso país. Como beneficiar-se da Pedagogia da Rua em aulas de Educação Física nas escolas, ou aulas de esporte em clubes e escolas de futebol, quando há impedimentos de aulas práticas provocados pela chuva ou, como ocorre atualmente, pela necessidade de isolamento social causada pela pandemia? Entre outras providências, podemos nos apropriar de uma extraordinária riqueza cultural da sociedade brasileira: nossa literatura, rica em textos sobre o esporte. Neste artigo, tomaremos como referência um de seus maiores expoentes: Luís Fernando Veríssimo. Veríssimo pincelou em prosa o Futebol de Rua. Nossa proposta para este texto é abordar a crônica de Luís Fernando Veríssimo sobre o Futebol de Rua, discutindo-a à luz da Pedagogia. Não apresentaremos a crônica em sua totalidade, mas trechos dela para estabelecer com eles um diálogo. Em uma aula de Educação Física na escola, em dias de chuva, se não podemos ocupar os espaços abertos (quadra, campo, pátio, ou até as praças e ruas, se necessário), o lugar, por vocação, da Educação Física, ficaríamos em sala, entre outras coisas, lendo as palavras do escritor gaúcho com nossos alunos e refletindo sobre elas. Por que nos causa tanto desassossego a chuva, quando temos um lugar abrigado para ler, escrever, contar histórias? Não somos “Veríssimos”, mas nós e nossos alunos vivemos nossas histórias, as que passaram e as que estão acontecendo. Sala de aula serve à Educação Física nessas ocasiões. Não é o nosso nicho, seguramente, e não é para a preferirmos ao espaço aberto, pois que o espaço aberto da Educação Física rompe com a arquitetura tradicional de salas e carteiras e poderia servir a uma revolução pedagógica. Não vamos à sala de aula por um motivo qualquer, mas vamos por Veríssimo! E, quando a chuva passar, certamente teremos muito gosto em sair da sala e bater nossa bola lá fora, riscando a quadra para que vire rua, e fazendo nossos pés correrem atrás de alguma coisa que role. Logo no início de sua crônica, Veríssimo diz: “…existe um tipo de futebol ainda mais rudimentar do que a pelada. É o futebol de rua. Perto do futebol de rua qualquer pelada é luxo e qualquer terreno baldio é o Maracanã em jogo noturno”. A Rua, no seu significado mais amplo, coloca-nos em pleno exercício do desenvolvimento da criatividade, da vivência do lúdico e do próprio gesto motor. Jogadores criativos se desenvolvem no ambiente da Rua e não nos clubes onde, cada vez mais, são privados de se divertir e improvisar com as bolas nos pés. Ao ler com os alunos passagens como esta: “Futebol de rua é tão humilde que chama pelada de senhora”, começamos por aprender sobre a humildade, se visitamos a Rua. A Rua não tem compromisso com a educação formal, nem mesmo com formar para a vida, ela não se importa com o que vai acontecer no futuro. A pedagogia sim, é que deveria ser sábia o suficiente para ir à Rua aprender tudo o que ela tem a ensinar. Veríssimo se dedica, então, a descrever como seriam as “regras oficiais” do Futebol de Rua, caso elas existissem. Com alta dose de ironia, versa sobre a bola, as traves, o campo de jogo, o tempo das partidas, a formação dos times, o juiz, as interrupções, as penalidades, a tática, o intervalo, a justiça esportiva… cada “regra” traz inúmeros aprendizados do ponto de vista pedagógico, dentre os quais explicitaremos alguns. A bola é o elemento central de um jogo de futebol, certo? Errado! A bola oficial, para alguns, indispensável na escola ou nos clubes, é apenas um dos elementos que propiciam a materialização do jogo. Para Luís Fernando Veríssimo, “A bola pode ser qualquer coisa remotamente esférica. Até uma bola de futebol serve. No desespero, usa-se qualquer coisa que role, como uma pedra, uma lata vazia ou a merendeira do seu irmão menor”.Essa diversificação de objetos seria, ou não, fundamental para a construção de um maior e mais qualificado repertório motor? Na mesma passagem há outro aspecto importante, típico do Futebol de Rua: a disputa de forças e o modo como ela é resolvida. Se não há bola, mas há a merendeira do irmão menor, por que não chutá-la? Ao falar


das traves, apesar de destacar que elas podem ser feitas com o que estiver às mãos (na maioria das vezes com chinelos ou tijolos), o cronista ironiza dizendo que podem também ser feitas com as merendeiras do irmão menor ou até mesmo com ele próprio. Se a bola vai para debaixo do carro, quem busca? O irmão menor. É isso mesmo; a Rua educa para o bem ou para o mal. Pode ser injusta, como na opressão sobre o irmão menor, sobre os mais fracos, mas deixa a lição de que há um jogo de forças em questão, que a Pedagogia da Rua tem que reconhecer e saber como tratar. A Rua nos apresenta cotidianamente uma disputa de forças que se traduz no espaço a ser utilizado para o jogo, na escolha dos times, nos equipamentos, nos acordos, enfim, em quase tudo que se refere ao Futebol de Rua. Já que no Futebol de Rua não há juiz, como se resolvem as discussões e discordâncias durante o jogo? Não raramente, como dito nesta crônica, “os casos de litígio serão resolvidos no tapa”. E os mais fracos, os menores, com frequência levam desvantagem. Isso tudo se relaciona à autogestão do jogo, que a Rua nos ensina. Chega a nos impressionar a dificuldade que nossos alunos de hoje apresentam quando se trata de jogar sem a presença de um professor ou de um árbitro à beira da quadra/campo. Quando Veríssimo descreve as diversas ocasiões em que os jogadores, na Rua, resolvem facilmente os litígios, como entram em acordo com facilidade, como tornam desnecessária a presença de um juiz, ele desvela uma sabedoria que deveria servir de exemplo aos que praticam as pedagogias oficiais. Outro aspecto que vale ser destacado na bela crônica de Veríssimo, é a Rua ser um espaço de todos, ainda que não livre das disputas que já mencionamos. “O número de jogadores em cada equipe varia, de um a 70 para cada lado”. Cabem todos, desde que o espaço permita. Cabem todos, mas não sem que, mais uma vez, a disputa de forças se manifeste. “Algumas convenções devem ser respeitadas. Ruim vai para o golo. Perneta joga na ponta, a esquerda ou a direita dependendo da perna que faltar. De óculos é meia-armador, para evitar os choques. Gordo é beque”. Como esperamos ter explicitado, a educação da Rua é tão rica, e, por outro lado, tão subaproveitada, quanto as possibilidades de sua apropriação no ensino e prática do futebol são imensas. E a nossa literatura, em crônicas, prosas e versos – Veríssimo é somente um exemplo dentre tantos outros que temos disponíveis -, fortalece nosso entendimento acerca da importância da Rua, e daquilo que ela nos ensina para a prática do futebol nas escolas, clubes e “escolinhas”. Rafael Castellani - Formado em 2005 no curso de licenciatura em Educação Física pela Universidade Estadual Paulista (UNESP/ Rio Claro), Mestre em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e Doutor em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (USP), tem suas primeiras experiências acadêmicas circunscritas à Psicologia do Esporte e ao Futebol. Vinculado, desde o primeiro ano da graduação, a ambos os campos, buscou focar sua participação em grupos de estudos e pesquisas onde a relação entre eles fosse possível. Atualmente é diretor executivo do Centro Esportivo Virtual e coordenador de Projeto Social do Instituto Rhodia. João Batista Freire - João Batista Freire é professor aposentado da Unicamp e referência nacional no ensino do futebol. Autor de diversos livros entre eles o "Pedagogia do Futebol".


CONSTRUÇÃO DE UMA ANTOLOGIA DE TEXTOS DESPORTIVOS DA CULTURA BRASILEIRA: PROPOSTA E CONTRIBUIÇÕES LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Centro Federal de Educação Tecnológica do Maranhão DELZUITE DANTAS BRITO VAZ Centro de Ensino Médio "Liceu Maranhense" Resumo Através do resgate e do registro de manifestações culturais esportivas na literatura brasileira, procura-se reconstruir a história do esporte, do lazer e da educação física no Brasil. A exemplo do que acontece em França, Itália, Espanha e Portugal, propõem-se reunir textos literários da cultura brasileira, com o objetivo de reconstituir a trajetória do esporte em nosso país, com a construção de uma antologia brasileira de textos esportivos. Palavras-chave: Educação Física. Esportes. Literatura. História Abstract Through the rescue and the registration of sportive cultural manifestations in bra\ilian literature, one tries to reconstruct the history of sport, leisure and physical education in Brazil. From the example of what happens in France, Italy, Spain and Portugalit is proposed to gather in our country, with the construction of a brazilian anthology of sport texts. Key-words: Physical Education. Sports. Literature. History. Introdução: Em 1994, o Ministério da Educação e do Desporto - MEC - constituiu Grupo de Trabalho (MEE/INDESP, 1996) para elaborar a aproximação conceitual de Esporte e Cultura, iniciando-se, no Brasil, uma discussão sobre “Esporte de Criação Nacional”. Com a identificação do problema conceitual, se fez necessário desenvolver a dissecação do título. No instante em que se separa a idéia “Esporte” de um lado e “Criação Nacional” de outro, percebe-se a possibilidade de um desdobramento fértil. Enquanto o “esporte” pode ser entendido como um jogo, uma brincadeira, uma dança, um ritual, etc., o atributo de “criação nacional” por sua vez, pode ser entendido como de “Criação Cultural”, ou com “Identidade Cultural” (SANTIN, 1996). SILVA (1987), ao levantar a questão da perda dos valores culturais e da identidade cultural, afirma que somos um povo mesclado pelas mais diversas influências raciais, cujos traços são refletidos nas mais variadas formas de expressão artística: “Neste aspecto, é importante relembrar que os jesuítas foram os primeiros a transformar os hábitos culturais dos nossos índios, obrigando-os, pelo processo de catequese, a aprenderem os hinos e os sermões da Igreja Católica e, justamente com isso, os falsos preceitos de pecado e moral. “Assim como os índios, nossos irmãos escravos, vindos da África, sofrendo sob as garras da opressão dos senhores de engenho, tiveram de fazer seus cultos e brincadeiras às escondidas, sob a ameaça dos chicotes. Em suma, a cultura ibérica, através dos portugueses, infiltrou-se e aculturou-se na nossa realidade, clima e vegetação. “Sobre a questão da perda dos valores culturais, é importante deixar claro que a nossa atitude passiva de receptores de outras culturas é histórico, pois até hoje guardamos o peso dessa herança advinda da colônia que parece ainda não ter passado...”. (p. 20-21)


Considera, ainda, que a perda da identidade cultural traz como conseqüência a minimização da criatividade popular, tornando, assim, a sociedade imitativa e caricaturista de valores culturais estrangeiros, com o que concordam DIECKERT; KURZ & BRODTMANN (1985) quando afirmam que no Brasil deve haver uma educação física brasileira e critica o modelo internacional do esporte corporal do povo brasileiro, que possui a capoeira como uma das maiores riquezas, além de outros jogos, danças e ritmos. DIECKERT (1987) destaca ainda o quanto é importante que essas manifestações sejam resgatadas, para não se transformarem em peças de museu. Da mesma forma, Manuel Sérgio VIEIRA E CUNHA (1985), ao analisar um tipo de esporte baseado na cultura, enfatiza o significado dos jogos tradicionais das diversas formas de desporto popular e ainda das pequenas agremiações locais, que cedem lugar ao imperialismo do desporto-instituição, reprodutor e multiplicador das “taras do ter”. Para SILVA (1987), a perda desses valores levou a sociedade a explorar o corpo dos cidadãos como se fosse objeto e não sujeito, imprimindo-lhe gestos e movimentos ginástico-desportivos padronizados, reduzindo o acesso às danças e aos jogos da lúdica popular e resultando na perda da ludicidade, que deve ser compreendida como o estado de espírito que dispõe o homem a ser alegre e brincar livremente. O primeiro grande impasse surge quando se pergunta o que se entende por esporte e por lazer, dada a abrangência dos termos. Deve-se entender como esporte apenas as atividades lúdicas praticadas sob a orientação da ciência e da técnica? Apesar do costume vigente de tratar o esporte, o jogo e o brinquedo como três categorias distintas de atividades, não restam dúvidas de que se pode unificá-las sob o manto da criação cultural, embora reflitam valores culturais diversificados (HUIZINGA, 1980; SILVA, 1987; SANTIN, 1996; DAMASCENO, 1997). O esporte, como tema literário, aparece pela primeira vez com Píndaro, embriagado pelos feitos atléticos dos campeões olímpicos: "Durante a realização dos Jogos, desaguavam em Olímpia tudo o que na Grécia havia de artístico, filosófico e desportivo. Os poetas escancaravam o que lhes medrava na alma, os sofistas dialogavam com auditórios eruditos e os atletas competiam entre sí. Enfim, arte, filosofia e desporto num conúbio que muito enriqueceu a literatura grega. Já Homero poetizara as corridas de carros, mas literatura centrada no desporto... foi Píndaro o primeiro" (VIEIRA E CUNHA & FEIO, s.d: 9). Depois dele, muitos outros. "E no gaiato tagarelar das ruas de Atenas, o desporto nascia como verdadeiro fenômeno cultural". Virgílio, Horácio, Tíbulo, Propércio, em Roma; Dante e Petrarca, na Idade Média; Rebelais, Cervantes, Camões, Francisco de Quevedo, Jeronimo Mercurialis, Rousseau, na Idade Moderna. VIEIRA E CUNHA & FEIO (s.d.) justificam a feitura de uma antologia portuguesa de textos esportivos afirmando que o desporto, ao contrário do senso-comum que se tem dessa manifestação, não se resume a "uma atividade meramente corporal que, no setor da ciência, se confunde com a Medicina, no campo da convivência, com a expresso apaixonada da agressividade natural e manifestando o mais redondo desconhecimento pelo mundo da cultura" (p. 7). Afirmam ser o desporto uma pujante afirmação de cultura; uma síntese original de criação artística e de contemplação estética; um meio de educação e de comunicação de excepcional valia; e um "fenômeno social capaz de concorrer à Paz, à Saúde, à Tolerância, à Liberdade, à Dignidade Humana" (p. 8): "Ainda integrado na luta pela compreensão do desporto, permitimo-nos recordar que a Cultura Física é uma Ciência do Homem e como tal deve ser analisada, estudada, praticada, difundida e... defendida! Daí que, ao nível da interdisciplinaridade com outros ramos do saber, não seja demasiado encarecer quanto à educação física e os desportos dialecticamente se relacionam, quer com as outras Ciências do Homem, quer com as Ciências da Natureza e as Ciências LógicoDedutivas..." (VIEIRA E CUNHA & FEIO, s.d.: 8). Também na Literatura Brasileira é significativa a presença de escritores a evidenciarem uma simpatia pela prática desportiva. O objetivo deste estudo é o de, articulando-se o trabalho de investigação e o trabalho de resgate, recuperar e organizar fontes literárias e documentais, procurando reagrupá-las, tornando-as


pertinentes, para constituírem um conjunto através do qual a memória coletiva passe a ser valorizada, instituindo-se em patrimônio cultural (FAVERO, 1994). A Atenas brasileira Na literatura dos viajantes, ABBEVILLE (1975:236) foi quem primeiro registrou, no Maranhão, as atividades dos primitivos habitantes da terra. Para esse autor é por não terem ambições materiais que os índios da Ilha do Maranhão têm na dança o primeiro e principal exercício; além da dança, têm como exercício a caça e a pesca. Já SPIX e MARTIUS afirmam serem os Jês hábeis nadadores, havendo o registro de serem também grandes corredores: "... timbiras de canela fina (corumecrãs)... famosos pela velocidade na corrida, esses índios enrolavam suas pernas com fios de algodão que acreditavam afinar-lhes as pernas e proporcionar-lhes leveza para correr..." (citados por CALDEIRA, 1991:77-78). A literatura maranhense tem início com o surgimento da imprensa. RAMOS (1986), escrevendo sobre o seu aparecimento no Maranhão registra, no período colonial, que "... jornalista era o magnífico João Tavares com sua 'Informação das recreações do Rio Munin do Maranhão'...". No período imperial registra-se o aparecimento de inúmeros jornais políticos e literários, coletâneas de poesia e de peças teatrais, sendo publicados entre 1821 e 1860, 183 jornais (RAMOS, 1986, 1992), a grande maioria de caráter político. Os jornais com objetivo de recrear - de caráter literário, recreativo, científico e/ou instrutivo - foram: a "Folha Medicinal", de 1822; o "Minerva", de 1827; "A Bandarra", 1828. Apenas esses dois últimos, dos 21 jornais do período de 1821 a 1830 dedicaram-se a divulgar literatura. Alguns periódicos tiveram contribuições de Sotero dos Reis, Odorico Mendes, João Lisboa (RAMOS, 1986). RAMOS (1992) ainda registra o aparecimento em 1831, do "Atalaia dos Caiporas"; em 1839, do "O Recreio dos Maranhenses”; 1840, de "A Revista"; "O Jornal Maranhense" aparece em 1841. Periódico oficial, trazia como epígrafe uma frase de Tímon: "a verdadeira educação de um Povo livre faz-se nos jornais". De 1842, são o "Museu Maranhense", " O Publicador Maranhense"; de 1845, o "Jornal de Instrução e Recreio",. "O Almazém"; de 1846, "O Arquivo Maranhense", contando com Gonçalves Dias, ainda jovem e interessado em teatro, dentre seus colaboradores. Escreveu em seu primeiro número: "Fiéis ao nosso programa, o nosso fim continua a ser - a Instrução e o Recreio -..." (RAMOS, 1992: 121). De 1849, a "Revista Universal Maranhense”. O "Jornal de Tímon", publicado em fascículos de 1852 a 1854, foi, no dizer de Viveiros de Castro (citado por RAMOS, 1992), "revista literária, de publicação mensal, na qual João Francisco Lisboa conquistou muito justamente a nomeada de um dos primeiros prosadores da língua portuguesa" (p. 189). Ainda desse ano de 1852, "A Marmotinha". Nos anos seguintes aparece "A Violeta" (1853); "O Botão de Ouro" e "A Sentinela" (1854); de 1855 é o "Diário do Maranhão"; em sua edição de 23.10.1855, número 41, é informado que "tivemos a satisfação de ler um novo jornal recreativo intitulado "A Saudade", dedicado ao belo sexo maranhense". (RAMOS, 1991: 213). De 1857 é "A Estrela da Tarde"; de 1858, o "Jornal do Comércio. O "Verdadeiro Marmota", jornal literário, foi saudado, em 1860, nestes termos elogiosos: "reaparece este interessante jornal, depois de ter por algum tempo, pela indolência e lassidão, que geralmente ataca os jornais recreativos nesta província..." (citado por RAMOS, 1992:237). Em 1860, contando com uma população de 35 mil pessoas, São Luís tinha matriculado em suas escolas primárias 2 mil rapazes e 400 moças e no secundário, 180. Esses poucos números mostram que era muito reduzido o número de pessoas que acediam à leitura. O ensino primário havia se desenvolvido desde a independência. Em 1838 é inaugurado o "Liceu Maranhense", dirigido pelo famoso gramático Francisco Sotero dos Reis. O Liceu passou a substituir os preceptores dos filhos da burguesia comercial e da oligarquia rural (MÉRIAN, 1988). No entender de Dunshee de Abranches, a fundação desse colégio, logo seguido do colégio das Abranches, do Colégio do Dr. Perdigão e de tantos outros, contribuiu para com o progresso da educação mental da juventude, levando o Maranhão tornar-se, de fato e de direito, a Atenas brasileira. Dois autores maranhenses Dunshee de Abranches João Dunshee de Abranches Moura nasceu à Rua do Sol, 141, em São Luís do Maranhão. Advogado, polimista, historiador, sociólogo, crítico, romancista, poeta, jornalista, parlamentar e internacionalista. Dentre


seus escritos, destaca-se a trilogia constituída pelo “A Setembrada”, “O Captiveiro”, e “A Esfinge do Grajaú” (GASPAR, 1993). Em “A Setembrada”, escrita sobre a forma de romance histórico, relata de forma viva e humana a face maranhense da Revolução Liberal de 1831. Publicado em 1933, confere uma atuação de primeiro plano a dois ascendentes seus: Garcia de Abranches, seu avô e Frederico Magno de Abranches, seu tio. Referindo-se ao Fidalgote, como era conhecido Frederico Magno, seu sobrinho relembra que: “... Os dois namorados [Frederico e Maricota Portinho] tiveram assim, momentos felizes de liberdade e de alegria, fazendo longos passeios pelos bosques, em companhia de Milhama, ou passando horas inteiras a jogar a péla de que o Fidalgote era perfeito campeão” (DUNSHEE DE ABRANCHES, 1970:31). GRIFI (1989), ao se referir aos jogos de bola, encontrou que Galeno, “o famoso médico grego”, recomendava tal prática para fins higiênicos e até mesmo escreveu um tratado específico sobre “o jogo da pequena bola”. Mas os jogos de bola, na Grécia, já aparecem nos poemas homéricos (p. 68). Mais adiante, afirma que nos séculos XIV, XV, e XVI destacou-se mais que os outros os jogos da bola, que se se fundiu às manifestações folclorísticas, no novo contexto das estruturas renascentistas: “Na França, particularmente, a bola (de dimensões maiores da normal), nascido no tardomedievo, como instrumento de contenda incruenta, torna-se momento lúdico e agonístico, aberto a todos. Os jogos mais conhecidos são a paume, o pallone, a soule, a crosse, aos quais seguiramse, na Itália, o calcio-fiorentino, o pallone al bracciale, a pallacorda, a palla al vento, a pallamaglio, o tamburello (...) A paume (jeu de paume) consiste em bater a bola com a mão e substituiu os ludus pilae cum palma romano; conhecido já no século XII foi jogado melhor no período sucessivo, até dar vida ao atual tênis. “ (p. 188). O “O Captiveiro”, não é apenas um livro de memórias. Escrito em 1938 para comemorar o cinqüentenário da abolição da escravatura e o centenário da Balaiada, trava-se, na verdade de registros de acontecimentos políticos e sociais do Maranhão (GASPAR, 1993). Numa de suas passagens, descreve as lutas entre brasileiros (cabras) e portugueses (puças), republicanos e monarquistas, abolicionistas e negreiros, que para defenderem seus ideais, passam a criar periódicos e grêmios recreativos de múltiplas denominações para defesa de seus ideais. Dessa mania surge a "Arcadia Maranhense", e de uma sua dissidência, a "Aurora Litteraria". Para ridicularizar os membros desta última, aparece um jornaleco denominado "Aurora Boreal": "... só faltava fundar-se o Club dos Mortos. E justificou [Raymundo Frazão Cantanhede] tão original proposta dizendo que, se tal fizéssemos, iríamos além dos positivistas: ficaríamos mortos-vivos e assim seríamos governados por nós mesmos". (ABRANCHES, 1941:174). O Clube dos Mortos reunia-se no porão da casa dos Abranches, no início da Rua dos Remédios, conforme relata Dunshee de ABRANCHES (1941) em suas memórias: "E como não era assoalhado nem revestido de ladrilhos, os meus paes alli instalaram apparelhos de gymnastica e de força para exercícios physicos (...) E, não raras noites, esse grupo juvenil de improvisdos athletas e plumitivos patriotas acabava esquecendo os seus planos de conjuração e ia dansar na casa do Commandante Travassos ... Apezar de só ter uma filha, agasalhava na sua hospitaleira residência uma parentella basta e jovial, em que superabundava o sexo frágil. Não faltavam pianistas, violinistas, e cantores nesse grupo variegado de moças casadeiras e gentis. Os saraus ali se succediam desde as novenas de N. S. dos Remédios á véspera de Reis. Era que, todos os annos, a família Travassos armava um presépio. Os ensaios das Pastorinhas iniciavamse desde fins de Outubro; e, depois delles fatalmente seguiam-se dansas até á meia-noite...". (p. 187-188). Nessa mesma obra, Dunshee de ABRANCHES (1941) lembra que o "Velho Figueiredo, o decano dos fígaros de São Luís" (p. 155), mantinha em sua barbearia - a princípio na Rua Formosa e depois mudada para o Largo do Carmo - um bilhar, onde "ahí que se reuniam os meninos do Lyceo depois das aulas, e, às vezes, achavam refúgio quando a polícia os expulsava do pátio do Convento do Carmo por motivos de vaias dadas aos presidentes da Província e outras autoridades civis e militares. Essas vaias era quasi diárias...". (p. 157).


Em “A Esfinge do Grajaú”, também livro de memórias (ABRANCHES, 1993), deparamo-nos como uma abordagem eminentemente política, tendo como pano de fundo as teses republicanas (GASPAR, 1993). Lembra dos passeios a cavalo que fazia pelas manhãs, acompanhando o Dr. Moreira Alves, então Presidente da Província: "... Adestrado cavaleiro, possuindo um belo exemplar de montaria, incumbira-se ele (Anacleto Tavares) na véspera de conseguir para o ilustre político pernambucano um valente tordilho, pertencente ao solicitador Costa Santos e considerado o mais veloz esquipador da capital. Para fazer frente a esses reputados ginetes, Augusto Porto, meu futuro cunhado e sportman destemido, havia-me cedido o seu Vesúvio... Moreira Alves ganhara logo fama de montador insigne... o novo Presidente da Província conhecia a fundo a equitação... Para o espírito estreito de certa parte da sociedade maranhense, afigurava-se naturalmente estranho que fosse escolhido para ocupar a curul presidencial da Província um homem que se vestia pelos últimos figurinos de Paris, usava roupas claras, gostava de fazer longos passeios a pé pelas ruas comerciais...". (p. 16-17). Aluísio de Azevedo Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo nasceu em 14 de abril de 1857 em São Luís do Maranhão. Em sua infância e adolescência foi caixeiro e guarda-livros, demonstrando grande interesse pelo desenho. Torna-se caricaturista, colaborando em “O Fígaro”, “O Mequetrefe”, “Zig-Zag” e “A Semana Ilustrada”, jornais do Rio de Janeiro. Obrigado a retornar ao Maranhão, em 1878, pela morte do pai, abandona a carreira de caricaturista e inicia a do escritor. Publica em 1879 “Uma lágrima de mulher”. Com a publicação de “O Mulado”, em 1881, introduz o Naturismo no Brasil. Publica, ainda : Memórias de um condenado (1882); Mistério da Tijuca (1882); Casa de Pensão (1884); Filomena Borges (1884); O Homem (1887); O Coruja (1990); O Cortiço (1890); Demônios (1893); A Mortalha de Alzira (1894); Livro de Uma sogra (1895). Em 1895, abandona a carreira de escritor e torna-se diplomata (AZEVEDO, 1996). Aluísio Azevedo, em conto autobiográfico, afirma que, aos doze anos, estudante do Liceu, havia uma coisa verdadeiramente série para ele: "era brincar, estabelecendo-se entre minha divertida pessoa e a pessoa austera de meus professores a mais completa incompatibilidade". Narra as estripulias da época, em companhia dos amigos de infância: "Criado a beira-mar na minha ilha, eu adorava a água. Aos doze anos já era valente nadador, sabia governar um escaler ou uma canoa, amarrava com destreza a vela num temporal, e meu remo não se deixava bater facilmente pelo remo de pá de qualquer jacumariba pescador de piabas." (citado por MÉRIEN, 1988: 47). Um dos fundadores de “O Pensador” (1879), jornal anticlerical, publica várias crônicas onde traça um perfil da mulher maranhense, e sua condição de mulher em uma sociedade escravocrata, cujo papel reservado era apenas o de mãe. Compara a mulher da burguesia maranhense à lisboeta desocupada, denunciando o ócio em que viviam. Como igualmente denunciava "o ócio dos padres que viviam do trabalho de pessoas honestas e crédulas" (MÉRIEN, 1988:158), sendo estes, os padres, também "culpados pelo atraso da instrução pública" (p. 159). Aluísio considerava que todo o mal vinha do ócio e da preguiça das mulheres e apenas uma mudança na educação e na concepção do casamento poderia permitir a realização da mulher: "Do procedimento da mulher (...) depende o equilíbrio social, depende o equilíbrio político, depende todo o estado patológico e todo o desenvolvimento intelectual da humanidade (...) Para extinguir essa geração danada, para purgar a humanidade desse sífilis terrível, só há um remédio: é dar à mulher uma educação sólida e moderna, é dar à mulher essa bela educação positivista, que se baseia nas ciências naturais e tem por alvo a felicidade comum dos povos. É preciso educála física e moralmente, prepará-la por meios práticos e científicos para ser boa mãe e uma boa cidadã; torná-la consciente de seus deveres domésticos e sociológicos; predispor-lhe o organismo para a procriação, evitar a diásteses nervosa como fonte de mil desgraças, dar-lhe uma boa ginástica e uma alimentação conveniente à metiolidade de seus músculos, instruí-la e obrigá-la principalmente a trabalhar... “. (Aluísio AZEVEDO, Crônica, "O Pensador", São Luís, 10.12.1880, citado por MÉRIEN, 1988:166, 167).


O mesmo tema é retomado quando da publicação de "O Mulato", criando-se enorme polêmica na imprensa, ora acusando o autor, ora vozes se levantando para defendê-lo acerca de sua posição sobre a condição feminina. Aluísio tinha consciência que parte dos leitores em potencial era constituída pelas mulheres da pequena burguesia portuguesa e maranhense da cidade e pelas filhas dos fazendeiros que encontravam na leitura uma diversão contra o tédio que pesava sobra a vida cotidiana e ociosa que tinham. No entender de MÉRIEN (1988), os discursos de Raimundo sobre a condição feminina, o papel da esposa e da mãe na educação das crianças, são dirigidos mais a elas do que a Manuel Pescada: "O senhor tem uma filha, não é verdade? Pois bem! Logo que essa filha nasceu o senhor devia ter em vista prepará-la para vir a ser útil... dar-lhe exercícios, alimentação regular, excelente música, estudos práticos e principalmente bons exemplos; depois evitar que ela fosse como é de costume aqui, perder nos bailes o seu belo sono de criança...". (Aluizio AZEVEDO, O Mulato, 1881). Dois amigos de Aluísio Azevedo, Paulo Freire e Luís de Medeiros, fazem publicar cartas sob pseudônimo Antonieta (carta a Julia, "Diário do Maranhão", São Luís, 6.6.1881) e Júlia (carta a Antonieta, "Pacotilha", São Luís, 9.6.1881), respectivamente - falando “de suas impressões e do impacto que o livro lhes causara" sobre a condição de vida de Ana Rosa, que lembrava a vida que as mocinhas maranhenses levavam (MÉRIEN, 1988:291). Julia/Luís de Medeiros faz longas considerações sobre a condição da mulher maranhense, "lastimando-se da educação retrógrada que recebera em sua família e no colégio" (p. 290), onde fora do português, não se ensinava mais nada às moças além de algumas noções de francês, de canto, de piano e de bordado. Para ela, "a falta de exercícios físicos é a origem das perturbações do sistema nervoso que atingem a maioria das moças maranhenses" (p. 290). A preocupação social é um traço marcante na obra de Aluízio, que buscava, com aguda capacidade de observação, compreender científicamente os elementos determinantes da realidade do Brasil. Em "O Mulato", faz uma descrição permenorizada dos costumes da São Luís nos idos de 1880, época em que aparece seu romance: "As crianças nuas, com as perninhas tortas pelo costume de cavalgar as ilhangas maternas, as cabeças avermelhadas pelo sol, a pele crestada, os ventres amarelentos e crescidos, corriam e guinchavam, empinando papagaios de papel." (p. 9). Conclusão A literatura ajuda-nos a compreender melhor o mundo que nos cerca, quando descreve a sociedade em que a história se passa. Pode ser usada como fonte de pesquisa, ao se identificar, na narrativa, as manifestações de caráter esportivo, recreativo e de lazer. Buscou-se em dois autores maranhenses - Aluízio Azevedo e Dunshe de Abranches - trechos em que se referem à cultura corporal no Maranhão, no século XIX, com o objetivo de reconstituir a trajetória do esporte em nosso país, com a construção de uma antologia brasileira de textos esportivos. Referências bibliográficas ABBEVILLE, Claude d'. HISTÓRIA DA MISSÃO DOS PADRES CAPUCHINHOS NA ILHA DO MARANHÃO E TERRAS CIRCUNVIZINHAS. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1975. ABRANCHES, Dunshe de A SETEMBRADA - A REVOLUÇÃO LIBERAL DE 1831 EM MARANHÃO romance histórico. Rio de Janeiro: Jornal do Brasil, 1970. ABRANCHES, Dunshee de. O CAPTIVEIRO (MEMÓRIAS). Rio de Janeiro: (s.e.), 1941 ABRANCHES, Dunshee de. A ESFINGE DO GRAJAÚ (MEMÓRIAS). São Luís: ALUMAR, 1993. AZEVEDO, Aluísio. O MULATO. Rio de Janeiro: Tecnoprint, (s.d.). AZEVEDO, Aluísio. O CORTIÇO. 29 ed. São Paulo: Ática, 1996. CALDEIRA, José de Ribamar C. O MARANHÃO NA LITERATURA DOS VIAJANTES DO XIX. São Luís : AML/SIOGE, 1991.

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Paulo

MÉRIAN, Jean Yves. ALUÍSIO AZEVEDO VIDA E OBRA (1857-1913) - O VERDADEIRO BRASIL DO SÉCULO XIX. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo: Banco Sudameris Brasil; Brasília: INL, 1988. MINISTÉRIO EXTRAORDINÁRIO DOS ESPORTES. INDESP. COLETÂNEAS: DESPORTO COM IDENTIDADE CULTURAL. Brasília, 1996. RAMOS, Clóvis. OS PRIMEIROS JORNAIS DO MARANHÃO. São Luís: SIOGE, 1986. RAMOS, Clóvis. OPINIÃO PÚBLICA MARANHENSE: JORNAIS ANTIGOS DO MARANHÃO (1831 a 1861). São Luís: SIOGE, 1992 SANTIN, Silvino. Esporte: identidade cultural. COLETÂNEA INDESP - DESPORTO COM IDENTIDADE CULTURAL, Brasília, 1996, p. 13-26. SILVA, Maurício Roberto da. Resgate da cultura popular na educação: uma perspectiva educacional libertadora no contexto da educação física escolar. REVISTA ARTUS, Rio de Janeiro, n. 20, dezembro de 1987, p. 17-25. VIEIRA E CUNHA, Manuel Sérgio; FEIO, Noronha. HOMO LUDICUS - ANTOLOGIA DE TEXTOS DESPORTIVOS DA CULTURA PORTUGUESA. vol. 1 e 2. Lisboa: Compendium, (s.d.).


ESPORTE & LITERATURA - MARANHÃO LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Mestre em Ciência da Informação – CEFET-MA DELZUITE DANTAS BRITO VAZ Especialista em Metodologia do Ensino - CEM “Liceu Maranhense" Resumo Através do resgate e do registro de manifestações culturais esportivas na literatura maranhense, procura-se reconstruir a história do esporte, do lazer e da educação física, propõe-se reunir textos literários da cultura brasileira, com o objetivo de reconstituir a trajetória do esporte em nosso país, com a construção de uma antologia brasileira de textos esportivos. Palavras-chave: Educação Física. Esportes. Literatura. Abstract Through the rescue and the registration of sportive cultural manifestations in Maranhão literature, one tries to reconstruct the history of sport, leisure and physical education, is proposed to gather in our country, with the construction of a brazilian anthology of sport texts. Key-words: Physical Education. Sports. Literature. Introdução: O esporte, como tema literário, aparece pela primeira vez com Píndaro, embriagado pelos feitos atléticos dos campeões olímpicos. Depois dele, muitos outros: Virgílio, Horácio, Tíbulo, Propércio, em Roma; Dante e Petrarca, na Idade Média; Rebelais, Cervantes, Camões, Francisco de Quevedo, Jeronimo Mercurialis, Rousseau, na Idade Moderna (Vieira e Cunha & Feio, s.d). Justificam a feitura de uma antologia de textos esportivos afirmando que o desporto, ao contrário do sensocomum que se tem dessa manifestação, não se resume a "uma atividade meramente corporal que, no setor da ciência, se confunde com a Medicina, no campo da convivência, com a expressão apaixonada da agressividade natural e manifestando o mais redondo desconhecimento pelo mundo da cultura" (p. 7). Afirmam ser o desporto uma pujante afirmação de cultura; uma síntese original de criação artística e de contemplação estética; uma meio de educação e de comunicação de excepcional valia; e um "fenômeno social capaz de concorrer à Paz, à Saúde, à Tolerância, à Liberdade, à Dignidade Humana" (p. 8). Também na Literatura Brasileira é significativa a presença de escritores a evidenciarem uma simpatia pela prática esportiva. O objetivo deste estudo é o de, articulando-se o trabalho de investigação e o trabalho de resgate, recuperar e organizar fontes literárias e documentais, procurando reagrupá-las, tornando-as pertinentes, para constituírem um conjunto através do qual a memória coletiva passe a ser valorizada, instituindo-se em patrimônio cultural (Favero, 1994). A Atenas brasileira Na literatura dos viajantes, ABBEVILLE (1975:236) foi quem primeiro registrou, no Maranhão, as atividades dos primitivos habitantes da terra. Para esse autor é por não terem ambições materiais que os índios da Ilha do Maranhão têm na dança o primeiro e principal exercício; além da dança, têm como exercício a caça e a pesca. Já SPIX e MARTIUS afirmam serem os Jês hábeis nadadores, havendo o registro de serem também grandes corredores: "... timbiras de canela fina (corumecrãs)... famosos pela velocidade na corrida, esses índios enrolavam suas pernas com fios de algodão que acreditavam afinar-lhes as pernas e proporcionar-lhes leveza para correr ..." (citados por Caldeira, 1991:77-78).


A literatura maranhense tem início com o surgimento da imprensa. Ramos (1986), escrevendo sobre o seu aparecimento no Maranhão registra no período colonial, que "... jornalista era o magnífico João Tavares com sua 'Informação das recreações do Rio Munin do Maranhão'...". No período imperial registra-se o aparecimento de inúmeros jornais políticos e literários, coletâneas de poesia e de peças teatrais, sendo publicados entre 1821 e 1860, 183 jornais (Ramos, 1986, 1992), a grande maioria de caráter político. Em 1860, contando com uma população de 35 mil pessoas, São Luís tinha matriculado em suas escolas primárias 2 mil rapazes e 400 moças e no secundário, 180. Esses poucos números mostram que era muito reduzido o número de pessoas que acediam à leitura. O ensino primário havia se desenvolvido desde a independência. Em 1838 é inaugurado o "Liceu Maranhense", dirigido pelo famoso gramático Francisco Sotero dos Reis. O Liceu passou a substituir os preceptores dos filhos da burguesia comercial e da oligarquia rural (Mérian, 1988). No entender de Dunshee de Abranches, a fundação desse colégio, logo seguido do colégio das Abranches, do Colégio do Dr. Perdigão e de tantos outros, contribuiu para com o progresso da educação mental da juventude, levando o Maranhão tornar-se, de fato e de direito, a Atenas brasileira. Alguns autores maranhenses Vaz e Vaz (2000) apresentaram uma proposta e algumas contribuições para a “construção de uma antologia de textos esportivos da cultura brasileira” durante o VII Congresso Brasileiro de História da Educação Física, Esportes, Lazer e Dança, realizado em Gramado. Abordaram a contribuição de dois autores maranhenses: João DUNSHEE DE ABRANCHES Moura e ALUÍSIO Tancredo Gonçalves DE AZEVEDO. Agora, trazem outros autores maranhenses que trataram do esporte em sua obra: Henrique Maximiano COELHO NETTO - nasceu em Caxias, Maranhão no dia 20 de fevereiro de 1864 faleceu no Rio de Janeiro no dia 28 de novembro de 1934. Foi para o Rio de Janeiro com dois anos de idade; estudou Medicina e Direito mas não concluiu nenhum dos cursos. Em 1885 relacionou-se com José do Patrocínio, que o introduziu na relação da Gazeta da Tarde; nesse jornal deu início à sua Lista Abolicionista e Republicana. Em 1891, foi publicada sua primeira obra "Rapsódias", um livro de contos. Dedicou-se a literatura com entusiasmo, publicando obras atrás de obras. Escreveu algumas peças teatrais, mais de cem livros e cerca de 650 contos. Foi também um orador de grandes recursos; em 1909 foi catedrático da mesma matéria. Foi deputado na Legislatura de 1909 a 1911; esteve em Buenos Aires como Ministro Plenipotenciário, em Missão Especial. Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. Em 1928, foi consagrado como "Príncipe dos Prosadores Brasileiros". De sua extensa obra literária, destacam-se: "A Capital Federal", "Fruto Proibido", "O Rei Fantasma", "Contos Pátrios", "O Paraíso", "Mano", "As Estações", "Sertão", "Mistério do Natal", "Fogo Fátuo" e "A Cidade Maravilhosa". Também poeta, escreveu um soneto que se tornaria famoso: "Ser Mãe"; Coelho Neto é o exemplo de fidelidade e dedicação às letras. Em várias de suas crônicas, tratou dos esportes; na revista “O Bazar”, em 1922, escreveu sobre a capoeira, em uma crônica intitulada “O NOSSO JOGO”: “... Concordamos in limini com o que diz o articulista, valho-me da oportunidade que me abre tal escrito para tornar a um assunto sobre o qual já me manifestei e que também já teve por ele a pena diamantina de Luiz Murat. “A capoeiragem devia ser ensinada em todos os colégios, quartéis e navios, não só porque é excelente ginástica, na qual se desenvolve, harmoniosamente, todo o corpo e ainda se apuram os sentidos, como também porque constitui um meio de defesa pessoal superior a todos quantos são preconizados pelo estrangeiro e que nós, por tal motivo apenas, não nos envergonhamos de praticar. (negrito do Editor) “Todos os povos orgulham-se dos seus esportes nacionais, procurando, cada qual dar primazia ao que cultiva. O francês tem a savate, tem o inglês o boxe; o português desafia valentes com o sarilho do varapau; o espanhol maneja com orgulho a navalha catalã, também usada pelo "fadista" português; o japonês julga-se invencível com o seu jiu-jitsu e não falo de outros esportes clássicos em que se treinam, indistintamente, todos os povos, como a luta, o pugilato a mão livre, a funda e os jogos d`armas. Nós, que possuímos os segredos de um dos exercícios mais ágeis e elegantes, vexamo-nos de o exibir e, o que mais é, deixamo-nos esmurraçar em ringues por machacazes balordos que, com uma quebra de corpo e um passe baixo, de um "ciscador" dos nossos, iriam mais longe das cordas do que foi Dempsey à repulsa do punho de Firpo.


“O que matou a capoeiragem entre nós foi...a navalha. Essa arma, entretanto, sutil e covarde, raramente aparecia na mão de um chefe de malta, de um verdadeiro capoeira, que se teria por desonrado se, para derrotar um adversário, se houvesse de servir do ferro. “Os grandes condutores de malta " guaymús e nagôs, orgulhavam-se dos seus golpes rápidos e decisivos e eram eles, na gíria do tempo: a cocada, que desmandibulava o camarada ou, quando atirada ao estomago, o deixava em síncope, estabelecido no meio da rua, de boca aberta e olhos em alvo; o grampeamento, lanço de mão aos olhos, com o indicador e o anular em forquilha, que fazia o mano ver estrelas; o cotovelo em ariete ao peito ou ao flanco; a joelhada; o rabo de raia, risco com que Cyriaco derrotou em dois tempos, deixando-o sem sentidos, ao famoso campeão japonês de jiu-jitsu; e eram as rasteiras, desde a de arranque, ou tesoura, até a baixa, ou bahiana; as caneladas, e os pontapés em que alguns eram tão ágeis que chegavam com o bico quadrado das botinas ao queixo do antagonista; e, ainda, as bolachas, desde o tapa-olho, que fulminava, até a de beiço arriba, que esborcinava a boca ao puaia. E os ademanes de engano, os refugos de corpo, as negaças, os saltos de banda, à maneira felina, toda uma ginástica em que o atleta parecia elástico, fugindo ao contrário como a evitá-lo para, a súbitas, cair-lhe em cima, desarmando-o fazendo-o mergulhar num "banho de fumaça". “Era tal a valentia desses homens que, se fechava o tempo, como então se dizia, e no tumulto alguém bradava um nome conhecido como:Boca-queimada, Manduca da Praia, Trinca-espinha ou Trindade, a debandada começava por parte da polícia e viam-se urbanos e permanentes valendo-se das pernas para não entregarem o chanfalho e os queixos aos famanazes que andavam com eles sempre de candeias às avessas "Dessa geração celebérrima fizeram parte vultos eminentes na política, no professorado, no exército, na marinha como " Duque Estrada Teixeira, cabeça cutuba tanto na tribuna da oposição como no mastigante de algum paróla que se atrevesse a enfrentá-lo à beira da urna: capitão Ataliba Nogueira; os tenentes Lapa e Leite Ribeiro, dois barras; Antonico Sampaio, então aspirante da marinha e por que não citar também Juca Paranhos, que engrandeceu o título de Rio Branco na grande obra patriótica realizada no Itamaraty, que, na mocidade, foi bonzão e disso se orgulhava nas palestras íntimas em que era tão pitoresco. “A tais heróis sucederam outros: Augusto Mello, o cabeça de ferro; Zé Caetano, Braga Doutor, Caixeirinho, Ali Babá e, sobre todos o mais valente, Plácido de Abreu, poeta comediógrafo e jornalista, amigo de Lopes Trovão, companheiro de Pardal Mallet e Bilac no O COMBATE, que morreu, com heroicidade de amouco, fuzilado no túnel de Copacabana, e só não dispersou a treda escolta, apesar de enfraquecido, como se achava , com os longos tratos na prisão, porque recebeu a descarga pelas costas quando caminhava na treva, fiado na palavra de um oficial de nome romano. “Caindo de encontro às arestas da parede áspera ainda soergue-se, rilhando os dentes, para despedir-se com uma vilta dos que o haviam covardemente atraiçoado. Eram assim os capoeiras de então. “Como os leões são sempre acompanhados de chacais, nas maltas de tais valentes imiscuíam-se assassinos cujo prazer sanguinário consistia em experimentar sardinhas em barrigas do próximo, deventrando-as. “O capoeira digno não usava navalha: timbrava em mostrar as mãos limpas quando saia de um turumbamba. “Generoso, se trambolhava o adversário, esperava que ele se levantasse para continuar a luta porque: "Não batia em homem deitado"; outros diziam com mais desprezo: "em defunto". “Nos terríveis recontros de guaiamus e nagôs, se os chefes decidiam que uma questão fosse resolvida em combate singular, enquanto os dois representantes da cores vermelha e branca se batiam as duas maltas conservam-se à distância e, fosse qual fosse o resultado do duelo, de ambos os lados rompiam aclamações ao triunfador.


“Dado, porém, que, em tais momentos, estrilassem apitos e surgissem policiais, as duas maltas confraternizavam solidárias na defesa da classe e era uma vez a Força Pública, que deixava em campo, além do prestigio, bonés em banda e chanfalhos à ufa. “O capoeira que se prezava tinha oficio ou emprego, vestia com apuro e. se defendia uma causa, como aconteceu com do abolicionismo, não o fazia como mercenário. “O capanga, em geral, era um perrengue, nem carrapeta, ao menos , porque os carrapetas, que formavam a linha avançada, com função de escoteiros, eram rapazolas de coragem e destreza provadas e sempre da confiança dos chefes. “Nos morros do Vintém e do Néco reuniam-se, às vezes, conselhos nos quais eram severamente julgados crimes e culpas imputados a algum dos das farandulas. Ladrões confessos eram logo excluídos e assassinos que não justificassem com a legitima defesa o crime de que fossem denunciados eram expulsos e às vezes, até, entregues a policias pelos seus próprios chefes. “Havia disciplina em tais pandilhas. “Quanto às provas de superioridade da capoeiragem sobre os demais esportes de agilidade e força são tantas que seria prolixa a enumeração. “Além dos feitos dos contemporâneos de Boca queimada e Manduca da Praia, heróis do período áureo do nosso desestimado esporte, citarei, entre outros, a derrota de famosos jogador de pau, guapo rapagão minhoto, que Augusto Mello duas vezes atirou de catrambias no pomar da sua chacarinha em Vila Isabel onde, depois da luta e dos abraços de cordialidade, foi servida vasta feijoada. Outro: a tunda infligida um grupo de marinheiros franceses de uma corveta Pallas, por Zé Caetano e dois cabras destorcidos. A maruja não esteve com muita delonga e, vendo que a coisa não lhe cheirava bem em terra, atirou-se ao mar salvando-se, a nado, da agilidade dos três turunas, que a não deixavam tomar pé. “A última demonstração da superioridade da capoeiragem sobre um dos mais celebrados jogos de destreza deu-nos o negro Cyriaco no antigo Pavilhão Paschoal Segreto fazendo afocinhar, com toda a sua ciência, o jactancioso japonês, campeão do jiu-jitsu. “Em 1910, Germano Haslocjer, Luiz Murat e quem escreve estas linhas pensaram em mandar um projeto a Mesa da Câmara dos Deputados tornando obrigatório o ensino da capoeiragem nos institutos oficias e nos quartéis. Desistiram, porém, da idéia porque houve quem a achasse ridícula, simplesmente, por tal jogo era...brasileiro. “Viesse-nos ele com rótulo estrangeiro e tê-lo-íamos aqui, impando importância em todos os clubes esportivos, ensinado por mestres de fama mundial que, talvez, não valessem um dos nossos pés rapados de outrora que, em dois tempos, mandariam um Firpo ou um Dempsey ver vovó, com alguns dentes a menos algumas bossas de mais. “Enfim...Vamos aprender a dar murros " é esporte elegante, porque a gente o pratica de luvas, rende dólares e chama-se Box, nome inglês. Capoeira é coisa de galinha, que o digam os que dele saem com galos empoleirados no alto da sinagoga. “É pena que não haja um brasileiro patriota que leva a capoeiragem a Paris, batisando-a, com outro nome, nas águas do Sena, como fez o Duque com o Maxixe. “Estou certo de que, se o nosso patriotismo lograsse tal vitória até as senhoras haviam de querer fazer letras, E que linda seriam as escritas! Mas, se tal acontecesse, sei lá ! muitas cabeçadas dariam os homens ao verem o jogo gracioso das mulheres". Domingos VIEIRA FILHO em seu “Breve História das ruas e praças de São Luís” traça a história da Rua dos Apicuns, e dá-nos notícias de ser local freqüentado por "bandos de escravos em algazarra infernal que perturbava o sossego público", os quais, ao abrigo dos arvoredos, reproduziam certos folguedos típicos de sua terra natural: "A esse respeito em 1855 (sic) um morador das imediações do Apicum da Quinta reclamava pelas colunas do 'Eco do Norte" contra a folgança dos negros que, dizia, 'ali fazem certas brincadeiras ao costume de suas nações, concorrendo igualmente para semelhante fim todos pretos que podem


escapar ao serviço doméstico de seus senhores, de maneira tal que com este entretenimento faltam ao seu dever... ' (ed. de 6 de junho de 1835, S. Luís." O famoso Canto-Pequeno, situado na rua Afonso Pena, esquina com José Augusto Correia, era local preferido dos negros de canga ou de ganho em dias de semana, com suas rodilhas caprichosamente feitas, falastrões e ruidosos. VIEIRA FILHO (1971) afirma que ali alguns domingos antes do carnaval costumavam um magote de pretos se reunir em atordoada medonha, a ponto de, em 1863, um assinante do "Publicador Maranhense" reclamar a atenção das autoridades para esse fato. JOSUÉ MONTELLO em seu romance “Os Degraus do Paraíso”, em que trata da vida social e dos costumes de São Luiz do Maranhão, na passagem do século XIX para o século XX, conforme relato de Mestre Eli Pimenta: “... encontrei uma passagem interessante que fala da Capoeira naquela cidade e naquela época. O autor fala da inauguração da iluminação pública de São Luiz com lampiões de gás, ocorrida em 1863, e comenta as modificações na vida da cidade com a ruas mais claras durante a noite: "Ninguém mais se queixou de ter caído numa vala por falta de luz. Nem recebeu o golpe de um capoeira na escuridão. Os antigos archotes, com que os caminhantes noturnos iluminavam seus passos arriscados, não mais luziram no abandono das ruas." Eli Pimenta (Capoeira em São Luiz do Maranhão. In JORNAL DO CAPOEIRA, acessado em 26 de abril de 2005, disponível em http://www.capoeira.jex.com.br/) comenta que essa alusão à Capoeira encontrada em Os degraus do Paraíso nos passa a idéia de que capoeiristas perambulavam pelas ruas de São Luiz na primeira metade do século XIX, e não deixa de ser uma pista promissora de pesquisa para aqueles que querem descobrir a origem da Capoeira no Brasil. DEJARD Ramos MARTINS aceita a capoeira como o primeiro “esporte” praticado em Maranhão tendo encontrado referência à sua prática com cunho competitivo por volta de 1877. Considera que tenha sido praticada antes, trazida pelos escravos bandu-angoleses. Fugitivos, os negros a utilizavam como meio de defesa, exercitando-se na prática da capoeira para apurarem a forma física, ganhando agilidade. "JOGO DA CAPOEIRA "Tem sido visto, por noites sucessivas, um grupo que, no canto escuro da rua das Hortas sair para o largo da cadeia, se entretém em experiências de força, quem melhor dá cabeçada, e de mais fortes músculos, acompanhando sua inocente brincadeira de vozarios e bonitos nomes que o tornam recomendável à ação dos encarregados do cumprimento da disposição legal, que proíbe o incômodo dos moradores e transeuntes". (MARTINS, 1989, p. 179) NASCIMENTO DE MORAES em uma crônica que retrata os costumes e ambientes de São Luís em fins do século XIX e início do XX, publicada em 1915, utiliza o termo capoeiragem: “A polícia é mal vista por lá, a cabroiera dos outros também não é bem recebida e, assim, quando menos se espera, por causa de uma raparigota qualquer, que se faceira e requebra com indivíduo estranho ali, o rolo fecha, a capoeiragem se desenfreia e quem puder que se salve”. (2000, p. 95); em outro trecho da obra de Nascimento de Moraes, em que é mostrada com riqueza de detalhes uma briga, identificada como sendo a capoeira: “Ninguém melhor do que ele vibrava a cabeça, passava a rasteira. Armado de um ‘lenço’ roliço e pesado, espalhava-se com destreza irresistível, como se as suas juntas fossem molas de aço. Força não tinha, mas sabia fugir-se numa escorregadela dos pulsos rijos que avidamente o tentassem segurar no rolo. Torcia-se e retorcia-se, pulava, avançava num salto, recuava ligeiro noutro, dava de braço e pés para a direita e para a esquerda, aparando no ‘lenço’ as pauladas da cabroiera, que o tinha à conta dos curados por feiticeiros de todos os males. Atribuíam-lhe outros, a superioridade na luta, a certos sinais simbólicos feitos em ambos os braços, sinais que Aranha, muito de indústria, escondia ao exame dos curiosos, o que lhe aumentava o valor”.


Conclusão A literatura ajuda-nos a compreender melhor o mundo que nos cerca, quando descreve a sociedade em que a história se passa. Pode ser usada como fonte de pesquisa, ao se identificar, na narrativa, as manifestações de caráter esportivo, recreativo e de lazer. Buscou-se em alguns autores maranhenses trechos em que se referem à cultura corporal no Maranhão, com o objetivo de reconstituir a trajetória do esporte em nosso país, com a construção de uma antologia brasileira de textos esportivos. Referências bibliográficas ABBEVILLE, Claude d'. HISTÓRIA DA MISSÃO DOS PADRES CAPUCHINHOS NA ILHA DO MARANHÃO E TERRAS CIRCUNVIZINHAS. Belo Horizonte : Itatiaia; São Paulo : EDUSP, 1975. CALDEIRA, José de Ribamar C. O MARANHÃO NA LITERATURA DOS VIAJANTES DO SÉCULO XIX. São Luís : AML/SIOGE, 1991. COELHO NETTO, Henrique Maximiano. O nosso jogo. In O BAZAR, 1922, disponível em http://www.capoeira.jex.com.br/ ECCHO DO NORTE – jornal fundado em 02 de julho de 1834, e dirigido por João Francisco Lisboa, um dos líderes do Partido Liberal. Impresso na Typographia de Abranches & Lisboa, em oitavo, forma de livro, com 12 páginas cada número. Sobreviveu até 1836. FÁVERO, Maria de Lourdes Albuquerque, O espaço PROEDES : memória, pesquisa, documentação. IN GOLDFABER, José Luiz (org.). ANAIS DO IV SEMINÁRIO NACIONAL DE HISTÓRIA DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA. Belo Horizonte : FAPEMIG; São Paulo : Anna Blaume : Nova Stella, 1994. p. 100103. MARTINS, Dejard Ramos. ESPORTE: UM MERGULHO NO TEMPO. São Luís : SIOGE, 1989 MÉRIAN, Jean Yves. ALUÍSIO AZEVEDO VIDA E OBRA (1857-1913) - O VERDADEIRO BRASIL DO SÉCULO XIX. Rio de Janeiro : Espaço e Tempo : Banco Sudameris Brasil; Brasília : INL, 1988. RAMOS, Clóvis. OS PRIMEIROS JORNAIS DO MARANHÃO. São Luís : SIOGE, 1986. MONTELO, Josué. OS DEGRAUS DO PARAÍSO. Rio de Janeiro : Martins Fontes, 1965 NASCIMENTO DE MORAES. Vencidos e Degenerados. 4 ed.São Luís : Cento Cultural nascimento de Moraes, 2000 PIMENTA, Eli. Capoeira em São Luiz do Maranhão. In JORNAL DO CAPOEIRA, acessado em 26 de abril de 2005, disponível em http://www.capoeira.jex.com.br/). RAMOS, Clóvis. OPINIÃO PÚBLICA MARANHENSE: JORNAIS ANTIGOS DO MARANHÃO (1831 a 1861). São Luís : SIOGE, 1992 VAZ, Leopoldo Gil Dulcio Vaz; VAZ, Delzuite Dantas Brito. Construção de uma antologia de textos desportivos da cultura brasileira: proposta e contribuições. In CONGRESSO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO FÍSICA, ESPORTES, LAZER E DANÇA, VII, Gramado/RS, 29 de maio a 1º. De junho de 2000. Anais e Resumos..., p. 603-608 VIEIRA E CUNHA, Manuel Sérgio; FEIO, Noronha. HOMO LUDICUS - ANTOLOGIA DE TEXTOS DESPORTIVOS DA CULTURA PORTUGUESA. vol. 1 e 2. Lisboa : Compendium, (s.d.).


O “SPORTMAN” ANTONIO LOPES DA CUNHA LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ1 Sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão São Luís – Maranhão - Brasil RESUMO Busca-se identificar entre os diversos autores maranhenses aqueles que se tornaram ‘sportman’ ou que escreveram sobre atividades esportivas e/ou de lazer praticadas em São Luís do Maranhão, resgatando-se a memória dessas atividades. Palavras-chave: Esportes e Lazer; memória; São Luis-Maranhão ABSTRACT The sportman Antonio Lopes da Cunha. It searches to identify maranhenses among several authors who have become 'sportman' or who wrote about sports activities and / or leisure practiced in St. Louis of Maranhao, rescuing the memory of these activities. Keywords: Sports and Leisure; memory; San Luis, Maranhao

INTRODUÇÃO A literatura ajuda-nos a compreender melhor o mundo que nos cerca, quando descreve a sociedade em que a história se passa. Pode ser usada como fonte de pesquisa, ao se identificar, na narrativa, as manifestações de caráter esportivo, recreativo e de lazer. O esporte, como tema literário, aparece pela primeira vez com Píndaro, embriagado pelos feitos atléticos dos campeões olímpicos: "Durante a realização dos Jogos, desaguavam em Olímpia tudo o que na Grécia havia de artístico, filosófico e desportivo. Os poetas escancaravam o que lhes medrava na alma, os sofistas dialogavam com auditórios eruditos e os atletas competiam entre sí. Enfim, arte, filosofia e desporto num conúbio que muito enriqueceu a literatura grega. Já Homero poetizara as corridas de carros, mas literatura centrada no desporto... foi Píndaro o primeiro" (VIEIRA E CUNHA & FEIO, s.d: 9)2. Depois dele, muitos outros. "E no gaiato tagarelar das ruas de Atenas, o desporto nascia como verdadeiro fenômeno cultural". Virgílio, Horácio, Tíbulo, Propércio, em Roma; Dante e Petrarca, na Idade Média; Rebelais, Cervantes, Camões, Francisco de Quevedo, Jeronimo Mercurialis, Rousseau, na Idade Moderna. VIEIRA E CUNHA & FEIO (s.d.) 3 justificam a feitura de uma antologia portuguesa de textos esportivos afirmando que o desporto, ao contrário do senso-comum que se tem dessa manifestação, não se resume a "uma atividade meramente corporal que, no setor da ciência, se confunde com a Medicina, no campo da convivência, com a expresso apaixonada da agressividade natural e manifestando o mais redondo desconhecimento pelo mundo da cultura" (p. 7). Afirmam ser o desporto uma pujante afirmação de cultura; uma síntese original de criação artística e de contemplação estética; um meio de educação e de comunicação de excepcional valia; e um "fenômeno social capaz de concorrer à Paz, à Saúde, à Tolerância, à Liberdade, à Dignidade Humana" (p. 8): "Ainda integrado na luta pela compreensão do desporto, permitimo-nos recordar que a Cultura Física é uma Ciência do Homem e como tal deve ser analisada, estudada, praticada, difundida e... defendida! Daí que, ao nível da interdisciplinaridade com outros ramos do saber, não seja demasiado encarecer quanto à educação física e os desportos dialecticamente se relacionam, quer com as outras Ciências do Homem, quer com as Ciências da Natureza e as Ciências LógicoDedutivas..." (VIEIRA E CUNHA & FEIO, s.d.: 8)4. 1

Professor de Educação Física do CEFET-MA; Mestre em Ciência da Informação; leopoldovaz@elo.com.br VIEIRA E CUNHA, Manuel Sérgio; FEIO, Noronha. HOMO LUDICUS - ANTOLOGIA DE TEXTOS DESPORTIVOS DA CULTURA PORTUGUESA. Vol. 1 e 2. Lisboa: Compendium, (s.d.). 3 VIEIRA E CUNHA; FEIO, obra citada. 4 VIEIRA E CUNHA; FEIO, obra citada. 2


Também na Literatura Brasileira é significativa a presença de escritores a evidenciarem uma simpatia pela prática desportiva. O objetivo deste estudo é o de, articulando-se o trabalho de investigação e o trabalho de resgate, recuperar e organizar fontes literárias e documentais, procurando reagrupá-las, tornando-as pertinentes, para constituírem um conjunto através do qual a memória coletiva passe a ser valorizada, instituindo-se em patrimônio cultural (FAVERO, 1994) 5. Buscaram-se em autores maranhenses trechos em que se referem à cultura corporal no Maranhão, com o objetivo de reconstituir a trajetória do esporte em nosso país. O REMO E AS REGATAS NO MARANHÃO O remo foi implantado no ano de 1900, pelos "sportsmen" maranhenses utilizando-se dos rios Anil e Bacanga. É desse ano a criação do "Clube de Regatas Maranhense", instalado na Rua do Sol, 36: "CLUB DE REGATAS MARANHENSE - Director Presidente - Manoel G. Moreira Nina; Vice Director Presidente - Jorge Brown; Director Secretário - José Carneiro Freitas; Director Thesoureiro - Benedicto J. Sena Lima Pereira; Director Gerente - Alexandre C. Moreira Nina; Supplentes: 1º - Manoel A. Barros; 2º Othon Chateau; 3º José F. Moreira de Souza; 4º - Antônio José Silva; 5º - Almir Pinheiro Neves; Commissão d'Estatutos: Dr. Alcides Pereira; Eduardo de A. Mello; Manoel Azevedo; Arthur Barboza Pinto; João Pedro Cruz Ribeiro".6 Essa iniciativa foi efêmera. Os primeiros passos foram dados, para colocar as coisas no rumo certo, mas faltaram recursos para aquisição das embarcações. Encontramos, nos anos seguintes, algumas iniciativas de se manter essa prática esportiva, sendo realizados alguns eventos nos anos de 1908 (a 13 de setembro voltouse a falar na implantação do remo, chegando a ser organizada uma competição, envolvendo duas equipes que guarneciam os escaleres "Pery" e "Continental"); em 1909, nas comemorações do 28 de julho7 houve outra prova, tomando parte da mesma militares do 24º BC e da Marinha, sendo utilizado barco a dois remos. A elite maranhense fez-se presente tomando parte ativa. Lembramos que em 1907, Nhozinho Santos funda o Fabril Athletic Clube – FAC -, nas dependências da Santa Isabel, implantando várias modalidades esportivas, como o futebol, o atletismo, o tênis, o cricket, o crocket. Outras agremiações surgem, ao lado de algumas já existentes e que iniciam, também, a prática de vários esportes8. De 1910 a 1915, houve uma grande crise do esporte maranhense, com a implantação, o ressurgimento e a extinção de várias equipes, clubes, esportes... Mesmo com esses contratempos, foram promovidas algumas competições, sempre no rio Anil. A partir de 1915 houve um que renascimento dos esportes, graças à iniciativa de Mr. Clissot, cônsul inglês na cidade. O remo e o futebol estavam entre os esportes de preferência da juventude.9 Nos anos seguintes, e até o final dos anos 20, promoveram-se alguns festivais, no rio Anil, sempre com receios de ataques de tubarões, que subiam para desfrutar dos dejetos despejados pelo Matadouro

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FÁVERO, Maria de Lourdes Albuquerque, O espaço PROEDES: memória, pesquisa, documentação. IN GOLDFABER, José Luiz (org.). ANAIS DO IV SEMINÁRIO NACIONAL DE HISTÓRIA DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA. Belo Horizonte: FAPEMIG; São Paulo: Anna Blaume: Nova Stella, 1994. P. 100-103. 6 REGENERAÇÃO, 21 de fevereiro de 1900. in VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. Remo no Maranhão – 1900-1929. In DaCOSTA, Lamartine Pereira (Org). ATLAS DO ESPORTE NO BRASIL. RIO DE JANEIRO: CONFEF, 2006, p. 3-2. 29. Disponível em www.atlasesportebrasil.org.br/textos/193.pdf 7 Em 28 de julho é comemorada a data da adesão do Maranhão à Independência do Brasil. É também a data comemorativa máxima do IHGM. 8 VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. Introdução do Esporte (moderno) em Maranhão. VIII CONGRESSO DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO FÍSICA, ESPORTE, LAZER E DANÇA. Ponta Grossa, 2002. 9 VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. Cluster esportivo de São Luís do Maranhão, 1860 - 1910. In DaCOSTA, Lamartine Pereira (Org). ATLAS DO ESPORTE NO BRASIL. RIO DE JANEIRO: CONFEF, 2006, p. 2.7 Disponível em www.atlasesportebrasil.org.br/textos/10.pdf


Modelo. Em 1916 houve uma competição que tinha como objetivo implantar, definitivamente, o remo, inclusive com a criação de uma "Liga do Remo". (MARTINS, 1989, p. 217).10. ANTÔNIO LOPES Antônio Lopes da Cunha nasceu na cidade de Viana – Maranhão -, em dia 25 de maio de 1889 e faleceu em São Luís aos 29 de novembro de 1950. Filho do desembargador (e futuro governador do Estado) Manuel Lopes da Cunha e D. Maria de Jesus Sousa Lopes da Cunha. Fez os preparatórios em São Luís. Em 1911, concluído seu curso de ciências jurídicas, na cidade de Recife. Foi durante os seus estudos em Recife que Antônio Lopes deu os seus passos iniciais na atividade literária, ao lançar Litania da Morte11, a primeira obra de sua produção, diversificada em múltiplas facetas, todas de extrema importância. Antes ele já havia fundado, em sua terra, a Revista Vianense, ao lado de Mariano Couto e José Belo Carvalho, “manuscrita, em folhas de papel azul de embrulhar rebuçado”. 12 Retornando à província natal, exerceu o magistério – era professor de Literatura Brasileira no Liceu Maranhense e de Filosofia do Direito na Faculdade de Direito do Maranhão, marcando sua atuação com uma vasta erudição Jornalista, redigia “A Pacotilha” e “O Imparcial”. Em 1938, fundou com Mauricio Jansen e Urbano Pinheiro o “Diário do Norte”, folha que exerceu grande influencia na mocidade intelectual de São Luís, pois acolhia generosamente aos jovens poetas e escritores. Antonio Lopes da Cunha introduziu o Escotismo no Maranhão, apenas dez anos depois de surgir na Inglaterra; o Grupo Escoteiro 18tão, antiga Associação Maranhense de Escoteiros foi instituída em 20 de maio de 191713. Foi um dos fundadores da Faculdade de Direito de São Luís (1918), ao lado de Fran Paxeco, Henrique Couto, Domingos Perdigão e outros. A elite intelectual maranhense sempre esteve envolvida com as coisas do esporte. Antonio Lopes não poderia ser diferente... NO ESPORTE CLUBE LUSO-BRASILEIRO 10

MARTINS, Djard Ramos. ESPORTE: UM MERGULHO NO TEMPO. São Luís: 1989 Bibliografia de Antônio Lopes: - O Feio – conferencia pronunciada no Clube Euterpe, em 1908; - Apreciação crítica – in Padrões, livro de versos de Sales e Silva, publicado em 1911; - Celso Magalhães – estudo crítico e biográfico, in Pacotilha, edição de 10.11.1917; - Celso Magalhães – resposta a um artigo de José Ribeiro de Oliveira in Pacotilha Ed. De 19.11.1917; - As caixas escolares, O ensino da Geografia nas escolas primárias, Relatório sobre a Educação Intelectual, - - Noções sobre: ensino obrigatório, a Instrução Escolar, Os Compêndios, A Instrução Publica Municipal de São Luis em 1919 – trabalhos apresentados no Congresso Pedagógico reunudoi em São Luis, em 1920; - Marília e Dirceu – crítica literária in “Geofgrafia e História no. 1, 1926; - O Dicionário Histórico e Geográfico do Maranhão – idem; - Armorial maranhense – idem; - Comendador João Gualberto da Costa – esboço bibliográfico, 1944; - Topônimos Tupi s no Maranhão – estudo sobre a toponímia tupi do Estado, publicado na Revista de Geografia e História no. 2, junho de 1947; - Topônimos Tupis no Maranhão – idem, no. 3, fevereiro de 1950; - Raimundo Lopes – bibliografia, in Revista de Geografia e Historia, no. 2, 1947; - Para a História do Maranhão – idem, 1947; - A História de São Luis – in Geografia e História, Revista do IHGM no. 1, novembro de 1949; - Uma grande data – idem; - A Capitania de Cumâ – Anais do IV Congresso de História Nacional. 4º. Volume, IHGB, 1950; - Alcântara – Rio 1957; - A Imprensa no Maranhão, Rio, 1957; - Presença do Romanceiro, Rio, 1967; Deixou em jornais e revistas do Maranhão um bom numero de artigos sobre o Folclore no Maranhão, sendo de notar um estudo sobre Santo Antonio e o Folclore. (in LOPES, Antonio. Estudos Diversos. São Luís, Sioge, 1973 – notas na orelha do livro) 12 In GASPAR, Carlos. ANTONIO LOPES DA CUNHA – um notável homem das letras. http://www.vianacidadedoslagos.com.br 13 In http://www.18tao.org.br/index.php?option=com_content&view=frontpage&Itemid=2 11


Vamos encontrá-lo em 8 de junho de 1919, sendo aclamado o novo Presidente do Esporte Clube LusoBrasileiro, quando de sua reestruturação14. Fizeram parte da nova diretoria, Edgard Figueira, como Presidente de Honra; o Dr. Tarquínio Lopes Filho, na vice-presidência; José Carneiro Dias Vieira, como Diretor de Esportes. A nova sede do clube localizava-se no tradicional Largo do Carmo, 16 (numeração antiga). Era dotada de extenso salão nobre belamente ornamentado, sala de jogos, salão de bilhar. Destacou-se o discurso, de improviso empolgando a todos, do Dr. Antonio Lopes, fazendo uma homenagem ao ex-sócio João Rego, falecido recentemente, deixando enlutado o mundo esportivo maranhense. O novo Presidente entendeu ser necessário uma melhor organização na formação de novos valores esportivos, especialmente para o futebol, evitando-se a importação de ‘cracks’. Entendia a importância da formação de equipes infantis. Na sua organização foram adotadas algumas providenciam consideradas fundamentais: os sócios-meninos só eram admitidos a partir dos 12 anos completos, com autorização dos pais ou responsáveis. Designou atletas da equipe principal – Lauro Lima e Napoleão – como instrutores responsáveis pela preparação física e ‘foot-ball’. Fixou em 50 o número desses associados. Os treinamentos davam-se as quintasfeiras, de maneira que a garotada não fosse prejudicada nos estudos, pois naquele dia era ‘feriado’ nas escolas. Não eram admitidos, para sócios, meninos analfabetos. Todo sócio-mirim, que no fim do mês não apresentasse caderneta da escola donde concluísse sua freqüência normal e a maioria das notas boas, estava passível de sua participação nos treinamentos e jogos, sustada e a continuação dessa irregularidade determinaria mesmo a sua eliminação (MARTINS, 1989, p. 470-473). Foi, também, o fundador e secretário perpétuo do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão: “Em 1925, tomei a iniciativa de reunir alguns homens de boa vontade na livraria de Wilson Soares, expondo-lhes a minha idéia de se comemorar o centenário do nascimento de D. Pedro II com a inauguração, nesta capital, de um Instituto de História e Geografia. Os que prestaram apoio à idéia foram: Justo Jansen, Ribeiro do Amaral, José Domingues, Barros e Vasconcelos, Domingos Perdigão, José Pedro Ribeiro, José Abranches de Moura, Arias Cruz, Wilson Soares e José ferreira Gomes. Mais tarde incorporou-se a esse grupo João Braulino de Carvalho. Ausentes de S. Luís apoiaram calorosamente a idéia Raimundo Lopes, Fran Pacheco, Carlota Carvalho e Antonio Dias, que também foram considerados sócios fundadores do Instituto.(p. 110) “A 20 de novembro realizou-se a sessão inicial, sendo apresentado, discutidos e votados os estatutos e eleita a diretoria, cujo presidente foi Justo Jansen. José Ribeiro do Amaral foi eleito presidente da assembléia geral. (p. 111)15. “A 2 de dezembro, no Salão da Câmara Municipal, inaugurava-se em sessão magna, em homenagem à memória de D. Pedro II, o Instituto de História e Geografia do Maranhão.” (LOPES, 1973, p. 111) 16 Encontramos, na imprensa local, que em 28 de julho de 1928 promoveu-se uma regata, em homenagem ao comandante Magalhães de Almeida, tendo a frente, dentre outros, o "sportman" Antônio Lopes da Cunha17.

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O Luso Brasileiro fundado em 24 de fevereiro de 1917 LOPES DA CUNHA, Antônio. Instituto histórico. In ESTUDOS DIVERSOS. São Luís: SIOGE, 1973. 16 LOPES DA CUNHA, Antônio. Instituto histórico. In ESTUDOS DIVERSOS. São Luís: SIOGE, 1973. 17 VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. Remo no Maranhão – 1900-1929. in DaCOSTA, Lamartine Pereira (Org). ATLAS DO ESPORTE NO BRASIL. Rio de Janeiro: CONFEF, 2006, p. 3-2. 29. Disponível em www.atlasesportebrasil.org.br/textos/193.pdf 15


ESPORTE & LITERATURA ALUÍSIO AZEVEDO Por Leopoldo Gil Dulcio Vaz Sócio efetivo do Instituto Histórico e geográfico do Maranhão Cadeira 40 – Patrono: Dunshee de Abranches Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo, nasceu em 14 de abril de 1857 em São Luís do Maranhão. Em sua infância e adolescência foi caixeiro e guarda-livros, demonstrando grande interesse pelo desenho. Torna-se caricaturista, colaborando em “O Fígaro”, “O Mequetrefe”, “Zig-Zag” e “A Semana Ilustrada”, jornais do Rio de Janeiro. Obrigado a retornar ao Maranhão, em 1878, pela morte do pai, abandona a carreira de caricaturista e inicia a do escritor. Publica em 1879, “Uma lágrima de mulher”. Com a publicação de “O Mulado”, em 1881, introduz o Naturismo no Brasil. Publica, ainda : Memórias de um condenado (1882); Mistério da Tijuca (1882); Casa de Pensão (1884); Filomena Borges (1884); O Homem (1887); O Coruja (1890); O Cortiço (1890); Demônios (1893); A Mortalha de Alzira (1894); Livro de Uma sogra (1895). Em 1895, abandona a carreira de escritor e torna-se diplomata (AZEVEDO, 1996). Um dos fundadores de “O Pensador” (1879), jornal anticlerical, publica várias crônicas onde traça o perfil da mulher maranhense, comparando-as à lisboeta desocupada e denunciando o ócio em que viviam. Considerava que todo o mal vinha do ócio e da preguiça das mulheres e apenas uma mudança na educação e na concepção do casamento poderia permitir a realização da mulher: "Do procedimento da mulher (...) depende o equilíbrio social, depende o equilíbrio político, depende todo o estado patológico e todo o desenvolvimento intelectual da humanidade (...) Para extinguir essa geração danada, para purgar a humanidade desse sífilis terrível, só há um remédio: é dar à mulher uma educação sólida e moderna, é dar à mulher essa bela educação positivista, que se baseia nas ciências naturais e tem por alvo a felicidade comum dos povos. É preciso educá-la física e moralmente, prepará-la por meios práticos e científicos para ser boa mãe e uma boa cidadã; tornála consciente de seus deveres domésticos e sociológicos; predispor-lhe o organismo para a procriação, evitar a diásteses nervosa como fonte de mil desgraças, dar-lhe uma boa ginástica e uma alimentação conveniente à metiolidade de seus músculos, instruí-la e obrigá-la principalmente a trabalhar... “. (Aluísio AZEVEDO, Crônica, "O Pensador", São Luís, 10.12.1880, citado por MÉRIEN, 1988:166, 167). O mesmo tema é retomado quando da publicação de "O Mulato", criando-se enorme polêmica na imprensa, ora acusando o autor, ora vozes se levantando para defendê-lo acerca de sua posição sobre a condição feminina. Dois amigos de Aluísio Azevedo, Paulo Freire e Luís de Medeiros, fazem publicar cartas sob pseudônimo - Antonieta (carta a Julia, "Diário do Maranhão", São Luís, 6.6.1881) e Júlia (carta a Antonieta, "Pacotilha", São Luís, 9.6.1881), respectivamente - falando “de suas impressões e do impacto que o livro lhes causara" (MÉRIEN, 1988:291). Julia/Luís de Medeiros faz longas considerações sobre a condição da mulher maranhense, "lastimando-se da educação retrógrada que recebera em sua família e no colégio" (p. 290), onde fora do português, não se ensinava mais nada às moças além de algumas noções de francês, de canto, de piano e de bordado. Para ela, "a falta de exercícios físicos é a origem das perturbações do sistema nervoso que atingem a maioria das moças maranhenses" (p. 290). A preocupação social é um traço marcante na obra de Aluízio, que buscava, com aguda capacidade de observação, compreender científicamente os elementos determinantes da realidade do Brasil. Em "O Mulato",


faz uma descrição permenorizada dos costumes da São Luís nos idos de 1880, época em que aparece seu romance: "As crianças nuas, com as perninhas tortas pelo costume de cavalgar as ilhangas maternas, as cabeças avermelhadas pelo sol, a pele crestada, os ventres amarelentos e crescidos, corriam e guinchavam, empinando papagaios de papel." (p. 9). O "SPORTISTA" Aos doze anos, estudante do Liceu, havia uma coisa verdadeiramente série para Aluísio de Azevedo: "era brincar, estabelecendo-se entre minha divertida pessoa e a pessoa austera de meus professores a mais completa incompatibilidade". Narra as estripulias da época, em companhia dos amigos de infância: "Criado a beira-mar na minha ilha, eu adorava a água. Aos doze anos já era valente nadador, sabia governar um escaler ou uma canoa, amarrava com destreza a vela num temporal, e meu remo não se deixava bater facilmente pelo remo de pá de qualquer jacumariba pescador de piabas." (citado por MÉRIEN, 1988: 47). Aluísio Azevedo, aos 38 anos de idade, submete-se a concurso para a carreira diplomática e torna-se cônsul (1895), abandonando a carreira de escritor. Exerce suas atividades em Vigo, um porto europeu - março 1896 a julho de 1897; em Yokohama (setembro 1897 a 1899); em La Plata, de janeiro de 1900 a março de 1903; Salto Oriental, no período de junho de 1903 a janeiro de 1904; em Cardiff, permaneceu por quase três anos, de abril de 1904 a fevereiro de 1907; de lá, foi para Nápoles, assumindo em março de 1907 e permanecendo até outubro de 1910. Após algum tempo no Rio de Janeiro, assumiu o consulado de Assunção em janeiro de 1911, permanecendo naquela cidade até outubro, indo para Buenos Aires em novembro, ai ficando até sua morte, em 21 de janeiro de 1913. Apesar de suas andanças pelo mundo, vamos encontrá-lo, em 1907, na sua querida São Luís, participando do grupo de Nhosinho Santos, quando da inauguração do Fabril Athletic Clube. Pertencia ao team "Red and White", formado por João Alves dos Santos; Izidoro Aguiar, Alcindo Oliveira; Afonso Guilhon, José Ramos Bastos, Antero Novaes, Ernesto Dobler, Carlos Neves, Manoel Alves dos Santos e Antero Serejo (MARTINS, 1989 : 285). Aluísio não praticava só o "foot-ball association", certamente aprendido durante sua estada na Inglaterra, onde permaneceu de 1904 a março de 1907. Nesse mesmo mês, estava em São Luís, e o encontramos participando de uma partida de "law-tennes", defendendo as cores do "Red & White". Muito embora seu biógrafo o dê como tendo assumido seu posto em Nápoles no mês de março de 1907 (MÉRIAN, 1988: 618), vamos encontrá-lo participando da partida inaugural do futebol no Maranhão18, em 27 de outubro de 1907. Seu "team", o "Red & White", ganhou por 2 x 0, do "Black & White", ambos, equipes internas do Fabril Athletic Club (MARTINS, 1989) Em setembro de 1908, durante as festas do primeiro aniversário dessa agremiação, lá estava novamente, desta feita defendo as cores do F.A.C, contra o Maranhense Futebol Club. A formação foi: João Alves dos Santos; Aluísio Azevedo e José Ramos Bastos; M. Matias, Afonso Gandra e Manoel Alves dos Santos; A. Vieira, Carlos Nina, Antero Novaes e Joaquim Ferreira Belchior. Aluísio jogava como "full back". Como o jogo terminou empatado em 0 a 0, isso exigia uma nova contenda. A 15 de novembro de 1908, as duas equipes voltaram ao campo da Rua Grande para o desempate. O FAC, com: João Alves dos Santos; Manoel Alves dos Santos e Waldemir Araújo; J. Bastos, J. Mário e Aluísio Azevedo; A. Vieira, J. Santos Sobrinho, Antero Novaes, Carlos Neves e A. Gandra. Aluísio jogou como "Half back". Em dezembro de 1908, o Fabril elegia nova diretoria, e Aluísio é eleito como suplente. No dia 31 de janeiro de 1909 ocorre um encontro entre o Maranhão Foot-Ball Club e o F.A.C., como partida preparatória para o festival de inauguração daquele club: 18

VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. A inauguração do "foot-ball" em Maranhão. São Luís : 2000b.


"Fabril Athletic Club "Match de Foot-ball em 31 de janeiro de 1909 "Team do 'Fabril Athletic Cub - Goal - J. Santos / Full backs - A. Azevedo, E. Simas / Half backs - A. Vieira, A Soeiro, J. Alvim/ Forwards - A.Neves, Ary Faro, T. R. Dowey, João Baptista, J. Santos, J. Santos Sobrinho /Reserve - R. Martins, F. Ribeiro, M. Neves / "Team do Maranhense Foot-ball Club - Goal - J. Mario / Full backs - J. Torres, J. Ferreira / Half backs - J. Santos, B. Queiroz, D. Rodrigues / Forwards - A. Lobão, R. Nunes, J. Gomes, S. Bello, A. Santos / Reserve - A. Figueiredo, A. Gonçalves... " (O MARANHÃO, 30/01/1909, grifos nossos) No período carnavalesco, as partidas eram interrompidas, voltando somente após a quaresma, conforme chamada de maio de 1908, conclamando os sócios a comparecerem ao clube, para reiniciarem-se as atividades: "Fabril Athletic Clube "Depois de uma pequena interrupção, haverá uma partida de Foot-ball, para isso estão inscritos os seguintes sócios: "Moraes Rego Junior - W. Reis - J. Moon - J. Shipton - A. Vieira - J. Prado Costa - A. José Rego Serra - J. Mário - C. Guilhon - Raul S. Martins - Aluízio Azevedo - Antero Novaes - José A. Santos - Alcindo Oliveira - M. Neves - A. Gandra "Começará às 4 1/2 hora da tarde". (O MARANHÃO, 23 de maio de 1908, grifo nosso). Essas jornadas esportivas não se limitavam à prática do "foot-ball association", apenas: "Fabril Club "Esteve brilhante a partida realizada hontem. Além de inúmeras famílias e cavalheiros, compareceram à festa a Escola de Aprendizes Marinheiros, que sob o comando de seu hábil instructor sr. David Santos realisou exercícios de fogo e esgrima de baioneta. "Foi este o esplendido programa cumprido à risca: "Os jogos realisados foram os seguintes: "1.- Corrida com ovos em colheres pelos sócios J. Mário, J. Moon, A. Vieira, J. Shipton, sendo vencedor A. Vieira. "2.- Corrida para enfiar agulhas executadas por C. Neves, J. Mário, A. Santos e A. Azevedo, sendo vencedor C. Neves e seguido por J. Mário. "3.- Execício de fogo, bayoneta e esgrima pela Escola de Aprendizes Marinheiros. "4.- Crors Cutrey (cross-country) - corrida pedestre com obstáculos por J. Mário, J. Moon, C. Neves, A. Vieira, A. Novaes, J. Shipton, J. Bastos, M. Neves, sendo vencedor J. Mário, seguido muito de perto J. Moon em terceiro logar A. Novaes, C. Neves. "5.- Match de Foot-Ball infantil havendo resultado negativo, por se acharem organizados os teams com força igual. Tomaram parte as seguintes creanças: team Bladi & Whate: Fausto Seabra, José Seabra, Frederico Perdigão, José Lopes, Celso C. Rodrigues, Sylvio Rego, Ruy C. Rodrigues, Antonio Rego, Antonio Santos, José M. Lobo, Lucio Bauerfeldt. "Team Red & White: João Paixoto, Braulio Seabra, Luiz Santos, Pedro Paulo R. Araujo, Ivar C. Rodrigues, Acyr Marques, Carlos Perdigão, Gastão Vieira, Justo M. Pereira, Celso Pereira, José Vieira. Servio de Refere M. Shipton". (O MARANHÃO, Segunda-feira, 08 de junho de 1908, grifos nossos).


Em setembro de 1908, era apresentado o programa de uma "matineé sportiva" que seria realizada no Domingo seguinte, na sede do F.A.C., reunindo os "Team Riachuello" - "Estrella Preta" - e o "Team Humaitá" - "Estrella Branca"-, ambos da Escola de Aprendizes Marinheiros, marcada para as 3:45 horas, seguida de outros jogos, como o Concurso gaiato, marcado para as 4:20 horas, sendo concorrentes: A. Novaes, J. Santos Sobrinho, A. Azevedo, A. Vieira; já o Concurso gaiato infantil seria disputado por: Ivar, Luiz, Celso, Bráulio, Soeiro Filho; para a quarta prova do programa, Concurso de Agilidade, estavam inscritos: Franklin, Zuza, Maneco Neves, Gui e Aluísio. Para o "match foot-ball", entre o FAC e o Maranhense, estavam inscritos: F. A. Club

M. Foot-ball Club

J. A. Santos

A. Santos

A. Azevedo - J. Bastos

J. Torres - J. Ferreira

J. Santos - M. Mathias – A. Gandra -

E. Souza - R. Nunes - B. Queiroz -

M. Santos A. Vieira - C. Neves - A. Novaes - J. Mario

A. Lobão - A. Guterrez - A. Silva - J. Gomes - I. Meireles

- J. Belchior - R. Serra Martins

- J. Santos - M. Amorim

Captain - C. Neves

Captain - A. Silva

Referee - J. M. A. Santos após a a partida de futebol, seria realizada a "Tug of War" (cabo de guerra), inscritos: Fausto - Antoninho Ruy - Zeca - Carlos Alberto - Soeiro Filho - Gastão - Yoyô - Lady - Lucio - José - Adolpho Salles (O MARANHÃO, sabbado, 26 de setembro de 1908). Na edição da Segunda-feira seguinte - 28 de setembro de 1908 - esse jornal apresenta o resultado dos "matchs" ocorridos: o jogo entre as duas equipes da Escola de Aprendizes Marinheiros terminou empatado em 1 x 1. Ficamos sabendo o que eram aqueles "concursos gaiatos", em que participaram os "sportemen" ludovicences, a elite econômica e intelectual da Atenas brasileira, Aluísio Azevedo, dentre eles: o primeiro deles - para adultos - foi vestir bonecas, saindo vencedor Anthero Novaes e J. Santos Sobrinho; o concurso infantil - enfiar agulha - foi vencido pelo menino Soeiro Filho, enquanto o concurso de agilidade consistiu de abrir garrafas de cola e beber o conteúdo, obtendo o primeiro lugar Manuel Neves. O jogo de futebol entre os dois clubes também terminou empatado, enquanto no Cabo de Guerra - "Tug of War" - o vencedor foi o lado encarnado. O ano de 1908 é encerrado com um jogo entre o F.A.C. e o Maranhense, em comemoração à proclamação da República, terminando em 2 x 0 para a representação fabrilense. Aluísio Azevedo não participa desse jogo, sendo substituído por J. Alvim. Certamente ainda de luto por seu irmão, Arthur Azevedo, ocorrido trinta dias antes, no Rio de Janeiro. Fonte: O "SPORTMAN" ALUÍSIO AZEVEDO. Por Leopoldo Gil Dulcio Vaz e Delzuite Dantas Brito Vaz. Publicado em "O Imparcial", São Luís, Domingo, 16 de julho de 2000, Caderno Impar, p. 5.


ESPORTE COM IDENTIDADE CULTURAL LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ esporte com identidade cultural (cev) REVISTA DO LÉO n. 5 - FEVEREIRO 2018 by Leopoldo Gil Dulcio Vaz - issuu

Graciliano Ramos, em crônica publicada em “O índio” (Palmeiras dos índios – Al, 1921), acreditava que o brasileiro não tinha vocação para o (futebol) esporte. Escrevia, sob o pseudônimo de J. Calisto, que “pensa-se em introduzir o futebol, nesta terra … será bem recebido pelo público, que, de ordinário, adora as novidades … vai ser por algum tempo a mania, a maluqueira, a idéia fixa de muita gente … vai haver por aí uma excitação, um furor dos demônios, um entusiasmo de fogo de palha, capaz de durar um mês … o futebol não pega, tenho a certeza.” Na constituição de 1988 está expresso que a educação não está desassociada do direito ao lazer e à prática desportiva. Com esse espírito, a Lei Zico, de no. 8672 de 06 de julho de 1993 e o Decreto no. 981 de 11 de novembro, que a regulamentou, apresenta-se como uma revolução conceitual, pois ao Estado, diz a lei, compete formular política desportiva nacional, traçar as suas grandes linhas e priorizar o desporto nacional. Diante disso, o sr. Maurilio de Avelar Hingel, Ministro da Educação e do Desporto, pode afirmar (JORNAL DO BRASIL, janeiro de 1994) que o Estado não faz desporto, nem lhe compete organizar manifestações desportivas, pois estas, formal ou não-formal, é livre de direito de cada um. O Estado deixa de ser a cúpula burocrática que administra toda a atividade desportiva, passando a atribuição de alimentar a sociedade desportiva, não substituí-la. “Mas por que o futebol ?” – perguntava-se Graciliano – “…não seria, porventura, melhor exercitar-se a mocidade em jogos nacionais sem mescla de estrangeirismos, o murro, o cacete, a faca de ponta, por exemplo ?”. Para isso, afirma ” … não é necessário ir longe, em procura de esquisitices que tem nomes que vocês nem sabem pronunciar. Reabilitem os esportes regionais, que aí estão abandonados”, grita ele, ” … o porrete, o cachaço, a queda de braços, a corrida a pé, tão útil a um cidadão que se dedica ao arriscado ofício de furtar galinhas, a pega de bois, o salto, a cavalhada e, melhor que tudo, … a rasteira.” Cumprindo o disposto no Artigo 217 da constituição, que trata da proteção, promoção e apoio às manifestações desportivas que decorram da cultura nacional, foi criado, no âmbito da Secretaria de Desportos do MEC, o Departamento de Desportos Sócio-Cultural, que tem em sua estrutura uma Coordenação-Geral de Desportos com Identidade Cultural – CODIC. Em reunião promovida em abril último – 27 a 29, Brasília – constituiu-se um “Grupo de Trabalho” para analisar questões relativas aos “Desportos com Identidade Cultural” e as suas correlações culturais e educacionais. O que é desporto com identidade cultural ? é a pergunta que se fez. Como resposta, foi solicitado ao Grupo de Trabalho – Silvino Santin (Doutor em filosofia, RS); Leopoldo G. D. Vaz (Mestre em Ciência da Informação, MA); Priscila R. Pereira (Historiadora, SC); Lamartine Pereira da Costa (Doutor em Educação, RJ); Paulo Vicente Guimarães (Doutor em Sociologia, DF); Leila Mirtes S. Magalhães Pinto (Mestre em Educação Física, MG); Muniz Sodré de A. Cabral (Doutor em Sociologia, RJ); Maria Hilda B. Paraíso (Doutoranda em Antropologia, BA) – produção de material científico-didático-pedagógico que venha referendar a contextualização de políticas relativas ao assunto. Pela primeira vez na história é instituída uma linha visando estabelecer relações intensas com a comunidade, à partir do município, revelando, resgatando, registrando, apoiando, enfim, participando ativamente das manifestações populares de cunho e desempenho desportivo que decorram da própria etno-história brasileira nos seus procedimentos de resistência cultural. Reabilitem a arqueria, a canoagem, caça, pesca e as lutas rituais indígenas, as corridas em meio rústico, vaquejadas, corrida-de-argolinha, derrubada de bezerro a laço, montaria de burro bravo, cavalgada, saltos e trotes com equinos, muares, asininos e até bovinos, regatas à vela, de saveiro e jangadas, além da capoeira. Todas manifestações próprias do processo de formação do brasileiro, pois as diversas vertentes étnicas propiciam grande riqueza de formas e meios dos desempenhos físicos dessa qualificação, sejam do índio ou do negro e do europeu, aqui chegados. O brasileiro é, sem dúvidas, um povo pródigo nesse campo, haja vista que no mapeamento desportivo, divulgado pela SEDES, dos 167 desportos


existentes, 15 tiveram origem no Brasil – Arobol, Biribol, Capoeira, Frescobol, Futebol de Mesa, Futebol de Salão, Futebol de Sete, Futevolei, Hipismo Rural, Peteca, Peteleco, Roller Skate, Taco, Tamboréu. A Inglaterra, berço do renascimento desportivo, conta com 19; Estados Unidos e França, com 10 cada; China e Japão com oito cada; a Grécia, com sete. “Reabilitemos os esportes nacionais”, já pedia Graciliano.


UM MUNDO ÀS AVESSAS JOSÉ MANUEL CONSTANTINO Um mundo às avessas | Opinião | PÚBLICO (publico.pt)

Há acontecimentos que por si só valem vários compêndios sobre as relações entre a política e o espectáculo desportivo. A final da Champions League ocorrida no Porto é um desses acontecimentos. Expõe de uma forma exemplar o modo como os diferentes poderes se relacionam: governamentais, partidários, autárquicos e desportivos. O que os titulares de alguns destes poderes afirmaram, antes e após o evento, deveria ser de estudo obrigatório em qualquer escola de ciência política, porque evidencia à exaustão como a nobreza da política pode sucumbir ao simples rigor de uma avaliação casuística ou, para não ser muito severo, ao elementar bom senso. Uma das maiores perplexidades deste tempo reside precisamente no facto de que uma parte significativa dos que censuram o facto do futebol se ter transformado num negócio, procurarem no futebol precisamente o que condenam: o negócio dos interesses políticos e partidários. Um traço que é comum à generalidade das diferentes famílias políticas. E a culpa não é, como tantas vezes se afirma, do futebol. Porque foi a política que o procurou muitas vezes cedendo nas orientações, regras e princípios que ela própria determina. O problema não reside no facto de tratar o espectáculo desportivo do futebol com a elevação, a importância e o respeito que ele merece. E no que representa para o país. E não se trata sequer de ignorar o valor potencial de acolher um grande evento desportivo. Mas no facto da decisão política ser construída numa base que não é reconhecida ao universo desportivo em geral e conflituar com orientações nacionais para o mesmo tipo de situações. Receber em Portugal um evento desportivo daquela dimensão foi, na sua génese, um acto político que ultrapassou em muito o poder desportivo e que foi decidido e reconhecido ao mais alto nível da governação com generalizado respaldo partidário. Se isto em si mesmo decorre de uma legitimidade que se não contesta é óbvio que no momento do balanço não se pode enjeitar responsabilidades ou transferi-las para quem se limitou a cumprir as ordens que recebeu ou que cumpriu o que era sua obrigação garantir. E garantir o que é óbvio num grande evento desportivo: os efeitos no espaço público e nas respectivas dinâmicas de uma competição que não se limita ao terreno do jogo e à envolvente do público no estádio. Separá-los seria, à partida, remeter o espectáculo desportivo a um mero entretenimento circunscrito a quem está no espaço da competição. Não o é, e todas as evidências o confirmam desde logo o de se o apresentar como um produto atractivo em vários domínios extracompetição pelos efeitos que pode ter, designadamente, nas economias dos países anfitriões. É certo que na vida social há dinâmicas, ocorrências, imprevisibilidades que nenhum planeamento consegue acautelar e que a complexidade das situações faz emergir. Antecipar riscos é um exercício elementar de bom senso, mesmo sabendo que a complexidade das situações não garante a imunidade da sua ocorrência. Não discutimos se o ocorrido no Porto poderia ou não ser evitado. Essa será sempre uma avaliação que quem domina todas as variáveis da situação poderá fazer. O que se nos afigura relevante é a avaliação política do ocorrido. Uma coisa temos como certa: trata-se de uma situação que tem amplos danos para todo o desporto, para a construção da sua identidade social, integridade, reputação e valor na sociedade portuguesa, mas também para a política como actividade que importa proteger e valorizar, ainda mais, num contexto em que derivas populistas e antidemocráticas a ameaçam. Nem tudo correu bem, disse o primeiro ministro. E lembrou a abertura das fronteiras facto que o próprio seguramente conhecia no dia em que se anunciou o evento no Porto. É pouco para tanto que haveria para falar. Mas é assim a política. Umas vezes palavrosa. Outras parcimoniosa.


ATLAS DO ESPORTE NO MARANHÃO CIDADES: TURIAÇU LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

HISTÓRICO/ORIGEM - Turiaçu é um município brasileiro do estado do Maranhão. Tem uma população de 33.933 habitantes (Censo 2010). A sede do município de Turiaçu está localizada à margem esquerda do rio Carapanaí ou São João. Vale ressaltar que o rio Turiaçu não banha a sede do município, o rio deságua na Baía de mesmo nome. 1655 O primeiro núcleo demográfico de Turiaçu, de acordo com o Professor Robson Campos Martins, e estava localizado à margem esquerdo do rio Turiaçu, na confluência do Paruá e margeando a estrada Viana-Belém, e recebeu o nome de Missão Jesuíta São Francisco Xavier do Turiaçu. 1834 Em 13 de fevereiro, quando Turiaçu estava sob o domínio do Pará, foi instalada a vila de Turiaçu. 1870 Turiaçu foi elevado à condição de cidade e município pela lei provincial nº 897 de 11 de julho de 1870. Entre os tantos filhos ilustres de Turiaçu, destacaremos: D. Joaquim Gonçalves de Azevedo, que chegou a ser Arcebispo Primaz do Brasil; José Gonçalves de Oliveira, que escreveu dentre outras obras: "Traçado das estradas de ferro no Brasil"; e Luiz Antônio Domingues da Silva, que foi governador do Maranhão de 1910 a 1914.

? – contam os mais velhos que o esporte turiense já teve seus áureos dias, quando num passado não muito distante era mais organizado, com times organizados e alguns até legalizados, em especial o futebol. Os torneios eram frequentes e realizados no estádio de Castanhal. O primeiro de Turiaçu 1956 12 de outubro, fundado a Associação Desportiva Turiaçu Atletico Clube ? - registra-se ainda o Comercial Atletico Clube, o União de Castanhal, destacando-se alguns atletas como Edi Ribeiro, Zé Pimenta, Arisvaldo, Zé de Coroço, Saracura, Mutuca, Chico Mamão, dentre outros 1990 – construidoo estádio Francisco Farias Rabelo, o Rabelão, no governo de Valdenor Ferreira Rabelo 2001/2004 -sendo secretário Célio Moura, foi reorganizada a Liga Turiense Desportiva – LTD – e reorganizsdoa alguns clubes, com a realização de vários torneios e campeonatos. Criado o Dia do Desportista Turiense, a ser comemorado a 20 de dezembro. 2015 - Também, nesta segunda-feira (24/08), o secretário Márcio Jardim conversou com representantes de comunidade quilombola do município de Turiaçu para tratar sobre as demandas esportivas da região. Após ouvir as demandas apresentadas, Márcio Jardim reforçou o compromisso do governo em levar o esporte e lazer às comunidades rurais. “O Governo do Estado tem se esforçado no sentido de interiorizar suas ações. Vamos levar em frente essa parceria, identificando projetos que alcancem a comunidade quilombola de Turiaçu”, disse. Representando a comunidade quilombola de Jamary dos Pretos, Valdery Silva falou sobre a importância de projetos esportivos que envolvam os moradores da região. “Nosso intuito é ter o governo como parceiro, especialmente no desenvolvimento de projeto esportivo de futebol, que envolva toda a comunidade”, afirmou. Governo discute projetos esportivos para os municípios de Tutóia e Turiaçu – Maranhão de Todos Nós (www.ma.gov.br)

- Na tarde desta terça-feira (25/08) o secretário de Estado do Esporte e Lazer do Maranhão, Márcio Jardim, recebeu a visita do prefeito de Turiaçu, Umbelino Ribeiro, e do deputado estadual Ricardo Rios (PEN/MA), para tratar sobre o desenvolvimento do esporte na região. Na ocasião, foram apresentadas


as principais demandas do município no que diz respeito ao esporte e lazer e discutidos projetos para beneficiar a comunidade. “Temos demandas na área do esporte que são prioridade e a parceria com o governo do Estado torna elas possível”, ressalta Umbelino Ribeiro. “Estamos trabalhando alinhados à política do governo Flávio Dino, interiorizando ações e priorizando levar equipamentos esportivos para os município”, lembrou Márcio Jardim. Na última segunda-feira (24) Márcio Jardim recebeu também representantes de comunidade quilombola do município de Turiaçu, para tratar sobre as demandas esportivas da região. Secretário Márcio Jardim discute sobre desenvolvimento do esporte em Turiaçu | (sedel.ma.gov.br)

- O governo do estado vai construir uma quadra poliesportiva em Turiaçu atendendo solicitação do deputado Ricardo Rios (PEN) ao governador Flávio Dino. Com características de um pequeno complexo, a unidade contará, além da quadra, com mini-auditório, sala multimídia e pista. O espaço mínimo ocupada será de 5.900 metros quadrados, sendo que a viabilização do terreno para a sua construção ficará a cargo da prefeitura. “É uma parceria que nós só temos a comemorar e um presente para os turienses, que terão mais um espaço público para desenvolver suas atividades”, festejou Umbelino Ribeiro, lembrando que este será um lugar de socialização, onde não só eventos esportivos, mas também culturais, poderão ter lugar. https://jornalpequeno.blog.br/johncutrim/deputado-ricardo-rios-anuncia-quadra-esportiva-para-turiacu/#ixzz6xIOISASQ 2017 - Seleções de Codó e Turiaçu decidem o Copão BR de Seleções. estádio municipal Renê Bayma na cidade de Codó, a seleção Codoense enfrenta Turiaçu às 16h, em busca do título da competição, que movimenta as principais equipes do interior maranhense. a seleção de Turiaçu, realizou seis jogos, sendo cinco vitorias e uma derrota. Na fase semifinal, a equipe eliminou a seleção de Araguanã, com uma vitória nos pênaltis por 4 x 1, após empate no tempo normal em 1 x 1. O Copão BR de Seleções de 2017 é organizado pelo Departamento Autônomo de Futebol da Região do Alto Turi (DAFRAT). A competição contou com a participação das Seleções representando os municípios de Alto Alegre do Maranhão, Araguanã, Arari, Bernardo do Mearim, Boa Vista do Gurupi, Bela Vista do Maranhão, Bom Jardim, Bom Jesus da Selva, Buriticupu, Cajarí, Capinzal do Norte, Carutapera, Caxias, Centro Novo do Maranhão, Codó, Coroatá, Godofredo Viana, Governador Newton Bello, Igarapé Grande, Igarapé do Meio, Itapecuru Mirim, Lago Açu, Lago Verde, Maracaçumé, Maranhãozinho, Matinha, Miranda do Norte, Monção, Paulo Ramos, Pedreiras, Peritoró, Pio XII, Pindaré Mirim, Pirapemas, Presidente Médici, São Bento, São Luís Gonzaga, São Vicente de Ferrer, Santa Helena, Santa Inês, Santa Luzia do Paruá, Santa Luzia do Tide, Santo Antônio dos Lopes, Satubinha, Turiaçu, Viana, Vitoria do Mearim e Zé Doca. Carloto Júnior: Seleções de Codó e Turiaçu decidem o Copão BR de Seleções (carlotojunior.com.br)

FONTE: COSTA FILHO, Edmar. GEO-HISTÓRIA DE TURIAÇU na Sala de Aula: um breve diálogo com o passado e o presente. São Luís: Viegas Editora, 2021, p. 124-125


HISTÓRIA(S) DO MARANHÃO


PADRE GABRIEL MALAGRIDA, O APÓSTOLO DO MARANHÃO: TORTURADO E MORTO PELO MARQUÊS DE POMBAL!

DIOGO GAGLIARDO NEVES Em 1723 foi enviado como missionário aos Caicazes, tribo indígena que habitava ao longo do curso dos rios Itapicuru e Munim, na Capitania do Maranhão. Depois, aos Guanarés e os Barbados, no rio Mearim. Fundou a capela existente até hoje no Colégio Santa Teresa, da Congregação das Irmãs de Santa Doroteia do Brasil, no Maranhão, onde existem até hoje objetos pessoais de Malagrida. Entre esses objetos encontram-se uma santa e um humilde banco de madeira onde ele dormia à época. Malagrida retornou a Lisboa em 1750. Permaneceu a capital até 1751, quando regressou ao Maranhão onde permaneceu até 1754. Nesse ano regressou definitivamente a Portugal, a rogo da da rainha viúva D. Mariana de Áustria. O poderoso primeiro-ministro Sebastião José de Carvalho e Melo (futuro Marquês de Pombal) não se agradou de sua presença. Graças ao seu irmão Francisco Xavier de Mendonça Furtado, governador do Grão-Pará e Maranhão, conhecia a atividade dos jesuítas no Brasil e este missionário era um dos seus principais mentores e ativistas em sua oposição. Após o terremoto de Lisboa, em 1755, redigiu um opúsculo, que ofereceu exemplares a José I de Portugal e ao marquês de Pombal, sobre moral, chamado "Juízo da Verdadeira Causa do Terramoto" (1756), reputava a catástrofe como sendo um castigo divino. Pombal não o perdoou. O suposto atentado de 3 de setembro de 1758, que culminou no processo dos Távoras, proporcionou ao ministro a ocasião para perseguir Malagrida ainda, acusando-o de colaboração na tentativa de regicídio e manda-o prender. Assim entregue ao tribunal do Santo Ofício de Lisboa, foi acusado de heresia e posteriormente condenado ao garrote e fogueira, penas executadas em um auto-de-fé no dia 21 de setembro de 1761, no Rossio, a praça principal de Lisboa. Na opinião do filósofo francês Voltaire na obra "Cândido, ou O Otimismo", "(...) ao excesso de absurdo, juntou-se o excesso de horror".


AÇAILÂNDIA, 40 ANOS

EDMILSON SANCHES edmilsonsanches@uol.com.br O município de Açailândia é um dos 217 do Estado do Maranhão e o primeiro em ordem alfabética (que chega ao “Z”, de Zé Doca). Situado no Oeste Maranhense, tem 5.805 quilômetros quadrados (km2), mais de quatro vezes maior do que a área atual do município que lhe deu origem territorial, Imperatriz, que tem 1.369 km2. A população açailandense é de 113.121, segundo estimativa oficial do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 2020. A economia (Produto Interno Bruto – PIB) de Açailândia é de R$ 2 bilhões, 379 milhões e 994 mil (2018) -é de número 373 do Brasil, entre os 5.570 municípios, e a quarta maior do Maranhão abaixo apenas de São Luís (R$ 33,6 bilhões), Imperatriz (R$ 7,1 bilhões) e Balsas (R$ 3,4 bilhões). A Indústria (Setor Secundário) é o setor que mais contribui para a formação dessa economia, com participação, segundo meus cálculos, de 41,51%%. Em seguida, vem o setor de Serviços (Setor Terciário, que inclui o segmento do comércio), com 33,21%,. Depois, a Administração Pública, nos três níveis (municipal, estadual, federal), com 17,10%. Paradoxalmente, o primeiro setor da economia é o último na formação do PIB açailandense: a Agropecuária (ou Setor Primário) participa com apenas 8,16%. No ano passado (2020), os bancos aplicaram em Açailândia, em operações de crédito (financiamentos, empréstimos etc.), mais de R$ 527 milhões. De modo pouco comum, a maior parte desse total pode ter vindo do bolso dos próprios açailandenses e dos municípios da jurisdição das instituições financeiras: mais de R$ 444,9 milhões estavam em contas de poupança (R$ 284,3 milhões), de depósito a prazo (R$ 113,5 milhões) e de depósitos à vista (R$ 47 milhões)... * Pela Lei Estadual nº 4.295, de 6 de junho de 1981 -- portanto, há 40 anos -- foi criado oficialmente o município de Açailândia, que saiu da condição de distrito de Imperatriz. (Por sua vez, Imperatriz saiu do território de Grajaú; Grajaú saiu de Pastos Bons e Pastos Bons, de Caxias, minha terra natal). Mas a história de Açailândia completará 63 anos no dia 19 de julho. Foi nesse dia, em 1958, que os índios Cotia e Cocranum, em busca de água para a equipe de trabalhadores que construíam a rodovia Belém— Brasília, encontraram um riacho que tinha às suas margens palmeiras de açaí.


A Prefeitura e a Câmara de Vereadores deveriam oficializar o 19 de julho como a data maior do município -assim como acontece com Imperatriz, que foi fundada em 16 de julho de 1852 mas só em 1856 foi oficialmente criada (e, depois, em 1924, elevada à categoria de cidade). Afinal, a data de 19 de julho de 1958 dá mais “tamanho”, historicidade para Açailândia. Para ser a data oficial, basta que a Prefeitura encaminhe à Câmara (ou esta inicie por conta própria) um projeto de lei onde se justifique que, “considerando a necessidade de preservar os elementos históricos de início da cidade, fica estabelecido, como data comemorativa maior do município o dia 16 de julho, em homenagem aos pioneiros índios e brancos que formaram o primeiro ajuntamento populacional no território do município, a partir da descoberta do riacho que levou o nome de ‘Açailândia’, em razão da existência, em suas margens, da espécie de palmeira chamada ‘açaí’”. Vale lembrar que a data de aniversário de uma pessoa é a data em que ela nasce e não o dia em que foi registrada no cartório. EDMILSON SANCHES ***

AÇAILÂNDIA – O NOME Ter um nome (de respeito) é tudo. E o que um nome tem? O que ele significa? Que história(s) conta? No caso do topônimo (nome de cidade) “Açailândia”, você leitor sabe, ele foi dado em razão da existência, no território do município maranhense, da conhecida espécie de palmeira chamada “açaí”, ou “juçara”, o outro nome pelo qual a planta e a fruta são identificadas -- incorretamente -- em grande parte do Maranhão (açaí e juçara são plantas -- palmeiras -- diferentes). A ORIGEM DO NOME - O nome “Açailândia” é formado da união de dois elementos linguísticos, um bem brasileiro, originado da língua tupi, e outro da Alemanha, país do Velho Mundo, a Europa. “Açaí” vem do tupi “iwasa’i”, com o significado de “fruta que chora” (diz-se que em razão do suco que sai dos frutos roxo-escuros). Por sua vez, “lândia” vem de “land”, palavra de uma antiga língua alemã, o teutão ou teutônico, que significa “terra”, “região”, “país”. “Land” ficou muito popular em inglês e francês e foi adaptado pelo latim (de onde veio para o português), com o acréscimo do sufixo “-ia”, servindo para formar muitos nomes em nosso idioma. A DATA - O registro impresso mais antigo da palavra “açaí” data de 1763. Ele foi localizado (segundo os lexicólogos Antônio Houaiss e Mauro de Salles Villar, autores do “Dicionário Houaiss”) no livro “Viagem e Visita do Sertão em O Bispado do Gram-Pará”, escrito pelo monge beneditino, frei e bispo dom João de São José.


AÇAILÂNDIA, A OUTRA - A maranhense Açailândia correu risco de ficar sem este nome. Em 1932, bem antes da fundação de Açailândia, um grupo de homens de origem japonesa desmatou terras no estado do Paraná e constituíram a Fazenda Três Barras. Com o povoamento, a área passou a ser chamada “Assahiland” . Neste caso, “Assahi” é expressão da língua japonesa que significa “sol nascente”. Em 30 de dezembro de 1943 a localidade é elevada à categoria de município, com o nome Açaí. O habitante ou natural de Açaí chamase “açaiense”, ficando “açailandense” para o município do Maranhão. (Embora haja grafia dupla para a cidade paranaense -- Açaí e Assai – os dicionários só registram “Açaí”). A LEI - Sobre a palmeira açaí, há décadas venho falando ou escrevendo no sentido de que a Câmara Municipal de Açailândia corrija uma inconformidade da Lei Orgânica de Açailândia, aprovada em 1990. (A Lei orgânica é a maior lei, espécie de Constituição de um município). A inconformidade está no Artigo 227. Se ainda não foi mudado, diz este artigo, textualmente: “Fica protegida por esta lei a espécie ‘Euterpe edulis’ (açaizeiros), que originou nome do Município”. O nome científico “Euterpe edulis” é exclusivo da palmeira conhecida como JUÇARA. Cientificamente, botanicamente, o AÇAÍ chama-se “Euterpe oleracea”. Embora se diga que no Maranhão “juçara” e “açaí” são a mesma coisa, em termos de Lei e de Ciência botânica as coisas não são assim -- ou, pelo menos, não devem ser assim.


MANÉLIS E AS TARÔAS DO MARANHÃO!!! RAMSSES DE SOUSA SILVA Manuel Jorge, português, navegador e construtor naval veio num pequeno trimarã batizado de “Tarôa”*, que é o nome do Deus Polinésio do Mar. Chegou ao litoral do Maranhão, no início da década de 60 com o amigo Carlos, também português depois de uma navegação recheadas de aventuras desde Portugal. Encantado com o calor, a chuva fina, a mata e o povo navegou por muitas ilhas, praias e portos da região, procurando um lugar agradável, resolvido a ficar. . . E por aqui ficou Logo, todos sabiam da chegada desta “estranha canoa”. Olhada pelo través era mesmo uma canoa a vela, mas vista de proa ou popa eram três cascos unidos que muito intrigavam os marinheiros das “beiradas”. Pela primeira vez em suas vidas, as comunidades pesqueiras do litoral maranhense viam um barco diferente. Talvez o primeiro multicasco, singrando as águas brasileiras. Na chegada aos portos, muita gente aglomerava-se para vê-los, indagando como navegava, se era boa de pano e o “nome” do barco. Manoel dizia simplesmente “TARÔA”*. Na realidade, estavam querendo saber o “modelo ou o tipo” da embarcação. Tarôa passou a ser sinônimo de barcos de dois e três cascos, no litoral do Maranhão e do Pará. Estabeleceu-se, primeiramente na praia de “Valha-me Deus,” que fica numa ilha do município de CururupuMA. Com observações argutas, das condições locais de navegação e sabendo: Das marés que chegam a mais de sete metros; Da grande parte dos portos que ficam no seco na baixa-mar; Dos muitos bancos de areias; Das correntezas rápidas de enchente e vazante; Dos ventos fortes que criam ondas imensas e curtas nestes mares rasos. . . Introduziu os multicascos na região! Muito velozes com pouco calado, de cascos estreitos e longa linha d’água, passam por lugares 3 a 4 vezes mais raso do que navegaria um monocasco de mesmo tamanho. Sua estrutura, leve e resistente suporta situações de enchentes e vazantes diárias, navegando muito rápido, com segurança, sem a inclinação característica e desconfortável dos monocascos, além de uma autonomia muito maior que os barcos locais. No seco ficam eretos e não tombam. A princípio houve muita resistência à novidade. Mestres marinheiros ouvindo falar desta nova canoa ficavam curiosos para conhecê-la e competir contra ela. Não davam nem para o início nas improvisadas regatas. Logo ficavam para trás, com cascos e velas sumidas, no horizonte. Até mesmos os motorizados, com o “vento de feição” ficavam para trás. A fama dele e suas tarôas foram crescendo entre os marujos locais. Deu-se bem no litoral do Maranhão. . . E foi agregando adeptos. Ele, com seu entusiasmo criou uma comunidade, dentro e fora da família, de pescadores, construtores, cruzeiristas, regateiros e admiradores dos multicascos. Há mais de 50 anos ensina, com paciência e tranquilidade a arte com todos os detalhes. A turma foi construindo e aprendendo. Manélis influenciou uma geração inteira, que passou a construir e navegar em barcos feitos a partir dos seus desenhos. Criou uma categoria de carpinteiros e operários navais, instruídos e imbuídos na nova forma de construir embarcações. A vontade é tanta de navegar que alguns transformam monocascos em Tarôas. Através dele, o Maranhão tornou-se a “Capital do Multicasco Brasileiro” e São Luís seu maior polo de construção. Estaleiros locais já constroem multicascos com técnicas desenvolvidas aqui, com qualidade e modernas tecnologias.


Na praia da Ponta D’areia, no Iate Clube de São Luís e na Marina-Aven existem dezenas com variados tamanhos e outra quantidade distribuída pelo litoral do Brasil, Guianas, Caribe e Europa. Manélis, no meio náutico é considerado como um dos introdutores do multicasco no Brasil é um dos melhores construtores. Hoje, vive tranquilamente na praia de Outeiro, Cedral- MA construindo barcos, navegando e testando suas obras de arte. É considerado, o Pai do Multicasco Maranhense. Quiçá do Brasil... Pela enorme contribuição que deu ao desenvolvimento das Tarôas, influenciando uma nova e vibrante geração. Uma Lenda Viva!!! * Quanto ao “Trimarã Taroa”, que deu este presente, linguístico, ao Maranhão, foi navegando para Belém com Carlos. Manoel resolveu ficar nas ilhas de Cururupu-MA. Na capital do Pará, saudoso de sua terra, Carlos vende a pequena embarcação de 7 mts ao Sr. Ville, agente de viagens, sócio do Iate Clube do Pará e embarca para Portugal. Não sei mais o sobre o trimarã. . . Infelizmente não se tem nenhuma foto deste maravilhoso veleiro que influenciou tanta gente! Bons Ventos, J3D.


HEMETÉRIO, O PROFESSOR ABOLICIONISTA DE CODÓ

ANTONIO CARLOS LIMA Depois de Maria Firmina dos Reis (1822-1917), reconhecida e celebrada como primeira escritora a tratar, na literatura brasileira, do tema da escravidão, chegou a vez de outro maranhense, o professor Hemetério José dos Santos (1858-1939), nascido em Codó, subir ao pódio das personalidades emblemáticas dos movimentos negros no Brasil. Assim como Maria Firmina (1822-1917), que ganhou notoriedade nos meios acadêmicos e estudantis depois de sua redescoberta nos anos 70 do século passado pelo poeta Nascimento Morais Filho, Hemetério dos Santos virou, repentinamente, tema de estudos em diversas universidades por sua contribuição, como professor e escritor, na luta pela inclusão do negro na sociedade e pelo fim do preconceito racial. O curioso é que nenhum dos dois esteve na linha de frente do movimento abolicionista, liderado por José do Patrocínio, Luís Gama, André Rebouças (negros, como Hemetério), Joaquim Nabuco e o maranhense Joaquim Serra, entre outros. Hemetério e Maria Firmina, que à época da Abolição tinham 30 e 66 anos de idade, respectivamente, atuaram como entusiastas, mas praticamente à margem desse que foi o primeiro movimento social brasileiro de abrangência nacional. A medida da curiosidade que hoje desperta esse maranhense quase ignorado no Maranhão desde sua morte há 81 anos foi dada há duas semanas pela Folha de S. Paulo. O jornal de maior circulação e influência no Brasil dedicou um podcast (reportagem em áudio, acessível pela Internet), de cerca de uma hora de duração, para contar, em tom quase épico, “a história do professor negro e antirracista que ensinou durante a escravidão”. Artigos e teses de mestrado, como a de Aderaldo Pereira dos Santos, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, sobre a trajetória do professor negro, multiplicam-se nos centros acadêmicos. Lembrou-se que, desde 1944, o professor codoense é patrono da cadeira número 25 da Academia Brasileira de Filologia. No bairro Jacarepaguá, na zona norte do Rio de Janeiro, uma escola pública o homenageia: a Escola Municipal Hemetério dos Santos. É quase a glória, para quem, não obstante os méritos intelectuais demonstrados como professor, filólogo, poeta e conferencista, foi vítima de preconceito racial no meio culto em que viveu e A língua como libertação Hemetério José dos Santos nasceu a 13 de março de 1858 em Codó, à época uma pequena povoação à margem do rio Itapecuru, formada por lavradores, a maioria escravos, e comerciantes. Filho da escrava Maria e do comerciante Theóphilo José dos Santos, antes dos dez anos foi levado para São Luís. Na capital, estudou no prestigioso Colégio Imaculada Conceição, dos padres Raymundo da Purificação Lemos, Theodoro de Castro e Raymundo Fonseca, instalado à rua São Pantaleão (depois, à rua do Sol), onde teve como colega, dentre outros filhos da aristocracia de seu tempo, o futuro governador Benedito Leite. Em São Luís provavelmente também conviveu com os irmãos Aluísio e Artur Azevedo, os quais, adolescentes como ele, já se aventuravam no mundo do teatro e da literatura. Foi no Colégio Imaculada Conceição que Hemetério passou a cultivar o gosto pela gramática. Ali foi educado segundo os métodos do professor Francisco Sotero dos Reis (1800-1871), para quem o ensino da língua,“como


instrumento político e como órgão das artes da palavra, primava sobre todas as disciplinas de Humanidades, e de todas era como base e fundamento único”, nas palavras do próprio Hemetério. Em 1875, aos 16 anos, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde complementou os estudos e, aos 20 anos, tornouse professor do Colégio Pedro II, o mais importante do Império, e do Colégio Militar. Publicou Gramática elementar da língua portuguesa; Livro dos meninos: contos brasileiros de acordo com os processos modernos; e outras versões de sua gramática para alunos da Escola Normal do Distrito Federal e do Colégio Militar. No mesmo ano em que Machado de Assis publicava “Memórias póstumas de Brás Cubas” e Aluísio Azevedo lançava em São Luís “O Mulato” (1881), Hemetério dos Santos trazia à luz o “Livro dos meninos”, compêndio de textos destinado a jovens estudantes sobre trabalho, higiene e instrução, no qual condena com veemência o escravismo. Também escreveu poesias (“Frutos cadivos”), crônicas e conferências, como “Pretidão de amor” e “Carta aos maranhenses”, documentos em que defende a dignidade dos negros após a abolição e, nesta última, mais enfaticamente, o ensino correto da língua portuguesa. Casou-se com Rufina Vaz de Carvalho, neta do editor e tipógrafo Francisco de Paula Brito, negro de grande prestígio nos meios intelectuais, o que pode ter contribuído para a sua inserção social. Demolidor de preconceitos Em artigo publicado na revista da Academia Brasileira de Filologia (Ano II, No. 2, Rio de Janeiro), em 2003, o escritor e filólogo maranhense Antonio Martins de Araújo já situava o professor Hemetério entre os grandes gramáticos de sua época. E assinalava que, “nascido em berço pobre, sabe-se lá quanto sofrimento e quanto preconceito ele teve de romper para chegar ao ponto que chegou”. O título do artigo resume a tese de Martins: “Hemetério José dos Santos, o demolidor de preconceitos”. O professor Hemetério era, segundo diversos testemunhos, pessoa de difícil trato. Polêmico, trajava-se de maneira extravagante. Usava fraque e cartola escuros e fumava charutos na rua, o que contribuía para alimentar o perfil caricato, alimentado pelo preconceito racial, com que era visto pela sociedade carioca branca e letrada. O jornalista e poeta satírico Emílio de Menezes (1866-1918), que desfrutava de grande popularidade, o desancou muitas vezes na imprensa, e sempre com viés racista. Das provocações feitas a intelectuais que julgava omissos ou pouco engajados na luta pela dignidade dos negros, antes e após a abolição (atacou o crítico José Veríssimo e o jurista Rui Barbosa), a mais prejudicial ao conceito público do professor Hemetério foi a que dirigiu ao escritor Machado de Assis. Poucos dias depois da morte do autor de “Dom Casmurro”, a 29 de setembro de 1908, publicou um artigo violento contra o escritor (“A arte de Machado de Assis é uma arte doentia, de uma perversidade fria”, “A sua poesia foi tão incolor como seus trabalhos ulteriores”), o acusa de omissão na causa antiescravagista e de ter abandonado a mãe adotiva. O episódio é narrado por Josué Montello no livro “Os inimigos de Machado de Assis”. Nele, o romancista maranhense transcreve o texto integral do artigo do professor Hemetério e a violenta reação da intelectualidade carioca. Mas o tempo passou e, com ele, a indisposição e a ignorância em relação a esse maranhense negro do Codó, o “demolidor de preconceitos”, na definição precisa do professor Antonio Martins de Araújo. Assim como sucedeu com Maria Firmina dos Reis, também mestra e escritora esquecida durante um século, o Brasil começa a desvelar “a história do professor negro e antirracista que ensinou durante a escravidão”, como anunciou a Folha de S. Paulo em seu podcast. Antes tarde do que nunca.


OS REFRESCANTES SABORES DA ILHA E SEU MAGO CERES COSTA FERNANDES Neste tempo de calor – e todo tempo é calor em Upaon-açu – é tempo de sorvete. Do sorvete de coco das caixas de zinco com gelo que resiste nas caixas modernas de alumínio forradas de isopor, ainda carregado no ombro do sorveteiro – vêeete coco. Ah, o sorvete de coco na casquinha! Tão bom e tão proibido: “Você sabe com que água ele é feito?” Inquiria meu pai, dedo em riste. Nem queria saber. Aprendi com meu tio Janu – mais conhecido como Zoquinha – que comidas muito temperadas ou de procedência duvidosa, se gostosas e imperdíveis, a gente come “pelas barbas de São Pedro” e todo mal é exorcizado. O sorvete de coco tem uma prima ancestral, também de molecada circundante e procedência duvidosa – e apesar disso, ou até por isso – muito saborosa e desejada: a raspadinha. Patrimônio alimentar da humanidade (não é?), a raspadinha é registrada historicamente desde os tempos de Nero: ele mandava vir neve das montanhas para ser misturada aos sucos de frutas servidos nos festins de Roma. É, pois, a ancestral registrada do sorvete. Nos banquetes, os romanos a sorviam reclinados nos divãs, dois deliciosos pecados capitais juntos: gula e preguiça. Só me dano é que, nos filmes de época, não sei o porquê, Nero sempre está saboreando cachos de uva; não é justo, e as raspadinhas? Morro de inveja dos romanos e de saudade das raspadinhas. Não venham me dizer que ainda resistem algumas na Praia Grande. São feitas com xarope industrializado, não mais com xarope de frutas de procedência duvidosa. Sorvete é arte, ponto. É perecível? Então é uma instalação; quem nisso puser dúvida, lembre os sorvetes de creme e o de ameixa (meu preferido) saídos das mãos do Lúcio. Quem de nós, ilhéu, viveu nesta São Luís quatrocentona dos anos sessenta ao começo dos oitenta e não soube a fama, ou teve o excelso prazer de provar dos sorvetes do mago conhecido apenas por Lúcio. Ou melhor, o Lúcio do Hotel Central? O curioso é que não lembro a figura dele. Nunca o vi. Conheci o nome, a celebridade e o sorvete. Todos os saídos do Hotel Central eram “do Lúcio”. Às vezes penso que Lúcio era mais uma marca, um mito que uma pessoa real. Existiria de fato? Era mais de um? Talvez fosse um Homero, um Shakespeare do sorvete, cuja autoria pode até ser contestada, mas as criações, únicas e inimitáveis. Confesso que a minha primeira vez foi em Fortaleza; quero dizer, a primeira vez em que saboreei, com ritos de iniciação, um sundae, novidade máxima, na época – não havia em São Luís. A cerimônia se deu nas Lojas Americanas de lá, acompanhada de Guaraná Champanhe. Comuniquei a aventura aos amigos do Largo de Santiago e recebi de volta uma informação solene que me assanhou: no Largo do Carmo, uma sorveteria servia um “sorvete enfeitado” que queria parecer um sundae. Quando convenci meus pais a irmos lá para conferir, ela, vida curta, tinha fechado. Decepção amarga. Muito tempo depois, outra tentativa: a sorveteria em cima da Loja Acácia. Sorvetes bons, mas nada de sundaes. Os verdadeiros surgiram na loja Ocapana da Rua Grande, ponto de encontro dos jovens. São Luís, então conheceu Banana Split, Vaca Preta, Vaca Dourada. Chovia a meninada por lá. E, é bom dizer, com os pais “acompanhando”. E quem se lembra do inicio da sorveteria Elefantinho? Caiu no gosto popular oferecendo sorvetes de sabores da terra; bacuri, cupu, juçara, cajá, murici, milho verde, tapioca e outros que tais. Outras tentaram, mas foi ela que mudou a preferência dos nativos; antes era chocolate, creme, ameixa, morango, caramelo, coco. Frutas da terra, só para picolés, assim mesmo com morango (artificial) ganhando disparado das outras. De nome estranho e lugar longe dos points da moda, lá no Diamante, foi campeão de vendas anos a fio. Ponto de referência obrigatório para turistas, surpresos com a variedade das nossas frutas. A descoberta das excelências do cupu, bacuri e juçara, os levavam ao êxtase gastronômico. Essa sorveteria tem o mérito de ter acordado os maranhenses para a riqueza e valorização do sabor de suas frutas, tão fora de moda na época em que sãoluisenses queriam ser cariocas. Hoje, temos sorveterias sem conta em São Luís (alguém se lembra da do Valentim Maia?), umas muitas boas, outras assim, assim. Mas, neste rememorar de tantos anos (quantos?) de raspadinhas e sorvetes, quero deixar minha homenagem aos sorveteiros anônimos do sorvete de coco; à raspadinha da Praça Deodoro (quando lá


era um recanto tranquilo e de convivência); ao sorvete do Lúcio (viverá ainda?) e ao inovador Elefantinho, que deixou São Luís com mais gosto de São Luís. Entrou pelo bico do pato saiu pelo bico do pinto, quem tiver as suas predileções, pode juntar mais cinco.


NAVEGANDO COM JORGE OLIMPIO BENTO A consagração do direito a uma vida digna, realizada no caminho de perseguição da felicidade, implica a presença acrescida do desporto, a renovação das suas múltiplas práticas e do seu sentido. Sendo a quantidade e qualidade do tempo dedicado ao cultivo do ócio criativo (do qual o desporto é parte) o padrão aferidor do estado de desenvolvimento da civilização e de uma sociedade, podemos afirmar, com base em dados objetivos, que nos encontramos numa era de acentuada regressão civilizacional. Este caminho, que leva ao abismo, tem que ser invertido urgentemente.


VISITA A TRÁS-OS-MONTES Vieste por causa da mesa farta e a preço módico?! O pretexto é louvável, porquanto os comes e bebes são de um sabor inigualável; mesmo depois de emborcados, a língua fica a bater palmas ruidosas com o céu da boca. Quem aqui não vem, ignora o requintado paladar da carne de vitela, de cabrito e cordeiro, do lombo de porco, do presunto, das alheiras, dos salpicões e outros enchidos, dos variados queijos de cabra e ovelha, a sério e não ao faz-de-conta. Para não falar no alimentício pão de trigo e centeio, cozido em fornos aquecidos com lenha. E há ainda os vinhos, que descem na garganta e deixam a boca cheia de um corpo aromático, sem pressa de desaparecer. Sendo tudo isto deveras relevante, veste o hábito de humilde peregrino. Admira os versos escritos nas ladeiras pelas mãos calosas dos Prometeus locais. Venera os autores, desmedidos poetas e sonhadores: arroteiam o chão pedregoso e nele plantam vinhedos, oliveiras, amendoeiras, cerdeiros, figueiras, pessegueiros, ameixeiras, morangueiros, laranjeiras, castanheiros, nogueiras, pereiras e macieiras, semeiam melancias e melões, batatas e toda a sorte de hortaliças. Quando o céu vira as costas às suas súplicas e recusa a vinda da chuva, eles regam a terra com o suor que lhes escorre da testa. Colhem então os frutos que nunca houve no paraíso. Aqui é o reino da gratidão e da ascensão, sentidos orientadores para o absoluto e divino. Embora afogados em trabalhos, os titãs arranjam tempo para subir ao alto das serras e montes, para orar e pagar promessas nas capelas e ermidas erguidas às Nossas Senhoras de todos os nomes. Duros e terrosos, comovem-se com a ética e estética dos caminhos e horizontes. Têm os olhos e o espírito tingidos das cores da natureza, como o amarelo das giestas e o branco das urzes que, nesta altura, coroam os outeiros. É pouco? Após a visita, sempre curta, regressarás a casa com a alma encantada e a jura de voltar. Percebeste finalmente que o húmus, onde nasce o transmontano, é uma sarça ardente! REGRESSO Para trás ficaram as serras, os vales e as ribeiras, mas continuamos lá. Não, não lavrem na deturpação das nossas proclamações. Somos transmontanos e temos a devida noção do que podemos e valemos. Não nos orgulhamos de nós, porquanto sentimos bem o peso dos inúmeros defeitos que nos ajoujam. Dada a falta de virtudes, afirmamos o orgulho na terra original. Procuramos nela o telurismo que atiça a inquietude, e nas suas fragas e montes o sentido que empina a alma e a insufla da ânsia de subir, de sublimar o chão aferrado à condição. É assim que regressamos à cidade grande e vivemos com a insatisfação de quem sabe da impossibilidade de corresponder ao magma que traz por dentro e o responsabiliza por fora. Vemo-nos em estado de permanente nascimento. Quão exigente obrigação! DESTRUIÇÃO DA SINGULARIDADE DA UNIVERSIDADE19 Em 14-15 deste mês vai ocorrer a eleição de docentes para o Conselho Geral da U. Porto. As listas concorrentes estão, há muito, no terreno, constituídas por pessoas estimáveis. Reparemos numa delas, com o lema ‘Recentrar a Missão da Universidade com Visão Estratégica’, por ilustrar o ambiente mental reinante. Que ‘recentração’ ou correção de rumo é essa? O essencial da proposta é fácil de resumir, porquanto o óbvio esconde a cabeça na areia e deixa o rabo à mostra. A lengalenga da moda perfaz o extenso rol de propósitos e ‘visões estratégicas’. A formulação cuida de impressionar, carregando nas tintas e recorrendo ao jargão do ‘globish’, usado a esmo, para tudo e para nada. Como os jovens nasceram na era ‘digital’, o ‘modelo educativo’ e os processos de ensino devem ser repensados e privilegiar a dimensão ‘virtual’. E, dada a ‘competitividade´ da globalização e do mercado, os académicos têm que a cultivar e adquirir a mentalidade e a atitude de ‘vencedores’. Ademais, recomenda-se a conversão da universidade num conglomerado de laboratórios, e a outorga a estes da primazia na pósgraduação. É manifesta a tentativa de abandonar e desacreditar a aula presencial, sim, a ‘aula de cátedra’, ponto culminante da docência, em que o professor põe à prova o nível do saber e da erudição, a arte da palavra, da 19

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‘comunicação’ (tornar comum) e transmissão. A aula e tudo quanto ela encerra são objeto de troca; a declaração de amor e paixão elege hoje as ‘competências’, a ‘criatividade’ , a ‘iniciativa’ etc. dos estudantes. Talvez sem saber, os ‘visionários’ evocam a ideia de ‘Progresso’ da Modernidade; porém pervertem-na e o mesmo fazem ao racionalismo científico-tecnológico daquela era. A ciência da Modernidade tinha por alvo a dominação da Terra; o conhecimento científico almejava tornar-nos ‘mestres e possuidores da natureza’. Qual era o intuito desta ambição? A nossa ‘emancipação’ da irracionalidade e menoridade animal. Ou seja, o desejo de dominar o mundo natural e social não se justificava e revia no gozo de ter esse poder; estava ao serviço da realização de objetivos superiores, tais como: aumento e melhoria das condições e garantias da liberdade, da felicidade ou bem-estar, da democracia, dos direitos humanos, do Estado providencial, enfim, do ‘Progresso’. Pois bem, a noção de ‘Progresso’, elaborada pelos pensadores da Modernidade, foi elidida paulatinamente pela ‘razão instrumental’. A ‘vontade de poder’, concebida por Nietzsche, conduziu à ‘tecnicização do mundo’, axiológica e eticamente desenfreada, elucidada por Heidegger na obra ‘Ser e Tempo’. Livres da supervisão de uma finalidade extrínseca, os meios erigem-se em fins e instauram uma lógica automática, animada exclusivamente pela mecânica e cegueira da competição e do sucesso a todo o custo. A reivindicação de mais meios tecnológicos torna-se um objetivo que se basta a si mesmo. O domínio da natureza ou da sociedade não visa hoje um mundo humano mais livre e feliz; o fito do comandar e dominar esgota-se no poder e prazer do comando e domínio. É para isso que se desfralda a bandeira da ‘competitividade’, geradora de um clima de conflitos e desarmonias, hostilidades e inimizades, com uma minoria de triunfadores e a maioria de perdedores, todos acorrentados pela depressão e exaustão. A obsessão pelo útil, pelo pragmático e pelo lucro económico põe em perigo o apego a valores fundamentais como a ‘dignitas hominis’ e a busca da verdade, ignora a utilidade das ‘coisas’ inúteis para a sacralização do humano. Deste jeito, o sublime ‘desígnio’ da ‘instituição’ (promoção da Ciência e da Cultura, da Espiritualidade e da Intelectualidade, do Progresso artístico, cívico, tecnológico, ético e estético da Humanidade) é atirado para o caixote do lixo. A Universidade assume-se como muleta auxiliar da ‘democracia comercial’, desvincula-se de compromissos daquele teor, renuncia à sua ‘singularidade’, àquilo que a torna credora da admiração universal; deixa-se ‘encantar’ e ‘arrasar’ por um totalitarismo ideológico, de trágicas consequências. Pouco a pouco, fica refém da pobreza da linguagem e da infantilidade do pensamento, incapaz de sair da prisão em que, voluntariamente, se encarcera. Eis a luminosa ‘visão estratégica’! É obrigação da consciência denunciar a enfermidade. Não sou saudosista de tempos idos; pugno por caminhos novos, ponderando os factos e extraindo deles atinentes ilações. Move-me a intenção de aplaudir vias de renovação e apontar as que levam à destruição. Quando o presente se fecha em si e não abre portas a um futuro auspicioso, é altura de parar e procurar outras fontes de inspiração, em vez de continuar a caminhar aceleradamente para o abismo. DA MISSÃO DA EDUCAÇÃO Há pensadores que, em meia-dúzia de palavras, condensam um extenso tratado. Temo-los, por isso, na conta de sábios. Trago hoje três à colação; num curto parágrafo ou frase expõem a ingente missão da educação, supratemporal e válida em qualquer conjuntura e situação. Começo com a visão iluminista de Emmanuel Kant (1724-1804): “É no problema da educação que assenta o grande segredo do aperfeiçoamento da humanidade.” Acrescento a graça e leveza de Mark Twain (1835-1910): “Tudo está na educação. O pêssego dantes era uma amêndoa amarga; a couve-flor não é mais do que uma couve que andou na Universidade.” Concluo com a advertência Herbert George Wells (1866-1946), que parece ditada pela atenção à barbárie e incivilidade crescentes nesta era, e encontra eco em vários avisos de António Damásio: “A história da humanidade torna-se cada vez mais uma corrida entre a educação e a catástrofe.” Qual dos competidores ganhará o prélio, se não o enfrentarmos com radicalidade, seja na escola, seja na universidade e noutras instâncias da sociedade irradiadoras de influências 'educativas'? E como devem agir os treinadores da educação para que ela atinja o estado de ‘forma’ olímpica e vença a prova?


DA ESTÁTUA, DO ATLETA E DA VIDA A estátua de granito, que extasia os nossos olhos, foi arrancada da pedreira. Era uma pedra dura e tosca. Sofreu cortes e sujeitou-se a intervenções do martelo e do cinzel para configurar o sonho imaginativo de beleza, de sublimação e magnificência do artista. Com o atleta sucede o mesmo. É obra da oficina, da atenção, do cuidado, da dedicação e das ações do treinador, bem como da esperança, da confiança e do trabalho em si. Atinge a forma, renunciando a não poucas coisas atraentes e doces, e cumprindo um plano de treino aturado, persistente e depurador de onerosidades perturbadoras. Ou seja, não chega ao pódio da admiração e do aplauso, de maneira espontânea e gratuita. Paga um elevado preço e percorre um caminho árduo e até de dor para alcançar a meta ambicionada. Igualmente é assim na educação e na vida. Aquilo que é valioso não cai do céu; requer um esforço amoroso e uma constante renovação da paixão. É a vontade que nos ata ao leme, a nossa e não a de outrem. CRENÇAS E LIMITES DA CIÊNCIA E DO CONHECIMENTO A indagação de Thomas Elliot (1888-1965) é hoje mais pertinente do que nunca: Onde está a sabedoria que perdemos com a acumulação de tanto conhecimento? Onde está o conhecimento que submergiu nas ondas de tanta informação? Herdamos do Humanismo e do Iluminismo uma crença exagerada na ciência, esperando dela respostas para questões que não são da sua conta. O resultado do equívoco está bem à vista na atualidade. O conhecimento não desbancou o senso-comum, não guia a Humanidade em todos os domínios, nem acaba com os ídolos da tribo e as credulidades mais inanes. Estamos submersos em formas várias de irracionalidade, de superstição e aversão à razão, de fanatismo, intolerância e obscurantismo. A incerteza não se deixa dominar e problemas importantes da existência humana – os de matriz ética e estética, injustiças, desigualdade de oportunidades, exclusão, pobreza, fome, doenças, insegurança, perseguições, guerra e barbárie – estão longe da resolução. Continua por alcançar a relação de reciprocidade entre ciência e bondade, sabedoria, democracia e cidadania, na qual Newton (1643-1727) acreditava piamente. Ou entre conhecimento e conduta ética, altruísmo, moralidade e felicidade, como imaginaram Sócrates (469-399 a.C.), Espinosa (1632-1677) e Voltaire (1694-1778) . A ciência é instrumentalizada como meio de poder. Não se opõe, por vezes é conivente e auxiliar, a sistemas de opressão e exploração. Ademais, o ‘cientismo paperista’, em voga nas instituições académicas, encoraja certezas fáceis, mata o pensamento e a visão sapiencial. Quem dá o sentido para a existência nesta época de sombras e conotações medievais? A ciência não-pensante tem pouco a dizer sobre a condição ontológica e metafísica do Ser, e até sobre o significado das realidades que investiga e manipula. É, pois, urgente a necessidade de avivar a curiosidade científica e de a casar com o espírito filosófico. Os protagonistas das entidades universitárias e afins tardam em acordar da dormência e em reconhecer o clamoroso falhanço da ordem vigente.

EVOCAÇÃO E HOMENAGEM Em 10 de junho de 2019 o Professor Alfredo Faria Júnior partiu para outra dimensão. Não consigo calar, neste dia, uma singela evocação. Ramalho Ortigão (1836-1915) percebeu e formulou, de maneira clarividente, a função da Educação Física (então designada ‘Ginástica’) ao serviço da educação: “A ginástica não é uma questão de circo nem de barraca de feira, é uma alta e grave questão de educação nacional.” Outros escritores, coevos do ilustre plumitivo portuense, tanto no Brasil como em Portugal, tiveram idêntica visão. No entanto decorreram muitos anos, antes que a Educação Física encontrasse alguém que a vestisse com roupagem didática e assim pudesse sair à rua, elegante e domingueira, sem complexos de inferioridade e medo de enfrentar o atavismo das irracionalidades e preconceitos. O feito tem obreiros; Alfredo Gomes de Faria Júnior refulge no meio deles. Até sempre, Amigo fraterno!



FIEP Bulletin On-line ALFREDO GOMES DE FARIA JUNIOR E A EDUCAÇÃO FÍSICA BRASILEIRA NOS ANOS 1960 E 1970: UMA HISTÓRIA QUE SE CONTA | NETO | FIEP Bulletin On-line ALVARO REGO MILLEN NETO, ANTONIO JORGE SOARES Resumo - O presente estudo pretende narrar, através da história de vida do professor Alfredo Gomes de Faria Junior, uma das possíveis histórias da Educação Física brasileira nos anos 1960 e 1970. A trajetória de vida configura-se como uma das chaves de acesso ao entendimento da dinâmica do campo acadêmico e profissional da Educação Física nesse período. A vida de Faria Junior, de sua infância até a formação profissional e seu posterior exercício, indica como a socialização do biografado com diferentes instituições (clube, Colégio Militar do Rio de Janeiro, Escola Nacional de Educação Física e Desportos, instituições esportivas e o magistério) formaram valores e disposições que influenciaram de sobremaneira sua atuação profissional nos anos 60 e 70 do século XX. Tais dispositivos e valores estavam presentes no habitus do profissional de Educação Física na época. Sua trajetória auxilia a explicar as transformações e ambigüidades que se operavam no habitus que conformava o campo da Educação Física. Por outro lado, temos em sua trajetória a possibilidade de relativizar a hipótese, construída pelos críticos nos anos 1980, que o período em questão teve o modelo esporte de alto rendimento como modelo pedagógico transplantado para o ensino da Educação Física escolar. A experiência de Faria Junior como professor em escolas de primeiro e segundo graus e como autor do livro "Didática de Educação Física" (1969) indica que os valores, meios e fins do esporte de alto rendimento foram ressignificados e sistematizados de modo a adequarem-se aos valores, meios e fins da escola. Palavras-chave História; História de Vida; Educação Física Escolar

AS DUAS VOZES Presumo que todos ouvem dentro de si vozes de sinal contrário. Ouço-as, desde que tenho noção da vida; e continuo a escutá-las. Uma amiga e a outra inimiga, uma estimula e a outra desencoraja; uma sussurra alento e confiança, a outra aposta em mostrar a realidade sem hipótese de alteração. Uma atrai para a possibilitação da impossibilidade, a outra prega a conveniência de não desafiar a conformidade, de gozar a comodidade da passividade. Uma toca constantemente a campainha da cautela e prudência face aos perigos e rasteiras, aos limites e fragilidades; a outra convoca para a ousadia, a persistência e resiliência. Ambas são bem audíveis, por exemplo, quando corro. Ao conselho de desistir ou correr menos tempo responde a vontade férrea que manda continuar. É assim na exercitação corporal e nas restantes modalidades performativas da existência e da consciência. Os triunfadores são aqueles que não cedem aos afagos e insinuações da voz traiçoeira; optam por seguir os desafios da norma alta, axiológica, cívica, culta, exigente e criadora. Os que cedem não superam nada; ficam onde estão.

NÃO ESTOU AQUI! No túmulo de Mário Quintana (1906-1994) lê-se este epitáfio, escrito por ele: “Eu não estou aqui.” Onde está então o ilustre vate? Nos livros e pensamentos que deixou, na memória e no coração dos leitores. Tal como entenderam os gregos, ele não é ‘anónimo’; o seu nome vive multiplicado e iluminado na grata lembrança e no doce apreço de muita gente. Quanto mais o Outro seja o nosso próximo, maior é o número de lugares onde estamos. Não me quero fechado em mim. Anseio estar nos familiares, amigos e em todos os que se cruzam comigo, de maneira cúmplice e solidária, na caminhada da vida. Estejam perto ou longe, são as minhas circunstâncias e parte grande de quem sou. Estou com eles, nas suas preocupações e realizações, alegrias e tristezas.


DA PALAVRA E DA CIÊNCIA A palavra não é inferior, nem anda desavinda da ciência. Ambas caminham de mão dada e lado a lado. A primeira poliniza e fecunda a segunda. A palavra interpela o mistério; a ciência aborda os fenómenos e as coisas. Na palavra mora a intimação da pergunta; a ciência busca a possibilidade da resposta. A palavra mergulha no obscuro; a ciência vai pelo caminho da luz. A ciência está vinculada à racionalidade da cabeça; a palavra brota do acordar da alma e do querer do coração. A palavra é inicial e pioneira. “No princípio era o Verbo!” Adão ou Epimeteu começou por nomear os animais, as plantas e os objetos. Sophia de Mello Andresen (1919-2004) disse-o desta maneira bela: “De longe muito longe desde o início / O homem soube de si pela palavra / E nomeou a pedra a flor a água / E tudo emergiu porque ele disse.” Os vates, inventores dos marcos da Humanidade e da Civilização, das utopias, inquietudes e interrogações, vêm de antemão; inauguram a arte e o esplendor da imaginação. Só mais tarde, muito mais tarde, surgem os cientistas e a ciência, para tentar explicar a criação. DA SORTE Dizem que pisar na merda dá sorte. Ora, considero-me um sortudo e não é devido a isso. Na maioria dos itinerários e das estações da vida encontrei pessoas limpas e ambiente asseado. Só vi merdice nos locais onde era suposto não existir. Cuidei de não a calcar, de me afastar dela e passar ao largo. Hoje o ‘pantrampismo’ goza de clima propício, está em alta, multiplica-se e amontoa-se. Surge em toda a praça e esquina. Isto não obsta que estejamos a viver uma era de infelicidade coletiva. Não abusem, pois, da euforia os que se sentem na trampa como o peixe na água; nem se deixem assustar ou deprimir os que a detestam. Daí não advém nada de bom ou que tenha futuro. A merda tem pouca dura; com a vinda do calor, seca e fica sem préstimo algum. Se queres encontrar a sorte, procura-a noutro lado! O QUE É E PARA QUE SERVE A POESIA? São muitos os alarves que perguntam, com ar de gozo e com baba bovina a escorrer pela boca: Para que servem a literatura, a poesia, a filosofia, a música e as artes num curso superior? Para quê sobrecarregar os estudantes com tais ‘inutilidades’ e ninharias? A esses paspalhos responde Aldo Pellegrini (1903-1973), poeta e ensaísta argentino (In ‘Chama-se Poesia Tudo Aquilo que Fecha a Porta aos Imbecis’): “A poesia tem uma porta hermeticamente fechada para os imbecis, aberta de par em par para os inocentes. Não é uma porta fechada com chave ou com ferrolho, mas a sua estrutura é tal que, por mais esforço que façam os imbecis, não conseguem abri-la, enquanto cede à simples presença dos inocentes. Não há nada mais oposto à imbecilidade que a inocência. A característica do imbecil é a sua aspiração sistemática a certa ordem de poder. O inocente, ao contrário, nega-se a exercer o poder, porque possui todos.” Ah quão maçador e incomodativo é o cultivo da estesia e do intelecto, de tudo quanto nos torna humanamente melhores!

DIAS DE EXALTAÇÃO DA FRATERNIDADE E GRATIDÃO Terminou ontem o XVIII Congresso de Ciências do Desporto e de Educação Física dos Países de Língua Portuguesa, organizado pela Faculdade de Educação Física e Desporto da Universidade Pedagógica de Maputo, sob a proficiente batuta do seu Diretor, Prof. Sílvio Saranga, coadjuvado pela diligente equipa de docentes, funcionários e servidores da instituição. O evento decorreu na modalidade virtual, porém com sessões presenciais no local, onde não faltaram altas entidades ministeriais, municipais e académicas. Bem hajam os organizadores pela felicidade que nos proporcionaram! Foram três dias de celebração da gratidão a figuras ilustres que já partiram (Professores Noronha Feio, Alfredo Gomes Faria Júnior e António Teixeira Marques e vários atletas e dirigentes moçambicanos) e ao Professor


António Prista, que continua apolíneo e solar entre nós. E também de exaltação de quantos abriram os caboucos de diversas áreas do saber. Quatro conferências e trinta e cinco palestras magistrais (e mesasredondas de idêntico teor) projetaram vias de reflexão e ação, por onde é curial caminhar nesta era tão carecida da ousadia da interrogação e reinvenção. A realização do próximo congresso é assumida pela FCDEF da Universidade de Coimbra. Lá estaremos em janeiro de 2023 para saciar a fome de abraços que nos consome e reforçar a fraternidade que nos une. Nada destrói este movimento; a tentação de o enterrar não deve esquecer que ele foi e é semente. Mesmo em horas escuras, os seus membros agem como a flor do girassol; para todos, sem exceção, irradiam o calor da abertura. Até Coimbra! No alto da Universidade cantaremos a saudade; a nossa voz fará transbordar o Mondego.


DA DELAÇÃO, DEMISSÃO E COBARDIA A delação é gratuita, porém a canalhice ínsita nela é abjeta. Denunciamos e damos os nomes dos contestatários e manifestantes aos poderosos, sejam estes dirigentes de países, empresas, instituições ou do gabinete de trabalho, para lhes mostrar que podem confiar em nós, que pertencemos ao mesmo mundo e não seremos nós a colocar-lhes quaisquer dificuldades. É uma questão de carreira. Isto aprende-se e pratica-se na escola e na universidade. O horror conta com a cegueira da maioria. Dá muito jeito atribuir à família a responsabilidade principal pela educação cívica e pelo chocante atropelo de princípios e valores, que hoje infeta a sociedade. Ainda existe a família? Exerce ela uma influência 'educativa' maior do que a de outros agentes de socialização? Alivia-se assim a escola e a universidade de uma obrigação categórica. E favorece-se a manutenção dos privilégios dos que nascem privilegiados. A cor (azul) do sangue continua a ser um fator de sucesso mais forte do que o mérito. Trago à colação a asserção de Aristóteles (384-322 a. C.),: “A coragem é a primeira das qualidades humanas, porque garante todas as outras.” Submeto a esta apreciação uma divisão evidente nos docentes das escolas e universidades: os que tomam posição e os que se omitem perante as várias formas do mal. São abundantes os segundos, cobardes e escondidos atrás das cortinas do oportunismo. Traem a instituição e os imperativos que juraram defender; vendem-se a interesses mesquinhos. Estes peixes mortos poluem os rios do presente, e deixam filhotes putrefactos para o futuro. Eis o seu ignominioso legado! DO ABSOLUTO E DO RELATIVO Valor absoluto têm a vida e a morte, os filhos e os netos, a mulher amada (ou o homem amado), os que moram no nosso coração, a dignidade e todos os direitos fundamentais das pessoas, a verdade e outros axiomas exaltantes da existência. Tudo isto é prioritário. O resto é relativo e secundário. AMOFINADA E VOCIFERANTE! A corte da capital causa mal à nação, mas nunca assume a responsabilidade. Ao invés, quando confrontada, fica amofinada. É o que está a suceder. Os seus tenores vociferam nos jornais e canais de rádio e televisão. Não se conformam ao confinamento. Dizem agora que o país não pode ser desigual; e omitem que a igualdade implica tratar com equidade e justiça o diferente. Reivindicam o privilégio de ser exceção, furar as regras, poder fazer o que lhes dá na veneta e não arcar com as consequências. Os castos amofinados passam uma esponja sobre os festejos futeboleiros e o comício realizado em Lisboa, há dias, pelo partido dito 'Iniciativa Liberal'. Liberal?! Não é bem assim, mas, como o verniz da mentira é moeda corrente na política, aceitemos que é mais ou menos assim. A nobreza e o baronato querem ‘livrar-se’ de obrigações sociais e afins. Ah quanto beneficiávamos em estar livres de semelhante bafio! DA IDADE Tenho muita idade, mais do que o número de anos. Provenho do tempo em que a maioria das pessoas dava passos esforçados e suados e não saía do sítio; só uns poucos iam longe, por obra do milagre congregador da transcendência e da sorte. Estou cheio de ontens, e estes de janelas e varandas. Nelas há vasos onde teimam em germinar e florescer viçosos amanhãs. Como se houvesse de viver eternamente. Não sei se isto é aprendizagem ou obrigação. Talvez seja um imperativo, uma não rendição a este presente, virtual, desumanizador e bloqueador da empatia, servidor de fins perversos, a contento de gente amante de formas refinadas da violência. Sinto saudade de rever professores que não aceitem ser burocratas, e gostem de estudantes interrogativos.


P’RA NÃO DIZER que não falei de poesia... e de poetas


AYMORÉ ALVIM (APLAC, ALL). NOITES DE VERÃO. Declina o sol tranquilo, no horizonte, Espargindo pela relva Tons verdes brilhantes, Nos campos da minha terra. Em revoadas, Pássaros buscam, nas copas, Seu aconchego. Plangentes sons Do campanário partem Prenunciando o cotidiano enredo Do fim de mais um dia. Ave Maria! Aos poucos, Os multicores raios do sol poente Vão ficando cada vez mais tênues. Um negro manto, no horizonte oposto, Vai se desdobrando sob o teto do céu. Ao longe, pálida e tímida, Emerge a lua, exuberante e linda, Diluindo na sua branca luz A escuridão. Pontos cintilantes, Quais diminutas pedras de brilhante, Vão pulverizando os céus. Uma doce aragem começa a soprar Lá das bandas da Faveira. Jacus, japiaçocas E as marrequinhas ligeiras Buscam seus ninhos. A noite avança... As rodas de conversas arrefecem. Apaga-se a luz dos candeeiros. Nas alcovas, um doce aconchego Faz chamar o sono. Pinheiro adormece...


ROBERTOFRANKLIN ALL, ALTO, AVLA, AMCL, SCLMA Pelos caminhos notei pedras umedecidas não pelo orvalho da madrugada mas sim pelas tuas lágrimas derramadas. Pelos caminhos, notei que a atmosfera que pela manhã exalava o perfume das rosas, agora fazia sentir o ranço do meu arrependimento. Não acreditei que te fiz sofrer Voltarei, quero enxugar teu pranto e transformar esse tédio em alegria, para que voltes a sorrir Peço perdão não quero mais causar tristeza quero devolver esse amor Que um dia foi teu para que juntos possamos novamente voltar a ser um só.


NOTA DE REPÚDIO E EM SOLIDARIEDADE AO CONFRADE JEANDERSON MAFRA

A Sociedade de Cultura Latina do Brasil, vem a público repudiar as injúrias dirigidas ao confrade Jeanderson Mafra, membro deste sodalício. O Escritor, Poeta e Amigo Jeanderson Mafra sempre foi um assíduo defensor dos Direitos Humanos no Maranhão; corajoso, engajado e impoluto defensor da justiça social e liberdade de expressão. A Sociedade de Cultura Latina do Brasil tem orgulho de ter o confrade Jeanderson Mafra em seu quadro como escritor e poeta maranhense humanista, com uma poesia e escrita inovadora que engrandece a literatura do Maranhão e lhe honra. Desejamos que todos os mal-entendidos sejam desfeitos e que a postura ilibada do nosso confrade seja reconhecida. A democracia, o direito à liberdade de expressão, e a característica própria da poética de Jeanderson Mafra é e sempre foi a de se fazer justiça social, de propagar o humanismo e ternura por meio da Arte e da Cultura. Dilercy Aragão Adler Presidente da Sociedade de Cultura Latina do Brasil. 4 POEMAS DE JEANDERSON MAFRA Publicado em agosto 12, 2019agosto 12, 2019 por Carvalho Junior 4 POEMAS DE JEANDERSON MAFRA – QUATETÊ (wordpress.com)

|https://www.facebook.com/jeanderson.mafra| Jeanderson Mafra |São Luís/MA, 1989|. Servidor público e escritor brasileiro. Com formação na área de letras, é o autor de Fragmentos de Mármore (2017). Prepara a publicação de Ode ao Rito Primevo, de onde os poemas aqui compartilhados foram extraídos.


O PEDINTE Andando pelas praças, Sujo e fétido, caminha, Um pedinte em sua sina, Mendigando na cidade, Às vezes mulher ou criança, Na combalida esperança de algo pra lhes suster, Seu vício, sua agonia Com altivez masoquista Inda persiste em sofrer ! Obscuro ele tateia, Submete-se humilhado, A quem com um vil olhado, Se contorce com a presença, A seguir sua trilha mórbida, De viver sem humanidade, Esquecido dos transeuntes, Invisível, sem vaidade. Na curva, seus dedos tremem, No torpor de uma viagem, E assim repete-se a cena, Sem nenhuma alteridade, Que viver é uma pena Impregnada de maldade!

SUBVERSIVA Subversiva, causa sombria, Amam-te a noite para negar-te o dia, Privada aos caprichos dessa tirania, Dão-te migalhas nas fartas orgias ! Subversiva, de olhar tão altiva, Temem teus seios de tanta ousadia, Querem -te presa com tua poesia, Odeiam teu canto que expande a magia, Teu doce encanto, quem o maldiria!? Feliz de quem ouve, Tua melodia, De quem se ajoelha e beija teus pés, Que sorve em transe tua vulva molhada, Toda lambuzada de mel e de vida, De quem te mordisca, Te come calado, Contigo a cereja, Que nunca te deixa na tarde cinzenta, Na cama sozinha, Qual uma vampira, A morder os lábios, Canino afiado, E língua macia.


TULIPA NEGRA Cabelo vermelho, Quedado ao marrom, Quem sabe teus cachos no meu edredon, Quem sabe a malícia do olhar zombeteiro No qual, corpo aberto, vacilo brejeiro. Andar de quizomba da negra mais linda, Da boca carnuda com mel, Melanina, Torpor teu perfume, Exalas vanila. Quem sabe é feitiço pra mãe rezadeira, Mas nem m’a parteira, Mulher benzedeira, Desata a mandinga da preta faceira. Na pele de jambo, Há frescor de menina, Também mãe de santo, _ Ogum – deus, nos livra! Da mística ginga que só ela tem, Do seu doce canto acordando o além. Envolve e fascina, (Será pomba gira?) Será samba-enredo a dançar na avenida? É quente a macumba de sua poesia, As coxas são cedros, Os seios: magia, E o som de seus passos é tambor de mina.

ODE AO RITO PRIMEVO Quem lê isso? Quem lê isso e não sente o cheiro de sangue? Um ranço podre Num papel timbrado, Um fétido escarro do pérfido escriba, Cantam ser um deus que assim queria, Louvam um tirano de misoginia, Pervertem mil sonhos com melancolia. Queimam sacras taras do rito primevo, Tolhem mundos belos com suas profecias; Escravizam mentes, E ameaçam todos, Que não se curvaram a tais vilanias.


Querem-nos churrasco do seu sacrifício? Que temos com isso? Aroma agradável em nariz de cortiço. Não somos seu gado, Nem bode expiado, Largado, com sede, pelo seu pecado. Maldito harbenário! Lucro calculado, Todas as mentiras que surtam tens pacto. A destruição de tua vil cabala, É tua mortalha sem nenhum ensaio. Não terás sucesso quando despertarem, Lerem outros livros, Desbravarem mares, Encontrarem tribos de eras milenares. Toda tua farsa de céu e inferno, Cairá por terra quando estes voarem. Feriram teus pés sujos de roubares, E hão de ver teu chumbo como é falsa prata. Hipócritas! Porcos! Almas desprezíveis! Esta terra nunca será vosso espólio! Demônios sois vós venerando a morte. Brilhará na Terra a Era de Ouro! No Divino gozo da minha consorte. PERFIL Escrever sobre mim? É realmente uma armadilha, pois não sabendo quem sou, tenho me perseguido a cada dia e creio que esta é a meta de todos nós sobre a face da terra. Como diria Herman Hesse, "a vida de todo ser humano é um caminho em direção a si mesmo". No mais, - sem muita filosofia para agora - sou escritor e postulante a poeta (na hora que musa Poesia me quer visitar!); tenho um livro publicado, em co-autoria com meu pai, intitulado "Fragmentos de Mármore"(2017) e tenho um poema escolhido para a Coletânea "Novos Poetas Maranhenses" 2019, chamado "Cálido". Sou graduado em Letras e as gosto de usar para a vida, nunca para corrigir quem quer que seja, mas para aprender as várias dialéticas e dialetos de nosso povo brasileiro. Pois cada um só pode expressar-se na língua de seu próprio chão, estando todos nós fadados às grades da anticatarse se optarmos encontrar a liberdade poética pelas maneiras de outros. Continuo escrevendo e publicarei por vezes, quando puder, aqui. Devo lançar mais um livro de poesia em 2020 que já se intitulou "Ode Ao Rito Primevo". Espero aprender mais e mais aqui e me sentirei contente por alcançar com meus escritops mais e mais pessoas. É isso que importa: o encontro de vida pela Vida e pela Arte!


RAPAZ, OBRA RARA COM GOSTO DE SEMENTE E SÊMEN LEILA MICCOLÍS20

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O livro RAPAZ, de Mariano Cassas, é obra rara, porque a poesia de cunho homossexual em nossa literatura é muito esparsa e apresenta-se, em geral, com pouca técnica. O tema, até hoje, infelizmente, é explosivo demais para que seus autores preocupem-se com a literariedade, o que faz com que as composições deste tipo, muitas vezes, tenham coragem, mas lhes faltem propriedades literárias maiores. Realmente não é fácil escrever abertamente sobre comportamento, pensando em metáforas, metonímias, ritmos, elipses, alegorias e tropos. Por isso mesmo, disse que o livro de Mariano Cassas é raro, pois consegue aliar ousadia, estilo, clareza, mas propriedades literárias também. Lembra-me António Botto22, o poeta decadentista português que morreu atropelado no Brasil, no começo do século passado. Não que Mariano Cassas necessite de lastros culturais estrangeiros para ser valorizado, de modo algum. Porém considero Botto um dos poucos poetas (inclusive, ao que consta, foi o primeiro de língua portuguesa) que conseguiu esta destreza: transmitir, através de sua poesia homoerótica, o testemunho da hipocrisia, da indiferença, da falta de solidariedade de uma sociedade pretensamente “aberta” à diversidade, porém ainda altamente preconceituosa, quando se trata de conviver com a diferença na prática. Não é apenas uma lírica impactante, é uma lírica que protesta contra o farisaísmo cotidiano, de forma veemente. Indaga Botto, no Poema 2 de Toda Vida: [...] “Moral! Que vem a ser isso / Que se dá sem se pedir? / Homens!, cantai a verdade, / Bem alto, para se ouvir!”. Pergunta Mariano Cassas em E se fosse HIV?: “Onde todos vocês estiveram / quando deveriam estar aqui? / Eu continuo vivo – assim seja – / sem homem comida e cerveja”. Repito que não tenho a menor intenção de traçar, entre os dois, um paralelismo que respalde a poesia de Mariano Cassas – ele não precisa disso. No entanto, a menção ao poeta português serve para percebermos que, lamentavelmente, pouco ou nada mudou em matéria de pseudomoralismos repressivos, e que, principalmente em tempos de AIDS, os riscos da vida são tidos como desnecessários, fazendo com que o sexo vá ficando cada vez mais virtual e robotizado. RAPAZ nos alerta sobre isto, expondo sua nudez exuberante e despudorada, através de um lirismo muitas vezes agressivo, porém, ao mesmo tempo, de uma beleza transparente e contagiante: “Sim / estarei sempre aprendendo / a me entregar”. Tomara que sigamos estes versos, diariamente, e cultivemos este precioso plantio amoroso: nos entregarmos à vida, às experiências e à poesia, sempre com renovada vontade de aprendermos com elas.

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Leila Míccolis (Rio de Janeiro, 1947) é uma poeta, ensaísta, romancista, contista, roteirista de cinema e televisão, dramaturga e editora brasileira.[1] Estreia na poesia em 1965 com o livro Gaveta da Solidão, e foi publicada na antologia 26 poetas hoje, em 1975, organizada por Heloísa Buarque de Hollanda. Wikipédia Morre o controvertido poeta maranhense Mariano Cassas (imirante.com) António Botto – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)


E SE FOSSE HIV? Onde estão vocês que não estão mais aqui? Onde se escondeu Deus que desfalece sem mim? Onde está o Haiti que Caetano diz ser aqui? Onde está a cidade que adormece sem mim? Onde vibra a coriza que lembra a víbora do fim? Por que não me beijam as mãos se sou todo coração? Onde todos vocês estiveram quando deveriam estar aqui? Eu continuo vivo - assim seja sem homem comida e cerveja


QUEM ERA FRANCISCA IZIDORA? Encontrei em O Publicador Maranhense de 1870 o seguinte:

Pesquisando um pouco mais, descobri não ser maranhense, mas pernambucana...


(Jaboatão/PE, 24/01/1855 – Vitória de Santo Antão/PE, 22/01/1918) FRANCISCA IZIDORA GONÇALVES DA ROCHA - Domingo com Poesia

Poeta, jornalista, cronista, tradutora, escritora e conferencista. Integrou a “Officina Litterária Martins Junior”, do Grêmio Jaboatonense Seis de Março. Colaborou com os jornais recifenses: Diario de Pernambuco (1901), Correio Pernambucano (1868) e A Província e dos periódicos: O Phanal e o Commercio, ambos do interior do Estado. Em 1902 colaborou também com a revista “O Lyrio”, dedicada às questões femininas. Foi sócia correspondente da Academia Pernambucana de Letras. Ao lado de outras combativas e atuantes, tais como Edwiges de Sá Pereira, Leonor Porto e Maria Amélia de Queirós, lutou em prol dos direitos das mulheres. É autora de um drama lírico em três atos e de duas traduções de Byron (inéditos), assim como outras diversas produções em prosa e verso. Consta no livro: Pernambuco, Terra da Poesia (Campos e Cordeiro, 2010, p. 586), que autora publicou um livro de versos, “Açucenas” e um volume de textos em prosa, “Distrações e Lembranças”. Foi tradutora de vários autores. Publicou também “Ursula Garcia” (1905).

Ilha de coral* Lá nas plagas de flores e harmonias No seio azul da Polinésia linda, Aonde as auras embalando os sândalos Sacodem ramos de fragrância infinda... Onde as palmeiras no cetim das nuvens Entrelaçam gentis frondes rendadas, E à laranjeira os rouxinóis se aninham Cantando idílios nas manhãs douradas. Num quadro belo sobre o mar pacífico, Como a gaivota em transparente lago, A ilha de Otaiti surge graciosa Sorrindo às vagas no amoroso afago... - Vênus formada num frouxel d’espumas Da luz d’aurora em em divinais fulgores... Orna-lhe o cinto de corais e pérolas... No colo airoso desabrocham flores!... Lá onde a natureza é um poema E os céus estrofes cintilantes d’oiro... Um dia Eles chegaram com as aves, Que voam ledas para um fruto loiro... No declívio relvoso da floresta,


Entre murtas, ao pé da cachoeira, Teceram de aloés uma cabana Enastrada com folhas de amoeira. À sombra dos bambus passava arinda No róseo lábio narguilé cheiroso... E entre as rendas da saia se mostrava Indiscreto e faceiro o pé mimoso... Soltas as tranças perfumando a brisa, E o peito em ondas d’infantil prazer, Como a gazela do deserto Assírio Inocente e gazil sempre a correr... Depois cansada, vacilante, trêmula, - Borboleta de amor – mole, indolente Ia de amante descansar nos braços, Bem como a estrela no sendal d’Oriente! Que floridas canções pela espessura Entre risos e amor cingindo a vida! Como era belo o pensativo poeta... - Novo Rinaldo nos jardins de Armida! ......................................................................................... De tarde, nas canoas d’insulares, Com bandeiras de juncos e plumagens, Corriam sobre as ondas do oceano Às vezes a pescar como os selvagens. Que transportes de amor em doce enlevo! Que cena bela de risonhas cores! Eram dois gênios que passavam rindo... - na quadra festival mais dois cantores!

*In Pernambucanas ilustres, 1879, p. 180-181


A DATA LITERÁRIA DA POESIA: EM 14 DE MARÇO, DIA DA POESIA NACIONAL. WYBSON CARVALHO poeta caxiense e membro da ACL! A poesia ganhou um dia específico, sendo este criado em homenagem ao poeta brasileiro, Antônio Frederico de Castro Alves (1847-1871), no dia de seu nascimento, 14 de março.

Neste mês de março, precisamente no dia 14, neste sábado, algo do melhor que há no Brasil aniversaria: A POESIA. “A poesia é a arte da linguagem humana, do gênero lírico, que expressa sentimento através do ritmo e da palavra cantada. Seus fins estéticos transformaram a forma usual da fala em recursos formais, através das rimas cadenciadas. A poesia faz adoração a alguém ou a algo, mas pode ser contextualizada dentro do gênero satírico também. Há três expressões de poesias: as existenciais, que retratam as experiências de vida, a morte, as angústias, a velhice e a solidão; as líricas, que trazem as emoções do autor; e a social, trazendo como temática principal as questões sociais e políticas”.


Mas, eminentemente, a poesia é arte e exercício humano/espiritual. Quanto ao questionamento conceitual sobre esse contexto, temos a certeza: Bertoldo Breath se fosse questionado por alguém a respeito do conceito de o quê é a poesia, certamente o questionador já obteria sua resposta - “poesia é o próprio homem/trabalhador e, em realidade, há homens que trabalham anos e anos; esses são considerados bons / há homens que trabalham anos e anos; esses são considerados muito bons / e há homens que trabalham sempre; esses são imprescindíveis...”. Portanto, a poesia é um produto do esforço psicofísico humano. O mesmo questionamento, feito a Henfil, é claro, também, ele já nos responderia: - “poesia é arvore de vida e, em realidade, se dela não houver frutos, valerá o perfume e a beleza das flores; se dela não houver flores, valerá a sombra e o abrigo das folhas; e, se, dela não houver frutos, flores e folhas, valeu a intenção da semente...”. Embora a poesia, é claro, também, produto natural do esforçado cio da terra. Mas, ser poeta é ser o quê? Segundo o sábio professor, poeta e jornalista maranhense, Alberico Carneiro, se é atualíssima, ainda hoje, a teoria de Aristóteles sobre a arte da poesia ou da poética, apresentando-a como imitação, transformação ou mutação da realidade vista por outro ângulo, o poeta é uma espécie de mago, feiticeiro, bruxo ou encantador. Desse ponto de vista, ele, o poeta, pode transfigurar a linguagem da semântica, isto é: fazer com que as palavras, à maneira dos camaleões, passem por um processo mimético ou do mimetismo. E, assim, como camaleão, que, para preservar-se dos predadores mais perigosos, adapta a coloração da pele à cor do ambiente, para fingir e confundir-se com a paisagem, também o poeta faz com que as palavras imitem a realidade, procurando inseri-las no contexto semântico à contemporaneidade. O poeta Português, Fernando Pessoa, traduz esse paradoxo ou ambigüidade aristotélica sobre o ato da imitação à realidade: - “o poeta é um fingidor/finge tão completamente/ que chega a fingir que é dor/ a dor que deveras sente”. Já o poeta ludovicense, Nauro Machado, outro ser humano-cultural incompreendido em seu tempo, se confessa e, portanto, explica: - “a dor de ser poeta/ do ser fatal/ a dor de ser feroz/ é instante só/ mas que no ser demora e dura e fere/ para que mais doa”. Já o conterrâneo e poeta-camaleão, Salgado Maranhão, se faz poetar nas coisas: - “As coisas querem vazar o poema/em sua crosta de enredos, as coisas querem habitar o poema/para serem brinquedos. Chove nas fibras de alguma essência secreta e o poema rasga a arquitetura do poeta”...!


EspeciaisLANÇAMENTOS

SAULO BARRETO APRESENTA O NOVO LIVRO DO PREMIADO ROGÉRIO ROCHA, "PEDRA DOS OLHOS" "Avante ao promissor poeta! O mundo das artes só tem a ganhar!" Por: Mhario Lincoln Fonte: Divulgação

capa "PEDRA NOS OLHOS" Foi com incomensurável surpresa e ao mesmo tempo arrebatador júbilo que recebi do amigo Rogério Rocha o nobre convite para apresentar seu primeiro livro. Um livro de estreia, decerto, requer enorme responsabilidade para qualquer mortal; encargo esse que se agiganta ainda mais quando tratamos de um volume com quase uma centena de poesias, sem falar da incontestável magnitude do conteúdo, o que afasta - ressalto de antemão - qualquer possibilidade premente minha de encetar uma análise crítica que a mesma requer, ainda que superficialmente. Feita a devida ressalva, vamos, pois, ao que me cabe de fato - apresentar a obra. Antes, porém, permita-me destacar duas estrofezinhas com o intuito de revelar o dia que o conheci; acontecimento, aliás, sucedido muito recentemente deve-se dizer. Estávamos na Livraria AMEI quando finalmente abordei o poeta com o fito de comentar acerca de seu canal no YouTube sobre filosofia. Para minha surpresa fui muitíssimo bem recebido, ato contínuo, não sendo dispensada minha presença logo nas primeiras trocas de palavras, como geralmente acontece. A primeira impressão que ficou foi de uma pessoa por demais solícita, acessível, sem nenhum resquício da empáfia tão comum em nosso meio, eivado de presunções. Posteriormente, nos reencontramos na sua palestra de tema: A filosofia do Caibalion e as 7 leis herméticas e mais tarde, ainda, na noite em que foram anunciados os nomes dos vencedores do 2º Concurso Novos Poetas Maranhenses 2019 - Prêmio Gonçalves Dias, na qual o mesmo conquistou - com incontestáveis méritos (e com direito a declamação) - o 2º lugar com a sua "A ilha que pende sobre o nada", em meio a quase três centenas de trabalhos inscritos de altíssimo nível. Isto feito, falemos, portanto, um pouco sobre a presente obra - Pedra dos Olhos. No decorrer destas invulgares páginas, os (as) leitores (as) se depararão com a Poesia em seu estado mais vigoroso, puro e natural. São poemas escritos sob a égide de vários temas e formas; alguns registrados em tenra idade, outros na juventude, outros mais na média idade. Não seria exagero se afirmássemos que são poesias gestadas durante toda uma vida, depois de longo e doloroso período puerperal, o que dá um peso ainda maior ao livro; rechaçando - a pari passu - uma possível equiparação a maneira açodada de alguns autointitulados “poetas” (de ocasião), que costumam abortar seus “livros” a toque de caixa. Enfim, caríssimos amantes da boa poesia, encontraremos adiante versos escritos ainda na infância, mais especialmente aos 12 anos de idade, denunciando serem eles constatações cabais de elucubrações cavoucadas do íntimo e recolhidos à vida; para mim, a comprovação clara do encontro do ponto de interseção entre a Filosofia e a Poesia. Além disso, fica patente que o poeta filósofo busca contemplar o passado, presente e futuro, sem se eximir de dialogar com os anseios autênticos da conturbada alma humana em suas mais diversas fases e idades; o que


não deixa transparecer também, influências claras de luminares como Fernando Pessoa, Gullar, Adolfo Monteiro e tantos outros. Mas o que mais chamou minha atenção em específico foi a poesia dedicada ao velho Nauro. Nesta peça fica ainda mais fulgente sua verve lírica, nos fazendo lembrar até a eterna dualidade de amor e ódio que Nauro Machado nutria por sua São Luís, ilha essa incubadora natural de artistas, filósofos, boêmios, poetas e versos mil. Pertinentemente homenageia Nauro, prematuramente arrancado do nosso meio - não pela idade, pois o mesmo já contava com 80 anos -, mas por se tratar de um Ser que tem, assim como Castro, essência suficiente para viver mais de um milênio, sem esgotar as suas mais recônditas inquietações existenciais. Homenageando Nauro, fatalmente o Dr. Rocha louva a sua cidade: “Eu o vejo descendo a pé / A sempre velha Rua de Nazaré... / Os velhos prédios, as velhas pedras (...)” Encerro, pois com o trecho deveras mais importante desta apresentação, que se resume na minha humilde recomendação: LEIA SOMENTE!!! Petrifique seus olhos nestas raríssimas laudas! Se delicie sem moderação com esse caleidoscópio de versos e temas... assim como, certamente, eu o farei. Ouse explorar as entrelinhas, as nuances, pois um bom livro sempre falará por si só. Avante ao promissor poeta! O mundo das artes só tem a ganhar! Do amigo menor, São Luís/MA, setembro de 2019. Saulo Barreto Lima ------------------------------------

Capa do livro. Poema que abre o livro PEDRA NOS OLHOS: A ilha que pende sobre o nada Ah! essa ilha que não para de rasgar os pactos, acordos, tratados… Essa ilha que sempre quis abrir-se aos ventos da liberdade, aspirar o sopro morno de manhãs singulares, beber da água doce das fontes intactas, cantar hinos brotados do coração da terra. Essa ilha opiácea, esses laços com a vaga, com as ondas, oceano rasgado por gente de longe, rodeada de abismos e dúvidas por todos os lados, passado e presente em eterno sacrifício… nada, nada, quem dera... Ah! Ilha esquálida, sorvemos todos, ingratamente, a tua essência mais rara, o teu sumo agridoce, a energia cravada nas pedras de (en)cantaria. Ah! Ilha, triste ilha! Que teima em não afundar,


apesar do oceano, dos ventos, das ondas bravias, dos erros, dos donos, dos ledos enganos. Morreu em teu ventre, no escuro do silêncio, sufocada, a serpente que não nos soube destruir. Quedou também sobre teu chão propício, nas areias tórridas do destino, o touro negro, pastoreado por turvos fantasmas. 12 Ah! Ilha, pobre ilha enfastiada. Se és mãe fiel, fecunda e rara, entendes a saga em que estás mergulhada. E sei que em tuas preces mais intensas rogas para que o touro negro não renasça e que o ovo da serpente não se parta. Mas se ainda assim, atendidas tuas súplicas, venha então o infortúnio das águas ferozes e o vasto oceano de chofre te invada, guardarei teu segredo em meu porvir, velarei tua lenda no fundo do nada. **********

Rogério Rocha. Outro Poema: A Verdade Avança pela noite a voz interna, a onda assume a sede voraz dos mares. Sobe e segue e urge, quando despeja solene a atroz espuma de pretéritos redemoinhos. Íntimo, passeia o espanto em oceano de plenas nuvens. Céu e solo, mar e sonho, brilho e abandono... sob as sombras, sobre os ombros, emoção que refulge perene. Visões de outrora, infinitas auroras. De dentro da orgânica tessitura da mais tênue existência (tua) ressurge, na mansidão noturna, preciosa e serena a verdade.


"RIQUEZA LITERÁRIA DO MARANHÃO"


A PRESENÇA DA MULHER NA LITERATURA MARANHENSE Maria Firmina Presente! DILERCY ADLER Inicialmente quero dizer da imensa alegria por estar, mesmo que virtualmente, neste Simpósio de Literatura Maranhense-A Produção Maranhense em foco: a escrita, o espaço e o tempo. Ao mesmo tempo agradeço o amável convite dos organizadores deste importante evento, na pessoa do Prof. Dino Cavalcante. Saúdo também as queridas companheiras de mesa, a Profa. Dra. Dinacy Mendonça Corrêa e a Profa. Dra. Regia Agostinho Silva e a todos que nos acompanham nesta tarde.

No tocante ao tema, A PRESENÇA DA MULHER NA LITERATURA MARANHENSE, eu o adotei como título da minha apresentação e elegi como subtítulo “Maria Firmina presente!” Essa escolha resulta do meu entendimento de que esta ilustre escritora se firma como representação da mulher maranhense no cenário da Literatura. Trago como subsídio de reflexão desta minha breve análise duas afirmações, que, à primeira vista, parecem antagonistas, mas que de fato integram dois vieses da mesma situação: A primeira afirmação está no meu “Elogio à Patrona Maria Firmina dos Reis: ontem, uma Maranhense; hoje uma missão de amor!”: Presto, desse modo, esta homenagem à Maria Firmina dos Reis, uma bela representante das filhas de Eva, habitante do panteão da Mulher, que abriga todas as mulheres da História da humanidade, as deusas, as humanas [...], as reveladas ou as silenciadas [...] que ousaram e ousam ainda quebrar os paradigmas opressores do seu tempo, e destemidamente fizeram da “fragilidade feminina” a sua força, o seu escudo, a sua lança nos embates indispensáveis da vida, sem esquecer o amor e o erotismo, forças geratrizes de vida e de criação (Adler, 2014,p. 19). A segunda afirmação extraí do bojo de um projeto de autoria da professora e escritora Anna Liz, Presidente da Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil- AJEB-Coordenadoria Maranhão, que neste mês de março de 2021 programou, no decorrer dos seus 31 dias, uma homenagem a todas as Mulheres. Nesse projeto a cada dia uma ajebiana publicou sua homenagem às mulheres em cards individuais. Todas as mensagens, muito primorosas, mas uma delas, a de Regiliane Maceno, me chamou a atenção, pelo seu teor à primeira vista incomum: “Não sou, nem pretendo ser uma mulher guerreira, aquela que sempre precisa estar na ‘guerra’ pelo espaço que é meu. O espaço é meu. Pronto.” Daí me vi frente à tão enfatizada e indispensável luta que a mulher, como categoria humana, e em respeito à sua condição humana vem empreendendo, de forma diferenciada, em momentos sociais distintos. E me deparei, ao fim da leitura das duas afirmações, com uma “luta” e uma “não luta”. Esta última pautada na plena consciência de propriedade do próprio espaço do feminino, em todas as suas formas de ser mulher, o que me remete também a um pequeno poema publicado no meu primeiro livro em 1991, há trinta anos: Crônica & Poemas Róseos-Gris: ESPAÇO FEMININO Espaço mulher mulher no espaço espaçonave espaço cósmico cômico espaço...


inusitado das normas do corpo do sexo do leite materno que eterno sangra do peito a jorrar boca a dentro do homem! Nessa perspectiva, é do conhecimento geral que, historicamente, nos últimos séculos, com raríssimas exceções, o homem tem marcado sua existência por meio de sua supremacia sobre a mulher, em decorrência de que O universo masculino é caracterizado por mais plasticidade e acesso a um quantitativo e maior intensidade de estímulos para o desenvolvimento das suas potencialidades do que o feminino. Assim é que, também a arte, a exemplo da ciência, tem demonstrado um quantitativo maior de expressões, de obras masculinas do que de femininas. Ou seja, em todas as áreas do conhecimento, o pensamento adotado e divulgado socialmente é aquele que tem na sua base o modelo eurocêntrico, masculino, caucasiano e aristocrático (ADLER, 2016, p.230). A lacuna no que diz respeito às mulheres, como sujeitos na História, é vasta. Nesse contexto, cabe e, talvez, principalmente, à crítica literária feminina, pesquisas e estudos, darem visibilidade às mulheres, tornando também audíveis suas vozes e discutindo o real lugar da autoria feminina no cânone literário, desconstruindo a visão predominante eurocêntrica, masculina, caucasiana e aristocrática, referida anteriormente, ainda predominante na atualidade. É importante ressaltar que esta mesa, composta por três mulheres, traduz e concretiza essa preocupação. O certo é que na realidade objetiva temos alguns nomes e situações de mulheres na literatura maranhense, que são exemplos vitoriosos dessa “luta” ou dessa “não luta”. Uma das mais importantes precursoras da literatura feminina no Brasil é natural do Maranhão, a ilustre escritora, compositora, folclorista, charadista, colaboradora de jornais literários, Mestra Régia, professora de primeiras letras do sexo feminino da Vila de Guimarães, Maria Firmina dos Reis que, segundo Charles Martin, no prefácio da 3ª edição do romance Úrsula (1988), com um título “Uma rara visão de liberdade” afirma: Maria Firmina dos Reis evidentemente traz uma contribuição definitiva para a literatura abolicionista: ela representa um ponto de vista de oposição à tendência geral, dotando o negro de um padrão mental próprio dentro do cenário de Novo Mundo. Isto significa uma revolução na representação do outro e na representação da autoridade. Não só o outro passa a ter um “eu”, como também passa se expressar de modo próprio. Quando Mãe Suzana e Antero exprimem as suas reminiscências, estão ao mesmo tempo se auto-representando. Noutras palavras, não só se mostram, como se demonstram. Além disso, no romance Úrsula ela aborda as condições e contradições da relação senhor-escravo, da situação da mulher na sociedade oitocentista. Nas palavras de Charles Martin: “O personagem feminino Úrsula ultrapassa a dimensão de uma simples mulher doméstica […] incute nos personagens negros uma visão densa e acurada do seu passado africano e um sentido de ajustamento ao novo ambiente da América.” Contudo, não posso falar de Maria Firmina, sem nomear Horácio de Almeida, paraibano e José Nascimento Morais Filho, os mais importantes responsáveis pela desconstrução do apagamento de Firmina. E se hoje falamos dela, pesquisamos a sua obra e a sua vida, por sinal, pródiga ainda em interrogações, devemos ao homérico trabalho de Nascimento Morais Filho, à sua luta, por isso o intitulo carinhosamente de nosso “Pássaro Sankofa Maranhense”. Feita essa justa e breve homenagem à Firmina, abordarei outras também importantes presenças de Mulheres Maranhenses na historiografia cultural e literária do Estado.


Eu tinha planejado e coletei para este trabalho a participação da mulher maranhense no cenário da Literatura em fontes variadas, tais como: Catálogo de publicações, como o de “Autores Maranhenses da Casa de Cultura de Josué Montelo”, Antologias, livros, medalhas outorgadas, medalhas instituídas, internet e aquelas facultadas por instituições. Mas, posteriormente, tive que me pautar em quantitativo menor de dados considerando o tempo de apresentação do tema. O meu objetivo é, pois, com base em uma pequena amostra, demonstrar aquilo que já sabemos empiricamente. Chamo atenção para esclarecer que os referidos dados foram levantados nestes últimos dias, e alguns foram gentilmente disponibilizados por alguns presidentes ou membros de Instituições, como aqueles enviados pelo Vice-Presidente da FALMA, João Francisco Batalha; pelo Presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, José Augusto Oliveira; pela acadêmica Wanda Cunha, da Academia Luminense de Letras- ALL; pelo Presidente da Academia Itapecuruense de Ciências, Letras e Artes-AICLA, Inaldo Lisboa; por Maria Natividade Silva Rodrigues,que enviou os dados das Academias: João Lisboense de Letras-AJL (da qual é membro efetivo e da Academia Imperatrizense de Letras AIL; pela Presidente da Academia Vianense de Letras-AVL, Maria de Fátima Rodrigues Travassos Cordeiro; pela presidente da Associação Brasileira de Escritoras e Jornalistas do Brasil-Coordenadoria Maranhão-AJEB, Anna Liz. Além desses, eu dispunho em meus arquivos de dados da Academia Ludovicense de Letras-ALL, assim como da SCLB, da qual estou atualmente na Presidência, e da SCLMA, cujo Presidente atual é César Brito. Inicio pela Federação das Academias de Letras do Maranhão – FALMA, que apresenta um total de 40 afiliadas, até este ano de 2021, tendo: 07 em 2008, 05 em 2009, 01 em 2011, 01 em 20017, 14 em 2018, 11 em 2019 e 01 em 2020. Podemos observar que as filiações têm início em 2008, e os períodos de maior adesão são 2018 e 2019. Também podemos notar um decréscimo a partir de 2020, que acredito seja em consequência da pandemia e das medidas sanitárias que a acompanham. Acredito também que o quantitativo da presença de mulheres como acadêmicas e patronas de Academias e de Cadeiras aumentaram se comparadas a coortes de outros períodos. No tocante às Academias, a Academia Maranhense de Letras-AML, fundada em 10 de agosto de 1908, apresenta no seu quadro 40 Cadeiras patroneadas exclusivamente por intelectuais do sexo masculino. Nela existem três categorias de Membros Fundadores: Fundadores Pioneiros, num total de 12; Fundadores Complementares, num total de 08 e Fundadores de Cadeiras, num total de 20. Nesta terceira categoria encontramos duas mulheres: Laura Rosa, a Violeta do Campo-1888-1976 (Cadeira. 26), eleita em 3 de abril de 1943 e Mariana Luz-1879-1960 (Cadeira. 32) sem registro da data de eleição. Nos seus quadros de Membros, na qualidade de Antecessores, a AML apresenta três nomes femininos: Lucy Teixeira-1922-2007 (Cadeira 7); Dagmar Desterro-1925-2004 (Cadeira 24); e Conceição Neves Aboud-19252005 (Cadeira 20). No quadro atual de ocupantes de cadeiras, existem mais quatro mulheres: Ceres Costa Fernandes (Cadeira 39), Laura Amélia Damous (Cadeira 6), Sônia Almeida (Cadeira 20) e Ana Luiza Almeida Ferro (Cadeira 12). Além dessas nove mulheres, convém lembrar que a primeira escritora cotada para uma vaga na AML foi Maria Luiza Lobo, filha de Antônio Lobo, um dos fundadores da Academia Maranhense de Letras. A Academia Ludovicense de Letras-ALL, “Casa de Maria Firmina dos Reis”, foi fundada em 10 de agosto de 2013, na cidade de São Luís, capital do Maranhão. A ALL em quatro gestões, com a atual (2021), teve uma presidente do sexo feminino (biênio 2016-2017), a Profa. Dra. Dilercy Aragão Adler. Das 40 Cadeiras, seis são patroneadas por mulheres, além do que a Patrona da Casa, Maria Firmina dos Reis, é também uma mulher, mulata, filha natural de Leonor Felippa, também mulata, que foi escrava do Comendador Caetano José Teixeira. A esse respeito registro no meu livro: “Maria Firmina dos Reis: uma missão de amor”, lançado em 2017, na página 76, o que segue: [...] a ALL foi fundada 401 anos após a fundação da cidade de São Luís, talvez essa demora fosse em função da espera do tempo/destino do momento adequado para que Maria Firmina tivesse nela lugar de destaque. Às vezes me pergunto: Se tivesse sido fundada antes, seria ela a Patrona? Acredito que dificilmente.


A ALL apresenta no seu quadro de Membros apenas 06 Patronas de Cadeiras, a saber: Maria Firmina dos Reis (Cadeira 8), Laura Rosa (Cadeira 25), Maria de Lourdes Argollo Mello-Dilú Mello (Cadeira 29), Lucy de Jesus Teixeira (Cadeira 34), Maria da Conceição Neves Aboud, (Cadeira 37) e Dagmar Destêrro e Silva (Cadeira 38). Como Membros Fundadores apenas 03 mulheres:: Dilercy Aragão Adler (Cadeira 8), Clores Holanda Silva (Cadeira 30), Ana Luiza Almeida Ferro (Cadeira 31); 04 mulheres são Membros Efetivos: Maria Thereza de Azevedo Neves (Cadeira 13), Ceres Costa Fernandes (Cadeira 34), Miriam Leocádia Pinheiro Angelim (Cadeira 24) e Jucey Santos de Santana (Cadeira 35). Membros Correspondentes mulheres: Ana Maria Felix Deva Garjan, Annabel Villar, Anely Guimarães Santos (Kalil Guimarães), Luiza Leite Bruno Lobo, Raimunda Jansen Pereira, Sálvia Haddad, Vanda Lúcia da Costa Sales. Em processo de aprovação: Cecy Barbosa Campos (Minas Gerais), Juçara Valverde (Rio de Janeiro), Dyandreia Valverde Portugal (Portugal), Angeli Rose (Rio de Janeiro), Socorro Lira (São Paulo), Renata Barcellos (Rio de Janeiro), Vera Duarte (Cabo Verde) e Dina Salústio (Cabo Verde). Assim, a ALL apresenta em seu quadro um total de 06 Patronas de Cadeiras e 07 Acadêmicas. Convém registrar que na minha gestão foi instituída a mais alta Comenda da Academia: a Medalha Maria Firmina, por meio da RESOLUÇÃO-ALL Nº 001/2017, de 09 de dezembro de 2017, com o teor que segue: Institui a Medalha “Maria Firmina” do Mérito Literário e Cultural. A Academia Luminense de Letras-ALL foi fundada em 22 de julho de 1917, na cidade Paço do Lumiar-MA. Já completou seu centenário e apresenta em seu quadro de Membros Efetivos 10 mulheres: Ivone Silva Oliveira, Karla Maria Silva Oliveira Gama, Emanuelle Fonseca Ferreira da Silva Costa; Lourença Araújo, Maria da Graça Oliveira Privado, Harleny de Fátima Ferreira Santos, Neuzimar de Maria Mandú, Albiane Oliveira Gomes, Sílvia Tereza de Jesus Pereira Dutra e Wanda Cunha. A Academia Itapecuruense de Ciências, Letras e Artes-AICLA, foi fundada em 07 de dezembro de 2011, na cidade de Itapecuru Mirim-MA, por 34 Membros Fundadores. O seu quadro de Patronas apresenta 05 mulheres: Mariana Luz (Cadeira 01); Maria das Dores Cardoso (Cadeira 07); Graciete de Jesus Cassas e Silva (Cadeira 08); Maria José Lopes Martins (Cadeira 23) e Lili Bandeira (Cadeira 24). As ocupantes de Cadeiras da AICLA são 05: Maria da Assenção Lopes Pessoa (Cadeira13), Jucey Santos de Santana (Cadeira 17), Maria das Mercedes Sampaio de Menezes (Cadeira 33), Benedita Silva de Azevedo (Cadeira 34) e Terezinha Maria Muniz Cruz Lopes (Cadeira 36). Na categoria de Membros Correspondentes, de um quadro de 24 cadeiras, duas são patroneadas por mulheres: Blandina Santos (Cadeira 2), Teresinha Bandeira de Melo (Cadeira 15). Ocupantes: Dilercy Aragão Adler (Cadeira 02), Mirella Cezar Freitas (Cadeira 5), Antonia Silva Mota (Cadeira 07), Maria de Fátima Rodrigues Travassos (Cadeira 14) e Maria Cecília Cantanhede Dutra (Cadeira 15). Dentre os dois Presidentes na recente história da AICLA, o atual é Inaldo Lisboa que sucedeu Jucey Santos de Santana. A Academia João-Lisboense de Letras-AJL foi fundada em 27 de abril de 2017, na cidade de João Lisboa– MA. Tem em seu quadro de Membros Efetivos: Sonia Maria Nogueira, Jaqueline Barbosa Ferraz Andrade, Flávia de Almeida, Maria da Conceição Medeiros Formiga, Herli de Sousa Carvalho, Nery Barreto Silva, Iolângela Barreto Silva, Maria Natividade Silva Rodrigues, Brunides Queiroz Moreira, Monica Monteiro, Maria Loza da Anunciação Silva, Zeneide Maria Pereira. Tem como Patronas: Lucy Teixeira, Clarice Lispector, Edelvira Marques, Maria Beatriz do Nascimento, Cora Coralina, Maria Firmina dos Reis. No total 06 patronas mulheres e 12 acadêmicas. A Academia Imperatrizense de Letras- AIL foi fundada em 27 de abril de 1991, na cidade de Imperatriz-MA. No seu quadro de Membros Fundadores duas mulheres já falecidas: Edelvira Marques de Moraes Barros e Sebastiana Vicentina Motta Mello, e no quadro atual de Acadêmicas: Antônia Arlene de Sousa Azevedo, Edna Fonseca dos Santos Ventura, Olga de Sousa Matos, Liratelma Alves, Maria Helena Ventura de Oliveira, Maria Tereza Bom-Fim e Adriana.


No total, 09 nomes, dos quais 02 de membros-fundadores mulheres já falecidas (às quais faço uma homenagem in memoriam) e 07 no quadro atual. A Academia Vianense de Letras, “Casa de Anica Ramos” foi fundada no dia 04 de maio do ano de 2002, na cidade de Viana-MA. Na Presidência atual está Maria de Fátima Rodrigues Travassos Cordeiro, na VicePresidência, Maria Vitória dos Santos Cidreira, e como Primeira Secretária, Laurinete Costa Coelho. Apresenta, portanto, na Diretoria atual 03 membros mulheres nos mais altos cargos. O seu quadro de Membros Efetivos é constituído por: Maria da Conceição Brenha Raposo (Cadeira nº 11), Rosa Maria Pinheiro Gomes (Cadeira nº 15), Maria de Jesus Silva Amorim-Maria de Jesus Amorim(Cadeira nº 17), Maria Helena Nunes Castro, (Cadeira nº 24), Maria da Graça Mendonça Cutrim (Cadeira nº 27), Pollyanna Gouveia Mendonça Muniz (Cadeira nº 28) e Maria do Socorro Sousa Cutrim (Cadeira nº 30). Patronas: Edith Nair Furtado da Silva (Cadeira nº 02), Maria de Lourdes Argolo-Dilú Mello (Cadeira nº 09), Ana Soriano Ramos-Anica Ramos (Cadeira nº 15), Faraíldes Campelo da Silva (Cadeira nº 21), Enedina Brenha Raposo (Cadeira nº 24), Josefina Cordeiro Cutrim (Cadeira nº 27), Zeíla Irinéia Cunha-Zeíla Cunha Laulleta (Cadeira nº 30), Benedita das Mercês Balby de Sousa-Benedita Balby ou professora Bibi Balby (Cadeira nº 32) e Maria Antônia Gomes Costa (Cadeira nº 34). No total são 10 acadêmicas e 09 patronas. O Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão- IHGM foi fundado em 20 de novembro de 1925, na cidade de São Luís, em comemoração ao centenário do imperador D. Pedro II. Nas palavras do atual Presidente, Prof. José Augusto Oliveira, ao atender a minha solicitação dos dados, declarou: “Verifiquei que, ao longo de sua história de 95 anos, o IHGM foi extremamente masculino. O ingresso de mulheres é fato mais contemporâneo”. No decurso desse período teve apenas duas Presidentes mulheres: Eneida Vieira da Silva Ostria de Canedo e Telma Bonifácio dos Santos Reinaldo. Em anos anteriores constam no quadro de membros Efetivos mulheres: Telma Bonifácio dos Santos Reinaldo, Iva Souza da Silva, Jossilene Louzeiro Alves, Rosa Mochel Martins, Ilzé Vieira de Melo Cordeiro, Ariceia Moreira Lima da Silva, Maria de Conceição Ferreira, Eneida Vieira da Silva Ostria de Canedo, Dagmar Desterro e Silva, Neide Maria Ferreira Lima, Maria de Nazaré Leite da Silva, Joseth Coutinho Martins de Freitas. Quadro atual: Dilercy Aragão Adler (Cadeira n.º 01), Ana Lívia Bomfim Vieira (Cadeira n.º 04), Maria Goretti Cavalcante de Carvalho (Cadeira n.º 17), Clores Holanda Silva (Cadeira n.º 18), Elimar Figueredo de Almeida Silva (Cadeira n.º 20), Elizabeth Sousa Abrantes (Cadeira n.º 24), Maria Hélia Cruz de Lima (Cadeira n.º 26), Assir Alves da Silva (Cadeira n.º 27), Abianci Alves de Melo (Cadeira n.º 29), Edna Maria de Carvalho Chaves (Cadeira n.º 30), Terezinha de Jesus Almeida Silva Rêgo (Cadeira n.º 33), Ana Luiza Almeida Ferro (Cadeira n.º 36), Madalena Martins de Sousa Neves (Cadeira n.º 37), Maria Esterlina Mello Pereira (Cadeira n.º 46), Rita Ivana Barbosa Gomes (Cadeira n.º 53), Josefa Ribeiro da Costa (Cadeira n.º 55) e Elizabeth Pereira Rodrigues (Cadeira n.º 59). No total são 17 Membros Efetivos mulheres ocupantes de Cadeiras. A Sociedade de Cultura Latina do Estado do Maranhão-SCLMA foi fundada em 25 de junho de 1997, tendo como Presidente-Fundadora, Dilercy Aragão Adler. Atualmente o Presidente é o escritor César Brito que assumiu em 2017. Membros Fundadores mulheres da Sociedade de Cultura Latina do Estado do Maranhão-SCLMA: Arlete Nogueira da Cruz Machado, Elba Gomide Mochel, Dilercy Aragão Adler, Ieda Lago Barros Costa, Júsia Maria Batista, Paula Souza, Carolina Montello Vianna, Mundicarmo Maria Rocha Ferretti, Mônica Bezerra da Rocha. Membros mulheres da primeira Diretoria: Dilercy Aragão Adler, Ana Maria Costa Félix, Clerice Bastos Ferreira, Ludmila Matos Lago, Lilian Doussou Romero e Maria Tribuzzi. O quadro atual de Membros Efetivos mulheres: Ana Luiza Nazareno Ferreira, Anely Guimarães Santos, Ana Elizandra Gomes Ribeiro, Clores Holanda Silva, Cristiane Gomes Coelho Maia Lago, Dinacy Mendonça Corrêa, Evangelina Maria Martins Noronha, Francinete Torres do Vale Rocha, Graciane Soares e Soares, Jucey Santos de Santana, Karolline Cristine Reis Garcês, Lindalva Maria Barros Neves, Márcia Regina dos Reis Luz, Maria Cícera Nogueira, Maria da Assenção Lopes Pessoa, Maria de Fátima Rodrigues Travassos Cordeiro, Maria Goreth Cantanhede Pereira, Marinha Luiza Cantanhede Gomes, Maria Ofélia de Siqueira, Mariana da Hora Montelo, Mires France Almeida Pereira, Natália Ribeiro de Souza, Rossana Mafra Azevedo,


Sharlene Serra, Silvana Lourença de Menezes, Tâmera Maria Ribeiro Pinto Oliveira, Valéria Carvalho Maranhão Falcão e Wanda Cristina da Cunha e Silva. No total 12 membros fundadores mulheres e 28 membros mulheres efetivos. A Sociedade de Cultura Latina do Brasil-SCLB é constituída por todas as Estaduais, e Dilercy Aragão Adler assumiu a Presidência da SCLB em 2013, durante uma reunião da SCLB que aconteceu como parte da Programação do Projeto “Mil Poemas para Gonçalves Dias”, do IHGM idealizado por ela. Na atual gestão foi instituída a mais alta Comenda: Joaquim Duarte Baptista, por meio da Resolução Nº 01SCLB, de 02 de maio de 2018, Institui a Medalha “Joaquim Duarte Baptista” do Mérito Literário e Cultural. Em 2018, por ocasião do “IV Encontro Nacional da SCLB”, em São Luís do Maranhão, foram agraciadas: Antonina de Almeida -Nina de Almeida, 3ª Presidente da SCLB, Porto Alegre-RS (in memoriam); Maria Aparecida de Mello Callandra, 2ª Presidente da SCLB, Mogi das Cruzes-SP; Evangelina Maria Martins Noronha, São Luís-MA, Luiza Leite Bruno Lobo, Rio de Janeiro-RJ; Nair Portela Silva Coutinho, São LuísMA, Rita Maria Oliveira Teixeira, São Luís-MA; Rutineia Amaral Monteiro, São Luís-MA. Nesse evento foram também contemplados com o Diploma do Mérito Cultural: Aline Carvalho do Nascimento-MA, Annabel Villar-Espanha, Betânia Pinheiro Lopes -MA, Camila Maria Silva NascimentoMA, Ceres Costa Fernandes Vaz dos Santos-MA, Gabriela de Santana Oliveira-MA, Joseane Maria de Souza e Souza-MA, Jucey Santos de Santana-MA, Lenir Pereira dos Santos Oliveira-MA, Lucineia Ferreira Paz Ribeiro Walter de Negreiros-MA, Luiza Cantanhede-MA, Magnólia Pedrina Sylvestre-ES, Márcia Regina dos Reis Luz-MA, Maria Cícera Nogueira-MA, Maria de Fátima Rodrigues Travassos -MA, Maria Goreth Cantanhede Pereira-MA, Maria Stela de Oliveira Gomes-MG, Marlene Barros-MA, Miris France de Almeida Pereira-MA, Renata da Silva de Barcellos-RJ, Soêmia Pimentel Cypreste- ES, Terezinha Pereira-EUA, Vanda Lúcia da Costa Salles-RJ, Zelia Maria Fernandes da Silva-RJ e Zenaide Emília Thomes Borges-ES. Comendas Joaquim Duarte Baptista entregues no “III Encontro Internacional da SCLB”, em Carrazedo de Monte Negro/Portugal, em 2019: Arlete Lopes, Valpaços/Portugal; Dilercy Aragão Adler, São LuísMA/Brasil; Dyandreia Valverde Portugal, Rio de Janeiro-RJ; Jucey Santos de Santana, São Luís-MA/Brasil; Vanda Lúcia da Costa Salles-Rio de Janeiro-RJ e Magnólia Pedrina Sylvestre-ES. Diploma do Mérito Cultural entregue na ocasião: Ana Lúcia Teixeira Xavier, Portugal; Anely Guimarães Santos, Brasília-DF; Assunção Anes Morais, Portugal; Carla Araújo, Portugal; Carla De Sà Morais, Portugal; Daniela Viola Bona, Vitória ES/Brasil; Manuela Tender, Portugal; Maria Izabel Viçoso, Portugal; Maria Viola Bona, Vitória ES/Brasil; Odete Costa Ferreira, Portugal; Ormira Sylvestre Strappa, Vila Velha/ES /Brasil; Sonia Maria Rodrigues Rosseto, Portugal;Teresa Elizabete Teixeira Xavier, Portugal; Magnólia Pedrina Sylvestre, Vila Velha/ES /Brasil. Dinacy Mendonça Corrêa foi contemplada em 2019 na confraternização de final de ano da SCLB e SCLMA. A Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil-Coordenadoria Maranhão-AJEB-MA foi instituída no Maranhão em 2018. Coordenadoria do Maranhão: Presidente Coordenadora: Ana Elizandra Ribeiro (Anna Liz), Vice-Presidente: Sharlene Serra, 1ª Secretária: Heloísa Helena Santos de Sousa, 2ª Secretária: Adriana Bezerra Silva, 1ª Diretora de Finanças: Luiza Cantanhêde, 2ª Diretora de Finanças: Ivanilde Ferreira (Ahtange), 1ª Diretora de Cultura: Geane Lima Fiddan, 2ª Diretora de Cultura: Dilercy Aragão Adler. Associadas Efetivas: Anely Guimarães Santos, Carla Sílvia Souza da Rocha, Eliane Morais Araújo, Fátima Stela Bezerra Viana Barbosa, Francinete Torres do Vale Rocha, Inês Pereira Maciel, Janayna Ricoly, Jucey Santos de Santana, Lindalva Maria Barros Neres, Márcia Regina dos Reis Luz, Maria do Perpétuo Socorro de Azevedo Veras, Maria Goreth Cantanhêde Pereira, Natália Ribeiro de Souza, Patrícia Danielle dos Santos, Regilane Barbosa Maceno, Silvana Lourença de Meneses, Vitória Gabriely Ferreira Duarte e Wanda Cristina da Cunha Silva. No total 8 membros na Diretoria e 18 membros efetivos. O diferencial da AJEB em relação às demais Instituições culturais pesquisadas é que é constituída só por mulheres. Assim, nas Academias de Letras e Instituições Culturais mais novas, já fundadas neste novo milênio, observamos na amostra pesquisada que, existem mais mulheres em todas as categorias: Patronas de Academias, Patronas de Cadeiras, Membros-Fundadores, Membros Efetivos e Membros Correspondentes.


Embora não seja ainda expressiva essa presença, mesmo assim, contrasta com a situação das instituições culturais mais antigas, que apresentavam em seus quadros patronos homens na sua totalidade e escritores do sexo masculino nas várias categorias, ao lado de um parco quantitativo de presença de mulheres. Mas, como nesta análise o tempo não comporta todos os trabalhos levantados, vou me referir ao livro “No PANTHEON”, de Maria Tereza de Azevedo Neves, ocupante da Cadeira nº 13, patroneada por Artur Nabantino Gonçalves de Azevedo, da Academia Ludovicense de Letras, por ser, no meu entendimento, indispensável para ser citado neste Simpósio. Ela homenageia cinco mulheres do passado e 18 da atualidade, 21 no total. E o que me chama muito a atenção é que no Maranhão temos agora, com esta preciosa obra, dois Panheons na versão-livro: a primeira de Antônio Henriques Leal, homenageando dezenove intelectuais do sexo masculino e “No Pantheon” de Maria Thereza na qual estão retratadas, com esmerado refinamento, vinte e uma mulheres. Outro dado denunciador do despotismo masculino, na sua relação com a mulher, extrapola a anulação do seu papel social e laboral para além da esfera doméstica, como também ao apagamento já referido e impinge impiedosa detração à figura feminina como demonstra Maria Thererza na apresentação do seu “No Pantheon”, quando cita um poema publicado em um Jornal de 1881, na antiga cidade de Desterro, hoje Florianópolis, A mulher que foi a perdição para o pai Adão, para Sansão a morte, e para Salomão uma vingança. .............. ............. .......... para o menino, um consolo, para o noivo, um desejo, para o marido, uma carga, para o viúvo, um descanso, para o jovem, um pesadelo para o homem, um estorvo, para o diabo, um agente. .............. Por isso, reafirmo que a mudança dos valores antes vigentes está sendo feita, lentamente, mas quebrando, sim, paradigmas, superando exclusão... numa viagem sem volta. Percebemos ainda, nessa mudança, claramente, um movimento mais lento inicialmente, mas com visíveis avanços que se fortalecem a cada dia. Eu sou adepta da conjugação do verbo esperançar de Paulo Freire. E finalizo com esse meu pequeno poema: MUDANÇAS Como são difíceis as mudanças desde as pequenas possibilidades... mas mesmo assim são POSSÍVEIS porque as coisas não permanecem iguais para todo o sempre!!!… In: Desabafos… flores de Plástico, libidos e licores liquidificados, 2008. Deixo a minha saudação para todas as mulheres que agora nos assistem ou leem no futuro: Evoé!


REFERÊNCIAS ADLER, Dilercy Aragão. POESIA FEMININA: estranha arte de parir palavras. São Luís: Estação Gráfica.2011. ADLER, Dilercy Aragão. Poesia Polarizada a partir do gênero: Condição real ou engendrada. Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil-AJEB: Palavras 2016. Porto Alegre: Evangraf, 2016. ADLER, Dilercy Aragão. MARIA FIRMINA DOS REIS: uma missão de amor. São Luís: ALL, 2017. ADLER, Dilercy Aragão. MULHERES NA LITERATURA MARANHENSE: o eco da palavra lírica e os embates femininos indispensáveis à vida no mundo humano. Texto apresentado na I FLIM- Itapecuru Mirim, mimeo, 2018. LEAL, Antonio Henriques. Pantheon Maranhense. TOMO I Ensaios Biographicos dos Illustres Maranhenses já fallecidos. Lisboa imprensa Nacional, 1873. LEAL, Antonio Henriques. Pantheon Maranhense. TOMO II Ensaios Biographicos dos Illustres Maranhenses já fallecidos. Lisboa imprensa Nacional, 1874. LEAL, Antonio Henriques. Pantheon Maranhense. TOMO III Ensaios Biographicos dos Illustres Maranhenses já fallecidos. Lisboa imprensa Nacional, 1874. LEAL, Antonio Henriques. Pantheon Maranhense. TOMO IV Ensaios Biographicos dos Illustres Maranhenses já fallecidos. Lisboa imprensa Nacional, 1875. MORAIS, José Nascimento Filho. MARIA FIRMINA FRAGMENTOS DE UMA VIDA. São Luiz: COCSN, 1975. NEVES, Maria Thereza de Azevedo. NO PANTHEON. São Luís: Gráfica Minerva, 2019. REIS, Maria Firmina dos. ÚRSULA. Organização e notas de Lobo; Introdução de Charles Martin. - 3ª ed. Rio de Janeiro: Presença Edições: Brasília INL, Coleção Resgate/INL, 1988. SANTANA, Jucey Santos de. Mariana Luz: vida e obra. Itapecuru Mirim: editora, 2014. ZIN, Rafael Balseiro. https://periodicos.fclar.unesp.br/itinerarios/article/view/10835.


A IMPRENSA COMO LUGAR DE MEMÓRIA: a obra de Maria Firmina dos Reis nos jornais oitocentistas do Maranhão DILERCY ADLER Inicialmente quero dizer da imensa alegria por estar nesta tarde, mesmo que virtualmente, na “III Festa Literária” dessa querida cidade, evento este que já vem se firmando como marca cultural itapecuruense. Ao mesmo tempo agradecer o amável convite dos promotores deste importante evento, na pessoa do Prof. Francisco Inaldo Lima Lisboa, Quero ainda prestar o meu louvor aos homenageados desta Festa Literária, o Professor, Jornalista e Herói da Setembrada, José Cândido de Moraes Silva (in memoriam) e Gonçalo Amador, fundador e editor do Jornal de Itapecuru-Mirim há trinta anos. E também saudar os meus ilustres companheiros de mesa, a Profa. Dra. Cristiane Navarrete Tolomei, o Prof. Mestre Joaquim de Oliveira Gomes e a todos que nos acompanham nesta tarde. No tocante ao tema desta mesa, A IMPRENSA COMO LUGAR DE MEMÓRIA, elegi um viés que resultou no subtítulo, “a obra de Maria Firmina dos Reis nos jornais oitocentistas do Maranhão”. No tocante à imprensa como lugar de memória, reafirmamos a fundamental importância dos meios de comunicação e comunicação de massa, mesmo com suas contradições e querelas político-ideológicas e literárias, as quais, por sua vez, retratam as contradições da estrutura social. A comunicação de massa é entendida, no geral, como a disseminação de informações, por meio de ferramentas que constituem um sistema denominado “mídia”, o qual, partindo de um único emissor, abrange, ao mesmo tempo, uma quantidade significativa de receptores. O público receptor geralmente é da área urbana e de sociedades complexas. Essas sociedades passam por processos múltiplos e dinâmicos que resultam no exercício de poder da mídia sobre os seus habitantes. Os veículos de comunicação vêm sofrendo transformações ao longo da evolução da sociedade, encurtando cada vez mais as distâncias entre os povos e acelerando a disseminação de informações. A mídia de massa é composta por indústrias, desde as tradicionais, como livros, jornais, revistas, gravações, rádio, filmes, televisão, até chegar à internet, que materializa uma rede que liga mundialmente milhões de computadores e se constitui como um dos meios de comunicação mais poderoso já desenvolvidos pelo homem, revolucionando a sociedade e a comunicação atual. Historicamente a imprensa se firma como um dos meios de comunicação mais antigos do Brasil, considerando que data de 1808. Enquanto o rádio nasceu no Brasil, oficialmente, em 07 de setembro de 1922, nas comemorações do centenário da Independência do país, com a transmissão da fala do presidente Epitácio Pessoa na inauguração da radiotelefonia brasileira. O auge desse meio de comunicação ocorreu nos anos 40 a 50 do século XX. Em São Luís a iniciativa se deu por conta de Joaquim Moreira Alves dos Santos, conhecido como Nhozinho Santos, e Francisco Aguiar, que, em 1924, fundaram a “Rádio Sociedade Maranhense”. Antes do Maranhão, apenas Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco e Ceará possuíam suas emissoras. Por outro lado, em 18 de setembro de 1950 foi inaugurada a TV Tupi, em São Paulo, por iniciativa de Assis Chateaubriand. Quatro meses depois, em 20 de janeiro de 1951, foi a vez da TV Tupi no Rio de Janeiro entrar no ar. Em São Luís, capital do Maranhão, a primeira emissora de TV, a Difusora, Canal 4, entrou no ar no dia 09 de novembro de 1963. Ao longo da sua história a televisão cresceu no país e hoje representa um instrumento importante de veiculação de elementos da cultura brasileira. No tocante à imprensa, que é o tema da mesa, o Brasil até 1808 era um dos poucos países, excetuando-se alguns do Continente Africano, que não dispunha dessa prerrogativa, essa lacuna vigorou por todo o período colonial. O acontecimento histórico desencadeador dessa superação foi a vinda do Príncipe Regente, D. João VI, e toda a sua corte para o Brasil, em 1808, fugindo do exército de Napoleão Bonaparte, e como consequência mudanças marcantes se efetivaram na Colônia. Entre elas a instituição da “Impressão Régia”, uma tipografia


oficial instaurada no dia 13 de maio de 1808, com a finalidade de publicar os despachos e atos governamentais do Príncipe Regente. Esse ato representou o fim da proibição de instalação de tipografias no Brasil. No Decreto de instituição da Impressão Régia, assinado pelo Príncipe Regente, D. João VI, e continha o seguinte teor: Tendo-Me constado, que os Prélos, que se achão nesta Capital, erão os destinados para a Secretaria de Estado dos Negocios Estrangeiros, e da Guerra, e Attendendo á necessidade, que ha da Officina de Impressão nestes Meus Estados: Sou servido, que a Caza, onde elles se estabelecêrão, sirva interinamente de Impressão Regia, onde se imprimão exclusivamente toda a Legislação, e Papeis Diplomáticos, que emanarem de qualquer Repartição do Meu Real Serviço. Decreto S/N 13 de maio de 1808. A inexistência de fronteiras entre jornalismo, política e literatura é a marca do contexto oitocentista, pois os jornais dessa época, de um lado, apresentavam polêmicas ideológico-partidárias, a exemplo, das contestações entre os liberais, pleiteando a permanência do Príncipe Regente e a convocação da Assembleia; e os monarquistas, defendendo o Absolutismo. Era comum pessoas consideradas influentes fazerem uso de pseudônimo, inclusive o próprio Príncipe D. Pedro. Por vezes os discursos eram acalorados, passando pela ofensa pessoal, pelo insulto, pela difamação. E de outro, a consolidação da literatura brasileira, por meio da criação e disseminação de determinados gêneros, entre os quais a crônica e o conto. Por outro lado, os periódicos oitocentistas constituem um rico material de pesquisa; são fontes inestimáveis para o conhecimento do processo de consolidação do gênero romanesco no país. A partir de 1821 começou uma proliferação dos periódicos oitocentistas e órgãos da imprensa em paralelo com o aumento das tipografias, tanto no Rio de Janeiro como no Maranhão. Os jornais e revistas maranhenses desempenhavam papel importante no cenário político e cultural da Província, exercendo influência sobre a opinião pública e o meio intelectual, sobretudo em São Luís. A atividade literária, portanto, encontrou em jornais e revistas do século XIX um espaço de difusão e discussão. Raros eram os periódicos oitocentistas que não reservavam um lugar em suas páginas para os assuntos literários. Assim, os jornais e revistas divulgavam textos de ficção: poemas, contos, romances seriados, críticas literárias, ensaios, resenhas e caracterizavam-se pela simbiose entre jornalismo e literatura, o que levou à incorporação de características “literárias” aos gêneros especificamente jornalísticos, a exemplo, de editoriais, artigos de fundo, reportagens, entre outros. Essa condição permite aos pesquisadores que hoje se dedicam à investigação da trajetória do romance no Brasil terem na imprensa oitocentista um rico arquivo de fontes primárias para seu trabalho. Os periódicos são marcas da presença e da circulação de romances no país, da produção de narrativas romanescas por autores brasileiros e do debate que aqui se estabeleceu sobre o gênero. Convém lembrar que nem todos os romances mais anunciados em 1857 e 1858 são conhecidos do público de hoje. Alguns deles, elogiados e recomendados por críticos que gozavam de prestígio na época, sendo por isso de grandes sucessos no século XIX, ficaram totalmente esquecidos posteriormente e, consequentemente, não entraram para o cânone. Nesse contexto, encontrava-se a obra de Maria Firmina dos Reis, que graças, principalmente a Nascimento Morais Filho, maranhense, e a Horácio de Almeida, paraibano, pôde renascer como uma Rosa-de-Jericó. Horácio de Almeida, em 1962, comprou um lote de livros usados, dentre os quais estava Úrsula: romance original brasileiro, por “Uma Maranhense” (1859). Buscou identificar a autora no Dicionário por Estado da Federação, de Otávio Torres, chegando a Maria Firmina dos Reis e continuou a pesquisa sobre ela no Dicionário Biográfico Brasileiro, conforme expõe no prefácio da edição fac-similar do romance lançado em 1975. Essa edição conta com notas de José Nascimento de Morais Filho. Por outro lado, Morais Filho (1975) relata que, ao procurar, na Biblioteca Pública Benedito Leite, nos jornais do século XIX, textos natalinos de autores maranhenses para a sua obra “Esperando a missa do Galo”, deparou-se com registros de/sobre Maria Firmina dos Reis, mulher que participava ativamente da vida


intelectual maranhense, lida e aplaudida nesse tempo, ao colaborar com jornais, revistas literárias e participou, também, da Antologia Parnaso Maranhense. Maria Firmina dos Reis nasceu no dia 11 de março 1822, no bairro de São Pantaleão na cidade de São Luís, capital do Maranhão, segundo sua certidão de batismo. Em 13 de agosto de 1847, sob o título “Notícia Local”.foi publicada pelo jornal “O Progresso”, sua aprovação no concurso para Professores de Primeiras Letras do Sexo Feminino para a Vila de Guimarães. Em 1859, foi publicado o seu romance Úrsula, considerado o primeiro romance escrito por uma mulher no Brasil. A esse respeito, Antonia Pereira de Souza (2017), em sua Tese de Doutorado: “A prosa de ficção nos jornais do Maranhão Oitocentista”, cita que em 1857 no jornal “A Imprensa”, de 17 de outubro de 1857, Ano I, número 40, página 3, segunda coluna, apresentava uma subscrição do romance Úrsula com dados sobre a obra e a autora. Mesmo assim a autoria era mantida em anonimato, considerando que o anúncio se referia à “jovem maranhense”, “autora brasileira”, o que indicava que se tratava de uma mulher. Assim, dois anos antes do lançamento do romance Úrsula já se tinha conhecimento da sua existência por meio da referida subscrição. As subscrições consistiam em vendas/compras antecipadas baseadas na confiança estabelecida entre autor e leitores (subscritores), estes últimos, comprometiam-se a adquirir o(s) exemplar(es) e, assim, garantiam a publicação da obra. Segundo Morais Filho (1975), a entrada oficial de Maria Firmina dos Reis na Literatura foi bem recepcionada pela imprensa maranhense com palavras de entusiasmo e estímulo à estreante. Essa afirmação é claramente comprovada pelas publicações acerca dos seus trabalhos nos jornais da época, além de anúncio dos livros, poemas, charadas, enigmas e inclusive romances e contos que eram publicados por capítulos. Muitas dessas publicações foram compiladas por Nascimento Morais Filho e referidas no seu livro: “Maria Firmina: Fragmentos de uma vida” dentre as quais, esta, constante no jornal “A Moderação" de 11de agosto de 1860: ÚRSULA -Acha-se a venda na Typographia do Progresso, este romance original brasileiro produção da exma sra. D. Maria Firmina dos Reis, professora pública em Guimarães. Saudamos a nossa comprovinciana pelo seu ensaio, revela de sua parte bastante ilustração e com mais vagar emitiremos a nossa opinião, que desde já afiançamos não será desfavorável a nossa distinta comprovinciana. (MORAIS FILHO, 1975, p.18). Ainda no jornal “A Verdadeira Marmota”, de13 de maio de 1861: Raro é ver o belo sexo entregar-se a trabalhos do espírito, e deixando os prazeres fáceis do salão propor-se aos afãs das lides literárias. Quando, porém, esse ente que forma o encanto da nossa peregrinação na vida, se dedica às contemplações do espírito, surge uma Roland, uma Stael, uma Sand, uma H. Stowe, que vale cada uma delas mais do que bons escritores; por que reúne a graça do estilo, vivas e animadas imagens, deliciosos quadros, e esse sentimento delicado que só o sexo amável sabe exprimir [...] O aparecimento do romance “ÚRSULA” na literatura pátria foi um acontecimento festejado por todo o jornalismo, e pelos nossos homens de letras, não como por indulgência, mas como homenagem vendida a uma obra de mérito. [...] As suas descrições são tão naturais e poéticas, que arrebatam; o enredo é tão intrincado que prende a atenção e os sentidos do leitor; o diálogo é animado e fácil; caracteres estão bem desenhados-como o de Túlio, do Comendador, de Tancredo e Úrsula.Sua autora, D. Maria Firmina dos Reis, professora de português na Vila de Guimarães, revelou o grande talento literário [...] […] A poesia é dom do céu, e a ninguém dotou mais largamente a divindade do que ao ente delicado, caprichoso e sentimental-a mulher. O belo sexo não deve viver segredado de tão sublime arte-os encantos e ornatos do espírito são sua partilha;- tome a senda que lhe abre com tão bons auspícios, rodeada de aplausos merecidos, D. Maria Firmina dos Reis, e siga-lhe os brilhantes voos. (MORAIS FILHO, 1975, pp.19-20).


Ou ainda no “Jardim dos Maranhenses” de 30 de setembro de 1861, n° 24, ano I: […] Existe em nosso poder com destino a ser publicado no nosso jornal um belíssimo e interessante ROMANCE, primoroso trabalho da nossa distinta comprovinciana a Exma Sra. D Maria Firmina dos Reis professora pública da Vila de Guimarães; cuja publicidade tencionamos dar princípio do número 25 em diante. Garantimos ao público a beleza da obra e pedimos a sua benévola atenção. A pena da Exma Sra. D. Maria Firmina dos Reis já é entre nós conhecida e convém muito animá-la a não desistir da empresa encetada. Esperamos, pois a vista das razões expendidas, que as nossas súplicas sejam atendidas, afiançando que continuaremos defendendo o belo e amável sexo-quando injustamente for agredido. Salus et paz (MORAIS FILHO, 1975, p. 21). Em “A Verdadeira Marmota”, o Poema UNS OLHOS Vi uns olhos ... que olhos tão belos! Esses olhos têm certo volver, Que me obrigam a profundo cismar, Que despertam-me um vago querer. Esses olhos me calam na alma. Chama de ardente paixão. Esses olhos me geram alegria. Me desterram pungente aflição. Esses olhos devera eu ter visto Há mais tempo - talvez ao nascer. Esses olhos me falam de amores; Nesses olhos eu quero viver... Nesses olhos, eu bebo a existência, Nesses olhos de doce langor; Nesses olhos, que fazem solenes, Meigas juras eternas de amor. Esses olhos, que dizem numa hora, Num momento, num doce volver, Tudo aquilo que os lábios nos dizem, E que os lábios, não sabem dizer. Esses olhos têm mago condão, Esses olhos me excitam a viver!... Só por eles eu amo a existência, Só por eles eu quero morrer! Guimarães 27 de maio de 1861. (MORAIS FILHO, 1975, p. 32).

Podemos perceber, pelas fontes consultadas, que Maria Firmina tramitava na imprensa maranhense amiudamente, e ainda com predominância de palavras elogiosas, em relação à sua obra, com tratamento respeitoso (Exma. Sra. D.), acredito que pelo cargo de Professora de Primeiras Letras do Sexo Feminino e, também, com valorização do gênero feminino, a exemplo de […] A poesia é dom do céu, e a ninguém dotou


mais largamente a divindade do que ao ente delicado, caprichoso e sentimental-a mulher. O belo sexo não deve viver segredado de tão sublime arte-os encantos e ornatos do espírito são sua partilha;[…]. O conjunto da sua obra é de notável reconhecimento e bastante significativo, tanto em quantidade quanto em variedade de gêneros literários e vertentes das artes: romances, crônicas, contos, poesias, composições (letra e música), enigmas, epígrafes, folclores entre outras: Obras: Úrsula (romance, 1859); Gupeva (romance de temática indianista,1861); Cantos à beira-mar, (poesia, 1871); A escrava (conto antiescravista,1887); Antologia Poética Parnaso Maranhense: coleção de poesias, editada por Flávio Reimar y Antonio Marques Rodrigues (1861); Publicações em jornais literários: Federalista, Pacotilha, Diário do Maranhão, A Revista Maranhense, O País, O Domingo, Porto Livre, O Jardim dos Maranhenses, Semanário Maranhense, Eco da Juventude, Almanaque de Lembranças Brasileiras, A Verdadeira Marmota, Publicador Maranhense e A Imprensa. Composições Musicais: Auto de bumba-meu-boi (letra e música); Valsa (letra Gonçalves Dias e música de Maria Firmina dos Reis) ou (letra e música de Maria Firmina); Hino à Mocidade (letra e música); Hino à liberdade dos escravos (letra e música); Rosinha, valsa (letra e música); Pastor estrela do oriente. (letra e música), Canto de recordação, “à Praia de Cumã” (letra e música). Um outro dado que se constata a partir da “Síntese Bibliográfica”, estruturada por Nascimento Morais Filho no seu livro “Maria Firmina: Fragmentos de uma vida”(1975), é que dos 95 anos que a escritora prograviveu neste plano físico, destacam-se os 53 anos de repetidas contribuições com a imprensa, ou seja, de 1847, a primeira publicação em jornal, “O Progresso”, até 1903 no jornal “Federalista”, a última noticiada. Do exposto, fica claro que, apesar do nascimento tardio da imprensa brasileira em relação à grande maioria dos países no século XIX, esta viveu um período agitado e afortunado de seu jornalismo, como comprovam os muitos periódicos postos em circulação. No caso do Maranhão, a imprensa apresentava maturidade e se instalou definitivamente como instituição na sociedade local, contando com um público cativo, um parque tipográfico, que permitia edições constantes, além de um grupo expressivo de homens de letras e jornalistas que abasteciam os periódicos de textos e matérias sobre os mais diversos assuntos, sobretudo os de caráter político-partidário. Ao lado de muitos periódicos de cunho partidário, circulava também um número razoável de revistas literárias, entre outras, nas quais se realizava a difusão de conhecimentos úteis sobre lavoura, saúde, costumes, ciências, filosofia, religião, indústria, comércio, geografia e, sobretudo, literatura, de modo que o público brasileiro de meados do século XIX tinha à sua disposição uma enorme variedade de romances, principalmente estrangeiros; todavia grande parte dos romances de sucesso em meados do século XIX é desconhecida do público atual; a produção romanesca nacional do século XIX ia muito além dos autores hoje consagrados. Para fechar a linha de raciocínio traçada, lançamos mão da citação de Jean-Yves Mollier (2003): “[...] para que se possa ter uma compreensão mais apurada da leitura e da literatura de um determinado período, não se pode limitar a reflexão às obras que entraram para o cânone.” Outra questão importante nesse contexto diz respeito à “A liberdade de imprensa e liberdade de expressão”: a primeira corresponde à comunicação por meio da mídia, como jornais, revistas ou televisão e a segunda se aplica a todas as formas de comunicação como, por exemplo, às artes. Assim, podemos concluir: Sendo livre, a imprensa incentiva a difusão de múltiplos pontos de vista, incentivando o debate e promovendo a troca de ideias! REFERÊNCIAS LUSTOSA, Isabel. Insultos impressos: a guerra dos jornalistas na Independência, 1821 -1823. S.P.: Via das Letras, 2000. LUSTOSA, Isabel. Cimento da imprensa brasileira. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.. MOLLIER, Jean-Yves. REVUE D’HISTOIRE LITTÉRAIRE DE LA FRANCE.PARIS, v. 103, p. 597612, jul.-set./2003. Martins Ricardo André Ferreira. BREVE PANORAMA HISTÓRICO DA IMPRENSA LITERÁRIA NO MARANHÃO OITOCENTISTA. Disponível em<https://periodicos.ufsm.br/animus/article/view/2442>. Acesso em: 8 de novembro de 2020.


MORAIS, José Nascimento Filho. MARIA FIRMINA FRAGMENTOS DE UMA VIDA. São Luiz: COCSN, 1975. MÜLLER. Andréa Correa Paraiso. Imprensa e leitura de Romances no Brasil Oitocentista. Disponível em<:https://periodicos.unisantos.br/leopoldianum/article/view/440/405.> Acesso em: 03/11/2020. PINHEIRO, Roseane Arcanjo. GÊNESE DA IMPRENSA NO MARANHÃO NOS SÉCULOS XIX E XX. Comunicação & Sociedade, São Bernardo do Campo, Pós Com Metodista, a. 29, n. 49, p. 43-64, 2º sem. 2007. SIMÕES Jr., Álvaro. DA LITERATURA AO JORNALISMO: periódicos brasileiros do século XIX. Patrimônio e memória. Assis-SP, n. 2, v. 2, p. 126-145, 2006. SODRÉ, Nelson Werneck . A HISTÓRIA DA IMPRENSA NO BRASIL. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966. SOUZA, Antonia Pereira de .A PROSA DE FICÇÃO NOS JORNAIS DO MARANHÃO OITOCENTISTA Tese de doutorado https://repositorio.ufpb.br/jspui/handle/tede/9172.

ANEXO A Marmota Maranhese (1851), periódico recreativo e literário mantido inicialmente por Inácio José Ferreira, da Tipografia Constitucional, depois publicado por Manuel Pereira Ramos, da Tipografia da Temperança, ambas de São Luís. Teve como modelo A Marmota da Corte (1849-1861), de Francisco de Paula Brito, que também inspirou o semanário A Marmotinha (1860). Ambos publicavam uma grande variedade de artigos literários, crônicas locais, poemas e textos de conteúdo jocoso e recreativo.

https://acervo.avozdaserra.com.br/noticias/imprensa-no-brasil-e-seus-desdobramentos-na-eratecnologica


FERNANDO FERREIRA DE LOANDA, UM POETA ESQUECIDO

FERNANDO BRAGA Foi Bandeira Tribuzi na redação do ‘Jornal do Dia’, em São Luís, quem primeiro me falou do poeta Fernando Ferreira de Loanda, o qual pensei que, em se tratando de um poeta português, de sua geração, e pela bemquerença com que o tratava, tivera sido seu contemporâneo em Coimbra. Depois, Nauro Machado clareou-me dizendo que Fernando Ferreira de Loanda era um poeta português de Angola, mas já naturalizado brasileiro e um dos mais legítimos representantes da geração de 45 e que fora o editor de ‘Rosa da Esperança’, livro de poemas de Tribuzi, publicado no Rio de Janeiro pelo grupo ‘Orfeu’, revista dirigida ao tempo por Fernando Ferreira de Loanda. Fernando Ferreira de Loanda [Luanda-Angola, 1924 – Rio de Janeiro, 2002] , surgiu no panorama poético, no início dos anos 50, emergindo com uma tradição propensa ao assombro e à rebeldia, fenômenos naturais à condição humana, para juntar-se a outros jovens como Lêdo Ivo, Astrid Cabral, Thiago de Mello... É o escritor Wilson Martins quem diz: “Prefaciando em 1991 o que parece ter sido o seu último volume de versos ["Kuala Lumpur"], Lêdo Ivo, que foi um dos maiores poetas da geração, assinalava que, em sua atividade editorial, Fernando Ferreira de Loanda lançou praticamente todos os poetas então emergentes: "Foi ele o primeiro editor ‘comercial’ de João Cabral, ao apresentar, nos ‘Poemas reunidos’ (1954), uma obra então rara. E a esse nome consular, acrescentemos os de Afonso Félix de Sousa, Darcy Damasceno, Nilo Aparecido Pinto, Péricles Eugênio da Silva Ramos, Marly de Oliveira, Octavio Mora, Marcos Konder Reis, Domingos Carvalho da Silva, Walmir Ayala, Gilberto Mendonça Teles, Stella Leonardos e tantos outros que constituem a chamada ‘Geração de 45’[...]." Fundou, com Lêdo Ivo, Darcy Damasceno, Fred Pinheiro e Bernardo Gerson, a Revista ‘Orfeu’, dirigindo-a no Rio de Janeiro de 1947 a 1953, à maneira da portuguesa, de Fernando Pessoa, Mário-Sá Carneiro e José Almada Negreiros... O jornalista José Nêumanne Pinto organizou e publicou pela ‘Geração Editorial’, em 2001, a antologia d’ Os Cem Melhores Poetas Brasileiros do Século’ um dos raros instrumentais que se tem sobre o poeta, já que pouca coisa sobre a vida dele está disponível na internet. “Ele foi uma personalidade relevante no cenário literário tanto como escritor, quanto como editor, compilando as produções de poemas de seus contemporâneos da geração de 45”. Vejam este ‘Poema para os estudiosos e biógrafos’: “Não me expliquem: prisma, de mil faces, / sou insondável, abissal. /A poesia não é um espelho; é um estado momentâneo./ Se me retrato, logo me desdigo,/transfiguro-me, horizontalizando minhas emoções e incertezas./Amo o imprevisto,/dói-me o que adivinho;/não me ofereçam /banquetes mastigados./ A clareza não a tenho à superfície; /é necessário uma faca para fazê-la flutuar; /vão ao cerne; sou quarto crescente na lua cheia./Não me expliquem pelas palavras, pelo bigode nem pelo cachimbo”.


Seu livro ‘Signo da Serpente’ foi premiado pela Academia Brasileira de Letras, “a chegar frio e sem mais nenhuma esperança”, como diz alguns dos seus amigos. Fernando de Loanda publicou ‘Antologia da Nova Poesia Brasileira’; ‘Do amor e do mar’; ‘Equinócio’. ‘Kuala Lumpur’; ‘Oda a Bartolomé Dias y otros poemas [em espanhol], além de produções em revistas, jornais e espalhadas em palestras e conferências. O escritor Carlos Pacheco, amigo do poeta, escreve em ‘Um poeta sepultado vivo’, no qual apuramos este seu grito natural de revolta: “[...] Realmente o mundo das letras, de língua portuguesa, acaba de perder um dos seus maiores vultos, só que de uma forma gritantemente absurda: enquanto em todos os quadrantes de língua espanhola – do México à Argentina, incluindo a Espanha – se exalta a poesia de Fernando Ferreira de Loanda, pujante de beleza estética e densidade discursiva, no Brasil, longe disso, essa poesia tem sido emparedada pelas capelinhas, quando não menos votada ao ostracismo. Em Portugal, por incrível que pareça, são raros os que a conhecem.” Nada mais se sabe... Foram esses os motivos, ou outras vertentes existem? O mundo das artes tem desses mistérios... Ouçamo-lo em ‘Viseu Revisited’: “Não falo das ruas da minha infância, / nem as nomeio, para que ignorem a pequenez do meu mundo. /Tinham, porém, fauna e flora, as árvores davam sombra e frutos, / os homens bom-dia e os pássaros cantavam”. Por fim, neste ‘Homem de incoercível esperança’, oferecido a Gabiono-Alejandro Carriego, enfeixado em ‘Poemas da Rua Quito’, Fernando Ferreira de Loanda, canta: “Homem de incoercível esperança/ transita, sem sonhos ou amanhã, /cúmplice, intemporal, urde a teia, / e ante o silabar e o afresco/trânsfuga, transmuta, transige. / Repetir sempre, tudo já foi dito;/importa é como dizê-lo, insinuá-lo./Não te acovardes ante a palavra implume. /Se desbotada ou erodida, dá-lhe tua seiva, tua vivência – investe:/morre quem ousa, quem ousa ama”. Ou ainda: “Acabaram com os bondes/ e a paisagem dói;/ tentam dinamitar a poesia/ os poetas da paróquia,/ardilosos, confundem/o incauto forasteiro,/vendem gato por lebre./Sê surdo: o exílio/em tua casa, entre os livros,/é a solução; na balança,/ a amabilidade de um/ ou o impropério de outro/só tem peso para a tua vaidade./Que falem em vão ao vento”. E Carlos Pacheco, finaliza triste: “Tudo terminou, para ele e em grande parte para todos, na melancolia cinzenta dos triunfos extintos: ”Os poetas da minha geração, a malograda,/ e os posteriores, os antolhados frívolos da glória,/ esqueceram-se de colocar a chave sob o tapete”, cantou por derradeiro o poeta Fernando Ferreira de Loanda, em ‘Ode para Walt Whitman ou Efraim Huerta’. Este angolano-brasileiro e carioca de adoção faria 78 anos em 19 de setembro de 2002, e poucos dias antes de seu falecimento, a Academia Brasileira de Letras o premiou pelo conjunto de sua obra, prêmio de que tomou conhecimento, mas não chegou a receber.



O “MATERIALISMO DIALÉTICO” IMPLÍCITO NA POÉTICA DE JOÃO BATISTA DO LAGO “(…) Ao falar mais especificamente do caráter literário da sua poesia JOÃO BATISTA DO LAGO revela que se considera um poeta “surracionalista” (palavra cunhada pelo filósofo francês Gaston Bachelard, para conceituar a poesia inferida ou abstraída de um campo filosófico), isto porque, diz ele: “como nos ensina Bachelard, é necessário estar presente, presente à imagem no minuto da imagem: se há uma filosofia da poesia ela deve nascer e renascer por acasião de um verso dominante, na adesão total de uma imagem isolada, muito precisamente no próprio êxtase da novidade da imagem”. E enfantiza o autor maranhense: “É assim a minha poética: gênese da imagem e do instinto do instante, ou seja, a minha poesia é o resultado da hora presente em toda a sua experiência, experimentação e experienciação do objeto imaginado no instante em que é, por natureza, imaginado”. A imagem poética é um súbito realce do psiquismo, realce mal estudado em causalidades psicológicas subalternas”; tal qual no surrealismo utilizo as palavras como objeto para alcançar o objetivo de uma ‘experienciação’ para uma nova realidade experimental, sacando-a do campo da simples epistemologia e introduzindo-a no campo da ontologia pura, na qual é operante uma meta-estética da fenomenotécnica; minha proposta é ultrapassar a simples qüididade da palavra e do texto no que se refere à essencialidade ou a substancialidade – seja geométrica, estética ou gramatical. Ora, isso sugere a desverbalização da palavra em si, de si e para si, o que significa a desconstrução do discurso da palavra ou do texto homófono, para constituílo e fixá-lo como ‘sujeito’ do discurso substancial, real e concreto”. (…)” ALIENATÓRIO Lá vai um homem Para o seu trabalho Para o seu trabalho Lá vai um homem… Todo dia é sempre tudo igual A “Coisa” toma sua dose letal… Lá vem um homem Para a sua casa Para a sua casa Lá vem um homem… Todo dia é sempre tudo igual A “Coisa” prepara seu ato final… Quando vai para o trabalho A “Coisa” não desespera… Espera! Quando vai para sua casa A “Coisa” espera… Desespera! Toma uma cachaça no boteco Tira-gosto com lingüiça… Espreguiça-se no balcão do nada Troca um lero-lero com a rapaziada… E aí vai pra casa ruminando a liça Assoviando um bolero… Cantarola: “Eu não sou cachorro, não para viver…” Todo dia é sempre tudo igual!


ANOMIA Por João Batista do Lago Perambula pela tonta cidade O exército dos deserdados Há muito condenado Perdido e desgraçado da sorte Anômico mendiga uma naca de felicidade Esses soldados da infeliz cidade Não conseguem essa guerra vencer E assim desesperam dia-a-dia no viver Vêem dia-a-dia a esperança morrer (mas) Sem trabalho si morrem em cada alvorecer E a cidade… Ó, infeliz cidade! Anônima de toda felicidade Enfileira sua miséria encantada E transforma a vida dos deserdados Em campo de concentração de miseráveis Ah, povo dos trabalhadores! Povo deserdado. Povo condenado. Povo vexado. Povo marcado. Não esperem que o céu resolva suas dores Essa divinal esperança só aumenta seus horrores Isso não é destino de Deus: é do homem a miserável economia! Que encerra todas as gentes no inferno da anomia BRASÍLIA Por João Batista do Lago No paço da República O passo só descompassa – a “res” nunca é pública! No passo da República – a “res” nunca é pública O paço só descompassa! CANÇÃO DO REGRESSO Por João Batista do Lago Minha terra tem um rio Onde se pode navegar As águas que nele correm Não mais existem por cá Minha terra tem um rio Sob solares e luares Minha terra tem Quilombos Onde não há n’outros lugares Sob os céus de Itapecuru Há muitas histórias pra contar A mais bela dentre todas O povo precisa resgatar


Minha terra tem Orixás Tem o “Tutor das Liberdades” Negro Cosme o seu nome Há de vingar sua dignidade Não permitam os Encantados Que eu morra sem antes pra lá voltar Quero encontrar com todo meu povo Com todos eles quero brincar e dançar Minha terra tem Carnaúbas Nelas também canta o Sabiá Têm Bem-te-vi e Ioruba Todos filhos de Oxalá Não permita Iemanjá qu’eu morra Sem que eu volte para lá Minha terra tem um rio: Rio Itapecuru – dá nome ao lugar Não permita Deus qu’eu morra Sem em suas Águas mergulhar CANTO VIÉS © De João Batista do Lago Que adianta o lirismo, Que adianta a estética, Que adianta o belo Residente na poética? Sim! Que adianta tudo isso Se a vida não é assim? Foges pela tangente do real Escapas pelos esgotos da beleza Cegas-te para não enxergar a dureza Cruel gerada na alma animal Do homem que da vida é só vileza! Oh, meu caro João, não me tome por mal; Bem sei da beleza que na vida há. Bem sei! E um dia hei-de a cantar nalgum verso toda essa beleza, Mas agora é prudente falar da maldade que há Instalada – em qualquer lugar – na beleza Perdida no barro da criação. – Não tenho dúvida, João, sou filho da indignação. Que adianta cantar a esperança, se matam em mim a criança? Que adianta cantar a paz, se me constroem soldado das guerras? Que adianta cantar a vida, se dela não me há qualquer guarida? Não. Não tenho por que sorrir… Nem mesmo lágrimas me restaram para chorar. Todo sorriso; toda lágrima Restaram consumados na insensatez doa próprio Ser. Quero sim, à vida cantar! Dizer dela toda beleza no plural e no singular: A rosa, são rosas A flor, são flores O amor, são amores


Na dor, não há-de haver dores Na fome, há-de haver todo alimento No Ser, toda solidariedade Da ação, nenhuma maldade Quero, pois, assim, Toda vida cantarolar CARTA PARA OUTRO-EU © by João Batista do Lago Olá, meu caro. Há quanto tempo não nos falamos! Gostaria de ter notícias tuas… Como andas? O que tens feito da vida? Sabes, ainda ontem andei pensando em nós dois. Quando éramos crianças (lembras?) brincávamos no alpendre lá de casa, corríamos por entre quartos, paredes e corredores… Ah, o Rex sempre nos atormentando, atravessando nossos caminhos mordendo nossos tornozelos… – Parem, meninos, parem com essa correria. Gritava mamãe sempre que passávamos por ela, escrava que era daquela máquina de costurar: tchic, tchic… tchic, tchic… tchic, tchic… tchic, tchic… tchic, tchic… tchic, tchic… tchic, tchic… tchic, tchic… tchic, tchic… tchic, tchic… Assim ela ia cosendo nossas vidas, nossas histórias… e nossas estórias. Dia após dia de intermináveis costurares! Mas nós continuávamos a brincar, a correr, a pular: E ela: – Parem, meninos, parem com essa correria – insistia em nos alertar. E a máquina: tchic, tchic… tchic,tchic… tchic,tchic… tchic, tchic… tchic,tchic… tchic, tchic… tchic,tchic… tchic,tchic… tchic, tchic… tchic,tchic… Ah, meu caro, tenho pavor às saudades, mas percebo que hoje, ao alcançar esta minha idade, elas se apresentam tão salientes que são difícil não escutá-las. Elas estão presentes em tudo e em todos os lugares! Ó, amigo, essas saudades são de amargar, me incomodam e se instalam em qualquer lugar ficam o tempo todo a me vasculhar… Saudades são como carrapatos de almas, verdadeiros parasitas inconfessos sanguessugas de velhas e novas lembranças, (que) roubam a consciência da presente esperança. Sabes! Hoje tenho nítida sensação de me haver internado numa masmorra. Sinto-me preso. Estou isolado num infinito labirinto. Não sei quando entrei… e nem por onde. Não encontro portas de saída. Estou só. Vago noites e dias entre as paredes frias da minha masmorra sem portas. Ouço o lamento do vazio num eterno calafrio de vozes que me vêm do além mais próximo de mim: ecos de dores… de horrores. São quermesses do nada exaltando o meu fim.


Vês, meu caro, o quanto sinto tua falta? Preciso-te. Necessito alentar minha dor, pois somente a palavra do poeta – palavra de sofredor! – não resolve a carência maior de minha paixão em flor. Sim! Preciso-te, caro amigo, para novamente corrermos entre quartos, paredes e corredores conversarmos com o vento e a infância, sem precisar ficar espantado com a adulta ignorância. Sim! Preciso-te. Urgentemente preciso-te. Preciso-te para viver minha eternidade de criança. Preciso-te para sair desta masmorra. Deste labirinto. Abraço-te, meu caro. Eu. CIRCULAR A MIS HERMANOS by João Batista do Lago Hermanos del mundo La expansión engañosa La felicidad ilusoria Ofrecida a nosotros Hace mucho tiempo Queda nuestra morada Desandando nuestras vidas Asesinando nuestras esperanzas Hermanos del mundo La muerte da Gaia Es el fallecimiento de nosotros… Con la muerte de Gaia Fallecemos con ella Quedados ante la fiesta desgraciada De hombres carrascos Productos del capitalismo cruel Hermanos del mundo Llanamente morimos… Que hacer delante de los carrascos Asesinos indomables del pueblo… Que hacer hermanos del mundo Esperar por Dios… Oh, no, Dios no Es responsable Por la miserabilidad e ganancia Hermanos del mundo La invitación es forzosa Clama a detenerse la muerte da Gaia Clama a evitarse la muerte de los hijos – nosotros Clama a vencerse la ganancia De los brujos capitalistas Señores de la miserabilidad Asesinos de la humanidad CONTRA-CANALHAS! © by João Batista do Lago Quanto tempo ainda restará Para conviver com os canalhas?


Vive-se um tempo de batalha: a Virtude é pura moeda rara! Perdeu-se a vergonha da cara; Falta coragem de usar a navalha. Ó, República da vagabundalha, República de miserável sorte, Rasgaram-te as vestes da Ética (e) Curvaram-te ante essa estética Sangram-te, ó mãe, os canalhas! Arrancar-te o Direito do peito é Tudo que deseja a vagabundalha: Nação inerte; prostrada ao leito. Sangram-te, ó mãe, os canalhas! Mas haverá dia que todo malfeito Restará findo… restará morto… A nação cativa se levantará do jugo Então aí – o povo –, plebe ignara, Tomará as rédeas do desatino e Fará da nação cativa seu destino: República de Virtude, Ética e Direito. DAVOS Por João Batista do Lago …e assim calo o meu silêncio, já tão calado e tão sofrido, diante do discurso alegre, miseravelmente alegre, dos senhores donos do mundo, agora amedrontados com a hipótese do fim. …e assim escorrego para dentro de mim, o mais profundo possível, para esconder-me das migalhas sobrantes do banquete hegemônico da dominação, da farra verberante de enganação que irá flagelar povos e nações, num novo modo de enriquecimento transformando o presente momento em “belos” discursos de novas flagelações. …e assim, povos e nações continuarão reféns do empobrecimento, sem notar o enredo do esquecimento, sem perceber a marcha do enriquecimento que há por trás dos grandes discursos, sambas-enredos dos carnavais do mundo, onde o cidadão não passará de mero vagabundo, modo de produção da dominação dos senhores comensais donos do mundo. …e assim o eco – sem eco – das multidões, enfim, aceito no banquete dos ricos comensais


será comido como sobremesa, mas expelido será, como estrume que adubará o pomar da riqueza, que irá produzir povos e nações – belos frutos de miséria e pobreza – reféns de ricos senhores produtores de dominações. FIÉIS by João Batista do Lago Vês Quanta gente-nada Assiste ao sermão da Mumificação do ser? Essa gente desesperada na Eterna busca do não-sei-o-quê Alimenta a dominação Enriquecendo a igreja da alienação. Vês Quanta alma é contrita na Infinita diasporia da Crucificação do não-ser? Essa alma regalada Revelada em pecado Cai de joelhos aos bocados e Morre dia-a-dia na igreja que não crer. Quanta gente se acredita Desgraçada eterna ser Busca em cada esquina… Em cada igreja Um deus-qualquer para vencer Presas fáceis são do falso saber Cristos de toda alienação Reféns fiéis da dominação Proscritos e miseráveis continuarão. NÔMADE © by João Batista do Lago Caminho-me dentro do eu-cidade Perambulo entre avenidas sofridas Vago ermo procurando a felicidade Deusa ausente desta cidade vencida (Macabra) Monstruosa no seu lamento profano A cidade me açoita feito vagabundo Insano; escorregadiço entre humanos Viajo a saudade da solidão do mundo (Sânscrito) Entre os tijolos do sagrado vou Construindo os deuses da cidade Velha moradia; mórbida felicidade Onde o ser sem palavra ficou (Marginal)


Desço às profundezas da marginalidade Invisível sujeito castigado pelo ócio da Produção de classes marginalizadas nos Guetos dos templos sagrados do moderno […] Na cidade macabra Caminho minhas dores Sânscrito deserdado Marginal dos amores O DIA EM QUE O CÉU DO ORIENTE CHOROU FOGO (1989) (Revisto: 2008) © De João Batista do Lago Procurei todas as razões para entender as guerras Nunca encontrei qualquer motivo que as justificassem É por isso que não as entendo… É por isso que não as compreendo. Jamais aceitei a idéia da guerra como recurso para a paz. Jamais! Nenhuma guerra é capaz de traduzir a paz. Nenhuma! Todas são evolução da ignomínia do homem. Todas! Em todas há a obsessão dada do poder e da ganância. Todas! Não há razões para o fazer da guerra! Que direitos são esses do Ocidente sobre o Oriente? Oh, noite das noites! Noites que se fazem meteoritos de estanho Noites que se matam as crianças Sem lhas dar as chances de saber da esperança Oh, noite das noites! Não posso cantar-te em meus versos De ti resta-me o odor do sangue escarlate Que jorra da terra como ouro negro E que se compraz perseguir a alma dos mortais Noite em que balas dançam pelos céus dos esquecidos! Quem dera fosse essa noite o Apocalipse de João. Quem dera! Não teríamos o amanhã para chorar os sete arcanos O céu não fumegaria o horror das bombas atómicas: Buuuuuuuuuummmmmmmmmm… Aqui uma cabeça; ali uma perna; mais adiante um braço… Diante de mim vejo o corpo do amor no seu último abraço Viro o rosto para não gravar tamanha desgraça… Mas cai à minha frente um coração que pulsa: brasa! Noites que rompem o tempo e se fazem espaço de guerras! Pilhas de corpos que se amontoam sobre a relva Corpos que depois de lavados são plantados em covas rasas Covas que darão árvores daninhas no alvorecer do amanhã Árvores que produzirão frutos de carnes humanas Frutos que serão no teatro da vida o prato de predileção Teatro onde se há-de encenar o ato seguinte da nova guerra Guerra que consumará a vitória dos senhores donos do mundo Vitória que será húmus da miserável guerra que renascerá na terra. Ó, Senhor de todos os céus, será assim eternamente a sina dos mortais!?


Noites de miseráveis guerras! Noites assassinas da Paz! OBREIRO © by João Batista do Lago Desorientado! Sim, desorientado saíra de casa… Casebre. No caminho do trabalho ia mastigando sua febre de 40º, ruminando desespero do filho sem leite, da mulher recém parida, que ficara na casa – casebre! – já quase sem vida. E ele, obreiro de muitas obras, de tantas e quantas obras, não tinha obra nenhuma para doar à família. Toda obra que construíra fora para pagar o salário miserável que consumia no dia-adia da sua miserável vida. Ruminava e ruminava. Ruminava inconsciente a caminho do matadouro onde entregaria sua mente a preço vil, sua força de trabalho restaria na produção covil. No dia seguinte tudo se repetia. Ainda assim esperançava um dia ser dono da mais valia que lhe roubava o pão nosso de cada dia. E pensava: “Antes de morrer hei de ver meu filho banhar-se de leite, minha mulher entre sedas, pedras preciosas e ouro… Hei de ver! Hei de vencer!” Passava o tempo e todo dia a mesma coisa se repetia: refém da mais valia, mas esperançava sempre – um dia! – o velho trabalhador ter a alegria de ser livre, de não ser apenas um sofredor; ser dono da sua força de trabalho, não ser apenas o curinga do baralho ou apenas peça descartável do mercado. Hoje, velho e maltrapilho… (maltratado!), arrasta-se entre ladrilhos de esperanças, contudo espera que sua criança – ainda sem leite! – não perca a esperança de um dia ser dono da sua laborança, que seja refratário ao vil capital do consumo, que seja libertário e que não se deixe pregar à cruz, para de lá, como eu, apenas dizer: “consummatum est!” ÓPERA DO HUMANO © by João Batista do Lago Proliferam deuses… Senhores donos do mundo! Surgem da escuridão e das noites dos tempos Eterno movimento de sanguessugas modernos Encenam no teatro da vida a tragédia dos infernos Desventura da miserável ópera humana O homem protagoniza o enredo da sorte Entoa em salmos sua oração mais profana: Vencer o irmão e subjugá-lo até a morte


Oh! Atores das desgraças abissais Homens desgraçados por séculos serão Tua triste sina não se findará jamais E quando tudo restara sem esperança No encanto da criação só restará do Humano o homem feito danado cão POEMA PARA JOÃO* © by João Batista do Lago Para ele a vida era apenas um começo! Tudo era descoberta. Tudo. Mas a algoz violência calou João. João está mudo! Antes mesmo do deserto da vida calaram João. Mataram João. Agora João, a esperança, está mudo. Agora tudo está mudo. O calvário de João Tomado de assalto pelo ladrão, que Sem qualquer perdão Arrastou o corpo de João pela Cidade Maravilhosa, Começou no semáforo, Anticorpo das artérias da cidade… Da cidade de João. Chicoteado pelo asfalto, Arrastado pelo sonho do consumo, João desfilava sua dor Entre os gritos das gentes: – Párem… párem… párem, Pelo amor de Deus, párem! Mas Deus não estava ali Para salvar o pequeno João. Golias venceu Davi! Agora João está mudo, e Não está mais aqui, e Não terá mais o Rio para Batizar a Vida, e Não terá mais o mundo – este deserto -, Para deblaterar contra A insensatez da miséria. Quanta pilhéria nos Revela o calvário do pequeno João! João está mudo, Mas se instala em cada coração Para dizer a toda gente: – prestem atenção senhores dono do mundo, Eles não têm razão, e vós, que razões querem ter? Escutai, escutai com coragem a voz do Ser. Ah, João não está mudo! João agora é cada um… é cada ser. E cada João não quer esquecer Que em cada ser há um “bom” ladrão…


Ladrões de joões e josés, de marias e madalenas Que revelam em suas cantilenas O sofrimento da hora, da agonia de agora, Mas logo em seguida esquecem a Maria que chora. João não está mudo! Está plantado no alto do morro, De braços abertos, está Gritando ao mundo, está Pedindo socorro, está A toda gente, a todo crente, E aos donos do mundo, está Dizendo: menos riqueza… dai conta da miséria e da pobreza. ROSA NEGRA © by João Batista do Lago Da senzala – a grande casa! – exala o cheiro de almas que agora deambulam pela casa vazia que grita os berros que ficaram presos nas gargantas ornadas com colares do ferros. Da senzala – a grande casa! – vêm-me os gritos das dores contidas das costas entrecortadas pelo gargalhasso da chibata que estala no dorso encantado da negra mucama acorrentada ao dedo-de-deu que aponta para o céu Da senzala – a grande casa! – poder cretino do senhor dengoso ouve-se, então, o choro do menino filho do estupro matutino… ou vespertino daquela escrava que outrora apanhava ao pelourinho para gozo do senhorinho que jamais irá saber do filho negrinho condenado a viver – toda vida! – sem carinho Da senzala – a grande casa! – ouço os acordes duma canção em lamento: – Não deixem que apaguem das memórias as histórias de horror e de sofrimento, as dores, os choros, os tormentos. Não esqueçam os estupros. Não! Não permitam que as flores apesar da beleza e do aroma


escondam o pólen da dignidade, da justiça e da virtude. Não! Não permitam que as rosas apesar do encanto e da diversidade das cores, mascarem a beleza da rosa negra. SAGA DA INDEPENDÊNCIA DO BRASIL © DE João Batista do Lago A saga pelas Liberdades Singra as águas do Atlântico Nasce em Porto revoltoso: Burgueses indignados estão Com o gerar da nova Nação Pois não querem dividir o pão D’Europa colonizadora Do Portugal imperialista Revoltam massas os burgos Cativam nelas a ignomínia Verberam vozes de mortes O Clero de pompas cativa A Nobreza sempre reativa Aliciam o corpo armado Do Exército português Gerando toda insensatez Criada a Revolução do Porto Dá-se, portanto o ultimato: Retorno à Corte para o Reino Dizem restaurar a dignidade Criam monarquia institucional Exigem incluso Pacto Colonial Reforçam assim a Ideologia Geram Revolução Liberal D. João VI agora submisso Deixa além-mares único filho: Pedro I – Regente do Brasil Terra do nativo varonil Elevado a escravo da Regência Ligada ao Portugal senil Mas Pedro há-nos de vingar Como Proclamador Del Brasil Assim começa a rica sina Das Liberdades do Brasil Porém a volúpia assassina Da burguesa portugália Insistia depredar a Nação Assaltava o ouro e a prata Matava o índio sem razão Queria a República imbecil Foi então que Pedro – o Primo Resolveu desacatar a Corte Disse não à frota-prisão Viver ou morrer seria solução


Rebelar o Brasil por sorte Dizer ao povo: “Fico, à morte!” Selava seu pacto de Razão Mata Portugal sua nação Conquista a elite brasileira Perambula revolucionando: Rio e Minas e São Paulo Entre afagos da Condessa Recebe da carioca Corte Sentença vinda de Portugal Não mais é Regente do Brasil Rebaixado foi a “delegado” Indigno agora é D. João VI Não merece a comiseração Quer do Pedro a rendição Portugal de João é pretexto O Rei quer manter a condição Capitula ante a burguesia Oferece a cabeça do filho Iluminismo da sua agonia Pedro I então indignado Corta os laços da harmonia Como tal um predestinado Ser Libertador do Brasil Reúne a tropa e o povo Brada a todos – e ao mundo Às margens do Ipiranga “Independência ou Morte!” • Assim libertou o Brasil das Garras do império português Aclamado foi Imperador Contudo continua a dor O Povo continua oprimido O Brasil continua freguês Ameaças há ao Brasil destemido D’outro imperialismo burguês. URUBUS DE FOGO (Para Neiva Moreira e Freitas Diniz) O céu é de brigadeiro Lá bem alto o Urubu-rei espreita Vasculha o terreno com olhos de rapina Sente o exalar da fedentina vitorinista Prepara-se então para sua saga carniceira Que se revelará no futuro imediato Sob o manto da bossa-nova O patrono-mor das misérias marânhicas O Urubu-rei então já possuidor da carcaça Abre suas asas e anuncia o seu domínio Deblatera em alto e bom som o seu reinado E aos poucos vai construindo-se potentado Sob a mira de olhares das gentes inconscientes Incapazes de verem à sua frente o fogo voraz


Da mente contumaz da miséria sagaz Deste Maranhão que dorme sob as suas asas Mas o Maranhão que não é só maranhão Não quererá mais quatro décadas de dominação E grita: “- É chegada a hora da redenção!” E assim retoma para si toda dignidade Resgata a honradez cidadã e a liberdade O desejo de construir o seu novo mundo Sem permitir que qualquer vagabundo Subjugue tão-somente a nação marânhica valente (Urubus são urubus – mesmo os de fogo e rei Das terras do Maranhão não mais se apossarão Feitos donatários republicanos de plantão, pois Em terras do Maranhão há, por certo, nova nação!) LIBERTAÇÃO © De João Batista do Lago Essa ambígua ordeiricidade brasileira, e conseqüentemente, do seu povo: país do carnaval! da mulata brasileira! país do futebol! da malandragem fagueira! é ufanismo trigueiro da burguesa “Luzes” subjetivismo do discurso da dominação. Sob este manto praticam-se o terrorismo social e o econômico, o político e o cultural, abstrusos, mas coesos no seu conjunto ideológico incrustado no terrorismo de Estado, que não permite aos comuns cidadãos perceberem, desde sempre, a condenação de suas almas numa constante subjugação. A tudo isso se junte, ainda, a medíocre “democracia racial”: falsa consciência da inclusão sob o beneplácito das elites, da classe média e da burguesia. E os ladrões de sempre, que roubaram, que roubam e, por certo, roubarão este povo que teima em não acordar, que continua “dormindo em berço esplêndido”, continuam nos palácios a nos encantar com a máxima da escravidão: “O Brasil é uma nação ordeira” – dizem. E assim continuamos nossa sina – com o apoio do burguês trabalhador que vendeu sua dignidade, que teve seu espírito comprado, que se esconde sob a proteção de sindicatos fascistas e sustentados pelo Estado terrorista que assalta, que furta o trabalhador comum compulsoriamente dilapidando o miserável salário, que se lhe arranca da boca a comida, do


intelecto a educação, do corpo a moradia. Não menos indulgente é a burguesia intelectual que num eterno louva-deus locupleta-se com migalhas furtadas comprantes das ideologias de plantão que permite assegurar o quinhão da dominação. Da mesma maneira o ramo podre da religião assim também age utilizando o campo do sagrado como fonte inexorável de opressão fazendo cair sobre os desgraçados da sorte o fogo do inferno se porventura desejarem libertação. No mesmo ritual teleológico segue o burocrata, o empresário e o político, os três Poderes: o Judiciário, o Executivo, o Legislativo – a “representação do povo”! Não é, pois, o momento da indignação? Porventura não é chegada a hora da libertação? A nação não pode condescender com seus detratores, com seus ladrões, com seus usurpadores, com seus facínoras, com seus ditadores – falsos democratas, antiprofetas da salvação. Prestai atenção, ó brasileiros! Ó povo dos trabalhadores, povo deserdado, vexado e proscrito! Povo (que é) aprisionado, (que é) julgado e (que é) morto! Povo ultrajado, povo marcado! Não sabeis que mesmo para a paciência, mesmo para a dedicação, há um limite? Não deixarás de dar ouvidos a estes oradores do misticismo que te dizem para rezar e esperar, pregando a salvação pela religião ou pelo poder e cuja palavra veemente e sonora te cativa? Teu destino é um enigma que nem a força física, nem a coragem da alma, nem as iluminações e o entusiasmo, nem a exaltação de nenhum sentimento pode resolver. Aqueles que te dizem o contrário enganam-te e seus discursos servem apenas para retardar a hora de tua libertação, que está preste a soar. O que são o entusiasmo e o sentimento? O que é uma poesia vã diante da necessidade? Para vencer a necessidade há apenas a Necessidade, razão última da natureza, pura essência da matéria e do espírito. Dá-me, agora, ó brasileiros, um pouco da vossa atenção! Tomai como vosso este poema e cantai em toda praça a todo cidadão. Sustentai este grito de alerta, de levante, de atitude revolucionária contra os vituperadores que tomaram esta nação: (é) uma convocação para a revolta, (é) uma ode à desobediência civil,


(é) um convite à marcha contra os canalhas, (é) uma incitação à derrubada do Estado terrorista. Mas também quero vos alertar: os ladrões do Brasil e de seu povo, a camarilha instalada nos três poderes, a elite, a classe média e os burgueses, jamais concordarão com este deblaterar. E dirão com certeza: – Não passa de um ‘esquerdista radical’, um ‘maoísta’, um ‘leninista’, um ‘marxista’, enfim… ‘um comunista’. Ou, no mínimo, dirão: um “revoltado”, um “louco”… Aí então deverás, desde sempre, rechaçar e repelir veementemente a prosa ditirâmbica dessa camarilha de ladrões. Não dareis, jamais, o direito de te definirem, de te identificarem, de te marcarem (feito gado encurralado) segundo seus conceitos, seus preceitos, seus preconceitos. E direis: – Tens agora, ó indignos bufões, o vicejar de um novo Sujeito, tens, aqui, por certo, o discurso da indignada nação, que não quer ver o seu povo, por toda eternidade, dirigido pela corrupção, que não deseja ser representado por congressos de ladrões, governado por rufiões do poder, que se escondem sob a toga da inquisição. E afirmareis a sentença da libertação: “Se os apelos dos movimentos urbanos não são atendidos, se os novos caminhos políticos permanecem fechados, se os novos movimentos sociais não se desenvolvem totalmente, então, tais movimentos – utopias reativas que tentarão iluminar o caminho a que não tinham acesso – retornarão, mas dessa vez, como sombras urbanas, ávidas por destruir as muralhas cerradas de sua nação cativa”. (in EU, PESCADOR DE ILUSÕES, 2006, Ed. Lulu Press) A QUIMERA DA REPETIÇÃO © by João Batista do Lago … e de repente de novo o povo é convocado para uma nova quimera … e de repente de novo o povo atende ao apelo mesmamente estamos diante de uma nova eleição parece festa de São João os brincantes meus-bois-bumbás não percebem que se encontram curralados nos arraiais da nação que seus amos estão sempre-alertas


para lhes arrancar a língua e servir com o pirão da inconsciência o farto manjar na mesa da dominação não basta devorar a consciência da população para ser um bom ladrão… é preciso mais que isso é preciso comer a palavra da reação (mesmo que esta reação seja instintiva não pensada imemoriada não-reativa) não permitir que o boi entenda que no interior da sua força carrega tanta e tamanha libertação… é preciso dissuadir enganar é preciso votar não é preciso não… com precisão renovar a dentadura do Mimoso é preciso ajuda ruminar o chibé (pirão feito com água, farinha de mandioca e açúcar ou mel e por vezes temperado com cachaça e também com pimentão) dar novos olhos ao Caprichoso é preciso ajuda a enxergar a inação da nação falsa consciência do democrático campo real da alienação … e de repente de novo o povo é convocado para uma nova quimera … e de repente de novo o povo atende ao apelo mesmamente e lá se vai o boi inconsciente para o matadouro: manso tranquilo calmo alienado… sem língua com dentadura sem visão com óculos feito povo marcado feito gente desprezada depositar na urna o voto da esperança perdida amanhã… quem sabe o amanhã … e de repente de novo o povo é convocado para uma nova quimera … e de repente de novo o povo atende ao apelo mesmamente


A MORTE TRANSFORMADA CERES COSTA FERNANDES Mais um amigo, mais uma amiga que se vão... assim sem mais , só assim... Em poucos dias de angustiadas expectativas ou de súbito. Não há velórios, nem despedidas, a não ser aquelas que seguem pelas vias sociais, que, por mais calorosas e amigas não substituem um longo e sentido abraço, com direito a chorar no ombro. O meu primeiro contato com a morte foi quando a minha bisavó materna, que finava sua velhice conosco, já desmemoriada, estava a morrer. Foi à noitinha e, logo, a pequena casa se encheu. Família, amigos, vizinhos, todos ao redor do leito da moribunda a rezar. Fraquinha, partiu rápido. Fez-se o velório, com café, bolinhos e muito choro. Era assim. Disso tudo, ficaram-me duas impressões, um vago estranhamento, que mais tarde transformar-se-ia em falta, e um susto, o descobrimento da noite cerrada e seu silêncio. Eu tinha sete anos. Este tipo de morte finou-se com a internação dos doentes em hospitais, o prolongamento da vida por instrumentos, até à inconsciência. Ninguém mais tem últimas palavras para deixar à família ou para a posteridade. Os discursos ao pé do túmulo sumiram juntamente com a moda de proferir discursos; os velórios passaram a ocupar salas de aluguel apropriadas e o acompanhamento a pé dos cortejos deixou de ser possível mercê das longas distâncias em que se situam os novos cemitérios Mesmo com esses impedimentos, modificações modernizantes, antes desta peste chamada Covid 19, que leva as pessoas de roldão, em horas que certamente não eram as ainda as suas, e tornam toda e qualquer manifestação de afeto criminosa, continuávamos a homenagear amigos na derradeira hora, comparecer aos velórios, levar flores e participar das orações conjuntas, mãos dadas, tudo o que sempre fez parte da liturgia da morte cristã. Estes ritos parecem conceder certo alívio aos parentes e amigos do morto e nos dá-nos a certeza de que o amigo partiu corretamente encomendado e, então, podemos iniciar o período de luto, necessário para que o ser humano processe a sua perda. Sem isso, fica-nos a sensação do vazio, a impressão de que nada aconteceu, de que as pessoas não morrem mais, desaparecem. Com a pandemia perdemos o contato físico, os encontros são proibidos, a roda de amigos mais próximos encolhe-se cada vez mais e temos a sensação de estarmos sendo roubados sem perceber como, sem identificar o que perdemos e quem foi o ladrão. A morte transforma-se em um ato de mera prestidigitação em que um mágico faz sumir pessoas apenas com o rápido voejar de seu manto bicolor. Quando morreu meu pai, eu, grávida de sete meses estava aqui em São Luís; ele, no Rio de Janeiro. Fui impedida de viajar para o funeral. Apesar de os amigos providenciarem uma missa de sétimo dia de “corpo presente” (com o caixão vazio, coberto de preto, havia disso), de sentir o carinho de todos, a convicção de sua morte não me chegou. Senti-me roubada em minha dor e sem poder despedir-me dele, uma pessoa tão presente em tudo da minha vida, ficou-me a impressão de que ele não havia realmente morrido. Sentia que ele existia em qualquer parte do tempo e do espaço, onde eu era impedida de ir para encontrá-lo ou buscá-lo. Uma sensação tão estranha, que até hoje não encontro palavras para ela. Não vivi meu luto, no sentido freudiano, embora me tenha vestido de preto. Não sei se me foi ruim ou boa essa falta de confrontação com a sua morte, hoje, só lembro dele nos sonhos e na companhia diária dos pensamentos, com seu terno de linho branco, sempre corado e inteiro. Acho que, a qualquer hora, posso viajar e ir ao seu encontro, não é essa coisa do “andar de cima”, ele está paralelo a mim, nem acima nem abaixo, só que em outra dimensão. Não preciso da morte para encontra-lo.


"O MAPA DA TRIBO", DE SALGADO MARANHÃO PAULO RODRIGUES O Mapa da Tribo é o décimo livro de Salgado Maranhão. Lançado pela editora 7Letras (2013), com 99 páginas e cinco seções que vão traçando os caminhos de uma poética capaz de ultrapassar o oceano. A ancestralidade discursiva do poeta é ampliada em muitos poemas. É certo que a sociedade brasileira é atravessada por muitos discursos, todos em relação, e contidos no sujeito enunciador ora analisado. O discurso literário enquadra-se como constituinte do ser social “designa fundamentalmente os discursos que se propõem como discursos de origem, validados por uma cena de enunciação que autoriza a si mesma” (MAINGUENEAU, 2006, p.60). Este ensaio deve apresentar uma análise do ethos discursivo de Salgado Maranhão. Usaremos três poemas para demonstrar a nossa inferência, de maneira que as imagens universais construídas na obra consigam apresentar as cenas dos nossos nervos sociológicos. José Salgado Santos é um homem negro, alfabetizado depois dos quinze anos, que enfrentou os demônios de uma sociedade capitalista periférica (com uma história longa de escravidão). Agarrou-se ao hábito da leitura como uma oração cotidiana. Foi a sua salvação. O poeta ganhou o prêmio Jabuti, em 1999, com Mural de Ventos e o prêmio da Academia Brasileira de Letras com A Cor da Palavra, em 2011. Traduzido para o italiano, francês, alemão e inglês, é destacável autor visitante de muitas universidades nos EUA. Desenha com muito sucesso uma carreira internacional, porque trabalha a palavra com o compromisso de um Samurai. Ferreira Gullar afirmou: “Salgado faz uma poesia da palavra, muito embora não ignore o real, pois o traduz em fonemas e aliterações. Que não hesita em ir além da lógica do discurso (ou do enlace com o plausível) se o resultado é o impacto vocabular e o inusitado da fala”. Os dois conhecem as vísceras da grande expressão poética. Podemos confirmar o que foi dito - pelo autor de Dentro da Noite Veloz - em: O sertão mordeu meus calcanhares. o sertão é um coiote vestido de súplica (sem que eu visse, abriu cáries em minhas lembranças; eis como sangra o poema vestido de ausentes; eis minhas unhas de barro e servidão. Em meu corpo o verão plantou cigarras, ergueu palavras sobre ruínas (e essa hipérbole para além do havido). Por onde passo até as pedras uivam. (MARANHÃO, 2013, p. 19)


É o segundo poema da obra. Apresenta três estrofes que dançam ao som dos tambores dos quilombolas de Canabrava das Moças. O poeta conscientemente sabe que éthos foi uma parte da retórica voltada para reconstituir o passado social. Por isso, denuncia: “eis como sangra o poema/ vestido/ de ausentes;/ eis minhas unhas de barro/ e servidão”. O servilismo que não desapareceu com a abolição, com a ‘república’, nem mesmo com a Constituição de 1988. “As cigarras” estão espalhadas pelos dias da linguagem e erguem uma identidade nacional. Salgado valida a palavra nacional mestiça e desconfiada da própria materialidade democrática da existência, nos trópicos: “Por onde passo/ até as pedras uivam”. Em ORIGEM 2, temos imagens que denunciam o enunciador e nossa gente: Da seiva que na pele me dá cor de barro de olaria e couro de tambor, eis-me timbrado e solto em muitas vias sujas de outroras e de algarvias. De tantas que eu até perdi a conta do que me jaz por jus ou desaponta. E em ser telúrico e alegre como os rios, me dou em terra, em sangue e ativos; eu próprio sendo “o quase que não vinga”, alimentado a barro de cacimba; para tornar-me um comedor de verbos, de sílabas com pimenta e – de soberbo – notar que, enfim, a vida é caixa-preta, tudo é transverso e nada ao pé da letra. (MARANHÃO, 2013, p. 78) Os dísticos fazem um paralelo entre o pretérito e o presente, arrancando das metáforas motivos, lembranças e guias. O poeta reconhece as marcas da (noite imêmore): “da seiva que na pele me dá cor/de barro de olaria e couro de tambor”. Salgado reafirma as dificuldades da maioria negra, em nosso país: “eu próprio sendo “o quase que não vinga/ alimentado a barro de cacimba”. Num estilo nada simplista denuncia as tragédias pessoais, num mapa de genocídio dos afro-brasileiros. Na estrofe final do poema que dá o título da coletânea, observamos o sujeito enunciador reverenciar sua gramática de origem: “ô vento ancestral/ das línguas que me rasuram!/ recluso em meus anexos/ meus ontens me procuram” (MARANHÃO, 2013, p. 89) . Por fim, os poemas trouxeram um éthos discursivo que busca o universal, o humano, o todo sem retirar a retina da ancestralidade. Salgado Maranhão é a transcendência/imanência, em meio ao caos da palavra contemporânea. ---------------------Paulo Rodrigues* (Caxias, 1978), é graduado em Letras e Filosofia. Especialista em Língua Portuguesa, professor de literatura, poeta, jornalista. É autor de vários livros, dentre eles, O Abrigo de Orfeu (Editora Penalux, 2017); Escombros de Ninguém (Editora Penalux, 2018). Ganhou o prêmio Álvares de Azevedo da UBE/RJ em 2019, com o livro Uma Interpretação para São Gregório.


EDMILSON SANCHES, O ENCONTRO DAS PEDRAS (POEMAS) Postado por DCP em 13/06/2021 - [Curadoria de Natanael Lima Jr]

Edmilson Sanches é escritor e jornalista, nasceu em Caxias (MA) I Foto: Reprodução EDMILSON SANCHES é escritor, jornalista, editor, palestrante, consultor de Administração Pública e empresarial, autor de dezenas de livros nas áreas de Administração, Comunicação, Desenvolvimento, História e Literatura (contos, crônicas, ensaios, poesias). Inúmeros trabalhos publicados em antologias literárias e jornais regionais e nacionais, além de sites, blogs e páginas de redes sociais. Diversos prêmios literários. Graduação e pós-graduação em Letras, Administração Pública, Comunicação e Desenvolvimento Regional e Administração de Empresas. Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, IHG de Caxias (MA), Sociedade de Cultura Latina do Brasil (MA), União Brasileira de Escritores (MA), Academia Brasileira Rotária de Letras (MA), titular das Academias de Letras de Caxias, Imperatriz, Santa Inês, Açailândia, Buriticupu, João Lisboa (MA) e sócio correspondente das Academias de Letras de Rondon do Pará (PA) e Praia Grande (SP). Membro dos Conselhos Regionais de Administração e de Contabilidade. CONTATOS celular/WhatsApp: (99)9.8405-4248; e-mail: edmilsonsanches@uol.com.br; site: https://edmilsonsanches.webnode.com SEIS POEMAS DE EDMILSON SANCHES O ENCONTRO DAS PEDRAS E agora, José? No meio do caminho tinha uma pedra. Aliás, uma pedrada, que é uma pedra movimentada. Dizem que a coisa foi orquestrada teleguiada. Mas, Zé, compreenda: há muita insatisfação, e o povo passa fome, arrocho, precisão. Você, não. É preciso separar o joio


do trigo. Mas onde está o trigo, meu Deus?! Ele já não é subsidiado –– só o povo continua subalimentado. E o povo, já sem razão, responde com quatro pedras na mão. José, você que é, que é católico, rezador, talvez diga que nem só de pão vive o “home”; entanto, ouça: acima da guerra, há o grito da fome. José, sabe como é: o povo se contenta com pouco. Boca cheia não grita. Bucho vazio deixa louco. Sei, não precisa repetir: atiraram a primeira pedra. Mas, José, e por que a outra? Lançada de catapulta, com destaque em jornal, apedrejaram o povo com a Lei de Segurança Nacional. Lei de Talião, pagou-se com a mesma moeda. Ou pedra. (Mas, José, duro com duro não faz bom muro). Não sei, José, não sei como é. Tudo serve de exemplo. E com pedra também se constrói um templo. Vamos juntar todas essas pedras e talvez, quem sabe, um dia com ela terminaremos, “não mais que de repente”,


o prédio transparente da democracia. E aí, povo forte, Nação em pleno viço, botaremos uma PEDRA em cima disso.

BIVALVE Em teu casulo me acasalo me encapsulo. Nele, dentro, me movimento -- ele me entende e se distende completamente; (me) move -- comove -fortemente (me) envolve profundamente até que cio e selva sejam só céu e relva e saia o arado e fique a leiva e em mim saciado brote a seiva e eu homem me transmuto em rio e sobre você mulher margens e leito corro percorro escorro liquefeito. Em teu casulo me acasalo me encapsulo: nele sou mais quanto mais me anulo...


POEMA SEM DATA Poeta, não dates teus versos. Eles não carecem de dia de nascimento –– pois que não têm hora para morrer. Ainda assim, o que pudesses datar seria o gesto gráfico literal frásico expressional. Esquecerias por certo a gestação incubação hibernação. Poeta, teus versos não precisam - nem dependem – de cronografia; também dispensam genealogia: o poema não tem pai, e se tem mãe, é filho da puta, filho de uma égua, é santo do pé do pote, nasceu no oco da palmeira, pode ter vindo de carona na bolsa marsupial ou no bico da cegonha. Poeta, expele teu poema antes que ele salte de ti e sobreviva à tua vida (subvida, sobrevida). Entretanto, nada de dia hora mês ano local. Os poemas estão por aí, soltos, misturados à poesia.


Pegue-os. Mas afasta deles o gesto cartorário, a mão tabeliã.

POEMA A UM JOVEM POETA Não se iluda. Toda a história do mundo se faz com poucas letras. Todo poema é só um verso ou uma só palavra ou meia ou palavra e meia (às vezes, apenas uma letra ou a intenção dela). Todo romance, um só capítulo um fim único capitulado. Nada é múltiplo e vário. Todo tanto todo tudo tudo quanto é uma só unidade que se desfaz na mente e na mentira dos homens

SPARRING Peguei o discípulo e, de supetão, dei-lhe um bogue na cara, um murro nos peitos, um soco no estômago, um chute nos ovos. Dei-lhe pena e papel. E garanti-lhe um minuto de silêncio para que escrevesse sob/re sua dor.


MOMENTO FEBRIL O trovão cala a chuva fala e me entala o coração. O som é forte tom de morte mas com sorte e oração não morro não.


O MULATO: UM ROMANCE MARANHENSE FERNANDO BRAGA Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo, nasceu em São Luís do Maranhão, em 4 de abril de 1857 e faleceu em Buenos Aires, em 1913. Estudou as primeiras letras no Maranhão, onde também trabalhou numa casa comercial. Aos dezessete anos foi para o Rio de Janeiro e estuda pintura na Escola de Belas-Artes. Estreou na imprensa como caricaturista, trabalhando em O Fígaro, O Mequetrefe e A Semana Ilustrada. De volta ao Maranhão, lá escreve o seu primeiro romance de grande êxito, O Mulato, criado pelo jovem Aluísio aos 26 anos de idade, no mirante de um solar revestido de azulejos portugueses, onde morava sua família, à Rua da Paz, em São Luís, hoje tombado pelo Patrimônio Histórico. Depois, Aluísio retorna ao Rio, onde publica diversas obras e colabora em jornais e revistas. Tendo feito concurso para cônsul, serviu em Vigo, Nápoles, Tóquio, e por fim em Buenos Aires, onde morreu. Aluísio é a figura principal do naturalismo no Brasil. Notável observador dos costumes e ambientes da sociedade do Segundo Reinado, a sua produção ressente-se do processo de trabalho do escritor, que era o do folhetim de imprensa. Há em seus livros uma significação histórica ao lado da significação literária. Pertenceu a Academia Brasileira de Letras e nos deixou estes preciosos títulos: Uma Lágrima de Mulher, 1879; O Mulato, 1881; Casa de Pensão, 1884; O Homem. 1887; O Coruja, 1889; O Cortiço, 1890; O Esqueleto, 1890; Demônios, 1893; Livro de uma Sogra, 1895, além de outras produções espalhadas em jornais e revistas. O Mulato ficou corporificado no Realismo, como o primeiro romance do naturalismo estilizado, dentro do aspecto da “art. nouveau”, exteriorizando em suas angústias e depressões sociais os mesmos males que oprimiam os artistas europeus, quando as misérias da crise mundial já rondavam a decadência emocional da “Belle Époque”. Aluísio Azevedo, escritor e diplomata foi um dos expoentes maiores da nossa ficção urbana, e, em sendo O Mulato, o primeiro romance naturalista brasileiro – retrata na sua estrutura todo o nódulo social calcado no racismo do meio maranhense do tempo, onde alguns críticos dizem, que para o estigma do nosso autor faltara àquela exigência de Emile Zola, quando normatiza a conduta dos personagens retratando o terrível comportamento da paixão, mas que, por outro lado, lhe sobrara, aqueles maneios acirrados que caracterizam a luta contra o conservantismo e as rigorosas imposições clericais que de algum modo entorpeciam São Luís no século XIX – servindo como pano de fundo a principal ação do romance. Raimundo (o núcleo central romanesco), filho de escravos e recém-chegado doutor da Europa, não se deu conta de sua “mulatice” e se fez amado e amante em circunstâncias dolorosas envolvidas por terríveis preconceitos. Mas foi assim que Aluísio quis que O Mulato agisse, tipificando-lhe à moda das histórias de Diderot, e dos romances de Tachear e Balzac, ou ainda, sob os traços dos contos de Maupassant e Tchekhov. O Mulato agride o desesperado preconceito racial gerado nas famílias abastadas de São Luís, talvez por isso tão bem recebido pela ferrenha crítica da Corte como exemplo, e ainda, por ter sido escrito no molde do naturalismo bem ao jeito darwinista, causando forte irritação em seus comprovincianos, que o forçaram voltar às pressas para o Rio de Janeiro e juntar-se novamente ao irmão, o dramaturgo, comediógrafo e também escritor Arthur Azevedo que, às gargalhadas, o esperava no cais do porto para comemorarem o que escrevia de Lisboa o crítico Valentim Magalhães: “Aluísio Azevedo é no Brasil, talvez, o único escritor que ganha o pão exclusivamente à custa da sua pena, mas note-se que apenas ganha o pão, porque as letras, no Brasil, ainda não dão para a manteiga”. E sempre será assim... A arte é um dom divino, por isso, dádiva de sacrifício!


LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

FRAN PAXECO:

recortes & memórias

SÃO LUÍS – MARANHÃO – 2021 PARTE XVIII –


Ano 1918\Edição 00159 (2)



11 de julho


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Ano 1918\Edição 00201 (1)


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18 de outubro


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28 de outubro


29 de outubro



07 de novembro





PACOTILHA, 1º DE JANEIRO DE 1919


O JORNAL, 08 DE JANEIRO DE 1919

PACOTILHA, 11 DE JANEIRO 1919


PACOTILHA, 13 DE JANEIRO



PACOTILHA, 22 DE JANEIRO



PACOTILHA, 29 DE JANEIRO



PACOTILHA, 31 DE JANEIRO

O JORNAL, 03 DE FEVEIRO 1919

PACOTILHA, 10 DE FEVEREIRO



PACOTILHA, 24 DE FEVEREIRO



PACOTILHA, 25 DE FEVEREIRO


O JORNAL, 08 DE MARÇO 1919

PACOTILHA, 10 DE MARÇO


PACOTILHA, 13 DE MARÇO

PACOTILHA, 13 DE MARÇO


PACOTILHA, 17 DE MARÇO


PACOTILHA, 18 DE MARÇO


PACOTILHA, 20 DE MARÇ0

PACOTILHA, 21 DE MARÇO



O JORNAL, 22 DE MARÇO DE 1919

PACOTILHA, 07 DE ABRIL




PACOTILHA, 08 DE ABRIL

PACOTILHA, 09 DE ABRIL


PACOTILHA, 16 DE ABRIL


O JORNAL, 22 DE ABRIL DE 1919


PACOTILHA, 26 DE ABRIL

O JORNAL, 06 DE MAIO DE 1919 - PACOTILHA


PACOTILHA, 06 DE MAIO



Ano 1919\Edição 00110 (1) 12 de maio


O JORNAL, 14 DE MAIO DE 1919

PACOTILHA, 19 DE MAIO


PACOTILHA, 27 DE MAIO


PACOTILHA, 02 DE JUNHO


PACOTILHA, 06 DE JUNHO

O JORNAL, 09 DE JUNHO DE 1919

PACOTILHA, 12 DE JUNHO


PACOTILHA, 17 DE JUNHO


O JORNAL, 18 DE JUNHO DE 1919

PACOTILHA, 19 DE JUNHO


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PACOTILHA, 07 DE JULHOILHA, 07 DE JULHO


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PACOTILHA, 10 DE JULHO




PACOTILHA, 14 DE JULHO


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O JORNAL, 22 DE AGOSTO DE 1919


PACOTILHA, 04 DE SETEMBRO


O JORNAL, 15 DE SETEMBRO DE 1919

O JONAL, 23 DE SETEMBRO DE 1919


Ano 1919\Edição 00227 (1) 26 de setembro




Pacotilha, 29 de setembro





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Pacotilhga, 02 de outubro




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Pacotilha, 06 de outubro




PACOTILHA, 07 DE OUTUBRO

08 DE OUTUBRO



O JORNAL, 11 DE OUTUBRO DE 1919

O JORNAL, 13 DE OUTUBRO DE 1919

O JORNAL, 13 DE OUTUBRO DE 1919


PACOTILHA, 13 DE OUTUBRO



Ano 1919\Edição 00242 (1) 14 de outubro



Pacotilha, 24 de outubro



O JORNAL, 27 DE OUTUBRO


PACOTILHA,




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PACOTILHA, 13 DE DEZEMBRO

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NÚMEROS PUBLICADOS: VOLUME 62 – JUNHO DE 2021 VOLUME 61 – MAIO DE 2021

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MARANHAY - (Revista do Léo ) - 56 - março 2021 - EDUÇÃO ESPECIAL: ANTOLOGIA - MULHERES DE ATENAS by Leopoldo Gil Dulcio Vaz - issuu VOLUME 55 – MARÇO DE 2021

MARANHAY - Revista Lazeirenta (Revista do Léo) 55, março 2021 by Leopoldo Gil Dulcio Vaz - issuu VOLUME 54 – FEVEREIRO DE 2021

MARANHAY (Revista do Léo) 54 - FEVEREIRO 2021 by Leopoldo Gil Dulcio Vaz - issuu VOLUME 53 – JANEIRO 2021 https://issuu.com/home/published/maranhay_-_revista_lazerenta_53_-_janeiro_2021 VOLUME 52 –DEZEMBRO – 2020 https://issuu.com/leovaz/docs/maaranhay_-_revista_lazerenta_52__2020b VOLUME 51 –NOVEMBRO – 2020 https://issuu.com/home/published/maaranhay_-_revista_lazerenta_51__2020b/file VOLUME 50 – OUTUBRO – 2020 https://issuu.com/home/published/maranhay_-_revista_lazerenta_-_50_-_2020b VOLUME 49– SETEMBRO - 2020 https://issuu.com/home/published/maranhay_-_revista_lazerenta_-_49_-__2020_VOLUME 48– AGOSTO - 2020 https://issuu.com/home/published/maranhay_-_revista_lazerenta_-_48_-__2020_bVOLUME 47– JULHO - 2020 https://issuu.com/home/published/maranhay_-_revista_lazerenta_-_47_-__2020_VOLUME 46– JULHO - 2020 https://issuu.com/home/published/maranhay_-_revista_lazerenta_-_46_-__2020_VOLUME 45– JULHO - 2020 https://issuu.com/home/published/maranhay_-_revista_lazerenta_-_45_-__2020_-_julhob VOLUME 44 – JULHO - 2020 https://issuu.com/leovaz/docs/maranhay_-_revista_lazerenta_-_44_-_julho__2020 VOLUME 43 – JUNHO /SEGUNDA QUINZENA - 2020 https://issuu.com/home/published/maranhay_-_revista_lazerenta_-_43_-segunda_quinzen VOLUME 42 – JUNHO 2020 https://issuu.com/home/published/maranhay_-_revista_lazerenta_-_42_-junho__2020/file VOLUME 41-B – MAIO 2020 https://issuu.com/leovaz/docs/maranhay_-_revista_lazerenta_-_41-b_-_maio___2020 VOLUME 41-B – MAIO 2020


https://issuu.com/leovaz/docs/maranhay_-_revista_lazerenta_-_41-b_-_maio___2020 VOLUME 41 – MAIO 2020 https://issuu.com/leovaz/docs/maranhay_-_revista_lazerenta_-_41_-_maio__2020 VOLUME 40 – ABRIL 2020 https://issuu.com/home/published/maranhay_-_revista_lazerenta_-_40_-_abril___2020.d VOLUME 39 – MARÇO 2020 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_-_maranhay__39-_mar_o___2020 VOLUME 38 – FEVEREIRO DE 2020 – EDIÇÃO ESPECIAL – PRESENÇA AÇOREANA NO MARANHÃO https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_-_maranhay__39-_fevereiro___2020 A PARTIR DESTE NÚMERO, CORRIGIDA A NUMERAÇÃO, COM SEQUENCIAL, DOS SUPLEMENTOS E EDIÇÕES ESPECIAIS: VOLUME 28 – JANEIRO 2020 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_-_maranhay__28_-_janeiro____2020b VOLUME 29 – FEVEREIRO 2020 https://issuu.com/home/published/revista_do_leo_-_maranhay__29-_fevereiro___2020b

REVISTA DO LÉO - NÚMEROS PUBLICADOS VOLUME 1 – OUTUBRO DE 2017 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_-_1_-_outubro_2017 VOLUME 2 – NOVEMBRO DE 2017 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_-_2_-_novembro_2017 VOLUME 3 – DEZEMBRO DE 2017 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_-_3_-_dezembro_2017 VOLUME 4 – JANEIRO DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_4_-_janeiro_2018 VOLUME 5 – FEVEREIRO DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_5_-_fevereiro_2018h VOLUME 6 – MARÇO DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_6_-_mar__o_2018 VOLUME 6.1 – EDIÇÃO ESPECIAL – MARÇO 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_especial__faculdade_ VOLUME 7 – ABRIL DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_7_-_abril_2018 VOLUME 8 – MAIO DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_8_-_maio__2018 VOLUME 8.1 – EDIÇÃO ESPECIAL – FRAN PAXECO: VIDA E OBRA – MAIO 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_8.1_-__especial__fra VOLUME 9 – JUNHO DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_9_-_junho_2018__2_ VOLUME 10 – JULHO DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_-_10_-_julho_2018 VOLUME 11 – AGOSTO DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_-_11_-_agosto_2018 VOLUME 12 – SETEMBRO DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_12_-_setembro_2018 VOLUME 13 – OUTUBRO DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_-_13_-_outubro_2018


VOLUME 14 – NOVEMBRO DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_l_o_-_numero_14_-_novemb VOLUME 15 – DEZEMBRO DE 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revisdta_do_l_o_15_-_dezembro_de_20? VOLUME 15.1 – DEZEMBRO DE 2018 – ÍNDICE DA REVISTA DO LEO 2017-2018 https://issuu.com/…/docs/233ndice_da_revista_do_leo_-_2017-201 VOLUME 16 – JANEIRO DE 2019 https://issuu.com/home/published/revista_do_leo__16_-_janeiro_2019 VOLUME 16.1 – JANEIRO DE 2019 – EDIÇÃO ESPECIAL: PESCA NO MARANHÃO https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__16_1__-_janeiro__20 VOLUME 17 – FEVEREIRO DE 2019 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_17_-_fevereiro__2019 VOLUME 18 – MARÇO DE 2019 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__18_-_mar_o_2019 VOLUME 19 – ABRIL DE 2019 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__19-_abril_2019 VOLUME 20 – MAIO DE 2019 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__20-_maio_2019 VOLUME 20.1 - MAIO 2019 – EDIÇÃO ESPECIAL – FRAN PAXECO E A QUESTÃO DO ACRE https://issuu.com/home/published/revista_do_leo__20.1_-_maio_2019_-_ VOLUME 21 – JUNHO DE 2019 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__21-_junho_2019 VOLUME 22 – JULHO DE 2019 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__22-_julho_2019 VOLUME 22.1 – JULHO DE 2019 – EDIÇÃO ESPECIAL: CAPOEIRAGEM TRADICIONAL MARANHENSE https://issuu.com/home/published/revista_do_leo__22-_julho_2019_-_ed VOLUME 23 – AGOSTO DE 2019 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__23-_agosto_2019 VOLUME 23.1 – AGOSTO DE 2019 – EDIÇÃO ESPECIAL: AINDA SOBRE A CAPOEIRAGEM MARANHENSE https://issuu.com/home/published/revista_do_leo__23.1-_agosto_2019_VOLUME 24 – SETEMBRO DE 2019 – LAERCIO ELIAS PEREIRA https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__24_-_setembro__2019_-_edi__o_espec VOLUME 24.1 – SETEMBRO DE 2019 – EDIÇÃO ESPECIAL: IGNÁCIO XAVIER DE CARVALHO: RECORTES E MEMORIA https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__24_-_setembro__2019_-_edi__o_espec VOLUME 25 –OUTUBRO DE 2019 – https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__25_-_outubro__2019 VOLUME 26 –NOVEMBRO DE 2019 – https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__26_-_novembro__2019 VOLUME 27 – DEZEMBRO DE 2019 – https://issuu.com/home/published/revista_do_leo__27_-_dezembro___2019 VOLUME 27.1 – DEZEMBRO DE 2019 – suplemento – OS OCUPANTES DA CADEIRA 40 DO IHGM https://issuu.com/home/published/revista_do_leo__27.1_-_dezembro___2019 VOLUME 30 – edição 6.1, de março de 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_especial__faculdade_ VOLUME 31 – edição 8.1, de maio de 2018 EDIÇÃO ESPECIAL – FRAN PAXECO: VIDA E OBRA – MAIO 2018 https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_8.1_-__especial__fra VOLUME 32 – edição 15.1, de dezembro de 2018 ÍNDICE DA REVISTA DO LEO 2017-2018 https://issuu.com/…/docs/233ndice_da_revista_do_leo_-_2017-201 VOLUME 33 – edição 16.1, de janeiro de 2019 – EDIÇÃO ESPECIAL: PESCA NO MARANHÃO https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__16_1__-_janeiro__20


VOLUME 34 - edição 20.1, de maio de 2019 – EDIÇÃO ESPECIAL – FRAN PAXECO E A QUESTÃO DO ACRE https://issuu.com/home/published/revista_do_leo__20.1_-_maio_2019_-_ VOLUME 35 – edição 22.1, de julho de 2019 – EDIÇÃO ESPECIAL: CAPOEIRAGEM TRADICIONAL MARANHENSE https://issuu.com/home/published/revista_do_leo__22-_julho_2019_-_ed VOLUME 36 – edição 23.1, de agoto de 2019 – EDIÇÃO ESPECIAL: AINDA SOBRE A CAPOEIRAGEM MARANHENSE https://issuu.com/home/published/revista_do_leo__23.1-_agosto_2019_VOLUME 37 – edição 24.1, de setembrp de 2019 – EDIÇÃO ESPECIAL: I. XAVIER DE CARVALHO: RECORTES E MEMORIA https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo__24_-_setembro__2019_-_edi__o_espec


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