Estagiornal #10

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Estagiornal Fortaleza, 30 de junho de 2010 - Ed. 10

Venustério, quartinho do amor do Abrigo dos Idosos.

Nesta edição

Venustério, o quartinho do amor Grupo de Acessibilidade AprePÁG. 1 e 2 senta estreia no TJA PÁG. 3

Mártir Francisca na Bela Vista PÁG. 4 e 5

Expediente: Laboratório de Inclusão | Grupo de Informação e Consciência Humana | Coordenador: João Monteiro Vasconcelos | Estagiários: Evelyn Onofre (Jornalismo), Gabriela Ferreira (Pedagogia), Horácio Peixoto (Administração) e Paula Castelana (Direito)


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Venustério, o quartinho do amor

Santo e Toinha, casal com frequência assídua no venustério.

Porta e paredes lilás, teto esfumaçado, um espelho retangular, um tapete, um quadro com copos-de-leite, uma poltrona, que quase cabem dois de tão larga e uma cama aconchegante com colcha florida. Em cima dela, dois pares de toalha, sabonete e várias almofadas vermelhas com a frase “eu amo você” estampada em dois idiomas diferentes. Aos pés, dois pares de chinelo. Quase tudo duplicado. Quase tudo em par, fazendo referência ao casal, exceto pelas quatro, cinco, seis borboletas que decoram o ambiente. Este é o venustério, quartinho reservado para os momentos de mais intimidade e aconchego entre os casais da terceiridade que moram no Abrigo dos Idosos. Esse quartinho do amor já rendeu muitas histórias. Uma, inclusive, abalou a reputação do venustério. Um dia, um casal reservou o quartinho e passou a noite junto. Mas, no dia seguinte, a mulher saiu falando que, na hora H, o homem broxou e que nada aconteceu. Desde então, muitos casais, que antes até frequentavam o venustério, ficaram com receio de ir novamente. Outros, que nunca estiveram lá, viram suas chances de conhecer

o quartinho diminuírem ainda mais. Essa história gira em torno de Luiza, que é bem mais idosa e tem um amor quase que platônico por Bibiano. “A gente estimulou, sem vulgaridade, dona Luiza e seu Bibiano, porque viu que os dois viviam se abraçando e se beijando. Organizamos tudo, mas foi um fracasso. Ele falhou e ela saiu dizendo pra todo mundo que não tinha dado certo”, conta Ivone Marques, assistente social do Abrigo. O estímulo, citado por Ivone, é mais como uma brincadeira. No Abrigo não se trabalha com remédios para isso. Na terceiridade, a sexualidade existe, mas atrelado e muito mais forte que isto está o companheirismo, a troca, a cumplicidade, a preocupação. “Eu acho que o sexo é algo que pode acontecer, mas não é o foco maior deles, não”, comenta Ivone. É mais o cuidado. O fato de ter alguém que pegue um copo com água ou um café levanta a auto-estima deles. Ivone conta que “Por mais que a gente estimule, converse sobre sexualidade é uma coisa difícil de abordar, principalmente se você for atrás da vida deles”.


Atualmente, o Abrigo está passando por algumas reformas, o que comprometeu também o uso mais frequente do venustério por alguns deles. Segundo Ana Maria, pedagoga do Abrigo dos Idosos, os frequentadores assíduos do venustério sempre foram Toinha e Santo, que se conheceram há mais de dez anos, desde quando foram para o Abrigo, e, hoje, são casados. Sobre usar o venustério na noite do dia dos namorados, Santo diz “É bom, né. Depois dessa reforma, nunca mais fui lá” e Toinha concorda. Angelúcia e Geraldo é outro casal que já foi ao venustério. Ele chegou a levar Maria do Carmo também. “Seu Geraldo, por ser garotão, mais ativo, chegou a levar duas pessoas - uma e depois outra, não as duas de uma vez. A gente ficou meio assim, com medo de que as duas brigassem”, conta Ivone. Pra utilizar o venustério existem algumas regras como não pode levar duas, três mulheres ou homens, e ter que ser namorado. No mais, é livre. Basta procurar o serviço social ou pedagogia para a autorização e liberação do quarto. Outro casal conhecido dentro do Abrigo é Chico e Dalva. Eles nunca foram ao venustério, mas são conhecidos pela cumplicidade e companheirismo. Chico não se comunica mais através da fala. Dalva sempre vai ao quarto dele, leva um copo com água, um café ou uma sopa. À noite, costumavam ficar juntos na pracinha das bananeiras, lugar conhecido em formar novos casais do Abrigo. Manoel e Maria do Carmo, Elenice e João Nunes são outros casais do Abrigo que dão beijo, abraço, andam de mãos dadas e cuidam um do outro. Namoram sem precisar usar o venustério. “Não é obrigado você ir ao venustério só pra fazer amor, não, mas pra passar a noite um com o outro, no aconchego”, diz Ivone.

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A cumplicidade de Dalva e Chico.

O Abrigo dos Idosos, também conhecido como Abrigo do Olavo Bilac, é uma unidade da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS), que comporta homens e mulheres de qualquer faixa etária, alguns ainda em idade produtiva. “Ele era inicialmente voltado para moradores de rua. Hoje, tem como público, idosos sem vínculos familiares e pacientes em condições de negligência pela família. Segundo Ivone, os pacientes são trazidos pela Promotoria do Idoso, e também quando alguém da

comunidade ou mesmo parente solicita a internação do mesmo. Pela Promotoria eles vêm na condição de perdido, onde cabe ao serviço social investigar.

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Grupo de Acessibilidade Apresenta estreia no TJA

Bia Marques na apresentação de estreia no Theatro José de Alencar.

No 1º dia do mês de junho, o Grupo de Acessibilidade Apresenta estreou com apresentação da cantora Bia Marques junto à Banda Acesso. O evento aconteceu no saguão do Theatro José de Alencar e foi promovido pelo Laboratório de Inclusão, da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS). O foco musical girou em torno da MPB com apresentações de músicas como “Linda demais” (Roupa Nova), “Como eu quero” (Leoni e Paula Toller), “Pingos de amor” (Paulo Diniz), “Fico assim sem você” (Abdullah e Cacá Moraes), “Palpite” (Vanessa Rangel), “Pintura íntima” (Leoni e Paula Toller), além de canções de autoria da própria Bia, como “Dominique”. Bia Marques é uma das primeiras cantoras selecionadas pelo Grupo de Acessibilidade Apresenta e começa agora a divulgar seu trabalho com a Banda Acesso, através de eventos promovidos pelo Laboratório de Inclusão. A banda tem como integrantes, Anderson Costa (violão), Lucas Albert (guitarra), Sérgio Rotschild (vocal), Ricardo de Oliveira (bateria) e Uesley Gomes (teclado). O Grupo de Acessibilidade Apresenta é um projeto coordenado por Sérgio Rotschild e desenvolvido pelo Núcleo de Acessibilidade Dificultada do Laboratório de Inclusão, que tem como objetivo divulgar e incluir

músicos com Acessibilidade Dificultada (AD) visual, cognitiva, física e auditiva, no mercado de trabalho. O projeto já conta com 30 músicos inscritos que passarão ainda por processo seletivo para se tornarem membro do Grupo, que gera emprego e renda através da própria arte.

Bia Marques e Banda Acesso.


A socialização do Mártir Francisca à Bela Vista

Quarteirão ornamentado pelos jovens do Centro de Semiliberdade Mártir Francisca.

A Copa do Mundo está unindo mais ainda o Centro de Semiliberdade Mártir Francisca (CSMF), unidade coordenada pela Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS), à comunidade Bela Vista. Logo no início, com a chegada do Centro ao bairro, aconteceram conflitos e temores por parte de seus moradores. Por ser uma unidade composta por menores em conflito com a lei, a comunidade, ou melhor, pessoas que iriam residir ao lado do Centro se rebelaram contra essa transferência da Washington Soares para Bela Vista. Protestos e manifestações foram divulgados pelas mídias. Saíram no jornal, na TV, no rádio e na internet vários posicionamentos contra essa transferência, mas, ainda assim, o CSMF não desistiu de tentar se aproximar da comunidade, através de atividades que acontecem durante datas comemorativas, como São João, Natal e, agora, Copa do Mundo. O CSMF participou, junto à comunidade, da competição de rua mais enfeitada tendo como prêmio ao vencedor um telão para exibir os jogos. Através dessa atividade, aproximadamente, 45 jovens e demais funcionários e colaboradores da unidade participaram da ornamentação da rua, pintando de verde e amarelo todo o quarteirão do Centro, as calçadas, os muros, além de pendurar bandeirolas e outros enfeites

que simbolizam o São João e a Copa do Mundo, os dois grandes eventos deste mês de junho. “Quando chegamos aqui, o povo todo pensava que a gente só era do mal. Não conhecia a casa e nada do que a gente fazia aqui dentro. Também piorou quando um amigo nosso saiu pro final de semana do reveillon e foi assassinado logo ali na esquina. Mas eles tinham que saber que cada um é cada um e os outros podem não ter o mesmo destino que ele e estamos aqui é para mudar e ter outra oportunidade”, conta Francisco Ângelo, um dos sócioeducandos do CSMF. A difícil convivência seguiu em meio a protestos e abaixo-assinados, todos em prol da retirada do CSMF do bairro, como relata Francisco Ângelo que está no Centro cumprindo medida de semiliberdade desde novembro de 2009. Francisco Ângelo é pai de Ângela, de um ano e oito meses e, hoje, cursa o 1º ano no Colégio Félix Azevedo, além de participar do Pró-Jovem, inserido no curso de manutenção de celulares e nos trabalhos de profissionalização dentro do CSMF. ESTAGIORNAL - De que maneira vocês se aproximaram da comunidade? Francisco Ângelo - O tempo foi passando, aí veio aqui uma TV e fez uma reportagem dizendo como a gente era, o que a gente fazia aqui dentro, o nosso dia

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Adolescentes do CSMF cooperando para deixar a rua em ritmo de Copa do Mundo.

Aqui todo mundo trabalha e estuda. Só não muda quem não quer, pois oportunidade aqui dentro tem muita e atenção também.

a dia. Mostrou nossos trabalhos das telas e serigrafias, aí viram que a gente estava aqui para melhorar, que era gente boa e de valor. Depois eles pararam de fazer zoada para a gente ir embora daqui e aí nos trataram bem. Muita gente veio até ver nossas telas e hoje damos bom dia e boa noite para eles e ficamos todos amigos. Até fomos nas casas deles agora enfeitar a rua para o jogo da Copa. Todo mundo cooperou e tudo foi a maior limpeza. E - O que você acha dos trabalhos realizados com vocês no CSMF? Como você se sente? F.A. - Aqui todo mundo trabalha e estuda. Só não muda quem não quer, pois oportunidade aqui dentro tem muita e atenção também. Todos aqui têm de tudo bom. A gente é que erra às vezes com eles e só sobra pra gente mesmo. Mas tudo é gente boa e nos trata muito

bem. Acho que quando eu sair daqui vou sentir é muita falta de todos, mas tenho que seguir minha vida só para o bem. Oportunidade estou tendo, né? Se deus quiser. O CSMF, fundado em 2001, desenvolve medidas sócio-educativas com jovens e adolescentes em conflito com a lei. O regime de semiliberdade é estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), onde sua medida pode ser aplicada desde o início, ou como forma de progressão de outros regimes, para o meio aberto, possibilitando a realização de atividades externas, onde é obrigatória a escolarização e profissionalização, devendo, sempre que possível, ser realizados os recursos existentes na comunidade, como consta no Art 120º, I e II do ECA. Os trabalhos da Unidade Mártir Francisca, são realizados através de uma direção e de um grupo de profissionais como psicólogo, pedagogo, advogado, assistente social, sócio-educadores e colaboradores. Todos com o mesmo projeto de orientar, ajudar e incentivar os jovens e adolescentes, como também os seus familiares, a vislumbrarem possibilidades melhores de um futuro digno e mais justo. Tentando também inserí-los numa sociedade com mais segurança e justiça, onde todos possam ter o direito de ser tratado de igual para igual, sem distinção de credo, cor ou religião, como afirma o Art 5º da nossa Constituição Federal.


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