Você sabe com quem está falando?

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COMUNICAÇÃO CORPORATIVA

Por Juliano Rigatti

FABRÍCIO BARRETO

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Revista

Super Sul

Você sabe com quem está falando?

B

em lá no início do curso de Comunicação Social, aprendemos que o emissor, o meio, a mensagem e o receptor são elementos fundamentais da comunicação. Sem um deles, o processo não se estabelece. Na prática, já no mercado, passei a compreender como funcionam os três primeiros dentro da área de Comunicação Interna de uma empresa. Embora se exercite diariamente técnicas que qualifiquem o emissor, o meio e a mensagem, nesta mesma prática, há pouco tempo para pensar sobre o último elemento, o funcionário da sua empresa. Quem é ele? O que o motiva? Que dúvidas ele tem a respeito da sua atividade? Essas são questões primordiais para o sucesso da comunicação interna em qualquer empresa do mundo. No Brasil, especialmente, o tema ganha mais um ingrediente: a qualidade da educação e a baixa escolaridade. Quanto tempo estudou? Qual seu nível de compreensão? Quantos livros lê por ano? Este é, portanto, o novo paradigma. Ouso dizer que, neste período de grande preocupação com a diversidade dentro do quadro de funcionários das organizações, além de todo investimento na valorização de negros, homossexuais e funcionários com deficiência, por exemplo, os empresários precisarão aplicar parte de seus esforços na comunicação com analfabetos funcionais. Aliás, você sabe o que é isso? Segundo a Unesco (organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura), analfabeto funcional é toda pessoa que sabe escrever seu próprio nome, lê e escreve frases simples, efetua cálculos básicos, mas é incapaz de interpretar o que lê e de usar a leitura e a escrita em atividades cotidianas. E você sabia que, sendo a sua empresa uma empresa que recruta brasileiros, se ela tiver cinco mil funcionários, 1.400 deles podem ser classificados neste grupo? O dado é da edição de 2009 do Indicador de Analfabetismo Funcional, o Inaf, que retrata a situação de brasileiros com idade entre 15 e 64 anos, estudantes ou não. Segundo o Inaf 2009, 28% dos brasileiros são analfabetos funcionais.

{Jul/Ago de 2011}

A grande preocupação que precisa surgir a partir desta realidade da nossa alfabetização é a seguinte: qual o nível de compreensão dos funcionários da sua organização às informações que são comunicadas diariamente dentro da empresa? Suponhamos que o seu supermercado ou a sua indústria tenham um mural e uma revista. Certamente, a alta direção nutre a expectativa de que os seus funcionários se movimentem motivados pelas informações obtidas por meio dessas ferramentas. Nada mais natural depois do investimento aplicado. Mas, repito o questionamento: este receptor está preparado para responder como o seu líder espera? Embora tenhamos assistido entusiasmados o fenômeno da emersão de milhões de brasileiros, que passaram a compor a classe C, ainda há estatísticas relacionadas à educação brasileira que nos envergonham – e prejudicam os negócios. Para se ter uma ideia, de acordo com o Relatório de Desenvolvimento Humano da ONU, a Organização das Nações Unidas, publicado no final do ano passado, o Brasil tem a média do Zimbábue no quesito educação. Nada contra o país africano, a não ser o fato de ele figurar na 169º posição do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), enquanto o Brasil está no 73º lugar. Os brasileiros estudam, em média, apenas 7 anos. O mesmo tempo que no Zimbábue. A ONU recomenda que o nosso país quase dobre o tempo de permanência da população dentro das salas de aula, elevando-o para 13 anos. E o futuro não parece nada promissor. O Brasil está apenas na 53ª posição do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, na sigla em inglês), divulgado em dezembro de 2010 pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). O estudo fez um raio-x da situação da educação (leitura, matemática e ciência) de cerca de três mil adolescentes brasileiros, todos na faixa dos 15 anos. A China foi a grande vencedora, com 1.731 pontos. O Brasil acumulou 1.203 e ficou atrás de nações como Chile, Trinidad e Tobago, Colômbia, México e Uruguai. Em se tratando de leitura, especificamente, nosso índice ficou abaixo da média. A pesquisa é produzida a cada três anos e reúne 65 países, entre membros e parceiros da organização.


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Levando em conta que a maioria das ferramentas de Comunicação Interna utilizam a palavra escrita, e que o varejo e a indústria acumulam um grande número de funcionários com o perfil das pesquisas acima, entendo que o processo precisa ser repensado. E aqui, outro elemento da comunicação, o meio, passa a ser decisivo. Vejamos o exemplo da AGCO, eleita em 2010 a empresa do ano na categoria Comunicação e Relacionamento com o Público Interno na região Sul pela Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje). Ela é fabricante e distribuidora global de equipamentos agrícolas, produz para marcas como Massey Ferguson, Fendt, Challenger e Valtra e está em 140 países de cinco continentes. Embora não tenha relação direta com o setor varejista, que lição ela tem a nos ensinar? A criação do Sistema AGCO de Comunicação Interna buscou solucionar reclamações comuns entre os funcionários, que alegavam não ficar sabendo da troca de diretores e de outras decisões corporativas enviadas apenas por e-mail. Para complicar, a empresa passou por um processo de integração em 2007, após adquirir a Valtra, uma companhia de Mogi das Cruzes (SP). Que solução foi encontrada? Além de outras medidas, a valorização da comunicação face a

face. A AGCO implementou reuniões chamadas “Bom dia” e “Boa Noite”, e o criou o encontro “Tá na Mesa”. Em cada um deles, funcionários e suas lideranças têm a oportunidade de conversar sobre a pauta semanal e integrar-se. Resultado: 79% de aprovação interna para o novo modelo de comunicação. Comunicação face a face, olho no olho, cara a cara. Seja qual for o nome do método, ele já provou ser eficaz em processos nos quais é necessário o convencimento, a abertura para perguntas e respostas. No país em que trabalhamos, sua aplicação é ainda mais necessária. Mesmo em plena era da informação e a popularização de sites, blogs e redes sociais, o contato pessoal virou prioridade a partir dos problemas da educação brasileira e dos reflexos dela na capacitação de nossos funcionários. Intranet, emails, cartas, boletins, murais e revistas continuam tendo papel importantíssimo na disseminação da cultura e das mensagens da companhia. Mas em grande escala, podem não ser eles os responsáveis por despertar motivação e engajamento, dois grandes objetivos de uma comunicação eficaz. Juliano Rigatti é jornalista, possui MBA em Gestão Empresarial e trabalha com varejo há 10 anos. E-mail: jfrigatti@gmail.com Revista

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