Monografia Conclusão MBA Gestão Empresarial

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS UNIDADE ACADÊMICA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA MBA EM GESTÃO EMPRESARIAL JULIANO FILIPE RIGATTI

ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA E RELAÇÕES PÚBLICAS: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A IMPORTÂNCIA DO RELACIONAMENTO COM A IMPRENSA PARA O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO DO HOSPITAL SANTA CASA DE PORTO ALEGRE

PORTO ALEGRE 2010


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Juliano Filipe Rigatti

ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA E RELAÇÕES PÚBLICAS: um estudo de caso sobre a importância do Relacionamento com a Imprensa para o Planejamento Estratégico do hospital Santa Casa de Porto Alegre

Trabalho de conclusão de Curso de Especialização apresentado como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Gestão Empresarial, pelo MBA

em

Gestão

Empresarial

Universidade do Vale do Rio dos Sinos

Orientador: Prof. Dr. Carlos Diehl

Porto Alegre 2010

da


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Agradeço a Deus pela vocação, à família pela criação, à namorada pelo apoio e carinho, e à psicóloga e à psiquiatra pela sanidade. À academia pelas descobertas, ao orientador pelo norte, à equipe do hospital Santa Casa de Porto Alegre, pela presteza e confiança e ao Walmart Brasil, pela experiência, aprendizado e valorização.


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Confidência do Itabirano Carlos Drummond de Andrade Alguns anos vivi em Itabira. Principalmente nasci em Itabira. Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro. Noventa por cento de ferro nas calçadas. Oitenta por cento de ferro nas almas. E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação. A vontade de amar, que me paralisa o trabalho, vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes. E o hábito de sofrer, que tanto me diverte, é doce herança itabirana. De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço: esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil, este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval; este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas; este orgulho, esta cabeça baixa... Tive ouro, tive gado, tive fazendas. Hoje sou funcionário público. Itabira é apenas uma fotografia na parede. Mas como dói!


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RESUMO Este estudo de caso teve como objetivo avaliar o Relacionamento com a Imprensa da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, no escopo da sua administração estratégica. Além disso, buscou-se propor melhorias que tornassem estratégico o relacionamento desta instituição com a imprensa. As evidências necessárias foram obtidas por meio de documentos, arquivos, matérias jornalísticas e entrevistas em profundidade com profissionais do hospital no primeiro semestre de 2010. Com base nos pressupostos do pesquisador e do quadro teórico composto, o estudo concluiu que a imprensa e a área de Comunicação são valorizadas pela alta direção da instituição estudada; que a mídia foi decisiva na composição do atual Planejamento Estratégico da organização; e que alguns conceitos da administração precisam ser incorporados às atividades de Relacionamento com a Imprensa a fim de que esta atue no sentido de gerar vantagem competitiva à Santa Casa. Palavras-chave: Planejamento Estratégico. Administração Estratégica. Vantagem Competitiva. Públicos Interessados. Stakeholders. Comunicação. Relações Públicas. Jornalismo. Assessoria de Imprensa. Relacionamento com a Imprensa. Mídia.


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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 7 1.1 Tema e Contextualização .................................................................................................. 7 1.2 Definição do problema ..................................................................................................... 7 1.3 Objetivos......................................................................................................................... 10 1.3.1 Objetivo geral .......................................................................................................... 10 1.3.2 Objetivos específicos ............................................................................................... 10 1.4 Justificativa ..................................................................................................................... 11 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ........................................................................................ 13 2.1 A administração estratégica e a satisfação dos stakeholders .......................................... 13 2.2 O poder do jornalismo .................................................................................................... 18 2.3 Relações Públicas e Relacionamento com a Imprensa ................................................... 21 2.4 Relacionamento com a Imprensa e sua relevância para a administração estratégica ..... 24 2.5 Jornalista e organização: um diálogo imprescindível ..................................................... 27 3. MÉTODO DE PESQUISA ................................................................................................... 30 3.1 O estudo de caso ............................................................................................................. 30 3.2 Definição do caso ........................................................................................................... 30 3.3 Coleta de evidências ....................................................................................................... 31 3.4 Análise de evidências ..................................................................................................... 31 3.5 Plano de análise dos dados ............................................................................................. 32 4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DAS EVIDÊNCIAS ........................................................ 33 4.1 Caso estudado: o hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre ........................ 33 4.1.1 Reconhecimentos ..................................................................................................... 33 4.1.2 Ajustes financeiros................................................................................................... 33 4.1.3 Mudança na imagem................................................................................................ 34 4.1.4 Principais norteadores ............................................................................................. 36 4.2 Análise das evidências coletadas .................................................................................... 37 4.2.1 Administração estratégica e o jornalismo: a importância dada à imprensa e aos profissionais da organização que se relacionam com ela ................................................. 37 4.2.3 Contribuições da área de Relacionamento com a Imprensa para a administração estratégica da organização ................................................................................................ 44 4.2.4 Proposições para um Relacionamento Estratégico com a Imprensa: criando vantagem competitiva para a Santa Casa ......................................................................... 47 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 55 REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 57


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APÊNDICE A ........................................................................................................................... 60 APÊNDICE B ........................................................................................................................... 63 APÊNDICE C ........................................................................................................................... 67 ANEXO A ................................................................................................................................ 70 ANEXO B ................................................................................................................................ 71 ANEXO C ................................................................................................................................ 72


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1. INTRODUÇÃO

1.1 Tema e Contextualização Relacionamento com a Imprensa1 e administração estratégia.

1.2 Definição do problema Para Wright, Kroll e Parnell (2007), é premissa da administração estratégica que nenhuma organização pode levar em frente seu plano de negócios sem considerar o macroambiente no qual está inserida e os stakeholders que são afetados por ela. A imprensa, com seu chamado quarto poder – termo cunhado pelo inglês Lord Macaulay, em 18282 –, atua na sociedade como sua porta-voz e agente fiscalizador, protegendo os cidadãos de eventuais abusos do executivo, legislativo ou judiciário. “Uma voz dos cidadãos na expressão das suas preocupações, da sua ira, e, se for preciso, da sua revolta”, acrescenta Maira Escovar3. Com o amadurecimento da democracia brasileira, a abertura econômica e o atual quadro concorrencial entre as companhias, o jornalismo ampliou sua cobertura dos temas corporativos e incluiu também as empresas na sua pauta diária de observação. Neste sentido, a relação das organizações com a imprensa assume importância fundamental no atingimento dos objetivos estratégicos e na sustentabilidade do ambiente competitivo. Este raciocínio sintetiza a problemática existente entre a área de Relações Públicas, mais especificamente o Relacionamento com a Imprensa, e o seu envolvimento na tomada de decisões estratégicas de uma organização. Para Harrison (2005), as organizações que valorizam públicos interessados com alto grau de influência no ambiente externo movem-

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Neste estudo, Relacionamento com a Imprensa será entendido como uma área de atuação pertencente às Relações Públicas. Como o Relacionamento com a Imprensa, uma organização pode ainda subordinar às Relações Públicas departamentos que atuam no relacionamento com governos, outras empresas e ONGs, por exemplo. 2 Maira Escovar, é jornalista e Mestre em Comunicação Midiática pela Unesp, Especialista em Televisão pela USP e Rede Globo, e em Jornalismo Econômico pelo MBA FAAP. Artigo hospedado no Portal da Imprensa. Disponível em: <http://portalimprensa.uol.com.br/colunistas/colunas/2007/07/16/imprensa6.shtml> Acesso em: 09 mai. 2010 3 Maira Escovar, op. cit.


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se “em direção à execução bem-sucedida de suas estratégias, consistentemente com sua direção estratégica” (2005, p. 214). A atividade de Relacionamento com a Imprensa teve seu início no Brasil em 1961, mas consolidou-se a partir da década de 80. O amadurecimento da democracia e da economia brasileira, e as inúmeras vitórias da liberdade de imprensa, reforçaram a relevância do jornalismo para a sociedade e para um ambiente concorrencial cada vez mais acirrado. Levantamento4 encomendado pelas agências de notícias BBC e Reuters à GlobeScan em 2006, afirmou que, nos 10 países pesquisados, entre eles o Brasil, 61% da população acreditava na imprensa. O dado era superior à confiança nos Governos, por exemplo, que ficou com 52%. Ao contrário de EUA, Inglaterra e Alemanha, onde a crença nos Governos era maior do que na mídia, no Brasil, 45% dos entrevistados disseram confiar na imprensa, enquanto somente 30% preferiam acreditar no Governo. A crise financeira mundial fez despencar a confiança na mídia entre os norte-americanos. Pesquisa5 feita pela Public Policy Polling, em abril de 2009, revelou que somente 5% dos 568 participantes do levantamento têm uma grande confiança na mídia. No Brasil, dados mais recentes comprovam maior credibilidade no meio jornalístico do que no vizinho EUA. Para o estudo6 realizado pelo Centro de Justiça e Sociedade (CJUS) da Escola de Direito do Rio de Janeiro, da Fundação Getulio Vargas (FGV Direito, do Rio de Janeiro) e pelo Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe), de 9 a 11 de fevereiro de 2009, a imprensa é a sexta instituição na qual os brasileiros mais confiam, com preferência de 58% dos entrevistados. A estatística confirma vantagem de confiança da mídia brasileira, por exemplo, sobre os poderes legislativo (Câmaras de Vereadores e de Deputados e Senado), executivo (Governo Federal, Estadual e prefeitura) e judiciário. Em pesquisa que analisa o grau de confiança nas profissões brasileiras, pertencente ao mesmo levantamento da CJUS, o jornalista repete a sexta posição, com 66%, à frente de militares, empresários e governador, por exemplo. Pesquisa7 realizada em março de 2010 pela GfK, 4ª maior empresa de pesquisa de mercado no Brasil e 4º maior 4

GlobeScan. Disponível em: <http://www.globescan.com/news_archives/bbcreut.html#perception> Acesso em: 26 fev. 2009 5 Public Policy Polling. Disponível em: <http://www.publicpolicypolling.com/pdf/surveys/2009_Archives/ConfidencePollToplines.pdf> Acesso em: 26 fev. 2010 6 FALCÃO, Joaquim. O Judiciário segundo os brasileiros. Cadernos Colaborativos - FGV Direito Rio. Rio de Janeiro, abr. 2009. Disponível em: <http://academico.direitorio.fgv.br/ccmw/images/c/cf/O_Judici%C3%A1rio_segundo_os_brasileiros.doc> Acesso em: 16 mai. 2010 7 MAXPRESS NET. Disponível em: <http://www.maxpressnet.com.br/noticia.asp?TIPO=PA&SQINF=437225>. Acesso em: 19 jun. 2010.


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grupo mundial do setor, que mediu o nível de confiança da população em profissões e organizações no Brasil, em alguns países da Europa, nos EUA, na Colômbia e na Índia, confirmou a confiança dos brasileiros no jornalista. Os profissionais da imprensa ficaram na sexta posição, com 76% das menções do entrevistados. Na avaliação mundial, os jornalistas ficaram na 11ª, com 41%. Em se tratando do estado do Rio Grande do Sul, há outra informação que torna a imprensa ainda mais relevante. Ao mesmo tempo em que jornais de todo o mundo enfrentam queda de circulação – só no Brasil, a soma da circulação dos 20 maiores jornais brasileiros caiu 6,9% em 2009, segundo o Instituto Verificador de Circulação (IVC) – o jornal Zero Hora investiu, no mesmo ano, cerca de R$ 70 milhões em um novo parque gráfico de 13 mil metros quadrados e teve boas notícias: crescimento de 2% em sua tiragem, entre 2008 e 2009, segundo o mesmo Instituto. O jornal Correio do Povo manteve seus números estáveis. Os veículos impressos gaúchos Zero Hora, Correio do Povo e Diário Gaúcho ocupavam em fevereiro de 20010 a sétima, oitava e nona posição no ranking brasileiro de tiragem do IVC, com 183 mil, 155 mil e 147 mil exemplares diários, respectivamente. O crescimento no acesso à página de Zero Hora na internet foi ainda mais significativo na comparação entre os dois períodos: 55,16%. E o mais contundente: o portal de notícias do grupo gaúcho RBS, o ClicRBS8 é o mais visitado dos sites de mesmo gênero auditados pelo IVC no Brasil, ficando à frente de páginas como Lancenet9, Estadão10 e O Globo11. A partir do dimensionamento da imprensa no cenário brasileiro, a discussão sobre o reconhecimento da área de Relacionamento com a Imprensa como dimensão competitiva torna-se ainda mais necessária. A afirmação de Lorino e Tarondeau (apud DIEHL, 2004, p. 44) concorda com isso, já que, para ele, processos estratégicos de organizações são aqueles que modificam as condições de inserção da firma sobre seu ambiente e que lhe fornecem vantagens concorrenciais duráveis. Segundo Grunig, Ferrari e França (2009, p. 74), além de proporcionar ganho de caixa e evitar despesas desnecessárias com crises, “as Relações Públicas contribuem para a gestão estratégica ao construir relacionamentos com públicos que influenciam ou, ao contrário, que por ele são influenciadas; desta feita, os públicos podem apoiá-las ou desviá-las da missão da organização.” A partir deste cenário, a área de Relacionamento com a Imprensa vem tentando consolidar a sua atuação na esfera administrativa das empresas. Quer ser reconhecida menos 8

http://www.clicrbs.com.br http://www.lancenet.com.br 10 http://www.estadao.com.br 11 http://oglobo.globo.com 9


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como um conjunto de tarefas para disseminação de mensagens positivas sobre a organização para a imprensa – muitas vezes reativamente, em situações de crise – e mais como um departamento com importância estratégica. Os jornalistas a serviço da organização – os assim chamados Assessores de Imprensa – entendem que precisam ser corresponsáveis pelo cumprimento da missão e dos objetivos empresariais. Querem ser valorizados por levar à esfera do processo decisório o equilibrio entre as necessidades da administração e os anseios de inúmeros stakeholders, representados pelo meio jornalístico. Portanto, a partir de estudo de caso realizado, torna-se relevante buscar, por meio deste trabalho, respostas ao seguinte questionamento: levando em conta a importância do Relacionamento com a Imprensa para os objetivos estratégicos das organizações, como age o hospital Santa Casa de Misericórdia no envolvimento desta área com seu planejamento estratégica?

1.3 Objetivos

1.3.1 Objetivo geral Avaliar o Relacionamento com a Imprensa da Santa Casa de Misericórdia, no escopo da sua administração estratégica.

1.3.2 Objetivos específicos •

Avaliar a atenção que é dada à mídia pelos profissionais envolvidos com o

planejamento estratégico da organização; •

Avaliar a importância da reputação de marca para profissionais envolvidos com

o planejamento estratégico da organização; •

Avaliar o conhecimento que profissionais envolvidos com o planejamento

estratégico da organização têm sobre a área de Relacionamento com a Imprensa e que importância dão à ela; •

Avaliar a relação da área de Relacionamento com a Imprensa com a

administração estratégica da organização; •

Analisar as contribuições da área de Relacionamento com a Imprensa para a

administração estratégica da organização;


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Propor melhorias que contribuam para a área de Relacionamento com a

Imprensa e para a administração estratégica.

1.4 Justificativa Com o amadurecimento do processo de democratização do Brasil, a inclusão digital e o crescente envolvimento dos públicos nos processos de comunicação de massa, sejam eles em veículos de comunicação tradicionais ou na internet, os stakeholders, presentes no ambiente externo das organizações, passaram a ocupar lugar ainda mais privilegiado na mesa onde as organizações tomam as suas principais decisões. Para Grunig (2009), as empresas raramente podem escolher sozinhas suas missões e visões, tão importantes para o atingimento de seus objetivos estratégicos. Para o autor, “os público também têm interesses nas organizações e podem, assim, empenhar-se para influenciar as missões e os objetivos dessas organizações” (GRUNIG, 2009, p. 27). Percebe-se que, a exemplo dos mercados (consumidores, concorrentes, fornecedores e credores) – que constituem o ambiente econômico das empresas –, os públicos de uma organização (governo, comunidade, acionistas, trabalhadores, mídia e grupos ativistas) – dos quais o ambiente institucional é composto – precisam participar da estratégia organizacional e do processo decisório do âmbito administrativo (GRUNIG, 2009). Nesse contexto, segundo o autor, as Relações Públicas – da qual pertence à área de Relacionamento com a Imprensa – “propiciam às organizações uma forma de dar voz e poder para os públicos no preocesso decisório das organizações” (GRUNIG, 2009, p. 26). Além disso, ainda conforme o autor, esse departamento da empresa a auxilia indicando comportamentos, ações, serviços ou produtos que sejam aceitos e almejados pelos seus stakeholders. Para esse autor, entretanto, os mercados precisam se movimentar a fim de que as Relações Públicas superem o que denomina como paradigma simbólico-interpretativo12 e alcancem o paradigma da gestão estratégica comportamental. Este último modelo “enfatiza várias modalidades de comunicação de mão dupla para conferir aos públicos uma voz no processo decisório e para facilitar o diálogo entre a administração e os públicos, tanto antes como depois da tomada de uma decisão” (GRUNIG, 2009, p. 24 e 25).

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Para Grunig (2009), este é um comportamento que permite que as organizações atuem reativamente com relação aos seus públicos de interesse, especialmente em crises.


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Assim sendo, o presente trabalho busca gerar conhecimento para as áreas de Relacionamento com a Imprensa e Planejamento Estratégica, a fim de que o trabalho em conjunto entre ambas traga vantagens na busca pelos objetivos estratégicos. O estudo também pretende trazer contribuições ao mercado de Relacionamento com a Imprensa, auxiliando no preparo de jornalistas para que sejam capazes de atuar não só na difusão de informações positivas sobre a organização, mas na constituição de um jornalismo que colabore com o desenvolvimento sustentável das empresas e da sociedade.


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2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Com o objetivo de dar consistência ao estudo de caso que será realizado, este capítulo pretende apresentar os conceitos-chave das áreas de Administração Estratégica e Relacionamento com a Imprensa, e construir um diálogo entre ambas, afim de que o segundo departamento possa contribuir com o atingimento dos objetivos estratégicos da organização. Em um primeiro momento, serão apresentados os conceitos-chave da administração estratégica, dando ênfase especialmente ao papel dos stakeholders na formação do ambiente externo da organização. A caracterização da imprensa será o tópico a ser tratado a seguir. Com ele, a valorização do jornalismo no Brasil e a sua influência no ambiente econômico – e, em consequência, no das empresas –, a partir das notícias que publica. Em seguida, as áreas de Relações Públicas e Relacionamento com a Imprensa serão definidas para que se possa iniciar a compreensão da relevância da comunicação com os públicos para o contexto em que competem as empresas atualmente. O cruzamento de conceitos de Administração Estratégica e Relacionamento com a Imprensa será abordado na sequência do estudo. O texto buscará fundamentar as razões pelas quais a organização deve investir na gestão do relacionamento com a mídia no sentido de criar uma relação sustentável e vantajosa com seus stakeholders e obter vantagens competitivas na busca pelo atingimentos de seus objetivos estratégicos.

2.1 A administração estratégica e a satisfação dos stakeholders A premissa básica da administração estratégica passa por determinar missão e objetivos gerais de uma organização, compatibilizando as oportunidades e ameaças do ambiente externo aos pontos fortes e fracos identificados em seu ambiente interno. Olhando especialmente para este ambiente externo e admitindo que as organizações não têm controle sobre as forças macroambientais que afetam sua performance, Wright, Kroll e Parnell (2007) sugerem que a administração estratégica precisa criar condições de desempenho positivo da empresa diante de restrições ambientais e ameaças, além de tirar proveito competitivo das oportunidades apresentadas pelo mercado. Para os autores, administrar estrategicamente uma organização é mais do que só tornar


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compatível seu âmbito de atuação com suas capacidades internas. Tornar isso possível é “levar em conta os desejos competitivos de vários stakeholders (ou públicos interessados) da organização, porque seu apoio é essencial para uma implantação de estratégias bemsucedidas” (2007, p. 24). Segundo eles, “há evidências empíricas de que ser voltado para os stakeholders contribui para competitividade e para um crescimento no valor do preços das ações” (2007, p. 40). Os objetivos organizacionais que por fim acabam sendo determinados devem equilibrar as pressões dos diferentes stakeholders, de modo a garantir a continuidade da participação de cada um deles. (...) A racionalidade sugere que os stakeholders devem estabelecer objetivos gerais da perspectiva de seus próprios interesses. Em virtude da diversidade desses interesses, a alta administração enfrenta a difícil tarefa de tentar conciliar e satisfazer cada stakeholder, ao mesmo rempo perseguindo seu próprio conjunto de objetivos gerais. Como os interesses de vários stakeholders são muito diversos, um exame detalhado de alguns desses interesses pode ser esclarecedor. (WRIGHT, KROLL E PARNELL, 2007, p. 98 e 99)

Os autores lembram que inúmeras literaturas orientam que a organização que visa retorno financeiro aos acionistas deva estar orientada aos desejos do cliente. Entretanto, consideram que: uma perspectiva mais ampla reconhece que, como as empresas são complexas e dependem dos recursos ambientais, elas não podem maximizar os interesses de um único stakeholder. Em vez disso, a empresa deve ser orientada para os stakeholders de uma forma ampla, tentando equilibrar os desejos de todos eles (2007, p. 101).

Mais do que deixar de orientar os negócios apenas com a perspectiva do cliente, Harrison (2005) afirma que as organizações não podem limitar-se a ver a administração estratégica como uma filosofia de guerra contra a concorrência, onde “a empresa é uma batalha, os concorrentes são o inimigo e o governo cria e põe em vigor as regras” (2005, p. 26). Para ele, “o surgimento de uma economia global altamente competitiva significa que as empresas tinham de expandir suas redes de relacionamento e cooperar entre si para se manter competitivas” (2005, p. 26). Nesse contexto, Harrison reforça na Figura 1 a teoria de Wright, Kroll e Parnell (2007) chamando os stakeholders de Públicos Interessados (PIs) e dizendo que empresas bem-sucedidas são aquelas que “aprenderam como desenvolver e gerenciar relações com um leque amplo de organizações, grupos e pessoas que têm interesse em suas companhias” (2005, p. 26).


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Figura 1 - Um mapa típico de PIs

Fonte: Harrison, 2005, p. 31

A necessidade de participação ativa dos públicos interessados na missão da organização, questão levantada por Wright, Kroll e Parnell (2007), fica ainda mais evidente quando se olha para exemplos reais. Já está estabelecido como expectativa da sociedade com relação a uma organização, por exemplo, a geração de emprego e oferta de bens e serviços. Os autores avançam ao afirmar que: a sociedade espera que as empresas ajudem a preservar o ambiente, vendam produtos seguros, tratem seus funcionários com igualdade, sejam verdadeiros com seus clientes e, em alguns casos, cheguem até mais longe, oferecendo treinamento aos desempregados, contribuindo para a educação e as artes e ajudando a revitalizar áreas urbanas onde há concentrações de favelas. (...) De fato, os altos administradores podem encontrar várias áreas em que seus interesses, os de vários stakeholders e os da sociedade são mutuamente compatíveis. Por exemplo, uma empresa que polui a atmosfera porque não consegue comprar equipamentos antipoluição caros está prejudicando não só a sociedade mas também, em última instância, seus próprios stakeholders. (WRIGHT, KROLL E PARNELL, 2007, p. 117)


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Para Harrison (2005), a relação da empresa com seus públicos interessados está diretamente ligada aos resultados financeiros. Para ele, “a falta de consistência entre as organizações e seus principais PIs pode resultar em perdas financeiras devido a processos, perda de contratos e perda de receitas” (2005, p. 33). A partir dessas referências, uma empresa que vise o lucro e que seja socialmente responsável, termo muito comum nos dias atuais, é uma organização estrategicamente eficaz, já que “consegue operar lucrativamente e, ao mesmo tempo, beneficiar a sociedade” (WRIGHT, KROLL E PARNELL, 2007, p. 117). Ainda no que diz respeito à criação ao relacionamento com os públicos interessados, Harrison (2005) é ainda mais contundente ao afirmar que as empresas não podem mais se limitar a negociar e contratar, ações que sempre foram importantes para os negócios. “A tendência empresarial é em direção a mais alianças estratégicas, joint-ventures e negociações de subcontratação com Públicos Interessados” (2005, p. 30). O modelo de PI, desenvolvido pelo autor, cujo detalhamento está na Tabela 1, indica algumas vantagens à organização: 1)

Ele dá noção ao líder do quanto é importante considerar a satisfação das

necessidades de mais públicos interessados do que ele está acostumado a interagir. 2)

Ao envolver um grupo mais amplo de PIs, a organização não fica dependente

do contentamento de apenas um público. 3)

O modelo amplifica as possibilidades estratégicas da organização, uma vez

que, construída a relação com diversos PIs, a empresa tem mais alternativas de atuação.


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Tabela 1 - Três perspectivas da administração estratégica Perspectiva tradicional Origem

Economia, outras disciplinas de administração e empresas de consultoria

Visão da empresa

Uma entidade econômica

Análise da situação dos Método de formulação da ambientes interno e externo levando à estratégia formulação da missão e das estratégias

Fonte de vantagem competitiva

Melhor adaptação da organização a seu ambiente tirando vantagem de seus pontos fortes e oportunidades e superando pontos fracos e ameaças

Visão baseada em Visão do PI recursos Economia, competências Ética empresarial e responsabilidade social diferenciadas e capacidade gerencial geral Um conjunto de recursos, habilidades e aptidões

Uma rede de relações entre a empresa e seus PIs

Análise dos recursos, habilidades e aptidões organizacionais; aquisição de recursos, habilidades e aptidões superiores

Análise de poder econômico, influência política, direitos e exigências dos vários PIs

Posse de recursos, habilidades e aptidões que sejam valiosos, raros e difíceis de serem imitados pelos concorrentes

Ligação superior com os PIs, gerando confiança e boa vontade, reduzindo a incerteza, melhorando os acordos comerciais e, por fim, melhorando o desempenho da empresa

Fonte: Harrison, 2005, p. 27

Nesse contexto, o autor indica a participação da mídia como público com interesse social e influência no comportamento político da organização (ver Figura 2). Harrison (2005) enfatiza que mesmo que estes agentes não estejam ligados diretamente à organização, “são interessados em assegurar que ela se comporte de uma maneira que eles considerem socialmente responsável. Esses ‘cães de guarda’ de nossa ordem social moderna, como o Greenpeace.” A mídia, como tema deste estudo, tem participação especial entre grupos de ativistas e líderes governamentais – posicionados pelo autor no mesmo quadrante de interesse – já que, de acordo com Marcondes Filho (1986) eleva a uma alta potência a capacidade de disseminação de informações e, como lembra Traquina (2008), as esferas sociais, políticas e acadêmicas considerar a imprensa como o “primeiro poder” entre os múltiplos agentes nas sociedades atuais. No campo da adminsitração estratégica, Harrison (2005) corrobora com este nível de importância, posicionando a mídia como vigia das empresas e como voz capaz de dialogar com toda a sociedade: Não apenas uma organização deve avaliar os potenciais efeitos das forças sociais em seus negócios como ela também deve administrar suas relações


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com a sociedade como um todo e sua reputação junto a essa sociedade. A mídia age como um “cão-de-guarda” para a sociedade. É uma força de comando para controle das atitudes do público em geral em relação às organizações. (HARRISON, 2005, p. 223)

Figura 2 - Papéis típicos dos diversos stakeholders

Fonte: Harrison, 2005, p. 67

2.2 O poder do jornalismo Considerada importante parte interessada, presente no ambiente externo da organização, a imprensa reúne em torno de si uma série de tentativas de definições, grande parte delas ligadas ao poder que possui como disseminadora de informações, e a pretensão que alimenta de tornar verdadeira a realidade sobre a qual discursa. Traquina (2008) atribui a um comentarista britânico a primeira definição de “quarto poder”, consagrada atualmente: “um poder do reino, mais poderoso que qualquer um dos outros poderes”. Segundo o autor,


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no início do século XXI, diversas vozes do mundo social, político e acadêmico não hesitam em considerar o jornalismo como o “primeiro poder” entre os múltiplos poderes nas sociedades contemporâneas. Ainda para Traquina (2008), esse grau de importância reconhecido no século XXI já era conferido ao jornalismo décadas antes, com a publicação de um livro intitulado “Opinião pública”, do jornalista norte-americano Walter Lippmann. Lippman (apud TRAQUINA, 2008) já sinalizou o papel fundamental deste ofício na sociedade moderna. No primeiro capítulo, intitulado “O mundo lá fora e as imagens nas nossas mentes”, Lippmann (1922) defendia que os media são a principal ligação entre os acontecimentos no mundo e as imagens que as pessoas têm na cabeça acerca desses acontecimentos, antecipando-se ao surgimento da teoria do agendamento, que postulava um poder dos media mais limitado. (TRAQUINA, 2008, p. 15)

Conforme a Teoria do Agendamento, a mídia não tem influência apenas no que as pessoas conversam no dia-a-dia, mas também em como elas conversam. Para Pena (2005), “um veículo como a televisão, por exemplo, certamente muda nossas formas de aprendizado, pois passamos a nos acostumar com a velocidade das edições e a telegrafia da linguagem. Reflexões profundas e demoradas tornam-se mais difíceis para as gerações que crescem em frente aos aparelhos de TV. O tempo de cognição é outro” (PENA, 2005, p. 144).

Mas não é apenas sobre o processo de aquisição do conhecimento que esta teoria tem efeito: O conceito de agendamento foi introduzido num artigo dos acadêmicos Maxwell McCombs e Donald Shaw, publicado em 1972 na revista acadêmica “Public Opinion Quarterly”. (...) depois de mais de vinte anos de investigação sobre a teoria do agendamento, numa análise retrospectiva da evolução da investigação, McCombs e Shaw sustentaram que a teoria do agendamento é muito mais que a asserção de que as notícias influenciam aquilo que as pessoas pensam. Escrevem McCombs e Shaw (1993:65): “A clássica exposição da marcação de agenda por Bernard Cohen (1963) (...) foi virada de pernas para o ar. Investigações recentes explorando as consequências da marcação de agenda e do enquadramento dos media sugerem que os media não só nos dizem no que pensar, mas também como pensar nisso e, consequentemente, o que pensar. (TRAQUINA, 2008, p. 15)

Ainda sobre o agendamento da mídia, Pena (2005) afirma que: a influência na mídia nas conversas dos cidadãos advém da dinâmica organizacional das empresas de comunicação. Nas palavras de Shaw, citado


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por Wolf, ‘as pessoas têm a tendência para incluir e excluir de seus próprios conhecimentos aquilo que os mass media incluem ou excluem do seu próprio conteúdo’. É disso que trata o agendamento. (PENA, 2005, p. 144).

Do ponto de vista do cotidiano das organizações, o papel da imprensa está em ampliar os

discursos

institucionais

em reportagens

jornalísticas,

impactando

positiva

ou

negativamente as imagens das instituições. Para Marcondes Filho (1986), veicular uma informação é: (...) encontrar uma forma de elevar a uma alta potência o interesse que têm indivíduos e grupos em afirmar publicamente suas opiniões e informações. É uma maneira de se dar eco à posições pessoais, de classe ou de nações através de um complexo industrial-tecnológico, que além de preservar uma suposta impessoalidade, afirma-se, pelo seu poder e soberania, como “a verdade. (MARCONDES FILHO, 1986, p. 11)

A “suposta impessoalidade” do jornalista, citada pelo autor, é justificada por ele quando aborda a rotina de produção da notícia e o decisivo papel dos profissionais na definição da informação que será propagada. Para Marcondes Filho (1986) “este processo é realizado segundo diversos critérios, que tornam o jornal um veículo de reprodução parcial da realidade. Definir a notícia, escolher a angulação, a manchete, a posição na página ou simplesmente não dá-la é um ato de decisão consciente dos próprios jornalistas” (1986, p. 12). Talese (2000), entretanto, aborda o distanciamento do jornalista dos fatos que noticia à sociedade. Conforme ele, (...) às vezes, (os jornalistas) se tornam meros voyeurs que vêem muito e sentem pouco. Encaram a morte e a tragédia de modo tão trivial quanto uma greve no porto e não têm dúvidas quanto ao seu direito de divulgar as fraquezas dos outros, sem nunca ter de se expor eles mesmos. Evidentemente, se os jornalistas se identificarem com uma causa ou uma grande figura, podem se tornar apologistas ou propagandistas, lacaios dos famosos. (TALESE, 2000, 83)

Dentro desse contexto, a notícia também é vista como um elemento que não é isolado, e o seu tratamento, defende Marcondes Filho (1986), dá à ela “apelos estéticos, emocionais e sensacionais”. “Notícia é a informação (que) sofre um tratamento que a adapta às normas mercadológicas de generalização, padronização, simplificação e negação do subjetivismo”, define o autor, que também caracteriza o jornal: Os jornais são como pontas de icebergs, que no nível externo representam a democracia formal, na qual todos seriam iguais, e, no fundo, escondem o


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poder político ou econômico que os sustenta, que é incomparavelmente diferenciado de um jornal para outro em relação ao seu tamanho e importância. (MARCONDES FILHO, 1986, p. 13)

Na tentativa de representar o mundo por meio das páginas impressas, dos sinais de rádio e televisão e nas páginas da internet, a imprensa também tem o papel de contar más notícias. E segundo Dias (2004), fatos negativos ligados às organizações ganharam o status de fenômeno no último século. Para ele, são agentes dessa mudança “a conformação atual da mídia, a enorme abrangência dos interesses econômicos e a ampla liberdade do debate político” (2004, p. 23). “Escândalos sempre existiram, por certo. Mas a conotação e a amplitude atual são uma marca de nosso tempo”, completa. O autor explica que as conhecidas “crises de imagem” – ou “crises de reputação” –, são diferentes das crises convencionais das empresas, geralmente de cunho econômico-financeiro. Essas crises são potencialmente mais devastadoras porque podem destruir o maior patrimônio de um profissional ou instituição: sua credibilidade. Costumo dizer que pessoas e empresas não vendem serviços ou produtos. O que se vende todos os dias, no mundo inteiro, é confiança. E quando a confiança que os outros depositam em nós deixa de existir, há uma sentença de morte profissional ou empresarial. (ROSA, 2004, p. 24)

Embora Rosa (2004) admita que a imprensa é um espelho seletivo da sociedade, no qual reflete apenas os temas “mais importantes e surpeendentes” e que “em em qualquer lugar do mundo, embute em seu âmago um certo grau de distorção, pois não reflete a variedade como um todo, senão seus aspectos capitais” (2004, p. 494), Marcondes Filho (1986) faz um alerta. Para ele, é preciso considerar o poder do jornalismo na medida em que “a ideologia constrói-se todos os dias, e nessa permanente reconstrução, o papel do jornal é o de um dos seus melhores artífices” (1986, p. 22).

2.3 Relações Públicas e Relacionamento com a Imprensa Com espaço fortalecido nas empresas brasileiras a partir da década de 80, a área de Relações Públicas visa estabelecer vínculos de convivência entre a organização e seus públicos de interesse, chamados de stakeholders. Neste estudo, esta área da comunicação empresarial será abordada também sob um aspecto mais específico de sua atuação, que é o


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relacionamento com a imprensa. Ao longo da pesquisa, uma série de conceitos de comunicação

empresarial

serão

discutidos,

ora

citando

Relações

Públicas,

ora

Relacionamento com a Imprensa. Para esta pesquisa, ambos têm, entretanto, a mesma função estratégica de garantir, por meio do diálogo que estabelece com o ambiente externo à organização, a sustentabilidade e o cumprimento das estratégias corporativas. Para Grunig (2009), há tendências importantes para a prática de Relações Públicas hoje no mundo. Segundo ele, entre elas está o fato de que a profissão está cada vez mais se baseando em conhecimentos científicos; está assumindo postos gerenciais nas organizações; e seus profissionais pensam mais estrategicamente e não mais apenas em divulgar informação para os veículos de massa. Outra grande mudança, conforme o autor, é que os especialistas desta área estão sendo reconhecidos mais por sua teoria do que nas coisas que sabem fazer tecnicamente, como preparar press-releases, organizar eventos ou redigir relatórios. Enfim, e mais importante, cada vez mais, as organizações estão valorizando seus profissionais de comunicação como pessoas capazes de impactar positivamente no planejamento estratégico, influenciando na tomada de decisão e no convívio harmonioso entre o ambiente interno e a sociedade. Desde quando nasceu nos Estados Unidos, no início do século XX, até sua consolidação no Brasil, na década de 1980 e início dos anos 1990, a Assessoria de Imprensa – ou Relacionamento com a Imprensa – tem visto muitos acontecimentos modificarem a sociedade e a economia brasileira, atribuindo à atividade cada vez mais importância no meio empresarial. Para Dias (1994), o relacionamento com a imprensa, é um dos canais de comunicação mais eficientes nesse trabalho de inserção da imagem positiva da organização nos diálogos da sociedade. A autora afirma que a aproximação dos jornalistas é vital porque este é o meio capaz de falar com diversos públicos simultaneamente, formar opinião, além de dar às mensagens o atributo mais importante: a credibilidade. Mafei (2005) considera que a a valorização do cliente é outro fato da história recente do país preponderante para o fortalecimento desta área nas empresas. Segundo ela, com a publicação do Código de Defesa do Consumidor, em 1989, o cliente descontente “deixou de lado a atitude de reclamar e passou a procurar mais a imprensa, os órgãos de defesa e o Poder Judiciário para manifestar indignação e solicitar providências” (2005, p. 39). Além de ter que dar satisfações convincentes à sociedade, considera Mafei (2005), as organizações tiveram que aumentar sua visibilidade positiva por intermédio de ações de responsabilidade social. Os investimentos nas áreas de comunicação aumentaram a partir de então porque são estes os departamentos capazes de dar voz às boas iniciativas das empresas junto à opinião pública.


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O profissional da área de Relacionamento com a Imprensa das organizações é outro tema que merece reflexão. Pode-se dizer que enquanto as organizações procuram visibilidade positiva às suas marcas, a mídia, para cumprir com sua missão, precisa de subsídios destas mesmas organizações. Segundo informações apresentadas em encontro da Abracom13 em abril de 2010, em Porto Alegre, 70% das informações presentes em alguns veículos de imprensa são provenientes de Assessorias de Imprensa de algum setor da sociedade. A responsabilidade dos jornalistas na produção de notícias, portanto, é dividida, segundo os dados acima apresentados e conforme Duarte e Júnior (2003), com as fontes de informação, que são observadas, investigadas e entrevistadas pelos jornalistas, visando à obtenção de matéria-prima para a notícia. Essas fontes, em geral, representam organizações ou membros de setores importantes da sociedade ou do país. O ambiente corporativo possui também, desse modo, um jornalista em seu quadro de funcionários. Um profissional responsável pela obtenção de notícias empresariais que destaquem, em um veículo sedento por informação, sua organização de forma positiva. Outro importante aspecto a ser abordado neste contexto é a diferença existente, no campo editorial, entre matéria jornalística e espaço publicitário ou, no campo da administração, entre comunicação e marketing. Conforme Dias (1994), a matéria jornalística é aquela que menciona a empresa devido ao interesse público e a diversas qualidades da informação gerada na organização, o que é fortemente influenciado pelo bom relacionamento que a empresa tem com a imprensa. Não há qualquer controle ou influência da empresa nesse processo. A autora ressalta que o espaço editorial é o local de maior credibilidade dos orgãos de comunicação, já que o leitor considera os assuntos nele contidos como isentos de qualquer comprometimento com outros interesses. Pesquisa14 relizada no Brasil, na Europa e outros países, já citada por este estudo, constatou que 76% dos entrevistados confiam na imprensa. Por outro lado, conforme Dias (1994), a publicidade é paga pela empresa e esta pode controlar o seu conteúdo e a sua publicação. Segundo a autora, este produto tem objetivos diferentes que os do conteúdo editorial. O anúncio publicitário promove um produto ou serviço, buscando seduzir seus clientes por meio de argumentos e formas criativas. De acordo com o mesmo levantamento conduzido pela empresa GfK, o índice de confiança nos diretores de grandes empresas está em queda mundialmente desde 2008, quando estava em 36%. Em 2009 caiu para 33% e, em 2010, está em 31%. E é neste aspecto que o marketing também se diferencia da comunicação no ambiente 13 14

Associação Brasileira das Agências de Comunicação MAXPRESS NET, op. cit.


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das organizações. Para Grunig (2009), enquanto os profissionais de comunicação – Relações Públicas, Relacionamento com a Imprensa – “elaboram programas de comunicação para se comunicar com os públicos, os profissionais de Marketing elaboram programas de comunicação para se comunicar com os mercados” (2009, p. 29). Grunig (2009) segue na mesma linha de Dias (1994) e avança ao considerar um ponto de vista que afeta as ameaças do ambiente externo das organizações. Os mercados são constituídos por pessoas que adquirem produtos ou que utilizam os serviços de uma organização. (...) Os públicos, no entanto, são diferentes, pois se formam e controlam uma organização quando não estão satisfeitos com ela. No nível gerencial, as relações públicas são bem diferentes do marketing. O marketing tenta comunicar-se com mercados relativamente passivos e aliados. As relações públicas devem se comunicar com os públicos ativos e frequentemente hostis. (GRUNIG, 2009, p. 29).

2.4 Relacionamento com a Imprensa e sua relevância para a administração estratégica Tendo revisado os conceitos de administração estratégica e definido a imprensa como um importante stakeholder – e, ao mesmo tempo, o agente que fala com muitos outros públicos interessados – e a comunicação como a área responsável pela gestão do relacionamento com este público, torna-se fundamental voltar a discussão para o âmbito dos benefícios que as organizações podem obter a partir do trabalho estratégico do departamento de comunicação. O papel do profissional de comunicação é exatamente o de orientar a organização a se “comportar da forma como o público externo espera dela” (Grunig, 2009, p. 19). Grunig vai ao encontro dos conceitos sobre stakeholders de Wright, Kroll e Parnell (2007) quando afirma que “(...) as organizações que atualmente empregam profissionais ou agências de relações públicas (...) reconhecem que as relações públicas criam valor para uma organização porque contribuem para o equilibrio entre os interesses da própria organização e os interesses das pessoas que são influenciadas por ela ou por aqueles que têm o poder de influir (...).” Entretanto, advertem Grunig (2009) e Ferrari (2009), o profissional de Relações Públicas não pode estar limitado à função de simples trasmissor de mensagens positivas da companhia para outros públicos. Grunig (2009) sustenta que o profissional dessa área precisa empenhar-se em “construir alianças com os públicos estratégicos no seu meio ambiente e darlhes voz no processo decisório que os influencia” (2009, p. 34). Definindo um cenário ideal


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de atuação do Relações Públicas, Ferrari (2009) afirma que ela é “uma atividade essencial para o bom desempenho organizacional, e nela o profissional atua como o estrategista da comunicação e participa de todas as tomadas de decisão que podem vir a causar algum tipo de impacto” (2009, p. 164). Kunsch (2003) concorda com os demais autores ao lembrar que “numa perspectiva moderna, as relações públicas precisam demonstrar sua contribuição também como um valor econômico para as organizações” (2003, p. 103). A pesquisadora concorda que tais funções de comunicação precisam entregar resultados e contribuir para que as organizações cumpram com o estabelecido em seus objetivos, missão, visão e valores corporativos. No sentido de elucidar a importância estratégica das Relações Públicas para a organização, Grunig (2009) cria dois conceitos para definir a questão. Para o autor, o chamado paradigma simbólico-interpretativo é considerado o inadequado para as organizações porque ele simplesmente atua na tentativa de influenciar os públicos com os quais a empresa se relaciona e “permite que a organização se comporte da forma como desejar” (2009, p. 24). Já o profissional de comunicação que atua próximo à alta direção, participando da tomada de decisão, têm a possibilidade de incluir os interesses dos stakeholders no gerencimento do comportamento da organização. Nesse caso, conforme o pesquisador, “as relações públicas são vistas como uma atividade de vinculação com os stakeholders, e não como um conjunto de atividades para a transmissão de mensagens, elaboradas para proteger a organização dos seus públicos” (2009, p. 24). Grunig (2009) considera ideal esta forma porque o processo de comunicação passa a ser exercido em mão dupla, conferindo voz aos públicos de interesse e facilitando “o diálogo entre a administração e os públicos, tanto antes como depois da tomada de uma decisão” (2009, p. 24 e 25) Para Grunig (2009), há quatro modelos distintos que servem para “entender a natureza e o propósito” das relações públicas dentro das organizações. Para o autor, “eles também ajudam a explicar como os profissionais devem pensar as relações públicas antes de exercêlas num papel gerencial estratégico” (2009, p. 31). O autor os denomina como agência de imprensa/divulgação, informação pública, assimétrico de duas mãos e simétrico de duas mãos. Segundo o pesquisador, apenas os dois últimos são capazes de “expandir as relações públicas de uma função técnica ou de marketing para uma função gerencial estratégica desenvolvida” (2009, p. 31). O primeiro modelo, chamado de agência de imprensa/divulgação, apenas busca obter inserção positiva na mídia para uma organização ou indivíduos. O segundo, informação pública, visa os mesmos objetivos do modelo anterior, sendo que em uma estrutura mais


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organizada, como uma assessoria de imprensa. Ambos os modelos, para Grunig (2009), não realizam “pesquisa e reflexão estratégica” já que atuam em movimentos de mão única e apenas buscam modificar o comportamento dos públicos com os quais se comunicam. Embora o terceiro modelo, denominado assimétrico de duas mãos, fique mais próximo do ideal no exercício da atividade de relações públicas, ele possui suas fragilidades. Ao mesmo tempo em que planeja as mensagens que deverão ser emitidas pela organização, o que é positivo, este modelo ainda não serve para contextos empresariais com alto grau de conflito porque não pressupõe mudanças na organização, mas apenas nos públicos com o qual se relaciona. O quarto modelo de relações públicas, o simétrico de duas mãos, é considerado o mais adequado para Grunig (2009). Para o autor, ele é o único que valoriza o diálogo entre organização e seus públicos interessados. É recomendado para ambientes com alto grau de complexidade nas relações com stakeholders. O que todos esses stakeholders desejam é que a organização inclua os problemas que considera relevantes em sua missão. Desejam participar das decisões que os afetam. Desejam uma comunicação equilibrada e ‘simétrica’ com a organização, e o diálogo em vez do monólogo. Por fim, esperam que a organização possa ser convencida tanto quanto eles são convencidos por ela. (GRUNIG, 2009, p. 32)

Conforme o pesquisador, o modelo simétrico de duas mãos “é baseado na pesquisa e utiliza a comunicação para administrar conflitos e aperfeiçoar o entendimento com públicos estratégicos” (2009, p. 32). Para concluir, Grunig (2009) sentencia a importância do trabalho da comunicação com os stakeholders para a perenidade da organização em seu ambiente: Os profissionais de comunicação deveriam ser capazes de defender a simetria em relações públicas pela mesma razão que um médico recomenda que uma pessoa com sobrepeso faça exercícios, ou seja, porque é bom para a organização exatamente como os exercícios são bons para a saúde. (GRUNIG, 2009, p. 55)

Numa relação direta com os conceitos de administração estratégica, as convicções de Grunig (2009) concordam com Wright, Kroll e Parnell (2007), para quem o planejamento estratégico de uma organização necessita gerir com igual eficiência as fases de formulação, implementação e de controle estratégico. Nestas três fases, o trabalho da área de comunicação torna-se relevante, a partir do subsídio de informações que ajudarão a nortear as decisões que serão tomadas em cada período.


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O que se pode concluir dessa interconexão de conceitos da área administrativa e da comunicação é que, vivendo em uma sociedade globalizada, com grandes volumes de informações diárias e aumento do nível de complexidade concorrencial, as empresas não podem mais garantir que suas estratégias sejam alcançadas sem o apoio incondicional dos principais públicos interessados nelas. A imprensa, além de ser um deles, como vimos, representa muitos desses públicos no espaço social por meio de seu ofício. A seção seguinte abordará mais esta questão.

2.5 Jornalista e organização: um diálogo imprescindível Como forma de introduzir este tema, Mafei (2005) inicia dizendo que ser assessor da imprensa em prol de uma organização não significa atuar na defensiva, impedindo o jornalista de acessar os profissionais que detêm a informação ou só auxiliar os empresários em um momento de crise. Ao contrário. Ainda que não se evidencie o papel de quem está nos bastidores, dali também nascem grandes pautas, e de onde fluem informações que serão processadas pelas redações. Um bom trabalho de assessoria de imprensa é capaz de movimentar grandes causas. (MAFEI, 2005, p. 17)

Para exemplificar, a autora conta um caso impactante que mostra o resultado de um trabalho eficaz de Relacionamento com a Imprensa. Em 2001, a Organizações das Nações Unidas (ONU) reconheceu no Brasil o país que mais estimulou o voluntariado e cuja imprensa deus mais visibilidade ao tema. Uma boa ação da mídia? Duvido que os veículos de comunicação tivessem despertado interesse à questão de forma continuada, não fosse o trabalho de assessoria de imprensa realizado na ocasião pelo Instituto Brasil Voluntário. (...) Os assessores foram hábeis em planejar os assuntos divulgados a cada mês e em contar histórias de pessoas e comunidades que melhoraram de vida graças ao voluntariado. Cercaram o assunto por vários lados. E tiveram basicamente muito jogo de cintura para fazer com que a imprensa achasse notícia onde não estava procurando. (MAFEI, 2005, p. 17 e 18)

Por fim, Mafei (2005) reitera a importância da decisão da organização de comunicarse bem com a imprensa. Ir à mídia para expor posições e tornar público bons trabalhos é o que têm buscado as empresas, os governos, as entidades da sociedade civil e os


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cidadãos comuns. Isso é algo próprio da democracia avançada em todo o mundo. É também, ao mesmo tempo, um voto de confiança na mídia e uma busca de legitimidade. (MAFEI, 2005, p. 18)

Em estudo realizado por Rigatti (2007) sobre o trabalho de Relacionamento com a Imprensa do hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre – mesma organização pesquisada neste trabalho –, concluiu-se que “a qualificação do relacionamento entre a equipe de comunicação da instituição e os jornalistas foi decisiva, ao longo do primeiro semestre de 2007, para que a Santa Casa tivesse sua imagem exposta de forma positiva na mídia” (2007, p. 121). Ainda para o autor, os resultados tornaram-se ainda mais evidentes quando a organização viu-se envolvida em fatos negativos, como erros médicos, por exemplo. Nestes casos, o relacionamento construído pela área de Relacionamento com a Imprensa do hospital com os jornalistas garantiu que a organização fosse ouvida antes da publicação da matéria. “A relação profissional e qualificada com a mídia (...) garante à organização participar da construção da notícia que chegará à sociedade” (2007, p. 121), afirma ele. Que conclui: “O resultado dessa parceria traz duplo benefício: a Santa Casa ganha, reduzindo o impacto negativo sobre sua marca; e a sociedade é beneficiada ao receber uma informação mais precisa” (2007, p. 121). Ao final, vê-se benefício direto à missão da organização (“Desenvolver e proporcionar ações de saúde, para todos, com qualidade e responsabilidade social”) já que a minimização dos efeitos negativos do notíciário contribuem para a transmitir aos stakeholders do hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre aspectos ligados ao seu planejamento estratégico. A análise a seguir, representa o oposto: um caso em que a ausência de diáologo entre a organização e a imprensa – e outros stakeholders importantes – quase causou a derrocada de uma empresa de grande porte. A análise feita por Pinheiro, Machado e Silva (2005) sobre o fato envolvendo a empresa Adriano Coselli, de Ribeirão Preto (SP), acusada, em fevereiro de 2000, pelo Ministério Público de Cravinhos, por adulteração no prazo de validade de produtos, também traz luz à reflexão deste estudo. Segundo os autores, antes da crise na qual foi envolvida, a organização chegou a ser considerada a maior atacadista do país em seu segmento. Cinco anos após o ocorrido, as consequências ainda podiam ser sentidas e a imagem e a posição no mercado foram comprometidas. Os autores atribuem os efeitos do episódio à falha na comunicação estratégica da empresa, que agravou o desgaste perante a opinião pública. Embora os advogados de defesa da empresa tivessa elaborado uma longa lista de argumentos que visavam a sua absolvição, os


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autores ressaltam o fato de que a organização “sempre manteve uma postura muito fechada, não cultivava boas relações com a imprensa regional e não divulgava as ações comunitárias que realizada” (2005, p. 22). Ainda segundo Pinheiro, Machado e Silva (2005), a ausência de um trabalho prévio junto aos stakeholders foi decisiva para que grande parte dos veículos de comunicação do local publicassem à época a versão da promotoria como verdade absoluta, sem manifestar a opinião da Coselli. A má gestão da comunicação também foi decisiva para que a opinião pública ficasse contra a empresa no caso citado e para uma queda de 80% nas vendas duas semanas depois do episódio. Conforme Pinheiro, Machado e Silva (2005),

O caso da Coselli revela que o administrador não pode mais subestimar a importância estratégica da comunicação empresarial na organização para que esta possa fazer uma mediação das suas relações com a sociedade. Essa comunicação empresarial deve ser entendida como uma atividade estratégica indispensável ao desenvolvimento organizacional. A nova disposição empresarial reflete a percepção de as empresas modernas se adaptarem ao meio ambiente, como uma forma inteligente e mais econômica de atenuarem os riscos operacionais, ao mesmo tempo em que criam um clima, favorável à organização, que resulta em simpatia, consenso e até em aumento da produtividade. (PINHEIRO, MACHADO E SILVA, 2005, p. 25)


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3. MÉTODO DE PESQUISA

3.1 O estudo de caso Este método de pesquisa foi escolhido porque, a partir da aplicação dos instrumentos de observação e entrevistas ao objeto em questão, será possível, como sugere Duarte, M. (2006), “retratar a realidade de forma completa e profunda, destacando a multiplicidade de dimensões presentes em uma determinada situação, enfatizando a sua complexidade natural e revelando as possíveis inter-relações de seus componentes” (2006, p. 233). Diferentemente de outros métodos, o estudo de caso, ao investigar os detalhes do caso, o torna único, ressaltando suas imperfeições e características. Ainda para a autora, outro ganho deste método é o fato de “permitir ao investigador identificar os vários elementos que constituem uma situação ou problema de modo a possibilitar que outros leitores tirem suas próprias conclusões” (Duarte, M., 2006, p. 234). Contribuindo para a escolha deste método, Yin (2005) afirma que “os estudos de caso representam a estratégia preferida quando se colocam questões do tipo ‘como’ e ‘por que’, quando o pesquisador tem pouco controle sobre os acontecimentos e quando o foco se encontra em fenômenos contemporâneos inseridos em algum contexto da vida real” (2005, p. 19). O estudo de caso é a estratégia escolhida ao se examinarem acontecimentos contemporâneos, mas quando não se podem manipular comportamentos relevantes. O estudo de caso conta com muitas técnicas utilizadas pelas pesquisas históricas, mas acrescenta duas fontes de evidências que usualmente não são incluídas no repertório de um historiador: observação direta dos acontecimentos que estão sendo estudados e entrevistas das pessoas neles envolvidas. Novamente, embora os estudos de casos e as pesquisas históricas possam se sobrepor, o poder diferenciador do estudo de caso é sua capacidade de lidar com uma ampla variedade de evidências – documentos, artefatos, entrevistas e observações – além do que pode estar disponível no estudo histórico convencional. (YIN, 2005, p. 26 e 27)

3.2 Definição do caso A pesquisa será realizada no hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, servindo de objeto de análise a Diretoria Financeira e de Planejamento e o Escritório de


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Qualidade, responsáveis pelo planejamento estratégico da organização, e a área de Comunicação, a quem está atribuída a função de gerenciar o relacionamento com a imprensa.

3.3 Coleta de evidências Conforme Yin (2005), as evidências para um estudo de caso podem ter origem em documentos, registros em arquivo, entrevistas, observação direta, observação participante e artefatos físicos. Para o autor, tais fontes de informação são complementares, não havendo níveis de importância entre elas. Para o estudo de caso deste trabalho, a informações necessárias foram obtidas por meio de documentos, arquivos, matérias jornalísticas e entrevista em profundidade, com a utilização de perguntas abertas (Apêndices A e B) aos entrevistados dispostos na Tabela 3. Conforme Duarte, J. (2006), a entrevista em profundidade significa uma “técnica qualitativa que explora um assunto a partir da busca de informações, percepções e experiências de informantes para analisá-las e apresentá-las de forma estruturada” (2006, p. 62). Tabela 3 - Entrevistas

Entrevistado Paulo Cezar de Souza Rodrigues Ricardo Minotto Ivo Stigger

Cargo Coordenador do Escritório da Qualidade Diretor Financeiro e de Planejamento Gerente de Comunicação

3.4 Análise de evidências Para Yin (2005), “a análise de dados consiste em examinar, categorizar, classificar em tabelas, testar ou, do contrário, recombinar as evidências quantitativas e qualitativas para tratar as proposições iniciais de um estudo” (2005, p. 137). O autor considera difícil a tarefa de estudar um caso, pois, independenetemente das técnicas utilizadas, o pesquisador precisa cumprir a tarefa de considerar todas as evidências, exibi-las de forma isenta e, mesmo assim, observá-las sob o ponto de vista de interpretações diferentes. Para cumprir com tal objetivo, Yin (2005) propõe que o pesquisador tenha definida uma estratégia analítica. Para ele, “a estratégia o ajudará a considerar as evidências de forma justa, produzir conclusões analíticas convincentes e eliminar interpretações alternativas” (2005, p. 140). Nesse sentido, o


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pesquisador estabelece três estratégias gerais para a análise dos dados obtidos com a coleta de evidências: 1. Basear-se nas proposições teóricas: Yin (2005) considera fundamental que o estudo do caso não perca de vista as motivações iniciais do projeto. Segundo ele, a proposição “ajuda a pôr em foco certos dados e ignorar outros” (Yin, 2005, p. 140). 2. Encontrar hipóteses concorrentes: na visão do autor, estas explanações concorrentes ajudarão o pesquisador a ver de forma crítica o curso natural das proposições originais do caso. Muitas vezes, a hipótese concorrente pode servir para realizar a análise do estudo de caso. 3. Organizando o caso em partes: nesta estratégia, Yin (2005) recomenda que o pesquisador separe em tópicos relevantes ao caso as informações obtidas por meio das evidências, os quais serão analisados de forma a produzir os resultados esperados. Ragin e Becker (apud DUARTE, M., 2006) contribuem com a discussão já que consideram que para que um caso exista, nas Ciências Sociais, é preciso que identifique-se nele uma característica única e que “sua uniformidade seja dada em experiências históricas concretas” (2006, p. 218). Entretanto, os autores explicam que, mesmo se for observada e explorada, este caso não tem significado em si. Ele só é significativo se um observador puder referenciá-lo em uma categoria analítica ou teórica. Não é suficiente observar um fenômeno social, um evento histórico ou destacar certos comportamentos com o objetivo de declará-los “casos”. Se desejarmos falar sobre um “caso”, precisamos dos meios de interpretá-lo ou contextualizá-lo em uma realidade. (DUARTE, M., 2006, p. 218)

3.5 Plano de análise dos dados A partir da coleta de evidências no hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, as informações serão analisadas com base nas proposições teóricas que levaram o pesquisador a este estudo de caso, à luz dos pressupostos do pesquisador e do referencial teórico existente para o estudo.


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4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DAS EVIDÊNCIAS

4.1 Caso estudado: o hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre Fundada em 1803, o hospital Santa Casa de Misericórdia, objeto estudado por esta pesquisa, está localizado no Centro de Porto Alegre e é referência na assistência em saúde na América Latina, devido à qualidade dos procedimento realizados. O complexo é integrado por sete hospitais, sendo dois hospitais gerais e cinco especializados, destacando-se as áreas de clínica médica, cirurgia geral, cardiologia, neurocirurgia, pneumologia, oncologia, pediatria e transplantes15.

4.1.1 Reconhecimentos A organização conquistou o Prêmio Nacional da Qualidade (PNQ) em 2002, concedido pela Fundação para o Prêmio Nacional da Qualidade em reconhecimento às organizações que mais se destacam pela prática de gestões de excelência. Além disso, a Santa Casa de Porto Alegre é o primeiro hospital e a primeira organização de direito privado sem fins lucrativos do País a receber o PNQ. Em 2003, o Programa Gaúcho de Qualidade e Produtividade - RS conferiu à Instituição o Troféu Diamante, em reconhecimento à certificação do PNQ16.

4.1.2 Ajustes financeiros A Santa Casa de Porto Alegre iniciou sua atuação em Porto Alegre dando auxílio assistencial às populações menos favorecidas do Estado, concedendo abrigo e os cuidados médicos necessários. A cobertura dos custos, segundo Stigger e Lersch (2006), se dava “com doações recebidas da comunidade, apoio de comerciantes e empresários e recursos públicos”. Valores cobrados dos proprietários dos escravos enfermos também ajudavam nas despesas. No segundo século de existência, a fundação da Faculdade de Medicina, em 1898, e o 15

HOSPITAL SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE PORTO ALEGRE. Relatório anual 2008. Disponível em: <http://bit.ly/d44XpV>. Acesso em: 15 mai. 2010 16 HOSPITAL SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE PORTO ALEGRE, op. cit.


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acompanhamento do avanço da medicina pela Santa Casa fez com que “a estratégia das esmolas” não fosse mais suficiente. Mesmo originando receitas provenientes do aluguel de alguns imóveis e do atendimento ao público no recém construído Hospital São Francisco, a sobrevivência da instituição começava a ser ameaçada. A década de 1980 ficou marcada pelo início da profissionalização da gestão da Santa Casa. O então governador do Estado, Jair Soares, condicionou o habitual auxílio financeiro estadual a uma radical mudança no sistema de administração da organização. Superada a fase de “limpeza” da instituição, o desafio surtiu efeito. O reconhecimento da Santa Casa como hospital-escola, conferido pelo Ministério da Educção e Cultura, por exemplo, fez com que alguns recursos dessem alívio ao caixa. “A alegria durou pouco”, como introduzem Stigger e Lersch (2006). “As tabelas do SUS, que nos primeiros anos cobriam todos os custos e permitiam uma pequena margem de lucro, ficaram defasadas num país então marcado por altíssimos índices inflacionários”. Em 1993, a direção da instituição decidiu alterar o modelo de dependência do Sistema Único de Saúde – 97% dos serviçosprestados eram destinados a pacientes do SUS à época – e passou a modernizar e equipar sua estrutura com a finalidade de disputar mercado com os mais qualificados centros de serviços de saúde do Estado. O objetivo era atrair clientes particulares e de outros planos de saúde.

4.1.3 Mudança na imagem Para concretizar um movimento administrativo de tamanha importância, a organização percebeu que deveria também alterar a forma como era vista pelo mercado. Coube ao Departamento de Marketing mudar a imagem que prevaleceu nos 190 anos anteriores, ou seja, a de um hospital voltado aos indigentes. Toda a comunicação, inclusive a realizada pela assessoria de imprensa, passou a privilegiar os aspectos da modernização dos prédios e instalações, do reequipamento tecnológico e da qualidade de seus novos serviços deixando em segundo plano – ou em lugar algum – a divulgação do gigantesco esforço que continuava sendo feito para atender centenas de milhares de clientes do SUS a cada ano. (STIGGER E LERSCH, 2006)

A estratégia deu certo. “A Santa Casa não só sobreviveu como executou cinco grandes projetos de expansão de seu complexo e de seus serviços. Da mesma forma, estava correta a diretoria executiva quando decidiu buscar a autossustentação da instituição no mercado”,


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avaliam Stigger e Lersch (2006). Como explica Ricardo Minotto17, atualmente, as contas estão em dia graças à filosofia implantada: A Santa Casa oferta 60% de seus serviços ao SUS, que contribue com 30% do faturamento. O segmento SUS é deficitário. Cada R$ 100 que o hospital gasta para atender o paciente SUS, o Estado o remunera com R$ 70. Para que a Santa Casa obtenha autossutentação e equilíbrio nas suas contas, ela oferta os outros 40% de sua capacidade para os sistema de particular e convênio que têm uma margem de contribuição positiva. Esta margem permite investimento e qualificação da Santa Casa e também auxilia na prestação de seviços ao SUS. Ao mesmo tempo, a gente entende que todo conhecimento gerado aqui ele deve ser dirigo a toda população, e não só ao sistema pagador.

Entretanto, ao ser vista como uma organização moderna que acompanhava as evoluções tecnológicas da medicina, a Santa Casa enfraqueceu seu principal diferencial competitivo, como explica Paulo Cezar de Souza Rodrigues18: Essa é uma questão para a qual temos um cuidado muito especial. Sabemos que valores devem muito mais ser praticados do que postos em discursos. E a misericórdia é um grande valor da organização, preservado até hoje e está presente na prática diária de todas as Santas Casas do mundo. Esse valor é a vocação e a disposição de atender a todos, sem preconceito, com foco maior nos mais necessitados. Esse é o nosso diferencial competitivo no mercado onde atuamos. Algumas pessoas podem achar contraditório. Mas só temos a qualidade que temos por termos o volume de atendimento que nós temos. É um círculo virtuoso. Nossa excelência no atendimento em geral vem do acúmulo do conhecimento adquirido no atendimento aos pacientes do SUS.

A repercussão de uma percepção inesperada da instituição entre a população, a mídia e o empresariado levou a Santa Casa a rever uma série de aspectos a partir de 2006. Rodrigues destaca, por exemplo, que “foi neste momento que o valor da misericórdia, que desde sempre esteve vivo na casa, passou a figurar nas nossas declarações estratégicas”. Minotto completa: “Isso gerou, inclusive, uma redefinição da marca, do logo da Santa Casa. Houve necessidade de esclarecer para a população que a Santa Casa nunca deixou de ser Santa Casa de Misericórdia”.

17

Diretor financeiro e de planejamento da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. Entrevista concedida a este pesquisador no dia 29/06/2010, no hospital Santa Casa, em Porto Alegre. 18 Coordenador do Escritório da Qualidade da Santa Casa de Porto Alegre. Gerente de Comunicação da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre – departamento responsável pela elaboração, controle e execução do planejamento estratégico do hospital Santa Casa. Entrevista concedida a este pesquisador no dia 21/06/2010, no hospital Santa Casa, em Porto Alegre.


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4.1.4 Principais norteadores Missão: Desenvolver e proporcionar ações de Saúde, para todos, com Qualidade e Responsabilidade Social. Visão: Instituição de referência em Saúde, integrada à sociedade. Valores: Misericórdia, Humanismo, História, Ética, Eqüidade, Credibilidade, Pioneirismo e Tecnologia, Autossustentação. Estratégias: 1. Ações em Saúde 1.1 Desenvolver e Proporcionar Ações de Promoção em Saúde 1.2 Desenvolver e Proporcionar Ações de Prevenção de Doenças 1.3 Desenvolver e Proporcionar Ações de Assistência em Saúde 1.4 Desenvolver e Proporcionar Ações de Ensino em Saúde 1.5 Desenvolver e Proporcionar Ações de Pesquisa em Saúde 1.6 Desenvolver a Gestão de Pessoas e Conhecimento 1.7 Aumentar a satisfação e fidelização dos Clientes 2. Autossutentação 2.1 Melhorar o resultado econômico e financeiro 2.2 Estimular demandas para os serviços e produtos 2.3 Efetivar a Cultura da Excelência 3. Responsabilidade Social 3.1 Desenvolver a prática da Governança Corporativa 3.2 Aperfeiçoar o relacionamento com todas as Partes Interessadas Modelo Organizacional A estrutura orgânica da Santa Casa é segmentada em três níveis: Estratégico (Nível Corporativo), Tático (Unidades Gerenciais Agregadas (UGAs), e Operacional (Unidades Gerenciais Básicas (UGBs). No total, são 23 UGAs que reúnem 184 UGBs (ver Figura 7.


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Figura 7 – Estrutura Orgânica da Santa Casa

Fonte: Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre

4.2 Análise das evidências coletadas A partir das evidências coletadas no hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, foi possível avaliar os aspectos que relacionam a área de Comunicação da organização, mais especificamente o Relacionamento com a Imprensa, com o seu Planejamento Estratégico. Em termos gerais, os resultados foram bastante positivos, mas há o que avançar no que diz respeito à consolidação de a uma vantagem competitiva.

4.2.1 Administração estratégica e o jornalismo: a importância dada à imprensa e aos profissionais da organização que se relacionam com ela Com grau de confiabilidade entre os brasileiros maior que o dos empresários (ver item 1.2) e considerada o “quarto poder” da sociedade (ver item 2.2), a imprensa recebe atenção dos profissionais da Santa Casa ligados ao Planejamento Estratégico da organização. Ricardo


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Minotto19 afirma que acessa notícias produzidas pela Imprensa sobre o setor de saúde e sobre a instituição “diariamente, pelo menos no início da manhã e, eventualmente, ao meio-dia e início da tarde”. Segundo Minotto, a atenção dada pelos seus colegas de mesmo nível hierárquico é bastante semelhante. Para Paulo Cezar de Souza Rodrigues20, o noticiário parece ser igualmente importante: “Hoje, eu recebo o clipping da equipe de Relacionamento com a Imprensa e passei a acompanhar diariamente (Anexo B). Além disso, tenho acessado blogs e o portal do Luis Nassif21. Neste portal, participo de discussões sobre políticas públicas”. Para Rodrigues, seus colegas de igual nível na organização acessam as notícias produzidas pela imprensa em periodicidade semelhante. “O interesse deles por informação é proporcional ao envolvimento com a aministração estratégica da casa. Quanto mais envolvido com alguma prática do planejamento estratégico, mais próximo ele estará das notícias sobre o setor”. Tanto Minotto como Rodrigues confiam no que leem na imprensa. Rodrigues, entretanto, atribui esta confiança ao trabalho que as organizações estão tendo em repassar informações corretas à mídia. O administrador ainda revela que considera negativo quando a imprensa não enfoca a informação da forma como foi divulgado pela Santa Casa: Partindo do pressuposto que as informações são repassadas pelas organizações, eu confio nas informações. Principalmente dos grandes veículos de comunicação. O que se percebe é que ou pelo espaço reduzido na imprensa ou pelo nível de conhecimento do jornalista, eu vejo que algumas vezes o enfoque que nós procuramos dar não foi exatamente o mesmo da matéria publicada. Eu acho isso negativo.

Minotto relativiza sua confiança na imprensa. Tanto para ele quanto para os demais diretores da Santa Casa há uma “grande confiabilidade” no jornalismo praticado no Estado, com exceção de alguns profissionais que “acabam criando interpretações equivocadas”. A importância demonstrada por Minotto e Rodrigues à imprensa se estende ao valor que ambos atribuem à área de Relacionamento com a Imprensa da organização. Isso, para Lopes (2000), é de extremo valor uma vez que “um dos fatores fundamentais para o sucesso de uma estratégia de relacionamento com a mídia é a importância que a alta direção da empresa dá a esta atividade” (2000, p. 85). A autora defende a idéia de que o “pulo do gato” de uma boa estratégia de comunicação é quando ela ganha “fortes aliados entre os agentes máximos de decisão”. Para Minotto, o respeito da mídia pelo trabalho da Santa Casa foi conquistado, em parte, devido ao trabalho dos jornalistas da organização: 19

Entrevista concedida ao pesquisador (passim). Entrevista concedida ao pesquisador (passim). 21 http://www.advivo.com.br/luisnassif/ 20


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A assessoria de imprensa tem um trabalho de manutenção das relações com a mídia que permite total transparência do que existe na Santa Casa, repassando informações, de modo que a imprensa fique informada da forma como a organização trabalha e dos valores que aquim são compartilhadas. Há uma compreensão de parte da mídia da seriedade do trabalho que é feito aqui.

Ao tratar de crises de imagem pelas quais a organização passou, Rodrigues também valoriza o trabalho do departamento e enfatiza o seu papel-chave no sentido de diminuir os efeitos negativos do fato na imagem da instituição. Lembro de um caso em que, por uma falha no agendamento de procedimentos, uma paciente do Hospital Santa Clara foi esquecida no bloco cirúrgico. Isso teve uma repercussão negativa na mídia. O acompanhamento da área de Relacionamento com a Imprensa foi decisivo para que a matéria, que abordou o assunto, saísse já com o posicionamento da Santa Casa e uma certa minimização do impacto negativo.

O administrador completa a análise dizendo que considera importante reconhecer a função do profissional que se relaciona com a imprensa. Para ele, é importante que haja um diálogo entre o jornalista do veículo e o jornalista da organização, que conhece a profissão mesmo estando do outro lado do balcão. Porque se a própria direção saísse em defesa, por um excesso de ação, poderia ter sido mais prejudicial ainda. E isso desmereceria todo o trabalho de uma área (Comunicação) que está ali para este tipo de atividade.

Minotto também relata um episódio de crise de reputação e enaltece o trabalho da equipe de comunicação: (Em maio de 2010) tivemos o fato de um falso médico (Anexo C) circulando pelos corredores da Santa Casa, o que gerou uma repercussão na Imprensa, até com uma ampliação maior do que, ao nosso ver, o fato mereceria. Neste caso, a atuação da área de Assessoria de Imprensa foi extremamente positiva. A atuação dela frente aos meios de comunicação permitiu a adequada compreensão para tornar aquele fato um episódio pontual e não como um fato que colocaria em cheque toda credibilidade do sistema de segurança da instituição, e o impacto que isso teria na prestação dos serviços à população.

O cenário apresentado concorda com Lopes (2000), já que para ela “uma empresa que conquista credibilidade junto aos formadores de opinião não terá sua imagem destruída de forma leviana. Muito pelo contrário, terá mais chances de ver a sua versão dos fatos retratada com fidelidade pela imprensa” (2000, p. 71).


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Mais do que obter bons resultados na tentativa de “salvar” a organização em um momento de crise, a boa gestão da relação entre Santa Casa e os jornalistas traz ganhos à imagem institucional. Lopes (2000) argumenta nesse sentido quando diz que a área responsável pela relação com a imprensa precisa “desenvolver estratégias que resultem numa rede eficaz de comunicação” com a mídia. Para ela, este trabalho terá a função mercadológica, de promover a venda de um produto ou serviço, ou corporativa, de reforçar a imagem institucional da empresa.

4.2.2 Administração estratégica e Relações Públicas: um alinhamento com fins estratégicos Já foi mencionado neste estudo que Ferrari (2009) considera a área de Relações Públicas fundamental para o bom desempenho da organização e que o seu profissional deve atuar como o “estrategista da comunicação” (2009, p. 164) e participar de todas as tomadas de decisão que causem qualquer tipo de impacto. Ainda para ela, as empresas que posicionam o departamento de Comunicação em contato com o alta direção “têm consciência da importância das relações públicas para os seus negócios exatamente pelo uso da comunicação como ferramenta estratégica” (2009, p. 164). Atuando desta forma, este profissional tem a possibilidade de incluir os interesses dos stakeholders no gerencimento do comportamento da organização, como também já afirmou Grunig (2009) neste estudo. Conforme o autor, “as relações públicas são vistas como uma atividade de vinculação com os stakeholders, e não como um conjunto de atividades para a transmissão de mensagens, elaboradas para proteger a organização dos seus públicos” (2009, p. 24). Grunig (2009) considera ideal esta forma porque o processo de comunicação passa a ser exercido em mão dupla, conferindo voz aos públicos de interesse e facilitando “o diálogo entre a administração e os públicos, tanto antes como depois da tomada de uma decisão” (2009, p. 24 e 25) A partir das evidências coletadas, a relação da área de Comunicação da Santa Casa de Misericórdia com o seu Planejamento Estratégico caminha de acordo com as recomendações dos autores citados. Em observação feita no escritório do gerente de Comunicação da organização, o pesquisador constatou a presença de cartaz afixado à parede contendo o Planejamento Estratégico da Santa Casa. Para Ivo Stigger22, a presença destas mensagens em

22

Jornalista e Gerente de Comunicação da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. Entrevista concedida a este pesquisador no dia 06/07/2010, no hospital Santa Casa, em Porto Alegre.


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sua sala significa o desafio permanente de alinhamento das divulgações para a mídia com os objetivos da organização: Carlos Drummond de Andrade, em seu poema Confidência do Itabirano (Anexo A), diz que Itabira, sua cidade natal, é apenas um retrato na parede, mas como dói. Dói porque é a Itabira da sua infância, da sua adolescência, portanto é a Itabira dos seus sonhos de menino e dos seus projetos de adolescente. Dói porque muitos desses projetos, muitos desses sonhos, desses ideais, não foram concretizados ao longo da vida. E à medida que tu te aproximas do teu limite, se tu fizeres um balanço da vida, é óbvio que tu tiveste muitos sonhos e muitos ideais, e muitos deles não se concretizaram. Mas mais uma vez eu posso dizer, olhando para este quadro na parede com o Planejamento Estratégico da Santa Casa, como se fosse o retrato de Itabira. Essas estratégias 2009/2013 não são só um enfeite na parede. E não doem. São um desafio permantente. Nos fazem pensar se as nossas ações de divulgação para a Imprensa estão dentro dos objetivos estratégicos da Santa Casa. E além de não doer, às vezes até nos alegram. Porque vemos que a gente realmente está se relacionamendo bem com a mídia, com este meio que nos liga à comunidade. Estamos cumprindo com nossa missão de manter a comunidade bem informada.

Nesta organização, os profissioanais envolvidos com o planejamento estratégico mantém canais periódicos de conversação com o principal líder da área de Comunicação. “Com ele, meu contato é de mais de duas vezes por semana”, relata Paulo Cezar de Souza Rodrigues23. Ricardo Minotto24 detalha o envolvimento da alta direção com a Comunicação: “Sempre que há a necessidade da comunicação de algo específico eles são envolvidos e sinalizamos a necessidade”. O contato permanente de toda a equipe de comunicação com os profissionais

responsáveis

pela

administração

estratégica

do

hospital

é

também

responsabilidade de Stigger. Como jornalistas da casa, estamos atentos e participamos de todo e qualquer evento da organização. Somos os arautos das boas novas para o público interno e para as comunidades. Eventualmente, novas nem tão boas assim. Dentro desse contexto, posso dizer que, sim, nós estamos alinhados a este Planejamento. Estamos sempre alinhados às coisas que definem ou reorientam às diretrizes da casa.

Stigger detalha este alinhamento: “Nosso contato é permanente, quase diária, com a diretoria geral. Há uma reunião mensal com o diretor geral e quinzenalmente com todas as diretorias”. O jornalista ainda detalha os encontros que são realizados para elaboração das ferramentas de comunicação: “Para a revista institucional, temos um conselho editorial, e para 23 24

Entrevista concedida ao pesquisador (passim). Entrevista concedida ao pesquisador (passim).


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as ferramentas de comunicação interna, temos um comitê gestor, envolvendo todas as diretorias”. Além de apontar o atual envolvimento cotidiano da área de comunicação com a administração estratégica da organização, a trajetória da Santa Casa de Porto Alegre nos últimos 17 anos também evidencia este vínculo. Stigger e Lersch (2006) confirmam a importância estratégica da comunicação para a organização. Para eles, o trabalho de promoção externa dos valores da Santa Casa foi fundamental para que o hospital conseguisse concretizar seu novo modelo de negócios, a partir de 1993, e alcançasse a sustentação das contas. A mais profunda mudança organizacional operada na Santa Casa de Porto Alegre, ao longo de sua história, data de 1993. Naquele ano, tempo em que as tabelas do SUS começam a não mais cobrir a totalidade dos custos, a Instituição se deu conta de que o governo não tem condições de honrar com o compromisso expresso na Constituição de 1988, que assegura ser a saúde “um direito de todos e um dever do Estado” e decide buscar no mercado clientes particulares e de convênios de saúde para pagar suas contas e cobrir o crescente déficit gerado pelo atendimento aos pacientes do SUS. Para qualificar seus serviços e atender às exigências desse cliente mais crítico, a Santa Casa implanta a filosofia e metodologia da Qualidade Total, o que transforma radicalmente sua gestão administrativa e a estrutura da organização. Intensificaram-se os programas de qualificação das pessoas, mas o foco principal da Casa ficou nos processos e, sobretudo, nos resultados. (STIGGER E LERSCH, 2006)

Especificamente sobre a contribuição da comunicação, o documento relata: Apoiada por sua estratégia de autossustentação e desenvolvimento, a Santa Casa, a partir de 1993 e através de seu Departamento de Marketing e Comunicação, trabalhou intensamente sua marca e imagem no mercado, alterando-a de “um hospital de indigentes” para um hospital moderno, marcado pelo pioneirismo e pela tecnologia. A estratégia deu certo: a partir da primeira década do século 21, a Santa Casa passa a ser vista, pela mídia e pela comunidade, como um hospital moderno, atualizado tecnologicamente e com alta qualidade nas instalações e nos serviços. (STIGGER E LERSCH, 2006)

Se o papel da área de Comunicação da Santa Casa fosse apenas a transmissão para a mídia e para os demais stakeholders das mensagens favoráveis à organização, como relatam Stigger e Lersch (2006), a função estratégica de tal departamento seria condenado por Grunig (2009). Para este autor, esta forma de atuação não realiza “pesquisa e reflexão estratégica” já que este setor atua em movimentos de mão única e apenas busca modificar o comportamento dos públicos com os quais se comunicam.


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No entanto, pelas evidências encontradas pelo pesquisador e conforme Stigger e Lersch (2006), é possível verificar que, em 2006, um movimento oposto fez com que uma informação veiculada na mídia levasse a organização a efetuar mudanças em suas diretrizes estratégicas. Os autores explicam que “a mudança de imagem (para um hospital mais moderna), que negligenciou as informações sobre a continuidade da prestação de serviços aos públicos menos favorecidos – hoje, o povo do SUS –, trouxe efeitos colaterais não desejados. A Santa Casa passou a ser vista, por grande parte da população e por parcelas da mídia e do empresariado, como um hospital rico, preocupado em atender clientes igualmente abonados ou beneficiários de rentáveis planos de saúde.” (STIGGER E LERSCH, 2006)

Uma das indicações de que a imagem construída pela Santa Casa junto aos seus stakeholders já prejudicava seu modelo de negócios veio de um programa radiofônico veiculado no Rio Grande do Sul em 22 de dezembro de 2005: “A Santa Casa de Porto Alegre não é mais a mesma. Hoje ela é um complexo hospitalar rico e moderno. Ela não atende mais aos pobres. Ela está mudando sua história de dois séculos de misericórdia”. Rodrigues25 conta: Antônio Carlos Macedo, da Rádio Gaúcha, foi um dos jornalistas que fez grandes questionamentos em relação ao valor “misericórdia” da Santa Casa. Em um dos casos, a expressão utilizada foi essa: a Santa Casa não é mais de misericórdia. Isso nos acendeu a luz vermelha porque falava de um valor extremamente importante para nós e, de certa forma, depunha contra uma história de 206 anos. Foi neste momento que houve a necessidade de reforçar este valor. Foi neste momento que este valor (o valor da misericórdia), que desde sempre esteve vivo na casa, passou a figurar nas nossas declarações estratégicas.

Ricardo Minotto26 confirma a importância de tal informação para o reposicionamento da organização: A partir dessa manifestação externa, foi feita uma compreensão disso pelos tomadores de decisão do âmbito interno, e percebeu-se a necessidade de uma redefinição de plano ou reposicionamento de imagem e o resgate da explicitação do valor misericórdia para as diferentes partes interessadas. Isso gerou, inclusive, uma redefinição da marca, do logo da Santa Casa. A partir dessa reconfiguração interna, foi feito um retorno ao público externo, buscando esse reposicionamento. Houve necessidade de esclarecer para a população que a Santa Casa nunca deixou de ser Santa Casa de Misericórdia.

25 26

Entrevista concedida ao pesquisador (passim). Entrevista concedida ao pesquisador (passim).


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Ao mesmo tempo, Stigger e Lersch (2006), admitem que, toda comunicação, inclusive a realizada pela assessoria de imprensa, passou a privilegiar os aspectos da modernização dos prédios, (...) deixando em segundo plano – ou em lugar nenhum – a divulgação do gigantesco esforço que que continuava sendo feito para atender centenas de milhares de clientes do SUS a cada ano

“Às vezes, a gente procura ver o inferno nos outros”, afirmou Rodrigues, eximindo a imprensa da responsabilidade de não reconhecer o valor da “misericórdia” para a instituição. Segundo ele, essa “miopia” da imprensa causou grande preocupação interna “porque em outros momentos do passado essa mesma imprensa havia nos ajudado a levantar grandes obras como, por exemplo, o Hospital da Criança Santo Antônio e o hospital Dom Vicente Scherer”. “Tudo por falta de uma ação mais efetiva nossa”, finaliza Rodrigues. Por fim, Stigger e Lersch (2006) reconhecem a importância estratégica da Comunicação: Entendemos que, a partir deste ano de 2006, é preciso alterar o foco de marketing e comunicação da Casa, privilegiando também as informações sobre o serviço – ainda a maior parte do total de suas atividades – que a Instituição presta aos clientes do SUS, hoje o estrato social que representa a clientela da histórica misericórdia da Santa Casa.

4.2.3 Contribuições da área de Relacionamento com a Imprensa para a administração estratégica da organização A aliança entre a área de Comunicação e a administração estratégica da organização se dá, conforme Grunig (2009) e Ferrari (2009), a partir do momento em que o profissional de Relações Públicas – ou de Relacionamento com a Imprensa, mais especificamente – não se limita à função de simples trasmissor de mensagens positivas da companhia para outros públicos. Para Grunig (2009), o profissional de Comunicação precisa atuar no sentido de “construir alianças com os públicos estratégicos no seu meio ambiente e dar-lhes voz no processo decisório que os influencia” (2009, p. 34). Harrison (2005) é ainda mais enfatico ao dizer que “tanto os públicos interessados internos como os externos influenciam a decisão estratégica. A influência é proporcional ao poder econômico, político e formal de cada um”.


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Para Harrison (2005), a direção estratégica de uma organização, composta por missão, visão, valores organizacionais e definição de negócio forma a base a partir da qual os planos de ação são desenvolvidos. As ações incluem estratégias competitivas da empresa, implementação das estratégias, sistemas de controle e a forma como os PIs internos e externos e as relações com PIs são administradas (HARRISON, 2005, p. 110).

Na prática, Harrison (2005) afirma que a partir dos resultados das ações organizacionais no ambiente externo ou do nível de cooperação dos públicos interessados, a organização pode tomar a decisão de fazer ajustes em sua direção estratégica. As ações organizacionais levam a determinados resultados como sucessos ou fracassos no mercado e a desempenho financeiro, que inclui crescimento de vendas. Além disso, os PIs vão responder pelas ações da organização de diversas formas. Por exemplo, os clientes podem se sentir muito satisfeitos com os produtos e serviços de uma organização, ou podem ficar muito zangados e abri um processo contra a companhia. (...) Os reguladores governamentais podem ser cooperativos ou podem interferir nas operações ou impor multas e penalidades. Esses resultados se traduzem em informações que a organização pode usar para ajustar a direção estratégica, as ações ou as duas coisas. (HARRISON, 2005, p. 110)

A partir da análise das evidências colhidas na Santa Casa de Miserírdia de Porto Alegre, foi possível verificar que a direção estratégica da organização foi modificada a partir do subsídio colhido na mídia (ver item 4.2.2), conforme teoria de Harrison (2005). Paulo Cezar de Souza Rodrigues27 conta que no momento em que o valor “misericórdia” passou a ser questionado pelos públicos interessados da organização, com manifestação direta da mídia, houve uma ruptura ao então planejamento estratégico e tal valor passou a figurar entre os valores organizacionais da Santa Casa (ver Tabela 4). A abordagem de Harrison (2005) demonstra a importância de tal decisão, já que para ele valores organizacionais são “a filosofia implícita que orienta decisões e comportamentos em uma empresa.” Para o autor, não pode haver incoerência por parte da organização no que diz respeito aos seus valores. (...) se as mudanças de valores na sociedade são voluntariamente incorporadas à empresa, um funcionários ou gerente pode “fazer uma denúncia”, o que seria uma tentativa de forçar a organização a deixar de praticar um comportamento que a sociedade atualmente considera inaceitável, ou incorporar uma prática que esteja de acordo com o novo valor social. (...) os gerentes estratégicos precisam se manter a par dessas mudanças a fim de posicionar suas empresas de forma bem-sucedida. (HARRISON, 2005, p. 118) 27

Entrevista concedida ao pesquisador (passim).


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Tabela 4 – Edições do Planejamento Estratégico da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre

Vigência Missão

2005/2010 Desenvolver e proporcionar Ações de Saúde, para todos, com Qualidade e Responsabilidade Social.

2009/2013 Desenvolver e proporcionar ações de Saúde, para todos, com Qualidade e Responsabilidade Social.

Visão

Instituição de Referência em Saúde, Integrada à Sociedade.

Instituição de referência em Saúde, integrada à sociedade.

Valores

Ética, Credibilidade, História, Eqüidade, Humanismo, Pioneirismo e Tecnologia.

Misericórdia, Humanismo, História, Ética, Eqüidade, Credibilidade, Pioneirismo e Tecnologia, Autossustentação.

Dimensão dos Temas Estratégicos

Ações de Saúde

-

Temas estratégicos Educação, Prevenção e Assistência; Formação de Profissionais; Geração de Conhecimento

Ações em Saúde; Autossustentação; Responsabilidade Social

Ainda para Harrison (2005), há uma estreita relação de sua teoria sobre públicos interessados e responsabilidade social. Conforme ele, “um dos princípios implícitos na teoria é que as organizações devem se comportar apropriadamente em relação ao vasto leque de preocupações e interesses dos PIs” (2005, p. 118). Para a Santa Casa, com seus 206 anos vinculados à prática da solidariedade, o tema responsabilidade social ganha destaque. A reavaliação do planejamento estratégico feito pelo hospital em 2008, a partir do qual ficaram definidas as diretrizes para o período 2009/2013, transformou a responsabilidade social da organização em um dos três temas estratégicos (ver Tabela 4). Tal modificação foi motivada pela necessidade da instituição de confirmar aos públicos interessados à observância da organização ao valor “misericórdia”. Segundo Rodrigues, o tema estratégico “Autossustentação” surgiu de uma convicção das lideranças da Santa Casa de que isso nos daria autonomia para decidir pelo futuro da organização. Essa autonomia nos fez decidir seguir nossa missão e transformar a “Responsabilidade Social” também um tema estratégico. Assim, ao colocar a “Responsabilidade Social” ao lado de “Autossustentação” e “Ações em Saúde”, como direcionadores estratégicos, a organização estava sinalizando que continuaria seu modelo de negócio de captação de recursos em convênios e particulares, mas sem deixar de lado o valor da misericórdia.


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Embora a influência dos públicos interessados no planejamento estratégico da Santa Casa tenha ficado evidente a partir dos processos descritos acima, e Ivo Stigger28 ter afirmado que “tudo o que (a área de Relacionamento com a imprensa faz) aqui está em absoluta sintonia com as estratégias de autossustentação e desenvolvimento da Santa Casa”, o pesquisador verificou que não há um alinhamento explícito e sistemático entre a área de Comunicação e o Planejamento Estratégico da organização. A relação entre as duas áreas se dá de forma tácita, por iniciativa de seus líderes, sem que haja processo de planejamento e controle do trabalho. O item 4.2.4, a seguir, tratará de proposições à instituição no sentido de tornar metódica, contínua e documentada a contribuição do Relacionamento com a Imprensa para a administração estratégica da Santa Casa.

4.2.4 Proposições para um Relacionamento Estratégico com a Imprensa: criando vantagem competitiva para a Santa Casa Além das atividades de contato com jornalistas, controle da divulgação e inserção na mídia (tarefas como arquivamento de press-releases e notas, e contagem das notícias publicadas na imprensa que citam a Santa Casa, por exemplo), faz-se necessário um trabalho da área de Relacionamento com a Imprensa mais alinhado ao planejamento estratégico da organização. Ivo Stigger29, relata o trabalho feito pelo departamento no monitoramento dos resultados, mas admite que melhorias podem ser implementadas: Existe a avaliação tradicional da empresa de clipagem contratada para sabermos o volume de notícias positivas, negativas e neutras. Quanto aos releases, eu faço essa avaliação e a nossa equipe tem reuniões semanais, mas acho que esta é uma área na qual poderíamos ser mais críticos.

Kunsch (2003) lembra que “numa perspectiva moderna, as relações públicas precisam demonstrar sua contribuição também como um valor econômico para as organizações” (2003, p. 103). A pesquisadora entende que tal função de Comunicação precisa entregar resultados e contribuir para que as organizações cumpram com o estabelecido em seus objetivos, missão, visão e valores corporativos. Harrison (2005) amplifica a relevância desse alinhamento quando diz que organizações que o fazem criam vantagem competitiva com relação aos seus 28 29

Entrevista concedida ao pesquisador (passim). Entrevista concedida ao pesquisador (passim).


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concorrentes. Para ele, isso significa administrar relações com PIs e recursos organizacionais de forma a mover a organização em direção à execução bem-sucedida de suas estratégias, consistentemente com sua direção estratégica” (2005, p. 214). Com base na teoria do autor, para quem as instituições precisam criar parceriais com PIs externos e transmitir conhecimento estratégico para seus funcionários, a Santa Casa deve conduzir seu processo de Relacionamento com a Imprensa com ganho de competitividade de duas formas: 1. Administrando seus recursos internos: O autor lembra que “as organizações são compostas de pessoas que interagem umas com as outras e com PIs externos, pois desempenham funções com objetivos de atingir as metas da organização”. Portanto, para a Santa Casa, é essencial que os profissionais que têm contato com a imprensa possuam pleno conhecimento do planejamento estratégico da organização. Em empresas cujas estratégias haviam sido implementadas efetivamente, os funcionários trabalhavam em um “sistema coordenado”, com todos os seus esforços separados mas interdependentes, voltados para as metas da empresa. Consequentemente, cada área funcional é uma peça de um sistema maior, e a coordenação entre as peças é essencial para a execução bem-sucedida da estratégia. (HARRISON, 2005, p. 226)

2. Reforçar parceria com a mídia: Embora já possua relações estabelecidas com a mídia (ver item 2.5), a equipe de Comunicação da Santa Casa, precisa reforçar este relacionamento não só no sentido se aumentar a presença no noticiário positivo, mas também com o objetivo de obter ganhos estratégicos a partir de seus resultados. Harrison (2005) justifica tal ponto de vista dizendo que “as organizações devem considerar parcerias com PIs que sejam estrategicamente importantes. Isso significa que eles têm um impacto importante na empresa e em seu sucesso futuro” (2005, p.216). Para o autor, a mídia “age como um ‘cão-de-guarda’ para a sociedade. É uma força de comando para controle das atitudes do público em geral em relação às organizações” (2005, p. 223). Os executivos têm pesadelos ao pensar que suas empresas podem se tornar vítimas do próximo programa (...). Por outro lado, uma mídia bem administrada pode ter um impacto positivo na imagem de uma empresa. (HARRISON, 2005, p. 223)


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Desse modo, a fim de sistematizar e tornar explícito o alinhamento entre a área de Relacionamento com a Imprensa e o Planejamento Estratégico da organização, este estudo propõe a implementação dos seguintes processos e ferramentas:

4.2.4.1 Elaboração e controle de metas O presente estudo sugere que a área de Relacionamento com a Imprensa da Santa Casa utilize as informações constantes na análise SWOT30 (ver Figura 3) da organização para orientar o trabalho de elaboração e transmissão de mensagens à mídia, e controle de metas. As forças e oportunidades da organização devem inspirar as mensagens de press-releases, notas e todo contato com a Imprensa, a fim de que gerem vantagem competitiva à organização, controlem e minimizem os aspectos voltados às fraquezas e ameças da instituição. O trabalho de Relacionamento com a Imprensa deve se inspirar ainda nos temas estratégicos da Santa Casa e seus objetivos (ver Figuras 4 e 5). Paulo Cezar de Souza Rodrigues31 entende que a área de Comunicação da Santa Casa têm importância no cumprimento dos objetivos de “Aumentar a satisfação e fidelização dos clientes” e “Estimular demandas para os serviços e produtos”, presentes no Planejamento Estratégico da organização. Seguindo na linha de apontamentos de temas estratégicos que podem constar nas divulgações para a mídia, Stigger e Lersch (2006), como já citado neste estudo, reforçam a orientação anterior: Entendemos que, a partir deste ano de 2006, é preciso alterar o foco de marketing e comunicação da Casa, privilegiando também as informações sobre o serviço – ainda a maior parte do total de suas atividades – que a Instituição presta aos clientes do SUS, hoje o estrato social que representa a clientela da histórica misericórdia da Santa Casa.

Ricardo Minotto32 ainda recomenda outros pontos fortes que deveriam ser mais explorados: a grande participação da Santa Casa no atendimento local e o fato de a insituição ser um hospital universitário. Para ele, o intensidade dessas mensagens na mídia: 30

A Análise SWOT (Strengths, Weaknesses, Opportunities, Threats) é uma ferramenta utilizada para fazer análise de cenário (ou análise de ambiente), sendo usado como base para gestão e planejamento estratégico de uma corporação ou empresa, mas podendo, devido a sua simplicidade, ser utilizada para qualquer tipo de análise de cenário, desde a criação de um blog à gestão de uma multinacional. É um sistema simples para posicionar ou verificar a posição estratégica da empresa no ambiente em questão. A técnica é creditada a Albert Humphrey, que liderou um projeto de pesquisa na Universidade de Stanford nas décadas de 1960 e 1970, usando dados da revista Fortune das 500 maiores corporações. Wikipédia. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/SWOT> Acesso em: 19 jul. 2010 31 Entrevista concedida ao pesquisador (passim). 32 Entrevista concedida ao pesquisador (passim).


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traria um maior reforço na imagem da Santa Casa, consolidando seu papel como uma organização social, comprometida com o bem-estar da sociedade e com a saúde das pessoas de Porto Alegre e do Estado do Rio Grande do Sul. (...) também traria reforço na imagem de um organização preocupada com a geração de conhecimento, em proporcionar as melhores alternativas terapêuticas para a população.

As metas deverão ser controladas e revisadas mensalmente e semestralmente, em reunião com o líder da área de Comunicação e sua equipe, tendo este departamento total autonomia nas gestão deste processo. Esta independência se justifica pelo mesmo motivo o qual leva os jornalistas a serviço de uma corporação ditarem o modo como vão abordar a imprensa ou como vão redigir um press-release. Para Mafei (2005), “o profissional (de Relacionamento com a Imprensa) dos tempos atuais deve abrir mão de ser apenas um instrumento para divulgações de seu assessoriado para se reconhecer, então, como um articulador estratégico” (2005, p. 27). Consciente de seu papel nas políticas institucionais de comunicação, o jornalista-assessor atua como gerente de todo um processo para garantir a visibilidade e a imagem da instituição. O que se espera deste profissional é o auto-conhecimento e a percepção clara do papel da instituição e de sua inserção na sociedade. (CALDAS, 2003, p. 309)

Figura 3 – Análise SWOT

Fonte: Wikipédia. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/SWOT> Acesso em: 19 jul. 2010


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Figura 4 – Estratégias Santa Casa

Fonte: Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre


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Figura 5 – Mapa Estratégico Santa Casa

Fonte: Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre

4.2.4.2 Inclusão das metas nos indicadores do Balanced Scorecard Tendo em vista que as metas elaboradas a partir das proposições do item 4.2.4.1 estarão alinhadas ao Planejamento Estratégico da Santa Casa e trabalharão no sentido de gerar vantagem competitiva à organização, este estudo sugere a inclusão das principais delas entre os indicadores do Balanced Scorecard (BSC)33 (ver Figura 6) da instituição. Tal proposição se justifica pelo fato de que, segundo Diehl (2004), “a ideia central do Balanced Scorecard é o desdobramento da estratégia em indicadores, através de quatro perspectivas interrelacionadas: financeira, clientes, processo e aprendizagem” (2004, p. 94). Ainda para Diehl (2004), a composição correta de indicadores permitirá que a organização implemente a estratégia de forma mais adequada. Para ele, “uma das maiores virtudes do BSC é o vínculo

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O Balanced Scorecard é uma metodologia de medição e gestão de desempenho desenvolvida pelos professores da Harvard Business School, Robert Kaplan e David Norton, em 1992. Os métodos usados na gestão do negócio, dos serviços e da infra-estrutura, baseiam-se normalmente em metodologias consagradas que podem utilizar a TI (tecnologia da informação) e os softwares de ERP como soluções de apoio, relacionando-a à gerência de serviços e garantia de resultados do negócio. Wikipédia. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Balanced_scorecard> Acesso em: 19 jul. 2010


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explícito feito entre as medidas de desempenho e a estratégia da unidade de negócio” (2004, p. 94). Este estudo entende que tal implementação auxiliará na avaliação de desempenho individual da área de Relacionamento com a Imprensa, além de contribuir na medição das contribuições desta mesma área para os objetivos estratégicos da Santa Casa. Em reunião semestral descrita no item a seguir (4.2.4.3), uma avaliação deverá ser conduzida pelas áreas de Planejamento Estratégico e Comunicação a fim de determinar as modificações que serão aplicadas ao BSC, no que diz respeito às metas definidas pela a área de Relacionamento com a Imprensa. O controle desse processo deverá ser feito em conjunto pelos mesmos departamentos. Figura 6 – BSC – Balanced Scorecard

Fonte: Wikipédia. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Balanced_scorecard> Acesso em: 19 jul. 2010

4.2.4.3 Criação de um Comitê de Relacionamento com a Imprensa Conforme Ivo Stigger34, a área de Comunicação da Santa Casa realiza reuniões mensais com a alta direção da organização e quinzenalmente com todas as diretorias. Há 34

Entrevista concedida ao pesquisador (passim).


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ainda um conselho editorial, formado para discutir o conteúdo da revista institucional, e um comitê gestor, envolvendo todas as diretorias, para gerir a produção das ferramentas de comunicação interna. A proposição deste estudo é que seja criado uma ocasião formal específica para discutir o processo descrito no item 4.2.4.2, com realização semestral.


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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir do estudo de caso realizado com o hospital Santa Casa de Porto Alegre e guiado pelos objetivos preestabelecidos, é possível apresentar as seguintes considerações: •

A atenção que os líderes da administração estratégica da organização dão à mídia contribui para que o trabalho realizado pela área de Comunicação seja visto como relevante, necessário e estratégico.

É amplamente satisfatória a importância que os mesmos profissionais conferem à imagem da instituição e à contribuição que a equipe de Comunicação dá no sentido de maximizar pontos fortes e minimizar fraquezas da Santa Casa. Conforme vimos neste estudo, isso para Lopes (2000) é de extremo valor uma vez que “um dos fatores fundamentais para o sucesso de uma estratégia de relacionamento com a mídia é a importância que a alta direção da empresa dá a esta atividade” (2000, p. 85).

Considera-se igualmente benéfico para a organização a relevância que a administração estratégica da organização atribui à área de Comunicação, especificamente ao Relacionamento com a Imprensa, foco deste estudo. Ricardo Minotto, atual diretor financeiro e de planejamento da Santa Casa, é categórico ao dizer que: A assessoria de imprensa tem um trabalho de manutenção das relações com a mídia que permite total transparência do que existe na Santa Casa, repassando informações, de modo que a imprensa fique informada da forma como a organização trabalha e dos valores que aquim são compartilhadas. Há uma compreensão de parte da mídia da seriedade do trabalho que é feito aqui.

No que diz respeito à relação entre às áreas de Planejamento Estratégico e Relacionamento com a Imprensa da Santa Casa, é possível considerar os seguintes aspectos: •

Há uma forte relação tácita entre ambos os departamentos, os quais trocam informações, preocupações e aprendizados em reuniões periódicas ou em telefonemas e encontros casuais, estes quase diários. Corrobora para esta afinidade entre as áreas o fato de que Ricardo Minotto possui doutorado na área de Comunicação e que Ivo Stigger, jornalista e gerente de Comunicação da organização, defendeu artigo de MBA no qual defendeu a contribuição da comunicação para a consolidação das diretrizes estratégicas da organização.

É possível constatar no Planejamento Estratégico do ciclo 2009/2013, vigente no período deste estudo, que a influência da mídia foi decisiva para ajustes na direção


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estratégica da organização. Tendo a opinião de um jornalista em programa radiofônico como principal determinante, a preocupação com a responsabilidade social da instituição passou a ser considerada como um dos três temas estratégicos. Além disso, a “misericórdia” tornou-se um valor organizacional da instituição. •

Contudo, o presente estudo considera que o atual alinhamento entre a Comunicação e a administração estratégica da Santa Casa requer melhorias. O trabalho da equipe de Relacionamento com a Imprensa da organização só passará a gerar vantagem competitiva evidente a partir da implementação de atividades sistemáticas, contínuas e explícitas. Com isto posto, a maior evidência do presente estudo de caso é que, mesmo em uma

organização como a Santa Casa de Misericórdia, onde a Comunicação é valorizada pela alta direção, alguns processos precisam ser implementados a fim de incorporar esta área à administração estratégica da organização. “Numa perpectiva moderna”, como introduz Kunsch (2003), a Comunicação precisa “demonstrar sua contribuição também como um valor econômico para as organizações”. Considerando a imprensa um público interessado externo com alto grau de importância, pode-se citar Harrison (2005), para quem “tanto os públicos interessados internos como os externos influenciam a decisão estratégica. A influência é proporcional ao poder econômico, político e formal de cada um”. Aplicando conceitos da administração à área de Comunicação, este estudo propõe que o Relacionamento com a Imprensa da Santa Casa passe a medir seus resultados por meio de metas baseadas na análise SWOT da organização; incorpore ao BSC parte dessas metas; e passe a avaliar, em conjunto com os responsáveis pelo Planejamento Estratégico, a contribuição dos resultados do departamento para a organização em uma reunião chamada Comitê de Relacionamento com a Imprensa.


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APÊNDICE A Entrevista com Ricardo Minotto, diretor financeiro e de planejamento da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre Como e com que frequência você acessa notícias produzidas pela Imprensa (impressa, rádio, tevê ou Internet) sobre o setor de atuação de sua organização? Diariamente, pelo menos no início da manhã e, eventualmente, ao meio-dia e início da tarde. Como e com que frequência você acha que seus colegas de mesmo nível hierárquico acessam notícias produzidas pela Imprensa sobre o setor de atuação de sua organização? Penso que sim. Pelo menos uma vez ao dia todos se atualizam. O acesso é direto ao veículo ou se dá por meio de alguma ferramenta da Santa Casa? Ambos. Pelos meios de comunicação ou pelo clipping disponibilizado pela área de Comunicação. É feita alguma análise por período? Sim, por inserções na mídia, com ajuda de uma empresa terceira. Com base neste relatório, já foi feito algum pedido da alta direção por mudança? Em 2009, com mais frequência. Atualmente, desde que a área de Comunicação está trabalhando de forma separada do Marketing, essa demanda não existiu mais. Mas sempre que há um produto ou serviço novo ou se faz necessária uma ação preventiva, há uma sinalização à área de Comunicação. Quando você lê uma notícia na Imprensa sobre o setor de atuação de sua organização, o quanto você confia no que está lendo? Depende a fonte. Alguns jornalistas já tem um certo estigma... mas de uma forma geral, há uma plena confiança. Na maioria dos casos, qual é a importância das notícias produzidas pela Imprensa sobre o setor de atuação de sua organização para o cotidiano deste mesmo setor? É similar. A imprensa tem uma grande confiabilidade. Determinados jornalistas acabam criando interpretações equivocadas, ao nosso ver. Nos últimos cinco anos (ou desde que você está na organização) a sua organização já enfrentou alguma crise com citação negativa das marcas ou da organização na Imprensa? Relate a contribuição dada pela área de Relacionamento com a Imprensa. Se eu fosse graduar de zero a 10, não teríamos nenhum com gravidade 10. Mas fatos mais intermnediários, houve, sim. Há poucos dias, tivemos o fato de um falso médico circulando pelos corredores da Santa Casa, o que gerou uma repercussão na Imprensa, até com uma ampliação maior do que, ao nosso ver, o fato mereceria. Neste caso, a atuação da área de Assessoria de Imprensa foi extremamente positivo. A atuação dela frente aos meios de comunicação permitiu a adequada compreensão para tornar aquele fato um episódio pontual e não como um fato que colocaria em cheque toda credibilidade do sistema de segurança da instituição, e o impacto que isso teria na prestação dos serviços à população. Há a situação em que a nossa área de assesoria de imprensa fica sabendo do propósito de um veículo de imprensa dar determinado enfoque a um fato. Não escondemos nada, mas


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trabalhamos para dar o devido entendimento aos fatos. A assessoria de imprensa tem um trabalho de manutenção das relações com a mídia que permite total transparência do que existe na Santa Casa, repassando informações, de modo que a imprensa fique informada da forma como a organização trabalha e dos valores que aquim são compartilhadas. Há uma compreensão de arte da mídia da seriedade do trabalho que é feito aqui. Relate alguma experiência em que as áreas envolvidas com o planejamento estratégico da organização tomaram alguma decisão baseada em uma notícia produzida pela Imprensa? Claro. A mídia nos sinaliza uma série de informações úteis. A própria construção do Planejamento Estratégico se utilizou de dados da imprensa como cenário, economia, tendências da economia, aspectos relacionados ao comportamento da sociedade, perfil da população, escolaridade, demandas de doenças, etc. A mídia tem sido rica nesse sentido. Ela pode não impactar rapidamente, mas cria um arcabouço de informações altamente importante. Informações de outros hospitais, sobre excesso de pacientes, etc., nos ajudam a tomar decisões no sentindo de absorver demandas ou, no mínimo, um alerta, para atuar de forma preventiva. Há um trabalho de assessoria de imprensa muito forte no sentido de evitar o uso de uma determinada informação de forma equivocada. Eles trabalham para que a informação seja bem compreendida e a complementam com os esclarecidos técnicos adequados, evitando que haja uma interpretação precipitada. Cite três tipos de informações da Santa Casa que se divulgados em alguma notícia trariam benefício à reputação da organização. Primeira: a grande participação da Santa Casa no atendimento local, tanto no que diz respeito ao atendimento de plano de saúde particular, como SUS. A organização tem uma participação relevante na eficiência e eficácia do sistema de saúde estadual e que não é refletido em sua visibilidade e exposição externa. Isso tanto para a população, como também para empresários e o setor de saúde. Se isso acontecesse, traria um maior reforço na imagem da Santa Casa, reforçando seu papel como uma organização social, comprometida com o bem-estar da sociedade e com a saúde das pessoas de Porto Alegre e do Estado do Rio Grande do Sul. Em segundo lugar, a Santa Casa é um hospital universitário e aqui se gera ciência, se gera conhecimento. Aqui, temos uma preocupação com a qualidade e a segurança dos procedimento médico-hospitalares por ser um hospital-escola. Vejo que a organização só tem esse entendimento das pessoas que estão diretamente relacionadas ao processo. Vejo que não há essa compreensão geral. Se isso fosse diferente, também traria reforço na imagem de um organização preocupada com a geração de conhecimento, em proporcionar as melhores alternativas terapêuticas para a população. Agora, isso divulgado em demasia, traria um excesso da demanda gerada. Uma terceira questão que poderia gerar notícias positivas é que a organização têm uma capacidade de atendimento ao SUS ociosa. A Santa Casa poderia contribuir mais com o SUS. Só não o faz pela limitação orçamentária desse sistema. Isso não é uma crítica aos gestores, mas é uma constatação. E isso ocorre com outros grandes hospitais de Porto Alegre. Como se dá a divisão de recursos da Santa Casa? A Santa Casa oferta 60% de seus serviços ao SUS, que contribue com 30% do faturamento. Esse segmento SUS é deficitário. Cada R$ 100 que o hospital gasta para atender o paciente


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SUS, o Estado o remunera com R$ 70. Para que a Santa Casa obtenha autossutentação e equilíbrio nas suas contas, ela oferta os outros 40% de sua capacidade para os sistema de particular e convênio que têm uma margem de contribuição positiva. Esta margem permite investimento e qualificação da Santa Casa e também auxilia na prestação de seviços ao SUS. Ao mesmo tempo, a gente entende que todo conhecimento gerado aqui ele deve ser dirigo a toda população, e não só ao sistema pagador. Na sua opinião, qual a contribuição que a área de Relacionamento com a Imprensa deu para o atual planejamento estratégico de sua organização? Pesquisas relacionadas às imagens das organizações, como a Marcas de quem decide, do Jornal do Comércio, ou Top of Mind, da Revista Amanhã, são utilizadas como input para o Planejamento Estratégico. As percepções daquele público são importantes para a organização. A influência de comentários negativos de jornalistas sobre o valor da misericórdia foi realmente decisivo para o atual Planejamento Estratégico? Sim. Foi uma constatação importante. Isso gerou um reposicionamento interno, sim. E repercutiu tanto interna como externamente. A partir dessa manifestação externa, foi feita uma compreensão disso a partir dos tomadores de decisão do âmbito interno, com redefinição de plano ou reposicionamento de imagem, e percebeu-se a necessidade de resgatar e explicitar o valor misericórdia para as diferentes partes interessadas. Isso gerou, inclusive, uma redefinição da marca, do logo da Santa Casa. A partir dessa reconfiguração interna, foi feito um retorno ao público externo, buscando esse reposicionamento. Houve necessidade de esclarecer para a população que a Santa Casa nunca deixou de ser Santa Casa de Misericórdia. Se a sua organização é citada (positiva ou negativamente) por alguma notícia produzida pela Imprensa, de que forma a alta direção toma conhecimento? Pelo jornal, de manhã cedo, ou por sinalização da assessoria de imprensa. Com que frequência a alta direção de sua organização dedica tempo à publicação/planejamento a respeito de notícias publicadas na Imprensa sobre sua organização ou sobre o seu setor de atuação? Nossa assessoria está monitorando e alimentando os veículos diariamente. Sempre que há a necessidade da comunicação de algo específico eles são envolvidos e sinalizamos a necessidade. Nos últimos três anos, tem se trabalhado muito forte a comunicação com o público interno. Podemos atribuir a decisão da Santa Casa em envolver-se com o PGQP ao embate que houve na Imprensa sobre falta de recursos e falta de qualificação da gestão? Sim, toda a discussão que se teve em torno do tema, há quatro ou cinco anos, motivaram a Santa Casa a ter até um papel de protagonismo na busca pela profissionalização da gestão dentro dos sistema de saúde como um todo. Mas a questão é mais complexa que isso, ela é multifatorial: tem a limitação de recursos, de realidades diferentes, etc.


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APÊNDICE B Entrevista com Paulo Cezar de Souza Rodrigues – Coordenador do Escritório da Qualidade, Responsável pela elaboação, controle e execução do planejamento estratégico do hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre Como e com que frequência você acessa notícias produzidas pela Imprensa (impressa, rádio, tevê ou Internet) sobre o setor de atuação de sua organização? Quando comecei a trabalhar, procurava me informar em casa, pelo menos uma vez por semana, nos principais veículos de comunicação. Era uma busca pessoal. Hoje, eu recebeo o clipping da equipe de Relacionamento com a Imprensa e passei a acompanhar diariamente. Além disso, tenho acessado blogs e o portal do Luis Nassif. Nesta portal, participo de discussões sobre políticas públicas. Como e com que frequência você acha que seus colegas de mesmo nível hierárquico acessam notícias produzidas pela Imprensa sobre o setor de atuação de sua organização? Pelo fato de a alta direção participar da elaboração e aprovação das divulgações da equipe de Relacionamento com a Imprensa da organização, imagino que o acompanhamento deva ser diário atualmente. O nível de envolvimento dos meus outros colegas com as notícias do setor ou da Santa Casa é proporcional ao envolvimento deles com o planejamento estratégico da casa. Quanto mais envolvido com alguma prática do planejamento estratégico, mais próximo ele estará das notícias sobre o setor. Quando você lê uma notícia na Imprensa sobre o setor de atuação de sua organização, o quanto você confia no que está lendo? Partindo do pressuposto que as informações são repassadas pelas organizações, eu confio nas informações. Principalmente dos grandes veículos de comunicação. O que se percebe é que ou pelo espaço reduzido na imprensa ou pelo nível de conhecimento do jornalista, eu vejo que algumas vezes o enfoque que nós procuramos dar não foi exatamente o mesmo da matéria publicada. Eu acho isso negativo. Na questão dos blogs, tu precisas ter um cuidado com a autoria. Quando tu te referes à incorreções ou à forma de colocar? Me refiro à precisão da informação. Em relação aos colegas de mesmo nível hierárquico, o quanto eles confiam nas notícias que leem? Em primeiro lugar, acho importante colocar que vejo nesta questão uma falta de ação de nossa parte por não transmitir corretamente para o mercado os valores da organização, o valor da misericórdia. Ainda que nós estivéssemos respeitando no nosso dia-a-dia o valor da misericórdia, percebemos que o mercado e a imprensa, não haviam entendido esta mudança. Por uma necessidade que tínhamos de ganhar mercado – não pelo lucro, mas pela possibilidade de gerar resultados financeiros suficientes para conseguir manter o atendimento ao SUS – talvez tenhamos “pesado a mão” em mostrar a qualidade de nosso atendimento e esquecido de equilibrar a questão da misericórdia. A partir daí, percebemos que os veículos de comunicação passaram a nos ver como uma organização que não desejava mais atender às populações mais carentes.


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Não é uma contradição a organização querer ser vista como um hospital de misericórdia quando é mostrando o nível de qualificação – de pessoal, de procedimentos e de tecnologia – que a Santa Casa atrairá pacientes com recursos suficientes para sustentar o atendimento ao pacientes do SUS? Essa é uma questão para a qual temos um cuidado muito especial. Sabemos que valores devem muito mais ser praticados do que postos em discursos. E a misericórdia é um grande valor da organização, preservado até hoje e está presente na prática diária de todas as Santas Casas do mundo. Esse valor é a vocação e a disposição de atender a todos, sem preconceito, com foco maior nos mais necessitados. Esse é o nosso diferencial competitivo no mercado onde atuamos. Algumas pessoas podem achar contraditório. Mas só temos a qualidade que temos por termos o volume de atendimento que nós temos. É um círculo virtuoso. Nossa excelência no atendimento em geral vem do acúmulo do conhecimento adquirido no atendimento aos pacientes do SUS. Então tu consideras que os teus colegas da organização não tinham um alto nível de confiabilidade na Imprensa porque viam nesta mesma imprensa a imprensa que não compreendia os verdadeiros valores da Santa Casa? Sim, e isso foi ficando até mais forte em determinados períodos, influenciando até na leitura de outras notícias sobre o setor. Tudo por falta de uma ação mais efetiva nossa. Às vezes, a gente procura ver o inferno nos outros. Isso nos causava grande preocupação porque em outros momentos do passado essa mesma Imprensa havia nos ajudado a levantar grandes obras como, por exemplo, o Hospital da Criança Santo Antônio e o hospital Dom Vicente Scherer. E temos exemplos de notícias onde essa desconfiança do valor da Santa Casa fica evidente? Sim, o Antônio Carlos Macedo, da Rádio Gaúcha, foi um dos jornalistas que fez grandes questionamentos em relação à misericórdia. Em um dos casos, a expressão utilizada foi essa: a Santa Casa não é mais de misericórdia. Isso nos acendeu a luz vermelha porque falava de um valor extremamente para nós e de certa forma depunha contra uma história de 206 anos. Nossa preocupação também estava voltada ao impacto que isso poderia causar nos funcionários da organização ou se estes mesmos funcionários não estavam retroalimentando essa impressão da Santa Casa na comunidade. Talvez a gente não tenha tido o discernimento de que essa percepção estivesse se cristalizando aqui mesmo dentro dos nossos muros. Foi neste momento que houve a necessidade de reforçar este valor. Foi neste momento que este valor (o valor da misericórdia), que desde sempre esteve vivo na casa, passou a figurar nas nossas declarações estratégicas. Nos últimos cinco anos (ou desde que você está na organização) a sua organização já enfrentou alguma crise com citação negativa das marcas ou da organização na Imprensa? Relate a contribuição dada pela área de Relacionamento com a Imprensa. Lembro de um caso em que, por uma falha no agendamento de procedimentos, uma paciente do Hospital Santa Clara foi esquecida no bloco cirúrgico. Isso teve uma repercussão negativa na mídia. O acompanhamento da área de Relacionamento com a Imprensa foi decisivo para que a matéria que abordou o assunto saísse já com o posicionamento da Santa Casa e uma certa minimização do impacto negativo.


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Um outro caso foi o relativo à perda da caixa craniana de uma criança durante um procedimento cirúrgico. Neste caso, mais uma vez tivemos uma atuação efetiva da nossa área de Comunicação, que já sabiam de antemão do ocorrido e atuaram junto à imprensa. Embora o impacto na imagem da Santa Casa tenha sido bastante negativo, até porque não é possível dissociar a repercussão dessa notíca do conjunto de profissionais da organização. Este é o primeiro aspecto. O segundo ponto de vista é o de defesa natural de quando a gente erra, como organização. Nossa posição foi de que aquele caso foi apenas um dos mais de três mil que tínhamos realizado naquele mês. Qual foi o papel da Comunicação? Minimizar e estabelecer este canal de comunicação com a imprensa. Primeiro como um pedido de desculpas e depois de diálogo. Um diálogo entre o jornalista do veículoi e o jornalista da organização, que conhece a profissão mesmo estando do outro lado do balcão. Porque se a própria direção saísse em defesa, por um excesso de ação, poderia ter sido mais prejudicial ainda. E isso desmereceria todo o trabalho de uma área (Comunicação) que está ali para este tipo de atividade. Relate alguma experiência em que as áreas envolvidas com o planejamento estratégico da organização tomaram alguma decisão baseada em uma notícia produzida pela Imprensa? Temos um bom exemplo, sim. Entre 2004 e 2005, já havia uma discussão na área da saúde sobre o que seria a causa das deficiências do setor à época. De um lado estavam os que defendiam que o que faltava eram recursos – principalmente profissionais e entidades de classe – e, de outro lado, os que atribuiam os problemas à falta de gestão – em especial, os Governos. Grande parte desse embate se dava pela imprensa. Foi com este cenário que a organização estabaleceu uma profissionalização da gestão, para que pudéssemos passar a mensagem de forma muito clara para a sociedade e para os gestores de que os recursos que nós obtínhamos com a venda dos serviços e com os projetos financiados pelo Governo eram transformados em produtos e serviços à disposição da população. A partir disso, criamos uma área de Projetos, com especialização reconhecida internacionalmente. Uma segunda ação da Santa Casa foi assumir uma posição de protagonista, em conjunto com a Fundação Gerdau, no sentido de qualificar sua gestão e apresentar este modelo de qualidade aos demais hospitais. Com a ajuda de uma consultoria interna e de uma empresa ligada ao PGQP, a Santa Casa de Porto Alegre, por meio de seu escritório de qualidade, desenvolveu uma metodologia para ser aplicada aos hospitais do interior com vista a melhorar sua gestão. Isso acabou sendo reconhecido pelo Ministério da Saúde como um modelo de âmbito nacional. Esse embate recursos x gestão não teria tido a envergadura que tece se não fosse a imprensa? Com certeza. Sem a mídia, essa discussão ficaria somente sendo feita entre Governo e as entidades do setor, cada um ao seu tempo e com suas ferramentas. Os órgãos de comunicação, como caixas ressonantes, ampliaram a discussão e a mediaram. Sem isso, até corre-se o risco de não separar o que é negócio do que é responsabilidade social. A sua organização possui informações que, caso fossem divulgadas em alguma notícia, trariam benefício à reputação da organização e à sociedade e/ou ao setor de atuação?


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Que obstáculos...? Utilizamos este canal de forma muito intensa. Mas acho que podemos avançar passando a utilizar alguns canais mais modernos da tecnologia da informação, como a nossa intranet, num modelo de interação entre as áreas. Hoje, isso está restrito ao e-mail ou à conversa. Na sua opinião, qual a contribuição que a área de Relacionamento com a Imprensa deu para o atual planejamento estratégico de sua organização? Se a área de Relacionamento com a Imprensa não existisse, o atual Planejamento Estratégico seria outro? Seria, certamente seria. No que diz respeito à comunicação dos Temas Estratégicos (Ações em saúde, Autossustentação e Responsabilidade Social) para o ambiente externo. E essa importância se dá especialmente no nível dos objetivos estratégicos do Planejamento Estratégico. Os itens “Aumentar a satisfação e fidelização dos clientes” e “Estimular demandas para os serviços e produtos”. Se nós não tivéssemos a área de Comunicação, estas iniciativas não existiriam. Elas estariam, no máximo, um degrau acima: seriam “Estabelecer um canal de comunicação”. E já foi assim no passado. Em períodos anteriores, tínhamos ali “Estabelecer um departamento de comunicação...”. Anteriormente, tínhamos apenas uma área de Marketing, que acumulava as funções. Por uma demanda do principal funcionário de comunicação da casa, de que existisse uma área com identidade própria para relacionar-se com a imprensa, essa área de Comunicação foi estabelecida. Se a sua organização é citada (positiva ou negativamente) por alguma notícia produzida pela Imprensa, de que forma a alta direção toma conhecimento? Pelo e-mail com o clipping e pela intranet. Com que frequência a alta direção de sua organização dedica tempo à publicação/planejamento a respeito de notícias publicadas na Imprensa sobre sua organização ou sobre o seu setor de atuação? Com o líder da área de Comunicação, meu contato é de mais de duas vezes por semana. Que mudanças o Planejamento Estratégico sofreu a partir da “questão misericórdia”? O tema estratégico “Autossustentação” surgiu de uma convicção das lideranças da Santa Casa de que isso nos daria autonomia para decidir pelo futuro da organização. Essa autonomia nos fez decidir seguir nossa missão e transformar a “Responsabilidade Social” também um tema estratégico. Assim, ao colocar a “Responsabilidade Social” ao lado de “Autossustentação” e “Ações em Saúde”, como direcionadores estratégicos, a organização estava sinalizando que continuaria seu modelo de negócio de captação de recursos em convênios e particulares, mas sem deixar de lado o valor da misericórdia.


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APÊNDICE C Entrevista com Ivo Stigger, gerente de Comunicação da Santa Casa 1. Como se deu a criação da atual área de Relacionamento com a Imprensa, dentro da Comunicação da Santa Casa? Quando eu cheguei na Santa Casa, em abril de 1999, a área de Comunicação estava subordinada à área de Marketing. O departamento de Assessoria de Imprensa da Santa Casa foi criado, de forma pioneira no Estado, no início dos anos 80. Passaram por aqui jornalistas como Danilo Ucha, Kenny Braga e Rogério Beidacki. Lembro-me que no meu primeiro dia aqui na Santa Casa já escrevi o meu primeiro release. Era sobre um assunto de interesse geral da comunidade. Eu tinha assinado o release com o meu nome e registro profissional, como jornalista responsável. O atual gerente de Marketing à época, a quem eu estava subordinado, achou muito bom o material, mas pediu que eu, em vez de assinar como Assessoria de Imprensa, colocasse, ao final do texto, Departamento de Marketing. Eu disse a ele que um release assinado pela Assessoria de Imprensa sempre será melhor recebido pelos jornalistas nas redações. A área de Marketing sempre tem a imagem de que ele está à serviço da marca e da venda. Na Assessoria de Imprensa há um compromisso absoluto com a verdade dos fatos. Então, pedi a ele que mantivéssemos o crédito do material à Assessoria de Imprensa. O atual gerente concordou e, a partir dali, todos os materiais jornalísticos passaram a ser assinados pela Assessoria de Imprensa. Em 2007, quando houve uma mudança da liderança da área de Marketing, eu pedi à direção da organização que aproveitássemos a mudança e separássemos a área de Comunicação do Marketing, tornando-a diretamente ligada à Provedoria e à Diretoria Executiva. E foi isso que aconteceu. Hoje, o departamento de Comunicação, separado do Marketing, é responsável por Comunicação Interna e Assessoria de Imprensa. E entendo que, nestes 11 anos de Santa Casa, estou fazendo um belo trabalho de consolidação, manutenção e de ampliação da imagem da Santa Casa junto à comunidade. Claro que apoiado e respaldado por uma história de dois séculos de serviços à comunidade. É muito fácil ser Assessor de Imprensa de uma organização que tem essa credibilidade. Além da melhor receptividade dos jornalistas para releases assinados pela Assessoria de Imprensa, quais outros benefícios à organização trouxe o fato de a área de Comunicação ser independente do Marketing? Desde que a área de Comunicação era ligada ao Marketing nunca houve qualquer tipo de restrição ao trabalho que desenvolvi. O líder da área de Marketing à época era um cara inovador, ele foi o cara que criou esse tipo de departamento em hospitais. Arrisco dizer que fomos copiados no Brasil. Imagine criair isso em um período em que mais de 90% dos atendimentos da organização era de indigentes. Então, naquela época não havia problema nessa subordinação, mas pensando no futuro, na situação que estamos vivendo hoje, acho muito importante que esta comunicação que fazemos à comunidade esteja diretamente ligada à diretoria geral, que é o braço executivo da Provedoria, que é a autoridade máxima da casa. Isso é importante para que fique claro que o que nós divulgamos para a mídia está ligado à verdade dos fatos. É claro que estamos trabalhando pelos interesses da casa, mas a instituição tem esse interesse histórico de trabalhar com a verdade. Não só nossas vitórias e nossas conquistas, mas também nossos fracassos e nossos erros. 2. Você considera sua área e as atividades que ela gerencia relevantes para a


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administração estratégica da organização? Por quê? Não saberia te responder isso com propriedade, mas posso afirmar que tudo o que nós fazemos aqui está em absoluta sintonia com as estratégias de autossustentação e desenvolvimento da Santa Casa. Em 2009, distribuímos 187 releases para a mídia do Estado – isso dá quase um release a cada dois dias. Em 11 anos, tempo que estou aqui, já aprovei a divulgação de quase dois mil releases. Neste volume todo, algum erro pode ser cometido. Mas sempre quando isso acontece, reconhecemos e procuramos nos retratar. Eu tenho orgulho de dizer que nós consolidamos a credibilidade da Santa Casa. Hoje, todo release nosso a Imprensa publica sabendo com absoluta convicção que aquilo que estamos dizendo é verdade. Tenho orgulho disso porque essa é a essência da nossa profissão. Entendo que é essa a principal contribuição que damos às estratégias da organização. Carlos Drummond de Andrade, em seu poema Confidência do Itabirano, diz que Itabira, sua cidade natal, é apenas um retrato na parede, mas como dói. Dói porque é a Itabira da sua infância, da sua adolescência, portanto é a Itabira dos seus sonhos de menino e dos seus projetos de adolescente. Dói porque muitos desses projetos, muitos desses sonhos, desses ideais, não foram concretizados ao longo da vida. E à medida que tu te aproximas do teu limite, se tu fizeres um balanço da vida, é óbvio que tu tiveste muitos sonhos e muitos ideais e muitos deles não se concretizaram. Mas mais uma vez eu posso dizer olhando para este quadro na parede com o Planejamento Estratégico da Santa Casa, como se fosse o retrato de Itabira. Essas estratégias 2009/2013 não são só um enfeite na parede. E não doem. São um desafio permantente. Nos fazem pensar se as nossas ações de divulgação para a Imprensa estão dentro dos objetivos estratégicos da Santa Casa. E além de não doer, às vezes até nos alegram. Porque vemos que a gente realmente está se relacionamendo bem com a mídia, com este meio, que nos liga à comunidade. Estamos cumprindo com nossa missão de manter a comunidade bem informada. De que forma a tua equipe está alinhada a esse Planejamento Estratégico? Como jornalistas da casa, estamos atentos e participamos de todo e qualquer evento da organização. Somos os arautos das boas novas para o público interno e para as comunidades. Eventualmente, novas nem tão boas assim. Dentro desse contexto, posso dizer que, sim, nós estamos alinhados a este Planejamento. Estamos sempre alinhados às coisas que definem ou reorientam às diretrizes da casa. Há alguma sistemática de alinhamento das divulgações da Assessoriade Imprensa com o Planejamento Estratégico? Com os 187 releases divulgados, tivemos 1.840 presenças na mídia ano passado. O hospital em segundo lugar em termos de inserção tem menos de um terço da nossa visibilidade. Temos nossas metas e nossos indicadores e estamos reavaliando-os para 2011. Atualmente, 97% ou 98% do que nós divulgamos são informações da nossa rotina. É feita alguma análise do que será divulgado e do que foi publicado do ponto de vista de mensagens estratégicas? Existe a avaliação tradicional da empresa de clipagem contratada para sabermos o volume de notícias positivas, negativas e neutras. Quanto aos releases, eu faço essa avaliação e a nossa equipe tem reuniões semanais, mas acho que esta é uma área na qual poderíamos ser mais críticos. 3. No dia-a-dia, como se dá o relacionamento entre as áreas de Relacionamento com a Imprensa e as áreas envolvidas no planejamento estratégico da organização?


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Há algum relatório/documento entregue periodicamente a esta área? Há alguma demanda deles? Nosso contato é permanente, quase diária, com a diretoria geral. Há uma reunião mensal com o diretor geral e quinzenalmente com todas as diretorias, inclusive com o Marketing. Para a revista institucional, temos um conselho editorial, e para as ferramentas de comunicação interna, temos um comitê gestor, envolvendo todas as diretorias. Não temos nada para assessoria de imprensa ainda.


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ANEXO A Confidência do Itabirano Carlos Drummond de Andrade Alguns anos vivi em Itabira. Principalmente nasci em Itabira. Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro. Noventa por cento de ferro nas calçadas. Oitenta por cento de ferro nas almas. E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação. A vontade de amar, que me paralisa o trabalho, vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes. E o hábito de sofrer, que tanto me diverte, é doce herança itabirana. De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço: esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil, este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval; este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas; este orgulho, esta cabeça baixa... Tive ouro, tive gado, tive fazendas. Hoje sou funcionário público. Itabira é apenas uma fotografia na parede. Mas como dói!


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ANEXO B


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ANEXO C

Fonte: jornal Zero Hora de 30/05/2010 (p. 15)


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