JornalCana — Edição 266 / Março 2016

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JC 266

3/2/2016

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PESQUISA & DESENVOLVIMENTO

Março 2016

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ENTREVISTA - Francisco Dutra Melo, pesquisador

Pesquisa do Nordeste bate de frente com a crise do setor Trabalho de incubadora tem foco na síntese de polímeros e compósitos derivados da cana-de-açúcar LUIZ MONTANINI, DO R ECIFE, PE

Ao lado de outros quatro companheiros o engenheiro químico Francisco Dutra Melo tem elevado o status da pesquisa e desenvolvimento de Pernambuco. Por meio de estudos em biopolímeros nanocelulósicos bacterianos derivados da cana-de-açúcar o grupo está apostando em inúmeros produtos voltados, especialmente, às áreas médica e farmacêutica, como próteses e curativos que aceleram cicatrizações dos tecidos. Pesquisador oriundo e ainda ativo na UFRPE — Universidade Federal Rural de Pernambuco, com sede no Recife, Dutra Melo e os colegas estão andando resolutos na contramão da crise, investindo nestes subprodutos da cana. Ganhador do Prêmio MasterCana Norte/Nordeste 2015, ele conta nesta entrevista como, à frente da incubadora Polisa Biopolímeros para Saúde, empresa de pesquisa, desenvolvimento, inovação tecnológica, produção e comercialização de polímeros de cana-de-açúcar e seus produtos, encontram muitas dificuldades, mas não desistem. Seu trabalho tem foco na síntese de polímeros e compósitos derivados da cana-deaçúcar e o desenvolvimento de produtos com alto valor agregado a partir do biopolímero, aplicáveis nas áreas de medicina, farmácia, biologia, bioquímica e física. Compósitos, para quem não está familiarizado com o tempo, são materiais de moldagem estrutural, formados por uma fase contínua polimérica (matriz) e reforçada por uma fase descontínua (fibras) que se agregam físico-quimicamente após um processo de cura. JornalCana — Junto com outros pesquisadores da Polisa, o senhor está trabalhando em subprodutos da cana em prol de vários benefícios ao setor. Quais são os principais, e como é que vocês começaram a pensar nesse trabalho? Francisco Dutra Melo — A cana-deaçúcar é uma matéria-prima que proporciona leque muito grande de aplicações. Fala-se que existem mais de mil possibilidades em derivados da cana. Existem alguns estudos avançados na África do Sul e no Brasil e é uma tendência mundial e ambientalmente correta transformar polímeros naturais em carboidratos. Algum tempo atrás, nós conseguimos isolar a bactéria. E a partir daí lançamos um programa de desenvolvimento na área da inovação. Criamos a empresa incubadora e hoje já temos novidade do setor. Quais são as novidades? Existe hoje um direcionamento para a geração de novos produtos. Principalmente

na área da medicina, na clínica médica. E já existe alguns produtos em fase final visando aprovação na própria Anvisa (Agência nacional de Vigilância Sanitária) para liberação do mercado de clínica hospitalar do país. Por exemplo, próteses pra braços, pernas, joelhos, articulações. São várias próteses, inclusive o próprio silicone elaborado a partir da cana-de-açúcar, com a enorme vantagem de ser um silicone natural, podendo ser usado em reparações humanas.

Os curativos podem chegar mais no curto prazo. Acreditamos que dentro de dois anos já se possa fazer. Nos demais, não tenho nenhuma previsão, nem mesmo há empresas que compraram os direitos de produção, especialmente porque ainda estão em testes. Existem pedidos de patentes em nível de Brasil, algo em torno de 6 patentes. A boa notícia é que estamos entrando agora em um ótimo mercado internacional, o maior do mundo, o americano.

Há algum já com aprovação comercial? Aprovação ainda não. Estão na última fase do protocolo clínico, principalmente a linha de curativos. São alternativas naturais bem interessantes, mas que vão eventualmente ter um tempo de processo aí para entrada no mercado. Principalmente as próteses. Isso vai demandar tempo, mas a gente segue nessa busca para levar melhor qualidade de vida às pessoas necessitadas e melhores oportunidades comerciais ao setor.

Com que produto estão entrando nos EUA? Com o resultado da pesquisa nanocelulósica bacteriana, um polímero para aplicações diversas na área da medicina. Mas também precisamos ter paciência para que o produto seja aprovado nos testes e suplante os

O Senhor faz ideia de quanto tempo deve levar para esses produtos chegarem em escala comercial?

O senhor é oriundo do extinto Planalsucar. O que tem visto nestes 30 anos de vivência no setor em termos de mudanças favoráveis e significativas que o setor sucroenergético, especialmente no Nordeste e em Pernambuco teve?

Bem, apenas o fato de o setor nordestino ter tido continuidade é significativo. Acredito que alguns programas que o Planalsucar implantou foram fundamentais para a cultura canavieira. Entre os quais destaco o de melhoramento genético da cana-de-açúcar e o próprio sistema de medição do índice de sacarose. Foram ferramentas imprescindíveis ao desenvolvimento canavieiro no nordeste. Como o senhor vê o setor sucroenergético brasileiro? Ele necessita de uma regulamentação mínima, voltada para a segurança fundiária e de novos investimentos em áreas absolutamente necessárias ao país, como a de geração elétrica pela biomassa. Para o setor nordestino em particular o que o senhor reivindicaria? Um grande programa que inclua investimentos governamentais em ração animal por meio do bagaço hidrolisado, por exemplo, ajudaria tanto os próprios produtores de cana quanto os criadores de algumas reses no agreste e sertão nordestino, que sofrem muito na seca.


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