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ano 18 - edição 59 | novembro de 2021

revista corpo da matéria CURSO DE JORNALISMO PUCPR

A voz deles Pessoas com deficiência (PCDs) utilizam redes sociais para gerar aproximação e inclusão social


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Corpo da matéria Ano 18 - Edição 59 - Novembro de 2021 Revista Laboratório do Curso de Jornalismo PUCPR Pontifícia Universidade Católica do Paraná R. Imaculada Conceição, 1115 Prado Velho, Curitiba PR REITOR

Waldemiro Gremski DECANA DA ESCOLA DE BELAS ARTES

Ângela Leitão

COORDENADORA DO CURSO DE JORNALISMO

Suyanne Tolentino De Souza COORDENADORA EDITORIAL

Suyanne Tolentino De Souza COORDENADOR DE REDAÇÃO/JORNALISTA RESPONSÁVEL

Paulo Camargo (DRT-PR 2569)

COORDENADOR DE PROJETO GRÁFICO

Rafael Andrade

Alunos - 5º Período Jornalismo PUCPR Andre Luiz Festa de Quadros, Beatriz Bleyer de Almeida Martins, Beatriz Garcia Artigas, Beatriz Tsutsumi de Almeida, Bruna Eugenia de Cassia Quaglia Colmann, Brunna Gabardo Roth, Camila Mengarda Acordi, Carlos Vinicius Mazetto Illipronte, Daniela Balieiro Cintra Silva, Diego Diogo dos Santos, Eduarda Fiori Silva Fernandes, Guilherme André Pesch Kruklis, Gustavo Silva Barossi, Herick Pires Lopes, Isabella Serena Demski Casagrande, Isabelle da Silva de Almeida, Isadora Guimarães Mendes Vesguerber, Isadora Picasky Deip, Isadora Vargas Candeia Freitas, Jessica Pretto Varella, Laura Luzzi Siqueira Campos, Lorena Rohrich Ferreira, Lucca Smarrito Marreiros, Luiza Maria Hauer Ruppel, Maria Vitoria Bruzamolin Rodrigues de Oliveira, Mariana Scavassin Vaz Mattos, Nathalia Miguel Brum, Rafael Wolf Teixeira Coelho, Raissa Micheluzzi Ferreira, Rebeca Trevizani de Castro, Ricardo Luiz da Silva, Romano Zanlorenzi, Sabrina de Ramos, Sarah da Silva Guilhermo Galvão, Sophia Becker da Gama, Sthefanny Gabryella Gazarra Borges Pereira, Thamyris Ramos Vieira Candéa, William Zaramella Gonçalves

Imagem de capa: Camila Mengarda Acordi

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SUMÁRIO

Eles não precisam de interlocutores

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Infância roubada

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“Nunca ninguém morreu de dor de parto!”

Prazer, liberdade!

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Olhos da cidade

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Lotados e tensos

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Comida pra quem tem fome

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Revendo nosso lixo

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Diplomas suspeitos

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A internet e o desempenho acadêmico das crianças

Ai, que vergonha!

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Os verdadeiros remédios

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Hábitos alternativos e saúde mental

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Psicologia mental

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Harmonização Facial: Próximo!

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A ascensão do comércio virtual na pandemia

Infiuencers de quatro patas

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Leitura para momentos de caos

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A distância que aproxima

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Muito além do papel

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Arte no corpo

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Pessoas com deficiência (PcD) nas redes sociais espalham o bê-a-bá da inclusão social pela internet Bruna Colmann Brunna Gabardo Isadora Deip Sabrina Ramos Sthefanny Gazarra

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@HEYAUTISTA

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influencer Polyana Sá, 20 anos, é graduanda de Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia. Por conta de seus hiperfocos (no autismo, estes são os interesses restritos), Poly viajou pelo mundo do teatro, do Whoniverse - nome dado ao cenário da série Doctor Who - da matemática, da música e da oratória. Polyana é uma mulher negra, autista e LGBTQIA+: “Por algum tempo eu não gostava muito de algumas dessas características, mas hoje em dia eu me

Arquivo pessoal

Eles não precisam de interlocutores


aceito e uso quem sou pra fazer o que eu faço nas redes sociais, criar o meu ativismo e o meu conteúdo”. Ela sempre esteve presente nas redes, mas brinca que habitava o “underground da comunidade”, pois não costumava se apresentar como autista. Assim como muitas pessoas se renderam ao Tik Tok devido ao ócio da pandemia, Poly também “se jogou” nesta nova rede em seus momentos livres. Entretanto, o desconIsadora Rodrigues, forto gerado pela falta de vídeos de pessoas pretas e com deficiência, em um canal de grande alcance, a levou a produzir alguns conteúdos sobre autismo, sem grandes pretensões. A sua descontração atingiu uma dimensão inesperada e Poly fortaleceu o seu ciberativismo com produções mais densas e aprofundadas a respeito do autismo. “Eu sei que existem muitas pessoas que se encontram no mesmo lugar onde eu já me encontrei um dia e eu posso ser a fonte de informação para ela saber quem é e não ter vergonha.”

descontraídos e bem humorados. Por conta do trabalho que produz, a influencer fez palestras para uma empresa multinacional, universidades e institutos federais, fez uma fala no fórum econômico social da Organização das Nações Unidas (ONU) e integrou o movimento “Vidas Negras com Deficiência Importam”.

“Quanto mais eu e outras PcD falarmos sobre isso, mais lugares vamos ocupar.”

O diagnóstico da influencer chegou apenas aos 16 anos. O desgaste causado pelo masking - capacidade de mascarar o autismo -, gerou problemas de depressão, relacionamentos e autoimagem, o que a levou a buscar auxílio médico. Para a jovem de voz cadenciada e sutil sotaque carioca, o diagnóstico reverberou um grito de liberdade, através dele começou a se conhecer, entender e aceitar quem é. Além disso, encontrar discursos semelhantes nas redes foi fundamental para sua autoestima. “Tudo isso contribuiu para que eu me aceitasse mais e eu não me visse como ser estranho que eu achava que eu era.” O “Hey Autista”, perfil de Polyana nas redes, conta com mais de 10 mil seguidores no Instagram e 28 mil no Tik Tok. O conteúdo da jovem é informativo e ativista, mas a personalidade divertida se reflete em seus vídeos

Influencer @OLHARCOTIDIANO_ A estudante Isadora Rodrigues, de 24 anos, encontrou nas redes sociais um caminho para compartilhar seus conhecimentos e vivências, como mulher negra, feminista e com baixa visão. Em 2014, ela criou o “Olhar Cotidiano”- uma página no Facebook que hoje também conta com um perfil no Instagram. “Muitas pessoas têm dúvidas em como tratar alguém com deficiência, como conversar e outras coisas básicas. Criei a página como um espaço em que eu pudesse desmistificar isso”, comenta. Hoje, o “Olhar Cotidiano’’ soma mais de 5 mil seguidores, considerando a presença nas duas redes sociais. Segundo Isadora, a internet fez com que ela percebesse que não está sozinha, no entanto, o senso de pertencimento não foi experimentado em todos os âmbitos frequentados pela jovem. Durante sua vida acadêmica, sempre foi a única ou uma das poucas pessoas com deficiência nos lugares onde estudou. Quando tinha 15 anos, ela aprendeu a ler e escrever em braille no Instituto São Rafael, em Belo Horizonte, cidade em que mora. A experiência ampliou o contato com pessoas com a mesma deficiência. Isadora conta que aprendeu a se posicionar melhor, a se cobrar mais e a reivindicar um papel que costumava ser de sua mãe: o de sinalizar o que ela mesma precisava.

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Em 2015, Isadora realizou uma de suas maiores aspirações desde a infância: entrar para a faculdade de Direito. A determinação em mudar o mundo foi marcante em sua graduação, e fez com que ela entrasse em contato com o feminismo. Quando se deu conta de que não se sentia representada enquanto mulher com deficiência, em 2019, entrou para o coletivo “Helen Keller”, cujo propósito é reconhecer as vozes, lutas e anseios dessas mulheres. De acordo com Isa, o movimento das pessoas com deficiência é marcante, mas ainda muito branco. Foi a partir dessa noção que ela integrou, em 2020, o “Movimento Vidas Negras com Deficiência Importam”, que une a luta contra o racismo e o capacitismo. Ela também começou, neste período, duas pós-graduações: em Cidadania e Direitos Humanos, e em Advocacia Feminista e Direitos da Mulher. Sobre o capacitismo sofrido, Isadora relata: “Só o fato da gente fazer o básico nos torna heróis, heroínas. Eu sei que sozinha não consigo acabar com esse preconceito, mas quanto mais eu e outras PcD falarmos sobre isso, mais lugares vamos ocupar e fortalecer nossa identidade”.

@SEUDIREITOINCLUSIVO “Bom dia, boa tarde, boa noite. Independentemente do horário que vocês

estão assistindo esse vídeo”, é como Gabriel Henrique Lima, 23 anos, dá início aos seus vídeos e suas lives no Instagram. As redes sociais sempre foram sua paixão e, ao se formar em Direito, acabou juntando as duas coisas. Em 2019, ele criou o “Seu Direito Inclusivo”, um perfil no Instagram dedicado a criação de conteúdo voltado aos direitos das PcD. Deficiente visual, foi se acostumando com os questionamentos por conta de sua deficiência desde menino, que também o levou a adentrar no universo da internet propagando os direitos das pessoas com deficiência e advogando para elas. “Nós, influenciadores PCD, temos uma influência muito grande na forma com que as pessoas enxergam a deficiência. E a internet nos faz criar conexões, ainda mais na pandemia, que ficamos muito mais online, já que precisamos ficar offline das ruas”, comenta. Com 3 mil seguidores no Instagram, ele conta que a interação com outras pessoas com deficiência aumentou por conta do perfil: “Eu brinco que os cegos têm a ‘cegolândia’, porque grande parte dos cegos se conhecem. O que o ‘Seu Direito Inclusivo’ me ajudou, foi conhecer outras deficiências, o autista, o cadeirante, o deficiente auditivo e as dificuldades que eles têm.” Sobre a competitividade presente na internet entre influencers digitais,

O COMPORTAMENTO NAS REDES SOCIAIS De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 25% da população brasileira tinha algum tipo de deficiência em 2019, o equivalente a 45 milhões de pessoas. A psicóloga Claudiane Quaglia, especialista em neuropsicologia, educação especial e inclusiva, acredita que o contato com as redes sociais faz com que os internautas enxerguem outras realidades. Ela menciona que, para muitas crianças e adolescentes autistas, seguir perfis de PcDs pode trazer estímulos e entusiasmo. Isso ajuda não somente a pessoa, mas também sua família, que a partir disso reconhece uma nova situação com diferentes possibilidades. A psicóloga

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aponta que acompanhar influencers com deficiência pode ser interessante também para a comunidade de forma geral, no sentido de educar, ensinar e trazer a ideia de incluir, ao invés de apenas integrar. Claudiane acredita que heroicizar ou vitimizar narrativas nas redes sociais não é benéfico nem para quem acessa nem para quem produz o conteúdo. De acordo com a especialista, influencers PcDs que trazem experiências sobre a realidade podem auxiliar bastante, porém, é importante existir um equilíbrio. “Mostrar os relatos de uma forma educativa na web é legal, mas extremos nunca ajudam muito.”


Gabriel conta que não enxerga isso em seu trabalho, e cita Isadora, do “Olhar Cotidiano”: “Ela fala do ativismo negro, de mulheres pretas, e eu não falo disso. Eu agradeço por ela falar de uma coisa totalmente diferente do que eu”. Ele também diz que o que mais o encanta na produção de conteúdo PcD é a diversidade. A inclusão das pessoas com deficiência esteve, durante toda a história, sendo contada nas entrelinhas, uma narrativa oculta da sociedade. Crianças, jovens e adultos eram sempre representados por seus familiares e amigos. “Hoje é o PcD falando das dificuldades, dos direitos, das expectativas e da vida do PcD. Não tem mais interlocutor, apenas o locutor, que somos nós”, comenta Gabriel.

INFLUENCIADORES DIGITAIS A internet e as redes sociais criaram um senso de comunidade entre grupos minoritários, adaptando cada um em uma abordagem e linguagem específicas. Entre eles, há os influenciadores digitais, que guiam os discursos e temáticas, mobilizando uma audiência, por meio da produção de conteúdo. Issaaf Karhawi, jornalista e pesquisadora em comunicação digital, explica que as redes sociais são um espaço da sociedade de amplificação de pautas e destituição das hierarquias. “As redes sociais essencialmente surgiram com a intenção de democratizar a informação, de ampliar pontos de contato com o conhecimento. O digital opera por uma dinâmica horizontal”, comenta. Atualmente, o país vive um momento plural e democrático dessa produção de conteúdo, no qual as pessoas com deficiência estão inseridas. A pesquisadora aponta a definição dos influenciadores minoritários, que são pessoas que fazem parte de um grupo social específico e que utilizam do digital para falar de sua própria existência neste grupo. As plataformas digitais também foram utilizadas por essas pessoas para o reconhecimento de outras lutas, como o movimento LGBTQIA+, questões raciais, a luta feminista, etc.

l Arquivo pessoa

Arquivo p essoal

A presença dos influenciadores PcDs revela uma reivindicação pela ocupação de espaços. Por exemplo, a hashtag #VerificaPCD no Twitter em julho de 2020, teve o objetivo de levantar o debate sobre acessibilidade no mundo virtual e pedir a verificação de contas de criadores de conteúdo que possuem algum tipo de deficiência. “A questão da verificação passa por uma legitimação. É importante para os influenciadores, uma vez que isso constitui um símbolo de prestígio, de distinção”, explica Issaaf. Conheça Confira um pouco mais sobre os perfis dos três influenciadores entrevistados na reportagem. portalcomunicare.com.br

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Infância roubada A pressão em amadurecer precocemente, assédio e abusos em menores de idade mostram como crescer em uma sociedade hipersexualizadora está longe de ser um processo seguro Beatriz Tsutsumi Camila Acordi Maria Vitória Bruzamolin Sarah Guilhermo

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erotização precoce em volta das mulheres está enraizada na sociedade, inserida de maneira certamente implícita em crianças no modo de se vestir e de se comportar. Roupas com transparência e sapatos para crianças com salto são alguns exemplos deste padrão. Na maioria das vezes, a família, pais ou responsáveis pela criança não têm noção que muitos elementos presentes no cotidiano, em especial as vestimentas ou apresentação da criança, possuem itens de sensualização do corpo. A estudante Mariah Foggiatto, de 18 anos, concorda com a afirmação. “É doentio o fato de que algumas pessoas veem uma criança diferente do que ela é: uma criança”, comenta a jovem, protagonista de assédios que aterrorizam seu passado. Mariah tinha 15 anos quando um líder religioso, que costumava se comportar

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como uma pessoa carinhosa com ela, fez uso dessa proximidade para se aproveitar da adolescente. “Ele tinha 60 anos e se viu no direito de me apalpar, me tocar e insinuar coisas sexuais no meu ouvido”, conta ela. “Como alguém de confiança, que era como um pai para mim, podia fazer algo do tipo? Como alguém assiste uma criança crescer e se vê no direito de abusar dela?” O abusador a conhecia desde os 4 anos. Aos 16 anos, sofrendo com as inseguranças causadas pelo ocorrido, um amigo da família a apalpou na presença de outros familiares, que não fizeram nada a respeito. “Eu estava bêbada sob supervisão dos primos e um amigo da família, que tinha 50 anos. Era um ambiente que parecia seguro para beber, afinal, achei que estava com pessoas de confiança”, Mariah explica. Assim como no primeiro caso, o abusador agia com carinho, como se fosse apenas um amigo mais velho, mais sábio. Mas foi necessário um momento de distração dos primos para o homem usar a embriaguez da jovem para se aproveitar dela. “No momento que ele começou a colocar a mão debaixo da minha camiseta, de forma sorrateira, eu acordei num lapso de lucidez e empurrei ele, dizendo não.” Ela correu para o quarto onde estava a sua mãe, que não sabia da bebida, e em um choro silencioso, escondeu o acontecimento dela por dois anos, buscando conforto em amigas diante da possibilidade de uma reação indiferente da família. “Os familiares que souberam do acontecimento invalidam e fazem piada até hoje, como se não tivesse problema. Isso traz uma cicatriz enorme, te deixa arisca.” A exposição de menores tem sido cada vez maior com o uso indevido das redes sociais, e consequentemente, o assédio. Fotos, vídeos de danças que em algumas vezes possuem teor sexu-


al, que aos olhos dos jovens pode não ser nada demais, pode vir a ser um tiro no escuro, uma vez que muitos dos que assistem podem ser predadores sexuais ou ver malícia diante o conteúdo. “É necessário olhar para a infância como uma fase crucial, com a necessidade de ser compreendida, estudada, levando informação para a população, treinamento dos pais e acesso à educação”, afirma a psicóloga Mariana Cançado. Ela comenta a maneira sobre o assunto das mídias sociais ser algo novo e da importância de que durante a fase da infância, a criança realmente vivencie esta fase,

Para que situações como essa diminuam, é indicado que a criança desde cedo tenha espaço para conversar sobre o assunto sem julgamentos e punições, mas, sim, com orientações. “Na maioria das vezes, esses temas são tabus dentro das famílias, e somando isso ao fato de não haver supervisão, a criança está sujeita a essas práticas, que podem trazer consequências muito sérias”, completa a coordenadora. E não é especulação dizer que toda mulher possui uma conhecida que já foi assediada, principalmente quando se é mais nova. Para a estudante Andressa*, de 21 anos, o anúncio da primeira menstruação foi a despedida de sua infância. A necessidade de usar sutiã foi imposta pela mãe, que logo trouxe um modelo com bojo, mesmo sem a menina ter peitos. Com sua baixa estatura e com o sutiã de bojo, frases como “Nossa, olha aquela anãzinha, ela é bem peituda” eram comuns para Andressa, que as ouvia com apenas 8 anos.

“Ele tinha 60 anos e se viu no direito de me apalpar, me tocar e insinuar coisas sexuais no meu ouvido.” Mariah Foggiatto, estudante tal como realizar uma orientação para os pais, para que possam fazer uma prevenção com seus filhos. “São todos pontos de proteção para a criança compreender que é uma fase, que precisa ser própria”, reforça a psicóloga. Quem também alerta sobre o perigo da exposição precoce em redes sociais é a coordenadora pedagógica do Marista Escola Social Ecológica, Suelen Cristine Fernandes. “Esses são criminosos muito pacientes, atuam aos poucos, criando vínculo com a vítima, fazendo ‘amizade’, se passando por pessoas da mesma idade, até ganharem confiança.” Além disso, Suelen ainda lembra que, normalmente, as vítimas nessa faixa etária costumam ser muito intensas e os abusadores, sabendo disso, se aproveitam. “Provas” de amor ou amizade costumam ser solicitadas pelos infratores, que, dessa forma, conseguem fazer com que a vítima cumpra desafios ou envie fotos íntimas de si.

Andressa considera que as portas do mundo adulto se abriram muito cedo para ela. A curiosidade sobre o sexo surgiu após sofrer abusos por um integrante da família - afinal, o que tinha acontecido com seu próprio corpo? “Eu comecei a pesquisar na internet quando ficava sozinha em casa, pesquisava por órgãos genitais e como os bebês vinham para o mundo”, conta ela. A exposição na internet também esteve presente na adolescência da jovem. A timidez e a vergonha fizeram a menina utilizar um aplicativo de relacionamento como forma de contato com outras pessoas. Mesmo menor de idade, Andressa saía com diversos adultos em busca de amigos, mantendo relações com alguns deles. Foi em um desses encontros, com seus 17 anos, que ela perdeu a virgindade, com um homem de 28 anos. “Eu só contei pra ele que eu era menor de idade quando a gente saiu, aí ele perguntou se não iria dar problema e eu disse que não”, comenta ela.

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CONSELHO TUTELAR Apesar de ser um assunto hoje discutido de forma mais aberta, as denúncias de abuso e violência infantil e adolescentes, ainda é um problema. Segundo João Carlos Pires, conselheiro e atual presidente do Conselho Tutelar de Curitiba, o número de denúncias não é exato. Um exemplo sendo a média do Conselho Tutelar do Cajuru, que foi por volta de 1600 denúncias no ano de 2019, mas Pires reforça sobre os diversos casos que não são denunciados. “Tem que ficar bem claro os números nunca vão ser reais. Há uma subnotificação. O número que a gente tem é só a ponta de um iceberg”, declara Pires. “Essa violência é muito forte, a ponto de a criança não conseguir relatar. Eu tenho poucos casos e muitos relatos de meninos que sofrem, ou sofreram com violência.” Após a denúncia e avaliação da vítima, o Conselho Tutelar irá aplicar medidas protetivas, preparar e fiscalizar a família, para que a criança ou adolescente retorne ao seu lar. Pires comentou também sobre as instituições de acolhimento, lugares antes chamados de abrigos que acolhem as vítimas. Casos com violência extrema, ou que a família não pode cuidar, são mais complicados devido ao ambiente para a criança. Entretanto, o conselheiro reforçou que instituições de acolhimento são os últimos recursos, e mesmo as propostas dos institutos hoje em dia sendo completamente diferente de anos atrás, retirar a criança de sua família é também uma forma de violência. “Você está afastando a criança do lar, mas hoje os abrigos têm a finalidade e missão de proporcionar uma dinâmica de família dentro daquela casa”, diz. O presidente do Conselho Tutelar também comentou sobre um novo programa para o acolhimento dos menores em situação de risco. O “Família Acolhedora” é uma organização na qual pessoas se cadastram no programa para futuramente receber crianças ou adolescentes que sofreram com algum tipo de violência. Semelhante ao sistema de apadrinhamento, os “acolhedores” ficarão com os jovens por um período temporário.

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Segundo a psicóloga Idáira Amoretti, não existe um padrão comportamental a ser “seguido” por jovens que sofrem ou sofreram abuso. No entanto, existem algumas mudanças de comportamento, que isoladas podem não significar nada, mas em conjunto, funcionam como um alerta para que a criança seja levada para uma avaliação profissional, um psicólogo. Entre essas mudanças, estão comportamentos mais agressivos, introspectivos, medo, recusa de alimentos que antes consumiam bem, ansiedade e até intensificação de higiene (tanto pessoal quanto do ambiente). A partir do momento que a criança vai para um psicólogo e é identificado que ela realmente foi vítima de abuso, começa a missão de reestruturação, cicatrização e de livrá-la de qualquer sentimento ruim que não a pertence, como por exemplo, o de culpar a si mesma. Idáira enxerga o trabalho do psicólogo nesses casos como de primeira importância e afirma “a possibilidade de fazer resgate emocional de uma criança ou adolescente que sofreu uma violência tão grande e tão marcante na sua vida é algo de importância de primeiro grau, além de todo o trabalho com a família.” O processo em busca da cura emocional de quem sofre com esse tipo de abuso é longo e intenso, e crianças e jovens que não recebem o tratamento adequado, costumam sofrer com danos emocionais pelo resto de suas vidas. Por isso, é de suma importância que tal atendimento esteja incluído na saúde básica e disponível para todos brasileiros em qualquer região do país. Segundo a pedagoga Suelen Fernandes, pesquisas mostram que cerca de 90% dos casos acontecem dentro de casa e a psicóloga Idáira explica o motivo. Geralmente esses casos ocorrem pelo fácil acesso que o abusador tem a criança. São pessoas do convívio da família como vizinhos, amigos próprios e até mesmo um familiar. Sendo assim, a vítima se sente intimidada pelo fato de ser alguém que todos gostam e incentivam o convívio, e não consegue verbalizar o que fizeram com ela, algo que não gostou. *Nome fictífico criado para proteger o anonimato do entrevistado.


Relatos Em uma pesquisa respondida por 93 pessoas, havia um espaço para falar sobre suas experiências de assédio e abuso enquanto menor

de idade, caso se sentissem confortáveis. 28 pessoas decidiram contar, anonimamente, suas histórias. Leia a seguir alguns deles.

“Ele falava que se eu contasse para alguém, ele ia me machucar muito. Nunca contei pra ninguém.” Gênero feminino, tinha 5 anos “Um amigo da família sempre tocava minhas partes íntimas quando não tinha ninguém por perto, eu tinha vergonha de contar.” Gênero feminino, tinha 10 anos

“Ele me perguntou se eu sabia o que era sexo, e respondi que não. Ele disse que era uma coisa legal, que ia fazer me sentir melhor e começou a passar a mão em mim. Eu não reagi, estava assustado. Ele acabou tirando minha virgindade.” Gênero masculino, tinha 10 anos

“Ele descobriu que eu ia terminar nosso namoro e me estuprou no parquinho perto de casa. Tive um filho fruto do ocorrido.” Gênero feminino, não lembra a idade

Leia Mais Cartilha com possíveis sinais de alerta manifestados por crianças e adolescentes que sofrem abusos. portalcomunicare.com.br

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“Nunca ninguém morreu de dor de parto!” “P O momento mais especial da vida de muitas mulheres, dar à luz é lembrado como trauma por muitas devido à violência obstétrica Isabelle Almeida Jéssica Pretto e Nathalia Brum

Bruna Aliane C. de Carvalho

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ara de gritar!”,”Cala a boca!’’, “Nunca ninguém morreu de dor de parto!”, “Na hora de fazer, tava bom né?”. Frases como essas foram ouvidas por muitas mulheres durante o trabalho de parto, e resumem a humilhação e violência que sofreram neste momento de vulnerabilidade.

Laissa Loraine conta que, durante seu trabalho de parto, molhava a boca escondida na torneira, pois estava de jejum há mais de 23 horas, imposto pela equipe médica, sem poder tomar nem água. “Sofri todo tipo de violência. Indução sem aviso prévio, toque de hora em hora pelo médico e por mais um monte de residentes, enfermeira empurrando minha barriga e mandando eu calar a boca.”


Violências que também a afetaram no pós-parto. “Tive depressão e, por pouco tempo, culpava meu filho por me sentir assim.” A violência obstétrica é a prática de procedimentos e condutas que desrespeitam e agridem fisicamente ou psicologicamente a mulher na gestação, no parto, no nascimento ou pós-parto, além de tratamentos inapropriados sem comprovação científica de eficácia. “A relação entre médico obstetra e ginecologista e a mulher é de muita intimidade e confiança, eu brinco que a mulher conta pra gente coisa que não

em cima dela e empurrou sua barriga com tanta força que ficou com medo que o bebê fosse se machucar. Além da dor que aquele procedimento gerou nela e provavelmente no seu bebê, ela ainda relata que se sentiu invadida, sem controle do próprio corpo. “Meu pesadelo começou quando entrei em trabalho de parto. No hospital fui tratada da pior forma pela médica que estava de plantão, ela disse que minha dor era psicológica e que eu fiz o bebê e tinha mesmo que aguentar”, conta Georgia Castellon, que teve seu primeiro parto em um hospital particular de Curitiba, está grávida novamente

“Eu sentia muita dor, me contorcia, gritava, estava com sede, e as enfermeiras não me deram nenhum suporte. Me senti sozinha, abandonada.”

Camilly Pereira conta para o marido, para mãe, para ninguém”, explica Marcelo Rodrigues, médico ginecologista e obstétrico, especializado em gravidez de alto risco. Segundo ele, muitas vezes o momento mais especial da vida de uma mulher é o parto e, por isso, o médico obstetra precisa torná-lo o melhor possível, de forma humanizada. Infelizmente, nem sempre o melhor possível acontece. Uma ampla pesquisa, desenvolvida pela Fundação Perseu Abramo e pelo Sesc, revelou que aproximadamente uma em cada quatro mulheres no Brasil sofreu com algum tipo de violência durante o parto. Outra pesquisa, realizada pela Fiocruz, chamada “Nascer no Brasil”, apontou que 37% das mulheres já tiveram algum profissional pressionando sua barriga durante o parto. A técnica não é recomendada, e pode causar lesões graves tanto para a mãe quanto para o bebê. Relatos nos quais muitas vezes a enfermeira sobe na gestante para praticar manobra de Kristeller (empurrar a barriga para baixo, para o bebê “descer”), são comuns. Fernanda De Oliveira conta que a enfermeira subiu

e planeja um parto domiciliar humanizado. Ela conta que sofreu diversas intervenções, como a episiotomia, corte feito para supostamente facilitar a saída do bebê. “Eu falei que não queria, mas o médico fez. Meu psicológico ficou abalado por tempos, e eu sentia muita dor na cicatriz do corte”, relata. A episiotomia é um procedimento que deve ser feito com cautela e não rotineiramente, segundo a OMS. Porém, dados da pesquisa “Nascer no Brasil” mostram que mais de 50% das mulheres sofrem com essa prática. Ana foi uma delas e conta que sentiu muita dor e a sensação de ser rasgada. “Enquanto o médico dava os pontos, ainda falou que daria mais um ponto de presente pro meu marido, para ficar bem apertadinha”, conta. “O parto humanizado é quando a parturiente tem suas vontades, autonomia, tempo e corpo respeitados”, descreve Émile Eni, que é doula, profissional responsável pelo suporte físico e emocional à gestante. Ela conta que são feitos encontros pré-natais, nos quais são ouvidas as dores, dúvidas, e traumas da paciente. Com um atendimento respeitoso

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Registro parto Daniela Pretto Oswald, parto humanizado realizado conforme os desejos da mãe.

Bruna Aliane C. de Carvalho

e humanizado, Émile defende que apenas benefícios são levados para a família, além de reduzir a taxa de mortalidade materna e neonatal, aumentando a confiança da mulher e o seu conhecimento sobre seu próprio corpo e limites. Segundo a OMS, a presença de um acompanhante é recomendada, pois garante segurança à mulher, aumentando os níveis de ocitocina e ajudando o trabalho de parto fluir. Mas a doula questiona a falta de preparo dos hospitais para um parto mais humanizado. “Começa quando muitas maternidades proíbem a entrada de acompanhantes desde o início do trabalho de parto, descumprindo completamente a lei 11.108/2005,

contrário do esperado, oferece atendimento de humanização de parto melhor do que a rede particular. Isso acontece porque os hospitais particulares e de convênio têm dificuldade em colocar suas estruturas para funcionar, por mais completas que elas sejam, explicou. “Os hospitais hoje estão investindo em centros de parto. O centro de parto é um quarto individual, que tem uma bola para a paciente fazer uma massagem, que tem um chuveiro para ela tomar banho no momento do trabalho de parto. O SUS já tem tudo isso, eles já são montados para isso, então a humanização começou pelo SUS”, afirma Rodrigues.

“Sofri todo tipo de violência.” Laissa Loraine permitindo a entrada apenas após os 8cm de dilatação.” Foi o que passou Camilly Pereira, quando a entrada de seu namorado foi proibida pelo hospital. “Eu sentia muita dor, me contorcia, gritava, estava com sede, e as enfermeiras não me deram nenhum suporte. Me senti sozinha, abandonada”, desabafa. No Brasil, os hospitais já melhoraram bastante sua estrutura para atender mulheres que desejam o parto humanizado, é o que observa o obstetra Marcelo Rodrigues. Para ele, os hospitais estão mais preparados do que estavam há quatro anos e o SUS, ao editoria 16 revistacdm | sociedade

Para que o parto humanizado aconteça, é necessário a presença de uma equipe multidisciplinar que engloba necessariamente: médico obstetra, pediatra, anestesista, enfermeira obstetriz e uma técnica de enfermagem para auxiliar no atendimento. Outros profissionais podem estar presentes de forma opcional, a escolha da gestante, como fisioterapeuta, doula e nutricionista. A mãe de Alícya Ellie sofreu logo ao chegar ao hospital. Ela foi obrigada a assinar um documento que permitia a episiotomia e seu plano de parto humanizado não foi aceito. Pouco depois, ela descobriu que sua doula


não viria e a notícia a abalou, já que, mesmo que ela não fosse responsável pelo parto, seria a pessoa que prestaria apoio emocional. E como se não pudesse piorar, teve a presença de estranhos durante o trabalho de parto, sem consentimento. “Às 16h30, entrei na fase expulsiva, e parece até que foi anunciado no hospital inteiro. Porque entraram, sem brincadeira, umas seis pessoas, sentaram no chão e ficaram olhando eu parir. Me senti um bicho numa jaula e um monte de gente olhando.” Durante o atendimento, a violência se

graças a Deus isso tem diminuído bastante, porque a gente tem formado médicos diferentes.” O obstetra conta que deixa as suas pacientes à vontade para escolher a posição em que elas querem parir, além de interná-las no momento certo (chamado de ativa no parto), garantir seu acompanhante 24 horas durante todo o processo e, se tiver a possibilidade, contar com a presença de uma doula. Durante o procedimento, o poder de decisão sobre a presença de anestesia é dado para sua paciente e ele não realiza a episiotomia em seus

“No hospital fui tratada da pior forma pela

médica que estava de plantão, ela disse que minha dor era psicológica.” Georgia Castellon repetiu. Sua bolsa foi estourada com uma espécie de agulha quando tinha apenas 6 cm de dilatação, e a médica orientou para que a medicassem ocitocina sem consentimento. “A médica torturadora entrava, era grossa, enfiava o dedo na minha vagina e lá dentro rodava e abria o colo do útero à força, colocando a ocitocina, sem eu pedir. Mandava eu botar a perna aqui e acolá. Eu fazia tudo, até que decidi que não deixaria mais ela me tocar”. O parto da mãe de Alícya terminou em cesariana, o oposto que esperava para o dia que sua filha nasceria, e ela ainda teve que esperar a médica realizar as cesáreas que estavam agendadas antes de fazer a sua. Para Rodrigues, algumas violências praticadas por médicos na hora do parto são resultado de uma formação antiga, em que o médico se colocava no papel principal do momento e conduzia-o da melhor forma para ele. Por isso, para ele, é muito importante formar médicos preparados não apenas profissionalmente, mas como ser humano. “Eu sou de uma época em que eu escutei os meus chefes falarem esses absurdos como ‘Na hora de fazer não tava doendo’ ou ‘Pare de gritar!’. É desumano falar algo assim para uma paciente, um absurdo. Mas

atendimentos, deixando o bebê nascer o mais natural e humanizado possível. E com relação ao limite entre decisões da mãe e do médico durante o trabalho de parto, o médico explica que, quando há risco para a mulher ou seu bebê durante o parto, é muito importante que o obstetra, como especialista, explique a situação para a paciente e que ela se posicione sobre a continuidade do atendimento. “Tem coisas que a gestante vai me pedir durante o trabalho de parto que eu como médico e técnico sei que aquele procedimento vai fazer mal para ela ou pro bebê. Não podemos obrigar ninguém a fazer nada ou deixar de fazer, mas a gente como médico pode deixar de fazer alguma coisa que a gente estudou e viu que não é correto na hora do atendimento obstétrico. Por isso, é tão importante a confiança entre a gestante e seu obstetra, para que ela saiba que tudo será feito sempre priorizando o seu bem e do seu bebê”, explica. O PÓS-PARTO Coração entristecido, face cansada e deprimida, essa seria a primeira impressão que muitos teriam de Cláudia Vilela após dar à luz, que preferiu manter sua identidade anônima.

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A experiência de parto de Cláudia foi “enlouquecedora”, o que desencadeou uma série de angústias e medos que mais tarde se transformaram em depressão. Durante o parto realizaram dois procedimentos sem o seu consentimento, a manobra de Kristeller e episiotomia, o que chegou a afetar o seu casamento. “Fiquei deprimida e não consegui amamentar, me sentia culpada.” Após muita pesquisa sobre os abusos que sofreu durante sua experiência de parto, Cláudia conta que descobriu que tinha sofrido violência obstétrica, felizmente ela e sua filha não sofreram nenhum dano físico, porém as sequelas psicológicas permaneceram. “O trauma emocional me afetou muito.” O pós-parto é muito romantizado pela sociedade como um todo, em que mulheres exuberantes e influencers postam fotos de seus corpos perfeitos logo após a chegada do bebê e compartilham sua saúde mental em excelente estado. O que não é realidade para a maior parte das mulheres, que muitas vezes sofrem com a depressão e ansiedade pós-parto. É o que relata a psicóloga Simone Di Pino Aline. “Muitas mulheres acabam entrando em estado depressivo, principalmente aquelas que tiveram uma gravidez não planejada”, diz. A questão profissional também é afetada durante a licença-maternidade, o

que gera inseguranças para a mulher. “Um dos casos que atendi a paciente desenvolveu gatilhos para todas as crises como ansiedade, pânico e depressão, que foi iniciado com a perda de emprego do marido e a pandemia, acrescida de uma gestação não planejada”, relata Simone. O tratamento com mulheres que desenvolvem alguma doença psiquiátrica crônica como a depressão logo após o parto está se tornando cada vez mais comum, isso se dá pelo acesso à informação sobre o assunto e a quebra de tabus sobre a procura de ajuda psicológica. “O tratamento é iniciado para auxiliar a paciente a lidar com seus medos. Ela é orientada a focar na solução, não alimentar pensamentos ruins, estar sempre na companhia de alguém, evitando ficar sozinha”, acrescenta a psicóloga. “Mas a paciente precisa estar ciente que o tratamento não tem uma previsão de término, que isso depende do tempo interno de cada indivíduo. Além da rede de apoio, tem que ter força de vontade para sair dessa, com muito amor, carinho por ela mesma e com a ajuda dos demais.” Saiba mais Cartilha de recomendações da OMS sobre cuidados pré-natais para uma experiência positiva na gravidez.

Registro parto Daniela Pretto Oswald, parto humanizado realizado conforme os desejos da mãe.

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Bruna Aliane C. de Carvalho

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Prazer, liberdade! Temas como a masturbação e a satisfação sexual feminina ainda são considerados tabus sociais Bruna Colmann Brunna Gabardo Isadora Deip Sabrina Ramos Sthefanny Gazarra Ilustração: Sabrina Ramos

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m uma galeria de mulheres em um pequeno salão, estão Ana, Maria, Gal, Elis, Cida, entre muitas outras que são impossíveis de nomear. Ou serão todas a mesma mulher? Uma deixou algumas roupas no varal, outra deixou a panela no fogão, outra ainda pensa em seus filhos, uma última perguntou o que faria com seu marido ao chegar em casa, antes que ele se acomodasse no sofá, pegasse uma cerveja e fosse dormir. Elas se sentem acomodadas e incomodadas. Em um silêncio absoluto. Ligadas a homens, à família, pensando em quando eram namoradas e realmente se divertiam. Pensaram que a liberdade viria com a idade, dinheiro ou tempo, mas a mulher seria verdadeiramente livre um dia? A assistente comercial Luana Masoni, de 20 anos, utiliza o espaço virtual para ampliar a visibilidade dos movimentos sociais dos quais participa. Em suas redes sociais e no seu círculo

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de amizades, ela notou um aumento do interesse por assuntos relacionados à liberdade sexual feminina durante a pandemia. “Estamos em um momento em que grande parte das pessoas não está saindo para ‘ficar’, como normalmente fazíamos. A partir daí, surge a questão da sexualidade voltada a nós mesmas”, relata. Para Luana, a questão do autoconhecimento envolve o entendimento do próprio corpo, o olhar para si mesma sem se objetificar, violentar ou machucar, seja por meio de relações sexuais ou de hábitos construídos socialmente, como a depilação. “Nossa sexualidade tem que servir para nós, e não para os outros. Precisamos saber primeiro do que gostamos, para daí entrar em relações e saber falar o nosso ‘sim’ e o nosso ‘não’.” A assistente comercial também conta que encarava a masturbação como algo proibido, e que foi o diálogo


com outras mulheres que abriu portas para seu próprio conhecimento. A assistente de marketing Rafaela Camargo, 21 anos, fala sobre sua evolução na busca por autoconhecimento e aceitação quanto aos gostos entre quatro paredes. A jovem conta que, quando perdeu a virgindade, chegou a pensar que “sexo não é tudo isso”, mas mudou de ideia à medida que colecionava experiências. Contudo, seu prazer não está apenas atrelado a figura de um homem, e ela nem mesmo precisa de outra pessoa para senti-lo. Mantendo um relacionamento sério por quase cinco anos, Rafaela chegou ao extremo da monogamia: seus únicos momentos de prazer sexual eram ao lado de seu antigo companheiro. Após ser presenteada com um produto erótico por uma amiga, ela passou a dar mais atenção ao seu corpo e descobrir formas de satisfazer a si mesma, com uma frequência maior. Sobre suas relações sexuais mais recentes, a jovem relata que os homens se dão por satisfeitos ao atingirem o ápice do prazer masculino. “Acaba o amor depois que eles gozam”, diz Rafaela sem se abalar, e completa: “Eu já me satisfaço, então tudo bem”. Apesar de não desgostar totalmente da relação com outras pessoas, ela encontra paz e prazer em si mesma de uma maneira única e insubstituível. A maneira com a qual a mulher se relaciona com o corpo, entende e aceita as práticas sexuais ao longo da vida, começa a ser moldada em casa. A ginecologista Carolina Ferrari explica que essa compreensão varia de acordo com o modo em que os pais conduzem o diálogo sobre ciclo menstrual, méto-

dos contraceptivos, uso de camisinha e a possibilidade de gravidez. Em contrapartida, ela ressalta a importância da educação sexual nas escolas, pois há lugares onde o diálogo não é adequado ou até mesmo não existe. O desconhecimento, também atrelado a convicções religiosas e culturais, sustenta tabus. Por definição, tabu é uma proibição e quando o assunto é mulher são muitos os que existem. Historicamente, a existência da mulher é construída ora no silêncio ora na repressão. Enquanto homens são incentivados a estimularem-se desde que aparece o primeiro pelo pubiano, e o pai se orgulha do filho, as mulheres, desde a pré-infância são advertidas a sentarem sem deixar as pernas abertas, pois é inconcebível para o imaginário machista que a calcinha de uma criança apareça. Há, também, um bloqueio em torno do ciclo menstrual, em algumas famílias é indecoroso falar sobre o assunto, e isso se reflete inclusive nas relações de trabalho. Carolina analisa que o mercado é puramente masculino e isto exerce um grande peso na forma como a mulher se relaciona com seu corpo, por conta da necessidade de se adaptar ao meio, muitas vezes optam por suprimir a menstruação. A educação sexual é a melhor ferramenta para desmistificar os tabus e deve partir da natureza do sexo, segundo a ginecologista. “A primeira coisa é fazer a mulher entender desde criança que o sexo é uma coisa natural. Não é só para reprodução, ele é para o seu prazer, e não é uma coisa que você precisa ter vergonha, é uma coisa que você tem direito”. Além disso, Carolina salienta que o senso de responsabilidade ensinado às mulheres, estreitamente ligado à maternidade, bloqueia o intuito de merecimento para elas. A ginecologista também observa que existe uma separação para a sociedade da mulher que é para o “casamento” e da mulher que é para o “sexo”. Ao contrário da mulher para o “sexo”, que entende as práticas e os rela

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cionamentos com maior autonomia, a mulher para o “casamento” segue o ideal do romantismo da pureza, delicadeza e inocência. “Essa mulher não pode expressar o desejo sexual, não pode expressar o tesão, muito menos sozinha. E isso acaba levando muitas mulheres a nunca terem um orgasmo na vida”, comenta.

ORGASMO A anorgasmia é uma condição na qual a pessoa tem dificuldade em atingir o orgasmo. De acordo com uma pesquisa do Projeto de Sexualidade da Universidade de São Paulo (Prosex), 55,6% das mulheres têm dificuldade para chegar ao orgasmo. As principais queixas são a dificuldade para se estimular e dores na relação. Segundo a ginecologista, um dos fatores que influenciam esse dado, é a falta de autoconhecimento do próprio corpo.

Durante a pandemia do novo coronavírus, a mentora e sexóloga Cris Arcuri percebeu, por meio de seus atendimentos e de suas redes sociais, que muitos casais e solteiros começaram a questionar suas vidas sexuais: “Eu sempre falo que diante de uma mudança histórica [como a pandemia], o comportamento humano muda.” Segundo dados levantados pelo portal Mercado Erótico, a venda de vibradores aumentou cerca de 50% entre março e agosto de 2020. E ainda de acordo com a Associação Brasileira de Empresas do Mercado Erótico, o setor de forma geral cresceu 12%. Cris comenta que proporcionalmente à abrangência nas formas de comunicação, aumentaram as buscas por produtos sensuais e o modo como as pessoas vendem esses itens influencia na compra. Ela menciona ainda que o vibrador deveria ser um tópico da lista de cuidados pessoais: “Eu até brinco falando que domingo é o dia do autocuidado, de cuidar da pele e do cabelo; mas eu penso que a masturbação também deveria entrar nessa lista”. De acordo com a sexóloga, o termo “liberdade sexual” ainda é desconfortável para as mulheres, pois a sociedade associa esse conceito a libertinagem ou sacanagem. “Quanto mais a mulher tiver a autoestima fortalecida e o autoconhecimento caminhando junto a isso, mais ela vai conseguir ser bem resolvida com a sua sexualidade.” Segundo um estudo realizado em 2017 pela Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS), o Brasil era o líder mundial em cirurgias realizadas na região genital feminina, as chamadas ninfoplastias, sendo feitas 21 mil cirurgias dessas por ano. Cris explica que muitas pessoas não realizam tratamentos estéticos necessariamente porque gostam, mas sim porque foram inseridas em um ambiente que as ensinou a sempre tentar alcançar um corpo ideal. Veja também Confira dicas de produções que abordam a liberdade sexual da mulher. portalcomunicare.com.br

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A RELAÇÃO COM O CORPO As experiências de vergonha e autoculpabilização, principalmente o silêncio, se deram por conta das mulheres não terem a possibilidade de fazer uma união. A psicóloga e feminista Rafaela Courbassier explica que durante a história, as mulheres nunca estiveram ligadas umas às outras, sempre estiveram ligadas aos homens.

com seu primeiro namorado. Ela teve a primeira relação sexual com o marido e diz que a experiência foi horrível: “Eu não amava o meu marido, fiquei casada com ele por muitos anos, sem amor. E era do jeito dele, eu achava que tinha que fazer o que ele queria.”. A situação a fez questionar se gostava de homem ou até mesmo de sexo.

“Eu não considero que existe, de fato, liberdade relacionada à condição de ser mulher.”

Citando Simone de Beauvoir, escritora e pensadora feminista, a psicóloga também aponta a reflexão sobre o corpo no feminismo, que ainda se submete a tabus e estereótipos que servem Rafaela como desculpas para legitimar as mais evidentes discriminações e violências. “Eu não considero que existe, de fato, liberdade relacionada à condição de ser mulher”.

Rafaela analisa a representação da mulher na mídia com a intenção de transformar o feminismo em uma pauta lucrativa. Ela afirma que esse tipo de mídia não ajuda a provocar as mudanças necessárias, que seriam modificar as bases da sociedade, com a consciência de que os problemas das mulheres são também problemas coletivos: “O que é tão nocivo, é a ideia de que você pode, sozinha, enfrentar uma estrutura social inteira.”

Courbassier, psicóloga Após se separar, Odila diz que sua vida, hoje em dia, é para ela. “Se eu conheço alguém e der certo, deu. O que importa sou eu. Se eu quiser, se for bom pra mim, eu não estou me importando com ninguém”, comenta. A aposentada conta que sexo e relacionamentos eram assuntos proibidos na sua família, inclusive entre nove irmãs, mas hoje discute sobre o assunto abertamente com seus filhos e netos.

A iniciação e liberdade sexual, implicações do casamento e a velhice são alguns dos temas que discorrem em relação à mulher e o tabu da sexualidade. A psicóloga comenta acerca da dificuldade da mulher, com os julgamentos e repreensões, em exercer essa liberdade e também a importância em se entender como um ser sexual ou não sexual. Antes dos princípios do feminismo, o caminho que restava às mulheres era justamente o do casamento, e o de se tornarem boas esposas e mães. Odila Maria Raizel, 69, hoje divorciada, se casou aos 19 anos

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A mulher como protagonista

A

ideia da falta de domínio da mulher perante o seu corpo tem raízes culturais e históricas. Filósofos como Platão e Aristóteles, viam no sexo feminino “um ser humano incompleto”, que deveria se colocar à disposição do homem. Aristóteles, em sua obra A Política, considera que “A força de um homem consiste em se impor; a de uma mulher, em vencer a dificuldade de obedecer.” A liberdade feminina como propriedade do homem também pode ser observada na literatura. As personagens construídas pelo olhar masculino raramente retratam de modo fiel as particularidades e implicações de ser mulher. O escritor tem o poder de determinar o corpo, os pensamentos e a personalidade da personagem, e muitas vezes o faz de uma maneira rasa e nada empática, representando a mulher como um ser guiado unicamente pela emoção, sem determinação e maiores aspirações. Durante o romantismo, movimento literário predominante no Brasil ao longo do século XIX, a figura feminina serviu de inspiração para uma série de obras. No livro O Guarani, publicado em 1857 por José de Alencar, a personagem Cecília é símbolo da idealização feminina, escrita de uma maneira

mistificada, permeada de delicadeza e ingenuidade. Apesar de retratada com trejeitos sensuais, é evidente a vergonha da personagem em relação a sua própria sexualidade. A estudante Camile Furtado, 18 anos, autora do livro Rainha Dandara, comenta que a forma como as mulheres são desenvolvidas por escritores homens, sofre uma estereotipação, na qual sempre têm uma imagem impecável, seja ela física ou emocional. O que se nota também nestes contos de autoria masculina é a parte da romantização, onde a mulher possui uma independência sentimental e vive para o seu parceiro com o objetivo de conquistá-lo e satisfazê-lo. Segundo Camile, é relevante a abordagem das mulheres nos livros, pois muitas meninas se espelham e esperam se encontrar nas linhas literárias. A pressão com que a sociedade aborda temas relacionados à sexualidade, acaba tirando a identidade das mulheres de caminhar para suas escolhas, por conta do receio e do julgamento. “Quando há uma personagem que é presa a outros personagens para sentir as coisas dentro da história, eu acho um pouco frustrante, porque isso não me representa”, comenta.

Narrativas apagadas pela história No Brasil, escritoras como Clarice Lispector, Lygia Fagundes Telles, Hilda Hilst e Gilka Machado contribuíram para que as questões que envolvem a relação entre gêneros fosse questionada. A literatura erótica feminina, por exemplo, e o movimento de mulheres divulgando poesia e prosa com luxúria, possibilitou discutir a liberdade sexual da mulher e o machismo na literatura. Provocadora e polêmica, Hilda Hilst foi uma das maiores escritoras da literatura brasileira com seus versos apai-

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xonados, ligados aos prazeres do corpo e o amor. Como no poema Tenta-me de novo: “[...] Disse palavras líquidas, deleitosas, ásperas Obscenas, porque era assim que gostávamos. Mas não menti gozo prazer lascívia Nem omiti que a alma está além, buscando Aquele Outro. E te repito: por que haverias De querer minha alma na tua cama?”

Crédito: Banco de imagem Canva


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Radiação no dia a dia

Beatriz Tsutsumi, Camila Acordi, Maria Vitória Bruzamolin e Sarah Guilhermo

E

stamos expostos a determinadas taxas de radioatividade diariamente. Em média, a dose anual que nosso corpo recebe é de 2,4 mSv (milésimos de Sievert), seja por gases na atmosfera ou na alimentação, podendo variar por simples ações, como fazer um exame de raio-x ou viajar de avião.

Mas nem sempre a radioatividade é um fator ruim - afinal, é graças a ela que temos tratamentos para o câncer e a produção de energia nuclear. A radioatividade foi descoberta essencialmente em 1902, quando o casal Curie (Pierre Curie e Marie Curie) conseguiu isolar partículas de rádio radioativo do mineral pechblenda (uraninita), em Paris, dividindo um Prêmio Nobel de Física com o cientista Henri Becquerel no ano seguinte, devido às pesquisas inovadoras sobre a radiatividade.

Os alimentos mais radioativos 1 | Castanha-do-Pará 2 | Feijão Lima 3 | Banana 4 | Cenoura 5 | Batata

6 | Sal light (com 0% Sódio) 7 | Carne vermelha 8 | Cerveja 9 | Água potável 10 | Manteiga de amendoim

“Um cientista no seu laboratório não é apenas um técnico: é, também, um menino colocado à frente de fenômenos naturais que impressionam como um conto de fadas.” MARIE CURIE, cientista

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DE BANANA EM BANANA Banana Equivalent Dose, também conhecida como BED, significa Dose Equivalente de Banana. Uma banana pode servir como medida informal para contar a quantidade de radioatividade de determinado local ou pessoa. A banana é um dos alimentos com maior taxa de radioatividade, uma vez que ela é cheia de potássio, molécula muito importante para o funcionamento de todo o corpo, mas que possui seu isótopo radioativo, o potássio -40. A ingestão de uma banana média equivale a 10^-7 Sievert (0,1 µSv), cerca de 1% do valor diário de exposição à radiação que pessoas normais costumam ter. Portanto, 100 bananas equivale à dose média de radioatividade que uma pessoa recebe em um dia.

E SE FOR COMIGO? Os efeitos da radioatividade no corpo humano podem variar de acordo com o nível de exposição que o indivíduo enfrentou. EXPOSIÇÃO A CURTO PRAZO: nos níveis moderados, com exposição acima de um gray costumam causar náuseas, vômitos, febre, dores de cabeça e diarréia como primeiros sintomas. Após passarem, o corpo pode ser visto como em estado normal, sem sintomas aparentes, no entanto, semanas depois, costumam voltar mais potentes. Quando os níveis de radiação em contato com o corpo são mais altos, como entre um e quatro grays, existem grandes chances de morte, mesmo que em pessoas adultas e saudáveis. EXPOSIÇÃO A LONGO PRAZO: para aqueles que tiveram contato com a radioatividade, porém sobreviveram ao primeiro contato, os efeitos podem surgir a longo prazo, sendo o câncer, o efeito de maior risco com o passar do tempo. Além dele, é possível que mutações genéticas apareçam, possibilitando assim, deformidades em futuras gerações que herdarem os genes do infectado.

CARBONO 14 Não é só de destruição que vive a radioatividade. O Carbono 14, conhecido por radiocarbono, está presente em todas as coisas vivas, inclusive em nós, seres humanos, e possui uma meia-vida de 5.730 anos. Medindo a quantidade de emissão radioativa em uma árvore, por exemplo, e o resultado dê 50 unidades, isso significa que a árvore possui 5.730 anos - com 25 unidades, teria 11.460 anos, e assim vai. *O C14 é formado na atmosfera, quando raios cósmicos atingem átomos de Nitrogênio e os transformam em Carbono.

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OLHOS DA

CIDADE

Detetives particulares de Curitiba contam fatos sobre suas carreiras sigilosas e compartilham os casos investigados mais marcantes Beatriz Tsutsumi Camila Acordi Maria vitória Bruzamolin Sarah Guilhermo

S

er investigador profissional requer uma vida anônima, uma identidade cautelosa e uma visão afiada. É graças a esse sigilo que um universo de investigações e descobertas dos segredos mais obscuros e profundos sobre as pessoas permanece invisível e intocável entre todos. O caso de Adriana*, que precisou de serviço particular para reencontrar um amor do passado, faz parte deste universo secreto. Parte da segunda geração de imigrantes japoneses, Adriana vivia na forte presença de sua cultura quando se apaixonou por Manuel*, um homem espanhol. O que a impediu de se casar com ele foi uma decisão tomada por sua família: sua mão estava prometida a outra pessoa, e seu destino era se dedicar a um casamento arranjado até o fim de sua vida. Mesmo após 28 anos, com filhos universitários e uma vida amorosa infeliz, o misterioso paradeiro de Manuel ainda pairava nos pensamentos de Adriana. Entrou em contato com uma detetive particular e ofereceu um orçamento limita-

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do, com medo de gastar mais e seu marido perceber. A profissional não foi capaz de encontrar o amor de Adriana dentro do tempo do contrato, mas tocada pela história, continuou a investigar sem pagamento extra. Conversando com a irmã de Manuel, descobriu que o homem quase perdeu uma luta contra o câncer, e após esse abalo, ele viajou até resolver voltar para Curitiba, onde agora trabalha em um armazém. “Foi a coisa mais linda que vi na minha vida’’, conta Izabela Alves, de 62 anos, detetive responsável por presenciar o reencontro dos amantes da juventude. “Ele também nunca foi feliz porque amava aquela mulher, e ela estava ali, na frente dele, depois de 28 anos.” Izabela começou a exercer a profissão em 1984, mas sente que a sede por investigação surgiu aos 11 anos, quando invadiram as terras de seu pai cego e paralítico e falsificaram a documentação para que ele perdesse tudo. Ela foi atrás de experiência na área e afirma ser a primeira detetive mulher de Curitiba, acumulando mais de 35 anos de profissão. A investigação foi algo que por muitos anos teve que ser aprendida na marra pelos detetives. Desde 2017, exercer a profissão de investigador particular significa ter uma profissão de acordo com as leis e, desde o mesmo ano, o curso de tecnólogo em Investigação Profissional é ofertado pelo centro


universitário UNINTER. Segundo o coordenador do curso, Gerson Luiz Buczenko, três pilares são o que formam um técnico em investigação. “Temos disciplinas voltadas para o Direito, como Inquérito Policial, disciplinas focadas na Segurança Privada, como a disciplina Proteção de Executivos e Autoridades, e disciplinas próprias da Investigação Profissional”, comenta Buczenko. Para ele, o mercado de investigações só vem a crescer e ter uma formação superior auxilia ainda mais no profissionalismo dos futuros detetives.

de trabalharem separadamente, e serem concorrentes no mercado, sempre se ajudam com trocas de informações entre si. Oliel também fala sobre seu caso mais marcante ser uma história de amor do passado, “Passados 53 anos do ocorrido, ela resolveu saber sobre esse amor do passado, e apesar dela ter amado o seu esposo jamais tinha esquecido aquele amor da adolescência”. O caçula, Eliel Alves, também teve contato com o mundo investigativo ainda jovem por volta dos 8 anos de idade, porém aos 25, já havia se formado e tinha suas credenciais. Eliel, 40, narra sua história com um olhar mais sentimental, o detetive fala que o motivo de seguir a área de investigação foi sua mãe e o modo como investigava seu pai com certas dúvidas matrimoniais, flagrando-o diversas vezes. Eliel ainda reforça seus princípios, “Trabalho neste ramo não por dinheiro. Eu faço questão de mostrar a verdade.” Ele também comenta sobre o impacto que o adultério gera nas famílias, as consequências e traumas que causam em seus filhos. Com base em relatos de diversos detetives particulares de Curitiba/ PR, casos de adultério estão entre os principais motivos de contratação do serviço investigativo na capital paranaense. Cônjuges constantemente buscam pistas para saber se seu parceiro (ou parceira) procura outro alguém para se divertir. Esse é o caso da gestora em segurança do trabalho Cristina dos Santos*. A a mulher de 39 anos tinha em seu radar, suspeitas de que o marido estivesse a traindo, porém, este insistia em negar e fazer piadas chamando-a de maluca. Quando decidiu de fato, ir atrás de provas do adultério que estaria sofrendo, optou por seguir indicações de uma colega que já havia utilizado o mesmo serviço. Dessa forma, após pesquisas, a gestora elegeu aquele que viria a comprovar que seu companheiro de vida, havia, de fato, outra companheira. Assim, contratante e contratada entraram em comum acordo sobre como ocorreria a investigação, e, numa tarde de segunda - feira, às 14h30, a verdade finalmente veio à tona. Em um único ato, Cristina* avisou: “Ele

“Trabalho neste ramo não por dinheiro. Eu faço questão de mostrar a verdade.” Eliel Alves, investigador profissional Mas não só de teoria se desenvolve um investigador, os filhos de Izabela Alves, Cristiane, Oziel e Eliel, são a prova viva de que ter uma grande inspiração dentro de casa ajuda, e muito, a criar um bom faro de detetive. Cristiane Alves, de 44 anos, conta que seu início no mundo investigativo começou quando tinha apenas 12 anos, ajudando sua mãe na coleta de provas e seguimentos de alguns casos. Entretanto, oficialmente, Cris está neste ramo há 14 anos, e a investigadora comenta sobre a mudança no trabalho ao longo dos anos, o modo como a tecnologia foi e é essencial para a facilitação na apuração e coleta de provas, porém, essa modernização tem seus pontos baixos. Um exemplo abordado pela detetive é o aumento de crimes como assaltos e a maneira que dificultam o trabalho da profissão. “Antigamente tu seguias a pessoa passo a passo, nem desconfiava, mas com o tanto de assalto aí, o pessoal fica com medo de outro carro seguindo”, relata a investigadora. Oliel Alves, 42, afirma que sua motivação profissional também tem raízes familiares, já que assim como seus irmãos, ajudava sua mãe em algumas tarefas. O detetive conta que, apesar

cidades editoria || revistacdm revistacdm 29 29


Nome fotógraf

Nome fotógrafo

Nome fotógrafo

A rua é um dos principais cenários para a investigação profissional

Sarah Guilhermo

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saiu”. E lá se foi o detetive, guiado por um GPS e escuta - instalados anonimamente no veículo - em busca

havia descoberto. “Eu disse que já sabia e ele acabou falando a verdade, e felizmente fiz ele ir embora de casa.” Após todas as turbulências, a mulher procura seguir de cabeça erguida, “Já fazem 6 meses isso, e fazer o que né… Bola para frente”, finaliza. Em geral, Cristina* afirma ter gostado muito do trabalho do detetive, no entanto, se espantou ao ser cobrada por um dinheiro extra que não estava combinado. “A única coisa que eu não gostei do detetive foi que ele me fez um valor para fazer o serviço, mas quando pegou meu marido no pulo, cobrou a mais.” diz ela.

“Eu disse que já sabia e ele acabou falando a verdade, e felizmente fiz ele ir embora de casa.” Cristina dos Santos, contratante da verdade. Ao chegar ao local, o investigador, com cautela, avisou: “Respira fundo que não sei não…”. E foi assim que Cristina* constatou que, de fato, não estava maluca como o (ex) marido afirmava. O homem havia sido flagrado entrando em um motel acompanhado de uma ex-funcionária do casal. “Eu ouvia as conversas quando eles estavam juntos, e é isso”, comenta ela. Após tudo ser confirmado, a cliente decidiu ser sincera com o até então marido, e abrir o jogo sobre o que

* nomes fictícios usados para manter o anonimato dos personagens

Leia mais

Conheça histórias ficcionais que envolvem o mundo da investigação. portalcomunicare.com.br

Detetive, coach e cupido Francisco de Oliveira Junior, investigador particular há 22 anos, sabia que os casos mais comuns de busca para detetives era o adultério, mas ele nunca havia pensado que acabaria servindo como instrumento de união para um de seus clientes. Em meados de 2011 a 2012, Guilherme* bate na porta de seu escritório, onde funciona a Harpia Investigações. O trabalho era rotineiro, o cliente queria que Francisco seguisse a sua ex-noiva, para confirmar que ela possuía outro parceiro. Aceitando o caso, o investigador coloca sua equipe para seguir a moça. Apenas no décimo primeiro dia de trabalho, quando o contrato com o cliente até mesmo já havia acabado, é que sua equipe de campo confirma o surgimento de Alice*, ex-noiva de Guilherme*,

em uma danceteria. Transtornado, Guilherme* chega ao local com súplicas para que a jovem o acompanhasse, e, ao receber um “não”, o desespero o atinge. “O cliente deixou o local chorando, me ligou dizendo que tinha que resolver o problema e que precisava dessa mulher na vida dele. Marquei a reunião no escritório”, conta Francisco. A partir daí, o serviço de detetive teve que se modelar. A busca pela paixão de Guilherme* foi cara e extensa, mas após descobrir que o motivo da separação era o egocentrismo do rapaz, os passos para a reconciliação, junto à reconstrução de Guilherme*, deram certo. “E após muita terapia de casal e ansiolítico, estão casados até hoje”, Francisco comenta.

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Lotados e tensos Pandemia de covid-19 revela a presença de problemas graves na logística do transporte público de Curitiba e região Beatriz Bleyer Lorena Rohrich Lucca Marreiros

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ucas pega quatro ônibus por dia. Morador de Pinhais, região metropolitana de Curitiba, e usuário da linha Weissópolis e Pinhais/Campo Comprido, o jovem de 24 anos se desloca até o Centro da capital para trabalhar em sua web rádio Pop FM. Sem condições de se locomover por outro meio de transporte, ele se sente inseguro ao entrar no ônibus, por conta do alto risco de contaminação da covid-19 . “Uso por necessidade, mas tenho muito medo. Muita gente não respeita, não usa máscara e espirra. Tudo isso me deixa muito aflito.” O medo do jovem é justificável, já que, até o momento em que esta reportagem foi escrita, o Brasil atravessava uma das piores fases da pandemia.

Envato

Em 2020, mais de dois mil protocolos sobre a aglomeração em ônibus foram registrados na Central 156.


Uma pesquisa realizada pelo Centros de Prevenção e Controle de Doenças (CDC) dos Estados Unidos indica que as partículas infecciosas podem ficar suspensas no ar por até duas horas e, então, em um ambiente onde não há ventilação correta, o perigo de contrair a doença é maior. O contágio, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), pode acontecer, ainda, por meio do contato das mãos e uma superfície contaminada e após à boca, ao nariz ou aos olhos e com a inalação das gotículas que os infectados exalam ao falar ou tossir.

Em 2021, foram 491 registros envolvendo o assunto e subdivisão citado, dos quais 36 relacionados à pandemia, o que representa 7,3% até aqui. Mesmo com a presença dos fiscais nos principais terminais de Curitiba e RMC, o desrespeito às medidas sanitárias acontece. Para quem enfrenta diariamente essa e outras doenças, como Daiane Santana, o cenário é bastante ofensivo: “A gente se sente desanimado, porque estamos trabalhando para evitar mortes e as pessoas não entendem a gravidade”.

Odinéia de Fátima também precisa utilizar o transporte público todos os dias. É moradora da região metropolitana de Curitiba e, aos 51 anos, a diarista enfrenta a lotação dos ônibus da linha Pinhais/Rui Barbosa, principalmente. O principal receio é pegar o vírus e repassar para o seu marido e seus dois filhos, com quem mora na mesma casa. “Tenho Daiane Santana, enfermeira de um muito medo de pegar o ônibus, mas não tenho hospital em Curitiba escolha. É a única maneira de me locomover para trabalhar.” lotados” para chegar ao trabalho. Apesar de não atuar na linha de frente no Um estudo do DataFolha encomencombate ao coronavírus, o seu turno dado pela empresa de aplicativo de cobre 12 horas diárias de tratamentos automóvel Uber, indica que o principal de outras doenças. “É desagradável fator decisivo para a escolha do moter que encarar uma rotina cansativa delo de transporte utilizado durante depois de enfrentar um ônibus cheio a pandemia pelos entrevistados é o e, mais tarde, voltar para casa na grau de aglomeração (29%). A segumesma situação”, afirma. rança que o transporte oferece (20%) e, empatados com 14%, a facilidade O risco se torna ainda maior quando de acesso ao meio e o risco de contase contam os casos de desrespeito minação, seguem como essenciais na às medidas de prevenção à Covid-19. hora da escolha. Assim como Odinéia e No ano de 2020, houve 2.145 proDaiane, muitas pessoas não têm outra tocolos registrados na Central 156, opção de locomoção. pela subdivisão “Melhoria na oferta de veículos/viagens”, que direciona a Houve uma tentativa de mudança nas situações de superlotação nos veínormas do transporte público na capiculos do transporte coletivo. Dentro tal, como a redução da frota e da cadesse total, houveram 292 menções pacidade de transporte nas linhas. De sobre preocupações com a “covid-19” acordo com dados da URBS, empresa ou “coronavírus”, correspondendo a responsável pelo planejamento, 13,6% do total. Daiane Santana, 25 anos, é enfermeira de um hospital em Curitiba e pega dois ônibus “na maioria das vezes

“Estamos trabalhando para evitar mortes e as pessoas não entendem a gravidade.”

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A recomendação é manter uma distância de 2 metros de outras pessoas. Lucca Marreiros

operação e fiscalização do transporte público de Curitiba, atualmente, existem 254 linhas de ônibus na cidade, sendo que seis foram extintas e outras duas foram fundidas. Segundo a instituição, o número de passageiros reduziu muito durante a pandemia. Antes, o sistema contabilizava cerca de 734 mil passageiros de ônibus por dia em Curitiba. Agora, esse número caiu para 347 mil.

PASSAGEIROS ENCHEM E FUNCIONÁRIOS RESISTEM A situação também impacta quem está trabalhando diariamente nas linhas. De acordo com o Sindicato dos Motoristas e Cobradores nas Empresas de Transporte de Passageiros de Curitiba e região metropolitana apontou que cerca de 53 trabalhadores do transporte coletivo, tanto na capital quanto na Região Metropolitana da cidade, morreram por complicações causadas pelo coronavírus. Motorista da linha Biarticulado, Cleverton Camargo trabalha seis horas por dia, um total de 180 horas semanais. Dentro do ônibus é impossível

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cumprir com as normas de segurança estabelecidas pela prefeitura, especialmente a do distanciamento social. “Quem trabalha no sistema sabe que o distanciamento de 1,5 metros jamais vai ser possível dentro dos ônibus. Não tem o que fazer, já que os passageiros não podem esperar o próximo transporte”, afirma. Para quem mais precisa, o poder público se fez inexistente. “Não me sinto abandonado, porque nunca estiveram do nosso lado. Nunca tomaram nenhuma decisão a favor do transporte coletivo.” Rodrigo Lins é defensor da categoria e trabalhou por 17 anos como motorista de ônibus em Curitiba. Atualmente é jornalista, mas mantém contato constante com os antigos companheiros de trabalho e participa ativamente do processo de decisões em prol da categoria, defendendo assiduamente os interesses do grupo. “Inclusive, em uma manifestação recente, fui em cima de caminhão de som na frente da Assembleia, cobrar vacina para todos”, conta. “Dizem que o transporte coletivo não é uma fonte de contaminação. Isso é mentira! Onde há uma quantidade maciça de população, há uma grande chance de contaminação. O risco é muito grande. A contaminação vem de fora para dentro.”


E A SAÚDE DE QUEM ESTÁ ENVOLVIDO NESSE CENÁRIO? Mesmo que as acusações e as ideias de que os meios de transporte coletivo são potenciais transmissores da covid-19, o professor de Medicina da PUCPR Giovanni Breda prefere tratar o assunto de uma forma mais cautelosa. De acordo com ele, é impossível confirmar que os ônibus contribuem

passageiros e também dos funcionários do transporte público. Isso pode, inclusive, chegar a atingir o corpo, gerando sintomas como mal-estar, angústias, insônias, inseguranças, medos e até mesmo pânico.”

Além disso, a profissional confirma que, sim, é possível que algumas pessoas desenvolvam transtornos psicológicos e de comportamentos a partir da angustiante e tensa rotina. “São pessoas que não encontraram recursos que deem sustentação para seu aparelho psíquico diante de uma realidade extremamente devastadora que assola a humanidade. São crises que podem se desencadear em sujeitos até então bem organiGiovanni Breda, professor de zados psiquicamente, mas que frente a situações de perdas Medicina da PUCPR ou notícias tão assombrosas se desestabilizam”, explica.

“É muito importante que a população se conscientize e use os aparatos para se proteger do vírus.”

de forma decisiva para a proliferação do vírus. “Ainda é cedo para dizer isso, justamente porque não existem estudos que comprovem essa situação. Há uma ideia, mas não um fato científico 100 % comprovado.” Breda, porém, explica que a falta de execução das medidas de segurança pode influenciar diretamente a saúde de todos os envolvidos e alerta para a importância de se proteger. “É fato que, quando você está dentro de um ônibus lotado, ou até mesmo em uma grande fila para entrar no transporte, o risco de contaminação é alto. Portanto, é muito importante que a população, enfim, se conscientize e use os aparatos para se proteger do vírus”, afirma. A psicanalista Nilma Bittencourt afirma que a locomoção diária por meio do transporte público pode causar uma série de efeitos negativos sobre as pessoas. Os incômodos, além dos psicológicos, também podem se manifestar de forma física. “É um adoecimento que vai assolando a psiquê dos

RECOMENDAÇÕES PARA REDUZIR AS CHANCES DE CONTÁGIO DE COVID-19 Para reduzir as chances de contágio dentro dos ônibus, é necessário seguir algumas medidas de segurança. URBS e COMEC têm em mãos uma série de recomendações, aliadas às já aplicadas pelas secretarias municipais de saúde. Dentre as medidas, destacam-se a solicitação para que as empresas distribuíssem álcool em gel e máscaras aos trabalhadores, além da limitação no número de passageiros nos veículos. Além disso, a prefeitura de Curitiba afirmou que o transporte coletivo tem sido uma das áreas de maior foco de ações para conter o avanço do Covid-19. O órgão municipal destaca algumas das ações realizadas para proporcionar uma maior segurança aos passageiros, com a realização de assepsias especiais realizadas em todos os terminais da cidade e a prorrogação dos créditos do Cartão Transporte durante a pandemia.

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Medidas de proteção para maior segurança sanitária dentro dos meios de transporte públicos. Recomendações entregues pelo SINDIMOC às organizações e ações preventivas indicadas pela Organização Mundial da Saúde.

Respeite o isolamento dos bancos próximos aos motoristas e cobradores, para evitar passageiros em cima dos trabalhadores do transporte Não coloque as mãos no rosto durante o trajeto (mantenha-as especialmente longe dos olhos, boca e nariz)!

Pedido para que os trabalhadores com comorbidades e grávidas fossem afastados do trabalho e para que os trabalhadores do transporte coletivo fossem testados

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Busca para a aprovação do custeio emergencial do transporte coletivo de Curitiba, garantindo tanto o salário quanto os benefícios dos trabalhadores

Solicitação para que os trabalhadores do transporte fossem vacinados contra Covid-19 na primeira fase. Os trabalhadores foram incluídos na fase quatro

Solicitação para que os cartões transporte daqueles que não exercem atividades essenciais e para os que testam positivo para a covid-19 fossem bloqueados


O uso de máscaras é uma das principais medidas de proteção. A proteção serve tanto para você quanto para as pessoas a seu redor. As máscaras funcionam como uma barreira física para a liberação de gotículas que contêm o coronavírus e são expelidas por pessoas infectadas quando alguém tosse, espirra ou até mesmo conversa. A máscara deve necessariamente cobrir o nariz e a boca! Use corretamente!

Dê preferência por pagar com cartões magnéticos (cartão transporte). O uso de dinheiro ajuda na propagação e transmissão do coronavírus. Em Curitiba, nas linhas convencionais as viagens passaram a ser pagas exclusivamente com o cartão.

Se tossir ou espirrar, cubra o rosto com o antebraço ou utilize um lenço

Mantenha as janelas do veículo sempre abertas para a ventilação do ar Ao chegar em casa, coloque as roupas usadas imediatamente para lavar Ao chegar ao destino, lave as mãos ou aplique álcool gel e limpe os objetos pessoais que tocou durante o trajeto

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Ande com álcool em gel e aplique nas mãos durante a viagem, principalmente se o trajeto for longo.

Saiba mais O descumprimento das medidas obrigatórias de segurança contra a Covid-19 (aglomerações ou de funcionamento irregular de comércios e serviços em desacordo com as medidas sanitárias vigentes) pode ser denunciado através do site da Central 156, da Prefeitura de Curitiba. portalcomunicare.com.br

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Três vezes história

Ricardo Luiz

A Catedral, primeira igreja de Curitiba, possui o estilo arquitetônico neogótico. O estilo é conhecido como “a arte das catedrais” sendo utilizado pelas mais famosas igrejas, como Notre Dame e Duomo di Milano

As três primeiras igrejas de Curitiba são a Catedral Basílica de Curitiba, a Igreja do Rosário e a da Terceira Ordem de São Francisco das Chagas. Isadora Vargas, Raissa Micheluzzi, Rebeca Trevizani e William Zaramella

O

centro histórico de Curitiba é composto por elementos que nos contam muito sobre a presença do catolicismo na cidade. Do largo da ordem à Praça Tiradentes, encontramos as três primeiras igrejas da religião , carregando grande peso histórico e pérolas valiosas da estética e arquitetura, que narram visualmente a história da cidade. A primeira igreja a ser construída foi uma pequena capela de pau a pique em meados do século XVII, localizada onde hoje se encontra a Matriz. Os faiscadores de ouro do Rio Atuba a levantaram em homenagem a Nossa Senhora da Luz. No ano de 1720 foi construída a Antiga Matriz no estilo colonial português. Apenas em 1893 ela passou a ser a Matriz da cidade e tornou-se Catedral no ano seguinte.

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A segunda igreja foi a do Rosário. Originalmente chamada de Igreja da Nossa Senhora dos Pretos de São Benedito. Ela foi construída por escravos negros do século XVIII para que eles pudessem exercer sua fé uma vez que não podiam frequentar uma igreja de brancos. Inaugurada em 1737, a igreja do Rosário possuía estilo colonial e foi reformada em 1946 mudando para o estilo barroco. Entre os anos 1875 e 1893 ela serviu de Matriz, logo após a abolição da escravatura. A Igreja da Ordem Terceira de São Francisco das Chagas foi a terceira. Inicialmente chamada de Nossa Senhora do Terço, o nome foi mudado quando a Terceira Ordem chegou a Curitiba. A Terceira Ordem se inicia com pessoas leigas, sem exercerem alguma posição


Ricardo Luiz

A terceira igreja de Curitiba é a Igreja da Terceira Ordem de São Francisco das Chagas. Assim como a Catedral seu estilo arquitetônico é o neogótico, marcado pela verticalidade, abóbodas ogivais e um grande número de janelas e portas.

Ricardo Luiz

A Igreja do Rosário é a segunda igreja de Curitiba. Diferente da Catedral, ela possui o estilo barroco apesar de ter sido inicialmente construída com o estilo colonial.

Ricardo Luiz

clerical, apenas seguiam as normas franciscanas. Com o estilo colonial, a igreja foi inaugurada em 1787 pelo Coronel Mota. Pouco tempo depois, no ano de 1880 a igreja foi ampliada e reformada para o estilo neogótico. Teve suas despesas financiadas por Antonio Ricardo de Andrade, deputado provincial da época. Lendas dizem existir túneis que conectam as três igrejas, construídos durante a Segunda Guerra Mundial para facilitar a fuga dos alemães que moravam em Curitiba caso fosse necessário. As visitações e missas estão sujeitas a mudanças devido aos decretos locais com medidas contra o covid-19.

Vitrais coloridos e cheios de vida, marcados por um grande valor monetário investido em cada um deles.

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Foto: Sophia Gama

Comida pra quem tem fome Iniciativa do MST Paraná, em parceria com voluntários, leva alimentos para pessoas em situação de vulnerabilidade social Herick Pires Isadora Mendes Mariana Scavassin Sophia Gama

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“As pessoas estão com fome e a gente compartilha o alimento.” - Leonardo Santos, comunicador popular

A

cordar, ir ao trabalho, viver o dia e, ao se deitar na cama à noite, não saber se terá o que comer no dia seguinte. Essa é a realidade de mais da metade das famílias brasileiras, conforme o estudo “Efeitos da pandemia na alimentação e na situação da segurança alimentar no Brasil”, divulgado no início deste ano. De acordo com a pesquisa, mais de 59% dos entrevistados passaram por algum nível de insegurança alimentar no último ano; essa porcentagem representa, aproximadamente, 125,6 milhões de brasileiros. Atualmente o Brasil passa pela pior situação em relação à segurança alimentar dos últimos 17 anos. Estima-se que, no fim de 2020, cerca de 19 milhões de brasileiros passavam fome. Uma pesquisa realizada pelo IBGE em setembro do ano passado apontou que, só no Paraná, pelo menos 250 mil pessoas estavam nesta situação, e que outros 2 milhões não tinham a garantia das principais refeições do dia. Apenas em Curitiba, o Cadastro Único do Ministério do Desenvolvimento Social aponta 2,7 mil pessoas vivendo nas ruas. Frente a um momento tão crítico, a solidariedade mobilizou grupos a formarem projetos para colocar comida na mesa de quem mais precisa. O Marmitas da Terra, ini-

ciativa do MST Paraná, é uma dessas iniciativas. O projeto surge quando integrantes do MST percebem a dificuldade ainda maior que a pandemia traria à população de rua e situação de risco no Paraná. Uma das organizadoras e idealizadoras do Marmitas da Terra, Adriana de Oliveira, lembra que foi lançada uma campanha ao nível nacional pelo MST, para arrecadar alimentos para aqueles que mais precisam. Entretanto, foi em Curitiba que os militantes resolveram montar uma cozinha para o preparo de refeições para serem distribuídas à população de risco. No início, eram cerca de dez voluntários, que produziam as marmitas, mas devido ao aumento da demanda e ao crescimento do projeto, hoje são mais de 170 pessoas trabalhando na produção. Muitos dos voluntários já tinham contato com os projetos sociais do MST, e assim que souberam do Marmitas da Terra procuraram alguma forma de ajudar. Vanessa Dotto, uma das voluntárias da ação, faz parte do coletivo desde julho de 2020 e esteve em diferentes áreas de atuação, ela conta que foi motivada pela emergência da fome e desemprego no país, e decidiu que sairia do isolamento para ajudar

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nas ruas. “Eu não tava saindo para canto nenhum, e falei: ‘Bem, se eu sair de casa, vou sair para fazer alguma ação, para doar um pouco do meu tempo para conseguir colaborar’.” No dia 2 de maio o projeto completou um ano, quase o mesmo tempo que o Brasil passa pela pandemia da Covid-19, e, nesse tempo, foram distribuídas mais de 55 mil marmitas, o equivalente a 600 toneladas de alimentos orgânicos, produzidos por meio da organização popular.

Sophia Gama

O que começou com a distribuição de 300 refeições semanalmente foi aumentando exponencialmente, e, depois de um ano, a produção semanal passou a ser de 1.100 refeições integralmente realizadas pela cozinha do MST, com alimentos oriundos do Assentamento Contestado, na Lapa. No dia das entregas - todas as quartas, sem falta - uma fila dupla com aproximadamente 100 pessoas se estende pela Praça Rui Barbosa, no Centro da cidade, à medida em que as marmitas são entregues, porém, a fila parece não diminuir. Por 30 minutos, pessoas chegam incessantemente ao local à procura do “almoço de graça da Rui Barbosa”. Algumas se espalham pela praça para comer, outras apenas pegam o kit que contém a marmita, um copo de água, uma fruta e uma máscara e vão embora.

Em um clima quase familiar, os mais distintos tipos de pessoas almoçam ali juntos. Ao perguntar para algumas delas o motivo pelo qual pegavam comida ali, as respostas eram diversas: “Enquanto eu estiver nessa situação, tenho que pegar”, “O cheiro da marmita traz a gente aqui, a fome fala”, “Essa marmitinha aqui eu vou levar para a minha família”. Apesar da divulgação on-line, grande parte dos beneficiados descobrem o projeto nas ruas - um conhecido ouviu falar, alguém foi perguntar, um amigo indicou. José, o vendedor de alfajor, é uma dessas pessoas e se beneficia do projeto desde o início. “Eu passei por aqui um dia, vi a fila e perguntei: é de graça? Desde então eu venho”. O comunicador popular Leonardo Santos, 26, faz parte da equipe de entrega dos alimentos e define o Marmitas da Terra como uma “ação assistencial imediata”. “As pessoas estão com fome e a gente compartilha o alimento”, conta. O objetivo principal do projeto, porém, não se resume apenas a sanar a fome da população em situação de vulnerabilidade. O Movimento Sem Terra visa um projeto de sociedade que engloba o fim da fome, a repartição igualitária de terras e o fim da luta de classes. O projeto, portanto, é um passo inicial para alcançar essa meta.

O Marmitas da Terra distribui, semanalmente, mais de 1.100 refeições para a população curitibana.

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Sophia Gama

Por meio do projeto, mais de 600 toneladas de alimentos foram entregues apenas por meio da iniciativa popular.

Saiba mais: Insegurança alimentar Conforme a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan), a segurança alimentar é definida como “a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais”. De modo a compreender o impacto da pandemia na segurança alimentar dos brasileiros, pesquisadores nacionais e estrangeiros uniram-se no estudo “Efeitos da pandemia na alimentação e na situação da segurança alimentar no Brasil”. Confira dados abaixo.

Conheça o Marmitas da Terra Se interessou pelo projeto e quer saber como ajudar? Conheça as redes sociais do Marmitas da Terra! portalcomunicare.com.br

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REVENDO NOSSO LIXO Frente à alta produção de lixo produzido no mundo, novos produtos reutilizáveis surgem como alternativa sustentável. Isadora Vargas, Raissa Micheluzzi, Rebeca Trevizani e William Zaramella.

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“C

omprei, testei e amei.” É assim que Sâmela Ribeiro descreve seu primeiro contato com absorventes ecológicos. A engenheira civil, que adorava a disciplina de saneamento como ela mesma descreve, pensa muito sobre os impactos ambientais gerados pela produção excessiva de lixo e a problemática da decomposição dos produtos com plástico foram as motivações iniciais para aderir aos absorventes reutilizáveis. Vivemos em uma sociedade de consumo que nos apresenta diariamente, formas rápidas de lidarmos com nossos problemas. Desde comidas rápidas, cheias de pacotes e

do que muitos pensam, a higienização das fraldas reutilizáveis é mais fácil do que parece. Aline explica que, para lavá-las, basta retirar os resíduos fecais e colocar a fralda na máquina de lavar com dois enxágues. Além de ser uma pauta importante para o meio ambiente, a reutilização dos plásticos também interfere bastante nas nossas finanças pessoais. Uma mulher que utiliza um absorvente gasta, em média, de R$ 6 a R$ 9 por mês, mas com a consciência de que a reutilização é mais viável também para o meio ambiente, ela consegue ter uma economia por mais tempo. Continuar com o alto consumo de plástico nas ações mais básicas do cotidiano, como no ciclo menstrual ou na fralda de uma crianças podem ser cruciais para o meio ambiente, uma vez que estruturas de polímeros (plásticos) estão diretamente ligadas à sua confecção. O plástico leva 450 anos para se decompor na natureza. Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) de 2018 mostram que os oceanos recebem anualmente 8 milhões de toneladas de resíduos de plástico.

“O problema é do plástico? Não, o problema é da gente.” - Doutora em Química, Cida Oliveira embalagens descartáveis até soluções para lidarmos com nossa higiene pessoal. A industrialização e a produção em massa nos oferecem a facilidade, que nos cega e nos faz produzir quantidades significativas de lixo todos os dias. A empreendedora e mãe Aline de Oliveira Fevereiro é dona da loja on-line Mamativa. Ela trabalha revendendo fraldas ecológicas reutilizáveis, absorventes femininos e outros produtos ecológicos. A empresária começou a trabalhar nesse ramo há dois anos, quando iniciou a utilização das fraldas na filha caçula. Para ela, achar métodos alternativos para diminuir o consumo de plástico traz diversas vantagens, indo da parte ambiental e financeira até o conforto e a saúde. “Com as fraldas ecológicas você economiza dinheiro, ajuda o meio ambiente, a saúde do seu bebê e o conforto também.” Fraldas descartáveis possuem mais de 30 substâncias tóxicas, que causam assaduras na criança. Diferentemente

Segundo o portal eCycle, uma mulher usa em média 10 mil unidades de absorventes descartáveis no decorrer de sua vida, totalizando 450 ciclos menstruais. Uma criança usa em média 4 mil fraldas descartáveis desde o momento em que nasce, até o dia do desfralde. Ambos os produtos são feitos com materiais semelhantes. Uma unidade de absorvente ou de fralda é feita de celulose, um polímero de glicose, diversos plásticos, como polietileno, propileno, adesivos termoplásticos, polímero superabsorvente e também utiliza papel siliconado, agente controlador de odor. Vale ressaltar que o problema supostamente gerado pelo plástico acontece, na verdade, pela má destinação do produto. Se houvesse melhor descarte do material, o cenário seria

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diferente. “O problema é do plástico ? Não, o problema é da gente”, diz a doutora em Química da Universidade Federal do Paraná, Cida Oliveira. É necessário pensar na reutilização e reciclagem do mesmo. É verdade que a reutilização traz grandes benefícios para a sociedade e é o que acredita a jornalista Beatriz Jarzinski. “Acho muito pertinente a reutilização dos plásticos em geral, já que isso contribui diretamente para a preservação e cuidado com o meio ambiente.” Beatriz também diz que se cada um fizesse sua parte, o retorno ambiental seria muito maior e haveria maior aproveitamento para todos num geral. Assim como algumas outras pautas ambientais, este assunto ainda não é tão veiculado na sociedade, mas não deixa de ser um ponto muito importante a ser discutido, já que tem tanta influência na vida das pessoas como um todo e na preservação do planeta. Muitas pessoas ainda relutam em usar coisas derivadas de materiais reutilizáveis e, de acordo com Beatriz, essa relutância está ligada ao desconhecimento. “Acho que essa relutância vem muito do ensino. As pessoas realmente não aprendem sobre esse assunto quando são mais novas e se isso acontecesse o cenário poderia ser diferente.” Convencer uma sociedade a adotar uma cultura de reutilização pode ser um desafio. Tudo é derivado do conhecimento, já que nem sempre sabemos o tamanho do benefício que uma atitude como esta pode trazer

Lixo no Paraná

Raissa Micheluzzi

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para nossa vida. “Para convencer as pessoas de que é seguro usar coisas derivadas de materiais reutilizáveis, devemos saber como é produzido, como influencia, quais são os benefícios. Ter essa base de ensino para depois saber quais são os benefícios no cotidiano”, finalizou a jornalista.

COLETOR MENSTRUAL Ainda que não haja total aprovação e desavenças a respeito de fraldas e absorventes menstruais de pano, outra saída muito eficaz para aqueles que querem reduzir o consumo de plástico é utilizar o coletor menstrual. Ele consiste em um pequeno copo de silicone hipoalergênico que se encaixa no canal vaginal, coletando assim o sangue do ciclo menstrual. O coletor é uma alternativa que agrada não somente pelos fatores ecológicos mas também pela praticidade. A estudante de pedagogia Anna Tojeiro diz ter aderido ao coletor em 2018 quando precisou ir viajar e buscou uma saída para não se preocupar com a menstruação. Desde então Anna passou a usar sempre e a se inteirar com as pautas ambientais que envolviam o produto. Apesar dos impactos gerados pelo uso do plástico, é importante lembrar da utilidade do mesmo para a qualidade e duração de alguns produtos. Segundo a doutora Cida Oliveira, é necessário fazer o uso racional do plástico. “Não podemos generalizar o problema do plástico.” Para ela, a saída para isso seria não somente a substituição do material, ainda que eficaz, mas também a reutilização.

Segundo a assessoria de imprensa da Secretaria do Desenvolvimento Sustentável e do Turismo do Paraná, não existe um número específico da produção de lixo a partir do consumo de absorventes e fraldas em todo o estado, porque para ter esta informação precisaria regularmente fazer a gravimetria dos resíduos, uma análise que os identifica em várias tipologias, antes de serem dispostos nos aterros sanitários. Essa prática só

é realizada nas grandes cidades do estado, então temos esse dado apenas de cidades como a Capital do estado, onde são geradas uma média de 13 toneladas de fralda por dia em Curitiba e Região Metropolitana. As legislações do país sempre se preocupam e incentivam a reciclagem. Além disso, o governo estadual tem programas de incentivo e apoio às cooperativas e associações de recicladores em todo estado.


Raissa Micheluzzi

O coletor menstrual substitui o absorvente descartável e pode ser usado por até 12 horas. Seu tempo de vida útil é de três anos.

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Diplomas suspeitos O expansivo comércio de trabalhos acadêmicos gera consequências legais e profissionais André Festa, Guilherme Kruklis, Laura Luzzi, Rafael Coelho e Romano Zanlorenzi

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começo do ano letivo traz de volta o tema da comercialização de trabalhos acadêmicos. Esta prática tem sido uma saída entre os estudantes que não conseguem dar conta de tudo. A fim de ter mais tempo livre, não ficar sobrecarregado ou, simplesmente, por preguiça, muitos optam por não realizar suas pesquisas e trabalhos acadêmicos e acabam comprando de outros estudantes. Assim, acreditam ter a garantia de uma boa nota sem muito trabalho e tempo gasto. Porém, além de crime, há a perda do aprendizado que o trabalho levaria o estudante a obter. Apesar de garantir sua nota, o aluno terá lacunas em sua formação, prejudicando sua vida profissional. De acordo com a pós-doutora e coordenadora do curso de Direito na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Vivian Valle, tanto vendedor quanto comprador podem responder judicialmente por crimes como falsidade ideológica e estelionato. Apesar das contraindicações, o comércio de trabalhos acadêmicos não é novidade no meio universitário. Na era digital, as transações ocuparam a

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internet, dando espaço para a criação de projetos como o marketplace “Deixa Que Eu Faço”. A página de Instagram que trabalha conectando estudantes dispostos a pagar por trabalhos e redatores que os fazem está em operação desde 1º de março. O criador e administrador da conta, Enrico Silvestri, observa um crescimento simultâneo dos dois públicos atingidos desde o início do projeto. “A gente enxerga nossa empresa como uma segunda chance, um benefício para o universitário”, argumenta Silvestri, ao citar redatores em busca de renda extra e alunos que estariam sem tempo ou desmotivados com o curso escolhido. O descomprometimento com matérias do currículo de Engenharia de Produção foi o que levou um aluno, que não quis se identificar, a apelar pela compra de trabalhos. “Me aproximei de profissionais, até de um que trabalha em multinacional na área de engenharia, e perguntei sobre (a disciplina) Cálculo: ‘Quantas vezes você usou isso na tua vida?’ - Todos me responderam que nunca usaram em nenhum momento”. O estudante, próximo da formação, conta ter delegado avaliações em ao menos três matérias, incluindo exames para aprovação do semestre. Apesar de ver importância na posse de um diploma, avalia que o título de engenheiro não seja determinante para a vida profissional que almeja.


Um estudante de Direito, também anônimo, admitiu que vende trabalhos da universidade. De acordo com ele, as pessoas nem sempre têm tempo

“O professor sente tristeza ao

saber que todo o seu trabalho para repassar o conhecimento está sendo em vão, já que o aluno opta por não realizar o trabalho e paga para que outro o faça em seu lugar.” Juliana Brambila, advogada e professora da Universidade Tuiuti para fazer tudo, e acabam buscando essas alternativas para não reprovar. O aluno também comenta que é bom para a formação dele. “Não é algo que me cansa, sabe? É minha profissão, estou revendo conteúdos, aperfeiçoando minha capacidade, e ainda ganhando por isso. Pô, super vale a pena”, ressalta o estudante. O aluno ainda fala que, durante o começo das aulas online, a demanda aumentou, mas agora as pessoas se adaptaram e está mais fácil de colar. O vendedor explica que o preço da compra de atividades acadêmicas pode variar de acordo com o tamanho e dificuldade. Um trabalho de duas laudas, por exemplo, custa cerca de R$ 70. Segundo a advogada Heloise Jory, a pena por falsidade ideológica pode chegar a três anos de reclusão mais multa em documentos particulares,

já nos documentos públicos pode acarretar em cinco anos de prisão. Outro crime passível no momento da compra de um trabalho é o de plágio. Neste caso, segundo o artigo 184 Código Penal, a pena para comprador e vendedor pode ser de multa e até detenção de três meses a um ano, além da punição acadêmica, na qual o trabalho se torna passível de ser zerado e invalidado, inclusive trabalhos de conclusão de curso. A argumentação dos representantes da “Deixa que Eu Faço” considera que os crimes só se comprovam com vendas de provas e TCC’s, não negociados pela empresa, e ainda declara que todos os documentos vendidos são autorais, tendo passado por “sistema anti-plágio”. A advogada e professora da Universidade Tuiuti do Paraná, Juliana Brambila, fala dos sentimentos de revolta e tristeza ao flagrar um trabalho que não foi escrito pelo aluno, “O professor sente revolta por se ver enganado pelo aluno que, na ânsia de tentar levar vantagem em sua aprovação, resolve pagar para que outro faça o trabalho em seu lugar. E tristeza por saber que todo o seu trabalho para repassar o conhecimento está sendo em vão, já que o aluno opta por não realizar o trabalho e paga para que outro faça em seu lugar”. A professora comenta como distingue um trabalho comprado: a forma de escrever, o vocabulário e a técnica linguística são aspectos identificáveis. Também existem programas de computador que auxiliam o professor, mas considera que a melhor forma é questionar o aluno sobre o trabalho, já que a maioria não é capaz de ler o trabalho que comprou. Juliana lamenta que o estudante esteja abrindo mão do próprio aprendizado e conhecimento verdadeiro, o que fará diferença ao entrar no mercado de trabalho.

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A internet e o desempenho acadêmico das crianças Tecnologia vem sendo incluída cada vez mais na rotina infantil. Se monitorada de forma correta pelos pais, pode se tornar uma grande aliada nos estudos Daniela Cintra, Isabella Serena, Diogo Santos

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ma pesquisa feita pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e a Universidade da Califórnia, resolveu testar o comportamento infantil após distribuírem consoles de jogos para algumas crianças. Após quatro meses de estudo, pode-se perceber que a maioria passou a maior parte do tempo jogando ao invés de realizar os deveres de casa, o que resultou em um decréscimo das notas escolares em 5%. Em outra pesquisa realizada pelo MIT, dois grupos de crianças tiveram que decorar uma lista de palavras, logo após a atividade: o primeiro grupo não poderia jogar, já o segundo grupo jogou videogame durante uma hora. No dia seguinte, as crianças que não jogaram lembravam cerca de 80% das palavras em comparação às que jogaram, que lembravam de 50% das palavras contidas na lista. É fato que nos tempos atuais as crianças têm encontrado nos videogames e na tecnologia uma válvula de escape para fugir da solidão do isolamento. Vera Staniack de 55 anos, técnica em enfermagem e cuidadora de idosos, conseguiu encontrar uma forma de fazer com que os netos se desligassem pelo menos um pouco dos video

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games. Moradores de um apartamento que não possui área de lazer, os irmãos Gabriel Staniack, de 8 anos, e Vinícius Staniack, de 10, rigorosamente todos os dias às 15 horas são levados à rua pela avó e a madrasta, que os observam enquanto eles andam de skate, bicicleta ou brincam de qualquer outra coisa que os desliguem dos celulares que cada um possui. “O desempenho nas aulas online tem sido bom, aparentemente, mas nós não sabemos se isso é algo sincero ou se é apenas uma tentativa de ‘tapar o sol com a peneira’ dos professores tentando dizer que eles estão indo bem”, comenta Vera. Quando não estão andando de skate, os meninos ficam o tempo todo dentro do apartamento, entretidos com videogames ou consumindo conteúdos do YouTube. Para Vinícius, que está no quinto ano, as atividades à distância são mais fáceis do que presencialmente, e garante que o tempo que passa no celular não o prejudica: “Não tem como fazer outras coisas na internet na hora da aula, pois você precisa ficar com o celular ali, conectado”, afirma ele. Já Rosemeri Aparecida Rozza Schambeck, de 48 anos, mãe de Bruno, de 13, e Isabela, de 11, as crianças têm se tornado mais antissociais, pois pas-


sam bastante tempo nos celulares e computadores, nos quais acabam fazendo amizades pela internet. “Tomo muito cuidado com as amizades virtuais, porque como estão na adolescência isso se torna bem complicado, então tenho sempre que ficar de olho.” Com as aulas on-line, Bruno e Isabela têm se afastado dos amigos da escola, às vezes conversando com alguns somente para manter o contato.

ideal e impor regras para o uso, já que os videogames também ajudam no raciocínio lógico, desperta a criatividade e ajuda a criança a ter facilidade em tomar decisões, sendo assim ele é bom para a parte cognitiva mas dentro de um tempo ideal de uso.”

Isabela revela que aprendeu um pouco de francês ao utilizar as redes sociais e assistir video aulas, tendo como preferência o Instagram e o YouTube, onde procura aprender coisas que lhe ajudam a passar o tempo. Para Renata Lima Wanderbrock, mãe de uma menina de 8 anos, as preocupações são de não conseguir ensinar o conteúdo para sua filha por não ter paciência e muitas vezes não saber como aplicar esse conteúdo na rotina. A pedagoga e psicopedagoga Fátima Cintra, afirma que o uso dos videogames ajuda na parte cognitiva e não deve ser retirado por completo da rotina da criança. “O essencial é que exista outras atividades que sejam priorizadas, não somente os video games, pois estes são equipamentos do momentos de lazer, o tempo ideal seria de uma hora por dia para crianças acima de 5 anos pois abaixo dessa idade não seria ideal acrescentar à rotina. Estudos apontam que o excesso de jogos fazem mal à saúde da criança, pois fazem com que demais atividades que elas precisam realizar sejam substituídas, porém, proibir as crianças de jogarem pode causar uma revolta no comportamento delas e gerar diversos problemas em casa ou deixá-las agressivas no dia a dia, cabe aos pais saberem estipular o tempo

Leia mais Confira o infrográfico com mais informações sobre o uso da internet no Brasil. portalcomunicare.com.br

Isabella Serena

Isabella Serena

Isabela passa duas horas por dia conectada ao celular.

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A influência do Tik Tok na indústria musical Entenda como funciona o processo de viralizaçao de uma música no aplicativo Eduarda Fiori Ricardo Luiz

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ão é nenhuma novidade que a indústria fonográfica precisou se adaptar a diversas mudanças com os avanços tecnológicos que acontecem em cada década, desde o surgimento do fonógrafo, gramofone, fita magnética, disco de vinil, fita cassete, walkman, CDs (Compact Disc) e o áudio digital. A modernização que vem ocorrendo desde 2010 com o surgimento da era dos streamings, traz uma nova forma de consumir música, a mais prática até então. Atualmente, existe um leque de possibilidades, como o Spotify, Deezer, Youtube, Apple Music e outras ferramentas que representam uma grande fatia na construção de um hit. Certamente, o uso de canais de rádio não se faz tão necessário quanto antes para saber das últimas novidades do mundo musical, é preciso apenas conferir o topo das paradas, playlists e aplicativos que lançam tendências, como o Tik Tok. Uma das mais usadas redes sociais no Brasil e no mundo, o Tik Tok, viralizou intensamente, principalmente com o início da pandemia, já que trouxe um escape da realidade para seus usuários. Seu valor de mercado aumentou

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em 33% nos últimos dois anos, de acordo com a Bloomberg. Com uma proposta de vídeos curtos e recursos de edição dinâmica, o Tik Tok surgiu em 2016. A rede social ganhou aproximadamente 6 milhões de usuários, se tornando o aplicativo mais baixado do mundo durante o primeiro trimestre de 2020 e atingiu dois bilhões de downloads, de acordo com o App Annie. O Tik Tok influencia fortemente não apenas as redes sociais, mas também os charts e a indústria musical e se consagrou como o favorito entre os jovens, um público que costuma lançar músicas e artistas ao sucesso.

DESAFIOS MUSICAIS E A BILLBOARD HOT 100 A indústria fonográfica foi fortemente afetada pela popularidade do Tik Tok. A plataforma se tornou o ponto de ancoragem de diversas campanhas de marketing, uma vez que ter sua música viralizada no aplicativo é sinônimo de grande sucesso. Assim, a popularidade da música se estende para todas as outras plataformas como o Youtube e o Spotify. O aplicativo também consegue introduzir novamente músicas antigas de volta às paradas e trazer novos ou pouco conhecidos artistas a elas também. O melhor exemplo é


a cantora pop Doja Cat, que deu seu maior salto da carreira quando sua música “Say So” ficou popular na plataforma de vídeos e graças a isso, a faixa obteve mais de 430 milhões de acessos no Youtube e assumiu o primeiro lugar na lista das músicas mais ouvidas da Billboard. Graças a essa visibilidade, Doja Cat foi vencedora da categoria “Artista Revelação” na maior cerimônia de premiações da indústria da música, o Grammy Music Awards. O sucesso trazido pelo Tik Tok mudou a forma como Doja Cat e diversos outros artistas trabalham o marketing de suas músicas, o videoclipe da faixa “Streets” da cantora começa com um desafio popular no Tik Tok, e serve como homenagem da cantora para a plataforma que a posicionou no mercado como uma grande estrela do pop. Essa é uma prática que vem se tornando cada vez mais comum, os artistas lançam suas músicas já pensando em um desafio no Tik Tok, uma vez que além de ajudar na divulgação da faixa, também é uma forma de interação entre o artista e seus fãs. Dessa forma, o app conseguiu trazer diversas músicas para o Billboard Hot 100, um dos charts mais conceituados no mundo musical. Outro exemplo, aconteceu com o cantor americano de R&B, Giveon. A música “Heartbreak Anniversary” alcançou na plataforma uma forte viralização, acumulando um

conjunto de coreografias em mais de 2 milhões de vídeos. Logo mais, a faixa chegou a terceira colocação na Billboard Hot Canções R&B, o décimo lugar em diversos Streamings de músicas e número 22 na Billboard Hot 100.

TIK TOK BRASIL O Brasil trouxe assíduos usuários a comunidade no aplicativo chinês. Na pandemia por exemplo, o tempo médio dos brasileiros dobrou de 30 para 60 minutos, e ao todo sete milhões de brasileiros já usam o TikTok, de acordo com o site Oberlo. Na música nacional, não poderia ser diferente, diversas músicas alcançam milhares de visualizações em aplicativos de streamings, a música “Bipolar” dos MCs Pedrinho, Davi e Don Juan, alcançou 101 milhões de visualizações no Youtube, após todos o sucesso dos desafios musicais do Tik Tok. “Bipolar” é a capa da playlist Top Brasil, uma das mais famosas do Spotify e está em quinto lugar entre as mais reproduzidas diariamente no Brasil no aplicativo. Outro caso de sucesso aconteceu com a música “Camisa do Flamengo” do MC Meno K e DJ 2L da Rocinha, o funk acumula mais de 65 milhões de visualizações no Youtube e se tornou popular entre os jogadores do Flamengo, como o craque Gabigol.

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Ai, que vergonha! Conciliar diversas atividades sem sair de casa e manter a aparência elevada é um dos muitos desafios que surgiram com a pandemia Isabelle Almeida, Jéssica Pretto e Nathalia Brum

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horário de levantar da cama, o percurso até o local de trabalho, a roupa para vestir e até a relação com a figura que aparece no espelho ou na câmera do celular, mudou. Com o isolamento social provocado pela pandemia da COVID-19, nosso ambiente de trabalho e descanso se tornou o mesmo. E como se adaptar a ele e a nossa presença virtual? De acordo com a pesquisa Gestão de Pessoas na Crise COVID-19, realizada pela Fundação Instituto de Administração (FIA), 46% das empresas adotaram algum tipo de trabalho remoto estilo home office em que 34% dessas pessoas apontaram algum tipo de dificuldade ao usar os equipamentos. Referente à autoestima durante esse período, 21% das mulheres relataram que não houve mudanças em comparação a 38% dos

Maria Eduarda Stelle

Rotina estud de Mar Eduar Stelle pandem


de dos ria rda na mia.

homens. Isso é um reflexo dos estímulos que as redes sociais promovem sobre a supervalorização do corpo e a cuidados com a beleza. Acordar em cima da hora atrapalha nossa aparência, ficar muito tempo sentado dá dores nas costas, usar a mesma roupa o dia inteiro estraga e por aí vai. Na rotina da estudante de Direito Maria Eduarda Stelle, Duda, 18, o look principal é o moletom, e quando um vai para lavar, já vem outro em seguida. Mas a monotonia da pandemia trouxe uma surpresa: a melhoria na autoestima. Para ela, passar mais tempo sozinha se tornou uma oportunidade para mudar seu visual e ter um novo olhar sobre si mesma. “Eu me encontrei na pandemia, mudei meu cabelo e outras coisas, e hoje me sinto melhor me arrumando do que me sentia antes, me sinto eu mesma.”

nal. “O vídeo é bem menos exigente com a gente e me parece muito com o que as pessoas estão vivendo no mundo real.” Apesar da rotina on-line ser “puxada”, Stancki relata que gosta do conforto que o trabalho em formato home office proporciona e que teve que estabelecer algumas regras mentais para conseguir seguir uma rotina de trabalho dentro de casa, como deixar de usar pijama o dia todo e tomar um banho antes do início de cada aula. “Eu sempre tomo banho antes de dar aula, mas é porque eu preciso colocar o meu cérebro para entender que eu vou trabalhar, o que é difícil, porque eu tô em casa o tempo todo.” As estudantes Maria Fernanda Almeida, 20, e Gabrielle Portes, 19, estão gostando bastante do conforto de estar em casa, porque a vida antes da pandemia era muito corrida e, agora, atividades exaustivas como lo-

“Tem um pijama que eu uso todos os dias que ele fez vários rasgos enormes que eu tive que jogar no lixo e comprar outro.” Maria Fernanda Almeida, estudante

As chamadas de vídeo que Duda faz no seu dia a dia geralmente não envolvem câmera, exceto pelas consultas quinzenais on-line com sua psicóloga em que a intimidade não exige embelezamento. O conforto proporcionado por estar em casa não é um problema para suas atividades, no horário de aula ela gosta de estar no seu cantinho, embaixo das cobertas e confortável. A rotina dos educadores e outros profissionais que tiveram que se adaptar ao home office não ficou muito diferente da de Maria Eduarda. Sem a preocupação de se arrumar por completo e passar produtos referente a perfumaria, o professor de Jornalismo Rodolfo Stancki comenta que prefere usar roupas mais confortáveis, mas nem por isso parecer menos profissio-

comoção até os compromissos abriram espaço para mais tempo de descanso. E esse conforto todo mexeu com o armário delas, enquanto as roupas favoritas estão pegando mofo, pijamas, moletons e outros looks estão indo à guerra. “Eu tenho outfits para cada momento, tenho dois pijamas, um pra dormir e outro pra ficar em casa, roupa de fazer exercício e a terceira roupa que é a roupa de guerra que é a roupa que eu uso pra sair de casa e que já coloco pra lavar quando volto por medo do coronavírus”, afirmou Gabrielle. E a relação da Maria Fernanda com o pijama nunca foi tão próxima, resultando até em desgastes no relacionamento: “Tem um pijama que eu uso todos os dias que ele fez vários rasgos enormes que eu tive que jogar no lixo e comprar outro”, assumiu.

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A advogada Suellen Cavalcanti, 35, conta que, no começo da pandemia, se arrumava normalmente para fazer reuniões com os colegas de trabalho, mas conforme os meses foram passando, a necessidade de estar vestida formalmente foi ficando de lado. “Como eu tenho uma filha pequena e ela ficou um bom tempo sem ir pra escola, minha rotina mudou, ficou mais corrido, então acontecia de eu não ter aquele tempo todo para me

Suellen passou por uma situação na frente das câmeras que considerou constrangedora. “Eu estava fazendo uma reunião com cliente, com uma camisa por cima, e por baixo um short de academia, porque estava fazendo exercício um pouco antes. No meio da reunião precisei levantar para pegar alguns documentos do outro lado da sala, e só me lembrei do shorts quando estava voltando para o computador e vi na tela.” Ela diz que ficou envergonha-

“A pessoa acaba se isolando cada vez mais, porque não se aceita, nem com ela mesma, nem no grupo.” Verônica Alves, psicóloga

arrumar, sem contar o ânimo. A gente fica com mais preguiça de se arrumar pra ficar em casa”, conta. Além disso, ela relata que houve mudança com relação a sua autoestima, já que, atualmente, tem se arrumado apenas em situações que o trabalho exige. “Deixei de ir ao salão fazer as unhas ou o cabelo por conta do isolamento, salto alto meu pé não vê há meses. é confortável, mas sinto saudades de me arrumar e sair.”

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da e sem graça, pois era uma roupa mais íntima que um cliente jamais veria, se não fossem as confusões que reuniões online podem causar.

DEPRESSÃO Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o número de brasileiros com depressão já ultrapassa 13 milhões de pessoas. A psicóloga Verônica Alves diz que a autoestima baixa pode causar a doença, dificuldade de sair

Maria Fernanda Almeida

Ma Fernan Alme assintin aula virt em ca


aria nda eida ndo tual asa.

Rodolfo Stancki

Rodolfo Stancki em sua rotina como professor dando aula de forma virtual na pandemia. de casa e até mesmo fobias. “A pessoa acaba se isolando cada vez mais, porque não se aceita, nem com ela mesma, nem no grupo.” Para se aceitar e se sentir melhor durante este período, a psicóloga comenta que o autocuidado é muito importante. “Fazer exercícios de respiração, yoga, exercícios em casa. Estar em contato com a natureza, aquilo que der pra fazer, ou mesmo uma caminhada na rua. E nutrir o corpo, cuidados com a alimentação, beber água.” Verônica também comenta sobre a importância de fazer terapia, que ajuda bastante no autoconhecimento, em se aceitar e tratar traumas do passado.

Saiba mais Confira dicas de autocuidado para você praticar durante a pandemia!

Em casa, na prática Resultados de enquete do Google Forms sobre a nova rotna na pandemia e seus constrangimentos Em uma pesquisa realizada por meio da plataforma Google Forms, sobre a vida on-line na pandemia, observou-se que a maioria dos entrevistados está gostando de realizar seus compromissos em casa e não passou nenhuma grande vergonha em chamadas virtuais. Entretanto, 14 dos 46 participantes do questionário afirmaram já ter passado alguma vergonha com a câmera ou microfone ligados em chamadas de vídeo e encontros virtuais. Entre as experiências, foram micos individuais, e até coletivos, relatados. “Tirei meu fone pra falar com a minha

mãe. Por acidente, meu microfone estava ligado, e acabei atrapalhando a aula por um minuto completo até perceber”; “Esqueci que tava de samba canção e levantei para pegar uma coisinha”; “Não estava arrumado e liguei a câmera sem querer no meio da aula” e até “Achei que o microfone estava desligado e soltei gases”. Questionados sobre a mudança no hábito de se arrumar na pandemia, o número de entrevistados que se arrumavam no início da pandemia, 43,2%, caiu pela metade em relação a hoje, 25,6%.

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Os verdadeiros remédios Alimentação, ansiedade, exercício físico e isolamento - como adquirir hábitos melhores para salvar vidas.

André Festa, Guilherme Kruklis, Laura Luzzi, Rafael Coelho e Romano Zanlorenzi

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pandemia, somada ao distanciamento social e à necessidade de permanecer dentro de casa, trouxe uma preocupação ainda maior em relação à saúde e ao bem estar. Além de todas as dificuldades intrínsecas às condições impostas pelo momento, problemas econômicos têm assolado a grande maioria dos brasileiros. Sendo assim, manter uma alimentação saudável virou uma necessidade para superar esses obstáculos e conseguir manter a saúde mental em meio a esse turbilhão de emoções. Dentro de casa e, muitas vezes, com restaurantes fechados e/ou menos acessíveis - já que pedir delivery ainda é um luxo no país - muitas pessoas se viram obrigadas a cozinhar. Ademais, a ansiedade é despertada de maneira mais intensa diante desse cenário caótico e, geralmente, é descontada na alimentação, seja na qualidade ou na quantidade dos alimentos ingeridos.

Frischenbruder está desde março de 2021 recebendo o acompanhamento de uma nutricionista e relata que, desde então, já pode perceber as mudanças, não somente no seu corpo - após perder seis quilos nesse curto período - mas também na sua saúde mental. Ela destaca que um dos benefícios de se sentir saudável é o aumento na sua autoestima.

“Se você gosta de tal comida, por que não comer? Ser saudável é poder consumir de tudo um pouco.” Gabriela Tsuchiya, nutricionista

Sofia Frischenbruder, estudante de Medicina, é um exemplo claro da situação. Ela conta que, desde o início da pandemia, notou que a cada refeição passava a ingerir mais alimentos, e que a qualidade desses produtos só diminuía. Ela chegou a engordar oito quilos desde o início do ano passado e, por isso, decidiu buscar ajuda profis-

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sional para lidar com os problemas de sua alimentação.

Segundo a nutricionista Gabriela Tsuchiya, uma alimentação saudável é fundamental para manter uma boa imunidade contra doenças que não podem ser tratadas no momento, em razão da lotação máxima dos leitos nos hospitais. Ela comenta que o mais importante é escutar o próprio corpo e que uma alimentação saudável não se baseia apenas em quantidade. “Se


você gosta de tal comida, por que não comer? Ser saudável é poder consumir de tudo um pouco.” Tsuchiya ainda ressalta que seguir dietas da moda é extremamente prejudicial para saúde física e psicológica, e relembra que o nutricionista é o único profissional capacitado para indicar o plano alimentar adequado para cada indivíduo. A nutricionista ainda explica que há diversas diferenças entre os produtos in natura, industrializados, os minimamente industrializados e os ultraprocessados. Os primeiros não contém modificação na sua essência, como fruta, legumes, e verduras. Processados são os que passam por uma industrialização produtiva. Já os minimamente processados são passados por uma limpeza ou moagem no caso de grãos, como feijão, lentilha e outros. Ultraprocessados, por sua vez, são os alimentos que passam por alta dosagem de adição de aditivos para auxiliar na textura, sabor e aroma dos produtos. Gabriela reafirma que, durante o período da pandemia, é necessário que as pessoas mantenham uma alimentação balanceada, regada a fibras, minerais e vitaminas.

mesma forma se quisesse manter a saúde em dia, já que, em casa, o gasto energético cai muito se comparado a um cotidiano agitado de professora, que ela tinha antes desse cenário. Para Maia, uma alternativa foi começar a cozinhar suas refeições, o que era impossível antes, já que dificilmente estava em casa. Milena relata que esse período de trabalho remoto a auxiliou no processo de mudança, uma vez que passou a ter mais tempo para se planejar. A personal trainer explica que o exercício e a alimentação têm uma relação bastante direta e que os benefícios de levar uma vida saudável vão muito além da estética. “Melhorei meu sono 100%. Aumentou minha disposição, autoestima, autocontrole, sensação de eficácia. A vida agora é outra”, relata Milena. Mas as mudanças não foram percebidas só de maneira individualizada. A engenheira de alimentos, na Stival Alimentos, Aline Cosmo comenta sobre o aumento da produção e da procura dos mercados por comidas mais saudáveis ou de produtos que possam ser entregues via delivery. “Como as pessoas estão cozinhando

Acervo Pessoal

“Melhorei meu sono 100%. Aumentou minha disposição, autoestima, autocontrole, sensação de eficácia. A vida agora é outra.” Milena Maia, personal trainer Milena Camila Maia, de 22 anos, passou por um processo parecido com o de Sofia. Ela é personal trainer e muito ativa fisicamente desde antes da pandemia. Contudo, neste período de isolamento, percebeu que ingeria alimentos de baixo valor nutricional, o que a atrapalhava, inclusive, nas sessões de treinamento. Em apenas um mês, a profissional de Educação Física engordou dois quilos e percebeu que não poderia continuar agindo da

mais, percebemos um aumento da procura por alimentos nos mercados. As compras estão sendo mais voltadas para o que pode ser cozinhado dentro de casa’ ‘Outro ponto percebido pela profissional foi o aumento da procura por mercados de bairro, mais próximos das residências, uma vez que acredita-se que haja menor chance de aglomeração de pessoas dentro desses estabelecimentos.

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Hábitos alternativos e saúde mental Terapeuta conta como hobbies e hábitos saudáveis ajudam no quadro emocional

Bernardo Gonzalez

Beatriz Artigas, Bernardo Gonzalez e Thamyris Candea

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aomi Isobe, de 21 anos, conta que todos os dias realizava caminhadas até a faculdade, onde cursa psicologia. Caminhava da faculdade até o estágio, no Tribunal Regional Eleitoral no Paraná, e, ao final do dia, também se deslocava a pé de volta para casa, no bairro Água Verde. No total, Naomi andava aproximadamente 6 km com esses trajetos. E, aos domingos, dançava no clube esportivo Nikkei das 14 às 19 horas. Quando a pandemia do Covid-19 começou, assim como a quarentena, a estudante de Psicologia cessou todas as atividades “a gente achava que ia ficar só umas duas semanas em casa né, daí não achei problema em parar de me exercitar”, recorda com pesar. Com a nova rotina, teve que criar novos hábitos: corridas às 6 horas da manhã, antes da aula do ensino à distância começar. Mas essa motivação logo acabou, uma vez que as duas semanas de quarentena viraram meses. Assim como Naomi, a professora Alesandra Ribas, 38, também tinha o hábito de se exercitar antes da pandemia: fazia academia e fit dance pelo menos quatro vezes por semana. Parada em casa, a professora percebeu que precisava se exercitar e se movimentar de alguma maneira. Então, decidiu comprar uma esteira para fazer caminhadas. A meta é caminhar, por dia, cinco quilômetros. Ribas também acompanha uma influenciadora fitness nas redes sociais, seguindo o plano de exercícios funcionais dela. Praticar exercícios e se adaptar durante a quarentena não é a única semelhança entre a professora e a

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estudante de Psicologia. Ambas procuraram fazer atividades alternativas em casa pelo bem da saúde mental: a pandemia piorou os estados de ansiedade e estresse. Além da ajuda no lado psicológico, a prática de exercícios físicos nesses tempos de colapso na saúde: estudos divulgados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em janeiro de 2021, afirmam que a população no Brasil se exercita menos do que deveria. Dados apontam que um em cada dois adultos não faz atividade física. Os danos do sedentarismo são inúmeros: aumento de peso, apneia do sono, doenças cardiovasculares e diabetes são alguns deles. E, com a pandemia, as comorbidades citadas podem levar um paciente com o Covid-19 para um estágio mais grave. Um estudo feito na França confirma que o risco de hospitalizações foi 32% maior para pessoas que não praticavam nenhum tipo de atividade física.

Para a psicóloga Gisele Souza, a pandemia trouxe uma abertura ainda maior para a prática dessas atividades, até mesmo para terapias alternativas. “Processos de terapia que se ampliaram além da terapia tradicional para tratamentos holísticos, alternativos, como costumamos falar, mas que já não estavam sendo considerados desta maneira”. Terapias alternativas, como cristais, reiki, thetahealing, barra de access, espiritualidade, tarot, astrologia, florais, acupuntura e constelação ficaram mais famosas nos tratamentos clínicos, segundo a terapeuta. Hobbies também estão sendo mais adquiridos pelos pacientes, como o bordado, crochê, pintura e culinária.

Segundo dados retirados da ferramenta Google Trends, pesquisas na plataforma de pesquisa sobre ioga, hobby e exercícios em casa tiveram um aumento significativo. Os benefícios da adoção de práticas mais saudáveis e alternativas para o bem da saúde mental são imensos, e, como a própria terapeuta descreve, “muitas vezes não tem como nem mensurar”. Não espere estar motivado para começar uma atividade, use o exercício para criar uma motivação. Criar hábitos saudáveis aos poucos e começar uma atividade devagar para o corpo e mente irem se acostumando com a nova rotina. Ter o auxílio de um especialista é fundamental para ajudar e evitar problemas. E por fim, celebre cada objetivo alcançado.

Bernardo Gonzalez

Ainda na tentativa de conciliar trabalho, convivência familiar, estudo e o estado emocional, Naomi Isobe conversou com sua terapeuta sobre algo que ela poderia fazer para aliviar os nervos. “Pensei sobre fazer meditação e minha psicóloga achou uma boa. Iniciei no começo da manhã e no fim da noite, é como se desligar do mundo e dos pensamentos do dia”, relata a estudante.

que permanecem fazendo o isolamento social - é cada vez mais delicado e estes buscam mudar o estilo de vida em busca da melhora emocional.

A psicóloga também conta que os relatos sobre a busca por atividades tem se tornado cada vez mais comuns, visto que o estado emocional - daqueles

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Nome fotógrafo

Ricardo Luiz da Silva

Ipsuntio. Et hariasi nvellab iur, non prae maximusant milit aut dolorio volupta voloreperum, quaest parum.

Psicologia

REMOTA

A terapia on-line foi a saída adotada pelos profissionais da psicoterapia para enfrentar a pandemia Eduarda Fiori Ricardo Luiz da Silva

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necessidade da adaptação para o meio on-line surgiu não apenas pelo fato do cuidado com a saúde mental se fazer de extrema importância durante tempos difíceis, mas também pelo receio que muitos pacientes sentem ao estarem em ambientes fechados, como consultórios, com outros pacientes esperando. Como é o caso dos pacientes de Fernanda Braga, psicóloga que possui uma clínica no Bigorrilho. Eles preferem a terapia on-line mesmo que a consulta seja seguindo todos os protocolos de segurança, e com o afrouxamento das restrições da quarentena. Ela ainda conta que sentiu um aumento significativo de demanda, pois diversos pacientes gostaram desse novo modelo, considerado mais prático, já que não exige nenhum gasto com locomoção, ou até mesmo pelo ambiente doméstico confortável.


“O atendimento ficou muito direto entre o terapeuta e paciente, mas sobrecarrega por outro lado.” Fernanda Braga psicóloga. Com a paralisação das atividades presenciais por conta da pandemia do novo coronavírus, diversas atividades tiveram que se adaptar à modalidade remota para se manterem funcionando. Com a psicoterapia, não foi diferente. A adesão ao on-line foi fundamental para a sobrevivência da profissão durante a crise econômica desencadeada pela Covid-19 e o método foi abraçado pela maioria dos psicólogos e pacientes, e tende a permanecer mesmo após a pandemia. Mesmo com toda a facilidade oferecida, alguns cuidados precisam ser tomados. Fernanda conta que a consulta requer todo um preparo pelo profissional, que precisa pensar em todos os detalhes do ambiente, como a luz, por exemplo, além de outros detalhes técnicos, como posicionamento da câmara ou qualidade do áudio. Tudo para trazer um ambiente confortável e acolhedor ao paciente. Além das precauções para que o horário de cada consulta não extrapole demais, “o terapeuta tem que sempre cuidar do limite, até que horário vai se comunicar com o paciente, se não acabamos não tendo um horário estabelecido de trabalho”, explica a psicóloga. Quando tratamos de atendimento psicológico, obviamente o atendimento remoto nem sempre supre as expectativas daqueles que necessitam de uma experiência um pouco mais tátil. Marina Geiger tem 20 anos e trabalha como vendedora de imóveis, fazia psicoterapia presencialmente antes da pandemia e hoje adotou as consultas on-line, mas sente que este método pode trazer diferenças negativas nos resultados. “Eu não deixaria de

falar alguns temas se fosse pessoalmente, me sinto mais confortável no presencial”, comenta. Marina também destaca que o feedback e a linguagem corporal do profissional é muito importante para ela, e acaba se perdendo pela perspectiva da chamada de vídeo ou até mesmo problemas de conexão.

A terapia remota, por sua vez, pode ser a solução para aqueles pacientes que acabaram se mudando de cidade, e não quiseram trocar de psicólogo. Esse é o caso da Maria Eduarda Alves, estudante e manicure. “Para mim continua dando certo, está dando os mesmos resultados e observei progresso”, diz a jovem. Para Maria, depois da fase de adaptação, não há grande diferença, e a jovem pretende continuar com o atendimento remto. “Antes, quando eu fazia terapia presencial e eu estava de férias, não conseguia fazer a terapia por estar viajando. Com o atendimento on-line, eu posso viajar e continuar fazendo terapia”, relata Maria. Há três anos, o Conselho Federal de Psicologia liberou a prática on-line. O profissional precisa informar ao órgão que o atendimento não será feito de forma presencial, explica Larissa Oliveira, psicóloga clínica. Ela relembra que, mesmo com uma resistência inicial ao atendimento remoto, muitos profissionais e pacientes acabaram cedendo já que a pandemia se estende há mais de um ano e, com isso, trazendo uma reinvenção na área. A psicóloga explica que não há diferença na qualidade do tratamento virtual e presencial, “O profissional precisa ter um ambiente preparado e o paciente necessita estar em um lugar tranquilo e que não tenha muita gente por perto, para que ele possa falar abertamente sem constrangimento.” Larissa afirma que a terapia remota continuará sendo uma opção para muitas pessoas mesmo com o fim da pandemia. Confira! Confira a reportagem em nosso portal. portalcomunicare. com.br

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Harmonização Facial: próximo! Cresce procura por conjunto de procedimentos estétiticos conhecidos como Harmonização Facial entre 2019 e 2021 Beatriz Bleyer Lorena Rohrich Lucca Marreiros

B

ianca Tonietto, de 25 anos, é advogada e realizou uma harmonização facial. Assim como a engenheira agrônoma Jéssica Miquelon, de 30 anos. Essas são histórias de duas mulheres que, entre 2019 e 2021, quiseram mudar seus rostos. Apesar de a harmonização facial ser um conjunto de técnicas de preenchimento facial e, por isso, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica não ter controle sobre o número exato do aumento, é impossível deixar de percebê-lo. Segundo o Google Trends, ferramenta que monitora os termos mais populares buscados no Google, a busca por “Harmonização Facial” cresceu 540% só em 2020. O recurso ainda mostrou que os responsáveis pela busca, também procuraram por assuntos relacionados à famosos. Zac Efron, Alok, The Weeknd e Gretchen são as principais celebridades ligadas ao termo. A decisão por realizar a harmonização facial está ligada à sua autoestima, segundo Jéssica Miquelon. “Eram coisas que sempre me incomodavam. Eu gostei muito do resultado, era o que estava

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esperando. Agora preciso terminar para ficar mais próximo do que eu espero”, afirma. A jovem fez uma série de procedimentos entre 2019 e 2020, como a aplicação de toxina botulínica, para eliminar o “pé de galinha” (rugas localizadas ao redor dos olhos) e a utilização da mesma no lábio, para preenchimento e volume. Na próxima fase, Jéssica pretende preencher o sulco nasogeniano e realizar uma projeção do mento “para dar contorno”. O termo harmonização facial foi criado para denominar diversas técnicas de preenchimento facial com ácido hialurônico. “Essa técnica começou a ser muito banalizada pois, o que passou a acontecer foi uma padronização dos pontos de preenchimento para todas as pessoas de forma igual, invés

“Na minha área, infelizmente, a aparência ainda conta muito e isso é muito mais pesado quando se é mulher.” Jéssica Miquelon, engenheira agrônoma


de individualizar os pontos dentro da necessidade de cada um. Criou-se uma caricatura do rosto ideal, em que todos estão ficando com rostos parecidos.”, acrescenta a médica dermatologista Isabela Gava. “Meu rosto possui uma aparência infantil e os procedimentos me deram uma aparência de mulher”, explica Bianca Tonietto. Para ela, realizar as intervenções foi importante para a sua autoestima e até mesmo para as suas relações profissionais. “Na minha área, infelizmente, as aparências ainda contam muito e isso é muito mais pesado quando se é mulher.” “Eu me sinto muito bem com os resultados.” Bianca realizou no total seis procedimentos estéticos: Preenchimento labial, entre 2018 e 2021; botox, 2019 a 2021; rinomodelação com preenchimento, em 2019; rinomodelação com fios PDO e faceta em resina composta nos dentes, em 2020; e lifting facial, com fios de PDO, em 2021. “Eu conheci pelos nomes individuais de cada procedimento, porque eles foram feitos aos poucos, mas com o tempo entendi que esse conjunto de procedimentos se chama harmonização facial.”

A especialista em harmonização facial Carolina Fraiz tem notado um crescimento na busca por cirurgias estéticas no último ano. “Com a pandemia e o uso obrigatório das máscaras, as pessoas vêm aproveitando esse período para a realização dos procedimentos. Nesse último ano, com a perda dos estigmas e popularização dos procedimentos a procura do sexo masculino tem aumentado muito também.”

O PSICOLÓGICO ENVOLVIDO De acordo com Isabela, questões psicológicas, como a autoestima, são fatores ligados às cirurgias estéticas. “Muitas pacientes buscam esses procedimentos para melhorar a autoestima, e assim é possível melhorar outras áreas como autoconfiança e performance.”, afirma Isabela Gava. A responsabilidade é grande, tanto para quem decide realizar o procedimento, quanto para o profissional, que necessita ser qualificado. “O paciente está entregando o rosto e saúde na mão de alguém, por isso é necessário buscar um profissional de confiança e capacitação. A banalização da harmonização facial fez com que muitos Envato

A busca pelo termo Harmonização Facial no Google cresceu 540% só em 2020, segundo o Google Trends

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profissionais ainda não qualificados começassem a realizar esse procedimento. Cabe aos médicos a conscientização de que estamos mexendo com a saúde de alguém, e ainda que existem possíveis complicações.”, diz Isabela Gava.

É necessário entender a responsabilidade para quem decide realizar o procedimento. Procure sempre um profissional de confiança e com capacitação.

No site, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica tem conscientizado a população para que se procure o profissional adequado. Se ele não estiver registrado no site da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e no site do Conselho Federal de Medicina, não se deve realizar nenhum tipo de cirurgia com ele. Bianca Tonietto se informou sobre os procedimentos principalmente a partir de profissionais que divulgam conteúdos no Instagram e em seus sites. “Hoje é muito fácil encontrar profissionais que realizam esse tipo de prestação de serviço, difícil é encontrar aquele que te forneça um atendimento personalizado, explique detalhadamente os procedimentos e eventuais consequências e seja extremamente transparente quanto a necessidade ou não de realizar o procedimento”, afirma a advogada. O censo 2018 da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica mostra que, na época, cerca de 60% dos profissionais utilizavam o Instagram como principal ferramenta para divulgação dos serviços ou conteúdos sobre as técnicas. 58%, utilizam o Facebook para isso e 55,5%, o WhatsApp.

Veja mais Veja fotos dos rostos das jovens mencionadas no texto, Jéssica Miquelon e Bianca Tonietto antes e depois dos procedimentos estéticos realizados.

Envato

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PROCEDIMENTOS ESTÉTICOS EM NÚMEROS TIPO DE CIRURGIA ESTÉTICA EM 2018

TIPO DE PROCEDIMENTOS NÃO CIRÚRGICOS EM 2018

Aumento de mama

Lipoaspiração

Peeling

Preenchimento

Suspensão com fios

Dermolipectomia abdominal

Blefaroplastia

22%

96%

90%

22%

96%

Toxina Botulínica

21%

21%

90%

Rinoplastia

Ácido Polilático

21%

21%

PROCEDIMENTOS ESTÉTICOS EM 2018 65 anos ou mais

13 a 18 anos

Muheres

79%

35% 19 a 35 anos

21%

7%

5% 2%

36%

Até 12 anos

16% 51 a 64 anos

Homens

POR GÊNERO

36 a 50 anos

POR FAIXA ETÁRIA

Fonte: Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica

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A ascensão do comércio virtual na pandemia Na contramão da economia, o e-commerce cresceu em média de 50% desde o início do isolamento social Eduarda Fiori Ricardo Luiz da Silva

O

comércio eletrônico se tornou a alternativa mais atraente para movimentar a economia sem a necessidade de furar as recomendações de isolamento social. O setor cresceu em média de 50% desde o início da pandemia e chegou a movimentar mais de R $100 bilhões, segundo dados da AbComm (Associação Brasileira de Comércio Eletrônico), e já ocupa 11% do volume do mercado. A modalidade, que já era tendência, parece ganhar ainda mais força com o investimento de peso de grandes varejistas para estar melhor localizado dentro do mercado digital. Um dos melhores exemplos de avanço no comércio eletrônico aconteceu com a Amazon, e aqui no Brasil, com a Magazine Luiza, explica o professor universitário Marcos José Zablonsky, especialista em Economia. “Esse segmento vem adquirindo uma expectativa de evolução cada vez maior do que isso: está criando uma nova cultura de compra on-line”, destaca o economista. Com a pandemia, à medida que as pessoas tiveram restrições de mobilidade, foi criado também um novo hábito. Dados revelam que 7,3 milhões de brasileiros compraram online pela

editoria 68 revistacdm | economia

primeira vez em 2020, de acordo com a pesquisa da Ebit/Nielsen. A marca de 1,3 milhões de sites já foi superada, de acordo com pesquisa realizada pelo Paypal e Big Data Corp. O impulsionamento causado pela pandemia também trouxe aos empreendedores uma opção para alavancar vendas ou gerar novas fontes de renda. Foi o caso de Beatriz Vilas Boas, dona da loja on-line B&AUTY, que começou seu negócio totalmente do zero pelo Instagram e Whatsapp. Beatriz não contava com muito capital para investir em uma loja física e todos seus gastos, como um aluguel, por exemplo. Por isso, tirou o plano do papel e possui a loja desde setembro de 2020. Um dos grandes motivos que incentivaram Beatriz a criar sua loja foram os diversos novos negócios surgindo durante o isolamento social, conta a empresária. “As vezes me pego pensando, se não tivéssemos nessa pandemia, eu seria infeliz com minha profissão e nunca teria a ideia de abrir minha loja.” Ricardo Luiz


O crescimento do comércio virtual no Brasil parece não ter dado os mesmos resultados para todas as empresas. Sofia Calliari, empresária e dona da loja de roupas Sodro, focada no público LGBTQIA+, conta que no início da pandemia a loja sentiu um grande aumento no número de vendas, mas que, gradativamente, foi diminuindo e, em 2021, o fluxo foi o menor desde antes da pandemia. “Acredito que a crise financeira chegou ao nosso público-alvo, e as vendas pioraram muito mesmo”, completa a empresária. Sofia conta que a loja física ainda é um sonho, mas não para o momento em que vivemos agora, e acredita que tanto a modalidade digital como física possuem suas vantagens. Para ela, o e-commerce não tem fronteiras. Outro caso de sucesso aconteceu com a loja de acessórios para pet Cane. O investimento no setor on-line trouxe um grande impulsionamento, que se intensificou ainda mais com a pandemia, conseguindo alcançar 70% das vendas fora da capital paranaense, deixando de ser uma loja apenas local. Giovana Motter Rodrigues, sócia da loja, conta que a Cane existia há quatro anos, mas apenas com vendas por meio de representantes, e que o foco nas vendas digitais surgiu nos últimos anos. Atualmente, as vendas acontecem principalmente pelo Whatsapp e Instagram, porém a sócia pretende criar um novo site. Giovana conta que o foco é engajar a loja on-line ainda mais para facilitar o processo de compra, porém a possibilidade de um espaço físico para receber clientes e mostrar produtos não é descar-

tada. “Ainda há clientes que gostam de ver os produtos fisicamente. Não deixamos de vender, mas precisamos muitas vezes convencer mais para finalizar a compra”. Marcos conta que o e-commerce trouxwwe uma possibilidade muito interessante para a própria sobrevivência de pequenos comércios e pequenos empreendedores, até mesmo para pessoas que perderam o emprego. Junto com esta prática, o WhatsApp, trouxe ainda mais suporte a esses empreendedores, principalmente o Whatsapp Business, plataforma criada para atender as necessidades de pequenas empresas. O aplicativo vem tornando-se cada vez mais popular e foi combinado com uma nova gama de pequenos negócios surgindo na pandemia. O especialista ainda completa que acredita que a experiência de apresentação de mercadoria fisicamente deve diminuir gradativamente, “É um caminho sem volta. Todas as empresas precisam se adaptar, pois os consumidores estão se mostrando bastante satisfeitos, assim como os suportes tecnológicos que estão ficando mais eficientes.” Confira em nosso portal! Confira esta matéria e outras em nosso portal! portalcomunicare. com.br

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A virada latina

Herick Pires, Isadora Mendes, Mariana Scavassin e Sophia Gama

D

esde Luís Miguel, passando por Tom Jobim e até o colombiano J Balvin, a presença de artistas latino-americanos na indústria fonográfica mundial chama atenção pela quebra de barreiras; sendo uma delas, a linguística. Artistas como, Shakira, Ricky Martin e Jennifer Lopez, carregam o peso de suas influências familiares ou de vivência no cenário norte-americano há muito tempo. Porém, o crescimento do mercado latino nos últimos anos traz a discussão sobre a presença de gêneros urbanos, enquanto elemento de representatividade, para um lado da latino-americano pouco considerado. O reggaeton é ritmo que vem da união do reggae e do maratón, nome das maratonas de rap da região do Caribe.

editoria 70 revistacdm | coluna

Ele foi popularizado em países como Panamá e Porto Rico, principalmente por atingir os grupos menos elitizados e falar mais sobre as realidades menos favorecidas em cada região. Muito semelhante ao reggaeton, o funk surge em meados da década de 70, como manifesto e crítica a sistemas de opressão e marginalização de pessoas desfavorecidas socialmente, principalmente em favelas e complexos do Rio de Janeiro. Em seu início o ritmo é muito influenciado pela cultura black soul. Posteriormente também entram o rap, o freestyle e o miami bass, sendo o último que trouxe o início das batidas mais rápidas ao som. Os novos artistas, que levam mundo afora esses ritmos, carregam a responsabilidade de levar juntos deles a história de resistência e de luta presentes na construção de cada elemento sonoro presente. Alguns dos maiores representantes da América-Latina no mercado internacional são:


Anitta A cantora carioca que começou no funk, hoje é uma das principais artistas latinas com seu nome reconhecido por toda a América Latina, com singles que não se limitam ao português. Com gravações em espanhol, inglês, italiano e agora também francês, a cantora se compromete a trazer visibilidade à música brasileira, através de seu mais recente projeto “Girl From Rio”, que será lançado no verão norte-americano. Através de parcerias com diversos artistas, como J Balvin, Madonna, e mais recentemente, Dadju, Anitta prova que para ela a barreira linguística é apenas um detalhe, é que seu poder de fazer acontecer é perpetuante independente do idioma.

Bad Bunny Fenômeno das plataformas de streaming, o porto-riquenho Bad Bunny não se limita ao território latino para atingir o sucesso. É dono do primeiro trabalho feito em espanhol a estrear no topo da Billboard 200, o álbum El Último Tour del Mundo, além de acumular mais de 8 bilhões de streams com o álbum YHLQMDLG. Trap, rap, reggaeton, rock e diversos outros gêneros musicais ja foram cantados por Bad Bunny, e tudo o que ele toca (ou canta) vira sucesso.

Karol G

Hit atrás de hit na conta da colombiana Karol G. Uma máquina de fazer colaborações com diversos artistas da comunidade latina, mas tem como seu maior sucesso a música “Tusa”, em parceria com a rapper estadunidense Nicki Minaj. Apesar de várias de suas músicas serem na pegada do reggaeton, Karol G não se apega apenas a esse estilo, assim como não se limita ao sucesso regional.

J Balvin J Balvin é um dos maiores artistas latinos da atualidade, e já conquistou o mundo com suas canções e posicionamentos, e o colombiano parece estar longe de se sentir satisfeito. Se alguém quiser ouvir J Balvin, principalmente os gringos, terão que ouvir em espanhol, pois o colombiano não se rende ao inglês, nem mesmo em colaborações com grandes nomes como Beyoncé, Justin Bieber, Dua Lipa, entre outros.

Daddy Yankee Você até pode não o reconhecer pelo nome, mas com certeza já ouviu algum dos hits de Daddy Yankee. O dono da música “Gasolina”, lançada há mais de 15 anos, definitivamente não é um cantor de um sucesso só, e carrega o legado da música latina ao decorrer dos anos com lançamentos como “Despacito”, de 2017, até músicas recentes como “Con Calma” e “Relación (Remix)”, colaborando com novos artistas latinos, dividindo o legado que carregou sozinho por muito tempo.

Donna Paola Multifacetada, a mexicana Danna Paola, apesar de jovem, já tem quase 20 anos de carreira na atuação, mas é uma novata no mundo da música. Após deixar a série “Elite”, Danna tem apostado cada vez mais em suas músicas com colaborações com outros artistas latinos, como Sebastian Yatra, Aitana e até a brasileira Luisa Sonza no álbum “K.O”.

editoria coluna|| revistacdm

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Chico, à esquerda, Leo, à direita, se divertem juntos enquanto posam para fotos.

Influencers de quatro patas Daniela Cintra, Diogo Santos, Isabella Serena

F

oi na intenção de criar um álbum de fotos digital para Leo Capablanca, um cão da raça samoieda hoje com 8 anos, que a jornalista Simone Kanning deu início a um perfil no instagram destinado ao seu cão. Ela, que não fazia muita questão de estar envolvida com as redes sociais, acabou se empolgando ao perceber que a raça do seu cachorro era pouco conhecida no país, passando a utilizar a rede social dele com o objetivo de mostrar um pouco sobre o Leo e a sua raça. A empolgação começou a tomar conta quando notou que o cão estava ganhando fãs a cada nova curtida, e também seguidores. No seu perfil, Leo está intitulado na categoria de “criador(a) de conteúdo digital”, com seus 11,5 mil seguidores, na qual “ele” alimenta seu feed com fotos e vídeos carregados de conteúdos geralmente engraçados, ou simplesmente para mostrar sua aparência e deixar os seguidores babando nos comentários. E como todo blogueiro tradicional, quase todas as legendas são em primeira pessoa, como a que é destinada à sua tutora Simone, na qual “ele” diz: “Você quer me vestir de Jade?”, fazendo uma comparação com a per-

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sonagem da novela O Clone, devido ao fato de ele estar usando um pingente dourado pendurado descontraidamente na testa peluda. A rotina do Leo como criador de conteúdo digital não para por aí. Ele também participa de eventos, e, antes da pandemia, Simone diz que a agenda do cão era lotada, chegando até mesmo a participar de vários eventos diferentes no mesmo dia. “Existem encontros dos Samoiedas CWB, um grupo de tutores desta raça que já existe há alguns anos. Quando fazemos isso no final do ano, costumamos nos encontrar para a tradicional foto com o Papai Noel. É uma fofura encontrar tantos ‘ursinhos’ juntos”, Uma das consequências do álbum digital que Simone criou sem pretensões para o Samoieda, e que o tornou conhecido, são as tradicionais parcerias com empresas para divulgação de produtos ou marcas, que é algo semelhante ao que ocorre com os blogueiros(as). “Hoje nós temos cinco empresas parceiras. No ano passado, esse número era maior, mas não conseguíamos administrar todas, ou às vezes percebíamos que a marca não tinha muito a ver com o nosso perfil.”,

Diogo Santos

Redes sociais estão sendo tomadas por perfis de animais “blogueiros”


afirma Simone. Ela complementa, informando que quando surgiram as primeiras propostas, Leo sempre recebia serviços ou produtos como permuta para divulgações. Hoje, exceto por algumas parcerias antigas, pelo bem-estar do cão, a jornalista ressalta que a qualidade do produto ou do serviço é avaliada primeiramente, para que então as marcas com interesse possam fazer um investimento e ter uma divulgação no perfil do Leo. Em um levantamento de dados realizado pela empresa de pesquisa por big data e inteligência de mercado Decode, mostrou que o Brasil ocupa o 2° lugar no mundo na busca por fotos e vídeos de bichos no Instagram. A fisioterapeuta Tassiane Batista, moradora da Paraíba, é uma destas pessoas que seguem até oito perfis de cães “blogueirinhos”, alguns fora do país. “Eu não posso ter cachorros ou qualquer outro animal de estimação peludo, pois o meu marido é alérgico, principalmente a gatos. Ver os vídeos e fotos desses bichinhos me ajuda a meio que suprir essa ausência de não poder ter um em casa”, comenta. Já para a médica veterinária e psiquiatra animal Fran Paese, essa posição é justificada pelo fato de que tais postagens funcionam como uma terapia em tempos difíceis: “Ver um vídeo divertido ou uma postagem bonita de um pet traz uma calma para alma e ameniza as dificuldades do dia

a dia”, afirma ela, especialista em cuidar de cães considerados astros, como a Bolacha, uma simpática cachorra da raça golden retriever que já atuou em comerciais, e o Luigi, um cão da raça border collie, que não só já atuou em propagandas de produtos animais, mas também em um curta metragem. No entanto, Paese ressalta que é preciso sempre estar de olho no bem-estar do animal, ao ponto de perceber até onde ele se diverte com toda esta atenção, e quando ela se torna incômoda. Bocejos, fugir de contato visual, se coçar com frequência, são alguns dos atos que podem traduzir um desconforto ou uma situação estressante pela qual o cão esteja passando. Leo tem familiaridade com as câmeras e, para ele, tudo é diversão, às vezes nem chegando a notar que está sendo filmado ou fotografado, segundo sua tutora Simone. Mas, para tutores que pretendem fazer com que seu pet siga os mesmos passos de Leo, Paese aconselha que os cães precisam ver fotos e vídeos como algo confortável e que os divirta, acrescentando também que treinamentos prévios podem ser uma ótima opção. “O treinamento ajuda para o dia da realização de alguma publicidade, pois o cão irá compreender que irá fazer apenas o que treinou, não sendo pego de surpresa ou se sentindo forçado a fazer algo que não goste, assim, evita-se um eventual desconforto.”

O golden retriever Chico e o samoieda Leo, reúnem mais de 12 mil seguidores no instagram.

Leia mais Confira o drive com todas as fotos do ensaio fotográfico dos pet influencers Leo e Chico. portalcomunicare.com.br

É preciso sempre estar de olho no bemestar do animal, ao ponto de perceber até onde ele se diverte com toda esta atenção e quando ela se torna incômoda. entretenimento | revistacdm 73


Leitura para momentos de caos Luiza Ruppel

Ipsuntio. Et hariasi nvellab iur, non prae maximusant milit aut dolorio volupta voloreperum, quaest parum

Em meio à pandemia, editoras e livrarias acreditam na fidelidade dos apaixonados por livros. O consumo de livros tem um aumento de 29%, segundo Nielsen e SNEL

Carlos Mazetto, Gusatvo Barossi e Luiza Ruppel.

74 revistacdm | cultura

A Itiban Shop teve que se readaptar para voltar a receber o público.


A

luz alaranjada do pôr do sol entra pela janela. Um fim de tarde gelado, típico do inverno curitibano. A xícara de café fumega sobre a mesinha de cabeceira (talvez seja a 5ª do dia). Gabriela Bonardi se deita, apreciando o alívio do fim do expediente, e então mergulha nas páginas de Todas as Cores do Céu. Dentro da história, a leitora se esconde embaixo da cama junto com Mukta, enquanto a mãe da personagem recebe um cliente em sua cama. A engenheira se transforma em leitora e a leitora se transforma em personagem, como quem se desfaz do uniforme para se vestir de fantasia. O caos instaurado pela pandemia e a frustração com a prisão da quarentena são diluídos por alguns minutos. No universo das personagens do livro, a realidade é outra. Não é exatamente uma fuga da realidade, como diria (e disse) Thiago Tizzot, escritor, editor e livreiro. “Para quem vive no Brasil e é todo dia massacrado por notícias terríveis, o livro ajuda a entrar em um mundo diferente e vivenciar outra realidade, mesmo que seja por um breve período. Se for um livro com final feliz melhor ainda”, conta o escritor.

consumo por conta do fechamento do comércio físico. “As vendas antes majoritariamente feitas em lojas físicas migraram quase integralmente para lojas virtuais, mesmo nos períodos de afrouxamento das restrições.” Sabe aquela vontade imensa de fazer algo que você gosta muito? Não importa se você está preparando seu almoço, resolvendo aqueles problemas do seu trabalho ou preso naquele engarrafamento, você daria qualquer coisa para realizar aquele desejo? Pois é, esse é Enzo Merolli quando o assunto é leitura. Ele descreve seu principal ritual pré-leitura como: “Tentar desesperadamente tirar um tempo do dia para que isso [leitura] ocorra”. Durante a pandemia, os hábitos de leitura do estudante de Letras, de 23 anos, sofreram grandes alterações. Ele conta que houve períodos em que nem sequer abriu um livro enquanto em outros, devorava ferozmente grandes clássicos literários. Essa oscilação se deve principalmente ao fato de que ler é uma atividade que demanda tempo e concentração, coisas que com o home office acabam ficando mais complicadas de se achar. Enzo relata ainda que, embora não esteja lendo tantos livros quanto gostaria, ele está comprando muito mais livros do que costumava antes da pandemia. O volume de livros vendidos entre os meses de janeiro, fevereiro e março de 2021 foi 29% maior do que o volume do mesmo período do ano anterior, chegando a um total de 11.950.098 livros vendidos em todo país neste período. Cabe ressaltar aqui que, embora em 2020 a pandemia do coronavírus tenha se alastrado pelo país, o setor dos livros só começou a sentir seus efeitos em abril de 2020, mês em que o volume de obras comercializadas despencou de 9 milhões para pouco mais de 1,5 milhão. Os dados coletados são do Painel do Varejo de Livros no Brasil produzido pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros em parceria com a Nielsen Bookscan Brasil.

“Uma pessoa que não lê se vê obrigada a viver apenas sua própria realidade. Quem lê, pode viver todas.” Sarah Coelho, editora executiva.

Editora Executiva da Editora Appris, que opera em Curitiba desde 2010, Sara conta que durante a pandemia houve crescimento de vendas entre outubro de 2020 e maio de 2021, associando tal fato com a maior disponibilidade de tempo para quem trabalha em home office e a busca por meios de desenvolvimento pessoal. Não obstante o aumento no volume de vendas, a editora pontua que a quarentena também mudou os hábitos de

editoria cultura | revistacdm 75


A quietude de uma cafeteria pouco movimentada, com toda sua calma e charme, faz parte do cenário ideal para várias pessoas que apreciam literatura. Como no caso de Rebeca Albuquerque, 19, que aos 7 anos de idade teve contato com a literatura por meio de um gibi da Turma da Mônica. De lá para cá, as obras literárias viraram companheiras inseparáveis em sua vida. Neste ano já foram mais de 45 obras lidas. Com tantos livros consumidos, são várias as sensações despertadas, as quais servem de combustível para estar sempre lendo. “A leitura é especialista em promover relacionamentos e aproximação - desde a fila do pão até a sala de aula - e é isso que sinto toda vez que um livro novo chega a minhas mãos. Afinal, como bem diz Alvo Dumbledore [o mestre diretor da escola na série Harry Potter], as palavras são, na minha nada humilde opinião, nossa inesgotável fonte de magia”, relata Rebeca. É uma convenção, entre os entusiastas dos livros, que todo bom aeroporto precisa ter uma livraria. Um quiosque, que seja. As horas de espera pelo embarque são melhor desfrutadas na companhia de um bom livro. Em um desses “bons aeroportos”, Tizzot encontrou em uma livraria o seu primeiro encanto no mundo da literatura: O Hobbit, livro homônimo de J. R. R. Tolkien. Em 2002, Thiago abriu uma editora. Em 2006, uma livraria. E, desde 2018, a livraria/editora/café Arte & Letra pode ser encontrada em Curitiba, na Rua Desembargador Motta, 2.011. Se antes o site da editora só vendia os livros dela própria, para não virar refém do fechamento do comércio físico, durante a pandemia do novo coronavírus as obras da livraria ganharam espaço na venda online. A mudança na forma de consumo chegou também ao universo literário, com e-books, lojas virtuais e tablets de leitura. Porém, Thiago acredita que o virtual não é uma ameaça às livrarias de rua, mas sim um concorrente indireto, com benefícios diferentes que não substituem os da compra na loja física. Segundo o livreiro, o leitor geralmente opta pela loja virtual

editoria 76 revistacdm | cultura

quando já sabe o que quer ler, mas quando deseja buscar algo além da sua lista de compras, ele então visita as livrarias de ruas. Segundo Tizzot, não são só livros diferentes que os leitores buscam nas lojas físicas. “Existe uma busca pelo encontro, que neste momento não é muito possível, mas é a busca por ir até uma livraria e encontrar alguém que você vai poder conversar sobre livros.”. Os que frequentam livrarias de rua nem sempre sabem o que buscam, muitas vezes passam horas entre capas e contracapas, entre sinopses e orelhas de livros, procurando sua próxima leitura sem saber o que querem achar. Mas ‘nem todos os que procuram estão perdidos’, como diria o autor J. R. R. Tolkien; o mesmo que encantou Thiago no aeroporto com suas palavras, também o que fez o músico e livreiro Luiz Francisco Utrabo se emocionar no cinema assistindo ao filme O Senhor dos Anéis, sentindo um misto de magia em poder ver as cenas que tinha imaginado ao ler e alívio pela obra ter sido bem adaptada.

“Esses pequenos lugares, essas livrarias de rua têm o papel do encontro, do cliente vir e ficar horas conversando contigo.” Mitiê Tekani, dona da Itiban Shop.

Além de leitor de carteirinha, Luiz passou 22 anos trabalhando como músico, o que o levou a morar na Espanha nos anos 1980. Durante sua aventura no país europeu, Francisco frequentou o Festival de Barcelona onde se conectou com o universo dos quadrinhos. De volta ao Brasil, Utrabo se fixou em São Paulo para tocar com sua banda Máquina Zero, cidade em que conheceu Mitie Taketani, a dançarina apaixonada por quadrinhos que, em 1988, se tornou sua esposa. Depois de casados, foram morar em Curitiba, cidade natal de Francisco, e o gosto que tinham em comum pelas histórias em quadrinhos rendeu frutos em 1989: a loja Itiban Comic Shop, situada na Avenida Silva Jardim, 845.


A pandemia do Covid-19 também afetou a Itiban, que se apoiou nas vendas on-line e contou com o engajamento dos clientes fiéis. “Nós fizemos um apelo no instagram e conseguimos viralizar. Tem cliente que tem uma lembrança tão rica do que vivenciou em uma livraria {no caso, aqui}, que continuam apoiando e, mesmo fora do país, continuam comprando. 30 anos de loja significam muito, e graças à essa experiência física que nossa história continua reverberando.”, conta Mitie, emocionada e orgulhosa.

POR QUE O LIVRO MERECE SER ISENTO DE TRIBUTAÇÃO? A reforma tributária proposta pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes, prevê a incidência da Contribuição de Bens e Produtos (CBS) sobre os livros, o que acarretaria em uma alíquota de 12% sobre transações envolvendo bens e serviços. Cabe lembrar que o artigo 150, VI, “d”, da Constituição assegura aos livros a imunidade em relação à incidência de impostos, motivo pelo qual a equipe responsável pela reforma optou por outra espécie tributária: a contribuição. Em defesa do projeto, Paulo Guedes justificou que o principal consumidor de livros no Brasil são as pessoas com maior poder aquisitivo, o que gerou uma ampla discussão no mercado literário brasileiro. A dona da Itiban Comic Shop, Mitiê Taketani afirma que a ideia de que só rico compra livro está errada e que a tributação afetaria toda a cadeia, inclusive o consumidor. Para ela, o mercado livreiro do Brasil ainda está em construção e seria prejudicado com a incidência da CBS sobre os livros.

Frente à indagação do que aconteceria caso as livrarias de rua desaparecessem, a comerciante destaca que a bibliodiversidade seria perdida sem o olhar e a curadoria do livreiro. Assim como Mitie, Thiago Tizzot, da Arte & Letra, afirma que a incidência tributária sobre os livros seria um fator ameaçador para o universo literário brasileiro como um todo, mas principalmente para as livrarias pequenas. Thiago explica que o mercado editorial funciona em várias etapas, e em cada uma delas o valor do livro vai aumentando. Nesse sentido, a incidência da CBS representaria um aumento percentual no preço final maior do que 12%. Para o editor e livreiro, a tributação do livro demonstra uma postura do governo de dificultar o fluxo de ideias de pessoas que pensam diferente ou de forma contrária aos governantes. “Acredito que o livro tem de ser isento porque toda forma de expressão cultural deveria ter facilidade e ser estimulada a circular, como cinema e música também. São propagações de ideias que muitas vezes dão voz para uma parte da população que normalmente é silenciada, e isso tem que ser incentivado“, finaliza Tizzot. (LR) Leia mais Quer conhecer mais sobre quadrinhos? A Itiban Comic Shop tem um canal no Youtube em que mostram conteúdos e eventos.

Luiza Ruppel

A editoria Arte e Letra recebe diversas visitas por conta de um espaço conjunto com uma cafeteria.

editoria cultura | revistacdm 77


Herick Pires Isadora Mendes Mariana Scavassin Sophia Gama

A distância que aproxima

Conheça as histórias de pessoas que aproveitaram o isolamento social para se aproximarem e encontraram o amor, mesmo que de forma digital

editoria 78 revistacdm | comportamento


F

oi através de um aplicativo de paquera que a estudante Lívia Gemene, 20, encontrou seu par, Nicolas, 22, mesmo em meio a pandemia. “Tudo começou no dia 29 de março, quando eu tinha acabado de começar as minhas aulas on-line, e decidi instalar o Tinder de novo. Eu tinha desinstalado e pensei: “‘Ah, vou dar uma chance de novo’. E aí ele foi o primeiro match que eu dei”, conta ela. Agora, já são quase oito meses juntos. “A gente começou a conversar e a partir desse dia a gente nunca mais parou”. Se os relacionamentos on-line já eram comuns no mundo moderno antes da pandemia do COVID-19, após e durante esse período, os encontros virtuais se tornaram uma das únicas opções na hora de encontrar seu par. Por mais incrível que pareça, existem muitos casais que acabaram se encontrando enquanto todos estavam isolados.

“Ele foi o primeiro match que eu dei.” - Lívia Gemene, estudante Enquanto o número de divórcios subiu em 15% durante esse período, segundo o Colégio Notarial do Brasil (CNB), o número de solteiros que acabaram engatando um relacionamento também aumentou. O sentimento de solidão fez com que muitos se voltassem para as redes sociais e apps de relacionamento; afinal o ser humano é naturalmente sociável e precisa de certos níveis de interação. Os aplicativos de paquera precisaram se atualizar, pois o número de acessos, conversas e usuários cresceu proporcionalmente. Novas funcionalidades, como maior raio de alcance e possibilidades de matches internacionais foram adotadas pela maioria das empresas. Apenas o Tinder teve 15% de crescimento no número de usuários e um aumento de 31% em seu lucro. De acordo com uma pesquisa realiza-

da pela empresa Happn - que também é um aplicativo usado para conhecer pessoas -, a troca de mensagens ao redor do mundo aumentou em 20%. No caso de Lívia e Nicolas, o relacionamento ficou seis meses apenas no ambiente virtual, sobrevivendo por meio de de mensagens e chamadas de vídeo. Depois de todo esse tempo, eles finalmente decidiram se encontrar por morarem perto um do outro. “E depois disso a gente continuou se vendo; todo final de semana ele vinha aqui em casa ou eu ia à casa dele”, ela afirma. O pedido de namoro ainda demorou um pouco. Foi acontecer de forma espontânea só no começo de outubro. “A gente tava ouvindo música… abraçadinhos no escuro assim, bem tranquilos, e ele olhou para mim e me pediu em namoro”, conta Lívia, com a voz emocionada. “Ele falou que era isso que ele sentiu que deveria fazer aquela hora, que não queria esperar, que era naquele momento”. Na precipitação do instante, Nicolas deu para ela seu anel de coco, para Lívia usar enquanto ele não comprava uma aliança. Durante três meses aquele anel foi usado diariamente como uma aliança, até comprarem uma definitiva, de prata. No caso da maquiadora Ariana Soares, 22, as coisas foram um pouco diferentes. Recém-separada do relacionamento que resultou no nascimento de sua filha Laís, ela se sentia despreparada para viver e se entregar a um novo parceiro. As inseguranças ocasionadas durante o período que esteve casada e o medo de inserir qualquer parceiro em sua vida e na de sua filha, afastaram, a princípio, qualquer possibilidade de envolvimento amoroso. “Eu tinha muito medo de encaixar alguém na minha vida por conta da Laís, por que hoje em dia a gente acompanha muita coisa na internet”, conta. Ela ressalta também o medo de apresentar sua vida aos possíveis pretendentes: “Às vezes pensava que eu poderia estragar a vida da pessoa porque tenho uma filha. Porque querendo ou não, não seria um relacionamento comum”.

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Sophia Gama

editoria 80 revistacdm | comportamento


Quando Ariana finalmente se sentiu preparada para conhecer novas pessoas, alguém que até então estava distante de sua vida, decidiu aproximar-se. Adriano, 27, um de seus amigos mais próximos antes mesmo do período de isolamento, decidiu dar um passo a mais na relação dos dois, e foi quando os sentimentos começaram a ficar estranhos. “Um dia ele veio falar comigo, e me disse que estava com saudades. Eu chamei ele pra vir até

“Toda comunicação carrega em si uma relação” - Gabriela Binde, psicóloga a minha casa, mas quando eu vi ele novamente depois de tanto tempo, ele já não era a mesma pessoa que eu conhecia e de quem era amiga”. As visões de mundo parecidas, a sinceridade, o carinho e segurança, passadas por ambos, levaram o casal a assumir o relacionamento. Ela destaca que a parceria entre eles foi o ponto chave para que o relacionamento desse certo, e que a pandemia contribuiu muito para a aproximação entre eles: “Como a gente não pode ficar saindo, acaba que a gente vê sempre as mesmas pessoas, então eu acabava vendo ele com mais frequência”. O relacionamento, que tem cerca de seis meses, já trouxe ao casal alguns ensinamentos importantes: desabrochar o lado mais romântico da maquiadora e estimular os laços entre ela e seus pais foram alguns deles. “Hoje em dia eu consigo ter um diálogo maior com eles, falo sempre para onde vou, sento em uma mesa e converso”.

comportamento mais racional e paciente: “Ele era uma pessoa que se estressava muito fácil, e por muito pouco. Hoje eu já percebo que ele pensa antes de qualquer atitude”. A terapeuta de casais Gabriela Binde acredita que se relacionar nos tempos de hoje está diretamente ligado à necessidade de se comunicar. A necessidade de ser ouvido, de ter acolhimento e carinho são os fatores que agregam na vida de quem hoje procura um relacionamento. “A linguagem talvez não existiria se não houvesse a necessidade de comunicar, e toda comunicação carrega em si uma relação, não é mesmo?”, questiona a especialista. A terapeuta percebeu um aumento de casais que procuraram seus serviços durante a pandemia. De acordo com ela, esse momento de isolamento permitiu que muitos fizessem uma reflexão sobre o que realmente queriam para suas vidas, e focar nas áreas que mais importavam para eles. “Nas entrelinhas, os casais procuram psicoterapia para entender o lugar que esse relacionamento ocupa na vida de cada um, e se ambos estão alinhados em seus propósitos. O amor, sozinho, não mantém uma relação”, afirma Binde. De qualquer forma, a necessidade de comunicação e sociabilidade do ser humano provou que pode ser mais forte, e assim como Lívia e Nicolas, Ariana e Adriano, muitos casais se encontraram e estão se esforçando para continuar nutrindo o relacionamento. Como a própria Lívia disse: “Relacionamentos não são muito fáceis, manter um relacionamento com outra pessoa exige muita maturidade. Você tem que lidar com os defeitos do outro, tem que lidar com os seus defeitos, mas sempre no final vale a pena porque é a pessoa que você ama”.

Ariana afirma ainda que conseguiu estimular em seu companheiro um Sophia Gama

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MUITO ALÉM DO PAPEL Isadora Vargas, Raissa Micheluzzi, Rebeca Trevizani e William Zaramella

Com o aumento da digitalização de textos, novas formas de acesso à leitura e a literatura têm se popularizado.

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emos nossas vidas nas mãos através de telas, de vários tamanhos e formatos. Hoje é praticamente impossível viver sem um computador ou celular. Essas transformações tecnológicas mudam nossos hábitos de consumo a cada dia que apresentam inovações. A leitura e a literatura não fogem a essa nova forma. Ler um livro impresso, folhear desde a capa até sua última página é quase um ato religioso. Uma prática que ultrapassou séculos e hoje se apresenta de uma nova forma. Agora não folheamos, mas deslizamos os dedos em tablets e kindles. As estantes nos cômodos da casa viraram pastas e aplicativos que guardam, em um espaço medido em polegadas e gigabytes, inúmeros títulos. Desde os que tiveram sua clássica origem no papel e foram digitalizados até os novos formatos, que são desenvolvidos exclusivamente para o ambiente digital com infinitos mecanismos que transformam a experiência literária. A estudante de pilotagem Izabella de La Vega sempre teve uma vasta rotina de leitura e acabou se encontrando prejudicada pela questão financeira. Nem sempre comprar um livro físico era possível por conta do valor. Para ela, migrar para plataformas como o Kindle, além de priorizar a praticidade na leitura, foi um alívio para o bolso. Izabella também aponta as vantagens da leitura digitalizada, “Gosto da maneira como eles disponibilizam diversas ferramentas para tornar a leitura o mais confortável possível para o leitor, além da iluminação que não cansa os olhos, dá pra ler horas e horas a fio.” Comemorando seu primeiro ano em funcionamento de maneira digital, o programa Curitiba Lê, integrado ao Curitiba App, oferece acesso gratuito a mais de 200 títulos da literatura. Além de obras literárias brasileiras e internacionais, o aplicativo também oferece uma pasta chamada “Estante Curitiba”, contendo livros de autores curitibanos. A iniciativa da prefeitura com a digitalização de obras literárias têm cooperado para a democratização da leitura na cidade.

A literatura digitalizada já se faz popular e acessível, diferentemente de uma forma de literatura analisada desde a metade dos anos 1990, mas que ainda está voltada para perspectivas acadêmicas, a literatura digital. Ela consiste em produções literárias que propõem uma estratégia diferente para a leitura, pois seu formato não se dá de forma alguma no papel ou reproduz uma perspectiva de leitura nele. Para o professor de literatura brasileira da Universidade Federal de Santa Catarina Alckmar Santos a literatura digital “é uma criação literária que lança mão do elemento verbal, da escrita, mas tem outros elementos.” Ele aponta que podemos falar de uma criação semiótica, ou até mesmo multissemiótica por conseguir divergir som, imagem, movimentos e a criação verbal. Alckmar pesquisa e explora desde 1995 uma experiência literária que não se dá no papel e que se utiliza de inúmeros instrumentos. Ele diz que apesar de anos explorando essa área, a literatura digital ainda não é acessível e se dá primordialmente no ambiente acadêmico, estando também distante da comercialização. Em março de 2021, ele lançou em conjunto com pesquisadores do Núcleo de Pesquisas em Informática, Literatura e Linguística dois ebooks pela editora InVerso, E-migrações e Minhas digitais vol 2, que são obras de literatura digital, explorando ilustrações, quadrinhos, animações e música que sustentam a narrativa escrita. “Eu não vejo a curto prazo nenhuma possibilidade disso tomar conta do mercado, nem que seja em um pequeno nicho. A curto prazo não vejo o público leitor atento a isso.” Santos afirma não conhecer nenhuma estratégia mercadológica que possa sanar o problema. A parceria com editoras se dá com o objetivo de utilizar canais de divulgação através desta. Com essa iniciativa, além de divulgar, também é possível popularizar esses materiais, usando também elementos comuns como histórias em quadrinhos para aproximar esse nosso formato de uma narrativa mais comum.

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Mesmo com alguns leitores ainda preferindo a versão impressa, a literatura digitalizada vem permanecendo cada vez mais na rotina de quem prefere uma leitura mais ágil e prática. Com um peso menor e uma locomoção mais adaptável, isso acaba facilitando quem prioriza o conforto de não precisar se preocupar em quantos livros vai carregar. É o que diz a jornalista Vitória Berveglieri que utiliza o Kindle desde o final da faculdade. “Antes eu tinha um preconceito enorme com o livro digital, mas depois que comecei a usufruir mudou totalmente a minha visão e hoje eu não vivo sem.”

sobre este assunto, e diz que ainda há preconceito nas pessoas contra a literatura digital. “Ainda há pessoas à minha volta que relutam um pouco contra a literatura digital, mas conforme você vai falando o quanto é vantajosa, muitas pessoas também acabam migrando para esse lado.” Uma das diferenças entre os dois modelos de consumir literatura é a experiência proporcionada em cada uma. A youtuber também aponta que ler digitalmente vai além de ficar horas em frente a uma tela qualquer cheia de texto, é uma tela feita especialmente para proporcionar conforto para quem está lendo. Possibilitando grifos e comentários sempre que quiser.

“Não gosto, também, de não poder segurar o livro, admirar a capa, sentir o cheiro, virar as páginas (...)”

O que vimos acontecer com os filmes, depois da chegada das plataformas de streaming, foi a quebra total das videolocadoras. Com este exemplo, cria-se um questionamento se isso pode acontecer também com os livros e a literatura digital: acabar de vez com as bibliotecas. Vitória acredita que pode acontecer depois de muito tempo. “Pode acontecer sim, mas acho que vai demorar. Conheço muitas pessoas que ainda têm muito zelo pelo livro físico e eu também ainda tenho.”

- Vitória Martins, youtuber Muitos dizem que é interessante ter a versão impressa do livro, por causa das páginas e até mesmo do cheiro. Mas, para Vitória, a sensação e as vantagens de ler digitalmente também contam. “A literatura digital veio para ser mais fácil e mais prática e ler nesta versão dá uma sensação de que a leitura fica também mais rápida.” A jornalista é assinante de uma biblioteca digital e consome em média três e-books por mês. As vantagens da leitura digitalizada vão além de apenas conforto. Na hora da compra há mais agilidade e preços mais em conta, e também a praticidade de compartilhar arquivos no aparelho e mostrar para amigos e pessoas próximas. Vitória também é youtuber, dona do canalEtc & Tal, no qual faz vídeos

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Apesar de plataformas digitais para leitura terem se popularizado, ainda há aqueles que prezam pelo bom e velho livro de papel. Para a estudante de Relações Internacionais Heloísa Baldi, os livros físicos nunca chegarão a um fim por conta do prazer proporcionado aos leitores ao manusearem suas obras literárias favoritas. “Não gosto, também, de não poder segurar um livro, admirar a capa, sentir o cheiro, virar as páginas. Não sei como descrever é uma sensação que só o livro físico te dá.” Independentemente das diferenças de ler digital ou fisicamente, as experiências que a leitura em si geram são ricas. Sempre que houver leitura, haverá vantagem, independente do modelo utilizado.

Escritores online Rebeca Trevizani A era digital abrange e influencia não somente leitores ávidos, mas também apresentou novos ares à vida dos escritores. Plataformas como o Wattpad facilitaram a divulgação e interação de histórias, capítulo por capítulo. Para o escritor Matheus Moledo, a magia do meio digital é conectar a todos com infinitas possibilidades de consumir literatura. Ele vem consumindo literatura desde que se entende por gente, e a partir da inspiração e admiração que tem por grandes autores, como J.R.R Tolkien, começou também a deixar a criatividade fluir. “A escrita ocupa uma parte bem importante da minha vida, não vivo para escrever, mas escrevo porque vivo.” Matheus começou a escrever em meados de 2013 e vem publicando suas obras de maneira on-line desde então. O meio digital possibilitou maior democratização do consumo de literatura, possibilitando novos meios de divulgar e explorar os horizontes da escrita e leitura.


Izabella de La Vega

Rebeca Trevicani

Representação do mesmo livro, entretante em diferentes formatos sendo um digital e o outro fisíco.

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CINDERELAS Bruna Colmann Isadora Deip Sabrina Ramos Texto: Brunna Gabardo Ilustrações: Sthefanny Gazarra

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s contos de fadas, fincados em lições de moral e em um eterno encantamento, carregam uma alegria de meninice em um ritual que faz parte do cotidiano das famílias, inclusive as brasileiras. Também o carinho com que a leitura europeia, geralmente contada pela voz materna, transportava as meninas para um mundo mágico, mas com regras explícitas. Como a clássica Gata Borralheira, serviçal isolada nos quartos dos fundos, com roupas da cor da pele para permanecer invisível aos olhos da patroa. As Cinderelas brasileiras contam histórias duras de derrota, na maioria das vezes sem final feliz. Para as personagens de Conceição Evaristo, notável professora e escritora brasileira contemporânea, Ana Davenga, Duzu-Querença, Natalina, Luamanda, Cida, Zaíta, suas realidades apresentam a mulher destituída, inferiorizada, violentada, inventando jeitos de sobrevivência para si e para sua família. Conceição também trabalhou como empregada doméstica, babá e faxineira até 1971, quando concluiu o Ensino Médio, assim como sua mãe. Tudo que escreve é marcado profundamente pela condição de ser mulher negra brasileira. Outra obra na qual é possível enxergar essa realidade, é na série em quadrinhos A Confinada, do ilustrador Leandro de Assis e da escritora Triscila Oliveira. As histórias retratam a relação entre uma influencer e sua empregada no confinamento durante a pandemia do coronavírus. Na edição número 9, a tirinha reflete a música “tristeza não tem fim, felicidade sim”, no qual diz que felicidade de pobre parece a ilusão do carnaval.

estado do Rio de Janeiro foi Cleonice Gonçalves, de 63 anos, empregada doméstica infectada pelos patrões que haviam chegado da Itália. Cleonice era uma mulher negra, diarista, mãe, que foi contaminada em seu local de trabalho: um apartamento no Alto Leblon. Não deve-se culpar somente o vírus, pois é necessário considerar suas condições de vida, que a mantinham com a necessidade de trabalhar mesmo estando exposta a transmissão. Outra situação, são as mães que precisam levar seus filhos para o trabalho por conta de as escolas ainda permanecerem fechadas. Isso para passear com os cachorros da patroa e, enquanto o filho fica sob seus cuidados, cai do nono andar de um prédio de luxo em Recife (PE) ao ser deixado sozinho. Embora o direito à saúde e segurança sejam resguardados na Constituição Federal, uma certa administração de corpos ocorre, e a situação da pandemia agrava desigualdades existentes. Mirtes Renata Santana de Souza, mãe de Miguel, e Cleonice, são mulheres de cor, empregadas domésticas e mães de classe média-baixa. No último conto de Olhos d’Água, “A gente combinamos de não morrer”, não é escrito “viveram felizes para sempre”, mas sim “escrever é uma maneira de sangrar. Acrescento: e de muito sangrar, muito e muito”. Bica, personagem que narra a história, conta que sua mãe separa com violência os dois mundos, e sabe que a verdade da telinha é a da ficção. Deve haver outros caminhos, mas até descobri-los, leremos “palavras caídas, apanhadas, surgidas, inventadas na corda bamba da vida” ao invés de lindas histórias de princesas.

Em paralelo, no “mundo real”, a primeira vítima fatal da Covid-19 no

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Arte no corpo Pessoas mais velhas veem as tatuagens como marcas de suas histórias pessoais Carlos Mazzeto, Gustavo Barossi e Luiza Ruppel.

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agulha perfura as camadas da pele até chegar na mais profunda.O barulho inconfundível da máquina de tatuagem marca a passagem do tempo com uma sequência de “dzzzzzzzzzz dzzz dz dzzzzzz”. Alguns minutos - ou horas - depois, a tinta aplicada na derme forma um desenho que será exibido para o resto da vida da pessoa tatuada. E (quem já se tatuou um dia talvez se identifique) a pergunta inevitável será feita: mas e quando você envelhecer? Existe um estigma de que o grande problema da tatuagem é que ela dura para sempre, o que significa que, quando a pessoa for mais velha, ter a pele tatuada será uma complicação. Totalmente contrário a esse pensamento, o modelo Walter Gianini, de 58 anos, não enxerga o problema na perpetuidade de suas tatuagens. “Perguntavam se elas não iriam desbotar. Eu digo que são marcas, e daí se vão desbotar? São registros da minha história, das minhas passagens.” Contra as crenças de sua família tradicional e religiosa, o modelo fez sua primeira tatuagem assim que completou 18 anos, em 1981. A avó de Gianini veio com seus três filhos para o Brasil fugindo da ditadura de Francisco Franco, instaurada na Espanha. Criada em meio ao medo da ditadura, a mãe de Walter, diz ele, pensava que ter uma tatuagem significava que a pessoa estaria marcada e seria identificada com facilidade pelas autoridades.

Mesmo tendo que lidar com as adversidades causadas por conta das tatuagens, Walter entende que o processo de desconstrução de paradigmas consiste também em respeitar as diferenças entre as gerações e o processo do outro, principalmente no ambiente familiar. Questões ideológicas e de religião sempre formaram o pensamento de pessoas ao seu redor, porém, esse preconceito se desfez, e hoje, a mãe que fazia críticas passeia pela areia da praia se sentindo orgulhosa da atenção que seu filho tatuado chama. Mas para chegar a uma aceitação maior, houve uma grande luta para que as coisas se tornassem menos duras. “Eu vim de um tempo que era tudo muito diferente e eu dei a cara para bater, por exemplo: pela minha orientação sexual, por eu ser gay. E na minha geração lutamos muito, abrimos portas para a geração que está chegando agora. ”Com a passagem dos anos, Walter foi adquirindo uma coleção de desenhos pelo corpo cada vez maior,questionado diversas vezes: “e quando você for mais velho?” Hoje, as tatuagens que cobrem sua pele significam para ele marcas da sua história e da individualidade de sua vida. “É eu poder me expressar da forma que quero e ser único, pois não tem outro igual a mim: as tatuagens me tornam único, representam marcas da minha vida, umas muito boas, e outras não tão boas, mas elas todas são marcas que representam quem eu sou.”

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Walter Gianinni

Walter não cobre suas tatuagens, acreditando que os traços que estouraram também são marcas que o representam. Walter Gianinni

Martina Mandic

Caio Passos

caio começou a se tatuar pensando em expor as opiniões e ideologias.

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Caio Passos

Martina tem planos de fazer mais tatuagens.


Para o skatista Caio Passos, 53, o seu rito de passagem para o mundo dos desenhos feitos na pele também ocorreu nos anos 1980. Com 13 anos, Caio comprou agulha, tinta nankin e escondido de seus pais fez em seu braço o símbolo da anarquia. “Eu era recém punk e achei que era a hora de me tatuar. Eu gosto muito dela porque tem um significado para mim até hoje. Essa tatuagem sou eu.” Caio adotou o punk como um meio de ver o mundo, contra o autoritarismo, a perseguição, os preconceitos e a repressão das diferenças na sociedade. Apesar

“Perguntavam se elas não iriam desbotar. Eu digo que são marcas, e daí se vão desbotar? São registros da minha história, das minhas passagens.” Walter Gianini, modelo. de ter se tatuado jovem, ele pontua a importância de pensar bem antes de resolver fazer uma tatuagem, ter cuidado com a simbologia dos desenhos e prezar pela escolha de bons profissionais. O skatista relata ter passado por momentos de preconceito por ser tatuado, mas acredita que o estigma social em torno da ideia de envelhecer tendo tatuagem depende da cultura do local. No Brasil, diz ele, a sociedade se escandaliza se as pessoas mais velhas querem fazer algo tipicamente feito por jovens. “Eu não vejo problema nenhum [em envelhecer sendo tatuado]. Não vejo problema nenhum em ser feliz a vida toda. O importante é você estar satisfeito com isso.”

Cuidados com a tatuagem Alguns cuidados que você pode tomar para que a tatuagem não deforme com o tempo

Hidratar a pele diariamente: a pele ressecada atrapalha no processo de cicatrização bem como de conservação, além de aumentar os riscos de deformação da tatuagem; Uso de protetor solar: o sol é o inimigo número 1 das tatuagens, a luz solar faz com que os traços estourem conforme o tempo. O ideal é evitar expor as tatuagens ao sol, mas quando não for possível, use protetor;

Em determinado período da vida, Caio cruzou seu caminho com o de Martina Mandic, 61, sua ex-esposa e amiga até hoje. Dona de uma personalidade ímpar, Martina nasceu na Alemanha, mas se mudou para o Brasil com 5 anos e já teve diversas profissões: atriz, tradutora de alemão, assessora para cidadania alemã e atualmente é empresária. Martina demonstra um ponto de vista um pouco diferente dos outros com relação a tatuagens. Ela entende que o conceito de se tatuar era diferente há uns anos, mas isso nunca a afetou diretamente. “Claro que as pessoas ficavam olhando meio para as tatuagens, mas preconceito mesmo eu nunca sofri. Talvez porque eu nem me importasse também.”

Tatuador O despertador toca, a chaleira apita, é mais um dia de trabalho. A arte já foi combinada com o cliente, é hora de tatuar. Ezequiel Basso, 43, já leva essa rotina há 26 anos, é tatuador profissional e instrutor de curso para iniciantes. Agora em seu estúdio, reformulado e com aparelhos novos, ele é exemplo para novos profissionais, mas nem sempre foi assim. No começo da carreira, ele só tinha acesso a máquinas velhas de difícil manuseio, além de agulhas caseiras, o que atrapalhava muito no desenvolvimento do desenho. Se em tempos atrás havia um estigma muito grande com quem possuía alguma arte no corpo, para quem resolveu adotar isso como profissão era ainda maior. Ezequiel revela que sofreu represália, principalmente por parte de sua família. “Eles diziam que tatuar não era emprego de verdade. Queriam que eu largasse para trabalhar com algo que eles achavam que era um emprego sério.”

Manter hábitos alimentares saudáveis: uma boa alimentação auxilia na hidratação e cicatrização na pele, sendo aconselhável evitar alimentos muito gordurosos e bebida alcoólica durante a cicatrização. Saiba mais sobre os cuidados com a cicatrização.

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JORNALISMO PUCPR

Há 60 anos formando profissionais com capacidade de discutir o passado, com o olhar crítico do presente, moldando a história do futuro.

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