constitui a diversidade cultural é a condição para a capacidade de escolha7 dos atores, indivíduos e instituições, isto é, suas liberdades fundamentais tanto quanto sua capacidade de desenvolvimento, segundo as análises de Amartya Sen: a diversidade cultural é a origem e o capital do desenvolvimento8. Cada um sabe, ou deveria saber, que não é a censura, a intimidação ou a violação de determinados direitos civis que protege um povo contra o assédio de um fundamentalismo, seja ele religioso ou não, mas o respeito ao direito à educação, à informação, a todas as liberdades dentro de um espaço público democraticamente organizado. A segurança não justifica nenhuma limitação de um direito humano, mas, ao contrário, supõe o florescimento de tais direitos. Quando é exigida uma restrição no exercício de uma liberdade, o benefício para o conjunto das liberdades deve ser imediatamente visível. Frente a um fanatismo redutor, a resposta democrática não pode ser o autoritarismo de um Estado centralizado (ressalvadas as condições estritas do estado de exceção), mas, ao contrário, a diversidade interativa das liberdades, dos direitos e das responsabilidades. A segurança humana não é garantida senão pela tessitura dos direitos/liberdades/responsabilidades. A análise da relação de direito (sujeito, objeto, devedor) nos dá, assim, um tríplice esclarecimento da diversidade: – diversidade das pessoas (mais precisamente, aqui, o respeito de seu direito à identidade); – diversidade dos seus objetos (direitos à propriedade, mais especificamente, aqui, o direito de acesso e participação nos patrimônios culturais), que garante (e é garantido por) o espaço das liberdades (aqui entendidas como as liberdades culturais ou liberdades de exercer atividades culturais e de participar da vida cultural)9; – diversidade das responsabilidades para as pessoas e os atores sociais. Nota-se aqui a importância do direito a uma informação adequada (levando-se em conta a diversidade cultural), sem a qual a responsabilidade não faz sentido. É também o direito à informação que permite a comunicação das diversidades e, portanto, o desenvolvimento da riqueza cultural. A diversidade dos interagentes (diversidade dos atores e de suas interações) é a base da segurança que não pode ser garantida senão pelos direitos. A segurança humana entendida como garantia do respeito pela substância de cada direito humano e da eficácia das instituições que são necessárias a isso apoia-se na manutenção dessa diversidade social como reserva ativa de capacidades, ou capital. Uma política de segurança humana, portanto, só é legítima e crível se tiver como alvo essa complexidade: ela só pode ser sistêmica. Seu objetivo, portanto, é sintetizado na atribuição de confiabilidade de todos os sistemas sociais referentes ao cerne intangível de cada direito humano. Uma medida parcial, que subestime o elo entre todos os direitos humanos – entre as diversas dimensões da segurança –, é parcial e perversa.
Cf. Artigo 3 da Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural.
7
8 O relatório de J. Pérez de Cuéllar, Notre Diversité Créatrice (Paris: Unesco, 1996) tinha definido muito bem o lugar da diversidade dentro do desenvolvimento. Faltavam-lhe, porém, as vias concretas, sobretudo as do direito, como também uma cultura renovada da economia, para que a riqueza cultural fosse considerada em seu devido lugar: no centro.
9
Classicamente, o direito à propriedade (a ser diferenciado do direito da propriedade), tal como definido no Artigo 17 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, ao qual tem direito “toda pessoa, sozinha ou coletivamente“, garante o espaço das liberdades. Pode-se considerar o direito ao patrimônio como uma interpretação do direito à propriedade nos domínios da cultura.
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