Cinema do IMS Poços, agosto de 2025

Page 1


Eu não me importo se entrarmos para a história como bárbaros (Îmi este indiferent daca în istorie vom intra ca barbari), de Radu Jude

destaques de agosto

Amedabade, Bombaim, Calcutá. As três cidades indianas aparecem na sessão Mutual Films, filmadas por Ruchir Joshi, cineasta, escritor e fotógrafo, e Mani Kaul, um dos principais nomes do cinema paralelo indiano e referência-chave para o cinema de Joshi. As paisagens são retratadas no seu cotidiano, mas também no contraponto direto aos estereótipos do audiovisual estrangeiro e no diálogo com a obra de outros artistas.

O proeminente cineasta Radu Jude retorna ao trauma da Segunda Guerra Mundial para refletir sobre a participação da Romênia, seu país natal, no Holocausto de 1941. Eu não me importo se entrarmos para a história como bárbaros é também um tratado sobre possibilidades e limites de um cinema político.

Uma das mulheres pioneiras na direção de filmes nos EUA, Ida Lupino teve também uma vasta carreira como diretora de televisão. No último mês da retrospectiva dedicada a Lupino, serão exibidos episódios que filmou para três proeminentes séries televisivas.

Em um futuro distópico, o governo brasileiro isola a população idosa em colônias afastadas das metrópoles.

Esta é a premissa de O último azul, de Gabriel Mascaro, com Denise Weinberg e Rodrigo Santoro, vencedor do Urso de Prata no Festival de Berlim deste ano.

Celine Song, indicada ao Oscar por Vidas passadas, segue com sua pesquisa sobre intimidade, identidade e relacionamentos modernos na comédia romântica Amores materialistas, sobre uma casamenteira de Nova York dividida entre dois homens.

Ainda este mês, no Cinema do IMS, o cinema brasileiro se debruça sobre o samba de Moacyr Luz, a vida de um médico cubano no Brasil, a fauna de diferentes biomas brasileiros e a construção de um lar: tijolo por tijolo.

[imagem da capa]

O último azul, de Gabriel Mascaro

A feiticeira: A magia das coisas simples (Bewitched: A is for Aardvark), de Ida Lupino
Moacyr Luz, o embaixador dessa cidade, de Tarsilla Alves
Amores materialistas (Materialists), de Celine Song

Em cartaz

Amores materialistas (Materialists)

Celine Song | DCP

Cloud – Nuvem de vingança (Kuraudo)

Kiyoshi Kurosawa | DCP

Moacyr Luz, o embaixador

dessa cidade

Tarsilla Alves | DCP

O deserto de Akin

Bernard Lessa | DCP

O último azul

Gabriel Mascaro | DCP

Tijolo por tijolo

Victória Álvares, Quentin Delaroche | DCP

Yõg ãtak: Meu pai, Kaiowá

Sueli Maxakali, Isael Maxakali, Roberto

Romero e Luisa Lanna | DCP

Sessão infantil

Thiago & Ísis e os biomas do Brasil

João Amorim | DCP

Dirigidos por Ida Lupino

O paladino do Oeste: Dama armada

(Have Gun – Will Travel: Lady with a Gun)

Ida Lupino | Arquivo digital

Além da imaginação: As máscaras

(The Twilight Zone: The Masks)

Ida Lupino | Arquivo digital

A feiticeira: A magia das coisas

simples (Bewitched: A is for Aardvark)

Ida Lupino | Arquivo digital

Sessão especial

Eu não me importo se entrarmos para a história como bárbaros (Îmi este indiferent daca în istorie vom intra ca barbari)

Radu Jude | DCP

Sessão Mutual Films

Uma terceira criatura: ocinema de Ruchir Joshi

Memóriasdacidadedoleite

(MemoriesofMilkCity)

RuchirJoshi|Arquivodigital

Chegada(Arrival)

ManiKaul|Arquivodigital

ContosdoplanetaKolkata

(Tales from Planet Kolkata)

RuchirJoshi|Arquivodigital

19:00 Tijolo por tijolo (103')

19:30 Tijolo por tijolo (103')

19:00 O último azul (86')

19:00 Moacyr Luz, o embaixador dessa cidade (95')

16:00 Thiago & Ísis e os biomas do Brasil (90')

19:00 O deserto de Akin (78')

16:00 dirigidos por ida lupino O paladino do Oeste + Além da imaginação + A feiticeira (75')

19:00 O deserto de Akin (78')

16:00 sessão mutual films Amedabade, Bombaim, Calcutá (80')

19:00 Tijolo por tijolo (103')

16:00 Moacyr Luz, o embaixador dessa cidade (95') sessão especial 18:00 Eu não me importo se entrarmos para a história como bárbaros (140')

(117')

16:00 O último azul (86')

19:00 Moacyr Luz, o embaixador dessa cidade (95')

16:00 Thiago & Isis e os biomas do Brasil (90')

18:00 Cloud – Nuvem de vingança (123')

16:00 Thiago & Ísis e os biomas do Brasil (90')

18:00 Cloud – Nuvem de vingança (123')

16:00 Tijolo por tijolo (103')

18:00 Amores materialistas (117')

16:00 Amores materialistas (117')

18:20 Moacyr Luz, o embaixador dessa cidade (95')

16:00 Thiago & Ísis e os biomas do Brasil (90')

18:00 O último azul (86')

Programa sujeito a alterações. Eventuais mudanças serão informadas em ims.com.br.

Uma terceira

criatura: o cinema

de Ruchir Joshi

A iniciativa Mutual Films apresenta o pensamento do cineasta e escritor indiano Ruchir Joshi, que nasceu em Calcutá em 1960 e que se empenha em tratar dos dilemas da Índia como um país que abriga diversas realidades. Dois dos seus filmes, originalmente lançados na década de 1990, serão apresentados no IMS Poços em novas versões restauradas, junto a um curta-metragem do cineasta Mani Kaul, que foi uma referência importante para seu trabalho. Joshi também é autor de diversos trabalhos de não ficção e dois romances, inclusive o retrato épico de Calcutá Great Eastern Hotel (2025), que foi publicado em inglês no início deste ano. Na ocasião das exibições de seus filmes nas unidades do IMS em São Paulo (em setembro de 2023) e em Poços de Caldas, Joshi escreveu o seguinte texto de apresentação, no qual elabora sua visão lúdica, política e autorreflexiva do cinema como o que ele chama de “uma terceira criatura”.

Aaron Cutler, Mariana Shellard e Ava Shellard-Cutler (Mutual Films)

Ruchir Joshi

É uma honra para mim que meus filmes sejam exibidos no Brasil. Apesar da Índia e do Brasil terem tanto em comum, os países são apenas uma ideia vaga na mente da maioria dos indianos que pensam no Brasil e na maioria dos brasileiros que pensam na Índia. É quase como se tivéssemos duas fileiras de dançarinos, uma diante da outra, compostas pelos principais clichês e arquétipos sobre o Brasil e sobre a Índia: de um lado, está o futebol, a vasta floresta, o grande rio, Carnaval, Rio, Copacabana, a garota de Ipanema, enormes favelas e, do outro, templos, encantadores de serpentes, dançarinas exóticas, Gandhi, música de cítara, filmes de Bollywood, enormes favelas, fazendeiros famintos, os Himalaias e assim por diante.

Falando apenas por mim, tenho uma certa vergonha de saber tão pouco sobre cinema e literatura brasileiros. O que eu sei sobre o futebol1 ou as favelas, ou sobre a floresta amazônica ou a arquitetura de Oscar Niemeyer, é principalmente mediado

1. Eu sempre fui um torcedor do Brasil em uma cidade louca por futebol como Calcutá, que, em cada Copa do Mundo, fica ferozmente dividida, com cada bairro apoiando uma grande potência como Brasil, Argentina, França ou Alemanha. Nosso futebol está a anos-luz de distância no ranking mundial – eu não acredito que viverei para ver a Índia participar de uma Copa do Mundo.

pelo “norte-por-noroeste”, ou seja, pelas fontes do chamado “Primeiro Mundo”.

O motivo disso acontecer, é claro, pode ser encontrado na história contínua da colonização em nosso período “pós-colonial”. Na Índia, nossa atenção externa e imaginação estão sintonizadas em duas direções principais, primeiro para os países e culturas da vizinhança imediata e, segundo, para os Estados Unidos e a Europa Ocidental. Eu vou chutar que, no Brasil, a situação é basicamente a mesma. Espero que as exibições de meus filmes sejam um pulso na corrente elétrica necessário para derrubar a parede da estática euro-americana que ofusca nossas culturas uma da outra.

Os meus filmes restaurados foram realizados entre os anos de 1988 e 1993. Especificamente, o longa-metragem Egaro Mile (Onze milhas) (Egaro Mile, 1991) foi iniciado em fevereiro de 1988 e concluído em fevereiro de 1991, o curta-metragem Memórias da cidade do leite (Memories of Milk City, 1991) foi produzido rapidamente, durante três meses, em meados de 1991, e o filme de 40 minutos Contos do planeta Kolkata (Tales from Planet Kolkata, 1993) foi realizado entre dezembro de 1992 e março de 1993, com a discussão do roteiro iniciada alguns meses antes.

Egaro Mile trafega entre os gêneros de road movie, filme-diário, filme-ensaio e uma espécie de antietnografia, ou etnografia alternativa, enquanto lida com músicos folclóricos tradicionais bengalis que são conhecidos como os Bauls. Dos três filmes, é o que vai para a Bengala rural, para o interior de Calcutá, bem como para a própria cidade grande. Memórias nos leva ao outro lado do país, à cidade de Amedabade, no oeste da Índia. É uma breve meditação sobre a luta, então em curso, entre a cidade velha e a cidade já não tão nova que surgiu do outro lado do rio Sabarmati, sobre a mutação da tradição e a propagação de uma certa americanização, e sobre o empurra e puxa entre uma cultura mais antiga e gentil e os novos impulsos consumistas, que já estavam alimentando uma crescente violência religiosa majoritária. Com Contos, voltamos a Calcutá e às ideias concorrentes da cidade que, entre os anos 1960 e o início dos anos 1990, foi para o Ocidente o símbolo do “pior desastre urbano do mundo” e que, para nós, nativos, foi o lugar do litost2 interno e de absurdidades destruidoras. Algumas pessoas têm percebido esse filme como a quarta parte

2. O termo usado pelo escritor Milan Kundera define um certo tipo de exílio, nostalgia por um lar perdido.

de uma obra, sendo as primeiras três as que compõem Egaro Mile. E, de certa forma, ele é, ao mesmo tempo que decola em uma nova direção.

Ao olhar para trás, algumas coisas vêm à mente sobre o momento em que os filmes foram feitos. Aqueles cinco anos marcaram um período turbulento no mundo. Internacionalmente, essa foi uma época em que o Muro de Berlim caiu e o Império Soviético se extinguiu (alguns diriam que deu uma pausa, antes de reacender em outro formato). Na Índia, sabíamos que o Brasil e outros países sul-americanos estavam completando o que foi chamado de “um lento retorno à democracia” ao longo da década de 1980. Em 1991, o apartheid terminou na África do Sul.

Esses cinco anos também podem ser vistos como um momento decisivo para a Índia. Duas coisas extremamente importantes aconteceram, e meus filmes são reflexos delas, mesmo que de forma bastante indireta. Em 1991, tivemos o que se chamava de “liberalização”, quando o modelo anterior de uma economia mista com forte participação do Estado foi alijado e o país se abriu para os mercados internacionais pela primeira vez na história de nossos 40 anos de independência. Talvez não por coincidência, esse também foi omomento exato em que a extrema direita

Memórias da cidade do leite
(Memories of Milk City)
Ruchir Joshi

hindu começou uma nova investida pelo poder, usando a desculpa de “restaurar o local de nascimento” de Senhor Rama (uma das principais divindades do hinduísmo) e insistindo que esse era exatamente onde havia uma mesquita do século XVI. Em 1992, os fascistas hindus finalmente conseguiram destruir a mesquita, levando a uma revolta massiva e a um derramamento de sangue no norte e oeste da Índia, que nos levaram ao período extremamente sombrio em que nos encontramos hoje.

Em termos de cinema de arte indiano, após o grande florescimento de novos filmes não comerciais entre os anos de 1950 e 1970, os anos 1980 provaram ser de estagnação no que diz respeito aos filmes sérios de ficção. Por outro lado, essa foi a década em que o documentário independente e o cinema de não ficção indianos atingiram maturidade. Anteriormente, tínhamos feito um grande trabalho inovador sob a égide da Films Division, a instituição governamental para documentários e filmes educativos,3 mas foi durante a década de 1980 que um grande número de filmes independentes abordando questões políticas e sociais

começou a ser feito em toda a Índia. Muito disso tinha a ver com a crescente disponibilidade de equipamentos em 16 mm e estúdios de pós-produção, e, para uma importante leva de documentaristas, o aumento do interesse e financiamento de canais de televisão estrangeiros (principalmente europeus).

3. Um bom número de filmes comissionados pela Films Division pode ser visto no canal de YouTube da entidade: tinyurl.com/filmsdivisionsmf. [Nota dos curadores]

Trabalhei no início dos anos 1980 como assistente para um cineasta em ascensão localizado em Bombaim, com a ambição de um dia também fazer filmes de ficção que seriam exibidos em festivais ao lado dos meus heróis (e heroínas) do cinema internacional. Entretanto, também vi vários filmes em festivais e cineclubes que não se enquadravam facilmente em nenhuma das duas categorias principais de ficção e documentário. Nessa época, eu não conhecia os trabalhos de Chris Marker ou Harun Farocki, mas foi através dos filmes de Jean-Luc Godard, assim como dos escritos de Milan Kundera e Eduardo Galeano, que fui cada vez mais exposto à ideia de que uma obra artística também poderia ser uma terceira criatura – o que, no meu caso, significava fundir as formas do ensaio e do diário com as tradições cinematográficas de documentário e ficção. Dos cineastas indianos da época que trabalhavam com não ficção, achei Mani Kaul (1944-2011) o mais interessante e desafiador. Eu admirava as conquistas formais de

seus célebres primeiros longas de ficção, mas o documentário A Desert of a Thousand Lines (1986), sobre o Rajastão, sua terra natal, realmente abriu meus olhos para o que era possível fazer com a realidade filmada. Depois disso, vi dois outros documentários dele, o curta Chegada (Arrival, 1980) e o longa Dhrupad (1983), nos quais seu engajamento poético tratava, respectivamente, de sua amada Bombaim e do estilo de música clássica indiana pelo qual ele era apaixonado, e novamente achei seu uso da câmera emocionante e libertador. Mani também fez seu maravilhoso filme Siddheshwari (1989), em torno da grande cantora de thumri e sua cidade de Benares (também conhecida como Varanasi), mas eu só vi esse filme alguns anos depois.

Chegada (que será mostrado com meus filmes no IMS) foi especialmente importante para mim. O primeiro filme que dirigi, chamado Bargain (1985), era sobre o New Market, um enorme edifício da era vitoriana em Calcutá. Em Chegada, Kaul filmou em torno do Crawford Market, a versão de Bombaim do New Market, e eu assisti a seu filme somente depois de ter concluído meu primeiro esforço estudantil. Embora ainda gostasse de muitas das coisas do meu filme, também pude ver como Kaul destilou de maneira magistral e criativa as qualidades

da observação e do comentário cinematográfico e social. Uma cena em Chegada na qual ele se afasta das atividades da rua para seguir, da janela de um apartamento, em um andar alto, um pedaço de papel voando, acompanhado por um trecho de uma música dhrupad, abriu meus olhos para o que um cineasta poderia fazer ao se dar a liberdade de usar a câmera tão pessoalmente quanto se faria com uma caneta ou um pincel. Embora eu nunca tenha seguido a máxima de Kaul de que cada cena de um filme deve ser autossuficiente (eu gostava da minha montagem picotada e das minhas cenas repentinamente interrompidas), essa foi uma aprendizagem crucial à qual me apeguei com muita gratidão.

Meus filmes em 16 mm foram todos patrocinados de uma forma ou de outra pelo Channel 4, no Reino Unido. Em Egaro Mile, obtivemos fundos para a conclusão graças a Alan Fountain, o coordenador de projetos do Channel 4 para filmes independentes e experimentais.4 Os outros dois filmes fizeram parte de uma série que Fountain lançou, chamada South (South 1 e South 2, em 1991 e em 1993), para a qual cineastas do 4. Mais informações sobre Fountain podem ser lidas em inglês através do link tinyurl.com/fountainsmf. [Nota dos curadores]

Sul Global apresentaram propostas para financiamento e exibição no canal.

Posso ver agora que meu trabalho esteve à beira de várias transformações. Os filmes foram feitos quase no final do movimento independente de 16 mm que começou na Índia no final dos anos 1970 e atingiu seu pico entre 1988 e 1995. Nessa época, câmeras DV com qualidade de transmissão entraram no mercado, assim como computadores de mesa com os quais era possível editar os filmes gravados em vídeo. Isso revolucionou a produção de não ficção em todas as áreas, do financiamento necessário à maneira como a obra poderia ser exibida em diferentes contextos. No Reino Unido, o Channel 4, que foi criado como um canal para vozes minoritárias e marginais, teve suas premissas alteradas por exigências do mercado, com pessoas como Fountain sendo forçadas a sair – dali em diante, ninguém mais seria capaz de lançar esse nosso tipo de filme limítrofe na televisão mainstream europeia. A Índia, como já disse, entrou nos primeiros dias do seu tango com o mercado global, o que significou o encerramento abrupto de qualquer espaço que pudesse existir nas redes televisivas indianas para um cinema diferente. Eu dirigi alguns documentários convencionais para a televisão britânica e depois

passei a trabalhar como escritor e jornalista. No cinema, fiz apenas dois vídeos ensaísticos desde então.5 Nos 25 anos seguintes, Egaro Mile e Contos conseguiram ter vida própria, sendo programados de tempos em tempos em festivais na Índia e na Europa e ocasionalmente na América do Norte, enquanto Memórias não teve um destino tão feliz, pois não havia uma boa versão legendada do filme em DVD ou Betacam. Em 2013-2014, em parceria com o Arsenal – Institut für film und Videokunst e.V., em Berlim, iniciei um projeto de digitalização dos três filmes. Esse trabalho foi concluído no final de 2018, e os filmes restaurados começaram a ser reintroduzidos nas conversas de cinema a partir de 2019, com os anos de covid intervindo em 2020-2022.

De certa forma, esses filmes agora são duplamente terceiras criaturas. São o que eram quando foram exibidos pela primeira vez, em seu primeiro avatar, por assim dizer. Depois, foram exibidos erraticamente em mídias diferentes do 16 mm, como fitas VHS, U-Matic e Beta e, eventualmente, como DVDs, então fica a memória de como eles

5. Os filme-ensaios de Joshi A Mercedes for Ashish (2005) e My Rio, My Tokio (2010) podem ser vistos através dos links tinyurl.com/ashishrj e tinyurl.com/riotokyorj, respectivamente. [Nota dos curadores]

pareceram e se transformaram com seus diversos espectadores ao longo dos anos. E agora aqui estão, nascidos três vezes, não novos, mas novos, prontos para interagir com públicos inéditos.

Graças às restaurações do Arsenal e aos esforços da Mutual Films, eles viajam agora pelo Brasil. Aguardo ansiosamente a repercussão.

Aliás: Eu gostaria de dedicar as sessões à memória de três pessoas: Deepak Majumdar (1934-1993), Vivan Sundaram (1943-2023) e Navroze Contractor (1944-2023).

Deepak foi um poeta, escritor, pensador cultural, provocador e professor, que se deslocou pela zona rural de Bengala Oriental, por Calcutá, pela América, Grécia, França e Polônia, mas acabou vivendo principalmente em Calcutá. Para aqueles de nós, sortudos o suficiente para ter aprendido com ele e alimentado uma amizade, ele foi uma presença enorme, exasperante, enervante, estimulante e inspiradora em nossas vidas.

Vivan foi um dos artistas mais importantes da Índia contemporânea (e ouso dizer do mundo). Desde seus dias de estudante em Baroda e depois em Londres, por volta de 1968, ele produziu uma variedade de trabalhos surpreendentes, de desenhos e pinturas narrativas a instalações, performances e

vídeos. Sempre aliado a causas e formas progressistas, Vivan inspirou e apoiou energicamente as gerações seguintes. Sua perda parece terrivelmente prematura, apesar dos problemas de saúde que sofreu no final de sua vida.

Navroze foi um dos maiores diretores de fotografia do cinema indiano. Ele começou a trabalhar com Mani Kaul, filmando o primoroso Duvidha (1973) com uma pequena câmera 16 mm com o mais lento dos estoques da Kodak. E, além de fotografar vários

Chegada (Arrival) Mani Kaul

longas-metragens, ele foi um dos melhores cinegrafistas de documentários do mundo. Seu trabalho com sua esposa Deepa Dhanraj é apenas uma parte importante de sua vasta e variada obra. Sua morte em um trágico acidente de motocicleta foi um golpe chocante para todos nós que o conhecíamos – mesmo aos 78 anos, Navroze era um dos mais jovens guerreiros do cinema.

Ruchir Joshi Berlim, julho de 2023/maio de 2025

Amores materialistas

Materialists

Celine Song | EUA | 2025, 117’, DCP (Sony Pictures)

Uma jovem casamenteira ambiciosa de Nova York se vê dividida entre o par perfeito, um milionário carismático e seu ex-namorado imperfeito, um homem que aspira se tornar ator.

Com Dakota Johnson, Chris Evans e Pedro Pascal, Amores materialistas é uma comédia romântica escrita e dirigida por Celine Song, indicada ao Oscar por Vidas passadas. Aqui, Song segue sua exploração de temas como intimidade, identidade e relacionamentos modernos. Em entrevista a Alisha Mughal para o portal The Asian Cut, Song comenta:

“Bem, eu sinto que existe uma linhagem muito longa e bonita de filmes como esse. Desde Billy Wilder até James L. Brooks e, claro, mais recentemente, Nora Ephron, certo? Então, há esses filmes que não são apenas sobre amor, romance e encontros – eles sempre são sobre algo a mais. Sempre vão tratar do que significa ser uma pes-

soa moderna tentando amar e tentando viver. O romance é um gênero incrível porque podemos, basicamente, dizer: 'Ei, convidamos o público a entrar em uma sala de cinema, e vamos passar duas horas apenas pensando e sentindo o amor.' É isso. Vamos falar sobre amor. Vamos sentir amor. Vamos pensar só sobre o amor – e que convite maravilhoso, que convite cheio de alegria. Mas o que eu realmente admiro em pessoas como Nora Ephron, Jim Brooks ou até mesmo Billy Wilder, é que eles sempre aproveitam essa oportunidade para falar de algo mais – falar de origens, de filosofias, das coisas que realmente nos desestabilizam, das coisas que nos fazem sentir de verdade. No fundo, é sempre uma pergunta: “Que tipo de pessoa nós somos?” – e essa será sempre uma questão que eles vão abordar enquanto temos uma plateia que está ali para sentir o amor.”

[Íntegra da entrevista, em inglês: tinyurl.com/ materialistascs]

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

Cloud – Nuvem de vingança

Kiyoshi Kurosawa | Japão | 2024, 123’, DCP (O2 Play)

Buscando lucro rápido, um jovem revende online diversos produtos baratos por preços elevados, o que acaba gerando insatisfação entre seus clientes. Conforme o descontentamento cresce, alguns clientes decidem se vingar, levando-o a enfrentar uma série de eventos misteriosos e ameaçadores que colocam sua vida em risco.

“A inspiração para este projeto não surgiu a partir de um tema específico, mas do meu desejo de longa data de criar um filme de ação. A ação é um gênero profundamente enraizado na história do cinema, mas realizar um ambientado no Japão contemporâneo apresenta desafios únicos, tanto logísticos quanto financeiros”, declara Kurosawa em entrevista ao portal The Hollywood Reporter.

“Um desafio significativo que impus a mim mesmo foi me afastar dos protagonistas típicos dos filmes de ação japoneses – frequentemente membros da Yakuza, policiais ou das forças

de defesa – e, em vez disso, focar em pessoas comuns. São indivíduos sem qualquer ligação com a violência em seu cotidiano, mas que se veem subitamente lançados em uma situação de vida ou morte, em que a sobrevivência exige medidas extremas. Isso exigiu criar uma história que colocasse de forma convincente pessoas comuns em circunstâncias extraordinárias – matar ou morrer. Levá-las até esse ponto foi o maior desafio narrativo.”

Sobre o trabalho de revendedor online que escolheu para seu protagonista, o diretor comenta: “Para mim, essa ocupação simboliza o capitalismo contemporâneo – em que, se você não tem talentos excepcionais ou riqueza, a revenda é uma forma de se virar dentro do sistema. É interessante porque, quando você pensa bem, essa operação em pequena escala espelha o que grandes corporações fazem em larga escala: comprar barato, vender caro – mas com menos consciência das linhas éticas que podem estar sendo ultrapassadas. Essa ocupação me pareceu uma metáfora poderosa para os tempos em que vivemos.”

[Íntegra da entrevista, em inglês: tinyurl.com/ cloudimskk]

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

Moacyr Luz, o embaixador dessa cidade

Tarsilla Alves | Brasil | 2024, 95’, DCP (Bretz Filmes)

Ao lado de parceiros como Aldir Blanc, Moacyr Luz inventou um Rio de Janeiro em sambas e canções. Em sua vida cotidiana, ele criou lugares onde esse Rio inventado se materializa, como o famoso Samba do Trabalhador das segundas-feiras.

O documentário acompanha as andanças do artista durante uma semana, desde uma roda de samba no domingo em São Paulo até um sábado de bloco carnavalesco no centro da capital fluminense.

Com participações de amigos e colaboradores ilustres, como Zeca Pagodinho, Maria Bethânia, Fafá de Belém, Teresa Cristina e Jards Macalé, o documentário traz ainda um registro inédito da emoção de sua primeira vitória de samba-enredo na Mangueira e desvenda o processo criativo por trás da canção “Coração do agreste”, fruto de uma parceria com Aldir Blanc.

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

O deserto de Akin

Bernard Lessa | Brasil | 2024, 78’, DCP (Retrato Filmes)

Akin é um dos médicos cubanos trabalhando no Brasil em 2018. Com as eleições, a cooperação entre o Brasil e Cuba chega ao fim. Os médicos são convocados a retornar ao seu país de origem. Akin está em uma encruzilhada: voltar para Cuba ou se estabelecer no Brasil?

Em entrevista a Hermelinda para o programa O rio em pauta, da Rádio Roquette-Pinto, o diretor Bernard Lessa conta: “Essa ideia surgiu durante a pandemia. Eu lembro naquele momento que na Lombardia, na Itália, a gente estava daqui acompanhando mortes diárias de mil pessoas, e falando: ‘Caramba, o que é isso?’. E todo mundo que podia estava fugindo desse lugar, todo mundo que podia saindo para outro lugar, menos os médicos cubanos, uma brigada médica cubana. E foi a

mesma coisa com o vírus ebola na África também. Então aquilo me deixou um pouco sensibilizado.”

“Então, naquele momento, havia saído uma lei Aldir Blanc também, e aí eu comecei a escrever um projeto justamente para desenvolver esse roteiro, que passava por uma pesquisa — que era uma pesquisa com cubanos residentes no Espírito Santo, com pessoas que haviam sido atendidas pelos médicos cubanos. Isso era em 2020, então havia dois anos da interrupção do programa, mas a memória afetiva e real da presença deles era muito forte ainda. Então essa ideia surgiu desse momento de perceber que, onde estava todo mundo fugindo, eram os médicos cubanos que estavam indo.”

[A entrevista completa está disponível no Spotify: tinyurl.com/akinbl]

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

O último azul

Gabriel Mascaro | Brasil, Chile, Holanda | 2025, 86’, DCP (Vitrine Filmes)

Para maximizar a produtividade econômica, o governo ordena que os idosos se mudem para colônias habitacionais distantes. Tereza, 77, se recusa – em vez disso, embarca em uma jornada pela Amazônia que mudará seu destino para sempre.

Com um elenco que inclui Denise Weinberg e Rodrigo Santoro, o mais recente filme de Gabriel Mascaro foi vencedor do Urso de Prata no Festival de Berlim 2025, na Alemanha, onde também recebeu os prêmios do Júri Ecumênico e do Júri de Leitores do Berliner Morgenpost. No Festival Internacional de Cine en Guadalajara, no México, também recebeu os prêmios de Melhor Filme Iberoamericano de Ficção e o Prêmio Maguey de Melhor Interpretação para Denise Weinberg.

Em entrevista a Nataliia Serebriakova para o portal Dirty Movies, o diretor conta: “Minha bisavó começou a pintar aos 80 anos – do nada. Isso realmente me ensinou como alguém pode redes-

cobrir a vida nessa idade. Aconteceu depois que meu avô faleceu, e esse momento sutil me afetou profundamente. Fez com que eu quisesse explorar o corpo idoso no cinema – como o filme pode abordar essa perspectiva?”

“Raramente vemos protagonistas idosos em papéis centrais no cinema narrativo ou na literatura. Quando comecei a pesquisar referências, me deparei com Ozu. A narrativa dele é incrível, mas seus personagens idosos muitas vezes olham para o passado – para um tempo que já passou, um tempo do qual eles não participam mais. Há uma sensação de deslocamento, como se existissem apenas na memória. O trabalho do Haneke também é brilhante, mas, em seus filmes, a presença da morte é iminente – há sempre um prazo, um limite pairando no ar.”

“Percebi uma lacuna na forma como retratamos corpos idosos no presente. Eu não queria fazer um filme sobre o passado, mas sim sobre um corpo que está vivo, experimentando as contradições do presente, redescobrindo a vida. É interessante como os gêneros tradicionais muitas vezes não permitem isso. Por exemplo, em filmes distópicos, pessoas idosas raramente são protagonistas. A rebelião é vista como algo da juventude. Eu quis quebrar essa tradição – trazer os idosos para dentro do gênero e permitir que eles incorporem a experiência de rebelião contra o sistema.”

“Assim, o filme mistura elementos de fantasia, distopia e até de coming-of-age. Mas por que o coming-of-age deve se limitar aos adolescentes? Existem tão poucos ritos de passagem para os idosos. O que criei no filme é que, ao atingir certa idade, o Estado coloca você em um espaço designado.”

[Íntegra da entrevista, em inglês: tinyurl.com/ ultimoazulgm]

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

Tijolo por tijolo Victória Álvares, Quentin Delaroche | Brasil | 2025, 103’, DCP (Olhar Filmes)

No Ibura, periferia do Recife, Cris tem a impressão de que tudo está por um fio. Ela e o marido perderam os empregos no início da pandemia de covid e também a casa em que moravam com três crianças, por risco de desabamento. Grávida do quarto filho e em busca de uma laqueadura, ela trabalha como microinfluenciadora digital, enquanto tenta reconstruir a casa e reestruturar a vida.

Em nota disponível no material de imprensa do filme, os diretores comentam que, apesar de terem filmado momentos bastante difíceis na vida desta família, “Tijolo por tijolo é um filme solar. Porque sempre foi importante para nós, na edição, ser fiel à forma como Cris e sua família lidam com a realidade – de maneira pragmática e realista, mas sempre com muito afeto e esperança. Com este filme, pretendemos criar novos imaginários possíveis de um Brasil real, ainda raramente retratado nas grandes telas. Alicerçados em uma relação

de intimidade e confiança, desejamos construir uma obra que retrata a maternidade sem idealizações – uma mulher que não é vítima nem heroína, e que nunca deixa de sonhar. O tipo de mulher que é invisível em nossa sociedade, mas sem a qual o mundo não seria o mesmo.”

[Íntegra do depoimento: tinyurl.com/tijolovaqd]

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

Yõg ãtak: Meu pai, Kaiowá

Sueli Maxakali, Isael Maxakali, Roberto Romero e Luisa Lanna | Brasil | 2024, 93’, DCP (Embaúba Filmes)

A busca de Sueli Maxakali e Maísa Maxakali pelo pai, Luis Kaiowá, de quem foram separadas durante a ditadura militar no Brasil. O filme acompanha a jornada da cineasta para reencontrar o pai, bem como as lutas enfrentadas pelos povos indígenas Tikmũ’ũn e Kaiowá em defesa de seus territórios e modos de vida.

Sueli Maxakali, Isael Maxakali e seus colaboradores frequentes vem construindo uma filmografia que se destaca no cenário brasileiro pela qualidade, solidez e inventividade. Yõg ãtak: Meu pai, Kaiowá teve sua estreia no Festival de Brasília em 2024, onde foi laureado com o prêmio de Melhor Direção. No debate do filme no festival, Sueli declarou “A gente assistiu a um filme sobre um

deputado que fala ‘Ainda estou aqui’. A gente também fala que nós também estamos aqui. O povo Maxakali, o povo Kaiowá estão aqui. Este filme me marcou.”

A diretora Sueli Maxakali escreveu sobre o filme em texto disponível n.o Blog do Cinema do IMS: tinyurl.com/cartasueli.

[Íntegra do debate: tinyurl.com/yogatakims]

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

Thiago & Ísis e os biomas do Brasil

João Amorim | Brasil | 2024, 90’, DCP (Descoloniza)

Os irmãos Thiago e Ísis, junto com seu pai, o cineasta João, exploram três biomas brasileiros: Cerrado, Pantanal e Mata Atlântica. Em cada cenário, eles ajudam um animal em perigo e descobrem a sua importância e os seus mistérios. Com músicas e animações divertidas, o filme apresenta às crianças o tema da preservação ambiental de forma lúdica.

O filme é inspirado nas duas temporadas da série exibida diariamente no Canal Futura, TV Brasil, Canal Educação e disponível na Globoplay.

Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

Eu não me importo se entrarmos para a história como bárbaros Îmi este indiferent daca în istorie vom intra ca barbari

Radu Jude | Romênia, República Tcheca, França, Bulgária, Alemanha | 2018, 140’, DCP (Beta Cinema)

“Não me importa que entremos para a história como bárbaros.” Essas palavras, pronunciadas no Conselho de Ministros no verão de 1941, deram início à limpeza étnica na Frente Oriental. Radu Jude – um dos criadores mais expressivos da Europa contemporânea – volta a expor os erros de gerações passadas que ainda assolam a sociedade de forma insidiosa. Desta vez, ele aborda um massacre perpetrado pela Administração Romena – um evento real que uma jovem artista ativista decide reencenar.

Em entrevista ao portal East European Film Bullet, por ocasião do lançamento do longa, o diretor declarou: “Minha intenção era inserir muitas coisas diferentes no filme. Para além do tema principal – a participação dos romenos no Holocausto em 1941 e suas consequências –, trata-se também de uma reflexão sobre o que significa fazer um filme, ou, mais especificamente, fazer a chamada arte política. O escritor W.G. Sebald influenciou meu filme não apenas na estrutura, mas também em outros aspectos. Lembro que Sebald descreveu sua profissão como o duvidoso ofício da escrita. E acho que entendo o que ele quis dizer. De certo modo, fazer um filme é sempre algo muito questionável. Fazer um filme sobre a história é ainda mais questionável. Fazer um filme sobre o Holocausto é dez vezes mais questionável. Quis levantar essa questão porque vejo que a maioria das pessoas envolvidas com teatro político, cinema político, arte social de algum tipo etc., está 100% convencida de que o que faz é útil, importante, que transforma a vida, a sociedade, e assim por diante. Tenho algumas dúvidas quanto a isso – e foi isso que quis destacar com este filme.”

O filme de Jude recebeu o prêmio de Melhor Filme no Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary em 2018.

[Íntegra da entrevista, em inglês: tinyurl.com/ barbarosrj]

Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

Dirigidos por Ida Lupino

Além de ser uma das primeiras mulheres a dirigir filmes em Hollywood, Ida Lupino também foi pioneira ao abordar temas nada convencionais à época, como gravidez fora do casamento, bigamia e os efeitos psicológicos de um estupro. Nos anos em que atuou como diretora, no entanto, não teve seu talento reconhecido, e cada novo trabalho era um desafio para ser concluído.

Apesar de ser a única mulher citada no livro

The American Cinema: Directors and Directions 1929-1968, seu autor, o crítico cinematográfico Andrew Sarris, ao falar da obra de Lupino, cita a atriz Lillian Gish, que, em sua única tentativa de direção, disse: “Dirigir não é trabalho para uma dama”.

Ida Lupino (1918-1995) foi uma atriz, diretora, escritora e produtora britânica que desafiou os padrões de sua época. Ao longo de sua carreira de 48 anos, participou de 59 filmes e dirigiu oito, trabalhando principalmente nos Estados Unidos. Mais conhecida pelo trabalho como atriz durante a Era de Ouro de Hollywood, sua obra enquanto diretora ainda é pouco conhecida no Brasil. Esta retrospectiva se encerra com a exibição de três obras dirigidas por Lupino para a televisão.

Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

Ida Lupino na TV: O paladino do Oeste; Além da imaginação; A feiticeira

A popularização da televisão impactou radicalmente a indústria cinematográfica. A empresa independente de Ida Lupino, The Filmmakers, também foi afetada por essas mudanças. Lupino dirigiu, escreveu e atuou em vários filmes para a televisão, além de mais de 100 episódios em produções televisivas, com temas que iam de westerns, comédias, mistérios, gângsteres a contos sobrenaturais. Este programa reúne episódios de três diferentes séries dirigidos por Lupino em sua versatilidade estética e temática.

O faroeste O paladino do Oeste (Have Gun –Will Travell) foi uma das primeiras séries em que Lupino atuou como diretora. Em Além da imaginação (The Twilight Zone), Lupino foi a única mulher a atuar como diretora em um episódio, que hoje é um de seus trabalhos mais conhecidos. Por fim, um episódio da famosa série de comédia A feiticeira (Bewitched). Todos os três episódios podem ser assistidos independentemente do restante das séries, sem comprometimentos narrativos.

O paladino do Oeste: Dama armada

Have Gun – Will Travel: Lady with a Gun Ida Lupino | EUA | 1960, 26’, Arquivo digital

Paladino, protagonista da série, viaja pelo Velho Oeste trabalhando como pistoleiro de aluguel. Neste episódio, ele parte no encalço de outra pistoleira, que busca vingar o assassinato de seu irmão durante a Guerra Civil.

Este é o episódio de número 30 da terceira temporada, que foi ao ar em 9 de abril de 1960, e pode ser assistido independentemente do restante da série.

Além da imaginação: As máscaras

The Twilight Zone: The Masks Ida Lupino | EUA | 1964, 25’, Arquivo digital

O magnata Jason Foster está morrendo e convida seus herdeiros gananciosos para uma festa de Mardi Gras, o carnaval de Nova Orleans. Os convidados devem usar máscaras encomendadas especialmente para eles – caso contrário, serão excluídos da herança.

Este é o episódio 145 da série antológica norte-americana The Twilight Zone (ou episódio 25 da quarta temporada), e foi ao ar originalmente em 20 de março de 1964, na CBS. Como todos os demais, ele apresenta uma história que pode ser assistida independentemente. Um dos mais memoráveis filmes do conjunto, As máscaras é o único episódio da série original dirigido por uma mulher.

A feiticeira: A magia das coisas simples

Bewitched: A Is for Aardvark Ida Lupino | EUA | 1965, 24’, Arquivo digital

Clássica série de comédia americana, A feiticeira aborda a vida de uma bruxa, Samantha, que decide se casar com um homem mortal comum, Darrin, e jura levar a vida de uma típica dona de casa suburbana. Extremamente popular, foi o segundo programa de maior audiência nos Estados Unidos durante sua temporada de estreia, da qual vem este episódio. Nele, Darrin fica de cama por conta de uma torção no tornozelo, e Samantha sugere que seu amado use seus poderes, dando-lhe um gostinho de como é ser feiticeiro.

Este é o episódio 17 da primeira temporada e foi ao ar em 14 de janeiro de 1965. Ele pode ser assistido independentemente do restante da série.

Uma terceira criatura: o cinema de Ruchir Joshi

A iniciativa Mutual Films destaca a obra do cineasta, escritor e fotógrafo indiano Ruchir Joshi (que nasceu em Calcutá em 1960). Joshi chama seu cinema de “uma terceira criatura” –nem ficção, nem documentário tradicional, mas uma não ficção que trilha seu próprio caminho em diálogo com os trabalhos e pensamentos de outros artistas. O programa que passará no IMS Poços conta com dois filmes de Joshi que foram rodados em 16 mm e lançados no início da década de 1990, e que serão apresentados em novas restaurações digitais. O curta-metragem Memórias da cidade do leite (1991) explora a cidade de Amedabade com um olhar poético, em parceria com o dramaturgo Madhu Rye, e o filme-ensaio de média-metragem Contos do planeta Kolkata (1993) – feito em colaboração com o artista norte-americano Tony Cokes, entre outros – cria um jogo de espelhos entre a metrópole indiana do título e suas representações difamatórias na mídia ocidental. A sessão também inclui uma versão remasterizada do curto retrato da cidade de Bombaim Chegada (1980), do grande cineasta indiano Mani Kaul, uma referência-chave para Joshi em sua busca cinematográfica por formas únicas.

Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

Amedabade, Bombaim, Calcutá

(3 filmes, 74 min)

O programa de três filmes passa pelas ruas de três cidades indianas, cada uma com suas particularidades. E assim reflete um deslocamento feito pela família de Ruchir Joshi, cujos pais migraram de Amedabade, no estado de Gujarate, para Calcutá antes de seu nascimento. Em um texto escrito para o WdW Review em 2015, o cineasta e escritor Ruchir lembra da viagem anual feita durante sua infância para o outro lado do país para visitar seus parentes gujaratis, com a cidade de Bombaim se inserindo no caminho: “Os contrastes entre Calcutá, Bombaim e Amedabade eram enormes. Calcutá era tropical, superpopulosa, decrépita, com a sensação de que em todo lugar coisas e sistemas quebravam... Bombaim era tropical, superpopulosa e assustadora: as coisas funcionavam, mas a um ritmo feroz e surreal... Amedabade, entretanto, parecia ser completamente desconectada das tensões que torturavam as duas cidades grandes. As pessoas eram relaxadas, calorosas e generosas, e até seu humor era gentil.”¹

Memórias da cidade do leite apresenta cenas de Amedabade (filmadas por Ruchir e Ranjan Palit), com texto e narração do dramaturgo gujarati Madhu Rye, que casa versos rimados de uma peça de rádio da década de 1960 com um texto autobiográfico. Inúmeras vacas nos guiam pelas ruas de uma cidade popular e simples, com aspecto pacato, enquanto ouvimos sobre um processo rápido de modernização e americanização que atinge os habitantes. Os rebanhos de animais compartilham as praças com bancas de comida de rua e um fluxo constante de motocicletas. Acompanhando os momentos lúdicos, há um tom sombrio que aponta para a história de violência

e opressão na cidade contra a minoria muçulmana. Enquanto crianças, mulheres e homens brincam, comem e se divertem à noite, Rye fala de “Amedabade... Onde basta uma folha cair para incitar rebeliões religiosas”.

A Bombaim percorrida por Mani Kaul em Chegada é também uma cidade de contradições. Embora Kaul seja mais conhecido por dirigir obras-primas narrativas do movimento de Cinema Paralelo indiano, como Uski Roti (1970) e Duvidha (1973), ele também fez documentários majestosos, nos quais sua liberdade formal driblou as restrições da obra comissionada. As imagens de Chegada (embaladas pela trilha sonora do renomado compositor clássico indiano Raghunath Seth) descrevem, quase sem diálogos, a variedade dos trabalhos precários oferecidos aos mais pobres. Operários da construção civil sobem de chinelo, sem capacete, num elevador estruturado por finas toras de madeira. Trabalhadoras carregam bacias de pedras nas cabeças. Centenas de pessoas dormem no chão de uma estação de trem. As variedades das comidas são ao mesmo tempo produtos de labor e ocasiões para descanso de pessoas que olham para a câmera com expressões marcantes.

Em Contos do planeta Kolkata, Joshi (um artista influenciado por Kaul) coloca sua cidade nativa na tela com o intuito de questionar a maneira como o cinema e a mídia ocidentais a percebem – por exemplo, na exploração da miséria por Louis Malle no documentário Calcutá (Calcutta, 1969), parodiado pela interpretação de Ruchir de um cineasta francês em busca da “câmera impossível”, e na superficialidade hollywoodiana de A cidade de esperança (City of Joy, 1992), cujas filSessão

magens com Patrick Swayze e um grande elenco são captadas ao lado das reações de habitantes de Calcutá, que não se reconhecem na história. O filme também apresenta outras narrativas possíveis, como em uma cena no qual o videoartista norte-americano Tony Cokes, cuja obra descontrói o racismo latente na mídia de seu país, aparece conduzindo um riquixá e encara o público para declarar que “parece haver uma indústria do medo do outro lado da câmera... Imagens familiares de Calcutá parecem existir para que o espectador ocidental se sinta mais confortável, mais humano e talvez até mais sortudo do que ele realmente é.” E há a vontade melancólica narrada por Ruchir de fazer um filme sobre a cidade com seu mentor Deepak Majumdar, um pesquisador e músico que morreu logo antes do começo do projeto a que estamos assistindo. A Calcutá do filme é uma e muitas cidades, aqui vista por alguém em busca de seu encantamento.

[O texto “Ahmedabad Mutations” pode ser encontrado em inglês através do link tinyurl.com/ ruchirsmf. Um outro texto marcante de Ruchir Joshi sobre sua história familiar, “Tracing Puppa”, pode ser conferido em inglês através do link granta.com/tracing-puppa/.]

Memóriasdacidadedoleite

MemoriesofMilkCity RuchirJoshi|Índia|1991,14’,Arquivo digital(Arsenal)

Chegada

Arrival

ManiKaul|Índia|1980,20’,Arquivodigital (AshishRajadhyaksha+NationalFilm DevelopmentCorporationofIndia)

ContosdoplanetaKolkata

(TalesfromPlanetKolkata) RuchirJoshi|Índia|1993,40’,Arquivo digital(Arsenal)

Instituto Moreira Salles

Cinema

Coordenador | Curador

Kleber Mendonça Filho

Supervisora de curadoria e programação

Marcia Vaz

Programador adjunto

Thiago Gallego

Produtora de programação

Quesia do Carmo

Assistente de programação

Lucas Gonçalves de Souza

Projeção

Fagner Andrades e Gilmar Tavares

Revista de Cinema IMS

Produção de textos e edição

Thiago Gallego e Marcia Vaz

Diagramação

Marcela Souza e Taiane Brito

Revisão

Flávio Cintra do Amaral e Juliana Travassos

A programação do mês tem apoio de Arsenal – Institut für Film und Videokunst e.V., National Film Development Corporation of India e das distribuidoras Beta Cinema, Bretz Filmes, BV Licenciamento Audiovisual, Descoloniza, Egeda Brasil, Embaúba Filmes, O2 Play, Olhar Filmes, Retrato Filmes, Sony Pictures e Vitrine Filmes.

Agradecemos a Aaron Cutler, Alexander Boldt, Anna Laura Melo, Antje Ehmann, Argel Medeiros, Ashish Rajadhyaksha, Cosima Pourroy, Courtisane Festival, Elaine Vegnaduzzi, Essay Film Festival, Fernando Motoryn, Gesa Knolle, Ibirá Machado, Karen Lima, Luiz Ernesto Bretz, Mariana Shellard, Markus Ruff, Michael Temple, Natália Meira, Ruchir Joshi, Samuel Ferreira, Shambhavi Kaul, Stoffel Debuysere e Tamara Ganhito.

Sessão Mutual Films

Realização: Cinema do IMS

Curadoria e produção: Aaron Cutler e Mariana Shellard

Venda de ingressos

Ingressos à venda pelo site ingresso.com e na bilheteria do centro cultural, para sessões do mesmo dia. No ingresso.com, a venda é mensal, e os ingressos são liberados no primeiro dia do mês. Ingressos e senhas sujeitos à lotação da sala. Capacidade da sala: 85 lugares.

Meia-entrada

Com apresentação de documentos comprobatórios para professores da rede pública e privada, estudantes, crianças de 3 a 12 anos, pessoas com deficiência, portadores de Identidade Jovem, maiores de 60 anos e titulares do cartão Itaú (crédito ou débito).

Devolução de ingressos

Em casos de cancelamento de sessões por problemas técnicos e por falta de energia elétrica, os ingressos serão devolvidos. A devolução de entradas adquiridas pelo ingresso.com será feita pelo site Programa sujeito a alterações. Eventuais mudanças serão informadas no site ims.com.br e no Instagram @imoreirasalles. Confira as classificações indicativas no site do IMS.

Tijolo por tijolo, de Victória Álvares e Quentin Delaroche

Visitação: terça a sexta, das 13h às 19h. Sábados e domingos, das 9h às 19h.

Entrada gratuita.

Sessões de cinema: Quinta a domingo.

Rua Teresópolis, 90 CEP 37701-058

Cristiano OsórioPoços de Caldas ims.pc@ims.com.br

ims.com.br /institutomoreirasalles @imoreirasalles @imoreirasalles /imoreirasalles /institutomoreirasalles

Chegada (Arrival), de Mani Kaul

Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.
Cinema do IMS Poços, agosto de 2025 by Instituto Moreira Salles - Issuu