A História de Outeiro, antigo concelho fronteiriço que integrou a linha de defesa e consolidação do reino, é vasta e merece ser destacada. O valioso património edificado, memória de gerações passadas, valia importante da actual e futuras gerações, permanece como testemunho duradouro, que resiste ao despovoamento desta terra, assente num passado feito de momentos devastadores e, também, de glória. O Núcleo Museológico, instalado no pequeno espaço da antiga cadeia, servirá como espaço de reflexão, encaminhamento e descoberta de memórias, da história e identidade do povo bragançano que ao país deu ao longo de séculos, contributos únicos, sacrificando vidas e gerações na estruturação e defesa da fronteira com o reino vizinho, deu os seus melhores talentos humanos para desenvolver outras parcelas do território continental e do Império. Como recompensa estes territórios têm sido votados ao esquecimento, por isso a escola fechou há vários anos, os mais novos partiram, os campos ficam abandonados, a relação de harmonia entre o Homem e a natureza vai-se quebrando. É preciso que os homens e mulheres de cultura saibam que o país tem uma dívida histórica por saldar para com o povo transmontano. Outeiro é um exemplo bem evidente do que tem sido o centralismo nefasto sobre estas terras que resistem, preservando valores e tradições essenciais à identidade que nos diferencia num mundo cada dia mais globalizado.
ANTÓNIO JORGE NUNES, ENG.º PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE BRAGANÇA NÚCLEO MUSEOLÓGICO, OUTEIROIGREJA MATRIZ
CASA DA CÂMARA
PELOURINHO DO OUTEIRO
IGREJA DE SANTO CRISTO DE OUTEIRO
CRUZEIRO DE OUTEIRO
FORTALEZA DE OUTEIRO / CASTELO DE OUTEIRO
CAMINHO ROMANO
SÚMULA HISTÓRICA DE OUTEIRO
Outeiro, freguesia do concelho de Bragança, tem 40,85 km2 de área e é formada pelos lugares de Outeiro e Paradinha. Abrange uma área de planalto, encontrando-se situada a 1km do monte de Outeiro, com 789 metros de altitude, e a, aproximadamente, 2 quilómetros a Oeste da margem direita do rio Maçãs e 4,7km a Este da margem esquerda do rio Sabor. Dista da capital concelhia cerca de 30km.
Foi vila e sede de concelho entre 1514 e 1853. Várias foram as freguesias que o constituíram, nomeadamente, Milhão, Outeiro, Quintanilha, Rio Frio, Argozelo, Carção, Pinelo, Santulhão, Paço, Paradinha de Outeiro e Veigas. Com as reformas administrativas do início do liberalismo, foram-lhe anexadas as freguesias de Angueira e Avelanoso.
Pelo Decreto de 31 de Dezembro de 1853 passou para o concelho de Bragança. Em 1801 contava com 4302 habitantes, em 2001 com 367, segundo dados dos Censos.
Foram vários os topónimos que designaram esta povoação, como, por exemplo, Santa Maria de Outeiro e, segundo o Foral que D. Manuel lhe concedeu em 1514, já se teria designado Outeiro de Asnas e, nessa época, denominar-se-ia Outeiro de Miranda.
Em época Medieval integrou o domínio dos monges de Castro de Avelãs. Prova disso é a Carta de Povoamento1, datada de 8 de Janeiro de 1270, que Frei Frutuoso, Abade do Mosteiro de Castro de Avelãs, passou, com autorização de D. Martinho, arcebispo de Braga. Na verdade, grandes foram os privilégios atribuídos aos povoadores para que aí se fixassem.
De acordo com José Peixoto Pinto da Mota2, D. Dinis terá atribuído o primeiro foral a Outeiro, a 7 de Dezembro de 1290, à então aldeia de Outeiro de “Muas”, que se unia à de Outeiro de Miranda. Além da obrigação de prestar serviço militar, o foral concede à localidade autonomia administrativa.
A sua posição geoestratégica, reconhecida por diversos monarcas, valeu-lhe ser palco de sucessivos confrontos bélicos, nomeadamente nas guerras que opuseram D. Fernando I de Portugal a D. Henrique de Castela, nos acareamentos resultantes da aclamação do Mestre de Aviz, D. João I, já que, segundo Fernão Lopes3, Outeiro tomou voz pelo lado Castelhano, e na Guerra de 1640, aquando da aclamação de D. João IV, momento em que a vila foi destruída e os seus habitantes se refugiaram no castelo.
A base da sua economia é a agricultura, destacando-se a olivicultura. A importância desta actividade para o sustento da população transparece nas Actas das Sessões de Câmara que fazem referência, por exemplo, às vindimas nas diferentes freguesias, à plantação de oliveiras, castanheiros e amoreiras, por serem próprias para o clima, e à criação de animais bovinos e caprinos. Facto curioso é que a Câmara, em reunião de 24 de Junho de 18474, suspende as reuniões até 1 de Agosto, em virtude do muito trabalho que as colheitas implicavam. Importante é, sem dúvida, a paisagem natural em que se insere, tal como o seu património edificado, tendo diferentes monumentos classificados.
1. ADBGC – Colecção de Pergaminhos, Doc. 003 P.
2. “A identidade de algumas aldeias transmontanas: subsídio para o seu estudo. 2 - Outeiro”. Brigantia, Vol XXIV (3 /4) – Vol XXV (1/ 2). Bragança (2004 – 2005) pp. 59-80.
3. LOPES, Fernão – Crónica de D. João I.
4. Actas das Sessões, Câmara Municipal do Concelho de Outeiro.
ROSA MARIA CADIME
CÂMARA MUNICIPAL DE BRAGANÇA
IGREJA DE SANTO CRISTO DE OUTEIRO
Edificio classificado como Monumento Nacional, pelo Decreto 14 615 de 24-11-1927, é sede da Confraria com o mesmo nome.
É um templo do Século XVII, cuja construção estará associada à necessidade de afirmação do país enquanto nação independente de Espanha.
Na sua origem estará um pequeno templo, votado ao abandono, até que, conforme inscrição existente na igreja de 26 de Abril de 1698, se terá dado o milagre do Santo Cristo ter suado sangue: “Nesta capela suou sangue o Santo Xto a 26 de Abril de 1698 e se reedificou Anno de 1755”. Depressa se espalhou a notícia e a primeira pedra para um Santuário foi lançada em 1698. No entanto, foi entre 1725 e 1739, com D. João V, que terá atingido o auge da construção e assume, precisamente no século XVIII, importância enquanto lugar de peregrinação.
Desconhece-se o autor do projecto, sabendo-se, no entanto, que terão aí trabalhado vários mestres pedreiros de origem galega e leonesa. O edifício é composto por templo com planta em cruz latina (nave única, transepto e capela-mor), sacristia e casa de arrumações.
Merece um olhar especial a fachada principal. Esta é ladeada por duas torres, de planta quadrada, com cunhais e sineiras almofadadas, divididas em quatro registos de diferente dimensão por friso e cornijas, e cobertas em pirâmide revestida a telha. O corpo central, em cantaria, e rematado por uma balaustrada que une as duas torres, organiza-se em função do portal mainelado (ao qual falta o mainel), a que se sobrepõe um óculo decorado, ambos de tipologia manuelina. Ladeiam estes
elementos duas colunas dóricas, continuadas por colunas torsas, que enquadram nichos de frontão interrompido.
Os alçados laterais N. e S., ritmados por pilastras coroadas por pináculos sobre os telhados, mostram uma galilé de três tramos com abóbada de nervuras. Cada tramo ostenta uma janela de feição diferente. O interior apresenta a nave principal de arco abatido e as laterais com arcos rampantes. Sobre eles foram feitas cruzarias de ogivas. A zona do arco cruzeiro apresenta abóbada de tipo anelar com falsos nervos. O coro-alto é sustentado por pilastras. O último tramo apresenta uma pia baptismal e dois altares em talha, sendo um deles dedicado ao Sagrado Coração de Jesus. O altar principal é ligeiramente peraltado e ricamente decorado com talha dos inícios de setecentos. Destaca-se o retábulo da capela-mor que estranhamente se recurva, na boca da tribuna, em jeitos de cortina túrgida e naturalista de recorte “manuelino” . 5
A sacristia tem o tecto apainelado com três dezenas de caixotões, pintados com cenas da vida de Cristo e executados por Damião Bustamante, oriundo de Valladolid, em 1768, e paredes igualmente revestidas de pintura sobre tela.
No largo fronteiro à igreja ergue-se o Cruzeiro.
5. In www.ippar.pt/patrimonio/patrimonio.html.
CRUZEIRO DE OUTEIRO
Classificado pelo Decreto 40 361 de 20-10-1955 como Imóvel de Interesse Público, remontará ao Século XVII. Sobre cinco degraus ergue-se uma base de secção quadrangular, com molduras em todas as faces decoradas com rosetas. O fuste, de secção circular, é estriado no seu primeiro terço, fazendo lembrar uma flor de lótus. Os restantes dois terços ostentam decoração em forma de escama de peixe. O conjunto é coroado por capitel coríntio que suporta uma cruz com Cristo.
FORTALEZA DE OUTEIRO / CASTELO DE OUTEIRO
A Fortaleza de Outeiro, também conhecida por Castelo de Outeiro, situase no topo do cabeço de Outeiro à cota de 812 metros e foi classificada como Imóvel de Interesse Público pelo Decreto 40 361 de 20 – 10 - 1955. A sua construção será da Idade Média, com grande probabilidade, da época de D. Dinis, como atesta a planta ovalada irregular do seu perímetro amuralhado, característico das vilas novas proto-urbanas de Trás-os-Montes e Alto Douro, nos séculos XIII e XIV. Tal facto é questionado pelo Abade de Baçal, que recorre a um documento, datado de 28 de Agosto de 13556, no qual os moradores de Outeiro pediam ao rei “que mandasse cercar e fazer vila cercada no dito logo d’Outeyro”, pretensão não atendida depois de ouvidos os procuradores de Bragança e Miranda do Douro. Contudo, em 1438 o castelo já
existia, como comprova a Carta de D. Afonso V que doava a D. Afonso, Duque de Bragança e Conde de Barcelos, a então vila de Bragança e seu castelo, juntamente com o de Outeiro7.
Os seus vestígios mostram restos de construções rectilíneas, uma espessa muralha, onde foi implantado o marco geodésico, e, a norte, uma barbacã de forma ovulada e a S. um baluarte.
Os desenhos de Duarte d’ Armas8 revelam uma torre de menagem rectangular, aparentemente adossada a uma das portas, uma extensa barbacã em forma de “D”, e “diversos elementos defensivos, como os hurdícios, ou balcões com matacães, e as troneiras, que protegiam as portas, inscritas nas próprias torres”.9
Apesar dos poucos vestígios que restam da sua grandeza, certo é que
teve um papel preponderante na história de Portugal. Ficou marcada pelo assalto de D. João I, que a devastou e, mais tarde, patrocinou a reconstrução das suas muralhas e até o seu alargamento. A decadência do castelo inicia-se com D. Manuel, pois, com o Foral de 1514, a população transfere-se do castelo para o vale.
6. ALVES; Francisco Manuel – Memórias Arqueológico – Históricas do Distrito de Bragança, Tomo III, pp. 128-130, Doc. 61.
7. Idem – p. 173, Doc. 80.
8. DUARTE, d’Armas – Livro das Fortalezas, 1509.
9. In www.ippar.pt/patrimonio/patrimonio.html.
PELOURINHO DO OUTEIRO
Classificado como Imóvel de Interesse Público pelo Decreto 23 122 de 11-10-1933, possivelmente terá sido erguido na época em que Outeiro recebe o Foral Manuelino (1514), já que, pela sua localização, junto à antiga cadeia, marcaria o centro cívico da população.
De acordo com a tipologia de Luís Chaves10, o pelourinho de Outeiro integra o tipo Bragançano. Ergue-se sobre um escadório de quatro degraus, hoje parcialmente coberto. Sobre uma base oitavada, elevase o fuste de secção octogonal, animado por flores alinhadas em faces alternadas, terminando em dois anéis. Estes precedem o capitel em cruz grega, de cujos braços se projectavam ferros em forma de S. O remate, de secção quadrada, exibe decoração variada nas suas faces. Numa surgem as armas de Portugal e, na outra, uma figura eclesiástica de báculo na mão e nimbo (?) na cabeça e com outra ajoelhada a seus pés, um cavaleiro com espada e um capacete partido. O Abade de Baçal questiona se não poderíamos ter aqui uma referência ao facto de Outeiro ter pertencido ao Mosteiro de Castro de Avelãs, passando, posteriormente, esta posse e rendas para os bispos e cabidos de Miranda. O bloco é coroado por um cilindro irregular rematado por meia esfera. Um apontamento, ainda, para o aro de ferro com argolas que se encontra no terço inferior do fuste.
10. CHAVES, Luis – Os Pelourinhos Portugueses.