ACERVO

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Revista Acervo

1ª EDIÇÃO

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ACERVO MUNDIAL


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Acervo Expediente

É com muita satisfação que apresentamos a vocês a primeira edição da revista Acervo. Resolvemos tornar essa edição especial abordando diferentes tipos de literatura de várias partes do mundo. Esperamos que vocês se divirtam com a leitura, e quem sabe até achem seus próximos livros favoritos,

Editora Miolo Redatores Luiz Rabelo Raquel Xavier Victoria Viana Vivian Seixas Maia Kemilly Toledo Daniela Prado Stefane Silva

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Projeto Gráfico Luiz Rabelo Victoria Viana Diagramação Luiz Rabelo Capa Vivian Seixas Maia

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Takehiko Inoue e Vagabond: O Mangaká que desenha com a alma Por: Luiz Rabelo

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akehiko Nariai mais conhecido como Takehiko Inoue, nascido em 12 de janeiro de 1967 em Okushi, é um dos autores mais ovacionados do Japão. Suas maiores obras são Slam Dunk e Vagabond, dois dos títulos mais vendidos da história dos mangás. Slam Dunk foi a sua primeira obra de sucesso e carrega uma essência juvenil que à primeira vista parece simples, mas esse mangá de basquete retrata a complexidade da mudança de vida de um delinquente juvenil japonês em um ávido jogador de basquete do seu colégio. A história se passa em uma escola que apresenta o esporte de forma didática, dinâmica e emocionante, comunicando-se muito com os desenhos. Os leitores de Inoue costumam dizer que é possível sentir o cansaço ou o estado mental dos personagens apenas com o desenho. Seu estilo de arte é realista, os desenhos de Slam Dunk mostram personagens ofegantes e suados, sendo perfeitamente representados nas páginas. Após o término de Slam Dunk em 1996, Inoue só voltará a escrever um mangá serializado em 1998 com sua inacabada obra prima Vagabond que veio com uma proposta completamente diferente do seu título anterior. Enquanto o Slam Dunk era um entretenimento mais otimista e trazia o

Slam Dunk Cápitulo 262

melhor do ser humano de uma forma bem mais simples, Vagabond era obscuro agresivo e filosófico.Vagabond é uma releitura do clássico Musashi, de Eiji Yoshikawa, que conta a história de vida de Shinmen Takezo e como ele vem a se tornar Miyamoto Musashi, conhecido no Japão como o maior samurai de todos os tempos. Atualmente Vagabond encontra-se em um hiato de 8 anos. Takehiko Inoue usa principalmente o pincel de caligrafia para desenhar Vagabond, esse instrumento, difícil de utilizar, proporciona um traço singular ao autor. Além de não permitir correções, todas as páginas que o mangaká faz é um “tudo ou nada” o que é impressionante, cada quadro das suas páginas carregam uma força descomunal, seu traço realista e expressões profundas proporcionam uma grande imersão na leitura. O mangá oscila 6


Japão bastante a atmosfera em seus 37 volumes lançados, inicialmente sendo muito mais “sujo”, agressivo e caótico e posteriormente mais límpido, calmo e reflexivo. Isso parece ser uma mudança abrupta e bagunçada, mas simplesmente se encaixa muito bem com a mente confusa do personagem principal que almeja ser o mais forte, trazendo discussões não só do porquê ser o mais forte, mas o que é ser o mais forte. Cada ato de Miyamoto Musashi tem uma consequência, tudo resulta em algo, seja mental ou fisicamente. No capítulo 26, o protagonista é atingido por uma katana, provocando um corte em sua testa e a cicatriz fica presente assim como muitas outras até o último capítulo lançado da obra. O último capítulo lançado de Vagabond foi o número 327 em 2014, desde então Takehiko Inoue segue sem publicar novos capítulos dessa sua obra, ele mesmo disse que não se sente pronto para continuar um título de tal magnitude. Para Inoue um capítulo só será publicado se ele estiver inteiramente

satisfeito, sua conexão com o trabalho é praticamente espiritual, pois nas suas próprias palavras ele explica: “minha qualidade de desenho é consequência do estado da minha alma”. A vida de um mangaká é insanamente desgastante, suas rotinas podem alcançar até 100 horas semanais, sempre tendo problemas com prazos e cobranças, sendo muito comum o adoecimento desses artistas. Takehiko Inoue não é uma exceção, apesar de Vagabond só ter sido interrompido uma vez, por questões de saúde do autor, o real motivo do longo hiato é que o autor quer desenhar, mas não sente vontade e, também, não se sente pronto. Como mencionado antes, a publicação de Vagabond depende da estabilidade emocional de Inoue. Sua produção é majoritariamente feita sozinho, normalmente em cafés onde ele observa a realidade das pessoas e em sua própria imersão consegue mergulhar na sua inspiração.

Vagabond Cápitulo 302

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Takehiko Inoue trabalhando em seu ecritório

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o mundo dos mangás existe um termo chamado “name” que funciona como o roteiro de um filme, é a etapa após o esboço, pois traça os quadros de todo o capítulo. O name é a alma do mangá e, para Takehiko a produção dessa etapa é pessoal, ele precisa entrar em um estado de meditação para concluir o name. “Eu uso o name para documentar o ritmo do texto, a atmosfera da cena, expressões faciais, o peso e a leveza de uma emoção” afirma o autor. Somente após a finalização dessa etapa, que é uma das últimas, o autor começa a trabalhar com os assistentes que normalmente finalizam os cenários e os detalhes da página após Inoue já ter desenhado a maior parte da página. Sua principal preocupação se relaciona com as expressões faciais e com os sentimentos que serão transmitidos. Para Takehiko Inoue seus personagens são como pessoas reais, e apesar de Vagabond ser uma adaptação, ele ainda é uma releitura de outro livro. Dessa forma, ele permite que os personagens se desenvolvam sozinhos, sem planejar muito anteriormente seus destinos. Para ele, os personagens perdem a humanidade quando suas ações são muito planejadas e, é por isso que Inoue precisa tanto se conectar com a

emoção dos personagens. A produção de Vagabond é algo inteiramente espiritual e até existencial, o autor enxerga que o atual hiato é como se fosse sua morte como artista, porém ele ainda não se sente pronto para retornar com a obra. Mesmo inacabado, Vagabond é considerado uma obra-prima e sempre será lembrado como um dos melhores mangás do Japão.

Takehiko Inoue em exposição do seu mangá Vagabond

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Antoine de Saint-Exupéry: de piloto a um dos maiores escritores literários na França Por:Raquel Xavier

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uerido leitor, te convido a imaginar comigo a seguinte história: você é uma criança talentosa, que logo em seus primeiros anos de vida, já tinha a habilidade de desenhar e pintar muito bem. Porém, em um determinado dia, ao apresentar um desenho para os seus pais, eles interpretam esse desenho de uma forma diferente da sua intenção, e isso causa um grande desapontamento. Então, passados alguns anos, você chega à idade adulta e precisa decidir sua profissão. Baseado em sua frustração de infância, você deixa de lado a oportunidade de iniciar sua carreira como pintor e decide se tornar um piloto de avião. Você se torna um excelente piloto, gosta do que faz, e também é muito reconhecido por isso, porém uma parte sua, sente-se triste por abandonar o seu sonho de criança. E então, imaginou? Essa história nada mais é, do que a lembrança de infância de Antoine de Saint-Exupéry, que está na obra “O Pequeno Príncipe”. Ele foi um piloto, ilustrador e escritor francês, que através do seu livro, deixou registrado na história, uma das obras mais traduzidas no mundo inteiro (traduzida em cerca de 250

idiomas, perdendo apenas para a Bíblia Sagrada), ela é também a obra literária francesa mais conhecida no mundo. Antoine encontrou em suas obras literárias, uma espécie de refúgio: desabafou sobre seu arrependimento por não ter seguido a carreira artística, compartilhou os acontecimentos como aviador no serviço militar e através de algumas simbologias, também falou sobre sua vida amorosa. No livro “O Pequeno Príncipe”, o autor é representado por um dos personagens principais, o aviador, que também faz o papel de narrador da história. Após seu avião cair no Deserto do Saara, enquanto tenta consertá-lo, ele encontra o pequeno príncipe, que vive em um asteroide e vem ao Planeta Terra em busca de um carneiro que possa comer as plantas que causam danos a sua terra natal. A partir desse encontro um tanto inesperado, o pequeno príncipe passa a compartilhar suas aventuras com o aviador. Ele havia passado por muitos outros planetas em busca de ajuda, e em cada um deles, encontrou um personagem diferente pertencente a história.

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França Ao lado, temos uma das cenas da última adaptação feita para os cinemas, uma animação brasileira, dirigida por Mark Osborne, em 2015. Existem no total, dezessete adaptações lançadas sobre a história do Pequeno Príncipe, sendo a primeira, lançada em 1966, na União Soviética.

Falando desse modo, para quem ainda não teve a oportunidade de ler essa obra, pode parecer algo um tanto simples e apenas voltado para o público infantil, e aí que você se engana. Ao longo da narrativa, o autor nos presenteia com uma serie de lições valiosas, com um teor filosófico e reflexivo a respeito da vida. Cada personagem encontrado pelo pequeno príncipe, possui um papel primordial na construção de significado e interpretação das lições que o autor nos traz.

Durante a leitura, entre as entrelinhas da narrativa, somos incentivados a não abrir mão dos nossos sonhos, a mantermos viva nossa criança interior, apreciarmos as coisas simples da vida e sairmos da nossa zona de conforto, entre outras muitas lições.

Antoine de Saint-Exupéry servindo ao Serviço Militar, no Regimento de Aviação de Estrasburgo. 11


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Colômbia

Quem é Gabo e como um latino-americano conquistou o mundo com a literatura nos anos 60 E como esse legado se manifesta na cultura pop até hoje Por Victoria Viana

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ncanto é uma animação da Disney, lançada em 2021 e ganhadora do Oscar de melhor animação em 2022. O filme é um musical de realismo fantástico e conta a história de uma família colombiana que vive em uma vila mágica. Todos os integrantes da família possuem poderes que utilizam para proteger a comunidade, menos a filha mais nova, que vivencia uma frustração existencial tentando impressionar a avó, e, depois, tentando salvar o vilarejo onde mora. Mas a matéria não é sobre Encanto. Para entender o porquê o texto começa dessa forma, precisamos voltar à Colômbia de 1927, mais precisamente ao munícipio de Aracataca, em Magdalena, na Costa do Caribe, onde nascia Gabriel García Márquez, ou Gabo, como ficou conhecido.

O escritor Gabriel García Márquez. Foto: Divulgação.

Em 1955, ao mesmo tempo em que trabalhava como repórter e crítico, lançou seu primeiro romance, A revoada (ou O enterro do diabo), em que nos apresenta a cidade fictícia de Macondo pela primeira vez.

Gabo passou a primeira infância com os avós em Aracataca, mas após o falecimento do avô, foi morar com seus pais na urbanizada Barranquila, capital do departamento do Atlântico e cidade que deixou e retornou diversas vezes. Aos 20 anos, mudou-se para a capital colombiana, Bogotá, para cursar direito, mas desistiu do curso e voltou a Barranquila para se dedicar ao jornalismo.

García Márquez trabalhou como jornalista na Europa e nos Estados Unidos, enquanto continuava a contribuir para a literatura latino-americana. Lançou cerca de 6 livros antes de publicar Cem anos de solidão – seu magnu opus –, em 1967, que internacionalizou seu nome e influenciou fortemente sua premiação com o prêmio Nobel da literatura, pelo conjunto da obra, em 1982. 13


Revista Acervo Cem anos de solidão é considerada uma das obras literárias mais importantes da língua hispânica e se passa, novamente, na fictícia e remota Macondo, cidade apresentada em seu primeiro livro e que foi baseada em Aracataca, onde o autor nasceu. O livro conta a história de sete gerações da família Buendía e da cidade que fundaram, onde a narrativa se desenrola. A trama explora os estigmas internos da família, mas, também, da comunidade isolada onde vivem.

Mike Kinsella (vocalista da banda American Football), em seu projeto solo Owen, escreveu a música The Sad Waltzes of Pietro Crespi (As valsas tristes de Pietro Crespi) baseada em Pietro Crespi, personagem músico, romântico e sentimental da obra. É aqui que voltamos à animação da Disney. Encanto partilha de diversas similaridades com Cem anos de solidão. Primeiro reconhecemos o apelo do parentesco e da comunidade. Temos uma matriarca importante nos dois enredos. A ambientação e a época em que as histórias se passam são muito próximas – um povoado afastado na Colômbia do início do século XX –. E, mais explicitamente, as borboletas amarelas que aparecem no filme são uma clara referência ao trabalho de Gabriel García Márquez. Esses são apenas alguns exemplos, assistindo ao filme conseguimos numerar várias outras referências ao livro.

A família Buendía se inicia a partir de Úrsula Iguarán – a matriarca que acompanhou todos os membros de todas as sete gerações e viveu cerca de 122 anos –, e José Arcandio Buendía – patriarca e fundador de Macondo, que acaba enlouquecendo. os Buendía são complexos, não apenas pela extensa linhagem, mas pelas características que partilham. Talvez por conta da precisão em apresentar a sucessão de acontecimentos Gabo tenha nos conquistado ao cruzar situações triviais como escândalos de corrupção, homicídios, extorsão e atos políticos com questões familiares.

Gabo se aposentou da escrita em 2009 e, em 2012, seu irmão, Jaime García Márquez, anunciou que o autor havia sido diagnosticado com um grau de demência e sofria de perca de memória. Em 2014 ele faleceu, vítima de uma pneumonia complicada pelo histórico de um câncer que teve nos anos 90.

Toda a profundidade da história a elevou ao patamar clássico em que se encontra e por isso é tão referenciada e inspirou tantos outros autores, além de existirem diversas obras de cultura popular baseadas na narrativa.

Mesmo após sua partida, o legado de Gabo continua. Seu trabalho é aclamado e a herança que deixou se perpetuará através de cada um que for tocado diretamente por um trecho de suas obras ou por alguma interpretação presente em tantas obras inspiradas pelo colombiano que levou a literatura da América do Sul ao mundo inteiro.

O texto de Cem anos de solidão foi influente na obra de diversos artistas. Existem composições que denunciam episódios políticos sob uma perspectiva baseada na narrativa. Por exemplo, a música Banana Co, da banda britânica Radio Head, que critica a exploração e o desmatamento das terras da América do Sul por grandes empresas para a plantação de bananas. 14


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Lee Min Jin e a história coreana sob lentes femininas Como o romance de Lee Min Jin, em meio a tramas familiares e salões de pachinko, criou novos parâmetros de conhecimento dos traumas enfrentados por imigrantes coreanos. POR VÍVIAN SEIXAS MAIA

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o ano de 2017, a escritora Lee Min Jin lança seu maior sucesso literário até então, o épico coreano Pachinko e mostra para o mundo que a história de seu país de origem é muito mais complexa do que muitos pensavtam. Com sua obra Lee bota em evidência a força feminina e os traumas pessoais de uma família, que acabam sendo também os traumas de uma nação. Nascida em 1968 na cidade de Seoul, Min Jin e sua família se mudam para os Estados Unidos em 1976, quando ela tinha apenas sete anos. Quando mais nova, a autora estudou na escola preparatória Bronx High School Of Science, e mais

Fragmento da capa de Pachinko (2017), publicado pela editora Intrinseca em 2020.

tarde desenvolveu seu amor pela leitura ao ter sua primeira aula de escrita de não ficção quando cursou história em Yale. Em uma entrevista para o site Wbur, Lee afirma que sua experiência como imigrante coreana nos Estados Unidos, principalmente em seus anos escolares, influenciou de forma exponencial sua carreira literária. Seu primeiro livro, Free Food For Millionaires (sem tradução para o português), e Pachinko demonstram isso ao terem como temas centrais imigração, raça e pátria. A trama de Pachinko gira em torno de Sunja, a personagem principal do livro. Filha da dona de uma pequena estalagem na cidade costeira e hoje

Sunja (Yuh-Jung Youn), protagonista da trama de Min Jin, na série lançada em 2022 pela AppleTV+

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Coreia Do Sul grande metrópole Busan, Sunja se apaixona por um forasteiro rico que visita sua cidade natal e, ao se envolver com ele, acaba engravidando. Porém, ao descobrir que o homem que amava já era casado no Japão, Sunja rejeita todas suas ofertas de estabilidade financeira e resolve salvar a reputação de sua família aceitando casar-se com o gentil pastor Isak. Junto com seu marido e seu futuro filho, a garota se muda para a cidade de Osaka no Japão e lá começa uma jornada marcada por intolerância, miséria, fé e superação que se desdobrará ao longo de gerações.

mantizações e mostra tanto os comportamentos a serem celebrados quanto as escolhas difíceis e questionáveis que são feitas em prol da sobrevivência. As mulheres retratadas no livro vão desde Sunja, uma jovem ingênua que em sua jornada se torna uma mulher calejada que faria de tudo pelos filhos, à Hana, filha da ex-esposa do filho de Sunja que faz todas as piores escolhas por não acreditar merecer um final feliz e acaba morrendo de AIDS ainda jovem. A variedade de faces femininas que Lee Min Jin escreve mostra também a diferença geracional de A grande força motriz da mulher para mulher, pois onde obra de Lee Min Jin Kyunghee, cunhase mostra no proda de Sunja, é conSerá que tanto tagonismo das ma- esforço vale a pena t i d a e m u i t a s v e z e s triarcas da família renuncia de sua quando a vida acaba de Sunja. Por abranprópria felicidade parecendo um jogo ger os anos de 1915 pessoal em prol do de Pachinko? a 1989, Pachinko faz marido, Emiko, exum excelente traba-namorada do neto lho ao mostrar a realidade de de Sunja, sempre toma decimulheres que nunca tiveram sões que a priorizam e não se nada a ganhar com nenhum deixa levar pelo que é considedos conflitos os quais foram rado certo pela sociedade. obrigadas a vivenciar. A auAlém da grande força femitora traz em Sunja o símbonina abordada na trama do lo de todas as mulheres que livro, Lee Min Jin explora a tiveram de sustentar sozirelação entre os imigrantes nhas uma família inteira em coreanos no Japão e as casas um lugar desconhecido onde de Pachinko, o famoso jogo nenhuma das fichas estava das máquinas caça-níqueis e a seu favor. As situações pepinballs. Segundo o jornal Jalas quais ela passa são menos pan Times em uma reportagem que ideais, porém Sunja segue de 2014, cerca de 80% dos esem frente com seu objetivo de tabelecimentos do jogo no país fazer com que sua família sosão comandados por imigranbreviva a rotina de um país tes coreanos e seus descendenequipado para expulsá-los. tes. Isso se mostrava verdadeiA realidade feminina retraro na representação das vidas tada pela autora foge de roda família de Sunja, sendo seu 17


Revista Acervo filho Mozasu uma representação de como imigrantes coreanos tinham maiores oportunidades dentro de casas de Pachinko do que na educação formal e em empregos em fábricas ou escritórios comuns. A relação entre Pachinko e o livro de Lee se expande quando se entende que esse jogo de azar não depende somente de sorte, mas também de destreza e habilidade. A vida de Sunja e seus descendentes é marcada por situações nas quais a personagem principal precisa muitas vezes se humilhar para que sua família continue prosperando. E apesar da necessidade de destreza por parte da família a sorte, sempre à espreita, define os próximos passos de Sunja, sejam eles positivos ou não. Esse cenário tecido por Lee leva à pergunta: será que tanto esforço vale a pena quando a vida acaba parecendo um jogo de Pachinko? Porém, um dos temas mais impactantes e importantes de Pachinko é a relação entre a obra e a realidade da história coreana. Em 1910, com o Tratado de Anexação da Coreia, o

país se tornou sujeito ao Império japonês e com isso houve uma grande diáspora de migrantes voluntários coreanos para o Japão em busca de melhores condições de vida e a família de Sunja e Isak é mais uma das que imigraram para o país fugindo da miséria. Por ter conexões no país, os dois conseguem uma casa em um dos guetos coreanos de Osaka, mas só isso não é o suficiente para excluir o casal e seus filhos da xenofobia e preconceito aos quais os imigrantes coreanos eram sujeitados. Lee Min Jin se utiliza da história dessa família comum para retratar a realidade coreana no Japão. Com seu idioma materno proibido, seus nomes trocados por nomes japoneses, o descaso das autoridades com sua condição de vida, e o fato de estarem sempre à margem da sociedade, os imigrantes coreanos dependiam de sua destreza e sorte para conseguir sobreviver no ambiente hostil do Japão. Nunca pertenceram à pátria japonesa, e os nativos do país faziam e fazem questão de relembrá-los

Os protagonistas, Sunja (Yuh-Jung Youn) e Isak (Noh Sang-Hyun), em uma das cenas iniciais da série da AppleTV+

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Coreia Do Sul disso até hoje, como é o caso da fotojornalista Natsuki Yasuda, que deu uma entrevista ao portal japonês Bushun Online relatando suas experiências pessoais com sua herança coreana por parte de pai e até onde ele foi para poupá-la do preconceito existente no país. A obra acaba sendo mais que uma história familiar e se torna um livro que fala sobre honra, sorte, pátria e sentimento de pertencimento de u m a n a ç ã o . A história de Sunja e d e s e u s d e s c e n d e n t e s representa o trauma d e t o d a u m a g e ração de pessoas que tiveram de se adaptar a situações as q u a i s elas nunca foram e q u i p a d a s p a r a e n t e n d e r , e tentar sobreviver mesmo com todas as dificuldades ativamente t e n t a n d o derrubá-los. A autora retrata com maestria os aspectos sentimentais da trama e honra a história com sua sensibilidad e e apreço pela história coreana.

A premiada autora Lee Min Jin, fotografada por Elena Seibert. Edição feita pela autora. 19


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Estados Unidos

Edgar Allan Poe e o Modernismo Por: Kemilly Toledo

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dgar Allan Poe possui um traço que o diferencia de forma decisiva de todos os outros escritores e constrói a sua peculiaridade marcante, a possibilidade de desenvolver a imaginação dos leitores e permitir que eles voem na riqueza de detalhes. Isso é a chave para todo o seu sucesso até hoje.

Poe esteve longe do heroísmo e do realismo, fazendo uma literatura que não era nem nacional nem popular. Na época foi considerado por muitos uma pessoa sem patriotismo, por não se comprometer politicamente com as políticas econômicas dos Estados Unidos. As suas narrativas não davam ênfase aos heróis da nação, contudo entendiam de fato a alma humana e enalteciam o que seria a representação mais fiel de sua época. Amores frágeis e trágicos, acompanharam Edgar desde sempre, moldando assim seu espírito “macabro” e doce que contemplamos em seus livros.

Mais conhecido como Homem da Machadinha, ele foi autor, poeta, editor e crítico literário, integrante do movimento romântico nos Estados Unidos no século XX. Teve uma vida repleta de percalços, gozando de poucos momentos de sucesso em sua breve carreira de escritor, mas hoje é considerado como uma das maiores influências literárias da história e foi criador do gênero policial.

Enquanto diversos poetas da época cantavam sobre a gloriosa nação, ele ficou preocupado em entender que tipo de ser humano essa sociedade iria formar e, por isso, encarnava essa questão em suas obras de forma fantasiosa. O autor explorava, assim, a contemporaneidade e os elementos da realidade como forma de entender o papel do homem.

Foi separado da irmã mais nova antes mesmo de completar três anos, quando foi entregue para a adoção sob tutela do casal Allan. Encontrou carinho em sua mãe adotiva e castigos físicos em seu pai adotivo, o escocês John Allan.

Ninguém jamais conseguiu descrever a complexidade da vida humana como Poe, que estabelecia não só a realidade, mas o descontrole, o espírito e a dor. Edgar não foi poeta de uma revolução, mas de uma época inteira da Modernidade, que ainda não teve fim.

Desde os primeiros anos de estudo, Edgar se familiarizou muito com os livros e cultivou o gosto pela poesia, desistindo de ser advogado ou militar e investindo no seu sonho de ser escritor. 21


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ILUSTRAÇÃO DE KELLYANN ROMAN

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A Persuasão de Jane Austen Por:Daniela Prado

“A senhorita me dilacera a alma, estou dividido entre esperança e agonia. “

desespero tomou conta de Austen, temia que tivesse inadvertidamente encorajado a garota a tomar esta decisão. Preocupada que a amada sobrinha não se mantivesse apaixonada por um muito tempo, Austen sentiu que era seu dever persuadi-la a não noivar, porém ao mesmo tempo, temia que sua influência pudesse ter terríveis consequências e arruinar a vida de Fanny.

E

sta é uma das mais emocionantes confissões da literatura, escrita em uma carta de Frederick Wentworth para Anne Elliot, carta por sua vez escrita pela autora Jane Austen em seu livro Persuasão. Ela começou a cria-lo pouco antes de adoecer e continuou a escreve-lo enquanto sua saúde deteriorava, sendo que a obra só foi publicada após sua morte.

E assim escreveu em uma carta a ela: “...Você não deve deixar nada depender de minha opinião. Os seus sentimentos e nenhum outro exceto os próprios devem determinar uma questão tão importante...”.

A trama da história reflete o conflito na vida da autora, Jane Austen estava na indesejável posição de persuadir sua sobrinha quanto ao romance dela. O livro Persuasão mostra como o papel de influenciadora é um fardo uma vez que a personagem Annie Elliot é requisitada a persuadir as pessoas, e como a persuasão pode ter consequências terríveis para aqueles que se deixam influenciar.

Com as emoções de sua vida pessoal e sua própria opinião sobre como a persuasão estava sendo usada pela sua sociedade para influenciar e ditar a vida das jovens. Jane Austen tomou a pena em suas mãos e escreveu a história de Anne Elliot, uma baronete apaixonada por Frederick Wentworth e se deixou persuadir por sua estimada amiga e conselheira Lady Russel a terminar o noivado.

A sobrinha de Austen, Fanny Knight, estava apaixonada por um moço e a tia disse que aprovava ele. Bem, talvez ela tenha dito sobre o caráter do jovem, a questão é que quando Fanny anunciou um longo noivado com ele o 24


Inglaterra Lady Russel não aprovava o noivado por Frederick ser pobre e não ter relações que dessem estabilidade financeira caso eles se casassem, mas ela não é com o Senhor Darcy em “Orgulho e Preconceito”, suas ações não provêm de elitismo e desdém. Lady Russel tinha respeito pelo jovem e reconhecia suas virtudes, mas Lady Russel era viúva, em uma era onde as mulheres eram completamente dependentes de seus maridos e pais para se sustentarem. A senhora não desejava que Anne sofresse com uma vida difícil e instável como a experiência que viveu após a morte do marido. A tava Anne e com

Retrato da Jane Austen Adaptação da aquarela de Cassandra Austen, irmã da Jane Austen.

senhora também acredique os sentimentos de eram apenas uma “crush” que sua amiga superaria o tempo e amadurecimento.

Agora seu ex retornou como Capitão e está amargurado pelo término e as circunstâncias fazem com que os dois tenham que socializar cordialmente, coisa difícil para a moça que sofre com seus sentimentos perto dele.

podem vir a prejudicar o influenciado, mesmo com as melhores intenções Estava Lady Russel certa com seu conselho a Anne? Estava a moça errada em se deixar persuadir? Isto é o que livro discute.

Anne também é um excelente persuasora, e considerada sensata, logo vários outros personagens pedem a ela que use suas habilidades para convencer as pessoas. E através disto que o livro discute a questão moral de influenciar as pessoas, especialmente quando as consequências de tais atos

Bem, para nós leitores a decisão foi a certa, caso o contrário não existiria a história de Persuasão!

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DAS PÁGINAS

Por:Stefane Silva

A

s palavras constroem uma história, que pode virar um

roteiro, que compõe cenas e acabam sendo traduzidas nas telas. Com as adaptações dos livros favoritos da estante para o cinema/streaming, é

2020, Crime, Suspense 1 TEMPORADA

possível experimentar e aproveitar outros espaços além da imaginação para as aventuras, medos e angústias.

Assistir

Aterrissando em solo Brasileiro, Netflix

chega

adaptando

o

livro

contra mulheres após ela presenciar

policial “Bom dia, Verônica” lançado

uma cena chocante de suicídio.

em 2016 e escrito pela criminologista

A série brasileira se destacou na pla-

Ilana Casoy e por Raphael Montes. O

taforma, a trama de suspense bem tra-

roteiro da série foi produzido pelos

balhada consegue deixar o espectador

próprios escritores do livro, mantendo

sempre ansioso para o próximo epi-

a obra na Netflix muito fiel ao material

sódio, instigando-o até compreender

original. Acompanhamos a jornada de

o desfecho da história. Cada episódio

Verônica Torres, escrivã da Delegacia

se desdobra em um novo clímax eletri-

de Homicídios que se envolve em

zante e extremamente tenso e pesado.

investigações muito além da sua alçada

“Bom dia, Verônica” (Netflix, 2020),

e decide rever dois casos de agressão

em sua primeira temporada apresen-

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PARA AS TELAS

Brasil

tou apenas oito episódios, aperte o play e já comece a maratonar. Outra dica para colocar na sua lista, “Bom dia, Verônica” não é a único trabalho de Raphael e Ilana nos stremings. A colaboração mais recente da 2021/ 1h 20 min Drama, Crime, Suspense

dupla para as telas foram os filmes “O menino que matou meus pais” (Prime Assistir

Video, 2021) e “A menina que matou os pais” (Prime Video, 2021). Eles fizeram um trabalho cirúrgico transformando o tribunal do caso Suzane Richthofen em um roteiro impecável.

2021/ 1h 20 min Drama, Crime, Suspense

Escanei o QRCode e envie indicações para que a sua adaptação favorita apareça aquis.

Assistir

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Querido leitor! Nós, da Revista Acervo, gostaríamos de agradecer pela sua preferência. Muito obrigado(a) por “viajar” conosco pela literatura ao redor do mundo. Também amamos esse tema! Buscamos ao máximo, trazer um conteúdo que possa enriquecer ainda mais o seu conhecimento, de uma forma leve e descontraída, através de matérias com uma linguagem de fácil compreensão, além de trazer curiosidades muito interessantes sobre cada autor abordado nessa edição. Nos manteremos cada vez mais empenhados em nosso trabalho, para que possamos garantir, um conteúdo de qualidade a todos vocês. Esperamos que vocês tenham tido uma ótima experiência conosco e contamos com você para próximas edições, viu? Se tiver quaisquer sugestões, por favor, não deixe de compartilhar conosco! Grande abraço,

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www.planetadeagostini.com.br 32


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