Pepitas brasileiras - Do Rio de Janeiro ao Maranhão, uma viagem de 5.000 quilômetros em busca dos he

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Dia 1º de janeiro de 2011. Na virada do ano, Leuk e Leão,

O TRADUTOR: Fernando Scheibe é doutor

em Teoria Literária e traduziu, entre outros autores, César Aira, Stéphane Mallarmé, Mœbius, Raymond Roussel, Michel Foucault, Arlette Farge, Georges DidiHuberman, Marcel Detienne, Catherine Malabou e, sobretudo, Georges Bataille.

Pepitas brasileiras

escritores e etnólogos, recebem um e-mail em forma de desafio: o retrato de pele negra que olha para eles da tela é o de Luzia, reconstituído a partir de um crânio encontrado em terras brasileiras. Uma mulher negroide, no “Novo Mundo”, cerca de treze mil anos atrás?! A surpresa e a excitação logo despertam seu instinto de investigadores: e lá vão eles se lançar em uma viagem de cinco mil quilômetros, de ônibus, Brasil afora e adentro, do Rio de Janeiro a São Luís do Maranhão. Ágil e rigorosa, a narrativa de sua jornada desvela fascinantes complementos à história oficial, que esquece tantos e tanto: os homens e as mulheres que encontram têm em comum o fato de serem negros, descendentes de pessoas escravizadas; de terem participado, com sua coragem, criatividade e resistência, da construção da(s) identidade(s) e da(s) alma(s) brasileira(s); e de terem ficado na sombra, ou à margem. Um taumaturgo siciliano (São Benedito), a santa da máscara de flandres (a escrava Anastácia), um boxeador campeão de arte bruta (Arthur Bispo do Rosário), o advogado das quinhentas vitórias (Luís Gama), um escultor de cabeças de açúcar (Caetano Dias), a rainha literária das favelas (Carolina Maria de Jesus), o vencedor da fome (Beato José Lourenço), o dragão dos mares (Francisco José do Nascimento) e o imperador das liberdades (Negro Cosme) são algumas das personalidades excepcionais evocadas por Jean-Yves Loude. Cintilantes pepitas de ouro negro nas águas tantas vezes lamacentas da história brasileira.

Jean-Yves Loude

JEAN-YVES LOUDE, escritor e etnólogo francês, consagra a maior parte de sua criação ao mundo lusófono. Seus livros são investigações sobre as memórias reprimidas da África: Le roi d’Afrique et la reine mer (O rei da África e a rainha-mar, 1994); Cabo Verde: notas atlânticas (1999); Lisboa na cidade negra (2003) e Coup de théâtre à São Tomé (Golpe teatral em São Tomé, 2007). Cada uma dessas narrativas funciona como um romance policial em que se investiga o apagamento, nunca inocente, de uma memória, e se revelam facetas surpreendentes da história. Sobre o Brasil, publicou também Planète Brasília (Planeta Brasília, 2008).

“Há uma coisa de que o Brasil sofre

Pepitas brasileiras Do Rio de Janeiro ao Maranhão, uma viagem de 5.000 quilômetros em busca dos heróis negros do país

ISBN 978-85-513-0077-0 ISBN 978-85-513-0077-0

9 788551 300770

Jean-Yves Loude

ainda hoje: a persistência de preconceitos ligados à evocação do país, clichês fabricados em grande parte pelo cinema, pela televisão e pela indústria turística e que sobrevivem graças à preguiça intelectual. Uma visão tacanha que irrita aqueles que se recusam a ver o gênio plural do Brasil, mestiço, efervescente, em perpétua criação, reduzido à simples evocação de Copacabana, do futebol, das novelas, da violência, do tráfico, do Carnaval e da coisificação do corpo feminino. No entanto, mesmo dissimulados por esse espesso véu de maia, sobrevivem há muito tempo no Brasil infinitos talentos populares, contidos na palavra figuras, sinônimo de personalidades peculiares, muitas vezes encantadoras. Vivos ou mortos, esses poetas dos recônditos, músicos, dançarinos, artesãos, filósofos analfabetos, tradutores dos deuses, deixaram e deixam rastros preciosos, ainda que suas criações permaneçam muitas vezes pouco visíveis, não gozem de reconhecimento. É preciso sair em busca dessas marcas, rastros, passagens, recônditos, resistências. Em busca dos construtores anônimos da realidade brasileira...


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