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24 Horas de Le Mans, 1969

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Pelo Mundo

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Le Mans, 1969

de um lado da pista, 45 carros alinhados, do outro lado, 45 pilotos, todos à espera da bandeirada de largada. O grau de ansiedade em cada um deles deveria estar no máximo, afinal, estava para começar mais uma edição das 24 Horas de Le Mans.

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Dada a largada, todos correram para seus carros, ligaram os motores e partiram. Todos menos um: Jackie Ickx atravessou a pista caminhando tranquilamente, em passos lentos, entrou no seu carro, afivelou o cinto de segurança e saiu em último lugar. Quando ele iniciou sua prova, o líder já estava na reta Mulsanne. 

Mesmo largando em último, Jackie Ickx e seu Ford gT 40 venceram a prova de 24 horas, incrivelmente chegando poucos metros à frente do porsche 908 de Hans Herrmann

A atitude de Ickx foi um protesto, pois ele era contra aquele tipo de largada, que ficou conhecida por “largada estilo Le Mans”. No afã de sair na frente dos adversários, alguns pilotos não afivelavam o cinto de segurança, justamente o que, na edição anterior da prova, em 1968, vitimou o piloto Willy Mairesse. Mesmo sem o cinto, ele sobreviveu a um acidente, mas as graves sequelas que poderiam ser evitadas com o uso do cinto o afastaram definitivamente das pistas, o que o levou a suicidar-se um ano depois.

Icxk não poderia ter sido mais contundente em sua atitude: logo na primeira volta, o piloto John Woolfe perdeu o controle de seu Porsche 917 na Maison Blanche e o choque o arremessou para longe, matando-o instantaneamente. Estava sem cinto.

O Ford GT 40 da dupla vencedora das 24 Horas de Le Mans de 1969, Jacky Ickx e Jackie Oliver

O Porsche 917 de John Woolfe, que se acidentou logo na primeira volta das 24 Horas de Le Mans de 1969

O protesto de Ickx, em conjunto com os lamentáveis incidentes, fizeram com que a largada no estilo Le Mans fosse abolida para sempre. Aquela edição de 1969 foi a última prova das 24 Horas de Le Mans a ter esse perigoso espetáculo.

Já na prova, ainda em último lugar, Ickx poderia não ter previsto que disputaria a liderança, em seu Ford GT 40, com o Porsche 908 de Hans Herrmann e Gerard Larrousse. Nem que venceria a prova com uma vantagem de apenas 30 metros do carro rival. Caso contrário, é quase certo que ele não teria perdido aquele precioso tempo na largada. Mas aquele era o seu dia e Jackie Ickx, com seu companheiro Jackie Oliver, com quem dividiu a pilotagem do Ford GT 40 de número 6, venceu a prova poucos segundos à frente do segundo colocado, depois de quase cinco mil quilômetros de corrida. O terceiro colocado, o Ford GT 40 da dupla Mike Hailwood e David Hobbs, chegou uma volta atrás. 

Não foram essas particularidades, apenas, que fizeram das 24 Horas de Le Mans de 1969 uma prova muito especial. O regulamento das provas de endurance estavam passando por constantes ajustes, o que apimentou ainda mais a disputa entre as equipes e seus carros. No ano anterior, a FIA estabeleceu o limite de cilindrada para o Grupo 4 em 5 litros, com um mínimo de produção passando de 50 carros para apenas 25 carros. Isso porque, anteriormente, eles haviam decidido que, para fazer frente aos velocíssimos motores de 7 litros, como o utilizado até então pelo Ford GT 40, a cilindrada limite seria de 3 litros. Para não esvaziar o grid, no entanto, foi criado o Grupo 4, para motores de maior cilindrada.

Em sua vitoriosa campanha, que se iniciou com a polêmica história que envolveu a emblemática Ferrari e a poderosa Ford anos antes – mais precisamente falando, Henry Ford II e Enzo Ferrari –, o Ford GT 40 já havia vencido em Le Mans nos três anos anteriores, 1966, 1967 e 1968, mostrando que realmente era o carro a ser vencido. Foi quando a Porsche criou o atualmente lendário 917, que com seu motor de 4,5 litros e 12 cilindros, era bem mais leve do que o já ultrapassado Ford GT 40.

Nesse primeiro ano do Porsche 917, a sua enorme potência, mais a estabilidade ainda não controlada e as quebras constantes fizeram com que os já consagrados Porsche 908 de 3 litros se tornassem os grandes rivais do Ford GT 40. E foi assim a disputa final da prova, talvez a mais acirrada de que se tinha notícia na história de Le Mans.

Com o 917 de Woolfe fora da prova desde a primeira volta e as quebras dos carros de Vic Elford e Richard Atwood, e de Kurt Ahrens e Rolf Stommelen, ambos com problemas na transmissão, mesmo que tenham liderado mais da metade da prova, as esperanças passam a ser os Porsche 908 de 3 litros. Dos quatro inscritos, com Jo Siffert e Brian Redman, Rudi Lins e Willi Kauhsen, Udo Schütz e Gerhard Mitter, e Hans Herrmann e Gérard Larousse, apenas esta última dupla terminou a prova, disputando palmo a palmo a liderança com o Ford GT vencedor, até as últimas voltas.

Mesmo largando em último lugar, Jacky Ickx já estava em quarto lugar na metade da corrida, com o outro GT 40 da equipe, com David Hobbs e Mike Hailwood, em quinto. No fim da prova, obtiveram o terceiro lugar, uma volta atrás do Porsche de Herrmann e Larrousse.

Dos 109 carros inscritos para as 24 Horas de Le Mans de 1969, apenas 51 efetivamente participaram dos treinos oficiais e apenas 45 largaram. E só 14 terminaram, entre eles um Alpine A210 com motor de apenas um litro e quatro Porsche 911. 

Alpine A210 de um litro, de Serpaggi e Ethuin: 12o lugar

Porsche 911 de J. P. Gaban e Y. Deprez: 10o lugar

Reinhold Jöest e Helmutt Kelleners, 6o com Ford GT 40

Uma prova mais que memorável, cujo resultado surpreendeu a todos e continua surpreendendo até os dias atuais. E as 24 Horas de Le Mans de 1969 carimbaram o passaporte de Jacky Ickx em sua entrada para rol dos grande nomes das provas de endurance. Depois dessa, ele venceu mais cinco vezes em Le Mans, em 1975, 1976, 1977, 1981 e 1982, o que lhe rendeu o apelido de Monsier Le Mans. Na Fórmula 1, ele levou o apelido de Rainmaster, por pilotar magnificamente no piso molhado.

Para o Ford GT 40, essa prova coroou seu currículo como um dos melhores carros do mundo, o que o Porsche 917 acabaria conquistando a partir do ano seguinte, depois que foi devidamente acertado. l

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