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Moda sustentável

Preço, qualidade e consciência ambiental alavancam venda de roupas usadas em brechós

MAYLA SHIVA

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Osetor da moda é um dos mais rentáveis e que atrai mais espectadores ao redor do mundo, sendo responsável pelo lançamento de grandes tendências e novidades que vão além do mundo fashion, mas impactam cada vez mais no cotidiano das pessoas e o meio ambiente.

Lojas de departamentos, as chamadas fast fashion, produzem peças em grande quantidade de uma única vez e que, provavelmente, serão substituídas após o lançamento de uma nova coleção. O problema é que nem sempre todas essas peças são vendidas, o que gera uma superprodução excessiva de materiais que depois não são devidamente aproveitados ou acabam até mesmo descartados.

Pensando nessas problemáticas, um movimento tem ganhado cada vez mais adeptos: a moda sustentável. Moda sustentável é, em outras palavras, a compra e uso consciente de peças de vestuários.

Uma pesquisa realizada pela Economist Intelligence Unit apontou que as buscas na internet por produtos sustentáveis tiveram crescimento de 71% nos últimos cinco anos. Englobando mais de 54 países, o estudo aponta que, no Brasil, os tuítes relacionados ao assunto aumentaram 82% no período analisado e o volume de notícias cresceu 60%.

Apesar do conceito parecer novo, engloba uma prática que já existe há muito tempo e que é o principal mecanismo quando se trata de moda sustentável – a compra e venda de peças de segunda mão, ou seja, que já foram usadas ou pertenceram a outra pessoa e agora são repassadas para o consumo novamente através de brechós.

“Você vê uma roupa na loja de departamento e, se não comprar naquele exato momento, ela vai sumir para dar lugar a outra coleção em menos de um dia. Dali vai para o lixo, ou sabe-se lá para onde, o que é bem diferente dos brechós. Eles parecem ter mais cuidado com as roupas. Cuidam, preservam

Foto: Becca McHaffie e dão uma nova chance para elas, não de uma forma descartável, mas como se fosse um pedacinho de quem vai usar. Isso sem falar da exclusividade das peças mais antigas, que se preservam na qualidade de uma forma que roupas de loja de departamento não vão conseguir”, afirma a estudante de Ribeirão Preto Manoela Radaieski, 19, que é consumidora de brechós desde os seus 12 anos de idade.

Além da questão sustentável e ideológica, outro fator levado em consideração na hora de optar por roupas de segunda mão é o preço, que costuma ser mais em conta, como explica a estudante Aella de Luca Cazaroto, de 18 anos.

“O que me levou a comprar em brechós definitivamente foi o fato de encontrar peças incríveis, muitas vezes mais bem feitas do que muitas que encontramos em lojas grandes, por um valor muito acessível. Nos brechós, é possível encontrar roupas especificas e únicas com mais facilidade, o que autentifica um estilo e reforça uma identidade. E pagando mais barato, o que é a melhor parte.”

“A sustentabilidade vem sendo cada vez mais o caminho para amantes da moda e de baixa renda, não só porque não podemos nos dar o luxo do consumismo, mas também porque nos vemos frequentemente substituindo peças que pagamos caro por achados de brechó.”

GARIMPO FASHION

Um verbo popular entre os clientes de brechós é o “garimpar”. No dicionário, você encontra a definição como “procurar meticulosamente; trabalhar como garimpeiro; extrair (metais, pedras preciosas), explorando garimpo”, e o sentido é parecido no mundo fashion: Quem “garimpa” em brechós faz uma

Foto: Prudence Earl

curadoria minuciosa das roupas disponíveis, procurando entre pilhas e mais pilhas de peças – pelo grande volume de itens que esses lugares costumam concentrar, nem sempre toda a mercadoria fica visível – até encontrar os melhores produtos.

Muitas vezes, garimpar exige tempo e paciência, além de visitas a mais de um brechó, como diz Aella: “Quem frequenta brechó sabe que garimpar não é opcional. Às vezes, por sorte, encontramos peças de interesse apenas olhando por cima, mas é raro. Normalmente, só garimpando.”

Manoela concorda. “Eu sei bem o meu estilo e as roupas que me deixam mais confortável, então, se eu preciso de alguma coisa, já sei em que lugares posso encontrar. A partir daí é procurar com paciência e atenção, ver o material, pensar se vou poder usar aquilo em todas as estações, se é necessário no momento. Surfar em araras de brechó me ajudou a encontrar grande parte das peças-chaves do meu guarda-roupa hoje em dia.”

O LADO DE QUEM COMERCIALIZA

demanda também acompanhe esse aumento. Novas iniciativas de brechós, principalmente através das redes sociais, têm surgido nos últimos anos.

O “Enjoei”, como o próprio nome sugere, é um aplicativo desenvolvido com a premissa de facilitar o comércio de artigos usados, como se fosse uma espécie de brechó online enorme que conecta qualquer um que queira vender ou comprar algo. Um levantamento realizado pela própria empresa aponta que 150 mil usuários estavam registrados no terceiro trimestre de 2020, com pelo menos 3,3 milhões de produtos anunciados em sua plataforma.

Além disso, as redes sociais são grandes aliadas do consumo consciente. Dados da GlobalData apontam inclusive que os brechós podem ultrapassar o varejo de moda em 2024, caso os números continuem a crescer desta forma.

Carolina Santos, 20, é proprietária do Brechó das Amigas, em Ribeirão Preto, possui mais de 1.500 seguidores na rede social por onde realiza a maioria das suas vendas. Ela conta que seu contato com moda sustentável começou muito antes de montar o seu negócio.

“Eu sempre vendi minhas roupas que estavam paradas no guarda-roupa. A maioria para amigas ou em grupos próprios para esse tipo de negociação, sabe? E então tive a ideia de abrir um brechó, foi uma evolução natural. Transformei algo de que eu já gostava, fazia quase por hobby, na minha fonte de renda.”

Carolina relata também a importância de estar atento às tendências, e que elas são importantes mesmo no meio do consumo sustentável, além da captação consciente das peças.

“Eu procuro sempre as roupas que estão sendo mais usadas, que estão em alta e em boa qualidade. Para a avaliação do que vou comprar para a revenda, eu peço para que me mandem fotos ou me tragam presencialmente, sou muito criteriosa. Brechó não é sinônimo de porcaria, jamais! Priorizo peças em bom estado”, explica a empreendedora.

“Já existiu muito preconceito, mas acho que isso está mudando. Hoje vejo mais pessoas, principalmente jovens como eu, participando do meio fashion através dos brechós e lojinhas sustentáveis. A nova geração entende mais que roupa não é descartável como papel, é só lavar e cuidar com carinho, que você pode ter uma peça para a vida inteira.”

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