Revista Em Evidência 81

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ÚLTIMA PALAVRA

TROCARAM A ÂNCORA FISCAL PELA ÂNCORA ELEITOREIRA

GUILHERME MACALOSSI Apresentador do programa Bastidores do Poder, na Rádio Band

Populistas de esquerda e de direita rejeitam a matemática. Apesar da necessidade de investimentos maciços em programas de renda básica, não se pode deixar de lado a responsabilidade fiscal. Ela é, afinal de contas, a baliza de sustentabilidade a nortear qualquer iniciativa das instâncias de governo. Não há, ao contrário do que alguns falsamente propalam, contradição ou oposição entre as duas coisas

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EM EVIDÊNCIA | Desde 2009 - No 81 - 2021

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Produto Interno Bruto brasileiro está condenado ao raquitismo no curto prazo. Mesmo o ano da “retomada”, esse que vai se concluindo ao final de dezembro, já ficará abaixo das previsões otimistas. Segundo levantamento feito em novembro pelo jornal Valor Econômico com projeções de 46 instituições bancárias e do mercado financeiro nacional e internacional, em apenas duas se calcula um PIB superior a 5% para 2021, e apenas três assinalam um PIB maior que 1% para 2022. É a realidade se impondo às palestras fantasiosas de Paulo Guedes.

cos torna as ações mais eficientes. Sair a distribuir dinheiro aos desamparados sem respeitar a conjuntura das contas é contratar a desvalorização da moeda, que impacta diretamente nas condições de vida dessas pessoas.

Em boa medida, escolhemos o descalabro, trocando os fundamentos da estabilidade pela busca desenfreada por votos

O cenário melancólico não é fruto de imposição da pandemia, ainda que ela tenha trazido dificuldades objetivas. A inflação, por exemplo, se tornou um desafio global, uma vez que a necessária interrupção de parte das atividades econômicas desorganizou as cadeias de produção. Mas há certas peculiaridades em nosso caso que são de ordem política. Em boa medida, escolhemos o descalabro, trocando os fundamentos da estabilidade pela busca desenfreada por votos. Populistas de esquerda e de direita rejeitam a matemática. Apesar da necessidade de investimentos maciços em programas de renda básica, não se pode deixar de lado a responsabilidade fiscal. Ela é, afinal de contas, a baliza de sustentabilidade a nortear qualquer iniciativa das instâncias de governo. Não há, ao contrário do que alguns falsamente propalam, contradição ou oposição entre as duas coisas. A correção dos gastos públi-

O fortalecimento do poder de compra é um dos mais poderosos instrumentos de ascensão social. Mas para isso é preciso de uma política fiscal comprometida com seus fundamentos, inclusive legais. Nos últimos meses, o governo Bolsonaro, em associação com o centrão fisiológico, tratou de investir contra o Teto de Gastos e a própria Lei de Responsabilidade Fiscal. A um só tempo, a aprovação da PEC dos Precatórios interfere em decisões judiciais, caloteia entes privados, muda o indexador de inflação de gastos, cria um passivo bilionário e estabelece precedentes perigosos no esforço do Estado em equalizar suas despesas com as respectivas fontes de receita. Em artigo para Gazeta do Povo, escrevi que “a necessária resposta à calamidade social que empurra os humildes para a miserabilidade absoluta virou a oportunidade perfeita para a ação insidiosa de parasitas, espertalhões, fisiológicos e populistas”. Ao trocar a âncora fiscal por uma âncora eleitoreira, atiraram a credibilidade do país no lixo e geraram a depressão continuada de nossas expectativas de crescimento.


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