20 | Forum Estudante | mar’22 /Livros
Entrevista aos autores do livro infantil “Ricky”
«Acreditamos que a educação é a chave para um mundo inclusivo» O livro “Ricky”, editado pela Forum Estudante no âmbito da comemoração dos seus 30 anos, foi escrito por dois primos: Ricardo Moins, que nasceu com atrofia muscular espinhal, e Lucas Chipenda, um dos pilares de Ricardo. Quando nasceu, os médicos deram a Ricardo uma esperança de vida até aos dez anos. Agora, com vinte e três, decidiu escrever um livro infantil juntamente com o primo em que contam algumas das suas aventuras. Em entrevista à FORUM, os autores contam mais sobre este projeto. Entrevista por Luís Duarte Sousa
Podem explicar-nos em que consiste a condição do Ricardo? Ricardo Moins (RM) - Tenho uma doença chamada Atrofia Muscular Espinal tipo II. Basicamente os meus músculos vão enfraquecendo ao longo do tempo. Sou completamente dependente de terceiros, seja para comer, tomar banho ou outras atividades. Tenho uma deficiência de 95%, que não tem qualquer tipo de impacto com a parte intelectual. Estás a tirar um curso superior, não é? RM: Sim, estou agora no terceiro ano do curso de sociologia. Está a correr bem, acabo este ano em junho, espero (risos). E também estás a estagiar. Como é que consegues conciliar as duas vertentes com a tua condição? RM - Nada é possível de se fazer sozinho, todos precisamos da ajuda dos outros. Sempre tive sorte, porque ao longo da minha vida foram aparecendo as pessoas certas para me
ajudar. Na faculdade tenho uma amiga que me ajuda na deslocação. Grande parte do estágio é feito através do zoom, o que facilita a parte da deslocação. Além disso, é uma questão de nos sabermos adaptar às circunstâncias. Como é que, em crianças, os dois aperceberam-se das condições do Ricardo? Lucas Chipenda (LC) - Foi aos poucos, porque ele também foi perdendo a força aos poucos. Tenho memórias nossas em crianças sentados no chão a jogar PlayStation, só depois é que ele começou a ter as cadeiras especiais. Às vezes, mesmo sem perguntar, os meus pais iam-me explicando o que se passava com o Ricky. Que outras adaptações precisaram de ser feitas na família? RM - As adaptações foram feitas gradualmente. Por exemplo, uma das adaptações foi a minha mãe abdicar da vida profissional mal nasci. Assim poderia proporcionar-me uma vida mais confortável. Tivemos também de mudar de casa porque a minha primeira era no terceiro andar, sem elevador. Aos 10 anos de idade os meus pais já não me conseguiam transportar. Tivemos também de comprar um carro adaptado. Como é que eram vocês enquanto alunos? LC - Nós nunca andámos juntos na escola. Mas eu era um aluno bastante distraído. Tinha uma grande dificuldade em concentrar-me nas aulas,
“Só é possível normalizar se a comunicação social partilhar estas histórias de uma forma natural. Falta esta visão mais natural da pessoa e não da condição” Ricardo Moins estava sempre a desenhar nos cadernos. Acho que a minha carreira toda escolar foi desenhar nas mesas (risos). A vertente teórica era horrível para mim. A minha mãe sempre esteve bastante presente nos meus estudos. Era ela que sempre me impulsionava para estudar e ficava a estudar comigo. RM – Eu não era um aluno brilhante, mas também nunca tive muita dificuldade na escola. Fui para economia, o que trazia um problema acrescido, porque tive uma altura em que era internado várias vezes e era difícil acompanhar a matéria, mas sempre fui bom o suficiente para entrar na faculdade. O mercado de trabalho é bastante competitivo e achei que o complemento da faculdade poderia ajudar a minha inserção. Estar a estudar sociologia também me veio a preparar para este caminho que decidi escolher, da inclusão.