Voz de Esperança Nov/Dez 2021

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NOV - DEZ / 2021

FIGURAS E FACTOS MARCANTES DO SEMINÁRIO CONCILIAR DE BRAGA

Diretor: Pe. Mário Martins Chaves Rodrigues Ano XXIV - 6ª Série | Nº 85 | Bimestral 1,00 €

“Imbuído do espírito renovador do Concílio de Trento – onde fica claro que a necessária e urgente reforma interna da Igreja passava pela formação do clero –, Frei Bartolomeu dos Mártires chega a Braga com a forte determinação de fundar um Seminário.” Ernesto Português Págs. 2

NAS MÃOS DO OLEIRO “O Seminário, qual vaso de barro, é constituído por fragmentos que, unidos na fragilidade, formam uma casa una e coesa: o ego cala-se perante a diferença; a diferença abre espaço à compreensão; a compreensão é o caminho para a comunhão.” Pedro Oliveira Pág. 9

EDITORIAL

450 ANOS DO SEMINÁRIO CONCILIAR… PARA OS ENVIAR A PROCLAMAR!

VIGÍLIA DE ORAÇÃO PELOS SEMINÁRIOS 5 de novembro | 21h15 Igreja de S. Pedro e S. Paulo (Seminário Conciliar de Braga)

O Seminário Conciliar de Braga celebra ao longo deste ano pastoral de 2021-2022 os 450 anos da sua existência, tendo aberto as suas portas em 1572, depois de todos os esforços empreendidos pela ousadia e pelo arrojo de S. Bartolomeu dos Mártires, sendo um dos mais antigos Seminários do mundo. Por essa razão, o jornal Voz de Esperança procurará, ao longo das seis edições que se seguirão, enfatizar, precisamente, este importante aniversário. Para tal, cada edição será particularmente dedicada a uma temática, escolhida para ajudar à reflexão, sendo que, desta vez, nos centramos sobre as pessoas que fazem parte da narrativa e da vida do Seminário. Deste modo, a secção “Visão”, que estará subdividida em duas partes, recorda-nos, em primeiro lugar, as pessoas que se nos apresentam como figuras marcantes na história do Seminário. Já a segunda parte, que ao longo das próximas edições será sempre composta por um conjunto de perguntas dirigidas a seis sacerdotes que ao longo das últimas décadas viveram a missão de Reitores do Seminário Conciliar, recorda-nos que os jovens das nossas comunidades paroquiais devem sentir e conhecer o pulsar da vida dos nossos Seminários, podendo ser chamados a viver nos mesmos uma experiência de verdadeiro discernimento vocacional, não esquecendo que “a pessoa se constitui como fim e nunca como meio no âmago da relação com Deus e os outros para a comunhão”, procurando, por isso, formar “para estarem com Ele e para os enviar a proclamar” (Mc 3, 14), como nos recorda o lema da Semana de Oração pelos Seminários de 2021. De resto, e tal como todas as notícias aqui publicadas o comprovam, evocamos também o caminho sinodal que a Igreja é atualmente convidada a realizar, recordando a recente afirmação D. Jorge Ortiga: “Queremos que a Arquidiocese tome consciência de que deve caminhar com os Seminários. Arquidiocese e Seminários distinguem-se, mas são uma coisa só”.


VISÃO

FIGURAS E FACTOS MARCANTES DO SEMINÁRIO CONCILIAR DE BRAGA Ernesto Português

Neste pequeno apontamento sobre os 450 anos do Seminário Conciliar de Braga evocamos os arcebispos que, no nosso entender, poderão ser considerados como as figuras maiores da sua história: D. Frei Bartolomeu dos Mártires, D. José Joaquim Azevedo e Moura, D. João Crisóstomo de Amorim Pessoa, D. António de Freitas Honorato e D. Manuel Vieira de Matos. Imbuído do espírito renovador do Concílio de Trento – onde fica claro que a necessária e urgente reforma interna da Igreja passava pela formação do clero –, Frei Bartolomeu dos Mártires chega a Braga com a forte determinação de fundar um Seminário seguindo as orientações conciliares, elas mesmas um verdadeiro Estatuto dos Seminários. Aí se estabelecem as condições básicas para a sua fundação e sustento, admissão de candidatos e regras de funcionamento, sendo o Bispo diocesano considerado o primeiro responsável. O Santo Arcebispo funda o Seminário em 1572, no Campo da Vinha – bem perto do paço arquiepiscopal –, dotando-o de alguns rendimentos anuais. D. Frei Caetano Brandão chega a Braga, em 1790, e encontra o Seminário com apenas 25 colegiais e sem verbas para o seu funcionamento. O Seminário começa a ser alvo de algumas reformas, introduzidas pelo Cardeal D. Pedro Paulo, que vão ter maior desenvolvimento com D. José Azevedo e Moura, a partir de 1856, que, mesmo antes de chegar a Braga, envia um novo Regulamento de Estudos que faz questão de mandar publicar e fazer cumprir. O velho edifício do Seminário, com trezentos anos, já não tinha o mínimo de condições exigíveis para a formação dos clérigos. Cabe, então, a D. João Crisóstomo, em 1880, a transferência do Seminário de S. Pedro, do Campo da Vinha para o edifício do extinto Colégio de S. Paulo, onde atualmente se encontra instalado, passando a denominar-se Seminário de S. Pedro e S. Paulo. Em 1883, o Seminário Conciliar conhece novas reformas com a chegada de D. António Freitas Honorato, que decreta o internato obrigatório para todos os alunos do 2

Curso trienal de Teologia. Ordena, então, a elaboração de um novo regulamento disciplinar, publicado em 1884, institui prémios de comportamento moral e disciplinar e introduz a cadeira de Filosofia Tomista. No final da sua prelatura, e com o seu patrocínio, funda Mons. Fernandes Lopes, na rua de S. Vicente, um quartel de estudantes destinados ao estado eclesiástico, que, mais tarde, daria origem ao Seminário de Santo António e S. Luís Gonzaga. Com a implantação da República, o edifício do Seminário é transformado em quartel militar. Depois de uns anos de vacância da Sé de Braga, chega, em 1915, D. Manuel Vieira de Matos, o restaurador da diocese, que, em 1924, põe a funcionar o Seminário Menor, em edifício próprio. E em 1932, já depois da morte do Arcebispo, é inaugurado o edifício do Seminário de S. Pedro e S. Paulo, na rua de Santa Margarida.


PALAVRA AOS REITORES 1. A partir do modelo de S. Bartolomeu dos Mártires, como vê a missão do pastor diocesano no que respeita à vida do Seminário? Cón. António Macedo: Para São Bartolomeu dos Mártires, a necessidade da fundação de seminários para acolher os futuros sacerdotes, a experiência da vida comunitária, o estudo da teologia e filosofia, era uma necessidade permanente. Viver em comunhão antes de partir para as paróquias como exercício de formar comunidades vivas nos locais para onde fossem enviados teria de passar por receberem cultura, formação e vida espiritual.

4. Que dimensões da pessoa considera centrais, devendo ser particularmente trabalhadas, na formação de um seminarista? Cón. Manuel Tinoco: A pessoa compreende-se a partir da sua experiência constitutiva, como sujeito livre e aberto a Deus e aos outros. Ser pessoa é a experiência constitutiva do ser-se único; é ser-se, dando-se aos outros, como ser relação dialógica recíproca do eu-tu. A pessoa constitui-se como fim e nunca como meio no âmago da relação com Deus e os outros para a comunhão. E ser seminarista constrói-se sobre o ser pessoa.

2. D. Jorge Ortiga afirma: “Queremos que a Arquidiocese tome consciência de que deve caminhar com os Seminários.” Que gestos devem partir de cada um de nós, de modo a que possamos trilhar este caminho sinodal? Mons. António Moreno: Como ninguém ama o que não conhece, os Seminários devem ser mais e melhor conhecidos. Esta divulgação deverá começar pelo testemunho de vida dos que já fizeram a experiência dos mesmos. Uma equipa vocacional deverá deslocar-se às paróquias para efetuar essa tão necessária divulgação. Nunca esquecendo o que Jesus para tal recomenda: “Pedi ao Senhor da Messe...”

5. O Seminário procura formar sacerdotes, pessoas ao serviço de outras pessoas. Qual deve ser a identidade do presbítero nos nossos dias? Cón. José Paulo Abreu: Do presbítero espera-se coração de ouro, simpatia, bom acolhimento, maturidade afetiva. Também se exige ilustração, que saiba o que diz e escreve. O povo não quer mercenários. É muito importante uma espiritualidade forte, uma intensa comunhão com Deus, sob pena de desgaste no ativismo e derrocada perante tentações e/ou dificuldades.

3. De que modo os jovens podem conhecer o pulsar da vida dos nossos Seminários, podendo ser chamados a viver uma experiência de verdadeiro discernimento vocacional? Cón. António Sepúlveda: Os jovens podem conhecer melhor o pulsar da vida dos nossos Seminários e aceitar a possibilidade de um discernimento, na medida em que forem capazes de o conhecer. Por isso, acho muito importante que contactem com a realidade concreta do Seminário, inclusive com a presença física, passando por lá, vendo como funciona e a proposta que apresenta.

6. Como é que um Reitor ou um padre de uma equipa formadora pode e deve promover a vivência de verdadeiro espírito de comunidade no Seminário? Cón. Vítor Novais: Não é possível educar para um espírito de comunidade sem existir a clarividência dos seus fundamentos teológicos e sem perceber a sua relevância para o ministério presbiteral. É decisivo promover um clima de plena liberdade, respeitando a singularidade de pessoa. Este tema reclama que a formação não se circunscreva à indicação dos procedimentos e comportamentos acerca da fraternidade, mas que seja capaz de ir às suas raízes e promover a descoberta do seu sentido, bem como da sua relevância para a vida em presbitério. 3


ARTE

OS COMEDORES DE BATATAS Luís da Silva Pereira

Para tema genérico de um novo ano pastoral dedicado à virtude da caridade, escolheu-se a frase da parábola do bom samaritano “aproximou-se e ligou-lhe as feridas” (Lucas 10, 34), recordando, mais uma vez, que onde há caridade nascem gestos de ajuda a todos os que trazem feridas abertas no corpo ou na alma. A virtude da caridade pode concretizar-se de incontáveis maneiras. Talvez o leitor se espante se lhe disser que até uma obra de arte pode ser uma manifestação de amor pelo próximo. Ao chamar a atenção para situações de necessidade, de dor e sofrimento, as boas obras de arte despertam consciências, iluminam inteligências, suscitam intensas emoções. A história está cheia de exemplos que mostram como elas levaram muitas pessoas a transfigurar-se no sentido da prática do bem e da transformação das sociedades. Apresento hoje um exemplo dessa capacidade que tem a arte de nos despertar para as dores humanas. Escolhi uma das mais famosas telas de Vincent van Gogh intitulada Os Comedores de Batatas, datada de 1885. Dela afirmou o próprio pintor que “o quadro dos camponeses a comer batatas que pintei em Nuenen é o melhor de todo o meu trabalho”. Situa-se, aliás, na mesma linha temática de muitas outras pinturas da

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sua autoria que representam rostos de camponeses, homens e mulheres, marcados pela dureza da vida: cavadores, semeadores, ceifeiros, lenhadores, debulhadores, etc.. Vincent van Gogh nasceu na Holanda, na localidade de Zundert, em 1853, e faleceu na cidade francesa de Auvers-sur-Oise, no ano de 1890. É considerado o mais importante pintor do pós-impressionismo, apesar da sua vida curta e da débil saúde mental que acabou por levá-lo ao suicídio. O seu estilo pictórico é inconfundível, sobretudo pela maneira como sobrepõe espessas camadas de tinta em pinceladas vigorosas e entrecortadas, dando relevo aos objetos representados. Lembra flagrantemente a técnica pontilhista que consiste no emprego de pontos coloridos para causar a ilusão visual dos objetos. É uma técnica que deriva do impressionismo que já recusara a linha contínua como delimitação das coisas pintadas. Os Comedores de Batatas é obra de cores terrosas e sombrias, muito diferentes dos turbilhões de cores vivas que o artista irá empregar posteriormente. Mostra uma família de camponeses pobres, à volta de uma mesa tosca, de tábuas meio desconjuntadas, em ambiente frouxamente iluminado por um candeeiro que pende do teto, mal deixando distin-

guir os traços fisionómicos dos comensais. Os rostos são duros, secos e angulosos. Estão todos calados, como se se sentissem demasiado cansados para dizerem qualquer coisa. Repare-se que comem da mesma travessa. A pessoa do nosso lado direito serve uma bebida quente. A sua mão esquerda pousada no joelho dá a entender que está exausta do trabalho. A personagem com uma tijela na mão parece já ter bebido a sua parte e estar a pedir mais. Repare-se que, aparentemente, só as duas pessoas do nosso lado esquerdo estão a comer. Dão-nos a ideia de que a comida não chegará para todos. A figura feminina olha para o homem com ternura, como se o convidasse a servir-se um pouco mais. As outras personagens não comem. Parecem dar prioridade aos outros ou abster-se simplesmente de comer. Quer a partir deste quadro, quer de outros em que o pintor traz para o mundo da arte a dura vida dos camponeses, somos convidados à compaixão e à solidariedade com aqueles que passam necessidade e sentimo-nos levados a agir para melhorar a sua situção. O quadro é, ao mesmo tempo, uma denúncia das más condições de vida de muitos seres humanos e um convite a melhorá-las.


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SEMINÁRIO MENOR

AO SABOR DA COMUNHÃO E DO ENCONTRO CASA DE CAMPO Pedro Cunha, 12º Ano

No passado dia 25 de setembro, realizou-se o encontro de Casa de Campo, onde participaram os seminaristas dos 11º e 12º anos do Seminário de Nossa Senhora da Conceição, uma iniciativa que privilegiou os sabores, sobretudo ao nível da comunhão e do encontro com Deus e com os outros. Nesse encontro, orientado pelo Pe. Álvaro Balsas, sj, os jovens viveram um momento de recolecção / recolha espiritual onde, através de um texto da Sagrada Escritura, puderam meditar e orar durante a manhã. 6

Após este momento de discernimento pessoal, o grupo dirigiu-se até ao Mosteiro Beneditino de Santo Tirso, no qual lhe foi exposta e explicada parte da história do local. Mais tarde, após o almoço, seguiu-se um momento de maior descontração, marcado por um breve passeio por Santo Tirso, onde os participantes foram presenteados por um Jesuíta, doce típico da cidade. Para finalizar a passagem por Santo Tirso, foi feita uma visita ao Mosteiro de Singeverga, onde os frades

beneditinos apresentaram a casa, falando sobre a sua fundação, sobre São Bento e sobre a história desta ordem em Portugal, desde a criação da mesma e a sua inserção no nosso país, referindo ainda a missão que tiveram na história de todo o mundo. Este encontro concluiu com o regresso a casa, mas, antes disso, foi tempo de provar o famoso licor de Singeverga e saber uma curiosidade sobre o mesmo, pois a sua receita é transmitida a apenas um monge quando aquele que guarda este “segredo” dá sinais de fim de vida.


SEMINÁRIO MENOR

SER FRATER (IRMÃO)

RECOLEÇÃO ESPIRITUAL Marco Magalhães, 10º Ano

No passado dia 23 de outubro, sábado, os seminaristas do Seminário de Nossa Senhora da Conceição realizaram o seu primeiro encontro de recoleção espiritual deste ano pastoral, contando com a colaboração e orientação do Pe. Adelino Domingues, diretor espiritual na comunidade. O encontro iniciou-se na Capela Cheia de Graça, onde, após uma breve explicação do que se trata uma recoleção, dirigida aos novos seminaristas da comunidade, se rezou o momento de Laudes. Este

tempo de oração foi dedicado ao tema deste ano pastoral proposto pela nossa Arquidiocese de Braga, “Onde há amor, nascem gestos”, a partir da frase retirada da Sagrada Escritura - “Vendo-o, ligou-lhe as feridas”. Nesta recoleção o objetivo passou, sobretudo, por interpelar cada um para “cuidar das feridas da fraternidade”, que resultou na seguinte conclusão: Ser irmão na fraternidade, na aliança, é sobretudo estar atento ao irmão. Depois deste momento de re-

flexão comunitária sobre o tema, houve um momento de reflexão pessoal, através de questões que remetiam para um olhar sobre o interior de cada um, de forma a saber olhar não só as fragilidades do outro, mas também aquelas que ferem o próprio. Deste modo, este foi o momento de recoleção espiritual que ocupou de forma produtiva a manhã dos seminaristas, para que cada um sempre possa melhor se localizar mediante a pergunta divina: “Onde estás?”. 7


SEMINÁRIO MAIOR

NARRATIVA MUSICAL CONCERTO COMEMORATIVO DOS 450 ANOS DO SEMINÁRIO CONCILIAR Adélio Mareira, 1º Ano

No dia 4 de outubro, realizou-se na igreja de S. Paulo o primeiro concerto comemorativo do 450° aniversário da fundação do Seminário Conciliar de Braga. Os presentes foram agraciados com a bela harmonia que se soltou do órgão Manuel de Sá Couto e ecoou majestosamente. A interpretação esteve a cargo do professor André Bandeira que, pela sua experiência e conhecimento profundos deste instrumento, embelezou e iluminou a noite com várias obras emblemáticas. 8

A noite foi preenchida por uma combinação elegante de sons melódicos, despertando nos ouvintes emoções que variavam de acordo com o seu estado de espírito e com a interpretação que cada um deles fazia. A miscelânea de sentimentos experienciados naquele amplo lugar fez-nos percorrer tempos e espaços, relembrando toda a história do seminário e da sua evolução ao longo de vários séculos. E, no seu auge, a música recaiu sobre nós com um sólido som, trans-

figurando a escuridão, tornando-se luz para todos os que a ouviam. Na alternância e no contraste dos agudos e dos graves que acompanhavam a melodia, o professor desenvolveu vários diálogos percetíveis a um ouvido atento num silêncio gritante. As comemorações dos 450 anos da criação do Seminário Conciliar de Braga prosseguirão, ao longo do presente e do próximo ano letivo, com muitas outras iniciativas que, certamente, irão ser do agrado de quem nelas quiser participar.


SEMINÁRIO MAIOR

NAS MÃOS DO OLEIRO ENCONTRO DE PROGRAMAÇÃO DO ANO Pedro Oliveira, 2º Ano

Um vaso de barro. Milhares de anos de vida. A sua fragilidade é percetível a olho nu. A sua sobrevivência depende da complementaridade de centenas de fragmentos encontrados dispersos. Aquele utensílio, outrora banal, hoje celebridade de museu, comunica-se gritando aos que o admiram, sem que estes se apercebam. O que nos diz a peça muda, mas ensurdecedora? De 15 a 17 de outubro, o Seminário Conciliar de Braga realizou o seu Fim de Semana de Programação. Reflexão, arte e convívio, três atividades vividas intensamente ao longo da atividade. A comparação é deveras estranha, mas o vaso de barro afigura-se o símbolo perfeito para o momento. O Seminário, qual vaso de barro, é constituído por fragmentos

que, unidos na fragilidade, formam uma casa una e coesa: o ego cala-se perante a diferença; a diferença abre espaço à compreensão; a compreensão é o caminho para a comunhão.

Reflexão, arte e convívio. Três dias em que se projetou o novo ano pastoral e letivo. Três dias em que recordamos a nossa condição de barro nas mãos do Oleiro.

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SEMINÁRIO MAIOR

TESTEMUNHO VOCACIONAL Sérgio Araújo, 6º Ano

O meu nome é Sérgio Araújo, tenho 28 anos e sou natural de São Vicente de Oleiros, arciprestado de Guimarães e Vizela. Neste momento, estou no 6.º ano, no Seminário Conciliar. Diz-nos o evangelho que Jesus «chamou à sua presença aqueles que entendeu e eles aproximaram-se.» (Mc 3, 13): Jesus mostrou-me o Seu chamamento de diversas formas. Inicialmente, aceitei e aproximei-me. Depois, com o avançar da idade, não correspondi ao chamamento e posso ter-me afastado um pouco. No entanto, Jesus não cessa de nos chamar e chegou uma altura em que tive de pensar realmente no que Jesus me chamava a fazer. Desde muito jovem, ingressei no grupo de acólitos da minha comunidade paroquial. A minha presença assídua nas eucaristias e a amizade, 10

que ao longo dos tempos, foi crescendo entre mim e o meu pároco (Pe. Manuel Oliveira) proporcionou que houvesse uma reflexão que eu sempre tentei esconder e muitas vezes oprimir. No entanto, após terminar o 9.º ano, pensei ingressar no Seminário mas, como todos os meus amigos e colegas de turma iam prosseguir os estudos e eu não me queria separar deles, entrei no Ensino Secundário no Curso Profissional de Técnico de Ótica Ocular. No final do 12.º ano, com a alegria de entrar no mundo do trabalho e de ganhar um pouco de autonomia, fiz um estágio profissional de meio ano e recebi a proposta de trabalhar numa loja de ótica. Com todos estes acontecimentos em catadupa, nem me lembrei desta «ocasião da graça que o Senhor deposita» nas minhas mãos. Mesmo assim,

Jesus não cessa de nos chamar, e algum tempo depois de estar a trabalhar, pela voz de um sacerdote amigo (Pe. Juvenal Dinis), surgiu novamente a questão: Queres conhecer o Seminário? Então, aí decidi ver como eram esses encontros de discernimento. Frequentei o Pré-seminário Adulto durante um ano e meio e depois tomei a decisão de entrar e de fazer esta caminhada, que não se faz sozinha, mas acompanhada pela oração e pelos colegas da comunidade. Com grande alegria, estou no sexto ano, como já o referi, e sinto a cada dia que passa que este é o chamamento que Deus me faz. Nos tempos em que vivemos, é verdade que os jovens são os protagonistas das suas escolhas. No entanto, um apelo deve ser feito às famílias para não serem um obstáculo, mas uma ponte. Uma ponte sólida entre o discernimento dos jovens e o apoio incondicional da família. As famílias devem proporcionar os melhores apoios para aqueles que estão a dar os primeiros passos e a tomar as primeiras decisões, cheios de dúvidas e impregnados de inseguranças. Aos jovens, simplesmente, digo: Questionai-vos! Questionai-vos sobre o que realmente Deus vos chama a ser. Para terminar, e como São João Paulo II disse no início de Pontificado: «não, não tenhais medo! Antes procurai abrir, melhor escancarar as portas a Cristo.»


PASTORAL UNIVERSITÁRIA

JOVENS UNIVERSITÁRIOS A CAMINHO DA JMJ 2023 UMA JORNADA REVITALIZADA PELO SNPES Raquel Madureira, Engenharia Física, Universidade do Minho

Depois de dois anos académicos subordinados à pandemia e, consequentemente, às aulas online e a reuniões à distância, o primeiro sábado de outubro deste ano foi uma lufada de ar fresco para muitos universitários que, desafiados a assumir a tarefa de preparação do Encontro Nacional de Estudantes Universitários de 2022, se fizeram à estrada até Fátima, juntamente com os representantes dos diversos serviços e movimentos de pastoral com assento no Serviço Nacional da Pastoral do Ensino Superior (SNPES), para a primeira reunião do ano deste serviço. Foi assim que cerca de 50 representantes e universitários, de diversas localidades do país, deram início aos trabalhos de um novo ano académico que será, de certeza, repleto de novos desafios e de experiências promissoras. As Jornadas Mundiais da Juventude (JMJ) de 2023 foram o tema central deste encontro, que contou com a presença de D. Américo, bispo auxiliar da Diocese de Lisboa e coordenar da JMJ, que, de forma desafiante, apelou à criatividade subversiva de cada um, num tempo em que a Igreja é chamada a refletir sobre a sua forma de evangelizar, citando Einstein: “Loucura é querer resultados diferentes fazendo tudo exatamente igual!”. Com estatísticas exigentes e pouco promissoras, refletiu-se ainda sobre o papel da Igreja no mun-

do universitário, cada vez mais tecnológico e desligado da mensagem que a Igreja tem para os universitários. É premente refletir sobre a necessidade de se cativar os jovens e de os levar a enamorar pela mensagem que Cristo lhes apresenta. As JMJ assumem, neste cenário, um papel fundamental no futuro da Igreja Católica em Portugal e uma oportunidade imperdível para todos os serviços e movimentos que trabalham com os universitários. A questão que se coloca e o desafio deixado aos serviços de pastoral universitária foi “O que é que nós podemos fazer para que se possam cativar mais jovens e, simultaneamente, criar um novo futuro para a Igreja?”. D. Américo reforçou a necessidade de se mudar a forma como é feita a comunicação, salientando que se devem trocar os cartazes afixados nos corredores da universidade pelas redes sociais, apostando assim no mundo tecnológico onde os jovens marcam presença. Antecipa-se a necessidade de se contrariar o costume e arris-

car em novas formas de comunicação e modelos de presença. As palavras de D. Américo interpelaram-nos ainda a pensar na necessidade de expandirmos o nosso olhar para tantos jovens que se encontram “fora do aquário” e que nunca tiveram a oportunidade de conhecer a mensagem de Cristo. Esta é a missão que cada um deve assumir, não só os serviços e movimentos, mas também nós, universitários, sendo essencial levar uma visão renovada e atual da Igreja, adequada à linguagem e às incertezas dos jovens universitários deste século. Maria levantou-se e correu apressadamente é o lema das próximas JMJ, escolhido pelo Papa Francisco, que mais uma vez coloca Maria como figura central. Aquela que nos ensina a dizer SIM. Por esse motivo, devemos encarar este desafio como a oportunidade perfeita para que muitos jovens possam também dizer “sim” ao caminho que Cristo lhes propõe e que cada um de nós possa revigorar a sua vontade de continuar a segui-l’O. 11


PASTORAL DE JOVENS

“LEVANTA-TE! EU TE CONSTITUO TESTEMUNHA DO QUE VISTE!” Departamento Arquidiocesano da Pastoral de Jovens

Os artigos publicados no “Voz de Esperança” seguem, ou não, o novo acordo ortográfico consoante a escolha dos autores.

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Que o Senhor vos conceda o Seu amor e Graça. O Papa Francisco, dando continuidade ao trabalho que tem vindo a ser realizado ao nível da Pastoral Juvenil, emitiu já a mensagem para as próximas JMJ. Nesta mensagem, o Papa declara-se agente ativo da pastoral e companheiro da juventude que, levantando-se do conforto do seu eu, assume o compromisso de viver autenticamente a fé professada, testemunhando, com a vida, a ação de Deus nas suas vidas. Nesta mensagem, o Papa alerta que os chamados a viver em comunhão com o Senhor Ressuscitado não são os santos, os puros, os perfeitos, mas aqueles que, como S. Paulo, são capazes de, tendo caído – levantarem-se e, reconhecendo a sua cegueira, fazer caminho e viver o encontro com Cristo, com voz missionária em todo o lugar em que se encontrem. O Departamento Arquidiocesano de Pastoral de Jovens faz, hoje, suas as palavras e o convite do Papa a todos os jovens da Arquidiocese, para que o pós-pandemia traga renovada força e juventude ao caminhar pastoral e de fé: «Hoje, o convite de Cristo a Paulo é dirigido a cada um e cada uma de vós, jovens: Levanta-te! Não podes ficar por terra a “lamentar-te com pena de ti mesmo”; há uma missão que te espera! Também tu podes ser testemunha das obras que Jesus começou a realizar em ti. Por isso, em nome de Cristo, eu te digo:

– Levanta-te e testemunha a tua experiência de cego que encontrou a luz, viu o bem e a beleza de Deus em si mesmo, nos outros e na comunhão da Igreja que vence toda a solidão. – Levanta-te e testemunha o amor e o respeito que se podem estabelecer nas relações humanas, na vida familiar, no diálogo entre pais e filhos, entre jovens e idosos. – Levanta-te e defende a justiça social, a verdade e a retidão, os direitos humanos, os perseguidos, os pobres e vulneráveis, aqueles que não têm voz na sociedade, os imigrantes. – Levanta-te e testemunha o novo olhar que te faz ver a criação com olhos cheios de maravilha, te faz reconhecer a Terra como a nossa casa comum e te dá a coragem de defender a ecologia integral. – Levanta-te e testemunha que as existências fracassadas podem ser reconstruídas, as pessoas já mortas no espírito podem ressuscitar, as pessoas escravizadas podem voltar a ser livres, os corações oprimidos pela tristeza podem reencontrar a esperança. – Levanta-te e testemunha com alegria que Cristo vive! Espalha a sua mensagem de amor e salvação entre os teus coetâneos, na escola, na universidade, no trabalho, no mundo digital, por todo o lado.»

Propriedade do Seminário de Nossa Senhora da Conceição

Rua de S. Domingos, 94 B 4710 - 435 Braga Telf: 253 202 820 | Fax: 253 202 821 www.fazsentido.pt seminariomenor@fazsentido.pt vozdeesperanca@fazsentido.pt N.º de Registo: 1152 88 Depósito Legal N.º 40196/91 Tiragem: 4000 Exemplares


SUPLEMENTO


No caminho do Seminário Estamos a celebrar os 450 anos de existência dos nossos seminários. Uma longa história, uma grande responsabilidade. Não é fácil entrar em tudo o que aconteceu ao longo de tantos anos. Sabemos, porém, o que poderá acontecer no momento que nos é dado a viver. Foram muitos os que acolheram o apelo de Deus e por cá passaram anos. Muitos, graças a Deus, acolheram o encargo de continuarem a tarefa de serem evangelizadores alegres do Reino. Alguns têm o seu processo de canonização introduzido pelo modo como viveram a sua fidelidade sacerdotal. Outros, dispersaram-se pelos quatro cantos da Arquidiocese com uma área muito superior à actual, e silenciosamente, foram semeando a semente do amor de Deus. Outros, na coerência da sua liberdade, ousaram abandonar, mas desempenharam papéis de compromissos sociais para o bem comum. Sem descer a mais pormenores, quero aproveitar este momento para proclamar que o Seminário será sempre um espaço acolhedor para os jovens que sonham com um mundo diferente. Sei que é mais cómodo ser como a maioria. Acomodar-se à corrente do mais fácil e esperar que o mundo decorra ao seu ritmo, sem qualquer vontade de lhe acrescentar uma marca pessoal. Nesta Semana dos Seminários, gostaria de fazer eco das palavras de Cristo, alertando para a grandiosidade da messe do Senhor mas, sobretudo, para a sublimidade em trabalhar nela. Aos jovens apetece-me gritar que não tenham medo, pois quando um ideal é exigente também se torna apaixonante. Sei que haverá sempre razões para as dúvidas ou desistências. Cortai as amarras e lançai-vos nesta aventura de serdes pescadores de homens. Aos párocos das comunidades, peço que readquiram o hábito do chamamento personalizado sem medo nem hesitações. Os resultados podem parecer poucos. Chegará sempre a hora da graça. Aos movimentos, alerto que o seguimento de Cristo deve significar apontar horizontes que testemunhem adesão ao projecto sonhador de Cristo de ver um povo congregado em torno da mesma fé por causa da dedicação incondicional de homens ao serviço do Reino. Aos pais de família, verdadeiros educadores para a felicidade autêntica, aconselho a que não hesitem em propor caminhos que podem ser diferentes mas que oferecem a felicidade a quem os percorre e a quem com eles cresceram no aconchego familiar. Regressando à celebração dos 450 anos dos nossos seminários, ouso recordar que o melhor modo de a viver consiste neste colocar o seminário como coração da Diocese, em tudo aquilo que ela é e em todas as suas estruturas. Como já é costume referir, não basta que este ano se torne um evento de muitos acontecimentos. Importaria que neste processo sinodal, em que toda a Arquidiocese está a peregrinar, o Seminário faça parte dele nas preocupações, nos sonhos, nos compromissos. Que, na verdade, esteja presente. Não se trata de uma alínea opcional. Sei que o Espírito Santo quer dizer a todos os arquidiocesanos que sem seminário não há Igreja. Foi assim no passado. Será assim no futuro. Sem jovens disponíveis e prontos para caminhar, nada realizaremos. É trabalho meu e de todos. Exige oração e compromisso. A voz de Cristo será ouvida. Caminhemos todos com os seminários. Intuindo, no Espírito, o que devem ser. Procuremos dar-lhe o rosto atractivo e motivador. O Reino crescerá segundo o projecto de Deus.

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Semana dos Seminários 2021 Decorre de 31 de Outubro a 07 de Novembro de 2021 a Semana dos Seminários que este ano tem por tema: «Estabeleceu doze para estarem com Ele e para os enviar a proclamar» (Mc 3, 14). A Semana dos Seminários deve ser momento para olharmos com amor e ternura para o coração da nossa Diocese onde jovens de diversas comunidades vão fazendo caminho de descoberta da vontade de Deus. “Esta semana é oportuna para reconhecer que os seminários são instituições marcantes em cada diocese. São lugares que evocam memórias únicas, momentos e vivências inesquecíveis do percurso pessoal e da história das Igrejas locais.” (Mensagem para a Semana dos Seminários 2021). E este ano queremos que esta Semana tenha um impacto especial no nosso Arciprestado de Terras de Bouro. A presença do Seminário (equipas formadoras e seminaristas) deve ser momento para cada comunidade tomar consciência que todos estamos implicados neste acompanhamento vocacional dos nossos jovens. Devemos estar atentos aos pequenos sinais para que, com a ajuda de cada um, os nossos jovens possam colocar com seriedade esta questão da vocação. Só uma comunidade unida e atenta, que reza pelas vocações e acompanha cada jovem com especial delicadeza, pode ser viveiro de vocações. Faço votos que esta Semana dos Seminários seja vivida com intensidade em cada comunidade e por cada cristão do nosso Arciprestado de Terras de Bouro para que produza abundantes frutos nas nossas comunidades e na nossa Igreja diocesana. Pe. Almerindo Costa, Arcipreste Terras de Bouro

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Evangelho e ensinamentos de Jesus são como um guia JOSÉ CARLOS, MÓNICA, GONÇALO E GUSTAVO

O que viram na proposta Cristã que a faz ser a principal bússola da vossa família? Para nós, os princípios cristãos vinculados pelo evangelho e ensinamentos de Jesus são como um guia que nos ajuda a lidar com os desafios diários da nossa vida e dos nossos filhos. Ou seja, poderíamos dizer que bastavam ser uma bússola, no entanto a bússola só aponta o caminho, mas quando nos deparamos com um obstáculo ela não pode ajudar, aí é necessário recorrer a outra ajuda. E é nos ensinamentos cristãos que podemos encontrar a ajuda para transpor o obstáculo. Assim, na proposta cristã tentamos encontrar os princípios e valores que nos guiam nos convívios e interação com os outros e nas nossas decisões do dia a dia. Orienta-nos na diferenciação entre o bem e o mal, o certo e o errado, é o nosso modelo de moral e dos valores éticos e atitudes sobre a vida. Porque até o melhor navegador tem de recorrer a determinados instrumentos para o ajudar na sua navegação. Estamos conscientes que o que aprendemos com as práticas cristãs que assistimos ou nos foram incutidas, revelam os princípios necessários para navegarmos pelas dificuldades com que nos deparamos. Orientam-nos como reagir diante dos obstáculos e encruzilhadas do nosso dia a dia, não nos deixando sem a tal bússola que só orienta. Ainda mais nos tempos de hoje, que somos confrontados e envolvidos pelo anticristianismo comum na nossa sociedade. Tentamos seguir as palavras que Jesus proferiu “Eu sou o caminho”. No nosso caso, podemos afirmar que estas diretrizes que vamos buscar aos ensinamentos cristãos, foram facilitadas por termos crescido no seio de famílias verdadeiramente cristãs. As quais nos incutiram, desde o nascimento, os verdadeiros valores da vida. Por isso, consideramos que temos uma grande missão em ensinar aos nossos filhos os princípios cristãos para que eles também encontrem solução para as dificuldades e encruzilhadas das suas vidas que agora estão a iniciar. Na vossa opinião, quais são as dificuldades que mais afetam as Famílias Cristãs? Sendo a família o pilar básico da nossa sociedade, na nossa opinião a maior dificuldade que as Famílias Cristãs encontram é a luta em manter os valores cristãos, invioláveis e imutáveis, presentes numa cultura e sociedade voltada para a vivência sem Deus. Uma outra dificuldade para as famílias cristãs prende-se com a falta de dedicação do pai e mãe à família, principalmente aos filhos, por questões de trabalho. Em muitos casos o trabalho passou a ser o principal decisor no seio familiar e os valores cristãos deixam de estar presentes na família. Uma outra dificuldade que apontamos é a falta de comunicação e diálogo entre os membros familiares. As novas tecnologias vieram tirar 4

e substituir a conversa familiar, e sem esta conversa deixou de se transmitir os valores que Jesus nos ensinou. O nosso desafio passa por mantermos vivos esses valores e o conceito de família deixados por Jesus, numa sociedade em que nos tentam impor novos conceitos e valores. Não podemos deixar que esses novos ensinamentos ou pseudovalores comecem a tornar-se naturais, também, para nós e passarmos a pensar como outos pensam e afastarmo-nos de Deus. Como reagiriam se um dos vossos filhos decidisse fazer uma experiência vocacional no seminário? Apresentam essa possibilidade na educação dos vossos filhos? Nunca diríamos como num testemunho que lemos de um rapaz que frequentava o seminário, no qual disse: “quando contei aos meus pais que queria ir para o seminário, a minha mãe disse- me, se soubesse que iria dar nisso jamais te levaria aquela oração pelas vocações”. Deste modo, se um dos nossos filhos quisesse fazer uma experiência vocacional no seminário, nesse momento, estaríamos sempre ao seu lado na sua escolha. Nós, como pais, devemos alertar os nossos filhos que em qualquer opção de vida temos que fazer escolhas e abdicações. Defendemos também que para se descobrir a vocação é necessário experimentar. Por isso, temos que saber oferecer todas as possibilidades para desta forma descobrirem o que realmente os faz felizes. É nosso propósito dar-lhes a conhecer histórias de Padres que tiveram um papel relevante e inspirador na vida dos jovens e da igreja, como o Santo João Paulo II e o Papa Francisco que impulsionaram os jovens para uma Fé mais viva. Lembraremos sempre aos nossos filhos as palavras do Papa Francisco “Queridos jovens, (…) A Igreja precisa do vosso ímpeto, das vossas intuições, da vossa fé...E quando chegardes aonde nós ainda não chegamos, tende a paciência de esperar por nós”.


m e v o J Quem és? Chamo-me Diogo Manuel Machado da Rocha, natural de Braga, do conselho de Terras de Bouro e da freguesia de Rio Caldo. Atualmente estudo na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, no curso de Direito, e tenho 19 anos.

Ao longo da tua caminhada de fé, sentes que fostes alguma vez desafiado (catequese, família) a discernir a tua vocação e tomares uma opção de vida à qual te sentisses chamado por Deus? Ao longo do meu percurso pela caminhada da fé, fui por vezes tentado a seguir uma opção de vida ligada ao chamamento de Deus, tanto pela minha família, especialmente as minhas avós, que desde novo sempre tiveram o gosto de compartilhar comigo a fé que sentiam por Deus. Como também na catequese, especialmente pela minha catequista, que que sempre foi capaz de cativar os seus catequizandos para a fé em Deus, que para além do ensinamento da doutrina cristã, compartilhando o seu testemunho e o seu percurso de fé, embutiu princípios morais pelos quais ainda hoje pauto a minha conduta. Todas estas experiências foram essenciais para descobrir o verdadeiro caminhar da minha fé, como pessoa e como cristão, contribuindo não só para o meu crescimento espiritual, mas também para o meu desenvolvimento moral e intelectual. Que perceção têm os jovens sobre esta opção pelo sacerdócio? O que conheces sobre o processo de discernimento oferecido pelo seminário? Hoje em dia, sobretudo ligado ao contexto em que vivemos e estamos inseridos na sociedade, é muito difícil um jovem largar tudo para seguir o sacerdócio. Pois, desde novos os jovens são sobrecarregados com a responsabilidade e preocupação de ter sucesso escolar para futuramente ingressar num curso universitário, para poderem ter uma vida financeiramente estável, e através deste padrão embutido pela nossa sociedade os jovens acabam por deixar a sua vida espiritual em segundo plano. Assim, não têm tempo para explorar os caminhos da fé cristã, para em seguida ingressar no sacerdócio. Também é importante referir o receio, ou até mesmo o medo, que os jovens sentem ao optar por uma vida ligada a Deus, pois muitas vezes questionam-se sobre a dimen-

são do chamamento que sentem em seguir os caminhos da fé, deixando a sua vocação de parte. Relativamente ao ingresso em um seminário, é uma decisão extremamente difícil de ser tomada por um jovem, uma vez que este processo é visto sem a possibilidade de desistir. Ou seja, o processo de discernir é extremamente mal compreendido e interpretado pela maior parte da sociedade, sendo visto como um sinal de fracasso ou até mesmo de renúncia a Deus. Sendo que, na realidade, os factos têm de ser interpretados de outra forma, uma vez que não entram para o seminário apenas jovens que têm a certeza que querem ser sacerdotes, pois o seminário não tem apenas a função de formar sacerdotes. Por esta razão, há jovens, que não tendo certeza de que caminho querem seguir, ingressam no seminário para ver se realmente é aquela a sua vocação, acabando por ficar lá um ou mais anos ou até acabando por fazer a opção pelo sacerdócio. Estes anos em que os jovens ficam no seminário e acabam por posteriormente seguir outro caminho não são anos perdidos, uma vez que contribuem para uma formação intelectual, humana e espiritual de que o jovem beneficiará para o resto da sua vida.

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a t s i r a n i m Se

o ã o J Abrir o coração ao chamamento de Deus é estar atento à Voz, que ecoa no íntimo do ser. Inumeráveis vezes, Ele toca o ser humano, para o chamar a uma vocação. É aqui, que revejo toda a caminhada vocacional, que discerni, até hoje. Oriundo de uma família católica, vivi sempre ligado à Igreja, nas diversas atividades, que a minha paróquia proporcionou. Com isto, mesmo sendo traquina, nunca deixei de escutar as vozes que me falavam de Jesus. Ora, foi nesse ambiente familiar que tudo começou. Em pequenos gestos e em frases marcantes, sentia que Deus despertava em mim algo que desconhecia, mas que queria descobrir. Partindo dessa inquietação e de um convite certeiro, do meu pároco, para visitar o Seminário, vislumbrei que Deus queria que fosse mais além, na resposta ao pedido que me fazia. Amedrontavam-me dúvidas, mas mesmo nelas mergulhado, resolvi confiar na Voz, que me enchia ternamente o coração. Com apoio total da família, essencial nas decisões que tomei, chegara a hora de dizer sim, à derradeira pergunta: “João, queres entrar no seminário?”. Dado o passo fundante, na iniciação de um discernimento vocacional, que se distende a toda a vida humana, compreendi que não tinha encontrado respostas para as profundas inquietações. No entanto, a Luz que se acendera dentro de mim, fez-me ver que o caminho que iniciara era a verdadeira reação à chamada de Deus. Deste modo, com a ajuda de oração e de uma comunidade, que são fulcrais no crescimento espiritual, fui notando que o pedido de Jesus, para ser feliz, ganhava cada vez mais corpo. Vividos longos anos, à escuta dos sinais de Deus, que vêm das mais variadas formas, chegara a hora de responder à pergunta mais importante de todas: “João, aceitas seguir Jesus, no ministério sacerdotal?”. A minha resposta será sempre um sim no Amor, enquanto o meu coração pulsar ao ritmo de Deus.

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Testemunho Sou Padre, e agora? Sou padre e o caminho continua... a descoberta da nossa vocação não fica resolvida com a ordenação. Não é um assunto que fica guardado na gaveta... É preciso continuar a alimentar e, muitas vezes, voltar às origens... É sempre bom recordar como tudo começou, perceber como Deus nos chamou e nos chama a partir dos pequenos sinais, dos rostos concretos, das experiências e dos acontecimentos que à primeira vista nada têm a ver com um chamamento...

Recordo-me perfeitamente: estava no 7º ano e, na conversa do nosso grupo de amigos, surgiu o tema do seminário. Um colega, o João, queria frequentar os encontros de pré-seminário, mas não queria ir sozinho, então lança o desafio ao grupo. Nestas coisas é sempre assim... Falei com o meu pároco e começamos, os dois, a frequentar esses encontros mensais, que me fizeram conhecer melhor aquela casa, levando-me essa descoberta a entrar no seminário para o 9º ano. Ao longo do tempo, fui percebendo que o seminário não era apenas uma casa que formava padres, mas é acima de tudo um tempo e um espaço que pretende formar jovens, ajudando-os a lidar com algumas questões, abrindo horizontes e apontando caminhos, mas sem decidir por ninguém. Após 4 anos de seminário menor, terminando o 12º ano, fui para o seminário maior, onde comecei a formação de preparação para o sacerdócio. Este, foi um tempo de grande amadurecimento vocacional e crescimento humano, até ser ordenado padre, no passado dia 18 de julho. Olhando para trás, encontro no rosto daqueles que me acompanharam a presença de Deus que faz da descoberta da minha vocação a realização de um projeto de felicidade, que está sempre em construção, para a minha vida. Por isso, não vejo este processo como terminado, mas sinto que o chamamento de Deus se vai renovando, diariamente, nos rostos com quem nos cruzamos, na missão que desempenhamos e na nossa relação com Deus.

Sacerdote O que o seminário representa para ti? O Seminário é a casa onde são acolhidos e acompanhados aqueles que procuram discernir o chamamento do Senhor para O seguirem enquanto padres. É no seminário que a vocação sacerdotal é aprofundada através das diferentes experiências e componentes formativas que o seminário proporciona. Desde a convivência diária entre seminaristas e formadores, até ao estudo da teologia, passando pelas outras vertentes da formação, como a formação espiritual, tudo contribui para que aquele que se sente chamado a ser padre possa fazer a sua escolha de uma forma livre e ponderada. Mesmo tendo ingressado no seminário numa fase mais adulta da vida, aos 28 anos, o seminário foi, para mim, um momento de grande crescimento humano, espiritual e intelectual. Ainda que não tivesse decidido dar o passo para a ordenação, o que não aconteceu, a passagem pelo seminário seria sempre um momento marcante na minha vida. Quais as maiores dificuldades que encontras quando desafias os jovens a um processo de discernimento no pré-seminário? As maiores dificuldades passam por mostrar que a vocação sacerdotal não é algo do passado. Muitas pessoas pensam que o padre é uma pessoa solitária e infeliz, preconceito que impede os jovens de hoje de procurarem conhecer esta vocação. Penso ainda que alguns exemplos de contratestemunho cristão contribuem para o afastamento dos jovens. Deus continua a chamar. Que transformação nos estará a pedir também a nós sacerdotes? Em meu entender aquilo que continua a levar os jovens a se questionarem sobre a vocação presbiteral é o exemplo de vida dos padres. Nesse sentido, considero que no mundo atual um estilo de vida simples e sóbrio, atento às necessidades dos outros, empenhado em promover o bem comum das pessoas, sem excluir ninguém, é a postura que continuará a interpelar os jovens. Por isso, o desafio para os padres passa por uma fidelidade cada vez maior ao Evangelho, a qual deve ser discernida na oração para que seja demonstrada em gestos concretos de caridade. 7


Oração Senhor Jesus, a Tua Igreja, em Sínodo, dirige o olhar para os adolescentes e jovens. Pedimos-Te que lhes concedas a coragem decidida de contemplar as realidades mais belas e mais profundas da vida e de conservar sempre um coração livre. Ajuda-os a responder ao chamamento que Tu diriges a cada um deles, conscientes de que os chamas para permanecerem Contigo e serem sempre enviados. Senhor Jesus, rogamos-Te que concedas aos seminaristas amor à vocação e a graça do compromisso de fidelidade ao Evangelho. Senhor Jesus, ilumina, com os dons do Espírito Santo, os formadores, recompensa e abençoa os benfeitores, ampara o nosso Bispo e os nossos padres, para que sejam sempre fiéis ao dom do seu sacerdócio.

Como Igreja, em Sínodo, nós Te rogamos que concedas às famílias a ousadia de Te proporem como caminho, verdade e vida. Senhor Jesus, com a intercessão e amparo de Maria e de José, continua a oferecer à Igreja vocações sacerdotais fiéis, felizes e fiáveis e faz dos nossos seminários comunidades de discípulos, onde se vive a comunhão, a participação e a missão. Ámen!


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