Curso: O pensamento de Bourdieu Professor: Clóvis de Barros Filho Número de aulas: 5
Aula 1: O Campo Social Páginas: 35
que os japoneses tão se preparando e que eu tinha que vencê-los. Se eles chegavam às cinco eu chegava também, e ficávamos das cinco as nove esperando a aula começar. E é claro que a história que eu conto no artigo é a história de uma frase que ele falou, porque, ele pode te socar, te humilhar, porque toda vez que você não entende é humilhante. Eu me sinto assim, humilhado, burro. Mas tem uma hora que você pega o peão na unha e diz: “Não, não é possível, eu tenho que entender. Eu não sou tão burro assim”. E a frase dele, que eu certamente já citei várias vezes, e vou retomar aqui no curso era assim: “Os circuitos de consagração social serão tanto mais eficazes, quanto maior a distância social do objeto consagrado”. Você pode imaginar que ele falou isso no meio de outra como quem diz: “Vou tirar a cueca porque me sujei todo”. Ele falou isso como se fosse a coisa mais óbvia do mundo, e continuava com outra pior. E eu dizia: “Pô! Mas não é possível.” Eu gravava a porra, transcrevia, levava pra casa e aí tentava lê: “os circuitos de consagração...” Não era possível. Tentava de todo jeito, lê devagar e aí já tinha esquecido o começo. Ou então tentava lê como ele falava, é, de forma pedante, um pouco como o Fernando Henrique dizia, como se fosse óbvio, né? E também não entendia porra nenhuma. Aí teve um dia, já que eu tava mesmo lá na frente dele, eu não tava no telão, terminou a aula eu levantei a mão. Nossa! Só Bourdieu pra explicar a heresia do gesto. Só Bourdieu pra explicar o quanto eu não deveria ter feito. Só Bourdieu pra explicar a falta de capital simbólico que me autorizaria a levantar a mão. Só Bourdieu pra entender o peso social daquele gesto. Só Bourdieu pra explicar o quanto eu devia ter ficado quieto. Mas como eu não tinha nada a perder e Bourdieu explica isso também, afinal de contas ninguém me conhece, eu levantei a mão, ele já tava indo embora, aí ele viu aquilo e ele levou três segundos pra encaixar o golpe: “Quem que é esse bosta, quer fazer alguma pergunta”. Ah, como
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