TAIANA MACHADO ÁREA DO CONHECIMENTO: LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS 1
MANUAL DO PROFESSOR
MARIA BEATRIZ ALVES MEIRA
Graduada em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP). Foi professora assistente na Universidade Católica de Santos (UniSantos-SP) e no curso de Multimeios da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Trabalhou como ilustradora, artista gráfica e cenógrafa em projetos na área de Educação e Teatro. Foi coordenadora pedagógica na Universidade das Quebradas, curso de extensão da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Autora de livros didáticos e paradidáticos na área de Arte.
RAFAEL VICENTE FERREIRA
Bacharel em Artes Cênicas pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Artes, na área de Arte e Educação, pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Pós-graduado em Roteiro para Cinema e Televisão pela Faculdade Armando Alvares Penteado (Faap-SP). Atuou como professor de teatro e percussão em escolas públicas e particulares, cursos técnicos, faculdades e contextos de educação não formal. Realizou oficinas em Centro de Atenção Psicossocial (Caps) e no Serviço de Medida Socioeducativa em São Paulo. Teatrista do Coletivo de Galochas. Autor e ilustrador de livros nas áreas de Narrativa e Teatro.
SILVIA CAMARA SOTER DA SILVEIRA
Bacharela em Comunicação Visual pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e Licenciada em Dança pela Universidade de Paris VIII. Mestre em Teatro pelo Centro de Letras e Artes da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio-RJ). Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Dramaturgista, pesquisadora e professora da Faculdade de Educação da UFRJ. Organizadora e autora de diversas publicações na área de Corpo e Dança.
TAIANA DE ARAÚJO MACHADO
Licenciada em Música pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio-RJ). Mestra em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professora em escolas particulares e em projetos culturais na rede municipal do Rio de Janeiro. Professora associada ao Instituto d’O Passo. Preparadora vocal e professora de canto em grupos teatrais e corais.
ÁREA DO CONHECIMENTO: LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS 1
Gerência editorial Roberto Henrique Lopes da Silva e Nubia de Cassia de M. Andrade e Silva
Edição Renato Vieira Malkov (coord.)
Francielle Batista de Carvalho, Sarita Borelli
Preparação e revisão Maria Clara Paes (coord.)
Ana Carolina Rollemberg, Cintia R. M. Salles, Denise Morgado, Desirée Araújo, Eloise Melero, Kátia Cardoso, Márcia Pessoa, Maura Loria, Veridiana Maenaka, Yara Affonso
Produção de conteúdo digital João Paulo Bortoluci
Gerência de produção e arte Ricardo Borges
Design Andréa Dellamagna (coord.)
Sergio Cândido (criação), Ana Carolina Orsolin, Everson de Paula
Projeto de capa Sergio Cândido
Imagem de capa Igor KlimoV/Shutterstock.com
Arte e produção Rodrigo Carraro Moutinho (coord.)
Raquel Coelho
Diagramação Lima Estúdio Gráfico
Coordenação de imagens e textos Elaine Bueno Koga
Licenciamento de textos Erica Brambilla
Iconografia Danielle de Alcântara Farias, Leticia dos Santos Domingos (trat. imagens)
Ilustrações Joana Resek, Maira Martines
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Meira, Maria Beatriz Alves [et al.]
360º Arte: volume único: Maria Beatriz Alves Meira [et al.]. 1. ed. São Paulo: FTD, 2024.
Componente curricular: Arte. Área do conhecimento: Linguagens e suas Tecnologias. Outros autores: Rafael Vicente Ferreira; Silvia Camara Soter da Silveira; Taiana de Araújo Machado.
ISBN 978-85-96-04678-7 (livro do estudante)
ISBN 978-85-96-04679-4 (manual do professor)
ISBN 978-85-96-04680-0 (livro do estudante HTML5)
ISBN 978-85-96-04681-7 (manual do professor HTML5)
1. Arte (Ensino médio) I. Meira, Maria Beatriz Alves. II. Ferreira, Rafael Vicente. III. Silveira, Silvia Camara Soter da. IV. Machado, Taiana de Araújo.
24-228212
CDD-700 Índices para catálogo sistemático:
1. Arte : Ensino médio 700
Cibele Maria Dias - Bibliotecária - CRB-8/9427
Reprodução proibida: Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. Todos os direitos reservados à
EDITORA FTD
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Em respeito ao meio ambiente, as folhas deste livro foram produzidas com fibras obtidas de árvores de florestas plantadas, com origem certificada.
Impresso no Parque Gráfico da Editora FTD CNPJ 61.186.490/0016-33
Avenida Antonio Bardella, 300 Guarulhos-SP – CEP 07220-020 Tel. (11) 3545-8600 e Fax (11) 2412-5375
APRESENTAÇÃO
Estudante,
Nos tempos atuais, em que o aprender e o ensinar acontecem de forma cotidiana, por meio de variados encontros presenciais e virtuais, o Ensino Médio é o momento de se aprofundar em diversos saberes e tomar decisões que orientarão seu futuro.
Nesse contexto, o componente curricular Arte pode adquirir um significado especial ao trazer, para o ambiente escolar, reflexões, sensibilizações, experiências e produções transformadoras.
A fim de explorar diversas linguagens artísticas – artes visuais, dança, música, teatro e artes integradas –, examinamos as nossas matrizes estéticas, a história da arte brasileira e as manifestações culturais contemporâneas.
Esses eixos são desenvolvidos por meio de painéis de contextualização e criação, pesquisas, teorias, técnicas e experimentações práticas, além de propostas de integração com as demais áreas de conhecimento, o que garante uma abordagem multifacetada e plural para a produção de conhecimentos que compõem o componente curricular Arte no Ensino Médio.
Convidamos você a olhar, escutar, ler, sentir e tomar este livro como uma oportunidade para conhecer um pouco mais de si mesmo, da sociedade da qual faz parte e do mundo em que vive.
Boa jornada!
Os autores
CONHEÇA SEU LIVRO
ABERTURA DE CAPÍTULO
Contém imagens que contemplam as linguagens artísticas que serão estudadas ao longo do capítulo. Cada imagem traz uma obra ou manifestação artística e é acompanhada de um texto sintético com provocações, ideias e proposições.
INTRODUÇÃO: O QUE É CULTURA E O QUE É ARTE?
Explora os conceitos de arte e cultura. Propõe o início de um percurso formativo e criativo em Artes.
ABERTURA DE UNIDADE
Apresenta propostas de reflexão sobre o tema central que será desenvolvido ao longo dos capítulos que compõem a Unidade.
INTRODUÇÃO AO
CAPÍTULO
Contém texto, imagens e registros de manifestações artísticas ligadas ao tema central do capítulo. A Introdução encerra com uma Atividade de sensibilização, que propõe uma aproximação com o tema por meio de experimentações práticas.
CONTEXTO
Apresenta uma contextualização histórica, social e cultural que desdobra o tema do capítulo, direcionando a reflexão para uma ou duas linguagens artísticas. É seguido de Repertório, Pesquisa, Teorias e modos de fazer e Ação, com três ocorrências desse conjunto por capítulo.
Cultura e arte são fenômenos diferentes que, algumas vezes, podem ser confundidos.
A palavra cultura pode ser definida como a maneira pela qual uma sociedade se estrutura e se comporta, incluindo o que ela produz. A cultura é um fenômeno integral, que abrange tudo o que uma coletividade é e faz. Trata-se do patrimônio material e intelectual compartilhado por um grupo social, recriado e transmitido no decorrer do tempo. A cultura engloba linguagens, comportamentos, símbolos, técnicas, objetos, ideias, regras, crenças, em suma, todas as realizações materiais e imateriais que se transmitem de geração em geração e atravessam o cotidiano de cada indivíduo inserido em um grupo social. Cada cultura tem elementos específicos, particularmente aqueles que unem uma comunidade a seu território e a seus ancestrais. Entretanto, aspectos culturais de um grupo social podem se difundir para seus vizinhos ou mesmo para povos que vivem em regiões distantes, por meio, por exemplo, da atividade comercial ou de redes de comunicação. Desse modo, elementos de uma cultura acabam sendo assimilados por outra, o que contribui para transformar a vida social de diferentes grupos. Por meio desse processo, invenções, como a roda, ou sistemas políticos, como a democracia, que nasceram em determinada cultura, puderam se difundir pelos mais diversos lugares do mundo.
PAULO
BRUSCKY
É preciso ressaltar, porém, que as relações culturais, na maioria das vezes, são atravessadas por relações de poder e, consequentemente, são marcadas por preconceitos e discriminações. Isso se expressa, especialmente, na relação de culturas ocidentais hegemônicas, como as europeias e a estadunidense, com as demais culturas do globo, incluindo a brasileira e a latino-americana.
Com a revolução digital, um processo recente diante da extensão da história da humanidade, o impacto das culturas ocidentais hegemônicas, que já era grande, tornou-se enorme. Ao mesmo tempo, de maneira contraditória, essa cultura globalizada estimulou a luta pela preservação de modos de vida locais.
A cultura digital propiciou novas formas de articulação entre pessoas de uma mesma sociedade e de sociedades muito diferentes. Além disso, facilitou o aparecimento de novas cenas artísticas, com vozes, olhares e gestos mais livres e diversos, e com novos padrões estéticos multifacetados. Também expôs as relações de disputa e de influência e as trocas que as diferentes culturas estabelecem entre si.
Definir o que é arte, por sua vez, é bem mais complicado do que definir o que é cultura. Alguns artistas são reconhecidos por grande parte da humanidade como tais. Olhando para a história, constata-se que algumas obras, na chamada cultura ocidental, promovidas pelo sistema de colonização cultural, tiveram tamanha força que influenciaram o comportamento de diferentes sociedades ao longo do tempo, tornando-se modelos do que seria “a grande arte”, ou seja, os cânones.
Nas últimas décadas, no entanto, esses modelos têm sido questionados, e a criatividade e a diversidade passaram a guiar a atividade artística ao redor do mundo. Hoje, entende-se a arte como um processo que se manifesta de formas variadas em todas as comunidades. Mais importante que louvar uma grande arte ou eleger cânones, é estimular processos artísticos em diferentes grupos e contextos sociais, como em uma comunidade ou na escola.
Uma estratégia para se aproximar da arte é fruí-la, observá-la, escutá-la e tentar alcançar uma compreensão do contexto em que foi concebida. Você está pronto para estudar, fruir e produzir arte?
Em vez de discorrer sobre os critérios utilizados para definir a arte no transcurso da história, considere as perguntas feitas pelo artista pernambucano Paulo Bruscky: o que é arte? Para que serve?
A proposta é que você leve essas perguntas com você no decorrer de todo o Ensino Médio, refletindo, discutindo e questionando-se durante o caminho. Em arte, o melhor é guiar-se por incertezas.
hegemônico: neste contexto, refere-se a um ou mais grupos sociais com a capacidade de dominar outros, por meios políticos, econômicos e/ou culturais.
1. Respostas pessoais. Verifique quem são os artistas que pertencem ao universo cultural da turma, se há artistas que são referência para vários estudantes ou se cada um deles tem suas próprias referências. Se você ainda não conhece, procure conhecer a produção dos artistas apontados pela turma. Reconhecer a cultura juvenil é fundamental para tornar a escola um espaço legítimo de troca. Explore também as diferentes linguagens artísticas, explanando para os estudantes que o componente curricular Arte é composto de cinco
Paulo Bruscky (1949-) é um artista multimídia brasileiro. Na década de 1970, desafiou a ditadura civil-militar, realizando trabalhos questionadores e provocantes. Na performance documentada nesta fotografia, Bruscky sentou-se em uma livraria na cidade do Recife, portando uma placa com os dizeres: “O que é a arte? Para que serve?”.
linguagens, ou unidades temáticas: artes visuais, música, dança, teatro e artes integradas.
Registro fotográfico da performance
O que é arte? Para que serve?, de Paulo Bruscky, no momento em que o performer está sentado no banco de uma livraria de Recife (PE). Fotografia de 1978.
D epois de ler o texto, observar as imagens da intervenção artística de Paulo Bruscky e refletir sobre os conceitos de cultura e de arte, converse com o professor e os colegas sobre as questões a seguir.
1 Quem são os artistas e quais são as obras de que você mais gosta? A quais linguagens artísticas esses exemplos pertencem – artes visuais, música, dança, teatro, artes integradas?
2 Q ue exemplos de obras e manifestações artísticas você apontaria para caracterizar a arte brasileira?
3 O que é cultura e arte para você?
Resposta pessoal. Explore com a turma a noção de brasilidade, isto é, aquilo que evoca uma noção de Brasil, investigando o que torna uma obra ou manifestação artística, na perspectiva dos estudantes, característica da arte brasileira. É possível que apareçam, entre os exemplos, atores de televisão, artistas de internet, músicos populares regionais ou nacionais, artistas visuais, fotógrafos ou grafiteiros.
3. Resposta pessoal. Incentive os estudantes a expor suas conclusões, arriscando formulações sobre o que é cultura e o que é arte, e qual a diferença entre os dois termos. O objetivo não é sedimentar uma noção fechada para esses termos, ao contrário, a ideia é explorar os múltiplos significados que os conceitos de arte e cultura carregam.
Para finalizar a introdução, escreva uma carta partindo das perguntas: o que é arte? Para que serve? Reflita sobre sua compreensão do que é arte e do que é cultura.
Essa carta é endereçada para você mesmo. Pense nesse texto como uma cápsula do tempo: no final do Ensino Médio, ele deverá ser retomado. Portanto, depois de escrita, guarde a carta com você em um lugar seguro. Ela ficará lá, esperando por você, até sua última aula de arte dessa etapa da sua escolarização. Antes disso, no entanto, faça um registro digital de seu texto, tirando uma fotografia e guardando-a em um ambiente virtual.
Quando você reler a carta, será possível comparar sua atual compreensão do que é arte e cultura com a concepção que terá no final da sua jornada no Ensino Médio.
Ao longo do percurso sugerido nas páginas deste livro, você vai aprender e produzir muitas coisas. Então, fique atento para guardar e organizar seus trabalhos e suas ideias em um arquivo seguro. Esse arquivo pode ser uma pasta física ou uma pasta digital, onde será possível salvar fotografias, vídeos, gravações sonoras e demais registros pertinentes que possam materializar o acúmulo da sua produção. As duas versões devem funcionar como um portfólio, com a memória de toda a sua produção nas linguagens de artes visuais, dança, música, teatro e artes integradas.
A importância de sistematizar essa produção é constituir uma memória do seu aprendizado. Reunir as diferentes produções e olhar para elas ao longo do tempo, relacionando técnicas, conceitos e elementos estéticos, pode ser, inclusive, uma forma de produzir conhecimentos. Para alguns artistas, construir um arquivo, manipulando, selecionando e ordenando imagens, sons e objetos, e concebendo formas de apresentá-lo é um modo de expressão estética. Os vestígios e os documentos passam a fazer parte do ato criativo. Se possível, durante o percurso, revisite seus registros na companhia de colegas, observando também como eles fizeram seus próprios arquivos. A maneira de registrar e de organizar pode trazer novas percepções sobre o processo e sobre os objetos registrados.
RENNÓ, Rosângela. Volcan, 2001 da série Vulgo, 1998-2003 fotografia digital processo Lightjet, laminada e montada em masonite, a partir de original do Museu Penitenciário Paulista. 168 x 122 cm
A artista mineira Rosângela Rennó (1962-) trabalha com registros e documentos, fazendo com que eles ganhem novos significados. Na Série Vulgo , a artista trabalhou com o material fotográfico do arquivo do Museu Penitenciário de São Paulo, selecionando, do vasto acervo, doze imagens de redemoinhos dos cabelos de detentos. Uma forma única de identificação, como uma impressão digital, esses traços físicos serviam para distinguir homens condenados e reconhecer os fugitivos. Para compor a obra, a artista realizou apenas uma intervenção digital na coloração vermelha no centro do redemoinho do couro cabeludo de cada indivíduo. O olhar para o arquivo do museu, a nova maneira de organizar e expor esses registros, além da intervenção mencionada, pode trazer novas reflexões e desdobramentos para o que existia.
Série Vulgo, da artista Rosângela Rennó, de 1998.
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MATRIZES CULTURAIS
Como ponto de partida para as reflexões sobre arte e cultura brasileiras, tomam-se três matrizes ancestrais: a dos povos indígenas que aqui sempre habitaram; a dos africanos que em diáspora foram trazidos para cá, escravizados e subjugados pelo sistema colonial; e a cultura europeia, que nos foi trazida pelo colonizador português.
É preciso ressaltar, entretanto, que o interesse não é propor o estudo das particularidades de cada uma das culturas que constituem essas três matrizes estéticas. O objetivo é a apresentação de exemplos que tornem nítidos os valores dessas culturas, expressos em ritos, objetos, imagens, narrativas e músicas dos diversos povos, assim como na arte de nosso tempo.
diáspora: deslocamento forçado. A diáspora africana, em sua enorme amplitude, refere-se à dispersão dos africanos pelas Américas em virtude do tráfico atlântico de escravizados.
[…]
O desafio que proponho aqui é imaginar cartografias, camadas de mundos, nas quais as narrativas sejam tão plurais que não precisamos entrar em conflito ao evocar diferentes histórias de fundação. É maravilhoso que ainda existam essas memórias nas tradições de centenas de povos, seja nas Américas, na África, na Ásia… Essas narrativas são presentes que nos são continuamente ofertados, tão bonitas que conseguem dar sentido às experiências singulares de cada povo em diferentes contextos de experimentação da vida no planeta. […]
KRENAK, Ailton. Futuro ancestral São Paulo: Companhia das Letras, 2022. p. 32-33.
Mulher tuyuka com adornos tradicionais e pintura facial. Manaus, na Amazônia brasileira (AM). Fotografia de 2018.
LUCIOLA ZVARICK/PULSAR IMAGENS
Culturas indígenas
SMAR INGBER/PULSARIMAGENS
Adornos e pinturas marcam diferentes etnias.
Indígena kayapó usando adornos diversos produzidos na Aldeia Aukre, em Tucumã (PA), 2023.
alaios confeccionados com talo de arumã, produzidos pelo povo indígena baniwa. Manaus (AM). Fotografia de 2015.
Artefatos trançados com fibras de arumã em complexos padrões. Objetos com essas qualidades afirmam a potência das culturas indígenas.
Existem tantos instrumentos musicais quanto povos indígenas. Os instrumentos são criados com base na matéria-prima disponível nas aldeias, como cabaças, troncos, bambus, cascos de tartaruga, entre outros.
Chocalho e apito feitos por indígenas pataxó, na Reserva Pataxó da Jaqueira. Porto Seguro (BA). Fotografia de 2019.
Seres vivos e seres míticos interagem no ambiente da floresta.
KUIN, Ibã Huni; KUIN, Bane Huni; KUIN, Rare Huni; KUIN, Ayani Huni; KANIXAWA, Ibã Neto Sales; MAHKU. Yube Inu Yube Shanu [Mito do surgimento da bebida sagrada Nixe Pae]. 2020. Acrílica sobre tela, 122,5 cm × 207,5 cm. Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, São Paulo (SP).
Não escreva no livro.
Considerando as imagens apresentadas nestas páginas de abertura, responda às questões a seguir.
1 Quais práticas artísticas aparecem nos exemplos apresentados? Produção de artefatos, produção de instrumentos sonoros, práticas rituais e pinturas.
2 Quais materiais e técnicas podem ser observados?
Trançados com fibra de arumã, instrumento musical feito de cabaça, pintura com tinta acrílica sobre tela, adornos e pintura corporal.
3 A confecção manual de artefatos é comum na comunidade em que você vive? Que objetos produzidos dessa maneira você conhece?
Respostas pessoais. Os estudantes podem se referir a técnicas artesanais como tricô, renda, confecção de redes de pesca, confecção de cadernos, criação de colares, entre outras.
EDUARDO ORTEGA/MUSEU DE ARTE DE SÃO PAULO ASSIS
SÃO PAULO, SP
Por que estudar as culturas indígenas?
Estima-se que cerca de mil diferentes povos habitavam o território correspondente ao do atual Brasil quando os colonizadores europeus iniciaram a invasão de suas terras, no final do século XV. Muitos desses povos foram dizimados pelo contágio de doenças trazidas pelos europeus e em decorrência da resistência à escravização e das numerosas guerras que ocorreram nos territórios costeiros.
Segundo dados do Censo Demográfico de 2022, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), essa população soma quase 1,5 milhão de indivíduos.
Embora submetidos a todo tipo de violência durante cinco séculos, alguns povos sobreviveram, e, nas últimas décadas, a população indígena retomou seu crescimento. Atualmente, no Brasil, existem cerca de 266 povos indígenas, que falam mais de 150 línguas e dialetos.
Inicialmente, os indígenas foram entendidos e retratados pelos europeus como seres exóticos e primitivos. Caracterizá-los como inferiores justificava e facilitava os propósitos coloniais. Mais tarde, no século XIX, empenhados em construir uma identidade para a nação, intelectuais e artistas tomaram o indígena como um símbolo para representar, de forma heroica e idealizada, a natureza exuberante do país. Assim, os indígenas só recuperaram a própria voz na segunda metade do século XX, principalmente na década de 1970, quando se organizaram para fazer frente às políticas de integração nacional do governo militar e lutar pela demarcação de suas terras e pelo direito à preservação de seu modo de vida.
exótico: nesse contexto, forma preconceituosa de se referir às culturas distantes e pouco conhecidas.
O pintor holandês Albert Eckhout (1610-1666) integrou a comitiva de artistas e cientistas trazidos por Maurício de Nassau (1604-1679) a Pernambuco durante o período em que governou o Brasil Holandês, entre 1637 e 1644. Eckhout produziu retratos etnográficos – de caráter descritivo e documental – dos habitantes locais, em tamanho natural, como este de uma mulher tapuia. O tema dessa pintura é a antropofagia – a prática de ingerir carne humana –, geralmente associada a rituais funerários ou guerreiros. Essa prática, comum entre alguns povos indígenas da época, contribuiu para que os europeus construíssem a imagem dos indígenas como povos bárbaros.
ECKHOUT, Albert. Mulher tapuia. 1641. Óleo sobre tela, 264 cm x 159 cm. Museu Nacional da Dinamarca, Copenhague.
Shirley Djukurnã Krenak (1980-), nascida em Ferros, em Minas Gerais, é artista, ambientalista e ativista. Para a criação desta obra, ela percorreu cerca de 700 quilômetros acompanhando o fluxo do Rio Doce, chamado de Watu pelo povo krenak, que foi poluído por lama tóxica após o rompimento da barragem de Mariana, em 2019. Ao longo desse trajeto, a artista captou sons, imagens e mergulhou em experiências simbióticas com o ambiente através de cantos, danças e ritos espirituais. Para os krenak, a Terra é um ser vivo a ser tratado com respeito e reverência.
Líder indígena Shirley Krenak em frame da videoinstalação Sons que curam, produzida por A Terrestre, em 2022.
AT¡v¡DaDe De SeNS¡B¡l¡ZAÇÃO Pedagogia do sonho
Para muitos povos indígenas, o sonho é parte da vida social. Em algumas aldeias, é comum o hábito de contar os sonhos ao acordar, buscando conselhos e reflexões para organizar a rotina do grupo. Para encerrar a introdução deste capítulo, será realizada uma dinâmica de contação de histórias baseadas em sonhos. Siga os passos.
1. A atividade deve ser realizada em um espaço amplo da escola, como a quadra, o pátio ou o auditório. Caso não seja possível, organize o espaço da sala de aula, junto com os colegas, afastando mesas e carteiras.
2. Deite-se no chão de maneira confortável. A turma deve se espalhar pelo espaço disponível.
3. Feche os olhos e busque em sua memória um sonho significativo. Tente recordar os detalhes desse sonho.
4. Em seguida, junte-se a outros colegas, formando um grupo de quatro integrantes.
5. Sente-se em roda com os colegas do seu grupo. Uma pessoa de cada vez deve narrar seu sonho.
6. Depois que todos tiverem compartilhado seus sonhos, converse com os colegas do grupo sobre as impressões e os significados de cada narrativa.
7. Encerrada a atividade, junte-se ao restante da turma para um debate coletivo, tendo como ponto de partida as seguintes perguntas.
• C omo foi narrar seu sonho? Você tem o hábito de contar para outras pessoas o que sonhou? E escutar o sonho de outras pessoas? Respostas pessoais. A relação com os sonhos é bastante diferente em cada contexto social e familiar. Explore essas diferenças com os estudantes.
• Você costuma se lembrar dos seus sonhos? Como essa lembrança ajuda ou atrapalha seu cotidiano?
Respostas pessoais. Dormir bem e diminuir o uso de telas antes de dormir e logo ao acordar, assim como desenvolver o hábito de contar ou registrar os sonhos ao despertar, pode auxiliar a lembrar dos sonhos.
CORTESIA SHIRLEY KRENAK
ARTES ViSUAiS
CONTEXTO
Culturas indígenas e artes visuais
O conceito de arte, tal qual é compreendido na sociedade ocidental, não existe para os povos indígenas que vivem no Brasil. As ideias de inovação e contemplação, por exemplo, não estão presentes na produção e fruição das formas estéticas desses povos, assim como não existe a figura do artista como um indivíduo criador, que procura expressar sua subjetividade por meio de formas originais.
Nas sociedades indígenas, a arte é fruto de práticas, muitas vezes coletivas, que visam à transmissão de saberes ancestrais, à realização de rituais e à produção da vida. Os povos indígenas consideram bonito aquilo que é bom, que faz bem a seu grupo e que é, portanto, útil.
Para produzir artefatos de uso cotidiano e ritualístico, os diferentes povos indígenas que vivem no Brasil empregam técnicas variadas, manipulando materiais como barro, sementes, penas, fibras, miçangas e pigmentos vegetais, entre outros.
O ato de ornamentar o corpo com pinturas ou adereços está ligado à organização comunitária e aos rituais. Pode demarcar posições sociais, gênero ou idade de um indivíduo, ou ainda a distinção de um clã. Também pode estar associado a curas ou formas de proteção. Para os povos indígenas, objetos, animais, pessoas e seres sobrenaturais podem ser transformados, domesticados, pacificados e incorporados em seu próprio corpo. Essas mudanças de estado ou condição costumam envolver rituais em que música, dança, ornamentação e comida compõem um complexo cerimonial.
Todos esses elementos presentes no cotidiano das comunidades indígenas também aparecem na Arte Indígena Contemporânea (AIC). Esse movimento tem trazido novos significados e uma perspectiva renovada para a arte brasileira. Em 2024, o Brasil foi representado na Bienal de Artes de Veneza pelo Pavilhão Hãhãwpuá, concebido por artistas e curadores indígenas.
CONeXãO
Pavilhão Hãhãwpuá
A palavra hãhãwpuá designa o grande território Brasil na língua pataxó. Esse território é habitado por humanos e não humanos e por memórias ancestrais e contemporâneas.
Saiba mais sobre o Pavilhão Hãhãwpuá, na Bienal de Artes de Veneza de 2024, no site oficial da mostra: https://kaapuera. bienal.org.br/sobre-kaa-puera/. (Acesso em: 14 ago. 2024).
Fotografia de parte da exposição no Pavilhão Hãhãwpuá, na Bienal de Artes de Veneza de 2024. Veneza (Itália), 2024.
curador: profissional responsável pela concepção, organização e execução de exposições artísticas.
GIUSEPPE
REPERTORiO 1
Arte e artefatos
Os wayana, que vivem no Amapá e no norte do Pará, dominam técnicas de trançado com fibras vegetais, como o arumã. Com essas fibras, fazem variados objetos que são utilizados tanto em rituais quanto na vida diária da aldeia, como abanos, adornos e esteiras, entre outros. As fibras são previamente tingidas, de modo que os grafismos aparecem conforme elas são trançadas.
O cesto cargueiro, que aparece nesta página, é feito com fibra de arumã, cipó-imbé, varetas de madeira, fios de caroá e de algodão. É um artefato confeccionado pelos homens e usado pelas mulheres para transportar redes, miçangas e outros objetos durante viagens. É considerado um utensílio de difícil confecção por conta dos padrões gráficos, que são organizados de forma diagonal em relação à superfície retangular que define o fundo do cargueiro, bem como pelo desenho do trançado, que pode ser observado nos dois lados da peça.
O entrelaçamento de arumã está presente no mito de origem da mulher primordial dos wayana. Segundo essa narrativa, a criação da mulher envolveu várias tentativas: a primeira mulher, feita de cera, derreteu sob o sol ao buscar mandioca; a segunda, de barro, ficou pesada demais para se locomover; a terceira, feita de arumã e dentes de amendoim, foi a única que deu certo.
Cesto cargueiro produzido pelos indígenas wayana e aparai, que habitam a região do Rio Paru de Leste, no Pará. Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém (PA).
abano: objeto utilizado para abanar algo ou alguém; espécie de leque.
Arumã da Amazônia. Manaus (AM), 2014.
2. Porque os padrões gráficos são organizados de forma diagonal em relação à superfície retangular que define o fundo do cesto. Além disso, o grafismo utilizado se repete nos dois lados da peça.
Observe o artefato wayana e responda ao que se pede.
Não escreva no livro.
1 A lém do cesto cargueiro, quais outros artefatos os povos wayana produzem com as fibras de arumã? Os povos wayana utilizam fibras vegetais variadas, como as de arumã, para produzir artefatos como abanos, adornos e esteiras.
2 Por que o cesto cargueiro, que aparece nesta página, é considerado um objeto de difícil confecção?
3 Como você imagina que os indígenas aprendem a realizar grafismos geométricos?
3. Resposta pessoal. No geral, os indígenas, como os representantes dos povos wayana, aprendem desde a infância a reproduzir grafismos, obedecendo espaçamentos precisos e dividindo mentalmente os espaços, repetindo elementos sempre na mesma proporção e dimensão.
ROMULO
FIALDINI/TEMPO COMPOSTO
FABIO COLOMBINI
REPERTORiO 2
Adornos corporais e rituais
As ornamentações corporais podem ser feitas tanto para os rituais quanto para o uso cotidiano. O corpo pode ser adornado com adereços como braceletes, brincos e colares feitos de penas, sementes e miçangas, além de pintura com grafismos.
Para os grupos indígenas amazônicos, o casco da tartaruga e a pele da jiboia são fontes de inspiração para os padrões gráficos usados em tecidos, cestaria, cerâmica e pintura corporal.
produzido na Terra Indígena Ribeirão Silveira (SP). Fotografia de 2024.
YANOMAMI, Joseca. [Sem título]. 2011. Técnica mista, 29,7 cm x 42 cm. Acervo do Instituto Socioambiental Museu de Arte Moderna de São Paulo (Masp), São Paulo (SP).
Neste desenho, Joseca Yanomami (c1971-) representa um ritual de seu povo, em que os homens ornamentados com pinturas, penas e outros elementos são guiados pelo xamã. Logo, o elo entre o mundo sobrenatural e o mundo dos homens é estabelecido pelo xamã, que pode viajar espiritualmente, visualizar as doenças e os seres invisíveis, sonhar com uma música e comandar um ritual.
Analise o desenho de Joseca Yanomami e, em seguida, responda às questões.
1 Q uem participa do ritual ilustrado no desenho? O desenho mostra seis figuras humanas.
2 Como são os elementos que ornamentam os yanomami, segundo a representação de Joseca? Como são as pinturas corporais?
3 Qual das figuras representadas pode ser o xamã?
3. O xamã pode ser a figura que se vê à direita, aquela que tem a cabeça maior e é representada de frente, o que pode indicar um papel social de destaque.
2. Eles usam adornos feitos de penas e pintura corporal. Cada figura humana está representada com uma pintura corporal diferente, formada por linhas paralelas, pontos, linhas diagonais e curvas, que acompanham as formas curvas e simétricas do corpo humano.
Não escreva no livro.
Arte indígena contemporânea
borduna: tipo de arma indígena feita de madeira que serve para ataque, defesa ou caça.
CABOCO, Gustavo. Kanau’kyba e os costumes da borduna wapichana. 2021. Acrílica sobre tela, 165 cm x 114 cm.
Um dos expoentes da AIC é o artista curitibano de origem wapichana, Gustavo Caboco (1989-). Em 2001, Caboco acompanhou a mãe, Lucilene, em seu primeiro retorno à terra indígena Canauanim, de onde havia sido desterrada aos 10 anos de idade. A partir de então, o artista fortaleceu sua identidade wapichana.
Caboco tem desenvolvido a ideia de coma colonial, sugerindo que estamos despertando para novas percepções da contínua exploração colonial. Em uma entrevista, ele afirma:
[…] Até bem pouco tempo nós éramos apenas inspirações. Basta você pensar no romantismo ou no modernismo, tanto na literatura quanto nas artes visuais. O que tem de diferente hoje é essa ideia do protagonismo e da diversidade de populações indígenas. Despertar do Coma colonial tem a ver com reconhecer essas histórias, essas narrativas, essas diferenças de trajetórias. […]
Na pintura apresentada, Gustavo Caboco narra a história de uma borduna wapichana consumida pelo fogo durante o incêndio do Museu Nacional, localizado no Rio de Janeiro, em setembro de 2018.
Não escreva no livro.
Observe os elementos escolhidos por Caboco para narrar os caminhos da borduna e responda às questões a seguir.
1 Q ue elementos na pintura de Caboco remetem às práticas culturais indígenas?
2 Nessa obra, o que pode ser relacionado ao território indígena?
1. O fogo, as casas, a serpente, os grafismos, pessoas dormindo e talvez sonhando, a luta, a dança e outras práticas corporais, tais como plantar bananeira ou ficar de ponta-cabeça.
PESQUiSA
Ritos e artefatos
Os povos indígenas que habitam o território brasileiro celebram inúmeros rituais – os quais, assim como outros aspectos de suas culturas, variam muito entre os distintos grupos étnicos. Para essas ocasiões, fabricam instrumentos musicais, máscaras, totens, adornos corporais e utensílios para preparar e servir alimentos. Muitos desses objetos foram levados pelos colonizadores e fazem parte de coleções etnográficas exibidas em museus europeus.
Faça levantamentos sobre essas práticas e aprofunde seus conhecimentos sobre o assunto.
1. Como são os rituais dos povos indígenas que vivem no Brasil?
• O p ovo enawenê-nawê, cujo território se situa no Mato Grosso, realiza o ritual Yaokwa para assegurar a manutenção da ordem social e cósmica. Esse ritual, que está relacionado ao calendário ecológico, dura sete meses. Foi declarado Patrimônio Imaterial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). É também um dos bens culturais registrados pelo Ministério da Cultura do governo brasileiro. Assista a um vídeo da Unesco que documenta o ritual Yaokwa. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=HIwoDa8iyxk. (Acesso em: 2 set. 2024).
Ritual Yaokwa do povo enawenê-nawê. Todo ano, durante o período da seca, o ritual é realizado em homenagem aos espíritos Yakairiti. Juína (MT). Fotografia de 2020.
2. Onde é possível encontrar artefatos produzidos por povos indígenas que vivem no Brasil?
• O Museu Nacional dos Povos Indígenas, que fica no Rio de Janeiro, reúne peças de diversas culturas. Disponível em: http://antigo.museudoindio.gov.br/. (Acesso em: 2 set. 2024).
• Há t ambém o Museu das Culturas Indígenas, do Governo do Estado de São Paulo. Disponível em: https://museudasculturasindigenas.org.br/. (Acesso em: 2 set. 2024).
• Em Brasília, há o Memorial dos Povos Indígenas. Disponível em: www.ipatrimonio.org/brasiliamemorial-dos-povos-indigenas/. (Acesso em: 2 set. 2024).
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Objetos rituais
Para as culturas indígenas, os objetos não são definidos apenas por suas condições materiais, mas principalmente pelo conjunto de relações que eles ativam e mantêm na dinâmica da vida social. A beleza permeia essas práticas ritualísticas, seja na fabricação cuidadosa dos objetos, seja na forma como eles são organizados, manipulados e combinados com gestos e músicas. Da mesma forma, em nossa sociedade, muitos acontecimentos são marcados por ritos, momentos em que a vida e a arte convergem para um só fim. Assim, alguns artistas contemporâneos visam promover experiências capazes de transformar ou despertar a consciência das pessoas, tal como fazem os xamãs indígenas.
BANIWA, Denilson. Pajé-onça hackeando a 33ª Bienal de Artes de São Paulo. 2018. Performance realizada na 33a Bienal de Artes de São Paulo. São Paulo (SP).
Denilson Baniwa (1984-) atravessou o espaço expositivo da 33a Bienal de Artes de São Paulo, onde fotografias de povos exterminados eram apresentadas apenas com descrições técnicas, realizando uma performance inspirada num ritual xamânico. Vestindo um manto, uma máscara de onça e rasgando as páginas do livro Breve história da arte (2018), Denilson bradava: “Tão breve, mas tão breve, que não vejo a arte indígena”.
O livro, a máscara e a pele de onça, ativados pelo discurso do artista, tinham o objetivo de impactar e despertar a consciência do público que visitava o evento naquele momento. Diante do olhar exotizado dos povos originários presente nas fotografias, Denilson escancarou a ausência da visão de mundo dos artistas indígenas nos grandes eventos, até aquele momento. Assim como na performance de Denilson Baniwa, diversos elementos podem estar envolvidos na execução de um ritual ou de uma cerimônia: vestimentas, adornos, comidas, lembranças, objetos, gestos, músicas, danças, discursos e sons ensaiados, combinados ou realizados de forma improvisada.
A força de um ritual pode ser a celebração de uma data, de uma pessoa ou de uma memória, assim como uma afirmação, um posicionamento político ou até um desejo ou uma proposta para o futuro.
AçÃO Objetos e rituais
Depois de conhecer diferentes objetos ritualísticos produzidos pelos povos indígenas, é hora de confeccionar ou reunir objetos para utilizar em uma cerimônia a ser realizada na escola.
1. Proposição
• Junte-se aos colegas, em grupos de cinco a oito integrantes, reunidos por afinidade.
• Discuta com eles que tipo de cerimônia pode ser realizada. O objetivo dessa ação deve ser denunciar, revelar ou evidenciar alguma injustiça, ou algo que seja importante para a turma ou para a comunidade escolar.
• Imagine com os colegas uma cerimônia que possa ser realizada na escola. Ela pode envolver a coleta de objetos que serão colocados no centro da sala, a formação de um círculo, danças ao redor, o canto de uma música conhecida, entre outros gestos.
• Que objetos seriam significativos para essa cerimônia? Que elementos seriam importantes mobilizar para gerar comoção ou conscientização no público? Discuta em grupo essa questão.
• Você e os colegas podem fazer uma lista das ações e dos objetos que foram propostos. Podem ser peças sonoras, como chocalhos; objetos flutuantes de papel; artefatos que interajam com o vento, como uma bandeira. Enfim, objetos de cores, materiais e tamanhos variados, que podem ser colocados no centro da sala ou conduzidos em uma espécie de cortejo.
• Divida as tarefas de produção com os demais integrantes do grupo: cada um deve se responsabilizar por conseguir ou confeccionar determinados materiais ou objetos.
• Pense em materiais fáceis de obter, como sucata e tecido, ou elementos naturais que existam em abundância em seu ambiente e que possam ser transformados, como água, terra, areia, pedra, galhos secos, folhas, palha, seixos, entre outros.
2. Elaboração dos objetos
• O grupo pode elaborar alguns objetos especialmente para a cerimônia: fotografias, cartazes, máscaras, enfeites corporais, potes de barro ou objetos sonoros.
• Máscaras podem ser confeccionadas utilizando uma estrutura de arame coberta com várias camadas de papel-jornal e cola, finalizadas com pinturas. Outra opção é usar apenas sacos de papel craft com faces desenhadas ou pintadas.
3. Momento da ação
• De posse dos materiais trazidos para a escola e dos objetos produzidos especialmente para a ocasião, prepare, junto com seu grupo, uma instalação para a cerimônia.
• Depois, planeje com os colegas os detalhes da cerimônia, envolvendo ou não a manipulação de outros objetos. A ação pode ter sons, danças, distribuição de alimentos ou objetos e até mesmo a realização de um discurso.
4. Avaliação coletiva
• Após as apresentações, converse com os colegas e o professor a respeito da cerimônia realizada. Reflita com eles sobre quais foram os resultados dos trabalhos dos grupos; que espaços as cerimônias ocuparam; que objetos foram utilizados; se os gestos mobilizaram outras pessoas da escola ou da comunidade, além dos integrantes dos grupos; se houve momentos especialmente belos, emocionantes, comoventes, fortes ou transformadores durante as cerimônias.
Durante a fase de concepção das cerimônias, converse com cada grupo, oferecendo orientação e apoio. Se houver preferência por grupos menores, não há problema, desde que todos estejam engajados. É importante deixar claro que a cerimônia não precisa ter conotação espiritual ou política. Podem ser simplesmente ações lúdicas, como uma brincadeira ou um esquete teatral. A própria confecção de máscaras já pode servir como inspiração para o evento. Incentive os grupos a analisar a viabilidade das cerimônias e da obtenção dos materiais necessários à sua realização.
Máscaras de papel feitas pelo artista romeno Saul Steinberg (1914-1999) em 1962. Fotografia de Inge Morath. Nova York (Estados Unidos).
MUSiCA
CONTEXTO
Música e rito
Grande parte dos povos indígenas que vivem no Brasil associa a música ao universo transcendente. Ela é responsável pela comunicação com os ancestrais e com o mundo sensível e invisível aos olhos. A música é utilizada em rituais de cura, proteção e passagem, bem como em celebrações relacionadas ao plantio ou à colheita, à guerra ou à confraternização. Enfim, é uma expressão que está presente no dia a dia dessas comunidades. A relação dos indígenas com a música, portanto, distancia-se do conceito ocidental de música como produto de consumo. Remontar à história das músicas dos grupos indígenas, do passado até os dias atuais, é muito difícil. Isso porque, desde o início da ocupação colonial, o imaginário dos estudiosos não indígenas e sua forma de compreender a música contaminaram esse estudo. Há registros do século XVIII sobre a tradição musical dos tupinambás, por exemplo. Entretanto, tais registros foram produzidos por ouvidos acostumados com a música europeia; assim, eles revelam muito mais sobre a percepção de música do colonizador do que sobre os povos originários.
Ainda hoje, a imagem dos indígenas construída pelos não indígenas influencia a forma como nos relacionamos com sua expressão musical. Além disso, é preciso considerar que diversas tradições musicais se perderam com o avanço dos colonizadores sobre as terras habitadas pelos indígenas, o que resultou no extermínio de muitas culturas e suas músicas.
No entanto, as primeiras décadas do século XXI apontam para uma mobilização crescente e uma valorização da cultura indígena no Brasil. O resgate das culturas, dos costumes e da forma de vida de diferentes grupos faz parte desse movimento. Como a música é uma expressão do dia a dia de muitos desses povos, estudiosos têm se dedicado a ouvir e compreender suas práticas musicais com uma nova perspectiva.
A f lauta uruá é um dos elementos do ritual fúnebre Kuarup, que integra o calendário de povos indígenas do Xingu (MT). Fotografia de 2022.
A voz da floresta REPERTORiO 1
A música é essencial na vida do povo huni kuin kaxinawá. Na fotografia, indígena do povo huni kuin kaxinawá toca violão. Aldeia Lago Lindo, Jordão (AC). Fotografia de 2021.
A voz é um elemento fundamental na música dos huni kuin. Para muitos membros desse povo, ser um cantor não é só saber cantar a música, mas saber se ornamentar, dançar e representar sua comunidade. São músicas para chegar; para tecer; para plantar e curar com as plantas de poder.
Entre os huni kuin kaxinawá que vivem no Acre, na fronteira entre o Brasil e o Peru, a música vocal integra rituais que fazem parte do imaginário da comunidade. Eles chamam sua prática musical de nukun ninawa , que significa “nossa música” ou “nosso canto”.
Ninawa é a capacidade de imitação dos sons dos animais, uma qualidade apreciada e atribuída aos grandes guerreiros, pois propicia não só atrair o animal mas também entrar em contato com seu espírito. Na comunidade, o líder do canto é denominado txana shaneibu.
Pássaro japiim, ou txana, como é chamado pelos huni kuin. Reserva Nacional Pacaya Samiria (Peru).
Txana, nas narrativas que falam dos tempos ancestrais, é um cantor e, também, o pássaro japiim, como é chamado localmente em português. Essa ave é reconhecida por sua capacidade de imitar o som de outros pássaros. Assim, ser txana significa ser esperto, sábio, ter boa memória e aprender escutando. O canto ritual, para os huni kuin, evoca uma força integral, que é fixada na pintura corporal, absorvida na comida e coletivizada na dança.
Considerando a importância da voz para a cultura huni kuin, reflita sobre as questões a seguir.
1 Você acha que imitar sons é uma boa forma de aprender a cantar? Por quê?
2 Por que os huni kuin valorizam a habilidade da imitação?
2. Imitar os sons dos animais pode ser uma forma de atraí-los ou afastá-los na floresta e, até mesmo, de entrar em contato com seus espíritos.
1. Respostas pessoais. Pergunte aos estudantes se eles sabem imitar algum som usando apenas a voz. Pode ser um som da natureza, o som de algum objeto ou até mesmo um som sintético.
Não escreva no livro.
REPERTORiO 2
O carimbó
Apresentação do grupo musical Cumaru de Carimbó em Alter do Chão, Santarém (PA), em 2017. O carimbó pau e corda paraense preserva a instrumentação original do gênero musical.
O carimbó é uma manifestação cultural que inclui música e dança e tem sua origem nas comunidades ribeirinhas do Pará, na região amazônica. Enquanto alguns musicólogos afirmam que sua origem é africana, a maioria dos mestres e carimbozeiros defende sua identidade indígena. Assim, pode-se dizer que o carimbó expressa uma identidade afro-indígena da Amazônia paraense.
O termo carimbó se refere ao instrumento musical “curimbó”, um tambor feito de tronco escavado com uma das extremidades coberta por couro. Em apresentações de carimbó, é comum o uso de dois ou três curimbós com timbres diferentes.
Enquanto o tocador se senta em cima do curimbó, o cantador de carimbó puxa os versos que são repetidos por todos os presentes. Além do curimbó, outros instrumentos podem fazer parte da apresentação, como rabeca, violão, cavaquinho, banjo e flauta.
Ouça, no material digital que acompanha este livro, a faixa “Ilha do Marajó”, do álbum Verequete é o rei (Tratore, 2007), gravado por Mestre Verequete. Em seguida, escute o “Pot-pourri de carimbó”, gravado ao vivo pela Banda Calypso para o álbum Em Angola (JC Shows, 2012).
O carimbó foi declarado Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil, em 2014. Na fotografia, vê-se o curimbó em destaque durante apresentação em Santarém (PA), 2017.
musicólogo: é o pesquisador de música. Aquele que estuda as perspectivas históricas e filosóficas das diferentes manifestações musicais.
timbre: é a identidade do som, aquilo que marca sua característica. É o que nos permite diferenciar, por exemplo, o som de uma buzina de carro da buzina de uma bicicleta.
1. Resposta pessoal. Os estudantes podem notar a presença de um instrumento de sopro, que pode ser uma clarineta ou um sax; um instrumento de corda, que pode ser um banjo; e instrumentos de percussão, como tambores curimbó, chocalhos, ganzá, maracás ou caxixis.
Após escutar os áudios indicados, responda às questões a seguir.
Não escreva no livro.
1 Quais instrumentos musicais você consegue reconhecer na canção "Ilha do Marajó"?
2 Qual é a diferença instrumental entre as duas gravações?
2. Na versão de Verequete, há uma combinação de percussão e sopro, em contraste com o baixo elétrico, a guitarra, a bateria e os teclados usados na versão da Banda Calypso.
REPERTORiO 3
Corais
Os indígenas guaranis se dividem em três grupos: os mbya, os kaiowa e os ñandeva. Os mbya são um povo presente em aldeias situadas no interior e no litoral dos estados do Sul do Brasil, bem como no Sudeste, nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, e no Norte do país. A musicalidade é parte do modo de ser guarani mbya. Em suas práticas, os indígenas mbya utilizam um violão de cinco cordas, o mba’epu , em que cada corda representa uma divindade. Também utilizam a rave, um tipo de rabeca que se assemelha ao violino. Os cantos mbya são ainda acompanhados de instrumentos de percussão, como chocalhos feitos de sementes e bastões.
Crianças guarani mbya cantando e dançando em agradecimento a Nhanderu. Maricá (RJ), 2021.
Nas aldeias guaranis, as crianças costumam iniciar o dia cantando músicas tradicionais que falam de seu modo de vida e da natureza. São os mais velhos que ensinam a elas a técnica do canto e explicam a importância e o significado de cada cântico. Algumas crianças fazem parte dos grupos de cantos que são organizados pelas aldeias juntamente com jovens e adultos. Acompanhados por instrumentos, esses grupos se apresentam dentro e fora das aldeias, promovendo o diálogo com os não indígenas e divulgando sua cultura como estratégia de resistência e afirmação da identidade guarani mbya.
O álbum Ñande Reko Arandu – Memória Viva Guarani (MCD, 2005) apresenta cantos e músicas das tradições guaranis entoados por 11 corais infantojuvenis de diferentes aldeias do Rio de Janeiro e de São Paulo.
ÑANDE Reko Arandu – Memória Viva Guarani. 2005. Capa do álbum.
Não escreva no livro.
Faça uma busca na internet e em plataformas digitais e ouça as músicas do álbum Ñande Reko Arandu – Memória Viva Guarani. Depois, responda às questões a seguir.
1 Quais instrumentos musicais você consegue identificar nas canções?
2 Como você descreveria as vozes que cantam nesses corais?
2. Resposta pessoal. Para descrever as vozes das crianças guaranis, os estudantes podem utilizar adjetivos variados, tais como metálica, frontal, nasalizada, aberta, clara, entre outros. É importante mencionar que se trata de uma postura vocal diferente daquelas que estamos acostumados a ouvir em cantores convencionais.
1. Resposta pessoal. Os estudantes podem identificar os sons da rabeca e do maracá.
PESQUiSA
Cantos e instrumentos indígenas
Não é possível falar de unidade na música indígena brasileira. Cada grupo possui suas características e variações. O canto de cada povo apresenta peculiaridades, e os instrumentos musicais utilizados por esses grupos se distinguem entre si, refletindo a diversidade cultural que existe entre os diferentes povos indígenas do Brasil.
1. Você tem o hábito de ouvir músicas cantadas por povos indígenas? Em caso positivo, quais costuma ouvir?
• Você pode conhecer músicas de diferentes grupos indígenas acessando os áudios do projeto Cantos da Floresta: iniciação ao universo musical indígena. Esse projeto, de Magda Pucci e Berenice de Almeida, reúne músicas, gravações, jogos e partituras. Conheça mais em: www.cantosdafloresta. com.br/audios/. (Acesso em: 20 ago. 2024).
• Em 2020, o canal CineDoc Brasil do pesquisador, documentarista e fotógrafo Felipe Scapino, lançou uma série de vídeos sobre a cultura guarani da Aldeia Bracuy de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. Os vídeos estão disponíveis no canal: www.youtube.com/@CineDocBrasil. (Acesso em: 20 ago. 2024).
2. A riqueza da música dos povos indígenas brasileiros inspirou a criação musical de diferentes artistas. Faça uma busca na internet e ouça algumas dessas parcerias.
• Em 1991, o compositor mineiro Milton Nascimento (1942-) lançou o álbum Txai . Essa palavra é um termo kaxinawá que significa “mais que amigo/mais que irmão”. Em suas 15 faixas, o artista apresenta músicas compostas em diálogo com a tradição de povos que conheceu em sua viagem pelos rios Juruá e Amônia, no Acre.
T XAI. 1991. Capa do álbum do compositor Milton Nascimento.
• A cantora, compositora e pesquisadora cearense Marlui Miranda (1949-) é reconhecida por interpretar, difundir e valorizar a cultura e a música indígenas no Brasil. Pesquise e escute seu premiado álbum Ihu: todos os sons
Reflita e debata com os estudantes sobre as semelhanças e as diferenças entre a produção de artistas inspirados pela música de povos indígenas e aquelas cantadas e gravadas diretamente nas aldeias indígenas. Observe que as músicas de Marlui Miranda e de Milton Nascimento são inspiradas em cantos de grupos indígenas, isto é, eles utilizam esses cantos para criar outras linguagens e arranjos, o que pode, por exemplo, incluir novos instrumentos. A música registrada em projetos como CineDoc ou Cantos da Floresta reflete práticas musicais que ocorrem no contexto da aldeia e não têm o objetivo de serem apresentadas a um público externo em um álbum ou show.
IHU: todos os sons. 1996. Capa do álbum de Marlui Miranda.
TEORiAS E MODOS DE
FAZER
Instrumentos
É notável a grande variedade de instrumentos criados pelos grupos indígenas brasileiros com base nos recursos disponíveis nas aldeias. A confecção desses instrumentos reflete as características e as territorialidades de cada um desses povos. Dessa forma, a construção de um instrumento musical também é uma expressão cultural.
Existe uma imensa variedade tanto de instrumentos musicais quanto de culturas ao redor do mundo. A disciplina que trata da descrição e da classificação dos instrumentos é chamada de Organologia. É comum classificar os instrumentos como cordas, percussão, sopros ou teclados. Embora não seja errada, essa é uma classificação superficial, pois não consegue abarcar as culturas não europeias ou mesmo os instrumentos mais recentes.
Por essa razão, muitos pesquisadores vêm preferindo uma classificação mais ampla com base na forma como o som é produzido. Assim, temos:
FERNANDOFAVORETTO/CRIARIMAGENS
Membranofones: instrumentos nos quais o som é produzido por meio da vibração de uma membrana, como no caso dos tambores, em geral.
ARQUIVO ANDRÉ FILHO/ACERVO INSTITUTO MOREIRA SALLES/ MUSEU VIRTUAL DE INSTRUMENTOS MUSICAIS/FOTO: MARCIO MELGE
Idiofones: instrumentos nos quais o som é produzido pela vibração do corpo do instrumento, como o agogô, o reco-reco e o triângulo. ARQUIVO ANDRÉ FILHO/ACERVO INSTITUTO MOREIRA SALLES/MUSEU VIRTUAL DE INSTRUMENTOS MUSICAIS
Aerofones: instrumentos nos quais o som é produzido pela vibração do ar, como flautas, saxofones e gaitas.
CONeXãO
Museu Virtual de Instrumentos Musicais
Você pode pesquisar novos exemplos de cada uma dessas classificações no site do Museu Virtual de Instrumentos Musicais. Disponível em: www.mvim.com.br/. (Acesso em: 20 ago. 2024).
Cordofones: instrumentos em que o som é produzido por meio da vibração de cordas, como no violão, no cavaquinho ou mesmo no violino (que utiliza o arco para provocar essa vibração).
Viola de cocho.
Eletrofones: instrumentos em que o som depende do uso de um alto-falante elétrico.
Tambor curimbó.
Trompa indígena.
Guitarra elétrica.
AçÃO Construindo uma flauta d’água
Conforme estudado, os povos indígenas costumam construir seus instrumentos musicais com base nos materiais que encontram em seu entorno. Partindo dessa premissa, a proposta é construir um instrumento musical utilizando materiais simples e de fácil manuseio.
Flauta d’água
A flauta d’água é classificada como um aerofone, isto é, seu som é produzido pelo sopro que passa pelo corpo do instrumento.
Materiais
• 1 mangueira de 30 cm
• 1 bexiga
• Tesoura
• Fita adesiva colorida ou fita isolante
• Água
• Funil
1. Confecção
• C om ajuda da fita adesiva, prenda a bexiga em uma das extremidades da mangueira. Procure prender com bastante firmeza, para evitar que a água escape pelas laterais.
Etapa inicial de confecção da flauta d'água.
• Encha seu instrumento de água até aproximadamente 1 cm acima da marca da fita adesiva que prende a bexiga.
Materiais para confecção da flauta d'água.
2. Tocando seu instrumento
• Você vai precisar treinar o seu sopro. Encostando a mangueira no queixo, sopre para baixo, fazendo o ar passar por dentro dela. Com a outra mão, aperte com delicadeza a bexiga de água.
delicadeza para a água não vazar.
ILUSTRAÇÕES: JOANA RESEK
• Observe que, quando a água entra por dentro da mangueira, o som fica mais agudo. Quando a água volta para a bexiga, o som fica mais grave. Assim, a água cumpre a função de um êmbolo que altera o tamanho do corpo do instrumento e, consequentemente, o som produzido.
3. Criando um ostinato com a flauta d’água
• Agora que você produziu seu instrumento, é hora de explorar suas possibilidades musicais. Organize um grupo de até cinco pessoas, cada uma com sua flauta d’água.
• Você e os colegas vão criar um ostinato musical, isto é, uma ideia musical curta que deverá se repetir várias vezes. Para isso, você pode criar um padrão rítmico que se repete ou até explorar as diferentes alturas de som que a flauta d’água pode produzir.
• Explore e experimente diferentes execuções até encontrar uma combinação de sons que tenha um sentido musical para o grupo e que possa ser repetida em ciclos.
• Quando você e os integrantes do grupo estiverem satisfeitos, podem fazer uma gravação e apresentá-la para o restante da turma.
êmbolo: peça com movimento de vaivém em cavidades cilíndricas que atua em mecanismos como seringas e motores.
ostinato: nesse contexto, trata-se de uma frase ou um motivo musical que se repete em um mesmo padrão rítmico ou melódico.
E xperimentações com a flauta d'água.
1. Resposta pessoal. Peça que os estudantes descrevam que experimentações e movimentos realizaram para produzir sons com a flauta d’água.
Após explorar diferentes sons com a flauta d’água, converse com sua turma.
1 Você achou difícil produzir sons com a flauta d’água?
2 Quais foram os maiores desafios para construir o ostinato em grupo? Não escreva no livro.
2. Resposta pessoal. Peça que os estudantes descrevam quais métodos utilizaram para chegar na composição coletiva.
CONTEXTO TEATRO
Teatro e os povos indígenas
Qual é a relação entre o teatro e os povos indígenas?
Esse debate tem ganhado espaço nos últimos anos. Os povos indígenas brasileiros lutam de maneira constante para defender seus modos de existir, seus territórios, suas vidas. Parte das batalhas é travada no campo simbólico: é necessário que os cidadãos brasileiros conheçam e respeitem as culturas indígenas. Assim, a linguagem teatral tem sido uma das ferramentas de combate.
No começo da história do Brasil, o teatro foi utilizado pelos colonizadores no violento processo de negar a cultura dos povos indígenas, impondo novos costumes e crenças. Este era o teatro jesuítico, que será abordado no capítulo 4. No entanto, atualmente, o processo se inverte: artistas indígenas têm defendido o seu direito de existir através da arte teatral.
Mesmo quando não estão fazendo teatro, os diferentes povos indígenas cultivam práticas cheias de teatralidade – esse conceito será estudado ao longo do capítulo. Inúmeras práticas culturais que compõem o dia a dia das aldeias, como rituais, narrativas, festas, danças e canções, têm um parentesco profundo com a linguagem teatral.
Além disso, artistas brasileiros não indígenas têm questionado os traços coloniais presentes na formação teatral do país. Se as referências teatrais europeias e estadunidenses são tão estudadas, por que a riqueza cultural dos povos indígenas que habitam o Brasil é ignorada?
Com base nessa inquietação, muitos teatristas têm buscado conhecer e criar pontes com os povos indígenas. Essas trocas baseiam-se em princípios éticos: a ideia não é fazer um uso descontextualizado de saberes ancestrais, mas estabelecer um contato frutífero para todos os envolvidos. O encontro entre artistas e intelectuais indígenas e não indígenas traz grande vitalidade à cena teatral contemporânea.
teatrista: profissional que trabalha com a arte teatral.
Atriz Zahy Tentehar em apresentação do espetáculo Azira’i, no 32o Festival de Curitiba (PR), 2024.
REPERTORiO 1
Azira’i
O espetáculo Azira’i é um solo da atriz, cantora, ativista e artista visual Zahy Tentehar (1989-). Por meio de narrativas orais e do trabalho com a música, a atriz compartilha reflexões e memórias sobre sua mãe, Azira’i Tentehar, que foi a primeira mulher pajé da reserva indígena de Cana Brava, no Maranhão.
Parte do espetáculo é falado em português, outra parte em ze’eng eté, língua materna da atriz, que ensina aos espectadores algumas palavras. Com essa proposta, o espetáculo convida a refletir sobre a imposição da língua portuguesa, uma das muitas violências sofridas pelos povos indígenas no Brasil.
Com essa obra, Zahy Tentehar tornou-se a primeira indígena a vencer um dos mais importantes prêmios de teatro no Brasil como melhor atriz. Segundo ela, os povos indígenas são teatrais. Sua busca é fazer uma junção entre a teatralidade de seu povo e as técnicas de teatralidade da cidade.
Ao assistir ao espetáculo, o intelectual indígena Ailton Krenak (1953-) comparou o trabalho de Zahy à prática dos pajés e avós indígenas. Para ele, a peça demonstra a capacidade de expressar a alma, abrindo caminho para que outros indígenas possam contar suas histórias através do teatro.
solo: espetáculo em que apenas um ator ou atriz está em cena.
Zahy Tentehar em apresentação do espetáculo Azira’i, 2023.
1. Incentive os estudantes a refletir sobre a imposição da língua portuguesa (língua dos colonizadores) aos povos indígenas brasileiros. Ao mesmo tempo, valorize o fato de eles perceberem como há palavras em seu repertório cotidiano que têm origem em línguas de povos indígenas.
Não escreva no livro.
Com base no estudo do espetáculo Azira’i, reflita sobre as seguintes questões.
1 Por que Zahy ensina palavras em ze’eng eté aos espectadores? Você conhece palavras ou nomes que têm origem em línguas de povos indígenas?
2 Em sua opinião, qual é a importância de uma pessoa indígena ganhar um prêmio teatral?
3 Você já escutou histórias sobre pessoas mais velhas de sua família ou de sua comunidade? Quais histórias você escutou quando era criança? Quem as contava?
3. Respostas pessoais. Valorize a prática da oralidade e o gesto de escutar histórias narradas por pessoas de gerações anteriores.
2. Resposta pessoal. Se possível, explore com os estudantes a ideia de representatividade, ou seja, a importância de diferentes grupos sociais se verem representados nas obras de arte.
DANIEL BARBOZA/SARAU AGÊNCIA
REPERTORiO 2
Sacerdote do riso
O documentário Hotxuá acompanha o dia a dia de uma aldeia dos indígenas krahô, localizada no estado do Tocantins. A figura central do filme é Ismael Aprac Krahô, que é um hotxuá – sacerdote do riso. O hotxuá exerce a importante função de brincar, provocar risadas e instaurar o bom humor nas mais diversas situações da vida em comunidade. O hotxuá não costuma se apresentar em um palco para um público específico. A comicidade não é separada dos outros fazeres humanos. Ele faz suas brincadeiras com pessoas que cozinham, caçam, realizam rituais e nadam no rio. As brincadeiras trazem graça para atividades comuns, como cozinhar e nadar. Dessa forma, as tarefas parecem mais leves e as relações, menos rígidas, criando uma atmosfera de espontaneidade e abertura para o inesperado.
Ismael Aprac Krahô exercendo seu papel de hotxuá em uma aldeia no Tocantins. Fotografia de 2023.
Porém, nem tudo é alegria. No filme, é possível observar os indígenas comentando sobre o perigo da instauração de uma barragem e os conflitos de terra na região. Ou seja, o documentário não esconde as dificuldades políticas enfrentadas por um povo que cultiva a harmonia. Com direção da atriz Letícia Sabatella (1971-) e do artista plástico Gringo Cardia (1957-), o documentário conta ainda com a participação do palhaço Ricardo Puccetti (1964-), que improvisa um número cômico ao lado de Ismael. O encontro entre um palhaço de tradição ocidental e um hotxuá faz toda a aldeia rir. Ambos dedicam sua vida à comicidade e, mesmo com tantas diferenças culturais, conseguem brincar juntos, encontrando uma linguagem teatral em comum.
Não escreva no livro.
Após ler essas informações sobre o documentário Hotxuá, converse com o professor e os colegas sobre as questões a seguir.
1 Como é o seu humor? O que lhe faz rir? Quem costuma fazer você dar risada? Quem ri das mesmas coisas que você? Respostas pessoais. Procure chamar a atenção dos estudantes para o aspecto coletivo do riso, destacando como ele pode revelar características a respeito do grupo que ri.
2 Qual é a função do riso em seu dia a dia? E em nossa sociedade? Quais espaços e situações seriam melhores se incluíssem o riso?
3 Você percebe diferenças entre a comédia trabalhada em obras de arte e a comicidade presente no cotidiano?
Respostas pessoais. Com base nas respostas dos estudantes, busque tecer relações entre o lugar social do riso para os krahô e o lugar social do riso na sociedade em que vivemos. É possível que essa comparação ajude-os a valorizar a existência do hotxuá para os krahô.
Resposta pessoal. Aproveite para conversar com os estudantes sobre as obras cômicas a que eles costumam assistir. Proponha que comparem essas obras (séries, filmes, peças de teatro) com situações do seu cotidiano que provocam riso.
RAISSA AZEREDO
O silêncio do mundo REPERTORiO 3
Ailton Krenak e Andreia Duarte em meio a caranguejos projetados na parede, em cena de O silêncio do mundo. 27o Porto Alegre em Cena, Festival Internacional de Artes Cênicas. Porto Alegre (RS). Fotografia de 2020.
O silêncio do mundo é uma palestra-performance protagonizada por Ailton Krenak e Andreia Duarte. Nela, os artistas compartilham reflexões sobre a relação dos seres humanos com a natureza, a importância do sonho e o lugar da ancestralidade.
Em meio às palavras, os artistas respiram juntos, sentem a chuva, dançam ombro a ombro.
O corpo da atriz se confunde com caranguejos, por meio de uma projeção. Por um momento, o corpo humano deixa de ser o centro do mundo.
Krenak ensina sobre o tempo do mito – muito diferente da visão de tempo-dinheiro que impera nas grandes cidades. O mito é uma experiência coletiva que resgata memórias ancestrais.
O processo de criação do espetáculo contou com a colaboração de Davi Kopenawa (1956-), xamã e líder político do povo yanomami. Ao longo da apresentação, são lidos trechos de seu livro A queda do céu: palavras de um xamã yanomami (2015), escrito em parceria com Bruce Albert (1952-). A ideia da queda do céu, para diferentes povos indígenas, simboliza o fim do mundo. Durante o espetáculo, uma obra de Ernesto Neto (1964-) está suspensa sobre a cabeça dos artistas, representando esse céu que precisamos segurar para que não caia sobre nós. Em tempos de destruição violenta da natureza, a peça se posiciona contra o fim do mundo.
Agora, converse com o professor e os colegas sobre os seguintes temas.
1 Você já refletiu sobre a expressão “tempo é dinheiro”? O que ela significa para você? Quais outras maneiras de pensar o tempo são possíveis?
1. Respostas pessoais. Incentive reflexões sobre a relação dos estudantes com o tempo e valorize a possibilidade de questionar
2 Qual é a sua relação com a natureza? Como as pessoas que vivem no mesmo local que você convivem com a natureza?
2. Respostas pessoais. Espera-se que o estudante reflita sobre sua relação cotidiana com a natureza, com base em sua rotina.
os modos de vida contemporâneos. Caso haja estudantes indígenas na turma, procure convidá-los a compartilhar com os colegas a visão de seu povo em relação ao tempo.
Não escreva no livro.
Teatro e os povos indígenas nos dias atuais
Nesta seção, será investigada a relação entre o teatro e os povos indígenas, com base em fontes disponíveis na internet. Felizmente, tem aumentado a oferta desses materiais, o que reflete tanto o trabalho dos próprios indígenas em expressar seus modos de vida e suas lutas quanto a busca, por parte dos artistas, em refletir sobre os processos coloniais brasileiros por meio de suas criações.
1. Dramaturgia: O silêncio do mundo.
No artigo, a noção de “fazermos juntos porque decidimos fazer” é construída pela dupla. A palestra-performance é resultado da união entre um indígena e uma artista que não é de origem indígena, mas que há anos dedica sua vida a vivências aprofundadas com povos indígenas e suas lutas.
Anotações de Ailton Krenak e de Andreia Duarte, respectivamente, feitas durante o processo criativo do espetáculo O silêncio do mundo, em 2019.
• Para conhecer a dramaturgia completa do espetáculo O silêncio do mundo, leia a revista de arte Corpo Futuro : www.outramargem.art/_files/ugd/19c25e_a1c1cf8e0e264d8db6a75c3fe9a949e0.pdf. (Acesso em: 20 ago. 2024). No capítulo 8 , será abordada a dramaturgia – o texto teatral, escrito para ser transformado em cena ou para registrar o acontecimento teatral.
• A publicação também conta com um artigo de Andreia Duarte sobre o processo, “A efemeridade de O silêncio do mundo”, no qual a atriz escreve sobre a importância da horizontalidade durante a criação: a obra é assinada conjuntamente por Andreia e Krenak.
2. Outra margem e Teatro e os Povos Indígenas (TePI).
• A a triz Andreia Duarte é fundadora do site Outra margem, endereço digital que concentra publicações diversas com base em um programa artístico e formativo. A Outra Margem tem como um de seus objetivos a escuta e a troca com o conhecimento dos povos originários. Suas ações artísticas e pedagógicas questionam a violência colonial e têm como horizonte a justiça social. Como parte do programa, o site concentra um histórico a respeito do Teatro e os Povos Indígenas (TePI). Desde 2018, o TePI promove mostras, encontros, debates e publicações defendendo o protagonismo artístico indígena, o diálogo com aliados não indígenas e a arte como forma de resistência. Para se aprofundar nesse tema, ler os textos e assistir aos vídeos, acesse a página: https://www.outramargem.art/tepi-teatro-e-os-povos-ind%C3%ADgenas. (Acesso em: 2 out. 2024).
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Teatralidade e narrativa
Você sabia que a arte teatral surgiu em diferentes lugares do mundo? Uma das maneiras de entender esse fenômeno é observar o que existe de teatral no dia a dia das pessoas. O que não é exatamente teatro, mas se assemelha a ele? De que forma a vida humana inspira a criação da linguagem teatral? Quais situações têm teatralidade, ou seja, características que tornam a realidade parecida com um espetáculo teatral?
Experimente fazer uma lista dessas situações: alguém contando uma história? Uma fofoca sendo sussurrada? A maneira de um professor fazer explicações? Nossa postura em uma entrevista de emprego? Duas pessoas durante um flerte? Costumamos ver teatralidade quando alguém assume um papel que é aceito pelos interlocutores. Somos diferentes conforme a situação, isto é, exercemos papéis sociais como o de filho, irmão, estudante ou funcionário.
Cada um desses papéis possui acordos prévios, que às vezes não são ditos, mas são conhecidos por todos. São exemplos: um professor faz a chamada esperando certas respostas; um adulto responsável alerta que é hora de ir para a escola; um líder religioso conduz um ritual respeitando uma série de palavras e gestos.
Esses combinados prévios também aproximam a vida de um espetáculo teatral: são como o texto que antecede a apresentação. Mas, tanto no teatro como nas situações com teatralidade, esse “texto” anterior é presentificado. Não repetimos mecanicamente o que devemos dizer. Damos vida ao que já estava combinado, colocando as palavras e os gestos no presente. Com um olhar atento, podemos perceber como a teatralidade brota da vida. O intelectual indígena Ailton Krenak comenta que uma criança da cidade, ao escutar a palavra “teatro”, costuma pensar em um prédio (o edifício teatral), diferente dos povos indígenas, que, de acordo com sua cosmovisão, quando falam “teatro” invocam um gesto que abraça a terra e as outras pessoas.
A ação de narrar histórias é cheia de teatralidade. Não importa quantas vezes já foi repetida: a narrativa ganha vida e verdade sempre que encontra novos interessados. Certas histórias nos ajudam a entender quem somos, por que existimos e o que nos conecta aos nossos ancestrais.
Daniel Munduruku (1964-), escritor, professor e ativista indígena. São Paulo (SP). Fotografia de 2019. Em seu livro Meu vô Apolinário: um mergulho no rio da (minha) memória (2009), homenageia seu avô, que compartilhava com ele os ensinamentos dos espíritos ancestrais de seu povo.
AçÃO Contação de histórias aprendidas com um parente mais velho
Conforme mencionado, o compartilhamento de histórias faz parte do cotidiano dos povos indígenas. A exemplo disso, nesta seção, você terá a oportunidade de compartilhar com os colegas histórias contadas por alguém especial.
1. E scutar histórias
• Convide um parente mais velho para uma conversa. Pode ser um avô ou uma avó, tio ou tia, ou alguém da sua comunidade – vizinhos e amigos da família também valem. Escolha alguém que tenha afeto por você e que tenha boas histórias para contar. Cuide para que esse encontro seja prazeroso para ambos: você pode passar um café, fazer um chá ou sugerir uma tarde na praça, por exemplo.
• Peça para essa pessoa lhe contar uma ou mais histórias. Podem ser memórias de vida, casos reais ou inventados, lendas ou mitos aprendidos na infância. Aproveite para fazer perguntas, pois bons detalhes surgem quando abrimos espaço para a curiosidade.
• Combine previamente com a pessoa convidada o registro dessa conversa. Você pode fazer anotações em um caderno ou desenhar enquanto escuta. Se a pessoa aceitar e se sentir confortável, você pode usar um celular para gravar o relato, mas lembre-se de consultá-la antes.
• Aproveite esse momento entre vocês. Experimente não se apressar e participe desse encontro sem se preocupar com o tempo. Se puder, evite olhar o celular ou se distrair com outras telas: a escuta presente é um exercício. Procure perceber as sensações geradas em você enquanto escuta a história.
2. P reparar uma contação de histórias
• Com base na escuta, escolha qual história você gostaria de compartilhar com a turma. Experimente narrar essa história em voz alta. O que mais lhe marcou? Quais detalhes você gostaria de privilegiar? Como sua voz e seu corpo podem expressar com mais inteireza aquilo que você ouviu?
• Experimente contar com o auxílio de um objeto. Pode ser um objeto que aparece na história ou que represente uma de suas personagens. Por exemplo, na imagem da próxima página, Alicce Oliveira segura o boneco de um pássaro – personagem do mito terena que ela está narrando. O objeto também pode despertar a imaginação dos espectadores: por exemplo, uma pena pode se transformar em pássaro através da força da sua narrativa.
• Escolha seu figurino. Que roupa você gostaria de usar para contar essa história? O figurino de Alicce foi confeccionado por indígenas do povo terena, com quem a atriz aprendeu os mitos que está contando. Você pode se aproximar visualmente do universo narrado através da sua vestimenta. Pode optar também por roupas com pouca informação visual, como peças da mesma cor e sem estampa, para que o foco dos ouvintes esteja em sua fala.
• Ensaie a contação de histórias já com todos os elementos escolhidos, como objetos e figurino, além de experimentar o uso do espaço. Explore diferentes maneiras de narrar a história, variando seus movimentos corporais, tons de voz e escolha de palavras. Depois desse momento de exploração de possibilidades, faça escolhas: de que maneira a história narrada mais se aproxima da sensação de interesse que você sentiu ao escutá-la pela primeira vez?
3. A presentar a história para a turma
1. Respostas pessoais. Procure acolher tanto a alegria de estar em cena como os possíveis receios e inseguranças vividos pelos estudantes. Esses afetos, muitas vezes, fazem parte do processo de aprendizagem da linguagem teatral. Vale tranquilizar os estudantes e deixar claro que eles terão novas oportunidades de experimentar estar em cena.
• Agora é hora de dividir sua narrativa com os colegas. Combine com a turma qual será a ordem e o formato das apresentações. Organize o espaço físico da sala de aula para melhor acolher vocês. Reorganize as carteiras para abrir espaço, de forma que cada contador de histórias possa se movimentar com mais liberdade.
• Reserve um momento para se concentrar e ativar seu corpo e sua voz para a apresentação. Junte-se aos colegas em uma roda para fazer um aquecimento coletivo. Cada pessoa pode propor um movimento e um som que auxilie nessa preparação.
• Aproveite a oportunidade de escutar histórias. Prestigiar o trabalho dos colegas é tão importante quanto se apresentar. Na hora de narrar, lembre-se de contar a história com atenção total para seus colegas. Perceba como cada momento da narrativa reverbera na audiência e faça pausas quando sentir que os ouvintes precisam respirar. A contação de histórias é uma troca que acontece na relação entre quem narra e quem escuta.
• Por fim, conte para a pessoa que lhe contou a história sobre essa experiência. Ela vai gostar de saber como a narrativa compartilhada foi contada por você!
Após as apresentações, troque impressões a respeito da experiência com a turma.
1 Como foi contar a sua história? Quais foram suas dificuldades e descobertas?
2 E em relação a escutar as histórias dos colegas? Qual história foi mais marcante? O que mais chamou a sua atenção?
2. Respostas pessoais. Deixe claro que não se trata de uma competição. A ideia é que os estudantes possam escutar um retorno a respeito do que criaram. Também é importante valorizar o lugar do espectador – em sala de aula, a fruição artística é tão importante quanto a criação.
CONeXãO
Histórias indígenas
Exetina Kopenoti – Histórias indígenas é uma criação da atriz Alicce Oliveira e da artista e pesquisadora indígena Naine Terena (1980-). A obra reúne mitos do povo terena, narrados com a ajuda de cenários, ornamentos e figurinos preparados por artesãos desse povo. As apresentações, realizadas em aldeias, quilombos e cidades de Mato Grosso, eram seguidas de uma palestra de Alicce sobre a importância de se contar histórias.
A contadora de histórias Alicce Oliveira em apresentação de Exetina Kopenoti –Histórias indígenas . Fotografia de 2017.
TÉO DE MIRANDA
Não escreva no livro.
PONTE PARA OUTRAS
liNGUAGENS ARTiSTiCAS
ARTES iNTEGRADAS ARTES iNTEGRADAS
Videogame
Os caminhos da jiboia
Na última década, indígenas brasileiros têm atuado em diversas linguagens artísticas. Suas criações trazem cosmovisões para nos ajudar a pensar em diferentes modos de viver no mundo e podem atrair o interesse de crianças, jovens e adultos.
Os saberes indígenas são o tema de Os caminhos da jiboia, um videogame desenvolvido em 2015 por Guilherme Pinho Meneses (1988-), com a colaboração dos huni kuin que vivem às margens do Rio Jordão, no Acre.
Os protagonistas do jogo são um jovem caçador e uma pequena artesã, que precisam adquirir o conhecimento de seus ancestrais a fim de se tornarem um pajé e uma mestra dos desenhos.
Frame do videogame Os caminhos da jiboia. O jogo foi concebido com o objetivo de difundir os conhecimentos dos huni kuin.
Audiovisual indígena
Um projeto de destaque da cultura indígena contemporânea é o Vídeo nas aldeias, coordenado pelo antropólogo franco-brasileiro Vincent Carelli (1953-). Iniciado no final da década de 1980, o projeto acompanhou populações indígenas do Brasil para investigar e registrar suas culturas por meio de vídeo. O projeto hospeda e divulga em uma plataforma on-line um acervo de filmes, documentários, reportagens, ficção e depoimentos realizados em várias aldeias brasileiras. Todos registram histórias e culturas dos povos nativos do Brasil com base na percepção dos próprios indígenas. Uma nova geração de cineastas indígenas surgiu nos últimos anos, entre eles Sueli Maxakali (1976-) e Isael Maxakali (1978-), originários do povo maxacali e diretores do filme Yãmĩyhex: as mulheres-espírito de 2019; e Ariel Kuaray Ortega, indígena guarani mbya, que dirigiu o filme A transformação de Canuto, juntamente com Ernesto de Carvalho (1981-), em 2023.
Frame do filme Yãmĩyhex: as mulheres-espírito (2019), dirigido por Sueli Maxakali e Isael Maxakali. Este documentário brasileiro foi filmado na Aldeia Maxacali, no norte de Minas Gerais (MG).
DANÇA
Festival de dança e cultura indígena
Em 1998, Ailton Krenak realizou o I Festival de Dança e Cultura Indígena, na Serra do Cipó, em Minas Gerais. Esse festival nasceu de um sonho de Krenak em que os antigos de seu povo reclamavam que não eram realizadas mais festas para eles e que os ritos estavam sendo abandonados. Então, isso o motivou a criar esse festival para celebrar, ativar os ritos e reverenciar os antigos.
Durante uma semana, no início da primavera, parentes de várias partes do país, como os maxakali, os kaxinawá, os terena, os pataxó, dentre outros, se reuniram para dançar, cantar, conviver e curar a terra. Ailton Krenak relata que:
[…] cada entrada de uma tribo no terreiro, para dançar, para cantar, é uma surpresa; é uma surpresa para nós mesmos; é uma surpresa para as tribos visitantes. Esse nosso terreiro na serra é a nossa estação mais próxima do mundo dos espíritos, do lugar dos sonhos.
[…]
KRENAK, Ailton. O lugar onde a terra descansa. Rio de Janeiro: Petrobras, 2000. p. 162.
Os maxacali no I Festival de Dança e Cultura Indígena, na Serra do Cipó (MG), em 1998.
DANÇA
Caboclinho
Folguedo de inspiração indígena, o Caboclinho é parte da tradição do Carnaval pernambucano, presente também em outros estados do Nordeste. Desfilando em duas alas, dançarinos de várias gerações, ornamentados com cocares e saias coloridas de plumas, realizam uma dança ágil e ritmada, com saltos curtos, rápidas batidas de pés e descidas ao chão. Os participantes iniciam seus treinos para o desfile de Carnaval ainda no mês de setembro, pois trata-se de uma dança exigente que requer muito preparo físico. A preaca, uma espécie de arco e flecha de madeira, é um dos instrumentos que marca com seus estalidos secos o ritmo da dança. Historicamente, essa manifestação popular tem suas raízes na Jurema Sagrada, uma beberagem composta das partes da planta de mesmo nome, cultuada pelos indígenas da região. Em 2016, esse folguedo tornou-se Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil.
folguedo: festa popular de caráter lúdico que ocorre em diversas regiões do Brasil.
beberagem: bebida de preparação caseira com pretensões medicinais.
Com cocares e saias estilizados e coloridos, de referência indígena, os participantes do Caboclinho evoluem de pés descalços, marcando o ritmo com as preacas. Nazaré da Mata (PE). Fotografia de 2014.
SiNTESE ESTETiCA
O espírito da floresta
Urihi a, a terrafloresta. Desenho de Davi Kopenawa que ilustra um dos textos do livro A queda do céu: palavras de um xamã yanomami.
Reflexão
Davi Kopenawa Yanomami é xamã e porta-voz de seu grupo étnico. Conheceu os brancos ainda criança, durante os primeiros contatos com sua gente. Mais tarde, tornou-se um líder na luta pelos direitos indígenas e contra a destruição da Floresta Amazônica. Ele concedeu diversos depoimentos ao etnólogo Bruce Albert, que visita as aldeias dos yanomami há 40 anos. Esses depoimentos foram reunidos no livro A queda do céu: palavras de um xamã yanomami, publicado em 2015. Leia, a seguir, um pequeno trecho do livro.
Como eu disse, o pensamento dos xamãs se estende por toda parte, debaixo da terra e das águas, para além do céu e nas regiões mais distantes da floresta e além dela. Eles conhecem as inumeráveis palavras desses lugares e as de todos os seres do primeiro tempo. É por isso que amam a floresta e querem tanto defendê-la. A mente dos grandes homens dos brancos, ao contrário, contém apenas o traçado das palavras emaranhadas para as quais olham sem parar em suas peles de papel. Com isso, seus pensamentos não podem ir muito longe. Ficam pregados aos seus pés e é impossível para eles conhecer a floresta como nós. Por isso não se incomodam nada em destruí-la! Dizem a si mesmos que ela cresceu sozinha e que cobre o solo à toa. Com certeza devem pensar que está morta. Mas não é verdade. Ela só parece estar quieta e nunca mudar porque os xapiri a protegem com coragem, empurrando para longe dela o vendaval yariporari, que flecha com raiva suas árvores, e o ser do caos xiwãripo, que tenta continuamente fazê-la virar outra. A floresta está viva, e é daí que vem sua beleza. Ela parece sempre nova e úmida, não é? Se não fosse assim, suas árvores não seriam cobertas de folhas. Não poderiam mais crescer, nem dar aos humanos e aos animais de caça os frutos de que se alimentam. Nada poderia nascer em nossas roças. Não haveria nenhuma umidade na terra, tudo ficaria seco e murcho, pois a água também está viva. É verdade. Se a floresta estivesse morta, nós também estaríamos, tanto quanto ela! Ao contrário, está bem viva. Os brancos talvez não ouçam seus lamentos, mas ela sente dor, como os humanos. Suas grandes árvores gemem quando caem e ela chora de sofrimento quando é queimada. Ela só morre quando todas as suas árvores são derrubadas e queimadas. Então restam dela apenas troncos calcinados, desmoronados sobre uma terra ressecada. Não cresce mais nada ali, a não ser um pouco de capim.
Os brancos não se perguntam de onde vem o valor de fertilidade da floresta. Nós o chamamos në rope. Devem pensar que as plantas crescem sozinhas, à toa. Ou então acham mesmo que são tão grandes trabalhadores que poderiam fazê-las crescer apenas com o próprio esforço! Enquanto isso, chegam a nos chamar de preguiçosos, porque não destruímos tantas árvores quanto eles! Essas palavras ruins me deixam com raiva. Não somos nem um pouco preguiçosos! As imagens da saúva koyo e do lagarto waima aka moram dentro de nós e sabemos trabalhar sem descanso em nossas roças, debaixo do sol. Mas não fazemos isso do mesmo modo que os brancos. Preocupamo-nos com a floresta e pensamos que desbastá-la sem medida só vai matá-la. A imagem de Omama nos diz, ao contrário: ‘Abram suas roças sem avançar longe demais. Com a madeira dos troncos já caídos façam lenha para as fogueiras que os aquecem e cozinham seus alimentos. Não maltratem as árvores só para comer seus frutos. Não estraguem a floresta à toa. Se for destruída, nenhuma outra virá tomar seu lugar! Sua riqueza irá embora para sempre e vocês não poderão mais viver nela!’.
KOPENAWA, Davi; ALBERT, Bruce. A queda do céu: palavras de um xamã yanomami. Tradução: Beatriz Perrone-Moisés. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 468-469.
xapiri: termo yanomami que designa tanto os xamãs, os homens espíritos (xapiri thëpë), quanto os espíritos auxiliares (xapiri pë).
yariporari: termo yanomami para se referir ao vento-tempestade.
xiwãripo: termo yanomami que designa um ser sobrenatural que representa o caos. në rope: princípio da fertilidade ao qual se atribui o crescimento e a vitalidade da floresta.
Os xamãs conhecem a floresta porque seu pensamento se estende para todos os lugares, reconhecendo na floresta um ser vivo e espiritualizado. Os brancos não possuem essa visão ampla, pois só conseguem ver seus interesses particulares, sem levar em consideração o todo.
A vida de todos depende diretamente da vida da floresta, pois é dela que vem os frutos e os animais que nos alimentam, bem como a fertilidade da terra em que plantamos.
Processo de criação coletiva
Tendo como ponto de partida o trecho do livro A queda do céu: palavras de um xamã yanomami, que você acabou de apreciar, desenvolva um processo artístico criativo e colaborativo. Para tanto, forme um grupo de seis a dez integrantes.
Análise e debate
Depois de ler o texto e analisar a imagem, debata com seu grupo as seguintes questões.
• Segundo o texto, por que os xamãs conhecem a floresta? E por que os brancos não a conhecem?
• Qual é a relação entre a vida da floresta e a nossa, de acordo com Davi Kopenawa?
Chamada de në rope pelos yanomami, a fertilidade da floresta é aquilo que torna possível o crescimento e a vitalidade dos ecossistemas.
• Qual é o valor da fertilidade da floresta para os yanomami?
Davi Kopenawa à frente das pessoas de sua aldeia, na terra indígena yanomami, localizada nos estados do Amazonas e de Roraima. Fotografia de 2023.
• Por quais razões os indígenas se mobilizam na luta para preservar as florestas?
• Qual é a sua relação com os povos indígenas? Compartilhe com seus colegas.
Resposta pessoal. Caso algum estudante da turma seja indígena, incentive-o a compartilhar com o grupo um pouco do seu cotidiano e de sua visão de mundo.
Anote os principais tópicos que surgiram no debate, pois eles servirão de base para o processo de criação artística.
Para os povos indígenas, a morte da floresta é também sua própria morte, a extinção da sua forma de existência. O modo de existir e a cosmovisão dos povos indígenas são completamente integrados com a natureza.
Ideia disparadora e linguagens artísticas
Em seguida, ainda em grupo, pense em como fazer uma síntese estética do debate realizado, ou seja, como transmitir as conclusões do grupo aos demais colegas da turma por meio de uma criação artística, como uma música, uma pintura, um poema, uma cena, uma performance, uma instalação etc.
Retome as ferramentas criativas trabalhadas ao longo deste capítulo que possam apoiar o processo de criação. Leve em consideração, também, as habilidades e os desejos artísticos dos integrantes do grupo para compor a ideia central da obra coletiva.
Em um primeiro momento, deixe as ideias fluírem, anotando todo tipo de sugestão dos integrantes. Depois, você e os colegas devem retomar as ideias e escolher a que parecer mais promissora, chegando em uma única ideia disparadora.
Um ponto de partida interessante é o fato de que, para os indígenas, a floresta é um lugar onde as pessoas, os demais seres vivos e os seres sobrenaturais atuam e se transformam, podendo trocar seus papéis entre presa e predador. Nessa concepção, os xamãs podem se transmutar em animais e seres sobrenaturais.
Permita que a imaginação flua livremente nesse momento. Você e os colegas podem imaginar formas de representar artisticamente o espírito da floresta evocado pelo texto, proporcionando vivências sensoriais que remetam a essa floresta viva, descrita por Davi Kopenawa. Também é possível compor uma obra musical baseada nos sons da natureza, como os sons dos pássaros, das águas e do vento, bem como montar uma instalação inspirada nas luzes, nas cores e nos aromas da floresta. Ou, ainda, compor uma cena poética que represente e expresse a dor da floresta.
Por fim, anote a ideia disparadora e a(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Pesquisa, criação e finalização
Organize as etapas de criação do projeto artístico com base nas reflexões centrais, na ideia disparadora e nas linguagens artísticas escolhidas.
Caso a criação do grupo envolva apresentação ou encenação, lembre-se de ensaiar o maior número de vezes possível, aprimorando o trabalho a cada repetição. Não deixe que o processo de criação fique só na conversa, lembre-se de experimentar os elementos em cena.
Caso a invenção do grupo envolva uma exposição ou instalação, faça uma lista de tudo o que será necessário para realizar o projeto, dividindo as tarefas entre os integrantes do grupo.
Não existe uma fórmula para esse processo de criação. Cada grupo deve desenvolver suas próprias etapas, estabelecendo critérios com base na obra ou manifestação artística que se está concebendo.
Com o trabalho desenvolvido, chegou o momento de compartilhá-lo com o restante da turma. Aproveite também para apreciar a criação dos seus colegas.
Culturas africanas
MÁSCARA da cultura bwa da Burkina Faso. [19--]. Madeira e pigmentos, 211 cm x 38 cm x 28,5 cm. Museu Horniman, Londres (Inglaterra).
Na forma de um pássaro, a máscara ritual do povo bwa conecta a humanidade aos espíritos da natureza.
VALENTIM, Rubem. Emblemágico 78. 1978. Acrílico sobre tela, 75,7 cm x 103 cm.
Elementos simbólicos do universo religioso de raiz africana em composição do artista baiano Rubem Valentim (1922-1991).
Música contemporânea africana, representada pela obra de Eneida Marta, uma das cantoras de maior projeção da Guiné-Bissau.
NHA sunhu. 2015. Capa do álbum de Eneida Marta, uma das mais vibrantes vozes africanas e a verdadeira embaixadora da música da Guiné-Bissau.
Festas populares como expressão pulsante da cultura afro-brasileira.
Grupo de bumba meu boi Boi da Maioba, que representa o sotaque matraca em São Luís (MA). Fotografia de 2013.
Imagens que questionam o futuro e o presente em cidades do continente africano, como Luanda, em Angola.
N’ZOMBO, Mussunda; GROTZ, Manuela. [Sem título]. 2023. Composição de arte digital regenerativa de inteligência artificial criada pelo performer angolano e pela artista alemã para a exposição “O futuro na lista de espera”. Angola, 2023.
Não escreva no livro.
Considerando as imagens apresentadas nestas páginas de abertura, responda às questões a seguir.
1. Máscara, pintura, geometria, música contemporânea, cultura popular, fotografia, urbanismo.
1 O que essas imagens representam?
2. Os estudantes podem estabelecer relações entre os tempos passado e futuro; bem como citar relações que envolvam rituais, tradições e religiões de matriz africana.
2 A quais temas essas obras e esses objetos podem se relacionar?
3. Resposta pessoal. Os estudantes podem citar conexões nas cosmologias e nos símbolos, na música, na culinária, na desigualdade social, entre outras.
3 Em sua opinião, qual é a conexão entre as culturas brasileiras e africanas?
É importante ressaltar que existem marcas da arte afro-brasileira que descrevem a nossa experiência histórica e cultural e se diferenciam da expressão em outros territórios que também sofreram com os mesmos processos de escravização. Da mesma forma, a arte africana possui seus próprios contornos e uma longa trajetória que inclui experiências dos povos autóctones, mas também experiências artísticas diversas que revelam as marcas do colonialismo no continente africano.
Por que estudar as culturas africanas?
Cerca de 4,8 milhões de africanos, originários de diferentes regiões e culturas, foram sequestrados e trazidos para o Brasil, onde viveram sob regime de escravidão entre os séculos XVI e XIX. Aqui, homens e mulheres pertencentes a um mesmo grupo eram separados, misturados a pessoas de etnias diversas e encaminhados a destinos variados. Visava-se com isso dificultar a consolidação de laços culturais.
Por necessidade e resistência, essas pessoas estabeleceram um processo contínuo de atualização da memória coletiva e de um imaginário comum. Suas variadas culturas foram preservadas e renovadas por meio de estratégias que incluíam práticas escondidas, linguagem codificada e adaptação às expressões estéticas dos portugueses e dos indígenas, em um processo de mestiçagem que constituiu a cultura brasileira.
Por serem vivas e dinâmicas, essas culturas se transformaram no decorrer dos séculos. As populações negras originárias da diáspora africana desenvolveram variadas formas de relações sociais e culturais e visões distintas da África como terra de origem.
Nas últimas décadas, os afrodescendentes obtiveram conquistas políticas, tais como a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira na escola, o sistema de cotas nas universidades e a criminalização de atos racistas. Acompanhando essas conquistas, têm se desenvolvido uma produção cultural voltada para a reflexão sobre a dinâmica social afro-brasileira nos campos da arte, da crítica, da museologia e da educação.
Nos anos 1980, o antropólogo mineiro Darcy Ribeiro (1922-1997) concebeu um monumento à negritude, no qual seria representado o herói da emancipação dos negros no Brasil, Zumbi, de quem não se tem um retrato, mas se sabe ser do povo banto.
No projeto Pontes sobre abismos, a artista Aline Motta (1974-) se debruça sobre a ideia de reconstruir uma genealogia familiar. Partindo de uma rota invertida do tráfico negreiro, ela viaja da cidade de Vassouras, no Rio de Janeiro, para Serra Leoa, na África, reunindo relatos, fotografias e documentos. Na fotografia a seguir, o chefe Iman Alhaji Mustapha Koker, do povo mende, segura orgulhosamente uma fotografia emoldurada de sua mãe, em frente a fotografia da bisavó da artista, ampliada e hasteada em tecido.
RIBEIRO, Darcy; LIMA, João Filgueiras. Monumento nacional Zumbi dos Palmares. 1986. Concreto armado e bronze. Escultura de 3 metros de altura, localizada no centro do Rio de Janeiro (RJ). Fotografia de 2023.
A ideia do antropólogo foi se apropriar da forma da cabeça de um governante de Ifé para representar Zumbi. O monumento, executado pelo arquiteto João Filgueiras Lima (1932-2014), situa-se na Pequena África, bairro carioca próximo ao porto do Valongo, usado para o desembarque de grande parte dos africanos trazidos pelo tráfico escravagista, a partir de 1850, quando tal prática já era proibida.
Luiz Gomes/Fotoarena
MOTTA, Aline. Pontes sobre abismos #3. 2017. Fotografia digital. A obra faz parte da série de fotografias e vídeos realizados pela artista no Brasil e em Serra Leoa.
AT¡v¡DaDe De SeNS¡B¡l¡ZAÇÃO Mandjólò
8.
• Respostas pessoais. É comum que estudantes do Ensino Médio sintam-se desconfortáveis ao exporem seus corpos. Acolha as dificuldades compartilhadas. Trabalhe essa barreira com a turma, construindo uma cultura de experimentação livre no ambiente da sala de aula.
• Respostas pessoais. Peça aos estudantes que reflitam sobre os saberes que vem do corpo, a disponibilidade de se deixar levar por uma composição musical que instiga determinados movimentos.
• Respostas pessoais. As culturas africanas marcam, de maneira decisiva, as produções artísticas brasileiras, habitando a cultura dos adolescentes, mesmo que não tenham consciência disso. Essas questões são uma oportunidade de explorar essa relação.
1. É recomendado realizar esta atividade em um espaço amplo, que possibilite o movimento livre dos estudantes, como um teatro, auditório, quadra ou outro local como esses que esteja disponível na escola.
Depois de conhecer algumas obras e artistas da África e do Brasil e ler e refletir sobre o processo de escravização e a diáspora africana, sugere-se escutar e dançar uma música africana contemporânea.
1. Com o professor e os colegas, organize o espaço para a atividade. Afaste mesas e cadeiras, se houver, deixando o ambiente livre.
2. Escolha um espaço e sente-se no chão. Todas as pessoas da turma vão participar da atividade ao mesmo tempo, seguindo a condução do professor.
3. Escute a canção "Mandjólò", do músico e compositor moçambicano Costa Neto (1959-). Feche os olhos para essa apreciação.
4. Ainda de olhos fechados, experimente mexer-se enquanto escuta a canção. Deixe-se levar pelas sonoridades, movimentando as partes do corpo que são provocadas pelo som.
5. Evolua esse movimento até que se torne uma dança, mobilizando seu corpo inteiro.
6. Então, abra os olhos e dance com os colegas, ocupando coletivamente o espaço.
7. Experimente repetir os movimentos dos colegas por alguns momentos antes de retomar a sua dança, realizando uma troca de passos e dinâmicas.
8. Ao final, converse com o professor e os colegas sobre a experiência, partindo das perguntas a seguir.
• Como você se sentiu ao realizar essa atividade? Houve momentos prazerosos? Houve momentos de desconforto ou alguma dificuldade?
• Q uais partes do seu corpo foram convocadas por essa música? Que tipos de movimentos você teve vontade de fazer?
• Essa experiência te fez lembrar de canções e danças brasileiras que já fazem parte do seu repertório? Se sim, quais?
ARTES ViSUAiS
CONTEXTO
Artes visuais nas culturas africanas e afro-brasileiras
Apesar das diferenças observadas entre as expressões culturais dos numerosos povos africanos, aspectos comuns podem ser percebidos em algumas regiões do continente, como a predominância da escultura, a valorização dos rituais e o uso do corpo como suporte.
Quase tudo o que se conhece como arte autóctone africana foi esculpido, moldado ou construído em três dimensões. Até mesmo os variados padrões de estampas geométricas podem ser aplicados sobre formas tridimensionais, como se vê nas máscaras usadas em rituais.
As esculturas em madeira são encontradas na arte dos antigos povos africanos. Elas podem ter função ritual ou representar personagens míticas e líderes históricos.
Há ainda uma importante produção de objetos de ferro, cobre, bronze e outras ligas metálicas, especialmente na região do Vale do Rio Níger, onde foram usadas sofisticadas técnicas de fundição desde o século X. Parte da população que foi trazida em diáspora para o Brasil a partir do século XVII veio dessas regiões, como os iorubás, que viviam no reino de Oió; ou os edos, do reino de Benin, na atual Nigéria.
Para muitos povos africanos, a performance é a forma essencial de arte. Esse tipo de manifestação inclui música e dança, envolvendo objetos e pessoas em ações coletivas. É o que se observa, entre outras situações, nas procissões em que esculturas são transportadas cerimonialmente ou nos festivais que incluem orquestra percussiva e dança.
Algumas dessas características podem ser identificadas nas expressões artísticas afro-brasileiras e na produção de artistas negros no cenário contemporâneo da arte no Brasil.
autóctone: aquilo que se origina da região onde é encontrado.
A artista baiana Goya Lopes (1954-) em frente a seus painéis estampados. Em suas obras, a designer têxtil reúne elementos botânicos brasileiros, objetos cotidianos e orixás.
2. Dwenini mmen, que significa “o carneiro, ao atacar, não deve fazê-lo com os chifres e sim com o coração”, símbolo da humildade e da força da mente, do corpo e da alma. Aya, que significa “eu não tenho medo de você”, símbolo de resistência, desafio às dificuldades, força física, perseverança, independência e competência.
REPERTORiO 1
Pinturas e padrões
Um aspecto de destaque nas culturas tradicionais africanas são os padrões elaborados dos tecidos estampados. A técnica de estamparia pode ter sido introduzida pelo povo akan, que vivia na África ocidental no século XVI e, hoje, distribui-se entre Gana e Costa do Marfim. Esse povo deu origem aos adinkras, conjuntos de símbolos aplicados a panos de algodão por meio de carimbos feitos com cascas de cabaça. Adinkra significa “adeus”, pois os tecidos estampados com esses padrões costumavam ser usados em ocasiões fúnebres.
Dois símbolos adinkra se alternam na estampa do tecido da imagem: dwenini mmen, que é inspirado no chifre do carneiro e que significa “o carneiro, ao atacar, não deve fazê-lo com os chifres e sim com o coração”, trata-se de um símbolo da humildade e da força da mente, do corpo e da alma; e aya, que é inspirado na folha da samambaia e que significa “eu não tenho medo de você”, é um símbolo de resistência, desafio às dificuldades, força física, perseverança, independência e competência.
NASCIMENTO, Elisa Larkin; GÁ, Luiz Carlos (org.).
Adinkra: sabedoria em símbolos africanos. Rio de Janeiro: Pallas, 2009. p. 126. Tecido com estampa de símbolos adinkra, que sintetizam, em linguagem visual, significados filosóficos.
A artista sul-africana Esther Mahlangu (1935-) em sua casa na vila de Mabhoko, em Mpumalanga (África do Sul). Fotografia de 2017.
Os padrões que repetem formas simbólicas são usados também na pintura de paredes das casas. Em algumas sociedades africanas, as casas são construídas com paredes de barro, com formas arredondadas, que podem ser decoradas com pinturas de elementos geométricos. É o caso das comunidades ndebele da África do Sul. Os ndebele preservaram suas tradições ancestrais, que incluem vestimentas, ornamentos e padrões de pintura caracterizados por um complexo conjunto de formas geométricas, grafismos e cores. Os grafismos geométricos são desenhados à mão livre, sem projeto ou medição prévia, mas, respeitando princípios de simetria e paralelismo.
Observe as imagens destas duas páginas e responda às questões a seguir.
1 Como as linguagens simbólicas podem ser definidas?
1. As linguagens simbólicas são formas de comunicação que operam, ao mesmo tempo, como linguagem visual e verbal.
2 Dê exemplos de significados filosóficos sintetizados em padrões geométricos.
3 Você conhece algum desenho que pode ser associado a um significado específico?
3. Resposta pessoal. Os estudantes podem citar: o yin-yang; o símbolo de pacifismo usado nos anos 1960; o símbolo de paz e amor feito com os dedos; os símbolos das cartas de tarô, entre outros.
Não escreva no livro.
REPERTORiO 2
Os bronzes de Benin
A cabeça era um símbolo de poder para o povo edo. Um dos títulos honoríficos do líder político desse povo era “cabeça grande”.
A arte da corte de Benin, onde vivia o povo edo, na região da atual Nigéria, abrange uma variedade de objetos de madeira, marfim, cerâmica, ferro e principalmente bronze, destinados à realeza. Muitos desses objetos eram feitos para os altares reais.
Essa cabeça de bronze de um governante de Ifé, encontrada em 1938, pode representar um oni (“rei”), jovem e altivo, com marcas de escarificação no rosto, usando uma coroa. Assim como outras esculturas naturalistas de épocas anteriores encontradas na região, as cabeças foram feitas com a técnica da cera perdida, que permite a realização de objetos e esculturas extremamente detalhados com metal fundido.
CABEÇA de bronze de um governante de Ifé (Nigéria). [ca. 1300-1400].
1 escultura em bronze. Museu Britânico, Londres (Inglaterra).
Representação das etapas da técnica da cera perdida para a confecção de esculturas em metal.
Nessa técnica, modela-se uma figura em argila, sobre a qual é aplicada uma camada de cera na espessura desejada para a escultura final. Na cera, o artista escava os detalhes e recobre a peça com uma grossa camada de argila. O conjunto é aquecido, e a cera derrete e é drenada por um orifício. Obtém-se assim um molde oco, onde é derramado o metal fundido, preenchendo o espaço antes ocupado pela cera. Com a peça resfriada, quebram-se e retiram-se a casca externa e o molde interno de argila, obtendo-se o objeto de metal.
Os povos trazidos em diáspora para o Brasil dominavam as tecnologias ligadas à mineração e fundição dos metais, como ferro e cobre. Estes sofisticados saberes foram utilizados pelas atividades mineradoras durante o período colonial no século XVIII, principalmente na região de Minas Gerais.
Reflita sobre as esculturas e responda às questões a seguir.
1 Por que o antropólogo Darcy Ribeiro utilizou como base para o monumento a Zumbi a reprodução da cabeça de bronze de um governante de Ifé?
2 Que materiais eram utilizados pelo povo edo na produção de objetos para os altares reais?
1. Como não se conhece o rosto de Zumbi, o antropólogo escolheu como base a imagem de um jovem e altivo rei da corte de Benin, atribuindo assim valores semelhantes ao herói nacional.
VITRA, Luana. Pulmão da mina. 2023. Instalação composta de ferro, prata, cobre, anil, corda e ervas. 35a Bienal de São Paulo (SP), 2023.
A artista Luana Vitra (1995-), nasceu em Contagem, em Minas Gerais. Seu trabalho é marcado pela narrativa de seus familiares sobre saberes e histórias do passado escravagista durante o período colonial brasileiro, em que os africanos trouxeram, em seus corpos e memórias, a tecnologia necessária para extrair os metais.
De sua vivência com a fuligem, o manejo do ferro e a marcenaria, a artista reuniu símbolos e objetos concretos na instalação Pulmão da mina, para evocar estratégias de defesa daqueles que eram obrigados a trabalhar nas minas de ouro. A obra nos conta sobre os canários, sensíveis aos gases tóxicos, que eram usados como sentinelas, com o objetivo de sinalizar, com sua morte, o momento de escapar das galerias.
No espaço que ocupou no pavilhão da 35a Bienal de São Paulo, em 2023, a artista organizou variadas composições com canários, flechas metálicas – que evocam a referência a Ogum, o orixá associado ao ferro e protetor dos artesãos e dos ferreiros – e pó de anil – usado como um elemento de limpeza enérgica.
Com base nos exemplos estudados, responda às questões a seguir.
1 Como a arte visual pode sensibilizar as pessoas sobre histórias do passado?
2 Como a instalação Pulmão da mina se relaciona com as estampas adinkras e a Cabeça de bronze de um governante de Ifé?
1. Trazendo símbolos, elementos, materiais e composições, como os pequenos canários da obra de Luana, que podem instigar, atrair e engajar o público a conhecer mais sobre as histórias referenciadas.
2. Na instalação, a artista repete a criação de padrões, como nas estampas adinkras, e trata sobre tecnologias usadas para extrair metais, além de usar elementos feitos de ferro, em diálogo direto com a Cabeça de bronze de um governante de Ifé
Não escreva no livro.
PESQUiSA
Arte afro-brasileira
2. O Museu Afro Brasil Emanoel Araujo, inaugurado em 2004, foi concebido pelo artista e curador baiano Emanoel Araujo (1940-2022), que depois de sua morte, teve seu nome incorporado ao da instituição como uma homenagem. O museu reúne um grande acervo de obras representativas das culturas africanas e afro-brasileiras.
A relação entre a cultura afrodescendente no Brasil e a cultura africana ancestral é tema de produções artísticas, debates na sociedade e estudos de acadêmicos e pensadores. Em casa ou na escola, aprofunde seus conhecimentos sobre os conceitos e as culturas afrodescendentes.
1. Aprenda mais sobre a África em diáspora.
• No Portal Geledés, há uma série de textos que tratam sobre a diáspora africana. Disponível em: www.geledes.org.br/africa-e-sua-diaspora/ (acesso em: 3 out. 2024).
2. O que você conhece sobre a arte afro-brasileira?
• A spectos fundadores da identidade e da cultura brasileira, como o samba, o Carnaval e a capoeira, estão fortemente ligados às práticas artísticas afrodescendentes, mas a arte afro-brasileira consiste em um leque mais amplo de manifestações produzidas em linguagens variadas, principalmente, no decorrer dos séculos XX e XXI. Pesquise, na programação do Museu Afro Brasil Emanoel Araujo, de São Paulo, as exposições que estão em cartaz. Verifique os temas que elas abordam, os artistas que homenageiam e se há reproduções de suas obras. Para isso, acesse: www.museuafrobrasil.org.br (acesso em: 3 out. 2024).
Vista do interior de uma sala de exposição do Museu Afro Brasil Emanoel Araujo, São Paulo (SP). Fotografia de 2023.
• E xistem outros museus no Brasil que têm como objetivo preservar a memória e a cultura afrodescendente. Na Universidade Federal da Bahia (UFBA), em Salvador, há o Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira (Mafro). Para conhecer seu acervo, visite: www.mafro.ceao.ufba.br (acesso em: 3 out. 2024).
• No Rio de Janeiro, há o Museu da História e da Cultura Afro-brasileira (Muhcab), estabelecido na região da Pequena África, junto ao Cais do Valongo. Sua página oficial é www.rio.rj.gov.br/web/ muhcab (acesso em: 3 out. 2024).
• Em Porto Alegre, há o Museu de Percurso do Negro, projeto destinado à instalação de obras de arte em espaços públicos da cidade, que pode ser visitado virtualmente em http://museudepercurso donegroemportoalegre.blogspot.com.br/ (acesso em: 3 out. 2024).
Professor, se possível, organize uma visita guiada com seus estudantes a um museu voltado para a cultura afrodescendente, caso exista um equipamento cultural desse tipo acessível para sua comunidade escolar. Caso a cidade não possua um museu ou memorial afrobrasileiro, pode-se sugerir que, a partir das referências estudadas, os estudantes construam seu próprio acervo.
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Arte e memória
As experiências que vivemos no passado e aquelas vividas por nossos ancestrais podem ser o ponto de partida para uma produção artística. Olhar para o passado de um povo ou grupo social também é uma forma de trabalhar com a memória e realizar reflexões e criações.
Memória pessoal
Objetos antigos podem servir de base para a criação de uma obra. Reunidos e articulados em determinada ordem ou composição, eles ganham novos sentidos. É possível reproduzir, ampliar e transferir fotografias antigas para variados suportes – como o tecido, por exemplo. As fotografias podem ser filmadas e somadas às narrativas gravadas em áudio.
Outra opção é reunir fotografias antigas de família. Uma vez digitalizadas, essas imagens podem ser duplicadas, recortadas, pintadas e sobrepostas, entre outras intervenções.
Memória coletiva
Fatos históricos de natureza política, social e cultural podem marcar a produção intelectual de uma geração. Escolher um período ou determinado fato e procurar documentos, vídeos, fotografias, ilustrações, publicidades e notícias de jornais relacionados a ele é uma forma de se aprofundar em algum assunto de interesse. Organizar e selecionar um arquivo com esse material pode disparar ideias visuais.
Um artista que trabalha com a memória é o mineiro Paulo Nazareth. Em seu projeto Cadernos de África, ele se propõe a viajar por países do continente africano e pelo Brasil realizando ações performáticas.
NAZARETH, Paulo. Árvore do esquecimento. 2013. Performance. Fotografia da performance realizada por Paulo Nazareth em Ouidah, no Benin (África).
Na performance Árvore do esquecimento, Paulo Nazareth “desfaz” o ritual de despedida dos africanos que foram escravizados. Em Ouidah, na costa do Benin, antes do embarque para a travessia do Atlântico, os escravizados davam sete voltas em torno de um antigo baobá, a “árvore do esquecimento”, com a finalidade de apagar seus laços afetivos, sua identidade e suas raízes. Paulo Nazareth dá voltas em torno do baobá, porém de costas, buscando retomar, por meio dessa ação invertida, as memórias perdidas por esse povo.
AçÃO Monumento à memória
Na atividade a seguir, você e seus colegas vão produzir um monumento memorial através de um processo de pesquisa e criação coletiva. Para isso, a turma deve se organizar em grupos de cinco a oito integrantes.
1. Discussão prévia
À esquerda, o memorial Strawberry Fields, em Nova York (Estados Unidos), 2013. Ao centro, cruzes e balões em homenagem às vítimas da covid-19, no Rio de Janeiro (RJ), 2020. À direta, o Monumento aos Veteranos do Vietnã, em Washington, DC (Estados Unidos), 2017.
O objetivo desta primeira etapa é conversar e refletir coletivamente sobre a necessidade de manter a memória viva.
• Defina com os colegas o que é um memorial. Levantar exemplos de memoriais existentes no Brasil e em outros países do mundo pode ajudá-lo nessa tarefa.
• Observe que datas, fatos, conceitos e personagens são reverenciados em um memorial ou em um monumento.
• Identifique fatos ou personalidades ligados à história de sua cidade ou região que tenham relevância para ser homenageados com um memorial.
• Finalmente, escolha com os colegas o tema do memorial que será construído por vocês.
2. O projeto
Encerrada a reflexão, é chegado o momento de identificar elementos significativos para compor o memorial e conceber o monumento.
• Faça, com os colegas, uma lista de palavras, nomes, textos, imagens e objetos que poderiam ser reunidos no memorial.
• Conceba como será o memorial. Uma opção é criar uma escultura – um objeto emblemático da memória a preservar – ou ainda uma pedra – um suporte para inscrição de textos, nomes, palavras. Um memorial pode ser algo simples e pequeno que atraia a curiosidade das pessoas.
• Defina a forma e os materiais que serão usados na construção, avaliando sempre se têm relação com a homenagem que o grupo quer fazer.
• Anote todas as ideias e faça vários esboços rápidos de como imagina esse monumento.
3. A maquete
Agora, você e os colegas vão construir uma maquete do monumento concebido, ou seja, uma réplica em escala reduzida.
• Com os colegas, defina nos esboços as dimensões reais que teria o monumento. Considere que os ambientes que habitamos têm, em geral, cerca de 3 metros de altura.
• Para construir a maquete, utilize papelão reaproveitado, elementos da natureza, como plantas, pedras e terra, e até mesmo materiais ou objetos antigos quebrados e sem uso.
• Se o memorial for de grande dimensão, a maquete deve ser feita na escala 1:10, isto é, dez vezes menor do que foi imaginado, porém guardando a proporção. Por exemplo, se o monumento tiver 1 metro (100 centímetros), a maquete terá 10 centímetros.
• Pinte, escreva textos ou cole elementos previstos para compor o monumento. Use cola branca, fita adesiva ou encaixes para emendar as partes da estrutura. A maquete pode ser forrada com papéis, tecidos ou materiais que simulem uma textura.
• Para finalizar, você pode fotografar a maquete em uma praça, ou outro ambiente urbano, buscando criar uma sensação de realidade; ou, ainda, fazer uma montagem fotográfica da maquete sobre uma fotografia de paisagem.
4. Avaliação coletiva
Cada grupo deve expor sua criação para o restante da turma, em um momento de apreciação coletiva de todos os memoriais.
• Organize com o professor e os colegas as maquetes pelo espaço da sala de aula.
• Cada grupo deve apresentar sua maquete para o restante da turma, discorrendo acerca do processo de criação e dos elementos que a compõem.
• Após a apresentação das maquetes, converse com os colegas e o professor a respeito da ação. Reflita com eles sobre que tipo de memória cada monumento celebra; que elementos no monumento contribuem para isso; em que lugar cada um deles seria instalado; como ficaram as maquetes do ponto de vista da execução; quais são os maiores e os menores memoriais; qual é o impacto emocional que cada monumento gera.
CONTEXTO MUSiCA
Música afro-atlântica
As décadas de 1960 e 1970 foram de grande importância para a articulação dos movimentos negros no Brasil e no mundo, com especial destaque para a atuação da sociedade civil nos Estados Unidos. Durante os anos 1960, movimentos como o Black Power (Poder Negro) e personalidades como Martin Luther King (1929-1968), Malcolm X (1925-1965) e Angela Davis (1944-) destacaram-se na liderança da luta pelos direitos civis das comunidades negras estadunidenses. Essa efervescência teve grande influência sobre os movimentos no Brasil, que passaram a se preocupar com a construção de uma cultura de consciência negra. A valorização cultural e a reivindicação pela melhoria das condições sociais das pessoas negras tornaram-se o principal foco de atenção. Grupos informais passaram a se reunir em torno do Viaduto do Chá, em São Paulo, para trocas espontâneas de informações. Outras reuniões como essas ocorreram também no Rio de Janeiro, onde se dá a fundação do Instituto de Pesquisa de Culturas Negras (IPCN), e em Porto Alegre, onde se destaca o Grupo Palmares. Em Salvador, também nos anos 1970, há a explosão dos blocos afro de Carnaval que tensionaram o cenário político e racial com desfiles que denunciavam o racismo no Brasil.
A partir dos anos 1960, as lutas pela independência em países sob domínio colonial produziram, nas comunidades negras ao redor do mundo, uma consciência de pertencimento às causas do povo africano. Nesse contexto, surgem movimentos culturais e musicais como o afrobeat, que mistura palavras em iorubá com características musicais dos gêneros jazz, highlife e funk, além da percussão e dos estilos vocais tipicamente nigerianos.
Esse caldeirão cultural integra a identidade afro-brasileira. Falar da matriz africana da cultura brasileira é pensar no histórico de escravização do país e também é exaltar as construções que nascem a partir dos encontros culturais que estão presentes na arte e na cultura contemporânea.
Lélia Gonzalez (1935-1994) foi uma das principais lideranças do movimento negro no Brasil. Fotografia de 1988. acer
iorubá: língua falada por povos que se identificam com a cultura iorubá e que hoje ocupam o sudoeste da Nigéria, o sul do Benim e o Togo. A cultura afro-brasileira tem forte influência do povo iorubá por causa da grande quantidade de pessoas escravizadas que vieram dessa região para o Brasil.
jazz: expressão musical afro-americana originária das comunidades negras dos Estados Unidos, especialmente de Nova Orleans, e que se espalha por outros países depois da Primeira Guerra Mundial (1914-1918).
highlife: gênero de música instrumental urbana que nasceu em Gana no início do século XX e se baseia em instrumentos de sopro que passam a ser incorporados nas execuções de gêneros musicais locais.
1. Respostas pessoais. Procure mapear se algum estudante ou membro de sua família integra um bloco afro ou afoxé em sua cidade. Em caso positivo, pergunte sobre sua experiência. Caso a turma desconheça outros grupos, proponha uma pesquisa rápida na internet para conhecer alguns nomes.
REPERTORiO 1
Afoxés e blocos afro na Bahia
2. Respostas pessoais. Converse com os estudantes sobre os mecanismos do racismo brasileiro, que segrega pessoas a partir da circulação nos espaços. São variados os relatos de pessoas negras que já foram vigiadas em shoppings ou lojas, ou que foram interceptadas por vigias ou policiais sem uma razão aparente, apenas por seu fenótipo. Caso haja estudantes na turma que relatem já terem vivido algum episódio semelhante, acolha os depoimentos com respeito e cuidado. Pondere o quanto o racismo brasileiro é um fenômeno estrutural em nossa sociedade e não uma ação individual. A história dos blocos afro exemplifica essa característica.
Desfile do afoxé Filhos de Gandhy, que reúne diferentes gerações em bloco com mais de 70 anos de existência. Fotografias de 2018.
Os afoxés e os blocos afro são expressões de destaque da cultura afro-brasileira. Os blocos afro são grupos carnavalescos que buscam valorizar a cultura negra e promover sua identidade. Apresentam-se nas festividades carnavalescas e participam de outras ações afirmativas, como os eventos do Dia da Consciência Negra, que faz referência à morte de Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares. A data celebra a luta dos movimentos negros contra a opressão e o preconceito racial no Brasil. Os afoxés são cortejos de rua que também desfilam no Carnaval ao som de ritmos como o ijexá e estão relacionados a preceitos religiosos, participando de celebrações como o Dia de Iemanjá, divindade pertencente a religiões e a filosofias de matrizes africanas.
A história dos blocos afro na Bahia denuncia o racismo observado no dia a dia das sociedades. Nos anos 1970, era negada às pessoas negras a possibilidade de desfilar nos grandes clubes da cidade; a esses indivíduos era delegada a função de tocar instrumentos musicais ou carregar alegorias. Em resposta, o bloco Ilê Aiyê fez seu primeiro desfile, em 1974, reunindo apenas pessoas negras, que levavam cartazes com denúncias do racismo no país. Esse desfile contou com cerca de 100 pessoas, e, hoje, o bloco conta com cerca de 3 000 associados.
Embora fundado nos anos 1950, o afoxé Filhos de Gandhy também renasce no contexto histórico dos blocos afro dos anos 1970. Em 1972, o compositor Gilberto Gil (1942-) retorna de seu exílio político – ele havia deixado o país em função das censuras e perseguições que decorreram da ditadura civil-militar no país (1964-1985). Gil tinha laços afetivos com o Filhos de Gandhy e sabia da sua importância histórica. Ao encontrar o afoxé em condições precárias, ele se associa ao grupo e recupera sua atuação no Carnaval a partir de então.
Não escreva no livro.
O afoxé Filhos de Gandhy e o bloco Ilê Aiyê são exemplos de grupos que trazem reflexões sobre o racismo no Brasil. Partindo dessa compreensão, responda às questões a seguir.
1 Você conhece outros afoxés e/ou blocos afro? Há algum em sua cidade?
2 Você acha que pessoas negras, no Brasil, têm dificuldade em acessar determinados espaços? Comente suas impressões.
Joacy Souza/ a la M y/Fotoarena
REPERTORiO 2
Black music: funk e soul no Brasil
A black music brasileira engloba gêneros como o rap, o funk e o hip-hop e está presente na indústria musical em profunda relação com a produção audiovisual e com a moda.
O soul, movimento musical afro-americano que embalava as lutas por direitos civis nos Estados Unidos, chega ao Brasil na década de 1970 e influencia artistas como Genival Cassiano (1943-2021), Tim Maia (1942-1998), Sandra Sá (1955-) e Hyldon Silva (1951-). Os bailes souls eram organizados nas periferias do Rio de Janeiro por grupos ligados às articulações sindicais de operários em plena ditadura civil-militar. Bailes como a Noite do Shaft e Black Power foram os principais difusores desse gênero, constituindo lugares de lazer e representatividade negra.
O funk carioca, por sua vez, constrói-se a partir dos anos 1980 influenciado pelo miami bass, um subgênero do hip-hop. O primeiro LP (long play) de funk do Brasil foi produzido em 1989 e marca o momento em que os MCs passam a cantar letras em português.
O movimento Black Power no Rio de Janeiro (RJ) acompanhou uma estética de valorização da moda e da beleza negra. Fotografia de 1976.
A nacionalização do funk acontece com a chegada do ritmo do tamborzão, no início dos anos 2000, quando DJs cariocas incorporam as sonoridades dos gêneros de matriz africana. O tamborzão aproxima o funk do ritmo tocado nas cerimônias de matriz africana como forma de cultuar e se comunicar com o orixá Xangô, e incorpora samplers como berimbau, conga e atabaque.
LP: sigla derivada da expressão em inglês long play. O LP, ou disco de vinil, é uma tecnologia de reprodução de áudio que consiste em uma chapa redonda, com sulcos impressos.
MC: sigla derivada da expressão em inglês master of ceremonies, cuja tradução é “mestre de cerimônias”, e designa o artista que fala e canta enquanto a música é tocada.
DJ: sigla derivada da expressão em inglês disc jockey, que se refere originalmente à pessoa que escolhe discos para tocar em uma festa dançante; no contexto da black music, é o artista responsável pela manipulação dos sons por meio da tecnologia, especialmente o sampling sampler: equipamento utilizado para armazenar sons de forma eletrônica. Os fragmentos sonoros armazenados se chamam samples. O ato de samplear é o manuseio musical desses fragmentos sonoros. conga e atabaque: instrumentos de percussão que têm casco de madeira e uma membrana esticada sobre ele. O corpo da conga é oval, e o do atabaque é cilíndrico, o que gera altura e timbre diferentes entre ambos.
Não escreva no livro.
Escute um trecho de "Vai quebrando (desce que desce)", música de Leo Justi e DJ Seduty (2020). Depois, reflita sobre a questão a seguir.
4
• Você identifica o ritmo tamborzão presente no trecho? Conseguiria imitar esse ritmo usando apenas as palmas?
Respostas pessoais. Procure identificar a entrada do sample do atabaque ao fundo da faixa e peça a alguns estudantes que tentem reproduzir o som com palmas. O intuito não é a execução, mas, sim, a percepção a partir da escuta.
REPERTORiO 3
O afrobeat de Fela Kuti
Panteras Negras: movimento político-social que nasceu nos Estados Unidos nos anos 1960 como parte da luta pelos direitos civis dos afro-americanos. Sua bandeira era o combate à violência e à opressão racial no país.
Fela Kuti em apresentação em Paris (França), 1986. O compositor, com seu afrobeat, lançou luzes sobre a situação política e cultural da Nigéria nos anos 1970.
O afrobeat é um gênero musical que nasce das fusões do jazz, do funk, do highlife e dos ritmos regionais do continente africano. Esse gênero se destaca na Nigéria a partir dos anos de 1970, com o multi-instrumentista Fela Kuti (1938-1997) e sua banda Afrika ’70. Além de influências do funk e soul estadunidenses, sua música também é fortemente influenciada pela obra do cantor e guitarrista Geraldo Pino (1939-2008), músico de Serra Leoa, país da África Ocidental.
Pino já fazia experimentações misturando o funk de James Brown (1933-2006) a elementos percussivos típicos do continente africano. Fela Kuti tem contato com seu trabalho em seu retorno para a Nigéria, após uma temporada de estudos na Inglaterra.
Em 1971, Fela Kuti batiza sua banda de Afrika ‘70 e começa a consolidar seu estilo, que mistura ritmos da cultura iorubá e mergulha na valorização da negritude, com forte influência dos ideais políticos dos Panteras Negras.
Por meio de suas composições, Kuti confrontou o racismo e as heranças do colonialismo britânico na Nigéria. Seu país vivia um contexto de forte ditadura militar quando o grupo lança o álbum Zombie (1977), uma sátira política em que os soldados são ridicularizados e comparados a zumbis, que não pensam por si próprios. A música foi sucesso dentro e fora da Nigéria, consolidando o afrobeat ao redor do mundo.
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Ouça um trecho da música “Zombie ” (1977), de Fela Kuti. Depois, reflita e converse com os colegas sobre as questões a seguir.
1 Quais instrumentos você identifica nessa música? Você associa algum desses instrumentos ao universo do jazz estadunidense?
2 Você conhece outros artistas que combatem o racismo por meio de suas músicas? Se sim, quais?
1. Os estudantes podem identificar o som da guitarra, do baixo, da percussão e do saxofone. Destaque a forte presença dos metais e do improviso musical como uma característica emprestada do universo do jazz
2. Respostas pessoais. Peça aos estudantes que enumerem de forma espontânea obras ou artistas que trazem essa temática em suas músicas. Caso não lembrem, podem fazer uma busca na internet.
Não escreva no livro.
PESQUiSA
Músicas que atravessam o Atlântico
O intercâmbio musical entre África e Brasil não se limita a um tempo ou espaço específicos. São muitos os artistas brasileiros que procuram produtores de música e realizadores em países falantes de língua portuguesa, como Angola, Moçambique ou Cabo Verde, para criar parcerias. Conheça algumas das iniciativas que aproximam o Brasil desses países.
1. Projeto Kalunga.
• A independência de Angola se dá em 1975, e o Brasil é o primeiro país a reconhecer o Estado angolano como autônomo. Cinco anos depois, o músico Chico Buarque (1944-) é convidado a organizar uma turnê pelo país e a chamar outros músicos brasileiros. Integraram o Projeto Kalunga nomes como João do Vale (1934-1996), Clara Nunes (1942-1983), Dona Ivone Lara (1921-2018), Martinho da Vila (1938-), João Nogueira (1941-2000), Dorival Caymmi (19142008), Miúcha (1937-2018), entre outros, que fizeram concertos nas cidades de Luanda, Lobito e Benguela.
Dorival Caymmi na Ilha do Mussulo, em Luanda (Angola), 1980.
2. Brasil mestiço.
• A canção “Morena de Angola”, de Chico Buarque, foi gravada por Clara Nunes no álbum Brasil Mestiço (1980). Para escutá-lo na íntegra, acesse: www.youtube.com/playlist?list=OLAK5uy_nN3kzpVL9 CCeBCk4Oms80nZhAptlIPGkQ (acesso em: 3 out. 2024).
3. Maria
• A t roca entre músicos brasileiros e músicos africanos segue acontecendo nos dias de hoje, e a língua portuguesa é uma forma de aproximar esse intercâmbio. Em 2023, a parceria entre o brasileiro Emicida (1985-), o cabo-verdiano Dino d’Santiago (1982-) e o angolano Kalaf Epalanga resultou na canção Maria, que reflete sobre o lugar da mulher na sociedade. Para escutá-la, acesse: www.youtube.com/watch?v=rOrGMCjU-nw (acesso em: 3 out. 2024).
D’SANTIAGO, Dino. Maria. 2023. Capa do single Maria, gravado por Emicida em parceria com Dino D’Santiago. A ilustração foi feita pelo próprio compositor cabo-verdiano para o lançamento da música.
Iolanda Huzak
TEORiAS
E MODOS DE FAZER
Pulsação e ritmo
A palavra ritmo indica regularidade. O ritmo está o tempo todo presente na natureza ou mesmo no funcionamento de nosso corpo.
A origem da palavra ritmo refere-se ao movimento ou fluxo. Apesar dessa origem comum, há uma diferença entre o que, hoje, é chamado de ritmo e o que se entende como fluxo. O fluxo é o caminho, e o ritmo são os eventos que ocorrem nesse percurso. Podemos fazer a seguinte analogia: se temos um ponto A e queremos chegar ao ponto B por meio de uma trilha, essa trilha é o fluxo; se o caminho está organizado em degraus ou se é uma ladeira, por exemplo, isso expressaria o ritmo.
Em música, a relação que se dá entre fluxo e ritmo é chamada de pulso ou pulsação entender melhor, será realizada uma experiên cia prática.
Tocando e andando
Grupo de pessoas canta e bate palmas para marcar o ritmo da canção. Fotografia de 2019.
• Junto com o professor e posicionado à frente dele, um voluntário da turma vai começar a bater palmas de forma regular. Uma vez estabelecido esse momento, o professor vai improvisar nas palmas enquanto o voluntário se mantém batendo palma sempre no mesmo tempo. O que aconteceu?
• Em seguida, o voluntário e o professor deverão andar um ao lado do outro. Toda vez que pisarem seu pé predominante no chão (o direito para os destros e o esquerdo para os canhotos), o voluntário deverá bater uma palma. A prioridade é permanecer andando juntos. Enquanto isso, o professor improvisará ritmos diferentes nas palmas. E agora, o que aconteceu?
• Observe que a caminhada que fizeram de maneira regular expressa a pulsação enquanto o que foi feito nas palmas é o ritmo. No caso do voluntário, um ritmo regular que ocorreu sempre no mesmo tempo. No caso do professor, um ritmo improvisado e irregular. Esse exercício ajuda a perceber a importância do corpo e do movimento para fazer música em grupo, pois o corpo torna visível a pulsação da música.
Essa é uma atividade do método O Passo de educação musical – assista a exemplos do exercício em www. youtube.com/watch?v=rJUkKq62Y1U (acesso em: 3 out. 2024) –, cujo objetivo é despertar a importância do movimento para a marcação da pulsação. A tendência é que o estudante avance, atrase ou pare o bater de palmas. Discuta com a turma a dificuldade que é tocar coisas diferentes simultaneamente, mas que é isso que torna a prática em conjunto interessante. Para tocar em grupo, é necessário mais do que “tocar ao lado” do outro, é necessário "tocar junto” tendo segurança do que você está tocando e conseguindo se relacionar com os sons realizados pelos outros.
É importante frisar que, se você e o estudante estiverem andando juntos, o exercício será bem-sucedido. Acompanhe o andamento que o voluntário der com o seu caminhar, mas se certifique de que o fato de estar fazendo muito rápido ou muito devagar não o está atrapalhando e impedindo sua regularidade. Na conversa com a turma, esclareça que vocês estarem andando juntos garantiu que o pulso da sonoridade criada ficasse explícito para ambos, o que tornou possível para vocês tocarem em simultâneo.
AçÃO Nos ritmos do ijexá e do funk
Você irá experimentar o ritmo e a pulsação do ijexá e do funk. Para isso, siga as orientações a seguir para fazer o movimento de caminhada que o auxiliará a marcar a pulsação. Faça essa atividade acompanhando as etapas nas faixas de áudio Ao som do Ijexá e do funk (partes 1 e 2).
1. Marcando a pulsação
• Para começar, ande de forma regular para a frente e para trás, como representado.
• Cada passo que você dá representa um dos tempos, e, ao andar dessa forma, é possível expressar a pulsação da música, ou seja, sua regularidade. Essa será sempre a primeira etapa para aprender as levadas desses dois ritmos.
2. Ijexá
• Agora, bata uma palma aguda, com as mãos bem abertas, em cada tempo, isto é, as palmas acontecem junto com cada passo que você der.
Marcação da pulsação com passos.
Levada 1: palmas agudas acompanham o movimento.
• Usando o mesmo movimento de caminhar para a frente e para trás, bata duas palmas graves, com as mãos em concha, no tempo 2 e duas no tempo 4. Isto é, você irá bater palma no tempo 2 e no seu contratempo e no tempo 4 e no seu contratempo. O contratempo é o lugar musical que marca a metade de um tempo para outro.
Levada 2: palmas graves em contratempo.
• Por fim, a turma deve se dividir em dois grupos: o primeiro faz a Levada 1, enquanto o segundo faz a Levada 2. Não se esqueça de que vocês devem permanecer caminhando sempre juntos, isso é, na mesma pulsação. Essas duas levadas soando juntas formam o ritmo tocado pelos surdos no ijexá do bloco Ilê Aiyê.
3. Funk
7 Levada 2: palmas graves no tempo 1 e no contratempo dos tempos 2 e 3.
• Agora, você vai conhecer a base do ritmo do funk carioca. Andando juntos, você e os colegas farão a Levada 1 do funk, sempre com a palma aguda. Você deverá bater palmas agudas nos tempos 2 e 4.
Levada 1: palmas agudas nos tempos 2 e 4.
• A Levada 2 deverá ser executada com palmas graves. Você deverá bater palma grave no tempo 1 e no contratempo dos tempos 2 e 3.
• Com os colegas, divida a turma em dois grupos e juntem as duas levadas para montar a base do funk carioca.
4. Ijexá e funk com outros instrumentos
• Toque, agora, esses dois ritmos com o acompanhamento de outros instrumentos característicos. Para isso, siga as etapas das faixas de áudio Ao som do ijexá e do funk (partes 1 e 2).
2 Ao cumprir a última etapa, quais instrumentos você percebeu na gravação? Não escreva no livro.
Após a realização da atividade, converse com o professor e os colegas sobre as questões a seguir.
1 Você sentiu alguma dificuldade ao longo da atividade? Quais?
1. Respostas pessoais. Os estudantes podem relatar dificuldades na levada do funk por apresentar o contratempo desprendido do tempo no “e” do 2 e do 3. Converse com a turma sobre essa dificuldade técnica.
2. É possível perceber a caixa e o agogô.
A dança da África no Brasil
A diáspora destinada à América portuguesa trouxe diferentes povos do continente africano para o Brasil, como os banto, os iorubá, os fon e os jeje. Impossibilitados de carregar pertences e objetos na viagem, os africanos escravizados trouxeram suas identidades sobretudo no corpo, o que fez com que a estética de cada grupo se manifestasse com força nas artes em que o corpo é protagonista, como a dança.
Em cada região em que se instalaram, suas experiências corporais foram se misturando às das populações locais, o que resultou em incontáveis combinações e, consequentemente, em uma grande variedade de manifestações dançadas. Essas danças expressam histórias e vivências, tanto da África como do Brasil. Assim, em todas as regiões do país, há muitas festas e danças em que a influência africana está presente – são as danças afro-brasileiras.
banto: grupo étnico e linguístico, representa uma gama de povos e culturas da África Central. Tal denominação surgiu a partir de línguas africanas que apresentam características em comum.
fon: grupo étnico e linguístico pertencente ao sul do Benin, localizado na África Ocidental. Para além da língua, a característica desse povo está em sua expressão social, histórica e política.
jeje: termo surgido na Bahia, no século XVIII, em referência aos africanos escravizados originários da África Ocidental, correspondente, na atualidade, à República do Benim e do Togo. Inicialmente, foi utilizado para designar o grupo de povos falantes da língua gbe, o que, gradativamente, foi apropriado, como forma de pertencimento coletivo.
Essas manifestações incluem, entre outras, a capoeira, o coco, o maracatu, o tambor de crioula, o samba, o batuque, o cacuriá e o jongo. Cada qual tem suas características, mas muitos elementos em comum são observados, como a percussão dos pés descalços no chão, os giros e as batidas ritmadas de pés e mãos, que acompanham o som do tambor ou de outros instrumentos percussivos. Movimentos acentuados de quadril, ondulações do tronco e elementos de jogo e brincadeira também são característicos dessas danças. É a corporeidade, originada da experiência dos africanos escravizados e de seus descendentes, e a forte relação com a música que aproximam as várias manifestações afro-brasileiras.
Baianas dançam com jarros de flores em Salvador (BA). Fotografia de 2020.
REPERTORiO 1
Jongo
Apresentação de jongo na comunidade Morro do Salgueiro no Rio de Janeiro (RJ). Fotografia de 2023.
Com origem na região que hoje abriga os países Angola e República do Congo, o jongo, também conhecido como caxambu, chegou ao Brasil com os escravizados entre os séculos XVI e XIX. Presente em comunidades quilombolas, a cultura do jongo tem forte presença no Sudeste. No Rio de Janeiro, influenciou a formação do samba.
A roda de jongo é animada pelos pontos, canções que, no passado, traziam, em suas letras, enigmas, protestos contra a escravização e desafios, mas que foram ganhando novos sentidos no decorrer do tempo. No jongo, os participantes dançam em roda, tocam tambores e marcam o ritmo com os pés no chão e as palmas. Por meio da dança, do toque dos tambores e dos pontos, as memórias de África se mantiveram vivas no corpo e na voz dos jongueiros. O jongo foi considerado Patrimônio Imaterial Brasileiro pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 2005.
CONeXãO
Sou de jongo
Para conhecer um pouco mais sobre o jongo, assista a trechos do filme realizado pelo Pontão de Cultura do Jongo/ Caxambu, do Observatório Jovem da Universidade Federal Fluminense (UFF). Disponível em: https://curtadoc.tv/curta/ cultura-popular/x-encontro-de-jongueiros/ (acesso em: 3 out. 2024).
Com base na imagem e no texto disponíveis nesta página, reflita sobre as questões a seguir.
1 Em sua opinião, qual é a importância de reunir pessoas de várias gerações em torno do jongo?
2 Há danças afro-brasileiras na região em que você vive? Quais? Você já participou de alguma delas? Não escreva no livro.
1. Resposta pessoal. Espera-se que os estudantes percebam que os encontros de jongo servem para dar continuidade à tradição. Para que o jongo siga vivo, é preciso que não fique restrito aos mais velhos e seja transmitido a outras gerações.
2. Respostas pessoais. Sugira aos estudantes que listem as danças que conhecem em suas regiões e busquem identificar as matrizes culturais dessas manifestações.
Tambor de crioula
Apresentação do Grupo Folclórico
Tambor de Crioula em São Luís (MA). Fotografia de 2024.
Dança de roda, festejo e ritual em louvor a São Benedito, o tambor de crioula é um dos mais importantes legados da cultura africana no Estado do Maranhão. Em geral organizada ao ar livre, a roda começa a ser formada pelos coureiros (que são os tocadores) e seus tambores; em seguida, associam-se a eles os cantadores; por fim, entram as dançantes ou crioulas que preenchem o centro da roda com sua dança alegre, fluida e ritmada.
São Benedito: santo católico cultuado em Portugal que, desde o século XVI, é também cultuado no Brasil, como parte das devoções negras.
Três tambores dispostos em linha dão o ritmo da dança. A afinação dos tambores é um processo sofisticado, que se realiza ao redor de uma fogueira. No centro da roda, cada dançante realiza giros e deslocamentos circulares, fazendo a saia rodar, o que acentua a sensação de espiral da coreografia. Nas margens da roda, outras mulheres acompanham a dança, executando passos pequenos enquanto aguardam sua vez de evoluir.
Quando a dançante decide sair do centro, ela convida uma das mulheres para ocupar seu lugar tocando com sua barriga a barriga da escolhida. Esse toque, a punga, também conhecido como umbigada, é comum a outras danças afro-brasileiras, como o jongo e o samba. É o momento mais importante da dança, encontro entre gesto e música, quando o corpo que toca e o corpo que dança se unem em grande sintonia. Em 2007, essa manifestação foi reconhecida como Patrimônio Imaterial Brasileiro pelo Iphan.
CONeXãO
Tambor de crioula do Maranhão
Para aprofundar seus conhecimentos sobre o tambor de crioula, assista ao documentário Tambor de crioula do Maranhão. Patrimônio Cultural do Brasil, de Kit Figueiredo e Gabriel Oliveira, de 2007, exibido pela TV NBR. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=yhtHsZniyIE (acesso em: 3 out. 2024).
Depois de conhecer um pouco sobre o tambor de crioula, responda às questões a seguir.
1 Em sua opinião, por que essa dança é feita no centro de uma roda?
2 Além da umbigada, há outros pontos em comum entre o tambor de crioula, o samba e o jongo? Não escreva no livro.
1. Resposta pessoal. Explique aos estudantes que a roda é uma organização que ativa o sentido de comunidade, em que todos participam dançando, tocando ou, ainda, observando.
2. São três manifestações das culturas afro-brasileiras em que música, dança e percussão se reúnem. Além disso, todas foram consideradas Patrimônio Cultural.
REPERTORiO 3
Festa do Senhor do Bonfim
Baianas lavam a escadaria da Basílica Santuário Senhor do Bonfim em Salvador (BA). Fotografia de 2020.
A festa do Senhor do Bonfim acontece na cidade de Salvador, na Bahia, desde o século XVIII, articulando tradições religiosas de matrizes afro-brasileira e católica. A celebração é um símbolo da cultura baiana.
Constituída de uma sequência de eventos que ocorrem durante 11 dias no mês de janeiro –a novena, a lavagem do Bonfim, o cortejo, os ternos de Reis e a missa solene –, a celebração inicia-se um dia após o Dia dos Santos Reis, 6 de janeiro, e encerra-se no segundo domingo, no Dia do Senhor do Bonfim.
A etapa mais conhecida da festa é o ritual de lavagem das escadarias e do adro da igreja de Nosso Senhor do Bonfim. A lavagem é realizada por baianas e filhas de santo , como missão familiar e religiosa. Portando suas quartinhas com flores e água de cheiro, elas reverenciam Oxalá, que, no culto aos orixás, corresponde ao Senhor do Bonfim e abençoa os devotos.
Segue-se ao ritual de lavagem das escadarias e do adro da igreja o cortejo da população e, em especial, dos devotos. A festa se completa com rituais que envolvem as medidas do Senhor do Bonfim – fitas que são amarradas no pulso ou no gradil da igreja, acompanhadas de pedidos –e as rodas de samba que acontecem na praça.
Com base no que você leu, responda às questões a seguir.
1 Por que esse ritual inclui a lavagem das escadarias da igreja?
adro: terreno externo que é parte de uma igreja.
filha de santo: no candomblé, a filha de santo tem a função de sacerdote e serve de instrumento, ou corpo, para o orixá, que, em certos momentos do culto, nela se incorpora.
candomblé: religião afro-brasileira que reúne elementos de variados cultos a orixás, inquices e voduns das religiões africanas tradicionais, com influências do catolicismo e do espiritismo.
quartinha: recipiente de barro usado para acondicionar líquidos.
Não escreva no livro.
2 Você conhece o uso das fitas de Senhor do Bonfim como pulseiras? Em sua opinião, por que elas têm também esse uso?
1. A lavagem das escadarias é uma ação de limpeza, de renovação e de purificação que marca o encerramento de um ciclo e o início de um novo.
2. Respostas pessoais. Caso os estudantes não conheçam esse uso das fitas, informe que elas são doadas e também vendidas para serem usadas como forma de proteção.
PESQUiSA
Danças que se transformam e permanecem
As danças afrodiaspóricas no Brasil estruturam-se na mistura de estilos e elementos de origem no continente africano, de variadas culturas, reelaborados em nosso território e transmitidos de forma oral, não escrita, dando margem a releituras e adaptações. Assim, sua história segue em contínua transformação.
Nos anos 1960, em Salvador, diversos grupos se organizaram em torno da pesquisa das manifestações mais expressivas da cultura de origem africana na Bahia: o candomblé, a puxada de rede, o maculelê, a capoeira e o samba de roda. O dançarino e coreógrafo estadunidense Clyde Morgan (1940-) tornou-se uma presença fundamental na Escola de Dança da Universidade Federal da Bahia, onde se produziam trocas culturais entre danças africanas, dança moderna, capoeira e candomblé. Também Raimundo Bispo dos Santos (1943-2018), conhecido como Mestre King, trouxe novas contribuições para as danças afro-brasileiras, que continuam se desenvolvendo como arte viva, disseminadas por vários mestres, por todo o país.
puxada de rede: ritual realizado por grupos de capoeira do Brasil. Ele reproduz artisticamente o gesto coletivo da pesca com rede do xaréu, peixe presente nas costas do nordeste brasileiro.
maculelê: dança de grupo realizada com o bater ritmado de bastões, as grimas, ao ritmo de atabaques e ao som de cantos em dialetos africanos ou em linguagem popular.
capoeira: combinação de dança, música, jogo e luta que surgiu no Brasil como forma de resistência de grupos de africanos escravizados, por volta do século XVII. Em 2014, foi reconhecida pelo Iphan como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade.
samba de roda: manifestação cultural do recôncavo baiano que integra dança, música e poesia com referências africanas e portuguesas.
Clyde Morgan, mestre da dança afro que viveu no Brasil entre 1971 e 1980, apresenta-se no Segundo Festival Mundial de Artes e Cultura Negra e Africana. Lagos (Nigéria), 1977.
1. De que modo os mitos e as danças que chegaram no Brasil pela diáspora africana se incorporaram e se transformaram na dança cênica daqui?
• A ssista ao trailer do documentário Danças negras, dirigido por João Nascimento e Firmino Pitanga. Observe algumas questões trazidas pelos entrevistados sobre a presença do corpo negro na dança cênica. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=uabE8qtuFz0 (acesso em: 3 out. 2024).
• A mostra de dança O corpo negro traz para a cena diferentes artistas e escritas que dialogam com as referências afrodiaspóricas. Neste site, você pode acompanhar a programação do evento. www. sescrio.org.br/o-corpo-negro/ (acesso em: 3 out. 2024).
2. Como as danças afro-brasileiras são preservadas e transmitidas de geração a geração?
• No site do Pontão de Cultura do Jongo/Caxambu, você pode pesquisar e se aprofundar nas discussões sobre patrimônio material e imaterial. Disponível em: www.pontaojongo.uff.br (acesso em: 3 out. 2024).
• No site do Iphan, há um texto sobre Patrimônio Cultural Imaterial. Para lê-lo, visite: http://portal. iphan.gov.br/pagina/detalhes/234 (acesso em: 3 out. 2024).
TEORiAS E MODOS DE FAZER
O sagrado e o profano
Roda de crianças, Patos (PB). Fotografia de 1938.
As religiões afrodescendentes e as vivências comunitárias, como festas e brincadeiras, têm sido, no Brasil, o elo mais forte com a ancestralidade africana. Por isso, elementos dos cultos, da música e da dança africanos surgiram nas mais variadas expressões artísticas brasileiras. Os conceitos de profano e sagrado estão intimamente ligados às danças do continente africano. As danças ditas profanas são parte fundamental da vida social e, em geral, estão integradas às atividades cotidianas. Expressando as relações entre os seres humanos e a natureza ou representando situações pessoais e coletivas, elas funcionam como elemento facilitador das interações sociais.
As danças também estão presentes nos acontecimentos importantes da vida em grupo, como nascimentos, casamentos, cerimônias fúnebres e celebrações festivas.
Já as danças ditas sagradas são danças rituais e requerem iniciação. Elas partilham muitos elementos e símbolos com as danças profanas, mas sua função é harmonizar corpo e espírito para propiciar a comunicação entre aquele que dança e as divindades, podendo tomar a forma de um transe. Essas danças acontecem em momentos e locais reservados para as cerimônias. A dança dos orixás é parte importante das danças afrodiaspóricas no contexto brasileiro. Na transposição do contexto sagrado para a sala de aula ou o palco, espaços profanos, os dançarinos experimentam as características das diversas divindades da mitologia dos povos iorubás. Cada orixá rege e é regido por um elemento da natureza e se identifica por um conjunto de características plásticas, rítmicas, posturais e gestuais.
Os tambores são considerados sagrados, e sua vibração produz a energia que move o corpo do dançarino. Na dança dos orixás, por exemplo, cada toque do tambor corresponde a uma divindade. A vibração do corpo é sentida pelo contato dos pés descalços com o chão, já que a energia que vem da terra se transfere por todo o corpo por meio dos pés, que simbolizam a raiz, a força e a firmeza. Esse contato representa também a ancestralidade, valor fundamental da descendência africana.
Dançar os elementos da natureza
Os movimentos da dança dos orixás são criados com base nos elementos da natureza. Representação dos orixás no Parque Memorial Quilombo dos Palmares, em União dos Palmares (AL). Fotografia de 2022.
Segundo a cosmovisão afro-brasileira, há uma relação entre os orixás e os quatro elementos básicos da natureza – água, terra, fogo e ar. A água é associada às divindades femininas, como Iemanjá, senhora do mar, e Oxum, deusa dos rios; a terra, associada às divindades protetoras, como Oxossi, deus da caça, e Ossaim, senhor das ervas e das folhas; o fogo, associado aos orixás do dinamismo, como Exu, o deus mensageiro; e o ar, associado aos orixás da criação, como Oxalá.
Nesta proposta, esses elementos servirão de mote para você e os colegas realizarem uma improvisação de dança. A ideia é utilizar os elementos como inspiração para a busca e descoberta de movimentos do corpo. Para isso, siga as instruções a seguir.
1. Planejamento
• Forme um grupo com três integrantes. O grupo deve escolher um elemento da natureza para explorar durante a atividade.
• Não revele aos integrantes de outras equipes qual foi a escolha de seu grupo, pois eles deverão adivinhar qual é esse elemento depois da apresentação da dança.
• Todos os grupos da turma passarão pelo mesmo processo. É possível que dois ou mais grupos escolham elementos iguais.
• Pense em cores, objetos, cheiros, sons, sensações, sentimentos e quaisquer outros itens que possam se relacionar ao elemento escolhido pelo seu grupo.
• Por fim, busque músicas que possam ser associadas ao elemento escolhido. O grupo deve compor a trilha sonora da apresentação. Considere selecionar uma canção que evoque tradições afro-brasileiras. Busque, nos aplicativos de música, artistas que pesquisam esses ritmos.
2. Improvisação
• Comece por um momento de aquecimento que pode ser individual ou em grupo. Em seguida, experimente o que o elemento da natureza escolhido traz ao estado do corpo e ao movimento. Para isso, pense em perguntas como: o que seriam movimentos líquidos? E o que seriam movimentos quentes? Como o corpo se movimenta se estiver no meio de uma ventania? E se ele for a ventania? Uma montanha pode se movimentar? De que maneira?
• Explore movimentos que mobilizem diferentes regiões do corpo. Busque se inspirar nas características do elemento escolhido e em tudo o que refletiu sobre ele. Com seus colegas de grupo, revezem as posições de improvisador e espectador.
• Juntem-se a outros grupos e façam uma grande roda. Cada grupo de três vai entrar no centro da roda e, ao som da percussão ou da canção escolhida, dançar por três minutos aproximadamente. Antes de sair do centro da roda, fique em silêncio por um momento e concentre-se nas sensações que o som e a dança provocaram em você.
3. Avaliação coletiva
• Verifique se os colegas da turma conseguem identificar que elemento da natureza inspirou a dança de seu grupo.
• Para finalizar, seu grupo poderá expor as razões que o levaram a escolher o elemento, assim como justificar a correspondência entre ele e os movimentos executados. Seria interessante, também, compartilhar histórias e curiosidades descobertas durante a atividade.
PONTE PARA OUTRAS
liNGUAGENS ARTiSTiCAS
ARTES iNTEGRADAS ARTES iNTEGRADAS
Instalação sonora de Stella do Patrocínio
Stella do Patrocínio (1941-1992) foi uma mulher negra nascida no Rio de Janeiro (RJ). Sua história de vida foi marcada por uma internação compulsória em uma instituição psiquiátrica, e, posteriormente, Stella recebeu, um diagnóstico de esquizofrenia. Permaneceu internada na Colônia Juliano Moreira (RJ) até o seu falecimento.
Em 2023, a 35a Bienal de São Paulo – coreografias do impossível contou com uma instalação sonora com áudios de Stella do Patrocínio, intitulada Falatório. A obra foi composta por quatro áudios, correspondendo a aproximadamente 90 minutos de gravação. A captação dos registros da artista ocorreu entre 1986 e 1988, realizada pela artista plástica Carla Guagliardi (1956-). Na época, Guagliardi era estagiária das oficinas de arte da Colônia Juliano Moreira.
No espaço da instalação, as paredes foram pintadas de preto, enfatizando a voz de Patrocínio. A linguagem dos áudios amplifica a força da narrativa. Para ouvir os áudios expostos na obra, acesse o link: https://museubispodo rosario.com/stella-do-patrocinio-memorias/ (acesso em: 3 out. 2024).
Stella do Patrocínio em um dos registros feitos pela artista plástica Carla Guagliardi entre 1986 e 1988.
Videoperformance de Tiago Sant´Ana
A atuação do artista visual brasileiro Tiago Sant’Ana (1990-) se relaciona com pesquisas em performance , vídeo, fotografia e pintura, abarcando temáticas que enfatizam as representações de identidades afro-brasileiras.
No trabalho realizado na linguagem do vídeo, Refino #2, de 2017, o cenário escolhido pelo artista foi o Engenho de Oiteiro, construção do século XIX, localizada no Recôncavo Baiano. O açúcar é elemento recorrente nos trabalhos de Sant’Ana, representando um material investigativo em diálogo com a própria história do Brasil e o período da colonização e escravização dos africanos e afrodescendentes.
O artista visita ruínas de antigos engenhos de açúcar, onde desenvolve performances com o objetivo de recontar, a partir de uma perspectiva contemporânea, um resgate da memória e história da população negra, afastando-se de um discurso centralizado na Europa. Nessa obra, o vídeo foi utilizado para reforçar a materialidade fluida do açúcar.
SANT´ANA, Tiago. Refino #2. 2017. Videoperformance. A imagem apresenta um antigo engenho de açúcar. Toda a cena é estática, exceto a cascata de açúcar, que cai de forma ininterrupta por cima do corpo de um homem negro.
Renato Nogueira é professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), escritor e pesquisador do Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Leafro). Possui formação familiar griô: recebeu ensinamentos de seu avô materno.
TEATRO
Griôs: narrar e criar mundos
Os griôs e as griôtes (forma feminina do termo) são guardiões da palavra e dos saberes coletivos de suas comunidades. Eles produzem conhecimento e os transmitem de geração em geração, através da oralidade. Exercem funções como as de diplomatas, professores, historiadores, atores, músicos e conselheiros.
A tradição dos griôs tem sua origem na África ocidental. São também chamados de djeli na língua manica.
Os griôs, ensina o professor Renato Noguera (1972-), precisam ter três características: estômago de avestruz, que permite comer de tudo e digerir bem; pele de crocodilo, para se deitar em vários locais e, durante a viagem, desenvolver seu conhecimento narrativo; e coração de pomba, para não remoer sentimentos e viver as emoções na medida adequada.
O djeli Toumani Kouyaté toca músicas e conta histórias em uma biblioteca municipal de São Paulo (SP). Fotografia de 2013.
Toumani Kouyaté (1965-) é um djeli de Burkina Faso, país da África Ocidental. Toumani explica que o djeli conhece o sagrado e o segredo das palavras. Sua família guarda a memória e a sabedoria de seu povo.
TEATRO
Mostra Internacional de Teatro de São Paulo 2024: pontes com o teatro africano contemporâneo
A Mostra Internacional de Teatro de São Paulo (MITsp) é um evento que ocorre desde 2014. Ele enfrenta um desafio da arte teatral: se o teatro acontece na presença, como conhecer o trabalho de companhias estrangeiras? É preciso organizar viagens de atores e atrizes, trazer figurinos e objetos, reconstruir cenários, legendar os espetáculos. Mas a recompensa é grande: trocar com artistas que habitam diferentes realidades permite enxergar elos históricos e construir pontes.
Em sua 9a edição, a MITsp se propôs selecionar apenas espetáculos criados à margem das referências geográficas dominantes (como Europa e Estados Unidos).
Fotografia do espetáculo Broken Chord (Acorde rompido), apresentado na MITsp em 2024.
O espetáculo sul-africano Broken Chord foi apresentado na abertura da MITsp. A obra debate as relações entre colonizado e colonizador, no passado e no presente. A montagem da MITsp contou com um coro de artistas brasileiros brancos, concretizando a opressão em relação aos corpos negros daqueles viajantes.
SiNTESE ESTETiCA
Arte contracolonial
Reflexão
Grada Kilomba (1968-) é uma artista interdisciplinar, escritora e teórica, nascida em Lisboa, Portugal, com raízes em Angola e São Tomé e Príncipe. Com uma obra híbrida, na fronteira entre as linguagens artísticas, Grada transita pela performance, encenação, instalação e vídeo, refletindo sobre memória, trauma, gênero e racismo. Leia, a seguir, um pequeno trecho de um dos seus livros, Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano, para aprofundar e debater os temas investigados pela artista em sua trajetória inquieta e contracolonial.
KILOMBA, Grada. O barco. 2021. Instalação escultórica e performática composta de blocos de madeira queimada. Somerset House, Londres (Reino Unido), 2022.
Na obra mostrada nas imagens, a artista dispõe 134 blocos de madeira no chão ao longo de 32 metros de comprimento, desenhando a silhueta do fundo de um navio tumbeiro, embarcação utilizada no transporte de pessoas raptadas e escravizadas. A instalação é acompanhada de uma performance que ativa a obra, realizada por um grupo de artistas negros.
Descolonizando o conhecimento
[…]
Quando frequentava a universidade, lembro-me de ser a única aluna negra no departamento de psicologia, por cinco anos. Entre outras coisas, aprendi sobre a patologia do sujeito negro e também que o racismo não existe. Na escola, lembro de crianças brancas sentadas na frente da sala de aula, enquanto as crianças negras se sentavam atrás. De nós, dos fundos da sala, era exigido que escrevêssemos com as mesmas palavras das crianças da frente “porque somos todos iguais”, dizia a professora. Nos pediam para ler sobre a época dos “descobrimentos portugueses”, embora não nos lembrássemos de termos sido descobertas/os. Pediam que escrevêssemos sobre o grande legado da colonização, embora só pudéssemos lembrar do roubo e da humilhação. E nos pediam que não perguntássemos sobre nossos heróis e heroínas de África, porque elas/eles eram terroristas e rebeldes. Que ótima maneira de colonizar, isto é, ensinar colonizadas/os a falar e escrever a
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partir da perspectiva do colonizador. Mas, sabendo que grupos oprimidos são frequentemente colocados na posição de ser ouvidos somente “se enquadrarmos nossas ideias na linguagem que é familiar e confortável para um grupo dominante” (Collins, 2000, p. vii), eu não posso escapar da pergunta final: “Como eu, uma mulher negra, deveria escrever dentro desta arena?” Patrícia Hill Collins argumenta que a exigência de que a/o oprimida/o seja obrigada/o a prover um discurso confortável, muitas vezes muda “o significado do nosso ideal é trabalhar para elevar as ideias dos grupos dominantes” (2000, p. vii). Assim, o conforto aparece como uma forma de regulação dos discursos marginalizados. Para quem devo escrever? E como devo escrever? Devo escrever contra ou por alguma coisa? Às vezes, escrever se transforma em medo. Temo escrever, pois mal sei se as palavras que estou usando são minha salvação ou minha desonra. Parece que tudo ao meu redor era, e ainda é, colonialismo. […]
A margem e o centro
A margem e o centro de que estou falando aqui referem-se aos termos margem e centro como usados por bell hooks. Estar na margem, ela argumenta, é ser parte do todo, mas fora do corpo principal. hooks vem de uma pequena cidade do estado de Kentucky, onde trilhos de trem eram lembranças diárias de sua marginalidade, lembretes de que ela estava realmente do lado de fora. Através daqueles trilhos se chegava no centro: lojas em que ela não podia entrar, restaurantes onde ela não podia comer e pessoas que ela não podia olhar nos olhos. Esse era um mundo onde ela poderia trabalhar como doméstica, criada ou prostituta, mas onde ela não podia viver; ela sempre tinha de retornar à margem. Havia leis para garantir seu retorno à periferia e severas punições para quem tentasse permanecer no centro.
[…]
[…] Nesse sentido, a margem não deve ser vista apenas como um espaço periférico, um espaço de perda e privação, mas sim como um espaço de resistência e possibilidade. A margem se configura como um “espaço de abertura radical” (hooks, 1989, p. 149) e criatividade, onde novos discursos críticos se dão. É aqui que as fronteiras opressivas estabelecidas por categorias como “raça”, gênero, sexualidade e dominação de classe são questionadas, desafiadas e desconstruídas. Nesse espaço crítico, “podemos imaginar perguntas que não poderiam ter sido imaginadas antes; podemos fazer perguntas que talvez não fossem feitas antes” (Mirza, 1997, p. 4), perguntas que desafiam a autoridade colonial do centro e os discursos hegemônicos dentro dele. Assim, a margem é um local que nutre nossa capacidade de resistir à opressão, de transformar e de imaginar mundos alternativos e novos discursos.
Falar sobre margem como um lugar de criatividade pode, sem dúvida, dar vazão ao perigo de romantizar a opressão. Em que medida estamos idealizando posições periféricas e ao fazê-lo minando a violência do centro? No entanto, bell hooks argumenta que este não é um exercício romântico, mas o simples reconhecimento da margem como uma posição complexa que incorpora mais de um local. A margem é tanto um local de repressão quanto um local de resistência (hooks, 1990). Ambos os locais estão sempre presentes porque onde há opressão, há resistência. Em outras palavras, a opressão forma as condições de resistência.
KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019. p. 63-69.
Segundo o texto, estar à margem significa habitar um lugar que auxilia a imaginar mundos alternativos, discursos contra-hegemônicos, capaz de nutrir nossa capacidade de resistir à opressão, apesar das dificuldades e violências que também fazem parte da vida nas margens da sociedade. Resposta pessoal.
Processo de criação coletiva
Partindo do texto e das imagens da instalação de Grada Kilomba, você vai participar do processo de criação de uma obra ou apresentação artística, que deverá abordar os temas da diáspora africana, os processos coloniais e o combate ao racismo. Para isso, forme um grupo de seis a dez integrantes e siga as instruções a seguir.
Análise e debate
Sim. Obras e manifestações artísticas que são realizadas tendo outros horizontes culturais, como as culturas africanas e indígenas, são essenciais para esse processo de decolonização do pensamento e das práticas que fazem a vida comum.
Depois de ler o texto e analisar as imagens, debata com seu grupo sobre as questões a seguir.
Questionar a formação dos saberes que aprendemos nas instituições de ensino que, geralmente, partem de um ponto de vista ocidental e eurocêntrico.
• O que significa estudar pela perspectiva do colonizado?
• As linguagens artísticas podem contribuir para essa perspectiva? Como?
• Para Grada Kilomba, o que significa estar à margem? E para você?
• É possível ver a margem como um espaço de resistência e possibilidade, para além da perda e da privação?
Resposta pessoal. Incentive os estudantes a perceberem a condição periférica como potência, para além das dificuldades materiais e sociais que também habitam esses lugares.
• Que arte pode ser criada para alimentar a capacidade de resistir à opressão, de enfrentar o racismo, de transformar a realidade e imaginar outros mundos possíveis?
• Os artistas e as produções culturais que participam da sua vida (músicas, livros, filmes, séries, videogames etc.) se relacionam de que forma com as culturas africanas e afro-brasileiras?
• Você conhece obras e manifestações artísticas antirracistas?
Anote os principais tópicos que surgiram no debate. Eles servirão de base para o processo de criação artística de seu grupo.
Resposta pessoal. Solicite aos estudantes que deem exemplos de obras e manifestações que, na visão deles, cumpram a função de enfrentamento do racismo e das opressões, em um exercício ativo de imaginação.
Mapeie com a turma obras e artistas que os jovens reconhecem como exemplos de culturas africanas e afro-brasileiras que participam da cultura da turma.
Solicite aos estudantes que explorem diferentes mídias nos exemplos elencados, explanando porque reconhecem aquela obra ou manifestação como antirracista.
Detalhe da instalação O barco, KILOMBA, Grada. 2021. Instalação escultórica e performática composta de blocos de madeira queimada. Somerset House, Londres (Reino Unido), 2022. Conforme caminha entre os blocos da obra, o visitante se depara com um poema escrito pela artista, traduzido em seis idiomas: yoruba, crioulo de Cabo Verde, kimbundu, português, inglês e árabe da Síria.
Ideia disparadora e linguagens artísticas
Em seguida, ainda em grupo, pense em como fazer uma síntese estética do debate realizado, ou seja, como transmitir as conclusões do grupo aos demais colegas da turma por meio de uma criação artística, como uma música, uma pintura, um poema, uma cena, uma performance, uma instalação etc.
Retome as ferramentas criativas trabalhadas ao longo deste capítulo, ou rememore procedimentos artísticos trabalhados no capítulo anterior, que possam apoiar o processo de criação. Leve em consideração, também, as habilidades e os desejos artísticos dos integrantes do grupo para compor a ideia central da obra coletiva.
Em um primeiro momento, deixe as ideias fluírem, anotando todo tipo de sugestão dos integrantes. Depois, você e os colegas devem retomar as ideias e escolher a que parecer mais promissora, chegando em uma ideia disparadora.
Deem sugestões que reverberem o texto de Grada Kilomba. Será uma coreografia de dança sobre travessia? Uma cena de teatro que aborde o processo colonial? Um canto coral realizado no pátio, homenageando as culturas afro-brasileiras? Uma instalação artística com objetos que remetem à ancestralidade dos integrantes do grupo? Uma mistura disso tudo?
Que tipo de manifestação artística vocês gostariam de desenvolver dentro do universo das culturas africanas e afro-brasileiras?
Por fim, anote a ideia disparadora e a(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Pesquisa, criação e finalização
Organize as etapas de criação do projeto artístico com base nas reflexões centrais, na ideia disparadora e na(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Caso a criação do grupo envolva apresentação, lembre-se de ensaiar o maior número de vezes que for possível, aprimorando o trabalho a cada repetição. Mesmo apresentações improvisadas exigem alguma forma de combinado e preparação. Não deixe que o processo de criação fique só na conversa, lembre-se de experimentar os elementos em cena.
Caso a criação do grupo envolva uma exposição ou instalação, faça uma lista de tudo o que será necessário para realizar o projeto, dividindo as tarefas entre os integrantes do grupo.
Não existe uma fórmula para esse processo de criação. Cada grupo deve desenvolver suas próprias etapas, estabelecendo critérios com base na obra ou manifestação artística que se está concebendo.
Com o trabalho desenvolvido, chegou o momento de compartilhar com o restante da turma! Aproveite também para apreciar a criação dos demais grupos.
3
Culturas europeias
A música da Grécia antiga ainda é influente na música ocidental praticada na atualidade, presente em alguns termos como os nomes de escalas, que são de origem grega.
Na arte, o culto ao corpo expressa os valores associados à ideia de beleza.
EFEBO de Crítio. [ca. 485 a.C. -480 a.C.]. Mármore, 116 cm. Museu da Acrópole de Atenas (Grécia).
[SEM TÍTULO]. [Entre 200 a.C. e 100 d.C.]. Bronze, 21,40 cm. Museu Britânico, Londres (Inglaterra). Máscara de bronze representando Dionísio.
Peça utilizada em rituais a Dionísio, deus do vinho, da festa, da alegria e da abundância. A máscara tornou-se um acessório emblemático no teatro realizado na Grécia antiga.
[SE M TÍTULO]. [ca. 500 a.C-401 a.C.].
Vaso de cerâmica grego que retrata uma aula de dança e elementos musicais. Na contemporaneidade, alguns arqueólogos e musicólogos buscaram reconstituir a música daquela época utilizando artefatos desse tipo.
1. É possível identificar as linguagens da escultura, da pintura em vasos de cerâmica, da música, da dança, da arquitetura e da fotografia, além de materiais como mármore, bronze e cerâmica. É possível notar uma relação entre as artes e os rituais, em razão da representação de um deus grego; a presença do corpo humano dentro de um determinado padrão estético ocidental na escultura; a representação de cenas cotidianas da Grécia antiga em vasos de cerâmica; a influência do cristianismo na cultura ocidental, expressa pelo reconhecimento dos sineiros como Patrimônio Cultural Imaterial, além de elementos da arquitetura grega que resistem ao tempo.
A presença do cristianismo, um dos pilares da cultura europeia ocidental, reflete-se no Patrimônio Cultural brasileiro.
Jovem toca o sino de uma igreja em Minas Gerais. O ofício dos sineiros, responsáveis por tocar os sinos das igrejas católicas para anunciar celebrações religiosas, foi reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. Fotografia de 2018.
3. Respostas pessoais. Os acervos culturais dos museus preservam a cultura do passado e permitem um diálogo com o presente. São também locais de apresentação da arte atual, resguardando bens culturais simbólicos ao longo do tempo.
Fundado em 1818 por D. João VI, com arquitetura que retoma os valores da Grécia antiga, é a mais antiga instituição científica do país.
Museu Nacional, localizado na Quinta da Boa Vista, Rio de Janeiro (RJ). Fotografia de 2022.
Não escreva no livro.
Considerando as imagens apresentadas nestas páginas de abertura, responda às questões a seguir.
1 Quais linguagens artísticas e que materiais podem ser identificados? O que essas imagens podem expressar sobre os valores estéticos e sociais da cultura europeia ocidental?
2 Você já usou máscara em algum evento? Como foi essa experiência?
3 Você costuma visitar museus e exposições? Qual é a importância de manter acervos culturais em instituições como os museus?
2. Respostas pessoais. Caso os estudantes não consigam se lembrar de eventos em que as máscaras são usadas, mencione alguns exemplos, como Carnaval, festas à fantasia etc. Observe se é mencionado o uso de máscaras em contextos ritualísticos e, caso isso aconteça, peça aos estudantes que apresentem mais detalhes sobre esse contexto de uso.
Por que estudar as culturas europeias?
As sociedades greco-romanas da Antiguidade produziram um conjunto de valores éticos, estéticos, filosóficos e sociais que definiram a civilização europeia.
A Grécia antiga, que teve seu apogeu socioeconômico e cultural entre os séculos V a.C. e IV a.C., foi fundamental nesse processo. Os gregos cultivaram as artes e os esportes, questionaram a existência humana por meio da Filosofia e praticaram um regime de governo participativo: a democracia. A conquista da Grécia pelo Império Romano resultou em um processo de absorção e difusão dos valores e elementos estéticos da cultura grega.
Essas culturas europeias, trazidas pelos colonizadores em seu processo de dominação, influenciaram a formação da arte e da cultura brasileira. A presença da cultura grega pode ser percebida, por exemplo, no uso cotidiano de palavras relacionadas à arte, à filosofia e à ciência que têm origem grega. Por exemplo, a palavra musa, que em português tem o significado de “aquela que inspira”, relaciona-se às nove filhas da deusa grega Mnemosine, a quem se atribuía a capacidade de inspirar a criação artística e científica. As musas preservavam a cultura e o conhecimento e, por isso, eram também as protetoras da educação. Seu templo era chamado de museu, palavra que ainda hoje é usada para nomear certos edifícios e instituições que preservam e promovem objetos e processos artísticos.
Além de palavras, alguns temas, personagens e histórias da Grécia antiga foram retomados por artistas no decorrer de mais de 2 mil anos, tanto no Ocidente quanto no Oriente. Um exemplo disso são as Graças, deusas que acompanhavam Afrodite, a deusa do amor, e que foram associadas a valores como beleza, abundância e alegria, simbolizando as melhores coisas da vida. Há um conjunto de esculturas, chamado As três graças, que retrata três jovens nuas, abraçadas, com uma delas de costas para as demais. Embora os originais gregos tenham se perdido, a obra sobreviveu através de cópias feitas pelos romanos em um período posterior. Essa obra foi revisitada inúmeras vezes ao longo dos séculos, produzindo uma intensa investigação sobre o belo na cultura ocidental, pois representa os ideais de harmonia e equilíbrio que
expressavam a noção de beleza dos antigos gregos, que valorizavam a proporção, a simetria e a justeza nas formas artísticas.
As três graças. [ca. 200 a.C]. Escultura em mármore, cópia romana de original grego, 123 cm x 100 cm. Museu Metropolitano de Arte, Nova York (Estados Unidos).
Respostas pessoais. Explore a perspectiva prática da atividade e proponha outras perguntas aos estudantes para desenvolver esse aspecto, tais como: qual é a dificuldade entre ter a ideia das esculturas e moldar o corpo do colega para atingir essa ideia? É difícil sustentar a posição que o colega esculpiu e ficar imóvel?
A dançarina estadunidense Isadora Duncan (1877-1927) concebeu os fundamentos da dança moderna ao buscar formas mais despojadas para se expressar por meio do movimento do corpo. Entre 1900 e 1915, criou uma série de coreografias inspiradas na cultura da Grécia antiga.
As três graças. c. 1915. Irma, Lisa e Anna, do Grupo Isadorables, de Isadora Duncan, realizam coreografia que remete à obra As três graças.
De SeNS¡B¡l¡ZAÇÃO
Investigando os conceitos de equilíbrio e harmonia
Respostas pessoais. O objetivo é que os estudantes procurem encontrar definições próprias para esses termos com base na atividade.
Chegou o momento de investigar de forma prática a cultura ocidental por meio de um jogo de composição de esculturas vivas.
Equilíbrio e harmonia normalmente estão associados à simetria, à leveza, à suavidade e à justeza das formas, resultando em composições sem excessos. Por outro lado,
1. A atividade pode ser realizada na sala de aula, mas será necessário afastar mesas e cadeiras para ampliar o espaço de circulação.
desequilíbrio e desarmonia tendem a se relacionar com o oposto disso, com formas disruptivas, expressões monstruosas e linhas assimétricas.
2. A turma deve se dividir em grupos com quatro integrantes. Todos jogarão ao mesmo tempo. Dentro do grupo, você e os colegas devem escolher duas pessoas para serem os escultores e duas pessoas que serão as esculturas. Depois vocês vão inverter os papéis.
3. Sempre com muito respeito, o corpo da pessoa escultura deve ser manipulado até que a pessoa que estiver esculpindo encontre a forma desejada. Se você for a escultura, busque apoiar-se nas partes do corpo que estiverem tocando o chão para sustentar a posição criada pelos colegas, incluindo as expressões do rosto. Já os escultores devem evitar posicionar as pessoas de modo desconfortável ou em posições difíceis de serem mantidas, adaptando as ideias às possibilidades corporais de quem está sendo esculpido.
4. Os escultores devem trabalhar juntos para moldar as pessoas que representam as esculturas. A primeira composição deve evocar equilíbrio e harmonia, pensando não só na capacidade física de manter-se em pé ou em uma determinada posição, mas à maneira de ocupar o espaço. Com todas as esculturas prontas, as duplas de escultores devem caminhar pelo espaço, observando as demais composições da turma.
5. O grupo deve se reunir novamente para realizar uma segunda proposta de composição, mas agora com a temática de desequilíbrio e desarmonia. Novamente, com as composições prontas, os escultores circulam pelo espaço observando as obras dos colegas.
6. Os grupos devem ser retomados para reiniciar a atividade, invertendo os papéis desempenhados: os escultores passam a ser pessoas esculturas, e as pessoas que foram esculturas passam a ser os escultores.
7. Em seguida, como forma de expressar e elaborar suas reflexões sobre a atividade, você e os colegas deverão conversar e responder às perguntas propostas a seguir.
• Como foi esculpir o corpo do colega? E ser esculpido?
Resposta pessoal. Incentive os estudantes a se expressarem usando termos associados ao objetivo da atividade, como formas
• De que maneira a harmonia e o equilíbrio se expressaram nas esculturas que você compôs? E o desequilíbrio e a desarmonia?
harmônicas e desarmônicas de composição, que expressam leveza e equilíbrio.
• Qual das esculturas dos colegas chamou mais a sua atenção e por quê?
• Qual é a relação entre essa atividade e a investigação sobre o conceito de beleza que foi feito até aqui?
A noção do belo na Grécia antiga é composta por uma relação entre beleza, bondade, harmonia, simetria e justeza (nada em excesso). No entanto, a noção do belo é dinâmica, associada a cada período e local, e seu padrão é constituído historicamente. Explore essa relação, investigando com a turma o que é considerado belo nos dias atuais e como isso se relaciona com a noção de um padrão de beleza, hegemonicamente associado a um caráter ocidental e eurocêntrico.
TEATRO
CONTEXTO
Vida urbana, debate público e teatro
Teatro de Epidauro, construído na primeira metade do século IV a.C. Peloponeso (Grécia).
A organização sociopolítica da Grécia antiga em pólis , atrelada ao culto aos deuses e à dinâmica social como um todo, criou o contexto propício ao surgimento do teatro grego, uma das raízes fundamentais do teatro ocidental. A origem do teatro grego está ligada ao festival religioso Dionísia, que consistia em uma cerimônia pública na qual um coro de homens vestidos de sátiros (criaturas metade homem, metade bode) dançava e cantava em homenagem à divindade. Com o tempo, o líder do Coro começou a se destacar, passando a ser chamado de Corifeu, e a execução coletiva das canções e danças converteu-se em diálogos. Esses diálogos entre Coro e Corifeu foram ganhando cada vez mais autonomia em relação ao ritual coletivo. Além da exaltação da divindade, outros temas foram introduzidos na celebração, tendo início os diálogos entre heróis e antepassados míticos do povo grego. Foi assim que surgiu o teatro grego clássico.
Percebendo as potencialidades do teatro como recurso para educar e doutrinar a população, o Estado instituiu um festival anual, que durava três dias e elegia os melhores autores. As representações constituíam grandes eventos cívicos. O teatro era considerado fundamental para a formação dos cidadãos, levando-os a refletir sobre as crenças e o comportamento na vida social. Foi nesse contexto, das encenações teatrais influindo no cotidiano da pólis, que o teatro grego clássico amadureceu suas principais formas: a tragédia e a comédia
pólis: modelo de organização social e política que foi adotado na Grécia antiga e se caracterizava pela autonomia e pela soberania das unidades formadas por um núcleo urbano e os territórios de seu entorno. Por essas características, as pólis também eram chamadas de cidades-Estados. Cada pólis podia adotar regimes políticos distintos, como a democracia ou a tirania, cabendo aos cidadãos livres criar as instituições e leis relativas à organização da cidade e sua produção.
tragédia: modalidade teatral que surgiu na Grécia antiga, caracterizada pela presença do Coro e de um herói (ou uma heroína) mítico que confronta um destino trágico, ou seja, um embate entre os desígnios dos deuses, as leis da cidade e a desmedida do herói.
comédia: modalidade teatral caracterizada pelo uso do humor e da ironia no tratamento de situações cotidianas. Na Grécia antiga, as comédias abordavam questões relacionadas à vida das pessoas comuns e ao funcionamento da pólis, não poupando críticas a seus governantes, aos nobres e até mesmo aos deuses.
REPERTORiO 1
A encenação na Grécia antiga
As tragédias e comédias gregas eram encenações espetaculares, apresentadas para milhares de cidadãos. Essas apresentações ocorriam em grandes teatros, como o Teatro de Epidauro, onde os espectadores se sentavam ao ar livre, em arquibancadas dispostas em torno de uma área circular. Essa forma dos teatros não era à toa: a acústica criada pelo círculo das arquibancadas fazia com que as vozes dos atores no centro do palco fossem ampliadas de forma natural, permitindo que todos pudessem ouvir o que estava sendo dito.
As máquinas de cena eram muito utilizadas nos espetáculos. Cenários gira tórios trocavam rapidamente a ambientação, plataformas móveis permitiam a entrada de personagens e máquinas reproduziam o barulho de trovões. Havia também um tipo de grua que servia para suspender os atores, como se eles estivessem voando, nas cenas em que represen tavam deuses e personagens míticos.
As encenações contavam, no máximo, com três atores. Assim, era preciso que cada um deles interpretasse vários papéis no decorrer da peça. Para tanto, utilizavam-se de máscaras, que exibiam as características principais de cada personagem, além de marcar sua classe social, facilitando a identificação pelo público. As máscaras tinham aberturas que amplificavam a voz dos atores. Eles apresentavam-se com figurinos volumosos, compridos e coloridos, além de coturnos de sola muito alta. Um dos registros de como os atores de tragédia grega se apresentavam é a estatueta mostrada nesta página, feita durante o Império Romano, que tomou como modelo as peças gregas e difundiu essa modalidade teatral em seu território.
Respostas pessoais. Incentive os estudantes a retomar informações obtidas no texto (por exemplo, que as encenações aconteciam ao ar livre, que
Após a leitura do texto sobre a encenação na Grécia antiga, você fará o exercício de imaginação proposto a seguir.
• Você consegue imaginar a encenação de uma tragédia ou comédia grega com base nas informações contidas nesta página? Como você imagina que seria a encenação? Converse com o professor e os colegas.
eram utilizadas máquinas de cena, que os atores usavam máscaras) e, ao mesmo tempo, abra espaço para que eles trabalhem com a imaginação.
[SEM TÍTULO]. [ca. 100 a.C-1 a.C.]. Estatueta em marfim policromado, 16, 4 cm x 5, 2 cm. Petit Palais, Musée des Beaux-Arts de la Ville de Paris (França). Representação romana de um ator da tragédia grega.
Não escreva no livro.
REPERTORiO 2
Coro: personagem coletivo
Herança direta dos rituais a Dionísio, o coro era uma presença essencial nas tragédias e comédias clássicas. Como personagem coletivo, ele representa no palco a perspectiva do público, do cidadão da pólis grega. Nas encenações, o coro cantava, dançava e declamava seus textos, fazendo a mediação entre os atores e a plateia.
Era o coro que marcava o início da peça, com uma entrada ritual e festiva, assim como o fim da encenação, com sua saída triunfal. Os membros do coro atuavam sempre em grupo, executando os mesmos movimentos e gestos. Seus integrantes aprendiam a modular a voz em conjunto para expressar suas falas com nitidez.
Na época das primeiras peças gregas, o coro era composto por um grande número de integrantes. Nas tragédias, costumava ter mais de dez pessoas, enquanto nas comédias chegava a incluir mais de 20 participantes.
Esta pintura em um vaso representa o coro de um dos espetáculos cômicos de Aristófanes (444 a.C.-385 a.C.), chamado Cavaleiros . Na cena, também aparece um instrumentista. A música ao vivo, a dança e o canto tinham grande importância nas apresentações. Observe a solução encontrada para representar os cavalos, bem como o requinte dos figurinos, das máscaras e dos adereços utilizados para caracterizar os cavaleiros.
[SEM TÍTULO]. [ca. 600 a.C.-401 a.C.].
Cerâmica, 33,1 cm x 21,7 cm x 15,2 cm. Museus Dahlem, Berlim (Alemanha). Representação do coro do espetáculo cômico Cavaleiros
Não escreva no livro.
Com base na leitura do texto a respeito do coro grego, reflita sobre as perguntas a seguir.
• Você já participou de algum grupo ou coletivo, como uma torcida organizada, um coral ou um conjunto de pessoas em manifestação pública? Como essas experiências podem ser relacionadas a um coro?
Respostas pessoais. Procure valorizar as diferentes experiências de participação em coletivos expressas pelos estudantes. É interessante fazer pontes entre a vivência deles e a forma do coro, que permitia materializar em cena os desejos e as necessidades de um grupo. Mencione também a existência de coletivos artísticos, como a ColetivA Ocupação, formada por estudantes secundaristas entre 2015 e 2016. Oriente uma pesquisa breve sobre esse coletivo.
2. Resposta pessoal. Procure valorizar o repertório dos estudantes e incentive uma conversa sobre filmes, séries ou peças de teatro que costumam assistir. É interessante mostrar como obras contemporâneas seguem sendo influenciadas pelo teatro de Shakespeare e, ao mesmo tempo, incluem as mais diversas referências. Um exemplo é o espetáculo Otelo, o outro, que estreou em São Paulo em 2023. Dirigida por Miguel Rocha, a obra inspira-se na dramaturgia de Shakespeare – Otelo, o mouro de Veneza –, mas inclui relatos reais de homens negros brasileiros contemporâneos e discute o racismo no Brasil de hoje.
William Shakespeare e o Globe Theatre
Ilustração de Cyril Walter Hodges (1909-2004) que reconstituiu o Globe Theatre (construído em 1599), teatro onde foram encenadas as peças de William Shakespeare. Ilustração de 1958.
Você já ouviu falar do amor de Romeu e Julieta? Já escutou a famosa frase do príncipe Hamlet, “Ser ou não ser”? O dramaturgo inglês William Shakespeare (1564-1616) marcou de tal forma o teatro ocidental, que é quase impossível se aventurar por essa arte sem se lembrar de suas peças.
Shakespeare escreveu em um contexto de mudanças históricas efervescentes. Os reis europeus concentravam o poder e afirmavam os Estados, enquanto, na Inglaterra, a burguesia crescia, aliada à nobreza. Conforme terras comunais passavam por um processo de cercamento, o êxodo rural resultava em um grande crescimento das cidades. Assim como ocorreu na Grécia antiga, a vida urbana favoreceu o florescimento de uma vida teatral intensa.
As peças de Shakespeare eram apresentadas no Globe Theatre, um edifício teatral que abrigava as diferentes classes sociais. O melhor lugar era reservado à rainha; no grande pátio, acotovelavam-se marinheiros, artesãos e outros trabalhadores, que pagavam um penny (moeda inglesa do período) pelo ingresso.
Em um momento em que o ser humano se afirmava como centro do universo, Shakespeare compôs personagens complexas, cheias de desejos e contradições. Os mais diferentes espectadores viam-se representados em cena e identificavam-se com os conflitos representados no palco. Em suas tragédias, reis e príncipes não conseguiam conciliar deveres de governante com vontades pessoais. Nas comédias, situações inusitadas (como a de um artesão que é transformado em burro em Sonho de uma noite de verão) convidam os espectadores a um exercício de imaginação.
1. Respostas pessoais. Abra espaço para que os estudantes troquem experiências e conhecimentos prévios (caso existam) sobre o tema estudado. Não escreva no livro. Após a leitura, converse com a turma sobre as questões a seguir.
1 Você já teve contato com alguma peça de Shakespeare? Se sim, qual?
2 Shakespeare compôs personagens vivas, profundas e complexas. Qual peça de teatro ou filme contemporâneo que você conhece também traz personagens assim?
PESQUiSA
Encenações de tragédias nos palcos brasileiros
A tragédia é um gênero teatral que marcou o teatro da Grécia antiga e as peças de Shakespeare. Também no Brasil de hoje o trágico se expressa em cena.
Pesquise sobre as referências a seguir e aprofunde sua compreensão sobre a presença da tragédia grega em obras recentes e contemporâneas na cena teatral do contexto brasileiro.
1. Gota d’água
• Adaptação da tragédia grega Medeia para o contexto brasileiro. Escrita por Chico Buarque e Paulo Pontes, estreou em 1975. Na peça, uma mulher madura e mãe de dois filhos, moradora de um conjunto habitacional, lida com a traição de Jasão, que abandona sua família e sua comunidade e abraça a chance de ter sucesso sozinho. Escute o álbum que alterna canções e falas do espetáculo. Disponível em: https://immub.org/album/gota-dagua-de-chico-buarque-paulo-pontes-bibi-ferreira. (Acesso em: 28 set. 2024).
2. Gota d’água {Preta}
Juçara Marçal (1962-) e Jé Oliveira (1983-) em cena de apresentação da peça Gota d’água {Preta}
• Em 2019, estreou Gota d’água {Preta}, adaptação de Gota d’água , pelo diretor Jé Oliveira. Na montagem, são evidenciadas questões raciais e sociais das personagens. Para saber mais, confira o site da Mostra Internacional de Teatro de São Paulo. Disponível em: https:// mitsp.org/2020/gota-dagua-preta/. Acesse também o documentário realizado pelo Sesc a respeito da peça, com falas dos artistas envolvidos na realização da obra. Disponível em: www.youtube.com/watch? v=4f_tmXAGk8Y. (Acessos em: 11 set. 2024).
3. Antígona na Amazônia
• A t ragédia grega Antígona acompanha a saga de uma mulher para enterrar seu irmão, apesar da proibição do governante. Em 2023, estreou a encenação Antígona na Amazônia , que atualiza a premissa grega. Na peça, Antígona é interpretada pela atriz indígena Kay Sara (1996-), e, nessa versão, muitos são os entes queridos que são proibidos de serem enterrados, remetendo ao Massacre de Eldorado dos Carajás, em que 21 trabalhadores rurais foram assassinados por policiais. O diretor suíço Milo Rau (1977-) trabalhou com um coro formado por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
• Acesse o site Fundação Caixa Geral de Depósitos, em que é possível, além de ler um texto, conferir imagens e vídeos e ouvir um podcast sobre a peça. Disponível em: www.culturgest.pt/pt/programacao/milo-rauntgent-antigona-na-amazonia/. (Acesso em: 11 set. 2024).
Frame de Antígona na Amazônia: ao fundo, uma projeção gigantesca da atriz indígena Kay Sara gritando; em primeiro plano, um corpo rodeado por terra.
SERGIO
SILVA
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Aspectos da tragédia, da comédia e do coro
As tragédias gregas apresentavam um herói que, por uma desmedida de seu caráter, caminhava em direção a seu destino, determinado pelos deuses. Essa dupla motivação do herói era a base da tragédia. Portador de um destino inevitável, o herói não era apenas vítima dele: suas ações conscientes o encaminhavam para seu final terrível.
Os autores das tragédias trabalhavam com base em enredos e personagens retirados da mitologia grega, como Édipo, Antígona e Medeia. Apesar de se passarem em um passado mítico, as peças provocavam debates urgentes para seu tempo histórico.
O público já conhecia as histórias que seriam narradas. O prazer do espectador não vinha de aguardar um desfecho surpreendente, mas de acompanhar como os artistas adaptavam o material mítico para o teatro. O destino terrível dos heróis trágicos provocava no público um misto de terror e piedade: essa era a catarse, palavra que significa “purificação”.
As comédias gregas abordavam aspectos do dia a dia de pessoas comuns e problemas da vida pública, além de fazer críticas sociais. O filósofo Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.) dizia que a tragédia retratava os homens de maneira superior ao que eles realmente eram, enquanto a comédia os retratava de maneira inferior. Mal-entendidos e falhas de caráter causavam o riso dos espectadores, mas também provocavam e faziam pensar. Por vezes, o comediógrafo (nome dado ao autor de peças cômicas) usava sua obra para satirizar figuras públicas conhecidas por todos, como governantes ou filósofos.
No teatro grego, o coro podia interferir na ação, mas, acima de tudo, ponderava e comentava as escolhas dos heróis, o que ia ao encontro de uma de suas principais funções: prezar pelo equilíbrio das emoções e dos discursos, como um espectador ideal ou a voz da opinião pública. Por sua característica coletiva, isto é, sua capacidade de representar um grupo social, o coro foi muito usado no teatro politizado dos séculos XX e XXI.
catarse: sentimento intenso de terror e piedade que os espectadores experimentavam ao acompanhar o desfecho terrível das tragédias. A catarse teria o efeito de expurgar os humores e apaziguar os ânimos dos cidadãos gregos.
sátira: crítica a pessoas, instituições ou ideias, operada por meio do humor e da ironia.
Coro de senhoras observa a protagonista no espetáculo Mata teu pai, peça da dramaturga mineira Grace Passô (1980-), inspirada na tragédia grega Medeia . Fotografia de 2019.
AçÃO Coro cênico
Neste momento, serão propostos dois jogos de aquecimento para criar coros cênicos. Para a realização da proposta, é necessário um espaço amplo e livre de obstáculos. A sala de aula pode ser adaptada. Para isso, afaste mesas e cadeiras com a ajuda dos colegas, deixando livre o espaço central. Outra opção é realizar a proposta em locais como o pátio ou a quadra da escola.
1. Siga o mestre
• Todos devem se organizar em uma fila. Quem estiver na frente é o mestre, que caminha pelo espaço e realiza movimentos que devem ser imitados pelos demais.
• Quando estiver no papel de mestre, procure variar ao máximo seus gestos. Lembre-se de utilizar todas as partes do corpo, explorando diferentes ritmos, pausas, amplitudes e níveis de altura.
• Depois de alguns experimentos, vá para o fim da fila e permita que o próximo mestre passe a guiar.
2. Cardume
• Agora, a fila deve ser desfeita e todos devem ocupar o espaço em grupo, sem se tocar, mas ficando próximos uns dos outros. Todos devem olhar para a mesma direção. Agora, o mestre não é previamente estabelecido. Um jogador que esteja na frente do grupo, visível para todos, deve começar propondo uma movimentação. Todos os outros devem imitá-lo.
• Sempre que o mestre realizar qualquer rotação, o coletivo se voltará para uma nova direção. Outros jogadores passarão a estar na frente do grupo; um deles assume a função de mestre e toma para si a tarefa de propor os movimentos.
• O desafio é que todos se movam em grupo e que a todo momento exista um acordo sobre quem está guiando. Com a prática, a transição entre um guia e o próximo se tornará mais orgânica: basta uma leve curva coletiva para que um novo jogador assuma a frente do grupo e mude a dinâmica, o ritmo, a amplitude e a altura dos gestos de todos.
• Se possível, jogue até que todos tenham experimentado propor os movimentos. Mas, lembre-se: o mais importante é trabalhar coletivamente para formar esse grande coro, ou seja, um cardume que se move em harmonia.
3. Coro cênico
• Reúna-se com os colegas em grupos de seis a oito pessoas.
• Com os colegas, selecione um texto que vocês gostem, com o qual se identifiquem. Pode ser um poema, uma letra de canção, um manifesto escrito por você e os colegas.
Não escreva no livro.
• Experimente declamar o texto em coletivo. Leia pausadamente, articule cada palavra e escute os colegas para que as palavras sejam ditas exatamente ao mesmo tempo.
• Juntos, planejem a caracterização do coro e como desejam ser chamados para a cena. Pensem que personagem coletivo melhor representa a ideia contida no texto. Vale tudo: coro de cães, coro de médicos, coro de apaixonados. Selecionem peças de roupa e confeccionem adereços que deixem nítido quem são os integrantes desse grupo.
• Já caracterizados, você e seus colegas deverão pesquisar, coletivamente, como se move esse coro. Quais são os gestos desse grupo? Como se deslocar conjuntamente?
• Perceba como o trabalho corporal altera a sua voz e a dos colegas. O texto pode ser dito com nova qualidade e entonação, com base na movimentação coletiva.
• Estabeleça o início e o final da cena com os colegas: como o coro faz sua entrada? Como se despede do público?
• Ensaie algumas vezes com eles, realizando as modificações que julgarem necessárias.
• Com a participação de todos, organizem o espaço de cena e combinem onde será o palco e onde ficarão os espectadores.
Acolha as falas dos estudantes sobre os diferentes afetos que estar em cena pode mobilizar. Procure também reforçar que a experiência de fruição é tão importante quanto a experiência
• É hora da apresentação! O professor irá anunciar o coro, e essa é a marca para que cada cena comece. Aproveite o momento de compartilhar o trabalho do grupo com a turma e observar as outras partilhas. Divirta-se!
4. Avaliação coletiva
de criação artística. É importante que percebam como os diferentes elementos da linguagem teatral produzem sentidos. Você pode ajudá-los propondo novas perguntas como: se o mesmo texto fosse dito por apenas um ator ou uma atriz, a cena teria sido diferente? Por quê? Proponha aos estudantes que teçam relações entre os aprendizados teóricos trabalhados durante o capítulo e a experiência prática de estar em cena. Se possível, relacione a forma do coro com a possibilidade de trabalhar cenicamente temas públicos e assuntos que dizem respeito a diferentes coletivos.
• Após as apresentações, converse com os colegas e com o professor sobre a criação de um coro cênico pensando nas sensações experimentadas e como as orientações do exercício reverberaram nos trabalhos. Por fim, comente sobre as possibilidades e potências do trabalho com o coro no contexto da linguagem teatral.
Coro de jovens em Amazonias – ver a mata que te vê [um manifesto poético]. Fotografia de 2022. O espetáculo foi realizado com base em um processo artístico e pedagógico que envolveu 35 jovens criadores, com idades entre 16 e 20 anos. Em sua maioria, moradores das periferias de São Paulo (SP), os atores e as atrizes foram provocados pela diretora Maria Thaís (1960-) a pensar sobre sua relação com a floresta amazônica.
MATHEUS
JOSÉ MARIA
DANÇA
CONTEXTO
A influência do balé clássico na dança cênica
Algumas características do balé clássico, como o modo de encenar histórias e narrar por meio de coreografias, a estreita relação entre coreografia e composição musical, além da participação de grandes elencos compostos de bailarinos profissionais, ainda se fazem presentes nos dias de hoje, inspirando artistas e companhias de dança, não apenas de balé.
Ainda que suas origens remontem ao período do Renascimento na Itália, nos séculos XIV e XV, o balé conquistou a corte, a nobreza e a burguesia nascente francesas a partir do reinado de Luís XIV, desenvolvendo-se tanto dramatúrgica quanto tecnicamente naquele país. Dos salões nos palácios, passou a ocupar os palcos de grandes teatros europeus e da Rússia, impulsionando a profissionalização de bailarinas e bailarinos. As coreografias do balé alternam entre momentos de pantomima e variações dançadas em grupos, duos, conhecidos como pas-de-deux, e solos, em que saltos, giros e momentos de suspensão exigem muita habilidade técnica e virtuosismo.
Uma vez que não há palavras faladas nessas obras, a pantomima apoia a narração da história. A música está intimamente ligada à própria construção coreográfica dos balés, já que alguns enredos decorrem das músicas – que, por sua vez, se inspiram em lendas e mitos europeus. Os espetáculos são acompanhados por orquestras que tocam a música ao vivo, posicionadas no fosso, um espaço reservado para os músicos abaixo do nível do palco.
pantomima: modo de narrar uma história usando exclusivamente expressões faciais e gestos, comum no balé.
Frame de A bela adormecida em montagem do Yacobson Ballet, de São Petersburgo (Rússia). Fotografia de 2022.
REPERTORiO 1
O lago dos cisnes
O sucesso do balé O lago dos cisnes é fruto da parceria entre o coreógrafo francês Marius Petipa (1818-1910) e o músico russo Pyotr Tchaikovsky (1840-1893). Se muitos balés criados no final do século XIX desapareceram e deixaram de ser encenados, é por causa da música de Tchaikovsky que O lago dos cisnes e outras peças dessa dupla, como A bela adormecida e O quebra-nozes, seguem lotando teatros.
Quando a peça foi composta, em 1877, sua música foi considerada inapropriada para ser dançada por ser demasiadamente sinfônica. Em virtude da versão coreográfica assinada por Petipa e Lev Ivanov (1834-1901), que estreou em São Petersburgo em 1895, este balé, em que música e coreografia são indissociáveis, passou a ocupar um lugar central no repertório de grandes companhias de balé no mundo. É na música e na transformação progressiva das melodias que a narração do enredo se apoia. O uso de temas recorrentes, alguns já conhecidos do público da época, sustenta o desenvolvimento psicológico da história e mantém o público fiel.
Não escreva no livro. Considerando a imagem desta página, que mostra o corpo de baile e os solistas, converse com os colegas sobre a pergunta a seguir.
• O que você percebe a respeito da relação entre os solistas e as bailarinas do corpo de baile?
As bailarinas do corpo de baile estabelecem um coro, sustentando a mesma postura, posição de braços e movimentos ao redor dos solistas que estão no centro do palco. No balé, é frequente essa relação entre solistas no centro da cena e o corpo de baile, emoldurando suas ações.
Apresentação de O lago dos cisnes realizada pela São Paulo Companhia de Dança no Jardim Botânico, em São Paulo (SP). Fotografia de 2018.
REPERTORiO 2
A sagração da primavera, da Europa para a África
École des Sables em apresentação de A sagração da primavera em Londres (Inglaterra). Fotografia de 2023.
A sagração da primavera é uma das obras mais marcantes do balé do século XX. Estreou em Paris, em 1913, com música de Igor Stravinsky (1882-1971) e coreografia de Vaslav Nijinsky (1889-1950). O enredo trata do sacrifício de uma jovem designada pela comunidade para ser entregue como oferenda a uma divindade, em troca de uma colheita proveitosa. A sonoridade dissonante, os ritmos irregulares da música e uma coreografia inovadora impactaram a plateia da estreia, que se dividiu entre vaias e aplausos. Ao longo dos seus mais de 100 anos, A sagração da primavera tornou-se referência na história da dança ocidental, apesar de ter sido pouco apresentada no século XX.
Em 1975, a coreógrafa alemã Pina Bausch (1940-2009) criou sua própria versão da peça com sua companhia de dança, o Tanztheater Wuppertal. Usando a música original de Stravinsky e uma coreografia que remetia à de Nijinsky, mas com a cena coberta por uma camada de terra, a versão de Bausch tornou-se um marco. Uma nova versão foi criada, em 2022, com os membros da École des Sables, escola de dança fundada em 1998 pela artista franco-senegalesa Germaine Acogny (1944-), sediada no Senegal.
Não escreva no livro.
Com base na fotografia e no texto, responda à questão a seguir.
• Ao cobrir o palco com terra, que elemento Bausch traz para a apresentação?
A sagração da primavera trata de um sacrifício em nome de uma boa colheita, e, por isso, a terra possui um papel relevante na narrativa. Sua presença no palco reforça esse aspecto do enredo. No entanto, dançar em um palco coberto de terra é desafiador para os bailarinos, pois precisam estar mais atentos para evitar deslizes.
STEPHANIE BERGER
REPERTORiO 3
Bailarinos brasileiros no exterior
Regina Advento em apresentação de Sweet Mambo, de Pina Bausch, com o Tanztheater Wuppertal. Fotografia de 2014.
Márcia Haydée (1937-) e John Neumeier (1939-) em apresentação de Oiseaux Exotiques. Fotografia de 1969.
Como no Brasil as perspectivas de trabalho para artistas da dança ainda são muito restritas, é comum que bailarinos e bailarinas nascidos e formados aqui partam para outros países em busca de oportunidades profissionais. Alguns desses artistas ganham grande destaque em companhias de dança ao redor do mundo.
Márcia Haydée nasceu em Niterói e, em 1961, foi convidada a integrar o Stuttgart Ballet, na Alemanha, onde atuou como primeira solista por 13 anos. Durante sua carreira, dançou em obras de renomados coreógrafos, como John Cranko (1927-1973) e Maurice Béjart (19272007). Entre seus parceiros de dança, destacam-se nomes como Richard Cragun (1994-2012), Rudolf Nureyev (1938-1993) e Jorge Donn (1947-1992).
Já a bailarina mineira Regina Advento (1965-), depois de alguns anos dançando com o Grupo Corpo, partiu para a Alemanha e, desde 1995, integra o elenco principal da Tanztheater Wuppertal. O carioca Thiago Soares (1981-) iniciou sua trajetória na dança pelo hip hop, no Rio de Janeiro, antes de começar as aulas de balé. Depois de conquistar medalhas em concursos de balé em diferentes partes do mundo, mudou-se para o Reino Unido em 2002, tornando-se bailarino do Royal Ballet, onde atingiu o posto de primeiro solista e permaneceu até 2019.
Ingrid Silva (1988-), outra carioca, mudou-se para os Estados Unidos em 2007 e, pouco depois, passou a fazer parte do Dance Theatre of Harlem. Além de sua carreira como bailarina, Ingrid tornou-se uma referência na luta antirracista dentro do balé, promovendo maior representatividade e inclusão na dança clássica.
Não escreva no livro.
Após a leitura do texto, converse com os colegas e com o professor sobre as perguntas a seguir.
1 Você conhece algum bailarino ou bailarina profissional?
Resposta pessoal. Caso os estudantes não conheçam bailarinos, tente expandir a conversa para dançarinos de modo geral.
2 Como você imagina ser a rotina de bailarinas e bailarinos profissionais?
Em razão da dança profissional ser uma atividade que exige muitas competências físicas dos bailarinos, a rotina desses profissionais inclui aulas de dança diárias e, eventualmente, outras práticas corporais para prevenção de lesões e bem-estar, mesmo quando não estão envolvidos na preparação ou em temporadas de espetáculos. Quando estão ensaiando ou se apresentando, essas aulas antecedem as horas de ensaio e os espetáculos.
Companhias de balé e a formação de bailarinos
Alunas da Escola Estadual de Dança Maria Olenewa em aula. Fotografia de 2023.
Em 1927, no Rio de Janeiro, a bailarina russa Maria Olenewa (1896-1965) criou a escola de dança do Theatro Municipal, cuja missão era preparar bailarinos e bailarinas para formarem o corpo de baile daquele teatro, que havia sido inaugurado em 1909. Atualmente conhecida como a Escola Estadual de Dança Maria Olenewa, foi a primeira escola de dança do Brasil. Hoje, há outras escolas que preparam crianças e jovens para a carreira de bailarinos, uma escolha profissional que exige treinamento técnico rigoroso e contínuo.
1. Faça um levantamento das companhias profissionais de balé clássico no Brasil e identifique os balés que compuseram o programa dessas companhias nos últimos dois anos.
• No site da São Paulo Companhia de Dança é possível, por exemplo, conhecer as obras dançadas e a programação anual. Disponível em: https://spcd.com.br/repertorio/portifolio/criacoes-spcd/. (Acesso em: 11 set. 2024).
2. Como você imagina que é a formação de crianças e jovens que pretendem se tornar bailarinos profissionais? Quanto tempo dura essa formação? Quais são os conteúdos abordados?
• Conheça o programa dos cursos da Escola de Dança de Paracuru, no Ceará. Disponível em: https:// mapacultural.secult.ce.gov.br/projeto/1196/. (Acesso em: 11 set. 2024).
• Na cidade de Joinville, em Santa Catarina, a Escola do Teatro Bolshoi no Brasil oferece formação para o balé. Disponível em: www.escolabolshoi.com.br/. (Acesso em: 11 set. 2024).
CAROL LANCELLOTI/ASSOCIAÇÃO DOS AMIGOS DA ESCOLA DE DANÇA MARIA OLENEWA
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Música para ser dançada
Nos grandes balés, música e coreografia são indissociáveis. As coreografias eram criadas em diálogo com composições musicais, dando corpo a personagens e enredos. Essa relação é tão forte que, até o início do século XX, não era usual dançar, em cena, músicas que não tivessem sido compostas com a finalidade de serem dançadas. No início do século XX, Isadora Duncan chocou as plateias europeias por se apresentar dançando músicas que não haviam sido criadas para a dança, como obras de Frédéric Chopin (1810-1849) e Ludwig van Beethoven (1770-1827).
A importância da música é ainda mais forte pelo fato de os balés serem acompanhados por música tocada ao vivo por orquestras. Uma personagem do enredo pode ser identificada por um tema musical, tocado por um determinado instrumento da orquestra, criando correspondências entre certos bailarinos e músicos. Uma boa sintonia entre música e dança, é condição essencial para a qualidade de um espetáculo de balé.
Para conhecer a orquestra
Como formação musical, a orquestra é parte da tradição da música ocidental europeia e se consolidou quando o interesse pela música instrumental superou o interesse pela música vocal. Uma orquestra é liderada por um maestro, responsável por marcar elementos da música como a pulsação, a entrada de cada instrumento e expressividade. Para isso, ele usa uma pequena vara chamada batuta. Ao acompanhar um balé, o maestro pode chegar a adaptar o andamento da música para dar mais apoio aos bailarinos.
Os instrumentos da orquestra são agrupados por naipes, de acordo com suas características e sonoridades. Assim, temos os naipes de cordas, percussão e sopros (divididos entre metais e madeiras), organizados da seguinte maneira:
JOANA RESEK
AçÃO Jogando com o corpo e os instrumentos musicais
Preparação
Cia. Dani Lima em apresentação de 100 gestos. 2012. Fotografia de 2012.
Para esta atividade, você vai precisar de: um local silencioso, espaço para se mover, um aparelho de som e dois dados. Você pode usar dados prontos ou confeccioná-los com papelão. O dado A será usado para indicar partes do corpo e o B, instrumentos da orquestra.
Dado A - Partes do corpo
Lado 1 - Cabeça e tronco
Lado 2 - Membro superior direito
Lado 3 - Membro superior esquerdo
Lado 4 - Membro inferior direito
Lado 5 - Membro inferior esquerdo
Lado 6 - Duas partes do corpo ao mesmo tempo
Dado B - Instrumentos da orquestra
Lado 1 - Violino
Lado 2 - Clarinete
Lado 3 - Tímpano
Lado 4 - Trompete
Lado 5 - Harpa
Lado 6 - Dueto (você vai sortear um dos duetos de instrumentos musicais)
Não escreva no livro.
Ouça as faixas de áudio “Instrumentos da Orquestra” (partes 1 e 2) e localize a seguinte minutagem:
8 FaixaMinuto Instrumento
FaixaMinutoInstrumento
815s-45s Violino
91min15s-1min45s Toda a orquestra 9
848s-1min18sClarinete
81min20s-1min49sTímpano
81min53s-2min22sTrompete
Etapa 1
82min25s-2min55s Harpa
98s-38s Dueto: violino e clarinete
940s-1min11s Dueto: tímpano e trompete
Instale-se no espaço em uma posição confortável. Se houver possibilidade, deite-se no chão ou sente-se em um banco ou uma cadeira que não restrinja os seus movimentos. Fique de olhos fechados por alguns minutos, atento à sua respiração, e busque identificar e eliminar tensões musculares desnecessárias.
Em seguida, ouça os áudios “Instrumentos da Orquestra”, partes 1 e 2, que apresentam o som dos instrumentos de forma isolada, em duetos e todos tocando em conjunto. Preste atenção nas características sonoras dos diferentes instrumentos e perceba se algum deles o inspira a se mover, convocando alguma parte específica do corpo ou um tipo particular de movimentação.
Etapa 2
Em seguida, os dois dados serão jogados pelo professor, o que resultará na indicação de uma ou duas partes do corpo e um ou dois instrumentos da orquestra. Você irá, então, acompanhar o som desse instrumento por alguns minutos, explorando os movimentos com a parte do corpo designada pelo dado. Os dados serão lançados três vezes, propondo a você e seus colegas diferentes combinações. Busque identificar se algumas combinações facilitam ou dificultam o movimento e se você percebe uma preferência por algum instrumento ou parte do corpo.
A turma será então dividida em dois grupos. Um dos grupos irá improvisar com base nos dados, enquanto o outro irá assistir. Em seguida, os grupos trocarão de posição/função.
Etapa 3
Agora, cada um escolherá um dos instrumentos musicais e tentará ouvir somente ele na composição que inclui toda a orquestra. Por fim, cada um criará uma movimentação livre para o instrumento que escolheu e fará isso junto com os demais membros da turma, enquanto ouvem toda a orquestra tocar. Se for possível, registre esse último momento em vídeo.
Finalização
Ao final, os grupos irão expor o que sentiram ao explorar os movimentos e ao observar os demais colegas. Compartilhe também as facilidades e as dificuldades de ouvir os instrumentos separadamente, no caso dos duetos, ou de escutar todos os instrumentos ao mesmo tempo. Assistam juntos ao vídeo da etapa 3 e percebam se os movimentos simultâneos parecem representar as múltiplas sonoridades da orquestra.
ARTES iNTEGRADAS
CONTEXTO
Patrimônio Cultural
Patrimônio é o conjunto de objetos, lugares e práticas culturais que são considerados bens de valor para o coletivo e, portanto, tem sua importância reconhecida pela sociedade e pelo Estado. O Patrimônio Cultural é dividido em duas categorias: material, formado por bens materiais (como edificações históricas, coleções de objetos e acervos de imagens); e imaterial, constituído por práticas que manifestam saberes, celebrações e formas vivas de expressão (como a música, a dança e a culinária, inclusive personalidades, tais como mestres e mestras da cultura popular).
O Cais do Valongo, no Rio de Janeiro (RJ), era o principal porto de entrada de africanos escravizados nas Américas. Seu reconhecimento como Patrimônio Mundial, em 2017, é importante como marco da memória da violência contra a Humanidade, representada pela escravização, ao mesmo tempo que exalta a resistência e a liberdade. Fotografia de 2024.
Em todo o mundo, organismos nacionais e internacionais atuam para preservá-lo. No entanto, é importante reconhecer como o processo de colonização interfere na percepção da importância e do reconhecimento de culturas não hegemônicas. Como exemplo, pode-se citar o Cais do Valongo, que passou a integrar a lista de Patrimônio Mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) apenas em 2017. Já em relação às culturas dos povos indígenas brasileiros, não há nenhuma representação inscrita nessa lista.
O Parque Nacional Serra da Capivara, no Piauí, é um Patrimônio Cultural da Humanidade reconhecido por seu valor cultural, por causa de seus sítios arqueológicos, e geológico, em razão das formas do terreno de chapada e pela preservação da caatinga e da mata atlântica. No site da Fundação Museu do Homem Americano (Fumdham), é possível conhecer mais sobre o parque e o museu, além de observar pinturas rupestres. Disponível em: http://fumdham.org.br/. (Acesso em: 11 set. 2024).
Para conhecer a importância do Iphan
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) é a instituição governamental responsável pela preservação e promoção dos bens culturais brasileiros. Para ler mais sobre o trabalho realizado e conhecer outros patrimônios, visite o site do Iphan. Disponível em: www.gov.br/iphan/pt-br. (Acesso em: 11 set. 2024).
Pintura rupestre em caverna no Parque Nacional Serra da Capivara, em Coronel José Dias (PI). Fotografia de 2024.
CONeXãO
WILIAN FERREIRA/SHUTTERSTOCK.COM
LUCIANO QUEIROZ/PULSAR IMAGENS
REPERTORiO 1
Unesco e o Patrimônio Colonial
A primeira capital do Brasil, Salvador, foi fundada em 1549, sobre uma colina com vista para a baía. Assim, a cidade logo se transformou em um porto importante, centro de exportação de açúcar.
Salvador apresenta dois planos: a cidade alta e a cidade baixa, onde se localiza o porto. Na cidade alta antiga estavam as igrejas, presença marcante do cristianismo europeu, bem como os edifícios públicos e os sobrados dos senhores de engenho, responsáveis pelo tráfico escravagista e pela exportação de produtos. Todas essas edificações foram construídas segundo os padrões estéticos das cidades portuguesas. No conjunto da igreja e convento de São Francisco, por exemplo, um dos mais expressivos exemplares do barroco brasileiro, há um pátio decorado com painéis de azulejos trazidos de Portugal no século XVI. Nas encostas, ficava o casario mais pobre, enquanto a região do porto era ocupada por armazéns, casas de pescadores e marinheiros.
O espaço público mais representativo da Salvador histórica é o Pelourinho, um largo de forma triangular e em declive nas proximidades do Convento do Carmo. Mistura de praça, belvedere e terreiro africano, esse largo era também utilizado para o açoite e a tortura pública dos escravizados e, posteriormente, veio a dar nome a toda a região do centro histórico de Salvador.
O centro histórico de Salvador (BA) recebeu o título de Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco em 1985. Fotografia de 2016.
Observe a fotografia do Largo do Cruzeiro de São Francisco no Pelourinho e converse com os colegas sobre as questões a seguir.
1 Quais elementos se relacionam com a cultura colonial?
A igreja católica ao fundo, o casario em três andares com características barrocas que configuram a praça e o grande cruzeiro ao centro.
2 Você conhece alguma cidade colonial no Brasil? Quais são suas características?
Respostas pessoais. As cidades coloniais apresentam construções sólidas, feitas de pedra e cobertas com telha de cerâmica artesanal. Os ornamentos, tanto externos quanto internos, são entalhados em pedra e madeira, resultando em fachadas austeras e interiores decorados.
Não escreva no livro.
Coleções de bens saqueados – Patrimônio Material
Glicéria Tupinambá, da aldeia da Serra do Padeiro, no território indígena Tupinambá de Olivença (BA), veste manto confeccionado por ela. Fotografia de 2021.
MANTO tupinambá. [ca. 1500-1700]. Fibras naturais e penas do pássaro guará, 1,20 m. Museu Nacional do Brasil, Rio de Janeiro (RJ). O Manto tupinambá foi levado para a Europa no século XVII e permaneceu cerca de 200 anos no Museu Nacional de Arte da Dinamarca, Copenhague (Dinamarca), tendo sido devolvido ao Brasil apenas no ano de 2024.
Os museus europeus guardam, em seus acervos, artefatos que foram saqueados dos povos que viviam originalmente nas terras invadidas e colonizadas a partir do século XVI. O Manto tupinambá é um deles. Cerca de 11 desses mantos foram levados do Brasil e permanecem até hoje em museus europeus.
Habitantes da região costeira do Brasil, os tupinambá foram considerados extintos após os primeiros séculos da colonização portuguesa, mas continuaram a existir em pequenas comunidades isoladas. Eles confeccionavam mantos de penas de pássaros, como os guarás-vermelhos, que eram usados em rituais.
Glicéria Tupinambá (1982-), professora e artista de uma dessas comunidades, iniciou em 2006 uma pesquisa para a confecção de um manto, como um gesto de resistência. Com base em sonhos, conversas com os mais velhos e uma visita a um museu europeu, Glicéria produziu três peças usando penas de pássaros fixadas em uma rede de fios de algodão revestidos de cera de abelhas. O trabalho culminou, em 2021, na exposição “Kwá yepé turusú yuriri assojaba tupinambá”, que, na língua nheengatu, significa “Essa é a grande volta do Manto tupinambá”. A obra de Glicéria provocou uma mobilização que reivindicou o retorno ao Brasil do manto que se encontrava há três séculos em Copenhague, no Museu Nacional de Arte da Dinamarca. O objeto fará parte do acervo do Museu Nacional, vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro, que deve ser reinaugurado até 2026.
Com base no episódio do Manto tupinambá, reflita sobre o tema e responda às questões a seguir.
1 Qual é a importância de retornar bens patrimoniais para os povos que sofreram com a colonização?
2 O que significa para o Brasil a volta do Manto tupinambá?
O retorno dos bens materiais saqueados no processo de colonização são gestos muito significativos, pois trazem o reconhecimento das violências cometidas pelos europeus com o modo colonial de habitar o mundo.
1. Os bens patrimoniais, como o Manto tupinambá, trazem valores simbólicos e espirituais de volta ao território cultural de um povo. Assim, reatam memórias perdidas e fortalecem a cultura e o direito dos povos que sofreram a violência da colonização.
Não escreva no livro.
FERNANDA LIBERTI
MUSEU NACIONAL, RIO DE JANEIRO, BRASIL
Festa do Divino Espírito Santo – Patrimônio Imaterial
Celebração da Festa do Divino Espírito Santo, em São Paulo (SP). Fotografia de 2017.
De origem portuguesa, a Festa do Divino Espírito Santo é uma manifestação da religiosidade popular cristã em diversas cidades brasileiras. As festas de santos foram trazidas pelos colonizadores como devoção católica e expressão da cultura medieval. A data está ligada à colheita e às crenças e tradições judaico-cristãs relatadas em textos bíblicos. Conta-se que, em Portugal, a celebração foi estabelecida pela rainha D. Isabel (1271-1336), que, mais tarde, foi canonizada como Santa Isabel de Portugal (1625). A rainha teria ordenado que, durante o período da festa, um menino fosse coroado rei, algumas pessoas presas fossem soltas e alimentos fossem distribuídos para a população. Dessa forma, estabeleceu-se uma festa voltada para valores cristãos, como igualdade, bondade e fraternidade.
No Brasil, a festa se transformou e adquiriu características locais. Ela é celebrada entre maio e junho e, como não figurava no calendário católico, ganhou contornos populares, misturando o sagrado e o profano, reunindo elementos como rezas, cortejos, coroações, levantamento de mastro e apresentações de grupos de música locais.
A festa é celebrada em diversas cidades por todo o país, como São Luiz do Paraitinga (SP), São João del-Rei (MG) e Pirinópolis (GO), entre outras.
1. Em um processo de colonização, há a tentativa de consolidar o modo de vida e as tradições do colonizador. Por outro lado, existe luta e resistência para manter ou transformar celebrações e outras manifestações de acordo com as características brasileiras.
Com base no texto e na fotografia da festa do divino, responda às questões a seguir.
1 Como relacionar a cultura europeia com aspectos da cultura brasileira, como no caso da Festa do Divino Espírito Santo?
2 De que forma o simbolismo da Festa do Divino Espírito Santo é expresso na relação entre sagrado e profano?
Nas apresentações musicais, na coroação ou na encenação teatral, há elementos que não possuem um caráter religioso. Já no aspecto sagrado, a festa conta com procissões, novenas e missas.
Não escreva no livro.
A riqueza do patrimônio brasileiro
No Brasil, povos originários, comunidades da diáspora africana, colonizadores e imigrantes europeus, além de grupos oriundos do Oriente Médio e de diversos territórios asiáticos, têm convivido sob regimes de opressão e violência contínua. No entanto, esse encontro produziu uma cultura potente e criativa ao longo do tempo.
1. Você estudou que, no processo de preservação do patrimônio mundial, destaca-se o papel da Unesco.
• Escolha um Patrimônio Cultural brasileiro da lista do Patrimônio Mundial da Humanidade da Unesco e verifique quando ele foi incluído na lista da organização. Pesquise as razões que levaram esse patrimônio a ser reconhecido como um bem cultural valioso para a humanidade. Anote essas informações em seu caderno. Disponível em: www.gov.br/turismo/pt-br/secretaria-especial-da-cultura/ assuntos/noticias/conheca-23-patrimonios-da-humanidade-que-ficam-no-brasil. (Acesso em: 11 set. 2024).
2. Na esfera nacional, o órgão que cuida do patrimônio cultural é o Iphan.
• Pesquise no site da instituição os bens imateriais registrados no país. Disponível em: http://portal. iphan.gov.br/pagina/detalhes/681/. (Acesso em: 11 set. 2024). Clicando na região onde você vive, verifique a lista de bens do estado e anote em seu caderno quantos bens estão registrados. Escolha um dos itens para aprofundar a pesquisa e descubra o que levou essa manifestação cultural a ser reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil.
3. A ação de pesquisa, reconstrução e divulgação sobre o Manto tupinambá , realizada por Glicéria Tupinambá, somou-se ao movimento de países de passado colonial, que demandam a devolução de artefatos de valor patrimonial e sagrado.
• Acesse a pesquisa realizada pela artista e pelas coordenadoras do projeto, Juliana Caffé e Juliana Gontijo, no catálogo da exposição “Kwá yepé turusú yuriri assojaba tupinambá: essa é a grande volta do manto tupinambá”. Escolha uma obra que documenta a presença do manto na Europa e uma obra de artistas brasileiros contemporâneos, a fim de comparar e apontar características comuns e distintas nas representações. Disponível em: www.yumpu.com/en/document/read/65935132/ catalogo-kwa-yepe-turusu-yuiri-assojaba-tupinamba. (Acesso em: 11 set. 2024).
C AFFÉ, Juliana; GONTIJO, Juliana (coord.). Kwá yepé turusú yuriri assojaba tupinambá: essa é a grande volta do manto tupinambá. São Paulo: Conversas em Gondwana, 2021. Capa do catálogo da exposição “Kwá yepé turusú yuriri assojaba tupinambá”.
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Acervos e coleções
Colecionar é uma forma de aprender mais sobre o que nos interessa. As coleções de objetos temáticos variados podem ser reunidas por pessoas ou instituições. Algumas pessoas passam a vida toda em busca de determinados itens. Outros são comerciantes: trocam ou vendem objetos menos valiosos ou repetidos e preservam os mais raros, deixando, assim, suas coleções cada vez mais apuradas.
Algumas coleções são tão especiais que se tornam patrimônios públicos, pois guardam saberes e informações valiosas. Existem coleções de variados tipos, que podem se relacionar a determinada pessoa, como as cartas escritas por Guimarães Rosa, ou a uma época, como a coleção de fotografias de D. Pedro II - incorporada à Biblioteca Nacional após a Proclamação da República (1889) e disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/. (Acesso em: 28 set. 2024).
Na maioria dos museus, a quantidade de peças expostas é uma pequena fração de todo o seu acervo. Em nome de sua preservação, muitos itens não são acessíveis ao público. No século XXI, o aumento do volume de dados determinou o surgimento do termo big data, ou “megadados”, em português. Com isso, surgiram iniciativas que procuram integrar acervos de bibliotecas e museus com o objetivo de tornar o patrimônio cultural disponível para o maior número de pessoas no mundo.
A Europeana é um exemplo de plataforma que reúne cerca de 50 milhões de itens digitalizados de museus e bibliotecas europeias para investigação do público em geral. Projetos como esses contribuem com a produção e a disseminação de conhecimento e integram as Humanidades Digitais, uma área de estudos que aborda os métodos e os processos de codificação e organização das informações relacionadas à cultura humana. Para começar uma coleção:
• escolha um tema que desperte o seu interesse;
• determine onde você pode encontrar tais itens;
• visite outras c oleções e verifique quem são os outros colecionadores desses objetos;
• procure por lugares onde você pode encontrar esses objetos;
• comunique o seu interesse para os amigos e parentes.
Imagem da Família Real Brasileira nas pirâmides de Gizé, no Egito, c. 1870. Coleção Dona Thereza Christina Maria, Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro (RJ).
AçÃO Colecionar
como método de pesquisa
Você tem ou já teve alguma coleção? De que tipo? Colecionar pode ser uma forma de pesquisar e conhecer mais sobre um determinado assunto. Por isso, para escolher um tema para começar uma coleção, você deve pensar sobre seus interesses.
1. Coleção de objetos
• Escreva num papel o tema que pode ser objeto de uma coleção e entregue para o professor. Verifique se há outros colegas na sala com o mesmo interesse. Se houver essa possibilidade, junte-se a um grupo para um trabalho compartilhado.
• Fora do horário de aula, reúna alguns objetos para montar uma coleção. Pode ser algo simples, como pequenos objetos da mesma cor, sementes de árvores ou pedras variadas. Podem ser coisas antigas, como caixinhas, embalagens, discos antigos e revistas, ou ainda fotografias antigas ou de um mesmo tema, amostras de tecidos, reproduções de obras de arte, peças de máquinas ou objetos quebrados.
• Você ainda pode reunir e colecionar sons, gestos e até palavras.
• Reúna e selecione pelo menos dez objetos ao longo da semana.
• Pense em uma forma de organizar sua coleção. Existe uma ordem para apresentá-la? Qual seria?
• Verifique se há semelhanças entre os objetos, se eles podem ser combinados, organizados por cor, textura, aparência ou funcionalidade.
• Analise se podem ser fixados sobre um mesmo suporte. De que cor e material seria esse suporte? O que pode ser feito para tornar esse conjunto mais interessante?
• Organize sua coleção e faça uma legenda com as informações que achar relevantes sobre ela. Por exemplo: o que os objetos têm em comum, qual é a sua procedência, de que época são, onde foram encontrados.
• Traga-a para a sala de aula para apresentar aos colegas.
2. Coleção digital
Nesta atividade, você e os colegas vão navegar em um banco de dados e fazer escolhas conscientes.
• Escolha um banco de dados de um museu brasileiro com a turma ou com o grupo.
• Analise como as informações estão organizadas e apresentadas visualmente.
• Converse com os colegas sobre quais tópicos têm interesse e quais gostariam de explorar.
• Após selecionar os tópicos do grupo, cada integrante deve escolher alguns itens dentro desse filtro.
• Imprima as imagens escolhidas e mostre-as aos colegas explicando por que escolheu aqueles itens e que relações podem ser traçadas entre eles.
SCORNAIENCHI, Valéria. Série Ainda. 2017. Impressão sobre PVC, 30 cm x 30 cm. A artista Valéria Scornaienchi reuniu, na série Ainda , fotografias do céu tiradas todos os dias ao amanhecer, entre 5h45 e 6h45. Depois, ordenou as imagens para construir uma sequência de cores.
PONTE PARA OUTRAS
liNGUAGENS ARTiSTiCAS
ARTES ViSUAiS
A beleza na Grécia antiga
Na Grécia antiga, “beleza” era sinônimo de “bem”. O que era belo estava ligado de forma indissociável com o bom e verdadeiro. Para expressá-la, os escultores representavam a figura humana em bronze ou mármore. No período clássico, essas esculturas não eram representações de um determinado indivíduo, mas de deuses e valores a eles associados, tais como virilidade e coragem.
A nudez era considerada natural. Nos jogos, os jovens atletas competiam nus e as mulheres costumavam cobrir o corpo com tecidos tão finos que eram quase transparentes. Os rapazes cultivavam o corpo, mantendo-se fortes e em boa condição física, de modo a se tornarem bons soldados e notáveis atletas. Praticar esportes era uma forma de honrar os deuses e de se manter preparado para a guerra. O ritual dos jogos desenvolvia nos jovens um espírito heroico.
ARTES ViSUAiS
A perspectiva na pintura romana
Um elemento que caracteriza a pintura europeia é o interesse pela representação do espaço através de simulações e efeitos de tridimensionalidade. Essas características podem ser observadas nas pinturas em afresco descobertas no interior das casas do sítio arqueológico de Pompeia, uma cidade da civilização romana que foi soterrada pela erupção do vulcão Vesúvio em 79 d.C. Durante o Império Romano, casas luxuosas tinham em seu interior pinturas murais e pisos decorados com mosaicos, mostrando um interesse pelo efeito de profundidade. Com o uso de recursos simples como sombras, a sobreposição de planos e a distorção na dimensão dos elementos e linhas diagonais, evocava-se a presença dos espaços emoldurados por detalhes arquitetônicos e florais.
Imagem da parede da casa de Lucrécio Fronto. Metade do século I. Pompeia (Itália).
DORÍFORO. [ca. 100 a.C.-1 a.C.]. Mármore, 2,12 m de altura. Museu Arqueológico Nacional, Nápoles (Itália).
As paredes dessa residência exibem uma série de painéis que, com o uso de tons de preto e vermelho, criam cenários dentro do ambiente.
MUSiCA MUSiCA
Música clássica e romântica
Na tradição ocidental, o que se conhece como música clássica refere-se predominantemente a um tipo de composição instrumental estruturada na forma de sonata, concebida na segunda metade do século XVIII na Europa. A sonata é composta de três movimentos: exposição, desenvolvimento e recapitulação. A exposição apresenta o tema musical, o desenvolvimento indica o desdobramento e a recapitulação retoma o tema inicial para finalizar a peça. No século XIX, os compositores românticos, em oposição aos clássicos, privilegiaram as emoções e a liberdade criativa, utilizando a multiplicidade de timbres e a variação de intensidade sonora com o intuito de evocar imagens em suas composições.
Quem já ouviu rádio no Brasil, provavelmente se deparou com a abertura do programa A voz do Brasil com o tema de “O guarani” (1870), música do maestro Carlos Gomes (1836-1896), compositor do romantismo. Ele foi o primeiro brasileiro a ter suas obras apresentadas no Teatro alla Scala, na Itália. Embora sua imagem tenha sido embranquecida, Carlos Gomes era um homem pardo, mas, para justificar sua circulação nos grandes salões europeus, essa identidade foi camuflada ao longo da história.
Sinfonia, concerto e ópera
Além de dar nome à forma, também é chamada de sonata a composição musical para um ou dois instrumentos. A formação instrumental, isto é, o grupo de instrumentos para o qual uma obra é composta, define também o seu nome. Assim, a sinfonia é composta para a orquestra; o concerto, para um instrumento solista com acompanhamento da orquestra; e a ópera, por sua vez, também é acompanhada pela orquestra, mesclando canto, interpretação e poesia. A história dos musicais contemporâneos se cruza com a origem das operetas francesas, que igualmente trabalham com o encontro de várias linguagens artísticas. Entre as óperas mais famosas estão A flauta mágica (1791), de Mozart; La traviata (1853), de Verdi; e Carmen (1875), de Bizet.
O maestro Antônio Carlos Gomes, retratado no século XVIII.
CARMEM. 1875. 1 cartaz.
A primeira produção de Carmen ocorreu na Ópera-Comique, em Paris. O libreto, isto é, seu texto, foi escrito por Henri Meilhac (1831-1897) e Ludovic Halévy (1834-1908), baseado no romance homônimo do autor francês Prosper Mérimée (1803-1870). A ópera retrata a história da cigana Carmen, que luta pela liberdade de amar a quem quiser.
SiNTESE ESTETiCA
O belo
Reflexão
pessoa que tem sede.
A beleza era um tema importante para os artistas e filósofos gregos. Nesta seção, você deverá refletir sobre esse conceito. Para se aprofundar um pouco na questão, leia um fragmento da introdução do livro História da beleza, de Umberto Eco (1932-2016), pensador e escritor nascido em Alexandria.
“Belo” – junto com “gracioso”, “bonito” ou “sublime”, “maravilhoso”, “soberbo” e expressões similares – é um adjetivo que usamos frequentemente para indicar algo que nos agrada. Parece que, nesse sentido, aquilo que é belo é igual àquilo que é bom e, de fato, em diversas épocas históricas criou-se um laço estreito entre o Belo e o Bom.
Se, no entanto, julgarmos com base em nossa experiência cotidiana, tendemos a definir como bom aquilo que não somente nos agrada, mas que também gostaríamos de ter. Infinitas são as coisas que consideramos boas: um amor correspondido, uma honesta riqueza, um quitute refinado, e em todos esses casos desejaríamos possuir tal bem. É um bem aquilo que estimula o nosso desejo. Mesmo quando consideramos boa uma ação virtuosa, gostaríamos de tê-la realizado nós mesmos, ou nos propomos a realizar uma outra tão meritória quanto aquela, incitados pelo exemplo daquilo que consideramos ser um bem.
Ou então chamamos de bom algo que é conforme a algum princípio ideal, mas que custa dor, como a morte gloriosa de um herói, a dedicação de quem trata de um leproso, o sacrifício da vida feito por um pai para salvar um filho… Nesses casos, reconhecemos que a coisa é boa, mas, por egoísmo ou por temor, não gostaríamos de nos ver envolvidos em uma experiência análoga.
Reconhecemos aquela coisa como um bem, mas um bem alheio que olhamos com um certo distanciamento, embora comovidos, e sem que sejamos arrastados pelo desejo. Muitas vezes, para indicar ações virtuosas que preferimos admirar a realizar, falamos de uma “bela ação”.
Se refletimos sobre o comportamento distante que nos permite definir como belo um bem que não suscita o nosso desejo, compreendemos que falamos de Beleza quando fruímos de alguma coisa por aquilo que é, independentemente da questão de possuí-la ou não. Até mesmo um bolo de casamento bem confeccionado, quando o admiramos na vitrine do confeiteiro, nos parece belo, mesmo que, por questões de saúde ou de inapetência, não o desejemos como um bem a ser adquirido. É bela alguma coisa que, se fosse nossa, nos deixaria felizes, mas que continua a sê-lo se pertence a outro alguém. Naturalmente não se considera o comportamento de quem, diante de uma coisa bela como o quadro de um grande pintor, deseja possuí-lo por orgulho de ser o possuidor, para poder contemplá-lo todo dia ou porque tem grande valor econômico. Estas formas de paixão, ciúme, desejo de possuir, inveja ou avidez, nada têm a ver com o sentimento do Belo. O sequioso que ao dar com uma fonte precipita-se para beber não lhe contempla a Beleza. Pode fazê-lo depois, uma vez satisfeito o seu desejo. Por isso, o sentido da sequioso:
Beleza é diverso do sentido do desejo. Podemos considerar alguns seres humanos belíssimos, mesmo que não os desejemos sexualmente, ou que saibamos que nunca poderão ser nossos. Se, ao contrário, se deseja um ser humano (que além do mais poderia até ser feio) e não se pode ter com ele as relações almejadas, sofre-se.
[…]
Um outro critério a nos guiar é que a estreita relação que a época moderna estabeleceu entre Beleza e Arte não é assim tão evidente. Se determinadas teorias estéticas modernas reconheceram apenas a Beleza da arte, subestimando a Beleza da natureza, em outros períodos históricos aconteceu o inverso: a Beleza era uma qualidade que podiam ter as coisas da natureza (como um belo luar, um belo fruto, uma bela cor), enquanto a arte tinha apenas a incumbência de fazer bem as coisas que fazia, de modo que servissem ao escopo a que eram destinadas – a tal ponto que se considerava arte tanto aquela do pintor e do escultor quanto aquela do construtor de barcos, do marceneiro ou do barbeiro. […]
[…]
Dito isso, nosso livro poderá ser acusado de relativismo, como se quisesse dizer que aquilo que é considerado belo depende da época e da cultura. É exatamente isso que se pretende dizer. […] Este livro parte do princípio de que a Beleza jamais foi algo de absoluto e imutável, mas assumiu faces diversas segundo o período histórico e o país […].
[…]
Por isso, de quando em quando devemos fazer um esforço para ver como diferentes modelos de Beleza coexistem em uma mesma época e como outros se remetem mutuamente através de épocas diversas.
ECO, Umberto. História da beleza . Tradução: Eliana Aguiar. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2022. p. 8-14.
Processo de criação coletiva
Forme um grupo de seis a dez integrantes. Com base no trecho do livro História da beleza, será realizado um processo de pesquisa e criação artística, investigando o conceito de beleza.
Análise e debate
Depois de ler o texto e refletir, discuta com seu grupo sobre os seguintes tópicos.
Não completamente. Os diferentes modelos de beleza são relativos, constituídos com base em cada época e cultura.
• No texto, o autor dá uma definição objetiva da beleza?
• Ainda segundo o texto, a beleza, para os gregos, estava relacionada ao que é bom e verdadeiro. Você concorda com essa afirmação? O belo está relacionado ao bem?
Respostas pessoais. Explore a reflexão filosófica entre a bondade e a beleza, noção contraditória para o que se compreende como o belo do contemporâneo. Aquilo que é belo é bom?
• Existe um princípio único e imutável de beleza ou aquilo que é considerado belo se modifica de acordo com o lugar e o período histórico?
• O que pode ser considerado belo hoje? Por quê?
• Faça um inventário de dez coisas que são belas para você. Depois, verifique quais delas desejaria ter, quais delas admira em outras pessoas, quais são apenas contempláveis, quais são ações, quais são características humanas e quais delas são objetos. Compare seu inventário com o dos colegas.
Não existe um princípio único e imutável de beleza. Aquilo que é considerado Belo é constituído social e culturalmente em cada tempo histórico e em cada cultura. Respostas pessoais. Peça que os estudantes qualifiquem aquilo que julgam belo e tentem explicar quais características uma pessoa, coisa ou ação deve portar para que seja considerada bonita.
Você e os colegas devem anotar um conjunto de tópicos principais desse debate, reflexões centrais que devem servir de base para o processo de criação artística.
Ideia disparadora e linguagens artísticas
Em seguida, sempre em grupo, pense em como fazer uma síntese estética do debate realizado, ou seja, como transmitir as conclusões do grupo aos demais colegas da sala por meio de uma criação artística, como uma música, uma pintura, um poema, uma cena, uma performance, uma instalação.
Retome as ferramentas criativas trabalhadas ao longo deste capítulo, ou rememore procedimentos artísticos trabalhados nos capítulos anteriores, que possam apoiar a criação. Leve em consideração também as habilidades e os desejos artísticos dos integrantes do grupo para compor a ideia central da obra coletiva.
Em um primeiro momento, deixe as ideias fluírem, anotando todo tipo de sugestão dos integrantes do grupo. Depois, você e os colegas devem retomar as ideias e eleger a que parecer mais potente, chegando em uma ideia disparadora.
Dê sugestões possíveis de serem realizadas, que reverberem o trecho do livro
História da beleza . Com os colegas, faça um levantamento de imagens, objetos, músicas, gestos ou textos que evidenciem o debate em torno das diferentes formas de entender a beleza. Com esse material é possível desenvolver o processo artístico de vocês.
Qual manifestação artística será desenvolvida para abordar de maneira instigante o tema da beleza e a definição do que é Belo?
Deixe a imaginação livre. Você e os colegas podem fazer a encenação de um debate sobre beleza em uma situação de preconceito, realizar uma exposição com imagens que vocês considerem “feias” e provocar um debate, criar uma coreografia de dança que evoque o que é belo para o grupo. Anote a ideia disparadora e a linguagem ou as linguagens artísticas escolhidas.
Pesquisa, criação e finalização
Organize as etapas de criação do projeto artístico com base nas reflexões centrais, na ideia disparadora e nas linguagens artísticas escolhidas.
Caso a criação do grupo envolva apresentação ou encenação, lembre-se de ensaiar o maior número de vezes possível, aprimorando o trabalho a cada repetição. Não deixe que o processo de criação fique só na conversa: experimente os elementos em cena.
Caso a invenção do grupo envolva uma exposição ou instalação, faça uma lista de tudo que será necessário para sua realização, dividindo as tarefas entre os integrantes do grupo.
Não existe uma fórmula para esse processo de criação. Cada grupo deve desenvolver suas etapas, estabelecendo critérios conforme a obra ou manifestação artística que está sendo concebida.
Com o trabalho desenvolvido, chegou o momento de compartilhar com o restante da turma! Aproveite para apreciar a criação dos grupos dos seus colegas.
MATEMÁTICA E SUAS TECNOLOGIAS
Proporção áurea
Contexto e referência
Como você estudou no capítulo 3, a noção de beleza na Grécia antiga estava relacionada à proporcionalidade, ao equilíbrio e à harmonia, concepções advindas do campo da geometria. Assim, a definição de belo estava associada à simetria, à justa proporção entre as partes e ao equilíbrio de contrastes. Para aprofundar os conhecimentos nesse campo, você vai, agora, investigar a relação entre Arte e Matemática.
Geometria na Grécia antiga
Os gregos assimilaram as técnicas usadas pelos egípcios para dividir as terras após cada cheia do rio Nilo. Essa prática possibilitou o desenvolvimento de um pensamento abstrato complexo, que permitiu aos gregos geometrizar o espaço e criar relações matemáticas entre as formas planas e as formas espaciais.
A proporção áurea é uma dessas concepções. Ela é atribuída ao escultor e arquiteto Phídias (490 a.C.-430 a.C.) e, por isso, é representada pela letra grega j (Phi), que corresponde a uma constante algébrica irracional.
O número de ouro
O conceito da proporção áurea, também conhecida como razão áurea ou número de ouro, pode ser encontrado de várias formas.
Uma delas é obtida considerando um segmento de reta de medida a + b, dividido nas medidas a e b, de modo que o segmento fique dividido em média e extrema razão. Isso significa que a razão entre a medida do segmento total (a + b) e a medida do segmento maior (a) é a mesma razão entre a medida do segmento maior (a) e a medida do menor (b).
Essa razão é o número de ouro j = 1,61803398875...
a + b a = a b = 1,6180339887... = o
Da mesma forma, é possível definir o retângulo áureo – retângulo cuja razão entre as medidas de seus lados maior e menor é igual ao número de ouro.
O retângulo áureo pode ser desenhado partindo de um quadrado. Acompanhe um modo de fazer isso.
Considerando o quadrado ABCD, fixa-se a ponta seca do compasso no ponto médio do lado AD (representado por M), traçando um arco de circunferência a partir do vértice C até
encontrar o prolongamento do lado AD, determinando o ponto E. O retângulo AEFB será um retângulo áureo, isto é, a razão entre a medida do lado maior e a medida do menor será de aproximadamente 1,618.
Aprofundando o estudo
A espiral áurea
Com base em um retângulo áureo, é possível construir uma espiral conhecida como espiral áurea
Para isso, basta traçar um segmento que defina um quadrado dentro do retângulo e, no retângulo que sobrar, desenhar mais um quadrado, e assim sucessivamente.
Depois de construída a sequência de quadrados, basta traçar arcos de circunferência inscritos em cada um dos quadrados.
O padrão definido pela espiral áurea pode ser observado no modo de crescimento de diversas formas de vida, como algumas conchas de moluscos, incluindo os náutilos. É importante lembrar que, na natureza, essas formas não seguem de maneira exata a espiral áurea, mas sim uma aproximação dela.
Como você estudou, os filósofos gregos costumavam debater o conceito de beleza. Para alguns, a beleza estava no equilíbrio entre os contrastes; para outros, estava na proporção entre as partes. Assim, na Grécia antiga, os artistas buscavam obedecer às proporções, como as que dão origem ao retângulo áureo, em suas obras.
Atividade síntese
Esquema dos náutilos, exibindo uma aproximação à espiral áurea em suas conchas. Esse padrão de crescimento pode ser encontrado também em plantas. Professor, é importante que todas as duplas utilizem as mesmas cores de tinta guache.
Nesta atividade, você fará uma construção, usando retângulos áureos e a espiral áurea. Para isso, forme dupla com um colega e providencie uma folha de cartolina ou de papel craft, medindo 50 cm x 70 cm; lápis; régua; compasso; 1 pincel no 8 e 1 mais fino; e tinta guache na cor branca e em mais 3 cores.
1. Na folha, construa vários retângulos áureos. Procure preenchê-la toda com retângulos áureos do mesmo tamanho ou variando as dimensões, mas mantendo as proporções. É possível, ainda, fazer um único retângulo, do tamanho da folha, que será subdividido em outros menores, mas proporcionais. Antes de fazer o desenho final na cartolina ou no papel craft, faça um estudo de sua composição em uma folha avulsa.
2. Dentro dos retângulos áureos, desenhando os quadrados, trace as espirais áureas. Atente para o sentido do desenho: as espirais podem estar dispostas de forma simétrica, com rebatimento vertical ou horizontal, ou de forma sequencial.
A espiral áurea obtida a partir de um retângulo áureo.
É provável que o painel final tenha relações geométricas proporcionais, já que as formas serão construídas com base no mesmo princípio. O uso das mesmas cores por todas as duplas contribui para a harmonia na composição.
Possibilidades de composição dos retângulos com as espirais áureas.
3. Considere se deseja fazer intervenções livres nas composições, inserindo, por exemplo, circunferências ou demarcando outros quadrados.
4. Lembre-se de que algumas linhas podem ser apagadas com as tintas na etapa da pintura.
5. Escolha as cores para pintar sua composição. Analise as áreas que podem ser pintadas com cores mais fortes para reforçar as espirais ou pense em como usar as cores para reforçar as formas quadradas ou retangulares. Você pode também usar cores mais claras (misturando-as à tinta branca) para fazer os fundos e as cores mais fortes para reforçar as linhas.
6. Lembre-se de que a cor do papel também pode ser usada como elemento de composição do trabalho. Deixando determinada área em branco, você estar á criando diferentes pesos em sua composição.
7. Em um espaço amplo da escola, como o pátio ou a quadra, disponha seu trabalho no chão, junto das composições das demais duplas e, com seus colegas, procure montar uma composição única com todos os trabalhos desenvolvidos. Depois, com a composição coletiva criada, é possível instalar a obra da turma em algum espaço comum da escola, colando-a na parede do corredor ou da entrada, por exemplo.
Caso não seja possível utilizar o pátio ou a quadra da escola para a atividade, ela pode ser realizada no chão da sala de aula. Para isso, oriente os estudantes a afastarem mesas e cadeiras, liberando o maior espaço possível.
8. Com base nas composições criadas, converse com os colegas sobre as questões a seguir.
• E xiste uma noção de equilíbrio nas composições criadas pelas duplas? Em todas ou apenas em algumas?
Pode ser que, na finalização dos trabalhos, os estudantes tenham optado por reforçar círculos, quadrados, retângulos, buscando uma assimetria na composição, vale analisar cada caso.
• Usar o retângulo áureo como elemento gerador das composições proporcionou certa harmonia nas composições de toda turma?
• É possível dizer que as composições de todas as duplas, juntas, seguiram o mesmo ritmo, ou criaram um painel com algo em comum?
Provavelmente, o painel final terá uma composição que propõe algum ritmo, ou seja, algumas formas e relações espaciais irão se repetir, ainda que de maneira variada, ao longo do painel.
• A proporção do retângulo áureo originou ou promoveu algo que pode ser chamado de beleza?
Esse debate é subjetivo. Não é possível dizer que a proporção do retângulo áureo é a responsável pela sensação de equilíbrio e harmonia, se for consenso que ela existe. Talvez o fato de repetir determinadas formas e usar as mesmas cores na composição sejam os fatores que mais contribuem para essa sensação de harmonia. Mas será que isso pode ser chamado de beleza?
Questione e ouça os estudantes, evitando proferir de forma categórica a sua opinião.
1. Resposta: alternativa a O texto diz que os integrantes do grupo conheceram o rap por meio do rádio e passaram a fundir o estilo musical (urbano e contemporâneo) aos temas de sua realidade e vivência (cultura indígena). Não há menção a contraposições temáticas, a rejeições da indústria radiofônica, a distanciamento da realidade social indígena (pelo contrário, ocorre a fusão) ou a estímulo ao estudo da poesia indígena.
ARTE EM QUESTÃO
Depois de diferentes atividades, obras, artistas, teorias e processos, a Unidade 1: Matrizes culturais terminou!
Agora, você irá verificar os conhecimentos construídos ao longo dessa jornada por meio de uma avaliação composta de questões de múltipla escolha. Assim, além de avaliar os conhecimentos em Arte desenvolvidos ao longo da unidade, você pode se preparar para a importante etapa dos vestibulares.
Siga as orientações do professor e boa avaliação!
Capítulo 1: Culturas indígenas
1. (Enem/MEC)
O mais antigo grupo de rap indígena do país, Brô MCs, surgiu em 2009, na aldeia Jaguapiru, em Dourados, Mato Grosso do Sul. Os integrantes conheceram o rap pelo rádio, ouvindo um programa que apresentava cantores e grupos brasileiros desse gênero musical. O Brô MCs conseguiu influenciar outros a fazerem rap e a lutarem pelas causas indígenas. Um dos nomes do movimento, Kunumí MC, é um jovem de 16 anos, da aldeia Krukutu, em São Paulo. O adolescente enxerga o rap como uma cultura da defesa e começou a fazer rimas quando percebeu que a poesia, pela qual sempre se interessou, podia virar música. Nas letras que cria, inspiradas tanto pelo rap quanto pelos ritmos indígenas, tenta incluir sempre assuntos aos quais acha importante dar voz, principalmente, a questão da demarcação de terras.
Disponível em: w w w.correiobraziliense.com.br. Acesso em: 13 nov. 2021 (adaptado).
O movimento rap dos povos originários do Brasil revela o(a)
a) f usão de manifestações artísticas urbanas contemporâneas com a cultura indígena.
b) contraposição das temáticas socioambientais indígenas às questões urbanas.
c) rejeição da indústria radiofônica às músicas indígenas.
d) distanciamento da realidade social indígena.
e) estímulo ao estudo da poesia indígena.
2. (UFSM-RS)
A diversidade é uma característica na cultura brasileira devido à pluralidade de povos e etnias que compõem todo o território nacional, desde a era pré-colonial. A partir da colonização portuguesa, juntaram-se às diversas etnias indígenas os europeus e os africanos, como culturas que estão na base da formação de uma cultura nacional.
Sobre a produção indígena contemporânea brasileira, considere as afirmativas a seguir.
I. A arte contemporânea indígena está, especificamente, baseada em práticas como pinturas corporais, cestaria e cerâmica, por seguir rigorosamente as tradições que se perpetuam no decorrer das gerações em relação aos símbolos e às imagens utilizadas nos rituais e tradições cultuadas pelos ancestrais.
II. A produção artística indígena tem a circulação restrita a espaços públicos, como praças, ruas e feiras, ou a espaços dedicados a esse tipo de arte, tais como os Museus do Índio, como os localizados nas cidades de Manaus e Rio de Janeiro.
III. A valorização da cultura indígena é um dos destaques em obras de arte contemporânea, produzidas a partir de diferentes suportes, como pinturas, performances e meios digitais.
Está(ão) correta(s)
a) apenas I.
b) apenas II.
2. Resposta: alternativa c.
c) apenas III. d) apenas I e II. e) apenas II e III.
A afirmação I está incorreta porque artistas indígenas atuam nas mais diversas linguagens artísticas, usando diversos recursos também. A afirmação II está incorreta porque não há restrição à circulação da produção artística indígena. Ela ocupa tanto museus e galerias quanto ruas e outros espaços públicos. A afirmação III está correta porque descreve um traço da produção contemporânea, sem restringir os lugares que podem habitar e as linguagens que podem produzir.
Não escreva no livro.
Capítulo 2: Culturas africanas
3. (Enem/MEC)
TEXTO I
3. Resposta: alternativa b
O item b está de acordo com a imagem e com o parágrafo porque explicita o processo criativo do artista que, com materiais descartados e que poluem o ambiente, cria objetos artísticos.
TEXTO II
HAZOUMÉ, R. Nanawax. Plástico e tecido. Galerie Gagosian, 2009.
Disponível em: w w w.actuart.org. Acesso em: 19 jun. 2019.
As máscaras não foram feitas para serem usadas; elas se concentram apenas nas possibilidades antropomórficas dos recipientes plásticos descartados e, ao mesmo tempo, chamam a atenção para a quantidade de lixo que se acumula em quase todas as cidades ou aldeias africanas.
FARTHING, S. Tudo sobre arte. Rio de Janeiro: Sextante, 2011 (adaptado). Romuald Hazoumé costuma dizer que sua obra apenas manda de volta ao oeste o refugo de uma sociedade de consumo cada vez mais invasiva. A obra desse artista africano que vive no Benin denota o(a)
a) empobrecimento do valor artístico pela combinação de diferentes matérias-primas.
b) reposicionamento estético de objetos por meio de mudança de função.
c) convite aos espectadores para interagir e completar obras inacabadas.
d) militância com temas da ecologia que marcam o continente africano.
e) realidade precária de suas condições de produção artística.
Capítulo 3: Culturas europeias
4. (Enem/MEC)
4. Resposta: alternativa a
A expressão de dor e lamento pelas pessoas falecidas foi integrada à vivência das comunidades negras do Amapá. Ou seja, o que inicialmente motivou os cantos foi ressignificado como marco cultural dessas comunidades, o que torna o item a correto.
O Marabaixo é uma expressão artístico-cultural formada nas tradições e na identificação cultural entre as comunidades negras do Amapá. O nome remonta às mortes de escravizados em navios negreiros que eram jogados na água. Em sua homenagem, hinos de lamento eram cantados mar abaixo, mar acima. Posteriormente, o Marabaixo se integrou à vivência das comunidades negras em um ciclo de danças, cantorias com tambores e festas religiosas, recebendo, em 2018, o título de Patrimônio Cultural do Brasil.
Disponível em: h t t p://portal.iphan.gov.br. Acesso em: 15 nov. 2021 (adaptado).
A manifestação do Marabaixo se constituiu em expressão de arte e cultura, exercendo função de
a) ressignificar episódios dramáticos em novas práticas culturais.
b) adaptar coreografias como imitação dos movimentos do mar.
c) lembrar dos mortos no passado escravista como forma de lamento.
d) perpetuar uma narrativa de apagamento dos fatos históricos traumáticos.
e) ritualizar a passagem de atos fúnebres nas produções coletivas com espírito festivo.
2
CAMINHOS DA ARTE NO BRASIL
Nesta unidade, serão abordados a arte brasileira e alguns dos fatores que formaram a diversidade que hoje se manifesta no país em todos os campos artísticos.
Há três aspectos relevantes relacionados a esses temas que são o ponto de partida para as reflexões: a colonização portuguesa e seus efeitos duradouros na sociedade brasileira; a forma como a arte moderna internacional foi apropriada pela elite cultural do Brasil no início do século XX; e a efervescência criativa das décadas de 1950 e 1960, que extravasou para outras partes do mundo por intermédio da Tropicália.
É preciso ressaltar, porém, que esse não é um estudo da história da arte no Brasil, mas uma apresentação de obras que, em suas singularidades, marcaram as produções artísticas no país em épocas distintas.
Ao analisar essas produções, pode-se deparar com os valores da cultura medieval europeia, como a monarquia e o cristianismo, com a religiosidade africana, com as cosmovisões dos povos originários e com a formação de uma estética popular, expressa em objetos, imagens, narrativas e músicas que se tornaram símbolos de brasilidade.
[…] O problema é que somos educados não apenas para ignorar, mas para desprezar as culturas de síncope, aquelas que subvertem ritmos, rompem constâncias, acham soluções imprevisíveis e criam maneiras imaginativas de se preencher o vazio do som e da vida com corpos e cantos.
[…]
A cultura é o território da beleza, da sofisticação e do encontro entre gentes. […]
SIMAS, Luiz Antonio. O corpo encantado das ruas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019. p. 22, 27.
síncope: na música, estrutura rítmica que ocorre fora da pulsação regular.
Calçadão da praia de Copacabana, realizado pelo artista Burle Marx (1909-1994). Rio de Janeiro (RJ), 2023.
4
Arte e colonização
RUGENDAS, Johann Moritz. Dança lundu. [182-]. Gravura, 22 cm x 27,8 cm. A gravura foi publicada na obra Viagem pitoresca através do Brasil (1834 a 1839), que faz parte do acervo da Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro (RJ).
FERREZ, Marc. Quitandeiras. [187-]. Fotografia. Coleção Gilberto Ferrez, Acervo do Instituto Moreira Salles. Nessa fotografia, Marc Ferrez (1843-1923) registrou, no Rio de Janeiro (RJ), mulheres negras que trabalhavam como “escravas de ganho”, as quais vendiam víveres nas ruas e eram obrigadas a entregar a seus senhores ao menos uma parte do valor arrecadado.
Festas profanas e religiosas retratadas por artistas estrangeiros.
As primeiras fotografias do Brasil: Marc Ferrez registra cenas do último país a acabar com a escravização nas Américas.
Ruínas da Redução Jesuítica de São Miguel Arcanjo, séculos XVII e XVIII, em São Miguel das Missões (RS). Fotografia de 2023.
Construções jesuíticas, testemunhos da ação catequética impositiva ao povo guarani, no sul da colônia portuguesa.
Uma festa ou um ritual de caráter popular, a fotografia de mulheres negras escravizadas, as ruínas de uma construção antiga e uma santa esculpida em madeira. Escultura em madeira, gravura, arquitetura e fotografia. Além disso, a obra Dança lundu representa elementos de música e de dança.
A santa de madeira foi feita pelo escultor brasileiro Mestre Piranga, provavelmente no século XVIII. A gravura é do artista alemão Johann Moritz Rugendas e foi realizada entre os anos 1822 e 1825. A Redução Jesuítica de São Miguel Arcanjo foi construída a partir de 1687. A fotografia das mulheres negras escravizadas foi registrada por Marc Ferrez por volta de 1875.
Não escreva no livro. Considerando as imagens destas páginas de abertura e os textos que as acompanham, responda às questões a seguir.
1 O que as imagens representam ou retratam?
2 Que linguagens artísticas estão contempladas nesse conjunto de obras?
O caráter singular da arte católica em Minas Gerais.
3 Quem produziu cada trabalho e em que época?
4 O que essas obras podem revelar acerca da arte produzida no Brasil sob o domínio português?
MESTRE PIRANGA. Nossa Senhora do Carmo. Século XVIII. Madeira policromada. 91,5 cm x 45 cm x 34 cm.
4. É possível observar elementos marcantes do Brasil colonial, tais como a religiosidade cristã; a presença de pessoas negras em situações de subalternidade em razão da escravização, enquanto pessoas brancas festejam; a ação dos jesuítas e a exploração de mulheres negras escravizadas, que eram obrigadas a prestar serviços como escravas de ganho. Tudo isso revela aspectos do passado brasileiro sob o domínio português que estão na fundação da sociedade brasileira.
GERSON GERLOFF/PULSAR IMAGENS
C omo a cultura dos países europeus se estabeleceu
no Brasil?
Como parte da ação colonizadora, os portugueses procuraram impor sua cultura aos povos originários e aos escravizados trazidos forçadamente da África. Assim, os padres jesuítas, norteados pelo contexto da Contrarreforma na Europa, atuavam para reconquistar fiéis e catequizar povos não cristãos, dedicando-se a converter os indígenas ao cristianismo nas Américas, impondo a religião católica cristã. Na sociedade colonial brasileira, as igrejas católicas eram centros de culto religioso e de convívio social. Numerosos conventos e igrejas foram construídos de acordo com os valores estéticos do Barroco –que emergiu na Europa na primeira metade do século XVII. No início do século XIX, diante da ameaça de invasão de Portugal pelas tropas de Napoleão Bonaparte, a família real portuguesa decidiu transferir-se para o Brasil. Ao estabelecer-se no Rio de Janeiro, o governo real providenciou reformas urbanas e culturais, como a formação de orquestras e corais, além da criação de um teatro, de uma biblioteca e de um museu. O projeto, nomeado como Missão Artística Francesa, culminou na contratação de artistas franceses para fundar uma Academia de Belas Artes, a fim de formar os futuros artistas brasileiros de acordo com a estética neoclássica, padrão que buscava resgatar noções de proporção, equilíbrio e harmonia desenvolvidas pelos gregos e romanos na Antiguidade, então dominante na Europa.
Contrarreforma: refere-se ao conjunto de medidas adotadas pela Igreja Católica para combater a expansão da Reforma Protestante. portulano: carta marítima utilizada pelos navegadores europeus que fornecia descrições das costas e dos portos.
Integrante da Missão Francesa, o artista Jean-Baptiste Debret (1768-1848) permaneceu no Brasil por 15 anos como pintor da corte e produziu uma vasta obra registrando cenas da sociedade brasileira. Retratou, na pintura da próxima página a chegada ao Rio de Janeiro da princesa austríaca Leopoldina, que veio se casar com D. Pedro I. Acompanhava-a sua corte, que incluía uma comitiva de cientistas e artistas, a qual ficou conhecida como Missão Austríaca.
Mesmo depois da independência do Brasil, o território permaneceu como um império governado por membros da família real portuguesa até a Proclamação da República, em 1889. Descendente das tradicionais monarquias portuguesa e austríaca, D. Pedro II interessava-se por Arte, Filosofia e Ciências. Em seu longo reinado, de 1840 a 1889, buscou associar o império brasileiro à ideia de prosperidade, com o intuito de construir a imagem de um país nos moldes do colonizador europeu e esconder o fato de o Brasil ser a única nação no continente americano onde ainda havia a brutalidade da escravização.
O êxito das grandes expedições oceânicas dos séculos XV e XVI dependia dos portulanos . A imagem intitulada Terra Brasilis representa o território recém-explorado da América portuguesa, com dezenas de pontos nomeados em sua costa. No mar, figuram naus portuguesas, e, no continente, papagaios, indígenas e árvores de pau-brasil, que logo se tornaram objeto de interesse econômico da metrópole.
DEBRET, Jean-Baptiste. Desembarque da imperatriz dona Leopoldina. 1818. Óleo sobre tela, 44,5 cm x 69,5 cm. Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro (RJ).
HOMEM, Lopo; REINEL, Pedro. Terra Brasilis. 1519. Biblioteca Nacional da França, Paris (França).
AT¡v¡DaDe De SeNS¡B¡l¡ZAÇÃO Cartografia afetiva
Respostas pessoais. Compare as escalas dos mapas de cada grupo, explorando o critério que levou à escolha do recorte espacial representado. Por se tratar de um mapa artístico, as formas e os desenhos para representar cada lugar são ótimos elementos para comparação e análise.
Depois de investigar um pouco da arte e da cultura do Brasil Colônia, inspirada pelo portulano Terra Brasilis , a turma deve realizar um mapa afetivo do território.
1. Você e os colegas devem se organizar em duplas ou trios para realizar a atividade.
Não escreva no livro.
2. Em uma folha avulsa, fazendo uso dos materiais que preferirem, vocês vão desenhar um mapa artístico do território, ou seja, uma representação cartográfica poética do bairro, da região ou da cidade onde moram.
Caso sua escola conte com esse material, forneça cartolina ou papel craft, cortados em tamanho grande, para as duplas ou os trios confeccionarem seus mapas.
3. Demarquem no mapa os “tesouros” desse território, aquilo que tem valor simbólico e afetivo: um parque, uma reserva florestal, um centro cultural, o local onde acontece uma roda de capoeira, uma pista de skate, entre outros.
4. Criem ilustrações para demarcar os elementos e tesouros do território.
5. Montem uma exposição dos mapas artísticos da turma, espalhando as produções pelas mesas. Então, circulem pela sala de aula para apreciar as obras dos colegas.
6. Encerrada a atividade, realizem uma conversa coletiva.
• O que havia em comum nos mapas criados? O que havia de diferente?
• Quais técnicas você e os colegas utilizaram para a produção dos mapas?
• D e acordo com sua apreciação, como você caracterizaria a criação de cada grupo, bem como a escolha dos “tesouros” nos mapas? O que foi considerado valioso e por quê?
Respostas pessoais. Problematize a noção de valor, distinguindo daquilo que possui valor econômico e explorando outras relações de valorização afetiva do território.
Solicite que os grupos descrevam seus processos de produção. Explore os diferentes materiais utilizados.
ARTES ViSUAiS
CONTEXTO
Arte no período colonial
O Barroco manifestou-se no Brasil de maneira singular e marcante, absorvendo características das culturas locais, e persistiu na produção artística por um longo período, em contínua renovação no país.
PORTO-ALEGRE, Manuel de Araújo. Selva brasileira 1853. Aquarela sobre papel. Acervo do Museu de História Julio de Castilhos, Porto Alegre (RS).
O Barroco alcançou seu apogeu com a exploração de ouro nas cidades mineiras, na primeira metade do século XVIII. Uma das contribuições mais originais da cultura luso-brasileira para a arte barroca foi a escultura. As linhas sóbrias nas paredes das igrejas coloniais ressaltam os relevos ornamentados em madeira, que muitas vezes eram folhados a ouro ou pintados de cores vivas e chamados de talha. Nessas igrejas, também foram reunidas imagens esculpidas em madeira ou moldadas em barro cozido para representar cenas com o intuito de propagar valores católicos cristãos.
No século XIX, muitos artistas europeus vieram ao Brasil, atraídos pela paisagem exuberante, pela luz tropical, pela ideia de exotismo ou acompanhando expedições científicas. Contratados pela corte portuguesa, a Missão Francesa, por exemplo, incluía nomes como Jean-Baptiste Debret, mencionado anteriormente, e Nicolas-Antoine Taunay (1755-1830).
Com as crises políticas do processo de independência, a Academia de Belas Artes, um dos objetivos da missão, só foi inaugurada dez anos mais tarde, dando início ao ensino artístico formal no país. Concebido com base em padrões neoclássicos, o ensino acadêmico propunha para esse movimento artístico e cultural que a arte trabalhasse a representação do conceito idealizado de beleza, buscando a valorização de temas heroicos, como a pintura histórica. Mas a paisagem e a natureza-morta, embora consideradas gêneros secundários pelo sistema acadêmico, foram predominantes entre os pintores brasileiros e estrangeiros no Brasil do século XIX.
A invenção da fotografia também impactou o século XIX, inclusive a sociedade brasileira. A notícia da invenção de uma máquina capaz de fixar a imagem, o daguerreótipo, foi publicada em um jornal em 1839, no Rio de Janeiro.
AKG-IMAGES/ALBUM/FOTOARENA
daguerreótipo: o inventor do equipamento foi Louis Jacques Daguerre (1787-1851), pintor parisiense que usou uma câmera improvisada, equipada com lentes, com a qual realizou experiências usando chapas de cobre banhadas em sais de prata, já conhecidos por suas características fotossensíveis. Por volta de 1837, conseguiu fixar uma imagem gravada pela luz. As imagens assim obtidas eram únicas e ficaram conhecidas como daguerreótipos.
Daguerreótipo fabricado em 1839 pelo oftalmologista Alph Giroux (1776-1848), Paris (França). Atualmente, o objeto faz parte do acervo do Deutsches Museum, em Munique (Alemanha).
ACERVO DO MUSEU JÚLIO DE CASTILHOS, PORTO ALEGRE, RS
REPERTORiO 1
A escultura no Barroco brasileiro
O artista que mais se destacou no Barroco brasileiro foi o mineiro Antônio Francisco Lisboa (1730-1814), conhecido como Aleijadinho. Filho de um mestre de obras português e de uma africana, esse artista autodidata talvez nunca tenha viajado para além das cidades mineiras. Pouco se sabe de sua vida, mas há registros de que tenha desenvolvido uma doença degenerativa que lhe causava dores e danos à coordenação motora e à mobilidade. Aleijadinho não se limitou a repetir os modelos europeus. Em suas obras, observam-se formas expressivas cheias de espontaneidade e autenticidade.
O Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, na cidade de Congonhas (MG), é considerado a principal obra de Aleijadinho. O conjunto é formado pela igreja; pelo adro, terreno em frente à igreja, onde estão instaladas 12 esculturas de profetas do Antigo Testamento esculpidas em pedra-sabão; pela escadaria e pelas seis capelas, que contêm os conjuntos de esculturas em madeira, somando, ao todo, 66 figuras nos Passos da Paixão de Cristo.
No conjunto de esculturas reproduzido a seguir, Aleijadinho encenou a Subida de Cristo em direção ao Calvário como um cortejo. À frente do grupo, há a figura de um arauto tocando trombeta, personagem sempre presente nas procissões que aconteciam nas ruas das cidades mineiras à época.
1. O pedestal em que a figura de Jesus está instalada consiste em uma rampa, sugerindo que o personagem se esforça para vencê-la carregando uma cruz. Seu corpo está curvado, sugerindo
Observe a imagem desta página e responda às perguntas a seguir.
ALEIJADINHO. Subida para o Calvário ou Cruz às Costas. 1796-1799. Conjunto de esculturas em madeira, Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, Congonhas (MG). Fotografia de 2015.
Não escreva no livro. Passos da Paixão de Cristo: conjunto de sete (ou múltiplo de sete) cenas que representam os últimos episódios da vida de Cristo: Última Ceia, Horto das Oliveiras, Prisão de Cristo, Flagelação, Coroação de Espinhos, Subida para o Calvário e Crucificação. arauto: mensageiro.
1 O que você observa na criação do escultor da Subida de Cristo para o Calvário? Atente-se à disposição das imagens, à posição corporal e à base em que as figuras estão apoiadas.
2 Em sua opinião, de que maneira o artista trabalhou as peças de madeira a fim de realizar essa encenação?
2. Resposta pessoal. Esclareça que o processo da escultura em madeira é bem diferente do processo da cera perdida, estudado no capítulo 2. Aqui, o artista esculpiu as peças de madeira retirando aos poucos as lascas, de modo a “encontrar” a figura imaginada em todos os seus detalhes – tais como as dobras das roupas que definem os movimentos. Depois, lixou cuidadosamente as peças a fim de obter formas arredondadas, ressaltando detalhes como as rugas na pele. Por fim, as peças foram pintadas para diferenciar as roupas, a pele e os objetos. o peso da cruz. As outras figuras foram representadas em marcha, isto é, com movimento das pernas. O arauto puxa a criança que parece atraída pela imagem de Jesus.
REPERTORiO 2
Os primeiros fotógrafos brasileiros
Em 1840, o daguerreótipo foi demonstrado ao jovem dom Pedro II. O monarca, então, percebeu a importância desse objeto e passou a contratar fotógrafos estrangeiros e brasileiros para documentar a vida da família real, obras públicas e paisagens.
Marc Ferrez, filho e sobrinho de integrantes da Missão Artística Francesa, nasceu no Rio de Janeiro e estudou na França. Interessado em ciência e inovações tecnológicas, tornou-se um dos primeiros fotógrafos brasileiros.
Trabalhando em projetos encomendados pelo governo imperial brasileiro, Ferrez viajou pelo país, registrou a construção de ferrovias e represas, as plantações de café e a população de diversos locais. Suas fotografias são consideradas o conjunto mais significativo de imagens e documentos visuais do país no final do século XIX.
Embora sua especialidade tenha sido a paisagem, o fotógrafo realizou também retratos do imperador e da família real, de tipos populares, vendedores ambulantes da cidade, trabalhadores rurais nas fazendas de café e indígenas em Mato Grosso e na Bahia. Dessa forma, documentou a diversidade étnica e cultural da população do país.
FERREZ, Marc. Amolador. 1899. Impressão em gelatina de prata, 24 cm x 18 cm. Coleção Gilberto Ferrez, Acervo do Instituto Moreira Salles.
1. O personagem é um homem jovem, forte, altivo, que parece orgulhoso de seu trabalho e que pode ser um imigrante português. Outros aspectos podem ser levantados, como a indumentária e o uso do cachimbo. É possível que os estudantes identifiquem o uso do cachimbo como um hábito do passado. Verifique se eles associam a redução ou o quase desaparecimento desse hábito aos conhecimentos atuais acerca dos graves prejuízos que causa à saúde.
Observe a fotografia do amolador e responda às perguntas a seguir.
1 O que se pode dizer sobre o personagem retratado?
2 Do ponto de vista da composição, como é a fotografia?
A fotografia é muito bem composta. Não se trata de um instantâneo, tudo nela foi posado e preparado. A tesoura ocupa o centro da composição.
Não escreva no livro.
REPERTORiO 3
Revendo a colonização em nossos dias
ANDRADE, Jonathas de. 40 nego bom é um real. 2013. Instalação composta de 16 serigrafias sobre madeira, 7 gravações em acrílico, 40 impressões riso prints sobre papel, 40 impressões laser sobre papel. Dimensões variáveis.
No projeto 40 nego bom é um real, o artista alagoano Jonathas de Andrade (1982-), inspirado nos gritos dos vendedores de doces nos mercados de rua no Nordeste brasileiro, inventa uma fábrica fictícia onde corpos negros trabalham em harmonia.
Na serigrafia à esquerda, o artista apresenta uma fábrica de doce de banana, inspirado nas gravuras feitas por artistas estrangeiros no século XIX, que mostravam o trabalho de africanos escravizados nos engenhos de cana-de-açúcar. A pintura central na imagem à direita é inspirada na ilustração de Cícero Dias (1907-2003) para a capa do livro Casa-grande & senzala (1933), do sociólogo pernambucano Gilberto Freyre (1900-1987). Ao redor dela, há textos que expõem acertos de contas com os trabalhadores, evidenciando que favores e relações pessoais se tornam moeda de troca para o trabalho duro.
Nos países que foram colônias de potências europeias, artistas produziram representações simbólicas, que tinham como finalidade reforçar o poder da metrópole, justificando práticas de dominação e submissão, como a escravização, e naturalizando a inferioridade e a superioridade racial ou cultural. Os estudos pós-coloniais atuais, entretanto, questionam a ideia de que a metrópole trouxe à colônia o progresso e os valores da sociedade europeia. Ao observar criticamente o modo colonial de ocupar a terra, percebe-se a exploração e a degradação do meio ambiente, o racismo estrutural, o caráter brutal da dominação e a enorme desigualdade que se estabeleceu nessas sociedades.
1. Várias razões podem ter levado o artista a escolher esse tema em seu trabalho: a relação da produção do doce de banana com o processamento da cana-de-açúcar nos engenhos durante a colonização do
Observe as imagens da obra de Jonathas de Andrade e reflita, respondendo às questões a seguir.
Nordeste brasileiro; o fato de a banana ser uma fruta símbolo do ambiente tropical; o nome do doce, “nego bom”, que pode fazer alusão, de forma irônica, à relação de camaradagem que esconde o racismo nas relações de trabalho no Brasil.
1 P or que Jonathas de Andrade usou uma fábrica de doce de banana para falar da colonização do Brasil?
2 Em sua opinião, por que é importante olhar de modo crítico para a colonização do Brasil?
Resposta pessoal. Espera-se que os estudantes percebam que refletir sobre a colonização do Brasil é uma maneira de compreender as opressões e violências, por vezes invisibilizadas no processo de formação cultural, e sua influência na produção artística contemporânea.
Não escreva no livro.
CENTRO
CENTRO GEORGES POMPIDOU, PARIS, FRANÇA
PESQUiSA
Fotografia e retrato
A invenção da fotografia teve grande impacto na ciência e na arte nos últimos 150 anos. A possibilidade de fixar imagens e a popularização desse processo transformaram nossa relação com o conhecimento e com a memória. Hoje, com câmeras inseridas em celulares, a fotografia faz parte do cotidiano, e, ao trocar imagens nas redes sociais, há um refinamento do olhar. Conheça um pouco mais o trabalho dos fotógrafos e as formas de fazer retratos no passado e no presente.
1. Onde encontrar as fotografias de Marc Ferrez e de outros fotógrafos brasileiros dos séculos XIX e XX?
• E m 1998, grande parte da obra de Marc Ferrez foi adquirida pelo Instituto Moreira Salles (IMS), que se ocupa em preservar e divulgar esse acervo. Para conhecer as fotografias de Ferrez, visite o site do IMS. Disponível em: https://ims. com.br/titular-colecao/marc-ferrez/ (acesso em: 6 out. 2024).
• Além da obra de Ferrez, o Instituto Moreira Salles preserva os trabalhos dos maiores fotógrafos que atuaram no Brasil nos séculos XIX e XX. Visite a página do acervo de fotografias do IMS e escolha um entre os vários fotógrafos apresentados.
Observe as fotografias do autor escolhido e identifique a época em que foram feitas, os temas abordados e as características da composição e do enquadramento. Disponível em: www.ims. com.br/ims/explore/acervo/fotografia (acesso em: 6 out. 2024).
2. O que a fotografia pode nos dizer sobre os africanos e afrodescendentes no Brasil do século XIX?
• No vídeo Entre cantos e chibatas, de 2011, a antropóloga e historiadora Lilia Moritz Schwarcz (1957-) comenta a presença do negro na fotografia no século XIX. O vídeo está dividido em quatro partes. Assista às duas primeiras partes e procure observar quais são os contrastes mais marcantes entre as fotografias dos homens e as das mulheres negras. Disponível em: https://blogdoims. com.br/entre-cantos-e-chibatas-conversa-comlilia-schwarcz/ (acesso em: 6 out. 2024).
ROSENTHAL, Hildegard. Meninas orientais tomando sorvete. 1940. Fotografia. Acervo do Instituto Moreira Salles.
HENSCHEL, Alberto. Mulher negra não identificada com bebê. [ca. 1869] Convênio Instituto Moreira Salles e Instituto Leibniz de Geografia Regional. Salvador (BA).
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Os desafios do retrato na fotografia
Durante séculos, uma das principais funções dos pintores no mundo ocidental foi representar chefes de governo ou pessoas abastadas em momentos solenes e históricos, com o objetivo de reafirmar o poder social e político dessas pessoas. Alguns artistas, como o espanhol Diego Velázquez (1599-1660), pintor oficial da família real espanhola, buscavam reproduzir com realismo os detalhes que observavam. Outros, como o holandês Rembrandt van Rijn (1606-1669), ficaram conhecidos não só por captar a aparência de seus retratados mas também por criar uma atmosfera única em suas pinturas. Com a fotografia, o mesmo desafio pode ser colocado.
A técnica da fotografia foi inventada com base em um aparelho chamado câmera escura, que é uma caixa revestida ou pintada de preto por dentro, contendo um pequeno orifício em uma de suas paredes. A luz refletida por um objeto entra por esse orifício e projeta, na parede oposta, uma imagem invertida. Para tirar boas fotografias, é preciso saber manipular a câmera, conhecer o funcionamento das lentes, prestar atenção na luz e ter sensibilidade e ousadia para fazer experiências.
Com as câmeras digitais, a informação visual é gerada em bits e gravada diretamente na memória dos aparelhos. Embora o funcionamento dessas câmeras seja basicamente igual ao da antiga câmera escura, os resultados podem ser automaticamente corrigidos e aproximados a um padrão de qualidade estabelecido, os chamados filtros, o que homogeneíza os retratos que circulam tão intensamente nas redes sociais. Que elementos ou alegorias podem estar presentes nos retratos para criar sentidos, forjando uma imagem complexa do retratado e fazendo da fotografia uma obra de arte com a potência de revelar o que o retratado pensa, faz e deseja?
Na fotografia produzida pelo fotógrafo carioca Walter Firmo (1937-), é possível observar como ele organizou os elementos no retrato de maneira a captar a sensibilidade do momento.
REMBRANDT. Autorretrato. 1628. Óleo sobre madeira, 22,6 cm x 18,7 cm. Acervo do Rijksmuseum, Amsterdã (Holanda).
FIRMO, Walter. Chapada Diamantina, Bahia. 1967. Fotografia. Acervo do Instituto Moreira Salles.
alegoria: símbolo que tem seu próprio significado, mas pode ser usado com outros sentidos.
AçÃO Retrato em fotografia e pintura
Como você observou, alguns fotógrafos produzem retratos interessantes e cheios de significado. Agora é sua vez de experimentar duas técnicas para fazer retratos.
1. Proposição
• Em duplas, você e um colega serão o fotógrafo e o modelo um do outro. A cada etapa, invertam os papéis, de modo que possam experimentar as duas funções e obtenham um retrato de cada um.
• Discuta com seu par como gostariam de ser fotografados. Na sua vez, pense em um conceito, um elemento significativo, um símbolo com o qual você se relacione de algum modo e que você queira que faça parte do seu retrato.
2. E scolha do local
• Procure um lugar na escola que tenha uma parede ou um piso com textura adequada para o fundo da fotografia.
• Se tiver a oportunidade de usar um aplicativo de tratamento de imagem, o fundo da fotografia poderá ser substituído por uma paisagem, aplicada atrás do modelo.
• Escolha um lugar bem iluminado para garantir melhor qualidade de imagem sem o uso de flash. Se optar por um ambiente interno, verifique se os equipamentos disponíveis têm flash.
3. P reparativos para a produção
• Organize uma lista do que será necessário para produzir essa imagem.
• De senhe um esboço do que será fotografado, a fim de explorar possíveis enquadramentos.
• Pense em elementos como roupas, objetos que podem estar pendurados, que podem ser segurados pelo modelo ou que podem estar posicionados em algum ponto do cenário. Escolha os elementos da imagem de acordo com os sentidos que deseja expressar e acrescentar à imagem da pessoa retratada.
• Quando você for o fotógrafo, experimente dirigir o colega que está posando, instruindo-o a fazer posições, gestos e expressões que também atuem na construção de sentido da imagem.
4. Fotografia
• Usando algum dispositivo fotográfico – câmera ou celular –, registre imagens de seu modelo com, pelo menos, cinco variações sutis de ângulo e luminosidade.
• No caso de encenações, peça ao modelo que pose com distintas expressões e posições.
5. Tratamento das imagens
• No computador ou dispositivo que utilizar para conferir a imagem, verifique a qualidade técnica e conceitual do trabalho e avalie a necessidade de repetir a produção.
• Se tiver a oportunidade de usar um aplicativo de tratamento de imagem, verifique se a luminosidade pode ser melhorada. Caso tenha imaginado um cenário especial, selecione e apague o fundo da fotografia para aplicar uma paisagem.
• Verifique o que pode ser feito digitalmente para acrescentar sentidos aos retratos que você e seu colega fotografaram. É possível aplicar uma cor sobre a imagem, colocar uma moldura ou um recorte? Isso vai trazer as qualidades estéticas desejadas para o trabalho?
• Por fim, reflita com seu colega sobre a possibilidade de associar outro retrato já existente para criar um contraponto aos retratos produzidos.
6. Avaliação coletiva
• Apresente os dois retratos que fizeram aos demais colegas. Se possível, organize, com a turma e o professor, uma projeção do conjunto de fotografias, para que possam conversar sobre o resultado do trabalho de maneira coletiva.
• Individualmente, procure apontar nas fotografias como cada estudante elaborou, na composição, sentidos que expressem algo a mais sobre os colegas. Identifique também os elementos que foram usados pelos estudantes em seus retratos para colaborar na complexidade da representação de seus modelos.
A fotógrafa soteropolitana Alile Dara Onawale em retrato. Na fotografia, é possível observar que a fotógrafa pensou cuidadosamente aspectos como enquadramento, luz, contraste, entre outros elementos que compõem a fotografia.
MUSiCA E DANÇA
CONTEXTO
Outros ritmos, outros
salões
Desde os primeiros tempos da colonização até meados do século XIX, a música tocada pelos africanos e afrodescendentes nas festas que promoviam em senzalas era conhecida de maneira genérica, e muitas vezes pejorativa, como “batuque”. No entanto, sob essa designação, havia uma diversidade de ritmos musicais que se estabeleceram como base de gêneros e danças que conhecemos hoje. O lundu, por exemplo, ganhou popularidade e se afirmou como expressão musical brasileira a partir da chegada do mercado editorial de partituras, na década de 1830.
A dança do lundu tem como forte característica a presença da umbigada, um movimento de encontro dos corpos por meio do umbigo e que estabelece as dinâmicas de troca entre o casal no centro da roda. A umbigada também está presente em outras expressões afro-brasileiras como o jongo e o batuque de umbigada, que foram passadas de geração em geração e seguem vivas até os dias de hoje.
CARYBÉ. Casal, Umbigada: Série Bonfim. 1950. Desenho a bico de pena, 27 cm x 21 cm. Museu de Arte da Bahia, Salvador (BA).
Ao mesmo tempo, os ritmos apreciados nos salões da elite e da classe média – polcas, valsas, mazurcas – eram dançados ao som de pequenas orquestras, cujos modelos e comportamentos eram importados da Europa. A música negra e mestiça não tinha espaço nos salões: podia apenas ser ouvida nas ruas, principalmente em festejos religiosos, onde se manifestava por meio de percussão, palmas, coros e acompanhamento de viola. Existia uma forte relação entre o tipo de música e de dança e seus espaços de circulação.
No entanto, existiam espaços informais onde a música de matriz europeia e aquela praticada pelos africanos e seus descendentes conviviam. As casas das tias baianas na região conhecida como Pequena África, no Rio de Janeiro, era um espaço de encontro para essas diferentes realidades musicais. Dessa convivência, nasceu o chorinho, um jeito abrasileirado de tocar as músicas europeias, mas que logo se estabeleceu como estilo.
MUSEU DE ARTE DA BAHIA, SALVADOR, BA
REPERTORiO 1
“Isto é bom”: o Brasil dos lundus e das modinhas
O processo que levou o lundu, inicialmente vinculado ao batuque, a conquistar os salões de dança da população branca e elitizada do país não se deu sem conflitos culturais. A figura do padre, poeta e músico Domingos Caldas Barbosa (1740-1800) foi importante nesse processo, pois ele foi responsável por levar a Lisboa os lundus e as modinhas brasileiras. A modinha era um tipo de canção já estabelecido em terras portuguesas. Com a ajuda de Caldas Barbosa, sua produção no Brasil sofreu um processo de diferenciação em relação à de Portugal.
Casa Edison, na rua do Ouvidor, 107. Rio de Janeiro (RJ), início do século XX. A Casa Edison foi responsável por mais da metade dos cerca de 7 mil discos lançados no Brasil entre 1902 e 1927, período que corresponde à chamada fase mecânica de gravação.
O mercado editorial de partituras começou a se firmar, e as diferenças entre a modinha brasileira e a portuguesa estabeleceram no Brasil os gêneros da modinha e do lundu. A primeira carregava os traços do lirismo português, ao passo que o lundu se incumbia da comicidade, dos assuntos de cunho sensual e das referências aos costumes da população negra.
Nas letras dos lundus, é possível encontrar palavras como “nhonhô”, “sinhá”, “bulir”, entre outros termos que fazem alusão e até denúncias aos assédios e maus-tratos sofridos pelas pessoas pretas durante a escravização, temas abordados sempre de maneira cômica. A comicidade dessas letras era uma forma de denunciar esses maus-tratos de modo indireto, um recurso possível para que a população negra pudesse abordar assuntos delicados em um contexto ainda escravagista.
Uma das primeiras canções gravadas nos estúdios da Casa Edison, em 1902, foi o lundu do compositor Xisto de Paula Bahia (1841-1894), “Isto é bom”, interpretado por Manuel Pedro dos Santos (1870-1944), conhecido como Baiano.
Observe a fotografia do sistema de gravação da Casa Edison e reflita sobre a questão a seguir.
• Como as tecnologias de gravação influenciam a forma como ouvimos música hoje em dia?
Não escreva no livro. Destaque que a tecnologia usada para gravar uma música, os instrumentos e os efeitos escolhidos (reverberação, pedais etc.) ajudam a caracterizar a época das músicas. Se julgar pertinente, incentive os estudantes a fazer uma pesquisa sobre a invenção do fonógrafo pelo estadunidense Thomas Edison (1847-1931) em 1887.
REPERTORiO 2
Polca e maxixe, para dançar
K. LIXTO. O baile pobre. [ca. 1905].
Reprodução fotográfica.
K. LIXTO. O baile rico. [ca. 1905].
Reprodução fotográfica.
Nas ilustrações reproduzidas, o artista fluminense K. Lixto (1877-1957) representa o ambiente do maxixe, dançado nas festas das camadas mais baixas da sociedade, e o da polca, dançada nos bailes da elite carioca.
Outro gênero que marcou o processo de construção de identidade da música brasileira foi a polca, que chegou ao Brasil, vinda da Europa, na década de 1840. Ela inaugurou o mercado de música dançante, tornando o baile um tipo de festa comum nas capitais e cidades litorâneas.
Tratava-se de música instrumental composta para o piano, instrumento que marcava presença nas casas da tímida burguesia carioca e representava um misto de civilização moderna e ornamento da casa senhorial.
Na década de 1870, a polca começou a incorporar características da linguagem musical brasileira que vigorava até então. Ritmos já usuais nos lundus começaram a se fazer presentes nas frases do acompanhamento da mão esquerda do piano ou nas melodias tocadas pela mão direita, dando a elas um “toque brasileiro”.
Um segundo gênero dançante que chegou nesse período foi o maxixe, que começou a aparecer com o sentido de “baile dançante”, referindo-se a uma festa das camadas mais baixas dos centros urbanos. Maxixe, inclusive, associa-se a um legume barato e rasteiro, refletindo o preconceito que envolvia esse ritmo. Assim como aconteceu com a modinha brasileira e o lundu, a diferenciação entre a polca e o maxixe refletiu os conflitos socioculturais significativos da virada do século XX.
Não escreva no livro.
Compare as duas imagens presentes nesta página e reflita sobre a questão a seguir.
• Você conhece festas e bailes que são frequentados por pessoas de diferentes classes sociais?
Destaque que a cultura reflete as dinâmicas sociais de cada tempo e local e que a música e a dança também traduzem essas dinâmicas. Com base nessa observação, incentive os estudantes a refletirem sobre quais são os bailes e as festas frequentados por jovens de diferentes grupos sociais na atualidade e peça a eles que deem exemplos.
IMAGENS: COLEÇÃO
REPERTORiO 3
O nascimento do choro e do samba
Morro da Favela (atualmente Providência), no Rio de Janeiro (RJ), na década de 1920, em contraste com a Avenida Rio Branco, também no Rio de Janeiro (RJ), após a reforma urbanística, em um cartão postal de 1912.
Na virada do século XIX, o Rio de Janeiro, então capital do país, passou por uma reforma urbanística para modernizar a cidade. Em 1903, foram demolidos cortiços e casebres que abrigavam a população mais pobre, a qual passou a ocupar, de forma improvisada, o Morro da Favela e as áreas de seu entorno. O fim da escravização era uma realidade muito recente, e grande parte da população segregada se constituía de pessoas pretas e mestiças que se somavam ao fluxo migratório do Nordeste para o Sudeste.
As festas, os encontros musicais na Pequena África – como ficou conhecida a região formada pela zona portuária e pelos bairros Praça Onze e Estácio –, aconteciam nas casas das tias baianas. Esse foi o cenário onde nasceu o choro e o samba. O choro era executado por flauta, cavaquinho e violão, e os instrumentos eram comprados apenas por aquelas pessoas que tinham poder aquisitivo. Já o samba de partido-alto tinha letras improvisadas e era tocado em roda, batido na palma da mão, podendo ser acompanhado por pandeiro e prato e faca.
O choro tinha mais prestígio e, se havia uma festa, era tocado na sala de visitas, enquanto o samba era executado só no quintal. Essa ocupação espacial representava muito da identidade brasileira que se construía no início do século XX. A sala de visita era reservada para as práticas culturais de influência europeia, enquanto espaços de intimidade da casa resguardavam as ligações com o universo afro-brasileiro. Apesar dessa separação física, houve uma troca de influências entre esses gêneros musicais.
As práticas musicais podem traduzir as dinâmicas sociais de uma cidade. Tendo isso em mente, responda à questão a seguir.
• P or que alguns estilos de música, considerados inadequados ou mesmo proibidos em certas épocas, tornam-se populares e apreciados em outras? Há fatores culturais que envolvem essa mudança de percepção?
Reflita com os estudantes, por exemplo, sobre classificações etárias de filmes, espetáculos e apresentações musicais, incentivando-os a discutirem as motivações dessas classificações. Lembre-se de que mudanças nas dinâmicas sociais e culturais fazem com que o mundo seja percebido com novos olhos, afetando também o gosto musical, por exemplo.
Não escreva no livro.
COLEÇÃO PARTICULAR
ACERVO ICONOGRAPHIA
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Entre pulsação e compasso
No capítulo 2, começou-se a compreender a diferença entre pulsação e ritmo. Lembrando que a pulsação é o fluxo contínuo em uma música, o trilho por onde se desenvolverá o ritmo.
Ouça a primeira parte da faixa de áudio Pulsação e compasso para fazer uma breve revisão de conceitos.
Compreendendo a relação entre pulsação e ritmo, agora é possível avançar sobre a relação entre pulsação e compasso.
O compasso é uma forma de organização da pulsação e, portanto, do discurso musical.
A pulsação pode ser agrupada de dois em dois tempos, compassos binários; de três em três tempos, ternários; de quatro em quatro tempos, quaternários; de cinco em cinco, quinários, e assim sucessivamente. No entanto, os compassos mais comuns são os compassos de dois, três e quatro tempos, e, em geral, os demais derivam da junção deles.
Para compreender a diferença entre esses compassos, serão utilizados os movimentos do corpo.
Para isso, ouça a segunda parte da faixa de áudio Pulsação e compasso e acompanhe as ilustrações do seu livro.
• Compasso quaternário: para descrever o compasso quaternário com o movimento de seu corpo, seu pé forte (o direito para os destros e o esquerdo para os canhotos) deverá ir à frente, seguido do pé fraco. O pé forte vai então atrás, seguido também do pé fraco, desenhando um quadrado no chão.
Execução dos assos do compasso quartenário. Exemplo da movimentação com o corpo todo, mas o foco do movimento está nos pés.
• C ompasso ternário : para experimentar o compasso ternário, imagine um triangulo no chão. Os vértices B e C estão sob os seus pés direito e esquerdo, respectivamente, que estão paralelos e separados. Essa será a posição de partida. Já o vértice A está posicionado à frente, entre o B e o C. O pé direito vai avançar e pisar no vértice A, acompanhado pelo peso do seu corpo. Em seguida, com o pé esquerdo, você irá pisar no vértice C, também trazendo o peso do seu corpo. O pé direito vai então voltar a pisar no vértice B, e você terá marcado os três tempos do compasso ternário. Você irá recomeçar a marcar os vértices com os pés, agora pelo lado esquerdo. O pé esquerdo, então, irá à frente para pisar no vértice A, no tempo 1, reiniciando o movimento, já que agora é o pé esquerdo que será o tempo 1. O pé direito repousará sobre um dos vértices e, por fim, o esquerdo no vértice que resta, completando o movimento. Observe que, no movimento do compasso ternário, os pés direito e esquerdo se alternam no tempo 1.
Execução do compasso ternário.
Reprodução esquemática do compasso ternário.
• Compasso binário: esse compasso tem apenas dois pontos de apoio. Um pé à frente (o direito para os destros e o esquerdo para os canhotos), marcando o tempo 1, e o outro atrás, no tempo 2. Não esqueça de deslocar o peso do seu corpo para cada um dos pés enquanto tira o outro do chão, como é ilustrado a seguir.
Execução do ompasso binário.
Reprodução esquemática do compasso binário.
Com o movimento dos pés, foram representados os compassos quaternário, ternário e binário. Repita mais algumas vezes cada um dos compassos, sem interromper, até que os movimentos fiquem bastante familiares. Procure bater palmas sempre que pisar o tempo 1 de cada um dos modelos.
Agora, com base nesses três modelos (quaternário, ternário e binário), explore outros movimentos conforme orientações apresentadas nas questões a seguir.
1 Q uais seriam as possíveis combinações que resultariam em um compasso quinário, isto é, de cinco tempos?
Os compassos de cinco tempos podem surgir da combinação de um compasso ternário e um binário (3 +2) ou o inverso, um binário e um ternário (2 +3).
2 Quais seriam as combinações de um compasso setenário, isto é, de sete tempos?
Os compassos de sete tempos podem surgir da combinação de um compasso quaternário e um ternário (4 + 3) ou o inverso, um ternário e um quaternário (3 + 4). Oriente os estudantes a fazer a junção dos modelos dos compassos dessa maneira e a realizar várias vezes seguidas, sempre batendo palmas no tempo 1.
Não escreva no livro.
Parte 1 - Dançar a dois ou a duas AçÃO
1. Andar no pulso
• Você e a turma vão se espalhar pelo espaço da sala ao som da composição “Odeon” (1909), música de Ernesto Nazareth (1863-1934), e caminhar, associando os passos à pulsação da música.
• 12 Para isso, acompanhe a faixa de áudio Dançando o tango brasileiro: Odeon e identifique a marcação da pulsação. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=Y59t7AWC6vA (acesso em: 7 out. 2024).
• Busque realizar trajetos que desviem dos outros colegas, garantindo que vocês se observem, não se esbarrem e preencham todo o espaço da sala.
2. Avançar e recuar em linha
• Você e os colegas devem se organizar em linha, um ao lado do outro, de frente para a mesma direção. Para tornar essa etapa mais simples, façam linhas com cinco participantes, no máximo. Posicione-se na linha com os dois pés paralelos e o peso do corpo bem distribuído nos dois pés.
• Agora, você e os colegas vão andar juntos, avançando quatro passos para frente, começando com o pé direito. Esse é o movimento de avançar
• Agora, vocês recuarão quatro passos, começando com o pé direito para trás, sempre em linha. Esse é o movimento de recuar
Da esquerda para a direita: estudantes posicionados em frente a uma linha desenhada no chão; movimento de avançar (quatro passos para frente); e movimento de recuar (quatro passos para trás), retornando ao ponto inicial.
• Façam essas sequências algumas vezes até sentir que todos conseguem fazer sem perder a posição na linha. Agora, experimentem a sequência iniciando o avançar e o recuar com o pé esquerdo.
• Agora, repitam a mesma sequência de avançar e recuar com a música, sempre respeitando sua pulsação.
3. Avançar e recuar com duas linhas
• Agora, organizem duas linhas, uma de frente para a outra, com cinco pessoas compondo a linha A e outras cinco, a linha B. Os participantes da linha B estarão frente a frente com os participantes da linha A.
• Em seguida, os membros da linha A avançarão quatro passos, começando com o pé esquerdo, ao mesmo tempo que os membros da linha B recuarão, começando com o pé direito. Ao final dos quatro passos, a linha B avança, enquanto a linha A recua. O intervalo espacial entre as linhas deve ser mantido ao avançar e ao recuar.
Na reprodução esquemática à esquerda, estudantes da linha A avançam, enquanto membros da linha B recuam. À direita, membros da linha A recuam enquanto membros da linha B avançam.
4. Avançar e recuar em dupla com bexigas
• Escolha um colega ou uma colega para dançar. Você e seu par segurarão uma bexiga. Posicionem-se frente a frente, mantendo o contato por meio da bexiga, que deve estar entre a palma da mão direita de um e a esquerda do outro.
Essa bexiga não pode cair.
• A vance dois passos, começando com o pé direito, enquanto seu par recua, começando com o esquerdo. Experimentem esse movimento algumas vezes sem a música. Quando estiverem à vontade, repitam a experiência com a música.
E xecução dos movimentos de avançar e recuar com bexigas.
• Aos poucos, quando sentirem que esse deslocamento está garantido, busquem explorar movimentos com o quadril, com os membros superiores ou o tronco, mas sempre guardando o contato com a sua dupla através da bexiga.
• Se quiser, você pode deixar a bexiga de lado e dançar com seu par guardando o contato entre vocês do modo que for melhor para os dois, respeitando os limites corporais de cada um.
MUSiCA E DANÇA
CONTEXTO
O sagrado e o profano nos tempos coloniais
O encontro entre portugueses, africanos, afrodescendentes e indígenas em solo brasileiro transformou os modos de cultuar o sagrado para esses grupos, bem como as formas de interação social coletivas. As pessoas sequestradas no continente africano e trazidas ao Brasil para trabalho escravo trouxeram seus modos de reverenciar o sagrado e suas festas. Obrigados a se submeter aos pontos de vista dos colonizadores portugueses, encontraram modos de assegurar sua religiosidade, criando correspondência entre suas crenças e os ritos dos colonizadores.
Crenças, imagens de culto e rituais sagrados e profanos foram, assim, se ampliando e se modificando. Com raízes ibéricas, também o catolicismo tradicional, tanto o leigo quanto o devocional, trazido para o Brasil pelos colonizadores portugueses, foi impactado por práticas e crenças africanas e indígenas.
Essas múltiplas influências ainda se fazem presentes nos dias de hoje, por exemplo, em festas religiosas e em outras celebrações realizadas por brancos, negros e indígenas, cujas origens religiosas são muitas vezes esquecidas. É o caso das festas juninas.
A pesquisadora Lélia Gonzalez (1935-1994), em seu livro Festas populares no Brasil (1987), lembra que […] são os anônimos setores populares da colonização portuguesa que trazem tais celebrações, já revestidas de aspectos católicos, para o Brasil. […]
GONZALEZ, Lélia. Festas populares no Brasil. 1. ed. São Paulo: Boitempo, 2024. p. 101.
Demarcações imprecisas entre ritos pagãos e religiosos, entre sagrado e profano nas diferentes culturas, amalgamaram-se em rituais, crenças, cerimônias e festas que fazem parte do calendário cultural do país.
CONeXãO
Uma mistura que dá samba
Dona Dalva Damiana de Freitas (1927-), importante referência do samba de roda do Recôncavo Baiano, é matriarca da Irmandade da Boa Morte, uma confraria religiosa afro-católica brasileira que existe há mais de dois séculos, composta apenas de mulheres pretas, em Cachoeira (BA). Mais um exemplo em que o sagrado e o profano se entrelaçam. Conheça dona Dalva e sua relação com o samba e com a Irmandade da Boa Morte em: www.youtube.com/watch? v=P9B5fzKYNfI (acesso em: 7 out. 2024).
Igreja da Imperial Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos, Rio de Janeiro (RJ), 1922.
REPERTORiO 1
Festas juninas e quadrilha
paganismo
arcaico: reunião de práticas religiosas em que se cultuavam os elementos, as forças e os ciclos da natureza.
33o Arraiá do Zé Bagunça, na praça Virgílio de Melo Franco, em Bueno Brandão (MG), 2023.
Com origens que remetem aos rituais pagãos de celebração do solstício de verão no Hemisfério Norte, as festas juninas foram incorporadas pelo cristianismo. As homenagens a Santo Antônio, São João e São Pedro associaram-se aos ritos do fogo do paganismo arcaico. A presença da fogueira anunciava a chegada da colheita, marcando a renovação da vida. No Brasil, onde coincide com o solstício de inverno, período de colheita do milho, a festa de São João tornou-se uma das festividades mais populares, sobretudo em algumas cidades do Nordeste. Além da fogueira, as festas de São João caracterizam-se pela presença de bebidas e comidas típicas, muitas à base de milho; pela música e pela dança coletiva conhecida como quadrilha.
A quadrilha, incorporada pelos portugueses, desenvolveu-se nos salões da França como uma dança de casal. Quatro casais formavam um quadrado no espaço e dançavam avançando, recuando, trocando de posição e alternando os pares, sempre em harmonia.
No Brasil, a quadrilha é dançada em pares trajados com roupas coloridas, organizados em grandes grupos e conduzidos por um orador. Há deslocamentos em linhas que avançam e recuam sincronicamente, além de filas que remetem a um trem. Em determinados momentos, os pares dançam como em um baile, formando uma grande roda, e em outros, unem-se pelas mãos para criar um túnel que é atravessado por todo o grupo. A quadrilha é dançada por pessoas de várias gerações. Em algumas cidades, como Campina Grande, na Paraíba, as festividades de São João tornaram-se grandes espetáculos.
Não escreva no livro.
Embora muito populares no Nordeste, as festas juninas já fazem parte do calendário de muitas escolas pelo Brasil. Como cada festa assume sua particularidade, responda à questão a seguir.
• Como a festa junina é comemorada em sua escola?
A festa junina está incorporada no calendário escolar de muitas escolas e toma os contornos de cada comunidade escolar. Faça com os estudantes o exercício de descrever a festa junina da escola com base no que ela tem de particular e no que ela tem em comum com essa expressão cultural.
Congada
Ensaios da Congada em Ilha Bela (SP) em 1930 e em 2023, o que mostra a prevalência da festividade ao longo dos séculos.
As congadas estão presentes em diferentes partes do Brasil, mas assumem especial presença no estado de Minas Gerais. Em geral, são realizadas por irmandades ou confrarias, dependendo da época, e reencenam a coroação dos reis do Congo.
No século XV, os portugueses fizeram contato com o reino do Congo (que corresponde, hoje, a territórios da Angola, República do Congo e República Democrática do Congo), de onde foi trazido um grande contingente de pessoas escravizadas. Nesse reino, existia o soberano Manicongo, senhor do Congo, cuja memória sobreviveu entre os escravizados e se mantém viva na festividade da congada.
No entanto, as festas também homenageiam os santos negros católicos de devoção entre a população afrodescendente, como Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, e podem relembrar eventos do passado, como a abolição da escravatura.
As letras das canções fazem referência aos mitos católicos e à memória da ascendência africana. Os instrumentos musicais utilizados incluem caixa, cuíca, pandeiro, reco-reco, tarol, tamboril, sanfona ou acordeão, mas a formação pode variar de um grupo de congo para outro. Cada grupo ou terno de congo, como podem ser chamados, possui uma característica própria e leva o nome de seu santo de devoção.
escreva no livro.
Observe as duas fotografias anteriores e repare em quando elas foram tiradas. Tendo isso em mente, responda à questão a seguir.
• O que elas têm em comum apesar da distância temporal que as separa?
Converse com os estudantes sobre a oralidade que caracteriza expressões culturais como a congada. Reforce que, em festas religiosas e folguedos que atravessam séculos, as práticas da dança e da música são passadas de geração em geração.
REPERTORiO 3
Festa do Círio de Nazaré
Procissão que acompanha a berlinda de Nossa Senhora de Nazaré, em Belém (PA), 2023.
A procissão do Círio de Nazaré é acompanhada por mais de 2 milhões de pessoas. O evento modifica o ritmo da cidade de Belém do Pará durante todo o mês de outubro. Essa festividade é realizada há mais de 200 anos e indica a devoção a Nossa Senhora de Nazaré. Foi introduzida no estado por jesuítas portugueses. Segundo a tradição, uma imagem da virgem foi encontrada por um agricultor por volta de 1700, onde hoje é a avenida Nazaré. Ele levou a imagem para casa, mas ela retornou para as margens do igarapé Murutucu.
A festa consiste em um conjunto de manifestações religiosas e profanas que tomam conta da cidade. Seu ponto forte é a enorme procissão em que a imagem de Nossa Senhora de Nazaré, em uma berlinda, é puxada pelos devotos com uma corda de mais de 400 metros. Entre os elementos profanos associados ao evento está a Festa das Filhas de Chiquita, bloco carnavalesco formado por homossexuais, que trazem a irreverência do Carnaval para as celebrações. Também é tradicional a presença dos artesãos, chamados de girandeiros, que produzem e comercializam brinquedos de miriti (buriti), um artesanato esculpido com essa madeira.
Ao longo da procissão, são cantados hinos e músicas de devoção à Virgem de Nazaré, e, durante os dias de procissão, há uma programação musical com a presença de artistas católicos nacionais. O evento acontece durante toda a quadra nazarena e leva o público, em especial os jovens, ao espaço da Praça Santuário.
Os calendários religiosos fazem parte do calendário anual de diferentes cidades e costumam ser eventos de festividade e celebração em comunidade.
Não escreva no livro.
Após a leitura do texto, converse com os colegas sobre a questão a seguir.
• Na sua cidade, há outras festas religiosas que ocupam os espaços públicos?
Procissões, lavações de escadarias e shows de louvor podem ser consideradas festas de caráter religioso que ocupam espaços públicos da cidade, dependendo da forma com que cada prefeitura gerencia essas atividades. Localize com os estudantes esse tipo de festividade.
PESQUiSA
As mulheres no samba
No dia 13 de abril, celebra-se o Dia Nacional da Mulher Sambista. A data, instituída a partir de 2024, homenageia a cantora e compositora carioca D. Ivone Lara (1921-2018), a primeira mulher a assinar sambas. A ala de compositores das escolas de samba sempre foi um ambiente extremamente masculino, mas D. Ivone Lara se tornou a primeira compositora da Império Serrano e logo se consagrou. Assim como ela, outras compositoras marcaram e contribuíram com a história do samba. Pesquise e conheça algumas dessas personalidades.
• S aiba mais a respeito da Tia Ciata e explore a história da pequena África no site do Ponto de Cultura Casa da Tia Ciata. Disponível em: www.tiaciata.org.br/home (acesso em: 7 out. 2024).
• Um dos compositores mais reconhecidos da Pequena África foi João da Baiana (1887-1974), filho de Tia Perciliana, também quituteira, que formou com Tia Ciata e Tia Amélia a comunidade das baianas da região. Ouça a canção “Batuque na cozinha”, gravada por Martinho da Vila em 1972, e busque descrever como devia ser o ambiente musical onde essa canção foi composta.
2. No ano de 1914, o maxixe “Gaúcho”, também conhecido como “Corta-jaca”, de Chiquinha Gonzaga (1847-1935), levou a um incidente diplomático, quando a primeira-dama do país, dona Nair de Teffé (1886-1981), executou a peça ao violão em uma festa no Palácio do Governo. A escolha do repertório provocou grandes constrangimentos, pois o maxixe era considerado uma música vulgar e pouco digna dos salões da alta sociedade. Na segunda metade do século XIX, era difícil uma mulher afirmar-se como compositora. Chiquinha Gonzaga se destacou na história brasileira por enfrentar uma sociedade fortemente patriarcal e escravocrata e, apesar disso, despontar como uma mulher afrodescendente e exímia pianista, compositora e regente na virada do século XIX para o século XX.
1. Após o processo de gentrificação da cidade do Rio de Janeiro, resultante do “bota-abaixo”, as casas das tias baianas popularizaram-se na região da Pequena África. Hilária Batista de Almeida, ou Tia Ciata (18541924), é uma das personalidades mais conhecidas do início do século XX. Além de promover festas e encontros musicais, ela também teve grande reconhecimento na vida econômica e cultural do Rio de Janeiro (RJ), vendendo quitutes e confeccionando roupas para teatros e desfiles carnavalescos. Fotografia do início do século XX.
ACERVO DA ORGANIZAÇÃO DOS REMANESCENTES DA TIA CIATA, RIO DE JANEIRO, RJ
• C onheça mais da história e do legado de Chiquinha Gonzaga. Disponível em: https://chiquinhagonzaga.com/ wp/ (acesso em: 7 out. 2024).
• C onfira também a respeito da “Ocupação Chiquinha Gonzaga”, mostra dedicada à maestrina na 51a edição do programa Ocupação Itaú Cultural. Disponível em: www.itaucultural.org.br/acervo-digital-memoriachiquinhagonzaga (acesso em: 7 out. 2024).
• A m archinha “Ó abre alas” (1899), até hoje cantada nos desfiles e blocos carnavalescos, foi composta por Chiquinha Gonzaga e inspirada pelo desfile do cordão Rosa de Ouro. Essa composição é considerada a primeira marcha-rancho da história. Conheça mais sobre o carnaval carioca no início do século XX. Disponível em: https://chiquinhagonzaga. com/wp/o-abre-alas-o-hino-carnavalesco/ (acesso em: 7 out. 2024). Faça também uma busca na internet para ouvir e conhecer essa marchinha.
3. Leci Brandão é carioca e foi a primeira mulher compositora da escola de samba Estação Primeira de Mangueira. Suas letras sempre foram carregadas de forte cunho político e seu sucesso “Zé do Caroço” (1978) chegou a ser rejeitado pela gravadora Polygram, em 1981. Além de cantora, atua como parlamentar e, em São Paulo, é madrinha do Bloco Afro Ilú
Obá De Min, composto unicamente por mulheres.
Chiquinha Gonzaga. Fotografia de 1877. Arquivo Chiquinha Gonzaga, acervo do Instituto Moreira Salles.
• Ouça a canção “Zé do Caroço”, cantada por Leci Brandão e gravada somente em 1985 pela gravadora Copacabana. Reflita sobre o tema da música e as razões que levaram à sua rejeição. Essa canção é inspirada em José Mendes Silva, o Zé do Caroço, policial aposentado que se tornou uma liderança no Morro do Pau da Bandeira, próximo ao bairro de Vila Isabel, no Rio de Janeiro. Pesquise a história desse personagem e descubra quem ele foi.
Leci Brandão. Fotografia de 2022.
LECI Brandão. 1985. Capa do álbum de Leci Brandão.
AçÃO Parte 2 – No tempo da valsa
Agora, experimente se movimentar em ciclos de três tempos, isto é, dançando uma música em compasso ternário.
1. Apreciação musical
• 13 Ouça a faixa de áudio Dançando a valsa: Julieta, composta em 1895 também por Ernesto Nazareth. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=iQnLidW_q3Q (acesso em: 7 out. 2024). Busque perceber a pulsação da música e bata palmas sempre no tempo 1.
2. Valsa no lugar
• Experimente dançar a valsa no lugar. Organize-se no espaço, com os pés paralelos e com o peso do corpo distribuído entre eles. Em seguida, leve o peso para a direita, marcando o pé direito no chão, e depois para a esquerda. Depois, retome o que aprendeu no compasso ternário, ainda sem deslocamento no espaço.
• Marque a pisada do pé direito com uma palma, depois o pé esquerdo se juntará ao direito, tocando o chão de leve, e o direito voltará a marcar o chão no mesmo lugar em que está, ou seja, sem se deslocar. Repita o movimento para a esquerda. O pé esquerdo marca o chão acompanhado de uma palma (tempo 1), o direito pisa de leve ao lado do esquerdo, e o esquerdo volta a marcar o chão.
3. Deslocamento pelo espaço em compasso ternário
• Sem bater palma, siga se mo vimentando, agora livremente pela sala. Desloque-se somente no tempo 1 e explore o movimento. A turma deve se distribuir por todo o espaço, mas sempre respeitando o ciclo do compasso ternário.
4. Dançando valsa a dois com bexigas
E xecução da valsa no lugar.
• Forme novamente uma dupla e retome o uso da bexiga. Vocês, agora, devem marcar o movimento da valsa em sincronia. A bexiga deve estar entre a mão direita de um e a mão esquerda do outro e pode ser pressionada com leveza.
5. Avaliação coletiva
• Após experimentar as propostas, converse com os colegas e o professor sobre qual foi o maior desafio ao se movimentar em pares.
Movimentar-se em sincronia com o movimento do outro pode ser um desafio para muitos dos estudantes. Destaque que dançar junto é um exercício de percepção do outro. A relação com o tempo da música também é fundamental, pois, se estiverem sincronizados com a pulsação e relacionando corpo e movimento, há grandes chances de a comunicação acontecer de forma fluente na dança também.
PONTE PARA OUTRAS
liNGUAGENS ARTiSTiCAS
ARTES iNTEGRADAS ARTES iNTEGRADAS
Arquitetura colonial
A história da arquitetura brasileira está atrelada aos primeiros séculos da colonização portuguesa. As mais antigas edificações foram os fortes concebidos para defesa do território e as igrejas das ordens religiosas católicas, como a igreja do Convento de São Francisco, construída em 1708, em Salvador. Essa construção tem o interior decorado com relevos e esculturas de madeira cobertas de ouro, a exemplo do estilo Barroco brasileiro. O convento também abriga um conjunto de 37 painéis de azulejos portugueses.
O uso dos azulejos como elementos decorativos nas construções brasileiras é uma característica da arquitetura portuguesa, assimilada da cultura islâmica. Os povos islâmicos dominaram a península ibérica no período que precedeu as expedições oceânicas que levaram à colonização.
Painéis de azulejos portugueses pintados entre 1743 e 1746 na Igreja e Convento de São Francisco, Salvador (BA). Fotografia de 2023.
Vista interna da Igreja e Convento de São Francisco, cuja construção foi iniciada em 1708, Salvador (BA). Fotografia de 2013.
Cultura cigana
O primeiro registro da chegada de ciganos em terras brasileiras data de 1574, quando o cigano João Torres, sua mulher e seus filhos foram degredados para o Brasil. Em Minas Gerais, os ciganos foram notados a partir de 1718, vindos da Bahia depois de serem deportados por Portugal. Atualmente, no Brasil, os povos ciganos são compostos principalmente por três grupos, cada qual com sua língua e costumes próprios: os Rom, os Sinti e os Calón. Nosso país é o lar da terceira maior população cigana do mundo. Além da semelhança nos costumes, na língua e nas vestimentas tradicionais, o nomadismo é um traço marcante que unifica as diferentes etnias dos povos ciganos. O racismo, a perseguição e a exclusão social, infelizmente, também são uma constante na história desse povo.
degredado: quem recebe a pena do exílio.
A herança cigana está presente em diferentes aspectos da cultura brasileira. Na música, as influências estão na moda de viola, no sertanejo e no samba. Na dança, temos a catira, típica de Minas Gerais e Goiás, associada ao flamenco, dança espanhola de origem cigana.
Frame do documentário Terra de ciganos (2024), dirigido por Naji Sidki.
TERRA DE CIGANOSVERÍSSIMO PRODUÇÕES
DANIEL CYMBALISTA/PULSAR IMAGENS
SERGIO PEDREIRA/PULSAR IMAGENS
TEATRO
Teatro jesuítico
Os jesuítas costumavam promover eventos teatrais, misturando elementos de teatro, música e dança como parte do projeto violento de aculturação dos povos indígenas e apagamento da cultura do outro. No Brasil, o padre José de Anchieta (1534-1597) foi um dos responsáveis pela presença da linguagem teatral como instrumento para a colonização. Anchieta organizava as apresentações nos aldeamentos indígenas, como parte integrante de festas religiosas. Esses aldeamentos faziam parte do projeto colonial de ocupação do território e aculturação dos indígenas, promovendo o deslocamento forçado dos povos originários de suas terras. Nesses locais, as peças aconteciam ao ar livre, realizadas por jesuítas e indígenas aldeados, seguindo o modelo do teatro medieval europeu.
Fac-símile de escritos do padre José de Anchieta, documento importante para compreender o teatro jesuítico. Aqui, temos o registro documental da dramaturgia de José de Anchieta na peça Auto representado na festa de São Lourenço, de aproximadamente 1583.
TEATRO
Casas de Ópera
As formas teatralizadas presentes no Brasil entre o século XVI e o início do século XVIII eram muito diferentes do que hoje entendemos por teatro. Elas não aconteciam em um espaço chamado teatro, já que, durante séculos, foi proibido construir edifícios teatrais na colônia.
Em meados do século XVIII, a proibição cessou, e foram erguidas as primeiras Casas de Ópera. Apesar do nome, não eram apresentadas apenas óperas mas também tragédias e comédias. Sua construção incentivou a formação de um sistema teatral, que englobava tanto os trabalhadores do teatro quanto o público espectador. Aos poucos, constituía-se nas cidades um circuito cultural que não estava diretamente ligado à Igreja.
A Casa de Ópera de Vila Rica foi inaugurada em 1770, em Minas Gerais. A riqueza trazida pela mineração constituiu uma elite que buscou reproduzir ali a cultura iluminista europeia. A contradição é que, enquanto as peças falavam de liberdade e enalteciam o indivíduo, a vida social brasileira era completamente marcada pela escravização, com parte do elenco composto por atores e atrizes negros escravizados.
Interior da Casa da Ópera - Teatro Municipal de Ouro Preto (MG). Fotografia de 2023.
A construção de uma cultura tropical SiNTESE ESTETiCA
Reflexão
Neste capítulo, foram abordadas as questões que envolvem a colonização e a formação de uma cultura brasileira. Viu-se como a junção de elementos de distintas matrizes constituiu uma cultura artística rica em manifestações festivas e em produções musicais e visuais. As historiadoras Lilia Schwarcz (1957-) e Heloisa Starling (1956-) discutem essas questões no livro Brasil: uma biografia, publicado em 2015, em que apresentam uma revisão da história brasileira, da colonização aos dias atuais. Leia, a seguir, um trecho dessa obra referente à vida cultural no Rio de Janeiro na época em que a corte portuguesa se instalou no Brasil.
Um rei no Brasil
[...]
Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro (RJ).
Continuavam faltando igualmente diversões e os requisitos mínimos para uma vida em sociedade. O Passeio Público, construído entre 1779 e 1783, foi por muito tempo o maior dos atrativos no Rio de Janeiro. Já as touradas, bastante animadas, realizavam-se no Campo de Santana. Leithold acompanhou uma em que “portugueses, brasileiros, mulatos e negros vaiaram do princípio ao fim. Um tourinho magro, cuja ira alguns figurantes paramentados procuravam em vão provocar com suas capas vermelhas, permanecia fleumático ”. Havia, ainda, o Real Teatro de São João, fundado em 1813, e durante dez anos o único na cidade. Na música dom João soube combinar artistas vindos do exterior com representantes locais. Por essa razão, cercou-se de profissionais como o compositor pardo José Maurício, que atuou até 1810 em todas as funções musicais sacras e profanas, e acabou ficando conhecido, como “Mozart brasileiro”; isso até a chegada de Marcos Antônio Portugal, músico habituado aos gostos da corte, formado pela escola italiana e com prática de batuta na regência das orquestras de São Carlos em Lisboa. E o ofício cresceu: em 1815, a Capela Real possuía um corpo de cinquenta cantores, entre estrangeiros e nacionais.
Passeio Público: primeiro local de lazer planejado para a capital carioca, o Passeio Público foi concebido pelo Mestre Valentim (1745-1813), artista e arquiteto que realizou diversos projetos na cidade, entre os quais chafarizes e esculturas de bronze.
Leithold: Theodor von Leithold (17711826), militar prussiano, conviveu com a corte portuguesa no Brasil em 1819 e escreveu um relato sobre a vida no Rio de Janeiro, Viagem de Berlim ao Rio de Janeiro e volta, publicado em Berlim, em 1820.
José Maurício: o religioso José Maurício Nunes Garcia (1767-1830) viveu a transição do Brasil Colônia para o Brasil Império e foi considerado um dos maiores compositores de seu tempo.
THEREMIN, Karl Wilhelm von. Entrada do Passeio Público. 1835. Aquarela, 48 cm x 30,5 cm. Fundação
Na Fazenda Santa Cruz, que pertencia à monarquia e distava sessenta quilômetros da cidade, “forneciam-se” produtos agrícolas mas também “artistas clássicos”: todos negros. Os escravos dessa propriedade, além de trabalharem nas lavouras, eram iniciados na música sacra, formando corais e tocando instrumentos. Esses músicos foram ganhando fama, e a escola recebeu a denominação de Conservatório de Santa Cruz. Embora a fazenda estivesse passando por um processo de decadência financeira, os mestres nunca pararam de exercer seu ofício, e a escola de música granjearia novo impulso com dom João. Em 1817 o prédio foi reformado, e a capela, redecorada, prevendo-se apresentações da orquestra e do coral. Ademais, Santa Cruz tornou-se a residência de verão da família real e sede de solenidades. Os músicos escravos dedicavam muito tempo ao estudo teórico e à prática instrumental, sob orientação de mestres como o próprio José Maurício. Costume inaugurado pelo príncipe regente, os artistas de Santa Cruz seriam constantemente “emprestados” para integrar a orquestra, o coral ou a banda do Paço de São Cristóvão e da Capela Real. Tocavam rabecas, violoncelos, clarinetas, rabecões, flautas, fagotes, trombones, trompas, pistons, requintas, bumbos, flautins de ébano; executavam marchas militares e patrióticas, valsas, modinhas, quadrilhas. Também apresentavam óperas. Dom João, amante da música, comparecia ao teatro, nos dias de gala, e às vezes adormecia. Acordava então assustado e perguntava a um de seus fiéis camareiros: “Já se casaram os patifes?”. […]
Todo esse gosto seria mais acentuado a partir de outra iniciativa dos tempos em que Antônio de Araújo ainda fazia parte das lides do rei. Em 1816, o mesmo conde da Barca seria o incentivador se não do convite, ao menos da boa recepção e alojamento de um grupo de artistas franceses. Foi em 1815 que o marquês de Marialva, encarregado de negócios de Portugal na França, achou por bem apoiar a ideia da vinda de diversos artistas reconhecidos em seu meio que, em consequência da queda do Império de Napoleão e preocupados com as represálias políticas, encontravam-se sem emprego e desejosos de emigrar. A iniciativa partira, na realidade, dos próprios artistas, liderados por Joachim Lebreton, o antigo secretário da Academia de Belas Artes. Já o governo local, ciente da importância da representação artística e, sobretudo, da veiculação de sua imagem positiva na Europa, resolveu arcar com as despesas iniciais do grupo. […]
O que eles não sabiam era que os planos de, uma vez no Brasil, fundar uma Academia nos moldes da francesa se revelariam melancólicos. Araújo morreria logo após a chegada do grupo e, sem seu principal mecenas, os integrantes seriam tratados com indiferença, além de sofrerem a surda hostilidade dos artistas nacionais e portugueses, que não concordavam em serem passados para trás por um grupo, diziam eles, “de bonapartistas desempregados”. Mas oportunidades havia. Com o falecimento da rainha e a futura aclamação do novo soberano, dois atos capitais na vida de uma nação monárquica, os artistas sem demora perceberiam que sua verdadeira função seria construir cenários e dar grandiosidade àquela corte imigrada. Tendo Joachim Lebreton (secretário perpétuo da classe de belas-artes do Instituto Real da França) como líder e os artistas Nicolas-Antoine Taunay (pintor do mesmo instituto), Auguste-Marie Taunay (escultor), Jean-Baptiste Debret (pintor de história e decoração), Granjean de Montigny (arquiteto), Simon Pradier (gravador) entre outros funcionários, o grupo era anunciado de dois modos: pela diversidade de especializações e pelo perfil profissional de seus membros. […]
Desde o século XVIII, difundiu-se no Brasil o estilo barroco, que predominou nas maiores cidades, como Rio de Janeiro,
Antônio de Araújo: Antônio de Araújo e Azevedo (1754-1817), conde da Barca, foi ministro de dom João VI. Tendo chegado ao Brasil com a corte portuguesa, em 1808, fundou instituições artísticas e científicas no Rio de Janeiro.
Recife, Salvador, e especialmente em Ouro Preto e Sabará, enquanto a forte presença do estilo rococó em Diamantina fez desta a menos barroca e a mais alegre das cidades mineiras. Essa arte colonial respondia às exíguas demandas locais, sendo os trabalhos encomendados, em sua maioria, por autoridades eclesiásticas ou civis, e excepcionalmente por particulares. Também Portugal carecia de pintores acadêmicos. Isto é, lá havia academias, mas a atividade continuava a ser considerada de menor importância e os artistas raramente se dedicavam a pinturas de gênero. Talvez por isso a corte tenha acolhido os artistas franceses, tidos como uma espécie de vanguarda ou ao menos um selo de qualidade. Eram, ainda por cima, educados no estilo neoclássico, o qual na França se pôs a serviço da Revolução e trabalhou em nome da criação de sua memória. E o modelo se encaixaria, ao menos teoricamente, de forma perfeita nos planos do governo de dom João, que pretendia animar um projeto palaciano a partir da expertise desses artistas. Aliás, diante da inexistência de um mercado de artes, o grupo não teria outra chance senão se filiar exclusivamente à família real e à agenda de datas que a monarquia mandava comemorar. Às exéquias de dona Maria sucederiam cerimônias de gala, substituindo os ornatos fúnebres por arcos triunfais e iluminações, por ocasião da vinda da futura imperatriz do Brasil, em 1817, e da aclamação de dom João em 1818. Os artistas seriam responsáveis, ainda, por várias obras urbanísticas e grandes monumentos, bem como criariam arquiteturas efêmeras, onde se exibiam comemorações públicas associadas ao Estado.
rococó: estilo artístico que se desenvolveu na Europa no século XVIII, caracterizado pela profusão de decorações e ornamentações com elementos espiralados. vanguarda: na arte, termo usado para designar a parcela de artistas que atuam como precursores em determinada técnica ou linguagem.
SCHWARCZ, Lilia Moritz; STARLING, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. p. 185-187; 191-192.
A recepção foi hostil, com artistas nacionais e portugueses insatisfeitos com a chegada de “bonapartistas desempregados” que roubariam seus empregos.
Processo de criação coletiva
Após a leitura do trecho do livro Brasil: uma biografia, forme um grupo de seis a dez integrantes para realizar um processo de pesquisa e criação artística, investigando criticamente os estudos sobre arte e colonização.
Análise e debate
As músicas, tanto de caráter sacro quanto profano, mesclavam artistas estrangeiros e nacionais, contando, inclusive, com pessoas escravizadas que eram iniciadas em música, cantando em corais e tocando instrumentos. Além das músicas de caráter sacro, os artistas locais executavam óperas, marchas militares, valsas, modinhas e quadrilhas.
Depois de ler o texto, analisar a imagem Entrada do Passeio Público e refletir, discuta as questões a seguir com seu grupo.
O Brasil possuía artistas, tanto brasileiros como portugueses, que animavam o cenário local. Peça aos estudantes que destaquem elementos do texto que evocam esse contexto, como o Real Teatro de São João, o Conservatório de Santa Cruz.
• Como era o cenário artístico do Rio de Janeiro no começo do século XIX?
• Que tipo de música era tocado e por quem?
• Por que trazer artistas da França para fundar uma academia de arte no Brasil?
• Segundo o texto, como os artistas franceses foram recebidos no Brasil?
• Em que tipo de eventos os artistas franceses eram chamados a colaborar com a monarquia portuguesa?
Dando grandiosidade à corte que havia imigrado para o Brasil, produzindo obras artísticas que respondessem a esse propósito, animando um projeto palaciano de poder.
Anote os principais tópicos que surgiram no debate. Eles servirão de base para o processo de criação artística.
Ideia disparadora e linguagens artísticas
Em seguida, com seus colegas de grupo, pense em como fazer uma síntese estética do debate realizado, ou seja, como transmitir as conclusões do grupo aos demais colegas da turma por meio
Era uma estratégia do governo local para veicular uma imagem positiva do Brasil na Europa, ciente da importância da representação artística nesse processo. Era também uma tentativa de formar quadros artísticos ao gosto europeu, diante de um povo sem educação artística formal.
de uma criação artística, como uma música, uma pintura, um poema, uma cena, uma performance, uma instalação ou outro formato.
Retome as ferramentas criativas trabalhadas ao longo deste capítulo, ou rememore procedimentos artísticos trabalhados nos capítulos anteriores, que possam apoiar a criação. Leve em consideração os desejos artísticos e as habilidades dos integrantes do grupo para compor a ideia central da obra coletiva.
Em um primeiro momento, deixe as ideias
DEBRET, Jean-Baptiste. Vista do largo do palácio no dia da aclamação de dom João VI. 1839. Litografia colorida a mão, 49 cm x 34 cm. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro (RJ).
fluírem, anotando as sugestões de todos. Depois, retome as ideias e eleja a que parecer mais potente, chegando em uma ideia disparadora.
Faça sugestões possíveis de serem realizadas e que reverberem o trecho selecionado do livro Brasil: uma biografia, além de fazer um levantamento de imagens, objetos, músicas, gestos ou textos que evidenciem a relação entre a colonização e a constituição da cultura brasileira, especificamente no que diz respeito a seus valores estéticos. Tome como ponto de partida a arte brasileira engendrada no ambiente colonial, refletindo sobre como os valores estéticos da colonização ainda se manifestam no cotidiano brasileiro. Pense em trabalhos artísticos que chamem a atenção das pessoas para a mesclagem de culturas que resultou do processo de colonização.
Deixe a imaginação livre. É possível fazer um levantamento de imagens representativas da mescla cultural no Brasil, resultante do processo de colonização, criando um painel com esses materiais; realizar uma apresentação musical na forma de um cortejo que explore o universo musical do período ou uma encenação de festa cívica, inspiradas nas festas populares; ou fazer uma cena de teatro representando os conflitos entre os músicos franceses e os músicos locais. Um dos integrantes do grupo deve anotar a ideia disparadora e a(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Pesquisa, criação e finalização
Organize as etapas de criação do projeto artístico com base nas reflexões centrais, na ideia disparadora e nas linguagens artísticas escolhidas pelos integrantes do grupo.
Caso a criação envolva apresentação ou encenação, você e os colegas devem ensaiar o maior número de vezes possível, aprimorando o trabalho a cada repetição. Mesmo apresentações improvisadas exigem alguma forma de combinado e preparação. Não deixe que o processo de criação fique só na conversa, lembre-se de experimentar os elementos em cena.
Caso a invenção do grupo envolva uma exposição ou instalação, faça uma lista de tudo o que será necessário providenciar, dividindo as tarefas entre os integrantes.
O processo de criação será diferente para cada grupo, de acordo com o que cada um escolheu realizar. Cada grupo deve desenvolver suas etapas, estabelecendo critérios de acordo com a obra ou manifestação artística que se está concebendo.
Com o trabalho desenvolvido, chegou o momento de compartilhar com o restante da turma! Aproveite para apreciar as criações dos demais grupos.
AMARAL, Tarsila do. Oswald de Andrade. 1922. Óleo sobre tela, 61 cm x 42 cm. Coleção particular.
AMARAL, Tarsila do. Autorretrato I. 1924. Óleo sobre placa de madeira aglomerada, 38 cm x 32,5 cm. Acervo Artístico-Cultural dos Palácios do Governo do Estado de São Paulo. Palácio Boa Vista, Campos do Jordão (SP).
COLEÇÃO DE ARTES VISUAIS DO INSTITUTO DE ESTUDOS BRASILEIROS DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (IEB-USP), SÃO PAULO, SP
Oswald de Andrade (1890-1954), Tarsila do Amaral (1886-1973), e Mário de Andrade (1893-1945) foram figuras centrais do Modernismo brasileiro.
SEGALL, Lasar. Retrato de Mário de Andrade. 1927. Óleo sobre tela, 72 cm x 60 cm. Coleção de Artes Visuais do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo, São Paulo (SP).
1. Solicite aos estudantes que descrevam o que apreciaram, com atenção ao suporte de cada exemplo e aos elementos da composição. Iniciem com os retratos pintados a óleo de três artistas do movimento modernista. Dois deles são de autoria de Tarsila do Amaral e o outro é de Lasar Segall (18891957). Depois, partam para a fotografia do tambor de mina, uma dança associada a um culto afrorreligioso registrada por Mário de Andrade. Sigam para a escultura em bronze de uma forma orgânica pouco figurativa e, fechando a sequência, para a fotografia de uma cena de teatro de revista.
Esta fotografia é um dos registros feitos pelas expedições organizadas por Mário de Andrade em 1938, quando esteve à frente do Departamento de Cultura da Prefeitura de São Paulo (SP).
Registro de tambor de mina, culto afrorreligioso surgido no Estado do Maranhão, popular em diversos estados das regiões Norte e Nordeste do Brasil. São Luís (MA), 1938. MARTINS, Maria. O implacável. 1947. Bronze patinado, x 117,6 cm x 19,5 cm. Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, São Paulo (SP).
A artista plástica Maria Martins (18941973), conhecida por suas obras surreais, teve grande influência no movimento surrealista internacional.
REPRODUÇÃO/FUNARTE
O teatro de revista oferecia ao público espetáculos suntuosos, com muita música e humor.
Teatro de revista da Companhia Walter Pinto, no Rio de Janeiro, na época, capital federal. Fotografia da década de 1940.
Considerando as imagens apresentadas nestas páginas de abertura, responda às questões a seguir.
1 Como você descreveria as obras apresentadas?
2 A que linguagens artísticas elas se relacionam?
2. As pinturas relacionam-se às artes visuais; as pinturas que mostram Oswald de Andrade e Mário de Andrade também se relacionam à literatura, já que os retratados foram dois importantes escritores da literatura brasileira; a fotografia do tambor de mina relaciona-se com a dança e a música; a escultura de Maria Martins também se relaciona às artes visuais; a fotografia da cena de teatro de revista está relacionada ao teatro.
3 O que essas imagens informam sobre o Modernismo no Brasil?
3. Com base na observação dessas imagens, algumas características do Modernismo no Brasil podem ser apontadas: os retratos foram feitos com cores fortes e formas simplificadas; a escultura não representa algo de modo realista; o registro fotográfico de uma dança de caráter afrorreligioso demonstra a valorização das matrizes culturais brasileiras; todas as imagens remetem, de alguma forma, ao corpo e ao Brasil. Observe que o teatro de revista não é um gênero relacionado às renovações modernistas, figurando, porém, como elemento expressivo do ambiente cultural predominante à época.
ROMULO FIALDINI/ TEMPO COMPOSTO/MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEAUSP, SÃO PAULOSP
Não escreva no livro.
C omo os artistas modernos conceberam uma identidade para o Brasil?
Entre o fim do século XIX e o início do século XX, muitos imigrantes chegaram ao Brasil, o que contribuiu para a diversidade cultural que aqui se estabelecia. Os milhares de europeus e asiáticos que desembarcaram no país tiveram papel fundamental no crescimento da agricultura, da industrialização e da urbanização da nação.
Como parte das comemorações do centenário da Independência, em 1922, um evento organizado por um grupo de artistas e intelectuais paulistas e cariocas tornou-se o marco simbólico do Modernismo: a Semana de Arte Moderna. O objetivo do evento era renovar a produção artística brasileira, trazendo as propostas estéticas de vanguarda que vinham provocando, desde a primeira década do século, rupturas na arte nos países europeus.
A maioria desses artistas, originária da elite econômica do país, não queria apenas reproduzir os modelos artísticos da Europa no Brasil. Para eles, era fundamental voltar o olhar para nossa cultura e incorporar em suas produções as expressões linguísticas, visuais, sonoras e gestuais próprias do povo brasileiro, como as manifestações culturais rurais e regionais ligadas às origens indígena, africana e portuguesa da população.
Em 1924, Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral viajaram para o Rio de Janeiro, onde passaram o Carnaval, e, em seguida, para as cidades históricas de Minas Gerais.
A arquitetura colonial, a obra de Aleijadinho, o colorido das festas profanas e religiosas, bem como o ritmo das músicas e das danças populares sensibilizaram esses artistas.
Mário de Andrade empreendeu pesquisas etnográficas, visitando o Norte e o Nordeste do Brasil. O músico Heitor Villa-Lobos (1887-1959), que também participou da Semana de Arte Moderna, enriqueceu seu repertório ao entrar em contato com ritmos como a embolada, o coco, o lundu e o maracatu. A consolidação dessa brasilidade no ambiente cultural aconteceu, sobretudo, na música, com a consagração do Carnaval como a principal festa popular do país e com a chegada do rádio em 1922, que inaugurou a era da comunicação de massa. vanguarda: nesse contexto, propostas inovadoras, disruptivas, que estavam à frente de seu tempo.
Nessa pintura, a artista representa o manacá, árvore nativa da Mata Atlântica. A composição, caracterizada por formas geometrizadas e simétricas, apresenta sólidos roliços em tons de azul e rosa. As cores, inspiradas na estética popular, foram chamadas, mais tarde, de “cores caipiras”. Nas pinturas desse período, Tarsila realiza uma fusão da estética cubista com elementos da cultura popular brasileira.
AMARAL, Tarsila do. Manacá. 1927. Óleo sobre tela, 76 cm x 63,5 cm. Coleção Simão Mendel Guss, São Paulo (SP).
As Pesquisas Folclóricas, organizadas pelo Departamento Municipal de Cultura de São Paulo, buscavam coletar músicas, danças, e objetos característicos dos cultos afro-brasileiros e indígenas.
Grupo de cabaçal fotografado em abril de 1938, em Cajazeiras (PB), pela Missão de Pesquisas Folclóricas. Fotografia de Luís Saia.
AT¡v¡DaDe De SeNS¡B¡l¡ZAÇÃO Símbolos da brasilidade
Foram investigadas diversas obras e manifestações artísticas representativas do Modernismo no Brasil e analisado como esse processo buscou promover uma arte genuinamente brasileira. Partindo da noção de brasilidade, você vai, agora, compor um painel coletivo.
1. Feche os olhos e reflita sobre símbolos ou elementos que evoquem, em você, uma noção de brasilidade. Eles podem ser bem distintos, como objetos, lugares, eventos, ícones, imagens, frases, citações, canções, entre outros. Ou seja, qualquer elemento que, em sua opinião, expresse uma noção de Brasil hoje.
2. Providencie uma folha de papel sulfite e materiais de artes visuais para trabalhar nessa superfície (como lápis grafite, lápis de cor, caneta hidrográfica, tinta, papel picado, recortes de revistas, de jornais e de folhetos etc.).
3. Crie uma composição visual com os símbolos de brasilidade que você imaginou. Essa composição pode mesclar textos, desenhos e pinturas.
4. Organize-se com os colegas e, juntos, seguindo as orientações do professor, façam uma instalação coletiva das obras na sala de aula.
5. Com a instalação finalizada, escolham, coletivamente, um título para o painel.
6. Em uma roda de conversa, debata com os colegas a atividade realizada, partindo das questões a seguir.
• O que levou à escolha dos seus símbolos de brasilidade?
• O que chamou sua atenção nos símbolos e nas composições visuais desenvolvidos por seus colegas? Que diferentes noções de Brasil se expressam no painel?
Resposta pessoal. Solicite aos estudantes que qualifiquem os motivos para a escolha de determinada simbologia e que indiquem o porquê daqueles elementos evocarem uma noção de Brasil para eles.
Respostas pessoais. Compare as muitas simbologias em torno da ideia de Brasil presentes no painel, demonstrando a pluralidade de percepções e compreensões contidas na nossa noção de brasilidade.
Não escreva no livro.
ARTES ViSUAiS
CONTEXTO
Moderno e brasileiro
O carioca Di Cavalcanti (1897-1976) esteve à frente da organização da Semana de Arte Moderna, que ocorreu no Theatro Municipal de São Paulo. Na exposição montada no saguão do teatro, havia pinturas da paulista Anita Malfatti (1889-1964), do pernambucano Vicente do Rego Monteiro (1899-1970) e do próprio Di Cavalcanti, além de esculturas do ítalo-brasileiro Victor Brecheret (1894-1955), entre outros. Os artistas que se reuniram no evento rejeitavam o espírito conservador que tomava conta da produção artística no país.
Na Europa, os chamados movimentos artísticos de vanguarda propunham a ruptura com as formas do passado, trazendo novas soluções estéticas e sociais. Os grupos promoviam uma troca estética entre as linguagens: a poesia sofreu a influência da fotografia, a literatura foi afetada pela narrativa do cinema, e a arquitetura adotou princípios de composição da pintura. Nas artes visuais, a pesquisa de novas possibilidades da linguagem levou os artistas a se interessarem por uma arte não representacional, isto é, abstrata, que operava principalmente com formas, linhas, cores, texturas, pesos e volumes.
Depois da Semana de Arte Moderna, Tarsila do Amaral, que estava na França, voltou a São Paulo. Ela e Oswald de Andrade passaram a promover no Brasil, nos anos seguintes, as ideias da vanguarda europeia. Em 1928, Oswald publicou o “Manifesto Antropófago”, que propunha o conceito de antropofagia para descrever o processo de formação da cultura brasileira. Segundo o autor, aos brasileiros cabia “deglutir” a estética da cultura europeia e as influências culturais dos negros e dos indígenas para, com base nesse “banquete”, produzir algo genuinamente brasileiro.
Na década seguinte, o pintor Candido Portinari (1903-1962) se destacou pela crítica social e pela arte mural que realizou em edifícios públicos, que retratavam o povo, o trabalho e os ciclos econômicos no Brasil.
CONeXãO
Moderno onde? Moderno quando?
Di Cavalcanti, idealizador da Semana de Arte Moderna, além de criar o cartaz e o catálogo do evento, participou da exposição com doze de seus trabalhos. Para saber mais sobre o evento e conhecer algumas das obras participantes, assista ao minidocumentário da exposição “Moderno onde? Moderno quando? A Semana de 22 como motivação”, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v= eI6Tv7n8B_w (acesso em: 20 set. 2024).
DI CAVALCANTI. Capa do catálogo da exposição Semana de Arte Moderna. 1922. Impressão sobre papel. Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo, São Paulo (SP).
REPERTORiO 1
A temática indígena na pintura moderna
MONTEIRO, Vicente do Rego. Atirador de arco. 1925. Óleo sobre tela, 65,7 cm x 82 cm. Museu de Arte Moderna Aloísio Magalhães, Recife (PE).
Ainda nos primeiros anos da década de 1920, Vicente do Rego Monteiro explorou, em suas obras, o uso de formas geométricas inspiradas nos achados arqueológicos da cultura marajoara. Em suas composições, notam-se a geometrização das figuras, o delicado jogo de luz e sombra que sugere volumes no plano da pintura e o uso das cores inspiradas nas cerâmicas ornamentadas dos povos que viviam na Ilha de Marajó.
Objeto cerâmico encontrado na Ilha de Marajó. As cerâmicas confeccionadas por povos que ali viveram entre os anos 400 e 1400 apresentam elaborados sistemas gráficos.
Na pintura, Rego Monteiro associa a temática indígena a uma linguagem moderna, usando composição simétrica, formas geometrizadas e efeitos de luz e sombra para enfatizá-las.
No Brasil, o Modernismo não se limitou a São Paulo. Artistas ligados à elite pernambucana, como Cícero Dias (1907-2003) e os irmãos Joaquim (1903-1934) e Vicente do Rego Monteiro, trouxeram ideias modernistas da Europa para o ambiente intelectual efervescente de Recife.
TANGA com motivo decorativo em vermelho sobre branco. [ca. 4001400]. Cerâmica pintada, 11,5 cm x 13,8 cm x 0,8 cm. Museu Histórico Nacional – UFRJ, Rio de Janeiro (RJ).
1. Ambos os trabalhos trazem formas simplificadas para os corpos, composição que valoriza as simetrias, o jogo de luz e sombra e as cores que variam entre o vermelho e o preto.
Observe as imagens, reflita sobre o Modernismo no Brasil e responda às questões a seguir.
1 O q ue há em comum entre a capa do catálogo da Semana de Arte Moderna e a pintura Atirador de arco, de Vicente do Rego Monteiro?
2 Por que a pintura de Vicente Rego Monteiro não pode ser chamada de representativa?
2. Porque se trata de uma pintura elaborada e construída com base em um projeto e não em uma cena observada pelo artista. A construção simétrica, os corpos que repetem suas formas, a posição do arco e o céu que envolve a cena, tudo foi organizado quase como uma ornamentação de um objeto ou estampa. Não escreva no livro.
1. Portinari usou formas figurativas e elementos geométricos, como planos de cores, para compor o afresco. A imagem mostra trabalhadores carregando sacas de café.
REPERTORiO 2
Muralismo
A série Ciclos econômicos do Brasil consiste em doze pinturas na técnica de afresco, em que Portinari trabalhou com tons sóbrios e formas geométricas, produzindo um inventário visual das principais atividades econômicas do país até aquela época.
PORTINARI, Candido. Café. 1938. Pintura mural e afresco, 280 cm x 298 cm. Mural da série Ciclos econômicos do Brasil. Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro (RJ).
No início da década de 1930, com a crise econômica causada pela quebra da Bolsa de Nova York, uma recessão espalhou-se por diversos países, provocando instabilidade política em todo o mundo. No Brasil, diante da crise social, os artistas voltaram seus interesses para a figura do trabalhador, tomando o sofrimento dos excluídos como elemento estético para suas obras. Em 1937, um golpe do presidente Getúlio Vargas instaurou o chamado Estado Novo, um período de governo autoritário que se estendeu até 1945. O Estado Novo, marcado por repressão e censura contra os que se opunham ao regime, no plano da política cultural, promoveu o sentimento de identidade nacional, valorizando aspectos que seriam as raízes culturais brasileiras. A obra de Candido Portinari e a temática explorada pelo artista foram incorporadas à construção desse sentimento de identidade nacional. Nascido em uma fazenda de café no interior de São Paulo, filho de imigrantes italianos, o artista adotou a pintura muralista, seguindo a tendência, então internacional, à monumentalidade. Produziu diversas obras para o governo, realizadas com diferentes técnicas, como afresco e mosaico de azulejo. Nelas o artista concebeu uma imagem idealizada do povo brasileiro, representando figuras como a do negro e a do mestiço com físico robusto e disposição heroica para o trabalho.
2. As figuras representam pessoas fortes. Por meio de suas roupas, o pintor procurou caracterizá-las como trabalhadores de um importante ciclo econômico do Brasil.
pintura muralista: grandes painéis que consistem em pinturas figurativas com temática histórica ou épica.
Observe o painel apresentado nesta página e responda às questões a seguir.
1 Que elementos o artista utilizou em sua composição?
2 Como são as figuras humanas representadas no painel?
3 Em sua opinião, esse painel contém elementos representativos da identidade nacional do Brasil?
3. Resposta pessoal. Comente com os estudantes que, nos anos de 1930, Portinari se empenhou em representar elementos da identidade brasileira por meio desses painéis. Identidade, no entanto, é um conceito historicamente definido, móvel, não sendo possível fixá-la no tempo. Hoje, entende-se que a visão de Portinari era externa e idealizada.
Não escreva no livro.
REPERTORiO 3
Surrealismo
Durante as décadas de 1930 e 1940, alguns artistas brasileiros se interessaram por questões relacionadas à mente, aos sonhos e ao corpo. Influenciado pelos estudos da psicanálise, o pintor paraense Ismael Nery (1900-1934) produziu trabalhos que se aproximavam do Surrealismo, movimento artístico surgido na França em 1924.
Os surrealistas usaram a poesia, a colagem, a pintura, a escultura, a fotografia e o cinema para subverter a cultura e apresentar o mundo sob um novo e surpreendente olhar. Encadeando situações incompatíveis, esses artistas promoviam, com seus trabalhos, uma espécie de choque conceitual.
As atividades surrealistas envolviam uma série de técnicas para liberar o fluxo do irracional e do inconsciente, tais como a análise de sonhos, a livre associação de palavras, a escrita automática e os transes hipnóticos. O objetivo era ajudar as pessoas a encontrarem a “surrealidade”, ou seja, aquilo que está além da estreita noção do real.
Ismael Nery preferia apresentar-se como filósofo. Seus textos e imagens eram uma forma de traduzir ideias filosóficas, às quais chamou de essencialistas. Essas ideias estão expressas em suas pinturas, nas quais se observa um ser humano desvinculado de referenciais espaciais ou temporais. Assim, diferentemente da maioria de seus contemporâneos modernistas, a ele interessava o universal, e não o nacional ou o regional.
Ismael. Essencialismo. Óleo sobre tela, 72,3 cm x 37,5 cm. Coleção Particular.
Nessa pintura, o artista e poeta paraense Ismael Nery buscou expressar uma composição onírica. Em sonhos, pode-se experimentar a sensação de que as coisas e as pessoas se fundem ou trocam de lugar.
Não escreva no livro.
Observe a pintura de Ismael Nery apresentada nesta página e responda às questões a seguir.
1 Que elementos expressam aspectos do sonho?
2. Apesar de os símbolos se confundirem, como em um sonho, o arranjo da pintura é equilibrado e harmônico; há nuvens flutuando em um céu límpido e azul.
2 Que elementos trazem aspectos da vida real na pintura?
1. A figura humana na pintura está duplicada, como se houvesse um ser projetado pela consciência. Em sua composição, Nery traz elementos que podem tomar diferentes significados: a figura abraça uma forma orgânica brilhante que pode ser as vísceras como o pulmão e o coração, ou mesmo a alma, a dimensão invisível da vida.
NERY,
PESQUiSA
Centenário da Semana de Arte Moderna
Em 2022, comemoraram-se os 100 anos da Semana de Arte Moderna. Foi uma oportunidade para reflexões, debates e olhares atualizados sobre o evento no Brasil.
1. Houve um movimento moderno fora do eixo Rio-São Paulo?
• A exposição "Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil", promovida pelo Sesc 24 de Maio, em São Paulo, expande a percepção de arte moderna para diferentes regiões do país e para diversas linguagens, aproximando a cultura brasileira e as vanguardas modernistas. Assista ao vídeo dos curadores da exposição, disponível em: www.youtube.com/watch?v=gGCHorYfpVM&t (acesso em: 20 set. 2024).
Fachada da exposição "Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil". Sesc 24 de Maio, São Paulo (SP), 2022.
2. Onde estavam os artistas negros no Modernismo?
• Busque referências de arte moderna no Brasil que sejam pouco visibilizadas e discutidas. Muitos artistas modernistas consagrados faziam uma projeção da população negra em suas obras, ao passo que artistas negros, pouco valorizados à época, narraram sua própria história.
• Conheça as obras de Abdias Nascimento (1914-2011), que, além de ator, dramaturgo, diretor e ativista, foi também pintor. Ele questionou a arte moderna vinda da Europa, enfatizando o Modernismo Negro. Disponível em: https://ipeafro.org.br/acervo-digital/imagens/museu-de-arte-negra/obras-abdias-nascimento/ (acesso em: 20 set. 2024).
3. A Semana de Arte Moderna na atualidade.
• P rocure relacionar em qual medida o Brasil moderno de 1922 se associa, ainda hoje, com a vontade de fortalecimento de uma identidade brasileira em diferentes esferas da sociedade, considerando, principalmente, a importância da arte. Leia o texto “Uma semana que dura para sempre”, disponível em: https://jornal.usp.br/cultura/uma-semana-que-dura-para-sempre/ (acesso em: 20 set. 2024).
ALBERTO SILVA CERRI/SESC 24 DE MAIO
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Arte e geometria
Os artistas da vanguarda europeia, como os cubistas franceses, pretendiam quebrar a rigidez da perspectiva renascentista, que usava pontos de fuga definidos para criar a ilusão de espaço. Para isso, construíam o espaço tridimensional por meio da sobreposição de planos bidimensionais, multiplicando as possibilidades de entendimento da imagem.
O fato é que a arte moderna buscou livrar o artista do tema. Desse modo, muitas das obras produzidas no século XX consistem em jogos e combinações de elementos constitutivos do espaço, tais como formas, linhas, cores, texturas, pesos e volumes. Muitos artistas passaram a explorar procedimentos de composição, como repetições, simetrias, ritmo, cheios e vazios, claro e escuro, entre outros.
Elementos da composição abstrata
REPRODUÇÃO/ACERVO DE FAMÍLIA
Ritmo: em uma composição geométrica, o ritmo é marcado pela repetição de um elemento e suas variações.
SACILOTTO, Luiz. Permuta 2. 1954. Lito-offset sobre papel, 65,7 cm x 47,7 cm. Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, São Paulo (SP).
NASCIMENTO, Abdias. A criação n. 2: Obatalá e Exu. 1973. Acrílica sobre tela, 152 cm x 101,5 cm. Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ).
Cheios e vazios: a percepção de cheio e vazio pode ser criada por meio da presença ou da ausência de matéria ou do contraste entre o escuro e o claro.
WEISSMANN, Franz. Espaço circular em cubo virtual. [entre 1957 e 1978]. Tinta industrial sobre aço, 301 cm x 300 cm x 300,5 cm. Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ).
Simetria : propriedade geométrica em que elementos visuais são repetidos, movidos ou transformados, mantendo-se as formas e a dimensão exatamente iguais. Simetria bilateral: duplicação de um elemento de modo espelhado, como visto na pintura de Vicente Rego Monteiro.
COLEÇÃO
Azulejos de papel AçÃO
Nesta ação, você desenvolverá módulos para um azulejo de papel e realizará uma intervenção gráfica, colando sequencialmente esses módulos de papel em uma parede, como se faz com azulejos de cerâmica.
Nesta proposta, podem-se combinar linhas, formas e cores para compor um painel no espaço escolar, em uma ação coletiva.
Na montagem final, os estudantes devem procurar criar algum tipo de continuidade entre os painéis criados, de modo que haja harmonia entre as partes.
1. Preparação
• Reúnam-se em grupos de três estudantes. Cada grupo deverá conceber um único módulo e criar algumas variações com base em transformações simétricas ou em mudanças de cores.
• C ada estudante do grupo pode elaborar um módulo diferente, mantendo algum elemento em comum com os demais, seja uma forma, seja uma cor. Depois, os integrantes devem estudar a montagem de um único painel, misturando os três módulos distintos.
• Outra possibilidade é cada estudante do grupo conceber um módulo diferente e montar um pequeno painel que será colado ao lado do painel do colega.
2. Elaboração
• Pr eparem os materiais necessários para a proposta: lápis, caneta preta, folha de papel sulfite e folha de papel quadriculado (para estudar as possibilidades de desenhos internos do módulo); régua, compasso (se forem usar formas circulares) e esquadro (se forem usar ângulos específicos); canetas hidrográficas ou tinta guache de duas cores, pincel, pano e água (para colorir os módulos).
• No papel quadriculado, desenhem, com o lápis, um quadrado de 10 cm x 10 cm e façam estudos, combinando formas geométricas dentro desse quadrado.
• Escolham o módulo que irão utilizar. Repitam o desenho do módulo escolhido em outro quadrado, recortem os dois e experimentem juntar as arestas para verificar se há pontos de contato entre os cheios e os vazios.
3. Ação
• Desenhem mais uma vez os módulos escolhidos, agora usando uma caneta preta em uma folha de papel sulfite branca. Se o projeto for fazer azulejos em preto e branco, preencham algumas partes com a cor preta. Se o projeto for fazer azulejos coloridos, façam apenas as linhas que definem o desenho.
• Em seguida, em uma máquina copiadora, façam pelo menos 12 cópias de cada módulo escolhido.
• Se optaram por algum elemento de cor no módulo, pintem esse elemento usando tinta guache ou canetas hidrográficas, nas 12 cópias. Nessa escolha, é importante lembrar as possibilidades de encaixe entre os módulos.
• Vocês podem diversificar a posição e a ordem das cores, fazendo uma variação da mesma imagem. Exemplo: uma figura amarela com o fundo violeta, em ara quebrar o ritmo da sequência, vocês podem inserir módulos somente
om outras formas pode tornar a composição mais complexaor fim, escolham a superfície que receberá a composição e colem os azulejos
onverse com o professor e os colegas sobre as dificuldades de se trabalhar em grupo e chegar a um consenso para a proposta. Comentem se alcançaram
onvidar outras turmas para uma apreciação guiada você el, ainda, dialogar sobre os objetivos da proposta, elencando a relevância
ANTONIO MALUF, O PROJETO
DANÇA
CONTEXTO
A dança chega à modernidade
As primeiras décadas do século XX trouxeram novas perspectivas também para a dança. O corpo e suas representações foram ressignificados por artistas de diferentes partes do mundo, que, em um contexto de velozes mudanças políticas, científicas e econômicas, fizeram emergir uma linguagem gestual apoiada na singularidade de cada projeto estético. Nos Estados Unidos, artistas como Doris Humphrey (1895-1958) e Martha Graham (18941991) contribuíram para o movimento conhecido hoje como dança moderna estadunidense. Na Alemanha, Mary Wigman (1886-1973), influenciada pelos ensinamentos de Émile Dalcroze (1865-1950) e de Rudolf Laban (1879-1958), criou, a partir de 1919, uma série de coreografias solo e de grupo, algumas apenas acompanhadas de percussão. O uso de máscaras e a ênfase em gestos de grande densidade, concentrados no alto do tronco, caracterizaram as coreografias daquela que foi pioneira da dança expressionista alemã. A dramaticidade da dança de Wigman realçou a dor e a opressão do período entre guerras. Essas duas correntes da dança tiveram forte influência na dança cênica brasileira. É importante ressaltar, porém, que a dança moderna estadunidense e a dança expressionista alemã não são homogêneas, uma vez que propostas artísticas e pedagógicas diversas constituem esses movimentos. E o mesmo conceito se aplica à dança moderna que se desenvolveu no Brasil.
Alunas da Escola de Dança de Mary Wigman, em Dresden (Alemanha), 1930.
REPERTORiO 1
A dança afro-brasileira de Mercedes Baptista
A origem do que se conhece hoje no Brasil como dança afro-brasileira está relacionada à vinda da dançarina estadunidense Katherine Dunham (1909-2006) ao país, em 1949. Mercedes Baptista (1921-2014), a primeira mulher negra a fazer parte do corpo de baile do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, entrou em contato com a técnica trazida por Dunham, baseada nas danças negras do Haiti, e passou a desenvolver sua própria pesquisa, que mesclou referências da dança moderna estadunidense com as de danças de matriz africana praticadas no Brasil. Em 1951, fundou o Ballet Folclórico Mercedes Baptista, um grupo formado por bailarinos negros que pesquisavam e divulgavam a cultura negra e afro-brasileira.
A dança de Mercedes Baptista era inspirada também nos rituais religiosos de matriz africana e nos movimentos e gestuais dos orixás, divindades do candomblé, religião afro-brasileira. Com isso, os movimentos nascidos da dança de orixás, por exemplo, ganharam os palcos. Suas propostas foram continuadas por seus alunos, que prosseguiram associando elementos de origem africana com elementos das danças clássica e moderna, criando uma linguagem cênica singular. Mercedes Baptista trouxe uma perspectiva afro-brasileira às técnicas da dança moderna no Brasil.
Não escreva no livro.
Com base nas informações lidas, reflita e responda à questão.
• Como o fato de ser a primeira bailarina negra no corpo de baile do Theatro Municipal do Rio de Janeiro pode ter impactado a vida profissional de Mercedes Baptista?
Ser a primeira e, naquele momento, a única bailarina negra do corpo de baile do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, composto de pessoas brancas, marcou a trajetória profissional de Mercedes Baptista. Conhecer o trabalho de Katherine Dunham, uma artista negra cuja proposta coreográfica articulava dança moderna e danças afrodiaspóricas, impulsionou Mercedes a desenvolver uma proposta cênica singular, colocando as danças afro-brasileiras em diálogo com sua experiência de balé e dança moderna.
Mercedes Baptista em 1955.
Mercedes Baptista em 2005.
REPERTORiO 2
1. Resposta pessoal. Caso haja dificuldade na leitura dos movimentos presentes na imagem, sugira aos estudantes que se coloquem de pé e, com a ajuda de um colega, reproduzam os movimentos sugeridos com o corpo.
A dança moderna expressionista de Nina Verchinina
CERBINO, Ana Beatriz Fernandes. Nina Verchinina e a dança moderna brasileira: o papel da crítica jornalística na formação de um pensamento em dança. 2003. Dissertação (Mestrado em Comunicação) –Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2003. Movimentos que mesclam técnicas de balé e de dança moderna. O alongamento e o fortalecimento das pernas são trabalhados por meio da sustentação e da tonicidade muscular realizadas com base no apoio da barra, enquanto o equilíbrio do corpo é buscado por meio das mudanças de direção do tronco.
Nascida na Rússia, Nina Verchinina (1910-1995) se instalou definitivamente no Rio de Janeiro em 1959, depois de viver em países em diferentes continentes. Em paralelo à sua carreira de coreógrafa e bailarina, tendo dançado, por exemplo, na importante companhia Ballet Russe de Monte Carlo, fundada pelo empresário russo Coronel Wassily de Basil (1888-1951) e pelo coreógrafo francês René Blum (1878-1942), ela criou uma técnica singular de dança moderna que se tornou referência para bailarinos e coreógrafos brasileiros nas décadas de 1960 e 1970.
Nina Verchinina desenvolveu um vocabulário próprio que sintetizou elementos de sua formação de artista, agregando movimentos de balé e das danças moderna norte-americana e expressionista alemã. Ela situava sua técnica como parte do que entendia como dança moderna expressionista. Para a artista, a dança não expressava apenas uma sequência de passos e era necessário que os bailarinos tivessem estrutura muscular e capacidade técnica para expressar seus sentimentos, finalidade principal de sua dança.
Observe, com atenção, as duas imagens e responda às questões.
1 Você consegue imaginar os movimentos indicados pelos desenhos da primeira imagem?
2 Algum dos movimentos mostrados se assemelha à posição da artista na fotografia? Não escreva no livro.
2. A terceira posição mostrada na primeira linha da primeira imagem se aproxima da posição de Nina Verchinina na fotografia, mas em sentido contrário, pois a figura representa o movimento com uma inclinação do tronco para a direita.
Nina Verchinina, 1951.
REPERTORiO
3
Mário de Andrade e as danças dramáticas brasileiras
ANDRADE, Mário
de. Danças dramáticas do Brasil. São Paulo: Livraria Martins, 1959. (Obras completas de Mário de Andrade, v. 3). Capa.
Mário de Andrade, 1928.
As artes cênicas não tiveram protagonismo na Semana de Arte Moderna de 1922. No caso da dança, por exemplo, há relatos de uma única e breve apresentação de Yvonne Daumerie (1903-1977), que, além de professora de violão, dava aulas de dança de salão, porém sem relevância na programação. No entanto, Mário de Andrade acabou por se tornar um nome de destaque também para a dança brasileira.
Escritor, professor, gestor público, musicólogo, folclorista e crítico de arte, em 1928, realizou uma viagem de pesquisa pelas regiões Norte e Nordeste do Brasil para conhecer e documentar tradições locais, com foco nas manifestações musicais e nas danças populares, o que influenciou profundamente suas pesquisas sobre a cultura brasileira. Como diretor do Departamento Municipal de Cultura de São Paulo, entre 1935 e 1938, coordenou a Missão de Pesquisas Folclóricas, que também documentou diversas manifestações artísticas pelo nordeste brasileiro.
Suas viagens e pesquisas ao longo das décadas de 1920 e 1940 resultaram em uma vasta coletânea de dados sobre músicas, danças e tradições populares. Esse material, organizado postumamente pela musicista Oneyda Alvarenga (1911-1984), resultou na publicação do livro Danças dramáticas do Brasil, em 1959.
Com base no que você leu, responda à questão.
• Em sua opinião, se as viagens de Mário de Andrade ocorressem nos dias de hoje, ele identificaria as mesmas danças e músicas que conheceu há cem anos?
Com o aumento da urbanização e a intensidade das trocas por meio tecnológicos, as danças e músicas ditas tradicionais, ainda que não tenham desaparecido, continuam se transformando e incorporando novas referências.
Não escreva no livro.
PESQUiSA
Mulheres da dança moderna
As artistas estadunidenses Loie Fuller (1862-1928), Isadora Duncan (1877-1927), Ruth Saint Denis (1879-1968) e Martha Graham e a alemã Mary Wigman são consideradas referências do nascimento da dança moderna. As razões para o fato de a gênese da dança moderna ser obra de artistas mulheres têm sido objeto de estudos e pesquisas. Alguns estudos sugerem que isso se deu, por exemplo, pela ligação entre os movimentos feministas, que também emergiram no início do século XX, e a primeira geração da dança moderna, no Hemisfério Norte.
No Brasil, a presença de artistas mulheres como pioneiras da dança moderna é evidente. A pesquisadora Cássia Navas (1959-) destaca a importância de artistas mulheres – a quem denomina “mães da modernidade” e “matrizes de inquietações e novidades” –para o desenvolvimento da dança moderna na cidade de São Paulo.
1. Como Isadora Duncan integrou vida e arte?
LECOMTE, Valentine. A d ança de Isadora Ducan. [ca. 1903-1927]. Estudos a lápis. Desenhos realizados durante recitais em teatros de Paris (França).
• Isadora Duncan, avessa às amarras impostas às mulheres e à própria dança no início do século XX, inovou ao dançar descalça, com túnicas soltas de inspiração grega e com movimentos que ela entendia como naturais e livres. Neste link , é possível assistir ao único e breve registro de Isadora dançando: www.youtube.com/watch?v=EdHiFMYUzkw (acesso em: 20 set. 2024).
• Pesquise na internet registros em vídeo de recriações de suas peças realizadas por outros bailarinos.
2. A trajetória de algumas artistas da dança que atuaram no Brasil no século XX influenciou profundamente os caminhos da dança até os dias atuais. Como suas contribuições como professoras, coreógrafas e bailarinas marcaram a Dança Moderna no Brasil?
• A d ançarina brasileira Chinita Ullmann (1904-1977) nasceu em Porto Alegre (RS) e mudou-se para a Alemanha para estudar com Mary Wigman, em Dresden. Em 1932, se instalou em São Paulo, onde abriu uma escola de dança moderna. Saiba mais sobre Chinita Ullmann em https://spcd.com.br/ en/verbete/chinita-ullman/ (acesso em: 20 set. 2024).
• Ma ria Duschenes (1922-2014) foi outra personalidade importante para a dança moderna no Brasil. Acesse a exposição virtual do Museu da Dança em www.museudadanca. com.br/maria-duschenes/#linha-do-tempo (acesso em: 20 set. 2024).
CARLETTO Thieben e Chinita Ullmann. 1926. 1 cartaz.
REPRODUÇÃO/ARQUIVO ISADORA DUNCAN
TEORiAS E MODOS DE FAZER
A análise do movimento por Rudolf Laban
LABAN, Rudolf. Esquemas 89 e 90. Coleção particular. Análises da dinâmica de movimentos de dança.
Rudolf Laban foi um dançarino, coreógrafo e teórico do movimento, cujas ideias e técnicas impactaram profundamente o desenvolvimento da dança ao longo do século XX, tanto na Europa quanto no Brasil. Suas ideias influenciaram, ao redor do mundo, tanto a dança moderna quanto a prática da análise do movimento em outras áreas.
Entre suas contribuições teóricas e práticas, destaca-se a teoria do espaço, denominada corêutica, que analisa a relação entre o movimento e a orientação direcional que um indivíduo efetua no espaço ao seu redor, incluindo linhas, dimensões, planos e níveis. Partindo da descrição do posicionamento das extremidades dos membros inferiores, superiores e da cabeça em relação ao centro do corpo (que permite descrever, por exemplo, que o membro superior direito de um dançarino se estende na direção baixo-direita), essa teoria permite compreender e descrever a trajetória espacial que as diferentes partes do corpo percorrem ao se mover.
Laban também se interessou pelas qualidades dos movimentos, propondo a teoria dos esforços (effort-study), que busca classificar os aspectos dinâmicos do movimento por meio de quatro fatores: peso, espaço, tempo e fluxo. Esses fatores são compreendidos com base em suas polaridades específicas – leve e pesado para o peso; direto e indireto para o espaço; lento e rápido para o tempo; contido e livre para o fluxo. A capacidade de analisar os movimentos de dança, descrevendo-os espacialmente e em suas qualidades expressivas, é ainda hoje uma importante ferramenta pedagógica, de análise do movimento e de criação para a dança.
Rudolf Laban, 1929.
AçÃO Dança coral
Membros da Escola Hertha Feist de Dança e Ginástica realizam exercícios rítmicos e de ginástica de acordo com os ensinamentos de Laban, em Berlim (Alemanha), 1927.
Inspirado pelos coros de música, Laban imaginou utilizar um princípio semelhante para criar danças comunitárias, como um coro de movimento. Para ele, a prática da dança coral era uma forma de reagir aos efeitos negativos da Revolução Industrial, por meio de um ato coletivo e criativo, estreitando laços de solidariedade e interdependência entre os participantes.
Nas danças corais, dançarinos amadores e profissionais se integram em um projeto comum. Essa prática foi posteriormente explorada por outros artistas da dança, como a estadunidense Anna Halprin (1920-2021). Alguns criadores de danças corais se inspiraram em temas da natureza, como as ondas do mar. Agora, você e os colegas irão trabalhar a escuta, o ritmo, a responsabilidade, a criatividade, a solidariedade e a consciência do corpo e do espaço por meio da dança.
1. Verbos dos temas da natureza
• Inspirando-se nas danças corais, reúna-se com os colegas para compor um grupo de 10 integrantes e identifiquem um tema da natureza que possa servir de inspiração, como o mar, o vento, uma floresta, o céu durante uma tempestade, um tornado etc. Decidam juntos o fenômeno que irão explorar nesse movimento coral.
• Se possível, pesquisem fotografias e assistam a vídeos que mostrem o tema escolhido.
• Observem os movimentos, buscando traduzi-los em verbos. Por exemplo, uma onda estoura na areia, as árvores da floresta balançam ao vento, uma ventania faz as folhas voarem em espiral ou se espiralarem. Façam uma lista com esses verbos.
2. E xplorando os verbos com o corpo
• Explorem com o corpo os verbos da lista. Como cada integrante do grupo pode fazer o movimento de uma onda que estoura na praia? E juntos? Como é possível, com todos juntos, mostrar o balanço das árvores da floresta? Explorem diversas possibilidades, individual e coletivamente.
• Lembrem-se de que não se trata de uma dança individual, mas em grupo, em que todos e cada um são responsáveis pela composição.
• Escolham três ações e explorem-nas, variando o fator tempo.
• E xperimentem realizá-las de modo lento e de modo rápido. Lancem mão dessas alternativas nas próximas etapas.
3. A ções em sequência
• Ordenem em sequência as ações escolhidas, decidindo qual será a primeira, a segunda e a terceira, e por quanto tempo o grupo irá explorar cada uma delas. Essa experiência pode ser acompanhada ou não de música.
• Uma vez decidida a sequência, escolham o local onde a dança coral irá acontecer, que pode ser ao ar livre, em um ginásio ou na sala de aula. Definam como o grupo irá ocupar o espaço e se, ao final, sairá do lugar ou ficará em uma forma estável.
4. E nsaio e apresentação
• Escolham um colega para ficar de fora, orquestrando os movimentos do grupo. Ele pode dar comandos vocais ou gestuais.
• Façam alguns ensaios para que cada participante do grupo consiga estar à escuta dos demais, do espaço e do tempo.
• Se possível, apresentem a dança coral para um público, que pode ser composto de outras turmas da escola, da comunidade escolar e familiares.
• Peçam a alguém que registre a dança em vídeo.
5. Avaliação
• Ao término da apresentação, reúnam-se com os espectadores e ouçam o que eles têm a dizer acerca da experiência.
• Depois, entre vocês, participantes, destaquem os pontos positivos e as dificuldades identificadas nesse processo de criação de uma dança coral.
CONTEXTO
Caminhos da modernização do teatro brasileiro
Dos artistas que realizaram a Semana de Arte Moderna, foi Oswald de Andrade quem posteriormente se aventurou pela linguagem teatral ao escrever três peças: O rei da vela (1933), O homem e o cavalo (1934) e A morta (1937). Seu esforço crítico, no entanto, ficou só no papel, pois, na época, essas peças não foram encenadas.
comédia de costumes: comédias que retratam, com humor, os tipos característicos de uma sociedade.
Na década de 1930, o teatro participava da cultura de massas que se formava no Rio de Janeiro e em São Paulo. Teatros lotados faziam sessões diárias – a população tinha o hábito de assistir a espetáculos! Duas vertentes principais, herdadas do fim do século XIX, dominavam a cena: a comédia de costumes e o teatro de revista.
Esses teatros eram mantidos com o dinheiro da venda dos ingressos. Para agradar aos espectadores e garantir o lucro, era comum que o teatro profissional repetisse fórmulas bem-sucedidas, e havia pouco espaço para experimentação. Isso explica por que as peças escritas por Oswald demoraram décadas para serem montadas.
Foi nos palcos do teatro amador que se deu a chamada modernização do teatro brasileiro. A figura do diretor foi fundamental nesse processo, somando-se ao desenvolvimento de uma dramaturgia nacional consistente, interessada em discutir a realidade social do país. A renovação empreendida pelo teatro amador pode ser organizada em três vertentes: o movimento carioca, em que se destacaram a companhia Os Comediantes, o Teatro Experimental do Estudante (TEB) e o Teatro Experimental do Negro (TEN); o movimento paulista, que culminou na criação do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC) e da Escola de Arte Dramática (EAD); e o movimento pernambucano, especialmente com o Teatro de Amadores de Pernambuco (TAP).
CONeXãO
Teatro de Amadores de Pernambuco
Criado em 1941, o Teatro de Amadores de Pernambuco mantém-se em atividade. Seu projeto artístico, como o dos demais grupos amadores da década de 1940, era realizar uma encenação de qualidade, partindo de dramaturgias estrangeiras reconhecidas. Foi essa prática que trouxe aos palcos brasileiros autores internacionais até então desconhecidos, como Oscar Wilde (1854-1900) e Tennessee Williams (1911-1983), entre outros.
O Teatro de Amadores de Pernambuco encena A casa de Bernarda Alba, de Garcia Lorca. Rio de Janeiro, na época, capital federal. Fotografia de 1953.
REPERTORiO 1
Teatro de revista
1. Os estudantes podem comentar a respeito do cenário grandioso, dos figurinos suntuosos e do elenco numeroso, com um grande corpo de baile. Abra espaço para que observem a imagem e comentem detidamente seus detalhes, pois se trata de uma fotografia com bastante informação visual.
Companhia de Revistas de Walter Pinto no espetáculo Ali Babá. Teatro Recreio, Rio de Janeiro, na época, capital federal. Fotografia de 1947.
O teatro de revista foi um gênero de teatro musicado muito importante para o desenvolvimento da linguagem teatral no Brasil. Recebeu esse nome porque as peças “passavam em revista” os fatos e acontecimentos do ano, em uma retrospectiva crítica e bem-humorada. Com lugar de destaque na diversão da população durante mais de um século, as revistas arrastaram multidões aos teatros e consagraram diversos artistas, como Grande Otelo (1915-1993), Dercy Gonçalves (1907-2008) e Aracy Cortes (1904-1985).
A primeira revista brasileira foi As surpresas do Sr. José da Piedade , de Justiniano de Figueiredo Novaes, que estreou no Rio de Janeiro em 1859. No início, os autores nacionais se inspiravam em modelos vindos da França e de Portugal. Aos poucos, a realidade brasileira tomou os palcos. As obras traziam sátiras políticas e sociais, e alguns atores e atrizes se especializavam em imitar personalidades políticas. Com a chegada da década de 1940, porém, sua inspiração mais crítica foi perdendo terreno para a valorização do deslumbramento. Espetáculos como os da companhia de Walter Pinto contavam com cenários grandiosos, ricos figurinos e corpos de baile com mais de 20 dançarinas. Cada ato se encerrava com uma cena de proporções monumentais, chamada apoteose. Tornou-se frequente a objetificação do corpo das atrizes e cantoras, também chamadas de vedetes.
Com base no texto e na imagem observada, responda às questões.
1 Que elementos teatrais descritos no texto podem ser reconhecidos na fotografia?
2 O teatro de revista deixou marcas na cultura brasileira. Você consegue relacionar alguma obra ou manifestação cultural contemporânea com o teatro de revista?
2. Resposta pessoal. É possível que os estudantes teçam relações entre o teatro de revista e o Carnaval, as escolas de samba, as produções da televisão brasileira (como programas de auditório em que há a presença de um corpo de baile), programas humorísticos em que políticos são satirizados, entre outros.
Não escreva no livro.
Teatro Experimental do Negro
O Teatro Experimental do Negro (TEN) foi criado em 1944 por Abdias Nascimento, escritor, artista visual, professor universitário e ativista no combate contra o racismo. A proposta do grupo era trabalhar a valorização social do negro no Brasil por meio da educação, da cultura e da arte, indo além do campo teatral. Maria de Lourdes Nascimento (1924-1995), assistente social, educadora, liderança negra, companheira de Abdias à época e cofundadora do TEN, atuou com afinco na alfabetização da comunidade negra, em um período em que os índices de analfabetismo no Brasil eram ainda muito altos.
Teatro Experimental do Negro em ensaio do espetáculo Sortilégio, 1957.
Nos palcos, o TEN buscava uma dramaturgia cujo foco fosse a cultura e as experiências de vida das pessoas negras. O grupo encenou peças de autores estrangeiros consagrados, como William Shakespeare e Eugene O’Neill (1888-1953), e fomentou a criação de dramaturgias brasileiras que discutissem o racismo. Um exemplo importante é a peça Sortilégio, de 1957, escrita pelo próprio Abdias. A peça estreou no Theatro Municipal do Rio de Janeiro: a ocupação daquele espaço elitizado por artistas negros era também significativa. O TEN participou da formação artística de atores e atrizes que marcaram a sua geração, como Ruth de Souza (1921-2019), José Maria Monteiro (1923-2010) e Léa Garcia (1933-2023).
Com um elenco composto de intelectuais, artistas, trabalhadoras domésticas, operários e moradores de favelas, todos negros, o TEN estreou mais de vinte peças, construindo espaço para a experimentação e para a afirmação da cultura afro-brasileira.
Converse com seus colegas sobre os temas a seguir.
1 Você conhece obras contemporâneas antirracistas? Se sim, quais?
2 Qual é a importância de existir um teatro brasileiro engajado na luta contra o racismo?
2. Resposta pessoal. Busque refletir, coletivamente, sobre o peso do racismo no Brasil e, se possível, retome os debates já realizados sobre o passado colonial brasileiro. A ideia é que os estudantes percebam o teatro como parte integrante dos embates culturais e políticos, no passado e no presente.
CONeXãO
Teatro negro e atitude
O teatro brasileiro contemporâneo tem se engajado em questões raciais e de identidade, utilizando o palco como espaço de denúncia, reflexão e transformação social. A companhia Capulanas de Arte Negra, originária da periferia de São Paulo, tem como objetivo dar voz e visibilidade às questões enfrentadas pela população negra no Brasil (especialmente as mulheres) por meio das artes cênicas. Saiba mais em https://capulanasciadeartenegra.com.br/ (acesso em: 20 set. 2024).
1. Respostas pessoais. Incentive os estudantes a trocarem referências de obras que façam parte de seu repertório. O professor pode contribuir para o debate mencionando o espetáculo Broken Chord (“Acorde Rompido”), citado no capítulo 2 deste livro; Gota d’Água {Preta}, que aparece no capítulo 3; e também suas próprias referências, enquanto docente. Aproveite para valorizar o universo cultural dos estudantes.
ARQUIVO NACIONAL, RIO DE JANEIRO, RJ
Não escreva no livro.
REPERTORiO 3
TBC: renovação estética e profissionalização
Durante a década de 1940, a indústria paulista ganhava força e, com ela, emergia uma burguesia urbana disposta a investir na criação de espaços culturais. Nesse contexto, o empresário Franco Zampari (1898-1966) projetou a construção do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), que foi inaugurado em 1948. Era uma casa de espetáculos para 365 espectadores, aparelhada com luz e som, salas de ensaio, ateliê de costura e marcenaria.
A ideia era dar seguimento à modernização da cena realizada pelos grupos amadores, mas, agora, em um esquema profissional, tornando o teatro uma mercadoria rentável. Foi contratado um elenco fixo de atores e atrizes, além de encenadores estrangeiros experientes, como Adolfo Celi (1922-1986), Gianni Ratto (1916-2005) e Ruggero Jacobbi (19201981), que traziam na bagagem pesquisas estéticas desenvolvidas na Europa.
Espetáculo A dama das Camélias, clássico de Alexandre Dumas Filho (1824-1895) encenado pelo TBC em 1951, com a atriz Cacilda Becker como protagonista.
No TBC, foram encenados grandes clássicos da dramaturgia internacional. Na imagem observada, Cacilda Becker (1921-1969) estrela A Dama das Camélias, um drama francês que põe em cena os dilemas éticos de um jovem de família abastada que se apaixona por uma cortesã.
Muitos foram os dramas montados pelo TBC. Nesse gênero teatral, a ênfase está na intersubjetividade, ou seja, na relação entre a subjetividade das diferentes personagens. Os protagonistas do drama são pessoas livres, capazes de tomar decisões e que vivem conflitos no âmbito de sua vida privada. O drama moderno se desenvolveu na Europa na metade do século XVIII, acompanhando a consolidação da burguesia, e reflete uma visão de mundo que valoriza o indivíduo.
Em 1964, o TBC fechou suas portas. Mas a estrutura desse teatro possibilitou a formação de toda uma geração de artistas brasileiros – atores, diretores, cenógrafos e figurinistas que deram novos passos em direção à consolidação de um teatro nacional.
Não escreva no livro.
Após a leitura anterior, reflita sobre o TBC por meio da questão a seguir.
• Qual foi a importância de se estabelecer um circuito de teatro profissional no Brasil?
Procure debater a ideia de sistema teatral, um circuito que incentiva a produção das artes cênicas em determinado território e concede sentido social ao fazer teatral. É interessante que os estudantes compreendam como a formação profissional dos diversos ofícios que a arte teatral envolve (atuação, direção, cenografia, figurino, sonoplastia, entre outros) é favorecida por uma estrutura bem estabelecida. Essa estrutura envolveu, no caso do TBC, um edifício teatral bem equipado, temporadas regulares com estreias frequentes e um público com o hábito de frequentar os espetáculos.
ACERVO
Elementos da encenação teatral
A encenação teatral trabalha com diversos elementos expressivos, que dialogam entre si e produzem sentidos. Tudo o que está em cena estabelece uma relação de significado com o texto teatral. Confira, agora, algumas áreas de trabalho que compõem a encenação.
1. A iluminação trabalha com o posicionamento das fontes de luz, as cores e as gradações de intensidade, que vão da completa claridade à sombra.
• C onfira entrevistas com diversos profissionais da luz, coordenadas pelos iluminadores Chico Turbiani e Guilherme Bonfanti. Disponível em: www.youtube.com/channel/ UCXkg9fxW8eYtfjug7FGMSyQ (acesso em: 20 set. 2024).
2. A cenografia é a arte de organizar o espaço de cena; ela cria o ambiente e interfere na movimentação do elenco. Em diálogo com a cenografia é concebido o figurino, os vestuários e adereços que o elenco irá vestir.
Os um e os outros, espetáculo teatral encenado pela Cia. Livre de Teatro em 2019, com luz de Cibele Forjaz e Matheus Brant.
• Navegue pela página de Flávio Império (cenógrafo, figurinista, encenador, arquiteto e artista visual) e conheça a seção que organiza seus trabalhos teatrais em cenografia e figurinos. Disponível em: http:// flavioimperio.com.br/area/468802 (acesso em: 20 set. 2024).
3. A sonoplastia organiza o conjunto de sons que compõe a peça – ruídos, músicas, canções.
• Ouça as canções do Grupo Galpão. Disponível em: https://open.spotify.com/artist/5uHHyr6SCoq d6RPH9Fp9Hg (acesso em: 20 set. 2024).
• Escute os álbuns da companhia teatral Estudo de Cena. Disponível em: www.estudodecena.com/ musica (acesso em: 20 set. 2024).
IMPÉRIO, Flávio. Projeto de cenário. Rouparia Peachum e Cia: elementos de cena. Detalhamento executivo. 1964. Nanquim sobre papel vegetal. Projeto de cenário para a Ópera dos três vinténs, 1964.
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Elementos da encenação teatral
Como já visto, a modernização do teatro no Brasil, encabeçada pelo teatro amador, foi marcada pela chegada da figura do diretor (ou encenador). Hoje em dia, parece óbvio que um espetáculo ou filme tenha direção, mas nem sempre foi assim. Nas comédias de costume, por exemplo, o que havia era o ensaiador, que organizava a cena com base em padrões já consolidados. Havia pouco espaço para pesquisa de linguagem.
Com o estabelecimento do diretor, passam a existir diversos caminhos possíveis para se chegar ao acontecimento teatral. São muitos os elementos que compõem um espetáculo – o jogo de cena entre atores e atrizes, a dramaturgia, o figurino, os adereços, a cenografia, a iluminação, a sonoplastia. O trabalho do encenador ou da encenadora é organizar a totalidade da cena, fazendo escolhas que possibilitem a interação entre os muitos canais expressivos.
Frequentemente, cada aspecto da encenação possui um artista responsável – o iluminador cuida da luz; o sonoplasta, da composição sonora e musical; o cenógrafo, da cenografia etc. O encenador deve, então, trabalhar em parceria com esses criadores, orientando o seu trabalho e, quando necessário, sugerindo modificações.
Assim, uma mesma dramaturgia pode ser montada de infinitas maneiras. Com base nas escolhas da encenação, novos significados e símbolos podem surgir.
Vestido de Noiva é uma dramaturgia de Nelson Rodrigues que foi encenada em 1943 por Zbigniew Ziembinski (1908-1978), com o grupo amador carioca Os Comediantes. O espetáculo é considerado um dos marcos da modernização da cena no Brasil.
O enredo da peça é simples:
Alaíde é atropelada, e seu marido casa-se com Lúcia, irmã da antiga esposa. A abordagem desse enredo, porém, é complexa, e se desenvolve em três planos: realidade, memória e alucinação. Essa dramaturgia ganhou a cena graças ao trabalho do encenador polonês Zbigniew Ziembinski, que, em parceria com o cenógrafo Santa Rosa (1909-1956), compôs o espaço cênico e a iluminação de forma a deixar nítidas as fronteiras entre os três planos.
Encenação da peça Vestido de noiva por Zbigniew Ziembinski, com o grupo Os Comediantes, 1943.
AçÃO Experimento cênico baseado em elementos da encenação teatral
Nesta ação, serão preparadas diferentes encenações para um mesmo texto teatral. Você trabalhará com um fragmento de Vestido de noiva, de Nelson Rodrigues.
Cena da peça
Vestido de noiva, de 2023, encenada pela diretora mineira Ione Medeiros com o grupo Oficcina Multimédia.
1. L eitura da dramaturgia
Faça uma primeira leitura coletiva para conhecer o trecho da dramaturgia. Uma pessoa lê a rubrica, que é a indicação cênica que está em itálico. Cada personagem será lida por um estudante: Pimenta, Redator, Carioca-repórter, Redator do Diário e Redator do jornal A Noite.
([…] Ilumina-se o plano da realidade. Quatro telefones, em cena, falando ao mesmo tempo. Excitação.)
PIMENTA – É o Diário?
REDATOR DO DIÁRIO – É.
PIMENTA – Aqui é o Pimenta.
CARIOCA-REPÓRTER – É A noite?
PIMENTA – Um automóvel acaba de pegar uma mulher.
REDATOR D’A NOITE – O que é que há?
PIMENTA – Aqui na Glória, perto do relógio.
CARIOCA-REPÓRTER – Uma senhora foi atropelada.
REDATOR DO DIÁRIO – Na Glória, perto do relógio?
REDATOR D’A NOITE – Onde?
CARIOCA-REPÓRTER – Na Glória.
PIMENTA – A assistência já levou.
CARIOCA-REPÓRTER – Mais ou menos no relógio. Atravessou na frente do bonde.
REDATOR D’A NOITE – Relógio.
PIMENTA – O chofer fugiu.
REDATOR DO DIÁRIO – O.k.
CARIOCA-REPÓRTER – O chofer meteu o pé.
PIMENTA – Bonita, bem-vestida.
REDATOR D’A NOITE – Morreu?
CARIOCA-REPÓRTER – Ainda não. Mas vai.
RODRIGUES, Nelson. Vestido de noiva: drama em três atos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2019. E-book. Localizável em: primeiro ato.
2. Divisão dos grupos e distribuição de funções
• Reúna-se com os colegas em grupos de quatro ou cinco integrantes distribuindo as personagens entre vocês e decidindo se haverá uma pessoa encenadora, alguém responsável por um olhar externo sobre a cena.
3. E xperimentação em cena
• Realizem uma leitura da dramaturgia conforme a distribuição de funções e, depois, compartilhem entre si as impressões que tiveram ao fazer a leitura e possíveis ideias de como a cena será realizada.
• Façam uma nova leitura do texto, desta vez, testando propostas de movimentação e ambientação do espaço de cena.
4. A profundamento em um aspecto da encenação
• Decidam, coletivamente, em quais elementos da encenação vocês gostariam de se aprofundar: figurino e adereços, cenografia, iluminação ou sonoplastia.
• Realizem experimentações ligadas ao elemento escolhido. Se decidiram pelos figurinos e adereços, testem diferentes peças de roupas e procurem uma concepção de cena – há uma cor dominante? Serão roupas contemporâneas ou devem parecer antigas? Como representar os telefones? No caso da cenografia, pode-se experimentar fazer a cena em diferentes ambientes, com cadeiras e mesas ou com os atores de pé, ou mesmo deslocar o local em que a plateia ficará para assistir. No caso da iluminação, é interessante jogar com luz e sombra, escolhendo o que a luz deve evidenciar e em que momento. E para a sonoplastia, é possível incluir ruídos, elementos de trilha sonora ou mesmo uma canção.
5. Ensaios
• Ensaiem a cena buscando relacionar as escolhas de atuação e de encenação.
• Encenador: você irá oferecer o seu olhar de fora da cena para comentar e sugerir quais escolhas podem ser melhores ou mais interessantes. Durante as repetições, você pode fazer sugestões concretas ao elenco. Por exemplo: vista o casaco nesse momento; experimente sentar-se na cadeira durante essa fala; caminhe em direção à fonte de luz; movimente-se no ritmo da música que está tocando ao fundo.
6. Apresentação
• Quando todos estiverem prontos, é hora de apresentar a cena e aproveitar para assistir o trabalho dos colegas!
7. Avaliação coletiva
• Terminadas as apresentações, compartilhe suas impressões com os colegas. Comente a sensação e as características de cada função (atuação e encenação). Perceba também como os diferentes elementos de encenação foram trabalhados e quais novos sentidos agregaram a cada cena.
PONTE PARA OUTRAS
liNGUAGENS ARTiSTiCAS
MUSiCA
O Modernismo de Villa-Lobos
O maestro e compositor Heitor Villa-Lobos foi uma personalidade de grande destaque na Semana de Arte Moderna de 1922. Sua música alcançou caráter universal ao conciliar células rítmicas e melódicas presentes na música popular com o universo da linguagem orquestral, o que promoveu o encontro entre as raízes brasileiras, a modernidade e a música de origem europeia. Entre suas influências destacam-se as rodas de choro emboladas, cocos, lundus e maracatus, e compositores como Claude Debussy (1862-1918) e Maurice Ravel (1875-1937).
Uma de suas obras mais conhecidas é Bachianas brasileiras, uma homenagem ao compositor alemão Johann Sebastian Bach (1685-1750). É possível traçar um paralelo entre a produção musical de Villa-Lobos e o gênero musical do choro, pois ambos representam a mistura de diferentes matrizes culturais em uma nova estética musical.
MUSiCA
O Modernismo negro de Pixinguinha
A recuperação da importância de personalidades como Pixinguinha (1897-1973) para a construção de um discurso sobre a modernidade brasileira é parte do processo de revisão histórica do Modernismo. Instrumentista, compositor, orquestrador e maestro, Alfredo da Rocha Vianna Filho, o Pixinguinha, destaque no gênero do chorinho, é um representante do discurso moderno de brasilidade.
Fundou o conjunto Oito Batutas, com o qual viajou para França, no bairro cultural de Montmartre. Com o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), esse bairro se tornou um local de encontro das diferentes matrizes africanas e diaspóricas por acolher ex-combatentes africanos e estadunidenses.
Em 1922, os Oito Batutas promoviam sua turnê europeia que rendeu uma linguagem musical com novos instrumentos, como o saxofone, o banjo e a bateria, além de elementos que foram incorporados a uma nova estética.
O maestro, compositor e músico Villa-Lobos. Pixinguinha, ao saxofone, com os Oito Batutas, 1923.
ARTES iNTEGRADAS
Artes gráficas e Modernismo
Os poetas e artistas que participaram dos movimentos de vanguarda na Europa, no início do século XX, se preocuparam em combinar o valor visual ao significado de seus textos. Algumas vezes, priorizaram a forma, ampliando as possibilidades semânticas do texto explorando a expressividade da tipografia trazendo uma dimensão visual da poesia.
O artista russo El Lissitzky (1890-1941), ao ilustrar o livro For the voice, do poeta russo Vladimir Mayakovsky (1893-1930), publicado em 1923, concebeu as páginas combinando letras de vários tamanhos, impressas em vermelho e preto. Na ilustração do poema da página 13, reproduzida a seguir, ele explorou as palavras do francês Mon, ‘meu’, e Mai, ‘maio’, em uma composição circular. O livro foi feito como um índice telefônico, exibindo, na margem direita, pequenos ícones que identificam cada poema.
MAYAKOVSKY, Vladimir. For the voice. Berlim: State Publishing House, 1923. p. 13. Ilustração de El Lissitzky para o poema de Vladimir Mayakovsky.
ARTES iNTEGRADAS
Artes gráficas e Modernismo no Brasil
Publicar uma revista foi a forma encontrada pelos artistas que participaram da Semana de Arte Moderna para continuar divulgando suas ideias. A Klaxon foi uma revista literária definida pelo escritor Paulo Menotti del Picchia (1892-1988) como “uma buzina literária”, e tornou-se um marco nas artes gráficas brasileiras.
KLAXON: mensário de arte moderna. Klaxon, São Paulo, n. 1, 15 maio 1922. Capa. Primeiro número da revista que circulou em São Paulo de maio de 1922 a janeiro de 1923.
O designer gráfico que se destacou no início do século XX no Brasil foi o carioca J. Carlos (1884-1950), responsável pela produção de semanários ilustrados como O Malho , Para todos e a primeira revista infantil do país, O tico-tico . Com seu desenho simples e suas personagens cheias de charme, J. Carlos foi um dos maiores cronistas visuais de sua época.
PARA TODOS. [S. n.], Rio de Janeiro, n. 427. 1927. Capa.
SiNTESE ESTETiCA
Antropofagia
Reflexão
Um dos grandes legados do movimento modernista no Brasil foi o conceito de antropofagia formulado por Oswald de Andrade. Muitos artistas contemporâneos continuam a “canibalizar” referências da história, de outros povos, da ciência ou da vida cotidiana, devolvendo algo novo e original.
A antropofagia, na formulação de Oswald, faz referência a um aspecto cultural de alguns povos indígenas que habitavam as Américas: o ato ritual de matar, assar e comer a carne dos inimigos para adquirir sua força. A metáfora criada pelo modernista de forma audaciosa valorizou o nativo que se rebela contra o colonizador. Trata-se de uma proposta de ataque. Por essa razão, o conceito oswaldiano tem sido retomado nas últimas décadas por intelectuais que desejam refletir sobre o país.
Leia, a seguir, fragmentos do “Manifesto antropófago”, escrito por Oswald de Andrade e publicado no primeiro número da Revista de antropofagia, em São Paulo, em 1o de maio de 1928.
Manifesto Antropófago
Só a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente.
Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz.
Tupy, or not tupy that is the question.
Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos.
Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago.
Estamos fatigados de todos os maridos católicos suspeitosos postos em drama. Freud acabou com o enigma mulher e com outros sustos da psicologia impressa. […]
O que atrapalhava a verdade era a roupa, o impermeável entre o mundo interior e o mundo exterior. A reação contra o homem vestido. O cinema americano informará. Filhos do sol, mãe dos viventes. Encontrados e amados ferozmente, com toda a hipocrisia da saudade, pelos imigrados, pelos traficados e pelos touristes. No país da cobra grande.
Tupy, or not tupy that is the question: apropriação da célebre frase “To be, or not to be: that is the question”, do dramaturgo inglês William Shakespeare, em Hamlet, que significa “Ser ou não ser, eis a questão”.
Cobra grande: na mitologia de alguns povos indígenas amazônicos, é o espírito das águas.
Foi porque nunca tivemos gramáticas, nem coleções de velhos vegetais. E nunca soubemos o que era urbano, suburbano, fronteiriço e continental. Preguiçosos no mapa-múndi do Brasil.
Uma consciência participante, uma rítmica religiosa.
[...]
Nunca fomos catequizados. Fizemos foi Carnaval. O índio vestido de Senador do Império. Fingindo de Pitt. Ou figurando nas óperas de Alencar cheio de bons sentimentos portugueses.
Já tínhamos o comunismo. Já tínhamos a língua surrealista. A idade de ouro.
Catiti Catiti
Imara Notiá
Notiá Imara
Ipejú.
[...]
Contra as sublimações antagônicas. Trazidas nas caravelas.
Contra a verdade dos povos missionários, definida pela sagacidade de um antropófago, o Visconde de Cairu: — É a mentira muitas vezes repetida.
Mas não foram cruzados que vieram. Foram fugitivos de uma civilização que estamos comendo, porque somos fortes e vingativos como o Jabuti.
Se Deus é a consciência do Universo Incriado, Guaraci é a mãe dos viventes. Jaci é a mãe dos vegetais.
Não tivemos especulação. Mas tínhamos adivinhação. Tínhamos Política que é a ciência da distribuição. E um sistema social-planetário.
As migrações. A fuga dos estados tediosos. Contra as escleroses urbanas. Contra os Conservatórios, e o tédio especulativo.
[...]
Antes dos portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade.
[...]
A alegria é a prova dos nove.
No matriarcado de Pindorama.
Contra a Memória fonte do costume. A experiência pessoal renovada.
Somos concretistas. As ideias tomam conta, reagem, queimam gente nas praças públicas. Suprimamos as ideias e as outras paralisias. Pelos roteiros. Acreditar nos sinais, acreditar nos instrumentos e nas estrelas.
Contra Goethe, a mãe dos Gracos, e a corte de dom João VI.
A alegria é a prova dos nove.
[...]
Contra Anchieta cantando as onze mil virgens do céu, na terra de Iracema — o patriarca João Ramalho fundador de São Paulo.
A nossa independência ainda não foi proclamada. Frase típica de dom João VI: — Meu filho, põe essa coroa na tua cabeça, antes que algum aventureiro o faça! Expulsamos a dinastia. É preciso expulsar o espírito bragantino, as ordenações e o rapé de Maria da Fonte.
óperas de Alencar: refere-se à ópera O guarani, do compositor Carlos Gomes (1836-1896), cujo libreto foi escrito com base no romance indianista de José de Alencar. Em ambos, o herói indígena, Peri, tem atitudes cavalheirescas semelhantes às dos senhores portugueses.
Catiti Catiti: poema em língua indígena que, pelo apelo sonoro e lúdico, se aproxima da estética surrealista.
Iracema: nome da protagonista do romance homônimo de José de Alencar, que, com O guarani, tornou-se símbolo de brasilidade durante o Romantismo.
Entre os aspectos do manifesto que podem ser relacionados à pintura da Tarsila, destaca-se a valorização de elementos das culturas indígenas, como as relações que eles mantêm entre si (caracterizadas pelo igualitarismo), com a natureza e com o sobrenatural. Trechos que exemplificam: “O que atrapalhava a verdade era a roupa, o impermeável entre o mundo interior e o mundo exterior. [...]”; “Filhos do sol, mãe dos viventes. [...] No país da cobra grande”; “Já tínhamos o comunismo. Já tínhamos a língua surrealista. [...]”; “[...] Guaraci é a mãe dos viventes. Jaci é a mãe dos vegetais”; “Antes dos portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade”.
Contra a realidade social, vestida e opressora, cadastrada por Freud – a realidade sem complexos, sem loucura, sem prostituições e sem penitenciárias do matriarcado de Pindorama. Oswald de Andrade Em Piratininga Ano 374 da Deglutição do Bispo Sardinha.
(Revista de antropofagia, n. 1, ano 1, 1o de maio de 1928. São Paulo.)
ANDRADE, Oswald de. Manifesto Antropófago. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda europeia & modernismo brasileiro: apresentação e crítica dos principais manifestos vanguardistas. Rio de Janeiro: José Olympo, 2022. E-book.
Processo de criação coletiva
Ao contemplar essa estranha figura pintada por Tarsila, Oswald de Andrade chamou-a de Abaporu , que em tupi significa antropófago . A pintura inspirou a base teórica de um movimento artístico: a Antropofagia.
A antropofagia, hábito ritual de alguns povos indígenas de comer a carne dos inimigos, foi escolhido como um conceito que representa o ato de canibalizar e deglutir as referências artísticas e culturais, tanto estrangeiras como, especialmente, as nacionais, para, com isso, gerar uma arte brasileira autêntica e não colonizada.
AMARAL, Tarsila do. Abaporu, 1928. Óleo sobre tela, 85 cm x 73 cm. Museu de Arte Latino-Americana de Buenos Aires (Argentina).
Partindo dos trechos selecionados do “Manifesto antropófago” e da pintura Abaporu, você realizará um processo de pesquisa e criação artística, revisitando e atualizando as provocações modernistas. Para isso, reúna-se em grupos de seis a dez integrantes.
Análise e debate
Depois de ler o texto, reúna-se com os colegas e, juntos, pesquisem o significado das palavras e expressões que vocês não conhecem. Em seguida, faça mais uma leitura do manifesto antes de refletir e debater as questões a seguir.
• Qual é a sua compreensão do termo antropofagia? Por que ele foi escolhido para representar o movimento modernista pelo escritor Oswald de Andrade?
• Várias ideias expressas no “Manifesto antropófago” estão contidas também na pintura de Tarsila do Amaral, que ilustra esta seção. Quais delas você identifica?
• Que signos e elementos tipicamente brasileiros o manifesto evoca?
Tanto na forma do texto quanto no uso da linguagem e nas referências, o texto elenca diferentes elementos que evocam brasilidade: o uso da língua tupi em um poema; aspectos da mitologia indígena, como Cobra grande, Guaraci e Jaci; e a evocação da cultura popular brasileira, como o Carnaval.
Respostas pessoais. Espera-se que os estudantes observem que, por meio da ironia e do humor, o autor tece em seu texto uma crítica ao modo como o colonizador português tentou impor sua cultura aos povos indígenas e à representação do indígena, durante o Romantismo, como um herói épico europeu. O autor aponta, ainda, a falta de conhecimento do colonizador acerca da cultura indígena como razão para o insucesso de suas tentativas de impor a cultura europeia no país. E, finalmente, conclama os artistas a um ato de ataque à cultura europeia, deglutindo sem pudores sua estética para criar um mundo mais livre no matriarcado de Pindorama, visando construir um pensamento autêntico a respeito da cultura brasileira.
• O manifesto afirma que “A nossa independência ainda não foi proclamada”. Você concorda com essa afirmação? Por quê?
• Em sua opinião, o “Manifesto antropófago” ajuda a pensar a cultura brasileira hoje? Explique.
Respostas pessoais. Oriente os estudantes a refletir sobre as diferentes formas como a indústria cultural, marcadamente estadunidense, ainda influencia e domina o imaginário artístico e cultural brasileiro.
Anotem, no caderno, os tópicos principais desse debate, a fim de suscitar reflexões centrais que devem servir de base para o processo de criação artística do grupo.
Ideia disparadora e linguagens artísticas
Depois da conversa, ainda em grupo, pensem em como fazer uma síntese estética do debate realizado, ou seja, como transmitir as conclusões do grupo aos demais colegas da turma por meio de uma criação artística, como uma música, uma pintura, um poema, uma cena, uma performance, uma instalação.
Retome as ferramentas criativas trabalhadas ao longo deste capítulo ou rememore procedimentos artísticos trabalhados nos capítulos anteriores que possam apoiar a criação. Leve em consideração, também, as habilidades e os desejos artísticos dos integrantes do grupo, para compor a ideia central da obra coletiva.
Em um primeiro momento, deixem as ideias fluir, anotando todo tipo de sugestão dos integrantes. Depois, retomem as ideias e elejam a que parecer mais potente, chegando a uma ideia disparadora.
Partindo da provocação dos trechos selecionados do “Manifesto antropófago”, elaborem formas artísticas possíveis que se relacionem com o texto. Vocês podem selecionar trechos do manifesto para utilizar em uma transposição criativa para outras linguagens artísticas.
Também é possível compor um manifesto que expresse o que seu grupo pensa da arte e da cultura no Brasil de hoje, ocupando um espaço da escola ou realizando uma ação artística pública de divulgação.
Anotem a ideia disparadora e a(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Pesquisa, criação e finalização
Organize as etapas de criação do projeto artístico com base nas reflexões centrais, na ideia disparadora e na(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Caso a criação do grupo envolva apresentação ou encenação, lembrem de ensaiar o maior número de vezes possível, aprimorando o trabalho a cada repetição. Mesmo apresentações improvisadas exigem alguma forma de combinado e preparação. Não deixem que o processo de criação fique só na conversa, experimentem os elementos em cena.
Caso a invenção do grupo envolva uma exposição ou instalação, façam uma lista de tudo que será necessário providenciar, dividindo tarefas entre os integrantes do grupo.
Não existe uma fórmula para esse processo de criação. Cada grupo deve desenvolver suas etapas, estabelecendo critérios e tendo em vista a obra ou manifestação artística que se está concebendo.
Com o trabalho desenvolvido, chegou o momento de compartilhar com o restante da turma! Aproveite para apreciar a criação dos demais grupos.
Uma arte tropical
Para se contrapor ao cinema tradicional e renovar a linguagem cinematográfica brasileira, surge o Cinema Novo.
O diretor baiano Glauber Rocha (1939-1981) durante a filmagem do longa-metragem Deus e o Diabo na terra do Sol, no interior da Bahia, em 1964.
Fachada do Teatro de Arena de São Paulo (SP), 1958.
3. O longa-metragem Deus e o Diabo na terra do Sol, de Glauber Rocha, foi filmado no interior do estado da Bahia; o Teatro de Arena foi fundado em São Paulo; a imagem do livro mostra a construção do Congresso Nacional, em Brasília; o trabalho de Lygia Pape e o álbum de Nara Leão foram produzidos na cidade do Rio de Janeiro.
O Brasil constrói Brasília, a cidade do futuro.
MAGALHÃES, Aloísio; FELDMAN, Eugene. Doorway to Brasilia. Filadélfia: Falcon Press, 1959. Livro físico não paginado. Fotografia em alto-contraste impressa em sistema de litografia offset.
A arte neoconcreta extrapola o espaço do quadro.
Bossa nova, música intimista para expressar lirismo e poesia.
PAPE, Lygia. Livro da Criação (O homem descobriu o fogo). 1959. Guache e têmpera sobre cartão, escultura manuseável, 30,5 cm x 30,5 cm. Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia, Madri (Espanha). Obra que, com mais 16 pranchas de papel cartão pintado, compõe a obra Livro da criação (1959).
NARA. Intérprete: Nara Leão. Rio de Janeiro: Elenco, 1964. 1 LP. Capa do álbum Nara, primeiro trabalho em estúdio da cantora Nara Leão (1942-1989). Projeto gráfico do designer Cesar G. Villela (1930-2020).
Não escreva no livro. Considerando as imagens apresentadas nesta dupla de páginas, responda às questões a seguir.
1 Em que linguagens artísticas a nova arte dos trópicos foi expressa? Música, design gráfico, arquitetura, teatro, artes visuais e cinema.
2 Que materiais e técnicas podem ser observados nesses exemplos?
3 A que lugares do Brasil as produções mostradas estão relacionadas?
2. Fotografia em alto-contraste, tipografia, litografia, construção tridimensional com papel e filmagem em locação externa.
4 O que você sabe sobre os movimentos artísticos ocorridos nas décadas de 1950, 1960 e 1970 no Brasil?
4. Resposta pessoal. Os estudantes poderão mencionar músicos ligados ao movimento tropicalista, como Caetano Veloso (1942-), Gilberto Gil (1942-), Gal Costa (1945-2022) e Maria Bethânia (1946-), ou o arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012), que projetou diversos edifícios de Brasília, por exemplo.
MUSEU NACIONAL CENTRO DE ARTE REINA SOFÍA, MADRI, ESPANHA
Como a arte brasileira se projetou no cenário mundial?
Por meio da música, o Brasil passou a chamar atenção na cena cultural internacional na década de 1950. Um grupo de jovens músicos, entre eles o baiano João Gilberto (1931-2019) e o carioca Tom Jobim (1927-1994), reunia-se em torno da chamada bossa nova. Naquele momento, o país despontava também como espaço privilegiado para a experimentação das propostas arquitetônicas e urbanísticas modernas. O urbanista Lúcio Costa (1902-1998) projetou Brasília, a nova capital do Brasil, atraindo a atenção de intelectuais europeus que viram na cidade planejada uma possibilidade de concretizar a utopia modernista
Nas artes visuais, artistas ligados ao movimento neoconcretista, como Lygia Clark (1920-1988), Hélio Oiticica (1937-1980) e Lygia Pape (1927-2004), criavam uma arte sensorial que extrapolava os limites do quadro e da escultura. No teatro, havia um desejo de colocar a realidade do país em cena, e foi nesse contexto que, em São Paulo, surgiram dois grupos que marcaram a história das artes cênicas do Brasil: o Teatro de Arena e o Teatro Oficina.
Em Salvador, a presença da arquiteta italiana Lina Bo Bardi (1914-1992) e do músico alemão Hans-Joachim Koellreutter (1915-2005), somada à implantação de instituições como o Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO) e o Museu de Arte Popular da Bahia (MAP), contribuiu para fomentar um pensamento inovador. Dessa efervescência cultural, nasceu um movimento cinematográfico, o Cinema Novo, e começou a ser gestada uma revolução musical que marcaria o final da década de 1960, a Tropicália (ou Tropicalismo).
utopia modernista: concepções que surgiram no contexto do movimento moderno, no início do século XX, que propunham solucionar os problemas sociais e econômicos a partir do projeto urbanístico. Acreditava-se que, em uma cidade ideal, se estabeleceria uma sociedade mais justa. movimento neoconcretista: movimento artístico e literário que se organizou no Rio de Janeiro a partir da publicação, em 1959, do Manifesto Neoconcreto. O grupo de artistas, liderado pelo poeta Ferreira Gullar, se opunha ao racionalismo exacerbado da arte concreta e propunha a liberdade para experimentação e expressão da subjetividade.
O filme Rio, 40 graus apresenta a história de meninos que vivem nas favelas do Rio de Janeiro. O diretor Nelson Pereira dos Santos (19282018) rompeu com a estética do cinema estadunidense, então dominante, e abriu caminho para uma mudança radical no cinema nacional. O filme tornou-se referência para o movimento do Cinema Novo.
Frame do longa-metragem Rio, 40 graus, de Nelson Pereira dos Santos, 1955.
João Gilberto e Tom Jobim em frame do longa-metragem Copacabana Palace, do italiano Stefano Vanzina (1917-1988), 1962.
João Gilberto e Tom Jobim foram figuras centrais da bossa nova, gênero musical que surgiu em 1958 e desencadeou importantes mudanças na música brasileira. João Gilberto criou uma forma de cantar, tocar violão e marcar o ritmo muito concisa, e Tom Jobim compôs acompanhamentos instrumentais para as melodias cantadas. Associada à juventude e à modernidade, a bossa nova ganhou o mundo, sendo apresentada por músicos brasileiros no exterior e gravada por artistas internacionais.
AT¡v¡DaDe De SeNS¡B¡l¡ZAÇÃO Improviso musical coletivo
Recomenda-se realizar essa atividade em um espaço amplo da escola, como um teatro, auditório, quadra ou outro que possibilite montar uma grande roda com os estudantes.
As décadas de 1950, 1960 e 1970 foram muito importantes para o reconhecimento internacional da arte e da cultura brasileiras, e parte da identidade musical do país se consolidou nesse período. Agora, você e os colegas vão explorar a musicalidade por meio de um jogo de improviso sonoro.
1. Coletivamente, organizem o espaço para a atividade. Se o local de escolha for a sala de aula, afastem mesas e carteiras, deixando o ambiente o mais livre possível.
2. Todos os estudantes deverão formar uma roda e marcar uma pulsação com os pés, alternando um passo com o pé esquerdo e outro com o direito, marcando um andamento sem se deslocar.
3. Seguindo as orientações do professor, uma primeira pessoa deve propor um som que se repita, apoiado no pulso. Pode ser um som qualquer, capaz de ser emitido e repetido em looping, envolvendo palmas, batidas no corpo, vocalizações, cantos, entre outros.
4. Quando a primeira proposta sonora estiver estabelecida, uma segunda pessoa da roda deve propor um som em composição com o primeiro, e assim por diante, até toda a turma contribuir com seu som para a música improvisada coletiva. Repitam a dinâmica de acordo com as orientações do professor.
5. Terminadas as experimentações, façam uma reflexão coletiva sobre a atividade, tendo como provocação as seguintes perguntas:
Respostas pessoais. Peça aos estudantes que descrevam como foi a experiência de participar do jogo musical, a maneira como desenvolveram a proposta e como a proposta dos colegas foi recebida.
• Como foi improvisar uma música coletiva? Quais foram as dificuldades encontradas ao propor um som? E ao compor com os sons dos colegas?
• A s sonoridades lembraram alguma música que você conhece?
Resposta pessoal. É possível que os estudantes utilizem o repertório cultural sonoro que possuem para propor as sonoridades do jogo, especialmente no momento temático, o que é excelente. Caso isso aconteça, peça que identifiquem essas referências.
REPRODUÇÃO/MAGNUN FILMES
CONTEXTO MUSiCA
Música popular brasileira: anos 1950, 1960 e 1970
Nos anos 1950, a televisão despontava como veículo de comunicação de massa, capaz de ditar modas e tendências. O modelo econômico e cultural estadunidense tomava o mundo de assalto: jazz, rock and roll e os filmes de Hollywood estavam por toda parte. No Brasil, a circulação de música aumentou, impulsionada pela tevê. Foi nesse contexto, em diálogo com estilos musicais estrangeiros, que surgiu a bossa nova, gênero musical que logo se internacionalizou. Nesse período, artistas e intelectuais buscavam novas formas de pensar a cultura brasileira e debatiam o papel da dominação cultural no estabelecimento da exploração econômica. Alguns artistas avaliavam negativamente a influência estadunidense no país, o que gerou o acirramento das críticas.
A defesa dos valores nacionais chegou a tal ponto que diversos artistas saíram às ruas no Rio de Janeiro na manifestação que ficou conhecida como “Passeata contra a guitarra elétrica”, em 1967. Um dos alvos das críticas nacionalistas era o movimento da jovem guarda, que tinha em Roberto Carlos (1941-) e em Erasmo Carlos (1941-2022) seus maiores representantes. Durante a ditadura civil-militar no Brasil, a resistência ao regime expressou-se por meio das canções de protesto que ganharam força nos festivais da canção promovidos por emissoras de televisão no Rio de Janeiro e em São Paulo. Esses festivais tinham forte apelo popular e expunham o clima de polarização do debate cultural.
No III Festival da Música Popular Brasileira, em 1967, os compositores baianos Gilberto Gil (1942-) e Caetano Veloso (1942-) apresentaram canções que despontaram como alternativa à dicotomia que se vivia à época, quebrando o antagonismo entre música de protesto e jovem guarda, fundando a Tropicália como nova estética musical que influenciaria diversas gerações.
Público assiste à escolha dos finalistas do I Festival Internacional da Canção de 1966 no ginásio do Maracanãzinho. Rio de Janeiro (RJ).
REPERTORiO 1
Bossa Nova
1. Observe os adjetivos que os estudantes utilizam para descrever a voz do cantor. Pode ser que surjam termos como bonita ou feia, mas insista para irem além e para que descrevam o que julgam ser possivelmente bonito ou não. Oriente-os a observar o volume da voz e a sua projeção e a perceber que a voz é um pouco anasalada e que não há terminações com melismas, como na música pop, por exemplo.
2. O arranjo inclui apenas voz e violão, o que descreve a tendência minimalista da bossa nova, que preza por poucos elementos musicais.
A bossa nova representou uma verdadeira revolução na forma de fazer música popular. A concepção musical dominante até então valorizava as grandes formações de bandas e orquestras, dando destaque à melodia. Por essa razão, os cantores tinham um papel fundamental, e suas interpretações comportavam grande virtuosismo vocal. Rompendo com esse padrão, a bossa nova propôs arranjos para voz e violão. O cantor integrava-se ao conjunto como mais um instrumento, e seu canto fluía muito próximo à fala.
O gênero surgiu na zona sul carioca, onde músicos se reuniam em pequenas festas sociais, como as que aconteciam no apartamento da cantora Nara Leão, para experimentar novas formas de tocar e cantar. Entre seus principais expoentes estavam João Gilberto, Tom Jobim e Vinicius de Moraes (1913-1980).
CHEGA de Saudade. Produção: Antônio Carlos Jobim. Intérprete: João Gilberto. Rio de Janeiro: EMI Odeon, 1959. 1 LP. Capa do primeiro álbum do compositor brasileiro João Gilberto.
A relação com a harmonia da música também mudou. Como consequência da aproximação com o jazz, com o bebop e com a música da vanguarda europeia – com a qual Tom Jobim estava bastante familiarizado – a bossa nova passou a valorizar harmonias complexas com sonoridades até então pouco exploradas na música brasileira. A batida do violão merece atenção especial, pois João Gilberto criou uma levada que gerava desencontros entre os acentos rítmicos e a melodia que era cantada. Até então, a bossa nova era uma maneira mais intimista e rebuscada de tocar o samba. Com a criação dessa forma de tocar violão e das composições do músico baiano, ela ganhou autonomia e se fixou como um novo gênero musical.
Não escreva no livro.
Faça uma busca na internet e ouça a canção “Chega de saudade”, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, interpretada por João Gilberto e lançada em 1959, para responder às questões a seguir. Como a voz de João Gilberto pode ser descrita?
Quais foram os instrumentos utilizados no arranjo musical?
CONeXãO
Os 60 anos da bossa nova
Em agosto de 2018, em comemoração aos 60 anos da bossa nova, uma emissora de rádio lançou um especial, em vídeo, em que grandes nomes da música narram histórias e curiosidades que marcaram esse gênero musical. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=zOz5pO90KPc (acesso em: 21 set. 2024).
REPERTORiO 2
Os grandes festivais e a jovem guarda
Da esquerda para a direita: Erasmo Carlos, Wanderléa (1944-), Roberto Carlos e o diretor Roberto Farias (1932-2018) durante a filmagem de Roberto Carlos e o diamante cor-de-rosa, em 1970.
Elvis Presley em concerto em Nova York (Estados Unidos), 1972.
No desenvolvimento do debate sobre novas formas de pensar a cultura no Brasil, muitos artistas se articularam no Centro Popular de Cultura (CPC), entidade fundada em 1961 no Rio de Janeiro, ligada à União Nacional dos Estudantes (UNE). O CPC defendia uma arte popular engajada com a revolução social, valorizando a expressão didática de conteúdos políticos que contribuíssem para a conscientização das camadas desfavorecidas.
Com o golpe de 1964, o CPC foi extinto, mas seu ideário persistiu. Em manifestações artísticas posteriores, compositores formados na época em que emergia a bossa nova intimista – como Edu Lobo (1943-), Chico Buarque (1944-) e Geraldo Vandré (1935-) – afastaram-se do estilo e da temática “bossanovista” e criaram canções de protesto com temas voltados para a injustiça social, as desigualdades regionais e a opressão política. Uma imagem recorrente nas canções desse estilo era a do “dia que virá” – uma idealização do amanhã como metáfora de tempos melhores do que os vividos durante a ditadura civil-militar.
Em oposição às músicas de protesto, a jovem guarda de Roberto Carlos e Erasmo Carlos se apresentava com roupas espalhafatosas, falava de “brotos”, “carangos” e aventuras amorosas em canções que flertavam com o rock internacional. Por essas razões, intelectuais, artistas e estudantes mais radicais consideravam o gênero uma expressão cultural a serviço do governo militar e um símbolo do que chamavam de “imperialismo ianque”.
1. O corte de cabelo e as vestimentas de Erasmo Carlos são bastante parecidos com os de Elvis Presley, o que demonstra uma inspiração para construir a estética da jovem guarda.
Observe as imagens, compare as vestimentas e os cabelos presentes na estética da jovem guarda com aquela traduzida nas roupas de Elvis Presley (1935-1977), músico e ator estadunidense considerado o rei do rock and roll , e responda às questões a seguir.
Quais são as semelhanças entre as roupas e os cortes de cabelo presentes nas fotografias?
Em sua opinião, a forma de se vestir e de se apresentar em público faz parte do estilo musical?
2. Um gênero musical é tradicionalmente definido por características como instrumentação, arranjo, harmonia, entre outras. No entanto, a partir da década de 1950, o mercado da indústria musical, especialmente na Inglaterra e nos Estados Unidos, passou a valorizar elementos extramusicais na caracterização de um estilo, tais como roupas, cortes de cabelo e o estilo de vida dos artistas. Assim, com a fetichização do produto musical, a forma como o artista se apresenta ao público e expõe seu modo de viver passou a fazer parte do gênero musical.
Não escreva no livro.
Tropicália ou Panis et circencis
Os compositores baianos Gilberto Gil e Caetano Veloso apresentaram as músicas “Domingo no parque” e “Alegria, alegria” no Festival da Música Popular Brasileira de 1967, fundando uma nova proposta estética para a música brasileira. A linguagem usada pelos compositores era extremamente inovadora para os padrões da época.
Caetano Veloso interpreta “Alegria, Alegria” no III Festival da Música Popular Brasileira em 1967.
De maneira geral, as canções de protesto privilegiavam o didatismo revolucionário e construíam narrativas em uma sequência lógica de causa e efeito. Já as músicas de Gil e Caetano, ao contrário, buscavam imagens visuais com cortes abruptos e recursos que as aproximavam da linguagem publicitária, dos gibis e do cinema.
Além de usar recursos literários inovadores para a época, eles também incorporaram a guitarra elétrica a seus arranjos – o que, embora os aproximasse da cultura pop, propunha um amplo diálogo com a música brasileira.
Essa abertura ao produto estrangeiro representou um passo importante na caracterização da Tropicália como movimento, possibilitando que se rompesse a barreira estabelecida pelo acirramento das críticas à dominação imperialista e, consequentemente, à absorção do que vinha de fora. O disco Tropicália ou Panis et circencis, lançado em 1968, é considerado o manifesto desse movimento.
Leia o fragmento da canção “Alegria, alegria” (1968), de Caetano Veloso.
O sol se reparte em crimes
Espaçonaves, guerrilhas
Em Cardinales bonitas
Eu vou
Em caras de presidentes
Em grandes beijos de amor
Em dentes, pernas, bandeiras
Bomba e Brigitte Bardot
O sol nas bancas de revista
Me enche de alegria e preguiça
Quem lê tanta notícia?
Eu vou
1. Note que Caetano Veloso sobrepôs imagens diferentes, que dão a impressão de que a personagem está passando os olhos pelas diversas notícias das publicações de uma banca de revistas. Assim, não parece haver um compromisso com o tempo da narrativa. Se possível, apresente aos estudantes a letra completa da música.
ALEGRIA, Alegria. Intérprete: Caetano Veloso. Compositor: Caetano Veloso. In: Caetano Veloso. Arranjos: Júlio Medaglia, Damiano Cozzella e Sandino Hohagen. Rio de Janeiro: Philips Records, 1968. 1 LP, faixa 4.
Não escreva no livro.
Com base no trecho lido da canção, reflita sobre as questões a seguir.
O fragmento apresenta uma narrativa com início, meio e fim?
A personagem parece estar lendo manchetes de notícias. Quais poderiam ser essas manchetes?
E qual é a postura da personagem diante delas?
2. Proponha manchetes, como “Criminalidade aumenta na cidade”, “Corrida espacial lança mais uma aeronave no espaço”, dentre outras, e peça aos estudantes que imaginem visualmente a capa desse jornal. Em seguida, comente que a personagem sente preguiça diante das notícias, ou seja, há, por parte dela, um ar de descompromisso.
PESQUiSA
Outras bossas
O diálogo da música popular brasileira com as criações musicais estrangeiras expressou-se em estilos e movimentos de diferentes épocas, desde a bossa nova, passando pelo jazz e pelo rock. Faça um levantamento de algumas das trocas e influências que marcaram a história da música no Brasil.
1. Quais são as relações entre o jazz e a bossa nova?
• A bossa nova tomou tal dimensão internacional que muitos jazzistas estadunidenses se aproximaram do estilo e passaram a interpretá-lo. O saxofonista Stan Getz (1927-1991), por exemplo, produziu e participou do álbum Getz/Gilberto (1964), com João Gilberto, Tom Jobim e Astrud Gilberto (1940-2023). Busque na internet a versão de “The Girl From Ipanema” cantada por Astrud Gilberto.
GETZ/Gilberto. Intérpretes: João Gilberto, Stan Getz. New York, NY: Verve Records, 1964. 1 LP. Capa do álbum do compositor brasileiro João Gilberto e do saxofonista estadunidense Stan Getz.
2. Como a Tropicália absorveu e ressignificou os elementos culturais e políticos do contexto internacional?
• Faça uma busca na internet e ouça “Within You Without You”, do disco Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band (1967), dos Beatles. Esse disco influenciou a estética musical da Tropicália com arranjos ousados que incluem cítaras e violinos. A capa do álbum Tropicália ou Panis et circencis , projetada pelo artista plástico Rubens Gerchman (1942-2008), representa o manifesto tropicalista e dialoga diretamente com a capa do álbum dos Beatles.
SGT. PEPPER’S Lonely Hearts Club Band.
Intérpretes: The Beatles. Londres: Abbey Road Studios e Regent Sound Studios, 1967. Capa do álbum.
• Escute a música “Tropicália”, do álbum Caetano Veloso (1968). A canção traz um arranjo ousado criado pelo maestro Júlio Medaglia (1938-), que mistura elementos falados, cantados e sons ambientes e se tornou um símbolo do movimento.
• S aiba mais sobre a Tropicália e seus compositores no site http://tropicalia.com.br (acesso em: 21 set. 2024), que explora o universo dos festivais, da Tropicália e do contexto histórico do período.
TROPICÁLIA ou Panis et Circencis
Intérpretes: Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil, Nara Leão, Os Mutantes, Tom Zé, Torquato Neto, José Carlos Capinan e Rogério Duprat. Rio de Janeiro: Philips Records, 1968. Capa do álbum.
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Diálogos sonoros
Diariamente, afirma-se que é importante viver em harmonia com as pessoas. Nesse contexto, a palavra harmonia remete a uma situação de concordância e equilíbrio que exige uma série de regras para ser alcançada. Em música, o significado de harmonia não está muito distante desse conceito.
Imagine três cantores emitindo, simultaneamente, uma nota distinta. O resultado disso é um acorde, isto é, um conjunto de notas que são ouvidas ao mesmo tempo. Para que essas notas se combinem de forma equilibrada, algumas regras precisam ser observadas. Em música, o estudo da combinação das notas em um acorde é chamado de harmonia.
O conceito de harmonia se aplica também à progressão dos acordes durante a execução de uma música. Quando uma pessoa canta e se acompanha ao violão, ela está tocando a harmonia da música, ou seja, a sequência de acordes que sustenta e complementa a melodia vocal. A harmonia se refere, portanto, a notas tocadas em simultâneo, e isso pode ser feito por meio de um instrumento harmônico – como o violão ou o piano – ou de instrumentos melódicos – como a voz ou a flauta – emitindo notas simultaneamente.
Já a melodia pode ser compreendida como um conjunto de notas tocadas de forma consecutiva, ou seja, não simultânea, como fazem a flauta ou a voz. Porém, é complexo definir o que é uma melodia, porque as concepções mudam de acordo com as variantes históricas, culturais e sociais. Assim, o que é considerado melodia hoje talvez não o fosse há quinhentos anos, por não respeitar as regras estéticas vigentes à época.
Movimentar um som em diferentes alturas, explorando as possibilidades que a alternância entre sons graves e agudos pode oferecer, gera uma melodia. Duas ou mais melodias tocadas simultaneamente geram um contraponto, nome que se dá ao diálogo entre melodias distintas.
Amaro Freitas (1991-), reconhecido instrumentista brasileiro contemporâneo. Manaus (AM), 2023. O piano é um instrumento harmônico, mas pode executar melodias também, dependendo de como é tocado.
AçÃO Compondo melodias
Nesta ação, você irá experimentar a construção de melodias e harmonias. Para isso, você vai precisar de um piano virtual, que pode ser facilmente encontrado na internet. Acesse os sites e aplicativos com teclados digitais sugeridos a seguir.
• Site que permite marcar previamente as notas para depois tocá-las. Disponível em: www.musicca.com/pt/piano (acesso em: 21 set. 2024).
• Site que oferece a correspondência das notas do teclado virtual com aquelas do teclado do computador. Disponível em: https://virtualpiano.net (acesso em: 21 set. 2024).
• Aplicativo que pode ser baixado em smartphones e tablets de forma gratuita. Disponível em: https://play.google.com/store/apps/details?id=com.gamestar. perfectpiano&hl=en (acesso em: 21 set. 2024).
Depois de acessar um dos recursos indicados, a seguir, conheça o piano.
1. C riando melodias
O piano é um instrumento muito interessante para a musicalização.
Agora, experimente criar diferentes movimentos melódicos com o seu piano virtual. Comece por uma melodia ascendente, isso é, uma melodia que parte do grave para o agudo. Para isso, basta que escolha uma nota e siga uma ordem crescente a partir dela. Oriente-se, em seu piano virtual, como indicado a seguir.
A disposição linear das teclas do piano facilita a compreensão das alturas das notas.
O teclado do piano se organiza em notas brancas e pretas que se alternam. Há uma estrutura que se repete e que inclui um conjunto de duas notas pretas, um intervalo em que duas notas brancas se encontram, e depois mais três notas pretas, até que novas notas brancas se encontrem.
Após observar a organização do teclado do piano, localize, no seu piano virtual, a nota dó, seguindo o exemplo da imagem. Ela está identificada como nota 1.
JOANA RESEK
JOANA RESEK
Procure usar, ao menos, cinco notas na sua melodia e lembre-se de que não precisam ser notas seguidas. Experimente algumas combinações e, em um papel, anote aquela de que mais gostou e registre a numeração que usou ou o nome das notas.
Exemplo de melodia ascendente:
3 (mi) – 5 (sol) – 6 (lá) – 7 (si) – 2 (ré)
Perceber a variação de grave e agudo auxilia a composição de melodias.
2. C ompartilhando melodias
A altura das notas está relacionada a percepção de grave e agudo.
Agora, experimente uma melodia descendente , ou seja, que parte do agudo para o grave. Escolha uma nota e siga uma ordem decrescente a partir dela, usando ao menos cinco notas. Novamente, experimente algumas combinações e faça seu registro.
Exemplo de melodia ascendente:
3 (mi) – 2 (ré) – 1 (dó) – 6 (lá) – 5 (sol)
Junte-se a um colega para experimentar alguns movimentos de contraponto, ou seja, o diálogo entre as melodias. Vocês podem tocar cada um o seu teclado ou compartilhar um.
• Apresentem a melodia ascendente um para o outro e, em seguida, toquem as melodias em simultâneo. Façam o mesmo processo com a melodia descendente que criaram.
• Em uma etapa seguinte, uma pessoa da dupla deve tocar a sua melodia ascendente enquanto a outra tocará a sua melodia descendente. Por fim, invertam os papéis: quem tocou a ascendente toca sua descendente e vice-versa.
3. Papo de compositor
O foco da atividade não é o ritmo da melodia, mas a percepção das notas tocadas ao mesmo tempo. Assim, peça aos estudantes que, mesmo que tenham criado ritmos diferentes para suas melodias individuais, executem o mesmo ritmo para que ouçam as notas em simultâneo.
Ainda em duplas, converse com o colega sobre as melodias criadas.
• Qual foi a combinação de melodias que mais o agradou e por qual motivo?
Resposta pessoal.
• Houve estranhamento na combinação de alguma das melodias? Alguma nota soou esquisita junto de outra?
Existem intervalos musicais que são percebidos como consonantes e outros como dissonantes; isso se relaciona a fatores harmônicos e culturais. Ainda que essa teoria não seja abordada na atividade,
peça aos estudantes que procurem explicar a sensação que há na combinação de uma melodia ou de outra. O exercício de elaborar essa escuta e explicá-la verbalmente faz parte do refinamento da percepção sonora.
JOANA RESEK
JOANA RESEK
CONTEXTO TEATRO
A realidade brasileira em cena
A efervescência social e política da década de 1950 e do início da década de 1960, no Brasil, alcançou também os artistas teatrais. Em 1953, um grupo de jovens recém-formados na Escola de Artes Dramáticas (EAD) encontrou uma maneira econômica e artisticamente ousada de fazer teatro, utilizando o espaço cênico da arena, onde o público se senta ao redor do palco e os atores precisam representar para todas as direções. Surgiu assim a companhia Teatro de Arena.
Com a entrada de amadores ligados ao Teatro Paulista do Estudante (TPE), em 1955, o Teatro de Arena consolidava o caráter político que caracterizaria sua trajetória. Entre seus novos integrantes, estavam Oduvaldo Vianna Filho (1936-1974), Gianfrancesco Guarnieri (1934-2006) e Augusto Boal (1931-2009) – este último passou a fazer parte do grupo em 1956. Em 1958, o grupo criou o Seminário de Dramaturgia, espaço de experimentação da escrita teatral. Para eles, uma dramaturgia brasileira era o caminho para que os problemas de nossa população fossem debatidos no palco.
Ainda em 1958, o coletivo estreou a peça Eles não usam black-tie, de Guarnieri, que colocou em cena a vida de uma família que habitava uma favela. A peça expunha o debate de um pai e um filho operários sobre entrar ou não em greve: a urgência do tema fez da peça um sucesso. O Teatro Oficina, formado em 1958 e encabeçado por José Celso Martinez Corrêa (19372023), concentrou-se em pesquisar uma encenação brasileira. Junto com Zé Celso, estiveram artistas como Fernando Peixoto (1937-2012), Renato Borghi (1937-) e Esther Góes (1946-). Havia total interesse em aprender com artistas estrangeiros que traziam novidades na bagagem – o russo Eugênio Kusnet (1898-1975), por exemplo, trabalhou por anos no Teatro Oficina, após ter contribuído com o Teatro Brasileiro de Comédia (TBC) e o Teatro de Arena. Os integrantes do Oficina também viajaram para a Alemanha para estudar o teatro épico de Bertolt Brecht (1898-1956). Mas os artistas elaboravam essas influências e as transformavam para melhor expressar, por meio da encenação e da atuação, as dores e as delícias de se viver no Brasil. Na década de 1980, o grupo passou a se chamar Teatro Oficina Uzyna Uzona e se mantém ativo até hoje.
Gianfrancesco Guarnieri e Eugênio Kusnet em registro fotográfico da peça Eles não usam black-tie, 1958.
REPERTORiO 1
O Movimento de Cultura Popular e o Centro Popular de Cultura
O Movimento de Cultura Popular (MCP) foi criado no Recife (PE) em 1960, durante a prefeitura de Miguel Arraes (1916-2005). A proposta era oferecer à população marginalizada acesso à educação e à cultura, criando oportunidades para melhorar a vida das pessoas. A abordagem do MCP respeitava a realidade das pessoas, utilizando, na alfabetização, palavras que faziam parte da vida e do trabalho dos educandos e propondo atividades artísticas ligadas ao repertório dos aprendizes. Foi nessa ocasião que o educador Paulo Freire (19211997) sistematizou sua pedagogia. No campo do teatro, o dramaturgo Ariano Suassuna (1927-2014) – autor de Auto da Compadecida (1955), O Santo e a porca (1957), entre outras peças importantes – esteve entre os fundadores do MCP.
Em 1961, no Rio de Janeiro, foi criado o Centro Popular de Cultura (CPC), ligado à União Nacional dos Estudantes (UNE). Inspirado na experiência do MCP, o projeto buscava construir uma cultura nacional, popular e democrática. Artistas das diversas linguagens artísticas se reuniram ali e, além de peças de teatro, produziram livros de poesia, álbuns de música e filmes experimentais. Os espetáculos teatrais do CPC eram apresentados em portas de fábrica, favelas e sindicatos. A proposta era que os debates sobre a realidade brasileira fossem travados junto ao povo, e não em pequenos teatros frequentados apenas por uma elite intelectual. A ideia rapidamente se espalhou, e foram fundados CPCs em diversas cidades, como Belo Horizonte, Salvador e Porto Alegre. No entanto, essa efervescência foi interrompida pelo golpe civil-militar de 1964.
Peça A m ais-valia vai acabar, seu Edgar, de Oduvaldo Vianna Filho, encenada por Chico de Assis (1933-2015) em 1960. Essa foi a peça que deu origem ao projeto do Centro Popular de Cultura (CPC). Teatro de Arena da Faculdade de Arquitetura da UFRJ, Rio de Janeiro (RJ).
1. Respostas pessoais. É possível que as respostas revelem que boa parte dos brasileiros não tem a linguagem teatral como parte de seu cotidiano. Se isso acontecer, vale a pena aprofundar o debate sobre a questão do acesso a essa forma de arte.
Com base nesses estudos, reflita sobre as questões a seguir.
Não escreva no livro.
Você já assistiu a um espetáculo teatral? E seus amigos e familiares, costumam ir ao teatro?
Você conhece projetos que buscam ampliar o acesso da população brasileira à linguagem teatral e a outras manifestações artísticas? Qual é a importância dessas iniciativas, na sua visão?
2. Respostas pessoais. Caso a cidade em que os estudantes vivem disponha de projetos desse tipo, é interessante compartilhar com a turma informações sobre o circuito teatral disponível na região. Essa é uma oportunidade importante de promover o acesso dos estudantes a espetáculos de teatro e outros eventos artísticos. Caso a cidade não ofereça essas iniciativas, é possível problematizar o motivo dessa ausência.
REPERTORiO 2
Arena conta Tiradentes e o sistema coringa
Com o estabelecimento da ditadura civil-militar, a liberdade de expressão foi significativamente tolhida. O Teatro de Arena foi um dos grupos que manteve sua produção crítica, mas precisou lançar mão de metáforas para falar do presente sem sofrer censura.
Em 1967, o grupo estreou o musical Arena conta Tiradentes, que estruturava o sistema coringa. Nesse modo de fazer teatro (que teve seu embrião em 1965, com Arena conta Zumbi), os atores eram desvinculados das personagens e se revezavam em cada cena. Com isso, evitava-se a identificação dramática de um ator com determinada personagem.
O sistema coringa, proposto por Augusto Boal, podia ser aplicado a qualquer montagem. Entre as inovações que trazia estava a personagem Coringa, que cumpria uma função narrativa. Ela podia comentar a peça, fazer perguntas às personagens e até assumir um papel.
Enquanto as demais personagens de Arena conta Tiradentes se colocavam em uma situação ocorrida no passado (a luta pela liberdade durante a Inconfidência Mineira), o Coringa tinha a consciência de um cidadão do presente e conhecia a finalidade da obra. A luta do passado ajudava a pensar as dificuldades da resistência durante a ditadura. O Coringa também permitia que a obra transitasse entre os mais diversos estilos – melodrama, farsa, comédia etc.
Com base no que você leu, reflita sobre as questões a seguir.
O protagonista era interpretado de maneira realista, sempre pelo mesmo ator. As outras personagens eram divididas em dois coros: o que apoiava o protagonista e o que se opunha a ele.
Cena da peça Arena conta Tiradentes. Ao centro, David José (1942-) interpreta Tiradentes; à esquerda, Gianfrancesco Guarnieri comenta a cena como o Coringa. O coro cria uma narrativa coletiva.
Teatro de Arena Eugênio Kusnet, São Paulo (SP), 1967.
1 Você já assistiu a alguma obra em que o ator reveza entre diferentes personagens? Que sensação isso pode produzir no espectador?
2 Você conhece alguma obra que se passa no passado, mas consegue discutir os problemas do presente? Se sim, qual?
1. Respostas pessoais. Se possível, converse com a turma sobre a possibilidade de o espectador de uma obra desse tipo não se entregar completamente à identificação com determinada personagem. Isso será abordado mais adiante, ao se discutir o teatro épico.
2. Respostas pessoais. Procure valorizar o repertório dos estudantes. Falar de obras que eles conhecem pode ajudar a tecer relações com as formas teatrais em estudo.
Não escreva no livro.
REPERTORiO 3
O rei da vela do Teatro Oficina
Cena da peça O rei da vela, dirigida por Zé Celso. Teatro Oficina, São Paulo (SP), 1967.
A montagem de O rei da vela realizada pelo Oficina é considerada um marco da Tropicália.
EICHBAUER, Helio. Projeto cenográfico para o segundo ato de O rei da vela. 1967. Desenho do cenário da peça encenada pelo Teatro Oficina.
A dramaturgia de Oswald de Andrade, escrita em 1933, representava de maneira irônica a sociedade brasileira e rompia com padrões estéticos de um teatro tradicional. A radicalidade do texto não se enquadrou no teatro de seu tempo, e a obra só foi montada em 1967, com a direção de Zé Celso.
A dramaturgia expõe o panorama nacional após a quebra da Bolsa de Nova York, em 1929. Nela figuram os seguintes elementos: a burguesia ascendente, representada pelos personagens Abelardo I e Abelardo II, os novos-ricos, donos de uma fábrica de velas e de um escritório de usura; a antiga aristocracia rural do café em decadência econômica, representada por Heloísa de Lesbos e sua decrépita família tradicional; e a nova economia que dominava o Brasil, representada pelo Americano (nome do personagem na peça), um banqueiro estadunidense vindo de Wall Street.
A encenação do Oficina mesclava formas eruditas e populares. O primeiro ato foi montado em linguagem circense; o segundo, como teatro de revista; e o último ato evocava a ópera. A cenografia de Helio Eichbauer (1941-2018) acompanhava essas mudanças de linguagem. Na imagem, está seu desenho de cenário para o segundo ato: um telão pintado representando a Baía de Guanabara, inspirado nos quadros modernistas de Tarsila do Amaral e Lasar Segall. O ator Renato Borghi levou o deboche à cena, inspirado por cômicos populares como Oscarito (1906-1970) e Grande Otelo, na busca por uma atuação brasileira.
Depois de refletir sobre a encenação de O rei da vela pelo Teatro Oficina, converse com seus colegas sobre as questões a seguir.
1. Respostas pessoais. Procure tecer relações entre as obras mencionadas pelos estudantes e a peça O rei da vela
1 Você já assistiu a alguma obra que busca representar a sociedade brasileira? Se sim, qual?
2 Você identifica alguma particularidade na forma como os atores brasileiros interpretam suas personagens? Que diferenças podem ser notadas entre a atuação de artistas brasileiros e estrangeiros?
2. Respostas pessoais. Procure evitar que sejam reforçados estereótipos. A ideia é que a turma compreenda que a arte da atuação possibilita diferentes escolhas estéticas e métodos criativos. É interessante reforçar que os atores desenvolvem seu trabalho com base em pesquisas e experimentação; na década de 1960, o Teatro Oficina estava interessado em investigar uma atuação brasileira.
Não escreva no livro.
FOLHAPRESS
Teatro do Oprimido
O Teatro do Oprimido é uma abordagem teatral criada por Augusto Boal, formulada com base em suas vivências no Teatro de Arena e em seus experimentos teatrais pela América Latina e Europa durante o exílio imposto pela ditadura civil-militar. O método consiste em um conjunto de exercícios, jogos e técnicas teatrais elaborados com o objetivo de desenvolver o teatro como uma linguagem acessível aos trabalhadores e setores populares, tornando seu aprendizado e sua prática um instrumento de leitura e transformação da realidade. Seu pressuposto é o de que todas as pessoas podem fazer teatro. Para saber mais, você pode acessar as fontes a seguir.
1. De que modo o Teatro do Oprimido continua a ser utilizado como ferramenta de transformação social nos dias atuais?
• E xplore a página do Centro de Teatro do Oprimido (CTO) para conhecer suas iniciativas contemporâneas. Disponível em: www. ctorio.org.br/home (acesso em: 21 set. 2024).
• A ssista ao documentário Teatro das Oprimidas (2023) e procure analisar o impacto do método nas questões atuais de gênero e direitos sociais. Disponível em: www.youtube. com/watch?v=OB63MtgOwXg (acesso em: 21 set. 2024).
2. Instituto Augusto Boal.
• Busque, em redes sociais, a página do Jana Sanskriti Centre for Theatre of the Oppressed, que disponibiliza fotografias e vídeos de cidadãos indianos que criam cenas e danças em diálogo com as propostas de Augusto Boal. PESQUiSA
Nega ou Negra, peça de teatro fórum (uma das modalidades do Teatro do Oprimido) criada em 2015 pelo Coletivo Madalena Anastácia e apresentada no Centro de Teatro do Oprimido, no Rio de Janeiro (RJ), em 2024.
• Navegue pelo site do Instituto Augusto Boal e investigue como suas iniciativas atuais conectam o legado de Boal com questões emergentes. Busque refletir sobre a relevância do Teatro do Oprimido para movimentos sociais e culturais nos dias de hoje. Disponível em: http://augustoboal.com.br (acesso em: 21 set. 2024).
3. Jana Sanskriti Centre for Theatre of the Oppressed.
• Embora tenha nascido no Brasil, a influência do Teatro do Oprimido se expandiu globalmente, sendo adaptada a diferentes contextos culturais. O Jana Sanskriti Centre for Theatre of the Oppressed, na Índia, é um exemplo notável disso. O centro pratica e adapta o método de Boal para abordar questões sociais específicas da Índia, utilizando o teatro para fomentar diálogos e mudanças na comunidade.
Augusto Boal em evento de fundação da Federação Indiana de Teatro do Oprimido. Calcutá (Índia), 2006.
LUIS
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Teatro dramático e teatro épico
No capítulo 5, o drama moderno foi apresentado como um gênero teatral surgido na Europa, na metade do século XVIII. Sua base são as relações intersubjetivas, ou seja, o drama se dá entre consciências individuais. Na concepção do teatro dramático, as pessoas são livres, desejantes, capazes de agir para construir individualmente o próprio destino. O diálogo é o principal veículo do drama, revelando as disputas entre as vontades das personagens.
Sérgio Mamberti (1939-2021) e Ricardo Gelli (1977-) em cena do drama Visitando o Sr. Green. O cenário realista reproduz a sala de estar da casa do protagonista. A obra aprofunda os conflitos éticos da relação entre um senhor judeu recluso e um jovem executivo homossexual. São Paulo (SP), 2019.
O drama se tornou hegemônico, estabelecendo-se como o padrão narrativo no mundo ocidental e sendo reproduzido até hoje em peças, filmes, séries e novelas. No entanto, essa é uma forma narrativa mais adequada aos temas da vida privada, pois apresenta limitações quando se trata de representar processos coletivos. Ao abordar questões como a desigualdade social, por exemplo, o drama não é capaz de mostrar a estrutura que a produz, focando mais nos efeitos da miséria sobre os indivíduos. Além disso, esse gênero pressupõe indivíduos livres, ao passo que vivemos em um mundo no qual a estrutura social determina muitas decisões.
Para extrapolar essas limitações, criou-se o teatro épico. O alemão Bertolt Brecht foi um dos artistas que sistematizaram o teatro épico: uma linguagem cênica e uma dramaturgia interessadas em colocar em cena as contradições sociais e analisar processos históricos.
A forma épica tem esse nome por seu caráter narrativo. Nas montagens desse tipo, os atores não “desaparecem” por detrás da personagem – ao contrário, lembram aos espectadores que estão no teatro. Na imagem a seguir, a atriz austríaca Helene Weigel (1900-1971) realiza um grito mudo, ao interpretar a peça Mãe coragem e seus filhos, escrita por Brecht em 1941. O desespero da personagem se expressa nesse gesto sem som, causando um efeito de estranhamento.
Por seu interesse em discutir a vida social, o teatro épico influenciou profundamente os artistas de teatro brasileiros, desde o final da década de 1950 até os dias de hoje.
Grito mudo de Helene Weigel, em atuação como protagonista da peça Mãe coragem e seus filhos, de Brecht, 1951.
AçÃO Fazendo cena
Agora, você e os colegas vão criar cenas dramáticas e cenas épicas para experimentar, na prática, essas duas formas teatrais.
1. Preparação
• Reúnam-se em grupos de quatro estudantes. Cada grupo irá escolher o gênero que pretende trabalhar.
• Os grupos dedicados ao drama irão trabalhar o tema “conflito familiar”. Pode ser um desentendimento amoroso, um mal-entendido entre irmãos, um conflito entre gerações, entre outras possibilidades. A cena deve se passar no interior da casa da família.
• Já os grupos dedicados ao épic o irão trabalhar uma cena ligada ao mundo do trabalho. A profissão das personagens é de livre escolha dos estudantes.
2. Improvisos com base no tema escolhido
• Após a definição do tema, façam um levantamento de possíveis personagens para a cena e definam qual estudante irá experimentar cada papel.
• Improvisem variadas possibilidades de cena e procurem levantar diferentes caminhos antes de definir a estrutura final. A ideia é vislumbrar oportunidades dentro da lógica do gênero teatral escolhido. Para isso, procurem responder às questões a seguir.
1 No caso do drama: o que um familiar precisa decidir? O que diz ao outro no momento do conflito? O que desejam as personagens? Como agem para realizar seus desejos? Como se transformam ao vivenciar o conflito?
2 No caso do teatro épico: de que forma as personagens vivem pressões ligadas ao mundo do trabalho? Como as escolhas da personagem refletem as condições em que ela vive? Como a personagem age de acordo com seu lugar social? De que forma a cena se relaciona com temas sociais do mundo contemporâneo?
3. Definição da estrutura da cena
• Em grupo, c omentem sobre as diferentes possibilidades que surgiram durante os improvisos. Avaliem qual caminho foi mais interessante.
• Feita essa opção, registrem o começo, o meio e o fim da cena. A ideia é que, mesmo havendo pequenas variações, o grupo consiga percorrer os aspectos fundamentais da cena proposta.
Imagem da encenação épica Uma leitura de búzios, dirigida por Marcio Meirelles. São Paulo (SP), 2022.
4. Trabalho sobre a atuação
• Experimentem atuar se relacionando com as premissas do gênero teatral escolhido.
• No caso do drama, busque se identificar com sua personagem. Investigue como ela se sente, quais são os seus desejos, como é instigada a agir. Observe também como as ações das demais personagens produzem efeitos sobre a sua personagem.
• Para a cena de teatro épico, pesquise os gestos sociais da personagem, as atitudes que revelam seu lugar na sociedade. É possível criar momentos de atuação em coro, formando um sujeito coletivo.
5. Trabalho sobre a encenação
• No capítulo anterior, foi estudado o conceito de encenação. Aproveitem para trabalhar um ou mais elementos dessa prática: cenografia, figurinos, sonoplastia, iluminação.
• Façam escolhas de encenação que aprofundem as características da forma teatral escolhida – drama ou épico.
• Ensaiem a c ena, incorporando um ou mais elementos de encenação escolhidos. Experimentem a organização espacial proposta, vistam peças de roupa, incluam ruídos, música ou canção, joguem com a luz e a sombra da cena.
6. Apresentação
• Após ensaiarem bastante, é hora de apresentar! Experimentem a sensação de ter sua cena assistida pelos colegas. Aproveite para fruir as criações dos demais grupos.
7. Avaliação
• Conversem sobre as sensações e os pensamentos provocados pelas cenas.
• Aproveitem para aprofundar os estudos sobre o teatro dramático e o teatro épico. Busquem perceber se houve diferenças entre os grupos que trabalharam o drama e os grupos que trabalharam o épico. Comentem a respeito dessas diferenças, do ponto de vista de quem criou as cenas e do ponto de vista de quem as assistiu.
Anote no quadro a sistematização feita pelos estudantes. Isso pode ajudá-los a perceber os conhecimentos construídos por meio da prática teatral.
Cena da peça Memórias de um cão, de 2015, do Coletivo Alfenim. O grupo paraibano de teatro trabalha com influências do teatro épico de Bertolt Brecht para debater a realidade brasileira.
ARTES iNTEGRADAS
CONTEXTO
Cinema Novo
No Brasil, o Cinema Novo surgiu no final dos anos 1950 e floresceu ao longo dos anos 1960 e 1970, representando um marco de transformação em relação ao cinema convencional. Surgido com a intenção de promover uma independência cultural e artística, o movimento buscou criar uma estética genuinamente brasileira, abordando temas que refletissem a realidade social do país, tais como a pobreza, a injustiça social, tensões políticas, e fez isso ao trazer para as telas uma visão dos conflitos de classe. Por esses motivos, se destacou pelas críticas às injustiças sociais e às desigualdades de direitos enfrentadas pela maior parte da população. Outro aspecto fundamental foi a concepção de filmes autorais e de baixo orçamento, que permitiam maior liberdade criativa e a expressão pessoal dos cineastas.
O Cinema Novo teve suas raízes no encontro de jovens cineastas no Rio de Janeiro, que compartilhavam e discutiam suas obras entre si, criando uma rede de colaboração e influência mútua. Os jovens cineastas acreditavam no cinema como instrumento de transformação social: por meio dele, seria possível mostrar as desigualdades sociais e conscientizar a população da realidade. Nesse contexto, o filme Cinco vezes favela (1962), dirigido por um grupo de cineastas, é considerado uma das obras inaugurais do movimento. Composto de cinco histórias curtas, cada uma dirigida por um diretor diferente, o filme oferece um retrato crítico das condições de vida nas favelas do Rio de Janeiro. O objetivo dessa produção era engajar o público, levando-o a refletir sobre as estruturas sociais. O cinema novo contribuiu para a formação de uma identidade nacional nas produções cinematográficas, sendo um movimento de resistência que buscou uma linguagem autêntica e que representasse o cinema brasileiro.
Frame do filme Cinco vezes favela, de 1962, com direção de Marcos Farias (1935-1985), Miguel Borges (19372013), Joaquim Pedro de Andrade (1932-1988), Carlos Diegues (1940-) e Leon Hirszman (1937-1987).
Pioneirismo e legado de Glauber Rocha REPERTORiO 1
A obra é considerada o marco do Cinema
O cineasta baiano Glauber Rocha foi uma figura central no Cinema Novo, destacando-se como um dos mais influentes representantes do movimento. Seu trabalho ainda hoje é referência para espectadores e estudiosos de diferentes áreas.
A experiência com o filme Terra em transe pode ser descrita como uma profunda análise da realidade política e social do Brasil daquele período. A trama traz diferentes personagens –militares, militantes, políticos e empresários –, todas envolvidas na disputa por poder.
O destaque do filme é o protagonista Paulo Martins, interpretado por Jardel Filho (19271983), um poeta e intelectual que vê seus sonhos revolucionários serem profundamente atingidos pelo golpe de Estado de 1964.
A narrativa de Paulo, situada no fictício país Eldorado, retrata um ambiente de embate entre o povo e o poder. O filme expõe o uso da força militar e a execução de políticos para calar vozes opositoras. Esses elementos são apresentados por meio de uma estética experimental, que enfatiza a sensação de transe para o espectador.
Não escreva no livro.
Diante das percepções acerca do filme, reflita e responda à questão a seguir.
• De que maneira a narrativa de Terra em transe refletiu o momento histórico que o Brasil vivia?
O filme apresentou, por meio das personagens e seus conflitos em um país inventado, aspectos relacionados ao período da ditadura civil-militar no Brasil.
Frame do filme Terra em transe, do diretor brasileiro Glauber Rocha, 1967.
Novo.
REPERTORiO 2
A jornada de um anti-herói
A produção do filme Macunaíma (1969), adaptação da obra homônima de Mário de Andrade, apresenta a saga de um anti-herói brasileiro nascido nas profundezas da mata virgem. Na versão cinematográfica, o personagem foi interpretado pelos atores Grande Otelo e Paulo José (1937-2021).
Entre os aspectos abordados pelo cineasta Joaquim Pedro de Andrade, destaca-se a reprodução de um ambiente simbólico que reflete a estrutura social do Brasil na década de 1960. O filme traz à tona a realidade conflituosa entre aqueles considerados mais fortes e os mais fracos, oferecendo uma crítica incisiva das relações econômicas e sociais da época.
A jornada de Macunaíma, desde seu nascimento, passa por uma série de situações inusitadas que refletem a formação do povo brasileiro: o personagem nasce negro, vive em uma aldeia próxima ao rio Uraricoera e torna-se branco ao se banhar em uma fonte de água mágica. O filme dialoga com a Tropicália ao transitar entre o popular e o erudito, em um tom irônico e provocativo. Quanto à sua estética, não há um estilo determinado e nem a preocupação em seguir as tendências artísticas tradicionais. De certa forma, Macunaíma simboliza alguém “devorado” pela própria sociedade.
2. Assim como o movimento cultural e artístico, o filme aborda um Brasil muito diverso, além do tom de paródia também presente em obras da Tropicália. Considerando o que leu sobre o filme Macunaíma, responda às questões a seguir.
1 Por que Macunaíma é considerado um anti-herói?
2 Quais são as possíveis aproximações entre o filme e a Tropicália? Não escreva no livro.
1. As características de Macunaíma contrastam com as dos heróis tradicionais. Ao invés de ser corajoso, virtuoso e moralmente exemplar, é preguiçoso, oportunista, egoísta e amoral. Ele age de acordo com seus interesses imediatos, sem seguir princípios éticos ou um código de honra. Essas características subvertem o conceito clássico de heroísmo e o transformam em um personagem ambíguo, que reflete as contradições e a complexidade do Brasil, sendo uma representação satírica do “herói sem caráter”, como foi descrito por Mário de Andrade.
Frame do filme Macunaíma, dirigido pelo cineasta Joaquim Pedro de Andrade, com a presença dos atores Dina Sfat, Jardel Filho e Grande Otelo, 1969.
REPERTORiO 3
Ganga Zumba: rei dos Palmares
Ganga Zumba (1964) narra a história de um grupo de negros escravizados que planejam sua fuga de uma fazenda de cana-de-açúcar rumo ao Quilombo dos Palmares. Interpretado pelo ator Antônio Pitanga (1939-) e dirigido por Cacá Diegues, o filme traz um recorte histórico, uma vertente do Cinema Novo, que desafia as narrativas tradicionais ao subverter as figuras tradicionais do herói e da vítima.
Nota-se ainda, no filme, um esforço nítido em recuperar a memória das personagens marginalizadas pela história, de modo a evidenciar suas próprias perspectivas – o que também pode ser observado em outras importantes produções dirigidas por Cacá Diegues, como Xica da Silva (1976) e Quilombo (1984).
A questão racial não foi negligenciada pelas reflexões instituídas pelo Cinema Novo. Os cineastas e críticos desse movimento questionavam os estereótipos e os papéis secundários destinados aos atores negros até aquele momento. Ganga Zumba é um dos exemplos da forma de representar a população negra brasileira que rompe com uma estrutura majoritariamente branca na representação cinematográfica.
É importante destacar que o Brasil das décadas de 1960 e 1970 vivia um período de tensões e transformações, incluindo a renovação do movimento negro e a maior valorização do dia 20 de novembro, data que marca a morte de Zumbi dos Palmares (1655-1695) e simboliza a luta pela resistência e liberdade da população negra.
GANGA Zumba: rei dos Palmares. 1964. Cartaz do filme dirigido por Cacá Diegues.
Considerando as perspectivas históricas representadas pelo Cinema Novo, responda à questão a seguir.
• Qual é a importância da inserção de personagens negras como protagonistas no cinema?
PESQUiSA
O audiovisual e suas possibilidades
A prática de narrar histórias por meio de imagens em movimento e sons começou a se estruturar em 1895, com a invenção do cinematógrafo, dispositivo movido a manivela que captava imagens para posterior projeção. No mesmo ano, em Paris, os irmãos Auguste (18621954) e Louis Lumière (1864-1948) realizaram a primeira exibição pública de cinema utilizando essa tecnologia.
Hoje, o conceito de linguagem audiovisual se expandiu, já que as telas estão presentes em diversos meios, como cinema, televisão, computadores e celulares. Isso nos permite explorar, de maneira mais ampla e profunda, o vasto universo dessa forma de comunicação.
1. Curadoria de referências audiovisuais na internet.
• Com o auxílio de sites e plataformas disponíveis na internet, faça uma pesquisa acerca do imenso acervo de filmes que marcaram diferentes épocas. Um exemplo é o filme Viagem à Lua , de 1902, do francês Georges Méliès (1861-1938), que se tornou referência para o audiovisual.
• No site Porta Curtas, é possível acessar alguns importantes curtas-metragens nacionais. Disponível em: https://porta curtas.org.br (acesso em: 21 set. 2024).
2. A presença feminina no cinema documental brasileiro.
• Há , no Brasil, uma forte presença feminina na produção e na direção de documentários. Muitos deles abordam temas importantes e que merecem ser debatidos coletivamente, como é o caso de Que bom te ver viva (1989), de Lúcia Murat, (1948-), que expõe situações de tortura vividas durante o período da ditadura civil-militar no país. Conheça um pouco mais da vida e da obra de Lúcia Murat. Disponível em: https://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa371773/lucia-murat (acesso em: 21 set. 2024).
3. Os festivais de cinema.
• Para ampliar seu repertório, faça uma pesquisa sobre a relevância dos festivais de cinema, como o É tudo verdade – evento anual dedicado exclusivamente ao formato documentário – e o Cine PE Festival Audiovisual. Disponível em: http://etudoverdade.com.br e https://festivalcinepe.com.br/ (acessos em: 20 set. 2024).
QUE BOM te ver viva. Direção: Lúcia Murat. São Paulo: Casablanca filmes, 1989. Capa do documentário com a atriz Irene Ravache (1944-).
Frame do filme Viagem à Lua, de Georges Méliès, 1902.
TEORiAS E MODOS DE FAZER
A linguagem do cinema
“Uma câmera na mão e uma ideia na cabeça.”
Glauber Rocha
A célebre frase de Glauber Rocha expressa o conceito central do Cinema Novo. Para os cineastas desse movimento, um filme começa com uma ideia principal – um tema pertinente, uma narrativa instigante – e pode ser realizado com os recursos disponíveis, sem a necessidade de grandes orçamentos e equipamentos de alto custo.
Os caminhos para transformar uma ideia em filme, no entanto, são inúmeros. Além de decidir o que será filmado, é importante pensar em como filmar. Um filme é uma obra audiovisual composta de uma sequência de imagens e sons que criam a ilusão de movimento, e isso tem como matéria-prima a imagem no tempo. Desse modo, a narrativa cinematográfica surge da organização de diferentes sequências gravadas que formam o enredo do filme.
Essas sequências são chamadas de tomadas (ou takes), e nada mais são do que o registro contínuo de uma cena, ou seja, a captura de imagens e sons sem interrupção, desde o momento em que a câmera começa a gravar até ela ser desligada.
Para compor uma boa tomada, é preciso definir o enquadramento, isto é, o que aparecerá na cena e de que maneira. O enquadramento é definido pelo posicionamento da câmera diante do que será filmado, delimitando o que será captado pela lente e de qual ângulo.
Geralmente, um filme é composto de inúmeros takes, e montá-los em sequência requer um trabalho de edição. Editar as diferentes tomadas é o que se chama de montagem, tarefa que envolve fazer escolhas como o tempo de duração de cada sequência, o ritmo das cenas, os efeitos de corte, entre outras.
Um dos recursos utilizados durante a montagem é a elipse, que se relaciona ao corte de partes do filme, ocultando ou revelando informações para os espectadores e fornecendo múltiplas camadas de leitura (por exemplo: a personagem diz que vai até a cafeteria e, na cena seguinte, já está no local, sem que seja mostrado o seu deslocamento até lá).
A montagem também possibilita saltos temporais na narrativa, como quando há um flashback (cena que aconteceu em um tempo passado) ou um flashforward (quando uma cena do futuro é exibida).
Atualmente, os dispositivos tecnológicos capazes de filmar se coletivizaram. Quase todo mundo tem um smartphone pronto para captar áudio e vídeo. E também há os softwares de edição, muitos deles disponíveis gratuitamente na internet, oferecendo efeitos variados.
Dessa forma, fazer cinema nunca foi tão acessível, e a máxima de Glauber Rocha nunca esteve tão atualizada, pois, para fazer cinema, tudo o que precisamos é mesmo de “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”.
Se possível, assista a trechos de filmes com os estudantes, procurando relacionar os termos técnicos apresentados ao que é mostrado na tela, dando uma dimensão concreta e prática à seção.
AçÃO Filmando em 3, 2, 1!
Agora, depois de ter contato com diversas possibilidades cinematográficas para contar uma história, você produzirá um filme experimental.
1. P roposição, organização e planejamento
• Reúna-se com alguns colegas, formando um grupo de quatro a oito estudantes.
• Juntos, pensem em uma narrativa com, aproximadamente, 1 minuto. Vocês podem se inspirar nos filmes assistidos ou em experiências pessoais.
• Para captar as imagens em movimento, usem uma câmera filmadora ou um telefone celular.
• Dividam as tarefas para facilitar o processo. Como sugestão, organizem a equipe em produção e elenco.
• Desenhem em um papel a sequência das cenas, com começo, meio e fim, assim saberão quais espaços ocuparão e quais são as necessidades práticas do processo.
• Elaborem um cronograma para o cumprimento das etapas.
2. Roteiro
• Definam o tema e a quantidade de cenas, com o objetivo de utilizar recursos como flashback, flashforward e elipse.
• Tenham em mente que histórias que se desenrolam em apenas um cenário são mais fáceis de produzir e filmar.
• Organizem um momento de “chuva de ideias”, do qual todos os integrantes do grupo participem expondo suas experiências cotidianas, para ajudar a compor o roteiro, lembrando dos recursos de manipulação de tempo.
Frame do filme
Deus e o Diabo na terra do Sol, dirigido por Glauber Rocha, 1964.
3. Produção e filmagem
• Os integrantes da produção devem ficar responsáveis por separar os objetos de gravação e providenciar a autorização para a filmagem, caso ocorra em um local público, com circulação de pessoas que não fazem parte do grupo e que podem, porventura, ser identificadas nas cenas. Converse com o professor para outros casos em que é necessária a autorização para o uso de imagem.
• O responsável por dirigir as cenas deve considerar a luz natural e a artificial do cenário escolhido, pois isso interfere diretamente na qualidade estética do filme.
• O figurino e os adereços – as roupas e os acessórios a serem utilizados em cena – podem ser trazidos de casa pelos integrantes do grupo.
• Para a gravação das cenas, é importante repassar o texto com os atores, tendo em mente seu posicionamento na cena e o enquadramento que será utilizado. Como sugestão, retomem os desenhos feitos inicialmente, chamados de storyboard, nos quais há a descrição visual e escrita de cada situação a ser filmada.
• A cena pode ser filmada mais de uma vez, considerando diferentes enquadramentos.
• Lembrem-se de que o improviso também é permitido. Durante a gravação das cenas, podem surgir ideias que podem ser incorporadas pelos atores e diretores.
• A cada cena gravada, certifiquem-se de que o áudio e as imagens foram captados com boa qualidade.
4. E dição ou montagem
• Esse é um momento fundamental da produção, que deve ser decidido antes e durante as gravações, pois o tempo de cena e seu enquadramento influenciam nos cortes a serem feitos. Pensem nas seguintes questões: qual é o encadeamento das cenas? Quanto tempo cada cena terá? Será preciso inserir efeitos de som e/ou de imagem?
• Existem muitos aplicativos de edição de vídeo gratuitos. Façam uma pesquisa para decidir qual é a melhor opção.
• Revisem o trabalho para verificar se os recursos de tempo foram utilizados nas gravações das cenas.
5. E xibição e avaliação coletiva
• Finalizados os curtas, é chegado o momento da apreciação coletiva. Organizem uma sessão de cinema com a turma, para que todas as produções possam ser compartilhadas.
• Encerradas as exibições, conversem sobre os curtas produzidos. Reflitam sobre os temas abordados e sobre as escolhas de montagem. Conversem também sobre todo o processo, desde a criação do roteiro até a finalização, e debatam as dificuldades encontradas na realização das filmagens.
Frame do filme Deus e o Diabo na terra do Sol, dirigido por Glauber Rocha, 1964.
PONTE PARA OUTRAS
liNGUAGENS ARTiSTiCAS
ARTES visuais
"Nova Objetividade Brasileira"
Em abril de 1967, uma exposição no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio), chamada “Nova Objetividade Brasileira”, reuniu trabalhos bastante variados que tiveram como temas centrais a cultura urbana, a crítica social, a experimentação e a denúncia política. Entre os participantes, estavam os cariocas Rubens Gerchman e Hélio Oiticica, a fluminense Lygia Pape, a mineira Lygia Clark e o paulista Nelson Leirner (1932-2020).
Hélio Oiticica apresentou a obra Tropicália , que consistia em um espaço que devia ser penetrado pelo espectador, com o objetivo de promover experiências sensoriais. Inspirando-se em elementos do universo popular, como a escola de samba e a favela, o artista propôs uma arte a que chamou de ambiental, e que hoje é conhecida como instalação
OITICICA, Hélio. O grande penetrável PN2 e PN3. 1967. Instalação com plantas, areia, pedras, araras, aparelho de televisão, tecido e madeira.
ARTES visuais
Lygias e suas artes
A obra de Lygia Clark foi igualmente revolucionária. A artista explorou, inicialmente, a série Os bichos (1960), que consiste em esculturas manipuláveis feitas de placas metálicas articuladas com dobradiças. Em seguida, desenvolveu ideias originais, que promoviam a interação do público com a arte. Por fim, dedicou-se à prática terapêutica, propondo objetos relacionais a partir dos quais seus pacientes podiam desenvolver e compreender melhor suas memórias e seus desejos.
Outra figura fundamental nesse momento foi Lygia Pape. Um de seus trabalhos mais instigantes é a obra Divisor , que só toma forma quando utilizada por várias pessoas ao mesmo tempo. O trabalho reflete as preocupações coletivistas e corporais que emergiram na década de 1960.
Para vivenciar o Divisor, é preciso que haja um grupo de pessoas e que cada uma delas passe a cabeça por um dos recortes. O tecido unifica a multidão, antes dispersa, transformando o coletivo em um corpo cênico.
PAPE, Lygia. Divisor. 1968. Tecido recortado, 3000 cm 3 3000 cm. Cena da performance realizada no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro (RJ), 2010.
DANÇA DANÇA
Os Parangolés de Hélio Oiticica
Na exposição “Opinião 65”, Hélio Oiticica mostrou, pela primeira, vez os Parangolés , peças compostas de estandartes, bandeiras, papel, plástico e tecidos coloridos. A experiência do artista com a escola de samba Estação Primeira de Mangueira, no Rio de Janeiro, inspirou a criação dos Parangolés, pois o fez refletir sobre a forma como arte e política se articulam em suas práticas, propondo uma nova participação das pessoas e da cidade nos processos artísticos. Oiticica passou a incorporar elementos sensoriais e corporais por meio da música, da coreografia, do ritmo e da dança. Os Parangolés precisavam ser vestidos pelos espectadores, para se tornarem objetos artísticos. É a dança de quem o veste, de um espectador-participante, que ativa o Parangolé , englobando o corpo em movimento à obra de arte.
OITICICA, Hélio. Parangolé P4 Capa 1
Dzi Croquettes: subversão e arte na ditadura
Em 1972, em plena ditadura civil-militar, estreou em um cabaré localizado na Lapa, Rio de Janeiro, o grupo Dzi Croquettes. No ano seguinte, os Dzi passaram a ser dirigidos pelo artista estadunidense Lennie Dale (1934-1994), cujas propostas artísticas e coreográficas misturavam jazz-dance, bossa nova e outros ritmos brasileiros e internacionais.
Formado por treze homens, entre cantores, bailarinos e atores, trajados com roupas e adereços femininos e com maquiagem exagerada, o grupo criou espetáculos em que o humor, a crítica ao moralismo da classe média brasileira e a sátira política eram atravessados por música, dança e cenas de plateia, com referências ao Carnaval, aos musicais da Broadway e ao Teatro de Revista. Em sua breve trajetória, encerrada em 1976, com suas figuras andróginas, sua fusão de referências em diálogo com a vanguarda da época
Capa de tecido e plástico. O músico Caetano
Veloso veste um dos Parangolés de Hélio
Oiticica. Fotografia de 1968.
Lennie Dale em uma das apresentações do Dzi Croquettes, em um teatro na cidade de São Paulo (SP), 1973.
SiNTESE ESTETiCA
Liberdade e repressão no país tropical
Reflexão
O teatrista Zé Celso foi uma figura de grande importância na Tropicália brasileira. O teatro que realizou com seu grupo, o Oficina, foi fundamental para consolidar a perspectiva tropicalista, com sua busca crítica de uma brasilidade nos palcos, misturando elementos tradicionais da cultura brasileira com a abertura para um experimentalismo radical. Leia, a seguir, uma passagem do diário de Zé Celso, escrita durante o seu exílio em Paris (França) em 1977. O fragmento foi extraído do livro Primeiro ato: cadernos, depoimentos, entrevistas (1958-1974), que reúne textos desenvolvidos pelo teatrista no período.
Longe do Trópico Despótico
Diário, Paris, 1977
Tudo o que aconteceu em 1968 é decisivo para a recuperação da nossa memória. Foram os últimos encontros coletivos no Brasil, antes de 1977, e os primeiros passos em direção a uma ruptura que equacionou, preparou o terreno para o embrião de uma revolução política e cultural no país. A violenta repressão que se seguiu, o processo de lavagem cerebral e de desinformação utilizando altas tecnologias fizeram e tudo farão para que pessoas, fatos e atos desapareçam da memória social e não cheguem aos que não participaram diretamente da explosão da época. É sempre assim: as classes dominantes vão tentar cortar o fio da história das lutas dos provisoriamente dominados. […]
O mais grave é que os participantes não podem presenciar os debates “à 68”, quero dizer, de corpo inteiro. E com suas obras. Porque 68 foi, acima de tudo, uma revolução cultural que bateu no corpo. Foi um movimento de ruptura, de descolonização em que a decisão individual (voluntarismo) era importantíssima. Independência ou morte. Era o corpo que arriscava; foi o corpo que arriscou; foi o corpo que avançou; foi o corpo que foi torturado também. E é o corpo que está até hoje sentindo o frio do exílio, longe dos trópicos… E a experiência da sobrevivência na noite desses anos, sua memória, está gravada no corpo… Qualquer análise que se queira fazer de 68 terá que partir desse dado.
O corpo social de 68 ainda está preso. Não há anistia para ele. Ainda há exilados e banidos; e os que ficaram só podem se exprimir caretamente. Qualquer assunto dessa época será portanto tratado sem a sua componente decisiva. Se os discursos não partirem dessa realidade física e tentarem enquadrar
despótico: relativo ao despotismo, forma de governo em que todo o poder se concentra nas mãos de um governante tirano, autoritário.
Coro de Galileu Galilei, Teatro Oficina, 1968.
as coisas em escolas, modas, rótulos de militância serão discursos suspeitos que servirão uma vez mais para se botar a pedra tumular em cima de uma das experiências coletivas mais ricas que o Brasil teve em sua história, gérmen, semente de um Brasil futuro.
Com todos os erros e desacordos, a vivência humana desse corpo social rejeitado é decisiva para se entender tudo — inclusive e principalmente o tropicalismo. Sim, o chamado “tropicalismo” não só tem a ver, mas foi influenciado por tudo isso; é produto direto desse movimento.
Ou melhor: o tropicalismo nunca existiu. O que existiu foram rupturas em várias frentes. E essa que chamaram de tropicalismo foi uma pequena manifestação dessas rupturas na área cultural. Uma nesga. Meu corpo se mexia por todos os movimentos inspiradores do corpo social de 68. Esses movimentos, corpos celestes em transação, mexiam com tudo. E eles me pegaram no meu espaço, o espaço do teatro. A minha libertação do neocolonialismo começou lá, dentro do teatro, onde eu estava.
O objetivo, ainda que inconsciente, passou a ser a destruição do aparelho neocolonial do teatro, que nos vinha sendo imposto do Padre Anchieta à burguesia executiva paulista de multinacional. Destruir suas máscaras, seus modelos, seus guetos e ir de encontro ao chamado do tempo.
A revolução cultural: a destruição de um Brasil de papelão, pré-americano, o reencontro da participação coletiva, o combate ao “espectador”, a procura da Outra História do Brasil, da que vinha das resistências dos escravos, dos índios, dos imigrantes, dos seus auditórios loucos para participar… É óbvio que tudo tinha que começar pela consciência de que estávamos nos trópicos. Esses trópicos que, na época, a nossa visão ainda tacanha limitava à América Latina, sem incluir claramente a África… Estávamos nos trópicos! Últimas reservas mundiais de matéria-prima, matéria de cobiça internacional. Espaço decisivo para a sobrevivência do imperialismo, portanto autoritário, violento, despótico. Trópico despótico.
No teatro, usamos tudo o que podíamos para contribuir com a desmascarada geral. Principalmente a arma do ridículo e uma técnica de autopenetração que localizava em nós mesmos o inimigo, para amá-lo e, através do choque do momento do gozo, destruí-lo. Não esquecemos que o patrão, o “senhor” (seja você patrão ou empregado) estava antes de tudo em nós; precisávamos reconhecê-lo, amá-lo, adulá-lo e destruí-lo. Não era uma agressão à pessoa, mas a sua careta.
A burguesia das multinacionais, através da imprensa, das agências de publicidade, aproveitou a brecha para comprar a coisa e lançá-la como o pop tropical. Batizaram-nos “tropicalistas”. Dominando todos os meios de comunicação, vincularam o nosso trabalho da época à uma brincadeira de salão. Eu mesmo, que era apenas um diretor de teatro, virei a figura mediatizada do “muito louco”, falando uma linguagem que nunca falei… e para completar o folclore neocolonial me atribuíram o papel de representante da contracultura no Brasil. Ainda muito ignorante desses mecanismos, eu me surpreendia, escandalizado com esse cara que inventaram que era eu. […]
Sem a repressão que houve a partir do AI-5, a evolução desse movimento acabaria por mudar o uso e o sentido dos teatros. As revoluções cultural e política encaminhavam-se para se encontrar e para encontrar o povo. Quebraram-se os compartimentos de várias áreas de informação: elas comunicavam entre si, trocavam suas experiências e iam atraindo, com os seus trabalhos, cada vez mais gente. Os veículos eram discutíveis, eram às vezes os próprios meios do poder: teatros, shows de TV (tropicalismo) etc., mas eles estavam possuídos pelo pique do movimento. Na área política, a radicalidade das primeiras ações despertaram a simpatia popular. Os estudantes se encontraram com os operários. Mas a repressão dos anos 70 cindiu em três esse corpo social. De um lado, o povo arrochado; do outro, o revolucionário cultural que virou o desbundado, o drop-out que quase se coloniza pela contracultura americana; e finalmente o político, isolado, sem frente popular ou cultural.
CORRÊA, José Celso Martinez. Primeiro ato: cadernos, depoimentos, entrevistas (1958-1974). São Paulo: Editora 34, 1998. p. 125-134.
1. Desenvolva uma conversa coletiva, rememorando, em linhas gerais, o que foi a ditadura civil-militar, que começou com o golpe militar em 1o de abril de 1964 e teve seu recrudescimento justamente em 1968, com a promulgação do Ato Institucional no 5 (AI-5) – momento em que a sociedade civil se organizava intensamente para derrubar o regime militar, integrando trabalhadores, estudantes, religiosos e artistas.
Processo de criação coletiva
Reforce com os estudantes que Zé Celso se refere a esses movimentos intensos, contestatórios, radicais e de enfrentamento à ditadura quando fala dos artistas
Tendo como base o trecho lido do diário de Zé Celso e refletindo sobre a Tropicália e a cena cultural, social e política do Brasil em 1968, será desenvolvido um processo de pesquisa e criação artística. Para isso, reúna-se com alguns colegas e formem um grupo de seis a dez integrantes.
Análise e debate
e do contexto cultural de 1968. Depois do endurecimento do regime, diversos intelectuais e artistas foram presos, torturados e exilados, como aconteceu com Zé Celso, que partiu para o exílio em Portugal em 1974, depois de ser preso e torturado. A ditadura civil-militar durou até 1985, atravessando sucessivos governos militares que desempenhavam uma democracia de fachada para esconder o regime autoritário.
2. Respostas pessoais. De acordo com o texto, a revolução cultural almejada deveria
coletiva, […] a procura da Outra História do Brasil, da que vinha das resistências dos escravos, dos índios, dos imigrantes […]”. Com isso, a ideia era tecer outra o espectador, “[…] auditórios participar […]”. vista específico do teatro, essa
buscava a “[…] neocolonial do teatro, que nos Padre Anchieta multinacional. Destruir suas máscaras, seus modelos, seus guetos e ir de encontro ao chamado do tempo”.
Depois de ler o texto, analisar as imagens e refletir, discutam as questões a seguir.
1. O que você sabe sobre a história do Brasil em 1968, período da ditadura civil-militar?
2. Para Zé Celso, o esforço dos artistas, em 1968, apontava uma revolução cultural de libertação contra o neocolonialismo. O que isso significa para você? Que passagens do texto corroboram sua opinião?
3. No texto, há a seguinte afirmação: “O tropicalismo nunca existiu”. Que reflexão levou a essa afirmação?
4. O texto expõe o Brasil como um país dos trópicos, local das "[…] últimas reservas mundiais de matéria-prima, matéria de cobiça internacional. Espaço decisivo para a sobrevivência do imperialismo, portanto autoritário, violento, despótico.” Qual é a sua opinião a respeito dessa avaliação? Você acredita que esse cenário é diferente nos dias de hoje?
Zé Celso como a personagem Dona Poloquinha na remontagem de O rei da vela, realizada pelo Teatro Oficina Uzyna Uzona em 2017. A mesma proposta de encenação da montagem original foi utilizada, refazendo figurinos, cenários e adereços 50 anos depois.
3. Segundo o texto, “tropicalismo” foi um rótulo inventado pela “burguesia das multinacionais”, que, "[…] através da imprensa, das agências de publicidade, aproveitou a brecha para comprar a coisa e lançá-la como o pop tropical […]", isto é, transformaram a experiência disruptiva dos artistas e das obras de 1968 em um produto palatável, passível de comercialização e agregação.
Ideia disparadora e linguagens artísticas
4. Respostas pessoais. Provoque os estudantes a refletirem sobre o grande peso que a exportação de produtos primários ainda exerce sobre a economia brasileira, mantendo um lugar neocolonial no sistema capitalista global. Esse tipo de reflexão demonstra o aguçado senso crítico que os artistas do período de 1968 desenvolviam.
Em seguida, sempre em grupo, pensem em como fazer uma síntese estética do debate realizado, ou seja, como transmitir as conclusões do grupo aos demais colegas da turma por meio de uma criação artística, como uma música, uma pintura, um poema, uma cena, uma performance, uma instalação.
Retomem as ferramentas criativas trabalhadas ao longo deste capítulo ou relembrem procedimentos artísticos trabalhados nos capítulos anteriores que possam apoiar a criação. Levem em consideração, também, as habilidades e os desejos artísticos dos integrantes do grupo para compor a ideia central da obra coletiva.
Em um primeiro momento, deixem as ideias fluírem, anotando todo tipo de sugestão dos integrantes. Depois, retomem as ideias e elejam a que parecer mais potente, chegando a uma ideia disparadora.
Deem sugestões possíveis de serem realizadas, que reverberem o trecho do diário do Zé Celso intitulado “Longe do Trópico Despótico”. Partindo desse título, é possível desenvolver o termo despótico, imaginando que autoritarismos podem ser enfrentados, hoje, por meio da arte. Também é possível partir do esforço da memória, revisitando criticamente o período da ditadura civil-militar no processo artístico.
Na montagem do Rei da vela, Zé Celso utiliza um tom de deboche para interpretar personagens que representam algumas figuras conhecidas pelo público geral, e assim, questionar o verdadeiro papel social dessas pessoas. Uma outra possibilidade de criação é valer-se dessa estratégia e pensar em como trazer essa abordagem debochada para o cenário de hoje, analisando o lugar do Brasil na economia mundial atualmente e seus impactos socioculturais. Como exemplo: quais filmes, novelas e celebridades são conhecidos de forma hegemônica pela mídia? Como seria possível trazer essas referências em cena de forma que se instigue uma reflexão sobre o colonialismo moderno e sua influência na forma de ver o mundo?
Para a criação desse trabalho artístico, é possível fazer uso de todas as referências culturais e artísticas que vocês desejarem, imaginando e realizando a revolução cultural que vocês sonham atualmente. Deixem a imaginação livre.
Anotem a ideia disparadora e a(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Pesquisa, criação e finalização
Organizem as etapas de criação do projeto artístico com base nas reflexões centrais, na ideia disparadora e na(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Caso a criação do grupo envolva apresentação ou encenação, lembrem-se de ensaiar o maior número de vezes possível, aprimorando o trabalho a cada repetição. Mesmo apresentações improvisadas exigem alguma forma de combinado e preparação. Não deixem que o processo de criação fique só na conversa, experimentem os elementos em cena.
Caso a invenção do grupo envolva uma exposição ou instalação, façam uma lista de tudo que será necessário providenciar, dividindo tarefas entre os integrantes do grupo.
Não existe uma fórmula para esse processo de criação. Cada grupo deve desenvolver suas etapas, estabelecendo critérios e tendo em vista a obra ou manifestação artística que se está concebendo. Com o trabalho desenvolvido, chegou o momento de compartilhar com o restante da turma! Aproveite para apreciar a criação dos demais grupos.
CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS APLICADAS
O povo brasileiro e as artes
1. Resposta pessoal. É possível que os estudantes mencionem que o povo brasileiro é caracterizado, no trecho lido, por sua concretude, aspirações, história e experiências, e que, apesar de expropriados de seus meios de afirmação, os brasileiros têm capacidade de transformação, criatividade e originalidade, influenciando a cultura e a produção artística do país. Incentive os estudantes a trazerem para o debate estudos que tenham realizado em outros componentes da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, como Sociologia, Filosofia, História, Geografia, entre outros. É importante evitar a reprodução de estereótipos e estigmas e perceber que não existe uma identidade única. Esse povo é formado por diferentes populações com origens, culturas e características diversas e em constante transformação.
Contexto e referência
A história das artes no Brasil é marcada pela busca de suas raízes e identidades. Existe uma arte brasileira? O que define o povo brasileiro? Considerando as marcas do passado colonial na formação social e cultural do território brasileiro, em diferentes momentos da história, houve a busca das formas e dos sentidos das criações artísticas desenvolvidas neste território considerando a questão: afinal, o que é a arte brasileira?
Nas primeiras décadas do século XX, essas questões desenvolvidas nos campos das artes e das ciências humanas e sociais partiram da ideia de uma suposta identidade nacional. Com o tempo, elas passaram a buscar o entendimento de como as artes expressam as diferentes identidades do povo brasileiro. Além da valorização da diversidade étnica formadora dessas identidades, uma parcela da classe média, formada por intelectuais e artistas, passou a se perceber como povo e a se aproximar das necessidades e da criatividade de quem formava a maior parte da população nacional.
A ditadura civil-militar representou um corte violento nesse processo. Os movimentos sociais foram reprimidos, e os artistas, censurados. A seguir, leia um trecho do prefácio de Chico Buarque e Paulo Pontes para a peça Gota d’Água, que estreou em 1975.
O povo, mesmo expropriado de seus instrumentos de afirmação, ocupa o centro da realidade — tem aspirações, passado, tem história, tem experiência, concretude, tem sentido. É, por conseguinte, a única fonte de identidade nacional. Qualquer projeto nacional legítimo tem que sair dele. [...] Em contato direto com as classes subalternas, a intelectualidade, raquítica e litorânea, ia percebendo que era, também, povo, isto é, que tinha uma história a fazer, uma realidade para transformar à sua feição, tinha responsabilidades, aliados, tinha, enfim, sentido. A aliança resultou numa das fases mais criativas da cultura brasileira, neste século. Foi daí que saiu a nossa melhor dramaturgia, que vai de Jorge Andrade a Plínio Marcos, passando por Vianinha, Guarnieri, Dias, Callado, Millor, Boal, etc.; dessa aliança saíram o Arena, o Oficina, o Opinião; saiu o Cinema Novo; saiu a melhor música popular brasileira; o pensamento econômico amadureceu; nasceu uma sociologia interessada em descobrir saídas para o impasse do terceiro mundo [...]. A partir de 64, a pressão de duas forças convergentes interrompeu o processo: o autoritarismo, impedindo o diálogo aberto da intelectualidade com as camadas populares; e a acelerada modernização do processo produtivo, assimilando e dando um caráter industrial, imediato, à produção de cultura.
Imagem do espetáculo Gota d’Água (1975): moradores do conjunto habitacional da Vila do Meio-Dia batalham para garantir sua moradia. A personagem Joana, em meio a uma tragédia, é acolhida pela vizinhança.
ARQUIVO/THEATRO
3. Resposta pessoal. Aproveite para trazer para a sala de aula o universo cultural dos estudantes, valorizando suas referências. É possível citar alguns exemplos, como o filme Bacurau (2019), que destaca a resistência e a luta de uma comunidade rural no sertão brasileiro contra ameaças externas, refletindo questões de identidade e resistência popular; a banda Bixiga 70, que mistura afrobeat com música brasileira, refletindo as raízes afro-brasileiras e celebrando a criatividade cultural das classes populares; o Slam da Guilhermina, evento realizado em São Paulo (SP), que dá voz
A interrupção deixou a cultura brasileira no ora-veja. Artistas, escritores, estudantes, intelectuais, arrancados do povo, a fonte de concretude de seu trabalho criador, caíram na perplexidade, na indecisão, no vazio, mazelas conhecidas da classe média, quando fica reduzida à sua impotência. [...] nós temos que tentar, de todas as maneiras, a reaproximação com nossa única fonte de concretude, de substância e até de originalidade: o povo brasileiro. Esta deve ser uma luta, de modo particular, do teatro brasileiro. É preciso, de todas as maneiras, tentar fazer voltar o nosso povo ao nosso palco. [...]
BUARQUE, Chico; PONTES, Paulo. Gota d’Água . Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983. p. XVI-XVII.
Aprofundando o estudo
às questões sociais e culturais das comunidades marginalizadas, colocando o povo como protagonista de suas narrativas; entre muitas outras possibilidades.
Após a leitura do trecho, reflita com os colegas e o professor sobre as questões a seguir.
1. Você percebe, no trecho lido, características próprias do povo brasileiro? Se sim, quais?
2. Quais produções artísticas estudadas até aqui abordam questões ligadas às identidades culturais do povo brasileiro?
3. Quais produções artísticas contemporâneas que você conhece colocam o povo brasileiro como centro?
4. Qual é a importância dos diferentes grupos que formam o povo brasileiro se expressarem por meio de obras de arte?
2. As obras presentes nos capítulos 4, 5 e 6 são especialmente voltadas à temática do povo brasileiro. Sugira aos estudantes que façam um exercício de memória para recuperar obras abordadas no livro que, para eles, expressam aspectos culturais diversos das populações brasileiras. Oriente-os a justificar as respostas.
O território brasileiro abarca diferentes formas de viver. Reflexões sobre a presença do povo brasileiro nas artes não devem servir para reproduzir estereótipos ou para buscar uma essência única que represente a totalidade da população. As obras de arte, em sua complexidade, devem, de preferência, respeitar as diversidades culturais, étnicas e sociais do Brasil. Para sistematizar esse debate, forme um grupo com 5 integrantes para confeccionar uma nuvem de palavras que podem ser associadas à diversidade do povo brasileiro. Use uma folha de papel sulfite e lápis de diferentes cores. Registre com maior destaque as palavras que, para o grupo, têm maior importância dentro da temática. Você pode fazê-las em tamanhos diferentes e usar as cores diferentes para destacá-las.
Atividade síntese
4. Resposta pessoal. É interessante que os estudantes empreguem conceitos abordados em outros componentes da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas no debate. Vale refletir sobre o olhar desses outros saberes para a função social da arte.
Com base na nuvem de palavras elaborada, crie uma intervenção artística que contemple artes visuais, música, dança e teatro.
1. Ainda trabalhando em grupo, coloque a nuvem de palavras em um local visível a todos e leia, em voz alta, cada uma das palavras. Inicialmente, as vozes irão se sobrepor, com todos lendo ao mesmo tempo.
2. Aos poucos, procure repetir as palavras que aparecem em maior destaque. Se seu colega estiver repetindo uma palavra destacada, experimente falar ao mesmo tempo que ele.
3. Explore a sonoridade e a possibilidade de dizer palavras individual e coletivamente. Brinque com o ritmo e o volume das vozes, pesquise uma musicalidade.
4. Partindo do som e do sentido trabalhados, pesquise como o grupo pode se mover pelo espaço. Para isso, experimente criar a “dança dessas palavras”. A nuvem de palavras deve ser carregada pelo grupo e exibida aos espectadores, como uma bandeira.
5. Sistematize uma maneira de entrar em cena, desenvolver o coro, exibir a nuvem de palavras aos espectadores e sair de cena, como em um desfile.
6. Depois das apresentações, explore as questões: houve semelhanças entre os grupos? Quais palavras foram mais repetidas? De que forma as escolhas de sonoridade, movimentação e teatralidade alteraram as sensações e os sentidos das cenas?
7. Por fim, experimente incluir, na análise das cenas, conceitos trabalhados nos componentes de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas e encerre a proposta discutindo a questão: o que as cenas revelam sobre as diversidades étnicas e culturais do povo brasileiro hoje?
ARTE EM QUESTÃO
1. A afirmação II está incorreta, pois a maioria dos anjos barrocos são esculpidos com formas mais arredondadas e volumosas, inclusive as bochechas, diferentemente do que é possível observar na imagem da escultura. A afirmação V também é incorreta, pois trata-se de uma interpretação que não considera a expressão completa – lábios entreabertos, olhos expressivos etc. – da composição do rosto na escultura que representa Jesus Cristo em uma cena da Paixão de Cristo.
Depois de diferentes atividades, obras, artistas, teorias e processos, a Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil terminou!
Agora, você irá verificar os conhecimentos construídos ao longo dessa jornada por meio de uma avaliação composta de questões de múltipla escolha. Assim, além de avaliar os conhecimentos em Arte desenvolvidos ao longo da unidade, você pode se preparar para a importante etapa dos vestibulares.
Siga as orientações do professor e boa avaliação!
Capítulo 4: Arte e colonização
1. (Unifor-CE)
Cena da Paixão de Cristo, no Santuário de Bom Jesus do Matosinhos, em Congonhas (Foto: Pedro Ângelo/G1). Disponível em: http: //g1.globo.com/minas-gerais/ noticia/ 2014/11/bicentenario-de-morte-de-aleijadinhoecelebrado-nesta-terca-feira.html. Acesso em 06/05/2015.
A arte barroca nasceu em oposição à arte renascentista, que se baseava na razão e nos modelos greco-romanos de equilíbrio e simplicidade. Entre os maiores artistas da época está Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. Foi o maior artista do período colonial e suas criações vão de projetos inteiros de igrejas a esculturas e entalhes delicados. As características próprias do Barroco adquirem em seus trabalhos uma feição particular, tais como:
I. O s olhos são expressivos, espaçados e amendoados e apresentam certa semelhança aos orientais.
II. A s maçãs do rosto mostram forte semelhança com as esculturas dos anjos barrocos.
III. O nariz é reto e alongado, o que dá muita força às fisionomias.
IV. Os lábios são entreabertos, o que traz uma ideia de movimento e vida à figura.
V. O qu eixo é sutilmente retangular, o que confere altivez à imagem esculpida.
É correto apenas o que se afirma em:
a) I, II, III.
b) II, III, V.
c) I, III, IV.
d) II, IV, V.
e) I, IV, V.
Resposta: alternativa c.
Capítulo 5: Modernismos no Brasil
2. (Unesp)
O quadro não se presta a uma leitura convencional, no sentido de esmiuçar os detalhes da composição em busca de nuances visuais. Na tela, há apenas formas brutas, essenciais, as quais remetem ao estado natural, primitivo. Os contornos inchados das plantas, os pés agigantados das figuras, o seio que atende ao inexorável apelo da gravidade: tudo é raiz. O embasamento que vem do fundo, do passado, daquilo que vegeta no substrato do ser. As cabecinhas, sem faces, servem apenas de contraponto. Estes não são seres pensantes, produtos da cultura e do refinamento. Tampouco são construídos; antes nascem, brotam como plantas, sorvendo a energia vital do sol de limão. À palheta nacionalista de verde planta, amarelo sol e azul e branco céu, a pintora acrescenta o ocre avermelhado de uma pele que mais parece argila.
2. A obra que mais se assemelha à descrição contida no comentário é a que está representada na alternativa a. Trechos como “[…] os pés agigantados das figuras […]” e “[…] As cabecinhas, sem faces […]” evidenciam que a obra a que o texto se refere contém mais de uma figura, por exemplo. Dessa forma, a alternativa a é a única que apresenta uma obra com essa característica.
Não escreva no livro.
UNIFOR, 2015
4. A alternativa a apresenta algumas das características mais marcantes do Tropicalismo, que inovou ao introduzir a guitarra elétrica na produção musical brasileira, incorporando influências internacionais de forma criativa e não meramente reprodutiva.
A mensagem é clara: essa é nossa essência brasileira – sol, terra, vegetação. É isto que somos, em cores vivas e sem a intervenção erudita das fórmulas pictóricas tradicionais.
(Rafael Cardoso. A arte brasileira em 25 quadros, 2008. Adaptado.)
Tal comentário aplica-se à seguinte obra de Tarsila do Amaral (1886-1973):
Resposta: alternativa
(Antropofagia, 1929.)
3. As cantigas de amigo são parte de uma literatura trovadoresca realizada no contexto da Idade Média. A canção apresentada utiliza-se de elementos desse tipo de literatura, embora tenha sido feita em um contexto e um tempo muito diferentes do período em que as cantigas de amigo floresceram. Já o texto que
3. (UEPA)
Ai, Ioiô
Eu nasci pra sofrer, Foi olhar pra você, Meus zoinho fechou E quando os óio eu abri, Quis gritar, quis fugir, Mas você, Eu não sei por que,
“Foi no teatro de revista que surgiu nossa primeira estrela da canção popular: Aracy Cortes. Na peça “Miss Brasil”, encenada em 1929, Aracy apresentou, e logo gravou, aquele que seria o primeiro sucesso da MPB: “Linda flor” (mais conhecida por “Ai, Ioiô”), de Henrique Vogeler e Luís Peixoto, já apresentando nestes versos, curiosamente, elementos à maneira trovadoresca das cantigas de amigo.”
Você me chamou. Ai, Ioiô, Tenha pena de mim. Meu Sinhô do Bonfim Pode inté se zangá, Se ele um dia souber Que você é que é O Ioiô de Iaiá.
(Marcelo J. Fernandes. LITERATURA E MÚSICA neo-cantigas de amigo: o legado trovadoresco na MPB. Poiésis - Literatura, Pensamento & Arte - nº 98 - maio de 2004)
Considerando o comentário e os versos lidos, assinale a alternativa correta.
a) A lamentação do eu-lírico feminino, nos últimos versos da segunda estrofe, é indicativo de que, na cantiga de amigo, o homem é considerado superior à mulher.
b) A presença da súplica amorosa em linguagem formal demonstra que o poeta despreza o registro popular da linguagem.
c) A dicção popular dos versos, marca da fala oral e afetiva, não é típica das cantigas de amigo.
d) O r egistro do modo de falar da gente do povo, nos versos, comprova a existência de uma variante linguístico-cultural diversa da variante culta, utilizada no comentário.
e) A o utilizar a linguagem do povo em seus versos, o poeta exprime seu preconceito linguístico, desrespeitando assim a diversidade linguístico-cultural.
Capítulo 6: Uma arte tropical
4. (UVA-CE)
O tropicalismo foi um movimento cultural dos anos de 1960 que teve em seus quadros artistas como Tom Zé, Gilberto Gil, Caetano Veloso e a banda Mutantes. Entretanto as inovações propostas por aquele coletivo não foram aceitas sem contestações, já que representavam uma ruptura aos padrões da época.
Assinale a alternativa que melhor caracteriza esse movimento: Resposta: alternativa a.
a) A integração entre o nacional e o estrangeiro, o erudito e o popular, além da inserção da guitarra elétrica.
b) Politização da música, sobrepondo o nacional ao estrangeiro.
c) A e xaltação da cultura popular em detrimento da erudita.
d) A propriação de estilos estrangeiros, como meio de qualificar a cultura nacional. Resposta: alternativa d.
a precede foi publicado no início dos anos 2000. Portanto, ambos evidenciam variantes linguísticas e registros da linguagem realizados em um tempo e em um contexto muito distintos, sendo a cantiga de amigo mais associada a um registro coloquial de uso da língua. É esperado que, ao elaborar textos que remetam a essas cantigas, ocorra também uma tentativa de se aproximar do registro linguístico empregado nelas.
(Abaporu, 1928.)
(A negra, 1923.)
(Sol poente, 1929.)
(São Paulo, 1924.)
3
ARTE HOJE
Nesta unidade, será abordada a arte contemporânea no Brasil e no mundo, bem como o impacto que a cultura digital e o pluralismo cultural tiveram em nossa sociedade a partir do final do século XX.
Três aspectos são relevantes para as reflexões sobre o tema: o multiculturalismo e a difusão da cultura digital, que permitiram a emergência de variados discursos; a experimentação e os limites borrados da arte contemporânea; e a forma como os desafios de uma sociedade em crise são elaborados pelos artistas em nossos dias.
O objetivo não é apresentar um panorama da arte contemporânea no Brasil e no mundo, mas sim explorar algumas obras, escolhidas entre inúmeras possibilidades, para promover a prática de análise crítica, que poderá ser aplicada a outros exemplos trazidos para a sala de aula por estudantes e professores.
As histórias importam. Muitas histórias importam. As histórias foram usadas para espoliar e caluniar, mas também podem ser usadas para empoderar e humanizar. Elas podem despedaçar a dignidade de um povo, mas também podem reparar essa dignidade despedaçada.
ADICHIE, Chimamanda Ngozi. O perigo de uma história única . Tradução: Julia Romeu. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. p. 32.
Reviravolta de Gaia, de Rivane Neuenschwander. São Paulo (SP), 2021.
7
Multiculturalismo
A arte contemporânea abraça as culturas locais em todos os territórios da Terra.
Cyprien Tokoudagba, escultor beninense de fama internacional, com sua mulher e uma de suas esculturas. Abomey (Benim), 2010.
HIP-HOP : cultura de rua . 1988. Capa do álbum gravado com a participação dos rappers Thaíde e DJ Hum, entre outros.
O hip-hop conecta as periferias do mundo.
A popularização dos computadores e a chegada da internet transformaram radicalmente a sociedade.
Computador de uso pessoal da década de 1990.
2. Cyprien Tokoudagba representa em sua obra o universo cultural da costa oeste da África. O artista levou seu trabalho para diversos países do mundo, inclusive para a França, o que evidencia significativas trocas interculturais. O disco reúne artistas do hip-hop, da cultura de rua, que vivem na periferia de São Paulo. A exposição “Como vai você, geração 80?” representa o universo de jovens artistas, possivelmente da elite, como sugere a situação retratada: uma festa ao redor da piscina em um palacete. Comente com os estudantes que, embora a mostra
Vista da exposição “Como vai você, geração 80?”. Escola de Artes Visuais do Parque Lage (EAV), Rio de Janeiro (RJ), 1984.
CHIC Show. 2023. Cartaz do documentário brasileiro dirigido por Emílio Domingos.
A arte jovem celebra a liberdade, a invenção e a diversidade na capital fluminense.
tenha reunido principalmente artistas do eixo Rio-São Paulo, havia também participantes de outros estados, como o artista cearense Leonilson, que será estudado mais adiante neste capítulo. O cartaz de divulgação do documentário aborda o contexto dos bailes de black music
Orgulho, identidade e pertencimento nos bailes de black music
Não escreva no livro. Considerando as imagens apresentadas nesta abertura, responda às questões a seguir.
1 A que linguagens ar tísticas essas imagens se relacionam?
As imagens se relacionam a artes visuais, música, cinema e dança.
2 Essas imagens são representativas de que universos culturais?
3 O que você entende por multiculturalismo?
3. Resposta pessoal. Espera-se que os estudantes reflitam sobre o encontro de diferentes culturas que se evidenciam nas formas culturais com as quais eles se relacionam no dia a dia. A que lugares e culturas pertencem as obras e produções artísticas de que os estudantes gostam? Após o estudo do capítulo, retorne a essa questão para comprovar ou refutar as hipóteses dos estudantes.
GUILHERME PINTO/AGÊNCIA O GLOBO
O que é multiculturalismo?
Nas últimas décadas do século XX, o mundo passou por profundas transformações impulsionadas pela globalização da produção e do consumo, o que desencadeou mudanças socioeconômicas e culturais em todo o planeta. As crenças utópicas em um futuro moderno e ordenado desapareciam diante da desigualdade social de um mundo que entrava em colapso. Os artistas não estavam interessados em conceber algo novo; ao contrário, havia entre eles um crescente interesse em resgatar e reinterpretar o passado ancestral.
Ideias como a preservação das florestas, dos rios, dos oceanos e das espécies ameaçadas, bem como a organização da sociedade na luta por interesses éticos – tais como a liberdade de expressar a sexualidade ou o apoio à demarcação de terras indígenas –, começaram a ganhar força entre ativistas, principalmente os jovens.
Com a invenção dos microprocessadores, os computadores tornaram-se mais acessíveis, inaugurando a era da informação. Esse avanço também democratizou os meios de produção artística, como câmeras de vídeo e mesas de som, que passaram a estar ao alcance de uma parcela maior da população. No início do século XXI, a expansão e a popularização da internet, bem como da comunicação em rede, possibilitaram que qualquer pessoa com acesso a um computador pudesse se manifestar, alcançando alguém no outro lado do mundo.
Novas vozes, antes excluídas da cena artística, passaram a ser ouvidas. Os valores culturais assimilados e defendidos pelas populações periféricas estavam mais alinhados às culturas rurais, aos saberes afrodiaspóricos e indígenas e às lutas políticas da classe operária. Esses conhecimentos trouxeram uma visão crítica dos processos contínuos de colonização presentes na sociedade. Como consequência dessas lutas, que envolvem questões de raça, classe e gênero, observa-se uma inadequação das distinções entre cultura erudita e cultura popular, divisão que expressa uma hierarquização entre diferentes formas culturais, rebaixando as produções e os artistas que estão fora das instituições culturais oficiais.
A cultura hip-hop , originada nos Estados Unidos, chegou ao Brasil em meados dos anos 1980. Caracterizada pela busca de conexão entre as periferias, apoiava-se em quatro pilares: o DJ ( disc jockey, responsável pela música) e o MC (mestre de cerimônias, o cantor de rap), o rap, o breaking (dança dos b-boys e das b-girls) e o grafite. O hip-hop despontava como uma forma de expressão capaz de denunciar a miséria e a violência sob as quais viviam os que estavam à margem do sistema econômico dominante.
cultura erudita: conjunto de expressões culturais associadas às elites, geralmente envolvendo o conhecimento acadêmico e o cânone europeu. cultura popular: conjunto de expressões culturais criadas e praticadas pelo povo, incluindo práticas ancestrais, festivais e manifestações artísticas ligadas ao território.
Nelson Triunfo, precursor de breaking no Brasil. São Paulo (SP), 1984.
O reconhecimento de que diferentes grupos e indivíduos – provenientes de variados contextos sociais – manifestam sua cultura de modo heterogêneo e de que sempre haverá uma tensão entre eles, gerando transformações e hibridizando os comportamentos sociais e as produções no campo da arte, é o que hoje se entende como multiculturalismo
SAMICO, Gilvan. O boi feiticeiro e o cavalo misterioso. 1963. Xilogravura, 42,5 cm × 54,5 cm. Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães, Recife (PE). Gravura do artista Gilvan Samico (1928-2013) para o livro Romance d’a pedra do reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta (1971), de Ariano Suassuna.
AT¡v¡DaDe De SeNS¡B¡l¡ZAÇÃO
multiculturalismo: conceito que abarca o encontro de diferentes culturas em uma sociedade, refletindo sobre suas diferenças, interações e hibridizações. Algumas vertentes intelectuais acreditam que é preciso garantir a expressão de toda a diversidade cultural em cada contexto social, ressaltando as diferenças. Outras afirmam que é no processo contínuo de disputa e assimilação entre as culturas que se dá o multiculturalismo.
O Movimento Armorial, organizado pelo escritor Ariano Suassuna (1927-2014) em 1970, em Pernambuco, foi pioneiro no resgate de uma estética genuinamente regional no Brasil. Suassuna herdou uma cultura rural letrada que se desenvolveu a partir de meados do século XIX, voltada à poesia e à criação musical. O movimento baseava-se em elementos como a música de viola, rabeca e pífano, a literatura de cordel, o teatro cômico, bem como em manifestações culturais como as cavalhadas, os maracatus e os caboclinhos.
1. Recomenda-se realizar essa atividade em um espaço amplo da escola, como um teatro, auditório, quadra ou outro local que possibilite montar uma grande roda com os estudantes.
5. Para a atividade, podem ser utilizadas as bases de rap 1 e 2, disponíveis nos áudios deste material (faixas 14 e 15 da coletânea), ou você pode escolher uma batida do universo hip-hop em canais de busca na internet.
Chegou a hora de você explorar o multiculturalismo com base em um jogo dançante que terá o hip-hop como inspiração e o beat (batida eletrônica) como base.
1. Organizem, coletivamente, o espaço para a atividade. Se o local de escolha for a sala de aula, afastem mesas e cadeiras, deixando o ambiente o mais livre possível.
2. Formem duplas e espalhem-se pelo espaço. Todas as duplas jogarão ao mesmo tempo.
3. Você e o colega farão um jogo de espelho, em que uma pessoa dança enquanto a outra imita, nos mínimos detalhes, os movimentos propostos. O objetivo do jogo é que seja impossível perceber quem está conduzindo e quem está imitando.
4. Decida com seu par quem irá conduzir os movimentos e quem irá imitá-los. O jogo terá duas rodadas, para que vocês possam inverter as funções.
5. O início da música marca o início de cada rodada. Preparem-se na posição inicial: parados de frente um para o outro.
6. Terminada a segunda rodada do jogo, realizem uma conversa com toda a turma, partindo dos questionamentos a seguir.
Resposta pessoal. Explore com os estudantes a condição de quem propõe o movimento, que deve realizar seus gestos de forma que a pessoa que está espelhando possa acompanhar; do contrário, o jogo não se realiza. Outro ponto interessante se relaciona ao uso do corpo como um todo na dinâmica; é comum que espelhemos os movimentos sem considerar a totalidade do corpo nesse
• Como foi a experiência de espelhar os movimentos do colega? E de propor a movimentação?
• D escreva a experiência de dançar um beat : que movimentos surgiram para acompanhar essa sonoridade?
esforço, mobilizando somente alguns membros, como braços e pernas, e negligenciando o restante.
Resposta pessoal. É possível que os estudantes, especialmente os que possuem alguma familiaridade com o breaking, façam uso do repertório de passos e manobras que já conhecem, o que é ótimo. Caso isso aconteça, peça que contem e demonstrem as danças que dominam, proporcionando um momento de troca.
ARTES ViSUAiS
CONTEXTO
Arte da periferia do mundo
Na década de 1980, sinais de uma mudança cultural que abalaria as sociedades em todo o mundo começaram a emergir. Os movimentos artísticos surgidos nas elites europeias e estadunidenses, que haviam se tornado referências estéticas e uniformizado a produção artística mundial, começaram a ser questionados.
Um dos primeiros movimentos a romper com essa hegemonia foi a cultura punk, originada na Inglaterra no final da década de 1970 e rapidamente disseminada pelas periferias urbanas. Adotando comportamentos insolentes e agressivos, os punks rejeitavam o sistema capitalista e os privilégios dos mais ricos. Os artistas dessa vertente acreditavam que a atitude e a crítica social eram mais importantes do que o domínio técnico das artes.
TIMES Square Show. 1980. Cartaz da mostra de arte colaborativa, autogerida e sem curadores realizada em Nova York (Estados Unidos). Biblioteca do Museu de Arte Moderna de Nova York, Nova York (EUA).
Essa geração também explorou novas formas de pensar e expor a arte. Em junho de 1980, uma mostra de arte colaborativa realizada em Nova York (Estados Unidos) – o ''Times Square Show'' – reuniu mais de cem artistas jovens que se apropriaram dos espaços espontaneamente, pretendendo, por meio de suas intervenções, desafiar o mundo oficial da arte. A exposição apresentou uma ampla variedade de manifestações, incluindo grafites, artes feministas, performances, bandas punk, cartazes políticos, xerografias e outras formas alternativas de expressão. O evento revelou artistas de bairros negros e hispânicos, ligados à emergente cultura hip-hop. No final da década de 1980, com a queda do muro de Berlim e o fim da Guerra Fria, o contexto cultural do Leste Europeu foi revelado ao Ocidente. As grandes mostras internacionais de arte, que haviam se multiplicado na segunda metade do século XX, tornaram-se espaços de troca entre os artistas. O sistema eurocêntrico foi forçado a voltar sua atenção aos países periféricos. Um marco dessa mudança foi a exposição "Mágicos da Terra", realizada em Paris (França), em 1989, como um dos eventos comemorativos do bicentenário da Revolução Francesa. O projeto visava explorar a arte produzida naquele momento em todo o mundo.
REPRODUÇÃO/COLEÇÃO
DA BIBLIOTECA DO MUSEU DE ARTE MODERNA DE NOVA YORK, EUA
REPERTORiO 1
Basquiat e a chegada do grafite
Jean-Michel Basquiat (1960-1988) foi um dos artistas que chamaram a atenção no "Times Square Show " . Negro, filho de pai haitiano e mãe porto-riquenha, ele abandonou a escola ainda adolescente e saiu de casa para se tornar um artista de rua. Em seu trabalho, Basquiat utilizava variadas técnicas e materiais, criando composições que consistiam em formas sofisticadas e originais de expressão. Basquiat produziu quase 3 mil trabalhos, apesar de não ter completado 30 anos de vida. Em suas pinturas, ele abordou temas ligados às desigualdades sociais, à diáspora africana, às culturas ancestrais e ao racismo. Em diversos de seus trabalhos, retratou personalidades negras históricas e contemporâneas, como o defensor dos direitos dos afro-estadunidenses Malcolm X (1925-1965), mais tarde nomeado Malik el-Shabazz, o boxeador Cassius Clay (1942-2016), mais tarde nomeado Muhammad Ali, e músicos como Miles Davis (19261991) e Charlie Parker.
BASQUIAT, Jean-Michel. Trompetistas. 1983. Acrílico e bastão de óleo sobre três painéis de tela montados em suportes de madeira, 243,8 cm x 190,5 cm. The Broad, Los Angeles (Estados Unidos).
Colecionador de discos de jazz, Basquiat queria aumentar a visibilidade dos negros nos meios culturais dominados por brancos em Nova York. Nesse tríptico, o artista retratou os músicos de jazz Charlie Parker (1920-1955), à esquerda, e Dizzy Gillespie (1917-1993), ao centro, e acrescentou referências às suas composições musicais.
1. Os elementos não se assemelham a desenhos feitos por criança, mas a forma aparentemente desorganizada da composição e a mistura de rasuras e pinceladas soltas podem remeter a obras infantis.
Observe a pintura de Jean-Michel Basquiat e responda.
1 Nesse trabalho, há elementos que lembram desenhos feitos por crianças? Explique.
2 Que elementos dessa obra se referem à cultura negra?
3 Que elementos se referem à música?
Os dois músicos de jazz retratados são negros, e a figura central evoca uma máscara africana.
Os instrumentos musicais – um trompete e um saxofone – e os símbolos que saem do saxofone. A composição em três partes e a repetição dos elementos marcam o tempo como em uma música.
Não escreva no livro.
REPERTORiO 2
O Brasil em "Mágicos da Terra": Cildo Meireles e Mestre Didi
A exposição "Mágicos da Terra" apresentou produções muito diversificadas de 111 artistas – alguns ligados à cena internacional e outros às culturas locais de vários países.
Ao propor uma busca baseada no universo mágico, o curador da exposição, Jean-Hubert Martin (1944-), reuniu artistas ligados à religiosidade e à ancestralidade regionais. Alguns críticos avaliam que a exposição não alcançou seu objetivo, apresentando, mais uma vez, a arte de matriz não europeia sob o foco do exotismo. O evento, porém, estimulou o debate sobre o conceito de arte vernacular e marcou a mudança de interesse do sistema mundial da arte do centro para a periferia.
Dentre as participações brasileiras está o baiano Mestre Didi (1917-2013), que era sacerdote do candomblé Nagô-Yorubá em Salvador e participou da exposição com 11 esculturas. O artista aprendeu com os mais antigos a manipular os materiais para fazer objetos e emblemas que dão forma às entidades sagradas da cultura iorubá.
Havia ainda a instalação Missão/missões (como construir catedrais), de Cildo Meireles, que provocou uma reflexão sobre a colonização no Brasil e o papel das missões jesuíticas na evangelização forçada dos povos originários. O trabalho consiste em um piso forrado com moedas de 1 centavo e um teto feito de 2 mil ossos de boi, com uma coluna central montada com 800 hóstias, que evoca a Igreja e faz a ligação entre o céu e a Terra.
1. O trabalho de Cildo Meireles relaciona-se ao catolicismo, e o trabalho de mestre Didi, ao candomblé. No entanto, o trabalho de Meireles aborda a religião de maneira crítica, ao passo que o de Mestre Didi é realizado como parte de um ritual religioso.
MESTRE DIDI. Iwini-Igi
(O Espírito da Árvore).
1994. Escultura feita com nervura de palmeira, palha da costa, couro, búzios, contas e miçangas, 170 cm x 35 cm x 16 cm. Museu de Arte Moderna da Bahia, Salvador (BA).
arte vernacular: arte que se relaciona ao território, que utiliza materiais e técnicas próprios de determinado local, autóctone.
MEIRELES, Cildo. Missão/missões (como construir catedrais). 1987. Instalação com cerca de 600 mil moedas, 800 hóstias, 2 mil ossos de boi, 80 pedras de pavimento e tecido preto, 249,9 cm x 346 cm x 346 cm. Blanton Museum of Art, Austin (Estados Unidos).
Observe os trabalhos de Mestre Didi e de Cildo Meireles e responda.
1 A qual universo cultural cada um desses trabalhos está relacionado?
2 Em sua opinião, por que os trabalhos desses dois artistas foram escolhidos para representar o Brasil?
Não escreva no livro. 2. Resposta pessoal. É importante que os estudantes notem que os trabalhos de Mestre Didi e de Cildo Meireles são representativos da diversidade cultural que se observa no Brasil. Mestre Didi representa a cultura afrodiaspórica, é ligado às tradições populares e à religiosidade de matriz africana. Cildo representa a arte conceitual, crítica e já reconhecida na cena cultural do país.
CARL DE SOUZA/AFP
REPERTORiO 3
Artes visuais na geração 80: a volta da pintura
Em 1984, a exposição "Como vai você, geração 80?" foi montada na Escola de Artes Visuais do Parque Lage (EAV), no Rio de Janeiro, apresentando uma geração que comemorava a volta da democracia. A mostra foi marcada pelo prazer da expressão, reprimido durante os 20 anos de ditadura civil-militar. O evento reuniu 123 artistas, grande parte deles do eixo Rio-São Paulo, mas de tendências variadas e com obras que incluíam pintura, escultura, performance, vídeo, música e instalação.
De modo geral, os participantes estavam interessados no fazer manual da pintura – pintavam em grandes dimensões, sobre lonas e outros suportes – e em expressar sua subjetividade.
LEONILSON. Os pensamentos do coração. 1988. Tinta acrílica sobre lona, 48 cm x 68 cm. Coleção particular.
Nessa pintura, Leonilson (1957-1993) reúne palavras e símbolos para expressar seus sentimentos. Leonilson foi influenciado pela obra do sergipano Arthur Bispo do Rosário (1911-1989), que relatou sua visão do mundo associando ornamentos e textos bordados em mantos, estandartes e fardões, que se tornaram conhecidos do grande público na década de 1980.
Alguns artistas desse período desenvolveram poéticas que focalizavam o corpo, o feminismo e a homossexualidade. É o caso de Leonilson, que abordou questões de comportamento e refletiu sobre a moral social. Em seus trabalhos de pequenas dimensões, mesclou pintura, desenhos, textos e bordados. O artista, muitas vezes, representou a si mesmo, expondo em seu trabalho, de maneira velada, suas angústias e dúvidas. Concebeu um vocabulário de enigmas – uma estratégia para falar de seus sentimentos e expressar a sua sexualidade. Ao ser diagnosticado com aids, fez de sua obra um testemunho diante da aproximação da morte.
1. Leonilson usou palavras – “Os pensamentos do coração” – e desenhos – um cérebro e duas espadas. O texto foi disposto em forma de coração sobre um fundo vermelho.
Observe atentamente a pintura de Leonilson e responda às questões a seguir.
1 Que elementos o artista utilizou nessa composição?
2 Que significados podem ser atribuídos a esses elementos? Não escreva no livro.
2. O cérebro e o coração parecem constituir uma unidade. A imagem sintetiza a ideia de que sentimento e pensamento não são apartados. Sentir e pensar são ações articuladas do corpo.
PESQUiSA
Artes visuais no final do século XX
Durante a ditadura civil-militar no Brasil, as propostas conceituais, muitas vezes engajadas politicamente, dominaram a cena artística. Com o retorno da democracia, na década de 1980, emergiu o desejo de uma expressão livre e múltipla, até então represada, e a pintura voltou com grande força e diversidade. Foi nesse contexto que começaram a surgir os primeiros grafites, pinturas feitas nos muros das ruas.
Conheça alguns trabalhos e exposições dos artistas desse período.
1. Como era a arte conceitual dos anos 1970?
MEIRELES, Cildo. Inserções em circuitos ideológicos: projeto cédula. 1975. Carimbo de borracha sobre cédulas. Novo Museu de Arte Contemporânea, Nova York (Estados Unidos).
• D urante os anos de ditadura civil-militar no Brasil, Cildo Meireles realizou a série Inserções em circuitos ideológicos , que assumiu um enfoque político. Sua ação consistia em retirar um objeto cotidiano de circulação, interferir nele e devolvê-lo ao sistema. O artista empreendeu essa interferência anônima carimbando em cédulas de um cruzeiro a pergunta sobre o assassinato do jornalista Vladimir Herzog (1937-1975) nos porões da ditadura: “Quem matou Herzog?”. Saiba mais sobre o trabalho de Cildo Meireles no site do Instituto Inhotim. Disponível em: www.inhotim.org.br/ item-do-acervo/galeria-cildo-meireles (acesso em: 30 set. 2024).
2. Qual foi o percurso dos jovens artistas que participaram da exposição “Como vai você, geração 80?”, nas últimas três décadas?
• A artista Mônica Nador (1955-) manteve e ampliou a atuação do projeto JAMAC – Jardim Miriam Arte Clube, fundado em 2004. A metodologia desenvolvida pela artista, de promover um trabalho com autoria compartilhada, se desdobrou em múltiplas ações que podem ser conhecidas em: https://jama carteclube.wordpress.com/wp-content/uploads/2013/07/livro-jamac.pdf (acesso em: 30 set. 2024).
• Um dos artistas mais importantes da geração de 1980 é Luiz Zerbini (1959-). Sua pintura se debruça sobre a diversidade da vida botânica. No site da galeria Fortes D’Aloia & Gabriel, é possível acessar as últimas exposições de que o artista participou no Brasil e no mundo. Disponível em: https://fdag. com.br/artistas/luiz-zerbini (acesso em: 30 set. 2024).
Não escreva no livro.
TEORiAS
E MODOS DE FAZER
Pintura: fazendo e preparando a tinta
A técnica da pintura foi se transformando ao longo do tempo, na medida em que novas tintas eram criadas, o que ampliou as possibilidades de uso de diferentes suportes.
Os artistas ligados às vanguardas modernistas no século XX experimentaram, então, materiais industrializados – chapas de madeira e vidro, por exemplo – como suportes para suas pinturas. No entanto, foi apenas com a invenção da tinta acrílica, composta de pigmentos e resinas plásticas, que se tornou possível pintar sobre plástico, chapas de metal, recortes de madeira compensada, tecidos estampados e todo tipo de superfície plana ou com relevos.
Assim, na década de 1980, muitos dos jovens artistas que se envolveram com a pintura usaram a tinta acrílica, que possibilitava experiências diversas sobre qualquer material. A renovação da pintura não se restringia, no entanto, à pesquisa de tintas e suportes. Associada a outras linguagens, como a fotografia, o bordado, a costura e a escultura, a pintura foi utilizada até para cobrir objetos de uso cotidiano.
Os artistas da geração de 1980 também exploraram a adição de materiais aos pigmentos para criar efeitos tridimensionais em suas pinturas. Eles experimentaram, inclusive, técnicas antigas, como a encáustica – que utiliza cera de abelha como aglutinante dos pigmentos –, e prepararam tintas pastosas, quase sólidas, derretendo parafina ou cera em lata.
Elementos como vaselina, gesso, terra e areia foram adicionados à tinta, enquanto palha, papelão e pequenos objetos foram aplicados diretamente na tela, formando relevos e texturas. O resultado dessas experiências foi uma pintura com volume, quase tridimensional.
O paulista Nuno Ramos (1960-), junto com outros jovens artistas do ateliê Casa 7, fazia grandes pinturas usando tinta esmalte sobre papel craft. Como esses materiais eram acessíveis, foi possível explorar o gesto e as grandes pinceladas. Não havia compromisso com a durabilidade do trabalho, o que se desejava era experimentar.
Nuno Ramos associou materiais diversos às suas telas, o que resultou em trabalhos grandes e tridimensionais. No decorrer de sua carreira, produziu esculturas e criou instalações, tornando-se um artista que trabalha com suas inquietações e explora diferentes temas, mídias, técnicas e linguagens, inclusive a literatura e o cinema.
R AMOS, Nuno. [Sem título]. 1989. Vaselina, parafina, pigmento, tecidos, metais e folhas de ouro sobre madeira, 280 cm x 340 cm. Coleção do artista.
FORTES D'ALOIA & GABRIEL, SÃO PAULO, BRASIL
AçÃO Fazendo arte
Depois das pesquisas e das reflexões sobre a pintura e os pintores, você vai experimentar alguns recursos e procedimentos capazes de desencadear processos criativos estimulantes.
Oriente os estudantes a preparar a sala de aula para o trabalho, forrando as mesas ou o chão com jornal. Para fazer a tinta, será preciso uma medida, que pode ser um pote pequeno. Esse pote, de plástico, ou de vidro, com abertura larga e tampa, deve ser usado para preparar e guardar a tinta. Se bem tampada, a tinta pode durar algumas semanas.
1. Experimentação de suportes
Oriente-os, também, a respeito da função de cada um dos elementos que compõem a tinta: o pigmento é o pó, o aglutinante é a cola branca, o solvente é a água, e o conservante é o detergente. O ideal é usar papel craft em rolo, que é mais acessível e pode ser cortado no tamanho adequado para a pintura de cada estudante.
Incentive a turma a usar as tintas em grandes quantidades, sem medo. Diluída com água, a tinta acrílica fica mais líquida e pode penetrar mais facilmente em tecidos variados, mas sempre vai ficar com um efeito de transparência. Para cobrir totalmente um elemento, o melhor é usar tinta branca. Algumas superfícies, como as de objetos porosos, são mais adequadas para pintura e podem funcionar melhor. Assim, se um estudante trouxer, por exemplo, um objeto de madeira, como um cabide antigo quebrado, será interessante lixar a superfície antes de pintá-la. Uma panela de alumínio pode ser pintada com tinta acrílica, mas a película da tinta, com o tempo, pode se desprender da superfície pintada.
• Para começar, você experimentará o trabalho pictórico sobre materiais não convencionais. Traga para a aula objetos quebrados, brinquedos antigos, utensílios que não são usados, pedaços de madeira, entre outros.
• Para essa atividade, você vai precisar de tinta acrílica branca. Junte-se a cinco ou mais colegas para dividir um pote da tinta branca e dois tubos de tinta colorida. Misturando o branco às duas cores dos tubos, é possível obter algumas variações de cor – que podem ser usadas por todos.
• Examine com atenção o material que você trouxe. É uma superfície plana ou um objeto tridimensional? É feito de algum tipo de tecido ou é de madeira, ferro ou plástico? Que tipo de intervenção você pode fazer nesse suporte com a pintura? O que pode ser apagado ou ressaltado nesse objeto por meio dela?
• Limpe bem e, se possível, lixe a superfície que você vai pintar. Se for pintar um tecido, umedeça-o antes de começar.
• Execute a pintura. Se necessário, dê mais de uma demão até atingir a cobertura desejada, sempre respeitando o tempo de secagem entre as aplicações de tinta.
Atenção: essa atividade é experimental, e alguns procedimentos podem ter resultados inesperados. O processo de experimentar tintas e suportes sempre traz algum aprendizado, mesmo que os objetivos pretendidos não sejam alcançados.
2. Fabricação de tinta
• Providencie os seguintes materiais: cola branca tipo PVA; pigmento em pó (uma cor para cada grupo de oito estudantes) ou terra seca e peneirada; detergente (um para a turma toda será suficiente); um pote de plástico com tampa; um palito; pincéis largos; água; e folhas de papel craft.
• Misture uma parte de pigmento em pó com uma parte de água. Faça essa mistura aos poucos, até alcançar uma consistência pastosa. Depois, agregue meia parte de cola branca. Misture bem até obter uma substância homogênea. Por fim, coloque três gotas de detergente na tinta, para que ela dure e não fique mofada.
• Use um pedaço do papel craft para experimentar a consistência da tinta. Você pode agregar outras substâncias a ela. Pense no que poderia misturar.
• C omo seu grupo preparou apenas uma cor, troque-a por cores criadas pelos outros grupos, se quiser usar mais cores. A tinta acrílica nem sempre adere a qualquer superfície e há diferentes composições dessa tinta no mercado.
• P ara realizar a pintura, prenda uma folha grande de papel craft em uma parede ou um muro. Ao pintar, faça gestos largos, não economize tinta, faça sobreposições e verifique se algo pode ser colado sobre sua pintura.
À esquerda, pigmentos coloridos, em pó, utilizados para preparo de tinta. À direita, as tintas prontas, devidamente misturadas.
3. Intervenção em imagem pronta
• Agora, você fará uma pintura em uma superfície que já traz informações.
• Providencie cola branca, tinta previamente preparada, pincéis largos, potes pequenos – podem ser de alimentos consumidos, como manteiga, requeijão etc., e que seriam destinados à reciclagem –, papel craft, uma ou mais páginas de revista, um cartaz antigo, um pedaço de outdoor encontrado na rua ou, ainda, fotografias impressas.
• Cole as páginas de revista (ou outro material que tiver conseguido) sobre uma folha de papel craft e deixe secar.
• Com a tinta, faça uma pintura apagando algumas partes e ressaltando outras, ou desprezando completamente a informação que já existe na superfície.
• Faça intervenções com uma cor, deixe secar, depois faça com outra cor.
4. Avaliação coletiva
• Após realizar as experiências propostas, pendure os trabalhos realizados em uma parede da escola, para que todos possam observá-los detidamente.
• Em seguida, converse com os colegas e o professor a respeito dos procedimentos utilizados e dos resultados obtidos: as experiências de pintar sobre suportes variados deram certo? Houve algum resultado inesperado? Qual? Que suportes foram mais inusitados? Como foi o processo de preparo das tintas? Como ficaram as pinturas com as tintas preparadas? Como você avalia a experiência de trabalhar sobre imagens prontas? Em que trabalhos se observou a opção de interagir com a imagem preexistente? Em que trabalhos essas imagens foram ignoradas na composição?
MUSiCA E DANÇA
CONTEXTO
A cidade é de todos
Não é só em museus, teatros ou centros culturais que é possível apreciar a arte ou assistir a projeções e encenações. Obras e manifestações artísticas também estão presentes em muros, praças e ruas da cidade. A arte urbana, portanto, não é uma novidade. A relação entre arte e espaço urbano existe desde o surgimento das cidades, manifestando-se, por exemplo, por meio da arte pública, cívica ou religiosa, que era realizada para celebrar conquistas, reafirmar o poder de grupos e pessoas, estimular a fé e promover vínculos entre a população e os espaços de convívio social. Contudo, foi a cultura hip-hop que, a partir do fim da década de 1970, ocupou as ruas como expressão artística do cidadão. Muitas das manifestações que ocorrem na cidade, hoje, tiveram sua origem nesse movimento, que tem como elementos essenciais o DJ e o MC, o rap, o breaking e o grafite.
Com a deterioração da qualidade da vida urbana no planeta, especialmente nas megalópoles, as cidades têm como desafio enfrentar o adensamento populacional, a carência de infraestrutura básica nas áreas periféricas, o excesso de automóveis em circulação, a insuficiência de espaços públicos de lazer para a população, a degradação e o abandono de áreas centrais e a restrição da circulação das pessoas por meio de grades e muros em vias e praças. Diante desses desafios, os jovens reagem e buscam conquistar o espaço urbano para práticas como skate, ciclismo, dança, música, grafite e outras intervenções. Essa apropriação dos espaços urbanos é uma maneira de exercer a cidadania por meio de manifestações artísticas. A população das grandes áreas urbanas está cada vez mais engajada em ocupar as ruas para realizar eventos culturais, intervenções, protestos ou festas. Assim, a cidade se torna um meio de expressão coletiva, viva e em contínua transformação. A cidade é de todos – ou, pelo menos, deveria ser.
CONeXãO
Triunfo, o pai do hip-hop
O documentário Triunfo (2014), dirigido por Caue Angeli (1984-) conta a história do dançarino, músico e ativista social pernambucano Nelson Triunfo (1954-).
Personalidade importante no estabelecimento da cultura black no Brasil nos anos 1970, ele foi pioneiro na introdução do breaking nas ruas de São Paulo e um dos primeiros artistas a se dedicar à difusão da arte e da cultura na periferia, defendendo o hip-hop como fonte de conhecimento. O trailer do filme está disponível em: https://vimeo.com/67247866 (acesso em: 30 set. 2024). Há também uma entrevista feita com o artista, por ocasião do lançamento do filme, que pode ser assistida em: http://revistatrip.uol.com.br/trip-tv/a-trajetoria-denelson-triunfo-no-trip-tv.html (acesso em: 30 set. 2024).
Nelson Triunfo, dançarino, músico e ativista pelas causas sociais, em performance no centro de São Paulo (SP), em 2011.
ACERVO PESSOAL
REPERTORiO 1
Slam poetry
Na década de 1980, surgiu no subúrbio de Chicago, nos Estados Unidos, uma nova forma de arte. O poeta e operário da construção civil Marc Kelly Smith (1949-) acreditava que uma poesia mais informal poderia ser utilizada para que ele pudesse se comunicar melhor com o público e gerar consciência política, passando, então, a usar espaços públicos para recitar. Assim surgiu a slam poetry
A slam poetry mistura elementos da cultura folk, do teatro de cabaré e do jazz e está inserida no movimento conhecido como spoken word. Esse estilo de poesia é influenciado por vários movimentos anteriores, como os beatniks – propulsores da estética hippie e da contracultura –; e o Black Arts Movement (BAM) – liderado por artistas afro-americanos que buscavam expressar suas experiências e lutar contra a discriminação. Além disso, personagens como Amiri Baraka (1934-2014) e Maya Angelou (1928-2014), que estiveram envolvidos na luta pelos direitos civis, tiveram um grande impacto na forma como a slam poetry se desenvolveu.
O slam chegou ao Brasil por meio da Frente 3 de Fevereiro, um coletivo transdisciplinar que, desde 2004, realizava ações voltadas para o combate ao racismo. Roberta Estrela D’Alva (1978-), integrante do grupo, entrou em contato com a cultura da slam poetry e, após uma viagem aos Estados Unidos, idealizou a primeira batalha de slam brasileira: o ZAP! (Zona Autônoma da Palavra), que ocorreu em São Paulo, em 2008. O evento atraiu tanto pessoas que nunca tinham recitado poemas quanto artistas já consolidados, como os representantes da chamada poesia marginal, MCs, rappers, atores, estudantes e poetas que frequentavam microfones abertos na cidade.
King Abraba no Slam BR, realizado na cidade de Itabira (MG), 2023. No ano seguinte, a paulista foi vice-campeã de poesia falada na competição latino-americana de slam, a Abya Yala Poetry Slam, e representou o Brasil na final.
Final do Slam de Cria, no Rio de Janeiro (RJ), em 2023.
1. Resposta pessoal. Destaque que o slam é uma arte nascida em contextos de periferia e possui forte apelo político. Assim, a experiência dos próprios poetas é tema presente nesse tipo de poesia.
Os slams abordam temas como desigualdade social, participação da mulher negra na sociedade, questões de gênero, feminismo e racismo, tendo forte apelo social. Sabendo disso, reflita sobre as questões a seguir.
1 Em sua opinião, por quais motivos esses são temas comuns na slam poetry do Brasil?
2 Quais podem ser as diferenças entre escrever e recitar uma poesia?
Resposta pessoal. Explore com os estudantes que, ao passo que a poesia escrita trabalha também a visualidade da palavra, a poesia falada explora elementos como a sonoridade, o ritmo e o gesto.
Não escreva no livro.
FÁBIO
CAFFÉ
AGUINALDO FERRY
Dança urbana: das ruas para os palcos
Cena do espetáculo In(in)terrupto, da Companhia Híbrida, criada por Renato Cruz Fotografia de 2018.
O hibridismo que caracteriza as danças urbanas desde o início do breaking, um dos eixos do movimento hip-hop, continua recebendo outras influências e provocando novas misturas. A partir dos anos 1990, a aproximação entre a dança de rua e os modos de investigação e criação próprios da dança contemporânea levou muitos dançarinos de rua para os palcos dos teatros. O fluminense Bruno Beltrão (1979-), à frente do Grupo de Rua de Niterói (GRN); o carioca Renato Cruz (1982-), da Companhia Híbrida; e a francesa Bintou Dembélé (1975-), diretora do projeto Rualité, coreógrafa e referência do hip-hop na França, são alguns nomes que vêm ampliando as fronteiras da dança urbana. Eles desafiam as convenções ao retirar essa dança do contexto exclusivo das batalhas, rompendo com a estrutura rígida de batidas regulares e as regras precisas das competições e abrindo espaço para novas formas de expressão e performance dentro do gênero.
No entanto, a aproximação da dança de rua e da arte contemporânea nem sempre é vista com bons olhos. Alguns grupos acreditam que há regras a serem defendidas para que a dança de rua seja preservada e mantenha suas características próprias, como o teor contestatório, a liberdade dos movimentos e suas origens, que são atreladas às classes trabalhadoras, às comunidades periféricas e aos grupos sociais historicamente excluídos de diversas esferas sociais. Ainda assim, as marcas desse estilo são presença forte e criativa nos palcos e festivais de dança contemporânea ao redor do mundo.
Com base no texto e na observação da fotografia, reflita e responda às questões a seguir.
1 O que muda nas danças urbanas quando elas se organizam para serem apresentadas nos palcos?
2 Você já teve a oportunidade de se apresentar em um palco? Como foi essa experiência? Não escreva no livro.
1. Nas danças urbanas, em geral, não há uma separação clara entre os que dançam e os que assistem, como acontece quando elas ganham os palcos. No palco, há uma preocupação maior com os figurinos, com a iluminação cênica e, eventualmente, com a cenografia. Resposta pessoal. Peça aos estudantes que relatem como foi a experiência de se apresentar diante de uma audiência em um espaço organizado para isso, como um palco ou auditório. Estar em situação de cena altera radicalmente a relação com nosso próprio corpo e presença, gerando um tipo de exposição bastante particular. Explore essas sensações com os jovens.
REPERTORiO 3
O rap e seus estilos
A palavra rap traz as iniciais de rhythm and poetry (ritmo e poesia), revelando que a cultura hip-hop tem a mensagem como um de seus pilares mais importantes.
O rap nasceu nos Estados Unidos, em comunidades jamaicanas, latinas e afrodescendentes que viviam na periferia de Nova York. Suas origens estão, portanto, na expressão da resistência política e social que ocorria nos bairros.
Hoje em dia, no entanto, não é possível falar do rap como um único estilo, pois há diversas variantes do gênero. O trap, por exemplo, se consolidou nos anos 2000, quando o estadunidense Paul Beauregard (1977-), conhecido como DJ Paul, começou a utilizar um sintetizador para fazer experiências sonoras e criar efeitos de forma mais livre. O estilo vem se popularizando entre os jovens e tem no cantor Matuê (1993-) um dos seus principais representantes no Brasil.
Já o rap gospel é um estilo voltado para a religiosidade e tem como base os ensinamentos de Jesus Cristo, que é reinterpretado como um homem negro que pregava ideais semelhantes
O rap é, portanto, a união da poesia e da música e visa expressar os desafios da vida nos grandes centros urbanos.
1. Resposta pessoal. Permita que que os estudantes compartilhem seus conhecimentos e peça a eles que citem exemplos de artistas. aos defendidos atualmente pelos rappers. O grupo paulista Ao Cubo, que iniciou seus trabalhos em 2003, é um dos maiores expoentes do gênero. Por sua vez, o rap politizado é protagonizado por artistas que se posicionam como porta-vozes das comunidades pobres de onde vieram e que têm consciência de seu papel político junto a elas. Em São Paulo, o grupo mais representativo desse estilo é o Racionais MC’s.
O grupo Racionais MC's em gravação do videoclipe da música "Mil faces de um homem leal", uma homenagem a Carlos Marighella, em um prédio pertencente a Ocupação Mauá, em São Paulo (SP). Fotografia de 2012.
Sabendo que o rap é um gênero musical muito difundido entre os jovens em todo o mundo, responda às questões a seguir.
1 Você conhece outros estilos de rap além dos mencionados no texto?
2 Em sua opinião, a música pode ser um meio de denunciar problemas sociais?
Não escreva no livro. Resposta pessoal. Destaque o fato de que a letra de uma canção pode transmitir mensagens e despertar reflexões e que a difusão da música pode dar visibilidade a questões sociais. Para isso, você pode recorrer a letras como a do rap “A volta pra casa” (2017), de Rincon Sapiência (1985-), que narra os desafios da mulher trabalhadora, do transporte público e da violência na cidade.
CARLOS CECCONELLO/FOLHAPRESS
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Letra e rima
A necessidade de equilibrar ritmo e poesia está no centro da construção dos textos de slam e das letras de rap , o que torna sua criação um processo complexo. Quando se trata da construção de uma canção, ou seja, do encontro entre a poesia e a melodia, é essencial lembrar que existem estudos sobre métrica poética que ajudam o compositor a adaptar o texto aos elementos musicais, como a harmonia, o contraponto, a textura e a estrutura melódica e rítmica. Esses estudos possibilitam uma integração fluida entre palavras e som, criando uma composição em que poesia e música se complementam.
Quando se trata de estilos musicais como o coco de embolada e o rap, que priorizam o improviso poético, a análise e o processo de composição se assemelham aos da poesia. Um dos maiores desafios é conseguir manter a fluência do texto e a qualidade das rimas.
Tal como na canção ou na poesia, o poeta de slam também se preocupa com a métrica e com a rima, e a construção da rima pode seguir alguns padrões. Leia, a seguir, alguns exemplos.
• Rima emparelhada : quando o primeiro verso rima com o segundo, e o terceiro verso rima com o quarto, no esquema AABB. O mano que entrega envelope o dia inteiro no sol (A)
Ou o que vende chocolate de farol em farol (A)
Talvez o cara que defende o pobre no tribunal (B)
Ou o que procura vida nova na condicional (B)
coco de embolada: expressão musical nordestina baseada no improviso de versos cantados e que podem ser acompanhados de instrumentos como pandeiro, viola ou rabeca.
RACIONAIS MC’S. Sobrevivendo no inferno. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. p. 54. Grifo nosso.
• Rima de terminação: quando vários versos terminam com a mesma rima (AAAA).
Não, não, não, eu tô a fim de parar (A)
Mudar de vida, ir pra outro lugar (A)
Um emprego decente, sei lá (A)
Talvez eu volte a estudar (A)
RACIONAIS MC’S. Sobrevivendo no inferno. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. p. 66. Grifo nosso.
• Rima multissilábica: quando há o encontro de sons em mais de uma sílaba das palavras, como no caso de periférico e numérico.
Este lugar é um pesadelo periférico
Fica no pico numérico de população
RACIONAIS MC’S. Sobrevivendo no inferno. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. p. 91. Grifo nosso.
CONeXãO
Rimas multissilábicas no rap
As rimas multissilábicas podem ser divididas em simples (quando os blocos de rima envolvem apenas uma palavra); compostas (quando cada bloco de rima tem mais de uma palavra – salário mínimo / trabalho digno); ou mistas (quando um bloco tem mais de uma palavra e o outro, não – fisicamente / lírica quente). Para compreender melhor esses conceitos, assista ao vídeo disponível em: www.youtube.com/watch?app=desktop&v=pZIbidPJYo0 (acesso em: 30 set. 2024).
Qual é o seu grito?
O slam e o rap são formas de linguagem que nasceram da vontade de ocupar a cidade. O rap originou-se dentro do movimento hip-hop e, por meio de sua poesia, pode ser um importante meio para denunciar os problemas das comunidades e posicionar-se diante deles.
Agora, você vai criar um rap que expresse as questões de sua escola ou da vizinhança. Você vai precisar de:
• lápis, papel e borracha para anotar a letra e as ideias;
• caixa de som para reproduzir o beat do rap
1. Compondo como um MC
• Em grupos com três ou quatro integrantes, escolham o tema a ser abordado. Para isso, reflitam sobre os problemas que afetam o cotidiano da escola ou da rua ou do bairro em que ela está situada. O que vocês gostariam de denunciar ou transformar? Sobre o que desejam alertar as pessoas da comunidade?
• Em seguida, pensem em palavras-chave que se relacionem com o tema escolhido. Façam, então, uma lista, buscando palavras que rimem com cada uma delas, como no exemplo a seguir.
Palavras-chave
Cidade
Educação
Desigualdade
Palavras que rimam
Diversidade, sororidade etc.
Solidão, comunhão etc.
Humanidade, comunidade etc.
• Comecem a compor os versos do seu rap, utilizando as palavras-chaves e as listadas. Procurem estar atentos ao ritmo e às rimas de cada verso. A melhor forma de perceber o ritmo dos versos é declamá-los em voz alta, para perceber suas sonoridades. Por isso, recitem o rap algumas vezes, com o objetivo de notar a divisão métrica.
• Procurem criar um refrão, ou seja, um trecho ou conjunto de versos que se repetem de tempos em tempos. O refrão pode ser um sample, isto é, um trecho de som ou música extraído de uma gravação já existente. Decidam em quais momentos o refrão entrará na composição. Esse recurso ajudará a organizar a forma do seu rap.
2. Criando como um DJ
• Para a base musical, vocês podem pesquisar um beat na internet ou escolher um entre os disponíveis nos áudios Bases de rap 1 e 2. Escolham a base que mais agradou ao grupo e que mais se relaciona com o tema definido. Se alguém no grupo souber fazer beatbox (percussão vocal), a base também pode ser acrescida desse recurso.
EDITORIA DE ARTE
• Ao longo do processo de composição, testem o rap com o beat escolhido. Esse processo pode ser facilitado se vocês estiverem ouvindo e se relacionando com a pulsação oferecida pela base musical.
• Ao usar a base musical, talvez seja necessário fazer ajustes na letra, como substituições de palavras ou elisões – esses recursos, muitas vezes, ajudam o compositor a relacionar o texto com a pulsação. Busquem deixar o texto o mais coerente possível com a batida.
3. Batalha de rap
elisão: eliminação de uma vogal átona ao fim de uma palavra, ligando-a ao início do vocábulo seguinte. Exemplos: minh’alma; copo d’água.
Organize a turma em roda, para que todos os estudantes possam acompanhar as apresentações.
• Cada grupo deverá apresentar o seu rap para os demais colegas da turma. Para isso, vocês vão precisar de uma caixa de som na qual se possa ouvir, em bom volume, os beats Microfones plugados à caixa podem ajudar na compreensão dos textos.
• Definam, coletivamente, quem será o MC, ou seja, o principal responsável pelo texto. Vocês também podem dividir a responsabilidade e escolher mais de um integrante para cantar cada trecho do rap. Se alguém souber fazer beatbox e simular uma bateria eletrônica usando a percussão vocal, esse elemento pode ser incorporado à apresentação.
• Certifiquem-se de que todos do grupo conhecem a letra criada. Se necessário, leiam a letra, embora isso faça com que se perca o contato com o público.
4. Avaliação coletiva
• Compartilhe suas impressões sobre o trabalho de seu grupo: quais foram as dificuldades enfrentadas na composição do rap? E na apresentação? Como foi assumir a postura de um rapper? A turma entendeu a mensagem de cada grupo?
CONeXãO
O beat na ponta da língua
Fernando da Silva Pereira (1975-), mais conhecido como Fernandinho Beat Box, é um dos pioneiros do beatbox no Brasil. Ele ganhou notoriedade ao popularizar essa forma de percussão vocal no país, especialmente no cenário do hip-hop. Participou de diversos programas de TV, batalhas e shows, ganhando respeito nas cenas musicais brasileira e internacional. Sua versatilidade o levou a colaborar com artistas de diversos estilos musicais, propagando a técnica para novos talentos e promovendo o beatbox como uma arte. Acesse o canal oficial do artista na internet. Disponível em: www.youtube.com/ channel/UCYpF72iJ8xpZZN71KTYBjfA (acesso em: 30 set. 2024).
Fernandinho Beat Box em apresentação na Virada Cultural de São Paulo (SP), 2017.
MUSiCA E DANÇA
CONTEXTO
Breaking e rap na cultura hip-hop
No início do movimento hip-hop, nas ruas dos bairros pobres das cidades estadunidenses, b-boys e b-girls desafiavam-se em batalhas com sua movimentação explosiva, atlética e precisa. Desde então, a dança de rua não parou de se transformar. Nos últimos anos, por exemplo, o passinho, nascido nas comunidades cariocas, conquistou crianças e jovens de várias partes do Brasil com sua movimentação alegre, que mistura referências do breaking, da capoeira, do frevo, do stiletto e até do kuduro, ritmo de origem angolana.
O rap também encontrou, na música e na poesia, sua expressão no contexto da cultura hip-hop e, a partir da década de 1980, ganhou um caráter politizado. A espinha dorsal do gênero é a colaboração entre MC e DJ. MC é a abreviação do termo master of ceremonies, que significa “mestre de cerimônias” e designa o artista que fala enquanto a música é tocada. Já o termo DJ deriva do inglês disc jockey e refere-se ao responsável pela manipulação da matéria sonora por meio de processos tecnológicos como o sampling – que consiste em selecionar fragmentos sonoros (samples) e inseri-los em um trecho da música que se está gravando ou tocando.
No Brasil, o rap consolidou-se no final da década de 1980, com os encontros de equipes de breaking em São Paulo. O estilo alcançou sucesso independentemente da grande mídia e atraiu a atenção de diversos setores da sociedade na época.
As rodas de breaking e as batalhas de rap são expressões do hip-hop que nasceram como forma de ocupação dos espaços das cidades. À esquerda, jovem faz movimento de break enquanto participantes do evento assistem, na Praça da Colmeia, em São Paulo (SP), 2023. À direita, uma batalha de MC's, misturando rap e hiphop, em Olinda (PE), 2018.
REPERTORiO 1
A parceria entre o MC e o DJ
O hip-hop é fundamentado na parceria entre o MC e o DJ, e cada um desses personagens possui uma função única. O DJ é o responsável por reinventar ritmos com base em elementos já existentes, por meio de sintetizadores ou samplers – o que exige grande domínio do ritmo e da pulsação musical.
O beat, ou seja, a batida, é formada, basicamente, por loops de baterias (ritmos de baterias eletrônicas que se repetem), linhas
O sintetizador que os DJs usam é conhecido também como caixa de ritmos. O primeiro sintetizador programável começou a ser usado no final de 1980.
Também é comum os DJs usarem discos de vinil em suas execuções e aplicarem técnicas como o scratch – onomatopeia para o som produzido pelo vai e vem do vinil sobre o toca-discos.
O MC é a pessoa responsável pela poesia, pela letra do rap. É comum que se tenha uma voz principal fazendo o discurso rimado e uma ou mais vozes de fundo para dar força e destacar trechos da letra como em um coro. Muitas vezes, artistas são convidados para fazer a segunda voz em trechos dos versos principais, por exemplo.
O MC também deve ter uma imensa habilidade rítmica, pois precisa interagir diretamente com o beat do DJ e ter grande capacidade de escandir os versos, isto é, criar destaques nas sílabas e palavras, de forma a dar um ritmo próprio à poesia do verso.
1. O surgimento dos instrumentos eletrônicos e dos sintetizadores revolucionou o mundo da música instrumental, e novos sons foram incorporados a arranjos e composições. Desse modo, o sintetizador pode ser classificado como um instrumento musical eletrônico.
O beat com o qual o DJ trabalha é criado em cima de bases eletrônicas. Essas bases podem ser elaboradas por meio de sintetizadores (máquinas que imitam instrumentos de maneira eletrônica) ou samplers (que usam sons pré-gravados). Sabendo disso, debata com a turma as seguintes questões.
1 O sintetizador pode ser considerado um instrumento musical?
2 Os samples (fragmentos de músicas já existentes e que são utilizados pelos DJs ) constituem uma forma de plágio ou de imitação musical?
Os samples são citações e releituras, e não cópias, o que não caracteriza plágio ou imitação. A citação faz parte do gênero musical. de baixo (melodias que imitam baixos elétricos), orquestras de suporte (melodias tocadas por instrumentos musicais e que se sobrepõem à base da bateria e do baixo) e samples (fragmentos sonoros de músicas já existentes e que são citadas no beat ).
CONeXãO
Compondo beats
Existem softwares on-line que simulam o funcionamento de um sintetizador com base em sequências musicais pré-gravadas que podem ser recombinadas para criar beats inéditos. Experimente diferentes sequências acessando o programa disponível em: www.virtualdrumming.com/drums/virtual-drum-machine-online/drum-machine-onlinefree.html (acesso em: 30 set. 2024).
Não escreva no livro.
BRANDON
REPERTORiO 2
Breaking: arte ou esporte?
O caráter dinâmico e atlético dos movimentos do breaking, somado ao aspecto competitivo das batalhas, contribuiu para elevar a atividade ao posto de modalidade olímpica nos Jogos Olímpicos de Paris, em 2024, pela primeira vez.
O breaking evoluiu de uma dança jovem e urbana, praticada nas ruas de Nova York nos anos 1970, para uma modalidade esportiva que conquistou jovens ao redor do mundo. Apesar de sua origem ligada à cultura de rua, o estilo ganhou espaço em festivais, batalhas e competições internacionais, como The World Battle, Freestyle Session e Unbreakable. No Brasil, eventos como o Quando as Ruas Chamam, realizado em Brasília, e o Festival Master Crews, em São Paulo, celebram a cultura hip-hop e o talento dos dançarinos.
No entanto, na qualidade de expressão esportiva, o circuito competitivo do breaking ainda está em fase de estruturação, havendo muito espaço para crescer e se consolidar no cenário global. O Brasil, por exemplo, não competiu na estreia olímpica do breaking. Algumas comunidades de b-boys e b-girls consideram que a inclusão do breaking nas competições esportivas trará mais visibilidade e reconhecimento a essa prática. Entretanto, há quem tema que essa transição para o âmbito esportivo possa diluir o valor artístico e cultural da dança, enfraquecendo suas raízes criativas e comunitárias.
1. Respostas pessoais. As relações entre arte e esporte são complexas e multifacetadas. É comum que uma jogada de excelência em uma partida esportiva seja qualificada como artística. Ou que formas artísticas assumam aspectos de jogos explícitos, como ocorre em espetáculos de comédia de improviso. Além disso, tanto a arte quanto os esportes são manifestações culturais. Explore essas fronteiras com os estudantes, incentivando o debate. Quando um esporte é arte? Quando a arte é esporte?
A B-girl lituana Dominika Banevic, conhecida por Nicka, comemora sua medalha de prata durante os Jogos Olímpicos de Paris na praça do Trocadero. Paris (França), 2024.
Não escreva no livro.
Depois de observar a fotografia e ler o texto, responda às perguntas a seguir.
1 Em sua opinião, alguma prática pode ser, ao mesmo tempo, artística e esportiva? Por quê?
2 Você conhece outra modalidade esportiva que se aproxima da arte?
Resposta pessoal. Algumas modalidades esportivas que podem ser mencionadas pelos estudantes são a ginástica rítmica e a patinação artística, por exemplo, pois ambas requerem habilidades técnicas e destreza. Em esportes como a patinação artística, skate e breaking, por exemplo, os movimentos são executados com precisão e complexidade, combinando a habilidade atlética com a expressão artística. Também podem ser trabalhados elementos comuns às modalidades, como: performance e expressão, competição e avaliação, criatividade e inovação, estética e estilo.
REPERTORiO 3
Breaking para todos os corpos
• Espera-se que os estudantes mencionem que a falta de incentivo e visibilidade são algumas das dificuldades. As pessoas com deficiência podem praticar qualquer tipo de atividade, desde que os espaços sejam acessíveis a elas. As pessoas surdas, por exemplo, necessitam de aparelhos sonoros que as permitam ouvir a pulsação da música. Portanto, é fundamental um apoio econômico, social e governamental para que a acessibilidade seja ampla e real. Incentive-os a refletir sobre como o mundo é feito para pessoas consideradas “padrão” e como isso dificulta a vida de quem não se enquadra nesse padrão estabelecido, desde o acesso ao transporte público a oportunidades no mercado de trabalho. Com incentivos governamentais, apoios e patrocínios, as pessoas com deficiência poderiam ocupar diversos espaços, seja na arte ou em outras esferas sociais. Além disso, as pessoas com
O breaking tem conquistado pessoas com deficiência em várias partes do mundo.
O grupo internacional ILL-Abilities, por exemplo, reúne b-boys de países como Argélia, Canadá, Estados Unidos, França, Coreia do Sul, Holanda, Chile e Brasil. Entre seus membros brasileiros estão Samuka e Perninha, que participam ativamente de apresentações e ações educativas, demonstrando que o breaking é acessível a corpos diversos.
O dançarino argelino Youcef Mecheri, conhecido como Bboy Haiper, é um exemplo notável de como o breaking pode ser adaptado. Ele aprendeu a dançar imitando os movimentos que via em vídeos e descobriu que, apesar de precisar de muletas para se locomover, podia integrar o apoio das muletas aos movimentos de breaking. Atualmente residindo na França, Mecheri foi um dos artistas que se apresentaram nas cerimônias dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Paris em 2024, mostrando ao mundo a capacidade que o breaking tem de transcender limitações físicas e inspirar a inclusão.
deficiência sofrem diversos preconceitos, portanto, é importante que a visão social a respeito delas mude para que elas possam ser tratadas com igualdade.
No Brasil, diversas iniciativas vêm fazendo do breaking uma prática cada vez mais inclusiva. Uma delas é o Breaking para surdos, uma extensão do projeto Jump in Dance criado, em 2017, pelo educador Fabrício da Fonseca na cidade de Paranaguá, no Paraná. Tal projeto tem como objetivo promover o ensino de breaking para jovens e adultos da comunidade surda. Durante a pandemia de covid-19, as aulas passaram a ser ministradas de maneira remota, o que aumentou a visibilidade do projeto e conquistou adeptos surdos de diferentes idades e países.
Grupo ILL-Abilities, formado por dançarinos com algum tipo de deficiência, nos Jogos Paralímpicos Paris 2024. Paris (França), 2024.
O argelino Youcef Mecheri, um dos fundadores do grupo ILL-Abilities em apresentação no Hip-Hop 360 Show, no Théâtre du Châtelet. Paris (França), 2024.
Não escreva no livro.
Tomando por base o conteúdo apreendido, responda à seguinte pergunta.
• Q uais são os desafios enfrentados por pessoas com deficiência para o acesso à prática do breaking?
RICHARD BORD/GETTY IMAGES
PESQUiSA
A cultura hip-hop em cena
O hip-hop não é só um estilo musical mas é também um movimento artístico com impacto social e político. Uma forma de aprender mais sobre o movimento hip-hop é por meio do cinema. Alguns documentários e filmes musicais realizados no Brasil abordam o crescente interesse dos jovens por esse tipo de arte nas grandes cidades do país. 1. Você conhece filmes que abordam o universo do rap e do slam no Brasil?
• No documentário Slam: voz de levante , a poetisa Roberta Estrela D’Alva guia o público em uma viagem às origens das competições nos Estados Unidos e traça um panorama do crescimento da cena brasileira desde 2008. O trailer oficial do filme está disponível em: https://globofilmes.globo. com/filmografia/documentario/filme/slam-voz-de-levante. ghtml (acesso em: 30 set. 2024).
• O rapper e compositor paulista Emicida (1985-) lançou, em 2020, o documentário AmarElo: é tudo pra ontem , que conta a história da produção de seu álbum homônimo. Ao longo do documentário, Emicida contextualiza temas como a escravização, a história do trabalho em São Paulo, a imigração e a gentrificação nas grandes cidades, que resultam na cultura hip-hop. O documentário aproxima a experiência periférica do rap nos dias de hoje com aquela vivida pelos sambistas no início do século XX e reivindica a fundação de um novo gênero, que batiza de neo-samba, estilo que mistura o rap e a tradição do samba urbano carioca, dando protagonismo à cultura negra e periférica de cidades como Rio de Janeiro e São Paulo. Busque pelo álbum AmarElo na internet e conheça melhor o trabalho do artista.
SLAM: voz de levante. 2018. Cartaz do documentário dirigido por Roberta Estrela D’Alva e Tatiana Lohmann.
AMARELO: é tudo pra ontem. 2022. Capa do documentário lançado em 2022 em plataformas de streaming.
2. De que maneira o universo da dança urbana no Brasil é mostrado no cinema?
• O crescimento da dança do passinho no Rio de Janeiro foi registrado no documentário A batalha do passinho, dirigido por Emílio Domingos (1972-). O filme aborda o aspecto competitivo da dança, assim como a importância que as batalhas têm em algumas comunidades cariocas. Assista ao trailer oficial do documentário em: www.youtube.com/watch?v= XCNWK_gErJo (acesso em: 30 set. 2024).
• No musical Maré: nossa história de amor, a diretora Lucia Murat (1949-) traz o amor impossível de Romeu e Julieta para uma comunidade carioca, na qual um projeto social promove o encontro dos jovens por meio da dança. As coreografias têm as danças urbanas como característica. Assista ao trailer oficial do filme em: www.youtube.com/ watch?v=0-Nw4tuXQTM (acesso em: 30 set. 2024).
MARÉ: nossa história de amor. 2007. Cartaz do musical dirigido por Lucia Murat.
A BATALHA do passinho. 2013. Cartaz do documentário dirigido por Emílio Domingos.
REPRODUÇÃO/OSMOSE FILMES REPRODUÇÃO/GLORIA
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Movimentos do breaking
Os movimentos da dança de rua têm inspirações diversas. Há quem reconheça manobras influenciadas pelas artes marciais, sobretudo pelo kung fu, como a do salto ágil para recuperar a vertical que os dançarinos fazem depois dos giros no chão. As marcas do sapateado estadunidense, como a rapidez dos movimentos dos pés, e alguns gestos da capoeira também podem ser reconhecidos.
Sempre vigorosos, de grande precisão e acrobáticos, os movimentos da dança de rua exigem muito controle dos dançarinos. No moinho de vento, por exemplo, uma das manobras mais conhecidas do breaking, os dançarinos realizam giros no solo em nível baixo, com o dorso em contato com o chão, movendo-se em torno de dois eixos simultaneamente. Há outros giros no chão, como o pião de mão, em que os dançarinos, apoiados com apenas uma das mãos no chão, usam o braço como eixo para girar. Já no pião de cabeça, o giro tem apoio somente na cabeça, com os pés orientados para o alto, em uma posição incomum.
O footwork, movimento básico dos b-boys e das b-girls, consiste em um trabalho ritmado e intenso dos pés, enquanto o restante do corpo, com o apoio das mãos, se movimenta em trajetória circular. Mas é por meio do top rock, outro movimento de pés, que os dançarinos mostram seu estilo quando entram nas rodas de batalhas. Muitas manobras se iniciam ou terminam em freezes – posturas em que o corpo parece congelar. Lembrando a origem estadunidense do breaking, esses passos e manobras, como muitos outros, ainda são identificados em inglês. Observe o footwork na imagem a seguir.
Na imagem, homem faz movimento de dança próximo ao chão. Aventurar-se pela dança de rua significa estar disponível para treinar e desafiar a coordenação motora e o equilíbrio. Além de boa escuta musical, é preciso desenvolver força física, flexibilidade e grande controle muscular, para que os movimentos sejam realizados sem risco. Praça Maria Izabel, no centro da cidade de Marília (SP), 2023.
AçÃO Batalha de dança
Batalha de hip-hop e competição de breaking, realizadas no Teatro Solar Boa Vista, no bairro do Engenho Velho de Brotas. Salvador (BA), 2016.
1. Preparação
• Faça um levantamento da presença da dança de rua no bairro ou na região em que você mora. Descubra se há festivais ou batalhas regulares ou se existem locais em que os jovens podem se encontrar para dançar ou assistir a batalhas e apresentações.
• Se não houver esse tipo de manifestação na região, busque ampliar seu conhecimento sobre o assunto por meio de videoclipes e filmes. Nesse caso, identifique passos e sequências que você possa realizar.
• Procure descobrir também se há, na escola, estudantes que conheçam passos de dança de rua. Se houver, convide-os para participar da batalha.
2. Praticando breaking
• Com a ajuda daqueles que têm mais experiência, vivencie alguns passos que você observou. Caso não haja uma pessoa que possa ensinar os passos, pesquise em canais de busca na internet.
• Eleja alguns passos para praticar. Pratique até que o movimento ganhe fluidez dentro do beat
• E xperimente algumas manobras. Comece sempre pela mais simples, não ouse fazer grandes saltos nem giros sem a garantia de que pode realizá-los sem se machucar.
• Lembre-se de que no universo do hip-hop, em que você tem liberdade de expressão, é possível improvisar e fazer interpretações muito pessoais dos movimentos observados.
3. Organizando a batalha
• Selecione músicas do universo hip-hop para a batalha, dando preferência ao rap.
• Definidas as músicas, experimente realizar os passos escolhidos. Trabalhe com mais colegas, pois o olhar do outro sempre ajuda a identificar detalhes que podem ser aprimorados.
• Quando você tiver um bom repertório de passos ensaiados, integre-se a um dos dois grupos em que a turma será dividida: grupo A e grupo B.
• O grupo A vai dançar primeiro. Não é preciso que o júri seja neutro: o grupo B vai observar para depois comentar, exercitando a análise e o olhar crítico.
• Na próxima rodada, os grupos deverão inverter os papéis.
4. A batalha em que todos vencem
• Junte-se aos colegas de grupo, formando uma grande roda. Dois integrantes do grupo A vão ao centro da roda para realizar uma batalha de dança.
• Assim que a primeira dupla encerrar sua apresentação, outra deverá iniciar, e assim sucessivamente, até que todos os integrantes do grupo A tenham dançado.
• Novamente em roda, o grupo B vai comentar as apresentações do grupo A, buscando contribuir para o aprimoramento da performance dos colegas.
• No mesmo dia ou em outra ocasião – conforme acordo prévio com os colegas e o professor –, a posição dos dois grupos deverá ser invertida, cabendo ao grupo B dançar e ao grupo A, assistir e comentar.
• Se possível, registrem as batalhas em vídeo e fotografias.
Pode acontecer de alguns estudantes não desejarem participar diretamente da batalha. Nesse caso, incentiveos a buscar, no universo do rap ou em sites que disponham de acervo de bases musicais eletrônicas, músicas com andamentos diferentes, para que os colegas possam improvisar. Eles podem pesquisar, por exemplo, um rap mais lento, um com andamento moderado e outro com andamento mais acelerado.
Se não houver na turma jovens interessados em dança de rua, transforme a batalha de dança em uma batalha do conhecimento. Peça aos estudantes que sugiram temas ou palavras para um debate, em que cada um possa falar uma frase, uma poesia, ou cantar um rap que aborde o tema definido previamente. Aproveite a ocasião para conhecer um pouco mais do universo dos jovens. Incentive os mais tímidos a se expressarem, reforçando a importância de defender suas ideias.
A mesma proposta pode ser desenvolvida com passos e gestos de outros estilos de dança. Não encare como um problema se cada estudante trouxer movimentos de diferentes fontes e com diferentes níveis de complexidade. Movimentos simples e bem realizados devem ser valorizados. O importante é que cada estudante perceba que tem competências e que seja encorajado a mostrá-las aos demais.
PONTE PARA OUTRAS
liNGUAGENS ARTiSTiCAS
TEATRO
Núcleo Bartolomeu de Depoimentos e o teatro hip-hop
O Núcleo Bartolomeu de Depoimentos é um coletivo teatral paulistano criado em 2000 pelos artistas Claudia Schapira (1964-), Eugênio Lima (1968-), Luaa Gabanini (1976-) e Roberta Estrela D’Alva. Desde o início, o grupo propôs um teatro que incluísse elementos da cultura hip-hop, como DJs em cena, atores e atrizes-MCs, grafite e breaking, resultando em uma linguagem cênica urbana e crítica.
O coletivo desempenhou um papel crucial na introdução do movimento slam no Brasil, e suas dramaturgias são marcadas pela poesia falada, destacando uma oralidade de resistência. Seus espetáculos, que muitas vezes se configuram como verdadeiros manifestos, também são influenciados pelo teatro épico de Bertolt Brecht (1898-1956). Adaptando as ideias do dramaturgo alemão à realidade brasileira, o Núcleo Bartolomeu de Depoimentos aborda questões sociais e políticas urgentes, criando um diálogo entre arte, resistência e transformação.
TEATRO
É possível assistir a uma versão filmada do espetáculo em: www.youtube.com/ watch?v=v4mYgQHCX-c (acesso em: 30 set. 2024). Se julgar pertinente, exiba algumas cenas para a turma, mas deve-se atentar a possíveis gatilhos, pois há momentos que envolvem temas sensíveis.
Brenda Lee e o Palácio das Princesas
O musical Brenda Lee e o Palácio das Princesas narra a trajetória da ativista brasileira Brenda Lee (1948-1996), uma referência na luta pelos direitos LGBTQIA+. Chamada de “anjo da guarda das travestis”, ela fundou a Casa de apoio Brenda Lee, também conhecida como Palácio das Princesas, o primeiro centro de acolhimento para pessoas portadoras do vírus HIV no Brasil.
A Casa foi formalizada em 1988 como um espaço de assistência médica e social e fomento às redes de solidariedade para pessoas portadoras do vírus HIV, que sofriam com a estigmatização do diagnóstico em um período crítico de desinformação e violência.
A proposta do espetáculo é trazer o protagonismo travesti, colocando no centro do processo criativo aquelas pessoas que frequentemente são marginalizadas. O espetáculo foi amplamente reconhecido e premiado pela qualidade das atuações, da música e da dramaturgia. A obra dá continuidade à pesquisa do Núcleo Experimental, grupo dedicado à criação de musicais originais brasileiros que integram diversão e crítica de maneira inovadora e impactante.
Fotografia do elenco de Brenda Lee e o Palácio das Princesas, no Teatro do Núcleo Experimental, São Paulo (SP), 2022.
Fotografia do espetáculo Hip-hop blues – Espólio das águas. São Paulo (SP), 2022.
ALÊ CATAN
ARTES iNTEGRADAS
Redes sociais
Em um contexto multicultural, as redes sociais, quando trabalhadas de maneira ética, têm o potencial de conectar saberes e expandir as fronteiras do conhecimento. Nesse diálogo intercultural, a cultura digital pode fortalecer grupos que foram esquecidos e invisibilizados promovendo uma desconstrução dos conceitos de saber tradicionalmente idealizados e legitimados. Isso possibilita a coexistência e a valorização de diferentes matrizes culturais, ampliando o entendimento e a diversidade no compartilhamento do conhecimento.
Com relação à arte, é cada vez mais comum que os artistas ampliem seus discursos e a visibilidade de suas obras, por meio de diversas plataformas de redes sociais. As postagens e o diálogo com seguidores ajudam a difundir suas criações e engajam o público de maneiras inovadoras.
As redes sociais permitem um intercâmbio entre passado, presente e futuro, moldando novos paradigmas para a comunicação e influenciando desde as relações interpessoais até a comunicação coletiva, redefinindo a forma como os artistas e o público se conectam e compartilham experiências culturais.
ARTES iNTEGRADAS
Cultura otaku
Foi na década de 1980 que a cultura otaku emergiu no Japão, manifestando o interesse de jovens e adolescentes pela cultura de massa japonesa, em especial pelo mangá e pelo anime.
O mangá é uma modalidade de quadrinhos caracterizada por seu estilo artístico e por uma narrativa de amplos gêneros e temas. Já o anime consiste em desenhos animados japoneses que foram criados após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), podendo incluir tanto séries quanto filmes.
O mangá contemporâneo deve muito ao trabalho de Osamu Tezuka (19281989), artista japonês que adaptou técnicas cinematográficas dos filmes de ação estadunidenses aos quadrinhos, alterando o ponto de vista do leitor constantemente e imitando o movimento de câmera usado para aumentar a sensação de ação. Uma característica marcante de seu trabalho é o aspecto arredondado e gracioso das personagens, que está fortemente ligado ao universo infantil.
Hoje, esses elementos tornaram-se produtos da indústria cultural global e movimentam um mercado que atrai pessoas de todas as idades para feiras e eventos em várias cidades do mundo.
O artista brasileiro
Vik Muniz (1961-) publica, na timeline de uma das suas redes sociais, paisagens dos lugares por onde transita e reposta outras publicações.
Na imagem, um print de uma de suas publicações, em que apresenta uma facekini, máscara usada nas praias da China.
Jovens no mundo todo assumem a identidade otaku, vestindo-se e comportando-se como as personagens da cultura de massa japonesa. Na fotografia, jovens caracterizados comparecem ao evento Madrid Otaku, em Madri (Espanha), 2022.
SiNTESE ESTETiCA
Cultura e política na periferia
Reflexão
O desenvolvimento da cena do hip-hop, especialmente na década de 1990, foi crucial para uma nova compreensão das periferias brasileiras. O livro A formação das sujeitas e dos sujeitos periféricos: cultura e política na periferia de São Paulo (2022), fruto da tese de doutorado do pesquisador, artista e morador periférico Tiaraju Pablo D'Andrea, explora a importância dos coletivos culturais nas quebradas, com foco especial no grupo de rap Racionais MC’s.
O trabalho de Tiaraju analisa como esses coletivos ajudaram a redefinir o conceito de periferia, transformando-o em um símbolo de potência e orgulho. Por meio da arte e da cultura produzidas nesses territórios, o hip-hop contribuiu para a organização política e para a valorização das vozes periféricas, destacando a relevância cultural e social dessas comunidades. Leia, a seguir, um trecho da tese do pesquisador.
A formação da sujeita e do sujeito periférico
[…] Ao longo desses últimos anos, houve um deslocamento no jogo de referências e remissões que o termo periferia parece mobilizar. Não mais entendida apenas como local de pobreza, privação e sofrimento passível de comiseração, a periferia passa a ser um termo utilizado como marcador da presença ativa de populações vistas não sob o signo da fragilidade, mas da potencialidade. No Rio Janeiro, esse mesmo deslocamento ocorreu com o termo favela. Potencialidade aqui entendida em dois sentidos: portador de possibilidades e portador de potência ou força.
[…]
[…] Por outro lado, essa potencialidade foi também capturada pelo mercado, passando a ser alvo e operador de uma celebração mercadológica dos pobres: é nesse registro que se pode entender a disputa, nos últimos anos, do chamado mercado de consumo popular […].
[…] Essa celebração da pobreza como mercado foi acompanhada por uma exposição midiática sem precedentes de periferias, favelas e seus habitantes. Essa exposição pode ser verificada nos produtos da indústria do entretenimento, como filmes e novelas; nas empresas de publicidade; e também na agenda pública.
[…]
Os anos 1990 podem ser vistos como a década que fez erodir as esperanças da década de 1980, quando uma crise econômica persistente conviveu
com um intenso processo de mobilização popular, projetando as classes populares no centro da cena política do país. Foram os anos das reformas neoliberais, que levaram à fragilização de conquistas sociais dos anos anteriores; o desemprego aumenta, os salários se deterioram e o chamado mundo do trabalho se desfaz sob o impacto da precarização das relações de trabalho e do aumento do mercado informal.
Nesses anos, a violência também aumenta, e muito. […]
Os Racionais MC’s, em 1994. […]
Desesperançada, pobre, desempregada e absorvida nas matanças corriqueiras de jovens entre si e destes com a polícia, a população periférica empenhou-se em construir mecanismos e inventar formas para contornar a violência e se manter viva. Lutar pela própria sobrevivência foi a questão catalisadora que fez girar uma engrenagem produtora de fatos e circunstâncias que afetaram a vida social, sob o primado de soluções práticas para um contexto de morte. E nesse registro que se pode entender o surgimento dos coletivos artísticos nas periferias. […]
Em torno dessas situações e dessas experiências, a população periférica engendrou uma narrativa e elaborou uma subjetividade para explicar seu lugar no mundo e fundamentar sua existência. A narrativa criada por essa população foi aquela expressa por um movimento cultural que soube condensar expectativas e sentimentos da população periférica. A principal expressão desse movimento é o grupo de rap Racionais MC’s. Por outro lado, surgiu uma nova subjetividade por meio de uma intensa luta para se colocar no mundo e se perceber por meio do orgulho, e não do estigma. Quando o indivíduo portador dessa nova subjetividade age politicamente é denominado neste trabalho como sujeito periférico
Uma narrativa
A dramática conjuntura social vivida pelos bairros periféricos na década de 1990 foi apresentada ao mundo por uma narrativa que buscou retratar aquele momento e aquele espaço. A forma: a música, e dentro das possibilidades musicais: o rap , cantado por jovens protagonistas daquele contexto. Verdadeira narrativa do drama, os raps do grupo Racionais MC’s tornaram-se a trilha sonora legitimada por aquela população para registrar suas misérias, seus dilemas, desesperos e sonhos. Dentre várias possíveis narrativas, foi a que teve maior reverberação. Para esta pesquisa, a abordagem sobre a periferia feita pelo grupo auxiliou na construção de uma ética regulatória das relações entre a população periférica. Também auxiliou na construção de um significado para o termo periferia
A narrativa elaborada por este grupo de rap é uma criação dos bairros populares, exaltando o orgulho de ser periférico na mesma medida em que é um fenômeno decorrente desse orgulho. […]
Respostas pessoais. Traga para a conversa os argumentos apresentados no texto sobre como o termo periferia foi ressignificado pelas populações que moram nas margens dos centros urbanos. Originalmente um marcador de privação e sofrimento, o termo foi transformado em símbolo de potência, orgulho, pertencimento.
De acordo com o texto, refere-se a um processo pelo qual as manifestações culturais das populações periféricas são apropriadas e comercializadas por setores da indústria de entretenimento. Esse movimento intensifica um mercado de consumo popular voltado para as populações de baixa renda, mas, ao mesmo tempo, esvazia o conteúdo crítico e a profundidade dessas manifestações culturais. Em vez de reconhecer e valorizar a riqueza cultural e a resistência dos sujeitos periféricos, essa captura celebra a pobreza e a marginalização como produtos de entretenimento, como filmes, novelas e clipes, frequentemente sem um engajamento real com as questões sociais subjacentes.
A degradação da vida social, produzida pelo impacto das reformas neoliberais, movimentou uma engrenagem de luta pela própria sobrevivência, tornando necessárias as ações para enfrentar esse contexto; o surgimento dos coletivos culturais nas periferias associa-se a esse movimento.
Uma nova subjetividade
Calcados na historicidade de atributos estigmatizantes e formulados quase sempre fora dos bairros populares, seus moradores começaram a construir novas formulações sobre si mesmo e sobre sua posição no mundo. Dessa forma, uma nova subjetividade se forma na periferia, sobretudo entre os jovens, enfatizando o orgulho de sua condição e as potencialidades dessa condição. Esta tese conceitua como sujeito periférico o morador da periferia que passa a atuar politicamente a partir de sua condição e orgulhoso dela.
Ou seja, a posse do orgulho periférico é a expressão da existência de uma nova subjetividade. No entanto, a transformação em sujeito periférico só ocorre quando essa subjetividade é utilizada politicamente, como organização coletiva e ações públicas.
D’ANDREA, Tiaraju Pablo. A formação dos sujeitos periféricos: cultura e política na periferia de São Paulo. 2013. Tese apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Doutor (Programa de pós-graduação em Sociologia) – Departamento de Sociologia da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. p. 10-11, 13, 14-15.
Processo de criação coletiva
Partindo da investigação realizada sobre o universo hip-hop e do trecho da tese de Tiaraju Pablo, você e os colegas realizarão, juntos, um processo de pesquisa e criação de uma obra ou de uma apresentação artística. Para isso, reúnam-se em grupos de 6 a 10 integrantes.
Não escreva no livro.
Análise e debate
Depois de ler o texto, analisar a imagem do grupo Racionais MC's na década de 1990 e refletir, discuta com seu grupo os tópicos a seguir.
• O que o termo periferia evoca para você: fragilidade ou potencialidade? Por quê?
• De acordo com o texto, o que significa uma “captura do mercado das potencialidades da periferia”?
• De que maneira a crise econômica ocorrida na década de 1990 impactou o surgimento dos coletivos artísticos nas periferias?
• De acordo com o texto, como a arte e a cultura periféricas contribuíram para elaborar a visão de mundo das pessoas que vivem na periferia?
• Em diálogo com o texto, defina a expressão sujeito periférico. Anotem os principais tópicos desse debate, bem como as reflexões centrais que devem servir de base para o processo de criação artística do grupo.
Ideia disparadora e linguagens artísticas Em seguida, sempre em grupo, pensem em como fazer uma síntese estética do debate realizado, ou seja, em como transmitir as *
conclusões do grupo aos demais colegas da turma, por meio de uma criação artística, como uma música, uma pintura, um poema, uma cena, uma performance, uma instalação.
Retomem ferramentas criativas trabalhadas ao longo deste capítulo ou rememorem procedimentos artísticos trabalhados nos capítulos anteriores que possam apoiar a criação. Levem em consideração, também, as habilidades e os desejos artísticos dos integrantes do grupo para compor a ideia central da obra coletiva.
Em um primeiro momento, deixem as ideias fluírem, anotando todo tipo de sugestão dos integrantes. Depois, retomem as ideias e elejam a que parecer mais potente, chegando a uma ideia disparadora.
Pensem em como a ideia de “sujeito periférico” pode ser elaborada no processo artístico do grupo: por meio de uma apresentação de rap? De uma exposição de fotos de diferentes regiões periféricas pelo mundo? De uma coreografia de outras manifestações dançantes de territórios marginalizados?
É possível utilizar artistas periféricos como referência, selecionando trechos de obras de outras linguagens artísticas na composição de vocês? O grupo pretende fazer algum tipo de denúncia poética das condições econômicas desiguais entre periferia e centro? Vocês conhecem alguma cena de teatro que explore essas relações?
Anotem a ideia disparadora e a(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Pesquisa, criação e finalização
Organizem as etapas de criação do projeto artístico com base nas reflexões centrais, na ideia disparadora e na(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Caso a criação do grupo envolva apresentação ou encenação, lembrem-se de ensaiar o maior número de vezes possível, aprimorando o trabalho a cada repetição. Não deixem que o processo de criação fique só na conversa, experimentem os elementos em cena.
Se a criação do grupo envolver uma exposição ou instalação, façam uma lista de tudo o que será necessário providenciar, dividindo as tarefas entre os integrantes.
Não existe uma fórmula para esse processo de criação. Cada grupo deve desenvolver suas etapas, estabelecendo critérios e tendo em vista a obra ou manifestação artística que se está criando.
Com o trabalho desenvolvido, chegou o momento de compartilhar com o restante da turma! Aproveite para apreciar as criações dos demais grupos.
*De acordo com o texto, a arte e a cultura periféricas, especialmente por meio do rap, desempenharam um papel fundamental na elaboração da visão de mundo das pessoas que vivem na periferia. O rap surgiu como um movimento cultural capaz de condensar e expressar as expectativas e os sentimentos das populações periféricas, funcionando como uma crônica rimada da periferia. Essa forma de expressão artística produziu uma narrativa e uma subjetividade capazes de gerar pertencimento e sentido existencial aos sujeitos nas margens, promovendo o conceito de “orgulho periférico”. Nesse contexto, o grupo Racionais MC’s se destaca como exemplo, sendo um importante veículo para a representação e afirmação da identidade periférica.
**Sujeito periférico é uma pessoa moradora da periferia que atua politicamente com base na sua condição. Esse conceito é sustentado pelo “orgulho periférico”, que expressa uma nova subjetividade e identidade emergentes entre os moradores dessas áreas. O orgulho periférico representa a afirmação e a valorização das experiências e da cultura periférica, possibilitando que os sujeitos periféricos se posicionem de maneira ativa e consciente nos cenários político e social.
8
Arte contemporânea
Recursos eletrônicos e sintetizadores revolucionam o universo da música.
Companhia Cerne em cena de Turmalina 18-50, espetáculo sobre a Revolta da Chibata. O grupo atua na baixada fluminense há mais de dez anos. Fotografia de 2019.
O teatro de grupo propõe novas investigações e territórios para a linguagem teatral.
Jocy de Oliveira (1936-), pioneira na música eletrônica no Brasil. Fotografia de 2014.
CAMILLA MAIA/AGÊNCIA OGLOBO
Festivais de arte transformam-se em potentes espaços de troca.
2. A encenação da Companhia Cerne relaciona-se ao teatro e à história do Brasil, retomando a memória da Revolta da Chibata. A imagem de Jocy Oliveira remete ao diversificado universo da música eletrônica brasileira. O festival de dança relaciona-se ao universo das artes do corpo, da performance e da arte experimental. O trabalho de Paulo Nazareth refere-se ao mercado de arte: ele apresenta a performance-instalação em uma feira de arte e coloca sua imagem à venda.
GUZZO, Marina. Navios. 2014. Performance. Realização no festival Panorama de dança contemporânea. Praia de Ipanema, Rio de Janeiro (RJ), 2015.
Corpo, objetos, textos: a arte contemporânea é, muitas vezes, híbrida.
NAZARETH, Paulo. [Sem título]. 2011. Performance-instalação. Realização na feira Art Basel em Miami (Estados Unidos), 2011. Na placa, lê-se: “My image of exotic man for sale ” (em português, "Minha imagem de homem exótico à venda").
Não escreva no livro.
Considerando as imagens apresentadas nestas páginas de abertura, responda às questões a seguir.
1 A que linguagens artísticas elas se relacionam?
2 A que universo cultural cada imagem está relacionada?
3 O que você entende por arte contemporânea?
1. A cena do espetáculo Turmalina 18-50 refere-se ao teatro. A fotografia de Jocy de Oliveira está ligada à música. Já as duas últimas fotografias relacionam-se à performance (dança e performance-instalação, respectivamente).
3. Resposta pessoal. Relembre com a turma que arte contemporânea é, em última instância, a arte produzida nos dias de hoje. Nessa perspectiva, aproveite o debate para explorar obras e artistas atuais que os estudantes apreciam, mapeando as produções contemporâneas que formam o universo cultural dos jovens, valorizando esse repertório e utilizando-o como elemento de comparação com os demais exemplos apresentados, tanto na abertura quanto no restante do capítulo.
VINÍCIUS TERRA
O que é arte contemporânea?
As múltiplas dimensões da vida ocupam os espaços expositivos, ativando reflexões estéticas sobre os mais diversos temas: o corpo, a cidade, as questões ambientais, a voracidade do capitalismo, a memória, entre outros. Como será possível definir o que é arte contemporânea? Pode ser adequado dizer que a arte contemporânea é aquela que se volta para questões que nos afetam no presente.
Alguns processos característicos da arte contemporânea incluem as apropriações e os diálogos com o passado, a participação do público no processo criativo, a hibridização das linguagens e os deslocamentos que estimulam a estesia
Para se opor a um ambiente saturado pelo excesso de informação, alguns artistas consideram não haver mais sentido em produzir novidades, dedicando-se ao remix e ao trabalho com arquivos. O desafio está em operar os acervos histricos e científicos, transformando as proposições do passado.
A cultura digital, com suas novas formas de cooperação, estimula esses artistas por meio da velocidade das trocas coletivas. Eles estabelecem uma relação com seu público, oferecendo-lhe espaço de participação e reconhecendo sua contribuição. Para esses criadores, a esfera das relações humanas é o verdadeiro lugar da obra de arte.
Para pesquisar, trocar experiências ou simplesmente vivenciar diferentes ambientes e contextos sociais, os artistas recorrem também a expedições, viagens e residências artísticas para expandir sua percepção estética.
estesia: capacidade de apreender, por meio de estados sensíveis, o mundo ao redor.
remix: termo originado no universo da música eletrônica, na década de 1970, quando os primeiros DJs começaram a operar mesas de som em discotecas. A prática se popularizou com o uso de samplers. No século XXI, a ideia se expandiu para além da música, passando a designar qualquer ato de retrabalhar e reinterpretar materiais culturais. residência artística: programa em que artistas são convidados, por meio de editais e/ou convocatórias, a participar de vivências coletivas em determinado território.
Altamira 2042 é uma instauração performativa idealizada por Gabriela Carneiro da Cunha (1982-) e composta de equipamentos de luz e som que reproduzem imagens da floresta e amplificam testemunhos de habitantes das margens do Rio Xingu sobre os impactos da catástrofe provocada pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte.
CUNHA, Gabriela Carneiro da. Altamira 2042. 2019. Instauração performativa.
NEREU JR.
A arte, hoje, transcende qualquer definição mais rígida, mas seu potencial transformador é reconhecido. Ela se afirma cada vez mais como forma de ativismo, ocupando diversos espaços de articulação social.
EMPREZA. Heavy Weight [Peso pesado]. 2014. Performance. Realização no Sesc Pompeia, São Paulo (SP), 2015.
Fundado em 2001, o grupo EmpreZa concebe a arte como uma expressão política com potencial transformador e realiza trabalhos pluriautorais. Em suas ações, explora o limite do corpo, o tempo, os materiais e, muitas vezes, o universo rural goiano. O coletivo realiza serões performáticos em que os estados energéticos são intensificados a tal ponto que as experiências vividas por seus integrantes podem vir a transbordar para o público.
AT¡v¡DaDe De SeNS¡B¡l¡ZAÇÃO Som em movimento
Recomenda-se realizar essa atividade em um espaço amplo da escola, como um teatro, auditório, quadra ou outro que possibilite montar uma grande roda com a turma.
Depois de refletir sobre o conceito de arte contemporânea, será realizado um jogo musical. Para isso, serão necessárias uma folha de papel ofício e uma folha de papel celofane.
1. A turma deverá formar uma grande roda, para que todos joguem ao mesmo tempo. O jogo deve ser jogado em silêncio.
Se julgar conveniente, é possível formar duas rodas que jogam simultaneamente.
2. A folha de papel ofício deve ser passada de mão em mão, por todos da turma. Nessa primeira rodada, o objetivo é fazer o mínimo de sons ao passar a folha. Observe a qualidade e a velocidade de seus movimentos, de maneira que não se ouça nenhum ruído do papel.
3. A rodada seguinte deve ser o extremo oposto. Cada estudante que passar a folha para o colega ao lado deve fazer o máximo de sons. Use a criatividade no manuseio da folha.
4. Por fim, repita o processo com a folha de papel celofane: uma rodada com o mínimo de sons e outra com o máximo de sons que esse material pode produzir.
5. Encerrada a atividade, converse com os colegas sobre a experiência.
• Qual das rodadas foi mais desafiadora? Foi mais difícil alcançar o máximo de sons ou o mínimo de sons ao manusear as folhas?
Respostas pessoais.
• Ao utilizar folhas de papel no seu dia a dia, você já havia percebido os sons que o manuseio delas pode gerar?
Resposta pessoal.
CONTEXTO DANÇA
Dança contemporânea: um conceito, muitas formas
O termo contemporâneo é frequentemente usado para qualificar aquilo que pertence ao tempo em que vivemos. Quando se trata de dança contemporânea, porém, ele adquire um significado específico. Nos dias de hoje, coexistem distintas manifestações de dança, mas nem por isso todas elas são consideradas dança contemporânea. Quais são os aspectos que a diferenciam das demais manifestações?
A dança contemporânea não se caracteriza como um estilo apoiado em técnicas próprias e traços homogêneos, uma vez que cada artista expressa sua busca e suas respostas de maneira singular. Tendo o corpo como questão central, o dançarino utiliza recursos variados para se expressar, muitas vezes incorporando técnicas e procedimentos de criação das artes visuais, do teatro, do circo, do cinema, da música, da literatura ou, ainda, de outras correntes da própria dança.
Na dança contemporânea, o corpo é, ao mesmo tempo, sujeito, objeto e ferramenta de seu próprio saber; é a partir dele que surgem novas formas de sentir, perceber e criar, que afetam artistas e espectadores. Assim, a dança contemporânea pode ser abordada como o compartilhamento de reflexões, pensamentos e experiências, como um diálogo que surge entre os artistas, o mundo contemporâneo, as obras e os espectadores, que se manifesta de inúmeras formas. Nas palavras de Laurence Louppe (1938-2012), estudiosa da dança contemporânea: […] ser bailarino é escolher o corpo e o movimento do corpo como campo de relação com o mundo, como instrumento de saber, pensamento e de expressão […].
LOUPPE, Laurence. Poética da dança contemporânea. Tradução: Rute Costa. 1. ed. Lisboa: Orfeu Negro, 2012. p. 69.
Há peças de dança contemporânea em que a música tem um papel importante; outras se desenvolvem em absoluto silêncio; outras, ainda, lançam mão de recursos tecnológicos, como vídeos e imagens digitais; e há aquelas que se apoiam em textos ou elementos das artes visuais.
Espetáculo de dança (Des)construção, da Companhia de Dança Contemporânea de Angola. Luanda (Angola), 2017.
REPERTORiO 1
Gira Dança
Sediada em Natal, no Rio Grande do Norte, a companhia de dança contemporânea Gira Dança dedica-se a explorar as possibilidades que diferentes corpos trazem à dança, reunindo bailarinos com e sem deficiências. As particularidades e o potencial singular de cada artista alimentam o trabalho da companhia, criada em 2005 pelos bailarinos Anderson Leão (1978-) e Roberto Morais, que vêm quebrando preconceitos em cena. Ao longo dos anos, o grupo realizou distintas pesquisas coreográficas que resultaram em obras assinadas por coreógrafos convidados, como Ângelo Madureira (1975-) e Ana Catarina Vieira (1975-), que assinam a peça Sem conservantes (2015); Clébio Oliveira, criador da peça Proibido elefantes (2012); e Alexandre Américo, diretor coreográfico de Dança que ninguém quer ver (2015). A companhia tem se apresentado em vários estados do Brasil e no exterior e promovido oficinas de dança contemporânea, ampliando o entendimento sobre o que é a dança contemporânea para diferentes públicos e quebrando preconceitos.
Cena do espetáculo Dança que ninguém quer ver, da companhia Gira Dança. Fotografia de 2022.
Depois de conhecer a companhia Gira Dança, responda à questão a seguir.
• Por que, em sua opinião, o trabalho da companhia quebra preconceitos?
Resposta pessoal. Entre as possibilidades de resposta, os estudantes podem mencionar que, muitas vezes, a dança é associada a corpos considerados ideais por se enquadrarem em padrões socialmente estabelecidos e, em razão disso, a compreensão de que pessoas com ou sem deficiência têm competências singulares e são capazes de criar e dançar pode quebrar preconceitos.
Não escreva no livro.
REPERTORiO 2
Corpo de Dança do Amazonas (CDA)
Criado em 1998, o Corpo de Dança do Amazonas tornou-se uma importante companhia de dança contemporânea no Brasil. Pensada para qualificar artistas da dança para espetáculos de ópera, a companhia ganhou autonomia artística com foco na dança contemporânea e conta com mais de 60 peças em sua trajetória. Coreógrafos como Ivonice Satie (1950-2008), Luis Arrieta (1951-), Henrique Rodovalho (1964-), Rosa Antuña (1977-) e Mário Nascimento (1964-) criaram trabalhos para o grupo. Em 2024, como parte da comemoração de seus 25 anos de atividade, a companhia realizou uma temporada no Teatro Amazonas e uma turnê nacional com peças que tratam de temas relacionados às questões ambientais e à importância dos povos originários para o planeta, como Rios Voadores, com coreografia de Rosa Antuña. O Corpo de Dança do Amazonas é composto, majoritariamente, de artistas das danças amazonenses.
no livro.
Com base na imagem observada e no texto lido, responda à questão.
• C omo um espetáculo de dança pode sensibilizar plateias para questões urgentes, como a importância da Amazônia para o planeta?
No caso da obra que aborda os rios voadores – fenômeno que evidencia a importância da Floresta Amazônica para garantir as chuvas e combater a seca –, é possível que diferentes públicos tomem consciência da importância de preservar as florestas. Com esse questionamento, espera-se que os estudantes compreendam que, ao transmitir emoções e mensagens poderosas por meio de movimentos, cria-se uma experiência que provoca reflexão e consciência em quem assiste ao espetáculo.
Grupo Corpo de Dança do Amazonas em cena do espetáculo Rios voadores, 202 2.
Não escreva
MICHAEL
Encantado, Lia Rodrigues Companhia de Danças
Cena do espetáculo Encantado, apresentado pela Lia Rodrigues Companhia de Danças. Fotografia de 2021.
Encantado é a primeira criação da Lia Rodrigues Companhia de Danças após a pandemia de covid-19. Na peça, que estreou em 2021 na França, estão em cena 11 bailarinos e 140 cobertores coloridos. Juntos, como uma comunidade de humanos e não humanos, eles compõem o cenário, o chão onde se dança, os figurinos, bem como os seres inusitados e mágicos que surgem, dançam e se transformam ao longo de todo espetáculo, celebrando a vida e ativando as forças da natureza. Na cosmovisão afro-ameríndia, os seres encantados são aqueles que transitam entre a Terra e o céu, habitando as florestas, o mar, os rios, as pedras e as plantas. A trilha musical da peça é composta de canções do povo guarani mbya da aldeia de Kalipety, que habita a Terra Indígena Tenondé Porã, que se estende pelos municípios de São Paulo, São Bernardo do Campo, Mongaguá e São Vicente, no estado de São Paulo. A companhia foi criada no início dos anos 1990, no Rio de Janeiro (RJ), e está instalada em Nova Holanda, uma das favelas que compõem o Complexo da Maré. É em sua sede que são desenvolvidos seus projetos artísticos e pedagógicos, além de serem apresentados seus espetáculos.
Não escreva no livro.
Após observar a imagem do espetáculo Encantado , responda à questão a seguir.
• De que maneira os artistas e os cobertores se relacionam na cena?
Apenas observando a imagem, nota-se que os cobertores aparecem como figurinos dos artistas, sendo também manipulados por eles de maneira a criar formas coloridas em movimento no espaço. Procure aprofundar a observação da cena, informando que os cobertores podem servir como extensões dos corpos dos artistas, amplificando a expressividade dos movimentos e criando um ambiente que potencializa a narrativa e a atmosfera do espetáculo, representando proteção, transformação ou outros conceitos que enriquecem a cena.
SAMMI
LANDWEER
PESQUiSA
Dança contemporânea - criação e difusão
A improvisação na dança valoriza a espontaneidade e a liberdade de movimento, permitindo que o corpo se expresse criativamente. Explore essa prática por meio de alguns levantamentos e aprofunde seus conhecimentos.
1. Improvisação.
A técnica de dança conhecida como Contato Improvisação foi criada pelo dançarino e coreógrafo Steve Paxton (19392024), na década de 1970, nos Estados Unidos. Nela, o movimento surge do peso e do contato dos corpos dos parceiros, e a dança se desenvolve como improvisação.
• O site Conectedance disponibiliza um vídeo histórico, gravado em 1983, em que Steve Paxton aparece improvisando com a dançarina Lisa Nelson (1949-). Há, ainda, uma entrevista realizada com o coreógrafo em São Paulo (SP). Disponível em: https://conectedance.com.br/diaadia/ steve-paxton-1939-2024-entrevista-e-videos-historicosno-conectedance (acesso em: 27 set. 2024).
2. Festivais e companhias de dança contemporânea. No Brasil, a dança contemporânea é rica e plural. Em algumas regiões do país, além de grupos de dança contemporânea, há mostras e festivais que apresentam artistas nacionais e também permitem que o público entre em contato com a produção internacional. Conheça a programação de alguns desses festivais, identifique artistas brasileiros e estrangeiros que já se apresentaram em alguns desses eventos e busque informações sobre o trabalho deles.
• Bienal Sesc de Dança. Disponível em https:// bienaldedanca.sescsp.org.br (acesso em: 27 set. 2024).
3. Artistas-criadores.
Steve Paxton em apresentação de Contato Improvisação. 1975.
Durante o desenvolvimento de uma obra, um coreógrafo pode contar com a participação de seus intérpretes-criadores. Os vários modos como essa colaboração acontece se manifestam, muitas vezes, nos textos de apresentação dos programas dos espetáculos.
• Nos sites da Mostra Internacional de Teatro de São Paulo (MITSP), disponível em https://mitsp. org/2024/apresentacao, e da São Paulo Companhia de Dança, disponível em https://spcd.com.br/ repertorio/portifolio/criacoes-spcd/ (acessos em: 27 set. 2024), é possível acessar programas de espetáculos de dança. Investigue de que maneira os colaboradores são identificados nesses programas.
Cena do espetáculo Cria, da Companhia Suave. Rio de Janeiro (RJ), 2018.
RENATO
MANGOLIN
KATHY LANDMAN
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Improvisação na dança
Na dança contemporânea, a improvisação constitui uma importante estratégia de investigação artística, permitindo aos dançarinos e performers explorar sua criatividade, experimentando diferentes modos de combinar os recursos que dominam e abrindo espaço para o novo.
Os processos de criação geralmente são colaborativos. Como acontece nas demais linguagens artísticas, para improvisar é necessário dominar a linguagem. Quanto mais se conhece uma forma de expressão – como a dança, a música, o teatro –, mais complexa e criativa é a improvisação. Improvisar, palavra etimologicamente ligada à noção de imprevisto, é explorar o que se apresenta no presente e não ter total controle sobre o que irá se desenvolver.
No campo da dança, para que a improvisação não se restrinja à reprodução de movimentos habituais e codificados, é necessário compreender que improvisar nunca é se mover com total liberdade. O mergulho no imaginário que faz emergir novos movimentos e modos de dançar será mais interessante quanto mais precisas forem as regras do jogo de improvisação.
Improvisar pode servir tanto para investigar distintas possibilidades do corpo em movimento, invocando sua memória ou explorando o contexto presente, como para integrar-se como parte da obra. Várias peças de dança contemporânea têm momentos “abertos”, em que a dança emerge, diante dos espectadores, da improvisação dos intérpretes-criadores.
A improvisação também está presente nas danças populares e sociais. Em muitas danças afro-brasileiras, por exemplo, há momentos em que músicos e dançarinos partem dos ritmos e passos de base, de códigos e referências daquela dança, para se lançar em um momento único de dança. Nas batalhas das danças urbanas, os dançarinos desafiam uns aos outros por meio de sequências improvisadas, que surgem no diálogo com o outro e com o contexto.
Grupo de três dançarinos em improvisação. Fotografia de 2019.
AçÃO Um baralho para improvisar
Exemplos de posições corporais que podem inspirar movimentos.
Nesta seção, você desenvolverá, com os colegas, um baralho para se apoiar em momentos de improvisação.
1. Preparação
Para esta atividade, a turma deverá se dividir em quatro grupos e providenciar:
• papel cartão de cores diversas, sendo uma cor por grupo presente na aula;
• canetas hidrográficas;
• tesoura;
• um espaço da escola onde seja possível se mover confortavelmente.
2. Construindo as cartas
• Cada grupo será responsável por desenvolver um conjunto de cartas que será identificado por uma cor. Dessa forma, cada grupo terá sua cor de carta.
• Cada cor de carta deve apresentar um tema que provoque um improviso de dança. Não existem temas definidos. O objetivo é propor desafios que possibilitem improvisar enquanto se investiga o movimento dançado. Seguem algumas sugestões de tema, mas a turma pode propor outros.
» Partes do corpo para explorar durante a improvisação, como cabeça, punho direito, joelho esquerdo etc.
» Ações em diferentes níveis espaciais, como rastejar, saltar, girar, ir ao chão e levantar, engatinhar, caminhar na ponta dos pés etc.
» Modos de se relacionar a dois: espelhar, seguir como se fosse uma sombra, afastar-se, manter contato visual, evitar contato visual etc.
» Movimentos inspirados em elementos da natureza, como o vento, o balançar das árvores, as ondas do mar etc.
3. Produzindo as cartas
• Depois de escolher a cor do seu grupo e elaborar os temas das cartas, chegou o momento de produzi-las! As cartas devem ser recortadas no papel cartão e, se possível, terem a mesma dimensão.
• A cor de cada conjunto de cartas deverá identificá-las como pertencentes ao seu grupo.
• Cada integrante do grupo deverá criar uma carta para o conjunto. Um dos lados da carta deve ser utilizado para sinalizar qual o estímulo proposto, que deve ser indicado por meio de texto e, eventualmente, de desenhos. O número de cartas de cada cor dependerá do tamanho do grupo.
4. Explorando as cartas
• As cartas de todos os grupos deverão ser misturadas em um único jogo e, então, devem-se iniciar os improvisos.
• Di stribuam-se pelo espaço e façam movimentos suaves de aquecimento. Prestem atenção à respiração e busquem mobilizar variadas partes do corpo, de modo respeitoso e consciente.
• Uma vez aquecidos, uma pessoa deverá escolher duas cartas do baralho, com cores diferentes, e mostrá-las a todo o grupo.
• Individualmente, mas de modo simultâneo no espaço, cada pessoa deverá improvisar com base nas propostas das cartas. Exemplo: vocês poderão rastejar (carta 1) com atenção especial aos movimentos da cabeça (carta 2).
• Explorem diferentes combinações de cartas, selecionando duas ou, ampliando a dificuldade, associando três cartas de cores diferentes.
• Se possível, registrem a experiência em vídeo.
5. Avaliação
• Ao término da dinâmica, conversem sobre a experiência e identifiquem as dificuldades e os pontos fortes. Se houver vídeos, assistam-nos juntos e observem como cada pessoa respondeu aos estímulos das cartas.
CONTEXTO TEATRO
Teatro de grupo
A partir da década de 1990, houve o ressurgimento do teatro de grupo, que se organiza em torno da pesquisa teatral – modo de produção em que os elementos da encenação e a dramaturgia vão surgindo na sala de ensaio, com base na experimentação dos artistas-pesquisadores envolvidos – e da busca de inserção social do teatro. Teatristas se reuniram em torno de projetos de pesquisa artística para refletir sobre as contradições históricas, políticas e sociais do Brasil.
Esse movimento não se encaixa nos moldes do teatro comercial, que busca integrar a linguagem teatral às exigências do mercado. O teatro comercial se apoia na presença de atores famosos e dramaturgias renomadas, além de se apresentar em edifícios tradicionais, localizados nos bairros e nas cidades onde há maior concentração de renda. Esse recorte geográfico e os preços dos ingressos acabam por tornar a linguagem teatral um privilégio acessado por uma minoria.
Os grupos, pelo contrário, atuam para descentralizar a produção teatral, alterando a relação com o público. Com isso, parte dos espectadores já não vão a teatros tradicionais para apreciar o trabalho individual de uma celebridade (seja um diretor, seja um ator), mas para assistir a uma produção coletiva. Nesse encontro, palco e plateia se debruçam sobre questões contemporâneas.
Para viabilizar essa abordagem não mercantil, os artistas têm lutado por políticas públicas voltadas à cultura, uma vez que a produção, a circulação e a fruição de bens culturais são direitos básicos de todos os cidadãos. É preciso criar mecanismos para garantir esses direitos, sempre considerando as necessidades e os desejos que habitam cada território.
Dada a diversidade de grupos de teatro espalhados por todo o Brasil, uma multiplicidade de formas e temas caracteriza as peças encenadas atualmente. Em diversos estados, artistas se organizam em torno de projetos político-estéticos, que buscam enfrentar as contradições da realidade social e criar, por meio da linguagem teatral, um enunciado coletivo.
Cena do espetáculo Desterro, da companhia Nóis de
atuante desde 2002 na periferia de Fortaleza (CE). Fotografia de 2023.
Teatro,
GUILHERME
SILVA
1. Resposta pessoal. Espera-se que os estudantes concluam que a participação do Bando de Teatro Olodum em festivais internacionais possibilita que a cultura afro-brasileira e as questões sociais do Brasil sejam levadas a um público global. Além disso, fortalece a presença do Brasil no cenário artístico mundial, evidenciando a diversidade e a riqueza de sua produção teatral.
REPERTORiO 1
Incentive os estudantes a refletir sobre as diferentes representações sociais envolvendo as pessoas negras na sociedade brasileira e no exterior. É interessante identificar a arte como campo de disputa simbólica, que pode contribuir para combater preconceitos e estigmas.
Bando de Teatro Olodum
O espetáculo Cabaré da Rrrrraça foi criado em 1997 e já realizou diversas temporadas. Trata-se de um musical brasileiro com inspirações no Teatro de Revista – bem-humorado, crítico e provocativo. Desde a sua estreia, a obra coloca em cena debates importantes, que, com muita luta, o movimento negro tem apresentado à sociedade brasileira. A obra já foi assistida por mais de 40 mil pessoas, em suas mais de 300 apresentações.
O Bando de Teatro Olodum, de Salvador (BA), tem uma linguagem cênica estruturada em elementos de matrizes afro-brasileiras e teve origem em 1990, no encontro do Grupo Cultural Olodum com o diretor Marcio Meirelles (1954-). Sediado em uma das cidades com a maior população negra do Brasil, o grupo defende um projeto de expressão negra coletiva, tendo como foco o combate ao racismo.
Fotografia do espetáculo Cabaré da Rrrrraça, encenado pelo Bando de Teatro Olodum, 2024.
Um dos aspectos mais importantes do trabalho do Bando de Teatro Olodum é a criação de uma dramaturgia própria. Diversos espetáculos do grupo surgiram com base em pesquisas e improvisações dos atores, posteriormente sistematizadas como texto teatral por Meirelles. Três dessas peças foram publicadas no livro Trilogia do Pelô (1995): “Essa é nossa praia”; “Ó paí, ó”, que inspirou um filme e um seriado; e “Bai bai Pelô”, peça de estreia do ator Lázaro Ramos (1978-).
A presença da música e da dança é fundamental para a estética do Bando. A construção dessa identidade contou com a importante contribuição do diretor de movimento Zebrinha (1954-) e do diretor musical Jarbas Bittencourt (1972-), que ajudaram a integrar essas expressões à linguagem cênica do grupo.
O Bando de Teatro Olodum é uma das companhias negras mais populares e longevas do país, tendo representado o Brasil em diversos festivais internacionais e se apresentado em países como Inglaterra, Portugal, Angola e Alemanha.
Após a leitura, converse com os colegas.
1 Qual é a importância de um grupo como o Bando de Teatro Olodum representar o Brasil em festivais internacionais de teatro?
2 Por que é importante que os cidadãos brasileiros conheçam o Bando de Teatro Olodum e outras companhias negras contemporâneas?
2. Grupos como o Bando de Teatro Olodum promovem a valorização da cultura afro-brasileira e o combate ao racismo, além de trazerem à tona questões sociais, políticas e históricas frequentemente marginalizadas. Ao acessarem essas produções, as pessoas se conectam com narrativas que refletem a diversidade e as lutas da população negra, enriquecendo o entendimento sobre a pluralidade cultural do Brasil e promovendo uma sociedade mais consciente e inclusiva.
Não escreva no livro.
DINEY ARAÚJO
REPERTORiO 2
Companhia de Teatro Heliópolis
1. Resposta pessoal. Caso algum estudante tenha contato com grupos de teatro que atuem em sua comunidade ou território, incentive-o a relatar como acontece essa relação. É interessante que sejam levantados aspectos positivos tanto para a comunidade (que encontra um canal para sua expressão pública) como para o próprio grupo de artistas (que encontra nas relações com a comunidade um lastro real para provocar e inspirar suas criações).
A Companhia de Teatro Heliópolis surgiu em 2000, do encontro de jovens da comunidade de Heliópolis, em São Paulo, com o diretor Miguel Rocha, apoiada pela União de Núcleos e Associações de Moradores de Heliópolis e Região (Unas).
O cerne do trabalho do grupo é a criação coletiva, em que um tema-condutor relevante para a vida dos moradores da comunidade é escolhido e, com base nele, os artistas apresentam propostas de cenas e realizam improvisações. Em seguida, os dramaturgos convidados organizam os materiais que surgiram durante a pesquisa e criam o texto teatral.
Foi assim com o espetáculo Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos, que estreou em 2022, com texto de Dione Carlos (1977-) e direção de Miguel Rocha. A companhia debruçou-se sobre um tema doloroso: a presença das mulheres no contexto do encarceramento. O Brasil tem uma das maiores populações carcerárias do mundo e, embora a maioria dos presos seja de homens, as mulheres à sua volta (mães, esposas, irmãs, filhas) carregam parte importante desse fardo, que abala profundamente sua condição emocional, familiar, financeira e sua segurança física.
A peça acompanha a vivência de duas irmãs. Maria das Dores teve seu filho preso injustamente, acusado de um crime que não cometeu, e luta por sua libertação. Já Maria dos Prazeres tem o ex-marido preso e está proibida de viver novos relacionamentos. Além disso, o pai das Marias também foi preso. O enredo da peça evidencia o quanto o modelo prisional brasileiro é discriminatório, tratando de maneira mais cruel as populações pretas e periféricas.
Em contraponto, a encenação trabalha formas de resistência dessas populações, como as religiões de matriz africana, a música, a dança e a solidariedade.
A montagem foi agraciada com o Prêmio APCA de Dramaturgia, o Prêmio Shell de Dramaturgia e Música e o VI Prêmio Leda Maria Martins (ancestralidade).
Cena da peça Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos, da Companhia de Teatro Heliópolis. São Paulo (SP), 2023.
Após conhecer a Companhia de Teatro Heliópolis, reflita sobre as seguintes questões.
1 Qual é a importância de um grupo de teatro que atua em uma comunidade?
2 Como o espetáculo Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos articula opressão e resistência? Não escreva no livro.
Os estudantes podem elencar como opressão o fato de um personagem ser preso injustamente e os problemas ligados ao encarceramento em massa no Brasil (racismo, más condições das prisões, entre outros). Por outro lado, o espetáculo mostra formas de resistência, como as religiões de matriz africana, a prática cultural (música, dança) e a solidariedade entre as personagens.
REPERTORiO 3
É interessante que as falas de cada personagem sejam lidas em voz alta por um estudante.
Um único estudante pode ficar responsável por ler todas as rubricas em voz alta, na sequência em que aparecem no texto.
Dramaturgia em Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos
Leia, a seguir, trechos da dramaturgia Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos O texto dramatúrgico é dividido em falas das personagens. O nome da personagem que fala aparece em letras maiúsculas antes de seu texto. O que está entre parênteses, com destaque em itálico, são as rubricas – indicações sobre o que está acontecendo em cena.
MARIA DAS DORES Minha mãe, valei-me, segura minha cabeça, toma conta do meu corpo vazio de mãe. Filho é como um órgão do nosso corpo. É como pulmão, rim, coração soltos pelo mundo, pegando ônibus, indo para a escola; caminhando na rua, atravessando sem olhar o sinal; com medo da prova do vestibular; esquecendo as chaves de casa; saindo sem levar o álcool gel; com dor de cabeça; viajando; tendo febre; sendo chamado de vagabundo, com a mão na parede sem poder se defender. O meu filho é desenhista. E dos bons. Ganhou bolsa de estudo em escola de Arte lá no Centro da cidade, passa o dia criando imagem. Pega o lápis e vai fazendo assim ó (desenha no ar).
MARIA DOS PRAZERES O que você está fazendo?
MARIA DAS DORES Nada. Me deixa.
MARIA DOS PRAZERES Deixo não. Deixo nunca. Vamos passar uma babosa nesse cabelo? Deixa eu ver as unhas, vou colocar uma unha de porcelana vai ficar uma gata. E ainda vou te dar um banho de mel com rosas, um banho de folhas, vai subir tudo, mulher. Deixa de bestagem que eu não te deixo nunca. Uma Maria segue a outra.
MARIA DAS DORES Tô cansada de ser braba.
MARIA DOS PRAZERES Ah, eu também. Quero é ficar cansada de ter vida boa, sabe? Emprego bom, uma bela casa, minha filha em escola particular. Eu e você de férias na praia sem preocupação nenhuma. Era disso que eu queria estar cansada.
MARIA DAS DORES Tô cansada de ser braba.
MARIA DOS PRAZERES Minha irmã, cê já falou isso.
MARIA DAS DORES ( Maria dos Prazeres entende que a irmã está prestes a surtar, para de trançar o cabelo da irmã) Eu tô tão, tão cansada de ser braba. Tão cansada. Eu tô, de ser braba. Não quero mais ser braba, não. Eu tô tão, tão, tão, tão cansada de ser braba. Eu não aguento mais ser braba. Eu não quero mais ser braba. Ser braba não me deu nada. Levaram meu filho! O que adiantou ser braba? Me diz!
(Maria dos Prazeres beija a cabeça da irmã, a abraça colocando a própria cabeça sobre a dela.)
MARIA DAS DORES Amanhã é o dia dele.
MARIA DOS PRAZERES Eu sei, por isso eu vim aqui, hoje. Você não tá sozinha.
[...]
( Corpos formam um pavilhão de cadeia, alinhados, de frente, de perfil, de costas, realizando gestos que evocam rendição e cerceamento. Gabriel, um jovem desenhista, filho de Maria das Dores, é o novato da cadeia.)
MARIA DOS PRAZERES O meu filho tá bem? É a primeira pergunta que uma mãe faz. E depois de garantir que “sim, o garoto tá vivo”, a voz do outro lado cita os dados do teu filho como se ele não existisse. [...] Não é só uma ocorrência. É a tua vida. E a tua vida é mais uma estatística para o Estado brasileiro. [...]
(O bando caminha em círculos, dobrando o joelho. Quando um, uma cai, o outro, a outra ajuda a levantar.)
CARLOS, Dione. Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos. Belo Horizonte: Editora Javali, 2024. Localizável em: cenas 1 e 2.
Após a leitura, converse com os colegas sobre a questão a seguir.
• O que mais chamou sua atenção na dramaturgia? Você teve ideias de como transformar o texto teatral em cenas? O que imaginou?
Não escreva no livro. Respostas pessoais. Incentive os estudantes a expressar livremente sensações e pensamentos suscitados pela obra. Ajude-os a refletir sobre a importância de um tema como esse ser tratado por um grupo teatral ligado a uma comunidade. Sugira aos estudantes que anotem ideias de como transformar o texto em cena, pois poderão ser usadas durante a proposta de ação que encerra o capítulo.
PESQUiSA
Se julgar oportuno, organize, com o apoio da direção da escola, uma excursão a um espaço teatral localizado nas proximidades da escola. Outra opção é convidar artistas locais para visitarem a sua aula e conversarem com a turma. Essas atividades poderão enriquecer o conhecimento dos jovens e contribuir para o envolvimento deles com essa linguagem artística.
Políticas culturais e teatros de grupo pelo Brasil
Conheça, a seguir, algumas iniciativas do teatro de grupo.
1. O teatro e as periferias.
• O livro Breves apontamentos sobre o teatro das_nas_pelas periferias brasileiras, organizado por Alexandre Mate (1952-), reúne artigos sobre o teatro brasileiro em toda a sua diversidade. Disponível em: www.spescoladeteatro.org.br/wp-content/uploads/2024/06/TEATRO-BRASILEIRO-DAS_ NAS_PELAS-PERIFERIAS-versao-grafica_compressed.pdf (acesso em: 27 set. 2024).
2. Arte contra a barbárie.
No campo da luta por políticas públicas para o teatro, surgiu em São Paulo, em 1999, o Movimento Arte Contra a Barbárie. Em 2002, o coletivo conquistou a promulgação da Lei Municipal de Fomento ao Teatro, que viabiliza a pesquisa continuada de grupos teatrais.
• O documentário brasileiro Arte contra barbárie (2011) explora como a arte pode ser uma poderosa ferramenta de resistência e transformação social diante de situações de violência e opressão. Assista à primeira parte do documentário disponível em: https://vimeo.com/21815104 (acesso em: 27 set. 2024).
• O “Manifesto Arte contra a Barbárie 3” defende a arte como forma crucial de resistência e transformação social. Disponível em: www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/popup_labaki_04.htm (acesso em: 27 set. 2024).
3. Grupos de teatro pelo Brasil.
• Navegue pela página da Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz, fundada em Porto Alegre (RS), em 1978, disponível em: www.oinoisaquitraveiz.com.br, e assista a uma gravação do espetáculo de rua O amargo santo da purificação, disponível em: www.youtube.com/watch?v=ytBe5HIkNak (acessos em: 27 set. 2024).
• Conheça o site do grupo Espanca!, fundado em 2004, em Belo Horizonte (MG), disponível em http:// espanca.com, e ouça um episódio de podcast sobre o espaço cultural Teatro Espanca, disponível em https://open.spotify.com/episode/5HE5G7pzfzITgntc7ZDAW1 (acessos em: 27 set. 2024).
• Visite o site do grupo Teatro Experimental de Alta Floresta (TEAF), fundado em 1988, em Alta Floresta (MT). Disponível em: www.teatroexperimental.com.br (acesso em: 27 set. 2024). Pesquise por TEAF nas redes sociais.
• Busque, em redes sociais, as páginas do grupo de teatro Panorando Cia. e Produtora, fundado em 2016, em Manaus (AM), e premiado na 34 a edição do Prêmio Shell de Teatro.
• Acesse a página do grupo Teatro Máquina, fundado em 2003, em Fortaleza (CE). Disponível em: https://teatromaquina.weebly.com (acesso em: 27 set. 2024). Se possível, acompanhe as páginas do grupo nas redes sociais.
4. Existem grupos de teatro próximos a você?
• Faça uma pesquisa para saber se existe algum grupo de teatro que atua na região em que você mora ou próximo à sua escola. Em caso positivo, verifique a possibilidade de agendar uma visita coletiva à sede do grupo.
Fotografia do espetáculo O amargo santo da purificação, apresentado pela Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz no Dia da Consciência Negra de 2023. Parque da Redenção, Porto Alegre (RS).
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Teatro de grupo: pesquisas e formas coletivas de criação
O teatro contemporâneo brasileiro é marcado pelo teatro de grupo e pela pesquisa teatral. Os espetáculos são escritos e encenados coletivamente, contando com a colaboração dos muitos artistas envolvidos no processo de criação.
Nesse modo de produção, o grupo de teatro elege uma inquietação compartilhada por seus integrantes. Pode ser um tema, uma vivência envolvendo determinada comunidade ou um elemento formal (o desejo de experimentar a linguagem cênica em determinada direção).
O processo para elaborar essa inquietação em cena é o foco do trabalho. A prioridade não é mais a conclusão de uma montagem, mas todo o percurso necessário para chegar a ela.
Cada grupo desenvolve caminhos para organizar a criação coletiva. Uma forma possível é o processo colaborativo, que une a criatividade e as habilidades dos integrantes para desenvolver uma escrita coletiva. Nesse tipo de processo, cada um desempenha uma função específica que corresponde a um dos elementos que compõem a encenação – atuação, cenografia, figurino, adereços, iluminação, sonoplastia, dramaturgia e direção.
De acordo com suas funções, os artistas trazem para o ensaio cenas experimentais, ou seja, fragmentos teatrais que mobilizam os temas e formatos eleitos como foco da pesquisa. Com base no que o grupo está estudando, atores e atrizes apresentam improvisos; iluminadores arriscam desenhos de luz; figurinistas testam roupas e adereços; cenógrafos propõem organizações do espaço cênico. Assim são levantados diversos materiais criativos.
O trabalho do dramaturgo também se modifica no processo colaborativo. O texto não é mais o ponto de partida do espetáculo, pois a dramaturgia vai sendo escrita no dia a dia dos ensaios, com base nas experimentações da equipe. O mesmo acontece com a encenação: o encenador organiza os materiais descobertos durante a pesquisa e provoca o grupo na direção de novas descobertas, até que se consolide a encenação.
Imagem do espetáculo Café com queijo, do grupo Lume, sediado em Campinas (SP). Desde 1985, o grupo trabalha com foco na pesquisa de atuação. Fotografia de 2014.
AçÃO Encenação colaborativa
Nesta ação, você e os colegas vão preparar uma encenação colaborativa com base em trechos do texto teatral Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos, apresentado na seção Repertório 3
1. Preparação
Junte-se aos colegas em grupos de, aproximadamente, dez integrantes. Defina com eles quem ficará responsável por cada função.
• Elenco: desenvolve a atuação, experimenta formas de vivenciar a cena.
• Iluminação: providencia os artefatos luminosos e define a disposição das luzes.
• Cenografia: define o espaço de cena, planeja e produz o cenário.
• Figurino: concebe e providencia o vestuário e os adereços.
• Sonoplastia: cuida da composição sonora da peça, seja na escolha de músicas gravadas, seja na seleção de sons e ruídos produzidos presencialmente.
• Encenação: coordena a equipe e aponta caminhos para o trabalho, tendo como base uma visão geral do processo.
O ideal é que ao menos cinco integrantes se dediquem à atuação. Para cada uma das demais funções, é possível ter uma ou duas pessoas. Também é possível uma pessoa acumular mais de uma função, como atuar e cuidar do figurino.
2. Leitura da dramaturgia
• Leia novamente, em conjunto com seus colegas, os trechos do texto teatral apresentados na seção Repertório 3. A leitura deve ocorrer de maneira contínua, sem interrupções.
• Compartilhe com os demais integrantes do grupo sensações e pensamentos suscitados pelo texto, bem como ideias de como colocá-lo em cena.
3. Aprofundamento nas funções
• O grupo deve ser dividido em duas frentes de trabalho: uma composta de elenco e encenação, e a outra dos integrantes da equipe de criação.
• A frente formada por elenco e encenação vai experimentar, em cena, a dramaturgia. Esse processo é criativo. Atrizes e atores devem explorar as situações cênicas, compreendendo, na prática, os sentidos das cenas e do diálogo entre Maria das Dores e Maria dos Prazeres e testando maneiras de teatralizar as ações coletivas do Bando, indicadas em uma das rubricas. A equipe de encenação deve acompanhar essas experimentações, sugerindo caminhos e fornecendo ao elenco um olhar externo, sempre com cuidado e empatia.
• Os integrantes da segunda frente de trabalho irão pesquisar possibilidades ligadas às suas funções, a fim de compor a linguagem teatral. Os cenógrafos pesquisarão espaços da escola e objetos que podem compor o cenário. Os figurinistas investigarão vestuários e adereços. Os iluminadores cuidarão das possibilidades de compor as cenas com a luz, usando recursos diversos, como lanterna de celular (para criar focos de luz), papel celofane nas lâmpadas e janelas (para servir de filtro), guarda-chuva (para ser usado como refletor e anteparo para a luz do dia), espelhos (também para refletir a luz), entre outros. Os sonoplastas irão buscar o arranjo sonoro que melhor componha a cena, pesquisando músicas e sons diversos.
4. Compartilhamento das pesquisas
• Os integrantes do grupo deverão compartilhar entre si o trabalho realizado até o momento: o elenco e a encenação apresentam o que ensaiaram para a equipe de criação, que, por sua vez, expõe suas propostas.
• Feito isso, compartilhe com seu grupo impressões sobre o trabalho de cada um – lembrando que todos os elementos podem ser modificados por meio de acordos coletivos, mas que cabe aos responsáveis de cada área a palavra final. Lembre-se de oferecer sugestões com generosidade, considerando o trabalho já realizado.
• O objetivo do grupo deve se voltar a executar, da melhor forma possível, as propostas estéticas que surgirem. É importante que todos colaborem para que as ideias funcionem na prática, utilizando os materiais disponíveis.
5. Ensaios integrando as propostas de todos
• Agora, o elenco deve voltar a ensaiar a cena, incorporando as propostas de cenografia, figurino, sonoplastia e iluminação.
• A equipe de encenação ficará responsável por uma visão do todo, garantindo que os elementos da cena conversem entre si. Tudo o que participa da encenação pode auxiliar os atores a estarem em cena e darem sentido à dramaturgia.
6. Apresentações
• É hora de cada grupo compartilhar sua cena com toda a turma!
7. Avaliação coletiva
• Após as apresentações, converse com seus colegas de turma: como foram as trocas criativas entre as diferentes funções? Quais foram as dificuldades e as possibilidades criativas proporcionadas pelo processo colaborativo?
Respostas pessoais.
• As escolhas da encenação favoreceram a comunicação entre as cenas? As cenas partiram do mesmo texto, mas cada grupo desenvolveu sua própria encenação. Comentem sobre as diferenças entre as apresentações e em que medida elas refletem o processo criativo e os interesses de investigação de cada grupo. Respostas pessoais.
CONTEXTO MUSiCA
Novos tempos, novos sons
Não será nosso dever […] encontrar meios sinfônicos de expressar nosso tempo, meios que evoquem o progresso, o arrojo e as vitórias dos dias modernos? O século do avião merece sua própria música.
DEBUSSY, 1913 apud GRIFFTHS, Paul. A música moderna: uma história concisa e ilustrada de Debussy a Boulez. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1978. p. 97.
Essa foi a proposta do compositor francês Claude Debussy (1862-1918) em 1913, ao discorrer sobre a música de seu tempo.
O início do século XX foi marcado por transformações tecnológicas que se relacionaram, inclusive, com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Os compositores desse período passaram a questionar os parâmetros musicais anteriores, em especial os românticos, que buscavam forte apelo emocional e enredos a serem contados.
Debussy, em suas experimentações de Prélude à l’après-midi d’un Faune (em português, Prelúdio à tarde de um Fauno), composta entre 1892 e 1894, desafiou a tradição germânica, que tinha um desenvolvimento lógico das ideias musicais com a intenção de contar uma narrativa. Em vez disso, o compositor francês buscou criar um efeito onírico, pois, para ele, a música não era um veículo de emoções pessoais e deveria evocar imagens e movimentos em associação livre, como em um sonho.
Na busca por traduzir o som das crescentes cidades que se enchiam de máquinas, fábricas e pessoas, compositores como John Cage (1912-1992) e Edgar Varèse (1883-1965) também buscaram incorporar em suas composições a percussão e o ruído, elementos pouco explorados na música sinfônica de tradição europeia até então. O objetivo era traduzir o ímpeto científico do início do século XX, em contraste com os pastoris literários do Romantismo.
Assim, o que se vive na primeira metade do século XX é uma “crise das alturas”, isto é, os compositores buscavam encontrar novos meios e caminhos de composição para se contrapor à tradição da música europeia como fora estabelecida até então. A música minimalista também se insere nesse movimento, representando uma tentativa de explorar novas direções para a música ocidental de tradição europeia, ao reduzir elementos e simplificar as estruturas musicais.
O bailarino Vaslav Nijinsky (1889-1950), que coreografou a composição Prélude à l’après-midi d’un Faune, de Debussy, e a apresentou em Paris em 1912.
REPERTORiO 1
Música eletroacústica: sons gravados e criados
O acesso à gravação de sons e a recursos eletrônicos, como os sintetizadores, provocou uma revolução no mundo da música. O dinamofone, ou telarmônio, criado em 1897, é considerado o primeiro dispositivo a introduzir a composição no universo eletrônico. Pesando cerca de duzentas toneladas, sua emissão de sons era controlada por movimentos das mãos, a partir de uma vareta vertical. Paul Hindemith (1895-1963) e Edgar Varèse foram os compositores que criaram as primeiras peças para esse equipamento, em 1931 e 1934, respectivamente. Em paralelo, duas escolas faziam pesquisas na área da música eletrônica. Uma delas, liderada pelo compositor Pierre Schaeffer (1910-1995), na França, trabalhava com a chamada música concreta, que utiliza sons gravados, como o de metais ou da água, manipulados pelos compositores por meio de recortes e loopings, a fim de criar alturas e ritmos em sua obra. A outra escola, do alemão Karlheinz Stockhausen (1928-2007), não se preocupava em gravar sons já existentes, mas em criar sons sintéticos completamente novos, partindo do estudo da frequência das alturas. Era a chamada música eletrônica pura.
O termo música eletroacústica abrange, portanto, toda a gama de composições que trabalham com base nessas pesquisas ou em diálogo com essas duas vertentes. Outros compositores que se destacaram nesse campo foram os franceses Pierre Henry (1927-2017), Pierre Boulez (1925-2016), Iannis Xenakis (1922-2001) e o próprio John Cage.
A musicista Carolina Eyck (1987-) toca o teremim com uma técnica que desenvolveu estudando esse instrumento desde os 7 anos de idade. Colmar (França), 2014.
CONeXãO
Som em movimento
Assista a um vídeo em que a musicista Carolina Eyck cria uma composição musical com o teremim. Disponível em: www. youtube.com/watch?app= desktop&v=vWHrMkdHXes (acesso em: 27 set. 2024).
Não escreva no livro.
Quando criado pelo russo León Theremin (1896-1993), o instrumento que leva seu nome ocupava o espaço da casa de máquinas de um navio. Com a evolução dos recursos tecnológicos, hoje ele é menor e mais prático. Observando a imagem de Carolina Eyck tocando um teremim, responda às questões.
1 Como você acha que esse instrumento é tocado?
1. Resposta pessoal. É pouco provável que os estudantes conheçam a forma de operação do teremim. Desse modo, permita a livre expressão. Observe, com a turma, que a musicista não encosta no teremim, ou seja, o som é gerado pela aproximação e pelo afastamento das mãos.
2 Em sua opinião, o som que o teremim emite se assemelha ao som de algum instrumento que você conhece?
O teremim foi criado com o objetivo de produzir um som inteiramente novo. Assim, ainda que possa lembrar o som de outros instrumentos, seu timbre é único.
Minimalismo
O compositor Philip Glass toca um sintetizador. Londres (Inglaterra), 1991.
A partir do século XX, a insistência na tonalidade e na progressão harmônica que caracterizam a música europeia começou a ser contestada por alguns compositores. A música eletroacústica buscava novas formas de composição, mas surgiram outras correntes, como o atonalismo, o dodecafonismo e o serialismo, que pretendiam romper com esse modelo. Ao mesmo tempo, nos Estados Unidos, desenvolveu-se como tendência o minimalismo, que explorava essa mesma ruptura.
O minimalismo se caracteriza pela repetição de pequenas melodias inúmeras vezes, com alterações graduais. As peças minimalistas costumam ser extensas, com duração de até meia hora, permitindo que as modificações progressivas sejam percebidas pelo ouvinte. Compositores como Philip Glass (1937-) e Steve Reich (1936-) traduziram bem esse estilo. Segundo Reich, o interesse pela música eletrônica, predominante nos anos 1960, se dissolveu nos anos 1970 para dar espaço ao contato com a tradição musical de culturas não europeias. Assim, surgiu no mundo da música de concerto o interesse pela “música não ocidental”, levando o minimalismo a incorporar recursos rítmicos e melódicos usados nas músicas de países africanos e asiáticos.
Assista ao vídeo Philip Glass - Opening (Official Video) , disponível em: www.youtube.com/ watch?v=-nBE9U7q1Uc (acesso em: 27 set. 2024), e responda à questão a seguir.
• Qual é a sensação causada pela repetição presente na música?
Não escreva no livro. Resposta pessoal. Os estudantes podem relatar sensação de relaxamento ou até de enfado diante da repetição. Pergunte a eles se percebem a música como “calma” ou “agitada”. Procurar adjetivar a música pode ajudar a definir melhor as sensações dos estudantes ao ouvi-las.
REPERTORiO 3
A música viva de Koellreutter no Brasil
A preocupação com uma música de concerto que expressasse os novos tempos também chegou ao Brasil. As tendências das vanguardas europeias encontraram espaço de debate e divulgação no grupo Música Viva, liderado por Hans-Joachim Koellreutter (19152005). O compositor alemão chegou ao Brasil em 1937, fugindo da polícia nazista alemã, e logo começou a lecionar no Conservatório Brasileiro de Música e a dar aulas particulares. Em 1939, criou, em parceria com um grupo de importantes músicos do cenário carioca, o movimento Música Viva e passou a realizar palestras e concertos com obras suas e de seus alunos. Koellreutter foi o responsável por desenvolver discussões e debates estéticos sobre música contemporânea que desencadearam importantes movimentos.
Koellreutter foi uma forte influência para artistas da música brasileira de concerto e para importantes nomes da música popular como Tom Jobim (1927-1994), um dos responsáveis pelo surgimento da bossa nova; Rogério Duprat (1932-2006) e Julio Medaglia (1938-), arranjadores do movimento tropicalista; e Tom Zé (1936-), compositor de renome também da Tropicália. Tom Jobim, em depoimento sobre Koellreutter, comentou a influência do compositor alemão sobre seu processo de criação.
[…] Me ensinou muita coisa prática, me ensinou assim por alto esse negócio de 12 tons, de não ser tonal, de não ter uma tonalidade principal e usar os doze tons do piano.
ANTÔNIO Carlos Jobim | Depoimento. [S. l.: s. n.], 2019. 1 vídeo (3 min). Publicado pelo canal Acervo Koellreutter. Localizável em: 1 m 47 s. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=vVfQn1WJzoc. Acesso em: 27 set. 2024.
O movimento Música Viva, que se estendeu até 1950, publicou três manifestos e promoveu uma série de iniciativas inovadoras, como boletins, emissões radiofônicas e conferências, audições públicas, entre outras, que fomentaram o debate sobre música contemporânea no Brasil.
Não escreva no livro.
Sabendo da relação entre o compositor alemão e Tom Jobim, reflita sobre a questão a seguir.
• Você acredita que existe interação entre compositores de música de concerto e da música popular? Explique.
Respostas pessoais. É comum que as pessoas vejam uma separação entre a música de concerto e a música popular. Isso é gerado por uma série de preconceitos que falam mais sobre a dificuldade de circulação dos diferentes tipos de música do que sobre as músicas em si. No entanto, ao longo da história, existem inúmeros registros de interações entre músicos de diferentes estilos e gerações.
Hans-Joachim Koellreutter rege músicos em São Paulo (SP), 1990.
PESQUiSA
Ecos das vanguardas hoje
As vanguardas ainda reverberam em compositores da atualidade. Conheça um pouco dos trabalhos de compositores que seguiram explorando a música eletrônica e o minimalismo em suas composições.
1. Kraftwerk segue na vanguarda.
• A b anda alemã Kraftwerk foi uma das primeiras a utilizar sons sintéticos em suas composições, ainda em 1970. O grupo, ativo até hoje, foi responsável por importantes inovações tecnológicas. Explore o catálogo disponibilizado no site oficial da banda e conheça sua estética em algumas de suas composições e vídeos. Disponível em: https://kraftwerk.com (acesso em: 27 set. 2024).
2. Ryuichi Sakamoto, entre telas e concertos.
• O compositor japonês Ryuichi Sakamoto (19522023) integrou a banda japonesa de música eletrônica Yellow Magic Orchestra, formada em 1978, em Tóquio (Japão). Sakamoto se destacou em suas composições para trilha sonora de filmes como O último Imperador (1987), Olhos de serpente (1998) e O regresso (2015). Sua última trilha original foi composta para o filme Monster (2023), dirigido por Hirokazu Koreeda. Pesquise na internet a trilha original desse filme.
3. As mulheres na música eletrônica.
Embora a história da música de concerto frequentemente destaque compositores homens, diversas mulheres desempenharam papéis importantes para a evolução desse gênero. Conheça e explore o trabalho de algumas delas.
• Daphne Oram (1925-2003) foi pioneira na música eletrônica na Inglaterra. Ela compôs trilhas sonoras e efeitos para a BBC, emissora jornalística do país. Saiba mais sobre o trabalho da musicista em seu site oficial na internet. Disponível em: www. daphneoram.org (acesso em: 27 set. 2024).
• A também inglesa Elizabeth Parker (1950-) compôs para cinema e televisão tendo recebido título de Doutora Honorária pela Staffordshire University. Conheça suas composições em www. elizabeth-parker.co.uk (acesso em: 27 set. 2024).
Apresentação da banda Kraftwerk, formada pelos músicos Ralf Hütter, Fritz Hilpert, Henning Schmitz e Falk Grieffenhagen. Milão (Itália), 2022.
2023. Capa do filme que contou com a trilha original de Ryuchi Sakamoto.
MONSTER.
Elizabeth Parker em estúdio, na década de 1980.
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Paisagem sonora e ecoacústica
O conceito de paisagem sonora (soundscape) é de autoria do músico e educador canadense Raymond Murray Schafer (1933-2021). Esse conceito ajuda a descrever a identidade sonora de um ambiente, destacando que as sonoridades têm um papel tão significativo quanto os elementos visuais. Schafer buscava separar a experiência auditiva da experiência visual e demonstrar que as paisagens sonoras são essenciais para entender a riqueza e a complexidade dos ambientes.
Além disso, Schafer diferenciou ruído de som, entendendo que o primeiro interfere no que se quer ouvir, evidenciando uma seletividade auditiva. É interessante, no entanto, notar que o que é percebido como ruído em um momento pode ser considerado música em outro, a depender do contexto e da perspectiva do ouvinte. Um assobio, por exemplo, pode ser um ruído irritante ou uma música relaxante, conforme o contexto em que se apresenta e o ponto de vista de quem o escuta.
O conceito de paisagem sonora propõe, portanto, uma nova maneira de perceber a realidade sonora que nos rodeia. Ele sugere uma análise atenta e contínua dos sons ao nosso redor e convida compositores a explorar os sons dos ambientes em suas criações.
Uma das peças de Schaffer, Music for Wilderness Lake (em português, Música para o lago Wilderness), propõe que doze trombonistas se coloquem às margens do lago e sejam regidos pelo maestro, que deve estar em uma jangada. Esse é um tipo de obra que dialoga com os sons do próprio lago e com os sons naturais ao redor dos músicos e da plateia.
Hoje, o conceito de paisagem sonora também é incluído no campo da ecologia sonora –estudo dos efeitos do ambiente acústico e dos seres que lá vivem. O músico e ecologista estadunidense Bernie Krause (1938-), por exemplo, trabalha com a paisagem sonora em suas pesquisas. Ao mesmo tempo que produz música, Krause compila e classifica sons que ajudam a ciência a compreender as vidas nos biomas e de que maneira o aquecimento global as afeta ano após ano. A ecoacústica é, portanto, uma área do saber que promove o diálogo entre a música, a ciência e a ecologia.
Raymond Murray Schafer em frame do curta-metragem Listen (2009), dirigido por David New. O educador segura um cartaz com uma palavra do inglês, listen, que significa "escutar".
AçÃO Criando e
explorando uma paisagem
sonora
O compositor Raymond Murray Schafer, em seu trabalho como educador, propôs uma série de exercícios para promover a limpeza dos ouvidos, isto é, aguçar a nossa capacidade de nos relacionarmos com nossa percepção auditiva e os sons ao nosso redor. Agora, a turma toda vai explorar as possibilidades das paisagens sonoras realizando uma composição coletiva.
1. Preparação
• Com os colegas, forme uma roda, acomode-se e proponha um ambiente a ser explorado: uma feira, o pátio de uma escola, um estádio de futebol, um canteiro de obras, o fundo do mar, entre outras possibilidades.
• Juntos, elaborem uma lista, em um papel ou no quadro, com os sons mais comuns no ambiente escolhido.
• Em seguida, elejam um colega para fazer o papel de maestro e combinem com ele o gesto que deve ser feito para que os sons comecem e o gesto para que sejam encerrados.
2. Primeiros ensaios
• A o primeiro gesto do maestro, todos os participantes devem compor o ambiente proposto, reproduzindo os sons listados. Para isso, utilizem apenas suas vozes e seus corpos (vale bater palmas, estalar os dedos, fazer barulhos estranhos, assoviar, gritar, sussurrar e fazer silêncio). Procurem fugir dos lugares-comuns e explorem modulações da voz, estalos de língua, ruídos e sons percutidos.
• Não tenham medo de momentos de muito barulho, mas busquem alterná-los com momentos de quase silêncio. A descrição da paisagem sonora também inclui perceber a alternância dos sons, sua periodicidade e sua duração. Nem todos os sons precisam ocorrer ao mesmo tempo.
• Lembrem-se de que a distância da fonte sonora influencia o volume, portanto, façam algumas experiências alternando a intensidade dos sons. A cada ensaio, conversem entre si e recombinem a entrada de cada um dos sons para que a paisagem sonora produzida se aproxime cada vez mais da realidade.
• Quando todos estiverem satisfeitos, façam o ensaio final para decorarem o que propuseram. É interessante fazerem uma rodada de olhos fechados, para que estejam mais conectados aos sons.
• Se possível, com o auxílio de um gravador, façam o registro sonoro da composição da turma para que não a esqueçam.
3. Paisagem para uma cena
• Agora, junte-se aos colegas em grupos de quatro a cinco integrantes, para criar um diálogo que ocorrerá nessa paisagem sonora. Cada grupo deverá escolher duas personagens para interagirem no ambiente criado coletivamente. Por exemplo: se a paisagem escolhida for um estádio de futebol, podem ser dois torcedores conversando; se for um canteiro de obras, podem ser dois operários.
• Criem um breve diálogo entre as personagens. A situação deve ficar nítida: elas estão assistindo a um filme no cinema? Estão participando de uma ceia de Natal? Estão esperando a chuva passar para poder ir para casa? A relação entre as personagens também deve ser expressa de forma clara: são mãe e filha ou irmãs? É um patrão falando com os funcionários ou são dois colegas de trabalho?
• Cada grupo de verá produzir um texto teatral para registrar o diálogo, anotando as falas das personagens e as rubricas necessárias.
4. Som em cena
• A turma deve reunir-se novamente e relembrar a paisagem sonora que compôs coletivamente.
• Em seguida, cada grupo deverá apresentar o diálogo das personagens que criou para habitar esse ambiente, enquanto os demais reproduzem os sons da paisagem sonora.
• Talvez seja necessário modular a intensidade do som para que se possa ouvir o diálogo a cada nova apresentação dos grupos.
• Da mesma maneira, aqueles que encenarão o diálogo de seus grupos precisam se relacionar com a paisagem sonora interpretada pela turma e, se preciso, devem projetar mais a voz.
5. Avaliação
Ao término de todas as rodadas, converse com os colegas sobre a experiência.
• Como foi criar personagens com base em uma paisagem sonora já existente?
Resposta pessoal.
• Algum diálogo c ombinou mais ou menos com a composição sonora coletiva?
Resposta pessoal.
• Quais foram as dificuldades para recriar sons utilizando apenas sua voz e seu corpo?
Resposta pessoal.
PONTE PARA OUTRAS
liNGUAGENS ARTiSTiCAS
ARTES ViSUAiS
Arte transdisciplinar
O artista dinamarquês-islandês Olafur Eliasson (1967-) é conhecido por suas obras que exploram a interseção entre arquitetura, ciência, tecnologia e elementos da natureza, como luz, água e temperatura, bem como a relação sensorial desses elementos com o ser humano. Ele cria objetos inovadores, muitas vezes utilizando espelhos e luzes, e desenvolve vídeos e projeções com o emprego de cores, gases e água para compor instalações que podem acontecer tanto dentro de museus como em espaços naturais.
Muitas de suas obras são projetadas para interagir com o público, gerando sons e movimentos que ampliam a experiência sensorial. Fundado em 1995 em Berlim (Alemanha), seu estúdio funciona como um laboratório de pesquisas onde trabalham pessoas formadas em diferentes áreas – como arquitetura, engenharia e design.
ELIASSON, Olafur. Symbiotic seeing [Visão simbiótica]. 2020. Instalação com lasers, máquina de neblina, sistema de ventilação e áudio. A obra fez parte da exposição de mesmo nome, realizada na Casa de Arte de Zurique (Suíça), em 2020.
ARTES ViSUAiS
A
complexidade do mundo
a partir da sua aldeia
O artista Augusto Leal (1987-) realiza trabalhos que lançam um olhar crítico e questionador sobre sua cidade natal, Simões Filho –polo industrial localizado na região metropolitana de Salvador (BA), considerada uma das cidades mais violentas do Brasil. Não há, na região, museus ou teatros para reforçar a presença da arte no cotidiano dos habitantes, o que impulsiona o discurso e a prática do artista.
Seu trabalho também discute o complexo sistema da arte, que envolve museus, galerias, críticos, curadores e artistas de importantes centros econômicos do mundo, que regem o mercado e definem os valores das obras.
Em sua obra Sinalização profética , o artista busca criar um novo mundo, no qual as relações sociais e geopolíticas são reveladas para influenciar o modo de ser e pensar das pessoas. Ao ressignificar as placas de rua, inserindo textos como “Diretoria Indígena a 500 m” ou “Curador simpático a 200 m”, e espalhando-as pela cidade de Simões Filho, o artista indica, por exemplo, instituições que não existem, além de promover o debate acerca da função da arte e do valor do artista.
LEAL, Augusto. Sinalização profética. 2021. Instalação realizada pelo artista em Simões Filho, (BA).
AUGUSTO
LEAL
JOSEPH NAIR, MEMPHIS
ELIASSON, MUSEU DE ARTE DE SINGAPURA
ARTES iNTEGRADAS
Performance: (se)cura humana
Na arte contemporânea, não existem limites entre as linguagens. Um coletivo de artistas pode conceber performances em parceria com músicos, coreógrafos, videoartistas, curadores, cientistas, entre outros.
Um exemplo desse tipo de atuação integrada é o coletivo (se)cura humana, que realiza ações artísticas e de ativismo ambiental, urbanas e aquáticas. Fundado em 2015, em São Paulo, por Flavio Barollo (videoartista e performer) e Wellington Tibério (músico e geógrafo), o grupo visa promover reflexões sobre questões ambientais, tais como o uso da água na cidade, as ameaças de devastação de florestas, os crimes relacionados à mineração, o racismo ambiental e a mudança do regime climático da Terra provocada pela ação humana.
Os artistas questionam o modo de vida urbano, que se tornou caótico nas últimas décadas, conferindo materialidade a sonhos e utopias relacionados ao uso da água no espaço urbano, por exemplo.
ARTES iNTEGRADAS
Performance: Holoscenes
Holoscenes acontece dentro de uma caixa com paredes de vidro, semelhante a um grande aquário, situada em espaços públicos. Criada pelo estadunidense Lars Jan (1978-) e o Early Morning Opera (um laboratório de arte e performance), a performance-instalação apresenta artistas executando simples ações cotidianas. Em uma das cenas, uma vendedora coloca uma cesta de frutas no chão; em outra, um homem se acomoda para dormir, com a cabeça no travesseiro e coberto por um lençol. No entanto, essas rotinas triviais vão se transformando, à medida que o aquário se enche de água. Em, aproximadamente, um minuto, artistas e objetos se veem submersos, impedidos de dar continuidade às ações. Misturando dança e performance, Holoscenes chama atenção, de modo poético e contundente, para o impacto da crise climática na vida de todos e de cada um.
COLETIVO (SE)CURA HUMANA. Simulação de um levante. 2024. Performance.
em São Paulo (SP), 2024.
EARLY MORNING OPERA; JAN, Lars. Holoscenes. 2014. Performance-instalação. Realização em Londres (Inglaterra), 2016.
SiNTESE ESTETiCA
É preciso descolonizar a arte contemporânea
Reflexão
Em 2018, por meio de uma parceria entre duas importantes instituições culturais da cidade de São Paulo, o Museu de Arte de São Paulo (Masp) e o Instituto Tomie Ohtake, foi realizada a exposição “Histórias afro-atlânticas”, que reuniu 450 trabalhos de 214 artistas, explorando o fluxo constituído, do século XVI ao século XXI, entre a África, as Américas, o Caribe e a Europa. O objetivo da exposição era provocar novos debates e questionamentos em torno das histórias afro-atlânticas, para que essas narrativas fossem recuperadas, revistas e reescritas. Leia, a seguir, trechos do texto “Histórias”, escrito por Adriano Pedrosa, diretor artístico do Masp. O ensaio compõe o catálogo da exposição e reflete acerca dos esforços dos artistas contemporâneos, especialmente do Sul Global, para propor uma arte aberta, plural, diversa e inclusiva que enfrente a colonização cultural.
Histórias
ALEXANDRE, Maxwell. Éramos as cinzas e agora somos o fogo. 2018. Pintura com materiais diversos sobre papel pardo, 319 cm x 480 cm. Obra da série Pardo é papel, que fez parte da exposição “Histórias afro-atlânticas".
1. A disciplina da história da arte, com suas raízes, estruturas e modelo profundamente europeus, é o aparato mais poderoso e duradouro do imperialismo e da colonização. Uma construção brilhante realizada no decorrer de séculos, ela tem consequências impressionantes. Embora a história da arte se baseie no talento de vários pintores e escultores, também foi preciso construir narrativas de causalidade e conexão entre eles, configurando sua grande narrativa com crônicas de progresso, desenvolvimento e refinamento. Artistas, obras de arte e conjuntos de obra se tornaram elementos que coreografam a evolução de movimentos, escolas, estilos, períodos e eras. Assim se dissertou tudo que era considerado as maiores conquistas das culturas materiais europeias e, mais tarde, euro-americanas. Um seleto grupo de artistas e suas criações formam o que é conhecido como cânone, o exemplo das manifestações mais sofisticadas da cultura ocidental. Enquanto os artistas são identificados como
gênios e mestres, suas obras incorporam um aspecto quase sobrenatural e reverencial. Como definiu o historiador da arte Steve Edwards: “O cânone é uma condição estrutural da história da arte”. Os mestres e gênios canônicos eram invariavelmente homens brancos, educados formalmente e europeus. Nesse sistema etnocêntrico, uma hierarquia perversa de objetos e autores é desenhada ao longo de um eixo regimentado. De um lado do eixo, encontramos o objeto cultivado das belas artes europeias ou euro-americanas – tais objetos e seus estilos com frequência eram associados aos gostos da elite e das classes governantes, mesmo que fossem apropriadamente pesquisados e legitimados por críticos e historiadores da arte. Do outro lado, os artefatos do resto do mundo, em especial aqueles produzidos por artistas das antigas colônias sem emular os estilos e formas europeus ou sem uma educação europeia – o objeto exótico, primitivo, tribal e folclórico. O objeto das belas artes europeias se torna padrão máximo, o extremo do eixo e a baliza pela qual todos os outros devem ser julgados, categorizados, classificados e posicionados. […] Nesse contexto, as hierarquias de raça, gênero e classe são impostas e os chamados povos nativos, indígenas, inferiores, subordinados, subalternos e não brancos devem ser conquistados, catequizados, educados, “dominados, amplamente exterminados, amplamente desalojados”.
[…]
Nas últimas décadas, produções de arte contemporânea de fora da Euro-América têm sido exibidas cada vez mais em vários museus e bienais, e o chamado modelo global contemporâneo de exposições de arte tem sido a norma desde os anos 1990. […] Mas o desafio persiste: encontrar outras ferramentas, modelos e conceitos para avaliar outras narrativas além da crítica e da história eurocêntricas. […] A questão não é tanto se desfazer por completo das ferramentas tradicionais da história da arte, o que muito provável implicaria no fim do museu, mas encontrar outros instrumentos para torná-lo mais diverso, inclusivo e plural – para canibalizá-lo e desenvolver uma caixa de ferramentas mestiça e antropofágica.
2. Quais outras histórias a arte pode ajudar a mostrar ou abordar além da história da arte? Que outros personagens, temas e narrativas além de estilos, movimentos, escolas e períodos da própria disciplina? Como podemos acercar-nos de histórias mais plurais, inclusivas, múltiplas e diversas? O que está além da história da Renascença e do barroco, do impressionismo e expressionismo, da abstração e da figuração, do construtivismo e da geometria, do pop art, da arte minimalista ou conceitual? É possível considerar várias histórias: da sexualidade, da loucura, da infância, do feminismo, histórias da colonização e do imperialismo, histórias indígenas, afro-atlânticas. Os temas são vastos e devem incluir muitos territórios, períodos, mídias e objetos, sem evitar por completo inflexões eurocêntricas. Entretanto devemos admitir que projetos tão ambiciosos e abrangentes estarão fadados à incompletude, fragmentação e parcialidade.
Histórias em português (bem parecido com o histoires do francês e o historias do espanhol) pode abranger narrativas ficcionais e não ficcionais, factuais ou míticas, micro e macro, podem ser escritas ou orais, e ter caráter político, econômico, cultural ou pessoal. Como estrutura em que se coalescem narrativas que foram deixadas de lado, na margem, ou esquecidas, histórias é aberta, plural, diversa e inclusiva. Ela pode abranger uma série de narrativas: pessoal, política, artística, cultural, mítica, oral, visual, subterrânea, menor, marginal, assim como a preliminar, processual, incompleta, parcial, até mesmo contraditória. Histórias, portanto, são distintivamente polifônicas, especulativas, abertas, impermanentes, em fricção. Há um aspecto canibalizante no termo — elas podem devorar tudo e, de fato, seu próprio contrário (até mesmo a história da arte tradicional e seu cânone pode constituir uma das muitas camadas de histórias).
PEDROSA, Adriano. Histórias. In: PEDROSA, Adriano; TOLEDO, Tomás (org.). Histórias afro-atlânticas: catálogo. São Paulo: Museu de Arte de São Paulo: Instituto Tomie Ohtake, 2018. vol. 1. p. 30-31.
A cultura ocidental é abordada de uma perspectiva crítica, pensando na maneira como seu cânone, de caráter eurocêntrico, estabeleceu uma hierarquia perversa, em que as obras e manifestações artísticas de outros lugares do mundo são deslegitimadas.
Processo de criação coletiva
Partindo do texto que acabou de ler, mobilizado pela perspectiva das histórias da arte múltiplas, inclusivas e plurais, você desenvolverá um processo de pesquisa e criação artística. Para isso, forme com os colegas um grupo de seis a dez integrantes.
Análise e debate
Depois de analisar a imagem, ler o texto e refletir, discuta com seu grupo as questões a seguir.
• Como a cultura ocidental é abordada no texto?
• Existe um padrão de arte e cultura? Do seu ponto de vista, que padrão é esse?
• No que consiste o desafio de buscar outras histórias da arte?
• Responda à provocação do texto: que personagens, temas e narrativas poderiam ser abordados nas histórias da arte?
Respostas pessoais. Debata com a turma a formação dos conceitos de beleza, de arte e de cultura formatados socialmente. Pergunte aos jovens que imagens se relacionam com esses padrões e de que maneira isso afeta as pessoas.
Consiste em procurar diferentes temas, narrativas e estilos, buscando histórias plurais, inclusivas, múltiplas e diversas. É ir além dos grandes marcos estabelecidos na história da arte ocidental, buscando construir histórias da arte, considerando narrativas deixadas de lado, à margem, no sistema colonial.
Resposta pessoal. Incentive os estudantes a relacionar a cultura à qual pertencem, as manifestações artísticas que consomem em seu dia a dia e os elementos que formam a identidade dos adolescentes como elementos que participam dessas histórias da arte, plurais e diversas.
TAYOU, Pascale Marthine. Bend Skin [Dobra pele], 2017. Instalação com vídeo, bicicleta, caixa de papelão, fitilho e tinta. Obra participante da exposição “Histórias afro-atlânticas”.
Ideia disparadora e linguagens artísticas
Pense em como fazer uma síntese estética do debate realizado, ou seja, em como transmitir as conclusões do grupo aos demais colegas, por meio de uma criação artística, como uma música, uma pintura, um poema, uma cena, uma performance, uma instalação.
Retome as ferramentas criativas trabalhadas ao longo deste capítulo ou rememore procedimentos artísticos trabalhados nos capítulos anteriores e que possam apoiar a criação. Considere também as habilidades e os desejos artísticos dos integrantes do grupo para compor a ideia central da obra coletiva.
Em um primeiro momento, deixe as ideias fluírem, anotando todo tipo de sugestão. Depois, com os colegas, retomem as ideias e elejam a que parecer mais potente, chegando a uma ideia disparadora.
Quais temas e narrativas são importantes para você e seus colegas e podem se transformar em uma obra ou manifestação artística? É possível pensar uma instalação com poemas e versos que fazem parte da sua cultura? Ou uma dança que retrate outras belezas e culturas para além do padrão imposto pela sociedade?
Talvez uma cena de teatro que investigue um tema ou assunto importante para o grupo? Uma composição sonora, feita de um remix de todas as sonoridades que fazem parte do seu dia a dia?
Para a criação desse trabalho artístico, podem ser utilizadas todas as referências culturais e artísticas desejadas. A ideia é ampliar o conceito de arte, explorando as múltiplas linguagens artísticas, na busca de expressar a identidade e as inquietações que atravessam essa etapa das suas vidas.
Deixem a imaginação livre. Anotem a ideia disparadora e a(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Pesquisa, criação e finalização
Organizem as etapas de criação do projeto artístico com base nas reflexões centrais, na ideia disparadora e na(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Caso a criação do grupo envolva apresentação ou encenação, lembrem-se de ensaiar o maior número de vezes possível, aprimorando o trabalho a cada repetição. Mesmo apresentações improvisadas exigem alguma forma de combinado e preparação. Não deixe que o processo de criação fique só na conversa, lembre-se de experimentar os elementos em cena.
Caso a invenção do grupo envolva uma exposição ou instalação, façam uma lista de tudo que será necessário providenciar, dividindo as tarefas entre os integrantes.
Não existe uma fórmula para esse processo de criação. Cada grupo deve desenvolver suas etapas, estabelecendo critérios e tendo em vista a obra ou manifestação artística que se está concebendo.
Com o trabalho desenvolvido, chegou o momento de compartilhar com o restante da turma! Aproveite para apreciar a criação dos demais grupos.
Arte e os desafios do nosso tempo
Festivais de cinema abordam questões socioambientais.
Cartaz da 13a edição da Mostra Ecofalante de Cinema, realizada em 2024.
Incentivar o reflorestamento do Brasil por meio da música.
Frame do videoclipe da música “Refloresta”, de Gilberto Gil (1942-), lançado em 2021 em parceria com o Instituto Terra.
Entrelaçamento entre teatro, música e dança para encenar a revolução no continente africano.
Cena do espetáculo de dança
Kalakuta Republik, de 2016, do coreógrafo burquinense Serge Aimé Coulibaly (1972-), inspirado em Fela Kuti (1938-1997), importante músico e ativista nigeriano, criador do afrobeat
2. O quadro de Luiz Zerbini aborda a resistência das florestas diante do atual colapso ambiental. O espetáculo Kalakuta Republik, que integra teatro, dança e música, aborda as revoluções africanas do passado e do presente. O videoclipe “Refloresta”, de Gilberto Gil, e a Mostra Ecofalante de Cinema abordam questões socioambientais. Por fim, a Blitz Cultural é uma mostra de teatro organizada pelo grupo Boca de Cena, que atua buscando transformar a realidade local de Aracaju (SE).
A pintura explora o mundo vegetal que ainda floresce em meio às ruínas.
Coletivos teatrais modificam a realidade local.
Imagem da Blitz Cultural, festival artístico organizado pelo grupo teatral Boca de Cena, de Aracaju (SE). Fotografia de 2024.
ZERBINI, Luiz. Lago quadrado. 2010. Acrílica sobre tela, 294 cm x 292 cm.
Não escreva no livro.
Considerando as imagens apresentadas nestas páginas de abertura, responda às questões a seguir.
1 Quais linguagens artísticas estão contempladas nesse conjunto de obras?
1. Artes visuais, música, dança, teatro e artes integradas (audiovisual).
2 A s obras e as manifestações artísticas apresentadas abordam desafios da atualidade. Quais seriam eles?
3 Você conhece outras obras e manifestações artísticas que também abordam os desafios do nosso tempo? Se sim, quais?
3. Respostas pessoais. Explore o universo cultural dos estudantes, solicitando exemplos de artistas e obras que abordam, de maneira crítica, a realidade contemporânea. Peça a eles que justifiquem suas respostas.
GRUPO TEATRAL BOCA DE CENA/BLITZ CULTURAL
LUIZ ZERBINI
De que forma a arte pode contribuir para o enfrentamento dos desafios do nosso tempo?
O contexto atual é marcado pelo crescimento exponencial da atividade industrial e pela exploração exacerbada das vidas humanas e não humanas na Terra. Nos últimos 200 anos, o consumo de energia fóssil produziu uma camada de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera que vem impedindo a dissipação do calor e culminando na elevação da temperatura da Terra, causando a mudança do regime climático global.
A temperatura média do planeta já aumentou 1,5 °C em relação ao período pré-industrial, e os impactos disso são perceptíveis em eventos como secas severas, chuvas torrenciais, inundações e variações de temperatura mais extremas do que as observadas ao longo do Holoceno, demarcando um novo período geológico, o Antropoceno
A insistência em perpetuar um modo colonial de habitar a Terra, que desmata as florestas, polui as águas dos oceanos e dos rios, investe em monoculturas, mineração e outras atividades predatórias, vem intensificando a extinção de espécies, substituindo a massa viva do planeta por uma massa de elementos inertes, feitos principalmente de cimento, asfalto, metais e plástico.
Para promover a vida, é fundamental produzir a diversidade, bem como proteger todas as formas de existência ameaçadas. Nesse contexto, a arte tem o papel de assegurar a multiplicidade cultural, fomentar comunidades de trabalho e trocas, produzindo uma comunicação sensível capaz de estimular pensamentos críticos e criativos, que desperte uma percepção aguda das ameaças iminentes e da necessidade urgente de mudanças.
Holoceno: tempo geológico que consiste, aproximadamente, nos últimos 12 mil anos, em que a temperatura foi amena, com períodos de clima regulares, o que possibilitou o surgimento da agricultura e da vida sedentária. Antropoceno: termo sugerido pelo químico holandês Paul Crutzen (1933-2021), vencedor do Nobel de Química em 1995, para nomear o tempo geológico atual, caracterizado pela interferência da humanidade nos ciclos vitais da Terra.
BAMBOZZI, Lucas. Cratera Mutuca. 2021. Fotografia. A obra integrou a exposição “Solastalgia”, realizada no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, em São Paulo (SP). Fotografia de 2023.
Na exposição “Solastalgia”, de Lucas Bambozzi (1965-), o artista busca sensibilizar o público a respeito da experiência emocional de se viver no período Antropoceno. A solastalgia , termo cunhado pelo filósofo Glenn Albrecht (1953-) em 2005, consiste em perceber a perda do mundo vivo diante das transformações radicais na paisagem natural ou urbana.
LUCAS
BAMBOZZI
O grupo indígena de rap Brô MC’s e a ativista Lídia Guajajara lançaram, em 2023, um videoclipe musical em defesa dos povos indígenas isolados, para marcar o encerramento da campanha “Isolados ou Dizimados”. O objetivo da campanha era conscientizar a opinião pública e pressionar as autoridades a proteger os povos indígenas isolados no Brasil.
CONeXãO
IsoladosOuDizimados
Imagem de divulgação da música “O chamado dos isolados”, dos artistas e ativistas Brô MC’s e Lídia Guajajara, lançada em 2023. REPRODUÇÃO/COIAB
O videoclipe de “O chamado dos isolados” pode ser assistido no canal oficial do Instituto Socioambiental. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=bwjxE-TEnPI (acesso em: 2 out. 2024).
AT¡v¡DaDe De SeNS¡B¡l¡ZAÇÃO
Trocando impressões
Depois de apreciar obras e manifestações pertencentes a diferentes linguagens artísticas realizadas com o objetivo de debater e agir sobre a realidade, você fará parte de uma dinâmica de “troca” de imagens digitais.
2. Se o número de tablets ou smartphones à disposição for inferior ao número de estudantes, é possível realizar essa dinâmica em duplas ou trios. Com isso, os grupos podem utilizar um mesmo equipamento.
1. Se for possível, realize a atividade em um lugar amplo da escola, como a quadra, o pátio ou o auditório. Ou, então, busque ampliar e organizar o espaço da sala de aula junto com os colegas, afastando mesas e cadeiras.
2. Utilize um smartphone ou um tablet para escolher uma imagem que você irá mostrar aos colegas. Essa imagem deve retratar um tema que você considera urgente ser abordado.
3. Em silêncio, caminhe pelo espaço em que se desenvolve a atividade. Pare diante de um colega e mostre a ele a imagem que você selecionou. Deixe-o observar a imagem com profundidade. Depois, peça a seu colega que fotografe a imagem, para que possa levá-la com ele.
4. Aprecie a imagem mostrada por seu colega. Observe-a com atenção, percebendo os detalhes da composição e a temática evocada. Fotografe essa imagem e leve-a com você.
5. Repita esse processo por algumas rodadas, seguindo as orientações do professor.
6. Escolha uma segunda imagem para compartilhar, com base em todas as referências imagéticas que você recebeu.
7. Repita o procedimento.
8. Converse com os colegas sobre a atividade, partindo das questões a seguir.
• Quais imagens você escolheu para compartilhar? Qual foi o motivo dessa escolha?
• Que imagens mostradas por seus colegas mais impactaram você? Por quê?
Respostas pessoais. Incentive os estudantes a explanarem o porquê da seleção, compartilhando as angústias e/ou os temas urgentes que os levaram àquela escolha.
Respostas pessoais. Aproveite o momento para mapear os assuntos e as questões mais relevantes para a turma, encontrando pontos em comum entre as temáticas abordadas na atividade.
ARTES ViSUAiS
CONTEXTO
A diversidade da vida
A vida é diversidade. Mesmo entre árvores da mesma espécie, cada uma possui características únicas, resultado de processos de diferenciação e adaptação ao longo do tempo, que geram novas espécies. Ao refletir sobre o atual empobrecimento biológico do mundo, alguns pensadores identificam a prática colonial da monocultura, isto é, a imposição de um único modo de cultura, como uma violência à produção de diversidade, que é a característica fundamental da proliferação da vida.
No contexto da arte, a diferença é sempre bem-vinda, pois a diversidade é garantia de criatividade. Partindo da visão de que cada pessoa é única e traz novos modos de viver, compreender e simbolizar o mundo, a inclusão de pessoas com diferentes sensibilidades, com deficiências e/ou neurodiversas tem sido cada vez mais demandada em processos educativos e criativos, bem como no mundo do trabalho.
Da mesma forma, é essencial reconhecer e valorizar a produção de artistas que não se encaixam no binarismo de gênero, que espera que as pessoas se identifiquem com o gênero masculino ou feminino. Esses artistas, muitas vezes excluídos do convívio social em razão de suas identidades, que não se enquadram nos padrões sociais estabelecidos, desenvolvem uma sensibilidade e um acurado pensamento crítico em relação às sociedades que os marginalizam. É o caso da artista amazonense Uýra Sodoma (1991-) e do mineiro Randolpho Lamonier (1988-), que serão apresentados mais adiante.
Judith Scott (1943-2005) foi uma artista estadunidense que trabalhou durante dez anos no Creative Growth Studio (Estúdio para Crescimento da Criatividade), instituição que promove a inclusão de pessoas com deficiência ou algum tipo de neurodiversidade na arte contemporânea. Em seu trabalho, a artista reunia objetos descartados, como tubos de plástico, rodas de bicicleta, guarda-chuvas e, sapatos, que eram unidos pelo entrelaçado de fios e encobertos por lã colorida até atingirem uma forma final que ocultava e revelava um mundo sensível, muitas vezes indecifrável, podendo, com isso, despertar múltiplas percepções, sentidos e interpretações do público.
neurodiverso: vem de neurodiversidade, conceito concebido com o objetivo de reconhecer e respeitar as diferenças neurológicas, como dispraxia, dislexia, transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), transtorno do espectro autista (TEA), síndrome de Tourette, síndrome de Down, entre outras.
SCOTT, Judith. [Sem título]. 2004. Escultura composta de cadeira, roda de bicicleta, cesto de palha, peças têxteis e fios, 73,7 cm x 40,6 cm x 53,3 cm.
CREATIVE
REPERTORiO 1
1. Resposta pessoal. Peça aos estudantes que mencionem exemplos, como os nomes dos responsáveis por compor essas imagens, e pergunte se eles seguem perfis de fotógrafos ou fotógrafas e o que eles acreditam que uma imagem deve conter para ser considerada artística.
Cindy Sherman: entre a imagem e a autoimagem
Os retratos fotográficos conceituais da artista estadunidense Cindy Sherman (1954-) dialogam com a estética do cinema, da moda, das artes, da performance e do cotidiano. Ao longo de décadas, Sherman lançou na mídia questões desafiadoras sobre o papel e a representação das mulheres na sociedade, além de explorar os diferentes modos de criação artística. Sua obra é composta de autorretratos que revelam uma complexa negociação entre ser, ao mesmo tempo, fotógrafa e modelo, assumindo uma variedade de identidades. Seus primeiros trabalhos, da série Untitled Film Stills (em português, Frames de filmes sem título), realizados no final da década de 1970, consistem em fotografias em preto e branco nas quais a artista personifica diferentes estereótipos femininos, relacionados aos filmes europeus e estadunidenses das décadas de 1940 e 1950, nos quais a mulher era apresentada do ponto de vista masculino, em personagens ingênuas, frágeis e fúteis.
SHERMAN, Cindy. Autorretrato. 2024. Fotografia manipulada digitalmente. A imagem foi postada na rede social da artista em janeiro de 2024.
Na atualidade, Sherman considera os espaços virtuais, como as redes sociais, uma plataforma para questionar o mundo da arte, propondo que seus posts sejam vistos como arte. Nas redes em que publica as fotografias manipuladas de si mesma, é evidente o uso de recursos digitais que alteram o rosto dela. Com isso, a artista evoca o real, a encenação e os estereótipos femininos. Ao exceder a saturação das cores e promover a deformação do próprio rosto, a artista revela um caminho inverso ao que normalmente é postado nas redes, em que a maioria das imagens segue determinados padrões “instagramáveis”.
A expressão "instagramável" refere-se a ambientes construídos para corresponder a um padrão estético típico da rede social à qual o termo se refere.
Após a leitura do texto e a observação da imagem, reflita sobre o trabalho de Cindy Sherman ao responder às questões a seguir.
1 A que tipo de imagem, entre aquelas que circulam nas redes sociais, você atribui valor artístico?
2 O bservando a imagem, o que é possível dizer sobre as intenções do autorretrato de Cindy Sherman?
2. A artista demonstra um olhar crítico para a autorrepresentação, em diálogo com uma ideia de mostrar-se ao mundo de diferentes formas, nem sempre correspondentes à realidade. Se possível, oriente os estudantes a visitar o perfil da artista (@cindysherman) para que possam ver outras fotografias da artista, que mantém seu perfil constantemente atualizado.
Não escreva no livro.
COLEÇÃO PARTICULAR
REPERTORiO 2
Uýra Sodoma: a árvore que anda
SODOMA, Uýra. Ensaio Lama. 2017. Fotografia, 100 cm x 150 cm. Fotografia de Keila Serruya, que compõe a série Elementar, da artista Uýra Sodoma.
Uýra Sodoma é artista e bióloga, nascida em Mojuí dos Campos, no interior do Pará. Neta de garimpeiros e mulheres indígenas do povo munduruku, Uýra vive desde os cinco anos de idade na periferia de Manaus.
A artista é uma pessoa trans não binária. Ela utiliza os conhecimentos de sua cultura e de sua formação como bióloga, entrelaçando saberes científicos e ancestrais. Usando o corpo como suporte, narra histórias de diferentes naturezas, em performances fotográficas, textos e instalações, falando da floresta e com a floresta.
Uýra é uma entidade híbrida que se define como uma pessoa de dois espíritos. Em seus trabalhos, debate sobre a conservação ambiental e sobre os direitos dos indígenas e das populações LGBTQIA+. Como a própria artista define, Uýra é uma entidade de comunicação e ocupação do imaginário; significa “quem se vê aqui e agora”.
Faz poucos anos que estou vivendo a consciência de que a Uýra existe, mas percebo que, quando tinha 5, ela já me habitava e já acontecia naquele instante uma investigação sensorial dos cheiros, das imagens e dos sons que existiam naquele local e que passam pela Uýra.
RAHE, Nina. Uýra Sodoma: a cobra das águas amazônicas diante da degradação ambiental. Revista SeLecT, São Paulo, v. 10, n. 49, p. 36-45, jan./fev./mar. 2021. p. 38. Disponível em: https://issuu.com/editora3/docs/select_20201222_49_ok_6aff654336c628. Acesso em: 2 out. 2024.
CONeXãO
Jornada de autodescoberta
Assista ao trailer do filme Uýra: a retomada da floresta (2022), dirigido por Juliana Curi. Disponível em: www. youtube.com/watch?v=2WPuDFMjLYY_ (acesso em: 2 out. 2024).
Após a leitura dos textos sobre a artista Uýra Sodoma e a observação da imagem, reflita sobre a diversidade e a floresta e converse com seus colegas sobre a questão a seguir.
• Como Uýra utiliza seu próprio corpo para narrar a beleza da diversidade?
Não escreva no livro. Resposta pessoal. A artista utiliza sua múltipla identidade para se apresentar como árvores, animais e seres míticos que expressam a diversidade e a resiliência da vida na Terra.
KEILA SERRUYA/UÝRA SODOMA
REPERTORiO 3
Randolpho Lamonier e suas profecias
LAMONIER, Randolpho. Toma posse primeira presidenta negra do Brasil: 2027. 2018. Bordado, colagem e costura em tecido, 155 cm x 185 cm. Série Profecias.
Em
descobrimos: Brasil é América Latina. 2018. Bordado, colagem e costura em tecido, 155 cm x 185 cm. Série Profecias.
Randolpho Lamonier nasceu em Contagem, cidade industrial da região metropolitana de Belo Horizonte (MG). Em alguns de seus trabalhos, o artista elabora sua visão crítica sobre as experiências que viveu na infância, crescendo em uma família de operários, no subúrbio mineiro degradado pela atividade industrial.
O trabalho com a linguagem têxtil começou em casa, ao observar a avó costurar. Sua mãe também trabalhava na indústria, costurando bancos de carros, e seu avô foi alfaiate. No entanto, conhecer os bordados das arpilleras foi decisivo para que Lamonier se interessasse pelo trabalho com o tecido como possibilidade expressiva.
Na série Profecias, os estandartes foram produzidos em materiais e objetos diversos e, assim como outros trabalhos do artista, trazem assuntos íntimos e questões da esfera pública, propondo um futuro mais promissor para grupos sociais historicamente oprimidos, como mulheres, negros, indígenas, pobres e a comunidade LGBTQIA+.
Não escreva no livro.
Após observar as imagens desta página, responda à questão a seguir.
• O q ue há em comum entre as arpilleras chilenas e o trabalho de Lamonier, na série Profecias?
A aplicação de tecidos sobrepostos feita com uma espécie de bordado, a presença dos textos bordados ou aplicados e o formato irregular no trabalho, que segue o comportamento do tecido. Ambos compartilham o uso de tecidos e da técnica do bordado como meio de denúncia social e resistência política.
Os trabalhos da série Profecias trazem uma data no futuro em que veríamos uma possibilidade de transformação para a sociedade.
DA RESISTÊNCIA
arpillera: técnica têxtil utilizada por um grupo de mulheres que, nos anos 1970, durante a ditadura civil-militar no Chile, passou a bordar em tecidos rústicos, de sacos de mantimentos, imagens que podiam disseminar a aflição e as variadas formas de violência a que eram submetidas cotidianamente.
LIBERTAD a los presos políticos [Liberdade para os presos políticos]. [198-]. Tecido bordado.
LAMONIER, Randolpho.
2050
REPRODUÇÃO/ARPILLERAS
Arte e diversidade
A palavra diversidade, no contexto da arte, pode abordar não só a pluralidade de temas mas também a variedade das vozes. Nesse sentido, você conhecerá, a seguir, algumas iniciativas artísticas que esbarram em questões como representatividade, feminismo e neurodiversidade.
1. Liberdade para as sensibilidades.
• Pesquise a programação do Museu de Arte de São Paulo (Masp) ao longo de 2024, dedicada ao ativismo e à representatividade LGBTQIA+. Disponível em: www.masp.org.br/exposicoes/programacaoanual-2024 (acesso em: 3 out. 2024).
2. A presença das mulheres na arte.
• O coletivo feminista Guerrilla Girls (em português, Garotas guerrilheiras) define-se como um grupo de ativistas feministas anônimas. Sempre que aparecem em público, utilizam máscaras de gorilas para não serem identificadas. Por isso, o grupo é fluido, ou seja, várias mulheres podem estar à frente em diferentes momentos. O grupo tem o mesmo objetivo desde a sua formação, em 1985: chamar a atenção para os preconceitos de gênero na arte e na cultura com o objetivo de denunciá-los. Reúna-se com alguns colegas e discuta as impressões individuais e coletivas acerca dos propósitos do grupo, destacando o cartaz “As vantagens de ser uma artista mulher”, carregado de críticas e ironias. Disponível em: https://masp. org.br/acervo/obra/as-vantagens-de-ser-uma-artista-mulher-portugues (acesso em: 16 set. 2024).
3. A força criativa de artistas neurodivergentes.
O Museu Bispo do Rosário – Arte Contemporânea (mBrac) está localizado no centro de saúde mental conhecido como “Colônia” Juliano Moreira, situado na zona oeste do Rio de Janeiro. O museu é responsável pela preservação e difusão da obra de Arthur Bispo do Rosário (1909-1989), apresentando mostras e exposições que se relacionam com a obra e o contexto vivido pelo artista. No site do museu, é possível realizar tours virtuais para conhecer exposições que já aconteceram. Disponível em: https:// museubispodorosario.com/exposicoes (acesso em: 3 out. 2024).
Grupo Guerrilla Girls em Nova York (Estados Unidos). Fotografia de 1985.
TEORiAS E MODOS DE FAZER
O bordado na criação artística
Na arte contemporânea, diversas formas de costura e bordado aparecem como modos de produção potentes para o processo criativo.
No Brasil, a presença das atividades têxteis no campo da arte contemporânea está ligada à primeira exposição dos estandartes de Arthur Bispo do Rosário (1911-1989), no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio), na exposição “Margem da Vida”, em 1982. Inspirados na obra desse artista marginalizado pela sociedade, negro, pobre, forçado a viver grande parte de sua vida recluso em um hospital psiquiátrico, instituição manicomial, jovens artistas da Geração 80 adotaram práticas que deixaram de ser vistas como uma atividade artesanal, como a do bordado, ligada ao cotidiano doméstico, para adentrar o espaço do museu.
Há muitas formas de bordar, usando linhas, lãs, barbantes, agulhas, alfinetes, pedaços de
BISPO DO ROSÁRIO, Arthur. Manto da apresentação. [1960-]. Costura, bordado e escrita, 118,5 cm x 141,2 cm x 7 cm. Arthur Bispo do Rosário veste sua obra, o Manto da apresentação. aviamento: conjunto de materiais utilizados para costura ou bordado.
tecidos ou outros aviamentos. A linha de bordado é como uma linha de desenho. Com ela, é possível explorar diversos pontos, simples e complexos, que criam volumes ou reforçam alguma direção da linha, usar cores variadas e texturas diferentes etc.
• Dicas gerais para bordar: escolha uma linha mais grossa e uma agulha grande. Não use uma linha muito comprida, para evitar nós ao longo do trabalho. Dê um nó discreto antes de começar o bordado e sempre cuide do avesso para que ele também fique interessante. Um instrumento que pode ser útil é o bastidor de madeira, que mantém o tecido bem esticado na região que se pretende bordar, facilitando o trabalho.
• Bordando livremente : com a linha na agulha, você pode fazer desenhos livres ou seguir algum desenho traçado previamente no tecido com lápis. Para isso, use a técnica de pesponto (dê pequenos pontos, sempre mantendo o espaço entre eles menor ou igual ao próprio ponto) ou a técnica do ponto atrás (em que a linha passa por baixo do tecido, saindo mais à frente e retornando para formar um ponto visível pela frente do tecido, até encontrar o ponto inicial).
Não há certo ou errado em um bordado, mas existem sites e tutoriais que ensinam a fazer determinados pontos, passo a passo. No entanto, se julgar necessário, procure uma receita de bordado para realizar seu trabalho. Sempre é bom aprender mais, pois assim você terá outras ferramentas para criar.
MOREIRA SALLES
AçÃO Criar e se transformar em personagens
As diversas facetas criadas por Cindy Sherman, tanto na fotografia quanto, mais recentemente, com o uso da tecnologia digital, podem inspirar uma investigação para a criação de personagens. Assim, a proposta desta atividade é criar e se transformar por meio do registro da imagem fotográfica.
1. A nálise do trabalho da artista
• Em uma seleção prévia feita pelo professor, observe e interprete, em conjunto com seus colegas, algumas fotografias com personagens produzidas por Cindy Sherman. Esse é um momento importante, pois você pode compreender e se aprofundar nas técnicas utilizadas pela artista e, principalmente, na forma como ela apresenta a personificação de estereótipos femininos em circulação em diferentes mídias.
2. Organização do trabalho
• Reúna-se com mais dois colegas, formando um trio. Cada integrante terá uma função: o modelo, o responsável pela maquiagem e pelo figurino e o fotógrafo.
3. E laboração de roteiro de trabalho
• Para melhor dimensionar os materiais e o espaço necessários para fazer o registro, elabore um roteiro de trabalho por meio de um storyboard, que deve conter: o desenho e a legenda do passo a passo; os materiais necessários para a criação das personagens; o local que será usado para o registro; o tipo de enquadramento da fotografia (médio, geral, detalhe); o tipo de iluminação mais adequado; entre outros.
4. C riação das personagens
• Antes de decidir as opções estéticas do registro escolhido pelo trio, é possível fazer testes, norteados pelas perguntas: quais reflexões quero gerar para o grupo? Que outras personagens e referências posso usar? Que elementos serão necessários para gerar uma transformação no colega que posará para a fotografia?
5. C osturando e bordando para o figurino e o cenário
• Que elementos podem ser elaborados para o figurino e para o cenário, usando as técnicas de costura, bordado e aplicações? Verifique a possibilidade de fazer um pano de fundo, um manto, um turbante ou uma simples aplicação com letras em uma camiseta velha. Busque retalhos de tecidos, lençóis, toalhas ou mesmo roupas em brechós que possam ser desmanchadas ou modificadas com aplicações.
6. P roduzindo a maquiagem para complementar
• Investigue a maquiagem, levando em consideração as mensagens que ela pode transmitir. Que materiais podem ser usados na maquiagem para a construção da personagem?
7. R egistros fotográficos
• A maneira mais comum de registro na atualidade é por meio da câmera de celular. Porém, é possível explorar as funcionalidades do aparelho, programando brilho, contraste e saturação das cores, dependendo daquilo que se deseja realizar.
• Embora você e seus colegas tenham se dividido por funções, nada os impede de revezar e produzir diferentes fotografias, tratando de um mesmo tema, por exemplo.
• Escolha até três registros para compartilhar com o professor e, posteriormente, submetê-los à análise da turma.
8. Avaliação coletiva
• Após a elaboração das fotografias e a exibição para a turma, você e os colegas participarão de uma conversa sobre a proposta. O professor será o mediador nesse momento de análise coletiva. Considerem questões como:
em qual medida os grupos se apropriaram do trabalho de Cindy Sherman? Os grupos utilizaram as técnicas têxteis? Como foi a experiência de trabalho em trio? Há semelhanças e diferenças entre os trabalhos dos grupos? Como você e os colegas percebem essas semelhanças e diferenças?
• Escute aten tamente as respostas dos colegas, pois esse momento de diálogo é importante para que você reflita sobre suas respostas e possa reconsiderar ou estar mais convicto daquilo que acredita. É possível que ocorram falas e opiniões muito diferentes das suas, por isso exercite a capacidade de acolher as divergências de forma respeitosa. Afinal, conviver harmonicamente com opiniões diversas faz parte de um aprendizado que traz benefícios a todas as relações.
Procure incentivar os estudantes a localizar as etapas do processo criativo,
as linguagens utilizadas e os conhecimentos que foram construídos e/ou ampliados.
Cindy Sherman em Nova York (Estados Unidos). Fotografia de 2022.
evidenciando
CONTEXTO TEATRO
Teatro fora da caixa
Na língua portuguesa, a palavra teatro pode se referir tanto a uma linguagem artística como a um espaço físico: o edifício teatral. No entanto, parte importante da produção teatral brasileira é imaginada, planejada e executada fora da caixa (ou seja, em outros locais que não o edifício teatral).
O teatro de rua, por exemplo, é realizado em espaços públicos, como praças, travessas, parques e ao redor de monumentos. Nessa vertente teatral, a palavra rua é entendida como todo espaço público aberto capaz de servir de suporte para a realização de uma peça. O teatro de rua, assim, ocupa lugares não destinados à prática teatral, transformando-os em espaços de trocas simbólicas.
Essa é uma modalidade de arte pública, acessível a todas as pessoas. Os passantes são convidados a dar uma pausa na correria do dia a dia, e a rotina das cidades é alterada. Ambientes de passagem tornam-se lugares de vivência, e os espaços públicos são habitados por encontros, narrativas e reflexões comuns.
Há também o teatro em espaço alternativo, que elege os mais diferentes locais para a realização de espetáculos. As obras são apresentadas em igrejas, hospitais, prisões, vagões de trem, ônibus em movimento, entre outras possibilidades. Cada um desses espaços carrega significados sociais e simbólicos, e a linguagem teatral vem para se somar a esses significados, dialogando com os aspectos físicos e imaginários presentes no local. Subvertem-se os comportamentos esperados para determinado ambiente: a vida, de repente, poderia ser uma coisa diferente.
Atualmente, há inúmeros grupos que trabalham com teatro de rua e teatro em espaços alternativos no Brasil. Suas pesquisas teatrais buscam promover uma ação cultural que alcance a população de maneira ampla, mobilizando a sociedade para novas formas de relação com o espaço público e com a própria linguagem teatral.
Cena do espetáculo Passa na praça que o Tá Na Rua te abraça, do grupo Tá Na Rua, primeiro grupo de teatro do Rio de Janeiro (RJ), que, sob a direção de Amir Haddad (1937-), pratica a arte em espaços públicos desde 1980. Fotografia de 2024.
REPERTORiO 1
Coletivo Estopô Balaio
Cena do espetáculo Reset Brasil, do Coletivo Estopô Balaio, em São Paulo (SP). Fotografia de 2023. A peça faz parte da Trilogia da Amnésia, que, além do espetáculo mencionado, inclui os espetáculos Reset Nordeste e Reset América Latina
Cena do espetáculo Reset Brasil, do Coletivo Estopô Balaio, em São Paulo (SP). Fotografia de 2023. Atores e atrizes encenam em um vagão de trem.
Desde 2011, o Coletivo Estopô Balaio realiza um teatro que ressignifica as relações com a cidade. O grupo tem como base o Jardim Romano, bairro localizado na zona leste da cidade de São Paulo, e suas dramaturgias são permeadas pelas vivências e histórias desse território e de sua comunidade. Os espetáculos do coletivo percorrem vagões de trem, estações, ruas e vielas.
Em Reset Brasil, que estreou em 2023, o Jardim Romano é cenário e tema de pesquisa. No período colonial, a região – então chamada Ururay – foi palco de uma importante resistência indígena. Além disso, São Miguel Paulista – bairro próximo que fazia parte de Ururay – é a região de São Paulo com a maior concentração de nordestinos fora do Nordeste. Da mesma forma, a maioria dos artistas do Estopô Balaio é nordestina e compartilha com quem vive ali a experiência de ser migrante em uma metrópole.
O espetáculo é itinerante e começa em um trem que leva os espectadores até a estação São Miguel Paulista. Ao desembarcarem, eles presenciam uma cena de levante indígena, passam pela Capela dos Índios (edifício histórico de 1622) e terminam na Praça do Forró. A dramaturgia é de Juão Nyn (1989-), integrante do coletivo e indígena potiguara, e a direção é de Ana Carolina Marinho. O elenco é composto de oito adultos e doze crianças.
Considerando o texto e as imagens desta página, converse com seus colegas sobre as questões a seguir.
1 Você já assistiu a algum espetáculo itinerante? Se sim, qual?
Respostas pessoais. Aproveite para retomar, com a turma, a ideia do teatro itinerante.
2 Se você pudesse eleger uma praça, uma rua ou um espaço alternativo da sua cidade ou região para um espetáculo teatral, qual seria sua escolha? Por quê?
Respostas pessoais. Incentive os estudantes a imaginar espetáculos teatrais ocupando os espaços da cidade, bem como as possibilidades desse acontecimento. É interessante que eles percebam como a linguagem teatral pode ocupar os mais diversos territórios.
Não escreva no livro.
CASSANDRA MELLO
CASSANDRA MELLO
REPERTORiO
Grupo Imbuaça
O Grupo Imbuaça, fundado em 1977, teve início com a realização de oficinas de linguagens artísticas na cidade de Aracaju, em Sergipe, e é considerado um dos grupos de teatro de rua mais antigos do Brasil. Reconhecido como Patrimônio Cultural de Aracaju, busca desenvolver suas pesquisas com a comunidade do bairro Santo Antônio, na zona norte da cidade, onde está sediado.
Nesse local, acontecem oficinas de teatro, apresentações, ensaios e ações sociais ligadas ao território. Muitos dos atores e das atrizes que hoje atuam profissionalmente com o Imbuaça foram formados nas oficinas oferecidas pelo próprio coletivo. As funções de dramaturgia e direção costumam ser revezadas entre os integrantes.
de Mar de fitas nau de ilusão, espetáculo de teatro de rua encenado pelo Grupo Imbuaça, que homenageia mestres e mestras da cultura popular. As apresentações ocorreram nas cidades de Santos (SP) e São Paulo (SP). Fotografia de 2022.
O nome do coletivo é uma homenagem ao embolador Mané Imbuaça. Em seus espetáculos, o grupo trabalha elementos da cultura popular, como a literatura de cordel, as danças dos folguedos e a música nordestina. Os mestres e as mestras da cultura popular sergipana são uma referência para as criações e são homenageados no espetáculo Mar de fitas nau de ilusão, que estreou em 2017 e continua sendo apresentado pelo Imbuaça.
O grupo já realizou apresentações por todos os estados brasileiros e em países como Equador, México, Cuba e Portugal. Sua atuação é marcante em festivais, vistos pelo Imbuaça como espaços importantes para trocas de experiências e debates a respeito de uma arte pública.
embolador: pessoa que compõe e/ou interpreta embolada, gênero musical de origem nordestina que faz parte da tradição oral. A embolada tem métrica, ritmo e rimas marcadas e que a caracterizam, sendo muito parecida, e às vezes confundida, com o repente. No Brasil, a dupla Caju e Castanha teve influência fundamental na inserção da embolada na mídia, fazendo com que esse ritmo ganhasse projeção nacional.
1. Respostas pessoais. Incentive os estudantes a compartilhar produções culturais que fazem parte de seu repertório. É interessante que apresentem exemplos de outras linguagens artísticas, como canções, séries, filmes, entre outros. Também é possível tecer relações com outras obras abordadas neste livro.
Após a leitura do texto, reflita sobre as questões a seguir.
1 Você conhece outras obras de arte contemporâneas que sejam influenciadas pela cultura popular brasileira? Se sim, quais?
2 Q ual é a importância de os grupos de teatro brasileiros incorporarem essas influências em seu trabalho?
Espera-se que os estudantes respondam que incorporar influências da cultura popular enriquece e diversifica a produção cultural, reflete a diversidade da sociedade e promove a inovação artística. Essa abordagem abre espaço para o diálogo sobre questões sociais e históricas, fortalece a identidade local e melhora a conexão com o público, resultando em um panorama cultural mais dinâmico e inclusivo.
Cena
Não escreva no livro.
IMBUAÇA PRODUÇÕES ARTÍSTICAS
REPERTORiO 3
Cambada de Teatro em Ação Direta Levanta FavelA
A Cambada de Teatro em Ação Direta Levanta FavelA foi criada em Porto Alegre (RS), em 2008. O grupo pesquisa uma linguagem teatral popular e engajada politicamente, realizando trabalhos que transitam entre o teatro de rua, o teatro de vivência e as intervenções cênicas.
O coletivo mantém, no espaço de sua sede e em caráter permanente, a Oficina de Teatro em Ação Direta, iniciativa gratuita e de livre acesso à população. As oficinas fazem nascer os espetáculos teatrais do grupo, agregando, a cada turma, novos atores, atrizes e agitadores culturais.
O grupo já realizou parcerias com diversos movimentos sociais e criou intervenções cênicas ligadas às lutas desses movimentos. Seu teatro já debateu temas como a crise climática, a insegurança alimentar, as violências contra a mulher, o racismo estrutural no Brasil, a resistência das populações indígenas guarani em defesa de seu território e de seu modo de vida, entre outras questões urgentes da realidade brasileira.
Cena do espetáculo Maria, suas filhas e seus filhos, do coletivo Cambada de Teatro em Ação Direta Levanta FavelA, em Porto Alegre (RS). Fotografia de 2023.
Maria, suas filhas e seus filhos , que estreou em 2022, narra a história de uma mãe solo que vive o processo de êxodo rural. Sem conseguir pagar as contas do armazém, Maria deixa o campo com seus filhos e arrisca-se como lavadeira na cidade grande. A obra foi dirigida coletivamente pelos integrantes do Levanta FavelA, que também compuseram músicas originais para o espetáculo. Junto às apresentações, realizadas em diversos bairros de Porto Alegre, foram oferecidas oficinas de teatro de rua.
1. Respostas pessoais. Muitos são os temas que podem ser mencionados, tais como: crise habitacional, violência policial, segurança pública, desigualdade econômica e social, crise ambiental e mudanças climáticas etc. É importante que os estudantes pensem na importância do tema e na maneira como sua abordagem pode impactar os espectadores.
Após a leitura do texto, converse com os colegas sobre as questões a seguir.
1 Qual tema urgente da realidade brasileira você gostaria de debater por meio do teatro? Por quê?
2 Como você imagina essa encenação? Não escreva no livro.
Resposta pessoal. Provoque os estudantes a imaginar possíveis encenações com base em assuntos que julguem importantes. Se possível, conecte o debate temático com o debate formal do teatro em espaço alternativo, que permeia este capítulo. Por exemplo: se o tema for crise ambiental, caberia criar uma encenação em um parque ou espaço de preservação ambiental e contracenar com a fauna e a flora do local? Ou gostariam de se apresentar em uma fábrica desativada, em uma praça que costuma ficar com muito lixo ou às margens de um rio poluído? Procure reforçar como as escolhas de encenação são determinantes para a produção de sentidos realizada por meio do espetáculo teatral.
RAMIRO SANCHEZ
PESQUiSA
Teatro de rua e teatro em espaço alternativo pelo Brasil
Neste capítulo, você estudou três grupos que realizam suas peças em espaços públicos. Diversos outros coletivos teatrais pelo Brasil compartilham essa prática, que mobiliza pesquisas de linguagem e provoca outras formas de se relacionar com a cidade. Conheça mais alguns desses grupos.
1. Teatro Imaginário Maracangalha.
Desde 2006, o grupo Maracangalha, de Campo Grande (MS), desenvolve uma arte pública. Suas principais marcas são os cortejos e as intervenções urbanas.
• A cesse a página do grupo, disponível em: https://imaginariomaracangalha.blogspot.com/?m=1 (acesso em: 3 out. 2024).
• Busque pelo perfil do grupo nas redes sociais e saiba mais sobre os trabalhos realizados.
2. Teatro da Vertigem.
Desde 1992, o grupo Teatro da Vertigem, de São Paulo, dedica-se a pesquisar a linguagem teatral em diversos espaços alternativos, realizando espetáculos em locais como presídios, hospitais desativados, igrejas e até em barcos navegando pelo Rio Tietê, entre outros.
• Navegue pelo site do grupo, disponível em: www.teatroda vertigem.com.br (acesso em: 3 out. 2024).
• Procure pelas páginas oficiais do grupo nas redes sociais.
3. Clowns de Shakespeare.
Fundado em 1993, em Natal (RN), o grupo Clowns de Shakespeare busca oferecer um teatro de expressão popular, nordestina, brasileira e latino-americana.
• Navegue pela página do grupo, disponível em: https:// clowns.com.br (acesso em: 3 out. 2024).
Cena do espetáculo Paraíso perdido, encenado pelo Teatro da Vertigem no Festival Internacional de Teatro Palco e Rua de Belo Horizonte (MG). Fotografia de 2004.
• A ssista aos vídeos disponíveis em: www.youtube.com/@ClownsdeShakespeare/videos (acesso em: 3 out. 2024).
• Busque pelo perfil oficial do Clowns de Shakespeare nas redes sociais.
4. ERRO Grupo.
O coletivo ERRO surgiu em 2001, na cidade de Florianópolis (SC), e, desde 2018, atua também em Barcelona, na Espanha.
• L eia sobre o trabalho do grupo no site : www.errogrupo.com.br/v4/pt/2001/03/13/sobre-o-erro/ (acesso em: 3 out. 2024).
• A ssista aos vídeos disponíveis em: www.youtube.com/@ERROGrupo (acesso em: 3 out. 2024).
• Busque por “errogrupo” nas redes sociais.
5. O Imaginário.
Criado em 2005 em Porto Velho (RO), o grupo O Imaginário atua para a formação de público na região.
• Conheça a página do festival Amazônia Encena na Rua, iniciativa que o grupo O Imaginário ajudou a criar. Disponível em: https://amazoniaencena.com.br (acesso em: 3 out. 2024).
• Acesse o livro eletrônico Memória: relatos do teatro de Rondônia , organizado por Valdete Sousa. Disponível em: https://edufro.unir.br/uploads/08899242/Edital%202019/MEMORIA.pdf (acesso em: 3 out. 2024).
GUTO MUNIZ
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Teatro de rua e teatro em espaço alternativo
Uma das características do teatro contemporâneo é a pesquisa de linguagem, ou seja, a busca pela melhor forma de colocar em cena os anseios do coletivo. Assim, não há uma fórmula pronta para criar espetáculos fora do edifício teatral. Por outro lado, o teatro de rua é uma das formas teatrais mais antigas, com saberes e tradições acumulados que os artistas podem acessar para criar. A seguir, serão apresentados alguns modos de fazer o teatro de rua (apresentado em espaços públicos) e o teatro em espaço alternativo (que transforma os mais diversos lugares em espaço cênico).
Teatro de rua
Espetáculo que acontece em espaços públicos da cidade, ocupando praças, parques e calçadas. O teatro de rua busca capturar a atenção dos transeuntes – que estão de passagem por ambientes ruidosos. Para isso, atores e atrizes utilizam gestos amplos e expressivos, além de uma projeção vocal marcante e potente.
Esse tipo de espetáculo também envolve a constante abertura para a improvisação. Como os acontecimentos no espaço público são imprevisíveis, a peça de rua está sujeita a uma série de intervenções não planejadas – pela ação de cachorros, crianças, passantes embriagados, chuvas repentinas, entre outras. Portanto, os intérpretes devem estar preparados para lidar com essas situações e integrar os imprevistos à cena de maneira criativa.
Teatro em espaço alternativo
do espetáculo João Candido do Brasil
A revolta da chibata, encenado pelo Teatro Popular União e Olho Vivo na Praça do Patriarca, em São Paulo (SP). Fotografia de 2001.
É criado, geralmente, pela relação dos artistas com um lugar específico, que carrega um sentido social e uma materialidade. No capítulo, foram apresentados alguns exemplos, como espetáculos em igrejas, trens e bairros históricos. Diferentemente do espetáculo apresentado em um edifício teatral, que se propõe a oferecer um palco “neutro” a ser preenchido pelos artistas, um espetáculo em espaço alternativo interage com a singularidade do local em que é realizado. Para criar essa conexão, é comum que os artistas realizem uma fase de experimentação na relação com o lugar escolhido. Isso envolve pesquisas sobre o território, improvisações que lidam com o que já existe naquele espaço físico e trocas com a comunidade local. Muitas vezes, é nesse jogo entre artistas e espaço que surge a dramaturgia do espetáculo.
Cena
–
GRACIELA RODRIGUEZ
AçÃO Criando
uma cena
Agora, a proposta é ocupar um espaço da escola ou do bairro com teatro! Para isso, siga as próximas orientações.
1. Definição do local e preparação
• Converse com os colegas e, juntos, elejam um local para a ação. Para isso, verifique se é possível o deslocamento coletivo para um espaço público próximo (uma praça, um parque, as calçadas de uma rua etc.) ou se é preferível trabalhar em espaços alternativos na própria escola. Em seguida, reúna-se com os colegas em um grupo de, aproximadamente, oito integrantes.
2. Investigação coletiva do espaço
• Com o grupo, realize uma caminhada pelo espaço escolhido pela turma (o próprio espaço da escola ou o espaço público do bairro).
• Esse é um jogo de coro, ou seja, um jogo de atuação coletiva. A caminhada vai acontecer da seguinte maneira: um jogador torna-se corifeu e, como em um jogo de “siga o mestre”, mostra para o grupo os caminhos a serem percorridos.
• O corifeu, ou mestre, observa o espaço e seleciona um detalhe que considera interessante. Em seguida, conduz o grupo até esse ponto de interesse e mostra para todos o que escolheu.
• Na sequência, um segundo jogador torna-se corifeu e conduz o grupo até um novo ponto para mostrar um detalhe interessante do espaço.
• A caminhada deve ser silenciosa; portanto, evite fazer comentários.
• O jogo se repete até todos terem experimentado ser corifeus.
• Ao final, converse com os colegas sobre a investigação: o que foi possível descobrir acerca do espaço? Quais detalhes novos foram descobertos, mesmo se tratando de um lugar conhecido? O que poderia se transformar em espaço ou objeto cênico?
3. Exploração criativa do espaço
• Com os integrantes do grupo, componha imagens congeladas, como fotografias. Elas irão relacionar os corpos em cena com elementos concretos do espaço.
• Seguido pelo grupo, um primeiro jogador caminha até o local onde deseja compor a fotografia cênica. A pessoa se coloca em relação com o espaço e “congela” na posição.
• Uma segunda pessoa entra para compor a imagem, relacionando-se com a proposta da primeira, que permanece em cena.
• O jogo segue com uma pessoa por vez entrando em cena e congelando.
• Quando um dos jogadores que está fora da composição sentir que a imagem já está completa (ou seja, que já produz sentidos e não precisa de mais integrantes), bate uma palma para finalizar a fotografia.
• O próximo jogador conduz o grupo para um novo lugar do espaço e recomeça com uma nova fotografia.
• Após jogar algumas vezes, converse com o grupo sobre os temas e as explorações formais que surgiram.
4. Definição do espaço cênico
• Partindo dos jogos anteriores, cada grupo deverá eleger dois lugares em que a cena irá acontecer. Os espaços precisam ser razoavelmente próximos um do outro, pois, durante a cena, atores e espectadores vão se deslocar entre eles.
5. Definição do tema
• Reflita sobre as fotografias que o grupo criou e eleja um tema central para a cena. Pode ser um assunto concreto que se relacione com os espaços escolhidos. Também pode ser um tema abstrato, que o espaço físico ajude a metaforizar (por exemplo: uma cena sobre separação amorosa realizada em uma escada, de modo que, ao longo da cena, as pessoas fiquem cada vez mais distantes uma da outra).
6. Improvisações direcionadas
• Após o grupo fazer essas escolhas, improvise algumas vezes a cena nos locais combinados, com base no tema escolhido.
• Experimente maneiras de se deslocar entre os dois espaços, lembrando que os espectadores serão conduzidos pelo grupo.
7. Definição da cena e ensaios
• Considerando as improvisações, defina com o grupo o roteiro final, agregando as principais ideias e os experimentos realizados.
• Ensaie algumas vezes, percorrendo todo o roteiro.
• Lembre-se de prestar especial atenção à relação entre os atores e o espaço cênico. Experimente formas de usar as características de cada lugar a seu favor.
8. Apresentações
• Apresente a cena e assista às apresentações dos demais grupos.
• Lembre-se de que o grupo tem a responsabilidade de conduzir os espectadores pelo espaço. É possível fazer isso como parte integrante da cena.
• Quando for espectador, colabore com os colegas que estão apresentando, posicionando-se para assistir à cena de modo a favorecer a apresentação.
• É possível que pessoas que não são da turma interfiram nas cenas, ao passar pelos lugares em que vocês estão trabalhando. Nesse caso, ajudem-se para manter as cenas acontecendo e, se possível, convidem os passantes a se tornarem espectadores.
9. Avaliação coletiva
• Converse com seus colegas sobre as cenas apresentadas, expresse como se sentiu ao apresentar uma cena em um espaço alternativo e, juntos, pensem nos desafios e nas potências de se apresentar em espaços que possuem determinados usos e sentidos.
ARTES iNTEGRADAS
CONTEXTO
Arte e cultura digital
Como dimensionar a experiência do sujeito diante do advento das tecnologias digitais? É difícil afirmar que essa relação ocorra em um espaço-tempo linear e sequencial, uma vez que as tecnologias digitais expandiram a experiência para além das fronteiras físicas e temporais tradicionais, integrando também o espaço virtual e proporcionando novos modos de estar no mundo.
A partir da década de 1990, com a interligação dos computadores pessoais à internet, houve uma revolução também na maneira que se propõe e se produz arte. É na hibridização das formas artísticas, em meio ao universo ciber, que se observa a atualização dos artistas, que, em muitos casos, atuam em percursos coletivos de colaboração entre criador e espectador.
Nos repertórios a seguir, serão apresentadas as particularidades de trabalhos como o de Gabriel Massan (1996-) e seu jogo decolonial, concebido para explorar a conectividade como ferramenta no debate de temas urgentes em um mundo de informações disseminadas em alta velocidade.
Já Roberta Carvalho (1980-) vem para lembrar que, independentemente do aparato tecnológico, a essência humana está fundamentada na relação com os elementos da natureza. A artista reforça que não existe uma separação de mundos, mas sim um intercâmbio de tecnologias.
Por fim, Silvana Mendes (1991-) usa a fotocolagem de maneira afetiva, trazendo para o debate as narrativas que acompanham pessoas negras e os contextos nos quais essas histórias podem ser contadas e divulgadas.
De acordo com Pierre Lévy (1956-), pesquisador da Ciência da Informação e da Comunicação, a internet tornou-se uma plataforma interativa, na qual quem consome também produz. Assim, se no passado outros dispositivos moldaram a produção artística, é inevitável, em um contexto aberto e em constante fluxo, reconhecer o universo digital como parte integrante do saber e do fazer artístico.
PAIK, Nam June. Mirage Stage. 1986. Trinta e três monitores de TV e quarenta carcaças de TV de madeira que exibem vídeos de três canais televisivos em projeção colorida e silenciosa, 431,8 cm x 609,6 cm x 243,8 cm. Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía, Madri (Espanha).
2. A proposta de um game pode debater tais temas ao criar narrativas inclusivas, desenvolver ambientes culturais autênticos e possibilitar que os jogadores façam escolhas que reflitam os desafios reais enfrentados por essas comunidades. Colaborar com membros dessas comunidades para garantir representação e usar o jogo como ferramenta educacional também são estratégias eficazes. O game desenvolvido por Gabriel Massan é um exemplo disso, pois desde sua concepção gráfica, passando pela escolha dos colaboradores e pela proposta estética, Terceiro mundo demonstra que, no universo dos games, para além da interação, há espaço para debater temas coletivos em suas personagens e em sua ambientação.
REPERTORiO 1
Gabriel Massan
Com um enfoque multidisciplinar, o carioca Gabriel Massan combina em seu trabalho a contação de histórias e a estética do universo virtual, por meio de esculturas digitais que dialogam com temas como as teorias queer e a experiência afro-indígena brasileira.
Em 2024, Gabriel inaugurou, no espaço Pina Contemporânea, da Pinacoteca de São Paulo, a exposição "Terceiro mundo, a dimensão descoberta", que oferece uma experiência imersiva por meio de um jogo de videogame ambientado em um universo fantástico. Nele, o jogador explora o mundo do game enquanto reflete sobre a ideia de “exploração” advinda da perspectiva colonial, convocando um posicionamento crítico.
A proposta, que compreende quatro estações de jogos, propõe que cada pessoa comece a jornada pelo jogo Terceiro mundo ou assista a outros jogadores em tempo real. A estrutura do espaço conta com cinco telas, nas quais os jogos são transmitidos ao vivo.
Os níveis dos jogos, assim como as vozes das personagens, foram elaborados em parceria com os artistas LYZZA (1999-), Castiel Vitorino Brasileiro (1996-), Novíssimo Edgar (1993-) e Ventura Profana (1993-).
É possível afirmar que o projeto tem um viés experimental, ao transitar por temas contemporâneos e, ao mesmo tempo, explorar a descentralização do uso das tecnologias.
1. Respostas pessoais. Na contemporaneidade, os videogames podem ser considerados mais uma maneira de intercambiar diferentes linguagens da arte, uma vez que combinam elementos criativos, como design gráfico, música e narrativa, oferecendo uma experiência interativa única. Eles exploram temas complexos e oferecem experiências emocionantes e imersivas, comparáveis a outras formas artísticas. O design visual e sonoro dos jogos é elaborado com atenção aos detalhes, permitindo uma expressão artística rica e multifacetada.
Imagem do game Terceiro mundo, de Gabriel Massan em colaboração com a Serpentine Gallery de Londres (Inglaterra), 2024.
Com base no texto sobre o trabalho de Gabriel Massan, converse com os colegas sobre as questões a seguir.
1 Você considera um jogo de videogame uma manifestação de arte? Por quê?
2 De que maneira a proposta de um game pode debater temas voltados às comunidades LGBTQIA+, afro-brasileiras e indígenas?
Não escreva no livro.
REPERTORiO 2
Roberta Carvalho e o projeto Symbiosis
Roberta Carvalho, natural de Belém (PA), é formada em Artes Visuais, mas pode ser considerada uma multiartista. Seus trabalhos envolvem linguagens visuais e tecnológicas, como video mapping, intervenção urbana, instalação e projetos interativos.
Suas obras exploram a tecnologia em consonância com o olhar para o território amazônico. Nesse contexto, ela criou o Festival Amazônia Mapping, que se tornou uma referência em arte e tecnologia.
O projeto Symbiosis, iniciado por Roberta em 2007, envolve ações de projeção de fotografia e vídeo em árvores e vegetações em diferentes espaços das cidades, combinando linguagens como instalação, intervenção urbana, vídeo digital e fotografia.
Vale destacar que, no contexto da ecologia, a palavra simbiose refere-se à relação entre dois ou mais organismos vivos de espécies diferentes, na qual ambos se beneficiam dessa interação. No trabalho de Roberta, a arte é “hospedada” pela árvore, criando uma fusão simbólica que dá origem a “um novo ser”, em que a natureza e a tecnologia se complementam e coexistem.
Nessa proposta sensível, projetada em lugares como as beiras de rios em comunidades ribeirinhas amazônicas, no estado do Pará, rostos de pessoas são expostos em meio à natureza e suas imprevisibilidades, como o balançar das folhas ao vento. Assim, a obra cria uma conexão orgânica entre o ser humano e o ambiente natural, ampliando a experiência estética e reforçando o vínculo entre arte, território e ecossistema.
1. A ideia é estabelecer uma relação de diálogo entre esses dois campos, como a árvore acolhendo uma imagem que integra a identidade pessoal do ser humano com a da natureza. Além disso, essa fusão cria experiências estéticas inovadoras, utilizando a tecnologia para revelar e explorar a beleza e a complexidade da natureza de maneiras que não seriam possíveis por meios tradicionais.
CARVALHO, Roberta. Symbiosis: "arte e natureza na Amazônia no 1". 2011. Projeção de imagem na floresta, em Belém (PA). Rosto projetado em árvores integrante do projeto Symbiosis, realizado desde meados de 2007, do qual fazem parte outras ações de projeção digital em copas de árvores e vegetações.
Não escreva no livro.
Pensando na interação entre arte e tecnologia proposta pela multiartista, converse com seus colegas sobre as questões a seguir.
1 Qual é a importância de associar tecnologia a aspectos da natureza?
2 Quais rostos você utilizaria em um projeto similar ao de Roberta Carvalho? Por quê?
Respostas pessoais. É possível que os estudantes partam de um olhar pessoal, como memórias de pessoas importantes na vida de cada um deles, ou coletivo, apontando personalidades que se destacaram ao longo da história.
REPERTORiO 3
Silvana Mendes
1. Ao pensar as relações do Brasil colonial até a contemporaneidade, há muitas situações nas quais homens e mulheres negros tiveram os seus registros identitários sem identificação, como em imagens fotográficas. Desse modo, o trabalho da artista dialoga com a história do Brasil, ao abordar questões raciais que são fruto do legado da escravização e da marginalização de pessoas negras no país. Suas obras trazem à tona narrativas silenciadas e desconstroem estereótipos negativos sobre corpos negros, destacando a importância de resgatar histórias pessoais, sociais e familiares que foram ignoradas ou apagadas.
2. Respostas pessoais. Incentive os estudantes a refletir sobre suas identidades, inclusive a identidade racial, se se reconhecem enquanto pessoas negras, indígenas, brancas, pardas, orientais etc. Procure trazer elementos culturais, como os costumes, a língua – muitos povos indígenas mantêm suas línguas originárias, tendo o português como segunda língua, por exemplo –, a cultura orientada por regiões, entre outras possibilidades, para que os estudantes mergulhem em reflexões a respeito de suas origens. Aborde o assunto com delicadeza e incentive-os a expressarem suas reflexões para a turma, caso queiram, ou a refletir e fazer anotações no caderno sobre o que pensaram.
MENDES, Silvana. Te imagino, Carolina. 2021. Colagem digital.
Silvana Mendes utiliza a colagem, a pintura, a videoarte e a fotografia como suporte para seu trabalho. Na busca por narrativas que desconstruam estereótipos negativos para corpos negros, trabalha e pesquisa questões raciais, pertencimento e territórios.
Em seus trabalhos, ela realiza uma série de colagens digitais que usam imagens de domínio público. O propósito é ressignificar narrativas e atribuir identidades historicamente negadas à população negra no Brasil.
A investigação imagética que Silvana propõe na criação das fotocolagens parte de uma discussão crucial sobre como uma pessoa negra é percebida socialmente, sendo comum retirarem-lhe a identidade pessoal e sua história social e familiar.
Na colagem digital deste repertório, destaca-se Carolina Maria de Jesus (1914-1977), autora do livro Quarto de despejo, lançado em 1960. A obra alcançou muitos leitores ao narrar, em formato de diário, a luta de uma mulher brasileira negra e periférica pela sobrevivência.
Silvana retratou Carolina autografando seu livro. Há um homem branco ao seu lado, que também escreve em cima de uma pilha de livros da autora, porém, esse homem não tem rosto, o que confere protagonismo a Carolina, que foi, por muitas vezes, silenciada pela história.
Reflita sobre o trabalho de Silvana Mendes por meio das questões a seguir.
1 Qual é a relação da história do Brasil com o trabalho da artista?
2 Como você percebe a sua identidade? Você se reconhece como pertencente a um determinado grupo social de acordo com a identidade, o parentesco ou outros motivos?
Não escreva no livro.
Arte, colaboração e inovação
O processo colaborativo em arte não é algo novo, porém, no contexto virtual, ou no chamado ciberespaço, é algo mais recente. Considerando o caráter aberto da web, com os seus compartilhamentos de textos, informações e ideias, é possível pensar em comunidades virtuais de criação e em processos de aprendizagem on-line. Assim sendo, você vai explorar de que maneira ações e investigações, sustentadas pela tecnologia digital, constroem redes que conectam arte e coletividade, ampliando as possibilidades de colaboração e inovação.
1. Afinal, o que é a Transiarte?
• Pensado como uma arte de transição, ou seja, que integra aspectos da arte não digital e da arte colaborativa digital, o PROEJA-Transiarte é voltado ao público da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Leia o texto “Mas afinal, o que é a estética virtual na Transiarte?” e converse com seus colegas sobre os princípios da Transiarte. Disponível em: https://files.cercomp.ufg.br/weby/up/779/o/ lucio_e_dorisdei.pdf (acesso em: 3 out. 2024).
2. FILE.
• O Festival Internacional de Linguagem Eletrônica (FILE) é um evento de artes de novas mídias que combina tecnologia, vídeos, animações e games com instalações interativas. O festival, que ocorre anualmente, promove a interseção entre arte e tecnologia, oferecendo uma plataforma para experimentar e explorar as possibilidades criativas das mídias digitais. Pesquise sobre a proposta do evento em seu site oficial. Disponível em: https://file.org.br (acesso em: 3 out. 2024).
3. Dear Angelica (em português, Querida Angélica).
• A nimação para realidade virtual desenhada à mão por meio da tecnologia Quill, com proposta interativa que transporta os espectadores para o universo dos sonhos, no qual eles podem explorar memórias e sentimentos associados a seus entes queridos. Assista ao curta-metragem e dialogue com seus colegas sobre como o espectador pode interferir em uma proposta artística, fazendo uso das tecnologias digitais. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=7O TrarOSB5E (acesso em: 3 out. 2024).
3. A animação, disponível em plataformas de vídeo na internet, não foi traduzida para a língua portuguesa, o que oportuniza o trabalho interdisciplinar com o componente curricular Língua Inglesa.
DEAR Angelica. 2017. Cartaz da animação digital interativa produzida pelo Oculus Story Studio.
TEORiAS E MODOS DE FAZER
Categorias para a arte digital
DOMINGUES, Diana. TERRARIUMplaces. 2003. Instalação contendo pó de mármore e pedras de rio, projetor, computadores e óculos de estereoscopia. A artista é referência da web art brasileira.
Na arte digital, o ambiente gráfico computacional oferece vastas possibilidades criativas, sendo possível criar obras de arte multimídia com o auxílio de softwares , aproveitando o ciberespaço. As categorias mais comuns desse tipo de arte são a ilustração, a pintura digital, a web art, as fotografias, as animações e os vídeos. Cada uma dessas categorias incorpora softwares, gadgets (dispositivos eletrônicos portáteis), aplicativos, entre outros, para desenvolver criações que se estruturam principalmente na interação com o público.
No que se refere às categorias da arte digital, o uso de dispositivos em tempo real, a visualização de imagens ao vivo e o papel do espectador como coautor da obra são essenciais. Para que isso ocorra de maneira positiva, não se pode descartar que muitos dos acontecimentos em ambiente virtual dependem de uma estrutura on-line para sua realização. Além disso, a arte digital pode incorporar características narrativas e o uso de hiperlinks que levam a textos na web. Dessa forma, a experiência do apreciador é transformada, explorando funções poéticas e estéticas em dispositivos como computadores, tablets e smartphones.
AçÃO Objetos e rituais
Criando fotocolagens
As fotocolagens de Silvana Mendes inspiram uma reflexão sobre como o registro fotográfico pode ampliar ou apagar o protagonismo das histórias pessoais e coletivas. Com enfoque em questões raciais, a artista manipula digitalmente o fundo da imagem, evidenciando o protagonismo de corpos negros, gerando contextos e narrativas, unindo, assim, o uso de aplicativos gratuitos de manipulação de imagens e o resgate de personagens da família ou da história brasileira. Agora, você vai criar suas próprias fotocolagens.
1. E scolha dos aplicativos para fotocolagens e efeitos
• Pesquise por aplicativos que possibilitam combinações e recortes de imagens, resultando em uma fotocolagem. Caso já conheça algum, compartilhe como foi a sua experiência de uso. É importante que o aplicativo seja de uso gratuito e que a navegação seja intuitiva. Faça o download do aplicativo na loja de apps do seu celular. No caso de a escola não disponibilizar acesso à internet, traga na pasta de downloads do celular as imagens que você deseja usar na proposta. Outra possibilidade é usar o laboratório de informática para fazer a seleção de imagens, caso sua escola ofereça essa possibilidade.
• Também é possível utilizar as funções da câmera do celular para a realização da atividade.
MENDES, Silvana. Afetocolagens Série I. 2019. Colagem digital.
COLEÇÃO PARTICULAR
2. Organização do trabalho
• Cada estudante estabelece um critério para a escolha da pessoa que será representada na fotocolagem: se é uma pessoa da família ou alguém que desperte algum interesse e admiração.
• O trabalho pode ser realizado de maneira individual, de modo que cada um narre, por meio da imagem criada, a história da pessoa escolhida.
• Caso você e um colega queiram abordar a mesma figura histórica, é possível elaborar o trabalho em dupla ou em grupo, desde que se tenha uma fotocolagem por estudante. Nesse caso, é importante debater, coletivamente, os elementos que devem ser trazidos para as imagens.
3. Criando as fotocolagens
• Existem algumas formas práticas de uso de apps ou da câmera do celular. Em aplicativos, em geral, é preciso iniciar um novo projeto, carregar as imagens e organizá-las. Já por meio do ícone da câmera do celular, deve-se selecionar a opção de colagem, acessar a galeria de fotos e adicionar efeitos e cores.
4. Compartilhando os resultados
• Para exibir coletivamente os resultados, o professor pode criar uma página da turma em uma rede social, à qual somente os estudantes tenham acesso. Assim, todos da turma
5. Autoavaliação e a valiação coletiva
• Neste momento, é importa nte que cada um dos estudantes possa falar um pouco de sua criação: qual pessoa ou história o inspirou; qual é a relação entre as imagens utilizadas na fotocolagem; o que se desejou transmitir com o trabalho.
• Coletivamente, os estudantes podem apontar semelhanças e diferenças entre os trabalhos realizados.
Série I. 2019. Colagem digital. podem visualizar o que os colegas realizaram.
MENDES, Silvana. Afetocolagens
PONTE PARA OUTRAS
liNGUAGENS ARTiSTiCAS
DANÇA
Original Bomber Crew
O Original Bomber Crew é um coletivo de artistas da dança, sobretudo do universo do hip-hop , das artes visuais e do skate , criado em 2005 no Grande Dirceu, bairro periférico de Teresina, no Piauí. No espetáculo tReta , o grupo realiza uma “invasão performática” – como define Allexandre Santos, diretor do trabalho – na qual seis performers e o público compartilham um ambiente sombrio em que a tensão permanente remete ao assédio, à violência policial e à iminência dos frequentes conflitos que ocorrem nas periferias brasileiras. No limiar entre performance , dança e luta, e ao som de música gravada e ao vivo, invadida por ruídos urbanos, a apresentação se modifica a cada novo espaço que ocupa, colocando a força e as desigualdades das periferias no centro das atenções.
DANÇA
A dança nas redes sociais
No ano de 2020, quando teve início a pandemia de covid-19, o número de downloads de plataformas de vídeos curtos disparou exponencialmente em todo o mundo. Enquanto as medidas sanitárias impunham isolamento e restrição a encontros presenciais, jovens de várias partes do planeta passaram a se relacionar por meio desses aplicativos, postando vídeos de humor, de entretenimento em geral e também de dança. A hashtag DC, que pode ser compreendida como “créditos da dança” (dance credits, em inglês) e “desafios de dança” (dance challenges, em inglês), identifica milhares de vídeos que desafiam pessoas a experimentar a dança, por meio de tutoriais e de reproduções de sequências dançadas. Ainda que haja um formato preciso para a adequação ao aplicativo – já que as sequências devem ser filmadas com o celular na vertical, enquadrando o corpo todo ou do quadril para cima –, com o passar do tempo, as danças estereotipadas do início passaram a conviver com propostas de investigação artística. Assim, as plataformas continuam encorajando pessoas ao redor do mundo a se aventurarem no universo da dança.
O grupo Rollettes Adaptive Dance Team, muito ativo em plataformas de vídeos, em apresentação no National Dance Day (em português, Dia Nacional da Dança), em Costa Mesa (Estados Unidos), em 2019.
ORIGINAL BOMBER CREW. tReta. 2018. Performance. Realização em São José do Rio Preto (SP), em 2019.
MUSiCA MUSiCA
A voz dos oceanos
A Organização das Nações Unidas (ONU) declarou o período entre 2021 e 2030 como a “Década da Ciência Oceânica”, com a intenção de promover a conscientização pública da saúde e da sustentabilidade dos mares. Em resposta a essa iniciativa, artistas e pesquisadores vêm investigando a importância do reino marinho para a estabilidade do clima no planeta. É o caso do compositor Jonas Hocherman (1985-), que, em parceria com o Instituto Finlandês do Meio Ambiente (SYKE), está desenvolvendo uma composição baseada nos dados coletados de fitoplânctons do Mar Báltico. Para tal, o compositor usa os conceitos da Análise Particional, uma teoria musical que ele utiliza para transformar os dados em sons. Os fitoplânctons são organismos unicelulares capazes de realizar fotossíntese, responsáveis por aproximadamente 50% da produção de oxigênio do planeta e formam a base da cadeia alimentar marinha. Hocherman acompanhou seu desenvolvimento entre janeiro e outubro de 2021 e vem transformando os dados em uma composição para a formação de uma big band, com instrumentos de sopro e percussão.
Música, programação e inteligência artificial
A utilização de algoritmos musicais criativos que ampliam as possibilidades de composição já é uma realidade no cenário musical contemporâneo. Artistas estão manipulando linguagens de programação e inteligência artificial para gerar novos timbres e criar interações entre sons e imagens em suas performances. Por essa razão, o campo da Inteligência Artificial aplicada à música vem se ampliando, e pesquisadores têm focado em modelar sistemas musicais que atendam às demandas criativas de músicos e compositores, bem como em compreender a música processada pela inteligência artificial.
O trombonista e compositor
Jonas Hocherman utiliza conceitos teóricos da Análise Particional de Pauxy Gentil-Nunes para sonificar os dados coletados de fitoplânctons e transformá-los em música, dando voz aos oceanos. Finlândia, 2024.
Dentro desse contexto, a artista colombiana Alexandra Cárdenas (1976-), radicada em Berlim, é uma referência. Ela explora a programação computacional como ferramenta criativa, utilizando técnicas de codificação ao vivo ( live coding ) para criar e improvisar música eletrônica experimental durante suas apresentações. Cárdenas integra composição e improvisação, transformando o código em uma forma de expressão musical. Além disso, ela também defende o empoderamento das mulheres na tecnologia e incentiva a participação feminina no campo da criatividade digital.
Alexandra Cárdenas utiliza ferramentas e plataformas digitais para suas performances de live coding. Fotografia de 2023.
SiNTESE ESTETiCA
Floresta de Cristal
Reflexão
O coletivo Floresta de Cristal, concebido pela artista mineira Rivane Neuenschwander (1967-), propôs uma nova forma de participação política nos atos públicos que ocorreram entre 2021 e 2022 em algumas cidades do Brasil.
Seres híbridos trajando vestes e máscaras de animais, plantas e fungos formavam uma floresta ambulante, empunhando placas com textos, como: “Amazônia e o ponto de não retorno” e “Rebeldia dos biomas”. A aparente festa carnavalesca reivindicava justiça ambiental e direitos para os seres humanos e não humanos na Terra.
O projeto começou com um grupo de cerca de dez pessoas, entre artistas e ativistas convidados, usando os figurinos e as máscaras concebidos e produzidos por Rivane. Aos poucos, o coletivo foi crescendo e ampliando a representação da biodiversidade.
Essa iniciativa foi materializada no filme de média-metragem Eu sou uma arara (2022) e no livro Reviravolta de Gaia (2023), realizados em parceria com a cineasta Mariana Lacerda, oferecendo um registro documental da tensão sociopolítica no Brasil e da aceleração da destruição da Floresta Amazônica.
“Eu sou uma arara” é uma expressão utilizada pelo povo indígena bororo, que habita o estado do Mato Grosso, para se referir à transmigração da alma. Filósofos e antropólogos utilizaram essa afirmação como ponto de partida para discutir as relações entre o pensamento mítico e o científico, afirmando a inexistência da oposição entre natureza e cultura.
Registro da ação do coletivo Floresta de Cristal em ato realizado na cidade de São Paulo (SP). Fotografia de 2021.
Leia um trecho do texto “Já eu sou um sagui”, escrito pelo filósofo Peter Pál Pelbart (1956-) como parte do livro Reviravolta de Gaia, refletindo sobre a importante ação estético-política realizada pelo coletivo Floresta de Cristal.
Já eu sou um sagui
Eu sou uma arara, dizem os Bororo. Já eu sou um sagui. É uma longa história. […]
Mas eu não sou antropólogo nem arara, sou apenas um sagui que nasceu num ateliê de artista por volta do início de agosto de 2021 na cidade de São Paulo, mais ou menos ao mesmo tempo que um tamanduá, uma onça, um boto, uma cobra-coral e, sim, também uma arara. Recém-nascido e já com uma cabeça gigante, não foi fácil dar os primeiros passos na selva de pedras a que chamam nossa metrópole. […]
Na primeira vez que saímos à rua para chamar atenção do mundo para esse perigo já éramos um grupo de 20 bichos. A cada semana, apareciam novxs voluntárixs: o crocodilo, a anta, o morcego, a raposa-ticuna, o bicho-preguiça, a borboleta azul, o besouro, a vitória-régia, o pica-pau, a água-viva, o polvo… Ao juntarmo-nos a uma manifestação na Avenida Paulista em São Paulo, cada um de nós carregava um cartaz com algum enunciado, político ou cosmopolítico, de protesto ou afirmação. Bastou pisarmos na avenida em meio às e aos manifestantes, e logo fomos longamente aplaudidos pela multidão, emocionada pelo que mais parecia uma miragem, uma aparição sobrenatural, uma alucinação encantada… De fato, para os que nos olhavam espantados e maravilhados, não éramos apenas bichos, mas Encantados - uma Encantaria, como nos nomeou a jornalista Eliane Brum. Parecíamos desafiar a pobre e tradicional coreografia política, com suas faixas partidárias, formação militar, palavras de ordem. Éramos os espíritos dos animais da floresta atravessando a cidade dos homens e dos negócios, dos arranha-céus e da polícia. Pois o que é uma floresta sem seus bichos e seus espíritos? O que é um bicho sem alma? O que são as mulheres e os homens sem seus orixás? O que é uma vida sem seu sopro? […]
Por mais mental, alado ou imaterial que pareça um espírito, ele se engendra a partir de um ponto de vista, que forçosamente é o de um corpo. E um corpo nunca é mera matéria, porém um feixe de afecções, capacidades ou modos de ser. É nesse sentido que um corpo tem alma. Pronto, já estamos de posse do circuito a que se chama de perspectivismo ameríndio: corpo, afecções, ponto de vista, perspectiva, espírito, mundo, multiplicidade de mundos. […]
Posso então eu me enxergar a partir do ponto de vista do sagui que me envolve? Incluir em mim essa distância que um olhar animal cava em mim, em vez de engolir o mundo a partir de meu antropocentrismo atávico? Como lidar com essa tensão entre as espécies e sustentar a comunicação entre elas? Os humanos, tão cheios de si, deveriam pensar nisso a cada vez que cruzam um bicho, e o estranhamento que provocou nossa passagem pela cidade pode ser um sinal do que está vindo: uma nova sensibilidade à alteridade dos não humanos, já não como meros “objetos”, mas como “sujeitos”. […]
Mas não somos xamãs. Quem entre nós ousaria reivindicar tal estatuto? Somos apenas um bando que não aguenta mais que nossa floresta, nós, os animais, os indígenas, sejam vistos apenas como recurso natural, reserva disponível para manipulação, futura mercadoria. […]
Sem os Encantados não se entende absolutamente nada da luta dos povos originários. Eles não estão defendendo apenas suas terras, mas sua vida. Isto significa seus modos de vida. Por conseguinte, as miríades de seres, visíveis e invisíveis, atuais e virtuais, humanos e não humanos, que fazem parte indissociável de sua cotidianidade a mais ordinária, importam tanto quanto eles. Sem uma ecologia que leve em conta as esferas imateriais que povoam sua existência, estamos condenados a exterminá-los. […]
Na verdade, a cada saída carregávamos novos enunciados, sintônicos com os acontecimentos que assombravam a atualidade política, militar, cultural, ecológica, ou indiferentes a elas, num fio atemporal acima do bem e do mal, como aquela deliciosa “dança cósmica”.
Os enunciados afirmativos estavam escritos em letra preta, os negativos em vermelho. […]
O filme termina, mas o sagui continua a postos. Talvez outras manifestações virão, quem sabe realizando o que desde o início parecia ser a ideia desse projeto elaborado por Mariana Lacerda e Rivane Neuenschwander e assumido por um pequeno grupo cuja sobrevivência é tão incerta quanto a dos animais na floresta: a Reviravolta de Gaia.
PELBART, Peter Pál. Já eu sou um sagui. In: LACERDA, Mariana; NEUENSCHWANDER, Rivane. Reviravolta de Gaia . Rio de Janeiro: Cobogó, 2023. p. 168-179.
CONeXãO
Eu sou uma arara
Rivane Neuenschwander é uma das artistas brasileiras reconhecidas no cenário internacional. Ela herdou o legado neoconcreto de Hélio Oiticica (1937-1980) e Lygia Pape (1927-2004) – para quem estar na rua era uma forma de reivindicar o espaço urbano como lugar de luta e catarse coletiva. Assista ao trailer do filme Eu sou uma arara, disponível em: https://vimeo.com/857593511 (acesso em: 3 out. 2024).
Processo de Criação Coletiva
De acordo com o texto, o perspectivismo ameríndio leva em consideração o corpo, as afecções, o espírito, a multiplicidade de mundos, com diferentes pontos de vista e perspectivas, para produzir a realidade, na busca de se construir um mundo em que caibam muitos mundos, respeitando todas as formas de existência da Terra.
Tendo como base as ações do coletivo Floresta de Cristal, as imagens apresentadas nesta seção e o trecho lido do texto “Já eu sou um sagui”, você participará de um processo de pesquisa e criação artística. Para isso, junte-se aos colegas para formar um grupo de seis a dez integrantes.
Análise e Debate
Resposta pessoal. Diante do iminente colapso ambiental, é fundamental adotar outras perspectivas para os ecossistemas e os povos. Para isso, é necessário deixar de ver a natureza como um recurso a ser explorado e reconhecer o meio ambiente como um ente vivo com direitos próprios que devem ser respeitados. Garantir essa mudança de abordagem é essencial para a preservação e a justiça ambiental.
Depois de ler o texto, analisar a imagem e refletir, discuta com seu grupo as questões a seguir.
• Você já participou de um ato com reivindicações sociais e políticas? Como foi essa experiência?
Respostas pessoais. Incentive os estudantes a contar suas experiências de mobilização social e política.
• Como você imagina que é participar de uma ação como a promovida pelo coletivo Floresta de Cristal, com humanos agindo como se fossem animais, plantas e fungos em um universo fantástico?
Resposta pessoal. Incentive os estudantes a se imaginarem na ação: que animal cada um gostaria de representar? Como seriam suas fantasias? Por quais lugares seria importante essa manifestação passar e por quê?
• Qual é a sua opinião sobre a seguinte afirmação do autor do texto lido: “[…] Somos apenas um bando que não aguenta mais que nossa floresta, nós, os animais, os indígenas, sejam vistos apenas como recurso natural, reserva disponível para manipulação, futura mercadoria. […]"
• Qual é o significado de assumir a perspectiva ameríndia para pensar a realidade?
• Que palavras ou frases de efeito você carregaria em uma manifestação? Quais seriam seus cartazes afirmativos? E os negativos?
Anote os principais tópicos desse debate, a fim de suscitar reflexões centrais que devem servir de base para o processo de criação artística do grupo.
Respostas pessoais. Investigue com os estudantes as mensagens de reivindicação que eles consideram importantes, bem como os temas que gostariam de compartilhar. Explore frases de contestação, de negação e de proposição que apontem para um futuro melhor.
Ideia disparadora e linguagens artísticas
Sempre em grupo, pense em como fazer uma síntese estética do debate realizado, ou seja, como transmitir as conclusões do grupo aos demais colegas, por meio de uma criação artística, como uma música, uma pintura, um poema, uma cena, uma performance, uma instalação.
Retome as ferramentas criativas trabalhadas ao longo deste capítulo ou rememore procedimentos artísticos trabalhados em capítulos anteriores que possam apoiar a criação. Considere também as habilidades e os desejos artísticos dos integrantes do grupo para compor a ideia central da obra coletiva.
Em um primeiro momento, deixe as ideias fluírem, anotando todo tipo de sugestão dos demais integrantes. Depois, retome as ideias e eleja, coletivamente, a que parecer mais potente, chegando a uma ideia disparadora.
Reflita sobre as maneiras de realizar um ato artístico em torno de um tema que seja importante para todos do grupo. Descubra qual luta social servirá de apoio para a criação, pensando em um assunto que, no ponto de vista de vocês, deve ser urgentemente mobilizado na sua comunidade escolar.
Esse ato poético pode ser realizado por meio da mistura de diferentes linguagens artísticas. Pode ser um desfile de criaturas fantásticas abordando o tema; um coro musical que realiza uma intervenção em algum lugar da escola; um grupo de dança e performance que desempenha uma ação simbólica; uma cena de teatro em formato de cortejo, que avança pelo território da escola levando sua mensagem poética de denúncia, entre outras possibilidades.
O importante é que a ação estética reflita esse assunto urgente e necessário, compartilhado entre os integrantes do grupo. Para a criação desse trabalho artístico, é possível fazer uso de todas as referências culturais e artísticas possíveis, lançando mão do repertório que o grupo tem à disposição.
Deixe a imaginação livre. Anote a ideia disparadora e a(s) linguagem(ns) artística(s) escolhida(s).
Pesquisa, criação e finalização
Organize as etapas de criação do projeto artístico com base nas reflexões centrais, na ideia disparadora e nas linguagens artísticas escolhidas.
Caso a criação do grupo envolva apresentação ou encenação, lembre-se de ensaiar o maior número de vezes possível, aprimorando o trabalho a cada repetição. Mesmo apresentações improvisadas exigem alguma forma de combinado e preparação. Não deixe que o processo de criação fique só na conversa, lembre-se de experimentar os elementos em cena.
Caso a invenção do grupo envolva uma exposição ou instalação, faça uma lista de tudo o que será necessário providenciar, dividindo as tarefas entre os integrantes do grupo.
Não existe uma fórmula para esse processo de criação. Cada grupo deve desenvolver suas etapas, estabelecendo critérios e tendo em vista a obra ou manifestação artística que se está concebendo.
Com o trabalho desenvolvido, chegou o momento de compartilhar com o restante da turma! Aproveite para apreciar a criação dos demais grupos.
InTEGranDO COm...
LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS
A poesia do slam
Contexto e referência
1. Respostas pessoais. Aproveite a questão para explorar o repertório literário da turma, mapeando quais leituras mobilizam os estudantes, quais textos poéticos participam de seus hábitos, tanto temática quanto formalmente. Para aqueles que dizem não ter o hábito de ler ou recitar poesias, lembre-os de que algumas letras de música foram originalmente poesia.
Como abordado no capítulo 7 , o slam é uma prática que nasceu no subúrbio de Chicago, nos Estados Unidos, na década de 1980. A palavra slam é uma onomatopeia em inglês, que equivale à batida de uma porta ou janela (algo semelhante ao som “pá!”, em português) e procura traduzir o impacto da poesia que atinge quem a ouve. A slam poetry chegou ao Brasil por meio do coletivo paulista Frente 3 de fevereiro, nos anos 2000. A atriz e poeta Roberta Estrela D’Alva (1978-), uma das representantes desse movimento no país, falou sobre o resgate da poesia por intermédio do slam em uma entrevista ao site Escrevendo o Futuro, em 2018. Leia, a seguir, um trecho dessa entrevista.
O que é o slam?
O autor Nilo Nūhatê Ybyraporã (Pi Eta Poeta) em performance poética realizada no Parque Municipal de Belo Horizonte (MG). Virada Cultural de Belo Horizonte, 2022.
Os slams de poesia, ou poetry slam, são batalhas de poesia falada, em forma de competição, campeonato, mas também é meio um programa de auditório, uma diversão, uma roda, um acontecimento, um encontro, sobretudo. Resumindo, é uma competição de poesia falada que tem três regras básicas: poemas próprios, de no máximo três minutos, sem acompanhamento musical […]. De fato, a nota é o que menos importa […] pouca gente lembra quem foi o campeão, a campeã, mas você nunca esquece aquela poesia que te tocou. Tem um chavão “a poesia sempre vence”. Se você considerar que hoje o Slam Resistência ou Slam da Guilhermina batem 600 pessoas na rua, 800 para ouvir poesia, é um grande avanço. […] Aqui no Brasil tem poucos slams que são em lugares fechados, com microfone, como existem em outros países; aqui ele tomou uma proporção de rua, de tomada de espaço público. Então dos 100 slams que temos hoje, em dezoito Estados, acho que 98% são feitos na rua. E isso é muito legal porque é tomada de espaço público. E você diz: “Mas isso aí não é nada. Isso é uma besteira, o slam não mudou nada”. Segunda-feira à noite, 800 pessoas vão a uma praça para ouvir poesia. Estão ali para ouvir e o governo não deu ticket para ir, ninguém está falando que é bom, não tem propaganda. Espontaneamente saem pessoas das Zonas Sul, Leste, Oeste, Norte de São Paulo e de fora de São Paulo, gastam o dinheiro da passagem, que poderia se gastar com qualquer outra coisa, para ir ouvir poesia.
D’ALVA, Roberta Estrela. A poesia sempre vence. [Entrevista cedida a] Esdras Soares e Alana Queiroz. Escrevendo o Futuro, [São Paulo], 6 maio 2020. Disponível em: www.escrevendoofuturo.org.br/conteudo/revista-digital/artigo/158/entrevista-roberta-estrela-dalva. Acesso em: 1 out. 2024.
BRUNA
BRANDÃO
2. Resposta pessoal. Oriente os estudantes a justificar suas respostas e investigue com eles o que significa ser de “difícil acesso” para conhecer quais são as percepções deles a respeito disso e como essas percepções são construídas. Comente com os estudantes que a poesia, entre outros objetos artísticos, também trabalha com uma dimensão subjetiva, por isso pode suscitar interpretações diversas. Isso significa que não há um certo ou errado no caminho da interpretação. O importante é que ela seja coerente com a obra interpretada. Como na questão anterior, aponte que há textos poéticos aos quais os estudantes têm acesso para além dos livros e que, muitas vezes, não se identificam como poesia.
A arte do slam simboliza a vitória da poesia, resgata o interesse por ela e democratiza essa forma de arte.
Aprofundando o estudo
Após a leitura do trecho da entrevista, converse com o professor e os colegas sobre as questões a seguir.
1. Você tem o hábito de ler ou de recitar poesias? Se sim, o que você costuma ler? Se não, por quê?
2. Você acredita que a poesia é uma arte de difícil compreensão ou de difícil acesso?
3. Em sua opinião, por que as pessoas se deslocam nos espaços da cidade para acompanhar as batalhas de slam?
4. Resposta pessoal. Lembre à turma de que o slam aborda diversos temas, sendo os desafios dos centros urbanos recorrentes nessas poesias faladas, sobretudo os desafios presentes nas regiões periféricas.
4. Você acredita que, por meio da poesia, é possível debater os desafios dos grandes centros urbanos?
Por ser uma poesia oral, ou seja, construída para ser recitada, a poesia do slam possui características que permitem o envolvimento de quem a ouve. A rima e o ritmo, por exemplo, são recursos importantes nesse formato. Além disso, o vocabulário e os temas abordados fazem referência ao cotidiano das pessoas que participam das rodas. Dessa forma, o slam poetry é um gênero poético que apresenta características literárias muito próprias.
Atividade síntese
Agora, você e os colegas vão organizar uma roda de slam para abordar, de forma poética, temas urgentes em sua escola ou para a sua comunidade. Para isso, reúna-se com os colegas para compor um grupo de cinco pessoas.
• Você e os colegas farão uma pesquisa de textos de slam poetry em português e em inglês. Em redes sociais, localize a página do Slam Brasil (slam_br) e busque vídeos de poetas como OCotta, do Rio de Janeiro, Matriarcak e Midria, de São Paulo, e Luiza Romão, de Minas Gerais, entre outros. Pesquise também, na internet, textos em inglês, como o poema “What Teachers Make ” (2002), de Taylor Mali (1965-) e Saul Williams (1972-) e busque performances deles em vídeos. Identifique características como rima e ritmo e observe como esses textos são recitados, tanto em inglês quanto em português.
• Você e os colegas vão ler, coletivamente e em voz alta, algum trecho de um dos textos pesquisados. Converse com os colegas sobre como se dará essa leitura, de modo que vocês empreguem o gestual que aprenderam enquanto assistiam aos vídeos dos slammers indicados ou outros que encontraram.
• Com o seu grupo, reflita sobre possíveis problemas que afetam a sua cidade: como é a questão da habitação? O transporte público atende a todos? Os espaços públicos de lazer são acessíveis a toda a população?
• Faça uma lista de palavras que se relacionem com os temas. Em uma segunda coluna, coloquem outras palavras que rimem com as primeiras. Em seguida, componham um texto poético relacionando o ritmo do texto e as palavras listadas.
• Convide colegas de outras turmas, professores e colaboradores da escola para compor um júri. Garanta que haja, pelo menos, 3 pessoas no júri e, se houver mais, que seja um número ímpar.
• Busque um espaço na escola para realizar a roda de slam e, se possível, providencie dois microfones. Se não houver esse recurso, encontre um lugar silencioso, para que a voz dos participantes possa ser ouvida. A apresentação pode ser feita em grupo ou os integrantes podem alternar para recitar partes do texto que criaram.
• Ao término da apresentação de todos os textos, os jurados poderão dar suas notas. Debata com seus colegas sobre a maneira como cada grupo desenvolveu o ritmo e as rimas em suas criações. Converse também sobre as críticas feitas às questões da sua cidade e sobre como essas questões foram abordadas. Lembre-se de que, no slam , a vitória é sempre da poesia.
3. Resposta pessoal. Procure destacar o caráter de encontro coletivo dos slams, o envolvimento com questões comunitárias, o interesse em participar dessa proposta artística, acompanhar a performance dos slammers e o interesse no evento em si. Também pergunte aos estudantes se eles já foram em um slam ou se têm vontade de ir a um evento como esse.
CIÊNCIAS DA NATUREZA E SUAS TECNOLOGIAS
Mudança do regime climático da Terra
Desmatamento no bioma Amazônia
Limite do bioma Hidrografia
Áreas de não floresta
Áreas de floresta
Parque Indígena Xingu
Fronteira
Limite de estado
de 2007 a 2023
Desmatamento até 2007
Desmatamento em 2008
Desmatamento em 2009
Desmatamento em 2010
Desmatamento em 2011
Desmatamento em 2012
Desmatamento em 2013
Desmatamento em 2014
Desmatamento em 2015
Desmatamento em 2016
Desmatamento em 2017
Desmatamento em 2018
Desmatamento em 2019
Desmatamento em 2020
Desmatamento em 2021
Desmatamento em 2022
Desmatamento em 2023
Elaborado com base em: TERRABRASILIS. Desmatamento. São José dos Campos: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, 2024. Disponível em: https://terrabrasilis.dpi.inpe.br/app/map/deforestation?hl=en. Acesso em: 10 out. 2024.
Contexto e referência
Recorte do mapa do Brasil que mostra a foz do Rio Amazonas. A linha laranja determina o limite do bioma amazônico; as áreas de não floresta estão em roxo; o avanço do desmatamento, de 2007 a 2023, está indicado pela escala de cores, que se inicia no amarelo e vai até o lilás; as áreas preservadas estão em verde. Observe a área preservada do Parque Indígena Xingu, enquanto seus arredores são alvo de desmatamento ao longo dos anos.
Ao longo do capítulo 9, você estudou diferentes obras e manifestações artísticas que partem do compromisso de enfrentar os desafios do tempo presente. A gravidade da mudança do regime climático da Terra e o modo como esse processo atingirá o futuro imediato da espécie humana estão entre os mais graves problemas da atualidade, anunciado repetidamente pela comunidade científica nas últimas décadas.
Apesar de todas as evidências documentadas e do crescente alerta da comunidade científica, há uma grande dificuldade em promover uma repercussão mais ampla na opinião pública mundial sobre o Antropoceno, a crise climática e os processos que retroalimentam o aquecimento global, como as queimadas. A situação é extremamente grave: estamos perigosamente próximos de atingir os pontos de não retorno.
Os cientistas continuam monitorando as temperaturas e observando os efeitos do aquecimento global em todos os sistemas da Terra, em especial na biosfera. Eles desenvolvem conceitos, coletam dados, constroem gráficos e criam mapas dinâmicos que mostram os acontecimentos em tempo real, além de projetarem modelos para o futuro próximo. No entanto, toda essa produção de conhecimento não é compreendida de forma imediata pelo grande público.
Nesse cenário de emergência global, a arte exerce um papel fundamental, em razão de sua capacidade de sensibilizar as pessoas. Ela tem o poder de traduzir dados, gráficos, mapas e
Não escreva no livro.
SONIA VAZ
Desmatamento
conceitos em formas poéticas, capazes de mobilizar a humanidade para agir e tomar medidas transformadoras, radicais, imediatas e abrangentes.
Aprofundando o estudo
A partir de agora, você começará a se preparar para um trabalho artístico que expresse a complexidade desse momento. Inicie fazendo algumas pesquisas, a fim de levantar dados e informações. Para isso, reúna-se com colegas em trios.
Conceitos
3. Esse é um debate interessante, mas sem uma resposta certa. Falar do terrível de modo agradável pode ajudar a engajar as pessoas, assim como o terrível, quando apresentado de forma sensacionalista, pode afastar o público.
Os fenômenos pesquisados pelos cientistas podem ser medidos, e os dados numéricos resultantes dessa medição podem ser sintetizados em gráficos que ajudam a expressar e valorizar a visualização das descobertas. Muitos dos gráficos que expressam eventos relacionados à mudança do regime climático trazem a curva exponencial para expressar o que é chamado de “grande aceleração”. Essa curva revela, em números, o aumento da produção, do consumo e do aquecimento da Terra.
• Pesquise três gráficos relacionados a temas ligados à mudança do regime climático da Terra. Copie a curva aproximada do gráfico e indique o que ele expressa em termos de mudanças. Por fim, verifique se a curva se assemelha a uma curva exponencial.
Mapas
Alguns temas que podem ser pesquisados pelos estudantes são: o crescimento populacional; o aumento do consumo de combustíveis fósseis; a intensificação da exploração mineral; o aumento do desmatamento das florestas; a elevação da concentração de dióxido de carbono na atmosfera, entre outros.
Os mapas são outra forma de representar as transformações da Terra.
• Pesquise mapas informativos sobre temas como clima, desmatamento e poluição.
• Anote o nome e o endereço da plataforma e explique, de forma simplificada, o tipo de informação apresentada.
Atividade síntese
2. Para essa questão, é importante que os estudantes conversem com o público (incluindo os próprios colegas) para coletar as impressões. Procure investigar se algum dos trabalhos foi mais impactante e busque entender o que causou essa reação (a abordagem do tema, a apresentação visual ou outros fatores).
Após estudar e pesquisar informações sobre o momento desafiador que vivemos, você irá traduzir um tema relevante para esse cenário em um trabalho de arte. Para isso, reúna-se com colegas em um grupo de três estudantes e pense em maneiras de impactar as pessoas de modo poético.
1. Com os colegas, escolha um tema que todos do grupo considerem relevante, como consumo de água, desmatamento, consumo de petróleo per capita em alguns países, entre outros possíveis.
2. Pense na melhor forma de expressar o tema escolhido: por meio de um mapa poético, de uma frase, de desenhos que se repetem insistentemente, de uma colagem de imagens sobre um mapa ou uma fotografia etc.
3. Utilize materiais que simbolizem o descarte, como o plástico. Isso pode conferir mais significado ao trabalho. Ou proponha ideias para um novo mundo, enriquecendo o trabalho com matérias orgânicas.
4. Defina a dimensão do trabalho e providencie os materiais necessários para realizá-lo. Dividir as tarefas entre os integrantes irá otimizar a produção.
5. Para finalizar, pense em um título poético, irônico ou didático que complemente o trabalho visual. Os trabalhos de toda a turma farão parte de uma exposição para a comunidade escolar, que poderá ser instalada nos espaços de circulação da escola. Após a exposição, discuta com os colegas e com o professor levando em consideração as questões a seguir.
1. O que você aprendeu nesse processo? Você acredita que seu grupo atingiu os objetivos pretendidos?
2. Quais trabalhos você acredita que mais impactaram o público?
3. As obras de arte produzidas são belas ou terríveis?
1. Respostas pessoais. O trabalho busca promover um processo de aprendizado expandido. A consulta a informações científicas em bancos de dados oficiais oferece mais precisão sobre aquilo que já é conhecido, tornando a troca de conhecimentos entre os estudantes um aspecto fundamental da proposta. Peça aos grupos que falem sobre seus objetivos e suas expectativas: o que pretendiam transmitir para o público? Que tipo de reação estavam esperando? O que de fato aconteceu?
ARTE EM QUESTÃO
1. Resposta: alternativa d. Essa questão trouxe muitas dúvidas aos vestibulandos que realizaram a prova do Enem de 2015, pois, além da alternativa d estar correta, conforme o gabarito divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), a alternativa c também pode ser considerada correta. Há, portanto, duas respostas conceitualmente corretas para a questão. Ao desenvolvê-la, inicie comentando com os estudantes algumas das características do bordado, pois trata-se de uma expressão artística enquadrada como “popular” e, por isso, não teria o mesmo status de obras que tradicionalmente ocupam galerias e museus – embora esse aspecto tenha adquirido outras perspectivas na produção artística contemporânea. Ademais, essas questões podem ser relacionadas à produção de Leonilson, que combina técnicas tradicionais dentro de uma estética contemporânea. Se possível, oriente os estudantes a pesquisar para conhecer mais sobre a obra de Leonilson.
Depois de diferentes atividades, obras, artistas, teorias e processos, a Unidade 3: Arte hoje terminou!
Agora, você irá verificar os conhecimentos construídos ao longo dessa jornada por meio de uma avaliação composta de questões de múltipla escolha. Assim, além de avaliar os conhecimentos em Arte desenvolvidos ao longo da unidade, você pode se preparar para a importante etapa dos vestibulares.
Siga as orientações do professor e boa avaliação!
Capítulo 7: Multiculturalismo
1. (Enem/MEC)
LEONILSON. O recruta, o aranha e o penélope. Bordado sobre tecido, 1992. Disponível em: www.projetoleonilson.com.br. Acesso em: 3 ago. 2012.
A obra do artista plástico Leonilson (1953-1993)
marca presença no panorama da arte brasileira e internacional. Nessa obra, ele utilizou a habilidade técnica do bordado manual para a) obtenção das linhas retas paralelas.
b) valorização do tracejado retilíneo.
c) e xploração de diferentes texturas.
d) obtenção do equilíbrio assimétrico.
e) inscrição homogênea das formas e palavras.
2. (Enem/MEC)
O rap, palavra formada pelas iniciais de rhythm and poetry (ritmo e poesia), junto com as linguagens da dança (o break dancing) e das artes plásticas (o grafite), seria difundido, para além dos guetos, com o nome de cultura hip hop. O break dancing surge como uma dança de rua. O grafite
2. Resposta: alternativa b Embora o break tenha uma gama de movimentos característicos e que compõem o repertório dessa dança, tais como top-rock e o freeze, o improviso é sua base fundamental.
nasce de assinaturas inscritas pelos jovens com sprays nos muros, trens e estações de metrô de Nova York. As linguagens do rap, do break dancing e do grafite se tornaram os pilares da cultura hip hop
DAYRELL, J. A música entra em cena: o rap e o funk na socialização da juventude. Belo Horizonte: UFMG, 2005 (adaptado).
Entre as manifestações da cultura hip hop apontadas no texto, o break se caracteriza como um tipo de dança que representa aspectos contemporâneos por meio de movimentos
a) r etilíneos, como crítica aos indivíduos alienados.
b) improvisados, como expressão da dinâmica da vida urbana.
c) suaves, como sinônimo da rotina dos espaços públicos.
d) r itmados pela sola dos sapatos, como símbolo de protesto.
e) cadenciados, como contestação às rápidas mudanças culturais.
Capítulo 8: Arte contemporânea
3. (Unicentro-PR)
Dança contemporânea, também considerada dança abstrata, reúne uma variedade de ritmos, formas e performances. Os elementos trabalhados são o processo criativo, as experimentações, o conceito e a ideia a ser coreografada. Com base nos conhecimentos sobre dança contemporânea, atribua V (verdadeiro) ou F (falso) às afirmativas a seguir.
3. Resposta: alternativa b. A dança contemporânea é inovadora e tem como uma de suas características a liberdade de movimentação, diferentemente dos padrões técnicos mais rígidos presentes nas danças clássicas. Além disso, emprega referências de danças como o balé, o jazz, o hip hop entre outras. Em diálogo com a contemporaneidade, de forma ampla, a dança contemporânea também se utiliza de vestuários e espaços alternativos, ou seja, não se limita ao espaço tradicional do palco e a figurinos específicos, como collants e sapatilhas.
Não escreva no livro.
4. Resposta: alternativa d
O processo colaborativo preconiza um tipo de criação em que todos os participantes são ativos e colaboradores, o que está diretamente relacionado a uma exploração da alteridade, como bem pontua o texto que acompanha a questão, e a propostas cênicas contemporâneas.
( ) O s pontos fortes dessa dança são a inovação e a liberdade, misturando os ritmos balé, jazz e hip-hop
( ) Um gênero da dança que destaca os padrões clássicos e técnicos, como simetria, leveza, compasso, ritmo e harmonia, que teve seu auge na década de 1930.
( ) Traz o conceito de coreografia, misturando as artes visuais, o teatro e a música, com ênfase na técnica e no conceito, levando a uma postura ereta e verticalizada com perfeição.
( ) Sua concepção de dança se baseia em experimentações coreográficas, movimentos ilimitados, vestuário e espaços alternativos.
( ) A presenta-se em um espaço teatral, um palco, utilizando a música clássica para exibir uma dança espetacular coreografada.
Assinale a alternativa que contém, de cima para baixo, a sequência correta.
a) V, V, F, V, F.
b) V, F, F, V, F.
c) V, F, V, F, F
4. (UFSM-RS)
d) F, V, V, V, F e) F, F, F, V, V.
O teatro brasileiro contemporâneo é atravessado por uma multiplicidade de propostas cênicas que visam, sobremaneira, uma relação ativa na realidade social, política e cultural do país. A partir das décadas de 1990 e 2000, expandiu-se um tipo de prática artística que, direcionando o olhar ao outro, exigiu uma relação de alteridade no teatro: seja no processo de criação, seja no espetáculo teatral. Esse tipo de relação pode ser observada em processos criativos em que o ato político se deu a partir da “investigação das realidades sociais do outro e na interrogação dos muitos territórios da alteridade e da exclusão social” (FERNANDES, 2013, p.353).
O Grupo Teatro da Vertigem/SP é um dos precursores desse tipo de processo, chamado de processo de criação
a) épico: dedicado à experimentação criativa a partir do diálogo entre o teatro, outras linguagens artísticas e os elementos que compõem a cena teatral.
b) educativo: dedicado à formação do ator e da plateia, desenvolvido especialmente em escolas a partir da noção de jogo teatral como experiência.
c) comunitário: dedicado à elaboração da cena e do exercício teatral, tendo como foco temas identitários, sem a preocupação com o produto final em forma de espetáculo teatral.
d) colaborativo: dedicado à busca de uma não hierarquização entre as funções desempenhadas pelos artistas envolvidos nos projetos artísticos, com propostas cênicas que usam, frequentemente, espaços não convencionais para apresentação.
e) psicodramático: dedicado ao estudo teórico de temas da psicanálise e da inter-relação pessoal, com propostas cênicas levadas a público somente em espaços fechados.
Capítulo 9: Arte e os desafios do nosso tempo
5. (Enem/MEC)
Espetáculo Romeu e Julieta, Grupo Galpão. GUTO MUNIZ. Disponível em: w w w. f ocoincena.com.br. Acesso em: 30 maio 2016.
A principal razão pela qual se infere que o espetáculo retratado na fotografia é uma manifestação do teatro de rua é o fato de
a) d ispensar o edifício teatral para a sua realização.
b) utilizar figurinos com adereços cômicos.
c) empregar elementos circenses na atuação.
d) e xcluir o uso de cenário na ambientação.
e) negar o uso de iluminação artificial.
5. Resposta: alternativa a. A imagem apresenta a cena de um espetáculo realizado em um espaço não convencional, ou seja, fora do lugar clássico do palco e ao ar livre.
PROjETO ARTE
Como agir na comunidade escolar por meio de um projeto artístico?
Nas unidades apresentadas neste livro, você entrou em contato com diferentes linguagens artísticas, além de ler e pesquisar diversos temas. Explorou também atividades práticas, que mobilizaram saberes diversos, tanto individuais quanto coletivos.
Nesse processo, você desenvolveu uma série de habilidades, compreendendo as categorias da arte como disparadoras de experiências e de criatividade, explorando questões que ampliaram sua capacidade de fruição de uma obra de arte, vivenciando a arte como modo de vida e desenvolvendo o pensamento crítico e criativo.
É chegado o momento de colocar em prática todos esses aprendizados de forma autônoma, em um projeto temático que envolva a sua comunidade escolar. Siga as orientações do professor e organize-se com seus colegas para trilhar os passos sugeridos neste projeto.
A proposta consiste em uma intervenção artística voltada a transformar o espaço da escola. A ideia é que essa ação artística englobe toda a comunidade escolar – estudantes, professores, funcionários e familiares –, compreendendo as pessoas que a integram como sujeitos provocadores de aprendizagem, criação e produção.
Fluxograma de etapas do projeto para intervenção artística.
MAIRA MARTINES
1o passo: investigando o tema
O território de uma escola pode agregar saberes diversos. Para isso, é preciso entender não apenas as potencialidades de aprendizagem do espaço formal da escola mas também as dos espaços públicos, como praças, parques e outros equipamentos culturais. Os agentes desse território – familiares, educadores, estudantes e associações de moradores – são fundamentais para um projeto amparado em ideias de pertencimento e de acolhimento. Desse modo, essa proposta tem o objetivo de mapear o espaço onde você vive, a fim de produzir uma intervenção que possa evidenciar os saberes e fazeres desse local. No processo de pesquisa, há possibilidade de resgatar histórias e memórias locais, assim como promover o fortalecimento do vínculo entre as pessoas pertencentes à comunidade.
Para aprofundar sua compreensão a respeito da comunidade escolar da qual você faz parte, leia, individualmente, as questões a seguir e reflita a respeito delas. Depois, seguindo as orientações do professor, debata com os colegas da turma. Essa conversa deve gerar ideias de ações artísticas que poderiam modificar a comunidade escolar de forma positiva.
• P ara você, qual é o significado da palavra comunidade? Em que circunstâncias essa palavra é utilizada?
• Quais percepções e sensações você tem em seu cotidiano escolar? Quando sente conforto, solidão, segurança ou alegria?
• Em sua comunidade, há espaço para acolhimento e escuta? Como você imagina que as pessoas se acolhem dentro e fora da escola?
• Se pudesse tirar uma fotografia de algum lugar da escola para guardar como lembrança, qual escolheria? Por quê?
• Descreva o seu trajeto de casa até a escola. Que percepções você tem durante o percurso?
• Quem são as pessoas da comunidade escolar com as quais você mais se relaciona?
• Como você definiria o espaço expandido da escola em seu bairro? Quais outras partes do seu território cumprem com a função de ensinar?
• Que desafios você identifica no seu território? É possível enfrentá-los por meio da arte?
Encerrado o debate, crie uma lista com potências e desafios presentes na comunidade escolar da qual você faz parte. Esse diagnóstico servirá de base para os próximos passos do seu projeto artístico.
2o passo: nosso repertório
Chegou o momento de investigar obras e manifestações artísticas que possam servir de referência para o projeto. Para isso, junte-se a colegas em um trio.
Repertórios do Ensino
Médio
• Investigue obras e manifestações artísticas estudadas durante o Ensino Médio que podem se relacionar com os desafios e as potências da comunidade escolar.
• Retome atividades práticas desenvolvidas nesse percurso, listando as linguagens artísticas que se mostraram mais potentes ao serem experimentadas.
• Selecione três trabalhos artísticos que podem servir de inspiração para o projeto a ser desenvolvido.
Repertórios da cultura juvenil
Referências são fundamentais para a composição de obras artísticas.
• Pesquise artistas e produções que fazem parte da sua cultura e que dialogam com os desafios da comunidade escolar. Quais produções artísticas formam a sua identidade cultural?
• Partindo desse levantamento, com os colegas, busque mais informações sobre as obras e os artistas citados.
• Escolha três obras de diferentes artistas para servir de inspiração para o projeto artístico a ser desenvolvido.
passo: ateliê de hipóteses
Pense em ideias ou temas que podem servir de base para o projeto. Partindo disso, serão elencados os principais pontos de interesse da turma.
Ideias disparadoras
Identifique os pontos que chamaram atenção nas referências trazidas e, com base neles, selecione duas ideias disparadoras para o projeto. As ideias podem ser temas ou proposições que já apontem a linguagem artística a ser trabalhada. Exemplo: montar uma peça de teatro sobre o lixo na escola; organizar um festival de bandas na hora do intervalo; criar uma instalação interativa sobre ansiedade e acolhimento.
Painel de hipóteses
Em seguida, toda a turma deverá se reunir para construir, com o apoio do professor, um painel de hipóteses. Cada trio apresentará suas ideias disparadoras, que serão anotadas pelo professor no quadro, em duas colunas: uma para o tema, ou proposição; e outra para as linguagens artísticas mobilizadas.
Depois, a turma fará uma análise geral das sugestões, visando mesclar as que são semelhantes, tornar outras mais compreensíveis para todos e anotar mais ideias que surgirem desse processo, chegando à versão final do painel.
Organização dos grupos
Agora, a turma deverá se organizar em grupos de seis a dez estudantes. A formação desses grupos deverá considerar os objetivos e desejos de cada integrante, bem como reunir diferentes potências e habilidades. Exemplo: uma pessoa que desenha bem, uma que tem facilidade para escrever, uma que pode cantar etc.
Música
• Relacione os interesses e as afinidades musicais dos membros do grupo. Há pessoas que tocam instrumentos musicais? Que gostam de cantar, rimar ou escrever letras? Que têm facilidade para editar sons coletados do ambiente digital?
• Imagine o tipo de criação musical que você e seus colegas gostariam de fazer. Vocês querem criar um arranjo para uma música existente ou pretendem compor uma canção?
Teatro
• Com base na ideia disparadora, aprofunde o tema central e pense em maneiras de levá-lo à cena.
• Imagine o tipo de peça que o grupo deseja encenar. Ela abordará uma situação dramática, com personagens em conflito, ou será uma peça narrativa, partindo de textos declamados, notícias de jornal, canções?
• Defina o espaço da encenação. A escola possui um teatro, ou auditório, ou a apresentação ocorrerá em um espaço alternativo?
Artes integradas
• O disparador do projeto pode ser uma intervenção em um espaço não convencional. Para isso, mapeie lugares pouco convencionais na escola e explore possibilidades do entorno.
• Pense em questões que permeiem os objetivos da proposta: o que explorar coletivamente? Como as tecnologias digitais podem fazer parte do processo?
5o passo: feira de trocas sobre o processo
Com uma proposta mais concreta do que se deseja realizar, os grupos farão intercâmbios dos seus planejamentos. A proposta é que compartilhem impressões, apontem fragilidades e potências, além de sugerir caminhos de desenvolvimento uns para os outros. A seguir, duas possibilidades de como essa troca pode ser feita.
• S eminário : cada grupo elege um representante para explicar o projeto para turma. Serão 5 minutos para a apresentação e 10 minutos para que os demais façam perguntas e comentários colaborativos.
• Conferência colaborativa : formam-se pequenas conferências com pelo menos um representante de cada grupo. Cada pessoa, então, expõe as ideias do seu grupo para os demais representantes.
6o passo: segunda rodada de planejamento
De volta à formação original, os grupos devem se reunir para uma segunda rodada de planejamento a partir da devolutiva recebida na feira de troca.
• Que novos aspectos a experiência trouxe para o projeto? O que pode ser melhorado ou potencializado na proposição do grupo?
• Ne sse momento, é fundamental conversar com o professor sobre a viabilidade do projeto. Verifique, por exemplo, se é preciso solicitar autorização para uso dos espaços escolares ou para realizar saídas da escola para pesquisa e produção; onde é possível encontrar informações sobre a história da escola, entre outras questões.
7o passo: produção
Este é o momento de organizar as etapas do trabalho, definir os materiais, dividir as tarefas entre os integrantes do grupo e alinhar as expectativas.
Dicas
Artes visuais
• Em conjunto com seu grupo, você pode buscar objetos descartados, juntar papelões ou reunir uma grande quantidade de sacos plásticos e emendá-los com fita adesiva.
Materiais em grande quantidade tendem a causar impacto pelo efeito de grandeza, volume e tamanho que trazem para a obra.
• Reserve tempo para pintar, bordar, desenhar, recortar etc. Algumas tarefas podem ser feitas de modo colaborativo e finalizadas individualmente.
Dança
• Se o grupo for utilizar trilha sonora, decida quem será o responsável por estruturá-la. Garanta que haja um aparelho de som para os ensaios e para a apresentação.
• A proposta demandará figurinos ou cenários específicos? Como serão providenciados? É possível compô-los com itens trazidos de casa.
• Trace um plano de divulgação da proposta, com a data, o horário e o local do evento. Elabore um breve texto que sirva de base para cartazes e outras formas de comunicação.
Música
• Defina os recursos necessários e quem irá providenciá-los. Se forem tocar instrumentos musicais, quem trará cada um deles? Se for necessário amplificar o som, a escola dispõe de equipamento?
Divulgar e registrar são ações que podem expandir o alcance de trabalhos artísticos.
MAIRA MARTINES
• Verifique o espaço da apresentação. Se o ambiente for ruidoso ou o grupo for utilizar instrumentos elétricos, pode ser necessário usar caixa de som. Se for um local silencioso, um trabalho acústico pode ser suficiente.
• Ensaie diversas vezes. A repetição é essencial para aprimorar o desempenho coletivo.
• Cuide do início e da finalização da obra. Alguém fará uma contagem para começar? Se forem utilizar playback , quem irá disparar o som?
Teatro
• Combine com os colegas quem será responsável pela direção do trabalho. É possível, também, que a direção seja coletiva.
• Defina o responsável pelas áreas criativas da encenação – cenografia, figurino, adereços, sonoplastia e iluminação (se houver). Uma pessoa pode exercer mais de uma função, como ator e figurinista.
• Crie um roteiro de ações para guiar a encenação, que servirá de base para o trabalho de todas as frentes de criação. Também é possível partir de um texto teatral existente.
• E xperimente em cena todas as ideias que o grupo pretende realizar. As sugestões devem ser improvisadas, partindo dos acontecimentos no palco para serem desenvolvidas.
• Ensaie o maior número de vezes possível, aprimorando as cenas a cada passagem. Quanto mais ensaios, melhor será a apresentação.
Artes integradas
• L iste os equipamentos disponíveis de acordo com as demandas do projeto.
• P ara envolver a comunidade escolar, realize, ao final da intervenção, uma roda para o compartilhamento de textos autorais que se relacionem com a temática escolhida.
8o passo: apresentações
Para que tudo dê certo no dia da apresentação do Projeto Arte, algumas providências são fundamentais.
• É preciso preparar uma estratégia de divulgação do evento para a comunidade escolar. Para convites físicos, organize a distribuição de impressões e uma ação artística para fazer a chamada. Já para convites digitais, combine com seus colegas uma postagem coletiva, com pelo menos uma semana de antecedência.
• É importante pensar em como será a interação com os convidados. Pense em como o público será recebido e estabeleça um roteiro de apresentações.
• Por fim, todos os estudantes devem se empenhar em recolher as impressões do público. Para isso, é fundamental observar a plateia e, se possível, convocar o público a partilhar sua experiência. Os formulários digitais podem aparecer novamente aqui para coletar uma devolutiva.
Dicas
Artes visuais
• Recepcione o público e fale sobre o projeto. Se o trabalho for interativo, explique como isso ocorrerá.
• É possível convidar um professor para mediar um debate. O diálogo e a troca de ideias sempre levam ao aprendizado.
Dança
• Chegue mais cedo para avaliar se o local está organizado para acolher o grupo e o público. Se o grupo for utilizar música gravada, teste o som para verificar o funcionamento do equipamento e a adequação do volume.
• Vista roupas e sapatos confortáveis, que permitam os movimentos de dança. Há também a possibilidade de dançar descalço.
• A queça as articulações e os músculos para a apresentação. Procure encontrar um estado de concentração e atenção para se apresentar. Se possível, ensaie novamente após o aquecimento.
Música
• Defina a posição de cada pessoa e experimente suas movimentações no espaço da apresentação.
• Faça a passagem de som, ajustando volumes e garantindo que os integrantes do grupo consigam escutar uns aos outros. Se for necessário amplificar o volume, posicione a(s) caixa(s) de som de modo a favorecer a escuta dos espectadores.
• Realize um aquecimento coletivo com seus colegas. Concentrem-se, deixem de lado as preocupações e conectem-se uns aos outros.
Teatro
• Defina quem receberá os espectadores e onde eles deverão se posicionar.
• Providencie um checklist dos figurinos, adereços e elementos cenográficos, além de verificar possíveis elementos técnicos.
• Aqueça o corpo e a voz antes da apresentação. Forme uma roda com os colegas para desejarem boa sorte uns aos outros.
• Evite combinados de última hora. Mas caso algo saia do planejado durante a apresentação, improvise.
Artes integradas
• Administre os horários, o tempo de duração e a quantidade de espectadores para a exibição dos vídeos, áudios e textos. O grupo pode revezar as funções de mediação, com alguns integrantes no espaço da intervenção e outros na finalização, fora do espaço da escola.
9o passo: encerramento do projeto
Converse com os colegas do grupo sobre as apresentações. É importante identificar qual foi o impacto no público e avaliar se os objetivos foram alcançados, além de relacionar o que não saiu como planejado e o que poderia ter sido melhor.
Com o professor e os demais colegas da turma, avalie o processo de pesquisa e criação do projeto, bem como sua abertura para a comunidade. Refletir sobre a troca com a comunidade escolar é crucial.
Pense nos próximos passos possíveis, como os projetos podem se expandir para outras comunidades escolares.
Afinal, o que é cultura e o que é arte?
“Começo, meio e começo”. É assim que o mestre e pensador quilombola Antônio Bispo dos Santos (1959-2023), o Nêgo Bispo, lembrava a força do ciclo nas culturas afrodiaspóricas. Os ciclos, nessa perspectiva, recomeçam, não se encerram. Neste momento, um ciclo de estudo da arte realizado por você se transforma, para recomeçar.
Neste percurso, você estudou as principais matrizes culturais brasileiras, conhecendo um pouco das culturas indígenas, afrodiaspóricas e europeias, alicerces que formaram a complexa e diversa cultura do nosso país, sempre em transformação. Essas matrizes seguem vivas e presentes em nossa vida cotidiana.
Você também pôde investigar as disputas em torno da formação da identidade nacional. Por um lado, apresentaram-se obras e manifestações artísticas que se apropriaram de traços culturais de populações subalternizadas ao longo da história do Brasil, expressões do violento processo de colonização. Mas, por outro lado, apresentaram-se resistências: criações artísticas críticas a esse processo, vozes dissonantes que disputaram outro projeto e imaginário de país.
Também foram objetos de seus estudos o impacto radical que a cultura digital teve nas formas de produção e de consumo de arte nos dias de hoje e os distintos modos como artistas têm buscado responder às urgências dos imensos desafios enfrentados em relação ao futuro da Terra. Agora, a proposição é fazer uma retomada do que você aprendeu e produziu nessa jornada, trazendo para o presente as memórias vividas ao longo desse ciclo de aprendizagem em Arte.
Imagem da ópera O Guarani, de Carlos Gomes, apresentada em 2023, no Theatro Municipal de São Paulo (SP). O espetáculo teve concepção de Ailton Krenak, encenação de Cibele Forjaz e efeitos visuais de Denilson Baniwa.
5. Respostas pessoais. Aproveite para valorizar os trabalhos artísticos realizados pelos estudantes. Abra espaço para que comentem sobre as produções uns dos outros e para que relacionem as criações com o momento de vida em que se encontravam. Em um momento de transformação, em um ciclo, os trabalhos artísticos da turma servem como testemunho das experiências e transformações vivenciadas pelos estudantes ao longo do Ensino Médio.
BANIWA, Denilson. Espírito dos animais. 2022. Infogravura.
1. Respostas pessoais. Aproveite para incentivar os interesses e predisposições artísticas da turma. É provável que os estudantes que gostam de desenhar se identifiquem com os debates sobre artes visuais, os que tocam instrumentos se lembrem mais das propostas relacionadas à música, e assim por diante. Além disso, eles podem trazer à tona a apreciação pela fruição das produções artísticas.
A ópera é um gênero surgido na Itália, no século XVI, que reúne diversas linguagens artísticas em um único espetáculo. Na ópera, teatro, música, dança e artes visuais se misturam para contar uma história. Trata-se de um espetáculo grandioso, no qual pode haver uma orquestra inteira acompanhando os cantores e um numeroso corpo de baile em cena, junto aos intérpretes dos papéis principais e do coro, que muitas vezes narra os acontecimentos.
A ópera O Guarani, de Carlos Gomes (1836-1896), baseada no romance de José de Alencar (1829-1877), narra o amor impossível entre Peri, um indígena guarani, e Ceci, uma jovem branca. A ópera foi concebida em italiano e é conhecida na cena internacional em sua versão romântica, na qual os indígenas, cantando em italiano, são retratados de forma caricata com figurinos que transformam trajes típicos em trajes exóticos.
As montagens contemporâneas de ópera, muitas vezes, são reinterpretações feitas a partir do diálogo entre o tempo no qual a obra foi criada e o tempo presente. Nesta montagem de 2023, concebida por Ailton Krenak (1953-) e Cibele Forjáz (1966-), a cultura guarani finalmente foi apresentada por atores indígenas, com os cantos guaranis, projeções luminosas de elementos da floresta desenhados por Denilson Baniwa (1984-) e objetos como redes coloridas no cenário. O embate entre os dois tempos mostrou uma visão crítica da obra e da sociedade brasileira. A montagem contemporânea de O Guarani é um exemplo de como a arte e a cultura são forças vivas que traduzem as questões do presente.
Oficina da memória
2. Resposta pessoal. Se possível, inclua na conversa as artes integradas e permita que os estudantes comentem sobre o trânsito entre diferentes linguagens artísticas, explorada em certos trabalhos artísticos.
Para revisitar os aprendizados construídos até aqui, comece olhando para o sumário do seu livro, identificando que temas pareceram mais interessantes. Selecione as obras que chamaram a sua atenção, que o tocaram, comoveram, ou incomodaram, e procure refletir sobre elas.
1. Há alguma linguagem artística, ou linguagens artísticas, com a qual você tenha se identificado mais? Por quê?
2. Qual linguagem artística foi usada nas obras que chamaram a sua atenção?
3. Que técnicas foram mobilizadas nestes trabalhos? Quais materiais e métodos foram usados na concepção destas obras?
4. Que temas e conceitos foram mobilizados na produção destes trabalhos? Como eles o afetaram?
3. Respostas pessoais. Essas questões permitem que o estudante conecte sua experiência de fruição com o estudo técnico ligado à criação artística. Há um interesse especial em compreender como uma obra de arte foi concebida e realizada. Essa investigação contribui para que novas criações sejam imaginadas. Incentive-os a alimentar esse interesse.
5. Levando em conta a sua produção, revisite os trabalhos que você fez ao longo deste percurso. Quais foram mais impactantes para você e qual a razão desta escolha? Com base nesses questionamentos, busque escrever palavras-chave que possam sintetizar o arrebatamento causado pelas obras mais marcantes e pelas produções que você destacou. Em seguida, junte-se a alguns colegas, formando um pequeno grupo, e troquem ideias sobre suas escolhas. Apresente suas palavras-chave e conheça um pouco da experiência de seus colegas nesse aprendizado na arte. Verifique se existem confluências e divergências. Questione os colegas sobre as escolhas que fizeram.
4. Respostas pessoais. Incentive os estudantes a rememorarem obras que tocaram em assuntos importantes para eles. É interessante
aprofundar os debates em torno da fruição artística, perguntando aos estudantes como as obras os sensibilizaram. Incentive-os a tecerem relações entre forma e conteúdo. Converse com eles sobre como os temas que consideram importantes foram enfatizados pelas escolhas formais dos artistas.
Para ampliar a troca, um estudante de cada grupo apresentará para toda a turma as obras escolhidas e os trabalhos produzidos por seu grupo, com as respectivas palavras-chave, que devem ser anotadas no quadro, em um cartaz ou em uma folha de papel craft.
Dessa forma, a turma terá um painel que dá visibilidade ao caminho de aprendizado desenvolvido por todos, ao longo do Ensino Médio, em que será possível perceber as linguagens, as técnicas e as poéticas que mais os mobilizaram.
Retome a carta que você escreveu para si mesmo, proposta na Introdução deste livro. Releia-a com os olhos de agora, tentando perceber e analisar o que mudou para você no entendimento daquelas primeiras perguntas disparadoras: o que é arte? Para que serve?
Depois de reler sua carta, escreva uma segunda carta, endereçada para você mesmo, no passado, com o seguinte tema: “o que eu gostaria de lhe contar sobre o que é arte e para que ela serve.”
Lembre-se da ideia de “começo, meio e começo”, explorando assim uma noção de tempo circular, onde presente, passado e futuro se misturam, especialmente no campo da arte, em que a imaginação e o pensamento criativo são capazes de ultrapassar os limites do tempo e do espaço, inventando novos mundos e evitando que os processos se finalizem.
Encerre sua carta comentando o que gostaria de investigar daqui para frente: que arte e cultura você vai fazer? Que arte e cultura você quer vivenciar?
FERRARIO, Carlos. Cenário da ópera II Guarany – Campo degli Aimoré. 1870. Aquarela, 42,5 cm x 32,6 cm. Museu Imperial, Petrópolis (RJ). Obra de Carlo Ferrario (1833-1907) usada na concepção do cenário da primeira encenação da ópera O Guarani, em Milão (Itália), em 1870.
PETRÓPOLIS, RIO DE JANEIRO
Essa pintura é um estudo para encenação da ópera O Guarani, realizado para sua estreia, que aconteceu em março de 1870, no Teatro Alla Scalla de Milão, na Itália. A partir dessa pintura, os artistas responsáveis pela montagem desenvolveram suas criações, concebendo e produzindo o cenário, o figurino e os adereços. A montagem, como é possível perceber pela aquarela, contava com um elenco numeroso, trajes requintados e um imenso cenário pintado ao fundo, simulando as paisagens da narrativa, como imaginada pelos artistas-criadores. Esse fundo era trocado diversas vezes ao longo da apresentação. Repare como as pessoas indígenas são representadas de maneira exótica e caricata, demonstrando o imaginário europeu sobre os povos indígenas do Brasil no período.
DE VOLTA AO COMEÇO: CARTA PARA O PASSADO
TRANSCRIÇÃO DOS AUDIOS
Unidade 1, Capítulo 1 FAIXA 1 / ILHA DO MARAJÓ
É lá, é lá, é lá, a maior ilha do nosso Pará / É lá, é lá, é lá, a maior ilha do nosso Pará / A Ilha do Marajó tem grande povoação / Aonde nasceu o Carimbó no tempo da escravidão / A ilha do Marajó tem grande povoação / Aonde nasceu o Carimbó no tempo da escravidão
Alô, Marajó!
É lá, é lá, é lá, a maior ilha do nosso Pará / É lá, é lá, é lá, a maior ilha do nosso Pará / A Ilha do Marajó tem grande povoação / Aonde nasceu o Carimbó no tempo da escravidão / A ilha do Marajó tem grande povoação / Aonde nasceu o Carimbó no tempo da escravidão
Alô, Marajó!
Eu vim, eu vim, eu vim, eu vim do Marajó / Eu vim, eu vim, eu vim, eu vim do Marajó / Eu vim amostrar pra essa gente a dança do Carimbó / Eu vim amostrar pra essa gente a dança do Carimbó
Pois é, garoto!
Eu fui passear de canoa, eu fui aprender a remar / A minha canoa furou na Baía do Guajará / Eu fui passear de canoa, eu fui aprender a remar / A minha canoa furou na Baía do Guajará Opa!
ILHA do Marajó. Intérpretes: Mestre Verequete e Grupo Uirapuru. Compositor: Mestre Verequete. In: VEREQUETE é o rei. Intérpretes: Mestre Verequete e Grupo Uirapuru. Belém: Na Music, 2007. Disponível em: www. youtube.com/watch?v=pRo9EECrWw8. Acesso em: 30 out. 2024. FAIXA 2 / POT-POURRI DE CARIMBÓ
Se você quer aprender um molejo diferente / Vá em frente e deixa o corpo te levar / Sem vergonha levanta a cabeça e vai em frente / Fica frio, o negócio é só balancear / Mexe o bumbum e mais que de repente / Não faltará um moreno a fim de ensinar / Mexe o bumbum e mais que de repente / Não faltará um moreno a fim de ensinar
Mexe a cintura pra trás / Pra frente um passinho só / Agora dá uma rodadinha / E dance assim o Carimbó / Mexe a cintura pra trás / Pra frente um passinho só / Agora dá uma rodadinha / E dance assim…
Tem que ter a cintura de mola / Pra dançar em Belém do Pará / Lambada, Calypso, Socamandu, Carimbó, Sirimbó, Siriá / Você tem um sorriso faceiro / E um brilho envolvente no olhar / Quando eu olho pro seu rebolado / Imagino seu jeito de amar / Quando eu olho pro seu rebolado / Imagino seu jeito de amar
Rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, embola / Quero ver você mexer, quero ver você dançar / Rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, embola / Quero ver você mexer, quero ver você dançar / Quero ver você mexer, quero ver você dançar
Rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, embola / Quero ver você mexer, quero ver você dançar / Rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, embola / Quero ver você mexer, quero ver você dançar
Rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, embola / Quero ver você mexer, quero ver você dançar / Rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, rebola, embola / Quero ver você mexer, quero ver você dançar / Quero ver você mexer, quero ver você dançar
Transcrito de: BANDA Calypso: pot pourri de carimbó: pra dançar Carimbó / Rebola. [S. l. : s. n.], 2020. 1 vídeo (3 min). Publicado pelo canal Banda Calypso Oficial. Disponível em: https://youtu.be/YPUVx3K8Wi4?si=91aTG7xBlFvHpyzh. Acesso em: 30 out. 2024.
Unidade 1, Capítulo 2 FAIXA 3 / MANDJÓLÒ
Mandjòlô / Nd’yà ka Mandjòlô / Kè m’baku / Nd’yà ka Mandjòlô
Hantlissa mu pfana / U ta ndy kuma ndlêlêny!
Lôku ndy sukaka padêni, minè / N’kwãkwãnana / Y n’gwavela kwapa ndlela / Ndy mu zinguiry minè
Kòdwa u suka Ximbanguini, muzay / N’kwãkwãnana / Y n’gwavela kwapa ndlela / U mu ndyndyndy wénè
Lôku ndy sukaka padêni, minè / N’kwãkwãnana / Y n’gwavela kwapa ndlela / Ndy mu zinguiry minè
Kòdwa u suka Ximbanguini, muzay / N’kwãkwãnana / Y n’gwavela kwapa ndlela / U mu ndyndyndy wénè
Ka Zantaca va longolokylè / Ka Zithundu va longa psy djumba / Ku ta buya ny va ka Khatwany / Ndy lêlêtêlêny kôlê ka Tembe
A xiguila xy kwyni / Ndy ta kina xigubu / Ka mu khulu / N’davèzitha
Na ndy tsimbi bèdjwa, kwa ndê! / Ndy tlhanguela T’rapezulu
K’ha n’pfa ndy nga psi tive / Eh psaku ku ni unandi ka Mandjólò
Ndy nhiketêny n’duku / N’dy ta vika ma tsôtsy / N’dlelêny, ka Madjuva
MANDJÓLÒ. Intérprete: Costa Neto. Compositor: Costa Neto. In: MANDJÓLÒ. Intérprete: Costa Neto. [Queijas]: Vachier & Associados, 2009. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=LUmwp6NdK8Q. Acesso em: 30 out. 2024.
FAIXA 4 / VAI QUEBRANDO (DESCE QUE DESCE)
Vai quebrando de ladinho (desce que desce)
VAI Quebrando (desce que desce). Intérpretes: Leo Justi, MC CL e DJ Seduty. Compositores: Leo Justi, MC CL e DJ Seduty. Rio de Janeiro: Heavy Baile Sounds, 2020. Disponível em: www.youtube.com/ watch?v=R6JKnkLRy6U. Acesso em: 30 out. 2024.
FAIXA 5 / ZOMBIE
[Introdução instrumental]
Zombie o, zombie (Zombie o, zombie) / Zombie o, zombie (Zombie o, zombie)
Zombie no go go, unless you tell am to go (Zombie) / Zombie no go stop, unless you tell am to stop (Zombie) […] ZOMBIE. Intérprete: Fela Kuti. Compositor: Fela Kuti. In: FELA Kuti and Afrika 70: Zombie. Produção: Fela Kuti. Nigéria: Coconut Records, 1977. Disponível em: https://youtu.be/Qj5x6pbJMyU?si=7pSW aEct7xL-UDAG. Acesso em: 1 nov. 2024.
FAIXA 6 / AO SOM DO IJEXÁ E DO FUNK (PARTE 1)
[Vinheta de abertura]
Vamos experimentar tocar os ritmos básicos do ijexá e do funk? Já aprendemos sobre esses gêneros musicais ao longo do capítulo. Agora, é hora de experimentá-los no nosso corpo. Ouça as batidas que marcam uma pulsação. Um, dois, três, quatro.
[Batidas do metrônomo]
Procure andar em sincronia com as batidas, alternando seu pé forte – o direito para os destros e o esquerdo para os canhotos – e o seu pé fraco.
Assim teremos: forte – fraco – forte – fraco; forte – fraco – forte – fraco; forte – fraco – forte – fraco; forte – fraco –forte – fraco.
Use as ilustrações presentes no seu livro para mapear seu movimento. Observe que, ao andar desse modo, as suas pisadas marcam os vértices de um quadrado no chão. Esse ciclo de quatro tempos forma compassos quaternários.
Vamos experimentar tocar o ritmo do ijexá, mantendo sempre a marcação da pulsação e dos compassos quaternários. Para começar, siga o esquema do seu livro e bata uma
palma aguda para cada passo que você der. Um, dois, três, quatro; um, dois, três, quatro; um, dois, três, quatro.
[Batidas do metrônomo e palmas]
Nesse caso, o ritmo que fazemos nas palmas corresponde aos tempos do compasso.
Agora, vamos experimentar outro ritmo. Siga marcando a pulsação com o movimento de caminhada dos pés, mas, dessa vez, bateremos duas palmas graves, com as mãos em forma de concha, no tempo 2 e outras duas no tempo 4.
[Batidas do metrônomo e palmas]
Um, dois, três, quatro; um, dois e, três, quatro e; um, dois e, três, quatro e.
Nesse caso, nem sempre as palmas equivalem aos tempos do compasso. Nesse ritmo, tocamos nos tempos 2 e 4 e em seus contratempos.
Agora vamos juntar os dois ritmos que aprendemos. Dividam a turma em dois grupos. O primeiro grupo tocará a palma aguda e o segundo a palma grave. Enquanto toca, você ouvirá instrumentos de percussão fazendo outros ritmos que compõe o ijexá.
[Batidas do metrônomo e palmas]
Um, dois, três, quatro; um, dois e, três, quatro e; um, dois e, três, quatro.
FAIXA 7 / AO SOM DO IJEXÁ E DO FUNK (PARTE 2)
E então? Conseguiu tocar o ijexá junto com os instrumentos de percussão sem se perder da pulsação, isto é, mantendo o movimento de caminhada com os pés? Vamos experimentar fazer o mesmo processo, só que, agora, com os ritmos do funk
Para começar, você deverá bater palmas agudas nos tempos 2 e 4. Não esqueça de permanecer caminhando nos tempos 1 e 3, certo?
O ritmo da palma grave do funk é um pouco mais difícil. Você deverá tocar no tempo 1 e no contratempo dos tempos 2 e 3. Ou seja, deverá andar nos tempos 2 e 3, mas só bater as palmas depois deles. Se preciso, escute mais de uma vez para compreender bem.
[Batidas do metrônomo e palmas]
Um, dois, três, quatro; um, e, e; um, e, e.
Agora é a hora de juntar as palmas agudas e graves do funk . Novamente, dividam-se em dois grupos. Um grupo deverá tocar as palmas agudas nos tempos 2 e 4 e o outro grupo as palmas graves nos tempos 1 e no contratempo do 2 e do 3. Novamente você ouvirá instrumentos de percussão tocando com você. Procure não perder a pulsação e continue tocando o funk junto com a gravação.
[Batidas do metrônomo, palmas e instrumentos]
Um, dois, três, quatro; um, dois e, três e, quatro; um, dois e, três e, quatro.
E então? Conseguiu executar os ritmos do funk junto com os instrumentos de percussão? Qual você achou mais fácil de acompanhar? O funk ou o ijexá? Tem alguma palma que foi mais simples para você? Compartilhe com a sua turma e, se quiserem, repitam o exercício com as bases a seguir.
Base do ijexá:
[Batidas do metrônomo e instrumentos]
Um, dois, três, quatro.
Base do funk :
[Batidas do metrônomo e instrumentos]
Um, dois, três, quatro.
[Vinheta de encerramento]
Unidade 1, Capítulo 3
FAIXA 8 / INSTRUMENTOS DA ORQUESTRA (PARTE 1)
[Vinheta de abertura]
Esse áudio acompanha a atividade de dança do capítulo 3
Ouça atentamente e siga as instruções da atividade do seu livro.
Ouça o violino: [Composição para violino]
Ouça o clarinete: [Composição para clarinete]
Ouça o tímpano: [Composição para tímpano]
Ouça o trompete: [Composição para trompete]
Ouça a harpa: [Composição para harpa]
FAIXA 9 / INSTRUMENTOS DA ORQUESTRA (PARTE 2)
Agora vamos ouvir combinações de dois instrumentos.
Ouça o violino e o clarinete: [Composição para violino e clarinete]
Ouça o tímpano e o trompete: [Composição para tímpano e trompete]
Ouça um trecho com toda a orquestra tocando: [Trecho orquestral]
[Vinheta de encerramento]
Unidade 2, Capítulo 4
FAIXA 10 / PULSAÇÃO E COMPASSO (PARTE 1)
[Vinheta de abertura]
No capítulo 2 , aprendemos sobre ritmo e pulsação. Compreendemos que o ritmo é um evento musical que acontece em relação à pulsação. O pulso, ou pulsação, por sua vez, se relaciona com o fluxo, aquilo que permanece em movimento na música.
Assim, podemos tocar diferentes ritmos a partir de uma pulsação. Ouça as batidas do metrônomo e tente bater os pés no chão junto com essa marcação.
[Batidas do metrônomo]
Você consegue criar um ritmo improvisado nas palmas a partir dessa pulsação?
[Palmas]
Podemos agrupar a pulsação em diferentes ciclos, os quais chamamos compassos.
Para entendermos melhor a diferença entre os compassos de quatro, três e dois tempos, vamos usar o nosso corpo. Siga o gráfico do seu livro e acompanhe as instruções do áudio.
Vamos começar pelo compasso quaternário, que já conhecemos anteriormente. Para isso, você irá marcar os vértices de um quadrado no chão, alternando o pé forte –direito para os destros e esquerdo para os canhotos – e o pé fraco. Você estará sempre andando para frente e para trás.
Um, dois, três, quatro; um, dois, três, quatro.
[Batidas do metrônomo]
Siga marcando o compasso quaternário com os pés enquanto ouve a ciranda “Minha sabiá, minha zabelê”, uma ciranda de domínio público. A ciranda é um gênero musical característico de Pernambuco. Ouça a versão que fizemos de um trecho dessa canção.
Um, dois, três, quatro.
[trecho de “Minha sabiá, minha zabelê”]
Minha sabiá, minha zabelê / Toda madrugada eu sonhava com você / Se você duvida vou sonhar pra você ver / Minha sabiá, minha zabelê / Toda madrugada eu sonhava com você / Se você duvida vou sonhar pra você ver
Agora vamos experimentar marcar o compasso ternário com os pés. Mais uma vez siga a ilustração do seu livro para compreender o movimento. Observe que você deverá marcar os vértices de um triângulo no chão e alternar o pé que vai ao vértice A. Da primeira vez, deverá cruzar o pé direito à frente, o esquerdo no C e o direito novamente no B. Da segunda vez, o pé esquerdo irá ao vértice A, o direito ao B e o esquerdo novamente ao C. Ficaremos então com:
Um, dois, três; A, C, B; A, B, C; A, C, B; A, B, C; um, dois, três; um, dois, três.
[Batidas do metrônomo]
Minha sabiá, minha zabelê / Toda madrugada eu sonhava com você / Se você duvida vou sonhar pra você ver / Minha sabiá, minha zabelê / Toda madrugada eu sonhava com você / Se você duvida vou sonhar pra você ver […]
MINHA sabiá, minha zabelê. Ciranda. Informação verbal. Agora por fim, vamos aprender o compasso binário. Siga as instruções do seu livro e marque o tempo 1 a frente, com o pé forte, e o tempo 2, atrás. Um, dois; um, dois; um, dois.
[Batidas do metrônomo]
Minha sabiá, minha zabelê / Toda madrugada eu sonhava com você / Se você duvida vou sonhar pra você ver / Minha sabiá, minha zabelê / Toda madrugada eu sonhava com você / Se você duvida vou sonhar pra você ver […]
MINHA sabiá, minha zabelê. Ciranda. Informação verbal. Para cada compasso temos uma maneira própria de se movimentar e agrupar a pulsação. E então? Conseguiu perceber a diferença entre os compassos quaternário, ternário e binário? Experimente cantar outras músicas e perceber em quais compassos elas foram compostas.
[Vinheta de encerramento]
FAIXA 12 / DANÇANDO O TANGO-BRASILEIRO: ODEON
[Vinheta de abertura]
Esse áudio compõe a atividade “Dançar a dois ou a duas” do seu livro. Assim, acompanhe as instruções da atividade juntamente com as dicas do áudio. Para começar vamos identificar a pulsação da música Odeon, uma composição de Ernesto Nazareth.
Ouça a marcação do metrônomo e busque caminhar junto com as batidas. Se mantenha na pulsação enquanto escuta a música executada pelo piano. Se preciso, repita mais de uma vez o exercício.
Um, dois, três, quatro.
[Batidas do metrônomo]
[trecho de Odeon , de Ernesto Nazareth, por Arthur Moreira Lima, piano]
ERNESTO Nazareth: Odeon (Arthur Moreira Lima, piano). [S. l.: s. n.], 2021. 1 vídeo (3 min). Publicado pelo canal Instituto Piano Brasileiro: IPB. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=Y59t7AWC6vA.
Acesso em: 30 out. 2024.
Conseguiu caminhar junto com a pulsação da música?
Siga a atividade, repetindo esse áudio quantas vezes achar necessário.
[Vinheta de encerramento]
FAIXA 13 / DANÇANDO A VALSA: JULIETA
[Vinheta de abertura]
Esse áudio compõe a atividade No tempo da valsa do seu livro. Acompanhe as instruções da etapa No tempo da valsa juntamente com as dicas do áudio.
Novamente, vamos identificar a pulsação da música. Dessa vez, você deve bater uma palma sempre que perceber o tempo 1.
[Batidas do metrônomo e palmas]
Um, dois, três; um, dois, três.
[trecho de Julieta, de Ernesto Nazareth, por Maria Nadir, piano]
ERNESTO Nazareth: Julieta (valsa) (Maria Nadir, piano). [S. l.: s. n.], 2021. 1 vídeo (5 min). Publicado pelo canal Instituto Piano Brasileiro: IPB. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=iQnLidW_q3Q. Acesso em: 30 out. 2024.
Conseguiu identificar o tempo 1 da valsa? Agora, faremos a mesma marcação do tempo 1, só que, além das palmas, usaremos os pés e nos movimentaremos de um lado para o outro.
Siga as instruções do seu livro e repita esse áudio quantas vezes achar necessário.
[Vinheta de encerramento]
Unidade 3, Capítulo 7
FAIXA 14
[Vinheta de abertura]
Base do rap 1
Vamos ouvir e criar rap a partir de novos beats. Ouçam a base e sigam a atividade proposta no seu livro a partir dela.
Primeira base: [Base de rap]
FAIXA 15
Base do rap 2
Vamos ouvir e criar rap a partir de novos beats. Ouçam a base e sigam a atividade proposta no seu livro a partir dela.
Segunda base: [Base de rap]
[Vinheta de encerramento]
REFERÊNCIAS BIBlIOGRÁFICAS COMENTADAS
Unidade 1: Matrizes culturais
ARTES VISUAIS
ECO, Umberto (org.). História da beleza. Rio de Janeiro: Record, 2010.
Reunindo centenas de imagens do cânone da arte eurocêntrica, o livro apresenta diferentes concepções de beleza, desde a Grécia antiga, constituindo um vasto painel dos diversos conceitos relacionados ao tema.
PEDROSA, Adriano; SCHWARCZ, Lilia (org.). Histórias mestiças: catálogo. Rio de Janeiro: Cobogó; São Paulo: Instituto Tomie Ohtake, 2015.
A exposição “Histórias mestiças”, que ocorreu no Instituto Tomie Ohtake em 2014, organizada por Adriano Pedrosa e Lilia Schwarcz, marcou uma mudança institucional na construção de um olhar decolonial para a produção da arte no Brasil. Reunindo textos, imagens e objetos para contar histórias que sofreram preconceitos e apagamentos ao longo de 500 anos, os curadores apresentaram uma outra configuração crítica e estética para a cultura brasileira.
DANÇA
KRENAK, Ailton. O lugar onde a terra descansa. Rio de Janeiro: Petrobras, 2000.
O livro traz registros fotográficos de diferentes povos indígenas e texto de Ailton Krenak, no qual o autor compartilha experiências, tradições e preocupações, reflexos de suas vivências, como um krenak, com outros povos indígenas e em contextos urbanos e rurais.
SABINO, Jorge; LODY, Raul. Dança de matriz africana: antropologia do movimento. Rio de Janeiro: Pallas, 2011.
Nessa obra, os autores discutem a matriz africana de danças populares brasileiras e as suas manifestações.
MÚSICA
FARGETTI, Cristina Martins; MIRANDA, Marlui. Fala de bicho, fala de gente:
cantigas de ninar do povo juruna. São Paulo: Edições Sesc, 2017.
O livro traz a análise de 49 cantigas de ninar jurunas cantadas pelos bichos-gente, categoria que remonta à cosmologia ancestral juruna. O material também traz partituras e estudos da musicista Marlui Miranda.
TEATRO
DORRICO, Trudruá; RECALDES, Luna Rosa (org.). Caixa de dramaturgias indígenas. São Paulo: Outra Margem: n-1, 2023.
A publicação reúne peças escritas por artistas indígenas (algumas delas produzidas em parceria com artistas não indígenas) de diversas partes do Brasil, assim como do Chile e da Argentina.
DUARTE, Andreia. A efemeridade de O silêncio do mundo. Corpo Futuro, Porto Alegre, v. 2, n. 1, p. 142-145, 2021. Texto de Andreia Duarte sobre o processo criativo do experimento cênico O silêncio do mundo, feito em coautoria com Ailton Krenak e Davi Kopenawa.
MUNDURUKU, Daniel. Meu vô Apolinário: um mergulho no rio da (minha) memória. São Paulo: Studio Nobel, 2009. O livro traz memórias da convivência de Daniel Munduruku com seu avô Apolinário. A convivência é marcada pelos saberes compartilhados por meio de histórias e marca a formação da própria identidade do escritor.
ARTES INTEGRADAS
ABREU, Regina; CHAGAS, Mário (org.). Memória e patrimônio: ensaios contemporâneos. 2. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2009.
O livro trata do conceito de patrimônio imaterial de maneira detalhada, abarcando manifestações culturais, como danças, pinturas corporais e grafismos. Escrito no momento de implementação de políticas públicas de reconhecimento e preservação do patrimônio imaterial, o livro apresenta artigos diversos que discutem questões relevantes para o tema.
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
DANÇA
SILVA JUNIOR, Paulo Melgaço da. Mercedes Baptista: a dama negra da dança. 2. ed. São Paulo: Ciclo Contínuo, 2021. Nesse livro, Paulo Melgaço aborda a construção da identidade negra nas artes brasileiras, com base na trajetória e na contribuição de Mercedes Baptista para a dança cênica.
MÚSICA
VIANNA, Hermano. O mistério do samba. Rio de Janeiro: Zahar, 1995.
Por muito tempo, o samba foi discriminado e visto como uma expressão artística a ser reprimida. Como ele se transformou em símbolo de identidade nacional? Essa é a pergunta que move o livro.
TEATRO
FARIA, João Roberto (org.). História do teatro brasileiro: das origens ao teatro profissional da primeira metade do século XX. São Paulo: Edições Sesc: Perspectiva, 2012. v. 1.
O primeiro volume da obra aborda o desenvolvimento das artes cênicas brasileiras, desde as origens até as tendências contemporâneas. Nesse primeiro volume, são abordadas as origens do teatro brasileiro até a primeira metade do século XX. FARIA, João Roberto (org.). História do teatro brasileiro: do modernismo às tendências contemporâneas. São Paulo: Edições Sesc: Perspectiva, 2013. v. 2.
O segundo volume da obra cobre a história do modernismo até as tendências contemporâneas.
ARTES INTEGRADAS
Santaella, Lucia (org). Novas formas do audiovisual. Barueri: Estação das Letras e Cores, 2019.
Nesse livro, organizado por Lucia Santaella, são apresentados textos inéditos que abordam práticas experimentais na produção audiovisual, envolvendo principalmente as tecnologias digitais.
Unidade 3: Arte hoje
ARTES VISUAIS
PEDROSA, Adriano; TOLEDO, Tomás (org.). Histórias afro-atlânticas: catálogo. São Paulo: MASP: Instituto Tomie Ohtake, 2018. v. 1.
O catálogo reúne textos e imagens da exposição que marcou os 130 anos da abolição da escravização, sistema que sustentou o violento processo de colonização promovido pelos europeus nas Américas, no Caribe e na África. Partindo da arte e da criação, a exposição reuniu mais de 400 obras desses continentes, apresentadas em oito núcleos e mais de quarenta textos, envolvendo publicações e seminários ao longo do ano de 2018.
NEUENSCHWANDER, Rivane; LACERDA, Mariana. Reviravolta de Gaia. Rio de Janeiro: Cobogó, 2023.
O livro documenta fotograficamente o projeto da artista mineira Rivane Neuenschwander, Reviravolta de Gaia. Com textos de curadores e pensadores contemporâneos, a obra reflete sobre o cenário atual do avanço do capital sobre a vida na Terra.
DANÇA
LOUPPE, Laurence. Poética da dança contemporânea. Tradução: Rute Costa. 1. ed. Lisboa: Orfeu Negro, 2012. Nessa obra, edição em língua portuguesa de livro lançado em 1997 na França, a pesquisadora da dança Laurence Louppe discute o surgimento da dança contemporânea e seu diálogo com a modernidade, com base no corpo em movimento.
MÚSICA
CAMARGOS, Roberto. Rap e política: percepções da vida social brasileira. São Paulo: Boitempo, 2015.
Com um recorte histórico voltado para o rap e o contexto brasileiro entre os anos 1990 e 2015, a obra mostra o vínculo entre as rimas e batidas do rap e a realidade sócio-histórica do país.
GRIFFITHS, Paul. A música moderna: uma história concisa e ilustrada de Debussy a Boulez. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
O livro traz um estudo sobre a história da música do fim do século XIX até o século XX, abordando as transformações e inovações que surgiram ao longo desses anos.
TEATRO
KOUDELA, Ingrid Dormien; ALMEIDA JÚNIOR, José Simões de (org.). Léxico de pedagogia do teatro. São Paulo: Perspectiva, 2015.
Estruturada na forma de um dicionário, a obra reúne verbetes ligados ao ensino e à prática das artes cênicas. Ela é resultado do trabalho coletivo de pesquisadores brasileiros e portugueses.
ARTES INTEGRADAS
LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: 34, 1999.
Uma referência quando se trata de questionamentos sobre a internet e as novas tecnologias digitais, o pesquisador Pierre Lévy apresenta a definição do conceito título da obra de forma didática e acessível, associando-a a um conjunto de técnicas, práticas e valores, que se consolidam no espaço virtual (ciberespaço), em conexão com dispositivos como computadores e celulares.
ARTE EDUCAÇÃO
PISEAGRAMA. Piseagrama, Belo Horizonte, n. 6-15, 2013/2022.
A revista Piseagrama é uma plataforma editorial sem fins lucrativos que se dedica a reunir pessoas para pensar outros mundos possíveis e a divulgar essas ideias. Iniciada em 2010, a revista vem sendo impressa regularmente e disponibiliza todo o seu conteúdo on-line gratuitamente.
Apresentação
ORIENTAÇÕES PARA O PROFESSOR
Estas orientações foram concebidas com o objetivo de apoiar a atividade didática dos professores do componente curricular Arte no Ensino Médio. Para isso, os temas relacionados a esse componente e às suas linguagens artísticas foram estruturados com um olhar generoso para a diversidade cultural brasileira.
A arte não obedece a uma gramática correta. Não existe uma formatação certa para a expressão e a construção nas linguagens artísticas. O processo de ensino-aprendizagem em Arte, especialmente na etapa do Ensino Médio, possui um permanente caráter investigativo e transformador.
A arte está cada vez mais presente na vida cotidiana dos jovens, daí a urgência de trazê-la para o ambiente escolar como um dispositivo capaz de inquietá-los, despertando-os, por meio da experiência estética, para a busca do conhecimento.
Nesse sentido, ao se apropriarem da obra, os professores são convidados a mediar esse diálogo entre os estudantes e a arte, acompanhando os debates, orientando as atividades e trazendo sua bagagem cultural para enriquecer a troca de saberes que deve ocorrer na escola.
A fim de auxiliá-los nessa mediação, foram elaboradas as Orientações pedagógicas a seguir, que trazem informações complementares, como textos que subsidiam os temas propostos e indicações de como conduzir as atividades. Com isso, pretende-se oferecer, acima de tudo, um incentivo à pesquisa, ao questionamento e à reflexão acerca do processo de ensino-aprendizagem da Arte.
Os autores
SUMÁRIO
Orientações pedagógicas gerais .. 355
1. O ensino de arte na escola: algumas referências .......................................... 355
A linguagem das artes visuais ........................ 355
A linguagem da dança ..................................... 355
A linguagem da música .................................... 356
A linguagem do teatro ..................................... 356
As linguagens das artes integradas ............... 356
2. Premissas teóricas e metodológicas .................................... 357
Percursos para o ensino da arte ..................... 357 Artes visuais ............................................................. 359
O ensino de Arte, desde as primeiras décadas do século XXI, vem ganhando mais importância. As novas tecnologias levaram o processo de ensino-aprendizagem para além do espaço escolar e da oferta restrita de fontes de pesquisa e estudo; o professor passou a assumir o papel de mediador do processo de ensino e aprendizagem; e ficou evidente a necessidade de reconhecer e valorizar o repertório e a produção artística do próprio estudante, que podem ser ponto de partida para debates.
Acreditando na potência da arte para tratar de temas de relevância ética e estética, torna-se fundamental enfatizar propostas inter e transdisciplinares para o ensino da Arte no Ensino Médio.
A linguagem das artes visuais
Considerando o impacto das novas tecnologias e das mídias no cotidiano dos jovens, diversos educadores passaram a defender uma abordagem mais abrangente para o ensino das artes visuais, denominada cultura visual. Essa vertente propõe eliminar as distinções conceituais entre arte e cultura, valorizar o repertório dos estudantes e compreender os aspectos visuais como importantes fontes culturais.
Independentemente da abordagem metodológica, a linguagem das artes visuais ocupou papel central no componente Arte nas últimas décadas. Atualmente, é necessária uma reorganização dos conteúdos para ampliar o acolhimento às outras linguagens artísticas. Assim, é fundamental reformular as abordagens das artes visuais e priorizar a arte contemporânea, as linguagens híbridas e sua diversidade.
Para explorar as artes visuais dentro da perspectiva da cultura visual, é necessário que, além de ler os textos, o estudante seja incentivado a observar as imagens de modo a apreender os discursos visuais e dialogar com as criações. Cabe ao professor propor a interpretação e a discussão dessas imagens, assegurando ao estudante o tempo necessário para elaborar reflexões sobre elas.
As atividades de artes visuais propostas nesta coleção preocupam-se em explorar diferentes formas de
expressão artística. Recomenda-se incentivar o estudante a utilizar o desenho em seu cotidiano, por meio de estudos, da elaboração de gráficos e da realização de anotações visuais. O desenho é uma das bases da linguagem das artes visuais e desenvolve, no estudante, a capacidade de raciocinar usando elementos gráficos.
A pintura também é contemplada nesta obra. Sobrepor cores e manchas, preparar tintas e experimentar diferentes suportes colabora para despertar o universo emocional e poético dos jovens.
Uma das atividades recomenda explorar a fotografia por meio da realização de um retrato, incentivando, no estudante, a observação e a capacidade de direcionar um olhar atento a aspectos do mundo ao seu redor.
Uma atividade com módulos geométricos promove o desenvolvimento do pensamento abstrato, estimulando a elaboração de composições com linhas, formas e cores.
Há também propostas que envolvem o trabalho com formas tridimensionais e a elaboração de um projeto de monumento, visando ao desenvolvimento da imaginação espacial e das habilidades construtivas.
Em outra proposta, o estudante é convidado a explorar o bordado e a costura, apropriando-se de técnicas do trabalho manual e enfrentando o desafio do tempo envolvido no processo criativo.
A linguagem da dança
Para assegurar um lugar de valor para a dança nas escolas brasileiras, é fundamental aprofundar a reflexão sobre a dança como linguagem artística no contexto escolar, com base em concepções de corpo, dança e ensino que reforcem ideais e valores compatíveis com a atual realidade educacional brasileira. A dança na escola deve ser entendida em suas manifestações plurais, integrando o repertório corporal e simbólico da diversidade dos estudantes e artistas. Acima de tudo, a experiência de dançar não deve ser exclusiva das meninas ou daqueles que têm determinadas características físicas e habilidades motoras.
Um importante tema relacionado à dança é a identidade. Abordar questões relativas ao corpo, com base na arte, pode trazer esse processo à tona, possibilitando a problematização de visões cristalizadas sobre “o outro”, o diferente. A discussão sobre identidade, a partir do ensino da dança, contribui para a desconstrução de preconceitos e posturas discriminatórias, promovendo o convívio com a diversidade.
A participação de estudantes com deficiência e neurodivergentes nas aulas deve ser incentivada, pois cada corpo constrói sua própria experiência em dança com base em sua identidade. Para além da necessidade de integrar a pessoa com deficiência no conjunto das práticas artísticas na escola, a aceitação e a valorização das singularidades enfatizam a ideia de que corpos diferentes criam diferentes danças.
A linguagem da música
Nesta obra, a proposta é aproximar a arte musical da vida do estudante, apresentando-a como uma expressão acessível a todos. A música aglutina experiências, sendo um importante registro imaterial, impalpável e invisível de vidas e impressões, bem como uma poderosa forma de transmitir sensações. A primeira intenção é fornecer ao estudante elementos que evidenciem que a música, como expressão cultural, é também produto de construções sociais e históricas e guarda em si traços dos conflitos que a constituem.
Cada grupo cultural tem suas próprias formas de fruição e produção musical, e elas devem ser devidamente contextualizadas. Assim, compreender a manifestação musical indígena, bem como sua relação com a natureza e com os rituais, é fundamental para aproximar o estudante dessa expressão cultural. Do mesmo modo, pesquisar a vida e a obra de personalidades do samba é compreender a história e os conflitos que permeiam esse gênero musical.
O aprendizado da teoria musical atua como ferramenta para aprofundar essa contextualização. Os conteúdos de melodia, ritmo, harmonia e texto ajudam o estudante a compreender as expressões culturais exploradas no material.
Ao abordar a educação musical nas escolas, é fundamental considerar uma dificuldade recorrente: a escassa ou inexistente disponibilidade de instrumentos musicais. Para contornar essa limitação, propõem-se atividades que alternam o uso da voz e do corpo na produção musical e sugere-se a utilização de instrumentos que podem ser construídos com recursos simples. Em parte das atividades, são recomendados, ainda, a realização de pesquisas na internet e o uso de instrumentos virtuais.
É importante ressaltar que a proposta de abordagem musical presente no Livro do estudante só se faz completa à medida que a coletânea de áudios que o acompanha é utilizada. Ela traz faixas ilustrativas dos temas dos capítulos, com o propósito de direcionar a escuta do estudante para um tipo de apreciação que envolve distintos elementos da música, e faixas que aprofundam conteúdos abordados e orientam atividades propostas.
Neste material, a arte musical é entendida como uma forma de interação, considerando as conexões que a música estabelece em diferentes contextos. A música se constitui com base em uma rede de relações, ligando o tempo e a experiência de quem a ouve ao tempo e à vivência de quem a produz.
A linguagem do teatro
Uma das características do teatro é sua efemeridade. Embora seja possível documentar diversos de seus aspectos, o evento teatral não pode ser fixado em sua totalidade. Isso coloca o estudo da linguagem teatral em um permanente estado investigativo.
Muito pode ser experimentado por meio das atividades propostas no Livro do estudante: a exploração do corpo e da voz na construção das personagens; a utilização de espaços alternativos da escola para as encenações; e o fortalecimento dos laços entre os estudantes por meio do trabalho em grupo. Essa experimentação prática de aspectos do dia a dia enriquece a sensibilidade e o repertório dos estudantes, proporcionando maior compreensão da realidade que os cerca.
As atividades propostas se concentram no acontecimento teatral, investigando os elementos concretos que o constituem, com base no conceito de jogo teatral. Nessa perspectiva pedagógica, o princípio lúdico é considerado o motor do processo de ensino-aprendizagem e da experimentação. No jogo teatral, todos os participantes se voltam a um objetivo comum: a criação artística. Para isso, é fundamental colocar-se em um estado de jogo extracotidiano, caracterizado por concentração e expressão.
Esse princípio lúdico deve ser mantido, sobretudo, nas atividades de leitura de dramaturgia e de improviso de cena. Uma abordagem prazerosa de um texto teatral pode modificar a relação de um estudante com o ato da leitura.
As linguagens das artes integradas
A BNCC descreve conhecimentos e habilidades específicos das quatro linguagens do componente curricular Arte – artes visuais, dança, música e teatro. Nesse sentido, as artes integradas atuam como um quinto elemento, promovendo o intercâmbio de saberes e experiências entre as demais linguagens. Essa abordagem amplia a fruição e a criação artística, apoiando-se no uso dos dispositivos digitais e nas tecnologias da comunicação.
O potencial das artes integradas pode ser avaliado tanto no campo da teoria quanto na prática. Embora a BNCC não forneça uma explicação detalhada sobre a melhor abordagem para esse conceito, é possível conectá-lo
a um processo integrativo que abarca diversas formas de expressão que perpassam as múltiplas linguagens artísticas. Assim, é importante fazer um resgate histórico para entender as artes integradas para além da mera polivalência. Esse aspecto é relevante, pois, durante certo período no Brasil, era comum pensar em propostas que combinavam as linguagens artísticas. Porém, aos poucos, incorporou-se a luta pela especificidade de cada linguagem artística, reconhecendo a complexidade e os conteúdos próprios de cada campo das artes.
Dito isso, é possível entender as artes integradas como formas de pesquisa, conexão e inter-relação de conhecimentos. Com base na BNCC, as artes integradas abrangem dois campos complementares. O primeiro diz respeito aos experimentos híbridos que surgem da interação entre as linguagens artísticas que constituem o componente Arte. O segundo funciona como um guarda-chuva conceitual que acolhe linguagens e práticas artísticas que, embora emerjam do intercâmbio entre diferentes formas de expressão, constituem objetos de conhecimento próprios, como a linguagem do circo, do audiovisual, da performance, da cultura digital, além do vasto campo do Patrimônio Cultural Material e Imaterial.
Ao se propor a integração das artes, a singularidade de cada expressão artística não é desvalorizada; ao contrário, é com base na compreensão sólida e aprofundada das linguagens artísticas que se pode desenvolver uma produção que as integre, evitando que a criação resultante seja superficial ou desordenada.
A metodologia contida nessa maneira de lidar com as artes integradas baseia-se na colaboração tanto entre as linguagens artísticas quanto entre os envolvidos, sejam professores, sejam estudantes. Sua elaboração se ancora em uma abordagem interdisciplinar, apoiada no diálogo social, cultural e histórico, nos sentidos, nas metáforas, nos sentimentos, nas técnicas e nos materiais. Além disso, considera-se o lugar onde a ação artística se desenvolve.
Ao criar filmes, intervenções, saraus, arte digital e investigar o patrimônio cultural ao seu redor, o estudante experiencia um processo de ensino-aprendizagem em Arte que dialoga com a realidade contemporânea.
2. Premissas teóricas e metodológicas
Diante de um cenário de complexas demandas pedagógicas, sociais e de formação do estudante-cidadão, a
proposta conceitual para o ensino de Arte no Ensino Médio foi elaborada com o objetivo de contemplar a interculturalidade crítica. Isso significa tratar a produção cultural como resultado da interação entre diferentes grupos humanos. A proposta busca uma abordagem interdisciplinar e transdisciplinar, integrando as diferentes linguagens artísticas do componente curricular Arte, sem perder de vista que o ensino de Arte permanece como o principal objetivo a ser alcançado.
A Arte, como área de conhecimento, está associada ao desenvolvimento cognitivo1. Nesse sentido, a proposta metodológica deste material parte da convicção de que, por meio das várias linguagens artísticas, é possível instigar o estudante a desenvolver uma percepção sensível do ambiente, para a reflexão, a imaginação, a interpretação, a formulação de hipóteses e a produção de visões de mundo diferenciadas.
Através da arte é possível desenvolver a percepção e a imaginação para apreender a realidade do meio ambiente, desenvolver a capacidade crítica, permitindo analisar a realidade percebida e desenvolver a capacidade criadora de maneira a mudar a realidade que foi analisada.2
Dessa forma, os processos de ensino-aprendizagem em Arte tornam-se uma ferramenta de questionamento da realidade, sendo baseados em leitura e atuação no mundo, possibilitadas pelas experiências artísticas. Os acontecimentos e fenômenos artísticos são mobilizados como fatos sociais e culturais completos, permitindo ao professor de Arte articular suas experiências de ensino-aprendizagem com fluidez e abertura, envolvendo as diversas culturas juvenis presentes na sala de aula.
Impulsionadas pelo desejo de transformação da realidade, as aulas de Arte no Ensino Médio podem, por meio da crítica, da poesia e do sensível/sinestésico, provocar mudanças nos repertórios culturais e simbólicos que permeiam o cotidiano escolar.
Percursos para o ensino da arte
Neste material, os distintos saberes artísticos foram organizados em torno de três grandes temas culturais, que estruturam o conhecimento contemporâneo de maneira progressiva. Em resumo, são os três eixos a seguir que orientam as proposições teóricas e práticas de cada unidade do livro.
1 BARBOSA, Ana Mae. Dilemas da arte/educação como mediação cultural em namoro com as tecnologias contemporâneas. In: BARBOSA, Ana Mae (org.). Arte/ educação contemporânea: consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2010. p. 98-112.
2 BARBOSA, ref. 1, p. 100.
• Unidade 1: Matrizes culturais : apresenta reflexões sobre ancestralidade, memória e identidade, investigando as três principais matrizes que formam o que compreendemos como arte e cultura brasileiras.
• Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil: aborda os diferentes processos históricos de formação da arte brasileira, originários da interação entre distintas culturas submetidas ao sistema colonial e à política imperialista.
• Unidade 3: Arte hoje: trabalha as múltiplas expressões culturais e artísticas que se estabeleceram na contemporaneidade, com base no intenso diálogo entre variados contextos culturais ao redor do mundo.
Embora autônomas, as três unidades formam um conjunto articulado que, mesmo sem seguir uma ordem cronológica, traça um percurso que vai do passado para o presente, de forma descontínua. O livro apresenta o passado sob uma perspectiva contemporânea, atualizada e crítica.
Ancestralidade na cultura brasileira
Culturas indígenas
Matrizes
Culturais
Caminhos da arte no Brasil
Arte hoje
Culturas africanas
Culturas europeias
Processo de formação da arte brasileira
Arte e colonização
Modernismos no Brasil
Uma arte tropical
Diálogo entre variados contextos culturais no século XXI
Multiculturalismo
Arte contemporânea
Arte e os desafios do nosso tempo
Um dos grandes desafios do Ensino Médio, último segmento da Educação Básica, é integrar os diversos componentes curriculares sem comprometer o aprofundamento necessário ao amadurecimento intelectual e profissional dos estudantes. Para contornar esse dilema, o conteúdo foi desenvolvido com uma
abordagem transdisciplinar e interdisciplinar, propondo focos de aprofundamento tanto nos temas integradores como nas linguagens artísticas.
As linguagens artísticas do componente curricular Arte foram distribuídas de maneira alternada nos nove capítulos do livro. Cada capítulo trabalha três linguagens escolhidas de acordo com a proximidade delas com o tema abordado. Essa estrutura estabelece um roteiro adequado para que o professor possa tanto explorar a linguagem artística das suas áreas de formação quanto se aventurar nas demais linguagens artísticas, possibilitando uma ampliação das suas áreas de pesquisa e de atuação.
Observe, no diagrama a seguir, a relação dos conteúdos do livro com as distintas linguagens artísticas:
Culturas indígenas
Artes visuais
Música O espírito da floresta
Teatro
Culturas africanas
Culturais
Caminhos da arte no Brasil
Artes visuais
Dança Música Arte contracolonial
Culturas europeias
Teatro
Dança O belo
Artes integradas
Arte e colonização
Artes visuais
Música A construção de uma cultura tropical
Dança
Modernismos no Brasil
Artes visuais
Dança Antropofagia
Teatro
Uma arte tropical Música
Artes integradas
Teatro Liberdade e repressão no país tropical
Matrizes
Arte hoje
Multiculturalismo
Artes visuais
Arte e colonização
Artes visuais
Música Cultura e política na periferia
Dança
Arte contemporânea
Dança
Caminhos da arte no Brasil
Teatro É preciso descolonizar a arte contemporânea
Música
Arte e os desafios do nosso tempo
Artes visuais
Teatro Floresta de Cristal
Artes integradas
A seguir, são relacionados os percursos formativos específicos de cada uma das linguagens artísticas que compõem o componente curricular Arte, com o intuito de explicitar a progressão de aprendizagens desenvolvidas em cada campo. Esses percursos não têm, no entanto, o intuito de demarcar fronteiras rígidas; pelo contrário, as diferentes linguagens artísticas se relacionam de maneira constante no livro, tendo como vínculo o tema das unidades e dos capítulos.
Artes visuais
Culturas indígenas
Artes visuais
Música O espírito da floresta
Teatro
Matrizes
Culturais
Culturas africanas
Artes visuais
Música Arte contracolonial
Dança
Culturas europeias
Teatro
Dança O belo
Artes Integradas
Arte hoje
Dança
Música A construção de uma cultura tropical
Modernismos no Brasil
Artes visuais
Dança Antropofagia
Teatro
Uma arte tropical
Música
Artes integradas
Teatro Liberdade e repressão no país tropical
Multiculturalismo
Artes visuais
Música Cultura e política na periferia
Dança
Arte contemporânea
Dança
Teatro É preciso descolonizar a arte contemporânea
Música
Arte e os desafios do nosso tempo
Artes visuais
Teatro Floresta de Cristal
Artes integradas
Para o percurso de artes visuais, sugere-se o trabalho com os seis capítulos indicados a seguir.
• C ulturas indígenas , que aborda arte e artefatos, adornos, pintura corporal e objetos rituais. Propõe a pesquisa de ritos e artefatos, além da concepção de uma celebração e da construção de objetos para realizá-la.
• C ulturas africanas , que aborda pinturas e padrões, e esculturas de ferro fundido, além de explorar a questão da memória, coletiva e individual, e de como ela aparece na arte contemporânea. Propõe uma pesquisa sobre arte afro-brasileira e um projeto de monumento.
• Arte e colonização, que aborda a chegada da Missão Francesa ao Rio de Janeiro, a escultura no Barroco brasileiro e os primeiros fotógrafos brasileiros, além de tratar brevemente das implicações estéticas do retrato na pintura e na fotografia. Propõe uma pesquisa sobre retrato fotográfico e a execução desse tipo de retrato.
• Modernismos no Brasil, que aborda a Semana de Arte Moderna, as revistas e os manifestos ligados a esse evento, a relação do muralismo com a arquitetura moderna e o Surrealismo no Brasil. Propõe uma pesquisa sobre o centenário da Semana de Arte Moderna, bem como o estudo e a elaboração de uma atividade ligada às relações entre arte e geometria.
Multiculturalismo, que aborda o ambiente multicultural em Nova York, a exposição “Mágicos da Terra” em Paris e as artes visuais para a geração de 1980 no Brasil, além de tratar das técnicas de pintura associadas a materiais diversos, que servem de suporte e como objetivo. Propõe uma pesquisa sobre a geração 80 e a realização de uma pintura.
A arte e os desafios do nosso tempo , que aborda a arte feita por pessoas que sofreram com o preconceito social, por artistas neurodivergentes que viveram em instituições manicomiais e por artistas não binários que se dedicaram ao trabalho com técnicas artesanais como o bordado e a costura. Propõe a construção de personagens, utilizando tecidos e outras modalidades têxteis.
Dança
Matrizes
Culturais
Culturas indígenas
Artes visuais
Música O espírito da floresta
Teatro
Culturas africanas
Artes visuais
Música Arte contracolonial
Dança
Culturas europeias
Teatro
Dança O belo
Artes integradas
Caminhos da arte no Brasil
Arte e colonização
Artes visuais
Música A construção de uma cultura tropical
Dança
Modernismos no Brasil
Artes visuais
Dança Antropofagia
Teatro
Uma arte tropical
Música
Artes integradas
Teatro Liberdade e repressão no país tropical
Multiculturalismo
Artes visuais
Música Cultura e política na periferia
Dança
Arte contemporânea
Dança
Música
Teatro É preciso descolonizar a arte contemporânea
Arte e os desafios do nosso tempo
Artes visuais
Teatro Floresta de Cristal
Artes integradas
Para o percurso de dança, sugere-se o trabalho com os seis capítulos indicados a seguir.
• Culturas africanas, que aborda a dança da África no Brasil, o jongo e o tambor de crioula, além das bases das danças afro-brasileiras. Propõe uma pesquisa sobre a história da dança de matriz africana e uma atividade de dança envolvendo os elementos da natureza.
• Culturas europeias, que apresenta elementos, obras e artistas das danças cênicas, buscando destacar as influências da Europa na construção da dança cênica brasileira. Diferentes instrumentos de orquestra servem de estímulo para uma proposta de exploração do movimento dançado.
• Arte e colonização, capítulo integrado com música, que aborda o surgimento de danças de salão, como o samba de gafieira, e suas influências europeias e africanas no
Arte hoje
período da colonização. Os desafios de dançar em par são experimentados na atividade proposta.
• M odernismos no Brasil , que propõe uma reflexão acerca da dança moderna no país, apresentando artistas e acontecimentos que se destacaram na construção desse movimento. Propõe a construção de uma dança coral inspirada em Rudolf Laban (1879-1958).
• Multiculturalismo , que aborda os novos caminhos da dança de rua por meio da apresentação de alguns movimentos dessa dança. Propõe uma pesquisa sobre dança de rua, filmes e eventos sobre dança e uma batalha de dança de rua.
Arte contemporânea , que aborda a dança contemporânea e os fundamentos da improvisação. Propõe uma pesquisa sobre mostras, festivais e companhias de dança contemporânea no Brasil.
Música
Matrizes Culturais
Arte hoje
Multiculturalismo
Artes visuais
Caminhos da arte no Brasil
Culturas indígenas
Artes visuais
Música O espírito da floresta
Teatro
Culturas africanas
Artes visuais
Música Arte contracolonial
Dança
Culturas europeias
Teatro
Dança O belo
Artes integradas
Arte e colonização
Artes visuais
Música A construção de uma cultura tropical
Dança
Modernismos no Brasil
Artes visuais
Dança Antropofagia
Teatro
Uma arte tropical
Música
Artes integradas
Teatro Liberdade e repressão no país tropical EDITORIA DE ARTE
Música Cultura e política na periferia
Dança
Arte contemporânea
Dança
Música
Teatro É preciso descolonizar a arte contemporânea
Arte e os desafios do nosso tempo
Artes visuais
Teatro Floresta de Cristal
Artes integradas
Para o percurso de música, sugere-se o trabalho com os seis capítulos indicados a seguir.
• Culturas indígenas, que aborda a música e o rito, o carimbó e os instrumentos musicais. Propõe a pesquisa de cantos e instrumentos musicais indígenas, além da construção de objetos musicais.
• Culturas africanas, que investiga a música afro-atlântica, explorando os afoxés, a black music e o afrobeat Também explora os conceitos de pulsação e ritmo, atrelados a uma atividade envolvendo os ritmos ijexá e funk. Propõe pesquisar o intercâmbio musical entre África e Brasil.
• Arte e c olonização , capítulo integrado com dança, que aborda o batuque, o lundu, a modinha, a polca, o maxixe e o nascimento do choro e do samba. Propõe uma pesquisa sobre as mulheres no samba e explora os fundamentos da pulsação e do compasso.
• Uma arte tropical, que aborda a bossa nova, os festivais, a jovem guarda e a Tropicália, além de investigar os conceitos de harmonia e melodia e os fundamentos do contraponto, atrelados a uma atividade de composição que explora esses elementos. Propõe uma pesquisa sobre a influência do jazz e do rock em contextos estrangeiros na música da época.
• Multiculturalismo, que aborda a relação entre música e poesia, além dos fundamentos da rima. Propõe uma pesquisa sobre o movimento hip-hop e da slam poetry e uma atividade de composição e batalha de rap pelos estudantes.
• Arte c ontemporânea , que aborda a música eletroacústica e o minimalismo, bem como o conceito de paisagem sonora e ecoacústica. Propõe pesquisa de trabalhos contemporâneos que investigam a música eletrônica. Propõe uma atividade de exploração de paisagens sonoras criadas pela turma.
Teatro
Matrizes
Culturais
Caminhos da arte no Brasil
Culturas indígenas
Artes visuais
Música O espírito da floresta
Teatro
Culturas africanas
Artes visuais
Música Arte contracolonial
Dança
Culturas europeias
Teatro
Dança O belo
Artes integradas
Arte e colonização
Artes visuais
Arte hoje
Para o percurso de teatro, sugere-se o trabalho com os seis capítulos indicados a seguir.
• Culturas indígenas , em que os estudantes entram em contato com dois espetáculos teatrais contemporâneos criados por artistas indígenas e discutem elementos de teatralidade presentes no cotidiano de alguns povos indígenas brasileiros. Propõe uma contação de histórias baseadas em narrativas aprendidas com familiares mais velhos.
• Culturas europeias, que aborda as relações entre religião, educação social e linguagem teatral, explorando o mito e o teatro na Grécia antiga, além do coro cênico. Também discute o teatro de William Shakespeare. Propõe a realização de um trabalho com o coro cênico pelos estudantes.
Música A construção de uma cultura tropical
Dança
Modernismos no Brasil
Artes visuais
Dança Antropofagia
Teatro
Uma arte tropical
Música
Artes integradas
Teatro Liberdade e repressão no país tropical
Multiculturalismo
Artes visuais
• M odernismos no Brasil , que aborda as tentativas modernizantes de Oswald de Andrade e a efetiva modernização da linguagem teatral na década de 1940. Explora, ainda, o teatro de revista, o Teatro Experimental do Negro e o Teatro Brasileiro de Comédia. Propõe um estudo sobre os elementos da encenação teatral, bem como a criação de um experimento cênico baseado nesses elementos, partindo da leitura de um trecho da dramaturgia Vestido de noiva, de Nelson Rodrigues.
• U ma arte tropical , que aborda as experiências do Teatro de Arena, do Teatro Oficina, do Movimento de Cultura Popular do Recife e do Centro Popular de Cultura. Explora também a produção de uma linguagem teatral brasileira engajada na transformação da sociedade, além dos conceitos de teatro dramático e teatro épico. Propõe uma pesquisa sobre o Teatro do Oprimido e uma experimentação de encenação com base no drama ou no teatro épico.
Música Cultura e política na periferia
Dança
Arte contemporânea
Dança
Teatro É preciso descolonizar a arte contemporânea
• Arte contemporânea, que aborda o teatro de grupo, importante vertente da linguagem teatral contemporânea, bem como o Bando de Teatro Olodum e a Companhia de Teatro Heliópolis. Propõe uma pesquisa sobre diversos grupos espalhados atualmente pelo território nacional e a encenação colaborativa que parte da dramaturgia Cárcere ou Porque as mulheres viram búfalos, escrita por Dione Carlos em parceria com a Cia. de Teatro Heliópolis.
Música
Arte e os desafios do nosso tempo
Artes visuais
Teatro Floresta de Cristal
Artes integradas
• A arte e os desafios do nosso tempo, que tematiza o teatro de rua e o teatro em espaço alternativo, além de abordar o Coletivo Estopô Balaio, o Grupo Imbuaça e a Cambada de Teatro em Ação Direta Levanta FavelA. Propõe a pesquisa de grupos que trabalham o teatro “fora da caixa” em todas as regiões do país, bem como a encenação de uma cena teatral em espaço alternativo.
Artes integradas
Culturas indígenas
Artes visuais
Música O espírito da floresta
Teatro
Matrizes Culturais
Caminhos da arte no Brasil
Culturas africanas
Artes visuais
Música Arte contracolonial
Dança
Culturas europeias
Teatro
Dança O belo
Artes integradas
Arte e colonização
Artes visuais
Arte hoje
Para o percurso de artes integradas, sugere-se o trabalho com os três capítulos indicados a seguir.
• Culturas europeias, que aborda o conceito de Patrimônio Cultural, a relevância da preservação de bens materiais e imateriais, além do resgate de símbolos nacionais. Apresenta conjuntos arquitetônicos reconhecidos como Patrimônio Mundial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), artefatos saqueados durante a colonização europeia e patrimônios imateriais reconhecidos pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Propõe uma atividade de criação de uma coleção como método de pesquisa.
• Uma arte tropical, que explora a linguagem do audiovisual, tendo como tema o Cinema Novo, movimento da cultura brasileira que, nas décadas de 1960 e 1970, rompeu com o modelo cinematográfico estadunidense para produzir filmes conectados com a realidade nacional, dando ênfase a personagens tradicionalmente tratadas como secundárias. Propõe a produção de um filme experimental.
Música A construção de uma cultura tropical
Dança
Modernismos no Brasil
Artes visuais
Dança Antropofagia
Teatro
Uma arte tropical
Música
Artes integradas
Teatro Liberdade e repressão no país tropical
Multiculturalismo
Artes visuais
• A arte e os desafios do nosso tempo, que aborda a cultura digital ampliada por discursos de artistas. Gabriel Massan, Roberta Carvalho e Silvana Mendes trazem práticas urgentes e contemporâneas, aliadas às linguagens da arte e ao uso da tecnologia digital. Propõe uma atividade que contempla o uso de aplicativos de forma a resgatar e ampliar histórias da população negra invisibilizada.
Outros caminhos
Música Cultura e política na periferia
Dança
Arte contemporânea
Dança
Teatro É preciso descolonizar a arte contemporânea
Música
Arte e os desafios do nosso tempo
Artes visuais
Teatro Floresta de Cristal
Artes integradas
Este material oferece múltiplas possibilidades de trajetórias pedagógicas dentro de sua rica e diversa teia de saberes. Um professor licenciado em Artes Cênicas, por exemplo, interessado em aprofundar-se nas culturas europeias, pode explorar o capítulo correspondente de maneira integrada, abordando não apenas o teatro e as seções comuns a essa linguagem mas também o contexto da dança, que reflete os valores estéticos fundamentais dessa sociedade. Da mesma forma, um professor com formação em qualquer linguagem artística, que tenha especialização ou interesse em cultura afro-brasileira, pode trabalhar o capítulo Culturas africanas de forma transversal, abordando não apenas o conteúdo de artes visuais, música e dança mas também as demais linguagens exploradas na seção Ponte para outras linguagens artísticas Organizado de modo a aproximar a realidade dos jovens dos temas integradores, o Livro do estudante combina produções do passado com exemplos de poéticas artísticas contemporâneas e da cultura juvenil. Para isso, são apresentados trabalhos de arte contemporânea e histórica, mesclando exemplos nacionais e mundiais. O enfoque, no entanto, está na arte e na cultura brasileiras, por meio da exploração das variadas formas artísticas produzidas em todas as regiões do Brasil, tanto em contextos rurais como em contextos urbanos.
Coletânea de áudios e objetos educacionais digitais
As faixas de áudio que acompanham o Livro do estudante também são essenciais para o desenvolvimento do trabalho. Nelas, há músicas de artistas que compõem o repertório estudado, bem como faixas autorais criadas para acompanhar atividades de música ou de dança ou para explicar temas de teoria musical. A seguir, um breve resumo, na ordem em que as faixas entram nas unidades.
• Na unidade 1, há faixas que exemplificam culturas indígenas e suas influências no carimbó, temas presentes no capítulo 1. No que se refere ao conteúdo do capítulo 2, há faixas que acompanham atividades, como aquelas que orientam a atividade final de música, bem como a que abre o capítulo, acompanhando a atividade de sensibilização. Há ainda faixas que exemplificam o trabalho de artistas e movimentos mencionados na seção Repertório. Por fim, as faixas que acompanham o capítulo 3 remetem à atividade final de dança e, ao mesmo tempo, apresentam conteúdo pertinente também à música.
Na unidade 2, as faixas se concentram no capítulo 4, em propostas que integram a música e a dança. Duas das faixas apresentam conceitos de pulsação e compasso, pertinentes ao campo da música; ao passo que as faixas que acompanham duas ocorrências da seção
Ação desmembram esses conceitos em uma dinâmica compartilhada entre as duas linguagens.
A unidade 3 oferece beats criados especialmente para a obra, com o intuito de explorar a linguagem do hip hop presente na atividade do capítulo 7, também compartilhados entre a música e dança.
Vale observar que a maior presença de faixas autorais do que de composições pretende destacar o protagonismo do estudante. Além disso, faixas de fácil acesso em meios digitais foram sugeridas como objeto de pesquisa para o estudante.
A coleção conta também com um acervo de objetos educacionais digitais, que tem por intuito enriquecer e expandir possibilidades em sala de aula ou em estudos em casa.
3. A BNCC no material
A A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento normativo que define os parâmetros da educação em todo o território nacional. O presente material foi desenvolvido em total conformidade com as diretrizes da BNCC.
As dez competências gerais da Educação Básica expressam o horizonte de saberes mínimos da BNCC,
abrangendo as dimensões do conhecimento humano. Segundo o documento, as competências gerais indicam conhecimentos, habilidades, atitudes e valores que os estudantes devem desenvolver durante sua jornada de escolarização. A seguir, estão os elementos centrais a serem mobilizados em cada uma delas.
1. Conhecimento.
2. Pensamento científico, crítico e criativo.
3. Repertório cultural.
4. Comunicação.
5. Cultura digital.
6. Trabalho e projeto de vida.
7. Argumentação.
8. Autoconhecimento e autocuidado.
9. Empatia e cooperação.
10. Responsabilidade e cidadania.3
As competências gerais da BNCC permeiam, de maneira transversal, o conteúdo do Livro do estudante e estão organizadas, em cada capítulo, como indicado a seguir.
• Abertura e Int rodução : 1. Conhecimento; 2. Pensamento científico, crítico e criativo; 7. Argumentação.
• Atividade de sensibilização: 4. Comunicação; 8. Autoconhecimento e autocuidado.
• Contextos e Repertórios: 3. Repertório cultural.
• Pesquisa: 2. Pensamento científico, crítico e criativo; 3. Repertório cultural; 5. Cultura digital.
• Teorias e modos de fazer : 1. Conhecimento; 2. Pensamento científico, crítico e criativo.
• Ação e Síntese estética: 6. Trabalho e projeto de vida; 7. Argumentação; 9. Empatia e cooperação; 10. Responsabilidade e cidadania.
Além disso, em Projeto Arte – espaço para desenvolvimento de uma produção coletiva e colaborativa autônoma dos estudantes, em que irão lidar com um desafio presente na comunidade escolar da qual fazem parte –, são mobilizadas as dez competências gerais da Educação Básica, com especial destaque para a 6, a 9 e a 10.
Seguindo a ordem proposta na BNCC, das competências gerais provêm as competências específicas de cada área de conhecimento, e destas se originam as competências específicas do componente curricular, quando aplicável. Por fim, chega-se às habilidades, que são a síntese de toda a cadeia de progressão de aprendizagens essenciais da BNCC, a expressão concreta dos Direitos de Aprendizagem que devem ser assegurados aos estudantes.
3 BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular: educação é a base. Brasília, DF: MEC, 2018. Disponível em: https://www.gov.br/mec/ pt-br/escola-em-tempo-integral/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal.pdf. Acesso em: 5 nov. 2024.
O componente curricular Arte está organizado em cinco unidades temáticas, também chamadas de Linguagens artísticas: artes visuais, dança, música, teatro e artes integradas. No contexto do Ensino Médio, o que se observa é um borramento mais intenso das fronteiras entre os componentes curriculares da Área de Linguagens e suas Tecnologias.
As características centrais da Arte na BNCC do Ensino Médio incluem o encontro entre racionalidade, sensibilidade, intuição e ludicidade. Essa abordagem visa fomentar criações poéticas, tanto individuais quanto coletivas, somadas à hibridização dos processos. Nesse esforço, são integrados os campos da cultura digital, das culturas juvenis e dos multiletramentos nas diferentes linguagens artísticas, com especial atenção aos elementos culturais e artísticos presentes na comunidade escolar.
Destaca-se o seguinte trecho da BNCC sobre essa importante etapa escolar:
A Arte, enquanto área do conhecimento humano, contribui para o desenvolvimento da autonomia reflexiva, criativa e expressiva dos estudantes, por meio da conexão entre o pensamento, a sensibilidade, a intuição e a ludicidade. Ela é, também, propulsora da ampliação do conhecimento do sujeito sobre si, o outro e o mundo compartilhado. É na aprendizagem, na pesquisa e no fazer artístico
Capítulo ou Seção do Livro do estudante
Competências específicas de Linguagens e suas Tecnologias para o Ensino Médio
que as percepções e compreensões do mundo se ampliam e se interconectam, em uma perspectiva crítica, sensível e poética em relação à vida, que permite aos sujeitos estar abertos às percepções e experiências, mediante a capacidade de imaginar e ressignificar os cotidianos e rotinas.
[…]
O trabalho com a Arte no Ensino Médio deve promover o entrelaçamento de culturas e saberes, possibilitando aos estudantes o acesso e a interação com as distintas manifestações culturais populares presentes na sua comunidade […], garantindo o respeito e a valorização das diversas culturas presentes na formação da sociedade brasileira, especialmente as de matrizes indígena e africana.4
Partindo dessa concepção, os processos de interação entre as linguagens são essenciais para a produção do sujeito social. É por meio dessas interações que se desenvolvem os conhecimentos, as atitudes e os valores culturais, morais e éticos dos estudantes.
O quadro a seguir lista as competências específicas de Linguagens e suas Tecnologias para o Ensino Médio, bem como as Habilidades relacionadas a cada etapa proposta, considerando as especificidades do componente curricular Arte e sua distribuição ao longo dos capítulos e das seções do livro.
Habilidades relacionadas às competências específicas de Linguagens e suas Tecnologias para o Ensino Médio
Até o fim do século XX, a chamada cultura ocidental canônica, predominantemente europeia, branca e masculina, ocupou o lugar central no ensino de Arte nas escolas brasileiras. Já nas últimas décadas, a abordagem multicultural trouxe uma visão mais democrática e inclusiva para a educação, propondo a valorização das singularidades das diversas culturas e o respeito às diferenças. No entanto, reunir exemplos diversificados em um panorama em que todas as minorias possam se reconhecer não garante a realização de uma educação democrática. Os novos estudos em arte-educação sugerem que é preciso oferecer igualmente aos estudantes possibilidades de compreender as relações de força entre as culturas ditas minoritárias e aquelas ditas dominantes, bem como as trocas que ocorrem entre elas.
Para esse debate, o conceito de interculturalidade5,6,7,8 cumpre um importante papel, ao propor uma perspectiva de respeito às diferenças e às identidades culturais, bem como uma atitude integradora, que acolhe a singularidade de cada estudante. A cultura é entendida como um contínuo processo de elaboração e troca, sempre atravessado por relações de poder. Nessa perspectiva, é preciso romper com o caráter homogeneizador da escola, propondo práticas educativas em que as questões da diversidade e da diferença estejam presentes.
Especialmente no Brasil, onde a diversidade é elemento constitutivo da cultura, torna-se urgente essa renovação de conteúdos, abordagens e práticas, de forma a dar visibilidade aos valores estéticos e às identidades que foram silenciadas no passado.
Na América Latina e, particularmente, no Brasil a questão multicultural apresenta uma configuração própria. Nosso continente é um continente construído com uma base multicultural muito forte, onde as relações interétnicas têm sido uma constante através de toda sua história dolorosa e trágica principalmente no que diz respeito aos grupos indígenas e afrodescendentes.
A nossa formação histórica está marcada pela eliminação física do “outro” ou por sua escravização, que também é uma forma violenta de negação de sua alteridade. Os processos de negação do “outro” também se dão no plano das representações e no imaginário social. Neste sentido o debate multicul-
5 BARBOSA, ref. 1.
tural na América Latina nos coloca diante da nossa própria formação histórica, da pergunta sobre como nos construímos socioculturalmente, o que negamos e silenciamos, o que afirmamos, valorizamos e integramos na cultura hegemônica. A problemática multicultural nos coloca de modo privilegiado diante dos sujeitos históricos que foram massacrados, que souberam resistir e continuam hoje afirmando suas identidades e lutando por seus direitos de cidadania plena na nossa sociedade, enfrentando relações de poder assimétricas, de subordinação e exclusão.9
Esse ponto de partida ético orientou o projeto desta obra, permitindo a inclusão de discussões étnico-raciais, religiosas, de gênero, de classe, de particularidades socioespaciais e de acessibilidade ao longo dos nove capítulos.
Ao longo do Livro do estudante, por meio de um grande esforço de síntese, buscou-se apresentar temas relevantes de cada linguagem, explorando manifestações artísticas que se relacionam com as culturas brasileiras e com o cotidiano. Embora sejam apresentados exemplos de variadas culturas e estéticas para aprofundar linguagens e contextos, optou-se por não abarcar uma amplitude planetária, mantendo o foco na cultura brasileira.
Além disso, reconhece-se que estudantes e professores são tanto detentores quanto produtores de cultura e saberes que devem ser trazidos para o ambiente escolar. Os conhecimentos e as referências artísticas desses jovens são frequentemente convocados a participar dos processos de criação, integrando o universo simbólico e cultural dos estudantes às experiências desenvolvidas em sala de aula.
Você, professor, está convidado a contribuir para o aprendizado do estudante por meio desse conjunto de conteúdos, enriquecendo cada um dos temas com seus saberes e com a cultura local e regional em que está inserido.
A seguir, exploram-se os quatro campos de atenção que integram os processos de ensino-aprendizagem em Arte no Ensino Médio, refletindo sobre esses campos e mapeando os trechos em que são desenvolvidos no Livro do estudante.
Grandes temas do nosso tempo
O Ensino Médio, por ser a etapa final da Educação Básica, representa uma importante transição para o estudante, trazendo um conjunto de expectativas em relação ao início
6 RICHTER, Ivone Mendes. Interculturalidade e estética do cotidiano no ensino das artes visuais. Campinas: Mercado de Letras, 2003.
7 MOREIRA, Antonio Flávio; CANDAU, Vera Maria. Indagações sobre currículo: currículo, conhecimento e cultura. Brasília: MEC/SEB, 2007.
8 MOREIRA, Antonio Flávio; CANDAU, Vera Maria (org.). Multiculturalismo: diferenças culturais e práticas pedagógicas. 10. ed. Petrópolis: Vozes, 2013.
9 CANDAU, Vera Maria. Multiculturalismo e educação: desafios para a prática pedagógica. In: MOREIRA, Antonio Flávio; CANDAU, Vera Maria (org.). Multiculturalismo: diferenças culturais e práticas pedagógicas. 10. ed. Petrópolis: Vozes, 2013. p. 17.
da vida adulta. Os processos de ensino-aprendizagem em Arte podem oferecer grandes contribuições nesse sentido, ajudando no enfrentamento das questões urgentes do nosso tempo com sensibilidade, crítica e criatividade.
Dessa forma, a jornada pedagógica proposta no Livro do estudante abrange diferentes temas contemporâneos urgentes que desafiam as juventudes hoje, no Brasil e no mundo.
• A div ersidade cultural é abordada no material de forma insistente, sendo apresentada como a força biológica da proliferação da vida e como o principal impulsionador do pensamento criativo. Em todos os capítulos, a diversidade é evocada enquanto potência. Diversos exemplos e práticas sugeridas estimulam reflexões e visões que buscam formar indivíduos dispostos a conviver com as diferenças e valorizá-las.
O pensamento decolonial permeia a forma como o conhecimento é organizado no livro, buscando enfrentar a hegemonia do eurocentrismo e a subalternidade imposta às culturas autóctones. Reiteradamente, as feridas coloniais e o modo colonial de habitar os espaços e explorar as vidas humanas e não humanas são abordados. As violências coloniais aparecem nas obras de artistas como Tiago Sant’ana e Jonathas de Andrade, que evidenciam, de forma poética, a escravização nos engenhos de açúcar. Também surgem na reconstrução das memórias ancestrais da África, como nos trabalhos de Aline Motta. Os saberes ancestrais aparecem como forma de gerar diálogo entre mito e ciência, caso do texto “O espírito da floresta”, de Davi Kopenawa, publicado no livro A queda do céu: palavras de um xamã yanomami ou com o objetivo de provocar, nos estudantes, a curiosidade sobre a cultura familiar. Além disso, esses saberes enfatizam a necessidade de olhar para outros modelos e tecnologias sociais em que as comunidades humanas viveram, de modo mais harmônico e sustentável com as demais vidas na Terra. A abordagem decolonial torna-se explícita na seção de encerramento do livro, que apresenta a visão romântica e idealizada das culturas indígenas na ópera O Guarani”, de Carlos Gomes, e sua adaptação contemporânea concebida e realizada em colaboração com artistas indígenas, revelando como o pensamento crítico e criativo pode desconstruir visões equivocadas através do tempo.
• A mudança do regime climático da Terra é outro tema contemporâneo presente ao longo da obra. Tal evento, que já impacta diversas dimensões de nossas vidas, precisa se tornar protagonista nas práticas pedagógicas, sendo abordado de maneira transdisciplinar. Ao propor uma centralidade nesse tema, busca-se promover a reflexão sobre a relação entre o sistema capitalista, a sociedade
de consumo e a sustentabilidade das vidas humanas e não humanas na Terra. O tema é o foco do capítulo 9, que apresenta artistas cujas obras revelam a degradação dos ambientes naturais e a perda da biodiversidade, o que põe em risco o ciclo da vida no planeta. A seção Integrando com Ciências da Natureza e suas Tecnologias convida o estudante a traduzir conceitos e um mapa do desmatamento na Amazônia em produções estéticas que sejam capazes de sensibilizar o grande público.
• O tema tecnologias e inteligências suscita debates cruciais na elaboração de soluções para os desafios contemporâneos. Em diversos momentos, ao longo do livro, o tema é abordado de modo a explicitar saltos epistêmicos na produção de objetos estéticos. Exemplos incluem o impacto da invenção da fotografia, no final do século XIX; a emergência do multiculturalismo a partir da introdução das trocas entre pessoas, descentralizando os poderes de informação e estimulando protagonismos das culturas periféricas; e o aumento das possibilidades de captar e gravar os sons por meio de sintetizadores, que trouxeram uma nova sonoridade para a música eletrônica.
• O engajamento de artistas em temas como a necessidade de restaurar a vida na Terra, a pressão para cooperação política entre países, o fomento de uma cultura de paz, a defesa dos direitos dos povos indígenas e das populações carcerárias, bem como a produção de filmes que promovem a troca de saberes socioambientais e a atuação do teatro na transformação da realidade de comunidades locais e periféricas no Brasil, entre outros, aponta o caminho do ativismo como uma forma de atuar, pensar e viver coletivamente. Artistas e ativistas combinam diferentes campos do conhecimento, provocando a imaginação radical, criando alianças e buscando a construção de um futuro melhor para todos os humanos e não humanos. Talvez seja nessa possibilidade de cooperação entre diversas modalidades de inteligências e sensibilidades que poderemos, juntos, humanos e não humanos, cultivar condições para a continuidade da vida na Terra. A educação em Arte tem um papel fundamental nesse processo.
Pessoas com deficiência e ensino da arte
O caráter criativo e singular da arte torna o ensino-aprendizagem em Arte um espaço potente para promover a inclusão no ambiente escolar. A experiência com a arte na escola, em suas várias manifestações, deve ser guiada pelo entendimento de que cada estudante é único. Cada jovem chega à escola com potencialidades e limites próprios, trazendo consigo uma bagagem cultural também singular. Na
defesa de que a educação inclusiva representa uma grande conquista para o país, é importante reconhecer a singularidade de cada estudante e buscar estratégias para que todos possam usufruir das experiências oferecidas pelas distintas linguagens artísticas ao longo do Ensino Médio, com especial atenção às pessoas com deficiência.
Além de convidar os estudantes a experimentar materiais e metodologias que convocam seus sentidos e múltiplas inteligências a se manifestarem pelo movimento expressivo, pelo som, pelo ritmo, pela palavra, pelo desenho, pela pintura, pela escultura, por exemplo, a arte é também um meio de autoconhecimento. O contato com temas, obras e artistas das variadas linguagens, de distintas matrizes culturais e de diferentes momentos históricos, por meio de atividades práticas e de fruição, oferece aos estudantes a oportunidade de ampliar a consciência de suas capacidades, afinidades e interesses. Essa característica do ensino da Arte é especialmente relevante para a inclusão de estudantes com deficiência, pois o autoconhecimento fortalece suas potencialidades e aumenta sua confiança para se lançar à experimentação. O professor deve evitar posturas capacitistas, como considerar que o trabalho com as artes visuais seria inadequado a estudantes com deficiência visual ou que uma deficiência motora seria um impeditivo para as práticas de dança. Pelo contrário, o trabalho com materiais diversos estimula elementos cognitivos, emocionais e motores, como a organização espacial, o esquema corporal e o fortalecimento da autoestima. As atividades práticas também promovem a interação coletiva e a interpretação por meio dos saberes prévios dos estudantes, ampliados pela mediação do professor. O livro apresenta exemplos de artistas com deficiência que trazem contribuições relevantes para o campo da Arte, em distintas linguagens. A exploração desses exemplos evidencia que as diferenças são valorizadas nas práticas artísticas e que de modo algum representam barreiras para o envolvimento com as diversas linguagens.
Ao longo dos capítulos, os estudantes são convidados a ler, observar, escutar, falar, dar forma, explorar gestos e interagir com pessoas, matérias e objetos. Ao conhecer suas turmas, o professor deve identificar quais desses convites precisam ser adaptados para garantir a inclusão de todos. Como observar sem a visão? Como escutar sendo surdo? Como pessoas neurodivergentes lidam com a leitura e a interpretação de textos escritos? É fundamental buscar alternativas adequadas às necessidades dos jovens que constituem o grupo.
No caso de pessoas com deficiência, é crucial considerar que um diagnóstico não representa necessariamente um limitador. A adequação de cada tema para garantir a compreensão e a colaboração de todos é um ganho teórico e prático.
A seguir, algumas sugestões para auxiliar o professor de Arte no trabalho com pessoas com deficiência, relativas a cada uma das linguagens artísticas.
• Artes visuais: esteja atento a estudantes cegos ou com baixa visão, para que tenham oportunidade de experimentar objetos de modo tátil. Pode-se oferecer materiais como argila, massinha, blocos de madeira, telas e matérias maleáveis, como espuma e plástico bolha, para serem moldados, empilhados, cavados, colados, trançados ou amarrados, em processos expressivos e criativos. A audiodescrição de uma obra de arte feita por um conjunto de estudantes pode proporcionar acesso àqueles que não podem vê-las, aprofundando a compreensão dos elementos presentes na obra. No caso de estudantes surdos, havendo oportunidade, é interessante que toda a turma aprenda algumas palavras em Libras, criando um repertório comum e inclusivo para todos.
• Dança: reforce que mais importante que o resultado das propostas é o processo. Isso vale para as pessoas com e sem deficiência. Ao propor uma atividade prática, é sempre indicado que se pergunte ao grupo e a cada estudante se eles se sentem confortáveis para realizá-la e o que imaginam que possa ser adaptado para que a atividade se torne mais adequada naquele momento. Uma pessoa cega pode, por exemplo, ser acompanhada de um colega quando precisar se deslocar dançando pelo espaço. Um estudante surdo pode apoiar partes de seu corpo no piso e nas paredes da sala para melhor sentir a música.
• Música: esteja atento aos estudantes surdos ou com algum grau de perda auditiva. É interessante incentivá-los a se relacionarem com as vibrações produzidas pelos sons, seja ao trabalhar com instrumentos musicais, seja ao reproduzir músicas gravadas. Esses estudantes podem ficar mais próximos das fontes sonoras para sentir essas vibrações. No trabalho com ritmo, uma possibilidade é utilizar um metrônomo visual (disponível gratuitamente on-line).
• Teatro: ao trabalhar a linguagem teatral em uma turma em que haja estudantes com deficiência, é interessante convidar o coletivo a encontrar soluções para que todos possam participar das atividades e das criações. No caso de haver um estudante cego, por exemplo, é interessante que os colegas experimentem fazer a audiodescrição de cenas, revezando-se nessa função. Caso haja cadeirantes, é preciso explorar as muitas possibilidades de expressividade com base nas movimentações possíveis para eles, além de adaptar o espaço físico para a sua presença. Se houver estudantes surdos e fluentes em Libras, é interessante trabalhar sua gestualidade como elemento expressivo e significativo.
• Artes integradas: as artes Integradas compreendem uma diversidade de formas de expressão e conversam com diferentes sentidos. Algumas obras lidam mais com a visualidade; outras, com os sons; outras, ainda, com a movimentação do corpo. O professor pode adaptar as atividades propostas, considerando as necessidades e as potencialidades das pessoas com deficiência presentes na turma. Para isso, pode contar com as sugestões relacionadas anteriormente, envolvendo artes visuais, dança, música e teatro.
Pensamento computacional
Em uma abordagem contemporânea de educação, especialmente para estudantes do Ensino Médio, o pensamento computacional é um importante campo a ser mobilizado, destacando-se na elaboração das etapas de aprendizagem e na resolução de problemas. É fundamental compreender que esse processo envolve a observação e a decomposição de uma situação em etapas, de maneira simples, ordenando e organizando as informações de forma estruturada, como fazem os computadores.
Ao inseri-lo em âmbito escolar, espera-se que o pensamento computacional se integre ao desenvolvimento das demais habilidades e competências exploradas pelo estudante. Nesse percurso, é essencial reconhecer que o desenvolvimento do pensamento computacional contribui para a reflexão crítica, além de acolher aspectos socioemocionais. O trabalho com o pensamento computacional abarca quatro elementos essenciais, com suas especificidades e suas convergências.
Decomposição: consiste em tratar um problema por meio da sua divisão em pequenas partes, tornando-as gerenciáveis e possíveis de solucionar.
Reconhecimento de padrões : envolve analisar um processo de erro de maneira acolhedora, sem negá-lo, trazendo novas perspectivas a determinada aprendizagem. Para isso, são acionados os saberes prévios e as experiências passadas.
Abstração de padrões : compreende selecionar as informações mais relevantes e as secundárias, colaborando para a tomada de uma decisão difícil, por meio do acionamento da sensibilidade.
• Projeto de algoritmo: consiste em definir as etapas necessárias para se fazer algo. Pode auxiliar em um projeto coletivo no qual seja preciso distribuir tarefas. Também pode ser aplicado ao uso de materiais expressivos nas diferentes linguagens artísticas, contribuindo para a organização dos processos criativos.
A integração do pensamento computacional nos desafios de ensinar e aprender arte revela uma ampla gama de cenários, especialmente quando conectada às práticas de tecnologia digital.
A comunicação e a construção do conhecimento estão intrinsecamente ligadas, portanto, não há impedimentos para que um estudante domine um software ou aplicativo e utilize esse conhecimento em propostas criativas, autorais e de protagonismo.
Ao analisar cada linguagem, considerando as artes integradas, surgem inúmeras possibilidades. Nas artes visuais, os aplicativos de desenho podem relacionar comandos de fundamentos da programação de computadores, convertendo-se em imagens ilustradas, a fim de narrar um trajeto de criação até o seu resultado. No teatro, a criação colaborativa propõe uma atenção maior para a abstração de padrões e decomposição das funções, nesse caso, cênicas. Na dança, pode-se decompor uma coreografia ou um gesto, de modo que todos os participantes possam se apropriar. Na perspectiva da música, é possível estimular a percepção do ritmo e da melodia explorando reconhecimento de padrões, dividindo, por exemplo, uma música em etapas, ou utilizar aplicativos gratuitos para a inserção de instrumentos musicais e composição coletiva.
As artes integradas têm sua essência marcada pela confluência das linguagens, portanto, tornam os elementos do pensamento computacional bastante evidentes em atividades com o uso da internet e de dispositivos móveis.
Culturas juvenis
O conceito de Culturas Juvenis pode ser entendido como o conjunto de formas e valores de vida de determinado grupo de jovens. Há que se considerar, no entanto, que existem muitas maneiras de abordar as formas coletivas de viver na juventude.
Assim, algumas questões se tornam relevantes: o que forma o repertório desses jovens? De que maneira eles interagem com as linguagens artísticas e suas reverberações, especialmente à luz das tecnologias digitais?
Oportunizar aos jovens que exponham suas visões de mundo acerca de suas referências de vida é uma chance de identificar elementos invisíveis que moldam suas culturas. Essas expressões – como roupas, gírias, penteados, gestos – não apenas os identificam como parte de um grupo como também os tornam singulares.
O planejamento docente deve envolver etapas que priorizem a construção coletiva, proporcionando a reflexão crítica, aliada às práticas de valores como a solidariedade e o respeito às diferentes opiniões e visões de mundo. O interesse pelo estudo pode ser estimulado por uma problematização própria da sala de aula ou do território no qual a escola está inserida.
Com relação às linguagens artísticas, são possíveis diversos percursos e integrações, considerando a importância das culturas juvenis.
• As artes visuais, habitualmente tratadas como algo produzido no passado, podem incentivar práticas inspiradas em intervenções urbanas e instalações.
• Na dança , a expressão das manifestações culturais brasileiras se destaca em confluência com a vida juvenil. Um levantamento das origens dos jovens e de seus familiares pode tornar o trajeto mais potente.
• A música, tão presente no cotidiano juvenil, possibilita a criação de playlists baseadas em temas contemporâneos e complementares a outras criações. Uma instalação, por exemplo, pode ter som.
O teatro é uma linguagem de comunicação e expressão jovem muito significativa. Ao estabelecer uma aproximação entre passado e presente, é possível abordar questões históricas, diversidade e visões para o futuro. Por meio das vivências dos jovens, surgem dramaturgias que respondem às demandas da juventude.
As artes integradas dão chance ao diálogo entre as linguagens – HQs, curtas-metragens, documentários, fotografias, patrimônios, entre outros. Essa abordagem enriquece a troca de conhecimentos, desafiando a noção de que o saber pertence a uma única área de estudo.
Em termos de argumentação, essa articulação acontece à medida que o repertório é respeitado e ampliado. Dessa forma, propor momentos de apreciação coletiva e de avaliação e autoavaliação processual é fundamental para dar sentido individual e coletivo ao que se pensa e ao que se diz. Reservar espaços para a leitura comparativa de imagens, bem como para a leitura e a escrita acerca do processo criativo é fundamental. Somado a isso, o contato com entrevistas de artistas locais, nacionais e internacionais enriquece o vocabulário e proporciona ao jovem perceber-se como produtor de arte.
A criatividade surge à medida que criamos. Segundo Fayga Ostrower, “Criar é basicamente formar. É poder dar uma forma a algo novo”10. Porém, esse ato criador precisa ser provocado. Portanto, o processo de tornar os jovens criadores autônomos exige um trabalho contínuo e uma escuta atenta. É na conversa que se revelam desejos, saberes e as formas pelas quais os sentidos se manifestam em seus corpos e existências.
5. Transdisciplinaridade
Um aspecto fundamental na concepção deste material didático é a busca por uma abordagem transdisciplinar que articule diferentes campos do conhecimento para
enfrentar a complexidade dos saberes. O pensador francês Edgar Morin (1921-), no documento “Os sete saberes necessários à educação do futuro”, escrito para a Unesco em 2000, alerta para o fato de que a educação está sendo confrontada por esse desafio:
[…] É o problema universal de todo cidadão do novo milênio: como ter acesso às informações sobre o mundo e como ter a possibilidade de articulá-las e organizá-las? Como perceber e conceber o contexto, o global (a relação todo/partes), o multidimensional, o complexo? Para articular e organizar os conhecimentos e assim reconhecer e conhecer os problemas do mundo é necessária a reforma do pensamento. Entretanto, esta reforma é paradigmática, e não programática: é a questão fundamental da educação, já que se refere à nossa aptidão para organizar o conhecimento.
A esse problema universal confronta-se a educação do futuro, pois existe inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre, de um lado, os saberes desunidos, divididos, compartimentados e, de outro lado, as realidades ou os problemas cada vez mais multidisciplinares, transversais, multidimensionais, transnacionais, globais e planetários.11
Diferentemente da interdisciplinaridade, em que conhecimentos de diferentes áreas se sobrepõem, na transdisciplinaridade12 os conteúdos são abordados por meio de temas que perpassam as diferentes áreas de conhecimento. Esses temas são também chamados de temas transversais ou temas integradores. Ao optar por abarcar temas transdisciplinares e interdisciplinares, a obra visa propiciar ao professor e ao estudante uma atitude interdisciplinar13 em seu trabalho cotidiano na escola.
Entendemos por atitude interdisciplinar uma atitude diante de alternativas para conhecer mais e melhor; atitude de espera ante os atos consumados, atitude de reciprocidade que impele à troca, que impele ao diálogo – ao diálogo com pares idênticos, com pares anônimos ou consigo mesmo –, atitude de humildade diante da limitação do próprio saber, atitude de perplexidade ante a possibilidade de desvendar novos saberes, atitude de desafio – desafio perante o novo, desafio em redimensionar o velho –, atitude de envolvimento e comprometimento com os projetos e com as pessoas neles envolvidas, atitude, pois, de compromisso em construir sempre da melhor forma possível, atitude de responsabilidade, mas, sobretudo, de alegria, de revelação, de encontro, enfim, de vida.14
10 OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. Rio de Janeiro: Vozes, 1977. p. 2.
11 MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 2. ed. rev. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: Unesco, 2011. p. 33.
12 MORIN, ref. 11.
13 FAZENDA, Ivani. Interdisciplinaridade: um projeto em parceria. São Paulo: Loyola, 2012.
14 FAZENDA, ref. 13, p. 13-14.
De maneira orgânica, os temas transversais permeiam as abordagens ao longo do Livro do estudante. Estudantes e professores são encorajados a expandir sua compreensão de mundo, integrando conhecimentos que extrapolam o componente de Arte e abordando temas considerados de grande relevância para o século XXI.
Temas contemporâneos transversais (TCTs)
Os Temas Contemporâneos Transversais (TCTs), relacionados a seguir, são regidos por marcos legais e visam conectar a educação às demandas da sociedade contemporânea: Ciência e tecnologia; Saúde (saúde, educação
UNIDADES CAPÍTULOS
Culturas indígenas
Culturas africanas
Matrizes culturais
Caminhos da arte no Brasil
Culturas europeias
Integrando com Matemática e suas Tecnologias
Arte e colonização
Modernismos no Brasil
Uma arte tropical
Integrando com Ciências Humanas e Sociais Aplicadas
Multiculturalismo
Arte contemporânea
Arte hoje
Arte e os desafios do nosso tempo
alimentar e nutricional); Economia (trabalho, educação financeira, educação fiscal); Multiculturalismo (diversidade cultural, educação para valorização do multiculturalismo nas matrizes históricas e culturais brasileiras); Cidadania e Civismo (educação em direitos humanos, vida familiar e social, direitos das crianças e dos adolescentes, processo de envelhecimento, valorização da pessoa idosa, educação para o trânsito); Meio Ambiente (educação ambiental, educação para o consumo).15
O objetivo de uma prática didático-pedagógica que incorpore os TCTs é promover uma educação que acolha e fortaleça a formação integral das juventudes. O quadro a seguir relaciona os momentos em que os TCTs são abordados no Livro do estudante.
TCTs
Multiculturalismo – Educação para Valorização do Multiculturalismo nas Matrizes Históricas e Culturais Brasileiras
Multiculturalismo – Educação para Valorização do Multiculturalismo nas Matrizes Históricas e Culturais Brasileiras
Multiculturalismo – Diversidade Cultural Economia – Trabalho
Ciência e Tecnologia – Ciência e Tecnologia
Cidadania e Civismo – Vida Familiar e Social
Cidadania e Civismo – Educação em Direitos Humanos
Economia – Trabalho
Cidadania e Civismo – Educação em Direitos Humanos
Cidadania e Civismo – Educação em Direitos Humanos
Multiculturalismo – Educação para Valorização do Multiculturalismo nas Matrizes Históricas e Culturais Brasileiras
Multiculturalismo – Diversidade Cultural
Saúde – Saúde
Meio Ambiente – Educação Ambiental
Cidadania e Civismo – Educação em Direitos Humanos
Multiculturalismo – Diversidade Cultural
Ciência e Tecnologia – Ciência e Tecnologia
Multiculturalismo – Diversidade Cultural
Saúde – Saúde
Meio Ambiente – Educação Ambiental
Meio Ambiente – Educação para o Consumo
Cidadania e Civismo – Educação em Direitos Humanos
Cidadania e Civismo – Processo de Envelhecimento, Respeito e Valorização do Idoso
15 BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Temas Contemporâneos Transversais na BNCC: contexto histórico e pressupostos pedagógicos. Brasília, DF: MEC/SEB, 2019. p. 13. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/implementacao/contextualizacao_temas_ contemporaneos.pdf. Acesso em: 5 nov. 2024.
UNIDADES CAPÍTULOS
Integrando com Linguagens e suas Tecnologias
Arte hoje
Projeto Arte
Integrando com Ciências da Natureza e suas Tecnologias
Partindo do quadro anterior, destacam-se, a seguir, as estratégias utilizadas para o trabalho com os TCTs ao longo da obra.
Multiculturalismo – Diversidade Cultural: são apresentados e estudados artistas oriundos de países africanos, da América Latina, da Europa, de países asiáticos e artistas estadunidenses, além de artistas de diversos estados brasileiros, sem privilegiar uma região específica do país. Há abordagens de culturas afrodescendentes, indígenas, periféricas, juvenis, entre outras.
Multiculturalismo – Educação para Valorização do Multiculturalismo nas Matrizes Históricas e Culturais Brasileiras: são apresentados e discutidos artistas e obras de diferentes tempos e territórios, expressando de modos variados as culturas indígenas, afrodescendentes, europeias, latino-americanas, asiáticas e ciganas, que se hibridizaram desde a colonização do Brasil. Além disso, são reveladas as forças que operam essas relações culturais, os modos de preservação, os movimentos estéticos, as disputas e as narrativas dessas culturas, bem como suas trajetórias e ancestralidades.
Meio Ambiente – Educação Ambiental: diversas obras e temas apresentados exploram questões socioambientais sob diferentes perspectivas. As reflexões propostas incentivam a busca por alternativas para enfrentar a acelerada extinção das espécies, o esgotamento dos recursos naturais, destacando a necessidade urgente de preservar e restaurar os ambientes naturais. Além disso, promove-se a crítica ao sistema de produção e ao consumo insustentável, que perpetuam desigualdades e injustiças sociais e climáticas.
• E conomia – Trabalho : diversos temas abordados conectam arte, economia e mundo do trabalho, com destaque para bens do Patrimônio Cultural, com a função da Museologia, com seus modelos de preservação cultural variados. Outra abordagem é a que relaciona arte e profissão, abordando artistas como trabalhadores da cultura, perspectiva explorada nas diferentes linguagens artísticas.
• Cidadania e Civismo – Educação em Direitos Humanos: o livro aborda os direitos dos povos colonizados aos bens
TCTs
Multiculturalismo – Diversidade Cultural Cidadania e Civismo – Direitos da Criança e do Adolescente
Meio Ambiente – Educação Ambiental
Cidadania e Civismo – Vida Familiar e Social Cidadania e Civismo – Direitos da Criança e do Adolescente
sequestrados pelos colonizadores, bem como o direito desses mesmos povos a terem sua cultura reconhecida e respeitada. Traz exemplos de defesa do direito de inclusão de pessoas com deficiência, valorizando os potenciais únicos de todos os corpos, as formas de sensibilidade e a neurodiversidade nos trabalhos criativos e no campo da arte. Diversos grupos que promovem uma arte pública, acessível a todos são apresentados, reforçando o direito que todo cidadão tem de expressar suas ideias estéticas.
• Cidadania e Civismo – Vida Familiar e Social: são apresentadas variadas coletividades que se formam em torno das festas, do teatro, do slam, dos jogos, dos esportes e de espaços públicos. O Projeto Arte busca ativar e fortalecer os vínculos entre os membros da comunidade escolar, promovendo a interação e a colaboração entre estudantes, familiares, funcionários e o território em que essa comunidade está inserida.
• Ciência e Tecnologia: a ciência e a tecnologia são relacionadas às linguagens artísticas, evidenciando o potencial que as novas tecnologias têm de ampliar a sensibilidade e a troca entre as espécies para estimular a produção da vida. O campo do audiovisual também é explorado em sua especificidade, bem como o universo da cultura digital e da cultura gamer, buscando abordagens positivas de elementos presentes na vida dos jovens.
• Saúde: a temática é abordada principalmente no trabalho da consciência corporal, da concentração e da comicidade; nas discussões sobre padrões de beleza, que podem trazer conforto emocional ao jovem; na abordagem das capacidades expressivas únicas das pessoas com deficiência; e no trabalho original de artistas neurodivergentes.
Há, no entanto, um TCT predominante no desenvolvimento dos conteúdos do Livro do estudante: Multiculturalismo – Educação para Valorização do Multiculturalismo nas Matrizes Históricas e Culturais Brasileiras Tal tema tem uma relação inerente à interculturalidade crítica, um dos princípios teóricos e metodológicos que orientam a concepção da obra. Todos os conteúdos e práticas pedagógicas propostos ao longo do volume visam promover o diálogo culturalizado entre os estudantes, as trocas de saberes, bem como a valorização das culturas brasileiras e de todas as suas matrizes históricas.
Encontro da arte com as demais áreas
de conhecimento
As obras, as imagens, as músicas, os artistas e os textos selecionados para compor o livro constituem um conjunto visual, sonoro e textual capaz de alertar os sentidos e colocar em discussão, de forma poética, questões relacionadas a temas urgentes do nosso tempo. Como afirma Michael Parsons, é preciso explorar o caráter transdisciplinar da arte em sua relação com as diferentes áreas de conhecimento:
Desde a década de 1960, arte-educadores vêm tentando descrever arte como algo único, diferente de outras disciplinas na escola. Tentam identificar o que faz o pensamento artístico diferir do científico, do linguístico ou do senso comum. Minha sugestão é que aceitemos o caráter menos estruturado da arte e tiremos proveito disso. O que é mais importante em Arte não é como ela se diferencia de outras disciplinas, mas como podem todas elas ser pensadas em conjunto. É bem verdade que Arte tem características próprias de técnicas, meios, qualidades, princípios e histórias, mas o que realmente conta é o significado que as obras carregam e as ideias que expressam. Mesmo que estas ideias sejam encontradas na vida comum e possam ser entendidas de
Unidade Relaçãoconteúdocom Área de conhecimento
Unidade 1 Capítulo 3
Síntese estética
Unidade 2 Capítulo 4
Síntese estética
Capítulo 5
Síntese estética
Capítulo 6
Síntese estética:
Unidade 3 Capítulo 7
Contexto: A cidade é de todos
Repertório: Slam poetry
Capítulo 9
Síntese estética
diferentes perspectivas. Precisamos aceitar o fato de que as ideias mais importantes de Arte requerem mais do que arte para serem entendidas.16
Além de apresentar os temas transdisciplinares trabalhados no Livro do estudante, estas orientações detalham as possibilidades de articulação interdisciplinares de Linguagens e suas Tecnologias com as demais áreas de conhecimento do Ensino Médio.
Nessa concepção didático-pedagógica, as seções Integrando com… propõem atividades que dialogam com os temas trabalhados nas unidades e nos capítulos.
Para que a proposta das seções Integrando com… seja bem-sucedida, sugere-se mobilizar professores de outros componentes curriculares para realizar uma aula conjunta. A proposta pedagógica deve ser previamente planejada entre os professores. Além disso, para que essa dinâmica seja efetiva, é essencial contar com o apoio e o acolhimento por parte da orientação pedagógica e da gestão escolar.
Modificar o calendário de aulas e promover, de forma criativa e consistente, o diálogo entre os professores não é uma tarefa simples. Sempre que possível, é recomendável reservar um horário comum para você e o professor da outra área discutirem os temas propostos e planejarem abordagens conjuntas, considerando os objetivos de ambos os componentes curriculares.
O quadro a seguir traz o mapeamento das propostas de integração entre os conhecimentos específicos de Arte e as demais áreas de conhecimento.
Tema e atividadeProfessores para parceria
Matemática e suas Tecnologias
Ciências Humanas e Sociais Aplicadas
Linguagens e suas Tecnologias
Ciências da Natureza e suas Tecnologias
Explorar o conceito de razão áurea, desenvolvendo uma composição visual coletiva.
Refletir sobre o tema da busca da identidade brasileira e as artes criando um coro performático com base nas palavras-chave mobilizadas nesse estudo.
Estudar e aprofundar o tema da slam poetry, culminando na realização de um slam dos estudantes.
Investigar a mudança do regime climático da Terra concebendo uma visualidade sensível para essas informações.
Matemática ou Geometria
História, Geografia ou Ciências Sociais
Língua Portuguesa ou Língua Inglesa
Física, Química ou Biologia
16 PARSONS, Michael. Currículo, arte e cognição integrados. In: BARBOSA, Ana Mae (org.). Arte/educação contemporânea: consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2010. p. 308-309.
6. Organização da obra
Estrutura
geral dos capítulos
e estratégia pedagógica
Os capítulos desta obra são compostos de nove seções que propõem diferentes estratégias pedagógicas: abertura do capítulo, Introdução, Contexto, Repertório, Pesquisa, Teorias e modos de fazer, Ação, Ponte para outras linguagens artísticas e, por fim, Síntese estética. Nessas seções, o tema geral do capítulo se desenvolve com base em textos, imagens, sons e atividades reflexivas e práticas, e cada uma delas pode ser apropriada pelo professor com autonomia. Elas estão estruturadas conforme o esquema a seguir.
ESTRUTURA GERAL DOS CAPÍTULOS
Introdução Abertura
Por quê? / Como? / O quê?
Atividade de sensibilização
Contexto e Repertório
Por meio de textos, imagens e músicas (a depender da linguagem em foco) são abordados os contextos e a estética de uma cultura, obra ou movimento artístico em determinados período e lugar.
Pesquisa
A seção consiste em atividades de levantamento de informação, nas quais o estudante é convidado a se aprofundar em temas que se desdobram com base naqueles tratados no capítulo. As propostas são acompanhadas de endereços digitais de museus, acervos, bancos de dados públicos, revistas, filmes, músicas, entrevistas, entre outros possíveis bancos de pesquisa.
Teorias e modos de fazer
Esta seção apresenta abordagens, teorias, fundamentos, comparações, técnicas e especificidades da linguagem artística em estudo, com o intuito de instrumentalizar o estudante para a atividade prática proposta na seção Ação, que virá na sequência.
Contexto
Repertórios
Pesquisa
Teorias e modos de fazer Ação
Contexto
Repertórios
Pesquisa
Teorias e modos de fazer
Ação
Linguagem 1
Linguagem 2
Linguagem 3
Ponte para outras linguagens artísticas
Contexto
Repertórios
Pesquisa
Teorias e modos de fazer
Ação
Ação
Nesta seção, são propostas atividades para serem realizadas de maneira individual ou coletiva pelos estudantes, com foco na linguagem artística em estudo (artes visuais, música, teatro, dança ou artes integradas). As propostas podem estar acompanhadas de orientações teóricas e técnicas detalhadas, além de encaminhamentos oferecidos ao professor.
Ponte para outras linguagens
artísticas
Exploração
Reflexão Produção
Síntese estética
Abertura do capítulo
Na abertura do capítulo, imagens, legendas e breves textos explicativos compõem um arranjo por meio do qual o estudante vai se aproximar do tema a ser tratado.
Introdução
Seção em que o estudante vai encontrar um texto cujo objetivo é promover uma reflexão inicial sobre o que motiva o estudo do tema proposto no capítulo, bem como a compreensão da importância desse tema no estudo das artes. Na sequência, ele é convidado a realizar uma atividade introdutória que visa à experimentação relativa a uma das linguagens artísticas trabalhadas na obra – dança, música, artes visuais, teatro ou artes integradas.
Organizada em quatro colunas, essa seção apresenta repertórios e elementos de pesquisa relacionados a linguagens artísticas não trabalhadas no capítulo. Cada coluna é composta de um texto teórico acompanhado de uma imagem que o ilustra.
Síntese estética
Esta seção tem como proposta pedagógica encerrar o estudo dos conteúdos apresentados no capítulo por meio de análise e síntese. A estratégia sugerida parte da leitura de um texto autêntico escrito por um artista e/ou algum especialista no tema, passa por um debate e, por fim, propõe a realização de um trabalho prático e coletivo em uma linguagem artística que será definida pelos estudantes, mobilizando conhecimentos construídos não só no capítulo em questão mas também ao longo dos estudos em Arte.
Questões
para reflexão
As questões apresentadas ao final de algumas seções têm como objetivo levar o estudante a refletir sobre os temas abordados no capítulo, seja por meio da leitura de imagens, seja por meio da leitura de letras de canções
ou da audição de músicas, seja por meio do levantamento de informações, tecendo, assim, de forma contínua, a interlocução entre o material didático e o estudante, por intermédio de uma postura construtivo-reflexiva.
Nas atividades práticas, localizadas na seção Ação e na parte de produção da seção Síntese estética, o estudante é convidado a produzir trabalhos nas diversas linguagens artísticas e a realizar uma avaliação coletiva da produção, bem como do processo de ensino-aprendizagem como encerramento.
Trajetórias de linguagem e hibridismo
A linguagem pode ser entendida como sistema simbólico constituído de signos. Como linguagem, a arte é um modo singular pelo qual o ser humano reflete sobre o mundo e se relaciona com ele. Assim, cada artista opera, a seu modo, esse jogo simbólico, articulando os elementos sempre de maneira única, a fim de construir uma poética própria.
Na concepção desta obra didática para o Ensino Médio, foram levadas em consideração as discussões que envolvem o ensino das linguagens artísticas, incluindo seus códigos e suas tecnologias, assim como as questões que se apresentam no cotidiano do professor de Arte. Observe, a seguir, como os conteúdos teóricos e práticos foram articulados, visando ao enfrentamento desses desafios.
Como promover análise, discussão, contextualização, integrando teoria, técnica e produção nas diferentes linguagens artísticas no Ensino Médio?
Cada um dos nove capítulos do livro se estrutura da mesma maneira. Em sete deles, há partes específicas para três linguagens artísticas e, nos capítulos 4 e 7, há uma entrada conjunta de música e dança, além de outra linguagem abordada. Nessas partes específicas, o professor vai encontrar abordagens teóricas, práticas, contextuais, apreciações, reflexões e análises aprofundadas para cada linguagem, além de estímulo à imaginação, criatividade e expansão da sensibilidade dos estudantes.
Como o professor pode trabalhar com temas e linguagens artísticas de acordo com suas competências individuais?
No material reunido neste livro, o professor e o estudante vão encontrar situações variadas de ensino-aprendizagem. Isso permite que se apropriem delas com autonomia e decidam que linguagens, debates e projetos
querem explorar a fim de criar um diálogo com os vastos territórios da arte e da cultura.
Como o professor de arte deve trabalhar com as artes visuais, a música, o teatro, a dança e o audiovisual sem resvalar na polivalência?
Os conteúdos e as atividades foram organizados de modo que o professor organize o próprio percurso, privilegiando a linguagem com a qual se sente à vontade para desenvolver com os alunos. Entretanto, o universo da arte não pode ser tratado com limites estanques. Como disse o crítico brasileiro Mário Pedrosa (1900-1981): “A arte é exercício experimental da liberdade”17. As linguagens artísticas se conectam e dialogam entre si, de modo que também é necessário abordar trabalhos realizados em linguagens híbridas, cada vez mais frequentes na arte contemporânea, como a performance e os objetos plásticos e sonoros, por exemplo. Ana Mae Barbosa comenta a diferença entre o trabalho dos artistas em colaborações que resultam em produções híbridas e o trabalho dos arte-educadores com as linguagens artísticas:
Nós, arte-educadores, ficamos perplexos com a riqueza estética das hibridizações de códigos e linguagem operadas pela arte hoje, pois fomos obrigados a combater no Brasil a polivalência na Educação Artística decretada pelo governo ditatorial na década de 1970. A polivalência consistia em um professor ser obrigado a ensinar música, teatro, dança, artes visuais e desenho geométrico, tudo junto, da 5a série do Ensino Fundamental ao Ensino Médio, sendo preparado para tudo isso em apenas dois anos nas faculdades e universidades. Combatemos este absurdo epistemológico. Contudo, mesmo naquele tempo, já defendíamos a interdisciplinaridade das artes. Nosso mote era: “Polivalência não é interdisciplinaridade”. A interdisciplinaridade era desejada, embora ainda fosse uma utopia para nós. Agora a arte contemporânea trata de interdisciplinarizar, isto é, pessoas com suas competências específicas interagem com outras pessoas com diferentes competências e criam, transcendendo cada uma seus próprios limites ou simplesmente estabelecendo diálogos. São exemplos o happening, a performance, a body art, a arte ambiental, a video art, a arte computacional, as instalações, a arte na web etc.18
Em todas as partes e em diversas seções do livro são propostos trabalhos, reflexões e atividades práticas em que há interação entre as linguagens do componente curricular Arte.
17 PEDROSA apud ARANTES, Otilia. Prefácio. In: PEDROSA, Mario; ARANTES, Otilia (org.). Acadêmicos e modernos: textos escolhidos III. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2004. p. 33.
18 BARBOSA, Ana Mae. Arte na educação: interterritorialidade, interdisciplinaridade e outros inter. In: BARBOSA, Ana Mae; AMARAL, Lilian. Interterritorialidade, mídias, contextos e educação. São Paulo: Edições Sesc: Editora Senac, 2008. p. 23-24.
7. Autonomia do professor
Educação é um fundamento da vida e vivo, no corpo e em tudo que ele pode dar, principalmente enquanto brincadeira, cisma, alegria, amor, fúria, desafio e sonho. É assim que ela acontece de maneira livre, dialógica e ecológica. Perseguindo experiências educativas que tenham liberdade, esperança, amorosidade, respeito e responsabilidade com as diferenças é que avanço nas apostas de disputá-la com um jeito vadio, que ginga entre batalha, cura e enfeitiça as demandas de seus praticantes. Considerando que viver implica práticas comunitárias e que esses modos fazem uso de gramáticas mais amplas do que aquilo que vem sendo apresentado nos últimos tempos, avanço na proposição de tratar a educação como fenômeno mais que humano.19
Reconhecendo as diferentes formações dos professores que assumem o ensino do componente curricular Arte, bem como as constantes transformações que advêm da prática e da pesquisa no processo de ensino-aprendizagem, acredita-se que um material didático voltado a esse componente deve ser adaptável a diversas realidades.
A carga horária, as condições de trabalho, os recursos materiais, a disponibilidade de espaço e o perfil das turmas variam nas escolas de Ensino Médio em todo o país. Assim, esta obra foi concebida de modo a garantir ao professor a possibilidade de escolher um caminho adequado à sua realidade específica. Ele poderá optar por enfatizar determinada linguagem artística, detendo-se às seções dedicadas a ela, o que lhe permitirá demorar-se nas discussões a respeito das obras, dos artistas e de seus contextos, ou, ainda, propor à turma que se dedique aos levantamentos relacionados à linguagem. É interessante que o professor tome suas decisões considerando o Projeto Político Pedagógico da unidade escolar e as particularidades do currículo estadual.
O componente Arte tem grande potencial de dialogar com as culturas juvenis, e é importante que o professor valorize a diversidade existente em cada turma. Ao acolher o repertório dos estudantes, o professor permite que seu universo cultural integre os debates e as criações realizados em sala de aula. Um ambiente heterogêneo e livre de preconceitos favorece as trocas e as descobertas.
Além de fomentar esses encontros entre os estudantes, é interessante incentivá-los a conhecer e se relacionar com a vida cultural do entorno, alimentando o interesse
por artistas, grupos e comunidades tradicionais que realizem produções artísticas nos arredores da escola.
O professor tem autonomia para adaptar o grau de complexidade de uma proposta, de acordo com a demanda do momento, a capacidade e os interesses da turma. Esses ajustes são importantes para alimentar a alegria ligada à realização de uma ação artística.
Ao longo do livro são propostas, por exemplo, ações de leitura de dramaturgias e encenações teatrais.
Quando essas encenações são apresentadas, um processo que até então era íntimo e restrito ao grupo ganha um aspecto público, seja na exibição para o restante da turma, seja em apresentações mais elaboradas para toda a comunidade escolar. No entanto, essas apresentações são apenas a síntese de um processo artístico-pedagógico maior. O foco do aprendizado está na elaboração dessas encenações, ou seja, no processo de pesquisa e montagem, passando pela abordagem das dramaturgias e chegando, por fim, às soluções teatrais levadas à cena.
Quando abordada a linguagem da música, o professor pode se aprofundar nas pesquisas históricas e culturais de cada tema, propiciando ao estudante observar que grupos sociais se envolvem e produzem determinado gênero. Da mesma maneira, o professor pode investir no detalhamento dos conteúdos musicais, buscando trabalhar individualmente os exercícios indicados e ouvindo separadamente cada estudante, o que lhe permitirá perceber melhor as dificuldades de cada um e verificar o que foi apreendido. O professor pode, ainda, investir nas performances, tanto naquelas propostas nas atividades do livro como em outras criações, baseadas em temas, estilos de dança e músicas relacionados ao conteúdo de cada unidade.
Ao trabalhar a linguagem das artes visuais, é interessante que o professor compartilhe a produção não só entre os estudantes, mas com toda a comunidade escolar, organizando exposições temporárias nos corredores da escola. Promover a realização de trabalhos no pátio da escola sempre atrai a curiosidade de outros estudantes e valoriza o componente de Arte, além de gerar afetividade na relação com o espaço escolar.
Sempre que a produção dos estudantes for compartilhada com a comunidade escolar, é importante lembrá-los de que os processos artísticos e pedagógicos são mais relevantes do que quaisquer produtos.
Igualmente imprescindível é discutir com a turma a importância de ser fruidor, enfatizando o treino do olhar e da sensibilidade que se desenvolvem quando se está no papel de observar e refletir sobre as produções artísticas dos colegas. Ninguém é juiz da produção artística
19 RUFINO, Luiz. Ponta-cabeça: educação, jogo de corpo e outras mandingas. Rio de Janeiro: Mórula, 2023. p. 22-23.
alheia; é fundamental evitar a acomodação em um papel de consumidor que se baseia apenas na lógica do gosto. Um olhar generoso e receptivo ao trabalho dos colegas favorece a aprendizagem e o amadurecimento dos estudantes. Assim, os debates estéticos caminham lado a lado com a preocupação ética.
Por meio de ações artísticas, os jovens podem enxergar as potencialidades uns dos outros, exercitando o trabalho coletivo e a empatia.
Nesse processo, é fundamental o olhar do professor. Cada docente instaura na sala de aula certo ambiente, e isso é reconhecido pelos estudantes.
Quanto mais o docente trouxer para a turma os temas e formas artísticos que lhe tocam, mais os estudantes se inspiram a fazer o mesmo movimento. Se, mesmo com todas as dificuldades ligadas à vida escolar, for possível criar um espaço de acolhimento e curiosidade, isso se refletirá nos estudos e nas produções da turma. O componente Arte, dessa forma, reforça as potencialidades da escola como local de valorização da diversidade e de exercício de um olhar crítico, em diálogo com a comunidade do entorno.
8. Avaliação em Arte
Assim como ocorre em outros componentes curriculares, a avaliação do ensino-aprendizagem é uma etapa fundamental para a construção do conhecimento em Arte. Para a importante tarefa de avaliação nesse componente, algumas características do ensino da arte merecem atenção. Uma das eventuais dificuldades da avaliação em Arte deve-se ao grau de subjetividade que pode se estabelecer na relação entre o professor, o trabalho com arte e o estudante. Ao propor uma atividade de exploração criativa de material plástico, corporal ou musical, o professor pode criar expectativas quanto ao resultado – e o mesmo pode acontecer com o estudante. Essas expectativas equivocadas podem decorrer do universo estético referencial do professor, que pode, eventualmente, ser muito distante do universo do jovem estudante. Este, por sua vez, tem intenções e ideias que deseja expressar por meio de técnicas e materiais que ainda não domina plenamente, o que pode levá-lo a se frustrar com o resultado. Somado a isso, é comum que, no decorrer de processos artísticos, surjam imprevistos e mudança de propósito, o que poderá influenciar o resultado de um trabalho.
Alguns estudantes se sentem seguros com sua produção em determinada linguagem artística e ficam mais à vontade na aula de Arte, ao passo que outros podem viver situações de desconforto. Por isso, é de suma importância que o professor reforce constantemente que todos podem realizar as atividades práticas.
Esta obra apresenta seções que podem, de forma combinada, alicerçar de modo amplo a avaliação do ensino-aprendizagem em Arte. Contudo, o professor é detentor das competências necessárias para definir suas próprias estratégias nesse importante exercício.
Avaliação diagnóstica
Tem como objetivo identificar o conhecimento prévio dos estudantes sobre determinado assunto. Além disso, permite ao professor reconhecer tanto as dificuldades quanto as habilidades individuais dos estudantes, possibilitando ajustes no seu planejamento.
Quando e como aplicar: a abertura do capítulo e a seção Introdução são propícias à realização de avaliações diagnósticas. Todos os capítulos se iniciam com uma apresentação do tema que será aprofundado, apoiada em textos, imagens e exemplos, e finalizam com questões que permitem avaliar a compreensão do estudante acerca do que será tratado, de maneira diagnóstica. Ao final dessas sessões, há uma proposta de atividade de sensibilização, permitindo ao professor identificar eventuais dificuldades e potencialidades dos estudantes quando estão envolvidos em uma ação prática.
Avaliação formativa
Permite acompanhar, de modo contínuo, o desenvolvimento da turma e de cada estudante ao longo do percurso de ensino-aprendizagem em Arte. Seu foco está na formação dos estudantes, exigindo uma atenção especial ao progresso individual, de modo a garantir que o ritmo do trabalho esteja adequado ao grupo. Isso possibilita que o planejamento inicial seja revisto sempre que necessário.
Essa avaliação é realizada com base em duas estratégias. A primeira é a observação atenta das atividades do estudante. Vale destacar que essa observação não se limita às ações práticas mas também inclui o acompanhamento das experiências de fruição e contextualização, ou seja, avalia-se a capacidade que o estudante tem de ler e interpretar obras e manifestações artísticas, conectando-as com seu contexto social.
A segunda estratégia gira em torno da avaliação coletiva, momento em que, partindo de perguntas gerais, o professor promove discussões em grupo sobre as atividades realizadas, possibilitando aos estudantes refletir sobre seus processos criativos, compartilhar suas percepções e ouvir diferentes pontos de vista.
É importante que, durante a avaliação coletiva de atividades práticas, o estudante compartilhe suas impressões sobre o trabalho, desenvolvendo, assim, a habilidade de criar um discurso verbal sobre sua produção nas diversas linguagens artísticas.
Nesse processo, é fundamental observar se o estudante:
• participa dos debates, das discussões e das conversas em sala de aula;
• faz os levantamentos sugeridos na seção Pesquisa;
• realiza as propostas com rigor e empenho, em conformidade com o que foi solicitado;
• busca e xplorar todo o seu potencial nos trabalhos realizados.
O professor que faz avaliações formativas regulares, tanto coletivas quanto individuais, conhece melhor os estudantes, tornando-se capaz de avaliar sua participação, seu empenho e seu desenvolvimento durante o ciclo de ensino-aprendizagem em Arte.
Quando e como aplicar: as seções Contexto, Repertório e Ação são indicadas para embasar a avaliação formativa. Nas seções Contexto e Repertório, o foco deve estar na capacidade do estudante em apreciar e contextualizar as obras e manifestações artísticas. Já a seção
Ação possibilita ao professor avaliar como o estudante mobiliza, na prática, os elementos das artes.
Avaliação ipsativa
Busca comparar o desenvolvimento de um estudante com seu próprio desempenho em um momento anterior. Trata-se de uma estratégia de avaliação especialmente interessante no ensino de Arte, pois o estudante pode avaliar seu progresso individual sem se comparar aos colegas. Isso oferece ao jovem a oportunidade de reconhecer seu crescimento ao longo do processo de aprendizagem.
Quando e como aplicar: há duas seções destinadas especificamente à avaliação ipsativa: Introdução e Encerramento. Em ambos os momentos, propõe-se ao estudante que escreva uma carta para si mesmo no futuro, e que ele mesmo a responda ao término do curso de Arte no Ensino Médio. Propor ao estudante que compare as ideias expostas nas cartas, ou seja, sua concepção de arte e de cultura ao adentrar o Ensino Médio e ao fim desse ciclo, permite que ele perceba mudanças.
Outro recurso para avaliação ipsativa, apresentado no início do livro, envolve a concepção do portfólio do estudante, que pode ser composto de uma pasta física e/ ou digital para organizar e arquivar suas produções. Convidar o estudante a revisitar esse portfólio ao término do percurso permite que ele relembre suas capacidades e compreensão iniciais, bem como o que foi capaz de desenvolver ao longo dessa jornada.
Avaliação comparativa
Busca comparar o desempenho dos estudantes em relação a um padrão externo. Pode ser adequada para avaliar conhecimentos teóricos relativos à história da arte, à autoria de obras de diferentes linguagens e a conceitos abordados nas distintas linguagens artísticas.
Quando e como aplicar: o momento mais propício à aplicação da avaliação comparativa é ao término da seção Ação. Recomenda-se retomar com os estudantes o que foi estudado na seção Teorias e modos de fazer, comparando o que foi desenvolvido às técnicas apresentadas e estudadas. O professor também pode lançar mão de outras estratégias, como solicitar aos estudantes que elaborem resumos das seções Contexto, Repertório e Teorias e modos de fazer, comparando o que foi escrito no resumo com o conteúdo desenvolvido nas seções.
Avaliação somativa
Atende à necessidade de quantificar o desempenho do estudante e registrá-lo por meio de notas ou conceitos. Esse tipo de avaliação acompanha algumas etapas do ciclo de ensino-aprendizagem e pode ocorrer a cada bimestre, trimestre ou semestre, ou, ainda, anualmente. Por essa razão, integrar os dados das avaliações formativas e ipsativas pode ser uma boa estratégia para quantificar o desempenho do estudante e manifestá-lo por meio de uma nota ou de um conceito. Em razão da relevância da experimentação e da criação na construção do conhecimento em Arte, é recomendável incluir, entre os critérios de avaliação, a disponibilidade e o empenho do estudante nesses processos.
Quando e como aplicar: esta obra enfatiza a importância dos processos e oferece oportunidades para que possam ser avaliados e traduzidos em notas e conceitos. Se houver necessidade ou interesse em propor uma ferramenta específica para o momento da avaliação somativa, com o objetivo de complementar os dados das demais avaliações, o professor pode elaborar testes e provas sobre os conteúdos abordados na obra. As seções Pesquisa e Síntese estética estimulam a investigação autônoma, a reflexão e a interpretação de texto, podendo servir de base para provas dissertativas, por exemplo.
Avaliação de exames de larga escala
Com o objetivo de preparar os estudantes para as provas de vestibular, etapa essencial para quem deseja ingressar no Ensino Superior, é importante que se aplique,
ao longo do Ensino Médio, provas de múltipla escolha, para que os estudantes se familiarizem com esse tipo de avaliação.
Para a aplicação desse modelo de prova, o professor deve providenciar um cartão-resposta a ser preenchido pelos estudantes para registrar suas escolhas, simulando, portanto, todas as etapas desse tipo de avaliação.
Quando e como aplicar: ao término de cada unidade do Livro do estudante há a seção Arte em questão, que apresenta uma prova de múltipla escolha abordando os conteúdos que foram estudados, com questões retiradas de diferentes vestibulares nacionais.
9. Museus, exposições, espetáculos, filmes e shows
Parte importante do processo de ensino-aprendizagem em Arte se dá na experiência com as obras.
Por isso, são recomendáveis visitas a museus, mostras, exposições, espetáculos, shows e festivais sempre que possível. Usufruir do ambiente artístico e passar a frequentar espaços culturais é uma mudança de atitude que o ensino de arte na escola pode estimular. Mas, para isso, é necessário planejamento. Muitas instituições oferecem programas de visita guiada mediante agendamento prévio.
Para organizar uma excursão cultural, o ideal é que o professor visite a exposição ou assista ao espetáculo antecipadamente, leia os materiais disponíveis e pesquise informações sobre o(s) artista(s). Mais importante que conhecer os dados biográficos do artista é buscar informações sobre a obra, as técnicas utilizadas em sua elaboração e o contexto em que foi produzida.
Em uma visita a uma exposição pequena, por exemplo, o professor pode determinar um tempo para o grupo circular livremente entre os trabalhos, explorando o contato com as obras e o espaço museográfico. Os estudantes devem ser orientados a ler as legendas dos trabalhos, observando o nome do artista, o ano em que a obra foi criada e a técnica utilizada em sua elaboração. É importante, ainda, orientar os jovens a anotar apenas os dados das obras que lhes despertam interesse. Depois, todos poderão visitar uma obra que o professor queira
apresentar ao grupo. Diante dela, após incentivar o compartilhamento das primeiras impressões, o docente deve conduzir a leitura visual e fazer uma breve explanação sobre o artista e a obra (daí a importância de visitar, ler e pesquisar com antecedência). Em seguida, os estudantes podem eleger um ou mais trabalhos a serem analisados por todos. Uma leitura visual atenta de duas ou três obras é suficiente.
No caso de um show ou de um espetáculo musical, teatral ou de dança, o professor pode indicar aspectos a serem observados, como a iluminação em uma cena, o som de determinado instrumento em uma música, o gestual de um ator, um momento específico de uma encenação. Deve-se cuidar para não revelar detalhes ou partes importantes do enredo. Ao fim do espetáculo, é interessante reservar um momento para que os estudantes compartilhem impressões entre si. Antes de assistir a um filme com a turma, também é possível propor pontos de atenção, especialmente em relação aos elementos específicos da linguagem cinematográfica, como enquadramentos, duração das sequências, iluminação, movimentos de câmera. Ao fim da exibição, a turma pode conversar sobre esses elementos.
Para complementar a experiência de fruição, ou quando as excursões culturais não são viáveis – como no caso de estudantes que residem em locais distantes de centros culturais, museus, cinemas e teatros –, é possível recorrer a alternativas virtuais. Nos sites de algumas instituições, é possível visitar exposições ou assistir a shows, filmes, espetáculos de dança e de teatro.
10. Cronograma
A seguir, é apresentada uma sugestão de organização dos conteúdos do Livro do estudante , atendendo a um planejamento semestral, trimestral ou bimestral. Esse planejamento considera um ano letivo com 40 semanas, com uma aula semanal para o componente Arte, abrangendo os três anos do Ensino Médio. Cada linha equivale, portanto, a duas semanas/aulas do ano letivo.
A quantidade de aulas e a periodicidade do componente Arte variam de acordo com a rede de ensino de cada região ou município. Por isso, o cronograma pode ser adaptado conforme as especificidades da sua escola.
1 o Semestre 20 aulas
1 o Trimestre 14 aulas 1 o Bimestre 10 aulas
2 o Bimestre 10 aulas
2 o Trimestre 13 aulas
3 o Bimestre 10 aulas
2 o Semestre 20 aulas
3 o Trimestre 13 aulas 4 o Bimestre 10 aulas
1o Ano
Introdução
Produção do portfólio
Unidade 1: Matrizes culturais
Abertura da unidade
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 1: Culturas indígenas
Introdução e Abertura
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 1: Culturas indígenas
Artes visuais
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 1: Culturas indígenas
Música
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 1: Culturas indígenas
Teatro
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 1: Culturas indígenas
Ponte para outras linguagens artísticas
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 1: Culturas indígenas
Síntese estética
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 2: Culturas africanas
Introdução e Abertura
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 2: Culturas africanas Artes visuais
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 2: Culturas africanas
Música
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 2: Culturas africanas
Dança
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 2: Culturas africanas
Ponte para outras linguagens artísticas
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 2: Culturas africanas Síntese estética
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 3: Culturas europeias Introdução e Abertura
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 3: Culturas europeias
Teatro
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 3: Culturas europeias
Dança
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 3: Culturas Europeias Artes integradas
Unidade 1: Matrizes culturais
Capítulo 3: Culturas europeias
Ponte para outras linguagens artísticas Síntese estética
Unidade 1: Matrizes culturais
Integrando com Matemática e suas Tecnologias
Unidade 1: Matrizes culturais Arte em questão
1 o Semestre 20 aulas
1 o Trimestre 14 aulas 1 o Bimestre 10 aulas
2 o Bimestre 10 aulas
2 o Trimestre 12 aulas
3 o Bimestre 10 aulas
2 o Semestre 20 aulas
3 o Trimestre 13 aulas 4 o Bimestre 10 aulas
2o Ano
Retomada do portfólio do ano anterior
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Abertura da unidade
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 4: Arte e colonização Introdução e Abertura
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 4: Arte e colonização Artes visuais
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 4: Arte e colonização
Música e dança – Parte 1
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 4: Arte e colonização
Música e dança – Parte 2
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 4: Arte e colonização Ponte para outras linguagens artísticas
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 4: Arte e colonização Síntese estética
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 5: Modernismos no Brasil
Introdução e Abertura
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 5: Modernismos no Brasil Artes visuais
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 5: Modernismos no Brasil Dança
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 5: Modernismos no Brasil Teatro
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 5: Modernismos no Brasil
Ponte para outras linguagens artísticas
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 5: Modernismos no Brasil Síntese estética
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 6: Uma arte tropical Introdução e Abertura
Unidade 2: Caminhos da Arte no Brasil
Capítulo 6: Uma arte tropical Música
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 6: Uma arte tropical Teatro
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 6: Uma arte tropical Artes integradas
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Capítulo 6: Uma arte tropical Ponte para outras linguagens artísticas Síntese estética
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil
Integrando com Ciências Humanas e Sociais Aplicadas
Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil Arte em questão
1 o Semestre 20 aulas
1 o Trimestre 14 aulas 1 o Bimestre 10 aulas
2 o Semestre 20 aulas
3o Ano
Retomada do portfólio do ano anterior
Unidade 3: Arte hoje
Abertura da unidade
Capítulo 7: Multiculturalismo
Introdução e Abertura
Unidade 3: Arte Hoje
Capítulo 7: Multiculturalismo
Artes visuais
Unidade 3: Arte Hoje
Capítulo 7: Multiculturalismo
Música e dança – Parte 1
Unidade 3: Arte hoje
Capítulo 7: Multiculturalismo
Música e dança – Parte 2
Unidade 3: Arte hoje
Capítulo 7: Multiculturalismo
Ponte para outras linguagens artísticas
Síntese estética 2 o Bimestre 10 aulas
Unidade 3: Arte Hoje
Capítulo 8: Arte contemporânea
Introdução e Abertura
Unidade 3: Arte hoje
Capítulo 8: Arte contemporânea
Unidade 3: Arte hoje
Capítulo 8: Arte contemporânea
Teatro
Unidade 3: Arte hoje
Capítulo 8: Arte contemporânea
Música
Dança 2 o Trimestre 13 aulas
3 o Bimestre –10 aulas
3 o Trimestre 13 aulas
4 o Bimestre 10 aulas
Unidade 3: Arte hoje
Capítulo 8: Arte contemporânea
Ponte para outras linguagens artísticas Síntese estética
Unidade 3: Arte hoje
Capítulo 9: Arte e os desafios do nosso tempo
Introdução e Abertura
Unidade 3: Arte hoje
Capítulo 9: Arte e os desafios do nosso tempo Artes visuais
Unidade 3: Arte hoje
Capítulo 9: Arte e os desafios do nosso tempo
Teatro
Unidade 3: Arte hoje
Capítulo 9: Arte e os desafios do nosso tempo Artes integradas
Unidade 3: Arte hoje
Capítulo 9: Arte e os desafios do nosso tempo
Ponte para outras linguagens artísticas Síntese estética
Unidade 3: Arte hoje
Integrando com Linguagens e suas Tecnologias
Integrando com Ciências da Natureza e suas Tecnologias
Unidade 3: Arte hoje Arte em questão
Projeto Arte
Passos 1 a 5
Projeto Arte
Passos 6 e 7
Projeto Arte
Passos 8 e 9
Encerramento
Orientações específicas
Introdução: O que é cultura e o que é arte?
Contexto (p. 8, 9 e 10)
A chegada dos estudantes ao Ensino Médio é um encontro para a abertura de caminhos. Receba a turma e destaque este momento: o início do percurso do componente curricular Arte, que será construído com os jovens, valorizando seus contextos culturais por meio de dinâmicas e de conteúdos sugeridos por você, professor, com o apoio do Livro do estudante
Após essa recepção, convide a turma para uma leitura coletiva das imagens da performance de Paulo Bruscky. Leia também as legendas, aproveitando para demarcar o exercício de identificar as características de uma obra de arte em sua legenda. Para começar os debates sobre a pergunta proposta no início da seção, solicite aos estudantes que comentem os elementos observados, incluindo a placa com os dizeres “O que é a arte? Para que serve?”.
Em seguida, avance para a leitura coletiva do texto. Em linhas gerais, cultura pode ser definida como um fenômeno integral que abrange a forma como uma sociedade se estrutura e se comporta, incluindo tudo o que produz. As formas culturais são híbridas, sempre imbricadas em diferentes relações, feitas de disputa, influências e trocas, permeadas por relações de poder.
Evite uma definição monolítica para o termo arte
Busque abarcar todas as formas expressivas que envolvam linguagens artísticas. Inclua elementos do repertório artístico e cultural dos estudantes como formas legítimas de arte, aproximando os conceitos da realidade deles. Após a leitura do texto e das imagens da performance de Paulo Bruscky, avance para as perguntas, a fim de suscitar uma conversa coletiva que retome o que foi investigado na seção.
Uma carta para o futuro (p. 10)
Incentive os estudantes com a perspectiva de produzir uma carta destinada a eles mesmos, no futuro. Destaque que o que escreverem ficará guardado até a última aula de Arte do Ensino Médio. Reforce a importância de guardar bem a carta – tanto a original quanto o registro digital –, para que ela possa ser resgatada no momento propício.
Guardar e organizar um arquivo (p. 11)
O esforço do registro e da organização da memória é uma forma de valorização da produção artística
dos estudantes, tornando possível, inclusive, que eles compartilhem suas criações com outras pessoas. Solicite a cada estudante que crie uma pasta física ou virtual para guardar seus trabalhos de Arte, incentivando uma cultura de registro das produções.
• Competências específicas de Linguagens e suas Tecnologias: 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7.
• Habilidades de Linguagens e suas Tecnologias : EM13LGG101, EM13LGG102, EM13LGG103, EM13LGG104, EM13LGG105, EM13LGG201, EM13LGG202, EM13LGG203, EM13LGG204, EM13LGG301, EM13LGG302, EM13LGG303, EM13LGG304, EM13LGG305, EM13LGG401, EM13LGG402, EM13LGG501, EM13LGG502, EM13LGG503, EM13LGG601, EM13LGG602, EM13LGG603, EM13LGG604, EM13LGG701, EM13LGG702, EM13LGG703 e EM13LGG704.
Orientações didáticas
Ao longo do processo pedagógico proposto, o professor deve buscar promover, sempre que possível, oportunidades de aprendizagem entre os estudantes provenientes de diferentes culturas. É essencial apresentar e valorizar as culturas autóctones, ressaltando a originalidade de seus aspectos simbólicos e estéticos, em contraste com as formas, muitas vezes diluídas, da cultura de massa.
Outra dinâmica que deve ser recorrente é a inclusão das culturas juvenis nos debates com a turma, tendo em vista não perder as oportunidades de ampliar os repertórios culturais, incorporando produções artísticas diversas, em especial as brasileiras. Tenha sempre cuidado ao abordar temas delicados e pessoais, que podem sensibilizar determinados estudantes de forma particular, evitando expô-los diante dos colegas. Contexto da unidade (p. 12 e 13)
Ao apresentar a abertura da Unidade 1, pode-se pedir a um estudante que leia em voz alta o texto de Ailton Krenak. Depois, solicitar a todos que observem
a fotografia da mulher tuyuca, questionando se ela remete a alguma lembrança dos estudantes.
O texto de Ailton Krenak traz uma pista importante sobre a metodologia proposta no livro. No percurso a ser trilhado, estudantes e professores vão conhecer múltiplas narrativas, estudar a cultura de povos indígenas, africanos e europeus, bem como descobrir histórias que foram silenciadas. Aproveite a oportunidade para apresentar a trajetória de Ailton Krenak, ativista, escritor e uma das vozes mais importantes do pensamento indígena no Brasil. Em abril de 2024, Krenak tornou-se o primeiro indígena a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras.
Ao longo da Unidade 1, com base nas três principais matrizes culturais que formam a cultura brasileira, propõe-se olhar para o passado de forma renovada e crítica. Em muitas atividades, os estudantes serão convidados a aprender com os mais velhos e a trocar com os colegas o que sabem sobre suas culturas familiares.
Cabe ao professor de Arte promover uma mediação intercultural, atuando na coletividade para fomentar a troca de saberes entre os jovens.
O professor, possuidor de uma cultura familiar e comunitária específica, acrescida de saberes adquiridos em sua formação acadêmica, também é convidado a participar dessa troca de forma ativa.
Capítulo 1: Culturas indígenas
Abertura (p. 14 e 15)
As páginas de abertura do capítulo possibilitam levantar os conhecimentos prévios dos estudantes acerca das culturas indígenas. Incentive a participação de todos, perguntando sobre os povos que conhecem e listando-os no quadro. Apoie-se nas imagens do livro para provocar diferentes abordagens sobre produção de objetos, música, sociabilidade e política. Recomenda-se ouvir o que os jovens sabem sobre culturas indígenas e fazer uma síntese dessas informações.
Por que estudar culturas indígenas? (p. 16 e 17)
Reforce com a turma a grande diversidade das culturas indígenas no Brasil. Os povos que vivem no alto rio Negro, como os tukano e os baniwa, são muito diferentes dos que vivem no norte da Amazônia, como os wapichana e os makuxi, ou dos huni kuin e dos ashaninka, que vivem no Acre. O mesmo acontece com os 16 povos
que vivem no Parque Indígena do Xingu (MT). Embora alguns estejam interligados em redes de troca e tenham similaridades em seus modos de vida, eles mantêm sua variedade linguística. As cosmologias de povos como os guarani mbya e os kaingang do sudeste do país são diferentes das de povos como os krenak e os maxakali de Minas Gerais ou os terenas e os kadiwéu do Mato Grosso do Sul, o que reflete uma rica diversidade cultural.
Atividade de sensibilização: pedagogia do sonho (p. 17)
Mobilizar o sonho pode ser algo instigante para os adolescentes. Para alguns povos indígenas, o sonho representa uma força social capaz de guiar as decisões de toda a aldeia. No contexto da vida urbana, existe um declínio do ato de sonhar (ou de lembrar o que se sonha), resultado, em grande medida, do excesso de telas. Em uma realidade que notoriamente provoca sentimentos de vazio existencial, especialmente entre os jovens, é essencial criar espaços de valorização do relato dos sonhos, de reflexão acerca da atividade humana de sonhar e de escuta da intimidade do outro.
Sugestão de leitura
Sidarta Ribeiro. O oráculo da noite. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
Para aprofundar o tema dos sonhos, recomenda-se a leitura desse livro, que traça uma relação entre a ciência e a história do sonho, partindo de informações antropológicas, históricas, psicanalíticas e literárias.
Artes visuais
Contexto: culturas indígenas e
artes visuais (p. 18)
Enfatize o protagonismo dos artistas e curadores indígenas hoje, no Brasil e no mundo, mencionando sua presença no Pavilhão Hãhãwpuá da Bienal de Artes de Veneza de 2024. Comente com a turma como a arte indígena contemporânea tem modificado a história da arte brasileira ao oferecer novos olhares para o passado, exigindo uma análise crítica das concepções coloniais sobre os povos indígenas ao longo de quinhentos anos. Ao abordar práticas indígenas, como a pintura e o adorno corporal, a produção de artefatos e os rituais, procure situá-las no presente, evidenciando que elas estão vivas e em transformação.
Repertório 1: arte e artefatos (p. 19)
O trançado de arumã dos wayana exemplifica os saberes indígenas sobre a floresta. Muitas das ativi-
dades cotidianas desses povos estão relacionadas ao manejo de espécies vegetais, tanto na produção de alimentos quanto na produção de artefatos. Os objetos produzidos com fibras vegetais são resistentes e compostáveis, promovendo um modo de vida com baixo impacto ambiental e reduzida produção de resíduos. Ressalte a complexidade das técnicas e a qualidade da execução desses objetos feitos à mão. Em muitas sociedades indígenas, a prática artística não é uma especialização; todos podem tecer, mas aqueles que se destacam são considerados mestres.
Repertório 2: adornos corporais
e rituais (p. 20)
Para os indígenas, toda atividade tem uma função. A pintura corporal, por exemplo, tem uma função ritual. Ela pode ser feita de modo simples e rápido em rituais de passagem de meninos e de meninas kaxinawá, mas pode ser feita com delicados palitos em corpos de adultos em outras ocasiões, ou seja, forma e sentido variam conforme o contexto.
Repertório 3: arte indígena contemporânea (p. 21)
Gustavo Caboco é um dos jovens artistas indígenas que trazem um olhar crítico para a colonização, propondo novas formas de compreender o mundo.
Aprofundamento
Para saber mais do conceito de Coma colonial, assista à entrevista concedida por Gustavo Caboco ao jornal Folha de S.Paulo, em abril de 2023. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=pZ0VTu65QOc (acesso em: 31 out. 2024).
Pesquisa: ritos e artefatos (p. 22)
Incentive os estudantes a se aprofundar no conceito de ritual e a fazer levantamentos sobre rituais de povos indígenas além dos citados.
Existem muitos museus indígenas hoje no Brasil, você pode pesquisar se há algum museu em sua cidade que tenha um acervo de arte indígena. É importante abordar o tema do capítulo de maneira local, trazendo informações sobre as culturas indígenas em sua região.
Conheça, a seguir, uma relação complementar de museus indígenas localizados em cidades brasileiras.
• Museu Paraense Emílio Goeldi, em Belém (PA).
• Museu do Marajó, em Cachoeira do Arari (PA).
• Centro Cultural Ikuiapá (CCI), em Cuiabá (MT).
• Museu de Arte Indígena (MAI), em Curitiba (PR).
• Museu dos Povos Indígenas da Ilha do Bananal, em Formoso do Araguaia (TO).
• Museu da Amazônia (Musa), em Manaus (AM).
• Museu da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre (RS).
• Museu Virtual Muká Mukaú – Portal da cultura viva Pataxó, em Porto Seguro (BA).
• M useu Histórico e Pedagógico Índia Vanuíre, em Tupã (SP).
Teorias
e modos de fazer: objetos rituais (p. 23)
O conteúdo da seção discorre sobre o conceito de ritual, apresentando esse tipo de manifestação como uma forma de expressão em que vida e arte se unificam. Pergunte aos estudantes se eles já participaram de algum acontecimento que pode ter um teor ritualístico, como batizados, casamentos, formaturas etc., por simbolizar uma mudança importante na vida dos principais envolvidos. Comente que há diversos rituais pertencentes às culturas do mundo, cada um com suas características.
Aprofundamento
Para saber mais sobre Denilson Baniwa, visite o site do Prêmio Pipa. Disponível em: www.premiopipa. com/denilson-baniwa/ (acesso em: 31 out. 2024).
Ação: objetos e rituais (p. 24 e 25)
Esta primeira ação artística marca o ponto de partida de um trabalho a ser desenvolvido no Ensino Médio e pode ser considerada um ritual de integração entre os estudantes. Não espere um resultado específico e valorize todas as etapas do processo criativo que envolverá cada grupo, incentivando a participação e a colaboração de todos.
O ritual pode ser organizado no pátio, na quadra ou em uma área aberta da escola.
Além das máscaras, uma possibilidade é confeccionar pequenos objetos de barro. Se for possível obter barro de modelagem, ele pode ser distribuído aos estudantes para que cada um faça uma pequena peça. A experiência de dar forma a um material como esse tem forte apelo sensorial, além de ser uma atividade acessível a estudantes cegos ou com baixa visão. Nesse primeiro contato com o barro de modelagem, em vez de propor a construção de formas ou figuras, é interessante incentivar os jovens a amassar o barro e verificar as formas que resultam desse processo. Os objetos podem ser reunidos em um círculo no centro da sala.
Música
Contexto: música e ritmo (p. 26)
Ao abordar a música indígena, destaque o caráter cotidiano do fazer musical. Embora a indústria cultural atribua a essa arte um valor comercial, entre grupos indígenas brasileiros, com frequência, ela desempenha funções rituais ou marca momentos importantes nos ciclos temporais da comunidade. Caso haja algum estudante indígena, peça a ele que compartilhe sua experiência e apresente uma música que seja familiar a ele.
Repertório 1: a voz da floresta (p. 27)
A diversidade de instrumentos musicais e de estilos de música é tão vasta quanto a de grupos indígenas no Brasil. Ressalte aos estudantes que, para os huni kuin, a voz desempenha um papel central na música, mas que cada povo segue sua própria tradição. Enfatize, ainda, que a imitação é um método comum de aprendizado em qualquer prática musical. Ao desenvolver essa habilidade, aprende-se a tocar um instrumento ou a cantar. Se a curiosidade dos estudantes for despertada, é possível propor uma pesquisa mais aprofundada sobre os hábitos do pássaro japiim.
Repertório 2: o carimbó (p. 28)
Destaque o carimbó como expressão cultural que integra manifestações africanas e indígenas, exemplificando os processos de hibridismo cultural no país. É possível ainda explorar a dança do carimbó, que também compõe essa manifestação.
Aprofundamento
Para saber mais sobre o carimbó, assista ao vídeo Caminhos da Reportagem: nas batidas do Carimbó, exibido pela TV Brasil. Disponível em: www.youtube.com/ watch?v=jDg0NZ7poWA (acesso em: 31 out. 2024).
Repertório 3: corais (p. 29)
É possível explorar a prática coral com base nos corais mbyá guarani. Pergunte aos estudantes se já participaram de um coral e, após ouvir as faixas do álbum indicado, peça a eles que comparem o coral guarani com outras experiências que tiveram. Questione acerca dos instrumentos que acompanham os corais em espaços como escolas e igrejas e compare-os aos
utilizados nos corais mbyá guarani. Caso haja algum estudante guarani, peça a ele que descreva como foi sua experiência de canto durante a infância.
Pesquisa: cantos e instrumentos indígenas (p. 30)
O objetivo desta seção é destacar as diferenças entre a produção indígena autêntica e aquelas que se inspiram nessas culturas. O material de Magda Pucci e Berenice de Almeida é referência para acessar, de maneira didática e organizada, a produção musical indígena. Além disso, o vídeo do fotógrafo e documentarista Felipe Scapino oferece uma imersão na prática musical guarani. Outra fonte relevante é o Indígenas.BR – Festival de Músicas Indígenas, que promove oficinas e conversas, além de produzir clipes musicais de artistas indígenas de diferentes povos. Alguns desses trabalhos podem ser acessados na videoteca do site do Centro Cultural Vale Maranhão ou no canal oficial da instituição na internet, disponíveis em: https://ccv-ma.org.br/ videoteca/acervo-indigenas e www.youtube.com/watch?v=ZrlXtZZLCPI (acessos em: 31 out. 2024).
Acerca das produções que se inspiram no universo musical indígena, além das obras de Marlui Miranda e de Milton Nascimento – compositores que realizaram uma grande imersão na cultura de grupos indígenas –, é possível destacar o álbum Roots (1996), da banda mineira de rock Sepultura, que conta com a parceria dos xavantes. O vídeo que mostra o processo de gravação do álbum pode ser encontrado na internet.
Teorias e modos de fazer:
instrumentos (p. 31)
Explore com os estudantes as imagens que ilustram os exemplos de instrumentos musicais. Avalie se conhecem esses instrumentos e, se possível, oriente os jovens a fazer uma breve busca na internet sobre cada um deles. Peça aos estudantes que mencionem outros exemplos de cada uma das classificações. Se houver instrumentos musicais disponíveis na escola, ou se os estudantes tiverem instrumentos em casa, essa é uma boa oportunidade de trazê-los para a sala de aula e conversar sobre como seu som é produzido e em qual classificação se enquadram.
Ação: construindo uma flauta d’água (p. 32 e 33)
Recomenda-se que essa atividade seja feita em grupo. Confeccionar a flauta pode ser um processo
partilhado e divertido, além de permitir que os estudantes ajudem uns aos outros. Oriente os jovens a se prepararem para a atividade, separando o material com antecedência. Caso seja conveniente, é possível substituir a mangueira por um cano de PVC fino, com diâmetro de 20 a 30 milímetros – o cano pode, inclusive, ser mais fácil de soprar do que a mangueira. Busque o material mais acessível para a turma.
Os estudantes podem encontrar dificuldade para emitir um som com o sopro nos primeiros contatos com o instrumento. Caso isso aconteça, oriente-os a começar a soprar sem apertar a bexiga, apenas usando uma das mãos para sustentá-la. Para emitir os primeiros sons, é preciso soprar devagar, direcionando o ar para baixo, da mesma maneira como é feito em brincadeiras de produção de sons com garrafas de vidro. Só depois de estarem seguros com os primeiros sons, os estudantes devem experimentar sons mais agudos, apertando suavemente a bexiga. Para conhecer uma possibilidade de construção da flauta d’água e da emissão do som, assista ao vídeo #BrinquedosqueaGenteFazEmCasa: Encontro 9: Flauta d’água, disponível em: www.youtube.com/watch?v=NOFirSaNmWs (acesso em: 31 out. 2024).
Dê tempo aos estudantes para que criem seus ostinatos. Para isso, será preciso experimentar diferentes melodias e ritmos até chegarem a realizações das quais gostem mais. Garanta que essa etapa seja realizada em grupo, para que os jovens compartilhem ideias e sugestões para as melodias. Como desdobramento da atividade, pode-se propor uma dinâmica em que a turma crie combinações entre os ostinatos compostos pelos outros grupos. Assim, promova ensaios em que um grupo toque seu ostinato simultaneamente aos demais. Se as combinações agradarem, grave-as para registrar as criações.
Teatro
Contexto: teatro e os povos indígenas (p. 34)
Caso haja estudantes indígenas na turma, convide-os a compartilhar experiências a respeito de suas vivências, garantindo uma escuta respeitosa e um espaço livre de preconceitos. Os povos indígenas sofrem diversas formas de apagamento cultural ao longo da história, por isso, ao abordar sua produção artística, incentive a curiosidade dos estudantes, bem como uma apreciação genuína e interessada.
Repertório 1: Azira’i
(p. 35)
Realize com a turma a leitura visual da imagem do espetáculo Azira’i. Há uma mulher indígena sentada em uma cadeira giratória. Chame a atenção dos jovens para o figurino. Ele alude à pintura corporal de povos indígenas, mas as linhas atravessam roupas urbanas, deixando nítida a complexidade da vivência indígena na contemporaneidade.
Aprofundamento
Para conhecer mais do espetáculo Azira’i e de sua idealizadora, a atriz, roteirista, diretora e ativista brasileira Zahy Tentehar, assista ao vídeo Zahy Tentehar fala sobre arte, ancestralidade e sua obra: Espetáculo Azira’i. Disponível em: www.youtube.com/watch? v=TPwqZ1RzVl8&t=2s (acesso em: 31 out. 2024). No vídeo, imagens do espetáculo são conectadas às falas da atriz e ao contexto das vivências indígenas, contribuindo para a compreensão da relação da temática indígena contemporânea com o teatro.
Repertório 2: sacerdote do riso (p. 36)
Projete para a turma trechos do documentário Hotxuá (2011), disponível em: www.youtube.com/ watch?v=po5nkwrN4mY&t=13s (acesso em: 31 out. 2024). Converse com os estudantes sobre o ritmo da obra. Pode haver um estranhamento com as pausas, pois o filme difere, em muito, das filmagens produzidas para as redes sociais. Aproveite para refletir sobre o ritmo da vida na aldeia krahô, em relação ao vivenciado pelos estudantes em seu cotidiano.
Repertório 3: o silêncio do mundo (p. 37)
Converse com a turma sobre a parceria entre um artista indígena e uma artista não indígena em O silêncio do mundo. Essa união reforça a possibilidade de a causa indígena ser abraçada por diversos aliados, visando à crítica aos processos coloniais e à exploração desenfreada dos recursos naturais, além de propiciar que mais brasileiros tenham acesso aos conhecimentos produzidos pelos povos indígenas.
Pesquisa: teatro e os povos
indígenas nos dias atuais (p. 38)
Se houver tempo hábil, proponha à turma a leitura coletiva do texto teatral O silêncio do mundo. Trata-se
de uma dramaturgia contemporânea em que não há personagens ficcionais, e as falas são atribuídas aos artistas Ailton Krenak e Andreia Duarte. É interessante que um estudante leia em voz alta as falas de Ailton, outro leia as falas de Andreia, e um terceiro leia as rubricas. Você pode selecionar as cenas que julgar pertinentes e revezar a leitura entre os estudantes.
Pode ser que alguns estudantes tenham dificuldade para ler em voz alta. Procure criar um ambiente de respeito e apoio mútuo entre eles, pois o treino da leitura em voz alta é importante não apenas para o trabalho com teatro mas também para o processo educacional como um todo.
Ainda no estudo da seção, oriente os estudantes a acessar a página dedicada à terceira edição do festival Teatro e os Povos Indígenas (TePI), na qual é possível baixar o clipping do evento, que reúne reportagens e críticas teatrais. Disponível em: www.outramargem. art/tepi2023 (acesso em: 31 out. 2024).
Teorias e modos de fazer: teatralidade e narrativa (p. 39)
O conceito de teatralidade é complexo e pode ser abordado de muitas maneiras, a depender do referencial teórico escolhido. Caso você tenha familiaridade com outro enfoque teórico, fique à vontade para explorá-lo junto à turma.
O importante é que a ideia de teatralidade legitime produções artísticas e formas de expressão de pessoas e povos indígenas. É nesse sentido que se propõe um estudo teórico e prático a respeito da narrativa. É interessante verificar se existem livros de Daniel Munduruku disponíveis na biblioteca da escola ou em bibliotecas públicas de sua região. Para complementar o tema estudado, sugere-se explorar a página do artista, que reúne textos e vídeos diversos. Disponível em: https://danielmunduruku.blogspot.com/ (acesso em: 31 out. 2024).
Ação: contação de histórias aprendidas com um parente mais velho (p. 40 e 41)
O primeiro cuidado essencial que se deve ter ao realizar esta atividade é mediar a participação de estudantes que não tenham laços familiares ou comunitários próximos com pessoas mais velhas. Alguns podem vivenciar relações conflituosas com seus responsáveis ou não ter vínculos afetivos com pessoas de outras ge-
rações. Se isso se mostrar um obstáculo para a realização da tarefa, colabore com o estudante na busca por soluções alternativas. Ele pode, por exemplo, fazer o trabalho em dupla, acompanhando um colega na conversa com seu parente e participando da criação conjunta da contação de histórias. Pode, também, pesquisar histórias com a comunidade escolar: professores, coordenadores e demais funcionários.
Na etapa em que são incorporados objetos e figurinos, incentive os estudantes a colaborar entre si na busca por recursos materiais. Eles podem emprestar objetos e peças de roupa uns para os outros, possibilitando a realização da atividade sem que haja custos.
Se houver estudantes cegos, valorize os aspectos sonoros da contação de histórias. Podem ser aprofundados o trabalho com a voz, a dinâmica das pronúncias (variações de volume, intensidade e expressão), a relação entre os sentidos das palavras e a enunciação.
No caso de haver estudantes surdos e fluentes em libras, uma possibilidade é explorar relações entre sinais e objetos escolhidos, compondo uma narrativa visual com a qual todos os estudantes possam se relacionar.
Busque criar, junto à turma, um ambiente seguro e descontraído para a troca das histórias. Para viver com plenitude a experiência de estar em cena, o estudante precisa confiar em seus espectadores, vendo-os como aliados no processo artístico. A instauração de uma coletividade solidária é um dos desafios para a pedagogia do teatro, mas é também uma das maiores contribuições que o teatro pode oferecer para a comunidade escolar.
Ponte para outras linguagens
artísticas (p. 42 e 43)
Artes integradas: videogame
Os caminhos da jiboia
Abordar a criação do jogo é uma oportunidade para discorrer sobre como o coletivo aparece na construção desse trabalho. Da concepção à narração, existe a presença indígena, ofertando a imersão na vida do povo huni kuin. Durante a aula, incentive os estudantes a compartilhar experiências pessoais relacionadas a grafismos, cantos e rituais indígenas que conheçam ou que tenham vivenciado; a comentar sobre outros videogames com os quais estão familiarizados; e a refletir sobre o papel dessa mídia na valorização e na preservação de culturas.
Artes integradas: audiovisual indígena
O audiovisual indígena oferece um amplo debate sobre maneiras de captar uma narrativa que foge daquilo que é ofertado habitualmente no circuito cinematográfico. Destaque o trabalho realizado pelo projeto Vídeo nas Aldeias e incentive os estudantes a pesquisar o assunto no site e nas redes sociais do projeto. Em plataformas de vídeo na internet, é possível assistir ao trailer do filme Yãmĩyhex: as mulheres-espírito (2019). Peça aos estudantes que compartilhem suas impressões sobre o ritual registrado no documentário.
Dança: festival de dança e cultura indígena
Reforce para a turma que a dança também é uma importante manifestação indígena utilizada em momentos em que é necessário reunir a comunidade para acolher as mudanças de ciclos, lutar, comemorar e festejar, realizar rituais de cura etc. A dança acontece de maneira integrada a cantos, ritos, encontros e festividades presentes no cotidiano desses povos.
Dança: caboclinho
Sempre que possível, complemente as informações do texto com imagens e vídeos. Assista com a turma ao episódio Caboclinho, da série Danças Brasileiras, promovida pelo Instituto Brincante. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=p4w-hsnnmSo (acesso em: 31 out. 2024). Essa é uma oportunidade de os estudantes terem acesso à história, aos movimentos da dança, às características rítmicas, aos instrumentos musicais, aos figurinos e aos adereços que constituem o Caboclinho.
Síntese estética: o espírito da floresta (p. 44 e 45)
Um dos objetivos do texto apresentado na seção é conectar os estudantes à perspectiva e à cosmovisão dos yanomami, fornecendo um ponto de vista para refletir sobre os ecossistemas, a exploração dos recursos naturais, o modo de produção da sociedade e nossa relação com a subjetividade e o mistério.
Inicie falando sobre o processo de escrita do livro A queda do céu: palavras de um xamã yanomami (2015), resultado de mais de 20 anos de conversas entre o xamã Davi Kopenawa Yanomami e o etnólogo Bruce Albert. Ambos assinam a autoria do livro, evidenciando a relação genuína e não exploratória do etnólogo com os yanomami na produção do conhecimento.
Em seguida, proponha a leitura da ilustração Urihi a, a terra-floresta, uma composição feita por Davi Kopenawa sobre a cosmologia yanomami, representando a vida integrada da floresta e os caminhos dos espíritos.
Faz parte da cosmologia yanomami uma relação de vitalidade e integração com a floresta, compreendendo o equilíbrio dos ecossistemas e a necessidade de comunhão com a natureza. Os rituais xamânicos e a presença dos espíritos da floresta exercem um papel de compreensão nessa interação com o meio ambiente.
Síntese estética: processo de criação coletiva (p. 46 e 47)
No momento do debate, procure relacionar a perspectiva dos yanomamis com o ponto de vista dos estudantes, confrontando a forma como os indígenas se relacionam com a floresta e o modo como os jovens compreendem essa relação. Essa é uma boa oportunidade para mapear os conhecimentos dos estudantes sobre os povos indígenas do Brasil, especialmente aqueles presentes na região da escola. Se houver estudantes indígenas na turma, convide-os a compartilhar suas perspectivas sobre a relação com a natureza, a cidade e a escola, promovendo um espaço de troca entre seus saberes e os dos demais colegas.
Enquanto os grupos dedicam-se a conceber a ideia disparadora e a escolher as linguagens artísticas de seu trabalho, reforce a importância de revisitar as obras e os artistas estudados no capítulo, partindo dos principais tópicos debatidos. Dessa forma, se um dos grupos deseja abordar, por exemplo, a relação da floresta com a exploração desenfreada que a ameaça, pode ser proposto um ritual de cura das matas, inspirado na proposta da seção Ação. Lembre aos estudantes que a inspiração em obras e manifestações artísticas é essencial, pois amplia a capacidade de produção criativa.
Capítulo 2: Culturas africanas
Abertura (p. 48 e 49)
As páginas de abertura oferecem a oportunidade de levantar os conhecimentos prévios dos estudantes acerca das culturas afrodescendentes no Brasil. Incentive a participação de todos, questionando o que sabem sobre a cultura afrodiaspórica. Verifique se conhecem esse conceito, preparando-os para a investigação proposta na introdução do capítulo. Utilize as imagens para suscitar diferentes abordagens sobre festas, mú-
sicas, pinturas e artistas negros no Brasil. Pergunte aos estudantes quais países da África eles conhecem e quais falam a língua portuguesa. Ouça as percepções deles sobre culturas africanas e afrodescendentes e procure sintetizar o que já sabem sobre o tema.
Por que estudar culturas africanas? (p. 50)
É essencial discutir os apagamentos históricos para resgatar a memória das lutas dos afrodescendentes. Estudar as culturas africanas, no contexto atual, implica abordar questões que ainda estão em debate na sociedade brasileira, como os indicados a seguir.
Quais culturas africanas teriam maior relevância para serem estudadas no Brasil?
Como as ancestralidades africanas se relacionam com a cultura afrodescendente constituída no Brasil?
De que maneira a África contemporânea se relaciona com o Brasil?
Converse com os estudantes sobre como eles percebem a presença desses conteúdos na escola e em seu contexto sociocultural.
A introdução deste capítulo relata brevemente como as culturas africanas, por meio da diáspora resultante do tráfico escravagista, tornaram-se parte da cultura brasileira, além de apontar formas pelas quais a ancestralidade africana se manifesta em nosso cotidiano. O texto também traz um ponto central que será abordado no decorrer de todo o capítulo: o desafio de identificar, dentro da pluralidade cultural do continente africano e da rica diversidade da África contemporânea, elementos da cultura afro-brasileira.
A cabeça do Monumento a Zumbi dos Palmares foi feita de concreto armado e bronze, oito vezes maior do que a original. Nesse monumento cívico, o antepassado iorubá tornou-se, ao mesmo tempo, símbolo da ancestralidade africana e do herói nacional.
Atividade de sensibilização:
Mandjólò (p. 51)
Esta atividade é uma oportunidade para que os estudantes ampliem seu repertório cultural. É comum que a relação dos deles com as culturas africanas ocorra por intermédio de referências indiretas, sem que entrem em contato com produções de artistas africanos. Procure criar um ambiente no qual os estudantes se sintam à vontade para se expressar na companhia dos demais, pois alguns podem ficar tímidos ao dançar.
Se isso acontecer, tematize essa dificuldade de forma aberta, incentivando uma discussão sobre a responsabilidade coletiva de acolher a expressividade de cada um, promovendo um espaço seguro para a livre manifestação de corpos e mentes.
Artes visuais
Contexto: artes visuais nas culturas africanas e afro-brasileiras (p. 52)
Esta seção visa oferecer um panorama do que será abordado em detalhe nos repertórios, que destacam práticas artísticas de diferentes culturas africanas, com foco nas pinturas e nos padrões gráficos e geométricos que adornam tecidos, superfícies de objetos e construções, exemplificados pela prática da comunidade ndebele. Outro elemento explorado envolve a criação de esculturas em ferro e outras ligas metálicas, encontradas na região do vale do Rio Níger, onde se conheciam métodos de fundição desde o século X. Esses saberes, que incluem as práticas de detecção e de extração de minérios, além das técnicas de fundição e forja de materiais metálicos, foram trazidos ao Brasil pelos africanos, que eram raptados de seus territórios, muitas vezes escolhidos em razão de seus conhecimentos e habilidades.
Repertório 1: pinturas e padrões
(p. 53)
Comente com a turma que os tecidos com estampas tidas como “africanas”, comercializados em todo o mundo, são uma invenção colonial. Inspirados no batique indonésio (técnica de tingimento feita com cera quente), esses tecidos foram industrializados na Holanda para serem vendidos no continente africano, onde foram transformados em símbolo cultural e passaram a ser conhecidos como tecidos wax (cera). Hoje, apenas 5% desses tecidos são estampados com cera e feitos, de fato, na África. O restante é produzido em países asiáticos.
Repertório 2: os bronzes de Benin (p. 54)
Na mitologia iorubá, a cidade de Ifé é considerada o “umbigo do mundo”, o lugar onde a humanidade foi criada e onde teve início a tradição monárquica.
Odudua, uma das divindades criadoras da Terra e da humanidade, tornou-se o primeiro oni (rei) de Ifé, e dele descendem todos os outros reis da cidade.
Muitos estudiosos situam a fundação de Ifé entre os séculos IX e X, e, por volta do século XI, a cidade já era um grande centro urbano, exercendo influência sobre outras cidades da região.
Repertório 3: instalação (p. 55)
Luana Vitra tem se destacado na nova geração de artistas negros, aplicando cosmovisões afrodescendentes a trabalhos tridimensionais que criam ambientes de imersão e reflexão. Sua participação na 35a Bienal de São Paulo com a obra Pulmão de Mina, foi um marco em sua carreira. Além da participação na Bienal, a multiartista criou a obra Giro, instalada temporariamente em Inhotim, que nasceu da relação que ela tem com o torno, maquinário que dá forma para matéria por meio do giro. Convivendo com o torno desde criança, já que seu pai é torneiro, ela percebe o giro como um movimento que conduz a matéria ao estado de transe. Se possível, apresente a obra Giro para os estudantes.
Aprofundamento
Para conhecer outras obras de Luana Vitra, acesse o site da artista. Disponível em: https://luanavitra.com/ obras (acesso em: 31 out. 2024).
Pesquisa: arte afro-brasileira (p. 56)
Nesta seção, os estudantes são incentivados a pesquisar, inicialmente, sobre temas da diáspora africana no Portal Geledés, órgão de informação do Instituto da Mulher Negra, fundado em 1988, que realiza ações políticas e sociais voltadas para a questão racial, e para as questões de gênero.
Vão também se aprofundar no conceito de afro-brasilidade, compreendendo a relação entre cultura afrodescendente e cultura africana ancestral. Para isso, incentive-os a pesquisar outros exemplos de arte afro-brasileira em sites de museus especializados, a apreciar variados objetos africanos, bem como a rever, reavaliar e recontar a história da arte brasileira, considerando o impacto que a cultura africana tem na arte contemporânea produzida no Brasil.
Ao final das investigações propostas, oriente os jovens a identificar objetos e imagens que fazem parte de seu cotidiano e que se relacionam com as culturas africanas, trazendo para a sala de aula essas referências culturais presentes em suas comunidades.
Teorias e modos de fazer: arte e memória (p. 57)
O objetivo da seção é conceituar memória, por meio da distinção entre memória pessoal e memória coleti-
va. Para demonstrar como a memória tem sido utilizada para resgatar valores culturais afrodescendentes presentes na arte contemporânea, é apresentado o projeto Cadernos de África, do artista mineiro Paulo Nazareth, que utiliza linguagens variadas em sua composição.
Conheça e apresente aos estudantes o blogue do artista, que contém os registros da obra mencionada. Disponível em: https://cadernosdeafrica.blogspot. com/ (acesso em: 31 out. 2024).
Ação: monumento à memória (p. 58 e 59)
Esta ação envolve a identificação de uma memória que se quer preservar, uma etapa da concepção de um memorial e uma fase de projeto e de construção da maquete do memorial.
Converse com os grupos antes de cada uma das etapas para verificar, principalmente, a relevância da proposta e a viabilidade da construção da maquete. Procure esclarecer que o memorial não precisa ser, necessariamente, uma escultura tridimensional: pode ser uma calçada, um painel, um jardim ou simplesmente um espaço para que a população possa se manifestar em relação a determinada memória. Relembre com os estudantes os exemplos apresentados na introdução do capítulo: o memorial concebido por Darcy Ribeiro e João Filgueiras Lima e o projeto de Aline Motta, que é também um modo de se produzir memória.
No desenvolvimento de um projeto, é fundamental fomentar a criatividade dos estudantes, acolhendo soluções poéticas e inovadoras, ainda que não sejam totalmente viáveis do ponto de vista construtivo. Contudo, é importante esclarecer essas limitações, sem inibir o potencial criativo dos jovens.
Construir uma maquete é uma atividade lúdica que pode despertar o interesse de alguns grupos por representar elementos do entorno do local em que o memorial seria implantado, ou por inserir figuras humanas em escala para dar ao projeto um aspecto mais realista. Havendo esse interesse por parte dos grupos, a escultura pode ser montada sobre uma base de papelão e as figuras, recortadas em papel-cartão.
Na etapa de avaliação coletiva, é importante assegurar um ambiente acolhedor e respeitoso, no qual todas as contribuições sejam valorizadas. Incentive a troca de ideias e impressões entre os grupos, reforçando que esse momento é uma oportunidade de aprendizado compartilhado. Certifique-se de que a avaliação seja construtiva, que promova a ampliação do conhe-
cimento e da visão dos estudantes e que ofereça ideias que possam ser aprimoradas em projetos futuros.
Música
Contexto: música afro-atlântica (p. 60)
A influência da musicalidade africana no Brasil é amplamente reconhecida. No entanto, mais do que relembrar o passado escravagista que resultou nessa presença cultural, a seção busca exaltar a potência de movimentos e músicas da cultura negra no Brasil e no mundo. Se possível, oriente os estudantes a realizar um estudo histórico sobre os movimentos negros ocorridos nos Estados Unidos, nos anos 1960 e 1970, compreendendo seu contexto histórico e investigando por que se tornaram inspiração para movimentos em outros países.
Repertório 1: afoxés e blocos afro
na Bahia (p. 61)
Falar sobre a história dos blocos afro da Bahia abre espaço para abordar o racismo presente em nossa sociedade. Esse é um tema sensível e que deve ser abordado com acolhimento, visto que situações de injúria racial são vividas por grande parte das pessoas negras do nosso país cotidianamente. Pergunte aos estudantes se algum deles participa ou participou de blocos afro e permita que compartilhem suas experiências.
Aprofundamento
Para saber mais da história do bloco Ilê Aiyê, acesse o site da exposição “Ocupação Ilê Aiyê”. Disponível em: www.itaucultural.org.br/ocupacao/ile-aiye/ (acesso em: 31 out. 2024).
Repertório 2: Black music: funk e soul no Brasil (p. 62)
A black music brasileira abrange os movimentos musicais urbanos que têm suas raízes na matriz afrodiaspórica. A partir dos anos 1990, o funk se consolidou como um importante movimento cultural derivado dos bailes soul, sendo considerado um fenômeno cultural de extrema importância. Embora algumas letras de funk possam ser inadequadas para a faixa etária dos estudantes, há muitas que abordam temas como a vida nas periferias e histórias românticas. Incentive os jovens a contribuir com a discussão, trazendo exemplos de funks que conhecem e que possam enriquecer o debate em sala de aula.
Repertório 3: o afrobeat de Fela Kuti (p. 63)
O afrobeat é um gênero musical muito difundido nos Estados Unidos e em diversos países da África. Para aprofundar o conhecimento sobre Fela Kuti, recomenda-se o documentário Meu amigo Fela (2019), dirigido pelo cineasta mineiro Joel Zito Araújo (1954-), que estabelece uma conversa com o afro-cubano Carlos Moore (1942-), biógrafo e amigo do compositor.
Pesquisa: músicas que atravessam o Atlântico (p. 64)
Prepare os jovens para o estudo da seção propondo uma breve pesquisa sobre os países africanos colonizados por Portugal e seus processos de independência.
A troca cultural entre Brasil e Angola é extremamente rica. Contudo, embora o Projeto Kalunga evidencie que em Angola há um grande consumo de música brasileira, no Brasil ainda se conhece pouco sobre a cultura angolana. As redes sociais, porém, têm ampliado nosso acesso à música e à dança de Angola, bem como de outros países africanos de língua portuguesa. Pergunte aos estudantes se já ouviram o kuduro, gênero musical angolano muito difundido entre os jovens do país e que foi internacionalizado nos anos 2000.
Teorias e modos de fazer: pulsação e ritmo (p. 65)
A atividade proposta é uma adaptação do método de educação musical O Passo, criado pelo educador e músico carioca Lucas Ciavatta (1965-). O método se baseia na regularidade do movimento de caminhar para explicar conceitos como pulsação, ritmo e compasso.
É importante que o estudante que se voluntariou para a atividade se sinta à vontade diante da turma, pois o nervosismo pode dificultar a execução. Por isso, recomenda-se que o professor conduza o improviso, ajustando a complexidade de suas palmas de acordo com o nível de conforto do estudante. Após a atividade, explique à turma que ter uma noção clara do corpo em relação ao ritmo ajuda a criar confiança, pois facilita a percepção do momento exato em que se deve bater palma. Por fim, peça ao estudante voluntário que compartilhe com os colegas como foi a experiência.
Para compreender melhor a atividade proposta, assista ao vídeo O conceito de posição e a notação corporal: O Passo, do canal do Instituto d’O Passo. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=rJUkKq62 Y1U (acesso em: 31 out. 2024).
Sugestão de leitura
Lucas Ciavatta. O Passo: música e educação. Rio de Janeiro: L. Ciavatta, 2009.
Para saber mais do método O Passo, recomenda-se a leitura desse livro escrito pelo criador do método.
Aprofundamento
O site do Instituto d’O Passo traz conteúdos relevantes a respeito do método, bem como registros visuais de aulas, apresentações, projetos, entre outras informações. Disponível em: www.institutodopasso. org/ (acesso em: 31 out. 2024).
Ação: nos ritmos do ijexá e do funk (p. 66 e 67)
A atividade proposta requer o uso dos dois áudios que a acompanham: Ao som do ijexá e do funk (partes 1 e 2), disponíveis na coletânea de áudios que acompanha a obra. Providencie uma boa aparelhagem de som e garanta que toda a turma escute bem as instruções. Se necessário, interrompa os áudios para tirar dúvidas. Caso seja preciso repetir algumas instruções, faça-o sempre acompanhando as ilustrações presentes no Livro do estudante. É possível que alguns jovens apresentem dificuldades para bater palma e andar ao mesmo tempo. Assim, antes de iniciar a atividade, faça com a turma um breve exercício.
Em roda, todos devem olhar para os pés uns dos outros e começar a andar para a frente e para trás, conforme indicado no livro. Se alguém se perder, basta que pare o movimento de caminhada, olhe para o pé do colega ao lado e retome o movimento quando ele for à frente.
Em seguida, todos de verão dizer “um”, quando pisarem o tempo 1, ou seja, quando o pé dominante (o direito para os destros e o esquerdo para os canhotos) for à frente. Repitam essa marcação do tempo 1 algumas vezes, até todos estarem familiarizados com sua posição. Parem de falar e continuem andando, sempre em sincronia.
• Agora, repitam o mesmo processo para o tempo 2, usando o pé não dominante. Pausem, retomem a caminhada e avancem para o tempo 3 e, depois, para o tempo 4. A cada passo, falem o número do tempo correspondente ao pé, repetindo quantas vezes for necessário.
• Por fim, repitam o processo, batendo palmas em cada um dos tempos.
• Tenham atenção para não acelerar. É muito comum que a ansiedade do grupo acelere o andamento, o que prejudica o fluxo. Nesse caso, não é preciso interromper, basta que todos olhem para o pé do professor e este volte a andar mais lentamente. Essa breve dinâmica dará aos estudantes mais segurança para localizar os tempos e associá-los aos passos. Àqueles que tiverem mais dificuldade nessa associação, é recomendado que façam as levadas 1 (palmas agudas) do ijexá e do funk, pois não apresentam batidas nos contratempos, o que facilita sua execução.
Dança
Contexto: a dança da África
no Brasil (p. 68)
Após a leitura do texto e da imagem, peça aos estudantes que indiquem festas e danças brasileiras em que as influências afrodiaspóricas estão presentes. Sintetize essas manifestações no quadro, associando a elas às regiões do Brasil onde ocorrem. Pergunte aos jovens o que essas manifestações têm em comum, preparando-os para as próximas seções. Se necessário, ajude-os nessa identificação. Caso algum estudante participe regularmente (ou já tenha participado) de uma dessas manifestações, convide-o a relatar sua experiência.
Repertório 1: Jongo (p. 69)
Busque áudios de pontos de jongo em aplicativos de música e reserve um momento para que a turma os escute. Peça aos estudantes que identifiquem os instrumentos musicais utilizados, bem como o tema das letras.
Aprofundamento
O site Jongo da Serrinha traz informações diversas sobre o jongo, como suas influências em outras manifestações, sua história, seus modos de transmissão e obras de referência. Disponível em: https://jongoda serrinha.org/111-2/ (acesso em: 31 out 2024).
Repertório 2: Tambor de crioula (p. 70)
Projete para a turma o documentário Tambor de Crioula no Mosaico Cultural: Bem Viver, que traz imagens da dança e depoimentos relativos a essa manifestação cultural. Oriente os estudantes a observar a movimentação das mulheres, seus gestos, vestimentas e adereços, bem como a relação entre elas na roda, e a reconhecer o momento da punga. O vídeo, de aproximadamente 4 minutos, está disponível em:
Se possível, projete também o documentário Tambor de crioula do Maranhão, que exibe diversos momentos de dança e música. O vídeo, de aproximadamente 10 minutos, está disponível em: www.youtube.com/ watch?v=s7msEK2vSAY (acesso em: 31 out. 2024).
Repertório 3: festa do Senhor do Bonfim (p. 71)
Promova uma conversa com a turma sobre festas locais, abordando a época do ano em que acontecem, quais são seus ritos tradicionais, como eles são praticados e o que significam. Conduza o debate a fim de destacar os elementos culturais que essas festas reúnem, como culinária, dança, música, encenações e confecção de adereços. Incentive os estudantes a refletir sobre como essas festividades afetam os espaços urbanos.
Sugestão de leitura
Leia o artigo “Agenciamentos afrocatólicos: modulações, tensões, transformações nas festas religiosas em Salvador”, escrito por Cleidiane Ramos e Fátima Tavares, que abordam as festas religiosas realizadas em Salvador (BA), como a Festa do Senhor do Bonfim. Disponível em: www.scielo.br/j/rs/a/XFXCKmDQ3RjS
QvrTYBMKKrN (acesso em: 31 out. 2024).
Pesquisa: danças que se transformam e permanecem (p. 72)
Esta seção aborda os processos de reelaboração e transformação das danças afrodiaspóricas. Para que os estudantes possam fazer as investigações propostas, procure garantir que, além das referências apresentadas, eles tenham acesso a outras fontes seguras de pesquisa. As perguntas servem de guia para que os jovens acessem os materiais com um foco específico, possibilitando que destaquem informações relevantes. Sugira que tomem notas, enquanto fazem leituras e assistem a vídeos, destacando elementos comuns às danças investigadas. Peça que registrem os nomes de artistas que conheceram por meio da pesquisa e elementos biográficos destes, assim como as estratégias encontradas para que essas danças seguissem vivas se transformando.
Sugestão de leitura
Confira o e-book Danças indígenas e afro-brasileiras escrito por Marilza Oliveira da Silva. Disponível
A partir da página 52 desse material é possível aprofundar-se no movimento de fortalecimento das danças indígenas e afro-brasileiras em Salvador.
Teorias e modos de fazer: o sagrado e o profano (p. 73)
A presença da dança em contextos religiosos e na vida social, em geral, não é exclusiva das culturas afrodiaspóricas. Converse com os estudantes sobre a presença da dança na vida deles, a relação que têm com essa linguagem artística e as situações em que ela está presente em suas vidas. Incentive a conversa, lembrando os estudantes de que a dança pode estar presente, por exemplo, em festas de família, nos filmes a que assistem, nas ruas e em celebrações populares. É importante criar um ambiente seguro para que jovens com orientações religiosas distintas possam se expressar. Incentive-os a refletir sobre o que os aproxima ou os afasta da dança, como praticantes e/ou espectadores.
Ação: dançar os elementos da natureza (p. 74 e 75)
Para a realização desta atividade, garanta um local adequado aos movimentos, livre de mobiliário e, de preferência, com piso regular e limpo. Conhecendo sua turma, avalie se é necessário adaptar a proposta, ou parte dela, para possibilitar que estudantes com deficiências possam participar. Auxilie os jovens na formação dos grupos, buscando equilibrar o perfil dos integrantes: aqueles que já se sentem confortáveis com o movimento dançado podem se reunir aos que apresentam dificuldades ou timidez. Sugira aos estudantes que reúnam fotografias, sons, imagens e vídeos curtos que os conectem com diferentes elementos da natureza, para facilitar a escolha do elemento que irá inspirá-los. Após a escolha, oriente-os a identificar e destacar as principais características desse elemento, que servirão de base para o desenvolvimento da atividade. Caso note que algum grupo está disperso, oriente seus integrantes a designar um líder para coordenar as tarefas, ajudando a manter o foco e a organização durante o processo.
Reserve um espaço e um momento para que cada grupo realize o aquecimento, seguido da improvisação. O objetivo do aquecimento é preparar o corpo, tornando-o mais disponível para explorar os movimentos, além de proporcionar a atenção e a concentração necessárias para a experiência da dança. Já nesse primei-
ro momento, proponha aos estudantes que integrem as qualidades do elemento da natureza escolhido e as explorem por meio da improvisação. Insista para que todos improvisem e para que haja alternância entre improvisador e espectador. Auxilie os jovens a formar uma grande roda no espaço e lembre-os da importância de estarem atentos ao que ocorre no centro da roda. Ressalte que ser um espectador atento é também uma habilidade a ser desenvolvida. É recomendável estipular um tempo para que cada grupo improvise, de acordo com o planejamento da aula. No momento de avaliação coletiva, incentive os estudantes a exporem suas impressões, partilhando seus aprendizados e, eventualmente, as dificuldades encontradas.
Ponte para outras linguagens artísticas (p. 76 e 77)
Artes integradas: instalação sonora de Stella do Patrocínio
Ao abordar a instalação Falatório, enfatize a relevância da trajetória de Stella do Patrocínio, considerando as condições em que a artista viveu. Provoque uma reflexão acerca da importância de a 35a Bienal de Arte ter dedicado um espaço a uma mulher negra, poeta e que experimentou a brutalidade do sistema manicomial. Convide os jovens a imaginar quantas pessoas criam artisticamente, mas são invisibilizadas por questões de classe, raça e gênero. Traga para a discussão a maneira como Stella compunha seus poemas: narrando os fatos de seu cotidiano.
Artes integradas: videoperformance de Tiago Sant’Ana
Ao abordar a videoperformance de Tiago Sant’Ana, inicie uma discussão sobre memória, tendo como base uma linha do tempo da história da arte brasileira. Oriente os estudantes a notarem que diversas questões atuais estão relacionadas ao passado colonial. Em uma entrevista de 2019, Tiago mencionou a naturalização da branquitude como parâmetro de vida. Essa observação do artista oportuniza o debate sobre a naturalização de comportamentos que cercam questões raciais. Conheça a entrevista completa em: https:// amlatina.contemporaryand.com/pt/editorial/a-natu ralizacao-da-branquitude-como-parametro-de-vidatiago-santana (acesso em: 31 out. 2024).
Teatro: griôs: narrar e criar mundos
Promova a exibição do vídeo Griot Toumani Kouyaté canta uma história no Arte do Artista, de 6 mi-
nutos de duração, disponível em: www.youtube.com/ watch?v=AWVeC6kbNH0 (acesso em: 31 out. 2024). Converse com a turma sobre a relação entre música e teatralidade presente no trabalho do artista e, também, sobre o sentido da história narrada, partindo de questões como: quais causas reúnem as pessoas hoje? De que maneira uma história pode oferecer ensinamentos aos ouvintes? De que modo a narração de Toumani dialoga com o conteúdo de sua fala?
Teatro: Mostra Internacional de Teatro de São Paulo 2024: pontes com o teatro africano contemporâneo
O site da MITsp, que reúne materiais interessantes para trabalhar em sala de aula, está disponível em: https://mitsp.org/. O teaser do espetáculo Broken Chord, que evidencia escolhas estéticas feitas para a obra e é também um conteúdo relevante, está disponível em: https://mitsp.org/2024/broken-chord/. Caso queira conversar com a turma sobre o trabalho da crítica teatral, selecione trechos do texto disponível em: https:// mitsp.org/2024/acordes-conectados-em-corposcoletivos-uma-experiencia-de-apreciacao-do-espe taculo-sul-africano-broken-chord-acorde-rompido/ (acessos em: 31 out. 2024).
Síntese estética:
arte contracolonial (p. 78 e 79)
A obra multimidiática de Grada Kilomba oferece uma perspectiva contracolonial ao abordar temas e memórias que permeiam corpos negros em diferentes partes do mundo, ligados pelas diásporas dos povos africanos – que foram forçados a deixar suas terras em razão da barbárie do comércio de pessoas escravizadas.
Analise a obra O Barco em conjunto com os estudantes, apreciando as imagens e as legendas que as acompanham. Se possível, caso queira aprofundar essa análise, selecione trechos da entrevista de Grada Kilomba sobre a referida obra, concedida à BoCA Bienal de Artes Contemporâneas 2021, disponível em: www. youtube.com/watch?v=D7vSm5DLgDs (acesso em: 31 out. 2024).
Em seguida, proponha a leitura coletiva do texto, incentivando os estudantes a compartilhar suas interpretações acerca de cada descrição. Proponha uma reflexão coletiva sobre o racismo estrutural e as possibilidades de transformação e ressignificação das cenas descritas no texto.
Pergunte a estudantes negros da turma se eles se identificam com o relato de Grada Kilomba e como acreditam que o texto pode contribuir para a busca de potência e de afirmação das culturas afrodiaspóricas.
Síntese estética: processo de criação coletiva (p. 80 e 81)
O debate proposto tem como objetivo questionar saberes frequentemente mobilizados, que têm, muitas vezes, caráter eurocêntrico, e buscar outras formas de conhecimento e outras visões de mundo, construindo espaços de transformação ativa da realidade. Essa intenção deve permear o trabalho dos grupos, direta ou indiretamente. É importante reforçar a inversão proposta por Grada Kilomba em seu texto, tomando a margem como sinônimo de potência, de imaginação de mundos alternativos.
Oriente os estudantes a utilizar como fonte de pesquisa as atividades realizadas e as obras estudadas no presente capítulo, buscando inspiração para a criação coletiva. Refletir sobre a produção de obras ou manifestações artísticas antirracistas pode servir de guia para a criação dos estudantes nesta seção. Além disso, devem ser consideradas as culturas africanas e afro-brasileiras contemporâneas e o repertório cultural dos próprios estudantes.
Capítulo 3: Culturas europeias
Abertura (p. 82 e 83)
As culturas europeias compõem uma matriz cultural complexa que envolve tanto a cultura do colonizador português – que teve um papel dominante na formação cultural do Brasil – quanto um conceito mais amplo de cultura ocidental.
A cultura ocidental marcou a história da arte de maneira hegemônica, definindo o que é ou não considerado arte e influenciando a formação do universo cultural dos estudantes, especialmente na sua relação com a indústria cultural estadunidense, determinando padrões de beleza e de comportamento.
Pode haver na turma estudantes descendentes de europeus, cujos ancestrais imigraram para o Brasil, muitas vezes em condições precárias, carregando consigo uma cultura singular que merece ser valorizada. Essas diferentes perspectivas devem ser consideradas ao tratar das culturas europeias.
Inicie o estudo do capítulo promovendo uma leitura coletiva das imagens, das legendas e das descrições
que as acompanham. Esse processo deve servir de ponto de partida para um debate sobre a formação da cultura ocidental e seus padrões de beleza, presentes no nosso cotidiano de diferentes formas.
Por que estudar as culturas europeias? (p. 84)
As concepções filosóficas, éticas, estéticas e políticas originadas nas antigas sociedades greco-romanas permanecem em nosso cotidiano. Ideais de beleza oriundos de certa concepção grega, associados ao equilíbrio na composição das formas, tendo como qualidades essenciais a simetria e a proporção, ainda são referência, mesmo que de maneira inconsciente, para composições estéticas e processos de ensino-aprendizagem em Arte. Ao apreciar as obras As três graças, peça aos estudantes que indiquem a relação entre essas noções. Retome as imagens apresentadas na abertura do capítulo, como a escultura de Efebo de Crítio e a foto do Museu Nacional, incentivando a reflexão acerca da harmonia, do equilíbrio e da justeza em sua composição. Tais conceitos são fundamentais, especialmente como elementos a serem mobilizados em uma composição artística, mas devem ser trabalhados de maneira consciente, evitando a formação de um ideal fixo de beleza e dando espaço para o que pode ser visto como desequilíbrio, desajuste e excesso no momento da criação artística dos estudantes.
Atividade de sensibilização: investigando os conceitos de equilíbrio e harmonia (p. 85)
Reforce para os jovens a importância de respeitar os corpos uns dos outros ao manipular a escultura viva. Não há problema em moldar o corpo do colega como uma escultura, desde que feito com respeito. O objetivo do jogo não é estabelecer uma noção teórica dos conceitos binomiais de equilíbrio/desequilíbrio e harmonia/ desarmonia, mas mobilizá-los de maneira prática e sensível durante o processo de composição, utilizando-os como ferramentas do fazer poético-artístico.
Teatro
Contexto: vida urbana, debate público e teatro (p. 86)
É possível que os jovens tenham estudado a Grécia antiga em momentos anteriores de sua vida escolar, com diferentes enfoques, em componentes curriculares como História, Literatura, Filosofia ou mesmo
Matemática. Ao contextualizar o surgimento do teatro grego, procure fazer uma avaliação diagnóstica, abrindo espaço para que os estudantes possam expor seus conhecimentos prévios, bem como possíveis interesses a respeito da cultura grega antiga.
Repertório 1: a encenação na Grécia antiga (p. 87)
Uma das referências teóricas utilizadas na elaboração do conteúdo do capítulo foi o pensador britânico Raymond Williams (1921-1988). Em seu livro Drama em cena (1954), ele reforça a necessidade de a História do Teatro se debruçar não apenas sobre a dramaturgia de determinada época, mas também sobre a encenação. Trata-se de um desafio metodológico, pois reunir documentos a respeito do acontecimento teatral em si não é tarefa simples. Esse enfoque permite, porém, uma compreensão mais profunda a respeito da teatralidade desenvolvida em cada tempo e espaço, bem como de suas relações com a vida social. Nesse sentido, procure despertar o interesse dos estudantes pelos aspectos concretos de um espetáculo ocorrido no passado: cenografia, figurinos, movimentação de atores, presença da música, relação com os espectadores.
Repertório 2: coro: personagem coletivo (p. 88)
O tema “coro” pode ativar a imaginação e a sensibilidade dos estudantes, abrindo espaço para diversas possibilidades da linguagem teatral. As formas de representação hegemônicas são muito focadas no indivíduo: protagonistas de séries e filmes enfrentam conflitos de ordem privada; influenciadores digitais se expressam por meio de monólogos. Em contrapartida, procure elaborar a ideia do coro como um personagem coletivo, um recurso que possibilita a encenação de questões vividas por um grupo de pessoas.
Repertório 3: William Shakespeare e o Globe Theatre (p. 89)
Projete para a turma a filmagem da encenação da peça Romeu e Julieta pelo grupo Galpão, que se apresentou no Globe Theatre em 2012. Disponível em: www. youtube.com/watch?v=pNvTDEplX0o (acesso em: 31 out. 2024). Comente os aspectos da cultura popular brasileira presentes na encenação. Caso haja estudan-
tes surdos na turma, opte pela filmagem da mesma obra apresentada em uma praça, com interpretação em Libras. Disponível em: www.youtube.com/watch? v=UCoOYEmYUT8 (acesso em: 31 out. 2024).
Pesquisa: encenações de tragédias nos palcos brasileiros (p. 90)
O objetivo da seção é aprofundar a compreensão dos estudantes acerca do gênero teatral tragédia e de suas múltiplas possibilidades. As características da tragédia contribuem para que diversos artistas teatrais brasileiros expressem questões urgentes ligadas à realidade social do país.
Se possível, amplie o debate para outras produções artísticas contemporâneas que façam parte do repertório dos estudantes. Quais filmes, séries, canções ou livros lidam com o sentimento trágico? De que maneira a expressão da tragicidade em obras de arte é recebida pelos estudantes? Como eles operam essa fruição? Quais são as potências e os limites dessa(s) forma(s) de arte?
As obras Gota d’água {Preta} e Antígona na Amazônia abordam, respectivamente, o racismo estrutural brasileiro e a memória do massacre de Eldorado dos Carajás. O Brasil é marcado pela colonização e por muitos massacres. Procure relacionar o tema social das obras com sua expressão formal por meio da tragédia.
Ao lidar com essas referências, é importante atentar para eventuais gatilhos. É possível que alguns estudantes tenham sofrido com o racismo ou perdido pessoas queridas em situações de violência. O cuidado com a vivência dos jovens deve anteceder os debates; procure relacionar os estudos de estética com uma orientação ética.
Teorias e modos de fazer: aspectos da tragédia, da comédia e do coro (p. 91)
É provável que os estudantes tenham muitas referências de obras de arte que lidem com a comicidade. Incentive-os a trazer para o debate seus interesses e seu repertório. Na qualidade de espectadores, que tipo de comicidade os agrada? Que papel cumpre, em seu dia a dia, a fruição de comédias? O que costuma provocar o seu riso?
Procure conduzir esse debate com o objetivo de suscitar as possíveis relações entre a comédia e a tragédia. Na Grécia antiga, ambos os gêneros conviviam
nos festivais de teatro. E no Brasil de hoje, em que contextos as obras de arte cômicas ou trágicas são assistidas? Que efeitos cada um dos gêneros pode produzir no espectador?
Ação: coro cênico (p. 92 e 93)
Nas atividades envolvendo coro cênico, incentive os estudantes a experimentar possibilidades diversas de movimentação e ocupação do espaço. Quanto mais aquecidos e dispostos ao jogo eles estiverem, mais interessante ficará a cena proposta ao final da sequência didática. Procure ativar um estado de jogo coletivo, semelhante ao que se instaura durante as brincadeiras e a prática de esportes.
Caso haja cadeirantes na turma, oriente o grupo a propor movimentações que dialoguem com as possibilidades desses indivíduos. É preciso organizar o espaço de forma a acolher as necessidades do jogador que se desloca com a cadeira de rodas. Ao mesmo tempo, é interessante valorizar o repertório de movimentos proposto pela pessoa com deficiência, que pode contribuir muito para a experimentação coletiva.
A criação do coro cênico, da maneira como está formulada no Livro do estudante, inclui o trabalho com um texto. É possível que alguns estudantes tenham dificuldades com a leitura em voz alta; nesse caso, é importante acolher esse receio e, ao mesmo tempo, incentivar esses jovens a enfrentar o desafio da leitura. Há também a possibilidade de o grupo declamar um texto memorizado: não há problema em trabalhar com falas decoradas, pois ambas as alternativas (leitura e memorização) podem levar a resultados interessantes. Relembre aos estudantes que o processo criativo é tão importante quanto a cena final elaborada pelos grupos. Por vezes, o estado lúdico mobilizado pelos jogos teatrais potencializa a experiência do estudante em cena, mas o momento da apresentação volta a inibi-lo. O horizonte a ser vislumbrado é que a mesma diversão propiciada por um jogo de “siga o mestre” possa ser vivenciada pelo estudante durante uma encenação teatral.
Dança
Contexto: a influência do balé clássico na dança cênica (p. 94)
Note o fato de que este é o primeiro momento, nesta obra, que o estudante se aproximará do universo das
danças cênicas. Como dança é um termo polissêmico e os estudantes têm ideias e atribuem sentidos diferentes a ele, é importante que essas várias concepções emerjam em sala de aula e que possam ser problematizadas. Proponha aos estudantes que cada um deles complete, por escrito, em uma tira de papel, a seguinte frase: “A dança é…”. Com base nas definições trazidas pelos jovens, inicie a abordagem do balé, bem como de suas marcas ainda presentes na dança de hoje.
Repertório 1: O lago dos cisnes (p. 95)
Na abordagem de peças coreográficas, busque, sempre que possível, projetar para a turma um vídeo que contenha trechos da encenação, após a leitura do texto. Sugira aos estudantes que pesquisem a história narrada por meio da dança e da música. Há muitas versões dessa obra disponíveis, parcial e integralmente, em plataformas abertas de vídeo e em sites de teatros e de companhias de dança. Como a obra é longa, podem ser projetados cerca de 10 minutos de cada ato. Após a projeção do vídeo, solicite aos jovens que descrevam o que viram e pergunte se reconhecem o tema musical.
Repertório 2: A sagração da primavera, da Europa para a África (p. 96)
Para introduzir o tema, se for viável, toque para a turma alguns minutos desta obra de Stravinsky, disponível em aplicativos de música. Em seguida, projete trechos em vídeo da versão coreografada por Pina Bausch, interpretada pela companhia Pina Bausch e pela École des Sables. Após as exibições, converse com os estudantes sobre as impressões que tiveram das duas versões. O documentário Dancing at dusk (2020) apresenta uma versão da Sagração da primavera, encenada no Senegal. Disponível em: www.pinabausch. org/post/dancing-at-dusk (acesso em: 31 out. 2024).
Repertório 3: bailarinos
brasileiros no exterior (p. 97)
O estudo do conteúdo pode servir de ponto de partida para abordar a dança no contexto profissional. Conhecer as trajetórias de bailarinos que precisaram, por exemplo, sair do país para ter espaço para dançar profissionalmente, como é o caso de Ingrid Silva, pode suscitar debates importantes sobre o estatuto profissional de artistas no Brasil e em outros países. Essas discussões podem incluir reflexões sobre seus modos
de vida, os desafios que enfrentam e as estratégias que utilizam para se manter ativos em suas profissões.
Pesquisa: companhias de balé e a formação de bailarinos (p. 98)
Suscitar a reflexão acerca dos percursos de formação de bailarinos é o objetivo desta pesquisa. Encoraje os estudantes a investigar, além das referências disponibilizadas, instituições e projetos que se dedicam à formação de crianças e de jovens para a dança. Sugira que pesquisem se há escolas, projetos sociais e academias de dança nas proximidades da escola ou em suas comunidades e que conheçam a proposta pedagógica dessas instituições. Recomende, se possível, que entrevistem um bailarino, para ouvi-lo falar de seu percurso formativo.
Teorias e modos de fazer: música para ser dançada (p. 99)
Nem sempre uma orquestra se apresentará acompanhada de um balé. Existem músicas compostas especialmente para orquestras, sem o objetivo de serem dançadas. Pergunte aos estudantes se já tiveram a oportunidade de assistir a uma orquestra, seja em vídeos, seja ao vivo, e explore o contexto em que isso aconteceu. Oriente-os a pesquisar, na internet ou por outros meios, orquestras existentes em sua cidade –alguns teatros municipais mantêm grupos orquestrais que se apresentam regularmente. O site da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, em sua seção “Sem mistério”, disponibiliza um rico material que pode ajudar na aproximação dos estudantes com o universo da música orquestral. Disponível em: https://filarmonica.art.br/ educacional/sem-misterio/ (acesso em: 31 out. 2024).
Ação: jogando com o corpo e os instrumentos musicais (p. 100 e 101)
Providencie uma caixa de som que possibilite aos estudantes uma boa escuta dos comandos, bem como um espaço amplo e com piso regular para que os jovens possam se movimentar. Oriente a turma a realizar um breve aquecimento. Caso haja estudantes surdos, disponibilize a eles imagens dos instrumentos musicais e solicite que encostem as mãos na caixa de som, a fim de sentir a vibração.
Etapa 1: observe como os estudantes estão instalados no espaço e ajude-os a encontrar posições confortáveis para que ouçam o podcast Instrumentos da
Orquestra. Observe que as faixas estão organizadas em parte 1, com os instrumentos em separado, e parte 2, com duetos dos instrumentos. Peça que atentem ao timbre, à melodia e a como seu corpo, ainda em repouso, reage a esses estímulos.
Etapa 2: convide os jovens a ficar de pé, espalhados pelo espaço. Jogue os dados e assegure-se de que toda a turma compreendeu a parte do corpo e o instrumento associados nessa rodada. Toque a faixa de áudio e permita que explorem os movimentos por algum tempo. O desafio é traduzir um som penetrante ou suave por meio do movimento de uma parte do corpo, por exemplo, o membro inferior esquerdo. Lembre os estudantes de que é preciso estabilizar o restante do corpo para movimentar uma única parte. Sugira que fiquem atentos ao contato dos pés com o chão, ao equilíbrio e às transferências de peso. Peça que experimentem novos movimentos a cada jogada dos dados. Aproveite o momento para avaliar se há estudantes com dificuldade em realizar a proposta.
Etapa 3: focar a escuta em apenas um instrumento enquanto vários outros tocam em simultâneo pode ser um desafio. Assim, se necessário, estipule um tempo para que os estudantes, novamente deitados no chão ou sentados, escutem toda a orquestra tocando e tentem identificar o instrumento escolhido. Em seguida, prossiga com o desenvolvimento da atividade.
Finalização: ao final da atividade, permita que os estudantes compartilhem as sensações e os sentimentos que tiveram durante a experiência. As etapas que envolvem os duetos e a orquestra em sua totalidade podem ser especialmente desafiadoras, pois associam o desenvolvimento da escuta seletiva e a fluidez do movimento. No entanto, é exatamente este o objetivo da atividade: explorar as conexões entre música e dança.
Artes Integradas
Contexto: Patrimônio Cultural (p. 102)
Solicite aos estudantes que reflitam sobre espaços, arquiteturas e manifestações considerados vitais e que devem ser preservados. Explique a eles que a narrativa de eventos ocorridos em determinado tempo e lugar é essencial para a compreensão do valor de um Patrimônio Cultural, pois preserva a história e revela de que maneira tal Patrimônio está ligado a sentimentos de afeto, luta e resistência.
Aprofundamento
A parte 2 da trilogia Escravidão no Brasil destaca o Cais do Valongo, Patrimônio Histórico da humanidade localizado no Rio de Janeiro (RJ). Disponível em: www.youtu be.com/watch?v=uJ_kE-eplbA (acesso em: 31 out. 2024).
Repertório 1: Unesco e o
Patrimônio Colonial (p. 103)
O diálogo pode se concentrar no acervo colonial e arquitetônico do Centro Histórico de Salvador (BA), explorando suas conexões com a trajetória da cidade. Traga para o debate aspectos interdisciplinares, como a configuração urbana que dividiu Salvador em “Cidade Baixa”, voltada a atividades comerciais, e “Cidade Alta”, onde se localiza o Pelourinho.
Aprofundamento
Conheça o trabalho do bloco afro Olodum, que demonstra a importância da arte como meio de expressão. Disponível em: https://olodum.com.br/ (acesso em: 18 out. 2024).
Repertório 2: coleções de bens
saqueados – Patrimônio Material (p. 104)
O diálogo sobre o tema abarca história, memória e resistência. O debate pode concentrar-se no significado do manto para o povo indígena tupinambá, por meio da leitura da reportagem “Manto Tupinambá revela segredos de séculos da História do Brasil”, disponível em: www.youtube.com/watch?v=SthRZBLY5Pk (acesso em: 31 out. 2024).
Após a análise do texto, enfatize os significados do manto nos contextos indígena e brasileiro, além de destacar a ideia de reparação histórica.
Repertório 3: festa do Divino
Espírito Santo – Patrimônio
Imaterial (p. 105)
Destaque para a turma que o conceito de Patrimônio Imaterial é complementar ao de Patrimônio Material, mas não menos importante no que diz respeito à sua escolha e relevância de preservação. Pergunte aos jovens o que sabem sobre a Festa do Divino, propondo uma leitura comparativa de imagens que tragam os elementos do festejo em diferentes cidades brasileiras. O texto publicado pelo Museu Afro Brasil Emanoel Araujo pode ajudar a guiar a conversa. Disponível em:
Pesquisa: a riqueza do patrimônio brasileiro (p. 106)
Nesta seção, é fundamental pensar em materiais que sejam propositivos e que se articulem os saberes prévios dos estudantes, bem como suas ampliações. É possível abordar as propostas, aprofundando-as com outras referências sobre o mesmo tema. Uma sugestão é selecionar algum trecho da fala de Glicéria Tupinambá, no vídeo “O futuro ancestral” Célia Tupinambá e Moara Tupinambá + Fernanda Pitta. Festival ZUM 2022. Disponível em: www.youtube.com/wa tch?v=9aja6uo3hTQ&t=2s (acesso em: 31 out. 2024).
Como possibilidade de diálogo acerca do Patrimônio Brasileiro, pode ser proposta a leitura da notícia “O Dia da Consciência Negra e o reconhecimento do Patrimônio”, que, entre outras informações, traz a menção a exposição “Carrancas”, de Paulo Nazareth. Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/noticias/deta lhes/4446/o-dia-da-consciencia-negra-e-o-reconhe cimento-do-patrimonio (acesso em: 31 out 2024).
Teorias e modos de fazer: acervos e coleções (p. 107)
Converse com a turma sobre o conceito de acervo, abordando sua definição de modo geral e, em particular, como se organiza um acervo artístico. Assim, discorra sobre os critérios de seleção utilizados pelas instituições, como os museus, para a preservação de objetos e demais elementos. Discuta com os estudantes as formas de armazenamento de imagens e documentos descritas no livro, bem como as melhores maneiras de organizar tais recursos. Essa conversa pode abordar estratégias para evitar a desordem de fotografias, vídeos e áudios, enfatizando a importância de métodos eficazes de catalogação e de acesso à informação.
O conteúdo da seção pretende incentivar os estudantes a trazer para o dia a dia a ideia de formação de uma coleção por meio de um olhar pessoal e, ao mesmo tempo, reforça a necessidade de ampliar o repertório com relação ao que se deseja colecionar.
Ação: colecionar como método de pesquisa (p. 108 e 109)
Esta ação é uma oportunidade para abordar alguns pontos acerca do tema “coleções”, tais como: o
que forma uma coleção? De que maneira o ato de colecionar se aproxima do ato de pesquisar? Como começar uma coleção?
Não descarte as primeiras ideias dos estudantes, pois podem ser pontos de partida interessantes. Informe à turma que uma coleção de itens de hoje pode fornecer evidências ou referências que ajudarão futuras gerações a entender contextos históricos, sociais e culturais. Portanto, direcionar um olhar particular sobre o que se coleciona não impede que se pense no coletivo. Explique aos estudantes que a coleta e a organização de qualquer material devem ser cuidadosas e amparadas em alguma temática. Sugere-se falar de artistas que trabalham a ideia de coleção, como a brasileira Rosângela Rennó (1962-), cuja obra é abordada no item Guardar e organizar um arquivo , presente na introdução do Livro do estudante . Pode ser interessante, ainda, narrar a biografia da fotógrafa estadunidense Vivian Maier (1926-2009), que teve sua obra descoberta postumamente pelo produtor cinematográfico e colecionador John Maloof (1981-). Em uma rápida busca na internet, é possível encontrar vídeos e reportagens que falam da vida e da obra da fotógrafa em detalhes.
O registro das coleções deve considerar a diversidade de saberes e repertórios dos estudantes, uma vez que a motivação para colecionar pode ser emocional ou estética. Havendo estudantes com algum tipo de deficiência, síndrome ou transtorno, essa é uma oportunidade de trabalhar o reconhecimento visual ou tátil de objetos, além de conteúdos interdisciplinares.
É importante reservar um momento para a apreciação coletiva das coleções. Estipule um tempo para os estudantes narrarem suas escolhas. Após as apresentações, semelhanças, diferenças e inspirações identificadas na apreciação coletiva podem ser trazidas para o diálogo com toda a turma.
Ponte para outras linguagens artísticas (p. 110 e 111)
Artes visuais: a beleza na Grécia antiga
O texto traz um elemento fundamental para o trabalho que será realizado na seção Síntese estética , na qual será proposta uma reflexão sobre o conceito de belo . Para os gregos antigos, a beleza
era preferencialmente representada pelos corpos dos jovens guerreiros. Nas esculturas de mármore, esses corpos se tornaram poderosos símbolos do que seriam formas e proporções belas. É importante perceber a permanência desse padrão e questioná-lo com a turma.
Artes visuais: a perspectiva na pintura romana
Um importante aspecto sobre as formas estéticas, que ainda são reconhecidas como modelos de representação, é a construção do espaço por meio da perspectiva. O texto destaca os elaborados afrescos romanos descobertos por arqueólogos na cidade de Pompeia, que revelam que as variadas formas de representar a perspectiva já estavam presentes na cultura romana, mesmo centenas de anos antes de os pintores renascentistas criarem sistemas geométricos para construí-las com precisão.
Música: música clássica e romântica
A forma sonata é uma estrutura musical de grande importância para a música orquestral. Ela parte de um tema musical, uma melodia que será explorada ao longo da peça. Na forma sonata, o primeiro bloco, também chamado de movimento, já explicita esse tema, que será recuperado no último bloco.
Aprofundamento
Para saber mais da forma sonata, assista ao vídeo Formas Musicais: Episódio 14: Forma Sonata. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=4x7tC7pxIOA (acesso em: 31 out. 2024).
Música: sinfonia, concerto e ópera
Existem semelhanças entre a ópera e o musical contemporâneo. A partir do século XIX, surge a opereta, que passa a ter diálogos intercalados com a música. O musical, por sua vez, apresenta diálogos, e a ópera é toda cantada. Pergunte aos estudantes se algum deles já assistiu a musicais e se têm curiosidade em assistir a uma ópera.
Aprofundamento
O vídeo Libiamo, Libiamo Ne’lieti Calici: La Traviata traz uma montagem da famosa ópera La Traviata, de Giuseppe Verdi (1813-1901). Disponível em: www. youtube.com/watch?v=cUNCUKtZDR0 (acesso em: 24 out. 2024).
Síntese estética: o belo (p. 112 e 113)
A investigação sobre o conceito de belo é muito importante para os estudantes adolescentes, que, muitas vezes, se sentem pressionados por padrões de beleza impostos pela indústria cultural. Fale abertamente sobre essas questões e destaque como pode ser nociva para a autoestima a imposição de um padrão de beleza.
Uma das ideias que deve permear esse debate diz respeito ao relativismo da noção de belo, ou seja, ao fato de que aquilo que é considerado belo depende de cada época e de cada cultura, assumindo diferentes perspectivas de acordo com seu contexto histórico. O que se pretende é combater a ideia de beleza como algo imutável, absoluto, assumindo que diferentes modelos de beleza se compuseram ao longo do tempo e em sociedades distintas e que essa ideia está em constante transformação.
Outro conceito interessante que deve ser explorado é o da associação entre beleza e bondade. O laço entre o belo e o bom, que em alguns contextos é mais nítido, deve ser discutido e questionado. Aborde, por fim, a relação entre beleza e arte, ideia que se sedimenta na época moderna e reduz ao segundo plano a noção do belo natural e a qualidade estética que as coisas da natureza podem ter, expressando as diferentes compreensões de beleza ao longo da história.
Processo de criação coletiva
(p. 113 e 114)
Reserve um tempo para o compartilhamento dos inventários de coisas belas elaborados pelos estudantes. Organize um momento coletivo de comparação dos itens relacionados pelos jovens, estabelecendo um debate sobre o que é considerado belo na perspectiva cultural dos estudantes. Esses inventários podem e devem servir de inspiração para a criação dos grupos. O tema do questionamento dos padrões de beleza é especialmente relevante para estudantes do Ensino Médio, constituindo uma oportunidade para a afirmação de outras formas de belo, fomentando a autoafirmação positiva e corroborando para a quebra de paradigmas e estereótipos. A ideia de explorar o oposto, o conceito de feio, também é um horizonte de provocação poética possível. Reforce com os jovens a importância de revisitarem obras e artistas estudados ao longo dos três capítulos desta unidade, pois esse
material pode ser utilizado para pensar a relação crítica com o conceito de belo.
Integrando com Matemática e suas Tecnologias (p. 115, 116 e 117)
O objetivo desta seção é oferecer ao estudante uma oportunidade de experimentar, de modo prático, a noção de proporcionalidade, equilíbrio e harmonia concebida pelos gregos na Antiguidade e, ao mesmo tempo, conceber uma visualidade para conceitos matemáticos.
Convide o professor de Matemática para compartilhar com você a apresentação da proporção áurea. Ele pode, inclusive, propor algum exercício para os estudantes assimilarem outras formas de obter o número áureo, por meio de equações ou construções geométricas.
A atividade de síntese pode ser conduzida apenas pelo professor de Arte. Deixe claro para os estudantes que se trata de um trabalho de arte, em que a invenção é sempre bem-vinda. Os jovens podem usar réguas, esquadros e compasso na construção do desenho final, mas desenhar as espirais à mão pode trazer um aspecto mais gestual para o trabalho. Solicite que variem a dimensão dos retângulos e sua posição. Experimentar girar e espelhar o retângulo também pode criar um ritmo interessante para a composição. Encoraje também um uso da pintura para ressaltar as formas curvas ou os quadrados, por exemplo.
Por fim, ao reunir os trabalhos, promova uma discussão sobre o conceito de belo. Mencione o texto de Umberto Eco trabalhado na seção Síntese estética e ouça as impressões dos estudantes. O objetivo desse debate é incentivar os estudantes a levar a questão do belo e suas interpretações como uma reflexão para suas vidas.
Arte em questão: unidade 1
(p. 118 e 119)
No momento de aplicação da avaliação, procure simular a dinâmica que acontece nas provas de vestibular, para que os estudantes possam se familiarizar com esse momento. Peça a eles que desliguem e guardem os aparelhos celulares, combine o tempo de realização da prova e distribua as fichas de resposta a todos. Na aula seguinte, revisite a prova, explanando o gabarito com a turma, questão a questão, dirimindo dúvidas e retomando os conteúdos trabalhados na Unidade 1: Matrizes culturais.
• Competências específicas de Linguagens e suas Tecnologias: 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7.
Habilidades de Linguagens e suas Tecnologias : EM13LGG101, EM13LGG102, EM13LGG103, EM13LGG104, EM13LGG105, EM13LGG201, EM13LGG202, EM13LGG203, EM13LGG204, EM13LGG301, EM13LGG302, EM13LGG303, EM13LGG304, EM13LGG305, EM13LGG401, EM13LGG402, EM13LGG501, EM13LGG502, EM13LGG503, EM13LGG601, EM13LGG602, EM13LGG603, EM13LGG604, EM13LGG701, EM13LGG702, EM13LGG703 e EM13LGG704.
Orientações didáticas
Nesta próxima etapa do processo pedagógico, serão tecidas relações com a História do Brasil, refletindo sobre a formação da nossa memória social e como essa herança se relaciona com a sociedade contemporânea. Comente esse esforço com os estudantes, de ter na leitura crítica do passado uma bússola para guiar o futuro, pensando as contradições que nos formaram e que ainda impactam nossa realidade. É também a oportunidade de incentivar os estudantes a se questionarem sobre sua própria história, de resgatarem o que for possível de ser rastreado sobre a própria memória.
Contexto da unidade
(p. 120 e 121)
Na Unidade 1, foram investigadas as matrizes culturais que compõem a arte e a cultura brasileiras. Já na Unidade 2, propõe-se um enfoque historiográfico, realizando um percurso de investigação pautado pelas formas e manifestações artísticas brasileiras ao longo de sua história. Esse recorte, no entanto, não pretende impor uma abordagem museológica para as manifestações artísticas das diferentes linguagens. O que se espera é que, ao lidar com a história e a memória na relação com a arte e a cultura, os estudantes encontrem pontos de contato entre o passado e o presente. Ao longo dos capítulos, concepções distintas de cultura e identidade brasileiras estão em disputa, demonstrando o movimento vivo e dinâmico de elaboração de determinada ideia de Brasil.
Inicie o estudo da Unidade propondo a leitura visual coletiva do calçadão da praia de Copacabana, no Rio de Janeiro (RJ), projetado pelo artista Burle Marx, explorando suas formas, cores e linhas, bem como sua dimensão, tendo como referência as pessoas na imagem. Esse calçadão é um exemplo de como importantes formas e realizações artísticas, que carregam elementos essenciais da memória e da história das artes no Brasil, habitam, muitas vezes, o nosso cotidiano sem que percebamos.
Em seguida, leia com os estudantes o texto de abertura, que aborda os principais campos que serão explorados nos três capítulos que compõem a Unidade.
Por fim, leia e debata com a turma a citação de Luiz Antonio Simas, retirada do livro O corpo encantado das ruas, sintetizando o esforço de abordagem da Unidade 2. Ao comentar sobre as “culturas da síncope”, o autor está se referindo às culturas populares, marginais aos sistemas artísticos hegemônicos, que, apesar disso, se tornaram a base do que hoje é compreendido como arte e cultura brasileiras.
Capítulo 4: Arte e colonização
Abertura (p. 122 e 123)
As páginas de abertura do capítulo oferecem a oportunidade de investigar os conhecimentos prévios dos estudantes. Incentive a participação de todos, perguntando o que sabem sobre o período de colonização do Brasil. Oriente-os a relembrar temas estudados nas aulas de História e permita que se arrisquem na descrição das imagens. Só então suscite diferentes abordagens sobre: a relação entre cristianismo e arte no Brasil no período colonial; os processos de assimilação das culturas afrodiaspóricas pelos portugueses, como a dança do lundu; o olhar dos artistas europeus em relação à sociedade brasileira retratada nas gravuras de artistas viajantes; e o papel documental da fotografia ao registrar a exploração das mulheres escravizadas no cotidiano urbano no início do século XIX. Por fim, se julgar conveniente, faça as perguntas sugeridas de forma oral.
Como a cultura dos países europeus se estabeleceu no Brasil? (p. 124)
Neste capítulo, é importante reforçar com a turma a ideia de colonialidade, isto é, a continuidade do modelo de exploração socioeconômica estabelecido na era das navegações e praticado pelos países europeus nas relações
com suas colônias. Vale destacar que, ainda hoje, há uma hierarquia de dominação e subalternidade no controle de recursos econômicos, do capital e do conhecimento entre as diversas nações em todo o mundo. Embora o colonialismo tenha sido superado, a colonialidade continua presente, inclusive nas relações sociais e culturais.
No Brasil, uma das marcas desse sistema está no comportamento das elites em enaltecer as culturas europeias e estadunidenses, desprezando a originalidade e a sofisticação da arte e da cultura brasileiras.
Atividade de sensibilização: cartografia afetiva (p. 125)
Reforce aos estudantes que esta é uma atividade artística, criativa, inspirada em elementos da cartografia. Isso quer dizer que não é necessária uma precisão cartográfica para realizar o trabalho. O importante é que as duplas ou os trios se apropriem da ideia de mapa para realizar a cartografia poética do bairro, da região ou da cidade onde moram. Isso, no entanto, não impede que mapas do território, disponíveis em ambientes digitais, sejam utilizados na realização da atividade. O principal objetivo é que os estudantes reconheçam as riquezas de seu próprio território, identificando elementos que eles mesmos valorizam e que formam os espaços de afeto e de pertencimento desses jovens.
Artes visuais
Contexto: arte no período colonial (p. 126)
Fale para a turma que o ensino formal de Arte estabelecido no Brasil Colônia era calcado nos valores tradicionais da arte europeia e concebido com base em padrões do Classicismo. Artistas franceses trouxeram obras da Europa para compor o acervo da Academia Imperial de Belas Artes (AIBA), cuja ligação com o governo imperial resultou na produção de pinturas de caráter ufanista. O gaúcho Manuel de Araújo Porto-Alegre (1806-1879) fez parte da primeira geração de alunos da AIBA e, ainda hoje, o Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro guarda uma série de pinturas nas quais o artista abordou, com a grandiosidade dos pintores românticos, o tema da paisagem.
Repertório 1: a escultura no Barroco brasileiro (p. 127)
A religiosidade cristã é um dos aspectos constitutivos da cultura ocidental trazidos para o Brasil no período colonial. A arte cristã barroca pode ser observada em inúmeras igrejas e instituições museográficas voltadas
à arte sacra em todas as regiões do Brasil. Para reforçar as similaridades e as diferenças da escultura barroca em Portugal e no Brasil, mostre aos jovens as esculturas do acervo do Museu de Arte Sacra do Funchal, em Portugal, disponível em https://artsandculture.google.com/partner/ museu-de-arte-sacra-do-funchal?hl=pt-PT (acesso em: 25 out. 2024), comparando-as às de Aleijadinho.
Repertório 2: os primeiros fotógrafos brasileiros (p. 128)
Comente que Dom Pedro II fez grandes investimentos na aquisição de obras para sua biblioteca particular, constituída de livros, mapas, gravuras e fotografias. Esse acervo está hoje na Biblioteca Nacional, com o nome de “Coleção D. Thereza Christina Maria”, em homenagem a esposa de Dom Pedro. Comente com os estudantes sobre o cachimbo na composição, fazendo uma abordagem crítica do tabagismo e seus malefícios para a saúde, embora tenha valor enquanto registro histórico sobre os hábitos de um determinado período. Explore também a ideia de composição, que nada mais é do que o modo como os elementos que aparecem no enquadramento da fotografia são dispostos, pensando no arranjo geral da imagem.
Aprofundamento
Acesse o site da Biblioteca Nacional Digital para conhecer o acervo da “Coleção D. Thereza Christina Maria”. Disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/dos sies/colecao-d-thereza-christina-maria-albuns-foto graficos/ (acesso em: 25 out. 2024).
Repertório 3: revendo a colonização em nossos dias (p. 129)
A obra de Jonathas de Andrade propõe um olhar crítico para as relações de trabalho e para o racismo estrutural que se estabeleceram no cotidiano do Brasil Colônia – e que persistem em nossas relações sociais contemporâneas.
Sugestão de leitura
O artigo de Lilia Schwarcz comenta as estratégias utilizadas pelo artista Jonathas de Andrade para evidenciar como o racismo se expressa na linguagem cotidiana.
A linguagem das relações. Publicado por Quatro cinco um. Disponível em: https://quatrocincoum.com.br/ artigos/arte/a-linguagem-das-relacoes/ (acesso em: 25 out. 2024).
Pesquisa: fotografia e retrato (p. 130) Nesta seção, sugira aos estudantes que pesquisem,
em fontes confiáveis na internet ou em outros meios, produções fotográficas realizadas por mulheres no Brasil e que não receberam o devido reconhecimento. Espera-se que os jovens cheguem a nomes como os das pioneiras Gioconda Rizzo (1897-2004), Hildegard Rosenthal (1913-1990) e Alice Brill (1920-2013) – as duas últimas, imigrantes suíça e alemã, respectivamente, que se fixaram em São Paulo na década de 1930 –, das fotógrafas Claudia Andujar (1931-) e Maureen Bisilliat (1931-) – que atuaram no fotojornalismo durante a década de 1970 –, e de Rosa Gauditano (1955-) – cuja atuação se destaca, sobretudo, por documentar a situação de populações consideradas à margem da sociedade. Por fim, aborde o tema do capítulo de maneira local, pedindo aos estudantes que tragam para a sala de aula fotografias antigas que encontrarem em casa, para ilustrar uma conversa com os colegas.
Reforce com os estudantes que “enquadramento” diz respeito ao recorte escolhido pelo fotografo, que elege, através da posição da câmera, o que estará no quadro. O enquadramento é um dos elementos centrais da composição de uma fotografia, mas não o único. A disposição dos elementos da foto, a postura e os gestos capturados, a iluminação, todos esses aspectos se somam ao enquadramento para gerar a composição de uma fotografia.
Teorias e modos de fazer: os desafios do retrato na fotografia (p. 131)
Comente com os estudantes que, ao fazer um retrato fotográfico, temos a preocupação de verificar se o modelo está em uma boa posição, se a expressão facial favorece sua aparência, se os olhos estão abertos, se os cabelos estão bem alinhados e se a iluminação está adequada, entre outros detalhes voltados para a obtenção de um resultado considerado “belo”. Entretanto, nem sempre nos preocupamos em como figurar pensamentos e qualidades da pessoa que está posando. Nas fotografias de estúdio, muito comuns até a primeira metade do século XX, elementos como roupas e objetos eram utilizados para compor a cena, com a finalidade de reforçar um caráter, verdadeiro ou falso, do modelo. Com base nisso, pergunte aos estudantes que sentimentos ou sensações lhes são suscitadas ao observar a fotografia de Walter Firmo.
Ação: retrato em fotografia e pintura (p. 132 e 133)
Para esta proposta, é fundamental explicar aos estudantes que o trabalho consiste em planejar e cuidar de todos os detalhes de uma ação que hoje é praticamente
automática no cotidiano dos jovens: o ato de fotografar. Portanto, é nesse tempo expandido de conceber, imaginar, refletir e discutir com o parceiro que o trabalho fotográfico se dará. Para os estudantes, esta ação é uma oportunidade de enfrentar o desafio de olhar para o outro em busca de sua essência e encontrar uma alegoria que traduza essa ideia. O que se espera, ao término da atividade, é que os jovens compreendam a imagem fotográfica como uma forma de expressar singularidades e subjetividades, para além da realidade visível.
Música e Dança
Contexto: outros ritmos, outros salões (p. 134)
Embora o processo de colonização também tenha impactado a música sacra brasileira, a seção traz um recorte da música profana, a fim de que os estudantes compreendam os fenômenos sociais e culturais representativos da cidade do Rio de Janeiro e do país. Assim, abordam-se gêneros musicais e danças que marcaram a interação entre as matrizes europeias e africanas resultantes da diáspora.
Repertório 1: “Isto é bom”: o Brasil dos lundus e das modinhas (p. 135)
Até meados do século XIX, o batuque e o lundu eram vistos de forma pejorativa, em razão de suas origens africanas. O processo histórico que levou esses gêneros a conquistar os salões da elite carioca é explorado por diversos autores. Reproduza para os estudantes o áudio do lundu “Isto é bom!” e peça que se atentem aos termos da época presentes na letra e à qualidade da gravação. Disponível em: www.youtube.com/wat ch?v=GIhrPVqw1Pc (acesso em: 25 out. 2024).
Sugestões de leitura
Carlos Sandroni. Feitiço decente: transformações do samba no Rio de Janeiro (1917-1933). São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
A obra aborda a história do samba no Rio de Janeiro. Jairo Severiano. Uma história da música popular brasileira: das origens à modernidade. São Paulo: Editora 34, 2013.
A obra aborda a música popular brasileira do século XVIII até a contemporaneidade, abordando gêneros musicais de destaque nos diferentes períodos, bem como artistas representativos de cada época.
José Ramos Tinhorão. Música popular: um tema em debate. 4. ed. São Paulo: Editora 34, 2012.
A obra sugerida reúne estudos sobre o choro, o samba, o Carnaval e a influência do jazz na bossa nova.
Repertório 2: polca e maxixe, para dançar (p. 136)
Além do diálogo entre os ritmos europeus e os gêneros que já existiam no Brasil, é importante destacar os conflitos sociais envolvidos nessa relação. Como exemplo, pode-se citar o polêmico maxixe “Corta-jaca”, de Chiquinha Gonzaga, executado pela então primeira-dama Nair de Teffé em um evento público, em 1914. A canção foi duramente criticada pelo então senador Rui Barbosa (1849-1923), que, em seu discurso no Senado Federal, julgou a música inapropriada para os salões diplomáticos.
Aprofundamento
Para saber mais sobre o incidente que ficou conhecido como “Noite do Corta-jaca”, acesse: https:// chiquinhagonzaga.com/wp/escandalo-politico-o-cor ta-jaca-no-catete/ (acesso em: 25 out. 2024).
Repertório 3: o nascimento do choro e do samba (p. 137)
Os conflitos sociais gerados pelas mudanças trazidas pela reforma urbanística promovida pelo engenheiro e então prefeito Pereira Passos, na cidade do Rio de Janeiro, resultaram também em implicações culturais, como o surgimento do choro e do samba. “Pelo telefone”, registrado por Donga (1890-1974), é considerado o primeiro samba urbano a ser gravado e ambienta o contexto da virada do século XX no Rio de Janeiro. A fim de aproximar esse repertório dos estudantes, solicite a eles que busquem esse samba na internet, bem como as canções “Pela internet” e “Pela internet 2”, de Gilberto Gil (1942-). Nestas últimas, o compositor faz alusão ao samba de Donga, refletindo, no entanto, a realidade da virada do século XXI.
Teorias e modos de fazer: entre pulsação e compasso (p. 138, 139 e 140)
Nesta seção, os estudantes são convidados a experimentar os compassos quaternário, ternário e binário. É recomendável que, antes de realizar o exercício, a turma recorde o conceito de pulsação. Os áudios que acompanham a seção serão fundamentais para auxiliar a revisão desse conceito, mas, caso seja necessário, retorne ao Capítulo 2 e releia o conteúdo sobre esse tema com os estudantes.
O primeiro compasso a ser experimentado é o quaternário. Utilize as ilustrações do livro em conjunto
com o áudio para orientar a atividade. Um erro comum é o estudante pisar o primeiro tempo com o pé forte e querer avançar para o terceiro tempo com o pé fraco. Por isso, vale ressaltar aos jovens que os tempos 1 e 3 são no pé forte e os tempos 2 e 4, no pé fraco. Se os estudantes tiverem dificuldade em pisar o tempo 1 e bater palma ao mesmo tempo, peça a eles que realizem primeiro o movimento e depois a palma.
O compasso ternário, em especial, pode gerar dúvidas. Para construir o movimento, recomenda-se que toda a turma esteja voltada para uma das paredes da sala e que o professor faça a demonstração do movimento, também de frente para a parede e de costas para a turma, pois o espelhamento do movimento pode gerar dúvidas. Quando todos estiverem seguros, podem retornar à roda.
O compasso binário, por sua vez, demanda especial atenção na transferência do peso do corpo para cada uma das pernas. Fique atento para que o estudante retire o outro pé do chão.
Por fim, a combinação dos compassos proposta na atividade pode gerar novos movimentos. O vídeo Compassos Alternados: Bloco d’O Passo (disponível em: www.youtube.com/watch?app=desktop&v=iu3fP_ol 4pA – acesso em: 25 out. 2024) ilustra bem a combinação de compassos alternados, ou seja, a combinação de compassos de 4, 3 e 2 tempos que resultam em ciclos com um denominador comum. Vale ressaltar que essa é uma abordagem proposta pelo método O Passo, de educação musical, e pode ser consultada em: https://www. institutodopasso.org/metodo (acesso em: 31 out. 2024).
Ação: parte 1 – dançar a dois ou a duas (p. 141 e 142)
Além do equipamento de som e das bexigas, providencie giz ou fita crepe para marcar pontos e linhas no chão. Reserve um momento para os estudantes se aquecerem antes de iniciar a atividade: proponha que caminhem livremente pela sala. Em seguida, oriente-os a alternar momentos em que experimentam caminhar com os joelhos estendidos e na meia-ponta (com os calcanhares fora do chão) e outros em que caminham apenas tocando os calcanhares no chão, com as pontas dos pés levantadas. Esse aquecimento já pode ser feito ao som da faixa de áudio que acompanha a atividade – isso permitirá que os estudantes se relacionem com a pulsação.
Marcar as linhas no chão com giz ou fita crepe pode ajudar os estudantes nos momentos de avançar e recuar em linha. Primeiro, sugira que façam os passos
lentamente, para garantir que todos na linha iniciem e terminem com o mesmo pé; só depois busquem outra cadência. Caso algum estudante tenha dificuldade com a lateralidade, ele pode ser auxiliado por outro estudante, que deve se colocar ao seu lado.
Você também pode utilizar o recurso de marcar o chão no momento em que os grupos se posicionarem frente a frente, avançando e recuando. Lembre aos estudantes que os pés irão “se encaixar”, como peças de quebra-cabeça: quando o pé direito estiver avançando, o pé esquerdo do parceiro estará recuando, e vice-versa. Não tenha pressa de passar para a fase seguinte. Antes de se dividir em duplas, é preciso que a turma esteja avançando e recuando com segurança.
Alguns estudantes podem se sentir incomodados com o contato mais próximo de outra pessoa. Assim, a bexiga é uma forma de manter a proximidade sem toque direto. Reforce que a divisão em duplas não precisa ser determinada pelo gênero. Sugerir que não permaneçam por muito tempo com um mesmo parceiro pode diminuir as resistências.
Música e Dança
Contexto: o sagrado e o profano nos tempos coloniais (p. 143)
Aproveite esta seção para conversar com os estudantes sobre as festas locais que eles conhecem ou das quais participam. Sintetize, no quadro, informações como a época em que essas festas ocorrem, as regiões em que têm maior presença, como são seus ritos tradicionais e o que significam, chamando a atenção para suas origens religiosas, quando for o caso. Destaque os elementos culturais que essas festas reúnem, como culinária, dança, música, encenações e adereços. Convide os estudantes a relatar suas experiências nessas festas.
Repertório 1: festas juninas e quadrilha (p. 144)
A depender da localidade da escola, as festas juninas podem ter características diferentes. Após a leitura do texto, peça a alguns estudantes que descrevam, com base em suas próprias experiências, o desenrolar de uma quadrilha, por exemplo. Em seguida, discutam o que há em comum e o que as diferencia das descrições disponibilizadas no Livro do estudante. Quais são as músicas utilizadas? Como os participantes se vestem? As quadrilhas são previamente ensaiadas pelos grupos ou são abertas a todos? Se possível, peça que demonstrem os movimentos que conhecem.
Repertório 2: congada (p. 145)
A seção permite aprofundar a discussão sobre as complexas relações entre festa e devoção no Brasil, iniciadas no período da colonização.
Sugestão de leitura
Luiz Antonio Simas. Santos de casa: fé, crenças e festas de cada dia. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2022.
O livro sugerido oferece um vasto material sobre a congada e o culto a Nossa Senhora do Rosário, além de explorar a figura de São João Batista e as festas juninas, incluindo também a devoção a Nossa Senhora de Nazaré. Além disso, a obra também ajuda a compreender as complexas relações entre festa e devoção no Brasil, inauguradas no período da colonização.
Aprofundamento
Para saber mais sobre a história dos Congados, assista ao primeiro episódio do documentário Congadeiros. Disponível em: www.youtube.com/watch?v =S_32dg_tlT0 (acesso em: 25 out. 2024).
Repertório 3: festa do Círio de Nazaré (p. 146)
A história das origens da celebração do Círio de Nazaré entrelaça mitos, práticas e crenças de culturas indígenas, africanas, afrodiaspóricas e portuguesas que constituem o Brasil.
Aprofundamento
O episódio “Do milagre ao carnaval devoto, o Círio que se amazonizou”, do podcast Olho d’água, narra a história do Círio de Nazaré e defende que uma das maiores festas do Brasil não parou de se transformar ao longo dos anos, tornando-se, cada vez mais, uma festa amazônica. Disponível em: www.amazonialati tude.com/2024/10/11/olho-dagua-carnaval-devotocirio-amazonizou/ (acesso em: 25 out. 2024).
Pesquisa: as mulheres no samba (p. 147 e 148)
As mulheres têm um papel essencial na história do samba desde o seu surgimento. Proponha aos estudantes uma pesquisa sobre D. Ivone Lara, a sambista que, de tamanha importância, teve seu aniversário homenageado na instituição do dia Nacional da Mulher Sambista. A pesquisa deve envolver sua biografia e a importância dessa data celebrativa.
Ao propor a pesquisa sobre Tia Ciata, é importante que os jovens se familiarizem com o contexto histórico abordado no Repertório 3. Peça a eles que
busquem, na internet, por fotos históricas da região do porto do Rio de Janeiro, do Passeio Público e dos bairros Praça Onze e Estácio, que correspondiam à Pequena África.
Já na proposta de pesquisa sobre Chiquinha Gonzaga, recupere o imbróglio diplomático gerado pela execução de “Corta-jaca”, em 1914, e ressalte que, além de ser considerada pelas elites uma música popular e inadequada para os salões diplomáticos, o fato de ter sido composta por uma mulher gerou mais um fator de repulsa à composição. Para explorar o expoente feminino que é a compositora, projete para a turma o trailer do documentário Chiquinha Gonzaga: música substantivo feminino, de 2023, disponível em www.youtube.com/ watch?v=3QTm5eBMpac (acesso em 25 out. 2024).
Quando os estudantes pesquisarem sobre Leci Brandão (1944-), destaque o ativismo social e as músicas de forte cunho político. A compositora segue atuando no mundo da música, o que também é uma oportunidade para destacar o protagonismo da pessoa idosa em nossa sociedade. Ela se tornou deputada estadual em São Paulo, Conselheira da Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e membro do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher.
Por fim, sugira aos estudantes que pesquisem, em sua cidade, a incidência de rodas de samba e procurem saber quantas delas são promovidas por mulheres. A título de curiosidade, cidades como Rio de Janeiro e São Paulo promovem rodas de samba com instrumentistas e cantoras mulheres, como “Samba que elas querem” (RJ) e “Samba de Dandara” (SP).
Ação: parte 2 – no tempo da valsa (p. 149)
Novamente, fazer marcas no chão com giz ou fita crepe pode ser uma estratégia eficaz para que os estudantes entendam e realizem corretamente a transferência de peso na valsa. Posicionar os estudantes de frente ou de costas para uma mesma parede ou janela, por exemplo, pode tornar mais simples a compreensão dos deslocamentos e das transferências de peso. Contagiar-se pelo movimento do outro também é um caminho para aprender. Assim, caso haja estudantes que tenham tido mais facilidade com o movimento da valsa, peça que se coloquem diante daqueles que ainda não conseguiram realizar o movimento com conforto. Os últimos devem apenas se deixar levar pela movimentação dos primeiros, mantendo contato visual, sem se preocupar com os pés ou outros detalhes nesse primeiro momento.
Não se esqueça de usar a faixa de áudio para acompanhar a atividade. Fazer o movimento ouvindo a música pode facilitar a compreensão da pulsação e tornar a dinâmica mais intuitiva.
Não há necessidade de contato físico para essa experiência. Um estudante que já compreendeu o movimento da valsa pode servir de guia para mais de um colega simultaneamente nessa etapa. Com o grupo mais seguro, retomem, então, o trabalho das duplas com as bexigas entre as palmas das mãos, agora explorando a valsa. Se as bexigas caírem ou estourarem com frequência, é provável que a dupla não esteja modulando bem a pressão. Peça que mantenham o contato por meio da bexiga, evitando a pressão excessiva, porém sem abandoná-la. Se considerar necessário, proponha que parem de dançar por alguns minutos para que ajustem a pressão sobre as bexigas para então retomar a dança.
As atividades propostas nesse capítulo são acompanhadas de composições de Ernesto Nazareth (18631934), pianista e compositor brasileiro. Muitas das composições de Nazareth eram chamadas de “tango brasileiro”, mas se aproximavam das polcas-lundus que escrevia. Atualmente, o tango é consagrado como um ritmo argentino. Proponha uma breve pesquisa sobre o compositor e esse gênero. É possível acessar o site oficial sobre o artista para ter mais informações de sua vida e obra. Disponível em: https://ernestonazare th.com.br/ (acesso em: 29 out. 2024).
Ponte para outras linguagens
artísticas (p. 150 e 151)
Artes integradas: arquitetura colonial Ao abordar a arquitetura colonial brasileira, busque trabalhar o repertório prévio dos estudantes, incentivando-os a descrever lugares que conhecem e que façam referência ao tema, como as igrejas ou casas da cidade onde moram e que datem desse período. Outra possibilidade é orientá-los a fazer a leitura das imagens presentes no livro, solicitando que destaquem elementos oriundos do período colonial, como os painéis de azulejos.
Aprofundamento
O site do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) oferece uma publicação detalhada sobre o tema. Disponível em: http://portal.iphan. gov.br/uploads/publicacao/robert_smith_e_o_brasil _vol1_parte2.pdf (acesso em: 26 out. 2024).
Artes integradas: cultura cigana
Ao iniciar o estudo da seção, é essencial mediar concepções estereotipadas que cercam essa população. Explorar a chegada dos ciganos ao Brasil, promovendo um resgate de sua história, pode dimensionar a relevância histórica, artística e cultural desse povo. Recomenda-se analisar com os estudantes diferentes manifestações, em variadas linguagens artísticas. Sugere-se destacar a comemoração do Setembro Cigano, que ocorre anualmente, desde 2019, na cidade de Araucária (PR). O evento busca promover a cultura cigana por meio de oficinas, músicas, filmes e danças.
Aprofundamento
Para um estudo mais detalhado, acesse a página do Centro de Estudos Ciganos, ligada à Rede de Direitos Humanos & Cultura (DHnet). Disponível em: www. dhnet.org.br/direitos/sos/ciganos/index.html (acesso em: 26 out. 2024).
Teatro: teatro jesuítico
Ao abordar o teatro jesuítico, é interessante fazer uma diferenciação entre a instituição da Igreja Católica – que, em certos momentos históricos, esteve envolvida com violências e disputas de poder – e a fé cristã – que, como qualquer outra prática religiosa, merece ser respeitada. Para aprofundar a reflexão sobre os diferentes papéis que a Igreja assumiu no território brasileiro, pode-se mencionar a Teologia da Libertação como um momento histórico em que pessoas ligadas à Igreja Católica lutaram por justiça social e contra a ditadura civil-militar.
Teatro: Casas de Ópera
Reforce aos estudantes os diferentes sentidos da palavra teatro. A seção aborda as Casas de Ópera – edifícios teatrais construídos no século XVIII. Porém, antes de existirem esses espaços físicos denominados “teatro”, já existia, na vida social, a presença de formas teatralizadas. Recomenda-se retomar o debate sobre a teatralidade cultivada por povos indígenas, estudada no Capítulo 1
Síntese estética: a construção de uma cultura tropical (p. 152, 153 e 154)
O texto extraído do livro Brasil: uma biografia (2018) traz um recorte de como as produções culturais e artísticas integravam o conjunto de exigências que envolviam a vinda da coroa portuguesa para o Brasil, depois de aportar no Rio de Janeiro (RJ), fugindo das tropas napoleônicas. A corte exigia espaços para lazer, teatro e fruição musical. O trabalho
de pessoas escravizadas, como é possível ler no texto, participa desse processo de maneira material, fornecendo mão de obra musical para os eventos culturais da época. Essa nova necessidade culminou na vinda da Missão Artística Francesa e no projeto de um país independente.
Solicite aos estudantes que observem as imagens trazidas na Síntese Estética que retratam o período destacado. Questione-os sobre o que lhes chama a atenção nas pinturas, considerando aspectos formais e técnicos, bem como os conteúdos expressos na representação.
A primeira obra, Entrada do Passeio Público (1835), é uma aquarela de Karl Wilhelm von Theremin (17841852), comerciante, diplomata, pintor e desenhista alemão que viveu no Rio de Janeiro, retratando a entrada do parque histórico mencionado no texto. É importante salientar a presença de pessoas escravizadas na cena, destacando como o trabalho forçado era um elemento cotidiano, a base do modo de produção da vida no período.
A segunda obra, Vista do largo do palácio no dia da aclamação de dom João VI (1839), é uma litografia – espécie de gravura realizada sobre uma matriz de pedra, colorida à mão – que retrata um momento de celebração da corte, feita pelo artista Jean-Baptiste Debret, integrante da Missão Artística Francesa.
Síntese estética: processo de criação coletiva (p. 154 e 155)
Refletir sobre aspectos da colonização, enfrentar suas contradições e seus processos e elaborar essa memória significa reconhecer elementos do colonialismo que permanecem presentes em nossa sociedade, como o racismo estrutural herdado do sistema escravocrata brasileiro. A violência desse sistema continua viva. A criação poética e artística dos estudantes oferece a oportunidade de confrontar essa ferida colonial, permitindo elaborar a memória e o pertencimento. Essa é uma das provocações centrais para a realização da síntese estética dos jovens, conectando o passado histórico ao presente vivido na escola.
Capítulo 5: Modernismos no Brasil
Abertura (p. 156 e 157)
Converse com os estudantes sobre as imagens apresentadas nas páginas de abertura. Incentive a participação de todos, perguntando o que sabem sobre
o contexto da arte moderna na Europa e no Brasil: que artistas conhecem? O que mostram as fotografias apresentadas?
Como os artistas modernos conceberam uma identidade para o Brasil? (p. 158)
As rupturas do Modernismo europeu chegaram ao Brasil de forma branda e tardia, e, mesmo na Semana de Arte Moderna (1922), não foram exibidos trabalhos de fotografia, de cinema ou de design, por exemplo.
Entretanto, os intelectuais da época demonstravam interesse em incorporar, por exemplo, elementos das culturas indígenas, afrodescendentes, regionais e rurais a seus discursos estéticos. No “Manifesto da poesia Pau-Brasil” (1924), Oswald de Andrade destacou a necessidade de explorar nossas raízes culturais. Em 1928, em seu “Manifesto Antropófago”, ele aprofundou essas ideias e sintetizou o processo de formação da cultura brasileira. Já Mário de Andrade promoveu expedições de pesquisa a estados do Norte e do Nordeste, com o intuito de registrar festas e tradições. Em 1928, publicou o romance Macunaíma: o herói sem nenhum caráter, inspirado em um mito de povos indígenas que viviam em Roraima.
Atualmente, está em curso uma revisão histórica sobre o Modernismo brasileiro, em que os povos indígenas reivindicam a autoria de suas histórias e de seus mitos. Segundo o artista macuxi Jaider Esbell (19792021), no romance de Mário de Andrade, as narrativas sobre Makunaimî, o espírito criador do mundo, foram misturadas e elaboradas de forma estereotipada, visando conceber uma síntese da identidade brasileira. Essa subalternização cultural é um reflexo da colonização, em que um escritor se apropriou de um elemento da cultura macuxi e o elevou à condição de símbolo nacional. O contexto em que Mário de Andrade criou seu romance era diferente do atual e, portanto, é fundamental que artistas indígenas possam resgatar narrativas e reivindicar a participação ativa de suas culturas na revisão do discurso modernista.
Sugestão de leitura
TAUREPANG et al. Makunaimã: o mito através do tempo. São Paulo: Elefante, 2019.
O livro indicado revela perspectivas indígenas acerca do personagem Macunaíma, apresentado na obra de Mário de Andrade.
Atividade de sensibilização: símbolos da brasilidade (p. 159)
Esta atividade de artes visuais visa explorar a noção plural de brasilidade dos estudantes, sendo, portanto, uma oportunidade de debater quais signos, representações e formas artísticas, do ponto de vista dos jovens, evocam uma ideia de Brasil. Também proporciona debater o porquê dessa simbologia, revelando quais representações podem ser disputadas na construção desse imaginário.
Artes visuais
Contexto: moderno e brasileiro (p. 160)
A ruptura estética clamada pelos artistas brasileiros na Semana de Arte Moderna teve reflexos ao longo da década de 1920, com as pinturas de Tarsila do Amaral, Di Cavalcanti e Vicente do Rego Monteiro, e com a publicação da revista Klaxon (1922) e do “Manifesto Antropófago”. Na década de 1930, houve uma mudança no cenário político e cultural do país: os artistas se voltaram para as questões sociais, momento em que Candido Portinari despontou com uma vasta produção, incluindo grandes murais de afresco e azulejo.
Repertório 1: a temática indígena na pintura moderna (p. 161)
Vicente do Rego Monteiro inspirou-se em elementos da cultura marajoara para criar cenas com formas geométricas e figuras simplificadas, seguindo a estética do Modernismo europeu. O artista criou um “glossário de pictogramas indígenas” e ilustrou o livro Lendas, crenças e talismãs dos índios do Amazonas, publicado em Paris em 1923. As cerâmicas marajoaras foram eleitas como emblema nacional brasileiro porque, segundo a arqueologia da época, representavam uma civilização extinta. Para aqueles arqueólogos, tais objetos eram “belos porque mortos”.
Repertório 2: Muralismo
(p. 162)
A pintura muralista ressurgiu no México após a revolução de 1910, quando artistas ávidos por reviver a riqueza cultural das antigas civilizações e, ao mesmo tempo, fazer do México uma nação moderna, buscaram uma linguagem que alcançasse as massas. Acesse o site do Projeto Portinari, disponível em: www.por tinari.org.br/ (acesso em: 26 out. 2024) e mostre aos estudantes os murais realizados por Candido Portinari.
Repertório 3: Surrealismo
(p. 163)
Comente com os jovens que a brasileira Maria Martins se destacou no movimento surrealista. Peça
que observem, na abertura do capítulo, a escultura O implacável (1947). Maria morou nos Estados Unidos, onde frequentou um círculo de artistas europeus, alguns deles ligados ao Surrealismo, como André Breton (1896-1966) e Marcel Duchamp (1887-1968). Em suas esculturas, realizadas na década de 1940, formas orgânicas que remetem a vegetais, animais e partes do corpo humano, a princípio estranhas entre si, eram associadas. Em 1942, realizou a série Amazônia –um conjunto de esculturas de bronze com temas extraídos do imaginário brasileiro. As peças Yara, Boiúna, Cobra Grande, Boto e Iacy abordavam mitos amazônicos; e as peças Yemanjá e Aiokâ, mitos afro-brasileiros. A exposição atraiu a atenção de Breton, que via o mito como um elemento capaz de unir pessoas e povos de todos os tempos e lugares.
Pesquisa: Centenário da Semana de Arte Moderna (p. 164)
Para complementar as pesquisas propostas na seção, sugira aos estudantes que busquem obras dos artistas mencionados no capítulo, a fim de ampliar seu repertório. Alguns sites que podem ser indicados são:
Teorias e modos de fazer: arte e geometria (p. 165)
Existem formas variadas de explorar o trabalho com a geometria, e algumas delas apresentam interdisciplinaridade com outros componentes curriculares. Se julgar pertinente, convide o professor de Matemática para que elaborem, juntos, uma aula que envolva construções geométricas rigorosas, em que os estudantes precisem utilizar instrumentos como régua, esquadro e compasso, bem como métodos de construção, para encontrar uma mediatriz ou calcular áreas de polígonos. Posteriormente, esses desenhos podem ser utilizados em composições que envolvam variações de ritmo, simetria e jogos de cheios e vazios.
Ação: azulejos de papel (p. 166 e 167)
A proposta deste trabalho é demonstrar o raciocínio que envolve a criação de estampas e as variações possíveis no trabalho com módulos. Esse tipo de projeto envolve geometria e raciocínio espacial e costuma atrair a atenção dos adolescentes, já que oferece técnicas de customização e personalização do espaço.
Muitos artistas ligados ao Modernismo no Brasil trabalharam com a criação de padrões para tecidos de decoração, bem como para azulejos e outras peças de acabamento para construção – é o caso de Portinari, Athos Bulcão (1918-2008), Roberto Burle Marx (19091994) e Antônio Maluf (1926-2005), que trabalharam em colaboração com arquitetos modernos.
Para inspirar os estudantes, mostre a eles os projetos urbanos contemporâneos do coletivo carioca Azulejaria. Disponível em: www.azulejaria.net/azuleja ria-projetos (acesso em: 26 out. 2024).
Dança
Contexto: a dança chega à modernidade (p. 168)
Como introdução ao tema, após a leitura do texto, apresente aos estudantes fotografias e filmes curtos, para que percebam as singularidades das propostas de diferentes artistas da dança moderna. O breve documentário, de aproximadamente 2 minutos, disponível em: www.youtube.com/watch?app=desktop&v =tXkDJeicQoc (acesso em: 27 out. 2024), filmado em preto e branco, mostra a coreografia Der Exodus, de Mary Wigman (1886-1973), e revela a atmosfera da dança dessa artista, referência para a dança expressionista alemã. Já no filme disponível em: www.youtube. com/watch?app=desktop&v=5UKxCewY9mk (acesso em: 27 out. 2024), é possível conhecer a dança de Doris Humphrey (1895-1958).
Repertório 1: a dança afro-brasileira de Mercedes Baptista (p. 169)
Se possível, apresente aos estudantes trechos do documentário Balé de pé no chão: A dança afro de Mercedes Baptista, de 2005, dirigido por Lilian Solá Santiago e Marianna Monteiro, disponível em: www. emdialogo.uff.br/content/bale-de-pe-no-chao-dancaafro-de-mercedes-baptista (acesso em: 18 out 2024). Proponha ainda que os jovens reflitam acerca dos preconceitos enfrentados por Mercedes Baptista e por outros artistas negros. O quinto episódio do Negra voz podcast: Mercedes Baptista, Consuelo Rios, Bethania
Gomes e Ingrid Silva, disponível em: www.youtube. com/watch?app=desktop&v=yITO5R-h98s& (acesso em: 27 out. 2024) aborda esse assunto e pode ser uma boa oportunidade para uma discussão.
Repertório 2: a dança moderna expressionista de Nina Verchinina (p. 170)
Após a leitura do texto e a observação atenta das imagens, sugira aos estudantes que fiquem de pé para ocupar o espaço da sala e, depois de um breve aquecimento, busque reproduzir com eles as posturas corporais indicadas na imagem no topo da página. Os jovens podem se organizar em duplas, para que se auxiliem mutuamente para chegar às formas desejadas. Ao final, peça que relatem o que perceberam em seus corpos: as articulações e os músculos acionados em cada posição, bem como suas dificuldades, sensações e descobertas.
Repertório 3: Mário de Andrade e as danças dramáticas brasileiras (p. 171)
Para entender a atualidade das pesquisas realizadas por Mário de Andrade, pode ser interessante apresentar à turma outro pesquisador da cultura popular: o artista brincante Antonio Nóbrega (1952-). Em uma entrevista, Nóbrega falou da relação entre a cultura popular e a escola, reconhecendo a importância do legado de Mário de Andrade para o conhecimento que temos hoje sobre as danças brasileiras. Disponível em: www. escrevendoofuturo.org.br/conteudo/revista-digital/ artigo/52/entrevista-antonio-nobrega (acesso em: 27 out. 2024). Outra possibilidade é apresentar aos estudantes o canal do Instituto Brincante, na internet, que dá acesso a vídeos que convidam à prática de danças brasileiras. Disponível em: www.youtube.com/@Insti tutobrincanteof/videos (acesso em: 27 out. 2024).
Pesquisa: mulheres da dança moderna (p. 172)
Nesta seção, sugira aos estudantes que tomem nota das reflexões suscitadas pela pesquisa, bem como das impressões, observações e dúvidas que surgirem durante o processo e, depois, podem compartilhá-las com a turma. Lembre-os de que pesquisar requer ter uma questão clara em mente e que as perguntas devem servir de guia. Aproveite para perguntar aos jovens se eles perceberam o modo como os elementos biográficos e as proposições artísticas das mulheres mencionadas se entrelaçam, situando-os acerca do momento histórico em que viveram.
Teorias e modos de fazer: a análise do movimento por Rudolf Laban (p. 173)
Para ajudar os estudantes a analisar o movimento por meio da teoria do espaço de Laban, proponha que eles tragam fotografias de pessoas em movimento. Oriente-os a analisas essas imagens, buscando identificar e nomear as linhas e as direções dos membros e do tronco de cada pessoa. Neste momento, os jovens irão lançar mão de seus conhecimentos em geometria, pois será necessário identificar eixos e planos. Convidar o professor de Geometria para colaborar nessa atividade pode ser uma estratégia interessante, além de propiciar aos estudantes um momento interdisciplinar.
Ação: dança coral (p. 174 e 175)
É interessante realizar esta ação em um espaço amplo, como o pátio, a quadra ou o estacionamento da escola. Caso não seja possível deslocar-se com os estudantes para um desses espaços, a proposta pode ser realizada em um local externo às dependências escolares. Se for possível, integre mais de uma turma para a construção dessa dança coral. Lembre-se de incluir os estudantes com deficiência, uma vez que, para isso, serão necessárias poucas adaptações à proposta inicial.
Discuta com os jovens sobre o uso ou não de música e ajude-os a providenciar a trilha sonora, se for o caso. Garanta que os estudantes tenham acesso a imagens que possam inspirá-los na escolha do elemento da natureza que irão explorar. Insista para que ampliem a lista dos verbos relativos a esse elemento da natureza. Uma vez escolhido o elemento, reserve tempo e espaço para um momento de aquecimento. Em seguida, encoraje os estudantes a explorar os movimentos por meio de improvisação, incentivando-os, sempre, a experimentar variações.
Além de explorarem o fator tempo, lembre aos estudantes que os movimentos podem, por exemplo, ser realizados em distintos níveis (baixo, médio, alto) ou variar em intensidade.
O planejamento da sequência das ações deve ser feito em grupo. A título de teste, sugira que, sentados lado a lado, um estudante por vez se levante e, depois, abaixe os braços, começando por aquele que estiver na extremidade esquerda da linha e terminando por aquele que se encontrar na extremidade direita, simulando uma onda –como a “ola”, comumente vista em estádios esportivos.
Para a composição da sequência, é interessante contar com um olhar externo, que pode vir de um ou mais
estudantes. A sequência precisa ser memorizada, e os movimentos, ensaiados. Decidam previamente o tempo que a dança irá durar. Antes da apresentação, é importante que o grupo ensaie no local onde dançará e avalie qual é o melhor modo de organizar os dançarinos e o público.
Teatro
Contexto: caminhos da modernização do teatro brasileiro (p. 176)
Realize uma avaliação diagnóstica em que os estudantes exponham seus conhecimentos prévios sobre a arte moderna brasileira. Nessa conversa, é possível que não se mencione a linguagem teatral. Se for o caso, cabe propor uma reflexão sobre essa ausência. Uma explicação possível é a demanda por recursos financeiros envolvida em uma produção teatral. Em teatro, a abertura para a experimentação depende de uma estrutura produtiva complexa. Em razão disso, é importante que a turma reflita sobre os aspectos materiais de uma produção artística.
O teatro amador foi fundamental para a modernização da cena teatral brasileira. Converse com os estudantes sobre a compreensão que eles têm da palavra amadorismo . É comum que o termo seja usado para depreciar um trabalho. Nesse caso, vale reforçar que a atuação de companhias não profissionais foi o que propiciou uma criação artística mais arrojada e criativa.
Repertório 1: teatro de revista (p. 177)
Para complementar o conteúdo da seção, sugere-se projetar para os estudantes o vídeo em que a atriz Dercy Gonçalves compartilha suas memórias acerca do teatro de revista, imprimindo o ponto de vista de quem trabalhava nele. Disponível em: www. youtube.com/watch?v=zyOEJH5tHDg& (acesso em: 27 out. 2024). O depoimento aborda temas como a relação direta com os espectadores, a formação do artista teatral e a perspectiva de um teatro popular brasileiro. A presença de uma atriz conhecida do grande público pode ajudar a captar o interesse dos estudantes.
Repertório 2: Teatro Experimental do Negro (p. 178)
Nos últimos anos, artistas e pesquisadores da história do teatro têm estudado o Teatro Experimental do Negro (TEN) com a merecida atenção, ampliando
a oferta de materiais sobre esse tema. Projete para os jovens o breve documentário disponível em: www. youtube.com/watch?app=desktop&v=6Vv2wkQBa Qs&list=PL8-2HC2yuKOp8IPtO2KjmR1BN_WZsGZFP (acesso em: 27 out. 2024), que sintetiza a história do TEN e apresenta falas de Abdias Nascimento.
Aprofundamento
O canal oficial do Teatro da Universidade de São Paulo (TUSP) lançou, em 2024, uma série de oito vídeos em homenagem aos 80 anos do TEN. Disponível em: www.youtube.com/playlist?list=PLDDeOM5WjQzVrR qfLmoq7Dhk8owHK7xqr (acesso em: 27 out. 2024).
Repertório 3: TBC: renovação estética e profissionalização (p. 179)
O edifício histórico do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC) foi tombado e está em processo de reforma para a sua reabertura. Sugira aos estudantes que pesquisem acerca da mobilização de artistas como Zé Celso (1937-2023) e Fernanda Montenegro (1929-) em torno da preservação desse patrimônio.
Pesquisa: elementos da encenação
teatral (p. 180)
O estudo dos elementos da encenação teatral pode colocar os estudantes em contato mais próximo com os interesses estéticos dos artistas teatrais contemporâneos. Esta pesquisa também contribui para a compreensão dos diferentes ofícios ligados às artes cênicas, uma vez que diversos profissionais estão envolvidos na realização de um espetáculo – iluminadores, cenógrafos, figurinistas, sonoplastas, costureiras, cenotécnicos, contrarregras, entre outros.
Durante o Ensino Médio, muitos jovens têm seus primeiros contatos com o mundo do trabalho, e é interessante que compreendam o campo das artes como uma das possíveis áreas para se trabalhar.
Se você ou algum estudante conhecer um profissional que trabalha com teatro, uma possibilidade para aprofundar a pesquisa é convidar essa pessoa para uma conversa com a turma, a fim de que ela narre o dia a dia de seu ofício.
Teorias e modos de fazer: elementos da encenação teatral
(p. 181)
O papel dos encenadores foi fundamental para a modernização do teatro, mas esse espaço de tomada
de decisão era majoritariamente ocupado por homens. Nos dias atuais, um número crescente de mulheres vem assumindo o lugar da direção, embora precisem, por vezes, lidar com preconceitos e misoginia.
Sugira aos estudantes que pesquisem a expressão “mulheres encenadoras” nas redes sociais, para que entrem em contato com um coletivo que lida com essa questão. Uma das iniciativas recentes do grupo foi oferecer uma incubadora de projetos para mães diretoras, pois ainda existe uma pressão social para que mulheres com filhos dediquem a maior parte do seu tempo a tarefas domésticas e ao ambiente da vida privada. Assim, iniciativas como essa trabalham na contramão dessa premissa, entendendo que é possível ser, ao mesmo tempo, mãe e encenadora.
Aprofundamento
O coletivo Mulheres Encenadoras disponibiliza na internet uma série de podcasts que pode ajudar na compreensão do tema. Disponível em: https://open. spotify.com/show/1CgmOD8s0Yrp9mJq3e6A3z? si=6ZPc_Oo3QY21rSlLKCFztw&nd=1&dlsi=a3d0c f7746424b6e (acesso em: 27 out. 2024).
Ação: experimento cênico baseado em elementos da encenação teatral (p. 182 e 183)
Para trabalhar o trecho selecionado, pode ser interessante trazer à tona um aspecto biográfico do autor Nelson Rodrigues: o fato de ele também ter sido jornalista. A fim de contextualizar o assunto, leia com a turma o texto disponível em: https://portais. funarte.gov.br/brasilmemoriadasartes/acervo/nel sonrodrigues/biografia-de-nelson-rodrigues/ (acesso em: 27 out. 2024).
Para o trabalho com os aspectos da encenação teatral, oriente os estudantes a trabalhar com base nos recursos disponíveis. Pode ser frustrante, por exemplo, planejar a iluminação cênica em um ambiente no qual é impossível produzir um blecaute. Mas recursos simples, como o uso de papelão para cobrir as janelas, podem modificar a luminosidade do espaço, produzindo efeitos importantes para a fruição da cena.
O mesmo ocorre com os demais elementos da encenação. É possível constituir uma linguagem para os figurinos e adereços simplesmente compartilhando peças de roupa e acessórios entre os jovens. O trabalho de cenografia no contexto escolar está muito ligado
à organização do espaço e do mobiliário. No caso da sonoplastia, é sempre válido convidar estudantes que toquem instrumentos para que contribuam sonoramente com a cena. Mas é igualmente interessante que os jovens trabalhem com sons gravados em celulares ou com músicas selecionadas no ambiente digital.
Caso haja estudantes cegos ou com baixa visão, compartilhe, como referência, vídeos que abordam o Teatro Cego (disponível em: https://teatrocego.com. br/?playlist=690d9295&video=76653cd; acesso em: 27 out. 2024). Este grupo reúne em seu elenco pessoas cegas e videntes, e os espetáculos acontecem no escuro, de forma que todos os espectadores experimentem uma fruição que não depende da visão.
A companhia Teatro Cego constrói encenações em que os atores não se apresentam em cima de um palco; eles trabalham próximos aos espectadores, convocando seus outros sentidos – audição, tato, olfato, paladar.
Ponte para outras linguagens artísticas (p. 184 e 185)
Música: o Modernismo de Villa-Lobos
Heitor Villa-Lobos é um importante expoente da história da música brasileira. Além de se destacar como compositor, foi um educador atuante na disseminação do canto coral na rede pública de ensino nos anos 1930. Ouça com os estudantes a composição “O trenzinho do caipira” (1930), executada pela Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp). Disponível em: www.youtube.com/ watch?v=KTKVgaY56NI (acesso em: 27 out. 2024).
Música: o Modernismo negro de Pixinguinha
A importância de figuras históricas no pensamento moderno brasileiro vem sendo cada vez mais revisitada. Sem dúvidas, Pixinguinha é um grande acontecimento nesse contexto. Ressalte aos jovens que Villa-Lobos e Pixinguinha se conheciam e que há registros de encontros entre os dois, ou seja, há uma grande permeabilidade entre o universo da música popular e o da música de concerto no Brasil. Separar ou criar um julgamento de valor entre ambos seria incompatível com a nossa história.
Artes integradas: artes gráficas e Modernismo
Diferentes formas de notação escrita foram criadas no decorrer da história. Em algumas delas, a própria forma expressa significados. Isso é observado, por exemplo,
nas diversas maneiras de transcrever a língua árabe –geométrica, manuscrita, criando padrões e até figuras –ou na escrita chinesa – que possibilita aos poetas expressar emoção por meio dos gestos que fazem ao desenhar um ideograma. Os poetas e artistas que participaram dos movimentos de vanguarda na Europa, no início do século XX, se preocuparam em combinar o valor visual ao significado de seus textos. O uso das palavras em liberdade também foi defendido pelo poeta italiano Filippo Tommaso Marinetti (1876-1944), autor do Manifesto Futurista (1909), em que a escrita atribui uma forma visual às palavras. De maneira geral, pode-se pensar em três níveis de interferência no tratamento visual da escrita: a letra, o texto e a página.
Artes integradas: artes gráficas e Modernismo no Brasil
Um exemplo contemporâneo que pode ser apresentado aos estudantes é a revista Tupigrafia. Voltada para o universo visual do mundo da escrita, a revista é editada pelos artistas gráficos paulistas Claudio Rocha (1957-) e Tony de Marco (1963-). Com periodicidade irregular, Tupigrafia apresenta, em todos os seus números, duas ou três versões diferentes de capa, cada uma trazendo uma concepção distinta da palavra que dá nome à publicação. Disponível em: www.tupigrafia. com.br (acesso em: 27 out. 2024).
Síntese estética: antropofagia
(p. 186, 187 e 188
O Manifesto Antropófago, de Oswald de Andrade, foi escrito com o objetivo de ser disruptivo, abalar as estruturas da sociedade do período, lançando mão de expedientes irônicos e mordazes na composição dos seus símbolos. A própria ideia de antropofagia expressa essa radicalidade, evocando o ato ancestral de deglutir a carne do inimigo como postura artística e a atitude de devorar todas as referências na busca de encontrar a própria força e identidade. O inimigo é o colonialismo sob diferentes roupagens, desde os povos missionários trazidos nas caravelas, passando por Goethe e a corte de dom João VI.
O texto apresentado é um potente exemplo do esforço imprimido na Unidade 2, cujo objetivo é levar os jovens a formular uma ideia de Brasil por eles mesmos, encontrando uma noção própria da nossa cultura, partindo do violento passado colonial que não cessa de se reinventar. O texto de Oswald é um gesto nessa direção, conclamando a formulação de uma cultura brasileira autêntica, formada por suas matrizes culturais múltiplas, envolvidas em processos de disputa e hibridização.
Síntese estética: processo de criação coletiva (p. 188 e 189)
Elementos do manifesto podem ser ressignificados, servindo de disparadores do processo. A figura da cobra-grande, por exemplo, uma lenda brasileira, abre espaço para uma possível reapropriação das lendas que resulte em uma nova composição, com base na perspectiva dos estudantes. A própria ideia de antropofagia é um importante elemento de provocação para o processo artístico dos estudantes. Que formas culturais e obras artísticas podem ser “devoradas” hoje para formularmos a ideia de Brasil que nos atravessa? Também é possível trabalhar o elemento disruptivo da forma manifesto, provocando os estudantes a reverberar a ideia de um manifesto artístico-poético que reflita sobre a identidade e a cultura brasileiras, das quais eles fazem parte. O que eles gostariam de gritar artisticamente para o mundo? Que visão de futuro, que sonho de amanhã pode ser evocado?
Capítulo 6: Uma arte tropical
Abertura
(p. 190 e 191)
A produção artística brasileira realizada nas décadas de 1950, 1960 e 1970 ecoa ainda hoje no cenário cultural. É possível que os estudantes já tenham tido contato com manifestações artísticas ligadas à bossa nova, ao Cinema Novo, à Tropicália, ou já tenham estudado a arquitetura de Brasília em etapas anteriores de sua escolarização. Aproveite as imagens da abertura para realizar uma avaliação diagnóstica, detectando possíveis interesses dos estudantes. Conforme se caminha nessa linha do tempo histórica em direção ao presente, multiplicam-se os registros das obras artísticas e os materiais disponíveis na internet. Assim, ao notar curiosidades e afinidades por parte dos jovens, é possível aprofundar as pesquisas e os estudos sobre os temas que mais reverberarem para os estudantes e para você, como docente.
Como a arte brasileira se projetou no cenário mundial? (p. 192)
As inovações artísticas abordadas projetaram o Brasil no cenário internacional como um país moderno, criativo e multicultural. No entanto, o golpe civil-militar de 1964 instaurou no país uma repressão progressiva, fazendo com que artistas, intelectuais, trabalhadores, estudantes e políticos fosse censurados e até mesmo perseguidos, presos, torturados e mortos.
Converse com os estudantes sobre o impacto violento da ditadura na vida social brasileira. É importante combater certa visão romantizada de que a censura e a repressão teriam produzido um ambiente mais criativo, como se a necessidade de driblar a censura culminasse em obras melhores. O que houve foi a instalação de um clima de terror que perdurou até o fim da década de 1970. Se grandes obras foram criadas nessa época, isso foi feito apesar do regime militar, e não em razão dele.
Atividade de sensibilização: improviso musical coletivo (p. 193)
Esta é uma atividade de música que utiliza a improvisação e a criação coletiva. Reforce esse aspecto com os jovens antes de realizá-la, incentivando-os a não se envergonharem de propor seus sons e ritmos –esse jogo sonoro só é possível com a contribuição entusiasmada e persistente de todos os participantes. Invista um tempo em encontrar o pulso coletivo com os estudantes, antes de solicitar que eles realizem seus improvisos sonoros. Espere que a proposta de um estudante esteja bem estabelecida, com firmeza na repetição, antes de solicitar que o próximo realize seu som. Comente que a tendência das contribuições sonoras é reforçar e marcar os tempos e as sonoridades propostos, mas que isso não é uma regra; é possível propor sons no contratempo, explorando outros timbres, a fim de tornar a composição coletiva improvisada mais complexa.
Música
Contexto: música popular brasileira: anos 1950, 1960 e 1970 (p. 194)
O contexto cultural dos anos 1950, 1960 e 1970 é atravessado pelos eventos históricos e políticos da época. Situe o capítulo partindo da influência estadunidense após a Segunda Guerra Mundial e contextualize o golpe civil-militar de 1964 no Brasil. Reflita com os estudantes sobre a “Passeata contra a guitarra elétrica” e pergunte se eles acreditam que uma mobilização como essa caberia nos dias de hoje ou não.
Repertório 1: bossa nova (p. 195)
A bossa nova representou uma inovação na linguagem musical brasileira dos anos 1950 e 1960 e, ao mesmo tempo, traduziu um momento de intercâmbio entre o já estabelecido samba e as influências jazzísticas estadunidenses. Contudo, essa influência também
foi alvo de críticas. Peça aos estudantes que pesquisem a letra da canção “Influência do Jazz” de Carlos Lyra (1933-2023). Depois, pergunte se eles acreditam que a mistura de diferentes gêneros musicais é positiva ou negativa. Peça que observem que tais misturas também envolvem contextos políticos, geográficos e culturais dos períodos em que ocorreram.
Repertório 2: os grandes festivais e a jovem guarda (p. 196)
A influência cultural dos Estados Unidos e da música pop é incorporada na cultura brasileira de diversas maneiras, dentre elas o movimento da jovem guarda. Os festivais da canção e as músicas de protesto também marcaram a efervescência cultural do período e representaram uma das formas de resistência expressiva ao regime militar sob o qual vivia o país. Os festivais geravam verdadeira competição entre pessoas e torcidas. Converse com a turma sobre outras expressões musicais que promovem encontros, como agremiações de escola de samba e fã-clubes.
Repertório 3: Tropicália ou Panis et circencis (p. 197)
O movimento tropicalista, por fim, se propôs a recriar a música brasileira, partindo de um diálogo entre as referências nacionais e as influências da música internacional. A guitarra elétrica, instrumento contra o qual houvera uma passeata, incorpora sonoridades novas e ritmos brasileiros. Assim, há a busca de uma linguagem brasileira com base no encontro com a influência estrangeira. Sugira aos estudantes que pesquisem na internet, ouçam e leiam a letra da música “Geleia geral” (1968), de Gilberto Gil e Torquato Neto (1944-1972). Converse com a turma, questionando o que eles entendem por “geleia geral” e quais misturas são apresentadas ao longo da canção.
Pesquisa: outras bossas (p. 198)
Esta seção possibilita ao estudante explorar o diálogo entre o jazz estadunidense e a bossa nova na apreciação de uma importante parceria entre Stan Getz, Tom Jobim, João Gilberto e Astrud Gilberto. Quanto à Tropicália, é proposto aos jovens que reflitam sobre a influência da música pop no movimento, com base nas aproximações estéticas entre o álbum fundador do tropicalismo e o álbum Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles. Dessa forma, pretende-se destacar, mais uma vez, as interações possíveis entre a cultura brasileira e o mercado fonográfico dominante no período.
Teorias e modos de fazer: diálogos
sonoros (p. 199)
O objetivo da seção é opor sons musicais simultâneos e sons musicais sucessivos. Assim, busca-se introduzir os conceitos de melodia, harmonia, acorde e contraponto. Uma comparação visual que pode facilitar a compreensão desses conceitos é imaginar a possibilidade de apreciar ou mesmo compor uma música atentando a seu caráter horizontal ou vertical. Se observarmos a horizontalidade de uma música, estamos mais atentos à sua melodia. Se observarmos sua verticalidade, então estamos atentos à sua harmonia. Equilibrar uma visão horizontal e vertical em simultâneo é a base do contraponto.
Caso algum dos estudantes saiba tocar instrumentos musicais harmônicos ou melódicos, é uma boa oportunidade de trazê-los à sala de aula. Instrumentos como violão e teclado ajudam a exemplificar as estruturas horizontal e vertical da música. Assim, se alguém souber cantar acompanhado de um desses instrumentos, peça que se apresente para a turma e, depois, que apenas toque o instrumento e cante separadamente. Oriente os jovens a observar que a parte cantada tem autonomia em relação ao que é tocado no instrumento e vice-versa. Embora se relacionem, o que está sendo cantado ou tocado por um instrumento melódico é a melodia, uma sucessão de notas com um sentido musical. A harmonia, executada pelo violão ou teclado, apresenta várias notas em simultâneo, chamadas acordes, que também possuem um sentido musical. Quando se pesquisa como tocar uma música em um site de cifras na internet, por exemplo, as letras que aparecem em cima da canção – cifras – são indicadores dos acordes daquela canção. Essa é a instância vertical da música.
Ação: compondo melodias
(p. 200 e 201)
Com os recursos tecnológicos disponíveis, pesquise os teclados virtuais que serão utilizados na atividade. Pode ser interessante providenciar fones de ouvido para a primeira etapa do exercício, para que os estudantes possam se escutar melhor, mas não é essencial para a execução da atividade. Você pode pedir que os jovens façam o download, em seus celulares, de aplicativos que tenham um teclado virtual, ou mesmo buscar sites que ofereçam esse recurso. O Livro do estudante traz algumas sugestões.
Deixe que os estudantes experienciem o teclado livremente. A primeira etapa do processo de
composição consiste em se localizar nas teclas do piano virtual. Peça a eles que observem em qual direção os sons ficam mais agudos e em qual direção ficam mais graves. Em seguida, peça que localizem a nota dó, conforme indicado na ilustração. As melodias ascendentes partem do grave para o agudo; já as descendentes, do agudo para o grave. Solicite a todos que toquem os exemplos de melodias ascendente e descendente sugeridos. Em ambas as criações, é importante que anotem a sequência das notas em um papel avulso e repitam muitas vezes essa sequência para se familiarizarem. Antes que definam sua melodia, insista que experimentem diferentes versões. Reserve tempo para essa criação e destaque a importância de que os estudantes estejam atentos ao ritmo da melodia que irão propor.
Na segunda etapa, as melodias podem ter ritmos diferentes ou iguais – essa é uma escolha que caberá à dupla. Então, peça que a turma experimente as duas versões, permitindo que, independentemente do ritmo, todos tenham a oportunidade de ouvir os intervalos musicais em simultâneo. Se a opção para a execução da atividade for incluir celulares individuais, cada estudante poderá tocar sua melodia em seu próprio dispositivo. No caso do uso de sites, há atalhos no teclado do computador que acionam as notas do piano virtual, permitindo que os estudantes compartilhem o mesmo espaço para executar o exercício – basta que verifiquem a configuração do site
Teatro
Contexto: a realidade brasileira em cena (p. 202)
Em 1981, o cineasta Leon Hirszman dirigiu uma versão fílmica da peça Eles não usam black-tie. No elenco, estavam o dramaturgo da peça, Gianfrancesco Guarnieri, e a atriz Fernanda Montenegro. Se houver tempo hábil, projete algumas cenas do filme para os estudantes. Disponível em: www.youtube.com/watch?v =Uzl2K1bDRog& (acesso em: 28 out. 2024).
A adaptação para o cinema foi realizada em um contexto social diferente daquele que engendrou a estreia da peça no teatro. A peça foi escrita em um momento de ascensão da luta social, antes do golpe, e o filme foi realizado em um contexto de batalha pela redemocratização. Tanto a peça como o filme mantêm o interesse por retratar, na arte, movimentos da vida social brasileira, especialmente a luta de trabalhadores por direitos.
Repertório
1: o Movimento de Cultura Popular e o Centro Popular de Cultura (p. 203)
Ao estudar o Movimento de Cultura Popular (MCP), do Recife, é interessante tecer relações entre o método de alfabetização de Paulo Freire e a preocupação por ampliar o acesso da população a manifestações culturais diversas, inclusive espetáculos teatrais. As ações do MCP estavam pautadas por um posicionamento ético que atravessava diferentes campos de trabalho. Para aprofundar esse debate, recomenda-se realizar uma aula em conjunto com um professor da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas.
Repertório
2: Arena conta Tiradentes e o sistema coringa (p. 204)
Após o golpe civil-militar de 1964, artistas teatrais realizaram diversos musicais politizados. Nesses espetáculos, a força da música popular brasileira contribuía para uma linguagem cênica crítica ao regime militar. Como atividade complementar, pode-se realizar com os estudantes uma audição do espetáculo Opinião, que estreou em dezembro de 1964 e foi gravado na íntegra, para, posteriormente, ser lançado em disco. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=p-1-4sFqfLg& (acesso em: 28 out. 2024). Como a peça tem a duração aproximada de 45 minutos, podem ser selecionados os trechos que julgar mais emblemáticos para a audição.
Repertório 3: O rei da vela do
Teatro Oficina (p. 205)
A encenação da peça O rei da vela, de 1967, realizou experimentações estéticas diversas. Para melhor compreendê-las, sugira aos estudantes que façam um estudo das imagens da encenação, que revelam aspectos de cenografia, figurinos e maquiagem, além de fornecer pistas sobre o trabalho de atuação. O acervo on-line da Fundação Nacional de Artes (Funarte) reúne diversas fotografias do espetáculo. Disponível em: https://atom.funarte.gov.br/in dex.php/o-rei-da-vela (acesso em: 28 out. 2024).
Se julgar oportuno, explore com os estudantes a linguagem circense, um dos elementos centrais da montagem do Oficina. Pergunte a eles se já tiveram a experiência de ir ao circo e abra espaço para que compartilhem suas vivências. Para saber mais sobre esse universo, explore com a turma o site do Centro de Memória do Circo, que conta com um acervo de fotos, artistas e descrições históricas. Disponível em: https:// memoriadocirco.org.br/ (acesso em: 4 nov. 2024).
Pesquisa: Teatro do Oprimido (p. 206) Ao abordar o tema do Teatro do Oprimido, pergunte aos estudantes se algum deles já teve contato com essa abordagem teatral. Em caso afirmativo, abra espaço para que compartilhe com os colegas suas impressões acerca dessa experiência.
Existem muitos grupos de Teatro do Oprimido em atuação por todo o Brasil. Se algum desses grupos atuar próximo à escola, é válido tentar uma aproximação, convidando-o para um encontro com as suas turmas. Muitas são as possibilidades de mediar um encontro desse tipo. Vale promover uma conversa entre os integrantes do grupo e os jovens, ou até mesmo uma oficina conjunta (já que o método pressupõe que todas as pessoas podem fazer teatro). Outra possibilidade é indicar aos estudantes que assistam a uma apresentação de teatro fórum.
O site do Instituto Augusto Boal, indicado no Livro do estudante, disponibiliza diversos textos escritos por esse artista. Boal preocupava-se em escrever de maneira nítida e convidativa, conversando com os mais diferentes leitores. Caso haja tempo hábil, é possível selecionar um dos textos para ser lido e debatido coletivamente.
Teorias e modos de fazer: teatro dramático e teatro épico (p. 207)
O estudo das diferenças entre o drama e o teatro épico é conceitualmente denso. Por isso, recomenda-se realizá-lo com calma, incentivando os estudantes a formular suas dúvidas e inquietações. Uma das melhores maneiras de compreender o drama é percebê-lo como forma hegemônica, partindo de uma análise sobre as produções culturais consumidas pelos estudantes. Investigue quais características do drama eles reconhecem em séries, filmes e telenovelas que assistem em seu dia a dia. Nessas produções culturais, um indivíduo protagonista é o organizador da narrativa? Suas vontades, expressas por meio de diálogos e ações, são centrais para a trama? A obra concentra-se em temas da vida privada?
Com base nessa conversa, busque fazer um diagnóstico coletivo sobre as possíveis limitações do drama. Quais assuntos não cabem nesse gênero? Quais temas sociais urgentes os estudantes gostariam de ver representados em cena? Quando temas políticos aparecem em cena, a forma do drama se mantém ou outros expedientes formais ganham espaço?
Com base nas experiências de fruição dos jovens, é possível compreender melhor as necessidades que historicamente fizeram surgir o teatro épico.
Ação: fazendo cena (p. 208 e 209)
Para um melhor aproveitamento pedagógico da atividade, é interessante que ambos os gêneros (drama e teatro épico) sejam trabalhados pela turma. Procure orientar a escolha dos grupos, levando em consideração essa diversidade.
Reforce aos jovens que a função de direção não deve ser exercida com autoritarismo, pois ninguém tem o direito de “mandar” na cena. Nesta atividade específica, se algum estudante quiser ficar na função de encenador, seu olhar deve se concentrar nas especificidades do gênero teatral trabalhado. Como um espectador interno, o estudante deve assistir aos ensaios e compartilhar suas impressões, comentando as sensações e os pensamentos suscitados pelo trabalho. O grupo pode, então, verificar se a fruição da cena está coerente com os pressupostos de uma abordagem dramática ou épica.
É interessante que o trabalho de dramaturgia e de atuação contemple personagens contraditórios. Isso vale tanto para o drama como para o épico. O esforço em lidar com a complexidade tende a resultar em cenas mais instigantes.
Ao mesmo tempo, vale ressaltar aos jovens que, mesmo em uma cena que apresente vários lados de uma questão, o gesto artístico imprime pontos de vista. Ao lidar com uma situação ficcional, o ator faz uma avaliação dos fatos, que, em certa medida, transborda para os espectadores. Portanto, envolver-se no que está sendo apresentado torna a cena mais significativa.
Desde o início da concepção, ajude-os a selecionar assuntos que despertem seu interesse. O desafio, então, passa a ser transpor esses temas para a linguagem teatral, utilizando as características de um dos gêneros estudados: o drama (para temas da vida privada) ou o épico (para questões sociais ou políticas).
Artes Integradas
Contexto: Cinema Novo (p. 210)
Exibir um trecho do filme Cinco vezes favela (1962), disponível em plataformas de vídeo na internet, e dialogar com os estudantes sobre as temáticas apresentadas, a construção de personagens e os recursos audiovisuais da época pode ser um disparador para uma conversa. Incentive os jovens a fazer uma relação entre passado e presente, apresentando a eles também a versão atualizada do filme, denominada Cinco vezes favela: Agora por nós mesmos, produzida em 2010 por jovens cineastas moradores das favelas do Rio de Janeiro. Essa versão também pode ser facilmente encontrada na internet.
Repertório 1: pioneirismo e legado de Glauber Rocha (p. 211)
O artigo “Precisamos resistir, resistir! Eu preciso cantar”, disponível em: www.revistas.usp.br/humani dades/article/download/140543/135523/274336 (acesso em: 28 out. 2024) traz uma abordagem histórica para o clássico de Glauber Rocha, Terra em transe. Ler trechos desse material com os estudantes pode colaborar para a compreensão do legado do cineasta, além de propor uma aproximação com o conteúdo de História, tratando de política e relações de poder.
Repertório 2: a jornada de um antiherói (p. 212)
Pergunte aos estudantes se eles já leram o livro
Macunaíma: o herói sem nenhum caráter para o componente curricular Língua Portuguesa. Em caso positivo, procure ressaltar as semelhanças e as diferenças entre as linguagens. Caso não tenham lido o livro, priorize o recorte do filme, com um olhar mais detalhado para o personagem-título. Nesse sentido, a frase “No fundo da mata virgem nasceu Macunaíma, herói da nossa gente” pode enriquecer o debate, revelando aspectos de nossa cultura e de nossa sociedade.
Repertório 3: Ganga Zumba: rei dos
Palmares (p. 213)
Promova um diálogo envolvendo o filme e questões da História do Brasil, principalmente no que se refere à representatividade de pessoas negras em produtos como o cinema, buscando propiciar aos estudantes um momento de interdisciplinaridade. É possível ampliar a conversa apresentando um resumo do livro Pequeno manual antirracista (2019), de Djamila Ribeiro (1980-). No tópico “Questione a cultura que você consome”, a autora questiona, principalmente, a forma como pessoas negras foram retratadas pelo cinema e pela TV, desde o surgimento dessas formas de comunicação no Brasil.
Pesquisa: o audiovisual e suas possibilidades (p. 214)
Nesta seção, é fundamental mediar as questões para a investigação dos estudantes. Assim, converse com eles sobre a importância de se ter questões para iniciar a pesquisa, podendo ser uma pergunta ou uma curiosidade. Incentive os jovens a buscar as indicações sugeridas e ampliá-las, fazendo conexões, como no caso das mulheres brasileiras que dirigem documentários. Elencar temas pertinentes ao período do Cinema Novo, em consonância com a produção artística,
pode ajudar na pesquisa. Se houver tempo hábil, projete para os estudantes algum curta-metragem, a fim de que eles possam se familiarizar com a linguagem. Aborde as mudanças da tecnologia digital e como, com o advento da internet, formas distintas e inovadoras de criação surgiram. Também é possível dar ênfase à produção feminina, representando um disparador para conversas sobre gênero e equidade na produção e divulgação no audiovisual brasileiro.
Teorias e modos de fazer: a linguagem do cinema (p. 215)
A linguagem do cinema apresenta muitas especificidades; então, é preciso que a abordagem seja feita passo a passo, destacando a relevância de cada uma delas. Se a escola disponibilizar uma câmera fotográfica, é recomendável relacionar cada tópico, demonstrando-o na prática. Caso não seja possível, o telefone celular também cumpre essa função. Analise, com os estudantes, alguns trechos de filmes de diferentes épocas e contextos, procurando notar a evolução de elementos como efeitos e montagem. Uma sugestão para essa atividade é o filme O baile (1983), de Ettore Scola (1931-2016), em que todos os planos acontecem no mesmo espaço, enfatizando as mudanças por meio da música e das roupas das personagens. É possível encontrar trechos da produção, ou o filme na íntegra, em plataformas de vídeo na internet.
Ação: filmando em 3, 2, 1! (p. 216 e 217)
A ação pressupõe que os estudantes já tenham tido contato com algum material audiovisual. Este é o momento de colocar em prática todos os saberes previamente mobilizados. Faça um levantamento dos espaços da escola que podem ser ocupados pelos jovens, sempre tendo em mente a importância de o professor transitar pelos grupos, garantindo a participação e a inclusão de todos. Uma sugestão é orientar cada grupo a eleger um líder, para cuidar de questões como a organização do espaço e a distribuição das funções. Peça aos grupos que desenhem um passo a passo das atividades planejadas (storyboard), para ajudar na visualização das etapas.
Retome com os estudantes as instruções apresentadas na seção, a fim de que trabalhem conforme a sequência proposta, otimizando tempo e garantindo maior qualidade ao material. No momento de escolher o que será gravado, enfatize a importância de narrar histórias que sejam significativas para os jovens, reforçando sempre a importância da representatividade e da inclusão. Essas questões podem aparecer, por exemplo, na valorização das habilidades diversas que cada pessoa possui.
Para a edição, é recomendável usar a sala de informática, se possível, ou realizar, em conjunto com os estudantes, uma curadoria de aplicativos de edição gratuitos. A necessidade de efeitos ou a escolha das melhores cenas exige planejamento prévio. Então, explique para os grupos o sentido da decupagem no cinema, ou seja, a seleção dos enquadramentos da sequência gravada.
Por fim, valorize a apreciação coletiva. Essa é uma oportunidade para que os estudantes com limitações na oralização e na socialização possam se posicionar de maneira democrática.
Ponte para outras linguagens artísticas (p. 218 e 219)
Artes visuais: “Nova Objetividade Brasileira”
Comente com a turma que o trabalho apresentado por Rubens Gerchman buscava explorar a questão do “bom gosto” e do “mau gosto”. Em algumas obras, o artista utilizava a linguagem própria da cultura popular e apontava questões políticas de modo dissimulado. Já Nelson Leirner, que havia participado, em São Paulo, do Grupo Rex – que promoveu os primeiros happenings no Brasil –, mantinha em seu trabalho uma atitude irônica e polêmica. Para saber mais sobre esses artistas, acesse: www.institutorubensgerchman.org.br/ e https://ocupacao.icnetworks.org/ocupacao/nelsonleirner/ (acessos em: 28 out. 2024).
Artes visuais: Lygias e suas artes
As artes visuais de Hélio Oiticica, Lygia Clark e Lygia Pape tornaram-se paradigmas para produções estéticas no cenário internacional, assim como ocorreu com a música e a arquitetura brasileiras nos anos 1950. Os trabalhos desses artistas têm sido apresentados em diferentes lugares do mundo nos últimos anos. Alguns materiais sobre exposições recentes podem ser apresentados aos estudantes:
Lygia Clark: Projeto para um planeta. Disponível em: https://pinacoteca.org.br/programacao/exposicoes/ lygia-clark-projeto-para-um-planeta/ (acesso em: 28 out. 2024).
Para aprofundar o conhecimento dos estudantes, faça com a turma uma visita virtual à exposição “Hélio Oiticica: a dança na minha experiência”. Disponível em: https://mam.rio/programacao/helio-oiticica-a-dancana-minha-experiencia/ (acesso em: 4 nov. 2024).
Projete para os jovens o vídeo Parangolé e bólides e, em seguida, converse com a turma sobre as impressões de cada um. Disponível em: https://mam.rio/ mam3d/helio/ (acesso em: 28 out. 2024).
Dança: Dzi Croquettes: subversão e arte na ditadura
Converse com os estudantes sobre o que eles estudaram nas aulas de História em relação ao período da ditadura civil-militar no Brasil. Conhecer o momento histórico em que surgiu o Dzi Croquettes pode ajudar a compreender a dimensão inovadora do grupo de artistas e de seus espetáculos. A trajetória de Lennie Dale se mistura, ainda, com a cena da música brasileira, pois foi ele quem propôs à cantora Elis Regina (1945-1982) que incorporasse amplos gestos de braços enquanto cantava. Há filmes sobre Lennie Dale e os Dzi Croquettes disponíveis na internet.
Síntese estética: liberdade e repressão no país tropical (p. 220 e 221)
Um primeiro elemento interessante do texto extraído do livro Primeiro ato: cadernos, depoimentos, entrevistas (1958-1974), de Zé Celso, é a forma de relato pessoal do diário. Converse com a turma sobre esse gênero literário, envolvendo nesse debate o deslocamento da intimidade gerado pelas redes sociais. A ideia de um diário íntimo cede espaço para a intimidade hiperexposta nas redes. Reflita sobre essa mudança de paradigma com a turma. Curiosamente, o texto se inicia com uma crítica aos processos de desinformação produzidos pelo uso de altas tecnologias – elemento apontado à época por Zé Celso e que reverbera nesse debate.
O esforço do teatrista em seu relato íntimo é elaborar as consequências das formas culturais ousadas surgidas nas décadas de 1950 e 1960, culminando na efervescência de 1968, que desemboca no endurecimento do regime civil-militar, seguido da tortura e do exílio dos artistas de destaque, entre eles, Zé Celso. Esse é o contexto cultural de onde emergiu a noção de Tropicália, duramente criticada no texto por ter sido, em certo momento, assimilada pela burguesia, o que amenizou o potencial disruptivo e questionador dos experimentos feitos pelos artistas. O texto especula, inclusive, sobre o impacto da violenta censura imposta pelo regime civil-
-militar, imaginando o rumo que o movimento cultural do período poderia ter seguido. Esse “corte traumático” interrompeu o sonho de uma revolução cultural e política.
Síntese estética: processo de criação coletiva (p. 222 e 223)
Diferentes elementos do texto servem de provocação para a criação dos estudantes. Desenvolva com a turma as hipóteses levantadas nas sugestões do item Ideia disparadora e linguagens artísticas, conferindo materialidade a essas hipóteses. Por exemplo: ao comentar sobre o tom de deboche, pergunte aos jovens quais elementos culturais poderiam ser satirizados por eles para analisar a realidade brasileira, exemplificando com figuras e personalidades. A postura questionadora e revolucionária do texto também é uma provocação interessante para os estudantes: que Brasil podemos sonhar por meio das nossas criações artísticas e poéticas?
Integrando com Ciências Humanas e Sociais Aplicadas (p. 224 e 225)
Ao conduzir esta atividade, procure evitar que os estudantes reproduzam preconceitos acerca do povo brasileiro. A história de colonização do Brasil tem como um de seus legados uma visão depreciativa dos brasileiros sobre si mesmos. Ao realizar as leituras, os debates e a ação artística propostos na seção, a turma pode mobilizar um olhar mais aberto e interessado para as características do povo brasileiro, procurando elementos de potência e valorização, incluindo os próprios saberes e memórias familiares nessa composição.
Ao trabalhar o trecho selecionado do prefácio da peça Gota d’Água, sugere-se tecer relações com o espetáculo Gota d’Água {Preta}, abordado no Capítulo 3. Se possível, trabalhe em conjunto com um professor da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. Compartilhe com a turma como cada área do saber carrega consigo formas de olhar para a vida social e para as manifestações artísticas.
Após a realização da ação artística, converse com os estudantes sobre a maneira como diferentes formas de conhecimento são mobilizadas em um processo criativo. O gesto criativo organiza saberes teóricos e práticos, além de mobilizar a intuição e o desejo.
Arte em questão – Unidade 2
(p. 226 e 227)
Retome a dinâmica de aplicação da avaliação, simulando uma prova de vestibular. Reforce que os conteúdos das questões se relacionam com o que foi estudado na Unidade 2: Caminhos da arte no Brasil.
• Competências específicas de Linguagens e suas Tecnologias: 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7.
• Habilidades de Linguagens e suas Tecnologias : EM13LGG101, EM13LGG102, EM13LGG103, EM13LGG104, EM13LGG105, EM13LGG201, EM13LGG202, EM13LGG203, EM13LGG204, EM13LGG301, EM13LGG302, EM13LGG303, EM13LGG304, EM13LGG305, EM13LGG401, EM13LGG402, EM13LGG403, EM13LGG501, EM13LGG502, EM13LGG503, EM13LGG601, EM13LGG602, EM13LGG603, EM13LGG604, EM13LGG701, EM13LGG702, EM13LGG703 e EM13LGG704.
Orientações didáticas
Na última etapa do percurso pedagógico composto dos nove capítulos que integram as três unidades do material, os estudantes vão explorar elementos das manifestações culturais e artísticas produzidas no tempo presente. O objetivo não é constituir um panorama geral da arte contemporânea, tarefa que se mostra impossível de contemplar em um material didático em virtude da dinâmica dessas produções, mas, antes, selecionar e explorar, dentro da vasta produção atual, obras realizadas com base no esforço de uma leitura crítica e radical da realidade e que mobilizam temas significativos para os jovens, de modo que eles possam explorar expedientes de criação que partem da leitura de mundo e do sonho de transformação da realidade.
Contexto
da unidade
(p. 228 e 229)
Faça uma leitura visual da imagem de abertura da unidade, extraída da obra Reviravolta de Gaia, de Rivane Neuenschwander, a qual captura uma ação do coletivo Floresta de Cristal em um ato realizado na cidade de São Paulo. A obra envolve a invasão poética de um evento público para ressaltar a importância da luta contra o colapso ambiental através de uma ação artística e, com isso, confirmar a presença importante da arte nas disputas sociais, políticas e estéticas do presente. O coletivo será retomado na seção Síntese estética do Capítulo 9
O trecho citado na abertura é parte do livro O perigo de uma história única, da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie (1977-), que, por sua vez, é a adaptação de uma palestra realizada pela autora no programa TED Talks, em 2009, em que ela reflete sobre a importância das narrativas para a afirmação e consolidação de culturas contra-hegemônicas, disputando os imaginários e os sentidos sociais das histórias que circulam na sociedade. Se julgar oportuno, você pode passar alguns trechos dessa palestra para a turma, disponível em: https://www.youtube.com/ watch?v=wQk17RPuhW8 (acesso em: 28 out. 2024).
Capítulo 7: Multiculturalismo
Abertura (p. 230 e 231)
Nas páginas de abertura do capítulo, há elementos distintos que nos remetem ao final do século XX. A cultura hip-hop, a chegada dos computadores e a arte festiva dos jovens da geração 80 evocam uma época de mudanças radicais na sociedade. O hip-hop e o grafite foram assimilados pela cultura, em toda parte do mundo, assim como a arte dos países africanos, asiáticos e da América do Sul passou a ser apreciada em feiras e exposições que aconteciam, e ainda acontecem, em variados países de todos os continentes.
O que é multiculturalismo?
(p. 232 e 233)
Neste capítulo, é importante ressaltar que a sociedade multicultural atual é fruto das transformações que aconteceram ao longo dos últimos 30 anos. Não houve um acontecimento, uma data, uma revolução, mas uma mudança de paradigma que permitiu o abandono de padrões impostos pela colonização e, posteriormente, pelo Modernismo, no mundo das artes. Comente com os estudantes que um dos marcos dessas transformações no Brasil foram as leis no 10.639 de 2003 e no 11.645 de 2008, que instituíram a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e de História e Cultura Indígena, respectivamente. Essas leis refletem a importância do multiculturalismo na constituição da cultura brasileira.
Atividade de sensibilização (p. 233)
É comum que parte dos estudantes tenha algum contato com a cultura hip-hop e esteja familiarizada com o universo sonoro do beat. Verifique e confirme essa
proximidade para que eles se sintam à vontade no momento de realizar a atividade. Diga aos estudantes que quem vai propor os movimentos deve improvisar uma dança e estar em sintonia com a outra pessoa da dupla. A ideia é expressar, através do movimento, as sensações que o beat desperta; por isso, explique que eles não precisam seguir passos de um estilo específico de dança, embora isso também seja bem-vindo na atividade.
Artes visuais
Contexto: arte da periferia do mundo (p. 234)
Nas artes visuais, uma mudança de paradigma social foi percebida com a descentralização da produção artística e com a presença de novos atores nesse campo, vindos das periferias.
Passaram a ver também iniciativas de mostras que aconteciam fora do sistema tradicional de arte, promovidas por artistas e organizadas em espaços públicos e alternativos, impulsionando a arte de rua que se estabeleceu com o movimento hip-hop.
Aprofundamento
Em 2023, foi realizada a exposição “Além das ruas: histórias do graffiti”, que reuniu artistas que atuaram na rua ao longo das últimas décadas. O catálogo da exposição está disponível em: www.itaucultural.org.br/ secoes/publicacoes/conheca-publicacao-alem-dasruas (acesso em: 28 out. 2024).
Repertório 1: Basquiat e a chegada do grafite (p. 235)
Se houver tempo, apresente outras obras do artista estadunidense Jean-Michel Basquiat e mencione também o artista Keith Harring (1958-1990). Ambos exerceram uma grande influência nos primórdios do grafite durante a década de 1980. Suas obras podem ser encontradas em: https://artsandculture.google.com/ entity/jean-michel-basquiat/m041st?hl=en; https:// artsandculture.google.com/entity/keith-haring/ m01sl6w?hl=en (acessos em: 28 out. 2024).
Repertório 2: o Brasil em “Mágicos da Terra”: Cildo Meireles e Mestre Didi (p. 236)
Ao trabalhar esta seção, aprofunde-se nas obras de Cildo Meireles e de Mestre Didi, que têm grande relevância para a arte brasileira. Para isso, acesse os materiais a seguir.
• h ttps://ocupacao.icnetworks.org/ocupacao/ cildo-meireles/
Repertório 3: Artes visuais na geração 80: a volta da pintura (p. 237)
Em 2024, a Escola de Artes Visuais do Parque Lage (EAV) promoveu o Ciclo de Conferências Geração 80, reunindo artistas que participaram da exposição “Como vai você, geração 80?” para uma conversa com o público. As conferências estão disponíveis em: www.you tube.com/watch?v=WELvQFb1diQ e www.youtube. com/results?search_query=EAV+ciclo+de+confer% C3%AAncias+gera%C3%A7%C3%A3o+80 (acessos em: 28 out. 2024).
Pesquisa: artes visuais no final do século XX (p. 238)
Nesta seção, ao abordar o item 2, você pode oferecer uma lista dos artistas que fizeram parte da exposição “Como vai você, geração 80?” para que os estudantes escolham livremente os artistas que desejam pesquisar. A lista completa com os nomes dos artistas está disponível na Ficha Técnica do verbete “Como vai você, geração 80?”. Disponível em: https://enciclopedia. itaucultural.org.br/evento83465/como-vai-voce-ge racao-80 (acesso em: 28 out. 2024).
Teorias e modos de fazer: Pintura: fazendo e preparando a tinta (p. 239)
Nesta seção, comente que a pintura, bastante experimental, dos anos 1980 trouxe muita novidade em termos de técnicas e de materiais. Naquela época, não havia a intenção de se realizar uma pintura realista, com efeitos de brilho, sombra, textura e profundidade. Hoje, no entanto, muitos artistas utilizam em suas composições, principalmente, a tinta a óleo, que permite a realização de transparências e sobreposições na produção de pinturas muito elaboradas. É o caso, por exemplo, de Alex Cerveny (1963-) e de Ana Elisa Egreja (1983-). Para saber mais sobre o trabalho desses artistas, acesse: https://alexcerveny.com/ e www.premiopipa.com/artis tas/ana-elisa-egreja/ (acessos em: 28 out. 2024).
Ação: fazendo arte (p. 240 e 241)
Esta seção visa promover a oportunidade de experimentar materiais diversos, bem como a técnica da pintura, com liberdade criativa. No entanto, para a realização de uma atividade desse tipo, é necessário que uma infraestrutura seja previamente organizada. Isso inclui um espaço de trabalho que conte com pias ou torneiras próximas, de modo a facilitar a lavagem dos materiais; roupas extras, que possam ser manchadas de tinta; e o fornecimento de materiais aos estudantes, como grandes pedaços de papel craft e tinta acrílica, mesmo que sejam utilizados em paredes. Caso não seja possível adquirir tintas prontas, comece pelo item 2, fabricando tinta com cola branca e pigmento em pó – materiais mais acessíveis e que podem ser adquiridos de forma coletiva pela turma.
Música e Dança
Contexto: a cidade é de todos (p. 242) Após a leitura do texto, aproveite esta seção para conversar com os estudantes sobre o local onde vivem. Peça a eles que descrevam seus itinerários de casa até a escola, mencionando se utilizam algum meio de transporte e, se sim, qual, além de comentar o que costumam observar durante o trajeto. Caso residam em áreas urbanas, pergunte se há intervenções artísticas na cidade, como grafites e esculturas, e se conhecem eventos de dança ou de música realizados ao ar livre e se participam deles. Promova uma reflexão sobre como, do ponto de vista dos estudantes, os espaços da cidade poderiam ser ocupados de outros modos, acolhendo encontros e projetos artísticos coletivos.
Repertório 1: slam poetry
(p. 243)
Pergunte aos estudantes se eles já tiveram a oportunidade de assistir a uma roda de slam ou de participar uma. Em caso positivo, oriente-os a compartilhar essa experiência com a turma, caso se sintam à vontade. Converse também sobre a experiência de atuar como jurado nesse tipo de evento, discutindo com eles quais critérios seriam justos para avaliar e dar nota aos textos. Oriente os estudantes a fazer uma busca na internet para pesquisar se há alguma roda de slam organizada na cidade onde vivem.
Repertório 2: dança urbana: das ruas para os palcos
(p. 244)
Para compreender algumas das transformações das danças urbanas e quando se estruturaram como danças cênicas, assista ao trabalho de artistas e companhias de dança cujas propostas artísticas se
dão neste diálogo. O trecho do espetáculo Tahaman, do coreógrafo Georges Momboye (1968-), da Costa do Marfim, é um exemplo de como esse diálogo está presente em várias partes do mundo. Disponível em: www.numeridanse.tv/en/dance-videotheque/taha man?s (acesso em: 28 out. 2024).
Repertório
3: o rap e seus estilos (p. 245)
Pergunte aos estudantes se eles conhecem outros estilos de rap além daqueles citados no texto. Aproveite para conhecer as potencialidades dos estudantes e descobrir se há algum rapper ou MC entre eles. Investigue também se a turma conhece outros nomes representativos de cada um dos estilos citados no texto. Caso não conheçam, oriente os estudantes a fazer uma busca na internet.
Aprofundamento
Para saber mais sobre a história e o desenvolvimento do rap no Brasil, recomenda-se o livro a seguir.
TEPERMAN, Ricardo. Se liga no som: as transformações do rap no Brasil. São Paulo: Claro Enigma, 2015.
Teorias e modos de fazer: letra e rima (p. 246)
Esta seção aborda a rima, conceito comum ao estudo da poesia e do texto musical. O foco está na presença da rima no rap, mas considere que a prosódia, isto é, o estudo da relação entre os elementos musicais e o texto, é parte importante do conteúdo de análise da canção e faz parte do currículo musical.
A canção brasileira possui um histórico de musicar poemas; alguns exemplos são “Canção Amiga”, do poeta Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), musicada em 1978 por Milton Nascimento (1942-); o texto Morte e Vida Severina (1956), do poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto (1920-1999), que recebeu uma versão dramatúrgica, com música de Chico Buarque, em 1966. Portanto, os limites entre a canção e a poesia na tradição da música brasileira sempre foram tênues, de forma que o conteúdo da seção é aplicado e contextualizado com base no rap, mas também pode ser explorado através de outras canções, conforme o interesse da turma.
Explore cada um dos tipos de rima expostos. Pode-se pedir aos estudantes que criem pequenas quadras – estrofes de quatro versos –, experimentando cada tipo de rima. Também é possível propor que pesquisem outros poemas ou letras de canções para exercitar a
percepção. Vale ressaltar que, embora existam muitos estilos de rima, o material abordou apenas três deles. Por isso, pesquisar novas canções ou poemas pode despertar a curiosidade dos estudantes para outros tipos de rima.
Ação: qual é o seu grito? (p. 247 e 248)
A proposta envolve a vivência prática da relação entre texto e poesia e permite aos estudantes associar seus conhecimentos sobre rap aos conceitos aprendidos sobre essa relação. Ao serem incentivados a compor um rap, oriente-os a ter em mente a mensagem que suas composições vão transmitir. Para isso, eles devem estar atentos não só à escolha das palavras mas também à sonoridade contida na métrica dos versos e nas rimas, retomando a classificação estudada na seção Teorias e modos de fazer: letra e rima
Aproveite este momento do trabalho para explorar o conceito de escansão, ou seja, a separação das sílabas poéticas. Se sentir necessidade, proponha aos estudantes que tragam textos musicais ou poéticos para realizar a escansão coletivamente, pois, ao experimentar essa divisão silábica, é possível que eles se sintam mais seguros para investigar a melhor construção métrica para seus textos.
As faixas de áudio 14 e 15, que acompanham a atividade, contam com um beat cada e foram compostas com exclusividade para a coleção. O primeiro beat, na faixa de áudio 14, possui um andamento mais lento, enquanto o segundo, na faixa de áudio 15, é mais acelerado. É importante que, ao longo do processo de composição, os estudantes possam testar seus textos sobre as bases musicais.
Caso algum estudante esteja familiarizado com o beat box, percussão vocal que por vezes acompanha os beats, permita que acrescentem esse elemento à sua composição.
No momento da apresentação, garanta uma caixa de som com uma boa potência. Se possível, disponibilize um ou mais microfones para que todos possam ouvir e compreender o rap.
Música e Dança
Contexto: breaking e rap na cultura
hip-hop (p. 249)
Além dos quatro elementos do hip-hop citados para os estudantes, alguns líderes do movimento, que desdobram suas atividades artísticas em ações educativas, consideram um quinto elemento: o conhecimento.
Aprofundamento
Para aprofundar-se no tema e desenvolvê-lo com os estudantes, é recomendada a leitura dos três volumes da coleção a seguir.
PISKOR, Ed. Hip hop genealogia. Tradução: Mateus Potumati. São Paulo: Veneta, 2024.
Repertório 1: a parceria entre o MC e o DJ (p. 250)
Oriente os estudantes a fazer uma busca na internet por bases musicais e a praticar a apreciação, identificando nos beats os seguintes elementos: loops de baterias, linhas de baixo, orquestras de suporte e samples. Vale lembrar que nem todos os beats terão todos esses elementos e que alguns podem apresentar outros elementos não mencionados na lista.
Repertório 2: breaking: arte ou esporte? (p. 251)
A presença do breaking nos Jogos Olímpicos de Paris intensificou o debate sobre os limites entre arte e esporte. Proponha aos estudantes que acessem, em plataformas de vídeo, trechos das batalhas masculinas e femininas dos jogos de 2024. Em seguida, peça que destaquem algumas das características que permitiram que o breaking fosse considerado modalidade esportiva. Lembre-se de que esse debate também está na BNCC, documento em que a dança tem dupla presença, tanto como conteúdo de Arte quanto de Educação Física.
Repertório 3: breaking para todos os corpos (p. 252)
Aproveite esta seção para trazer para a turma o tema da inclusão de pessoas com deficiência nas danças, identificando eventuais preconceitos e desconstruindo-os. Mesmo em danças exigentes, do ponto de vista técnico, e marcadas pelo virtuosismo, como é o caso do breaking, há lugar para corpos diversos e para múltiplas habilidades. Peça aos estudantes que assistam, por exemplo, a vídeos do grupo ILL-Abilities e incentive-os a observar como cada artista realiza os movimentos de acordo com suas próprias possibilidades. Disponível em: www.illabilities.com/ (acesso em: 28 out. 2024).
Pesquisa: a cultura hip-hop em cena (p. 253 e 254)
Convide os estudantes a se aprofundarem no universo do hip-hop, sugerindo filmes de ficção e documentários que abordam temas relacionados às
danças, ao slam e ao rap. Caso haja espaço no planejamento, organize uma pequena exibição de filmes na escola. É possível organizar a turma em grupos, e cada grupo se dedicar a um filme que explora o universo do rap, das danças ou do slam. Além dos filmes indicados, há outros documentários disponíveis em plataformas de vídeo que tratam de diversos aspectos do movimento hip-hop, em geral.
Antes da exibição, é fundamental que os filmes sejam assistidos previamente pelo professor para garantir que o conteúdo seja adequado ao contexto escolar.
Teorias e modos de fazer:
movimentos do breaking (p. 255)
Peça aos estudantes que destaquem no texto os termos que se referem aos movimentos do breaking, como footwork, freezes, moinho de vento e top rock. Sugira que busquem na internet por vídeos de cada um desses movimentos, dançados por diferentes b-boys e b-girls. Pode ser interessante escolher um único movimento e propor que a turma toda assista a várias pessoas executando-o, tentando identificar o que é comum a todos e o que é realizado de modo diferente. Esta atividade fornecerá mais subsídios para a ação que será realizada na próxima seção.
Ação: batalha de dança (p. 256 e 257)
Para esta atividade, não é esperado que os estudantes sejam capazes de realizar movimentos complexos, já que o breaking é uma dança que requer certo tempo de prática. Se possível, antes de iniciar a movimentação, organize um aquecimento coletivo com a turma. Disponha a turma em roda e peça que, a cada vez, um estudante proponha ao grupo um movimento simples, que tenha como foco uma única articulação. Peça ao grupo que observe bem o movimento proposto pelo colega e que, em seguida, repita esse movimento. Continue até que todos os estudantes tenham proposto seu movimento.
Pergunte aos estudantes se eles conhecem algum movimento de breaking e se podem ensinar aos colegas. Caso não conheçam, pesquise com a turma por tutoriais dirigidos a iniciantes e assistam juntos. Para aprender, é necessário experimentar os movimentos e dedicar tempo ao aperfeiçoamento. Portanto, reserve um tempo para que os estudantes aprendam pelo menos dois movimentos, mesmo que simples.
Caso não seja possível explorar o breaking, a mesma proposta pode ser desenvolvida com passos e
gestos de outros estilos de dança. Se os estudantes trouxerem movimentos de diferentes fontes e com diferentes níveis de complexidade, isso não é um problema para a proposta. O importante é que os estudantes sejam reconhecidos como pessoas que têm habilidades e que sejam encorajados a mostrá-las aos demais.
Nesta atividade, a batalha deve ser encarada como uma estrutura que permite, de modo lúdico, que os estudantes se desafiem e se apresentem individualmente, já que entram na roda um de cada vez. Mesmo que apresentem movimentos simples, insista para que sejam bem realizados. A prática, portanto, é fundamental.
Encoraje os estudantes a participar, mas, caso alguns deles não se sintam à vontade, sugira que se encarreguem da música, por exemplo.
Ponte para outras linguagens artísticas (p. 258 e 259)
Teatro: Núcleo Bartolomeu de Depoimentos e o teatro hip-hop
O Núcleo Bartolomeu de Depoimentos realiza uma produção intensa desde 2000, e há diversos materiais ligados ao grupo disponíveis no ambiente digital. Caso a turma demonstre um interesse especial pelo hip-hop, é possível indicar que realizem uma pesquisa sobre o Núcleo nas redes sociais e que socializem os materiais encontrados. Essa pesquisa pode contribuir para que estudantes que tenham afinidade com elementos da cultura hip-hop se aproximem também da linguagem teatral.
Teatro: Brenda Lee e o Palácio das Princesas
Ao abordar essa peça, procure instaurar um ambiente interessado e livre de preconceitos. O Brasil é um dos países com os mais altos índices de violência contra pessoas trans e travestis, e é essencial que artistas trans encontrem espaços para expressar seu talento e serem reconhecidos. Esse movimento é fundamental para combater os estigmas que essa população enfrenta. Caso existam estudantes trans na turma, é necessário um olhar ainda mais cuidadoso, a fim de garantir que eles se sintam acolhidos e respeitados.
Artes integradas: redes sociais
É provável que alguns estudantes tenham perfis em redes sociais. Sendo assim, incentive-os a refletir sobre o tempo que ficam conectados diariamente, o tipo de
conteúdo que consomem e se interagem com artistas ou pessoas específicas.
Artes integradas: cultura otaku
É possível que nem todos os estudantes conheçam a cultura otaku por seu nome de origem, mas é provável que muitos consumam mangás e animes. Inclusive, muitos jovens têm a prática de desenhar com base nas características dos desenhos japoneses. Dessa forma, o professor pode fazer uma curadoria, selecionando algumas produções dos estudantes a fim de analisar os elementos culturais e artísticos da cultura japonesa. A imagem escolhida para esta seção, que representa jovens com roupas inspiradas na cultura popular do Japão, é um bom disparador para conversas sobre consumo e cultura pop
Síntese estética: cultura e política
na periferia (p. 260, 261 e 262)
Comente com a turma que o texto desta seção é um trecho de uma tese de doutorado, a fim de aproximá-los do universo da produção acadêmica. Explore o esforço do pesquisador Tiaraju em ter como objeto de pesquisa a sua realidade de sujeito periférico e investigar o surgimento do termo, com as características sociais e políticas dos territórios distantes dos centros urbanos nos anos 1990, período de formação do autor. O tema pode despertar interesse nos estudantes do Ensino Médio, com base na concepção de que elementos da vida deles podem se constituir como objetos de pesquisas acadêmicas, tanto deles quanto de outros pesquisadores, partindo da premissa da produção de um conhecimento interessado em compreender e intervir na realidade.
Outro elemento interessante envolve a eleição do grupo de rap Racionais MC’s como fonte de pesquisa fundamental para o desenvolvimento da tese, reconhecendo a produção dos integrantes como trilha sonora legítima das periferias, expressão viva e complexa da narrativa das populações pobres e marginalizadas que, ao enfrentar as injustiças sociais que permeiam seu cotidiano, encontram potência, orgulho e poesia. Diante disso, pergunte aos estudantes que outros artistas simbolizam, para eles, essa voz legítima das periferias nos dias de hoje.
Síntese estética: processo de criação coletiva (p. 262 e 263)
Os estudantes podem se inspirar nas obras e manifestações artísticas que se relacionam explicitamente
com a ideia de periferia, relendo esses repertórios e formas estéticas em suas criações. Também é possível fazer uma investigação da realidade desses territórios hoje, elaborando como os jovens veem a noção de sujeito periférico nas suas realidades, sejam eles mesmos sujeitos periféricos ou não. Outro caminho é desenvolver temas que se relacionem com a vida na periferia, explorando não só as injustiças e os desafios dessa realidade mas também as potências e formas de sociabilidade únicas desses territórios.
Capítulo 8: Arte contemporânea
Abertura (p. 264 e 265)
Proponha uma leitura visual coletiva das imagens da abertura e da introdução do capítulo, solicitando aos estudantes que descrevam os elementos que as compõem, as linguagens artísticas que reconhecem, os materiais e os meios técnicos utilizados para realizá-las, além de identificar os temas ou assuntos que as obras parecem abordar.
O tema arte contemporânea é uma oportunidade de conhecer e valorizar as múltiplas culturas juvenis que habitam a sala de aula. Se possível, reserve um momento da aula para que os jovens criem uma lista com dez obras ou manifestações culturais que apreciam e que se relacionam com sua identidade. Reforce que diferentes linguagens e mídias, como a cultura digital e a cultura gamer, são bem-vindas nessa listagem.
O que é arte contemporânea?
(p. 266 e 267)
Alguns elementos marcam a produção artística atual, tema abordado no texto da introdução. A primeira característica destacada é a multiplicidade, ou seja, a não unidade entre diferentes obras e manifestações artísticas, com formas, linguagens, temas, materiais e meios em constante transformação. Elementos como diálogos com a memória, identidade, participação do público, hibridização das formas, borramento das fronteiras e diálogo com as demais áreas de conhecimento da humanidade são características comuns da arte contemporânea em suas diferentes linguagens. Outros dados essenciais e que devem ser levados em consideração são aqueles relacionados à cultura digital, tal como a presença das redes sociais e a presença do universo cibernético como definidor da realidade e dos processos de identidade.
Atividade de sensibilização: som em movimento
Esta é uma atividade de sensibilização que visa despertar os estudantes para os sons presentes nos objetos do cotidiano e na paisagem sonora no qual estão inseridos. Pode ser difícil não gerar nenhum som com a passagem da folha, em especial na rodada com o papel celofane. Procure fazer com que os jovens explorem o máximo de possibilidades, incentivando-os a amassar, esfregar, rasgar e soprar as folhas – a ideia é observá-las não como um papel, mas como uma fonte sonora. A concentração no exercício pode gerar uma abstração dos sons ao redor ou mesmo uma hiperpercepção desses mesmos sons. Com base nas diferentes reações, oriente o debate acerca da relativização do que é som e do que é ruído, a depender da intenção da nossa audição.
Dança
Contexto: dança contemporânea: um conceito, muitas formas (p. 268) Como introdução ao tema e avaliação diagnóstica, proponha aos estudantes uma conversa para identificar o que eles já conhecem sobre dança contemporânea. Pergunte aos jovens se já assistiram a algum espetáculo, ao vivo ou por vídeo, e se conhecem grupos, artistas e companhias de dança contemporânea brasileiras ou estrangeiras. Em caso positivo, peça a eles que descrevam o que viram e compartilhem com a turma suas impressões. Caso a turma não traga exemplos, disponibilize informações sobre a dança contemporânea. Nos sites de companhias como o Grupo Corpo, é possível ter acesso a informações e trechos de obras. Disponível em: https:// grupocorpo.com.br/companhia/https://grupocorpo. com.br/ (acesso em: 28 out. 2024).
Repertório 1: Gira Dança (p. 269)
A companhia Gira Dança é tema de um dos vídeos que integram o Livro do estudante . Assista ao vídeo com a turma para conhecer a história do grupo. Destaque como a singularidade das propostas gestuais, artísticas e políticas tem grande valor na dança contemporânea e como essa singularidade é reforçada em uma companhia que associa pessoas com e sem deficiência. É importante mencionar aos jovens que a companhia Gira Dança desenvolve seu trabalho em Natal (RN), cidade fora do eixo Rio-São Paulo – onde há mais incentivos para a dança con -
temporânea –, e que essa falta de investimentos dificulta, muitas vezes, a maior circulação dos trabalhos do grupo.
Repertório 2: Corpo de Dança do Amazonas (CDA) (p. 270)
O canal oficial de vídeo do Corpo de Dança do Amazonas, na internet, disponibiliza a websérie CDA em movimento. Assista com a turma ao episódio 1, dedicado ao espetáculo Mata, de Clébio Oliveira. Nesse episódio, são abordados diversos aspectos do processo de construção da peça, como a criação do figurino, a seleção das músicas e a composição da iluminação. Cada episódio dedica-se a uma obra da companhia. Disponível em: www.youtube.com/watch ?v=6XJWmH6Ji3A&list=PLN7rI0oEWPsNjuA4LGYj 1zRm43Yl22Len (acesso em: 28 out. 2024).
Repertório 3: Encantado, Lia Rodrigues Companhia de Dança (p. 271)
Para complementar o tema abordado na seção, projete para os estudantes a entrevista acompanhada por trechos de dança realizada na ocasião da estreia de Encantado no Théâtre de Chaillot, em Paris (França), 2021. Disponível em: www.youtube.com/watch ?app=desktop&v=3a1ZACyWZpM (acesso em: 28 out. 2024). A coreógrafa Lia Rodrigues fala do espetáculo, de suas inspirações e referências, de sua postura política enquanto artista e de seu trabalho na favela da Maré.
Pesquisa: dança contemporânea –criação e difusão (p. 272)
O objetivo desta pesquisa é, de um lado, apresentar aos estudantes o Contato Improvisação e, de outro, incentivar a ampliação de suas referências sobre a dança contemporânea, por meio do acesso a mostras, festivais e modos de colaboração. Há uma importante concentração de mostras, festivais e companhias na Região Sudeste do Brasil; assim, é importante orientar os jovens a buscar conhecer eventos e artistas de outras regiões do país também. Caso seja possível contar com a colaboração de professores de línguas estrangeiras, sugira que também façam a pesquisa em sites estrangeiros.
Teorias e modos de fazer: improvisação na dança (p. 273)
Em entrevista publicada na revista Dança , em 2022, a artista da dança Dudude Herrmann (1958-) falou de sua relação com a improvisação.
Disponível em: https://periodicos.ufba.br/index.php/ revistadanca/article/view/48143 (acesso em: 28 out 2024). Com vasta experiência na improvisação em dança, a artista relata seu encontro com essa prática e suas descobertas. Destaque alguns trechos dessa entrevista para debater com a turma.
Ação: um baralho para improvisar
(p. 274 e 275)
Esta ação tem duas etapas bem distintas: a de formular e confeccionar as cartas, e a de jogar com as cartas para improvisar. Para a primeira etapa, auxilie a turma a se dividir em grupos, bem como a escolher a cor de cada grupo e o tema do conjunto de cartas que será desenvolvido. É interessante que haja quatro grupos, pelo menos, e, quando possível, que cada grupo conte com cinco estudantes, no mínimo. Peça a eles que sugiram diversos temas e organizem as sugestões em uma lista no quadro. Cada grupo irá, então, construir seu conjunto de cartas com base em um único tema. Por exemplo, cada carta do grupo amarelo indicará uma parte do corpo.
Para a segunda etapa, proponha aos estudantes que formem uma roda para um aquecimento coletivo. Algumas cartas já podem servir como guia para o aquecimento, indicando, por exemplo, uma parte do corpo ou uma qualidade de movimento a ser explorada. Juntem e embaralhem as cartas de todos os grupos e selecionem duas cartas de cores diferentes. A turma deve explorar, por meio de improvisação, as indicações de ambas as cartas, associando-as. Por exemplo, simular o movimento da água (1a carta) com os membros inferiores (2a carta).
A depender dos temas, o jogo será mais ou menos desafiador. Se o grupo estiver conseguindo combinar as duas indicações, proponha que experimentem selecionar três cartas de cada vez e avaliem, juntos, o resultado.
Teatro
Contexto: teatro de grupo (p. 276)
Este tema exige que se tracem relações entre as formas de produção e circulação do teatro e os espetáculos em si. É interessante que os estudantes identifiquem a presença de elementos extraestéticos que influenciam as obras. Como uma produção teatral é viabilizada? Quem paga por ela: os espectadores (por meio da compra de ingressos) ou todos os cidadãos (por meio de impostos que são revertidos para a área cultural)? Quem tem acesso a assistir a espetáculos? Quais são as possíveis barreiras para que mais pessoas possam
fruir obras teatrais? Essas questões estão intimamente ligadas ao teatro de grupo brasileiro. No Ensino Médio, os estudantes passam a lidar mais diretamente com o mundo do trabalho. Então, é importante que reflitam sobre as condições materiais do trabalho artístico em seu contexto social.
Repertório 1: Bando de Teatro
Olodum (p. 277)
Na reta final do Ensino Médio, é interessante criar oportunidades para que os estudantes teçam relações entre os diversos estudos realizados. Uma sugestão é retomar o tema do Teatro Experimental do Negro, abordado no capítulo 5 do Livro do estudante. Na década de 1940, Abdias Nascimento (1914-2011) já compreendia o teatro como um espaço importante no combate ao racismo.
Repertório 2: Companhia de Teatro
Heliópolis (p. 278)
Para estudar a Companhia de Teatro Heliópolis, é fundamental considerar seus laços com a comunidade de Heliópolis e sua associação de moradores. Caso exista algum grupo teatral que atue na região da escola, procure incluí-lo como objeto de investigação. Conhecer um grupo de teatro que se relacione com o território e a comunidade próximos à escola pode enriquecer em muito a compreensão dos estudantes acerca das formas de trabalhar adotadas pelo teatro de grupo.
Repertório 3: dramaturgia em Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos (p. 279)
É possível que alguns estudantes tenham contato pessoal com a questão do cárcere e com a experiência dolorida de ter um parente ou amigo preso. Ao lidar com essa dramaturgia, procure sondá-los a esse respeito e avisar sobre possíveis gatilhos que podem ser suscitados por meio da leitura. É preciso cuidar de quem tem no cárcere uma vivência real de trauma. Ao mesmo tempo, em um país com uma população carcerária tão grande como o Brasil, cabe valorizar o fato de um grupo teatral lidar com a problemática por meio de sua arte.
Pesquisa: políticas culturais e teatros de grupo pelo Brasil (p. 280)
Como sugerido na seção, você pode organizar uma visita técnica para que os estudantes tenham a oportunidade de conhecer de perto um grupo de teatro que atua na cidade.
É importante conhecer as normas estabelecidas pela escola para a realização de excursões. Geralmente, é preciso informar a coordenação e as turmas com determinada antecedência, além de solicitar autorizações dos pais ou responsáveis para os estudantes menores de idade, garantindo a segurança dos jovens e do professor. Informe-se também sobre os registros exigidos pela instituição escolar: é preciso fotografar a atividade externa? Como lançar a lista de presença nessa data?
É importante enfrentar o medo de ganhar as ruas: o debate sobre o direito à cidade está ligado à atuação de grupos de teatro pelo Brasil.
Uma possibilidade para facilitar as excursões é tecer parcerias com docentes de outros componentes curriculares. Dessa forma, é possível compartilhar responsabilidades e fruir conjuntamente os benefícios de ir ao encontro de artistas e espaços culturais.
Teorias e modos de fazer: teatro de grupo: pesquisas e formas coletivas de criação (p. 281)
Em uma vida social cada vez mais marcada pelo individualismo, o estudo sobre formas coletivas de criação constrói pontes entre a estética e a ética. Os grupos de teatro podem expressar sua visão de mundo por meio de seus espetáculos e também de sua forma de organização. É possível evitar, por alguns momentos, a lógica da mercadoria e experimentar outras maneiras de se relacionar com os parceiros de criação.
Não é preciso nutrir idealizações: como qualquer outro espaço de convivência, os grupos de teatro também lidam com conflitos. No entanto, é importante alimentar a imaginação dos estudantes para a possibilidade de um trabalho coletivo pautado pela cooperação, e não pela competição.
Ação: encenação colaborativa
(p. 282 e 283)
Esta atividade está apoiada na dramaturgia de Dione Carlos por duas razões. Em primeiro lugar, para aprofundar as experimentações dos estudantes envolvendo a encenação de um texto teatral. Em segundo lugar, para que possam brincar com os elementos da cena com uma base de qualidade que os ampare. É importante que os jovens vejam o texto como um ponto de partida para o trabalho, e não como um limitador de sua criatividade ou uma meta inalcançável. O passo a passo da atividade pode ser adaptado a outros textos teatrais, caso a turma prefira, que
podem ser selecionados na biblioteca da escola ou no ambiente digital.
Uma possibilidade é trabalhar uma peça da coletânea Dramaturgia Negra, organizada por Eugênio Lima e Julio Ludemir. Disponível em: https://desenvol vimento.funarte.gov.br/7/tainacan/edicoes-online/ dramaturgia-negra/ (acesso em: 28 out. 2024). Também é possível escolher uma peça contemplada pelo Prêmio Funarte de Dramaturgia 2018 – Infância e Juventude. Disponível em: https://portaltainacan.funarte. gov.br/edicoes-online/premio-funarte-de-dramatur gia-2018-infancia-e-juventude/ (acesso em: 28 out. 2024). Outra ideia é selecionar dramaturgias clássicas que estão em domínio público. Disponível em: www. dominiopublico.gov.br/ (acesso em: 28 out. 2024).
Por vezes, é necessário mediar o trabalho dos grupos. Trabalhar coletivamente pode ser um desafio, e isso é abordado nos estudos sobre o teatro de grupo. A intervenção do professor pode contribuir para que estudantes mais tímidos se desenvolvam artisticamente, exercitando a encenação em contextos públicos. Mesmo um estudante que opte por não estar em cena como ator pode estar fortemente implicado com a encenação, contribuindo com a criação de cenografia, figurino, sonoplastia, iluminação ou direção.
Música
Contexto: novos tempos, novos sons (p. 284)
Esta seção reflete alguns dos principais movimentos e fundamentos da música europeia na virada do século XIX para o século XX. Explique o contexto histórico do continente no período pós-Primeira Guerra Mundial, ressaltando as transformações tecnológicas e a nova paisagem sonora das cidades. Converse com a turma sobre sons que eram comuns no passado e que foram desaparecendo do nosso cotidiano, como o som do telefone fixo ou da internet discada, observando o quanto isso reflete as mudanças dos tempos. Reflita também sobre a influência dos avanços tecnológicos nas criações musicais.
Repertório 1: música eletroacústica: sons gravados e criados (p. 285)
As tecnologias de gravação e manipulação dos sons permitiram que compositores registrassem sons naturais e criassem com base neles ou mesmo investigassem frequências sonoras na criação de novos sons, os
chamados sons sintéticos. Experimente simular uma onda sonora utilizando um simulador de ondas disponível na internet. Sugere-se o disponível em: https://phet. colorado.edu/pt_BR/simulations/sound-waves/about (acesso em: 28 out. 2024), no qual é possível visualizar os gráficos de cada frequência.
Repertório 2: minimalismo (p. 286)
O minimalismo é um recurso musical muitas vezes utilizado para criar ambientes em trilhas sonoras de filmes. Peça aos estudantes que busquem, por exemplo, a trilha sonora de filmes como Mishima: A Life in Four Chapters [Mishima: uma vida em quatro tempos] (1985), dirigido por Paul Schrader (1946-) com a trilha sonora de Philip Glass, e percebam como o compositor usa a repetição em sua composição. Conversem sobre o clima que a repetição de pequenas melodias pode gerar – desde climas de tensão até o extremo relaxamento – e o quanto essas intenções podem ser exploradas cinematograficamente.
Repertório 3: a música viva de Koellreutter no Brasil (p. 287)
As tendências vanguardistas europeias chegaram ao Brasil por meio de Koellreutter. Destaque sua atuação não apenas como compositor mas também como professor no Brasil. No site da Fundação Koellreutter (disponível em: www.koellreutter.ufsj.edu.br/; acesso em: 28 out. 2024), é possível explorar sua vida, bem como suas composições.
Pesquisa: ecos das vanguardas hoje (p. 288)
As tendências musicais que surgiram na virada do século XIX para o século XX não desapareceram; elas foram atualizadas e continuam se desdobrando até hoje. Pergunte aos jovens se algum deles tem o hábito de ouvir música eletrônica. Em caso afirmativo, peça que compartilhem músicas, compositores e bandas com a turma. Infelizmente, o ambiente da música eletrônica de concerto ainda é predominantemente masculino, oferecendo pouco espaço e representatividade para as mulheres. Oriente os estudantes a pesquisar, além dos nomes mencionados, as compositoras brasileiras Jocy de Oliveira (1936-) e Marisa Rezende (1944-).
Teorias e modos de fazer: paisagem sonora e ecoacústica (p. 289)
O conceito de paisagem sonora diz respeito à identidade sonora de um lugar. É importante destacar aos
estudantes que cada cidade terá seu som, assim como cada mata atlântica, cada bosque etc. Isso porque cada espaço possui sua particularidade e sua biosfera, e isso se expressará também em seus diferentes sons.
Existe uma série de exercícios rápidos capazes de despertar nossa atenção auditiva, por exemplo: peça à turma que fique em total silêncio e cronometre 60 segundos no relógio. Durante esse período, os estudantes deverão estar atentos aos sons ao redor. Peça a eles que busquem perceber o som mais próximo do ambiente em que estão. A seguir, o som mais distante. Por fim, peça que comecem a perceber e classificar as fontes sonoras – quais sons foram gerados por humanos, quais eram sons da natureza e quais foram gerados por máquinas ou motores.
Aprofundamento
Para saber mais sobre a relação entre música, ciência e ecologia, assista ao vídeo Bernie Krause: a voz do mundo natural (2013), que explica como o conceito de paisagem sonora pode identificar os problemas gerados nos biomas em razão do aquecimento global. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=u TbA-mxo858 (acesso em: 24 out. 2024).
Ação: criando e explorando uma paisagem sonora (p. 290 e 291)
Durante a preparação, oriente os jovens a pensar em ambientes com grande variedade sonora. Enquanto eles fazem a lista, já é possível experimentar diferentes formas de recriar os sons. Peça que observem aspectos como volume e frequência em sua criação. O ideal é utilizar apenas os sons do corpo, mas, se necessário, pode-se recorrer a elementos da sala de aula, como latões, caixas ou as próprias cadeiras, para explorar diferentes timbres.
Nos primeiros ensaios, é comum que todos queiram apresentar seu elemento sonoro ao mesmo tempo. Observe que o momento em que o som será produzido também compõe essa paisagem.
Havendo oportunidade, utilize um gravador de som, por exemplo o de um celular, para registrar as paisagens durante os ensaios e as reproduza em seguida. Isso pode auxiliar os estudantes a escolher e variar os elementos sonoros durante o processo de composição.
Da mesma forma, é importante que todos estejam atentos ao volume dos sons. Fontes sonoras mais próximas ao ouvinte tendem a ser mais facilmente identificadas do que aquelas mais distantes.
Na terceira etapa, os estudantes podem precisar de ajuda com a produção do texto teatral. Se for o caso, retome a função das rubricas e a melhor maneira de indicar as personagens e falas. Na quarta etapa, a turma deverá observar elementos como o volume dos sons, para que seja possível ouvir as falas.
Ponte para outras linguagens artísticas (p. 292 e 293)
Artes visuais: arte transdisciplinar
As artes visuais praticadas atualmente deixaram de ser um ofício realizado de forma individual por um pensador que olha de modo externo para o mundo. A arte contemporânea é fruto de pesquisas, técnicas e práticas colaborativas, em que diferentes profissionais atuam para conceber, produzir e apresentar exposições elaboradas para interagir com os mais variados públicos. Dessa forma, hoje, o ateliê de um artista pode ser uma empresa ou um laboratório onde trabalham diferentes profissionais, com o objetivo de elaborar objetos únicos e experimentais. Para corroborar o tema da seção, apresente aos estudantes o site de Olafur Eliasson e oriente-os a interagir com os elementos em tela. Disponível em: https://olafureliasson.net/ (acesso em: 28 out. 2024).
Artes visuais: a complexidade do mundo a partir da sua aldeia
A arte pode acontecer em todo lugar – seja em uma aldeia, seja em uma cidade pequena –, sendo realizada por um artista que pensa seu corpo, sua cultura e sua comunidade. Ela também pode ser apresentada em lugares distantes. Nesse contexto, o papel dos curadores é fundamental. São eles que viajam, assistem e pesquisam, selecionando obras e artistas com os quais tecerão sentidos complexos ao conceber grandes exposições. Na atualidade, o curador é, muitas vezes, capaz de produzir conhecimentos ao enredar diferentes visões em um único discurso de grande potência.
Sugestão de leitura
Leia sobre o trabalho e as concepções que nortearam o processo curatorial da mostra Dos Brasis – Arte e pensamento negro , apresentada no Sesc Belenzinho (SP) e no Sesc Quintandinha (RJ). A exposição, que reuniu 240 artistas de todo o país, contou, inclusive, com o trabalho de Augusto Leal. Disponível em: www.sescsp.org.br/editorial/artistas-dos-brasis-arte-e-pensamento-negro/ (acesso em: 28 out. 2024).
Artes integradas: performance: (se) cura humana
Retome com os estudantes o entendimento da linguagem das performances. Enfatize a característica interdisciplinar da criação performática, possibilitando que várias áreas do conhecimento se combinem, como acontece no caso do coletivo (se)cura humana. O grupo disponibiliza, em suas redes sociais, fotos, vídeos e textos, apresentando seu “artivismo” socioambiental em articulação com a arte. A fim de complementar o conteúdo abordado na seção, apresente aos estudantes a exposição “Onde há fumaça”, que esteve em cartaz no Museu Paulista da Universidade de São Paulo (também conhecido como Museu do Ipiranga) e contou com a participação do coletivo. Disponível em: https://museudo ipiranga.org.br/exposicoes/ (acesso em: 28 out. 2024).
Artes integradas: performance: Holoscenes
O diálogo pode ter início com a apreciação de um trecho da performance, disponível em: www.youtube. com/watch?v=KRYzrCzfHQo (acesso em: 28 out. 2024). O vídeo, com duração aproximada de 4 minutos, deve ser articulado com a intenção artística, que tem por objetivo gerar impacto entre o comum do cotidiano e a crise climática que assola o planeta Terra. Pergunte aos estudantes quais situações do dia a dia eles percebem como relacionadas à crise climática atual e quais causas ambientais eles associariam a essas situações. Essa é uma questão importante a ser discutida nos processos de vida, em diálogo com a arte.
Síntese estética: é preciso descolonizar a arte contemporânea (p. 294 e 295)
O texto Histórias, de Adriano Pedrosa, importante curador e pensador da arte contemporânea, sintetiza o esforço decolonial na produção de uma história da arte, refletindo de maneira crítica sobre a hegemonia do cânone ocidental europeu nessa compreensão e buscando ferramentas, modelos e conceitos que possibilitem investigar e afirmar outras histórias, no plural.
A exposição “Histórias afro-atlânticas”, da qual Adriano Pedrosa foi curador (o texto compõe o catálogo da mostra), possui um acervo considerável de materiais disponível na internet. Se possível, solicite aos estudantes que pesquisem esses materiais e elaborem uma análise crítica. Disponível em: https://masp.org. br/exposicoes/historias-afro-atlanticas (acesso em: 28 out. 2024).
Promova uma leitura visual coletiva da obra do artista Maxwell Alexandre, relacionando-a com o título da série Pardo é papel, que aponta o campo reflexivo do trabalho e gira em torno do tema do enfrentamento ao racismo, abordando-o de maneira temática e material (as pinturas são realizadas em papel craft, que é classificado como papel pardo). A pintura representa um imaginário visual de potência das populações negras, também evidenciado no título da obra: Éramos as cinzas e agora somos o fogo
A segunda obra que compõe a seção mostra uma instalação do artista camaronês Pascale Marthine Tayou, que se vale de elementos cotidianos ligados ao universo de trabalho dos entregadores de aplicativo –uma bicicleta e dezenas de caixas –, refletindo acerca da precarização das relações de trabalho contemporâneas.
Síntese estética: processo de criação coletiva (p. 296 e 297)
Desafiar os padrões culturais impostos pode ser bastante libertador para os estudantes, constituindo territórios existenciais para além das cobranças materiais e subjetivas que cercam as juventudes. Aproveite também para instigá-los com a perspectiva de pertencimento histórico, por meio do procedimento de investigar passagens, temas e narrativas pinçadas da história sob outro ponto de vista, buscando a construção de uma memória plural que abarque todas as culturas e formas de vida. Nesse sentido, assuntos abordados em outros componentes curriculares podem servir de ponto de partida para a realização das criações artísticas dos grupos.
É possível, por exemplo, fazer conexões com a área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, partindo dos conteúdos afrodiaspóricos e indígenas para realizar o processo artístico, criando uma exposição de painéis que resgate aspectos negligenciados da narrativa historiográfica, intervenções cênicas contando a trajetória de figuras importantes e pouco comentadas da memória nacional ou mesmo manifestações musicais que evoquem esse imaginário.
Capítulo 9: Arte e os desafios do nosso tempo
Abertura (p. 298 e 299)
Converse com os estudantes sobre as fotografias da abertura deste capítulo. O objetivo deste painel de imagens é ilustrar a ideia de diversidade,
mostrando diferentes territórios, linguagens e objetivos. As imagens representam diferentes ações: reflorestamento, enfrentamento à violência da guerra, troca de experiências e saberes, apoio às comunidades mais vulneráveis. Peça aos estudantes que compartilhem informações acerca de outras experiências artísticas que conhecem e comentem como elas podem contribuir para o enfrentamento dos desafios do nosso tempo.
De que forma a arte pode contribuir para o enfrentamento dos desafios do nosso tempo? (p. 300 e 301)
Os jovens têm sido bombardeados com crises sociopolíticas, econômicas e ambientais que trazem más notícias e ameaças de proporções desconhecidas, causando sofrimento psíquico generalizado nessa geração. A arte quer e pode colaborar nas transformações urgentes e necessárias para a vida, para a sociedade e para o planeta. A arte pode promover convivências, diálogos e redes de interação, além de propor práticas vivas para recriar o sentido de humanidade. A sensibilidade e o pensamento criativo possibilitam que as pessoas reimaginem um mundo onde a convivência com as diferenças seja possível e onde a vida, em toda sua diversidade, poderá voltar a se propagar.
Aprofundamento
Para exemplificar uma visão positiva da juventude como agente de transformação, compartilhe com os estudantes o vídeo da artista e ativista mineira Isadora Canela, falado em inglês, no qual ela dá uma definição do que é artivismo. Disponível em: www.instagram.com/reel/DAv2bE3pLt8/?igsh=bD BiOWg4ZDZubzZ3 (acesso em: 28 out. 2024).
Atividade de sensibilização: trocando impressões (p. 301)
As imagens digitais fazem parte do dia a dia dos jovens. A relação com essas produções tende a ser marcada pelo consumo apressado e pela descartabilidade, com pouca reflexão sobre os conteúdos veiculados. Essa atividade de sensibilização é uma oportunidade de tecer outra relação com esse repertório, convocando os jovens a dedicar mais tempo à análise dessas imagens, aprofundando suas relações de fruição e de capacidade crítica diante desse expediente cotidiano do mundo digital.
Artes visuais
Contexto: a diversidade da vida (p. 302)
O que se pretende neste texto é apontar a diversidade como um valor, como uma característica da vida. Aprender a dialogar e a conviver com as diferenças é o desafio para confrontar as barreiras da sociedade e eliminar os preconceitos. O exemplo de Judith Scott é didático: ela iniciou sua carreira nas artes aos 43 anos, depois de uma vida de exclusão. Nos primeiros anos em que foi desafiada para o trabalho artístico, apenas desenhou círculos de forma contínua sobre os papéis que lhe ofereciam. Mas, ao conviver com uma artista têxtil, passou a se interessar pelos fios e a tecer teias com objetos, criando esculturas arredondadas e macias.
Aprofundamento
Há diversos materiais sobre a vida e a obra de Judith Scott. Assista ao filme realizado pela Bienal de Veneza, um trecho sem som, em que se vê a artista trabalhando. Disponível em: www.youtube.com/watch ?v=qRDJQymiNpw (acesso em: 28 out. 2024).
Repertório 1: Cindy Sherman: entre a imagem e a autoimagem (p. 303)
Há muitos temas que podem ser desenvolvidos com base no trabalho de Cindy Sherman. Um deles é discutir o papel das mulheres nos filmes estadunidenses de meados do século XX, em que elas eram apresentadas invariavelmente como ingênuas e fúteis. A identidade também é um tema suscitado pela obra da artista. Ao explorar esse tema, especialmente com jovens e adolescentes, enfatize que a identidade é fluida e que nos transformamos à medida que aprendemos mais sobre nós mesmos. Um terceiro tema que está presente na obra de Sherman é a aparência e a vaidade extrema, estimulada pelas redes sociais, que impõem padrões inalcançáveis e desinteressantes. Converse com os estudantes sobre as diferenças físicas que tornam as pessoas únicas e singulares. Para conhecer os trabalhos da artista, visite o site do MoMA. Disponível em: www. moma.org/artists/5392 (acesso em: 28 out. 2024).
Repertório 2: Uýra Sodoma: a árvore que anda (p. 304)
Uýra Sodoma apresenta-se como uma “árvore que anda”. A artista traz em seus trabalhos o debate sobre a conservação ambiental, os direitos dos indígenas e das populações LGBTQI+, aproveitando os conhecimentos de sua cultura e de sua formação em
Biologia, entrelaçando esses saberes em aulas, performances fotográficas, textos e instalações.
Para saber mais sobre a artista e conhecer seus últimos trabalhos, visite o site do prêmio Pipa. Disponível em: www.premiopipa.com/uyra/ (acesso em: 28 out. 2024).
Repertório 3: Randolpho Lamonier e suas profecias (p. 305)
Randolpho Lamonier estudou Artes Cênicas e iniciou sua carreira trabalhando com cenografia. Aos poucos, foi se interessando por performance e instalação. O artista se preocupa com os excessos da sociedade contemporânea, em que se produz muito mais do que o necessário para a sobrevivência. No início de sua carreira, sem dinheiro para comprar materiais artísticos, ele costumava recolher objetos descartados diretamente da rua, o que acabou se tornando uma marca estética de seu trabalho. Parte de suas criações é feita em tecidos usados, reaproveitados. O artista não se debruça em um tema central e trabalha com inúmeras técnicas, como a costura, o bordado e a tapeçaria.
Para saber mais sobre Randolpho Lamonier e outros artistas visuais da cena contemporânea no Brasil, visite a plataforma do prêmio Pipa. Disponível em: www.premiopipa.com/artistas/randolpho-lamo nier/ (acesso em: 28 out. 2024).
Pesquisa: arte e diversidade (p. 306)
Atualmente, muitas instituições promovem experiências artísticas para pessoas com deficiência (PcD) ou com algum tipo de neurodiversidade. O Creative Growth Studio (Estúdio para Crescimento da Criatividade), que foi frequentado por Judith Scott, promove, há 50 anos, a expressão artística, a inclusão e as vivências comunitárias em Oakland, na Califórnia (Estados Unidos).
Aprofundamento
Para conhecer mais sobre o Creative Growth Studio, visite o site disponível em: https://creativegrow th.org/ (acesso em: 28 out. 2024).
No Brasil, também há organizações com trabalhos semelhantes. Uma delas é a La casa de Carlota, um estúdio de design que tem criadores com neurodiversidade em sua equipe. O site oficial está disponível em: https://lacasadecarlota.com/en/saopaulo/ (acesso em: 28 out. 2024).
Você também pode verificar se existe alguma instituição em sua cidade ou estado que promova trabalhos criativos para PcD e apresentá-la aos estudantes.
Teorias e modos de fazer: o bordado na criação artística (p. 307)
Existem muitos artistas modernos e contemporâneos que trabalham com técnicas de bordado, tecelagem, tapeçaria e costura. Se julgar interessante, apresente alguns deles para os estudantes: uma das precursoras da tapeçaria modernista foi Regina Graz (1897-1973); no bordado, destaca-se a paulista Rosana Paulino (1967-); e da geração mais jovem, a designer paranaense Flávia Itiberê (1984-); entre muitos outros.
Sugestão de leitura
Para saber mais sobre o tema, leia o artigo “Bordado, arte contemporânea”, publicado na revista Continente. Disponível em: https://revistacontinente. com.br/secoes/reportagem/bordado-arte-contemporanea (acesso em: 28 out. 2024).
Ação: criar e se transformar em personagens (p. 308 e 309)
O foco desta atividade é a elaboração visual de uma personagem; por isso, o figurino, o cenário e a maquiagem devem ser o centro da proposta. Espera-se, também, que os estudantes possam se dedicar à criação de um objeto têxtil, que pode ser um pano de fundo, um xale, um véu, uma echarpe, um turbante, uma capa, um vestível, uma almofada, entre outras possibilidades. É importante estar claro que esse não se trata de um trabalho de fotografia. A fotografia será o meio de registrar o que foi produzido coletivamente.
Oriente os estudantes a buscar materiais descartados, como tecidos e aviamentos que possam ser reaproveitados. O trabalho têxtil pode ser feito de forma colaborativa: peças podem ser emendadas e bordadas separadamente. Lembre aos estudantes que a cenografia e o figurino que serão produzidos para a fotografia podem ser fixados no próprio modelo, por meio de alfinetes de pressão ou outros recursos provisórios.
Teatro
Contexto: teatro fora da caixa (p. 310)
Pergunte aos estudantes se eles já assistiram a algum espetáculo teatral realizado em espaços alternativos. Se sim, peça que compartilhem essa experiência, relatando em que espaço se deu a apresentação e quais sensações e pensamentos foram suscitados neles como espectadores.
Converse com a turma sobre as diferentes motivações que levam artistas teatrais a explorar espaços alternativos. Há grupos que trabalham fora da caixa para aprofundar uma determinada pesquisa de linguagem; outros o fazem por razões políticas; e há, ainda, as justificativas materiais para essa escolha.
Diversas cidades brasileiras não possuem edifícios teatrais. Quando existem, esses teatros nem sempre são de fácil acesso, seja pelo preço de sua pauta (valor que se paga para utilizar o espaço), seja por dificuldades de agenda ou pela ausência de manutenção e de profissionais técnicos. Por isso, é importante valorizar os edifícios teatrais existentes, especialmente os públicos, e lutar para que sejam mantidos com qualidade.
Repertório 1: Coletivo Estopô Balaio (p. 311)
Como material complementar, sugere-se que os estudantes naveguem na página do coletivo. Disponível em: https://coletivoestopobalaio.com.br/ (acesso em: 28 out. 2024).
A seção de vídeos é especialmente interessante, pois permite que os estudantes assistam a cenas dos espetáculos itinerantes, ajudando-os a compreender de forma mais concreta o funcionamento dessa modalidade de apresentação.
Repertório 2: Grupo Imbuaça (p. 312)
O estudo do Grupo Imbuaça explicita pontes históricas que existem entre o teatro de rua e elementos da cultura popular brasileira. Reforce com os estudantes a possibilidade de entrarem em contato com mestres e mestras da cultura popular que atuem em sua região. Deixe nítido que é possível incorporar danças, musicalidades e visualidades dessa cultura popular em seus experimentos teatrais.
Repertório 3: Cambada de Teatro em
Ação Direta Levanta FavelA (p. 313)
Proponha aos estudantes que analisem a fotografia do espetáculo apresentada nesta página. O que é possível perceber acerca das escolhas estéticas do grupo Levanta FavelA? Como os figurinos, os adereços e a atitude do elenco se relacionam com o espaço público?
Aprofundamento
Acesse o site oficial do coletivo, disponível em: http:// levantafavela.blogspot.com/ (acesso em: 21 out. 2024).
Pesquisa: teatro de rua e teatro em espaço alternativo pelo Brasil (p. 314)
Esta seção apresenta um grupo de teatro de cada região brasileira. A ideia é explicitar a potência de criações artísticas realizadas nos mais diferentes contextos sociais. É importante que os estudantes percebam o fazer teatral como algo possível e próximo deles. Dessa forma, pode ser interessante que a turma aprofunde a pesquisa sobre coletivos que atuem o mais perto possível de seu território.
Ao mesmo tempo, é provável que estudantes do Ensino Médio já tenham, nessa altura de sua escolarização, afinidade com determinadas experimentações de linguagem. Permita que os materiais de pesquisa sugeridos instiguem a curiosidade deles, levando-os a descobrir quais formas teatrais despertam maior interesse. Nesse sentido, o ambiente digital pode contribuir para que se entre em contato com produções artísticas realizadas nos mais diferentes locais e, até mesmo, em outros países. Se a pesquisa os levar a essas fontes mais distantes, sugira que se inspirem nelas para imaginar qual teatro desejam criar em seu próprio contexto.
Teorias e modos de fazer: teatro de rua e teatro em espaço alternativo
(p. 315)
A ação teatral em espaços públicos revela os modos de funcionamento dos fluxos urbanos e, ao mesmo tempo, abre frestas para imaginar outra forma de sociabilidade. Esse debate se realiza na interface com as áreas da Geografia Cultural e da Sociologia. Caso haja abertura, é possível trabalhar o assunto em conjunto com docentes da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas.
Sugestão de leitura
Como bibliografia complementar para o docente, sugere-se a leitura do texto “Ambiente, fluxo e dramaturgias da cidade: materiais do Teatro de Invasão”, de André Carreira (1960-), professor e diretor de teatro. Carreira reflete sobre a ação do teatro de rua em relação com as dinâmicas da vida na cidade. O texto está disponível no link: https://seer.unirio.br/opercevejoon line/article/view/482/402 (acesso em: 28 out. 2024).
Ação: criando
uma cena (p. 316 e 317)
A realização de um experimento cênico em um espaço alternativo pode suscitar uma série de questões. Vale orientar os estudantes na investigação, exploração e definição do espaço cênico, tendo em vista que
se criem oportunidades de expressão e descoberta e, ao mesmo tempo, protegendo-os de possíveis riscos ou situações delicadas. Lembre-os de que podem se inspirar nos exemplos apresentados pelo livro na hora de criar suas próprias cenas em espaços alternativos.
A primeira decisão importante a ser tomada é se o experimento será realizado em um espaço alternativo da escola ou em um local público nas imediações. Por um lado, o trabalho no interior dos portões da escola pode oferecer mais segurança aos estudantes, especialmente quando o espaço público não oferece condições adequadas de acolhimento. Por outro lado, apresentar-se em praça pública pode ser uma experiência significativa, proporcionando aos estudantes a oportunidade de se expressarem e de se sentirem conectados com a comunidade.
Se optar por experimentar espaços alternativos dentro da escola, cuide das relações com os colegas de trabalho. Uma ação teatral pode causar uma intervenção positiva no cotidiano, um respiro para a rotina, ou reflexões sobre as dinâmicas da comunidade escolar. Pode ser que os estudantes queiram surpreender as outras turmas com sua ação artística, mas é gentil garantir que os docentes e funcionários da instituição estejam avisados, para que possam se organizar. Após as cenas, aproveite para escutar os espectadores sobre sua experiência de fruição. O momento de avaliação pode envolver todos que circulam pela escola, desde que se faça uma mediação cuidadosa.
Caso opte por trabalhar fora da escola, é preciso consultar a coordenação sobre os procedimentos previstos pela instituição. É possível que você precise colher a autorização de pais e responsáveis dos menores de idade.
Se houver estudantes cadeirantes, a escolha do espaço precisa prever a acessibilidade. Caso haja pessoas com transtorno do espectro autista na turma, leve em consideração como esses estudantes reagem aos estímulos de um ambiente diferente ao escolher o local da ação.
Converse com a turma sobre a possibilidade de imprevistos nessa modalidade de teatro. Prepará-los para esses momentos pode ajudar a prevenir frustrações. A abordagem inicial com jogos pode ser útil para que os estudantes desenvolvam um estado de cena lúdico e presente, permitindo-lhes lidar com aspectos que estão fora de seu controle. Uma obra pode tornar-se surpreendentemente mais interessante quando dialoga de forma franca com seu entorno.
Artes integradas
Contexto: arte e cultura digital (p. 318)
Na seção Contexto , faça um breve panorama da inserção da cultura digital no campo da arte. Na leitura da imagem da obra de Nam June Paik, uma linha do tempo pode ser estabelecida, mostrando os avanços tecnológicos de 1986 até o momento atual. Se, na experiência de Paik, o artista propõe a interação com sua obra, na atualidade, o espectador também é coautor. Com base nessa ideia, os estudantes podem contar se, em suas experiências com 3D e games , já tiveram a oportunidade de interferir na ação das personagens.
Repertório 1: Gabriel
Massan (p. 319)
O trabalho de Gabriel Massan pode ser complexo, mas ao mesmo tempo próximo da realidade dos estudantes. É complexo por abordar uma trama com referenciais pautados em temas como memórias e revisões históricas e próximo por se tratar da linguagem dos games. As desigualdades social, racial e de gênero são temas apresentados nas fases do videogame criado por Gabriel em parceria com outros artistas.
Sugestão de leitura
Um material complementar que pode ajudar a compreender a obra de Gabriel Massan é a matéria “Pinacoteca de SP: Gabriel Massan expõe jogo que critica desigualdades”. Disponível em: www.youtube.com/ watch?v=ViJbXg7Lx9A (acesso em: 28 out. 2024).
Repertório 2: Roberta Carvalho e o
Projeto Symbiosis (p. 320)
Roberta Carvalho é uma artista ativa na defesa da Amazônia. Responsável pelo Festival Amazônia Mapping, ela visibiliza a arte do Norte do país, além de superar discursos do senso comum sobre a região. Faça uma leitura da imagem com a turma, utilizando o material disponível no livro, no sentido de explorar as relações entre o corpo humano e a natureza. Uma proposta complementar seria articular o trabalho de Roberta com os pensamentos do líder indígena Ailton Krenak (1953-), abordado em outros momentos neste material.
Repertório 3: Silvana Mendes (p. 321)
Silvana Mendes é uma artista que gosta de falar sobre o seu território: um bairro da periferia de São Luís (MA), chamado Cantinho do Céu. Essa abordagem, acerca do lugar de nascimento, pode ser um ponto de partida para uma conversa com os estu-
dantes sobre suas próprias memórias e histórias de família, por exemplo. A obra Te imagino, Carolina, reproduzida no Livro do estudante, integra a série Afetocolagens: reconstruindo narrativas visuais de negros na fotografia colonial, cuja proposta é evidenciar corpos negros, destacando sua ancestralidade. Nesse sentido, destaque a obra de Carolina Maria de Jesus, presente no trabalho de Silvana. Se julgar produtivo, faça uma curadoria de citações de Carolina e disponibilize-as para o debate com a turma. Apresente, também, outros trabalhos da série, disponíveis em: https://dasartes.com.br/materias/ silvana-mendes/ (acesso em 7 nov. 2024).
Pesquisa: arte, colaboração e inovação (p. 322)
A seção tem como proposta oferecer ferramentas para os estudantes investigarem os processos colaborativos, muito presentes na cultura digital. Dessa forma, incentive-os a buscar parcerias com outras turmas de forma digital, criando, por exemplo, uma página para trocas de referências nas linguagens artísticas. Para tornar o ambiente digital mais seguro, o acesso pode ser restrito apenas aos estudantes e ao professor.
Os materiais disponibilizados no livro expandem a conversa para a cultura digital e a produção audiovisual e cibernética. Um debate interessante é falar das temáticas da animação Dear Angelica, com base nas perspectivas dos jovens sobre sonhos e saudade.
Teorias e modos de fazer: categorias para a arte digital (p. 323)
As categorias da arte digital provavelmente circulam entre os estudantes por conta das facilidades dos aplicativos e softwares gratuitos para a criação e manipulação de imagens digitais. Nesse sentido, conduza a conversa para a produção autoral, questionando se eles já experimentaram ilustrar, desenhar ou fazer pequenas animações.
Caso existam produções feitas pelos estudantes, organize um momento de apreciação coletiva. Para expandir esse conhecimento, sugira a navegação pelo site Rhizome, que, conforme descrito em sua página, é o lar das culturas digitais e da arte desde 1996. Disponível em: https://rhizome.org/ (acesso em: 28 out. 2024).
Outra valorização importante é destacar a ação de artistas brasileiros na arte digital, como é o caso de Igi Lola Yadun (1990-) e suas múltiplas plataformas de trabalho, que incorporam, inclusive, a Inteligência Artificial.
Ação: objetos e rituais: criando fotocolagens (p. 324 e 325)
A proposta de criação de fotocolagens é uma ampliação da análise do trabalho de Silvana Mendes. Recorde com os estudantes as temáticas que envolvem o trabalho da artista. Destaque as exposições de grande repercussão, nas quais o trabalho de Silvana aparece, como “Um defeito de cor”, por exemplo.
O nome da exposição também é o título do livro de Ana Maria Gonçalves (1970-), uma narrativa inspirada na vida de Luísa Mahin. Embora existam poucos registros sobre a história de Luísa, sabe-se que ela foi uma figura de destaque na Revolta dos Malês, na Bahia.
Sugestão de leitura
Para conhecer um pouco da trajetória de Luísa Mahin, leia o texto publicado no Portal Geledés: www. geledes.org.br/luiza-mahin/ (acesso em: 28 out. 2024).
Fazendo essas aproximações, dialogue com a turma sobre suas próprias histórias ou sobre pessoas que os jovens gostariam de homenagear em um trabalho artístico. Incentive-os a incluir na criação pessoas que, habitualmente, não teriam destaque em livros ou museus, como personagens da família ou de seu círculo próximo.
Por se tratar de um trabalho que envolve o uso das tecnologias digitais, reserve um momento para que se tenha colaboração entre os estudantes com relação ao uso dos aplicativos do celular ou disponíveis na área de downloads do aparelho. Como nem todos podem ter o mesmo domínio das ferramentas, é fundamental tratar essa ação como um processo colaborativo.
Ponte para outras linguagens
artísticas (p. 326 e 327)
Dança: Original Bomber Crew
Aprofundamento
Na ocasião da comemoração dos 30 anos do Festival Panorama da Dança, em 2022, o espetáculo tReta foi apresentado no Rio de Janeiro. Através desse vídeo, os estudantes podem ver um extrato da performance e observar como o público reagiu às cenas. Converse com a turma sobre suas impressões. Disponível em: www.youtube.com/watch?v=FOb6F d3CeAg (acesso em: 28 out. 2024).
Dança: a dança nas redes sociais
Compartilhe com os estudantes que o grupo Rollettes Adaptive Dance, por meio das redes sociais, criou uma comunidade composta principalmente de pessoas com deficiência. Nesse espaço, elas se encontram, compartilham, debatem e fruem a arte, criando oportunidades para que cada vez mais pessoas possam se expressar através das linguagens artísticas, independentemente de qualquer deficiência.
Sugestão de leitura
Durante a pandemia da covid 19, as professoras Larissa Bonfim e Débora Souto Allemand aproveitaram o interesse dos jovens pelas danças em aplicativos para seguir trabalhando com dança, envolvendo estudantes de Colégios de Aplicação do Rio Grande do Sul e de Pernambuco, mesmo sem aulas presenciais. A experiência delas, relatada no e-book Dança na escola: pedagogias possíveis de sôras para profes (2021), oferece pistas de como utilizar a presença dos jovens nesses espaços virtuais para construir conhecimento em dança. Disponível em: https://guaiaca.ufpel.edu.br/ handle/prefix/8458 (acesso em: 28 out. 2024).
Música: a voz dos oceanos
Não é incomum nos depararmos com compositores que se inspiram em elementos da natureza para criar suas obras. No entanto, a análise particional vai além da inspiração. Pesquisas como a de Jonas Hocherman permitem que o compositor se relacione diretamente com os dados coletados. Dessa forma, destaque que o trabalho do artista explora as relações entre humanidade e natureza ao conectar arte e oceano, permitindo que o ciclo de produção e de vida dos fitoplânctons interfira diretamente em sua obra.
Música: música, programação e inteligência artificial
Criar música com softwares de programação exige conhecimentos básicos de computação e domínio das interfaces utilizadas. A programação musical, portanto, é uma área que dialoga com a música e com a computação. Converse com a turma sobre quais seriam as diferenças entre aprender a tocar um instrumento musical e aprender a criar códigos computacionais para gerar música. Será que um músico pode ser um programador computacional e um programador pode ser um músico? Será que o pensamento envolvido na execução dessas duas tarefas se assemelha de alguma maneira? Esses são debates trazidos pelas inovações
tecnológicas contemporâneas. Não há uma resposta certa para essa questão. Incentive os estudantes a compartilhar suas opiniões.
Síntese estética: Floresta de Cristal (p. 328, 329 e 330)
O projeto Reviravolta de Gaia foi concebido pela artista mineira Rivane Neuenschwander em parceria com Mariana Lacerda e o coletivo Floresta de Cristal, formado por artistas que se aglutinaram em torno de um incômodo vivido no momento da crise política de 2021. Trata-se de uma obra de arte que extrapola o mundo das disciplinas. Nasce de reflexões e conceitos que o professor pode trabalhar antes da leitura do texto de Peter Pál Pelbart, tais como:
Cosmopolíticas : termo cunhado pela filósofa da ciência Isabelle Stengers (1949-), que busca politizar o fazer científico e dar visibilidade ao fato de que fazer ciência é construir mundos. A filósofa reforça a impossibilidade, diante do Antropoceno, de continuarmos imaginando que existe uma divisão entre o que é humano e o que é natureza.
P erspectivismo ameríndio : termo cunhado pelo antropólogo Eduardo Viveiros de Castro (1951-), que define o modo como os diferentes povos indígenas das Américas percebem a si mesmos e os outros seres do cosmos. Para os indígenas, de acordo com o antropólogo na obra Encontros, “o outro existe, logo pensa” e o seu pensamento é diferente do meu. Ou seja, o ponto de vista cria o sujeito.
Essas ideias ficam claras quando, no texto, Peter sugere que talvez esteja surgindo “uma nova sensibilidade à alteridade dos não humanos, já não como meros ‘objetos’, mas como ‘sujeitos’”. Esse pensamento propõe uma política interespécies e enfrenta o antropocentrismo, que é a visão hierárquica que coloca o ser humano acima dos demais seres vivos. Com base nessas ideias, cada artista escolheu um ser da floresta para se fazer presente. Um sofisticado figurino foi concebido e executado, textos com afirmações positivas e negativas foram escritos, uma tipografia foi definida para esses textos e toda uma coreografia foi criada para a realização dos cortejos, que aconteceram em meio às manifestações políticas de 2021.
Síntese estética: processo de criação coletiva (p. 330 e 331)
Neste processo de criação, o ponto de partida deve ser o trabalho coletivo. Quanto maior for o
ato poético – seja um desfile, um coro ou uma invasão performática –, maior será a força do evento na escola. É possível, inclusive, mobilizar a turma toda em torno de uma única proposta. Explore a perspectiva de um ato artístico-poético que envolva elementos da realidade dos estudantes, levando em consideração o contexto de urgência climática atual, por exemplo, para sensibilizar e engajar todos os envolvidos.
Integrando com Linguagens e suas Tecnologias (p. 332 e 333)
O conteúdo desta seção retoma os conhecimentos do Capítulo 7 sobre as culturas urbanas e o slam. Se necessário, retome o capítulo e relembre alguns elementos da discussão. Em parceria com os professores de Língua Portuguesa e de língua estrangeira, converse sobre o hábito de ler e de ouvir poesia. Ainda pode existir uma visão elitista do slam, como algo distante da realidade da maioria das pessoas, e um dos objetivos dessa arte, em sua origem, é popularizar a poesia. Lembre aos estudantes que a linguagem poética está muito presente em nossa vida, como nas letras de canções.
Ao pesquisar textos e vídeos de slam poetry, sugerimos que busque vídeos nacionais e internacionais. Esse é um movimento que ocorre em diferentes países e que, por isso, se adapta ao ritmo, à rima e à métrica de cada idioma. Assim, essa pesquisa é uma ótima oportunidade de explorar a poesia em inglês ou espanhol, por exemplo.
Ao compor o texto poético em grupo, é possível retomar e expandir o conteúdo sobre rima, apresentado no Capítulo 7 dessa unidade. Antes de apresentar ao público, é importante que os slammers ensaiem seus textos em voz alta algumas vezes, buscando imprimir ritmo e projeção vocal. A intenção do poema no slam é passar uma mensagem; portanto, no momento de recitar, observe o silêncio no ambiente e o volume da voz dos estudantes. Se possível, providencie um microfone para as performances.
Reforce que o objetivo das notas dos jurados não é criar situações de constrangimento ou inimizade. O papel dos jurados exige responsabilidade ao avaliar as poesias, sendo importante que eles saibam explicar de forma construtiva o que agradou ou não em cada texto, visando sempre contribuir para o desenvolvimento dos colegas.
Ao final, proponha uma roda de conversa para que sejam compartilhadas as experiências de ser slammer e de ser jurado da roda de slam. Aborde também a reação do público e a identificação com os temas trazidos em cada texto.
Integrando com Ciências da Natureza e suas Tecnologias
(p. 334 e 335)
Nesta seção, o estudante tem a oportunidade de realizar um trabalho usando as técnicas artísticas exploradas ao longo de todo o livro de Arte, com o intuito de mobilizar a comunidade escolar em torno do debate a respeito das mudanças do regime climático da Terra.
Convide um professor de Química, de Biologia ou de Física para participar da apresentação do tema. O professor de Química pode explicar com mais profundidade como se dá o efeito estufa. Já o professor de Biologia pode falar com mais propriedade sobre os ecossistemas, o surgimento da vida e o processo de extinção das espécies. O professor de Física, por sua vez, pode explicar o aumento da temperatura média do planeta, além de ajudar na análise de gráficos e das plataformas que apresentam a dinâmica do clima nas diferentes regiões da Terra.
Você também pode convidar o professor de Geografia para trabalhar a leitura de mapas com a turma. Como as abordagens podem ser bem variadas, combine um recorte mais específico para o trabalho com os estudantes.
Depois que os temas forem escolhidos, converse com cada estudante a fim de orientá-los sobre a maneira mais adequada de conduzir o projeto. Lembre aos estudantes das técnicas estudadas ao longo do ano, como colagens fotográficas, bordados, pinturas, textos, gestos, sons, entre outras.
Para os que vão trabalhar com dados, reforce que, para dar visibilidade aos números, é possível conceber imagens digitais. Pode ser interessante mostrar o site da exposição “Existência numérica”, que ocorreu em 2024 no Rio de Janeiro (RJ), disponível em: www.exis tencianumerica.com.br/ (acesso em: 28 out. 2024).
Já a revista ClimaCom Cultura Científica , publicada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), tem uma seção dedicada à arte que pode ser inspiradora. Disponível em: https://climacom.mu dancasclimaticas.net.br/arquivo-arte/ (acesso em: 28 out. 2024).
Arte em Questão: unidade 3 (p. 336 e 337)
Considerando que esta é a terceira dinâmica desse tipo que é realizada, espera-se que os estudantes já tenham adquirido alguns hábitos e estratégias para a realização de provas de múltipla escolha. De qualquer forma, na aula anterior à execução das atividades, reforce os combinados para o simulado, lembrando que os conteúdos se relacionam com os capítulos da Unidade 3. No momento da aplicação, mantenha os procedimentos comuns em provas de vestibular, incluindo o preenchimento da folha de resposta, que deve ser providenciada antecipadamente. Além disso, aproveite a aula seguinte para explorar o gabarito com a turma, sanando todas as dúvidas.
Projeto Arte
Como agir na comunidade escolar por meio de um projeto
artístico? (p. 338)
O Projeto Arte é um processo de criação coletiva a ser realizado pelos estudantes, no qual se espera que eles façam uso dos conhecimentos e das habilidades adquiridos ao longo dos estudos em Arte no Ensino Médio. O objetivo é que eles se organizem em grupos e desenvolvam um trabalho artístico, mobilizando as linguagens que julgarem pertinentes, partindo da reflexão sobre a comunidade escolar da qual participam, para, por meio dessa pesquisa e criação artística, enfrentar problemas e explorar potências do território que habitam.
Com a realização dessa dinâmica coletiva de cuidado, afeto e criação, espera-se que os estudantes reconheçam a si mesmos como agentes de transformação de sua própria realidade, tendo nos processos e linguagens artísticas meios para criar, conceber, desenvolver e agir no mundo.
Comente esses aspectos do Projeto Arte durante a leitura coletiva do texto explicativo. Compartilhe com a turma a responsabilidade criativa e o trabalho que essa realização demandará. Para iniciar, faça uma leitura do fluxograma, descrevendo cada etapa do processo, instigando-os a aceitar esse desafio artístico e respondendo a dúvidas sobre modos e prazos de realização.
1o passo: investigando o tema (p. 339)
Caso seja possível no seu contexto escolar, cada grupo pode apresentar o seu Projeto Arte no entorno da escola, como em uma praça, parque ou outro espaço público de convívio que atenda a essa demanda. Esse é um processo desafiador, pois envolve a cooperação dos responsáveis pelos estudantes e o apoio da coordenação e da direção. Todavia, é bastante recompensador presenciar a escola, representada por seus estudantes, atuando artisticamente, de maneira positiva, no território.
As perguntas da seção investigam a noção de comunidade escolar para os estudantes, eixo central da proposta artística que será desenvolvida. É o momento propício para uma conversa sincera sobre os afetos e pertencimentos que o ambiente escolar mobiliza, bem como as percepções que os estudantes têm do território onde a escola fica e da comunidade da qual fazem parte. Também é uma boa oportunidade para valorizar todas as pessoas que participam da comunidade escolar, explorando a percepção dos estudantes em relação a funcionários, familiares, agentes educacionais, professores e pessoas do entorno que participam do cotidiano da escola.
O momento de consolidação da lista de potências e desafios da comunidade identificados pela turma é muito importante. Se possível, registre essa lista em cartolina ou papel craft, de modo que ela permaneça exposta ao longo de todo o processo. Isso permitirá que os estudantes retornem a esses pontos iniciais sempre que for necessário.
2o passo: nosso repertório (p. 339)
Partindo da lista de potências e desafios da comunidade, solicite aos estudantes que se juntem em trios para essa etapa. Peça que revejam obras, artistas, técnicas, teorias e atividades que realizaram ao longo do Ensino Médio e que possam servir de inspiração para uma ação artística que explore algum dos pontos da lista. Esse conjunto de referências deve ser ampliado para as obras e manifestações artísticas da cultura dos estudantes, que também devem servir de inspiração para a criação que será realizada.
3o passo: ateliê de hipóteses (p. 340)
Instigue os trios a conceber o maior número possível de ideias disparadoras. Essas ideias devem ser suscintas (preferencialmente expressas em uma frase) e indicar qual linguagem artística será mobilizada, lembrando que é possível mobilizar mais de uma
linguagem por projeto. Solicite aos trios que escrevam as ideias em um papel. Em seguida, desenvolva um grande painel de hipóteses, agrupando ideias parecidas que surgirem entre os trios, consolidando uma grande listagem de ideias de processos criativos. Reforce com a turma que esses serão os temas disparadores para o trabalho de cada grupo. Aproveite o momento para organizar a turma em coletivos de criação, que devem ter de seis a dez integrantes. Peça que se organizem com base nos temas e linguagens escolhidos, reunindo os estudantes com interesse em desenvolver processos de criação dentro de um mesmo horizonte.
4o passo: primeira rodada de planejamento (p. 341)
Não existe uma receita única para planejar uma criação artística. Esse esforço deve ser pautado em dois momentos. Primeiro, solicite aos grupos que imaginem a obra ou manifestação artística mais ousada que puderem. Depois, oriente-os a rever suas ideias, pensando na realização prática do projeto, nos trabalhos e nos materiais que serão demandados e no que é possível fazer. O mais importante é que o grupo consiga definir, em linhas gerais, o que deseja fazer, quais linguagens artísticas serão mobilizadas no processo e quais etapas de trabalho são necessárias para que essa realização aconteça.
5o passo: feira de trocas sobre o processo (p. 342)
Esta etapa é útil para que os grupos possam trocar ideias sobre seus projetos de criação, compartilhando caminhos, objetivos, fragilidades e/ou sugestões. Reforce com os estudantes o compromisso com a generosidade nessas trocas, enfatizando que todos podem contribuir para o trabalho de todos, para que os projetos de criação de cada grupo possam se desenvolver.
6o passo: segunda rodada de planejamento (p. 342)
Instigue os grupos a não se apegarem demais ao planejamento inicial desenvolvido no 4o passo. Para que um processo de criação se desenvolva de maneira efetiva, é preciso estar disposto a modificar rumos, escolhas, técnicas, materiais e/ou etapas de trabalho. Solicite aos estudantes que reescrevam o planejamento do projeto, pensando em como torná-lo mais potente depois das trocas realizadas com os demais grupos.
7o passo: produção (p. 343)
Mantenha a objetividade nesta etapa do trabalho e oriente os grupos a transformar em acontecimento e materialidade tudo o que foi planejado. Peça que se inspirem nas dicas fornecidas no livro e reforce que a quantidade de trabalho criativo depositado é o que culminará em um resultado mais potente. Muito da criação e da produção nas artes envolve um esforço artesanal persistente, cansativo, intenso e exigente, como qualquer trabalho, mas é recompensador quando a obra ou manifestação artística adquire consistência e é compartilhada com as demais pessoas.
8o passo: apresentações (p. 344)
Organize com a coordenação, a direção e demais professores a realização desse momento, para que a maior parte dos estudantes da escola possam apreciar o trabalho desenvolvido nos projetos artísticos dos grupos. Se possível, mobilize também os familiares, criando um momento de celebração artística com toda a comunidade escolar.
9o passo: encerramento do projeto (p. 345)
Reserve um momento na aula seguinte das apresentações para refletir coletivamente sobre a realização desse dia de projetos artísticos na escola. Comece solicitando aos estudantes que avaliem o evento, em um primeiro momento, em seus respectivos grupos. Depois, junte toda a turma para uma conversa de avaliação coletiva, explorando as impressões positivas e negativas sobre o dia dos projetos artísticos. Instigue-os a seguir desenvolvendo seus projetos fora da escola, caso desejem aprofundar seus estudos e práticas em alguma linguagem artística no futuro.
Encerramento: Afinal, o que é cultura e o que é arte?
Contexto (p. 346)
Espera-se que o término da jornada do estudante pelo componente curricular Arte no Ensino Médio seja o encerramento de um ciclo e a abertura de novos caminhos de participação social, expressão, imaginação e sonho. É nesse sentido que evocamos Nêgo Bispo e sua frase “começo, meio, começo”, relembrando a sabedoria das culturas afro-brasileiras, pautadas na circularidade e na ancestralidade,
em que todo fim é também um começo, recheado de memórias e de possibilidades de futuro. Demarque com a turma esse momento de despedida das aulas de Arte e de abertura de novos caminhos, com toda a vida que se anuncia deste ponto em diante, podendo ser percorrida com o apoio dos saberes artísticos e poéticos construídos neste ciclo final da Educação Básica.
Dentro dessa perspectiva de encontro entre passado e futuro, solicite aos estudantes que comparem as imagens das duas montagens diferentes da ópera O Guarani. Leia o texto explicativo coletivamente, explorando especialmente a forma de representação dos povos indígenas e a participação desses povos nas montagens, colocando em debate as modificações realizadas na atualização dessa obra paradigmática, explorando também o gênero da ópera.
Oficina da memória
(p. 347)
As palavras-chaves devem servir como bússolas afetivas daquilo que mais marcou o estudante nas suas investigações e criações nas aulas de Arte. Esse esforço de reflexão e síntese deve orientar a realização da atividade, com base em perguntas que giram em torno de grandes temas, como a proximidade com linguagens artísticas específicas; técnicas, materiais e métodos que mobilizaram o estudante; e os assuntos abordados que modificaram sua forma de ver e pensar a realidade. Nesse momento de retomada das produções dos estudantes, é importante debruçar-se de maneira generosa sobre o portfólio físico e digital da turma, valorizando e celebrando suas criações.
De volta ao começo: carta para o passado (p. 348)
Para encerrar esse processo de despedida, solicite aos estudantes que retomem a carta que escreveram no começo da jornada das aulas de Arte no Ensino Médio. Relembre com a turma a pergunta disparadora – “O que é arte? Para que serve?” –, provocando os estudantes a se deixarem surpreender com essa cápsula do tempo, considerando como eles compreendiam o universo artístico cultural no passado e como eles o compreendem agora. Instigue os estudantes a sonhar que tipo de arte e cultura gostariam de mobilizar em suas vidas daqui para a frente, ampliando a capacidade de ação e as perspectivas de futuro.
TRANSCRIÇÕES DO OBJETO EDUCACIONAL DIGITAL PODCASTS
TRANSCRIÇÃO PODCAST 1
[Locutora] O passado da humanidade e a preservação do patrimônio histórico
[Música de transição]
[Locutora] Quando a arqueóloga paulista Niède Guidon começou a estudar um conjunto de pinturas nas rochas do interior do Piauí, em 1970, estava puxando um fio que revelaria fatos extraordinários sobre a história da humanidade. A partir de 1979, com a criação do Parque Nacional da Serra da Capivara e a colaboração de outros pesquisadores brasileiros e franceses, foram encontrados centenas de sítios arqueológicos. Trata-se da maior concentração de pinturas rupestres do mundo, muitas delas retratando animais e cenas da vida cotidiana, datadas como os registros mais remotos da presença humana no continente sul-americano.
Escavando em alguns sítios arqueológicos na região, ela encontrou fósseis de carvão ainda mais antigos, que a arqueóloga interpretou como restos de fogueiras feitas por grupos humanos que viveram na Serra da Capivara. Exames de laboratório realizados nesses fósseis e análise de outras evidências encontradas ali levaram Niède a propor uma hipótese surpreendente. Ao contrário do que se acreditava até então, os grupos humanos teriam chegado na região há mais de 30 mil anos, atravessando o Oceano Atlântico em pequenas embarcações. A descoberta da cientista contrariava uma hipótese mais conservadora, segundo a qual os grupos humanos teriam chegado ao continente há 13 mil anos atravessando a pé o Estreito de Bering, no extremo norte do continente. Até hoje, esse debate ainda persiste, mas com novas descobertas no campo da Genética e Bioquímica, os cientistas estão confiantes na datação proposta por Niède Guidon.
Além das atividades acadêmicas, Niède dedicou as décadas seguintes a estudar e preservar a região de caatinga no Piauí. O parque abriga alguns dos sítios arqueológicos mais importantes do mundo. Por isso, é considerado Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco e, também, Patrimônio Histórico e Artístico do Brasil pelo Iphan.
[Música de transição]
[Locutora] Quando falamos em patrimônio, geralmente nos referimos a objetos, imóveis, terras que uma pessoa, uma família, uma empresa ou mesmo um Estado possui.
Mas quando falamos do patrimônio cultural de um país, estamos nos referindo aos bens materiais e imateriais que são considerados relevantes para a cultura e para a sociedade como um todo. Os bens materiais são aqueles que têm existência física, como, por exemplo, as cidades históricas de Paraty e de Ouro Preto ou os sítios arqueológicos da Serra da Capivara. Já os bens imateriais incluem conhecimentos, saberes, tradições, festas populares, danças e ritmos, como o samba de roda, a capoeira e o Círio de Nazaré.
No Brasil, o órgão responsável por esse tema é o Iphan, o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. O Iphan exerce um trabalho fundamental ao cuidar de políticas públicas para a promoção e preservação do nosso patrimônio cultural. A
Unesco, o braço de educação e cultura da ONU, faz o mesmo no âmbito internacional.
No início dos anos 1990, as duas instituições atestaram que os 100 mil hectares do Parque Nacional da Serra da Capivara representam uma riqueza que o Brasil e o mundo devem conhecer e preservar. E isso foi fundamental não apenas para desenvolver as pesquisas científicas nos sítios arqueológicos do parque mas também para melhorar a qualidade de vida das pessoas que vivem no entorno.
[Música de transição]
[Locutora] Quando Niède Guidon chegou pela primeira vez no interior do Piauí, contou com a ajuda da população local para localizar as cavernas onde estavam as pinturas rupestres. Embora os moradores da região não soubessem, aqueles desenhos, que muitos já tinham visto, se tornariam o centro de um intenso debate acadêmico entre cientistas do mundo inteiro.
Os grupos humanos chegaram à América do Sul navegando pelo Oceano Atlântico ou atravessando a pé o Estreito de Bering e cruzando a América do Norte e Central em direção ao sul? A questão permanece em aberto. Os sítios arqueológicos da Serra da Capivara continuam sendo amplamente estudados, e novos achados sugerem datas ainda mais antigas, de até 100 mil anos atrás.
Mas Niède logo descobriu que a preservação do ambiente dependia da colaboração dos piauienses, que precisavam entender a importância da riqueza guardada naquelas rochas. Em 1986, ela criou, então, uma fundação para difundir o conhecimento arqueológico para a população local. A Fundação do Homem Americano também promoveu a criação de postos de saúde e escolas de tempo integral na comunidade. Nelas, professores convidados abordavam de forma inovadora temas como meio ambiente, arte e cultura local. E as crianças tinham contato direto com arqueólogos do mundo inteiro, que vinham estudar as pinturas e os fósseis.
Uma dessas crianças era Marian Rodrigues, que cresceu com o sonho de ser doutora. Anos depois, o sonho se realizou: Marian fez doutorado em Arqueologia e hoje é a chefe do Parque Nacional Serra da Capivara. Ela segue, assim, os passos de sua mentora, Niède, que aos 90 anos se aposentou, mas continua vivendo no sertão do Piauí, em uma casa na cidade de São Raimundo Nonato, ao lado de seus cachorros.
[Música de transição]
Créditos:
A música “A Brand New Day” está na Biblioteca de áudio do YouTube.
TRANSCRIÇÃO PODCAST 2
[Locutor] César Vieira e o Teatro Popular União e Olho Vivo
[Trecho de fala]
“O nosso grupo é o Teatro Popular União e Olho Vivo de São Paulo. 49 anos de resistência! De trabalhos, apresentações de espetáculos pelos bairros de São Paulo e pelas cidades vizinhas. Sejam todos bem-vindos!”
[Locutor] O que a Guerra de Canudos e o Corinthians têm em comum? Aparentemente nada, mas o clube alvinegro e esse episódio marcante da história do Brasil foram tema de duas das primeiras peças do dramaturgo César Vieira, e elas estão na gênese do Teatro Popular União e Olho Vivo. Conhecida como Tuov, a companhia existe desde 1966 e é uma das expressões mais representativas do teatro popular brasileiro.
O teatro popular, como o próprio nome já diz, é para o povo. O Teatro Popular União e Olho Vivo surgiu com a intenção de oferecer uma alternativa às peças de estética e temas europeus. Suas apresentações são gratuitas ou com ingressos a preços acessíveis, e acontecem em locais públicos, como praças, parques, circos e periferias. Desde o início, os atores e atrizes não são necessariamente profissionais de teatro, o que categoriza o grupo como amador.
Era esse tipo de expressão artística que César Vieira tinha em mente quando escreveu a peça Corinthians, Meu Amor, que estreou em 1967, e foi encenada por um grupo de bancários, professores, lavadores de carro e desempregados. O tema da peça era a história do Corinthians, clube fundado por operários no bairro do Bom Retiro, e não por coincidência, o time do coração de César.
Outra peça escrita por ele, O Evangelho segundo Zebedeu, foi apresentada no Circo do Onze, montado no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, em 1970. O preço baixo do ingresso e o tema, a Guerra de Canudos, atraíram um público diversificado: de estudantes a imigrantes nordestinos.
Outro sucesso desses primeiros anos foi o espetáculo Rei Momo, que estreou em 1973, em que quatro escolas de samba convidadas contam a história da eleição de um monarca caricato no Carnaval carioca.
E por falar em samba, ele também está presente na peça Bom Retiro Meu Amor – Ópera Samba, de 2018. O bairro, de tradição fabril e de trabalhadores imigrantes, foi escolhido para ser a sede do grupo na década de 1980 e é homenageado na peça, que fala de acontecimentos marcantes e situações do cotidiano do Bom Retiro.
Ouça agora um trecho da peça.
[Música da peça Bom Retiro Meu Amor]
“Canta, canta, canta. Eu vou, eu vou, eu vou. Rema, rema, rema. Eu vou, eu vou, eu vou. Essa história é pra contar. Um território, algum lugar. Um lugar, um Bom Retiro, um Bom Retiro, um Bom Retiro pra ficar. Essa história é pra contar, um território algum lugar. Um lugar, um Bom Retiro, um Bom Retiro, um Bom Retiro pra sonhar. Canta, canta, canta. Eu vou, eu vou, eu vou. Rema, rema, rema. Eu vou, eu vou, eu vou.”
[Locutor] A escolha de temas populares, como samba e futebol, além de episódios marcantes da história do Brasil, como a Guerra de Canudos, estava no cerne da proposta artística do grupo, que adotou outras estratégias para cumprir seus objetivos. Uma delas foi a chamada tática Robin Hood: cobravam ingressos mais caros de quem podia pagar e, com a verba arrecadada, financiavam apresentações para quem não podia, reafirmando a missão de construir uma arte teatral em parceria com as camadas populares.
[Trecho de fala de César Vieira]
“[…] ou a gente vai ao bairro e se apresenta numa igreja, numa escola, ou a gente traz, que é uma inovação de um ano pra cá, de ônibus, 80, 60 jovens de um bairro da periferia, pra vim assistir ao espetáculo no Olho Vivo, tomar um lanche com a gente, conversar sobre vários assuntos, inclusive sobre a peça. E essa é a nossa função.”
[Locutor] Esse que você ouviu é o próprio César Vieira. Mas você sabia que César Vieira não era seu nome verdadeiro? Isso mesmo! Esse foi um pseudônimo que ele adotou para driblar a censura durante a ditadura militar. Nascido em 1931, na cidade de Jundiaí, no interior de São Paulo, o advogado e dramaturgo, na verdade, se chamava Idibal Matto Pivetta.
Durante a graduação em Direito, ele se envolveu com o movimento estudantil e chegou a ser vice-presidente da União Nacional dos Estudantes, a UNE. Dois anos depois do golpe de 1964, ele e outros estudantes criaram um grupo de teatro, o Teatro do XI, no centro acadêmico da faculdade.
Quando se uniram ao Grupo Casarão, também de teatro amador, adotaram o nome Teatro Popular União e Olho Vivo, na mesma época em que apresentaram a peça Rei Momo. Como o objetivo das peças era levar às periferias mensagens em defesa dos interesses das classes trabalhadoras, era previsível que os militares não aprovassem a ideia. E, com seus textos censurados, Pivetta passou a assiná-los como César Vieira.
Como dramaturgo, ele via no teatro um meio de empoderar os trabalhadores. Como advogado, defendeu gratuitamente centenas de presos políticos e, por isso, foi considerado subversivo. Após uma apresentação da peça Rei Momo, César foi preso pelos militares, mas isso não o impediu de continuar nos movimentos de resistência à ditadura assim que foi liberado.
Em 2013, a companhia encenou a peça escrita e dirigida por ele, A Cobra Vai Fumar – Uma Estória da FEB. FEB é a sigla para Força Expedicionária Brasileira, uma divisão militar do Exército e da Força Aérea Brasileira que lutou na Segunda Guerra Mundial.
A peça retrata a participação do Brasil na guerra e faz críticas a governos totalitários. A estreia, realizada no antigo prédio das Auditorias Militares, que passaria a abrigar o Memorial da Luta pela Justiça (MLPJ), em São Paulo, teve uma plateia de mais de 350 pessoas, entre elas 40 ex-perseguidos políticos e 12 advogados que defenderam presos políticos naquele prédio.
Quando César morreu, em 2023, aos 92 anos, seu nome foi lembrado por diversas pessoas e instituições como um grande defensor da democracia e dos direitos humanos.
[Trecho de fala de Cesar Vieira]
“A ditadura odeia o conhecimento como odeia também o teatro. Talvez porque o teatro seja olho no olho, falando as coisas, talvez porque o teatro incite aquela pessoa a discutir aquele tema. Um teatro que não coloque ‘a nossa saída e solução é essa’, mas coloque a nossa saída e nossa solução para ser discutida dentro de outras teses também.”
[Trecho de fala da atriz]
“O Teatro União e Olho Vivo vai apresentar A Cobra Vai Fumar, daqui a pouco aqui no calçadão Dr. Nagur.”
[Trecho de música]
Hoje tem teatro! Com o grupo Teatro Popular União Olho Vivo. União Olho Vivo.
Créditos: Os trechos da entrevista com César Vieira, assim como a participação dos atores e a música do Tuov, estão no site Vimeo e no canal “Teatro Popular União Olho Vivo” do YouTube.
TRANSCRIÇÃO PODCAST 3
[Locutora] A performance na arte
[Música de transição]
[Locutora] Tente imaginar a cena. Um homem em uma sala, com o rosto coberto de mel e folhas de ouro, segurando uma lebre nas mãos, espécie parecida com um coelho. Só que a lebre está morta. E o artista alemão está falando com a lebre morta. E ele faz isso durante três horas.
Você diria que isso é uma obra de arte? Se você respondeu que não, talvez seja hora de repensar a sua ideia sobre arte, porque essa cena de fato aconteceu em novembro de 1965, e o alemão no centro da sala é o artista performático Joseph Beuys.
Beuys foi um dos pioneiros da performance, um gênero de arte que desafia o nosso entendimento sobre os limites e os sentidos da expressão artística.
Como explicar imagens para uma lebre morta é o nome da obra criada por Beuys naquele inverno, em Düsseldorf, na Alemanha. Ele e outros artistas dos anos 1960 estavam criando um tipo de arte que opera fora dos limites convencionais da pintura e da escultura, e também do teatro, da música e do cinema. A performance se utiliza do corpo do artista e da interação dele com o público para produzir sentidos diversos e provocar estranhamento, curiosidade ou mesmo repulsa.
Outro exemplo dessa fase inicial da performance são os trabalhos do grupo Fluxus, um coletivo de artistas que construía suas obras em conjunto com o público. Eles saíam das galerias para se apresentar em locais de grande circulação de Nova York, convidando os transeuntes a interagir com o corpo dos artistas.
Nos Estados Unidos, na Europa e no Brasil foram realizadas muitas performances nas décadas de 1960 e 1970. No entanto, a artista performática que se tornou mais conhecida do grande público foi Marina Abramovic.
[Música de transição]
[Locutora] Marina nasceu em Belgrado, na antiga Iugoslávia, hoje Sérvia, em 1946, mas foi nos anos 1970, na Itália, que ela provocou uma pequena revolução no mundo das artes.
Ao entrar na sala de uma galeria de Nápoles e enfileirar 72 objetos diferentes a sua frente, a artista informou que durante as seis horas seguintes, os espectadores poderiam fazer o que quisessem com os objetos e com o corpo dela.
A ideia era entender o limite do ser humano, descobrindo como os espectadores se comportariam se tivessem permissão para fazer qualquer coisa com outra pessoa, sem punições ou censuras.
Durante as décadas seguintes, Marina Abramovic provocou o público de formas mais sutis, como na obra A artista está presente, na qual ela permaneceu sentada em uma cadeira, por mais de 700 horas, encarando por até um minuto quem se dispusesse a sentar-se em sua frente.
No Brasil, o baiano Ayrson Heráclito é um dos artistas contemporâneos da performance, ele costuma inserir elementos ritualísticos em suas obras. Em O Sacudimento da Casa da Torre e o da Maison des Esclaves em Gorée, de 2015, o artista evoca a prática religiosa do sacudimento, ao utilizar plantas consideradas sagradas para benzer dois edifícios ligados à colonização no Brasil e ao tráfico de pessoas escravizadas; o primeiro na Bahia e o segundo no Senegal.
Ele se valeu da videoinstalação, que explora tanto o plano da imagem em movimento quanto o do ambiente. O espectador é convidado a usar outros sentidos, além da visão, e a dialogar com a arte por meio do corpo.
Confira, a seguir, um trecho em que Ayrson explica como pensa sua produção.
[Trecho de fala]
“Eu comecei a organizar o meu pensamento e pensar performance, pensar produção fílmica, pensar produção fotográfica como… como, é agentes, né, de ritualidades, né! E a fotografia e o vídeo também passaram, deixaram de ser registro, né, e passaram a ser, é, um prolongamento, né, do próprio ritual, né, uma ação viva do próprio ritual. Isso é muito importante pra compreensão do meu trabalho, porque não é só estético, mas eu busco, é, que o trabalho aja, né, sobre as pessoas, né, como um devir do ritual, né,. Como se, então, aquela ideia ocidental que a fotografia é a morte, né, o registro de um momento que morreu, que se foi, de um passado que se foi, não cabe aqui, né, não cabe dentro desse universo. Principalmente porque também a gente tem uma outra concepção, uma concepção esférica de temporalidade. Então, tempo para a gente é um tempo né que comunga, né, o passado, o presente e o futuro, né, é algo esférico. Então, é, o futuro é o imediatamente agora e o passado está aqui também, né, então é um tempo circular onde se une, né, essas temporalidades […]”.
[Locutora] Heráclito contou que “nesta performance, a morte a ser afastada definitivamente de nós é da história da colonização e da escravização. […] que nos legou o racismo, as desigualdades e a pobreza para as populações pretas do mundo”.
O artista, que nasceu em 1968, na cidade de Macaúbas, Bahia, ganhou evidência por exaltar as raízes do povo negro, relacionando temas da cultura afro-brasileira e de patrimônios históricos vinculados à escravização no Brasil à produção de suas obras.
Todas essas performances apresentadas podem parecer diferentes ou não remeter a eventos artísticos mais comuns, mas o trabalho de Ayrson Heráclito, Marina Abramovic, Joseph Beuys e de outros artistas performáticos, no Brasil e no mundo, mostra que as definições de arte podem ser sempre expandidas.
O mais importante é compreendermos que, assim como qualquer atividade, a arte muda com o tempo e reflete os prazeres e as angústias vividos pelo ser humano. Por isso, os limites da expressão artística estão sempre sendo desafiados.
[Música de transição]
Créditos: O trecho com a fala de Ayrson Heráclito foi retirado do canal Escola das Artes da Universidade Católica do Porto, de 2024, do YouTube. A citação está no site da Bienal. A música “Candy Apple Town” está na Biblioteca de áudios do YouTube.
Referências bibliográficas comentadas
• ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Perspectiva, 2000.
O livro traz um compilado de 8 artigos, nomeados como “exercícios de pensamento” pela autora, que abordam temas como a autoridade, a liberdade, a importância da educação e a perda de sentido de noções como justiça, razão e responsabilidade.
• BARBOSA, Ana Mae (org.). Arte/Educação contemporânea : consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2010.
Organizada por Ana Mae Barbosa, importante pensadora da educação em arte, a obra reúne artigos de arte-educadores e intelectuais de diversos países, como Nigéria, Brasil e Canadá. Nela explora-se conceitos como a interculturalidade, a interdisciplinaridade no ensino de Arte entre outros conceitos importantes da área.
• BARBOSA, Ana Mae; AMARAL, Lilian. Interterritorialidade, mídias, contextos e educação. São Paulo: Sesc-SP; Senac-SP, 2008.
Coletânea de artigos que investiga temas como território híbrido das linguagens artísticas na contemporaneidade, questões ligadas à criação, recepção, mediação, ensino e difusão educativo-culturais.
• BOAL, Augusto. Jogos para atores e não-atores Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998. O livro reúne diversos jogos criados por Augusto Boal ou recolhidos por ele em diferentes cidades e contextos sociais. A metodologia lúdica parte dos pressupostos de que todo ser humano pode se expressar através do teatro e de que a ludicidade é uma ferramenta importante para o trabalho com a cena.
• CANDAU, Vera Maria; MOREIRA, Antonio Flávio. Indagações sobre currículo: currículo, conhecimento e cultura. Brasília, DF: MEC, 2007. Documento que promove uma reflexão sobre a concepção de currículo e seus desdobramentos para a elaboração dos projetos políticos pedagógicos das escolas e dos sistemas.
• MOREIRA, Antonio Flávio (org.). Multiculturalismo: diferenças culturais e práticas pedagógicas. 10. ed. Petrópolis: Vozes, 2013.
A obra reúne textos de diferentes autores que abordam reflexões em torno do termo “multiculturalismo”, compreendido enquanto uma atitude diante
da pluralidade cultural, bem como uma estratégia política e um corpo teórico buscando instigar novas práticas na escola e na formação docente.
• DOSSIÊ: Docência em Arte. In: Revista Digital do LAV – Santa Maria, v. 17, e8, jan./dez. 2024. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/revislav/in dex. Acesso em: 31 out. 2024.
No dossiê, publicado pela Revista Digital do Laboratório de Artes Visuais da Universidade Federal de Santa Maria, encontram-se artigos sobre o ensino das artes visuais, dança, do teatro e temas como a educação antirracista, a decolonialidade, a educação digital e diferença.
• ECO, Umberto. Obra aberta. São Paulo: Perspectiva, 1991.
A publicação aborda problemas ligados ao campo da estética e da teoria da informação, refletindo, em um conjunto de artigos, sobre o conceito teórico de “obra aberta”, utilizado pelo autor para investigar a arte contemporânea em sua multiplicidade.
• FAZENDA, Ivani. Interdisciplinaridade: um projeto em parceria. São Paulo: Edições Loyola, 2002. Explorando desafios da prática interdisciplinar na educação, os textos reunidos nesta publicação refletem sobre a formação dos professores atrelada a modos de trabalhar com novos conhecimentos e práticas na dinâmica escolar.
• FERDINAD, Malcom. Uma ecologia decolonial: pensar a partir do mundo caribenho. São Paulo: Ubu, 2022.
Nesse livro, Ferdinand unifica ecologia e racismo. Ao elaborar uma visão crítica sobre a colonização, nos mostra como a diáspora africana, a escravização, o extrativismo, a monocultura, as violências contra os povos originários e contra a floresta constituem um modo colonial de habitar o mundo, baseado na exploração dos seres e dos ambientes, do qual precisamos nos libertar.
• FREIRE, Paulo. Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.
Escrito durante o exílio forçado do autor, esse livro apresenta as bases da abordagem freiriana na educação, concebida como meio de libertação dos seres humanos, transformando-os em agentes de transformação da realidade.
• MORANDI, Carla; STRAZZACAPPA, Márcia. Entre a arte e a docência: a formação do artista da dança. Campinas: Papirus, 2012. Nesse livro, as autoras abordam os vários caminhos de formação de artistas da dança em contextos formais e não formais no Brasil.
• MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 2. ed. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: Unesco, 2011. p. 33. Explorando a abordagem conhecida como “paradigma da complexidade”, a obra investiga sete eixos que relacionam educação, futuro e formação, integrando temas como identidade, conhecimento, incerteza e condição planetária.
• NAVAS, Cássia; SIQUEIRA, Arnaldo; ROCHELLE, Henrique; DIAS, Linneu. Dança Moderna (1992-2022) 1 ed. Mireveja/Cássia Navas Produções. E-book. Essa edição reúne textos já publicados em 1992 sobre dança moderna e novos artigos que tratam de temas atuais como a dança em Recife e outras questões da dança contemporânea. Um novo texto de Navas revisita a presença da dança na Semana de Arte Moderna de 2022.
• OSTROWER, Fayga. Criatividade e Processos de Criação. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1977. Partindo da análise de processos criativos, tendo como enfoque termos como percepção, formas, intuição e imaginação, o livro investiga a criatividade enquanto campo interdisciplinar, expressão do potencial próprio de todos os humanos.
• PARSONS, Michael. Compreender a Arte. Lisboa: Presença, 1992.
O livro traz uma abordagem da experiência estética a partir de um ponto de vista do desenvolvimento cognitivo.
• PEDROSA, Mario; ARANTES, Otília (org.). Acadêmicos e modernos. São Paulo: Edusp, 2004. Os textos do crítico Mario Pedrosa reunidos nesse livro trazem uma reflexão sobre a arte brasileira, investigando como o nacional e o regional operaram em alguns casos na unificação e, em outros, na diferenciação da arte moderna internacional.
• RICHTER, Ivone Mendes. Interculturalidade e estética do cotidiano no Ensino das Artes Visuais. Campinas: Mercado de Letras, 2003.
Nesse livro, Ivone Richter relata uma experiência
de educação intercultural, trazendo a diferença cultural para o ensino de artes visuais, a partir da estética feminina nas famílias dos estudantes de uma escola municipal de ensino básico, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul.
• RUFINO, Luiz. Ponta-cabeça: educação, jogo de corpo e outras mandingas. Rio de Janeiro: Mórula, 2023. Nessa obra, o autor propõe uma visão de educação que vai muito além da escola formal e que traz o corpo como presença central nos processos de educar, aproximando educação e capoeiragem.
• SPOLIN, Viola. Improvisação para o teatro. São Paulo: Perspectiva, 2006. Essa edição conta com dois capítulos dedicados à teoria e fundamentação, auxiliando o docente a compreender como conduzir os exercícios propostos com base no sistema criado por Spolin para o trabalho com as artes cênicas através de jogos.
• STROETER, Guga; MORI Elisa (org.). Uma árvore da Música Brasileira. São Paulo: Sesc, 2020.
O livro traz artigos de diferentes autores e busca traçar um panorama da música popular brasileira desde a modinha e o lundu, nos séculos XVIII e XIX, até a música eletrônica contemporânea. O livro acompanha uma árvore genealógica com gêneros musicais variados e suas conexões.
• VIVEIROS. Eduardo; SALDANHA, Rafael Mofreita; DANOWSKI, Débora (org.). Os Mil Nomes de Gaia: do Antropoceno à Idade da Terra. v. 1. Rio de Janeiro: Machado, 2022.
Esse é o primeiro volume, que reúne as conferências realizadas durante o Colóquio Internacional Os mil Nomes de Gaia, ocorrido em 2014, na Casa Rui Barbosa, Rio de Janeiro. Com a participação de 34 cientistas multidisciplinares que discutiram as transformações do sentido da história e das condições de vida na Terra expressas pelos conceitos de Antropoceno e Gaia.
• WISNIK, José Miguel. O som e o sentido. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
O autor constrói uma abordagem sobre a história da música que se amplia a diversas tradições musicais. Assim, esse livro foge da construção de uma história baseada em biografias de compositores e propõe um estudo sobre a sonoridade nas diversas culturas. O material escrito acompanha faixas de áudio.