Projeto Opportunities

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C CAMI_ NHOS N

na voz de migrantes

as histo_ rias



O projeto OPPORTUNITIES propõe uma nova narrativa de integração bem-sucedida que redireciona a atenção para os benefícios da migração. Tem por base a ética do diálogo e da abordagem dos direitos humanos, conforme sugerido na Agenda Europeia para a Integração de Nacionais de Países Terceiros (2011). Propõe, também, uma integração mais bemsucedida dos migrantes. Ao longo de 2022 e 2023 foi possível, através da metodologia das Cross Talks (Conversas Cruzadas), recolher um conjunto de histórias de migrantes que escolheram Portugal para viver e aqui constroem os seus percursos de inclusão. Aqui, os migrantes partilham as suas experiências, as suas aspirações e sonhos e o que esperam da sociedade que os acolhe. Numa segunda fase das Cross Talks, promoveu-se um diálogo entre migrantes e representantes de diferentes setores da sociedade com experiência de trabalho nesta área. As leituras públicas das histórias permitiram um confronto entre a própria experiência e a do outro, o que leva ao reconhecimento e à compreensão, que são necessários para focar no que todos têm em comum. A troca de histórias permite um diálogo justo sobre migração. Os benefícios das Cross Talks são notáveis, promovendo uma visão autêntica das vidas de outras pessoas, incentivando empatia e estabelecendo um terreno fértil para o diálogo. Este método revelou-se altamente ecaz ao unir diferentes perspetivas e experiências, proporcionando um espaço acolhedor e inclusivo para a livre expressão de ideias. As conversas promovem a compreensão mútua e, por conseguinte, a coexistência harmoniosa numa sociedade intercultural. O Projeto OPPORTUNITIES não se limita a partilhar histórias, ele constrói pontes, desafia preconceitos e fortalece laços entre comunidades diversas. Esta exposição é uma porta de entrada para explorar estes “20 Caminhos na Voz de Migrantes” e convidar todos para fazer parte desta narrativa de integração e inclusão. A EAPN Portugal acredita que, Juntos, podemos contribuir para a construção de uma sociedade mais inclusiva, que abraça a riqueza cultural que a migração traz.


27 anos, Brasil


Gostaria de viver em Portugal em condições dignas, sem ter de lidar com preconceitos e com a valorização e reconhecimento daquilo que construi até o momento. Sempre foi um processo difícil, mas que eu tentei percorrer da forma mais correta possível. Fiz a validação da Licenciatura, finalizei o Mestrado, mas sinto as que as oportunidades e que os reconhecimentos profissionais nunca irão aparecer em Portugal. Neste momento, gostaria de ter um trabalho em que me reconheçam e que me valorizem, gostaria de não me sentir sozinha e gostaria de, sobretudo, voltar a ser a pessoa leve que um dia fui. Sinto-me sozinha. Isso pode ter a ver também com a leveza que perdi. É normal que as pessoas acabem por se afastar de mim por eu estar sempre preocupada, sempre triste. Ninguém quer pessoas tristes por perto. Mas eu também prefiro isolar-me a obrigá-las a estarem perto de uma pessoa que se tornou alguém sem alegria. Penso também em regressar para o Brasil, acho que me faria bem por um tempo, mas, teria de começar tudo do zero e, hoje, não sei se tenho forças. Confesso que tinha grandes expectativas para a minha vida aqui em Portugal. Idealmente queria morar numa boa zona em Lisboa, ter uma casa própria, um carro e uma vida tranquila com um bom salário. Ter um namorado, mas que não fosse culturalmente muito diferente de mim, para que o nosso relacionamento fosse mais fácil. Já enfrentei algum preconceito aqui em Portugal, já fui tratada com menos respeito e consideração por ser imigrante, mulher e brasileira. Estes três fatores que podem ser metaforicamente mencionados como uma cicatriz, daquelas que não desaparecem nunca, são para a vida toda. Eu posso ter orgulho desta cicatriz, porque me constituiu enquanto ser humano. Mas, infelizmente, em Portugal, muitos vão olhar para ela com asco, com desprezo. No meu antigo local de trabalho houve pessoas que rejeitaram ser atendidas por mim por eu ser brasileira e tudo isso me fez sentir que não posso ser quem sou em Portugal. Mas a minha a preocupação é sempre de corrigir o outro sem nunca o agredir, e é algo que tenho conseguido sempre fazer.


28 anos, GuineBissau


As minhas aspirações em Portugal são aspirações comuns de qualquer jovem, seja nacional ou imigrante. Quero ter oportunidades de trabalho e sentirme em casa, quero que Portugal seja o meu “lar doce lar” e que não seja constantemente lembrado que não pertenço a este lugar. Por vezes, sinto que pertenço a este lugar, mas outrora não. E isso é fruto dos obstáculos que vou enfrentando enquanto imigrante. A burocracia e as barreiras administrativas em termos legais para conseguir ter acesso ao título de residência têm sido um grande obstáculo desde que aqui cheguei. O racismo é também um problema estrutural. Senti que já fui ignorado e evitado pelos meus colegas da universidade por ser negro e já fui abordado de forma discriminatória pela polícia: pediram-me os documentos apenas por estar na rua. É difícil. Eu não quero ser visto como um encargo e como alguém que vem roubar os trabalhos aos nacionais. Resiliência é a palavra que me define. Tenho muito orgulho da minha história de vida, de todos os desafios e dificuldades que tive para agora estar a viver onde eu queria viver. A minha história de vida inspira-me e gostava de inspirar outros migrantes que estão neste momento na mesma situação em que eu já me encontrei. Um dos meus objetivos é também ajudar a desconstruir os estereótipos associados aos africanos e aos negros em Portugal. Tenho um especial carinho pelo trabalho social e pelo voluntariado e aspiro a ser uma figura de referência na luta pelos direitos dos migrantes. Estou aqui para desenvolver as minhas competências pessoais e académicas, tirar o meu mestrado e ajudar os outros a alcançarem os seus sonhos. O meu grande objetivo é contribuir para a sociedade melhor e ajudar os outros migrantes a fazer o mesmo. Sonho e acredito que um dia, vou acordar num mundo em que o termo globalização não seja só um instrumento político e retórico pintado de lindas cores, mas que tem sombras tortas na sua valência. E sim, viver numa aldeia realmente global em que as palavras sejam acompanhadas de práticas reais e sentir-me um verdadeiro cidadão do mundo. Que os limites fronteiriços sirvam de instrumento de determinação do limite de autoridade de um estado e não como instrumento de segregação entre os seres humanos. No meu antigo local de trabalho houve pessoas que rejeitaram ser atendidas por mim por eu ser brasileira e tudo isso me fez sentir que não posso ser quem sou em Portugal. Mas a minha a preocupação é sempre de corrigir o outro sem nunca o agredir, e é algo que tenho conseguido sempre fazer.


24 anos, Nepal


Já passou mais de um ano desde que vim morar em Lisboa. Cheguei através de um processo de reagrupamento familiar; os meus pais e o meu irmão também vivem aqui. Não sei quanto tempo quero ficar em Portugal, dependerá das oportunidades de emprego que surgirem. Se eu conseguir um bom emprego, tenho mais motivação para ficar por cá. Um bom emprego inicial na minha área seria a mediação cultural, mas não quero fazer isso para sempre. Cada passo é um passo difícil como imigrante. Os primeiros meses em Portugal foram para mim os mais desafiantes depois de ter sido afastada da minha universidade para vir morar aqui com a minha família. No início, não consegui encontrar o mesmo ambiente académico que antes. Embora tivesse tido a oportunidade de trabalhar numa das associações de imigrantes aqui, não foi como eu imaginava. No início pensei que era uma boa oportunidade para ganhar alguma experiência e estar mais próximo da comunidade e aprender mais sobre eles, mas o ambiente tóxico e a forma como funcionavam não me permitiam exercer o meu trabalho de forma mais eficaz, pelo que deixei o trabalho. Senti realmente que estava a ficar para trás na minha carreira. Agora, iniciei o mestrado numa universidade portuguesa. Não foi fácil integrar-me no sistema educativo português e todo o processo de inscrição numa universidade. Mesmo depois de estar inscrita, o desafio continua porque as aulas são em português e eu não o domino, ainda estou a aprender. Antes de entrar numa universidade, eu não tinha uma rede nem conhecia nenhum ex-aluno da universidade com quem falar, isso deixava-me em baixo psicologicamente. No entanto, tive a sorte de ter os meus pais, que sempre me apoiam em tudo. A maioria dos jovens imigrantes não tem este privilégio. Compreendi que há muitos estudantes imigrantes motivados que querem continuar a sua educação para melhores oportunidades de carreira. Seria bom se houvesse instituições genuínas focadas nos estudantes imigrantes com recursos mais acessíveis e mais claros. O meu desejo é de trabalhar para a comunidade após o meu mestrado. Estou muito focada nisso, mas também não quero desistir do voluntariado e de outras coisas que me fazem feliz. No futuro, gostaria de ter o meu próprio espaço, a minha própria casa, para estar mais próximo da natureza e ter mais independência.


23 anos, Brasil


É verdade que me sinto estrangeira nos dois lugares, mas sinto-me mais em casa aqui em Portugal e não quero voltar para o Brasil de jeito nenhum. Estou aqui para ficar e queria muito ter uma casa só para mim e para o meu marido, gosto muito de ter meu próprio espaço e queria ter um cão, mas neste momento está muito longe de ser uma possibilidade financeiramente. Quero alcançar minha independência financeira, mas tem sido mesmo difícil, especialmente agora com a inflação. Estou muito empenhada em conseguir a minha bolsa de investigação para doutoramento porque isso é o que eu quero fazer e me ajudaria em termos monetários. Além disso, eu quero viajar pela Europa com o meu marido porque ainda não tivemos a oportunidade. Quero que o meu casamento dê certo e ser profissionalmente bem-sucedida. Sou muito grata pelas pessoas que têm me aberto portas nesse sentido em Portugal. Sinto que no Brasil a minha vida seria muito mais fácil, mas não tão feliz. Aqui confiamos muito nas instituições, mais que no Brasil, mas há muita burocracia para alguém que vem de fora e é mesmo difícil, já para não falar da discriminação. Para mulheres brasileiras acho que o pior é a hipersexualização, já recebi alguns comentários sexualmente inapropriados e muito desagradáveis.


28 anos, Curdistao


A minha maior aspiração em Portugal é terminar os meus estudos e encontrar oportunidades que apoiem financeiramente os meus estudos. O fato de ser estrangeira faz com que eu tenha menos oportunidades. Eu sinto que aqui não tenho apoio, aqui não tenho ninguém. Sou uma pessoa muito trabalhadora, mas sinto que meu esforço é maior do que as oportunidades que tenho. Viveria melhor em Portugal se tivesse apoio com as minhas despesas de educação ou oportunidades de emprego. Mesmo tendo me inscrito em tantas bolsas nacionais, não consegui nenhuma. Sempre que vejo os resultados das candidaturas a bolsas, tudo o que vejo são nomes portugueses. Embora seja feliz a viver aqui como imigrante, não tenho a certeza se quero viver em Portugal a longo prazo, uma vez que não consigo encontrar oportunidades de trabalho na minha área de formação e investigação. Tenho medo que aqui não consiga desenvolver a minha carreira profissional, devido ao desemprego, barreira linguística e lentidão dos procedimentos burocráticos. Portugal é um país diferente. Às vezes sinto-me uma estrangeira aqui, e outras vezes não. Tudo o que eu quero é não desistir dos meus objetivos e terminar meus estudos porque desistir não é uma opção.


24 anos, Angola


Estou a estudar aqui em Portugal e tenho estado a gostar muito porque me sinto mais seguro do que em Angola e há uma estabilidade que lá não tinha. Aqui e na Europa as coisas são muito diferentes e há coisas boas e menos boas. Tive alguns choques culturais e já fui olhado com algum preconceito porque, com o crescimento da extrema-direita e as pessoas mais velhas habituadas a outros tempos, já me disseram que vim tirar empregos e muitas vezes estranham o meu sotaque e dificultam a comunicação. Além disso, em Angola as pessoas são mais extrovertidas, estabelecem logo uma relação e expõem-se ao passo que aqui aprendi a fechar-me mais e a não contar tanta coisa. Ainda assim, gostaria de trazer a minha família para cá, constituir família aqui e ter um emprego que me permitisse ter estabilidade financeira. Quero-me sentir mais em casa e criar uma associação multicultural que apoie e financie artistas locais e os seus projetos de impacto social. Seria uma espécie de restaurante / brunch place. As minhas limitações são, por um lado, internas porque preciso de arriscar mais e ter um pouco mais de ambição e, por outro lado, o país não encoraja muito os jovens na prossecução dos seus objetivos, o que faz com que eu tenha de me esforçar ainda mais.


22 anos, GuineBissau


Eu tinha grandes expectativas em relação a Portugal como qualquer outro cidadão africano tem em relação à Europa, mas a realidade é muito diferente, é muito difícil viver aqui. Já fui vítima de preconceito várias vezes, já fui segregado na faculdade nos primeiros tempos, fui tratado como se o meu português não fosse compreensível e fosse errado e fui rotulado como alguém de baixo estatuto social, que vive do RSI e que vim para aqui roubar empregos e a verdade é que não. Vim para Portugal para estudar e já terminei a minha licenciatura e iniciei o meu mestrado. Quero acabar os meus estudos e arranjar um emprego internacional na minha área, idealmente como diplomata. A discriminação é um dos maiores obstáculos que tenho enfrentado aqui em Portugal, no entanto conheci também pessoas maravilhosas que me compreenderam e me ajudaram no processo de adaptação, cujas palavras e ações inspiradoras que fizeram sentir acolhido. Precisamos de mais portugueses que olhem para os migrantes de outra forma e os acolham.


22 anos, GuineBissau


Vim para Portugal para estudar e neste momento já estou no meu mestrado e tenho produzido alguns artigos. O meu objetivo é terminar os estudos e arranjar emprego aqui em Portugal, possivelmente na banca. O facto de Portugal estar na UE alicia-me porque gostaria de ganhar experiência profissional aqui e teria mais oportunidades para as quais me sinto preparado com tudo o que tenho aprendido. Na Guiné eu era muito ativo em projetos da sociedade civil e gostava muito de manter isso aqui porque também é importante para mim, já que quero ser político e ajudar no desenvolvimento de África. A discriminação e o preconceito são os maiores obstáculos que enfrento aqui em Portugal. Passei por diversas situações onde fui vítima de segregação racial, o que não faz sentido, porque nós, imigrantes, temos cada vez mais qualificações e penso que quanto mais pessoas de nacionalidades diferentes e com qualificações diferentes houver, mais Portugal evoluirá e se tornará mais inclusivo. Este é também um país com pessoas boas, seres humanos impecáveis que me acolheram bem, ajudaram-me a crescer e tornaram o meu percurso académico.


30 anos, Brasil


Eu quero viver em Portugal de forma livre. Poder viver as melhores experiências deste país, aproveitar as oportunidades sem ter dúvidas que serei preterida ou subjugada pela minha cor ou nacionalidade. Quero trabalhar com promoção de igualdade racial e social com as comunidades menos favorecidas. Quero ver esta diferença na sociedade com oportunidades iguais de moradia, renda, trabalho entre outros. Eu aspiro um bom trabalho na minha área, que me dê disponibilidade e abertura para atuar em diversas temáticas. Para isso, acredito que seja preciso experiência e competências que possam ser desenvolvidas com cursos, estudo, voluntariado e vivências com a comunidade. Acredito que como uma imigrante enfrento muitas dificuldades. A primeira delas é a discriminação e xenofobia. Eu sou uma mulher negra brasileira. No imaginário de algumas pessoas eu não sirvo para muita coisa. As mulheres brasileiras são discriminadas e lidas como mulheres que querem ganhar a vida na prostituição, o que não é verdade. Segundo o sotaque. O português do Brasil e chamado de “brasileiro” como se fosse um outro idioma. Isso é extremamente ofensivo, que nos coloca em um local de exclusão e como se fosse errado nossa forma de falar. O sotaque já me trouxe constrangimentos e experiências muito ruins e traumatizantes. Depois por eu ser negra. Em Portugal, para alguns não há negros portugueses. Os negros são africanos e os mestiços brasileiros. Muitas vezes já me perguntaram de que lugar da África eu sou por ser retinta e duvidarem de eu ser brasileira. O racismo em Portugal é negado e escondido, e reforçam a ideia de amizade com as “nações irmãs” como Brasil, Guiné-Bissau e Cabo Verde. Entretanto a verdade é que Portugal é um dos países mais racistas que já conheci e de uma forma direta e despudorada que fere a minha existência diretamente e enfraquece meus sonhos e objetivos neste país. Mas eu resisto, assim como meus ancestrais que foram levados à força para o Brasil, eu tenho de resistir pelos meus planos e objetivos. Apesar das dificuldades eu pretendo ter êxito na minha profissão e no país que eu escolhi viver e me desenvolver.


25 anos, Iraque


Quando o ISIS (Estado Islâmico do Iraque e da Síria) entrou nas cidades de Sinjar em Agosto de 2014, fomos forçados a fugir para o Monte Sinjar porque temíamos pelas nossas vidas. Ficámos na montanha durante oito dias sem comida nem água. Fomos para a Síria e depois para o Curdistão, no norte do Iraque. As condições em que nos encontrávamos no Curdistão eram péssimas, e por lá permanecemos por mais de dois anos. Tive de pagar a um contrabandista para poder sair do Iraque e ir para a Turquia. Estive preso na Turquia durante 33 dias, a vida era tão difícil quanto era a vida nas montanhas. Depois de ser libertado da prisão, fui para Istambul, fiquei na cidade durante mais de um mês, e depois fui para Izmir. Tentei sair do território turco em direção à Grécia pela minha segurança. Após quatro tentativas falhadas, consegui finalmente entrar no território grego via marítima. A minha última tentativa foi bem-sucedida. A situação na Grécia era muito difícil. Estive num campo de refugiados durante 2 anos e 3 dias, e a única coisa que eu queria era viver em paz e ter uma vida melhor sem medos. Depois de tudo o que passei na vida, a minha maior aspiração é viver em paz, num lugar seguro. Confesso que Portugal não foi o país que escolhi para viver, mas agora estou feliz por estar aqui. A Alemanha era a minha primeira opção uma vez que tenho lá família. Fiquei tão desapontado quando soube que vinha morar em Portugal, um lugar onde não conhecia nada nem ninguém. Mas fui tão bem recebido e acolhido que quero muito ficar por aqui e abrir meu negócio. No Iraque minha família tinha um restaurante e eu adorava aventurar-me na cozinha. O meu grande sonho é abrir um restaurante com pratos de todos os países por onde passei durante meu trânsito na Europa. Tenho uma história em cada um destes países, na Turquia, Grécia, Itália, Espanha, França, Alemanha, Holanda, Bélgica, Suíça e Portugal, e quero contar a minha história através da arte de cozinhar. Amo cozinhar e por isso meu objetivo é ser Chef no meu próprio restaurante, a cozinhar da forma que gosto e a gerir a minha própria equipe. Sei que não será fácil, é preciso muita paciência e ter as pessoas certas ao meu lado. Preciso de pessoas que me ajudem, pensem comigo e me motivem. O mais importante para mim é não desistir.


29 anos, Eritreia


No meu país fazia negócios que me permitiram juntar dinheiro suficiente para pagar a minha travessia para a Europa. Aqui em Portugal sinto que trabalho muito, mas ganho pouco e não consigo poupar dinheiro suficiente para atingir os meus objetivos. Estou aqui sozinho há cinco anos e adoraria ter o meu próprio restaurante porque trabalho como cozinheiro e adoraria abrir um restaurante com comida eritreia porque não há nenhum em Lisboa. Sonho com isto para poder ficar aqui e finalmente poder trazer a minha mulher, começar uma família e ter uma vida confortável. Mas se não conseguir concretizar os meus objetivos a longo-prazo, é provável que não continue a viver em Portugal. O que torna difícil para mim aqui alcançar as minhas aspirações é o facto de ainda não ter aprendido muito bem a língua portuguesa. Onde eu trabalho também não me permite aprender a língua, porque trabalho com outros imigrantes e só falamos inglês. Mas eu não perco a esperança, amanhã é outro dia e será melhor. Acredito que um dia serei capaz de falar e escrever português fluentemente. Muitas pessoas bem-sucedidas fizeram grandes sacrifícios para realizar os seus sonhos. Isto encoraja-me muito, porque já provei a amargura da vida e agora quero provar a sua doçura. O slogan da minha vida é nunca desistir dos meus sonhos e trabalhar arduamente para os tornar realidade.


29 anos, GuineBissau


Estou em Portugal há 3 anos e já tenho algumas saudades de casa e da minha mãe – gostaria de a trazer para cá para ela ter acesso a melhores cuidados de saúde. Na Guiné-Bissau fala-se muito bem de Portugal e eu vim para cá porque sempre soube que não me queria formar lá. A minha história de imigração começou em 2014 quando consegui uma bolsa de estudos para o Brasil e, em 2019, decidi que ia fazer meu mestrado em Portugal. Lisboa é uma cidade encantadora. Sou completamente fascinado pela cidade, pelas suas paisagens arquitetónicas, espaços culturais e de lazer e por tudo o que esta cidade me ensinou. No entanto, não me posso deixar levar pelos encantos do rio Tejo, porque não vejo muita evolução, parece que as coisas estão sempre no mesmo lugar. É difícil ser negro e ser de outra nacionalidade aqui em Portugal, os desafios aqui são imensos. Desde dificuldades em conseguir a documentação, dificuldades de integração e discriminação. Um imigrante que vem da Guiné-Bissau não é igual a um imigrante que vem da Inglaterra. Já me recusaram arrendar uma casa por causa do meu sotaque africano e sei também que às vezes não me dão trabalho pela minha cor de pele, o que me deixa magoado. Sei que estou numa posição desvantajosa, por ser negro e imigrante, isso faz como que tenha mais obstáculos e que a luta seja maior para conseguir concretizar as minhas aspirações. Se ontem minhas aspirações passavam por terminar os meus estudos e conseguir um trabalho na minha área profissional, hoje não sei se posso afirmar o mesmo. Quero mais, quero muito mais. Quero ter mais oportunidades, morar num lugar tranquilo com preços acessíveis, um emprego estável e um salário digno. Apesar de todas as situações menos boas que vivo aqui, sei que em Portugal tenho mais oportunidades de que no meu país de origem. O meu objetivo é ajudar e motivar os estudantes e migrantes que estão numa situação semelhante à minha, mas mais do que isso, sonho em terminar o meu mestrado, ter um bom currículo na minha área e trabalhar nas Nações Unidas. Quero também trabalhar para a minha comunidade, a comunidade negra, para a empoderar. Quero tornar o mundo um lugar mais igualitário, mas perceber também onde serei mais útil, onde a minha contribuição será mais reconhecida. Tenho vindo a pensar e a analisar em que lugar do mundo conseguirei concretizar tudo o que aspiro. Eu não sei, assim como não sei se realmente quero continuar a viver em Portugal.


26 anos, GuineBissau


Portugal é o país de sonho de qualquer jovem guineense que quer morar na Europa. Seja pela partilha de um idioma comum ou pelas afinidades culturais. Eu sonho viver aqui de forma tranquila com a minha família e ter um bom trabalho. Ajudar o outro faz parte da minha essência, e por isso as minhas aspirações passam por ajudar os migrantes, principalmente mulheres migrantes que são as que mais sofrem. Quando cá cheguei estava muito desorientada e parecia que o mundo não queria saber de mim. Passei por algumas dificuldades, fui vítima de racismo e discriminação, o que teve um impacto muito negativo na minha saúde mental. Senti-me muitas vezes ignorada e fui tratada com menos respeito por ser imigrante. Não consegui criar amizades com nenhuma portuguesa e, naquela altura, gostaria muito de ter tido uma amiga para conversar, partilhar as minhas coisas e que me apoiasse. Mas não consegui estabelecer esse vínculo com ninguém. Claramente, poderia sempre ligar aos meus pais ou aos meus irmãos que estavam à distância de uma chamada telefónica, mas ainda assim, não era a mesma coisa. Tenho muito orgulho de não ter desistido de correr atrás dos meus objetivos e, por isso, gostaria que outras mulheres migrantes não desistissem dos seus sonhos. Eu gostaria de apoiá-las. Consegui concretizar um objetivo, estagiar no INMUNE (Instituto da Mulher Negra em Portugal) e daqui para a frente gostaria de trabalhar em projetos que dão voz às mulheres negras. Esta é uma das minhas maiores aspirações.


28 anos, GuineBissau


Vim da Guiné há 3 anos e neste momento estou muito focado em terminar a minha licenciatura em Sociologia e depois fazer o meu mestrado na área e poder ser político. Interessa-me muito o associativismo, o ativismo e a luta social. Idealmente, queria ajudar outros imigrantes e recém-chegados na adaptação a Portugal e por isso sou Presidente da Associação dos Filhos e Amigos de Ingoré. Nós passamos por várias dificuldades quando cá chegamos e enfrentamos muitas barreiras. Quando cheguei a Portugal tive vários obstáculos porque não tinha dinheiro suficiente para pagar as propinas da faculdade e todas as despesas inerentes e, como o meu visto era de estudante, não me era permitido trabalhar. Também me senti, e ainda sinto, muito excluído, mesmo na faculdade. Por ser africano os meus colegas tendem a rejeitar-me para trabalhos de grupo e sinto que sou tratado com menos respeito ou consideração que uma pessoa portuguesa. Além disso, a questão da língua e toda a aprendizagem académica são desafiantes. Agora, felizmente, já trabalho e consigo cobrir as minhas despesas e estou a tirar a carta de condução. Sonho em ter um carro meu porque na Guiné eu era mecânico e continuo a gostar muito de carros. Aqui aprendi que na vida temos de estar preparados para tudo por isso estou ciente que terei outras dificuldades, mas sinto-me capaz de superar. Só tenho é que continuar a estudar e trabalhar para isso porque nada é impossível. Tenho de estar sempre preparado para o amanhã e para a dificuldades que irão surgir. Quero viver de forma digna, como um ser humano onde os meus direitos não são postos em causa e sentir-me acolhido neste país que me acolheu.


30 anos, Sri Lanka


Sou uma mulher de 30 anos e o meu sonho é como o de qualquer outra mulher, ter uma família e uma carreira profissional orientada para objetivos que possam dar sentido à minha vida. Todos os dias, quando acordamos, independentemente do que fazemos, quer seja algo grande ou pequeno, todos nós precisamos de ter um motivo para apreciar o nosso trabalho e saber que isso tem um impacto na sociedade. Não é só o que fazemos, mas também a forma como fazemos. Saí de casa quando tinha 17 anos, a Europa tornou-se a minha segunda casa e poderia certamente chamar a mim mesmo uma hóspede. Ser um imigrante não é só uma fantasia, é uma escolha que fizemos e por isso devemos descobrir tudo sozinhos. Quando vim para Portugal, tive a oportunidade de trabalhar com imigrantes e consegui facilmente relacionar-me com eles e identificar cada uma das necessidades não ditas e toda aquela inquietação. Parece-me que há falta de esclarecimento sobre como funcionam os serviços públicos, e seria vantajoso se houvesse algumas associações capazes de ajudar os recém-chegados. Adoraria ter uma associação que apoiasse os imigrantes desde o primeiro momento em que chegam a Portugal, por exemplo, começaríamos por deixar folhetos no aeroporto e estações de comboio explicando o máximo possível sobre como aceder aos serviços públicos aqui em Portugal. Ambiciono em ter o meu próprio negócio, um café com um ambiente acolhedor para estudar ou ler. O maior obstáculo à minha ambição não é a falta de dinheiro, mas sim o valor absurdo das rendas e a extrema burocracia. O facto de o SEF não ter estado em pleno funcionamento durante a pandemia fez com que eu ainda esteja há dois anos a aguardar uma marcação. Este tempo todo que tenho aguardado não vai voltar, e tendo apenas a Manifestação de Interesse faz com que estejamos muito limitados. Tudo isto afeta negativamente a saúde mental e o bem-estar social dos recém-chegados, pois sentimo-nos insatisfeitos, oprimidos, humilhados e mal servidos, o que justifica o facto das pessoas não viverem em Portugal a longo prazo.


22 anos, Iemen/ Angola


Vim para Portugal e mantenho-me cá para acabar a minha licenciatura em Direito e poder exercer a profissão e ter o máximo possível de experiências profissionais. Eventualmente quero entrar numa firma e ser advogado para ajudar quem precise, fazer amigos e criar uma rede de contactos. Há outras profissões que gostava de experimentar, como por exemplo, ser manequim. Pessoalmente, é importante para mim conhecer pessoas novas de diferentes culturas com as quais consiga aprender mais sobre outros países e culturas. Os grandes obstáculos às minhas aspirações são, por um lado, não ter ainda cidadania portuguesa e, por isso, não tenho a facilidade para viajar e trabalhar pela Europa. Por outro lado, o racismo e a discriminação. Tendo em conta as minhas feições, acabo por ser alvo de discriminação e a ser rejeitado em certos lugares, no entanto, algumas pessoas também me acham interessante devido à minha experiência de vida. Estou aqui há sete anos, já domino melhor o português e tenho comportamentos mais portugueses, mas ainda assim continuo a ser tratado como estrangeiro. Eu compreendo, mas torna-se um pouco desconfortável para mim porque quero apenas sentir-me integrado. Embora, já me sinta melhor aqui porque as pessoas já tiveram o tempo e a oportunidade de me conhecer. Tudo o que eu aspiro é viver uma vida tranquila com estabilidade financeira e segurança. Para atingir os meus objetivos sei que tenho de trabalhar muito e obter a nacionalidade portuguesa. Assim que a conseguir sei que várias portas e oportunidades surgirão, o que me facilitará a alcançar os meus objetivos.


30 anos, Brasil


Eu não quero ser espelho porque ser espelho é refletir: eu quero ser inspiração para os outros. E, assim, evitar que eles passem por aquilo que eu passei para chegar onde estou. Quero que todos tenham a possibilidade de escolher onde querem ir e o que querem fazer e isso motiva-me a conhecer a Lisboa periférica dos imigrantes, dos trabalhadores e dos desfavorecidos. Por isso, gostaria de ser professor de história numa escola pública portuguesa e dar a conhecer outras realidades - uma cara do Brasil que talvez não conheçam com uma forma de falar diferente que deve ser respeitada. Enquanto alguém que chegou onde chegou através dos estudos, quero mostrar que é possível ser imigrante e ocupar outros cargos de trabalho além das limpezas e telemarketing. É fundamental estarmos representados em todos os lugares porque isso é ter visibilidade e sentir que podemos fazer qualquer coisa. Atualmente minha maior aspiração é terminar meu doutoramento. Para isso é preciso força, foco e atenção. Depois quero ser professor, seja na universidade ou no ensino básico. Sei que este objetivo pode ser mais difícil de atingir pelo facto de ser imigrante. Não sei até que ponto as escolas e os pais querem que seu filho aprenda história com um professor brasileiro, principalmente pela história e a relação que Portugal e Brasil estabeleceram durante muitos anos. A verdade é que tudo o que quero é ter uma vida tranquila sem necessidade de fazer para além do necessário e de fazer o não humano. Tendo um trabalho fixo e que eu goste. Talvez dando aulas, talvez trabalhando em museus ou fazendo pesquisa histórica. Um trabalho decente que dê para pagar as contas, viver bem e ajudar quem eu posso.


24 anos, Angola


Estou a estudar aqui em Portugal e tenho estado a gostar muito porque me sinto mais seguro do que em Angola e há uma estabilidade que lá não tinha. Aqui e na Europa as coisas são muito diferentes e há coisas boas e menos boas. Tive alguns choques culturais e já fui olhado com algum preconceito porque, com o crescimento da extrema-direita e as pessoas mais velhas habituadas a outros tempos, já me disseram que vim tirar empregos e muitas vezes estranham o meu sotaque e dificultam a comunicação. Além disso, em Angola as pessoas são mais extrovertidas, estabelecem logo uma relação e expõem-se ao passo que aqui aprendi a fechar-me mais e a não contar tanta coisa. Ainda assim, gostaria de trazer a minha família para cá, constituir família aqui e ter um emprego que me permitisse ter estabilidade financeira. Quero-me sentir mais em casa e criar uma associação multicultural que apoie e financie artistas locais e os seus projetos de impacto social. Seria uma espécie de restaurante / brunch place. As minhas limitações são, por um lado, internas porque preciso de arriscar mais e ter um pouco mais de ambição e, por outro lado, o país não encoraja muito os jovens na prossecução dos seus objetivos, o que faz com que eu tenha de me esforçar ainda mais.


30 anos, India


Nunca sonhei em viver fora do meu país ou fora do meu estado, não fazia ideia do que havia lá fora, mas agora estou aqui a viver em Portugal graças aos planos de Deus e estou muito feliz. Embora trabalhe como engenheiro, uma carreira que me aconselharam a não deixar, o meu sonho é ser pastor e ser obediente ao que Deus me propôs. Senti que Deus me disse para me focar na Igreja a tempo inteiro, o que foi confirmado quando surgiu a oportunidade de me tornar assistente de pastor. O meu objetivo é terminar o meu mestrado em Teologia e ajudar o próximo. As minhas aspirações em Portugal passam por impactar a vida das pessoas tanto quanto possível, ajudar a comunidade à minha volta e fazê-las felizes tanto espiritual como materialmente. Esta transição de área foi difícil porque tive de estabelecer uma nova rotina para estudar, trabalhar e ainda ter tempo para me divertir. Por vezes sinto-me em baixo, mas é importante ter uma boa perspetiva sobre os meus maiores planos e objetivos. É bom sonhar, mas é ainda melhor dar os primeiros passos e trabalhar para isso. Os pequenos objetivos são mais realizáveis e foi isso que fiz até agora. É muito importante ter bons amigos à nossa volta para nos motivar a mantermo-nos concentrados. Há sempre muitas distrações, mas é importante saber o que realmente queremos para a nossa vida, quais são as nossas prioridades e ter bons hábitos, que é o que nos levará onde queremos ir.


28 anos, GuineBissau


Vim de Marrocos para Portugal e estou a trabalhar aqui como cabeleireiro por conta própria ao mesmo tempo que estou na faculdade. Quero muito acabar o meu mestrado, mas tem sido muito desafiante porque há alguns conhecimentos que eu não tinha adquirido antes e que parece que toda a gente tem. Preciso e quero muito cultivar-me mais, é essa a minha grande aspiração aqui. Ao mesmo tempo também não me sinto totalmente integrado e capaz de perceber bem a sociedade daqui porque não tenho amigos portugueses. Os portugueses têm dificuldade em criar laços com negros e não dão espaço para interação. Gostaria muito que isso mudasse e de conseguir a nacionalidade portuguesa para trazer a minha família da Guiné para aqui e constituir a minha própria família. Espero também conseguir ter uma casa própria para que tudo isso seja mais viável.


26 anos, Bangla_ deche


Vim de Itália para Portugal, e estou realmente a gostar de estar aqui. A minha adaptação a Portugal tem sido fácil em parte porque tenho algumas competências que a minha mãe me transmitiu e que facilitam a minha comunicação com as pessoas à minha volta. Aqui nunca me senti discriminado porque o país é muito diversificado e multicultural, pelo que não me olham de forma excessiva ou com grande estranheza. A minha maior dificuldade é económica porque eu gostaria realmente de poder ajudar mais a comunidade. Há muitas pessoas necessitadas e, a longo prazo, gostaria de fazer algo pelos idosos: ter um lar totalmente livre onde tenham tudo o que precisam. Para o conseguir, preciso de apoio financeiro e de uma boa rede de contactos e amigos para me ajudarem. Este é o meu sonho, e é minha grande ambição deixar uma marca na humanidade, mesmo que já não esteja aqui.


OPPORTUNITIES (União Europeia Horizon 2020 grant agreement n°101004945) é um Projeto de investigação-ação transnacional promovido pela BEWEGING (Bélgica) com duração de 4 anos (2021-2025) que conta com diversos parceiros internacionais , incluindo ONG’s, Centros de Investigação associados a Universidades e Representantes do mundo cultural em 8 países europeus: Alemanha, Áustria, Bélgica, França, Itália, Países Baixos, Portugal e Roménia, e 2 países africanos: Gana e Senegal. A EAPN Portugal lidera a implementação do Projeto em Portugal.


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