













































zar a feliz expressão de Raymundo Faoro (23). Perdeu-se, em E&panha e Portugal, o sen tido contratual e público da po lítica e passou ela a ser enten dida, no sentir de Richard Mor se (24), de maneira estática “(...) sendo a tarefa do gover no manter uma segurança e uma estabilidade acrobáticas num mundo em movimento (...). Num corpo político que se recusava a capitular ante o dinamismo da época, a ralson d'état foi generalizada de prin cípio de governo a estratégia de enfrentamento de situações, mo ral de acomodação que permea va toda a sociedade
Nesse caldo de cultura em que também se estruturaram politicamente o Brasil e as res tantes nações latino-america nas, vingou a prática do compadno, do nepotismo, da corrup ção, como decorrências natu rais do poder entendido de for ma doméstica. A política deixou de ser a administração da re pública e se converteu no retaIhamento do Elstado como res privata entre as oligarquias e os seus paniaguados. A esse fe nômeno de desaparição da po lítica no seu sentido original fez referência Faoro (25), quando confessava em recente entrevis ta: “Eu venho acompanhando há muitos anos a política brasi leira e vejo que a corrupção é congenial. Mas existe um senti mento que eu nunca detectei antes, e que observo também na maioria das pessoas: é o sentimento de que a política acalwu. A ação e a atividade políticas se fazem em torno de um negócio, de uma vatagem que possa ser obtida do Elstado, ou que o Elstado possá patroci* nar”.
A representação, que é a questão chave na evolução polí tica dos Elstados, converteu-se no Brasil em intermediação entre a sociedade desarticulada
e os donos do poder, na obten ção de benesses e sinecuras. Não é à toa qiíe quem legisla aqui é o Executivo, mediante o artifício do decreto-lei. O Con gresso, como poder legislativo que representa os interesses dos cidadãos, além de ter sido achincalhado pelo Executivo hi pertrofiado, perdeu credibilida de perante a população, ao en-
os médios e grandes Eistados, com absoluto predomínio, na Câmara dos Deputados, das re giões econômica e culturalmente menos desenvolvidas (...)”.

A única forma que o Congresso teria de recuperar a autoridade moral é a prática e o aprimoramento da representação.
veredar pelo caminho sinuoso do favorecimento clânico, e terse convertido num “grande con domínio”, na expressão utiliza da por um Senador, ex-presi dente da Casa.
A única forma que o Con gresso teria de recuperar a au toridade moral é a prática e o aprimoramento diuturnos da re presentação. Mas infelizmente o caminho está cada dia mais cheio de pedras. A rejeição pela (Constituinte ao voto distrital é uma delas. Outra é a desigual dade gritante consagrada em matéria de representação pro porcional, tendo sido conserva do na nova Carta o mínimo de oito deputados para cada Elstado e o máximo de 60, atribuído a São Paulo. A propósito, frisa o professor Miguel Reale(26): (...) Se considerarmos que se pretende criar mais 4 unidades federativas, fácil é compreender que serão atingidos ainda mais
3) A questão econômica central: a livre Iniciativa. — Para muitas pessoas, o proble ma fundamental do Brasil, no terreno econômico, é o capita lismo. As dificuldades que en frentamos, a estagnação, o de semprego, a dívida externa e a inflação, decorrem desse mal básico: o capitalismo que suga as nossas matérias-primas, ex plora os trabalhadores, mercantiliza a vida humana. No que tange às relações internacio nais, a teoria da dependência e 0 terceiro-mundismo se encar regam de mostrar que tudo de corre de um arquétipo maniqueu: exploradores versus ex plorados. A teoria da dependên cia terminou gerando no meio acadêmico uma dependência da teoria, que não aceita explicar a nossa realidade senão a par tir do esquema dicotômico ini cial. A sociologia brasileira, aliás, de acordo com a acurada análise de Wanderley-Guilherme dos Santos (27), poleirizou-se ao
(23) Cf. FAORO, Raymundo, “Os do nos do poder: formação do pa tronato político brasileiro”, Ijt edição. Porto Alegre, Olobo, 1958, 2 vol. (24) MORSE, Richard. “O espelho de Próspero: cultura e idéias nas Américas”, (trad. de Paulo Neves; apres. de Antônio Cân dido), São Paulo, Companhia das Letras, 1988, pg. 68. (25) FAORO, Raymundo. “A política acabou: o que temos é o favo recimento, a intermediação, a corrupção”, entrcivlsta concedi da a WilUam Waack, in: “Jor nal da Tarde”, 27/02/88, Ca derno de Sábado, pg. 1. (26) REALE, Miguel. “Avaliação da * Constituinte”, in: “Jornal do Brasil”, 25/02/88, l.o Caderno, pg. 11. (27) Cf. SANTOS, Wanderley Gui lherme dos. “Ordem burguesa e liberalismo político”, ob. cit.

longo deste século ao redor des sa matriz ideológica. Talvez fosse mais acertada uma teoria que explicasse as nossas mazelas econômicas, à luz da configuração dos valores que formaram o chão sobre o qual se foram construindo as intermediária, critica liberal. A ^ instituições brasileiras. Esses sociedade civil não teve órgãos inflação crescente e baixos salár*os.
O problema do BraeU não é,
quado. O Estado é essencial mente orçamentivoro, não pro dutor de riqueza. Onde quer que
num contexto de arbítrio do Es tado. A respeito, Faoro(32) afirmou em recente entrevista: “No Brasil a corrupção se dá se encarapitou um Estado mais em escala muito maior porque forte do que a soci^ade, seja a estrutura do E]stado não pas- Rússia, na Argentina, no Pa- sou por um regime de crítica Quistâo ou no Brasil, aK os ci dadãos terão de pagar a conta
valores, para o caso de Brasil próprios para se tornar emane de Portugal, não foram pri- cipada. Aqui a atividade econônr.ordialmente os do homo faber, mica depende do arbítrio, do que fez eclodir nas Dhas Britâ nicas a revolução industrial e o capitalismo, mas os do homo predator que se dislocou da Pe nínsula em direção ao Novo Mundo, para lhe arrancar as riquezas sem que intermediasse mais trabalho que o de guerrear 0 infiel, como foi feito contra os muçulmanos em Espanha e Portugal(28).
Passado a primeira onda de conquista do Novo Mundo, a mentalidade do lucro obtido em guerra contra o infiel sofreu uma transformação, no sentir de Oliveira Viana(29). A partir do momento conhecido como "fumos da índia”, a nobreza decadente portuguesa, tornada caudatária das sinecuras régias, introjetou uma escala de valo res pré-capitalistas, típica do mercantilismo. Dois elementos podemos destacar inicialmente nessa escala: horror ao traba lho produtivo e consumo suntuário. O favor real, e este é o ter ceiro elemento da nova escala de valores, garante o consumo suntuário. Assim teriamos ar mada a equação ócio sinecura = consumo suntuário, típi ca da classe ociosa estudada por Veblen(30).
O momento pombalino(31), com a idéia de que compete ao Estado empresário, auxiliado pela ciência aplicada, garantir a riqueza da Nação, completa o quadro de mentalidade mercan tilista. Assim, podemos nos ex plicar como hoje a nossa reali dade econômica se desenvolve
Ê muito ilustrativa, a res peito, a comparação feita por Simon Schwartzman (34) entre a Argentina e a Austrália. A pri meira, que ocupava um lugar à testa do terceiro mundo nas dé cadas de vinte e trinta, graças à livre iniciativa aplicada à pro dução agropecuária, regrediu verticalmente a partir da as censão do populismo peronista. A segunda, que no período an terior aos anos quarenta era menos desenvolvida que a Ar gentina, nos últimos 30 anos a superou largamente, graças ao progresso econômico decorrente da economia de mercado. Se melhante consideração poderia mos fazer em relação ao Brafavor do EIstado, de um emprés- sil, face a países que há vinte timo, de uma vantagem do Ban- anos estavam atrás dele e que CO Central. O Banco Central escolhe os seus interlocuto res. Poderia escolher a mim, podería escolher a você pa ra dar uma patente de banco. (...) Ê um monopólio do dinhei ro, embora não seja vitalício, pois um telefonema de um bu rocrata do Banco Central tam bém acaba com ele”.
pois, o capitalismo, é o pré<apitaUsmo que anima a nossa
burocracia setecenüsia.
O problema do Brasil não é pois p capitalismo, é o pré-capitalismo que anima a nossa bu rocracia setecentista. Para a visão mercantilista, a riqueza não se produz: se toma de al guém. Esse é o pressuposto que anima à teoria da dependência. Passou inadvertida para os que assumem esse pressuposto, a descoberta de Adam Smith(33), de que a riqueza se produz. Ora, na produção de riqueza um sistema que abra o caminho à livre iniciativa é o mais ade-
(28) a. RODRIGUEZ, Ricardo Vélez. “Liberalismo y conservatismo en América Latina”, Bogo tá, Tercer Mundo, 1978. (29) Cf. VIANA, Francisco José de Oliveira. “Introdução à história social da economia pré-capitalista no Brasil”, 2.a edição, (intr. de Antônio Paim). Belo Hcrlzonte, Itatiaia, 1988. (30) Cf. VEBLEN, Thorsteln. “A Alemanha imperial e a revolu ção industrial”; “A teoria da classe oci<»a”, (trad. de BollLamounicr e Olívia Krahensbühl), 2.a ed., São Paulo, Abril Cultural, 1985, pgs. 35 e seg. (31) Ci. PAIM, Antônio (org. e intr.), “Pombal na cultura brasileira”, ob. cit. (32) FAORO, Raymundo. “A poUtica acabou...”, entrevista citada. (33) Cf. NOVAK, Michael. “Será a liberdade?” (trad. de Octávio N. C. Bemardes), Rio de Janei ro, Nordica, 1988. (34) Cf. SCHWARTZMAN, Simon. “Bases do autoritarismo brasi leiro”. ob. cit. var






















