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Paulo Geiger

ax2 + bx + c = 0 [-b ± √ (b2 - 4ac)]/2a - x = 0

Paulo Geiger

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Olho para a página em branco e fico pensando sobre o que escrever, que faça cócegas no raciocínio dos leitores. Como se hoje em dia faltassem assuntos, em qualquer lugar deste planeta, a qualquer momento, em qualquer contexto... Mas este é exatamente o problema atual de quem se dispõe a escrever uma crônica, uma análise, um protesto, um esquete humorístico sobre o que está acontecendo ou prestes a acontecer: é que tudo está acontecendo ou prestes a acontecer ao mesmo tempo, desde os confins do universo até o nosso próprio quintal. O problema é que em nossas equações de funcionamentos e comportamentos há cada vez menos coeficientes fixos (coisas tipo responsabilidade, equanimidade, probidade, humanidade) e cada vez mais variáveis (quem nos conduz, quais ideias prevalecem, que interesses atuam), tornando imprevisível o que vem depois do sinal de igualdade. Aonde estamos sendo levados, ou melhor, aonde estamos levando a nós mesmos e nossos descendentes? O Brasil de hoje seria uma boa metáfora para essa perplexidade, se o absurdo das variáveis não fosse tão grande e concreto que transforma a metáfora em vida real. No início, eram fatos, descobertas, eventos que chocavam em sua veracidade nua e crua. Hoje, sabemos que são bolhas, inevitáveis quando a caldeirada ferve. Não são fatos isolados, não é ‘só’ corrupção, empoderamento, interesses escusos, predação, é toda uma concepção de relacionamento entre estado e sociedade (e a natureza) que está em jogo. E não basta prender ou cassar, ‘empoderar’ outros, desjudicializar a política ou despolitizar a justiça, trata-se de adotar um modelo que, por sua própria natureza, não permita que isso aconteça. Um estado que seja a própria sociedade assumindo as rédeas de si mesma, e não um poder ‘acima’ da sociedade, que a manipule como sustentáculo e alimento de si mesmo (e de seus dirigentes eventuais). As ideologias, sejam de direita, de esquerda, ou ‘liberal’, não resistiram ao modelo, as variáveis variaram demais e submeteram os coeficientes. A equação desandou.

O mundo, como ‘sociedade de nações’, parece que ficou mais ‘reacionário’, não no sentido de resistir a mudanças (geralmente conduzidas pela esquerda), mas no de reagir mais do que agir. E como cada reação provoca uma cadeia de reações contrárias, o processo passou a ser não o de construir um modelo de convivência entre homens, nações, ideias e a natureza (e o universo, já que a Terra já não basta para alguns), e sim de negação, e as subsequentes negações de negações. Sabemos o que não queremos (eles sabem o que não querem), seja estar na União Europeia, que mexicanos entrem no país, que a oposição vença as eleições, que a Ucrânia seja independente, que a secularidade prevaleça sobre a religião em política, que o ‘progresso’ seja prejudicado por considerações ecológicas, enfim, NÃO queremos abrir mão do que temos hoje, ou do queremos ter hoje, dane-se o resto. E a reação é tão forte, tão ancorada, que se transforma automaticamente em radicalização, e quem não pensa como eu passa a ser meu inimigo, nós e eles, patriotas e traidores, coxinhas e mortadela, I first, etc. etc. Aonde leva isso, no outro lado do sinal de igualdade da equação? Zero.

Na visão cosmológica, se alguma inteligência extraterrestre estivesse observando o mundo e a humanidade, nesse processo de variação das variáveis, o zero corresponde à autodestruição. Os habitantes de um minúsculo ponto entre bilhões de outros, um momento numa história de milhares de anos comparados a milhões de bilhões de anos de evolução, em vez de acomodar num planeta vulnerável, de recursos limitados, de modo que sua sobrevivência se prolongue na maior parte do tempo de vida desse planeta, que é finito, decidem ser ‘contra’. Contra o que os incomode hoje. Que os prive, não dos confortos de que já usufruem, mas de continuar ampliando a exploração dos recursos da Terra para mais acúmulo de ‘riqueza’, de poder (ou de sensação de poder).

Deixo a questão da equação israelense para outra ocasião. Já temos falado sobre ela, mas as variáveis continuam mudando.

Ainda há tempo de reformular a equação. Reforçar os coeficientes fixos, que expressem nossa vontade do que queremos que seja, e não só nossa oposição ao que não queremos. Mas implica também querer não só o que hoje é vantajoso para nós pessoalmente, para nossa família, nossa nação, nossa geração, mas principalmente o que permita uma existência honrosa, estável, confortável, pacífica, para todos, todas as famílias, todas as espécies, todas as nações, todas as gerações, sempre. Pois se isso valer para todos, com certeza valerá para nós. E se não valer para todos, talvez estejamos entre os perdedores, por mais que pensemos ou pretendamos ser os vencedores.

Que x e y (os corruptos, os radicais, os chauvinistas, os predadores) sejam resolvidos por a, b, e c. (nós).

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