Revista Abranet . edição 38 . junho-agosto 2022

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editorial Eduardo Neger Presidente da Abranet

O novo fio da meada Na rotina das empresas de internet, o que nunca muda são as frequentes e inevitáveis mudanças, seja de tecnologias, seja de modelos de negócio, ou mesmo de legislação. Uma das mais recentes é a chegada das redes neutras. A forte entrada das companhias de infraestrutura de fibra irá modificar a forma como nos posicionamos frente ao cliente e competimos entre nós. Se – ou quando – a presença da rede física não for mais um diferencial, nosso escopo de trabalho de serviços ficará centrado nas aplicações, na experiência do cliente e no desenvolvimento de novos produtos. A matéria de capa desta edição mostra que os especialistas concordam que as redes neutras vieram para ficar. Um argumento a ser levado em conta é o fato de seu uso diminuir a necessidade de investimentos na construção de redes próprias. Logicamente, cada um vai adotar as redes neutras, parcial ou totalmente, conforme sua estratégia empresarial e os locais em que atua. De qualquer forma, nesse caso e em muitos outros, precisamos agir com as mentes abertas, dispostas a analisar o que é novo. Quem detalha isso muito bem em entrevista especial à Revista Abranet é Edmundo Matarazzo, consultor e membro do Conselho Consultivo da entidade. Matarazzo, com sua experiência de 30 anos no setor de telecomunicações, dos quais 10 anos na Anatel, alerta que estamos mirando o futuro com olhos no retrovisor. Ele é enfático ao advertir que “perdemos o fio da meada. O instrumento poderoso é o smartphone. Mas a cabeça ainda está no STFC.” Para o consultor, a Anatel trabalha com uma lei estabelecida quando o mundo ainda era praticamente todo com monopólio estatal e o serviço máximo era o STFC, mas esse não é mais o mundo de hoje. Ele salienta que estamos presos em discussões do cami-

nho e não do destino. Não deixe de ler; é imperdível. Esta edição mostra também que a desigualdade digital diminuiu, mas que ainda é preciso trabalhar muito, como aponta a pesquisa TIC Domicílios, feita pelo Cetic.br/NIC/br. Na zona rural, a penetração passou de 53% em 2019 para 71% em 2021; também cresceu na área urbana, mas menos: de 75% em 2019 para 86% em 2020, com ligeira redução para 83% em 2021. E o que nos motiva é que parte do crescimento da internet nas áreas rurais veio das empresas de internet. A edição trata ainda de mais um desafio: como contratar e reter os profissionais de tecnologia mais qualificados? Além disso, falamos da grave questão da segurança, com o aumento dos ataques de ransomware e o pagamento de resgate para recuperar os dados roubados, que colocam em cena a figura das seguradoras. A Abranet defendeu a criação de um ambiente regulatório propício para que as pequenas e médias empresas, que representam cerca de 99% dos negócios brasileiros, possam desenvolver e utilizar tecnologias de Inteligência Artificial. Com tudo o que nos desafia, é preciso estarmos atentos e fortes! Bons negócios! Boa leitura! abranet.org.br junho / julho / agosto 2022

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índice 05 | abranet responde Com a redução do ICMS, quais procedimentos as empresas de internet devem adotar? A Abranet recomenda aos associados o repasse integral da redução do imposto para as contas. E um cuidado especial na comunicação aos clientes sobre o impacto da medida.

Conselho Editorial Eduardo Neger neger@abranet.org.br

Eduardo Parajo

parajo@abranet.org.br

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Redes neutras:

a competitividade vai além da infraestrutura

A exemplo da telefonia móvel, há alguns anos, o mercado de internet fixa está prestes a passar por uma revolução, como ocorreu com as operadoras quando venderam suas torres. A forte entrada das companhias de infraestrutura de fibra irá mudar a forma como as empresas de internet se posicionam frente ao cliente e competem entre si. Se – ou quando – a presença da rede física não for mais um diferencial, o escopo de trabalho das prestadoras de serviços ficará centrado nas aplicações, na experiência do cliente e no desenvolvimento de novos produtos.

Gerência Executiva Roseli Ruiz Vazquez gerente@abranet.org.br

Projeto, Produção e Edição

Editora Convergência Digital editora@convergenciadigital.com.br Tel: 011-3045-3481

12 | ENTREVISTA . Edmundo Antonio Matarazzo

Direção Editorial / Editora-chefe

Telecom decide o futuro com olhos no retrovisor. Para o veterano do setor e conselheiro da Abranet, debate sobre revisão e unificação de serviços preserva mentalidade da telefonia fixa. “Nós nos perdemos em discussões do caminho e não falamos do destino”, afirma.

analobo@convergenciadigital.com.br

Ana Paula Lobo Edição

Bia Alvim

bia.alvim@pebcomunicacao.com

15 | carreira Como contratar e reter profissionais de alto quilate? Empresas de internet enfrentam o desafio da falta de especialistas para a jornada de transformação digital no Brasil.

18 | Segurança A nova cara do ransomware. Esse tipo de ataque segue crescendo, e a proporção das organizações afetadas mais que dobra no Brasil. Os impactos financeiros são enormes, e as seguradoras entram em cena.

Reportagem / Redação

Roberta Prescott

prescottroberta@gmail.com

Luis Osvaldo Grossmann ruivo@convergenciadigital.com.br Edição de Arte e Diagramação

Pedro Costa

pedro@convergenciadigital.com.br

22 | LEGISLAÇÃO IA: ambiente regulatório tem de ser favorável às PMEs. Em contribuição para a regulamentação sobre inteligência artificial, a Associação Brasileira de Internet (Abranet) sugere prioridade para o fomento à inovação.

24 | PANORAMA Conectividade avança nas áreas rurais. As empresas de internet tiveram papel decisivo para levar conectividade às áreas mais remotas do Brasil. A desigualdade digital diminuiu, mas ainda há lacunas a serem preenchidas, revela a pesquisa TIC Domicílios 2021.

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28 | CONEXÃO 5G e Wi-Fi 6E geram novos modelos e oportunidades de negócios. Testes de uso outdoor. Brasil em risco. Brasileiro quer o banco na palma da mão. PIX em alta. Inteligência Artificial e governos. Sem internet.

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abranet responde Tem uma dúvida? Quer que um especialista da Associação Brasileira de Internet responda? Escreva para o Abranet Responde. O e-mail é abranetresponde@abranet.org.br

Com a redução do ICMS, quais procedimentos as empresas de internet devem adotar? Um dos temas mais debatidos nos últimos dias no segmento de internet foi a redução do ICMS imposta para combustíveis, energia, telecomunicações e internet, com a fixação da alíquota máxima de 18%. A medida tem impacto direto nos preços dos serviços prestados pelas empresas de comércio eletrônico, datacenter e provimento de internet. A Abranet recomenda aos associados o repasse integral da redução do imposto para as contas. Também aconselha um cuidado especial na comunicação aos clientes sobre o impacto da medida. Deve-se ressaltar que a redução visa a beneficiar os consumidores, portanto, os valores dos bens e serviços envolvidos devem ser recalculados segundo a nova alíquota. Não se trata de ampliar a margem das empresas. O benefício deve ser repassado ao consumidor final. Pela lei, os estados não podem cobrar alíquota de ICMS acima daquela aplicada para as operações gerais, que, pelo país, variam entre 17% e 18%. São Paulo, por exemplo, já reduziu a alíquota para 18%. A Abranet reforça que as empresas de internet e associadas da entidade são apenas intermediárias no recolhimento do imposto e devem repassar toda a redução integralmente para o consumidor final. A Abranet alerta ainda que: a Em geral, os serviços pós-pagos são referentes ao período mensal fechado, por exemplo: 1 a 30 de junho, a ser pago ao longo do mês de julho nas datas escolhidas pelos consumidores; b A cobrança referente ao período de junho deve

considerar a alíquota anterior até o dia 22 de junho de 2022 e que a nova alíquota se aplica a partir de 23 de junho de 2022, portanto, gerando uma situação atípica que deve ser explicada aos clientes; c Para as empresas optantes do Simples Nacional não há alteração, visto que este regime já considera alíquotas distintas (menores); e d As regras para emissão da Nota Fiscal de Serviço de Telecomunicações (NFST) possibilitam a comunicação da alteração em campo específico do próprio documento fiscal. É bom observar ainda que a medida está em disputa judicial, uma vez que os governadores dos estados de Pernambuco, Maranhão, Paraíba, Piauí, Bahia, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Sergipe, Rio Grande do Norte, Alagoas, Ceará e do Distrito Federal entraram com uma Ação de Direta de Inconstitucionalidade contra a Lei 194/22, que reduziu o ICMS. O caso vai ser julgado no plenário do Supremo Tribunal Federal, na volta do recesso, em agosto. abranet.org.br junho / julho / agosto 2022

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capa

Roberta Prescott

Redes neutras:

a competitividade vai além da infraestrutura A chegada de mais fornecedores provendo redes neutras e a expansão da fibra ótica impõem desafios às empresas de internet. Enquanto o cenário se consolida, as prestadoras de serviços terão de entender como esse novo modelo impacta seus negócios. A exemplo da telefonia móvel, há alguns anos, o mercado de internet fixa está prestes a passar por uma revolução, como ocorreu com as operadoras quando venderam suas torres. A forte entrada das companhias de infraestrutura de fibra irá mudar a forma como as empresas de internet se posicionam frente ao cliente e competem entre si. Se – ou quando – a presença da rede física não for mais um diferencial, o escopo de trabalho das prestadoras de serviços ficará centrado nas aplicações, na experiência do cliente e no desenvolvimento de novos produtos. Especialistas apontaram que o caminho será longo até as chamadas redes neutras se expandirem a ponto de terem capilaridade suficiente para levar as prestadoras de serviços de telecomunicações a reverem suas estratégias. Isso porque um dos diferenciais das pequenas prestadoras é instalar redes, justamente, nos locais menos atraentes às grandes operadoras. No entanto, as empresas de internet já se deparam com esses novos fornecedores. E isso pode representar para elas tanto uma alternativa interessante, inclusive de capitalizar vendendo suas redes, quanto um aumento de concorrência, já que os operadores de redes neutras facilitam o ingresso de novos players, pois derrubam uma grande barreira de entrada, que é o investimento em construção de infraestrutura. Diante dessa encruzilhada, qual caminho seguir? Andre Kriger, CEO da FiBrasil, avalia que, na perspectiva das prestadoras de serviços de internet, há os que veem como uma superoportunidade e outros, como ameaça. “É uma oportunidade, um jeito de aumen-

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“[As redes neutras] são um jeito de aumentar a cobertura do provedor de internet sem fazer grandes investimentos.”

“É uma alternativa interessante, porque não existe Capex para o provedor de internet e sabemos que o acesso ao capital é difícil. Contratando tudo, ele não precisa investir em rede.”

Andre Kriger FiBrasil

Rafael Marquez V.tal

tar a cobertura do provedor de internet sem fazer grandes investimentos e sem fazer licenciamento de postes ou se preocupar com o campo. Os provedores de internet que veem isso como oportunidade têm foco no cliente, em criar pacotes e produtos diferenciados”, afirmou. Já os que enxergam como desafio e ameaça, segundo ele, são, normalmente, empresas que possuem uma rede de altíssima qualidade, licenciada pelas elétricas. “É uma oportunidade ou um desafio, dependendo do estágio de maturidade do provedor de internet”, resumiu Kriger. Ele disse acreditar que o modelo de redes neutras vai facilitar a expansão da oferta no interior do País, já que as principais cidades e capitais estão cobertas. Agora, o natural é expandir para lugares mais distantes do centro. “A gente está muito focado em cidades pequenas e médias que não são tão bem servidas.” Para Rafael Marquez, diretor de marketing da V.tal, o conceito de infraestrutura como serviço (IaaS, na sigla em inglês) é um modelo de economia compartilhada, que dispensa a posse de ativos e requer uma forma eficiente de gestão de recursos. “É uma grande viabilizadora de complemento de rede para os provedores de internet”, opinou. Trata-se, segundo Kriger, da FiBrasil, de um movimento cauteloso, em que, independentemente da estratégia, ao entrar em uma nova cidade, quer seja com rede neutra ou própria, a empresa de internet precisa conhecer o negócio e identificar como se diferenciar. Para os players fora do mundo de telecomunicações, a cautela deve ser ainda maior. Gigantes como âncoras A V.tal conta atualmente com 400 mil quilômetros de rede de fibra ótica e presença em 2,3 mil municípios. São ainda 230 cidades com modelo de FTTH pronto. É, segundo Marquez, uma rede que dá à empresa de internet a opção de alugar e fazer ativação do cliente. São duas formas de comercialização: o modelo tradicional de atacado (transporte e capacidade) e, no mundo FTTH, um modelo de banda larga como serviço. Nesse último, a V.tal tanto oferece FTTH fim a fim, fazendo toda a conectividade para o provedor, inclusive a ativação no cliente, modem, network analytics e monitoramento, quanto entregando a fibra no poste, cabendo à prestadora de serviços fazer a ligação até a casa do cliente. “O sucesso do provedor vai ser o nosso sucesso também”, ressaltou. “É uma alternativa interessante, porque não existe Capex para o provedor de internet e sabemos que o acesso ao capital é difícil. Contratando tudo, ele não precisa investir em rede. E temos toda uma integração para o sistema de gestão para o provedor”, completou o diretor de marketing da V.tal. Segundo Marquez, a companhia, que nasceu com a venda dos ativos da Oi e que hoje é controlada pelo BTG Pactual, tem cerca de 25 contratos assinados com empresas de internet em várias regiões brasileiras e de portes variados. A Oi é o cliente âncora da V.tal. No caso da FiBrasil, quem está por trás é a Telefônica (Brasil e espanhola). A companhia começou com

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1,4 milhão de casas passadas e tem hoje 2,8 milhões. Kriger não revelou nomes de clientes, mas disse que, além da Vivo, são mais de dez empresas de internet, entre os que almejam atuar em uma cidade específica, aqueles que querem alcançar o Brasil todo e novos entrantes. A cobrança da FiBrasil é feita por cliente conectado. “Se o provedor de internet tem receita, a gente tem também. A gente monta a estratégia, formata o serviço e a precificação de acordo com a necessidade do provedor de internet. É um modelo flexível”, disse Andre Kriger. A I-Systems, criada com a aquisição da FiberCo (TIM) pela IHS Towers em novembro de 2021, está focada em atender à crescente demanda por serviços de banda larga no mercado nacional, oferecendo serviços para prestadoras e operadoras, por meio do modelo de infraestrutura neutra. Conta com cerca de 70 mil quilômetros de fibra em sua rede secundária, abrangendo nove estados do Brasil e chegando a aproximadamente 6,6 milhões de domicílios passados (HPs) – dos quais 3,5 milhões em fibra até a casa (FTTH). Daniel Cardoso, CEO da I-Systems, explicou que a companhia atua dentro do modelo de atacado puro, baseado no conceito de rede neutra de fibra. “Não atendemos a clientes finais, sejam B2C ou B2B, mas focamos em ISPs e operadoras nacionais ou regionais que desejam crescer nesses mercados, com menor time-to-market.” Segundo Cardoso, “os ISPs desempenham um papel importante como agentes da transformação digital, levando conectividade a lugares antes inacessíveis, ampliando o alcance das tecnologias e conectando pessoas e empresas pela primeira vez à internet.” Ele destacou que as empresas de internet são, sem dúvida, parte do foco de mercado da companhia. O modelo de negócios da I-Systems está alinhado com o conceito de rede neutra. Cardoso ressaltou que os clientes (prestadoras e operadoras) economizam o Capex necessário para expandir suas redes e pagam um valor por usuário conectado, além de taxas de serviço pelo uso dessa infraestrutura. “Se um dos nossos clientes necessitar da construção de uma nova rede para chegar a uma nova região, este ‘cliente âncora’ assume um compromisso mínimo quanto à utilização da rede e, em contrapartida, tem uso exclusivo durante os primeiros seis meses nessa região”, detalhou. Outro operador de redes neutras, a American Tower do Brasil tem vários clientes de diferentes portes já operacionais. “Quando concebemos nosso modelo de rede neutra

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“Os ISPs desempenham um papel importante como agentes da transformação digital, levando conectividade a lugares antes inacessíveis.” Daniel Cardoso I-Systems

para o lançamento, em 2019, buscamos maximizar a eficiência do compartilhamento. A rede nasceu planejada para ser multioperadora, ou seja, com cada um dos elementos e arquitetura projetados para conceber múltiplas operadoras dos mais diversos portes”, disse Daniel Laper, diretor de novos negócios e IoT da American Tower do Brasil. A companhia opera dentro de um modelo de rede ativo, que vai das OLTs (do inglês optical line terminals, ou equipamentos ópticos terminais), que ficam em estações nas cidades, até o poste ou edifícios, próximos das casas dos clientes finais. “Entendemos que esse é o modelo mais eficiente do ponto de vista de infraestrutura, pois permite o compartilhamento de postes, dutos, operação e manutenção, energia e até mesmo fibra, uma vez que o compartilhamento se dá no nível do feixe de luz”, completou. Em 2018, a American Tower concluiu a compra de ativos da Cemig Telecom. Atualmente, conta com 24 mil quilômetros de rede de fibra óptica e, em 2019, lançou sua rede neutra FTTH, replicando o modelo bem-sucedido de compartilhamento de torres. Com seus 46 mil quilômetros de rede de fibra instalados, a companhia opera dentro de modelos de FTTH, FTTT (Fiber-to-the-tower) e atacado. Infraestrutura como commodity Se, de um lado, ao contratar um operador de rede neutra, a prestadora de serviços não se preocupa, por exemplo, com a manutenção e evolução da rede, de outro, está usando uma infraestrutura que pode ser usufruída por concorrentes. A competição ficará nos diferenciais que ela agregar e no atendimento ao cliente. É um movimento parecido com o que ocorreu, no passado, com as torres. “Não era ali que as telecoms iam competir. Era mais inteligente sob a ótica financeira não competir


“As redes neutras otimizam e racionalizam os investimentos no setor, naturalmente fomentando o compartilhamento de infraestrutura, o que evita a sobreposição de redes.” Daniel Laper American Tower do Brasil

ali [nas torres]. No mundo de provedor de internet, o nascimento das redes neutras leva para o mesmo raciocínio. Você vai ganhar o jogo na prestação de serviço para o cliente”, defendeu Rafael Marquez, diretor de marketing da V.tal. No entanto, ele mesmo reconhece que, ainda que simplifiquem a vida das empresas de internet, por serem neutras e compartilhadas, essas redes de fibra ótica estão amplamente acessíveis e diminuem a barreira de entrada para novos competidores. É o caso da Obvious, que partiu do zero e contratou a V.tal para ofertar serviços de banda larga fixa. “O cenário do setor já mudou e há modelos novos que vieram para ficar e para democratizar mais o acesso à infraestrutura. Ganha o jogo quem tiver melhor serviço”, enfatizou Marquez. Na mesma linha, Paul Sassine, CEO da Ava Telecom, disse que as redes neutras serão um movimento natural, assim como se passou com as torres na telefonia móvel. “Sem os pequenos provedores de internet não haveria internet no interior do Brasil. Hoje, as cidades têm bastante redes graças a eles. Mas só faz sentido ter rede própria onde estão sozinhos”, avaliou o CEO, explicando que a infraestrutura é diferencial competitivo quando as prestadoras chegam com as redes e não são mais uma. A Ava Telecom tem cerca de 70 clientes na base e trabalha com a meta de alcançar cem e dobrar a extensão de sua rede. “Nós só vendemos para B2B e cobramos por tráfego, vendemos a banda, que é diferente de quem faz a última milha, que cobra por cliente. O ISP contrata a banda e se preocupa com a última milha”, explicou Sassine. Mas ele alertou: “as redes neutras vão fomentar a concorrência.” Para Andre Kriger, da FiBrasil, estamos caminhando para um momento em que a infraestrutura passiva ótica é cada vez mais commodity, estando disponível para todos e com condições isonômicas de preços. Assim, a diferencia-

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Momento para vender ativos? O avanço das operadoras de redes neutras tem agitado ainda mais o movimento de fusão e aquisição (M&A) entre empresas de internet. À consolidação do mercado, com as prestadoras indo às compras, somase a oportunidade de elas venderem suas redes às operadoras de redes neutras. A FiBrasil, de acordo com o CEO da companhia, Andre Kriger, tem interesse em comprar infraestrutura e analisa várias oportunidades. “Alguns provedores de internet entenderam que vão existir as ‘infraco’ e as ‘clientco’; e vão focar no que são bons, que é atender aos clientes. Vários têm nos procurado para entender que tipo de operação de M&A pode ser feita”, detalhou. O mercado está bastante aquecido, com consolidação entre as prestadoras de serviços de internet e delas com as redes neutras. De acordo com Kriger, vai vencer a competição quem provê o melhor serviço, e nisso quem ganha é o cliente final. Rafael Marquez, diretor de marketing da V.tal, disse que o DNA da companhia é construir e não adquirir infraestrutura pronta, mas acrescentou que “eventualmente não descarta avaliar algum ativo”. A aquisição poderia ser para chegar a lugares onde ainda não está. Mas ele lembrou que um dos conceitos da rede neutra é minimizar o conflito de muitas infraestruturas e que a sobreposição não faz sentido para o modelo. O mercado de banda larga é descentralizado, fragmentado e liderado por um número de pequenos provedores de internet que cresce ano a ano, apontou Daniel Cardoso, CEO da I-Systems, acrescentando que a companhia analisa o cenário constantemente e considera possíveis aquisições, se fizerem sentido dos pontos de vista estratégico, técnico e de custo. Já Paul Sassine, CEO da Ava Telecom, considera que a grande onda de consolidação já passou e que, provavelmente, vão coexistir prestadoras de serviços de internet, redes neutras e grandes empresas. “Não tem dinheiro para consolidar o mercado inteiro. Vão coexistir”, justificou. “As concessionárias já optaram por criar rede neutra e focar na parte de serviço, que é o que sabem fazer. O diferencial dos ISPs é o cliente; eles têm de se preocupar em atender ao cliente”, completou.

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Demanda mais fraca Muitas prestadoras de serviços de internet seguem instalando suas próprias infraestruturas, o que, na visão de entrevistados para esta matéria, faz sentido se no local não houver redes. Mas, segundo Celso Motizuqui, diretor de vendas para o Brasil da Furukawa, o segmento deu uma retraída, diminuindo as expansões de redes e focando mais em vendas. Segundo ele, houve, no início de 2022, uma certa retração no mercado de empresas de internet quanto à compra de equipamentos para expansão de rede. “Na nossa leitura, há um movimento de fusão e aquisição que vem acontecendo de forma forte, com os fundos adquirindo diversos provedores de internet. Então, tem este movimento de fusão e aquisição, de aquisição por parte de fundos e o movimento de integração entre os provedores de internet, com eles se unindo para criar operações mais fortes”, afirmou. “Dentro disso, sentimos que muitos provedores de internet estão focando em rentabilizar os investimentos que foram feitos, em conseguir trazer mais clientes com as redes construídas.” Para ter assinantes, é preciso fazer mais investimentos, mas existem dificuldades. O mercado está sofrendo, de um lado, com uma certa falta de equipamento GPON (sigla para Gigabit Passive Optical Network, Rede Óptica Passiva Gigabit) e, de outro, com os provedores de internet de médio e pequeno portes em compasso de espera para saber o que vai acontecer. “De maneira geral, muitos já programaram as entregas dos equipamentos, principalmente, focando na questão de aumentar as vendas e a base de assinantes. E tem um segundo movimento que é das operadoras avançando em cidades em que anteriormente elas não estavam. Fatalmente, está aumentando a questão da concorrência”, avaliou Motizuqui. Já o CEO da WDC, Vanderlei Rigatieri, avaliou que as empresas de internet continuam sendo uma grande mola propulsora da implantação de fibra ótica no Brasil, porém, disse que a expansão está mais lenta que no passado. “Mas também imaginamos que as pessoas não terão duas conexões de fibra ótica em casa”, ponderou.

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“Sem os pequenos provedores de internet não haveria internet no interior do Brasil. Hoje, as cidades têm bastante redes graças a eles. Mas só faz sentido ter rede própria onde estão sozinhos.” Paul Sassine Ava Telecom

ção está no portfólio de serviço, nas ofertas e em como se cria proposta de valor para os clientes. Com pouco mais de três anos de operação comercial, a American Tower do Brasil observou que as redes neutras ativas têm um componente tecnológico importante, sendo um investimento de infraestrutura pensado para o longo prazo e considerando as evoluções tecnológicas. “Outro ponto que observamos foi a importância de facilitar o processo de integração das operadoras à nossa infraestrutura. Toda a integração na nossa rede é feita através de APIs, que são interfaces e padrões que conversam com os sistemas e processos de cada operadora. Citando um caso prático, uma das nossas operadoras clientes em dois meses estava integrada e ativando seus primeiros clientes na nossa infraestrutura”, acrescentou o diretor de novos negócios e IoT da companhia, Daniel Laper. Laper defendeu que “as redes neutras otimizam e racionalizam os investimentos no setor, naturalmente fomentando o compartilhamento de infraestrutura, o que evita a sobreposição de redes e, portanto, investimentos redundantes e ineficientes.” Sob a perspectiva das empresas prestadoras de serviços, ele argumentou que a utilização de redes neutras permite reduzir custos de Capex com a implementação de novas estruturas, ao mesmo passo em que possibilita direcionar recursos e esforços à melhoria da qualidade da prestação dos serviços de telecomunicação aos usuários finais. “O modelo de compartilhamento favorece a expansão das redes de telecomunicações, servindo como um importante catalisador à expansão da conectividade e ao mesmo


“Um grupo grande de provedores de internet tem vontade de crescer, mas não tem condições. Para eles, o caminho é interessante, até porque a própria rede neutra pode conseguir disponibilizar e profissionalizar mais serviços.”

“Não estamos vendo muitos provedores aderindo em massa à rede neutra. É opção interessante, mas o que temos percebido é que o provedor de internet ainda está preferindo construir a sua rede.”

Celso Motizuqui Furukawa

Vanderlei Rigatieri WDC

tempo contribuindo para a eficiência dos investimentos do setor como um todo”, disse. Os investimentos da American Tower em redes de fibra óptica alcançaram a marca de perto de US$ 1 bilhão nos últimos quatro anos em países da América Latina e da África. O Brasil é um país-chave na estratégia da empresa. Celso Motizuqui, diretor de vendas para o Brasil da Furukawa, disse que tem observado provedores de internet avaliando a questão da rede neutra como forma de expansão. “Em muitas cidades, temos visto dificuldades relacionadas aos postes e, quando se coloca a conta de investimentos no papel, ela favorece as redes neutras”, apontou. Na avaliação do diretor de vendas da Furukawa, apostar ou não em redes neutras versus manter infraestrutura própria depende de vários fatores. “Alguns ISPs estão satisfeitos com o tamanho de empresa que eles têm; para outros, a rede, além de ser patrimônio, é o sonho da vida, e para estes é mais difícil deixar de ser empresa de engenharia para ser de prestação de serviço. Mas tem um grupo grande de provedores de internet que tem visão diferente, tem vontade de crescer, mas não tem condições. Para eles, o caminho de redes neutras é interessante, até porque a própria rede neutra pode conseguir disponibilizar e profissionalizar mais serviços”, justificou. E há um outro fator a ser levado em consideração. Segundo Celso Motizuqui, as operadoras de redes neutras tendem a implantar de duas a três vezes mais rapidamente que as prestadoras de serviços de internet. “Isso também está fazendo os provedores partirem para esse modelo”, acrescentou, citando uma solução pré-montada de fábrica

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como um dos fatores que agilizam a implantação de redes a um custo menor que a fusão tradicional. Já da perspectiva dos operadores de redes neutras, o diretor de vendas para o Brasil da Furukawa disse que a preocupação delas reside em conseguir, na mesma rede, prestar diversos serviços para diversos clientes e com demandas diferentes. “Até pouco tempo atrás, você tinha uma rede que chegava à sua casa e tinha de atender a uma empresa, a um prédio corporativo que precisava de um SLA diferente. A ideia agora é ter dentro da mesma rede a possibilidade de atender aos mais diversos serviços”, explicou. O CEO da WDC, Vanderlei Rigatieri, é uma voz dissonante. Segundo ele, as redes neutras ainda estão muito associadas às operadoras âncoras. “Não estamos vendo muitos provedores aderindo em massa à rede neutra. É opção interessante, mas o que temos percebido é que o provedor de internet ainda está preferindo construir a sua rede, até porque existem opções para construir sem investimentos altos, como a WDC, que tem o BTS (built-to-suit)”, apontou. Rigatieri disse acreditar que a rede própria vai ser sempre maior que a rede neutra, mas que os provedores de internet podem adotar a rede neutra para testar mercado, por exemplo, para verificar se entrar em uma determinada cidade é rentável ou não. “Posso ir com a rede neutra que está lá e testar meu serviço. Se for bom, posso pensar em construir minha rede depois.” Outra possibilidade, segundo ele, é usar a rede neutra como uma extensão da infraestrutura própria. De qualquer maneira, assim como os outros entrevistados, o CEO da WDC disse que o conceito de rede neutra veio para ficar.

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ENTREVISTA Edmundo Antonio Matarazzo Consultor e membro do Conselho Consultivo da Abranet Luís Osvaldo Grossmann

Telecom decide o futuro com olhos no retrovisor Para o veterano do setor e conselheiro da Abranet, debate sobre revisão e unificação de serviços preserva mentalidade da telefonia fixa. “Nós nos perdemos em discussões do caminho e não falamos do destino”, afirma. Novas tecnologias, mudanças de hábito, um mundo hiperconectado – o mercado de telecomunicações mudou profundamente desde que o país adotou a Lei Geral de Telecomunicações (LGT), incentivou o investimento privado, possibilitou a competição, enfim, pôs para funcionar a privatização do setor. Não surpreende, portanto, que mais de 25 anos depois se discuta uma revisão das regras e modelo que valeram até aqui. Mas como alerta o membro do Conselho Consultivo da Abranet Edmundo Antonio Matarazzo, com 30 anos de experiência em telecomunicações – dez deles na Anatel –, a discussão proposta pela agência reguladora trouxe uma série de idiossincrasias. “Não temos um objetivo a alcançar, vamos só tentar simplificar as regras. Perdemos o fio da meada. Hoje o instrumento poderoso é o smartphone. Mas a cabeça ainda está no STFC”, diz. Para Matarazzo, a Anatel sugere o caminho da consolidação dos serviços por meio da unificação da telefonia fixa, banda larga e TV por assinatura em um único serviço fixo, algum dia, e mais rapidamente a inclusão do Serviço Móvel Global por Satélite (SMGS) para a prestação do SMP. Entretanto, se reconhece incapaz de enfrentar questões estruturais por não ter competência para mexer na Lei Geral de Telecomunicações ou mesmo na regra específica da TV assinatura, caso da Lei do Seac. A seguir, os principais trechos da entrevista.

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Abranet: Exatos 25 anos do marco legal que reestruturou as telecomunicações no Brasil, o setor tenta discutir o que fará nos próximos. É um momento promissor? Edmundo Matarazzo: O futuro digital é promissor, mas o que preocupa muita gente é que as mudanças afetam também os serviços de radiodifusão, os meios de comunicação social. A comunicação utilizou várias ferramentas ao longo do tempo, desde as pinturas rupestres, a escrita, o correio, o jornal, o rádio, o telefone, a televisão, o computador, a internet, e nos dias de hoje o smartphone. Nossa vida hoje está no smartphone. Passou a perna no rádio, na TV, no computador etc. E serve para tudo. É pau para toda obra. É carteira de identidade, meio de pagamento, é jeito de comunicar, com vídeo ou sem, mensagem, aplicativo, até serviço de telefonia faz. Mas a estrutura do setor, tanto de comunicação quanto telecomunicação, não se preparou para isso. Aconteceu de supetão, sem ninguém prever ou estimular. E não tem como frear. Diante dessa situação, a Anatel trabalha com uma lei estabelecida quando o mundo ainda era praticamente todo com monopólio estatal e o serviço máximo era o STFC. A LGT não tratou das comunicações, somente das telecomunicações. Não é o mundo de hoje. Estamos atrasadíssimos. Não conseguimos visualizar o futuro. Não estamos conseguindo enxergar para onde vai e qual será o modelo. A ideia não seria reunir os serviços em um número menor de licenças? Em pleno 2022, a Anatel justifica que ‘a convergência das redes e serviços de telecomunicações tem se tornado uma realidade cada vez mais presente’ e abre uma consulta para


discutir regulamento de serviços. Fala do consumidor, qualidade, competição. E, ato contínuo, que os regulamentos devem evoluir simplificando as regras no que for possível, com a potencial consolidação de serviço. Como traduzir isso? Estamos falando de telecomunicações, a Agência já fez no passado uma consolidação de serviços e no fim o que se fazia antes continuou sendo feito e o nome do serviço mudou. Perdemos o fio da meada. Temos problemas distintos e jogar tudo no mesmo saco e unificar ou consolidar não permite entender o objetivo a ser alcançado, não dá para entender o que se quer regular ou controlar. Mas a consolidação parece toda escorada no mesmo modelo do STFC e do SeAC. A consulta indica que se pretende discutir área de prestação, remuneração de redes, regras de interconexão, impacto na numeração se unificar. Lembra que alguém tem que rever a Lei do SeAC. Não há uma diretriz sobre o que será feito com o regime público. Sobre a competição, parece que se pretende alterar o PGMC [Plano Geral de Metas de Competição] e as regras assimétricas para PPPs [Prestadores de Pequeno Porte], que até funcionam. E, por fim, tem que ajustar o SMP para incluir uma modalidade de serviço móvel via satélite meio que perdida ao longo dos últimos anos. Mas não seria importante rever logo todos esses serviços? O problema é que toda a estrutura que a gente tem foi baseada no STFC – chamada local, longa distância nacional

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e internacional. Quando surgiu o móvel, foi alinhado com o STFC, só que móvel. O SCM ficou no limbo porque não podia ser meio para nenhum outro serviço de telefonia ou TV por assinatura; assim, qual infraestrutura seria necessária? Acabou sendo uma rede entre o usuário e o provedor de conectividade. Agora vamos dar numeração ao SCM, a mesma do STFC, para fazer chamada local, LDN e LDI, com a mesma regra de interconexão do STFC. O SeAC não terá numeração, seguirá como uma infraestrutura entre head end e usuário. O Serviço de Comunicação de Dados é igual ao STFC? Precisa de área local? Remuneração de rede, interconexão? Qual segmento da cadeia de valor do SeAC a lei privilegia? A gente precisa pensar fora da caixa. Nada disso precisa continuar existindo. Mas esse é o ponto que gera insegurança em todo mundo. Nessa situação, as empresas se agarram na receita. Enquanto existir, precisa ter receita. Nessa perspectiva, o STFC é tido como morto exatamente porque não gera mais receita; passou a ser um serviço de telecomunicações com pouca relevância. O que está fazendo revolução é WhatsApp, é o vídeo disponível via Facebook, via diversas plataformas, ferramentas como Teams, Zoom, Skype, que fazem comunicação entre pessoas com voz e imagem, troca de texto. Mas essas não são as limitações do que o regulador pode fazer? O que a Anatel vai conseguir fazer? Acho que muita gente se perde em discussões do caminho e não do destino. Quero discutir o uso do poste, mas nem sei se vai continuar existindo poste. Isso vai servir para alguma coisa? O foco precisa se alterar. Todo mundo está preocupado com o dinheiro da janta porque gastou o do almoço. E no dia seguinte ninguém sabe o que vai fazer. Fazer telecom rentável está difícil. Mas ninguém pergunta por quê e se vai continuar assim. A discussão está sendo conduzida para a consolidação de serviços. O problema é que é uma discussão de menos da metade, porque a Anatel não pode mexer na legislação. Para alterar o STFC como serviço público, é preciso alterar a lei; decreto só para outras modalidades. Para agregar um equivalente ao SeAC, é necessário, além de mudar a lei, mudar a cadeia de valores utilizada, que já se desfez frente ao mundo real. Olha a confusão. A Anatel não pode alterar as leis não pode decidir sobre manter ou não o regiabranet.org.br junho / julho / agosto 2022

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me público. Por isso, a única coisa que se pode dizer é que o SCM terá numeração, um dia. Mas a numeração não é uma demanda importante? O que acontece no SCM quando se discute numeração, é se vai ser a mesma do STFC, ou do SMP. No STFC, o número é vinculado a uma área local. No SMP, o número é da área de numeração, para fins de tarifação e encaminhamento das chamadas. Qual será o uso da numeração no SCM? Recurso para fazer chamadas telefônicas? Comparar o SCM ao SMP é mais razoável e condizente com as tecnologias aplicadas. Mas, no fim das contas, não tem sentido. Nem área de numeração, nem área local, nem longa distância. Isso é algo que está sendo mantido só porque existe STFC e no SMP por alinhamento com o STFC. Faria mais sentido discutirmos ter SCM fixo e SCM móvel (SMP), mas não vamos conseguir avançar por aí, porque as operadoras pagaram uma baba pelas licenças, tem um legado pesado e que aumenta a cada dia que adiamos as mudanças. Imagina implementar a interconexão STFC com SCM com ‘bill and keep’, é imaginar que o SCM vai tarifar chamadas como o STFC. É colocar o mundo novo dentro do velho e achar que vai dar certo. É a tal cabeça no STFC? Veja quanto custa um acesso local STFC em uma concessionária, fazendo chamadas para o Brasil inteiro. É coisa de R$ 80/mês. Mas eu posso comprar um acesso móvel que faz chamadas para o Brasil inteiro e ainda permite 2 GB de dados por R$ 39,90. Se quiser só internet móvel 100 GB sai por R$ 99,90. Como pagar R$ 80 para ter voz? Ninguém vai comprar STFC. Todo estabelecimento hoje anuncia um número, mas para uso do Whatsapp. Não é mais número para chamada telefônica. A numeração no SCM não vai matar o STFC. O STFC está morto faz tempo. E se der numeração para SCM e tiver que cumprir as obrigações do STFC, melhor não ter o número. Se tudo isso nos deixa presos no caminho, qual seria o destino? Acho que quando a gente pensa em unificação de serviços, a primeira coisa seria, talvez, pensar qual será o dispositivo utilizado pelos usuários. Telefones são peças

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“A Anatel trabalha com uma lei estabelecida quando o mundo ainda era praticamente todo com monopólio estatal e o serviço máximo era o STFC. Não é o mundo de hoje.” de museu ou antiquário. O smartphone é o dispositivo do momento, tem mais aparelho móvel no país que o número de habitantes. Esse dispositivo serve para assistir a vídeo, para fazer videoconferência, usar app, pagar conta, navegar na internet, serve de documento de habilitação, passaporte, serve para tudo isso. É o instrumento importante. Então, todos têm um dispositivo desses. É o que está à venda. É o instrumento que vai ficar cada vez mais poderoso. Na maioria dos países o serviço universal é um princípio, e ainda encontramos o serviço de voz presente, mas a conectividade já está ao lado. Nossa lei não se contentou em indicar um princípio, definiu as modalidades de serviço e escolheu como universal o Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC). Reitero: qual é o dispositivo que a maioria da população tem nas mãos? O aparelho móvel. Resumindo, uma simplificação de regras, sempre bemvinda, porém, uma consolidação que não leva ao futuro, mas nos mantém presos ao passado. Fica até difícil fazer uma contribuição. Porque sai do escopo, tem que mexer na LGT, tem que mexer na Lei do SeAC. Vamos alertar sobre o que se precisa discutir para valer. Por que se não se discute o futuro digital que precisamos, corremos mais risco de nos afastar dele. Por fim, um comentário sobre a Norma n°4 e a tributação de telecomunicações e SVA. A norma é essencial e foi a pedra fundamental em inúmeras decisões judiciais em diferentes instâncias para evitar que as Receitas Estaduais ampliassem a base de cálculo do ICMS, o que teria tornado a internet mais cara e a deixaria ainda mais distante de parte da população. Saber como funciona a internet e como ela difere de um serviço de telecom é dever de todos que operam a internet no mundo. Nesse caso, muito me alegra a posição do conselheiro relator que preserva a norma e abre oportunidade para que aqueles que tenham dúvidas sobre o que é internet e o que é serviço de telecomunicações tenham as mesmas sanadas definitivamente.


CARREIRA

Roberta Prescott

Como contratar e reter

profissionais de alto quilate? Empresas de internet enfrentam o desafio da falta de especialistas para a jornada de transformação digital no Brasil.

2023, teremos dados suficientes para apresentarmos números mais precisos”, adianta. Entre as principais dificuldades que as empresas de internet enfrentam, segundo Janone, está a falta de profissionais qualificados, problemas de entrosamento entre trabalhadores de diferentes gerações na mesma empresa e a dificuldade de alinhamento da visão e missão das empresas com os objetivos individuais dos trabalhadores.

Contratar e reter profissionais de tecnologia da informação, telecomunicações e internet é uma tarefa árdua, por se tratar de uma mão de obra qualificada e muito re- Vagas a preencher quisitada. A expectativa de demanda por esses profissioNa contramão da falta de vagas de trabalho, o setor de nais praticamente duplicou em dois anos. Segundo um tecnologia da informação enfrenta sérios problemas para levantamento da Associação de Empresas de Tecnologia recrutar funcionários, vendo crescer a demanda. Mas por da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais que a cada ano, em vez de diminuir, a lacuna aumenta? (Brasscom), em 2019, uma primeira projeção apontava Para o professor Ildeberto Aparecido Rodello, recém-nopara a necessidade de 420 mil profissionais em um perío- meado diretor do Centro de Tecnologia da Informação do de cinco anos, mas este número passou para 800 mil no (CeTI-RP) da Faculdade de Economia, Administração e levantamento feito em 2021. Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP), a quantidade “No Brasil, falta mão de obra qualificada, em todas as de profissionais formados por ano fica aquém da demanda profissões. Nas empresas de internet ainda mais, pois, para exigida pelo processo de transformação digital que vivea maioria das vagas, requerem-se conhecimentos das ciên- mos, e essa defasagem pode piorar. cias exatas, pré-requisitos para as linguagens de programaEm matéria no jornal da USP, Rodello ressalta que “a ção”, diz José Janone Junior, presidente do Sindicato das pandemia da Covid-19 tornou esses profissionais ainda Empresas de Internet do Estado de São Paulo (Seinesp). No que tange às empresas de internet, Janone explica que os dados da demanda por profissionais não estão atualizados. “Ao conversarmos com os gestores dos provedores de internet, o sentimento é de que existem vagas para ampliar em um terço os postos de trabalho. Em José Janone Junior Presidente do Seinesp

“Quem investe em seus profissionais não tem garantia nenhuma de que eles permanecerão em sua empresa quando tiverem uma oferta tentadora de um grande concorrente.”

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“A pandemia da Covid-19 tornou esses profissionais ainda mais essenciais para empresas e instituições de ensino.”

mais essenciais para empresas e instituições de ensino.” Formar profissionais no mesmo ritmo de crescimento do mercado, há anos, tem sido um grande desafio. Além disso, conforme aponta Roberto Vilela, consultor empresarial e mentor de negócios, muitas vagas e carreiras para as quais os estudantes foram preparados ao longo da formação sequer existem mais. “Em contrapartida, diversas outras atribuições foram surgindo, impulsionadas pela tecnologia e novos formatos de trabalho e de vida. Assim, as formações ainda incipientes e o não acompanhamento da evolução da própria carreira ou setor por muitos profissionais criaram um hiato entre como se formam os colaboradores e o que a empresa realmente precisa”, explica. Somado a isso, com a popularização do teletrabalho durante a pandemia, os profissionais brasileiros passaram a buscar empregos em empresas localizadas fora do Brasil – e, assim, receber salários em moedas mais fortes, como dólar ou euro. Nesse ambiente hipercompetitivo, existem algumas atitudes e práticas que as empresas podem adotar para se tornarem mais atraentes. Gregory Goris, diretor de tecnologia da Printi, enumera como primeiro ponto a adequação salarial. “Os salários dos profissionais de tecnologia já vinham em uma crescente nos últimos anos e foram impulsionados ainda mais após a pandemia de Covid-19, que forçou muitos negócios a acelerarem seus projetos de transformação digital. Por mais difícil que seja equiparar os salários no Brasil aos oferecidos pelas empresas estrangeiras, os negócios nacionais precisam ao menos oferecer remuneração equivalente ao mercado para evitar perder seus atuais e futuros talentos”, defende. A retenção de funcionários também passa por ques-

Ildeberto Rodello Professor da FEA-RP tões comportamentais, como inteligência emocional e soft skills. “É o comportamental alinhado à cultura da empresa; se a pessoa não estiver alinhada com a cultura, você a perde”, atesta Dorian Lacerda Guimarães, CEO da Inspand e diretor da Abranet. Para Janone, as empresas de internet devem investir nas áreas de recursos humanos para compreender melhor a atual geração de jovens profissionais, além de instituir política de participação de lucros e resultados, ter programas de inclusão social, abrir vagas 100% em teletrabalho e também semipresenciais, estabelecer ambientes de trabalho confortáveis e criativos e oferecer cursos e treinamentos para assimilação de novas tecnologias. “Com a popularização e a universalização da conectividade de internet, muitas aplicações que eram registradas e utilizadas por softwares offline passaram para os computadores em nuvem e tornaram-se online”, acrescenta o presidente do Seinesp. Segundo Dorian Lacerda Guimarães, há de se levar em conta ainda um movimento das pessoas, pós-Covid, colocando outros valores para a sua vida, sobre o que fazer com o tempo. Portanto, é necessário prestar atenção ao que os profissionais estão buscando hoje. “A Covid acelerou a transformação digital e começaram novas formas de trabalho, como o trabalho remoto, que, até então, era visto com desconfiança”, diz.

“As formações ainda incipientes e o não acompanhamento da evolução da própria carreira ou do setor criaram um hiato entre como se formam os colaboradores e o que a empresa realmente precisa.” Roberto Vilela Consultor empresarial e mentor de negócios

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“O que retém as pessoas é dar direção e propósito para onde você está indo. Tem de escutar quais são os sonhos das pessoas que estão com você.” Dorian Lacerda Guimarães CEO da Inspand e diretor da Abranet Treinamento Um dos caminhos para a retenção e o aprimoramento da qualidade técnica dos profissionais são os treinamentos, seja dentro das empresas, seja em parceria com alguma instituição. No entanto, Janone diz que, em geral, as empresas de internet não têm políticas formais nesse sentido e que os melhores profissionais buscam qualificação por conta própria e, por isso, são tão desejados e independentes. “Atualmente os bons profissionais que trabalham nas empresas de internet são tão procurados por diferentes concorrentes quanto os bons jogadores de futebol por outros clubes. No caso dos clubes de futebol que revelam craques, estes e seus empresários são recompensados por uma transferência com uma vultosa multa financeira e todos ficam felizes. No mundo empresarial, quem investe em seus profissionais, tornando-os de excelência, não tem garantia nenhuma de que eles permanecerão em sua empresa quando tiverem uma oferta tentadora de um grande concorrente”, sinaliza. Uma alternativa para minimizar esse dilema seria o investimento em educação tecnológica nas escolas, desde o ensino fundamental e básico, para, no médio prazo, a equação fechar. Dorian Lacerda Guimarães diz que as empresas que veem treinamento como ganho têm vantagens com um desempenho melhor das pessoas que estão trabalhando. Falando especificamente dos profissionais de internet, Guimarães aponta que há muito conteúdo oferecido de graça

por entidades como o Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br). “O pessoal dos provedores de internet tem formação mais técnica e segmentada. Os conteúdos gratuitos são muito ricos, e vemos mudanças de comportamento usando os conteúdos abertos. Por exemplo, técnico em campo que pesquisa vídeo na rede para resolver problema”, diz o executivo. “Há um mercado que está muito valorizado como o de programação, desenvolvimento de aplicativo, software e sistemas. Temos visto programas de incentivo por parte das empresas para as pessoas buscarem certificação”, completa. A Inspand, de Guimarães, atua justamente nesta área. O executivo conta que há uma grande procura por treinamentos na parte de comportamento: como fazer comunicação não violenta, como trabalhar a inteligência emocional. Além disso, a área de escola corporativa atende à demanda das empresas nos quesitos que envolvam liderança, aplicação em grupo e comportamento. “As maiores companhias têm uma área que cuida desta parte. Já as empresas de internet, normalmente, são menores, têm menos colaboradores e a solução de treinamento é diferente”, diz. Para as empresas de internet, firmar convênios com empresas de treinamento e formação de mão de obra e inscrever os líderes e colaboradores em turmas abertas é uma alternativa interessante. Guimarães reforça o coro de Janone ao afirmar que treinamento não retém colaborador. “O que retém as pessoas é dar direção e propósito para onde você está indo”, ressalta, explicando que as pessoas precisam enxergar onde estarão no futuro da empresa. E, para chegar lá, sim, o treinamento faz a diferença. “Tem de escutar quais são os sonhos das pessoas que estão com você”, aponta.

“Os negócios nacionais precisam ao menos oferecer remuneração equivalente ao mercado para evitar perder seus atuais e futuros talentos.” Gregory Goris Diretor de tecnologia da Printi

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Segurança

Roberta Prescott

A nova cara do

ransomware Esse tipo de ataque segue crescendo, e a proporção das organizações afetadas mais que dobra no Brasil. Os impactos financeiros são enormes, e as seguradoras entram em cena. Longe de estarem diminuindo, os ataques de ransomware estão se transformando, são predominantes e cada vez mais empresas têm pagado o resgate para recuperar os dados roubados. Em análise dos cenários nacional e internacional, o relatório global da Sophos apontou que 66% das organizações mundiais e 55% das brasileiras sofreram ataques desse tipo em 2021 e que houve um aumento, em quase cinco vezes, do valor médio de resgate pago pelas empresas que tiveram dados criptografados, chegando a US$ 812,360. Nessa toada, as empresas especializadas em oferecer seguros para esses ataques também ganharam relevância. A edição 2022 da pesquisa anual The State of Ransomware retratou que houve um aumento de ataques na comparação com os 37% registrados globalmente e dos 38% reportados no Brasil em 2020. De acordo com o estudo, 46% das companhias que tiveram dados encriptados pagaram o resgate para recuperá-los, apesar de terem outros meios de recuperação disponíveis, como backups. No Brasil, 73% das companhias declararam que o backup é o método mais utilizado para a restauração de dados após um ataque de ransomware. E 25 % dos entrevistados que pagaram o resgate compartilharam o valor exato desembolsado: a média bateu os US$ 211,790. Entre as que

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pagaram o resgate, houve recuperação de, em média, 55% dos dados, contra 70% de 2020. Já a porcentagem das que recuperaram todos os seus dados depois de pagar o resgate caiu de 17% em 2020 para 8% em 2021. Em transformação Durante coletiva de imprensa para apresentar o estudo, Rafael Foster, engenheiro de vendas sênior da Sophos, apontou que o ransomware se tornará mais modular, uniforme e influente, com elementos de ataques como serviço. Os desenvolvedores estão criando códigos mais sofisticados e têm feito isso como serviço.


Métodos usados para recuperação de dados

Fonte: The State of Ransomware 2022

Veja a íntegra da edição 2022 da pesquisa anual The State of Ransomware: https://assets.sophos.com/X24WTUEQ/ at/4zpw59pnkpxxnhfhgj9bxgj9/sophosstate-of-ransomware-2022-wp.pdf

“Não precisa ser mais aquela pessoa especialista ou técnica para codificar ransomware e atacar. Está se trabalhando em um modelo mais modular. Temos visto grupos diferentes de ransomware codificando partes, módulos, cada um fazendo uma parte e depois unificando as partes dos códigos e assim tendo algo mais impactante”, disse Foster, dando como exemplo o ataque que houve no serviço de e-mail da Microsoft. O modelo de ransomware como serviço e mais modular está ganhando popularidade, e o número de ‘famílias’ vem aumentando a cada ano. Foster ressaltou que o “as-aservice” como modelo de negócio acaba atraindo outras

ameaças cibernéticas para criar um sistema de entrega de ransomware massivo e interconectado. “Vai ter uma influência maior nos ataques, como um buraco negro, uma força gravitacional que vai atrair outras ameaças e mais fortes do que vimos no passado”, destacou. “Antes, tinha o malware que infectava a máquina, mas, hoje, não. A pessoa recebe um arquivo que não é detectado, porque não tem nada malicioso dentro dele, mas tem um acesso que vai conseguir pegar ransomware na internet e colocar dentro da empresa.” Foster acredita que vai haver aumento no número de extorsões. Mas, ao mesmo tempo, a pesquisa mostrou que abranet.org.br junho / julho / agosto 2022

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mais vítimas estão conseguindo recuperar seus dados. No Brasil, 97% das empresas conseguiram recuperá-los segundo o estudo, um porcentual superior aos 93% de 2020. “Ainda existem empresas que estão pagando para ter dados de volta e isso é um problema, porque financia o mercado – os criminosos conseguem contratar mais pessoas e ter mais ferramentas para melhorar as técnicas –, mas as empresas atacadas, muitas vezes, não veem saída e acabam pagando para recuperar dados”, ponderou. É necessário, disse o especialista, criar um plano de recuperação, ter uma estratégia para mitigar os ataques, mesmo porque 92% das empresas brasileiras afirmaram que o ataque de ransomware impactou sua capacidade de operar e 83% delas informaram que causou perda de negócios/receita. “Ter ferramentas é importante para estratégia de recuperação, mas não está claro para as empresas que prevenção é o mais importante.”

empresa tentando negociar sozinha, mas, ainda assim, a recuperação é muito complexa para voltar a operar. Muitas organizações contam com o seguro cibernético para ajudá-las a se recuperar de um ataque de ransomware. The State of Ransomware 2022 apontou que 83% das companhias de médio porte tinham um seguro cibernético para cobertura no caso de um ataque de ransomware. Em 98% dos incidentes, a seguradora pagou parte ou todos os custos (com 40% cobrindo o pagamento do resgate), e 94% das organizações com seguro cibernético disseram que a experiência mudou nos últimos 12 meses, com demandas mais altas por medidas de segurança cibernética, políticas mais complexas ou caras e menos companhias oferecendo proteção de seguro. De acordo com o estudo, o custo médio para recupera-

Seguro em ascensão Nesse cenário, as empresas de seguros emergem como alternativa. Segundo Rafael Foster, as seguradoras ajudam a diminuir o impacto em comparação a uma

5 passos para

proteger sua empresa Os ataques cibernéticos do tipo ransomware, em que dados são roubados e liberados em troca do pagamento de um resgate, representam atualmente a pior ameaça a empresas e governos. Por gerar alto retorno financeiro para os criminosos, este tipo de invasão está se multiplicando e colocando em risco companhias e instituições do mundo inteiro. No Brasil, um estudo recente da Forrester Consulting, encomendado pela Tenable, revelou que o ransomware foi a causa número um dos ataques cibernéticos com impacto nas empresas,

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respondendo por 51%. Para Marty Edwards, vice-presidente de Segurança de Tecnologia Operacional da Tenable e ex-diretor do Departamento de Segurança Interna dos EUA, trata-se de um tipo de ameaça que não pode ser subestimada, já que por trás dos ataques não há gangues de rua, mas verdadeiras organizações criminosas. Ele acrescentou que, infelizmente, hoje em dia, uma empresa ser vítima de um ataque


“(Hoje), a pessoa recebe um arquivo que não é detectado, porque não há nada malicioso dentro dele, mas tem um acesso que vai conseguir pegar ransomware na internet e colocar dentro da empresa.” Rafael Foster Engenheiro de vendas sênior da Sophos

ção do ataque de ransomware mais recente em 2021 foi de US$ 1,4 milhão. Nesse caso, a organização demorou, em média, um mês para se recuperar dos danos e interrupções. Além disso, 90% das empresas disseram que o ataque afetou a capacidade de operar e 86% das vítimas do setor privado afirmaram que perderam negócios e/ou receita por causa do ataque. No Brasil, 85% das empresas afirmaram que têm seguro e que o contrataram prevendo incidentes na área de tecnologia, mas em apenas 46% dos seguros existe proteção que cobre ataques de ransomware e resgates, e 39%

das empresas disseram ter seguro contra ransomware, mas há exclusões (cláusulas de políticas). “O lado positivo é que as cláusulas têm ajudado as empresas a melhorarem as defesas, como manter atualizados os sistemas operacionais”, disse Foster. O relatório de 2022 da Sophos resumiu o impacto do ransomware em 5.600 organizações de médio porte em 31 países da Europa, Américas, Ásia-Pacífico e Ásia Central, Oriente Médio e África, com 965 casos detalhados de pagamentos de ransomware nessas localidades. Do Brasil, participaram 200 empresas.

ransomware não é questão de se, mas de quando. Para reduzir a exposição a riscos de ataques cibernéticos, Edwards apresentou uma cartilha com cinco soluções para as empresas, durante a 4ª Conferência Latino-Americana de Segurança em SCADA (Supervisory Control and Data Acquisition). São elas:

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Crie um plano de gestão de crise: se um ataque cibernético for levado a cabo com sucesso, como isso vai ser comunicado aos funcionários da empresa, aos acionistas e à imprensa? Deixe esse plano estruturado e pronto para ser colocado em prática rapidamente

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Faça um inventário dos dispositivos da empresa e implemente um esquema de gestão: o que eu tenho, como os dispositivos estão conectados e como funciona o fluxo de comunicação entre eles. Após isso, é possível traçar prioridades e definir quais sistemas devem ser religados em caso de ataque

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Monitore a saúde do seu ambiente cibernético: crie alertas para cada ameaça ou mudanças nas configurações do sistema que fujam do padrão

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Faça backups constantes de todos os dados da empresa: hardware, software, firmware, configurações etc

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Estabeleça um plano de recuperação e realize testes recorrentes de restauração de dados: de nada adianta ter backup se a empresa não tem um procedimento de como restaurá-lo e pessoas treinadas para esta tarefa

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LEGISLAÇÃO

IA: Em contribuição para a regulamentação sobre inteligência artificial, a Associação Brasileira de Internet (Abranet) sugere prioridade para o fomento à inovação.

Roberta Prescott

ambiente regulatório tem de ser favorável às PMEs Está em construção no Brasil o marco regulatório para inteligência artificial. Ao participar da consulta pública, encerrada em maio, a Associação Brasileira de Internet (Abranet) sugeriu que o fomento à inovação seja o norte de todo o processo e que sejam levadas em conta as micro, pequenas e médias empresas. A Abranet defendeu a criação de um ambiente regulatório propício para que as PMEs, que representam cerca de 99% dos negócios brasileiros, possam desenvolver e utilizar tecnologias de IA. “Sob uma perspectiva regulatória, a Abranet entende que a formulação de um marco regulatório de IA deve levar em consideração dois aspectos principais: a existência de princípios sólidos no ordenamento jurídico brasileiro já aplicáveis ao tema, de forma que eventuais novas disposições criadas devem estar em harmonia com a estrutura legal e regulatória vigente; e a criação de um ambiente regulatório propício à inovação, sobretudo considerando o desenvolvimento de tecnologias de IA por micro, pequenas e médias empresas, que representam cerca de 99% dos negócios brasileiros e 30% de tudo que é produzido no país e, portanto, são atores fundamentais para posicionar o Brasil”, apontou a associação na consulta pública. No documento para a Comissão de Juristas, responsável por debater e elaborar o marco normativo sobre IA, a Abranet também pediu uma definição clara e objetiva do conceito de inteligência artificial, sem margem para dúvidas ou inseguranças jurídicas. “Nesse sen-

O Brasil precisa de políticas públicas nacionais para que a Inteligência Artificial possa ser efetivamente usada como meio de desenvolvimento social e econômico do país

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Abranet defende que o Brasil adote a mesma definição de Inteligência Artificial da Comissão Europeia

tido, sugerimos que, tal qual vislumbrou-se na definição de IA adotada pela Comissão Europeia, todos os sistemas considerados como de IA sejam delimitados, incluindo sistemas de aprendizagem automática, sistemas baseados na lógica e sistemas baseados em métodos de pesquisa.” A Abranet – que representa empresas de diversos segmentos que desenvolvem atividades prestadas através da internet e das Tecnologias da Informação e da Comunicação e tem abrangência nacional, com mais de 400 associadas atuando nas áreas de meios de pagamento, conectividade de internet, aplicações e conteúdos – sugeriu ainda a realização de uma gradação de riscos casuística quanto aos impactos da inteligência artificial, de modo que cada atividade seja classificada de acordo com o risco que possui, prezando pela proporcionalidade e neutralidade do quadro regulamentar. Pediu também que haja um plano estruturado de estipulação de políticas públicas integradas em nível nacional entre os diferentes entes, para que a IA possa ser efetivamente utilizada como meio de desenvolvimento social e econômico do país. Com relação à legislação, a Abranet pediu que seja

considerada a existência de princípios sólidos no ordenamento jurídico brasileiro já aplicáveis à IA, constantes no Marco Civil da Internet, na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) e no Plano Nacional de Internet das Coisas, de modo a evitar duplicidade normativa, obrigações contraditórias e excesso de regulamentação. Ainda na contribuição, a Abranet solicitou que, tal qual a gradação de riscos, haja uma divisão de custos relacionados à conformidade de IA setorial e casuística, de modo que estes sejam justamente distribuídos entre as IAs de baixo e alto risco, considerando o tamanho da empresa e as dependências institucionais que ela possa criar. Por fim, pediu que sejam avaliados, de forma essencial, os segredos comerciais, industriais e questões de propriedade intelectual envolvidas no desenvolvimento das tecnologias em si, inclusive para eventuais fiscalizações em torno de soluções de IA. A Abranet recomendou também a realização de estudo de impacto regulatório detalhado e o desenvolvimento de estratégias que busquem estruturar metas e princípios para garantir a inovação e tutelar direitos no contexto da IA. A Abranet destacou que, dentre os projetos de lei, o PL nº 21/2020 é o único a propor uma definição de IA, mas que há um principal ponto de tensão na definição, relacionado ao fato de que o PL deixa em aberto técnicas que podem eventualmente ser enquadradas no conceito de IA, além de apresentar conceito geral que não parece ser tão técnico. “É importante, portanto, que o conceito de IA permita compreender, de forma mais delimitada, o que pode ser considerado uma IA. Sendo assim, sugerimos que tal qual observa-se na definição de IA adotada pela Comissão Europeia no âmbito do Regulamento de Inteligência Artificial da União Europeia”, diz o documento.

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PANORAMA

Roberta Prescott

Conectividade avança nas

áreas rurais As áreas rurais brasileiras estão mais conectadas. E as prestadoras de serviços de telecomunicações continuam exercendo um papel fundamental para levar internet a regiões remotas. Na comparação do cenário antes da pandemia, em 2019, com o de 2021, houve avanço no número dos domicílios com acesso à internet, segundo a pesquisa TIC Domicílios 2021, lançada no fim de junho pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). O aumento foi significativo: 20 pontos percentuais entre 2019 e 2021. Entre os indivíduos de dez ou mais anos conectados à internet na zona rural, a penetração passou de 53% em 2019 para 71% em 2021. A porcentagem também cresceu na área urbana, mas menos: de 75% em 2019 para 86% em 2020, com ligeira redução para 83% em 2021. “Nesta edição, vimos grande crescimento na conectividade rural, talvez devido à pandemia, quando as pessoas precisaram ficar trabalhando remotamente”, salientou

As empresas de internet tiveram papel decisivo para levar conectividade às áreas mais remotas do Brasil. A desigualdade digital diminuiu, mas ainda há lacunas a serem preenchidas, revela a pesquisa TIC Domicílios 2021.

José Gontijo, coordenador do CGI.br, durante a apresentação online da pesquisa. “A partir dessas informações, várias políticas públicas ao longo dos anos foram implementadas. As políticas públicas têm de ser baseadas em dados e evidências”, completou. O levantamento apontou que, em 2021, 81% da população de dez anos ou mais usou a internet nos últimos três meses anteriores à pesquisa – o que corresponde a 148 milhões de indivíduos. Também foi registrado um crescimento significativo na proporção de usuários da rede nas regiões Norte (83%), Sul (83%) e Nordeste (78%) em relação a 2019. Importante ressaltar que a pesquisa, conduzida pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), sofreu alteração para se adequar às restrições impostas para conter o avanço da Covid-19. “Houve uma adaptação do ques-

“A partir das informações [da pesquisa], várias políticas públicas ao longo dos anos foram implementadas. As políticas públicas têm de ser baseadas em dados e evidências.” José Gontijo Coordenador do CGI.br

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Divulgação


DOMICÍLIOS COM ACESSO À INTERNET Total de domicílios Sim

Não

Não sabe

Não respondeu

82

18

0

0

Urbana

83

17

0

0

Rural

71

29

0

0

Sudeste

84

16

0

0

Nordeste

77

22

0

0

Sul

83

17

0

0

Norte

79

20

0

0

Centro-Oeste

83

17

0

0

Até 1 SM

69

31

0

0

Mais de 1 SM até 2 SM

81

19

0

0

Mais de 2 SM até 3 SM

91

9

0

0

95

5

0

0

98

2

0

0

Percentual (%) TOTAL ÁREA

REGIÃO Veja a íntegra da pesquisa: https://cetic. br/pt/pesquisa/ domicilios/ indicadores/

Mais de 3 SM até 5 SM RENDA Mais de 5 SM até 10 SM FAMILIAR Mais de 10 SM

99 1 0 0 tionário para realização por telefone. Tivemos Não tem renda uma amostra menor, o que aumenta a margem 58 42 0 0 de erro”, explicou Fabio Storino, analista de Não sabe 83 17 0 0 informações do Cetic.br/NIC.br e coordenaNão respondeu 82 18 0 0 dor da TIC Domicílios. A 100 0 0 0 Realizada anualmente desde 2005, a TIC 98 2 0 0 CLASSE B Domicílios busca medir a posse, o uso, o SOCIAL C 89 11 0 0 acesso e os hábitos da população brasileira em DE relação às Tecnologias da Informação e Co61 39 0 0 municação (TICs). Devido às medidas de disFonte: CGI.br/NIC.br, Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), Pesquisa sobre o uso das tecnologias de informação e comunicação nos domicílios brasileiros - TIC Domicílios 2021. tanciamento social provocadas pela pandemia, em 2020, a pesquisa teve a sua metodologia adaptada, sendo realizada preferencialmente pelo telefone. Em 2021, voltou a ser adotado o modelo urbana ou rural segue a definição do IBGE. integralmente presencial. Os dados foram coletados enComo já demonstrado em outros levantamentos do tre outubro de 2021 e março de 2022, com a inclusão de NIC, a 17ª edição da pesquisa TIC Domicílios confir23.950 domicílios e 21.011 indivíduos de 10 anos ou mais. mou a relevância do acesso à internet no contexto proDe acordo com Alexandre Barbosa, gerente do Cetic. porcionado pela emergência da Covid-19, em especial br/NIC.br, parte do crescimento da internet nas áreas ru- com o avanço das atividades de trabalho e estudos remorais veio das prestadoras de serviços de telecomunicações. tos. Barbosa ressaltou que, em comparação ao período “Mas não podemos afirmar que tudo vem delas, porque há que antecedeu a crise sanitária, houve uma ampliação da várias tecnologias, como satélite”, disse. presença da internet nos domicílios e de seu uso por inNa área rural, as conexões dos domicílios por fibra divíduos, sobretudo, nas áreas rurais. ótica ou cabo somam 39% (contra 64% na zona urbana), Entre 2008 e 2021, a pesquisa deixou claro o avanenquanto as redes móveis são responsáveis por 20% das ço de domicílios com acesso à internet. “É possível ver a conexões rurais (17% na urbana); satélite por 10%; e rá- evolução da penetração da internet nos domicílios, saindo dio, 9%. Segundo Barbosa, o que se enquadra como zonas de 18% em 2008 para 82% em 2021”, disse Storino, que abranet.org.br junho / julho / agosto 2022

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destacou a grande variação na área rural em relação ao período pré-pandemia, passando, como já mencionado, de 51% para 71% entre 2019 e 2021. “Mas ser domicílio com conexão à internet não revela a qualidade, e quando cruzamos os dados é possível observar diferenças importantes”, sinalizou o coordenador da pesquisa. “Enquanto a fibra ótica e o cabo são as principais tecnologias em quase dois terços das casas urbanas, nas rurais, as maiores conexões são por rede móvel, satélite e rádio”, apontou. Redução da desigualdade Com o avanço do acesso à internet nas classes sociais e na área rural, as desigualdades identificadas em edições passadas da TIC Domicílios foram reduzidas, mas ainda há lacunas a serem preenchidas. Em comparação aos dados coletados em 2019, a presença de conexão de internet nos domicílios aumentou em todos os estratos analisados, notadamente, nas classes DE (61%, aumento de 11 pontos percentuais). Enquanto 100% da classe A tem acesso à internet no domicílio, na classe C a proporção é de 89% e na DE, de 61%. Do ponto de vista da conectividade, a disparidade entre os domicílios das classes A e DE vem diminuindo nos últimos anos, sendo que a diferença entre esses estratos passou de 83 pontos percentuais em 2015 para 39 pontos em 2021. O indicador apresentou estabilidade, com 39% dos domicílios brasileiros com computador, mas, ao analisar algumas variáveis, ainda há desigualdades entre as áreas urbana e rural, com a urbana tendo mais que o dobro de proporção e por classe, com 99% da classe A com computador, contra apenas 10% das classes DE. “Desde 2015, é possível observar que na classe A há uma estabilidade na proporção de computador nos domi-

cílios, enquanto vemos uma redução nas classes C e DE, em que houve uma diminuição significativa na proporção de casas que possuem computadores”, ressaltou Fabio Storino. O analista destacou ainda o crescimento do uso da internet pela população com 60 anos ou mais. A pesquisa também mostrou que, no Nordeste, a proporção maior é de usuários exclusivos de Wi-Fi. Já no Norte do País, a maior proporção é de acesso à internet por plano celular. “Isso tem impacto na diversidade das atividades que são realizadas online”, explicou Storino. Outro destaque foi o uso da internet por tipo de dispositivo. “Enquanto o computador foi o principal meio até 2014, há mais de uma década, desde o surgimento dos smartphones, o celular começou a se popularizar, e hoje 99% acessam a internet por celular e parte dos novos usuários são exclusivos com o acesso via celular”, disse. Com relação ao acesso via televisão, que vinha crescendo desde 2014, em 2021, ficou em segundo lugar, saindo de uma população de 49,5 milhões, em 2019, para 74,5 milhões em 2021. Serviços públicos A proporção de usuários de internet com 16 anos ou mais que utilizaram serviços de governo eletrônico passou de 68%, em 2019, para 70%, em 2021. Cerca de 93 milhões de brasileiros afirmaram usar algum tipo de serviço de governo eletrônico no período, um acréscimo de 12 milhões de indivíduos nesses dois anos. Os aumentos mais significativos ocorreram na região Sul (de 69%, em 2019, para 80%, em 2021), entre pessoas com renda familiar de três a cinco salários-mínimos (de 79% para 88%). Entre os tipos de serviço público analisados pela pesquisa, os relacionados à saúde foram os mais buscados ou realizados em 2021, sobretudo entre usuários da classe B (44%), com Ensino Superior (44%) e os na faixa etária de

“Enquanto a fibra ótica e o cabo são as principais tecnologias em quase dois terços das casas urbanas, nas rurais, as maiores conexões são por rede móvel, satélite e rádio.” Fabio Storino Coordenador da TIC Domicílios

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“Reflexo da pandemia, predominou o acesso a serviços eletrônicos relacionados à saúde pública, como agendamento de consultas, busca de informações sobre a vacinação, entre outras formas de interação com os sistemas de saúde.” Alexandre Barbosa Gerente do Cetic.br/NIC.br

45 a 59 anos (34%) – em 2019, foram 25%, 28% e 20%, respectivamente. “Reflexo da pandemia, predominou o acesso a serviços eletrônicos relacionados à saúde pública, como agendamento de consultas, busca de informações sobre a vacinação, entre outras formas de interação com os sistemas de saúde”, comentou Alexandre Barbosa. gerente do Cetic.br/NIC.br. Atividades culturais Entre as atividades realizadas pela internet, ouvir podcasts foi a que mais cresceu em relação ao período pré-pandemia. De acordo com a 17ª edição da TIC Domicílios, 28% dos usuários de internet disseram ter ouvido um podcast em 2021 (em 2019, eram 13%). Em 2021, 41 milhões de pessoas realizaram essa atividade, cerca de 24 milhões a mais que em 2019. Assim como verificado em 2019, as atividades de assistir a vídeos, programas, filmes ou séries pela internet (61%) e ouvir músicas (61%) estiveram entre as atividades culturais online mais citadas pelo conjunto da população brasileira. Quanto ao pagamento por serviços que dão acesso a conteúdos culturais, os maiores aumentos, em relação a 2019, ocorreram para ver filmes (acréscimo de 7 milhões de indivíduos) e séries (acréscimo de 9 milhões), incremento que ocorreu com maior intensidade entre indivíduos da classe C. “A pesquisa revela mudanças importantes em termos de conectividade, especialmente em áreas rurais, e também o crescimento da televisão enquanto dispositivo de acesso à internet. A TIC Domicílios cumpre um papel fundamental de auxiliar o poder público e a sociedade na proposição de políticas que visem a melhorar o acesso à internet, expondo desafios e indicando oportunidades para avanços”, completa José Gontijo, coordenador do CGI.br.

Divulgação

DOMICÍLIOS COM COMPUTADOR¹ Total de domicílios Percentual (%)

Sim

Não

39

61

Urbana

42

58

Rural

20

80

Sudeste

46

54

Nordeste

27

73

Sul

46

54

Norte

29

71

Centro-Oeste

41

59

Até 1 SM

19

81

Mais de 1 SM até 2 SM

32

68

Mais de 2 SM até 3 SM

51

49

65

35

82

18

88

12

Não tem renda

16

84

Não sabe

32

68

Não respondeu

42

58

A

99

1

B

83

17

C

41

59

DE

10

90

TOTAL ÁREA

REGIÃO

Mais de 3 SM até 5 SM RENDA Mais de 5 SM até 10 SM FAMILIAR Mais de 10 SM

CLASSE SOCIAL

Fonte: CGI.br/NIC.br, Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), Pesquisa sobre o uso das tecnologias de informação e comunicação nos domicílios brasileiros - TIC Domicílios 2021. ¹ Considera-se um domicílio com acesso a computador todo aquele que menciona ao menos um entre os seguintes tipos: computador de mesa, notebook e tablet

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conexão

5G e Wi-Fi 6E geram novos modelos e oportunidades de negócios O presidente da Abranet, Eduardo Neger, afirmou que a combinação do 5G com o Wi-Fi 6E tem potencial para a geração de novos negócios. “A Anatel destinou 1.200 megahertz para o Wi-Fi 6. O Brasil abre para toda a cadeia de valor da internet novas possibilidades de

Testes de uso outdoor No mesmo evento, a Anatel anunciou que vai fazer testes de uso externo de roteadores Wi-Fi 6E, que se valem de um novo naco de radiofrequência para viabilizar a tecnologia de acesso fixo com taxas de transferência de 10 Gbps. “Vamos fazer um piloto para coordenação de frequências e testar o Wi-Fi 6E outdoor, que pode agregar um competidor a mais para as redes, seja no modelo de rede privativa, seja em parceria público-privada, para atender a ‘n’ tipos de negócios”, destacou o superintendente de Outorgas e Recursos à Prestação (SOR) da Anatel, Vinícius Caram. O uso outdoor já estava no radar desde o início, mas exige o desenvolvimento do chamado ‘controle automático de frequência’, ou AFC, na sigla em inglês. Trata-se de uma espécie de monitoramento permanente das fre-

Brasil em risco Um novo estudo da empresa de segurança cibernética Surfshark classifica o Brasil como o quarto país que mais sofreu violações de segurança cibernética ao longo do 2º trimestre de 2022, sendo o 1º na América do Sul. Os dados do Surfshark mostram

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desenvolvimento de aplicações”, apontou Neger. Ele lembrou que os primeiros equipamentos certificados estão disponíveis e há mobilização em torno das aplicações. O executivo participou, em junho, do Brasil Tech Fórum, realizado em Brasília pela Network Eventos.

quências em uso em uma determinada área, de forma a evitar interferência do Wi-Fi 6E nesses serviços. “Para o uso outdoor acontecer, a gente precisa desenvolver um sistema chamado AFC. Como a faixa tem outras utilizações, inclusive em caráter primário, o sistema precisa pegar informações do que existe em funcionamento e da posição geográfica do equipamento que se quer ativar, para apontar e dizer ao equipamento em qual frequência e potência vai trabalhar”, explica Sidney Azeredo, assessor na SOR. É um sistema na mesma linha do previsto nas regras de uso do Wi-Fi 6E nos Estados Unidos – que já partiu da liberação desse espectro para o acesso não licenciado com previsão de uso outdoor desde o início. Mas embora tenha baixado essas regras um ano antes do Brasil, por lá também a FCC, órgão regulatório norte-americano, ainda está às voltas com a estruturação do sistema AFC e, até aqui, não há Wi-Fi outdoor em uso.

que, no período, 3,2 milhões de usuários brasileiros foram violados, um aumento de 771% em relação ao primeiro trimestre. Os três primeiros lugares no ranking global do trimestre foram ocupados pela Rússia (28,8 milhões de usuários violados), Índia (4,4 milhões) e China (3,4 milhões). O Brasil superou os EUA (2,3 milhões), em quinto lugar.

Violações de segurança 2º trimestre de 2022

País

Nº de usuários violados

Rússia

28,8 milhões

Índia

4,4 milhões

China

3,4 milhões

Brasil

3,2 milhões

EUA

2,3 milhões Fonte: Surfshark


Brasileiro quer o banco na palma da mão...

Inteligência Artificial e governos

O PIX foi o maior parceiro e impulsionador dos bancos móveis em 2021. Com a força do meio de pagamento, as transações financeiras efetivadas pelo canal móvel cresceram 75% em 2021, passando de 9,3 bilhões para 16,1 bilhões, revelou a terceira etapa da pesquisa da Federação Brasileira de Bancos (Febraban). De acordo com o estudo, o banco móvel é, hoje, o principal canal de transações do setor financeiro, ao responder por 56% do total das transações bancárias. Somado ao Internet Banking, os canais digitais já são 70% de todas as transações financeiras efetivas no Brasil. O levantamento mostrou ainda que sete em cada dez transações acontecem pelos canais digitais. E o mais importante: um quarto das transações feitas no canal móvel são transações efetivamente financeiras e não consultas apenas.

O uso de tecnologias emergentes chegou ao poder público, como mostra a nova edição da pesquisa TIC Governo Eletrônico. A Inteligência Artificial é de longe a tecnologia mais mencionada, por quase metade dos órgãos federais (45%) e 22% dos estaduais. Os tipos de Inteligência Artificial mais utilizados foram aprendizagem de máquina para predição e análise de dados (32% dos órgãos federais e 9% dos estaduais) e automatização dos processos de fluxo de trabalho (31% dos órgãos federais e 11% dos estaduais). Destaca-se ainda o uso de tecnologias de mineração e análise de linguagem escrita por um a cada quatro órgãos federais. Já o reconhecimento e processamento de imagens foram citados por 13%; o reconhecimento de fala, por 10%; a geração de linguagem natural, por 7%; e a movimentação de máquinas autônomas, como robôs, veículos ou drones, por 1%.

... e PIX em alta

Sem internet

O PIX é o meio de pagamento preferido do brasileiro. O levantamento da Febraban mostrou que, entre março de 2021 e março de 2022, o número de correntistas que pagaram mais de 30 PIXs por mês cresceu 1.000%, enquanto a base geral de usuários cadastrados cresceu 72%, chegando a 51 milhões de correntistas. Já a base de usuários que receberam mais de 30 PIXs por mês avançou 464%. O levantamento detectou que o ritmo de expansão de recebimento de mais de 30 PIXs por mês em pessoas físicas é maior do que em pessoas jurídicas (PJs), o que sinaliza a oportunidade de expansão da ferramenta de pagamentos instantâneos em comércios e serviços. O crescimento nas PJs ficou em 445%.

A TIC Educação 2021, realizada pelo CETIC.br/ NIC.br e divulgada em julho deste ano, desvenda um triste dado da realidade brasileira no ensino: 84% dos alunos residentes em áreas urbanas não têm dispositivos – PCs, celulares ou tablets – e nem acesso à internet em suas casas. O percentual piora ainda mais na área rural, chegando a 92%. Os professores – ouvidos pela primeira vez na pesquisa – também revelaram suas dificuldades. Tanto que 66% dos professores da área urbana assumiram a falta de habilidade para realizar atividades educacionais com os alunos com o uso de tecnologias. Na área rural, o índice de professores com essas dificuldades aumenta para 76%. Dos professores que mostraram dificuldades em realizar atividades utilizando a tecnologia, 69% eram da rede pública de ensino, seja ela estadual ou municipal.

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opinião Maria Clara Souza Baroni Advogada e integrante do departamento jurídico da VianaTel, empresa especializada em consultoria regulatória para provedores de internet

As regras do telemarketing e as empresas de internet Resultado de incontáveis queixas de usuários de telefonia, ligações que configurem a prática de telemarketing ativo devem apresentar número de origem identificável sempre iniciado pelo prefixo 0303. Ao determinar a obrigatoriedade, a Anatel visa possibilitar às pessoas que não querem receber tais ligações recusá-las ou bloquear as linhas de origem. A questão que fica para as empresas de internet é até onde a medida as afeta. A obrigatoriedade do uso do prefixo é prevista pelo Ato nº 10.413, aprovado pela Anatel em novembro de 2021. O documento determina que operadoras móveis teriam até 90 dias após a publicação da medida no Diário Oficial da União para adotarem o 0303. Desta forma, empresas que possuem a licença para SMP (Serviço Móvel Pessoal) tiveram até 10 de março último para se adequarem. A decisão não se aplica apenas às operadoras de telefonia fixa e móvel. Prestadoras de serviço de telecomunicações que utilizam recursos de numeração organizados por meio de um conjunto de prefixos e códigos e que permitem o estabelecimento de conexões entre diferentes terminações de rede também ficam sujeitas à determinação. Ainda que existam questionamentos quanto à abrangência do procedimento operacional, diante das medidas de controle da Anatel, verifica-se que todas as empresas com interesse em contatar potenciais consumidores para vendas precisarão se regularizar e usar o prefixo 0303. A Anatel deixou claro que sua intenção inicial era se concentrar sobre telefonia fixa e móvel, principais meios usados no telemarketing ativo. Porém, já prevendo que, com número significativo de usuários bloqueando números ou recusando essas chamadas, a atividade migrará para outros canais. Por isso, já se manifestou no sentido de que SMS, WhatsApp e outras ferramentas de comunicação abranet.org.br

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que possam ser usadas para a oferta de produtos e serviços serão alvo de determinações semelhantes. Isso já ocorre com o VoIP. Por conta do seu uso para a realização de grandes volumes de ligações de até três segundos de duração, a agência tem autuado prestadoras exigindo, entre outros, que realizem o bloqueio de chamadas que não utilizem recursos de numeração por ela atribuídos e remetam-lhe listas de usuários que geraram 100 mil ou mais ligações diárias com as características mencionadas. Mais do que os canais porque ele se dá, a intenção da agência é coibir o telemarketing ativo. É a resposta ao elevado número de queixas de pessoas que consideram a atividade intrusiva. O telemarketing ativo refere-se às ligações realizadas com o intuito de ofertar serviços ou produtos, seja através de ligações gravadas previamente ou não. A determinação da Anatel, portanto, não se aplica a ligações envolvendo cobranças, pedidos de doação e outros. Após a publicação do Ato, associações que representam empresas do setor de call center, como é o caso da Associação Brasileira de Telesserviços (ABT), recorreram ao Supremo Tribunal Federal (STF) solicitando o reconhecimento da inconstitucionalidade parcial da norma, no sentido de que a atribuição de uso de código não geográfico 303 é restrita à oferta por telefone de produtos e serviços por empresas prestadoras de serviços de telecomunicação. Ainda que existam questionamentos quanto à abrangência do procedimento operacional, a prática de atividades de telemarketing ativo sem o uso do prefixo é considerada ilegal e poderá gerar sanções por parte da Anatel, como por exemplo, bloqueio do número indevidamente utilizado e aplicação de advertência ou multa, conforme estabelecem as normas internas do órgão.

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